Excesso de Magenta 01

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Cidade Belém Game Mario Bros. Ensaio Ruínas Cinema Almodóvar

EXCESSO DE

Música Joy Division

MAGENTA


Índice Música | pg6

Joy Division Em apenas quatro anos, Ian Curtis e sua turma mostraram que o talento, quando verdadeiro, é capaz de sobreviver a tudo, inclusive à tragédia. Guto Lobato conta a trajetória do Joy Division, uma das mais importantes bandas do pós-punk inglês, ícone de uma época e pai de centenas e centenas de grupos ao redor do planeta.

Belém

Cidade | pg16

O que escondem as esquinas de Belém? Nada que um olhar atento não seja capaz de captar. Nas lentes do fotógrafo Bob Menezes, uma Cidade das Mangueiras cheia de nuances e beleza. Páginas do cotidiano eternizadas em imagens.

Game | pg30

Mario e eu Quem nunca passou horas tentando ultrapassar as fases de Super Mario Bros. que atire o primeiro console. Arthur Napoleão, que aprendeu as primeiras letras ao mesmo tempo em que decorava macetes dos jogos lançados pela Nintendo, lembra um pouco da história do game de maior sucesso da história.


Ensaio | pg36

Ruínas No Bosque Rodrigues Alves, em pleno coração da capital paraense, existe uma história pedindo para ser contada. A fotógrafa Luiza Cavalcante fornece o clima e a personagem. Cabe a você dar vida e escolher os caminhos a serem tomados dali em diante.

Almodóvar

Cinema | pg46

Trinta anos de carreira, 16 filmes. Prolífico. Polêmico. Genial. O cineasta espanhol Pedro Almodóvar tem sua trajetória esmiuçada por Mayara Luma, em um texto que remonta à origens de muitas das obsessões que fazem do espanhol um dos nomes mais singulares e importantes do cinema contemporâneo.

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Cidade Belém Game Mário Bros Ensaio Ruinas

EXCESSO DE

Música Joy Division

MAGENTA

Editor: André Loreto Diretor de arte: André Loreto Design: André Loreto Colaboradores: Arthur Napoleão, Guto Lobato, Mayara Luma, Bob Menezes, Luiza Cavalcante, Elvis Rocha Ilustrações: Gabriel Cavalcante, Rodrigo Cantalicio Revisão: Elvis Rocha Fale conosco: excessodemagenta@gmail.com

Cinema Almôdovar

Excesso de Magenta é uma publicação bimestral. Os textos assinados são de responsabilidade dos autores e não refletem, necessariamente, a opinião da revista. Capa Gabriel Cavalcante


Editorial

Wikipédia. Está lá. Magenta. Única cor em mais de uma faixa no espectro. Associação de Artistas pela Arte de Figueira da Foz, em Portugal. Banda de rock progressivo do País de Gales. Cidade-palco de uma sangrenta batalha na Segunda Guerra de Independência Italiana. Percepção visual, cultura e história. Uma única palavra. (...) Excesso. Substantivo masculino. Exagero. Cúmulo. Falta de moderação. (...) O que está diante seus olhos a partir de agora ultrapassa - e muito – a simples reunião de dois vocábulos trissílabos. Excesso de Magenta. Percepção visual imoderada. Exagero de informação. Bosque Rodrigues Alves e Joy Division. Super Mario Bros. e Almodóvar. O cotidiano da cidade e suas cores. História e Cultura aos montes. Aqui. Em Excesso. Em Magenta.

Elvis Rocha


Colaboradores De Loreto

Elvis Rocha

Guto Lobato

Bob Menezes

Luiza Cavalcante

Arthur Napole達o

Mayara Luma

Rodrigo Cantalicio

Gabriel Cavalcante


pg6 Música


Por Guto Lobato

Joy Division Do início em um show do Sex Pistols ao suicídio precoce de seu líder, quatro anos depois, grupo inglês disseminou o pós-punk ao redor do mundo e fez ecoar as angústias de um talentoso – e controverso – astro do rock


Bernard Sumner guitarra

Ian Curtis vocal

D

Peter Hook baixo

Stephen Morris bateria

izem que uma morte fala mais

positor Ian Curtis, encerrava a curta e intensa trajetória

alto que um disco genial no

do quarteto inglês de pós-punk Joy Division.

