Revista Híbrida DANCE

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Grupo Corpo Dança contemporânea brasileira 3


O projeto DANCE, é uma revista híbrida experimental, fruto de um trabalho de conclusão de curso de design, que tem a “dança” como seu principal tema. Esse produto editorial é híbrido, pois, com um único layout gráfico ele pode ser ao mesmo tempo, apropriado tanto para o suporte impresso quanto para o digital, explorando as possibilidades que existem em ambos os meios. Essa revista será uma publicação semestral que demonstrará, através de possibilidades interativas e dinâmicas, usando imagens estáticas e em movimento, além de áudios e animações, diferentes grupos brasileiros de dança, suas histórias, obras, características, curiosidades, etc. Nessa primeira edição piloto, foi apresentado o trabalho de um grupo brasileiro de dança contemporânea, o Grupo Corpo, suas obras, sua equipe e todo o seu sucesso tanto no Brasil quanto no exterior. Além de em cada edição apresentar como principal assunto um grupo de dança diferente, haverá sempre uma sessão denominada “Agenda” que informará ao leitor alguns grupos de dança que estarão se apresentando em Campinas e outras cidades da região durante todo o semestre que segue a publicação. As informações utilizadas nesse boneco da revista híbrida foram retiradas principalmente do site oficial do Grupo Corpo (disponível em: <http://www.grupocorpo.com.br/>. Acesso: Nov./2015) e de outros sites secundários, como o Wikipédia (disponível em: <https://www.wikipedia.org/>. Acesso: Nov./2015) e Época (disponível em: <http://epoca.globo.com/vida/noticia/2015/08/grupocorpo-celebra-40-anos-em-boa-forma.html>. Acesso: Nov./2015) Desse modo, esperamos que cada página desta revista possa ser agradável e interessante para todos os leitores amantes da dança e da cultura brasileira. Daniela Fecchio Martins Editora


Sobre a Revista Híbrida Essa revista foi projetada para ser utilizada tanto em suporte impresso quanto no digital, ou seja, suas páginas foram pensadas para uma boa leitura em tela, na versão digital, ou em papel, na versão impressa. Se, primeiramente, o usuário está lendo essa revista em sua versão impressa, terá a oportunidade de desfrutar de todas as características que esse produto oferece, como poder levá-lo para qualquer lugar, poder sentir sua textura, seu cheiro e até mesmo anotar em suas páginas. Entretanto, posterior, com um dispositivo digital, o leitor poderá ter acesso à outra versão da revista, podendo assistir a vídeos, ouvir músicas e ler muito mais sobre o conteúdo apresentado através dos links externos. Contudo, se a situação for ao contrário, ou seja, primeiramente o leitor estiver diante da revista no suporte digital, desfrutando de toda sua interatividade e dinamicidade, ele também poderá, se necessário, imprimir suas páginas e lê-las nesse outro suporte. A maneira de utilizar essa revista é muito fácil, seu sentido de leitura é tradicional e são apresentados alguns ícones (abaixo) que auxiliam o leitor a manipular esse produto no suporte digital.

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SU

RI

AGENDA

10 SEM MIM Na obra Sem Mim (2011), é possível per­ ceber uma intensa rela­ ção entre os movimentos feitos pelos bailarinos e aqueles das ondas do mar. 6

Saiba quais gru­ pos de dança irão se apresentar em Cam­ pinas e região durante o primeiro semestre de 2016! Um de nossa lista é o Gira Dança, de Natal/RN.

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BACH Obra do Grupo Corpo de 1996, Bach foi uma forma de homenagear um dos maiores compositores de todos os tempos, Johann S. Bach.

