Texto Base - Módulo 1 - Mediação da Aprendizagem

Page 1

Módulo 1 Texto Base – Mediação da Aprendizagem

Autora: Flávia Sampaio GPEC – Educação a Distância www.gpeconline.com.br

Layout: Janaína Corrêa Martino Bernaola


CURSO MEDIAÇÃO DA APRENDIZAGEM PROFª: FLÁVIA SAMPAIO

TEXTO BASE O curso mediação da aprendizagem foi pensado a partir dos questionamentos e angústias dos professores em entender como a relação pedagógica influencia na aprendizagem e na vontade de aprender do aluno. Inúmeros destes professores buscam melhorar sua prática e a efetividade do processo de ensino aprendizagem, abandonando a visão de uma educação bancária, na qual, fomos educados, e aderindo à concepção de uma educação construtivista, de construção do conhecimento. Ainda, alguns educadores mantém seu foco de trabalho nos conteúdos a serem disponibilizados ao aluno, oferecendo o “conteúdo pelo conteúdo”, sem uma objetivação maior e sem uma participação discente na apropriação destes. Atualmente, percebemos que o conhecimento não é adquirido, mas construído, numa relação mediadora entre o professor e o aluno, em que sejam ofertados experimentações, abertura à fala e participação discente, objetivos claros e transcendência dos mesmos às situações rotineiras. O conceito de mediação da aprendizagem não é novo. Sócrates, filósofo ateniense, filho de um escultor e de uma parteira, criou um método de ensino chamado de “Maiêutica”, que a tradução é “ajudar a nascer”. Este método consistia em deixar que o aluno expusesse sua própria opinião e suas ideias acerca do tema e, o professor (Sócrates), através de perguntas direcionadas e convites à reflexão, levava o aluno a rever suas ideias, lapidando-as, e criando conceitos sobre as mesmas. Neste método, é o aluno quem produz seu próprio conhecimento sendo “mediado” pelo professor. Méier (2004) relata sobre o conceito de mediação “... certamente é anterior a Sócrates, pois faz parte do agir humano. A mãe que ensina seu filho a andar, a 2


comer, a falar e a estabelecer relações com o mundo, faz mediação. A criança, que orienta seu irmão nos primeiros passos em um jogo ou brincadeira, faz mediação. E é essa mediação que possibilita o desenvolvimento emocional, afetivo, físico e cognitivo da criança...” Segundo o autor, a mediação “é o mecanismo, por excelência, responsável pela transmissão da cultura de um povo, de um grupo social.” E quando a criança e/ou jovem não se beneficia efetivamente desta cultura, ou um adulto mediador não consegue transmití-la de forma eficaz, há o que Feuerstein denominou como Síndrome de Privação Cultural, e como consequência disto, apresentará dificuldades de aprendizagem. O autor coloca a Síndrome de Privação Cultural como o fator paralisador da modificabilidade, bem como, enfatiza que o desenvolvimento cognitivo “somente pode acontecer de forma natural e saudável se o indivíduo puder experimentar uma interação humana que lhe forneça os instrumentos para lidar com o mundo.” (GOMES, 2002) Por este motivo, vários profissionais têm dedicado suas pesquisas e trabalho ao estudo deste mecanismo. Um dos autores que mais tem se destacado no estudo da mediação da aprendizagem é o psicólogo e doutor em psicologia do desenvolvimento Profº Reuven Feuerstein. REUVEN FEUERSTEIN – BIOGRAFIA Reuven Feuerstein nasceu em 21 de Agosto de 1921, na Romênia. É o quinto de oito filhos de uma família judia e reside em Israel desde a década de 40. Méier (2004) relata que “no grupo particular e familiar de Feuerstein, a mediação esteve sempre presente por intermédio de conversas entre os irmãos e a mãe, quando contavam uns aos outros o que aprenderam e leram durante a semana, reconstruindo tais experiências mental e verbalmente. Ficavam todos sentados à mesa da cozinha conversando, e estas conversas eram mediadas pela mãe, tal fato lhes dava condições de acesso ao significado de suas experiências.”

