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GALERIA NUNO CENTENO
GALERIA
De Portugal para o Mundo
A GALERIA NUNO CENTENO É UM ‘EX-LIBRIS’ DA CIDADE DO PORTO. SITUADA LONGE DO QUARTEIRÃO DAS ARTES, NUM EDIFÍCIO EMBLEMÁTICO DA CIDADE, A GALERIA É HOJE UM PONTO INCONTORNÁVEL DA ARTE CONTEMPORÂNEA. NUNO CENTENO, QUE COLECCIONA PRÉMIOS INTERNACIONAIS, COMO O QUE O COLOCOU NO LOTE DOS MELHORES 10 GALERISTAS EUROPEUS PELO ARNET OU A DISTINÇÃO DA APOLLO 40 UNDER 40 DA APOLLO INTERNATIONAL ART MAGAZINE, CUJO OBJECTIVO É CELEBRAR A PRÓXIMA GERAÇÃO DE INOVADORES E INSPIRADORES LÍDERES EMPREENDEDORES DO MUNDO DA ARTE, DIZ QUE “TRABALHA DO PORTO PARA O MUNDO” E NÃO TEM DÚVIDAS EM AFIRMAR QUE HOJE A GALERIA E O PORTO “JÁ FAZEM PARTE DO MAPA INTERNACIONAL DAS ARTES”. “QUANDO VIAJO, DE UMA MANEIRA GERAL EU SEI QUEM SÃO OS OUTROS E OS OUTROS SABEM QUEM SOU”.
“Queria um espaço que fosse representativo da cidade do Porto”, é desta forma simples que Nuno Centeno justifica a escolha do emblemático edifício da Cooperativa dos Pedreiros para instalar a “sua” galeria desde 2018. O espaço, com 1100 metros quadrados, transporta-nos para o “mundo da arte”, as paredes “brutalistas” e “meio toscas”, remetem-nos para os ‘lofts’ industriais que nos acostumamos a ver no Soho em Nova Iorque, ou em Berlim…mas a vista impressionante sobre a cidade rapidamente nos recorda que estamos no Porto. A Cooperativa dos Pedreiros, que está ligada a alguns dos mais emblemáticos edificados da cidade como a rotunda da Boavista, a mítica estação de S. Bento ou o edifício dos Paços do Concelho, é agora o albergue de um espaço dedicado à arte contemporânea, a Galeria Nuno Centeno. Nuno Centeno, filho do reconhecido artista plástico Sobral Centeno, desde cedo percebeu que o seu destino estava traçado, mas como costuma dizer “as coisas a mim vão-me acontecendo”. Com 21 anos embarca para o Rio de Janeiro para ser artista…mas sai de lá galerista. “Como estava sozinho no Brasil, acabei por me dedicar à arte 24 horas por dia. Os meus dias eram passados entre estudar arte, ir a inaugurações, fazer algum desporto e andar no meio, conhecer pessoas…aprendi muito até porque os brasileiros têm muita liberdade criativa e artística”, diz o galerista. Eclético por natureza, Nuno depara-se com um problema. Gostava de todas as formas de arte e percebe que a “única forma de agregar tudo isso e estar no meio artístico era viver a arte através dos outros”. Foi assim que nasceu o galerista Nuno Centeno. Em 2007, quando regressa a Portugal, é o pai que o apoia a abrir o primeiro espaço, a Reflexus. “Basicamente era uma micro sala de 20 metros quadrados, forrados a pladur, num prédio tipicamente português, em frente ao Palácio de Cristal”. O funcionamento era também simples. “Comecei a convidar artistas locais muito novos e fomos crescendo juntos, quando dei por mim, o que idealizara como um espaço de projectos torna-se uma galeria, estava a representar artistas…foi um processo muito espontâneo”, recorda
ELISABETE FELISMINO
NUNO CENTENO
Nuno Centeno. A galeria foi-se “tornando super cool”, porque “apesar do mercado de arte ser muito forte na altura, era também muito estanque”. Com 27 anos, Nuno Centeno percebe que “tem liberdade para fazer o que os outros não podiam até porque não tinha a preocupação comercial”. “Tínhamos apenas a necessidade de fazer coisas fixes, de ser cool”. É com esse espírito que Nuno parte para Londres, em 2009. Juntamente com dois amigos começa a fazer uma exposição por mês, num micro ‘atelier’ de um deles, por trás da Whitechapel Gallerry. O projecto foi um sucesso, durou cerca de dois anos, mas o galerista só esteve envolvido durante um ano, e consistia em convidar todos os meses um artista português da nova geração, com alguma visibilidade em Portugal, a expor em Londres. Mas o chamariz de Portugal fala mais forte. Nuno regressa ao Porto, desloca a galeria para a Rua Miguel Bombarda (a rua das artes no Porto) e passa a chamar-lhe Galeria Nuno Centeno. “A partir daí começa a existir uma consciência maior, tinha mais confiança para abrir um espaço com o meu nome. E há um momento muito interessante, os artistas que escolho para trazer a Portugal muitos deles não eram ainda conhecidos, mas estavam a um passo de se tornarem artistas muito grandes”. “Foi uma viragem incrível para muitos deles. Passaram a ser representados pelas maiores galerias do mundo e é aí que a galeria também começa a crescer”, recorda. A tal simbiose no mundo da arte: “os artistas crescem, a galeria cresce, a galeria cresce e os artistas crescem”. Seguem-se anos de muito trabalho e de grande reconhecimento. “Começa a saga de 10, 11 anos de feiras internacionais ( Frieze London e Nova Iorque, Miami Art Basel, ARCO Madrid, entre outras) que só pararam na pandemia”. De resto, em 2018 a Galeria é distinguida com o prémio do melhor ‘stand’ da feira internacional Frieze em Nova Iorque. Nuno Centeno depara-se agora com um ‘statement’. “Este é um projecto muito bonito, eu acho, e muito específico porque é um projecto pessoal, é um projecto de vida, não é só um projecto comercial- que também o é, até porque temos contas brutais para pagar- é um projecto, é a Galeria que vai sendo aquilo que eu sou ao longo da vida”. “Sou muito eclético, gosto de rock, gosto de jazz, gosto de música brasileira e eletrónica e na arte é exatamente igual e à medida que vou crescendo vou ajustando o programa”, afirma Nuno. Agora “o que estou a tentar é
encontrar um balanço entre o meu projecto que é esta galeria e conciliar a família”. Até porque admite “o mundo da arte é extremamente agressivo, da mesma forma que é mundo da música e o mundo da moda”. E sobretudo é um mundo em que se “fala muito de liberdade, mas onde acabas por estar preso a um conjunto de regras que não estão escritas no papel, são códigos e regras que existem…é um mundo muito impenetrável do qual tenho o privilégio de fazer parte”. Nuno Centeno diz mesmo que “para se estar no mundo da arte, há uma altura na tua vida em que só podes viver e respirar aquilo que fazes e depois ao fim de alguns anos, se te conseguires posicionar, consegues libertar-te um pouco”. “É um pouco nessa fase que estou”, frisa o galerista.