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26 POR TRÁS DO PALCO Um espetáculo não surge simplesmente do nada. Muito esforço e de­ dicação podem ser visto no trabalho de preparação do Grupo Corpo. 7


AGENDA

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GIRA DANÇA

QUASAR CIA DE DANÇA

CIDADE: Campinas

LOCAL: Paulínea

PERIODO: Jan./2016 - Jun./2016

PERIODO: Mar./2016 - Jul./2016

Gira Dança é uma companhia de dança con-

A Quasar é um veículo de manifestação artís-

temporânea com sede em Natal/RN, que foi

tica, que se expressa através da dança con-

criada em 2005 e desde então, tem apresen-

temporânea, desenvolvendo uma grande pro-

tado em palcos de todo o Brasil um trabalho

posta estética própria e diversa. Movimentos,

que rompe preconceitos, limites pré-estabe-

a irreverência e velocidade contrastam com

lecidos e cria novas possibilidades dentro da

sutileza e leveza, em uma dança envolvente,

dança contemporânea.

que busca na excentricidade.


RAÇA CIA DE DANÇA

SOPRO CIA DE DANÇA

CIDADE: Piracicaba

LOCAL: Paulínea

PERIODO: Fev./2016 - Jul./2016

PERIODO: Mar./2016 - Jul./2016

Raça Cia. de Dança de São Paulo foi chama-

O SOPRO Cia de dança apresenta espetácu-

da a habitar o imaginário de três gerações

los de dança que seguem um estilo-técnico

de bailarinos acordando neles a percepção

contemporâneo definido, mesclando nos li-

de modo distinto de abordar a dança.

mites da dança, teatro e poesia, formando

Uma Cia. Brasileira, não pelas suas propos-

um híbrido na arte, que é a característica

tas temáticas e sim porque seus corpos exa-

básica dos alicerces da miscigenação da cul-

lam brasilidade.

tura brasileira.

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O mar (de Vigo), que leva e traz de volta o amado, o amigo, é o que dá vida e movimento à Sem Mim, espetáculo do Grupo Corpo de 2011, que é totalmente baseado nas canções galego portuguesas de Martín Codax do século XIII. A intenção de utilizar ritmos contemporâneos e brasileiros junto ao espírito profundo medieval traz o grande diferencial dessa obra. Fotografia de José Luiz Pederneiras de um movimento da obra Sem Mim, da cantiga que demonstra a emoção do encontro entre o amado e amada.

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O

mar (de Vigo), que leva e traz de volta

do mar de Vigo”, de Martín Codax. Nas sete

o amado, o amigo, é o que dá vida e

canções, datadas do século XIII, o poeta se pro-

movimento a Sem Mim. O balé é em-

nuncia sempre em nome da mulher; mais especi-

balado pela trilha original urdida a quatro mãos

ficamente de jovens apaixonadas que pranteiam

pelo viguês Carlos Núñez e pelo brasileiro José

a ausência ou festejam a iminência do regresso

Miguel Wisnik a partir do único conjunto de

do amado-amigo. Na avidez do reencontro, elas

peças do cancioneiro profano medieval galego

confidenciam ora com o mar, ora com a mãe, ora

-português que chegou aos nossos dias com as

com amigas. E, para aplacar ou fustigar o seu de-

respectivas partituras de época: o célebre “ciclo

sejo, saem a banhar-se nas ondas do mar de Vigo. A sincronização de movimentos para cima e para baixo, remetem ao calmo e continuo movimento do mar.

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A lírica do trovador medieval leva Rodrigo Pederneiras a pautar sua partitura de movimentos na alternância entre calmaria e fúria e no vaivém próprios das ondas do mar, e, também, a (re)produzir, no jogo de cena, o apartamento entre feminino e masculino, onde um(a) reclama sempre a falta do outro, em coreografia marcada pelo fluxo constante de avanços e recuos e pela recorrência.

As cantigas Galego-Portuguesas de Martín Codax inspiram Rodrigo Pederneiras a produzir movimentos que alteram entre calmaria e fúria e no vaivém próprios das ondas do mar, além de reproduzir, no jogo de cena, a relação entre feminino e masculino, onde um(a) reclama sempre a falta do outro.