3


De 1940 a 1941 frequentou o “Teachers College” em Bucareste e em 1944 formou-se em Psicologia no “Onesco College” na mesma cidade. De 1944 a 1945 frequentou o “Teacher Training Seminary” em Jerusalém. Voltou aos estudos em 1949 na Suíça onde participou de palestras de Carl Jaspers, Carl Jung e L. Szondy. De 1950 a 1955 estava na Universidade de Genebra sob a orientação de Andre Rey e Jean Piaget, completando sua graduação em Psicologia Clínica e Geral Em 1970 Feuerstein obteve seu doutorado em Psicologia do Desenvolvimento em Sorbonne. Seus principais campos de pesquisa foram Psicologia do Desenvolvimento, Psicologia Clínica e Psicologia Cognitiva a partir de uma perspectiva trans-cultural. Atualmente mora em Jerusalém, Israel, onde dirige o Instituto para o Desenvolvimento

do

Potencial

de

Aprendizagem

(ICELP),

órgão

internacionalmente reconhecido por seu trabalho de referência na área de intervenção cognitiva junto aos indivíduos com a síndrome de Down. Além desse trabalho, o Instituto tem realizado anualmente um congresso internacional em que são divulgados os resultados das pesquisas no campo da intervenção cognitiva e da mediação da aprendizagem. Esse ano, em julho de 2004, o encontro foi realizado em Amsterdã, na Holanda. É o diretor do Instituto Hadassah – WISO - Canada Research Institute desde 1965. Este instituto faz parte, desde 1993, do Centro Internacional para o Desenvolvimento do Potencial de Aprendizagem (ICELP) – International Center for the Enhancement of Learning Potential, com sede em Jerusalém. O Hadassah é um órgão internacional que tem contribuído financeiramente com o trabalho e com as pesquisas realizadas no ICELP. Foi fundado em 1983 pelo próprio Feuerstein e colaboradores. Seu principal trabalho ocorre no ICELP, onde pesquisa e desenvolve a teoria da Modificabilidade Estrutural Cognitiva, as experiências de aprendizagem mediada, a avaliação dinâmica do potencial de aprendizagem (LPAD), o sistema

de

intervenção

cognitiva

denominado

PEI

-

Programa

de

4


Enriquecimento Instrumental e, ainda, o campo relacionado aos “ambientes modificantes”. Tem realizado também inúmeros trabalhos, pesquisas e ações com populações de indivíduos com dificuldades cognitivas, incluindo vários projetos de integração da população de imigrantes judeus vindos de outros países, como da Etiópia e outros. Entre as atividades e as pesquisas desenvolvidas por Feuerstein estão os estudos dos efeitos dos programas de Youth Aliyah nos sobreviventes do Holocausto, programas para preparação de jovens Sindrômicos de Down, ou outras deficiências no trabalho, para que possam atuar como monitores, auxiliares ou atendentes a idosos ou deficientes, ou como auxiliares no trabalho com o Programa de Enriquecimento Instrumental para adultos com alto nível de funcionamento tanto quanto para crianças pré-escolares.