universo do rock. Nos tempos

Mas morte não é a única coisa que vem à mente

áureos do gênero – aqueles

quando se pensa neste quarteto, que nasceu, cres-

em que o dinheiro não falava

ceu e definhou quatro anos depois, com dois CDs

tão alto e o visual junkie vinha

gravados e a perspectiva (concretizada tardiamente)

acompanhado de boa música –, no entanto, muitos fo-

de conquistar o mundo. Conhecer a história de Ian,

ram os mártires que souberam aliar qualidade artística

Bernard Summer (guitarra), Peter Hook (baixo) e Ste-

à tragédia humana: Jimi Hendrix, Janis Joplin, John

phen Morris (bateria) é, também, dar um passeio pelos

Bonham, Jim Morrison, Keith Moon, Sid Vicious, John

efervescentes anos 1970 – os anos da disco music,

Lennon, Elvis Presley. Todos mensageiros de seu

do punk e, enfim, do pós-punk inglês, que dominavam

tempo; ícones da história do rock que, de fato, tinham

jovens, rádios, emissoras de tevê e jornais de todo o

algo a dizer. Lá pelos idos de 1980, um jovem entrou

mundo – e parar na virada de década em que as gui-

precocemente neste seleto rol – um artista problemáti-

tarras cediam espaço aos sintetizadores.

co, dono de um talento singular junto a seu grupo, mas

O marco inicial do Joy Division foi emblemático: tudo

que deixou o mundo com poucas obras registradas.

começou num show dos Sex Pistols, no início do ve-

Com o suicídio de seu vocalista, líder e principal com-

rão de 1976. Empolgado com a idéia de sair do bate-


cabeça da platéia e berrar tudo o que quisesse no palco, Ian Curtis – jovem soturno, metido a poeta e entediado com a vida em Manchester – conheceu Peter Hook e Bernard Summer, com quem fez amizade e marcou alguns ensaios. Meses depois, encontraram o baterista Stephen Morris e formaram o Joy – inicialmente sob o título Warsaw, em homenagem a uma canção de David Bowie –, um quarteto como muitos outros que surgiam e sumiam no cenário independente àquela época. Só que com uma diferença: a verve de seu vocalista, dono de uma voz soturna e uma postura doentia em palco que criaram o conceito do pós-punk – um punk realmente póstumo, taciturno e introspectivo à enésima potência. Se Curtis tinha problemas com tons, semitons e agudos prolongados – e tinha mesmo, o que alimentou duradouras críticas à banda –, superava-os com letras densas e uma performance exagerada, quase teatral, »»


que incluía dancinhas metódicas, ataques epilépticos

fóbica do fin-de-décennie e trouxeram, na volta, can-

(reais, às vezes) e improvisações inesperadas. Hook,

ções como “Disorder” (o título a descreve bem, muito

Summer e Morris amavam isso. E o público começou

bem), “She´s lost control”, “Shadowplay”, “Day of the

a amar os quatro assim que os shows e participações

lords” e “Insight”. Os únicos ecos do punk no CD es-

em programas de tevê se intensificaram, numa ascen-

tão em “Interzone”, que já vinha sendo tocada ao vivo

são meteórica cujo registro mais acessível é o primeiro

pela banda. A esta época, as marcas registradas já

disco do grupo, “Unknown pleasures” (1979).

estavam bem claras: o baixo protagônico de Hooke, os rudimentos de Morris, a guitarra suja e descuidada de

Ascensão e “queda” em onze meses

Summer, o teclado que aparecia aos poucos. E Curtis,

Gravado em Stockport e lançado pela gravadora

cada vez mais rockstar – no bom e no mau sentido.

Factory em questão de meses, este CD conseguiu a

Não, não era arrogância ou algo do tipo. Curtis so-

façanha de levar ao estúdio a aura dos shows do Joy

fria de epilepsia, se entupia de remédios e havia casa-

Division. Deixando de lado os singles e canções lan-

do para arrumar uma amante logo depois, o que o fez

çados até então – alguns deles já hits, como “Trans-

mergulhar num forte quadro depressivo. Mesmo cada

mission” e “Digital” –, Curtis, Hooke, Summer e Morris

vez menos dono de si, o vocalista continuou levando

mergulharam fundo na poética deprê e algo claustro-

adiante a agenda lotada com a banda, às vezes pas-


sando mal no palco – e é nessa época que a banda

rada e, vá lá, certa evolução técnica de Curtis, o disco

lança no mercado a canção “Love will tear us apart”,

contém canções antológicas, como “Isolation”, “The

provavelmente seu maior sucesso até hoje. Com os

eternal”, “Heart and soul” e a bela “Twenty four hours”.

versos “When the routine bites hard/ And ambitions

Mais taciturnos que nunca, os instrumentais soavam

are low/ And the resentment rides high/ But emotions

inéditos mesmo à audição mais crítica e tinham tudo

won’t grow/ And we´re changing our ways, taking di-

para estourar mundialmente – o problema é que, na

fferent roads/ Then love, love will tear us apart again”,

véspera de embarcar para os Estados Unidos na pri-

Curtis mandou o recado de sua angústia ao público

meira turnê internacional do Joy Division, Curtis não

– tudo junto ao famoso riff de teclado que faria época

aguentou. Enforcou-se em sua casa, aos 23 anos, ou-

nos anos seguintes, fruto do contato da banda com os

vindo “The idiot” – CD do Iggy Pop, um de seus maio-

dinossauros da música eletrônica do Kraftwerk.

res ídolos.