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O

mar (de Vigo), que leva e traz de volta o amado, o amigo, é o que dá vida e movimento a Sem Mim. O balé é em-

balado pela trilha original urdida a quatro mãos pelo viguês Carlos Núñez e pelo brasileiro José Miguel Wisnik a partir do único conjunto de peças do cancioneiro profano medieval galego -português que chegou aos nossos dias com as respectivas partituras de época: o célebre “ciclo

do mar de Vigo”, de Martín Codax. Nas sete canções, datadas do século XIII, o poeta se pronuncia sempre em nome da mulher; mais especificamente de jovens apaixonadas que pranteiam a ausência ou festejam a iminência do regresso do amado-amigo. Na avidez do reencontro, elas confidenciam ora com o mar, ora com a mãe, ora com amigas. E, para aplacar ou fustigar o seu desejo, saem a banhar-se nas ondas do mar de Vigo.

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As cantigas Galego-Portuguesas de Martín Codax inspiram Rodrigo PeA lírica do trovador medieval leva Rodrigo

derneiras a produzir movimentos que

Pederneiras a pautar sua partitura de movi-

alteram entre calmaria e fúria e no

mentos na alternância entre calmaria e fúria e no vaivém próprios das ondas do mar,

vaivém próprios das ondas do mar,

e, também, a (re)produzir, no jogo de cena,

além de reproduzir, no jogo de cena,

o apartamento entre feminino e masculino,

a relação entre feminino e masculino.

onde um(a) reclama sempre a falta do outro, em coreografia marcada pelo fluxo constante de avanços e recuos e pela recorrência.

A sincronização de movimentos para cima e para baixo, remetem ao calmo e continuo movimento do mar.

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Avanços e recuos e pela recor-

paisagens e elementos distintos: mar, monta-

rência de movimentos, sinuosos

nhas, nuvens, barco, rede de pesca, alvorada.

ou abruptos, de tronco.

Sobre malhas finas inteiriças tingidas de acor-

A partir da combinação de uma

do com a cor da pele de cada bailarino, Freusa

forma geométrica (um enorme quadrado

Zechmeister aplica inscrições e texturas base-

de alumínio vazado) com uma forma orgâni-

adas em ornamentos da Idade Média, trans-

ca (metros e metros de uma trama sintética

formando o corpo dos bailarinos em suporte

fabricada para o sombreamento de culturas

para uma simbologia da época, e criando a

agrícolas), ambas manipuláveis verticalmente,

ilusão de que a cena é povoada por homens e

Paulo Pederneiras constrói um cenário meta-

mulheres “em pelo”, cuja “nudez” é coberta

mórfico que, no decorrer do espetáculo, vai se

apenas por um dos signos mais arcaicos do

transfigurando e formando representações de

imaginário marítimo: a tatuagem. A partir da

A imagem do canto superior esquerdo é uma ilustração do artista Antonio García Patiño que pode ser relacionada com as imagens abaixo, que são movimentos da obra Sem Mim. Em ambas mostra a relação, os sentimentos, existentes entre a mulher e seu amado.

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combinação de uma forma geométrica (um

Pode-se fazer uma relação entre

enorme quadrado de alumínio vazado) com

imagens dos movimentos da obra

uma forma orgânica (metros e metros de uma trama sintética fabricada para o sombreamen-

Sem Mim com ilustrações do artista

to de culturas agrícolas), ambas manipuláveis

Antonio García Patiño que recriam o

verticalmente, Paulo Pederneiras constrói um

que dizem as cantigas Galego-Portu-

cenário metamórfico que, no decorrer do es-

guesas de amigo, como as de Martín

petáculo, vai se transfigurando e formando representações de paisagens e elementos distintos: mar, montanhas, nuvens, barco,

Codax, datadas do século XIII, que foram resga-

rede de pesca, alvorada, sobre malhas finas

tadas para o espetáculo

inteiriças tingidas de acordo com a cor.

do Grupo Corpo.

A imagem ao lado é uma ilustração do artista Antonio García Patiño que conversa com a imagem abaixo, de modo que ambas demonstram a consolação que se existia, que é cantada nas cantigas de amigo, quando as mulheres aguardavam a chegada do amado.