5


MAS, O QUE É MEDIAÇÃO? Segundo o dicionário, mediação é entendida como o ato ou feito de mediar, ato de servir de intermédio entre pessoas, grupos, partidos, a fim de dirimir divergências ou disputas; é o processo pelo qual o pensamento generaliza os dados apreendidos pelos sentidos. A definição de mediação também varia de acordo com a especificidade de sua utilização, assumindo sentidos diversos. Há várias denominações para este termo, da filosofia à psicologia: como um processo criativo, mediante o qual se passa de um termo inicial a um termo final; enquanto este define o termo como uma sequência de elos intermediários, numa cadeia de ações. Há também o conceito comumente utilizado de que mediação é a ponte, é o que permite uma passagem de uma coisa à outra. Sócrates, filósofo ateniense, já utilizava a mediação em sua interação com seus discípulos e outras pessoas da comunidade. Ele estabelecia, através do diálogo, uma ponte, uma atitude reflexiva, que instigava o interlocutor a buscar definições de conceitos e palavras. Segundo o filósofo, era necessário conhecer bem cada coisa em particular, pois só assim se podia explicá-la aos outros. Acreditava Sócrates que a falta de conhecimento constituía em engano para si e para os outros. Mediar significa, portanto, possibilitar e potencializar a construção do conhecimento pelo mediado. Significa estar consciente de que não se transmite conhecimento. É estar intencionalmente entre o objeto de conhecimento e o aluno de forma a modificar, alterar, organizar, enfatizar, transformar os estímulos provenientes desse objeto a fim de que o mediado construa sua própria aprendizagem, que o mediado aprenda por si só. A concepção da mediação como possibilitadora da construção pessoal do conhecimento, deve trazer consigo algumas mudanças na ação do professor. Posturas não mediadoras precisam ser revistas, integradas e contextualizadas. Há que se promover transformações no trabalho docente que garantam a mediação da aprendizagem como opção consciente de ação pedagógica. Quando o professor fala em sala de aula, realiza, sob o ponto de vista físico, alterações no meio ambiente por meio de ondas sonoras. Essas ondas 6


movimentam-se pelo ar e causam perturbações nos tímpanos do sistema auditivo dos alunos de acordo com o que foi produzido pelo professor. Uma vez havendo movimento do tímpano, o sistema auditivo transforma essa alteração física em químico-elétrica. A corrente elétrica percorre os neurônios até a área primária da audição localizada no lobo temporal, no cérebro. A partir da decodificação realizada na área primária, tem-se a sensação auditiva que, em seguida, é encaminhada, também por meio de corrente elétrica, à área secundária onde há uma nova decodificação criando uma "imagem auditiva". Da área secundária da audição, essa imagem auditiva segue para a área terciária e associa-se às imagens provenientes das outras sensações - visuais por exemplo. Esse conjunto de associações, juntamente com imagens provenientes da memória e do córtex frontal, responsável pela ação de pensar, imaginar e raciocinar, cria a consciência e a compreensão do conceito inicialmente explicado pelo professor. Ocorre aprendizagem.

7


PARADIGMA HOLÍSTICO DA APRENDIZAGEM Em qualquer paradigma são implicados vários fatores: físicos, sociais, estéticos, políticos, relacionais, emocionais. Neste, todos os componentes que o compõem são baseados na modificabilidade cognitiva. Esta interação de todos os componentes tem como objetivo a modificabilidade cognitiva do indivíduo. Diferentemente do conceito de “inteligência”, que nos passa uma visão de adaptação, de modificação, mas por um outro lado traz a ideia de barreira e de limite. Os

componentes

do

paradigma

holístico

da

aprendizagem

estão

disponibilizados de acordo com o quadro a seguir

Aprendiz

Conteúdo

rr Conteúdo Mediador

rr

AMBIENTE A junção destes pólos forma a interação da aprendizagem mediada. Todos os pólos, com suas funções, estão interligados e interferem entre si. 

Ao aprendiz é dada a função de se apropriar do conteúdo e construir o conhecimento acerca do mesmo;

Ao conteúdo é dada a função de estar adequado ao aprendiz, sendo significativo a este;

8


Estes componentes são intermediados pelo mediador que se interpõe selecionando, filtrando e estimulando;

Todos estes componentes são circundados pelo ambiente que recebe tais, modifica-os e é por eles modificado.