A “fuga” do quarteirão das artes Nuno Centeno justifica a escolha do espaço e a transferência da Rua Miguel Bombarda, onde de facto nasceu a Galeria que transporta o seu nome, com as limitações da rua. “É uma rua muito bonita, cresci ali, mas é uma rua com limitações em termos de espaço, precisava de um espaço maior e queria sair do conceito de loja”. Quase por acidente, encontra a Cooperativa dos Pedreiros, apaixona-se pelo espaço e começa logo ali a visualizar o futuro. Reconhece que as inaugurações em simultâneo da Miguel Bombarda tem alguma vantagem a nível da dinâmica, mas não a nível comercial. Hoje, adianta, tem o seu próprio público. “As pessoas vêm aqui para vir à Galeria, vem aqui para ter um momento cultural, para ter uma experiência com a cidade”. “Geralmente veem mais do que uma exposição, às vezes até quatro, têm projectos integrados com arquitectura, às vezes vídeo arte, projectos mais experimentais e depois há ainda esta coisa incrível que é a vista para a cidade, portanto temos mais para dar do que só a experiência artística”. De resto, acrescenta: “cada vez mais estamos a convidar artistas que vêm de áreas diferentes, do cinema experimental, arquitetura, design”. Apesar de não estar no quarteirão das artes o entendimento com os pares é “muito bom”. O mesmo se passa com os agentes culturais da cidade, nomeadamente com a Fundação de Serralves, onde faz parte inclusive do Conselho de Fundadores. Quanto ao futuro, Nuno vê a galeria a caminhar para um modelo mais profissional e mais livre. “Caminha sempre de uma forma íntima e pequena, não quero que a galeria seja grande em termos de estrutura, quero que seja grande em termos de visibilidade, de ‘branding’ e de programa”. E, sobretudo vê a galeria Nuno Centeno a caminhar para “uma experimentação, a de cruzar artistas contemporâneos nas várias ramificações que podem ir do design, à arquitetura, à música, ao fashion design”. Nuno Centeno tem ainda um desejo quase secreto. “Questiono a possibilidade de no futuro vir a ter uma galeria/espaço cultural sem uma preocupação de representação de artistas, é algo que gostava de experimentar. Ou seja, uma galeria que não tivesse a necessidade de representar um artista, uma galeria que pudesse fazer livremente exposições de artistas”. Uma opção que reconhece “traria mais liberdade e que tem muito a ver com este meu lado de estar sempre à procura de algo mais, de não saber estar quieto”. Seria, acrescenta “uma experiência que poderia abrir a porta para um trabalho mais emocional com os artistas, penso que é algo que pode vir a ser muito interessante no futuro”. Para Nuno Centeno, Portugal está na moda no que respeita à arte contemporânea e a prova disso é a maior facilidade com que hoje se trazem artistas para Portugal. “Portugal está na moda, claro que está. Há uma tendência de estrangeiros a quererem mudar-se para Portugal e, de um modo geral, os artistas têm interesse ou curiosidade em fazer uma apresentação ou uma exposição no nosso país”. Apesar de não ser uma galeria de “muitos clientes, mas sim com bons clientes”, Nuno admite que “nos últimos tempos temos tido cada vez mais clientes, costumo dizer que aparecem do nada, mas a verdade é que isso é o culminar de muito trabalho. Nos últimos 15 anos não tive vida própria e foi preciso vir uma pandemia para que isso se alterasse”. Aliás, sobre a pandemia, altura em que a Galeria Nuno Centeno chegou a fazer quatro exposições virtuais ao mesmo tempo, o galerista admite que foi um “período positivo, fui obrigado a parar e tive tempo para pensar”. Com alma de artista, o galerista reconhece que hoje é empresário, mas salienta que “evito pensar como tal, tento ser muito pragmático, muito simples a fazer a gestão da galeria”. E como estamos a falar de uma estrutura “familiar torna-se mais simples”. “Somos uma galeria sólida em Portugal com visibilidade para o mundo”, e é assim que “queremos continuar a ser”. Depois da exposição de Carolina Pimenta “This side of Nowhere”, que decorreu até 28 de Maio, actualmente pode ser vista, até 16 de Julho, a exposição de Ângelo de Sousa, Philippe Van Snick e Sobral Centeno. l