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Cenas de coreografias da obra Sem Mim (2011) do Grupo Corpo.

CANTIGA IV

CANTIGA V

Ai Deus, se sabe ora meu amigo

Quantas sabedes amar amigo

como eu señeira estou en Vigo?

treides comigo a lo mar de Vigo

E vou namorada!

E bañar-nos-emos nas ondas.

Ai Deus, se sabe ora meu amado

Quantas sabedes amar amado

como eu en Vigo señeira maño?

treides comigo a lo mar levado

E vou namorada!

E bañar-nos-emos nas ondas.

Como eu señeira estou en Vigo

Treides comigo a lo mar de Vigo

e nullas gardas non hei comigo?

e veeremo-lo meu amigo

E vou namorada!

E bañar-nos-emos nas ondas.

Como eu señeira en Vigo maño

Treides comigo a lo mar levado

e nullas gardas migo non trago?

e veeremo-lo meu amado

E vou namorada!

E bañar-nos-emos nas ondas.

E nullas gardas non hei comigo ergas meus ollos que choran migo! E vou namorada!

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CANTIGA VI

CANTIGA VII

E no sagrado em Vigo

Ay ondas que eu vin ver!

bailava corpo bonito:

Se me saberedes dizer

Amarei!

por que tarda meu amigo

Em Vigo no sagrado

sen min?

bailava corpo delgado:

Ay ondas que eu vin mirar!

Amor hei!

Se me saberedes contar

Bailava corpo bonito que nunca tivera Amigo:

por que tarda meu amigo sen min?

Amarei! Bailava corpo delgado

As músicas da obra Sem Mim produzidas por

que nunca tivera amado:

Carlos Núñes e José Miguel Wisnik, sobre obra

Amor hei!

de Martín Codax, transmitem movimentos e

Que nunca tivera amigo

sentimentos que podem sem sentidos e enten-

senão no segredo em Vigo:

didos pelos espectadores, quando esses escu-

Amarei!

tam os ritmos, interpretam as letras e assistem aos movimentos dos bailarinos. 19


Cenas de coreografias da obra Sem Mim (2011) do Grupo Corpo.

CANTIGA IV

CANTIGA V

Ai Deus, se sabe ora meu amigo

Quantas sabedes amar amigo

como eu señeira estou en Vigo?

treides comigo a lo mar de Vigo

E vou namorada!

E bañar-nos-emos nas ondas.

Ai Deus, se sabe ora meu amado

Quantas sabedes amar amado

como eu en Vigo señeira maño?

treides comigo a lo mar levado

E vou namorada!

E bañar-nos-emos nas ondas.

Como eu señeira estou en Vigo

Treides comigo a lo mar de Vigo

e nullas gardas non hei comigo?

e veeremo-lo meu amigo

E vou namorada!

E bañar-nos-emos nas ondas.

Como eu señeira en Vigo maño

Treides comigo a lo mar levado

e nullas gardas migo non trago?

e veeremo-lo meu amado

E vou namorada!

E bañar-nos-emos nas ondas.

E nullas gardas non hei comigo ergas meus ollos que choran migo! E vou namorada!

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CANTIGA VI

CANTIGA VII

E no sagrado em Vigo

Ay ondas que eu vin ver!

bailava corpo bonito:

Se me saberedes dizer

Amarei!

por que tarda meu amigo

Em Vigo no sagrado

sen min?

bailava corpo delgado:

Ay ondas que eu vin mirar!

Amor hei!

Se me saberedes contar

Bailava corpo bonito que nunca tivera Amigo:

por que tarda meu amigo sen min?