APRENDIZ – Este precisa estar bem física, psíquica, emocional e socialmente. O aprendiz precisa sentir-se seguro, alimentado, e em condições físicas de aprender. Aluno com fome, inseguro, emocionalmente limitado, com dores, não aprende. Daí a necessidade de observação constante e contato com as famílias para conhecer o histórico de cada aluno. CONTEÚDO – Este deve ser agradável, de acordo com a faixa etária e grau de desenvolvimento de cada aluno. Conteúdos demasiadamente complexos, extensos, ou o contrário, fáceis demais, são desestimulantes e desmotivantes. Não instigam o aluno a querer aprendê-los. Conteúdos sem conexão com os conhecimentos prévios dos alunos, sem link com outras situações ou disciplinas escolares, ou seja, o conteúdo pelo conteúdo, também não incentiva a vontade de apreendê-los e dominá-los. AMBIENTE – O ambiente deve ser confortável, aconchegante, acolhedor, alegre, seguro, tanto física quanto socialmente. Um ambiente quente, com pouca ventilação, ou com cadeiras desconfortáveis (muito baixas ou muito altas); ou que não tenha a cara dos alunos, expondo os trabalhos do professor e evitando os dos alunos, fica lindo, porém, não acolhe nem valoriza o trabalho discente. Quando o professor opta por enfeitar a sala de aula com suas produções, ou seus cartazes comprados prontos, com bichinhos de histórias infantis ou de mídia, colocando-os em destaque: cartaz dos aniversariantes, cartaz do ajudante, dia da semana: a informação que transmite ao aluno é „só gosto de coisas perfeitas’, e interfere na criação do aluno que tentará sempre fazer estes desenhos, com esta qualidade e desmerecendo-se. O aluno acaba por sempre querer reproduzir o que, em sua

9


concepção, agradará ao professor, e sempre ficará com a sensação de incompetência. Também o ambiente deve ser limpo, sem ruídos externos. E aí, podem me falar que há escolas construídas às margens de ruas de alto trânsito e estas são insuficientes para os alunos? Muitas vezes, o ambiente desta ou outra nesta mesma situação, têm uma temperatura relacional tão boa que o ruído se torna mínimo. Deve-se avaliar os vários critérios para a formação deste ambiente. O ambiente circula todos os componentes do Paradigma. MEDIADOR – Este, se analisarmos por uma outra ótica, perceberemos que é a figura central do processo de aprendizagem, pois é ele quem seleciona e filtra os conteúdos a serem trabalhados com os alunos; é ele quem escolhe o que, quando e como avaliar; é o mediador quem direciona o movimento de aprendizagem, a dinâmica de sala de aula e as atividades a serem realizadas. Portanto, este deve, também, estar bem física, psíquica e emocionalmente. O mediador deve gostar de sua profissão, do local em que trabalha (escola e comunidade); também deve manter uma relação harmoniosa consigo mesmo, exercendo o hábito de trabalhar sua autoestima, de ter momentos de lazer e crescimento pessoal. Um mediador que não se encontra bem fisicamente, estressado, com problemas pessoais, familiares e sociais, não conseguirá efetivamente ajudar seus alunos no processo de aprendizagem. O mediador deve estar bem para bem acolher, ajudar, desequilibrar e ensinar. Todos os componentes apresentam uma função relevante, mas é dado ao mediador a mais importante. É o mediador que, ao se relacionar com o mediado, apresenta uma série de objetivos, uns conscientes e outros nem tanto, pois nesta relação perpassam muito mais que os conteúdos acadêmicos predeterminados. A mediação acontece na interação, no conviver e, nesta interação humana, os valores, os sentimentos, as opiniões e ideias, também são apresentadas ao mediado.

10


O mediador, dentro de um outro ponto de vista, deveria ser considerado o pólo central da aprendizagem, pois é ele quem determina, em uma medida ilimitada, a disposição do aprendiz de aprender, o papel do conteúdo (além de sua escolha), como este conteúdo será avaliado. O mediador tem um papel central, relevante no processo educacional!! O papel do mediador é ajudar os alunos a atingirem os objetivos estipulados, atuando de forma qualitativa. A maior dificuldade para uma mediação benéfica está em planejar a aula, é prever, antecipar a reação dos aprendizes, mediante o que foi ensinado. A noção de planejar não pode ser desconectada dos aprendizes. Para se chegar na base das dificuldades, o mediador deveria questionar e analisar os 4 pontos da aprendizagem: aprendiz, conteúdo, mediador, ambiente.

11


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.