Após meses de turnês e pioras do quadro clínico

Todos os planos foram por água abaixo? Que nada.

do vocalista, o grupo conseguiu entrar em estúdio em

A queda não foi íngreme: cercado de uma aura mór-

1980 e gravou “Closer”, o segundo full-lenght. Este

bida, “Closer” só foi prensado meses depois e estou-

aqui, polêmicas à parte, é um passo adiante em rela-

rou, alcançando o sexto lugar nas paradas inglesas e

ção a seu antecessor: com uma produção mais elabo-

motivando novos fãs a conhecer os pais do pós-punk.»»


Só faltou a tão esperada turnê, mas Ian Curtis e o Joy

(Gillian Gilbert, esposa de Morris) no line-up, com um

Division conseguiram, enfim, ganhar fama mundial-

grupo new wave também seminal na história da músi-

mente, emplacar suas canções no meio alternativo e,

ca, o New Order.

vá lá, conquistar a tão implicante crítica musical. Como

As canções ganharam acordes maiores, arranjos

mitos, lendas ou seja lá o que for do rock. Com menos

antenados ao mundo pop, mas relutaram a perder o

de quatro anos de estrada. E menos de 25 anos de

charme e a essência do jovem que uniu aqueles músi-

idade.

cos perdidos com a morte do punk inglês. Hook, Summers e Morris acabaram mais conhecidos no cenário

Lançamentos póstumos e a “nova ordem”

pop sob esta nova formação, editaram discos inspira-

Assim que viram o amigo e colega de banda enfor-

dos, como “Movement” (1981), “Power, corruption &

cado em sua casa, Hook, Summer e Morris decidiram

lies” (1983) e “Technique” (1989), lançaram hits mun-

acabar a banda. Não por ânsia de mitificação imediata,

diais como “Bizarre love triangle”, “The perfect kiss”,

mas sim por conta de um “acordo” feito entre eles: se

“True faith” e “Ceremony” (esta, uma “sobra” dos tem-

alguém saísse ou morresse, adeus Joy Division. Mas o

pos de Joy Division, chegou a ser tocada com Ian no

desejo de viver de – e para – a música continuou para

último show antes de seu suicídio, em 1980). Mas, cer-

os remanescentes do quarteto inglês: meses depois,

tamente, não conseguiram ofuscar o brilho do grupo

eles ressurgiram, acompanhados de uma tecladista

que os tornou famosos.


Para ler “Joy division/New Order – nada é mera coincidência” (Helena Uehara, 2006, editora Landy, 144 pgs.) Para assistir “Control” (Control, 2007, EUA/Inglaterra, 121 min., dir.: Anton Corbjin) “A festa nunca termina” (24 hour party people, 2002, Inglaterra, 112 min., dir.: Michael Winterbottom) Bandas que influenciaram Joy Division Iggy Pop & The Stooges, Sex Pistols, Velvet Underground, David Bowie, Lou Reed, Kraftwerk Bandas que Joy Division influenciou The Bravery, Editors, She Wants Revenge, Radiohead, Interpol, The Killers, Legião Urbana Com o tempo, vieram as coletâneas e CDs póstumos. Todos são válidos, especialmente para fãs, mas vale destacar os álbuns “Still” – uma coletânea lançada em 1981, com registros informais e a gravação histórica do último show do grupo –, “Warsaw” (1995) – CD que traz as primeiras sessões de estúdio da banda, ainda sob a influência direta do punk europeu – e o álbum ao vivo “Preston 28 February 1980”. Lançado apenas em 1999, este último é bem difícil de encontrar (uma cópia custa R$ 70 na Galeria do Rock, em São Paulo), mas traz o quarteto de Manchester em sua plena forma. Até ataque epiléptico de Curtis – durante uma versão etérea e longuíssima de “The eternal” – tem. Outras peças essenciais são os materiais literários e audiovisuais: destes, vale destacar o livro “Joy division/New Order – nada é mera coincidência”, de Helena Uehara, que traz uma abordagem interessante da poética dos dois grupos, comparando-as aos seus contextos de produção. E no cinema, há duas pequenas grandes obras-primas: “Control” e “A festa nunca termina”. Ambos são ótimos, mas o primeiro é o mais indicado; não apenas por trazer à tona todos os detalhes sobre a vida pessoal de Ian Curtis – baseando-se no livro “Touching from a distance: Ian Curtis & Joy Division”, de autoria de sua ex-mulher, Deborah Curtis –, mas pela direção genial do fotógrafo Anton Corbjin, que encontrou na escala cinza-preto-branco a expressão ideal para o ciclo autodestrutivo a que o jovem prodígio se submeteu.