Amarei! Bailava corpo delgado

As músicas da obra Sem Mim produzidas por

que nunca tivera amado:

Carlos Núñes e José Miguel Wisnik, sobre obra

Amor hei!

de Martín Codax, transmitem movimentos e

Que nunca tivera amigo

sentimentos que podem sem sentidos e enten-

senão no segredo em Vigo:

didos pelos espectadores, quando esses escu-

Amarei!

tam os ritmos, interpretam as letras e assistem aos movimentos dos bailarinos. 21


Um jogo entre o que se ouve e o que se vê, no qual o barroco de Bach e o barroco de Minas Gerais, no Brasil, se realizam como dança. A coreografia aspira ao que está acima, e a música, ao que está dentro das partituras de Bach, as quais Marco Antônio Guimarães, o compositor, nos ajuda a descobrir.

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U

m Bach mais que barroco. Mineiro. De

estreou mundialmente em setembro de 1996

um azul ultramarino intenso. E grafite.

na tradicional Bienal da Dança de Lyon, arran-

E dourado. Como as igrejas do ciclo do

cando dez minutos ininterruptos de aplausos.

ouro, nas antigas Geraes – talhadas pelo gênio

Vigésima sexta coreografia na cronologia da

de Aleijadinho, ungidas com afrescos de Ataíde.

companhia mineira de dança, Bach brota de

Um Bach divinamente profanado. Que despenca

uma criação livre e iluminada de Marco An-

de súbito dos céus para outra vez ascender às

tônio Guimarães em torno da obra do maior

alturas. Um Bach que cantata, mas que também

compositor de todos os tempos. Mineiro,

ciranda. Um Bach mais que barroco, mineiro.

moldado para a música na legendária usina

Assim – clássico, contemporâneo, universal,

de sons montada em Salvador pelo suíço Wal-

interiorano, divino, profano, solene, malemo-

ter Smetak, cérebro e medula óssea do Uakti

lente – é Bach, a primeira produção do GRUPO

(o mais instigante e original dos conjuntos ins-

CORPO na qualidade de companhia residente

trumentais brasileiros), colaborador do COR-

da Maison de La Danse, de Lyon – condição

PO desde 1992, quando compôs a trilha ma-

que ocupou por três anos consecutivos. Bach

gistral de 21, Guimarães mergulhou por um.

Vigésima sexta coreografia na cronologia da companhia mineira de dança, Bach brota de uma criação livre e iluminada de Marco Antônio Guimarães em torno da obra do maior compositor de todos os tempos, Johann Sebastian Bach.

Johann Sebastian Bach (1685 - 1750) foi um compositor, cantor, cravista, maestro, organista, professor, violinista e violista oriundo do Sacro Império Romano-Germânico, atual Alemanha.

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Ano no universo barroco de João Sebastião

ções: Conceição Nicolau e Sandro Assunção, do

(1685-1750). Escarafunchou bibliotecas; vas-

coral do Palácio das Artes de Belo Horizonte.

culhou cada vereda da memória; retrogradou

A intensa carga de religiosidade que emana

movimentos; fundiu cantatas, coros e prelú-

da música de Bach encontra tradução visu-

dios; revelou partes ocultas na partitura do

al no desdobramento do espaço cênico em

gênio; transmutou suítes em acompanhamen-

dois planos: um aéreo/celeste, outro rasteiro/

tos e, como Gounot na Ave Maria, derramou

terreno – recurso determinante no resulta-

sobre eles nova melodia. Fez mais. Fez o que ja-

do final do espetáculo, idealizado por Paulo

mais havia feito antes: pesquisou, alterou e criou

Pederneiras, diretor artístico e iluminador do

timbres e instrumentos em teclados eletrônicos.

grupo, que desta vez assina a cenografia ao

Quase uma heresia para quem dedicou a vida à

lado do “titular da pasta”, o artista plástico

investigação de novas texturas sonoras, tendo

Fernando Velloso. Como estalactites futuris-

por base, invariavelmente, instrumentos acús-

tas, um feixe de tubos metálicos tingidos de

ticos (no mais das vezes inventados, também).

negro se precipita dos urdimentos.

Na trilha, sintetizadores e dois instrumentos de corda (o Chori, da linhagem do mestre Smetak, e o Gig, de lavra própria) são comandados pessoalmente pelo (re)criador, enquanto duas vozes celestiais conduzem árias, cantatas e can-

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Diversos tubos metálicos tingidos de negro se precipita dos urdimentos, criando uma inusitada zona coreográfica, de onde os bailarinos despencam na cena e por onde forjam a ascensão. Iluminada na diagonal a “peça” cenográfica faz alusão ao órgão, instrumento que o compositor alemão tangeu com paixão e maestria.


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Uma inusitada zona coreográfica, de onde

Freusa Zechmeister despe as pernas e os braços

os bailarinos despencam na cena e por onde

dos bailarinos e brinca com as três cores básicas

forjam a ascensão. Iluminada na diagonal a

do cenário sobre macaquinhos de couro stretch

“peça” cenográfica imprime na retina do es-

ou elanca fosca e botinhas de cano curto.

pectador a imagem (ou semelhança) do ins-

O idioma singular e brasileiríssimo, desenvol-

trumento que o compositor alemão tangeu

vido pelo CORPO em 21 anos de dança, ex-

com paixão e maestria.

pande seu universo vocabular, incorporando

Um mesmo e profundo azul colore o piso e as

aqui e ali fonemas, sílabas e dicções do rock

duas camadas de tecido que compõem o fun-

– língua desde sempre universal. Enquanto a

do do palco. Do meio para o final do espetá-

coreografia de Rodrigo Pederneiras liberta-se

culo, descem sobre a cena 172 m de retalhos

cada vez mais da forma, tirando os pontos de

de popeline ultramarino, num portentoso pa-

apoio do espectador e lançando-o no domí-

tchwork monocromático, versão glorificada

nio irresistível do inesperado imagem (ou se-

dos alegres tapetes populares do interior.

melhança) do instrumento.

2

28


Nas imagens acima podemos observar os figurinos desenhados por Freusa Zechmeister, que deixa o mais livre possível todos os movimentos realizados pelos bailarinos.

À parte o desempenho do elenco do Corpo, que reúne talentos exaltados pela crítica internacional, “Bach” tem como ponto forte a ambientação cênica, em que tons vigorosos de azul, preto e dourado conferem, por vezes, uma dimensão futurista.

29


por trรกs do palco

30


Para se ter o espetáculo que vemos no palco, existe um longo caminho a ser percorrido. O preparo é intenso e deve sempre ser levado a sério pelos bailarinos e toda a equipe do Grupo Corpo. Registro de vários momentos de ensaio ilustram todo esse processo existente até a conclusão da obra final.

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por trรกs do palco

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Para se ter o espetáculo que vemos no palco, existe um longo caminho a ser percorrido. O preparo é intenso e deve sempre ser levado a sério pelos bailarinos e toda a equipe do Grupo Corpo. Registro de vários momentos de ensaio ilustram todo esse processo existente até a conclusão da obra final.

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O

espetáculo se pauta pelo lirismo,

Ao mesmo tempo que ganhava currículo cos-

pleno de movimentos delicados que

mopolita, com a realização de turnês mundo

passam longe do gestual extravagan-

afora, o Corpo manteve sua natureza domés-

te e das acrobacias que vemos em conhecidas

tica. É essencialmente um grupo mineiro, cria-

atrações de dança contemporânea. “Não gosto

do pelos irmãos Pederneiras. Paulo, Pedro,

muito de fogos de artifício. Não é nossa praia”,

Rodrigo e Miriam ainda integram a equipe,

afirma Pederneiras. Tanto os figurinos quanto a

enquanto o primogênito, José Luiz, e a caçu-

cenografia e a iluminação servem como supor-

la, Marisa, partiram para outros projetos. O

te para realçar o bailado, sem desviar a atenção

primeiro endereço da turma foi a própria casa

dele. Uma parte da exibição tem como pano de

dos pais, que abriram mão da moradia em

fundo um grande painel branco com textura se-

prol do sonho maior dos filhos. Como apên-

melhante à de um papel amassado. Na outra, as-

dice, o Corpo ganhou uma escola de dança

soma um mosaico com mais de 1.000 fotografias

e, tempos depois, um projeto social que hoje

que remetem às quatro décadas de existência

envolve 600 crianças e adolescentes. O grupo

da companhia. A pompa se resume a um collant

chega aos 40, mas com vigor e corpinho de

de veludo usado pelas bailarinas na segunda me-

20, como mostra este ensaio fotográfico feito

tade da apresentação, que tem duração de 115

durante a preparação para o espetáculo, que

minutos e a participação de 21 dançarinos.

chegou em São Paulo e ao Rio de Janeiro.

Abaixo e na página anterior, podem-se observar momentos dos ensaios dos bailarinos no Grupo Corpo, que sempre procuram a perfeição no movimento coreografado, que além de ser sincronizado, tem que ser sentido. Fotos: Leo Drumond.

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Eu acho que, de uma maneira geral, o Grupo Corpo abriu um monte de portas, um monte de janelas, deu uma arejada muito grande no movimento de dança no Brasil, de uma maneira geral. [...]Todas as plateias atÊ agora aplaudiram de pÊ no intervalo, isso Ê a coisa mais rara do mundo.

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Retrato de Rodrigo Pederneira, coreรณgrafo do Corpo desde 1978, que tem seu trabalho reconhecido nacional e internacionalmente.

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A revista DANCE realizou uma entrevista com Rodrigo Pederneiras, coreógrafo e um dos principais responsáveis pela formação do Grupo Corpo, na qual pode-se perceber sua opinião sobre o grupo e algumas de suas obras. Quantos espetáculos você já coreografou?

Você tem medo de se repetir?

Já fez essa conta?

R: Não. Não tenho medo nenhum. Às vezes

R: Para o Corpo, em 39 anos, foram 32 espetácu-

a gente acaba se repetindo mesmo, o que não

los. Mas já trabalhei muito fora também, na Fran-

acho ruim. Você acaba criando certas referências

ça, Suíça, Alemanha, Canadá, Estados Unidos.

para o seu trabalho. Acho isso até importante.

Há pouco fiz um trabalho para a Limon Dance Company, em Nova York, com música feita pelo

Qual é o seu espetáculo preferido?

Paquito D’Rivera especialmente composta para

R: O preferido é sempre o último. Mas “21”

o grupo. Também trabalhei com todas as maio-

(1992) foi um trabalho em que eu tive uma par-

res companhias do Brasil, como a Companhia de

ceria muito boa com Marco Antônio Guimarães

Dança do Palácio das Artes, o Ballet do Rio de

(do Uakti). A “Missa do Orfanato” também é

Janeiro e São Paulo Cia. de Dança.

um trabalho que eu adoro. Em “Lecuona” tive uma boa parceria com nosso cenógrafo Fernan-

Qual é a principal diferença entre trabalhar

do Velloso. É um espetáculo que nasceu a partir

com o Corpo e para essas companhias que

das conversas que tive com o Nando a respeito

te contratam?

das canções (de Ernesto Lecuona). Gosto muito

R: É uma diferença muito grande. Não posso

de “Sem Mim”, de “Nazareth” (1993), do Triz e

querer fazer o que faço para o Grupo Corpo,

de muitos outros que realizamos.

no mesmo espaço de tempo que faço para o Corpo, com outra companhia. Seria pos-

Quais características tem que ter o bailarino

sível se tivesse um tempo muito maior, mas

que vem para o Grupo Corpo?

normalmente é impossível, porque as com-

R: Primeira coisa que nós olhamos é a técnica

panhias têm cronogramas já planejados. Aqui

clássica. Tem que ter essa técnica muito apura-

no Grupo Corpo existe uma relação muito

da. Depois fazemos testes com repertório da

próxima entre eu e os bailarinos, os bailarinos

companhia, para ver como ele se insere nesse

já conhecem o meu tipo de trabalho, a minha

tipo de linguagem e também a força que esse

forma de trabalhar, a maneira de lidar.

bailarino tem individualmente. 37


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