Unknown Pleasures [1979] Disorder Day of the Lords Candidate Insight New Dawn Fades She’s Lost Control Shadowplay Wilderness Interzone I Remember Nothing

Unknown Pleasures é o nome do primeiro álbum da banda inglesa de pós-punk Joy Division. O álbum foi gravado em abril de 1979 no Strawberry Studios, em Stockport. Não há indicação dos lados do LP, e os nomes das músicas estão escritos no encarte, não no selo. Na reedição em CD, convencionou-se ser o lado A o que começa com a música Disorder. A capa foi feita por Peter Saville e Chris Mathan, mas foi Bernard Sumner quem deu a idéia de colocar a figura usada na capa, que nada mais é do que a morte de uma estrela captada por um medidor de pulsos. A figura da capa também está no selo do LP. Na contracapa do LP, consta a frase “Isto não é um conceito, é um enigma”.

para escutar | http://www.myspace.com/joydivision

She´s lost control Confusion in her eyes that says it all She’s lost control And she’s clinging to the nearest passer by She’s lost control And she gave away the secrets of her past And said I’ve lost control again And of a voice that told her when and were to act She said I’ve control again And she turned around and took by the hand and said I’ve lost control again And how I’ll never know just why or understand She said I’ve lost control again And she screamed out kicking on her side and said I’ve control again And seized up on the floor, I thought she’d died She said I’ve lost control again, she’s lost control (2) Well I had to ‘phone her friend to state my case And say she’s lost control again And she showed up all the errors and mistakes And said I’ve lost control again But she expressed herself in many different ways Until she lost control again And walked upon the edge of no escape And laughed I’ve lost control again She’s lost control again, she’s lost control (2)

Singles An Ideal For Living - 1978 Transmission - 1979 Licht und Blindheit - 1980 Komakino - 1980 Love Will Tear Us Apart - 1980 She’s Lost Control / Atmosphere - 1980 Love Will Tear Us Apart - 1980 Transmission - 1980 The First Peel Session - 1986 The Second Peel Session - 1987 Atmosphere - 1988 Love Will Tear Us Apart - 1995 Compilações Still (Joy Division) - 1981 Substance (Joy Division) - 1988 Permanenent - 1995 Warsaw - 1995 Heart And Soul - 1997

Closer é o segundo e último álbum da

Digital Feel it closing in Feel it closing in The fear of whom I call Every time I call I feel it closing in I feel it closing in day in, day out (6) I feel it closing in As patterns seem to form I feel it cold and warm The shadows start to fall I feel it closing in (2) Day in, day out (5) I’d have the world to see just whatever happens Stood by the door alone And then it’s fade away I see you fade away Don’t ever fade away I need you here today Don’t ever fade away (4) Fade away, fade away (4)

Closer [1980] Atrocity Exhibition Isolation Passover Colony A Means to an End Heart and Soul Twenty Four Hours The Eternal Decades

banda inglesa de pós-punk Joy Division, sendo considerado um dos mais importantes álbuns do movimento pós-punk. As músicas foram gravadas sob uma abóbada de estuque especialmente construída, a fim da captar a ressonância de uma capela. Não há indicação dos lados, seja no selo, seja no encarte. Assim, com o álbum anterior, Unknown Pleasures, a relação das músicas encontra-se apenas no encarte. Na reedição em CD, considerou-se o lado A sendo o que começa com Atrocity Exhibition, e o lado B começa com Heart And Soul. Por problemas na tiragem, o álbum só foi lançado em junho de 1980, depois do suicídio do vocalista Ian Curtis, tornando-se um álbum póstumo. A capa, que mostra a foto de uma lápide de cemitério, foi concebida antes da morte de Ian Curtis, mas acabou sendo uma infeliz coincidência.


pg16 Cidade


Por Bob Menezes

Nas Ruas

de BelĂŠm














pg30 Games

Mario & eu 1985

1987

1990

1992

1996


Por Arthur Napoleão

E

u nasci em 1985. Um ano particularmenparticularmen te interessante para os videogames e para viagens no tempo em filmes do Michael J. Fox. Neste ano foi lançado Super Mario Bros.

para o NES (conhecido por aqui também

como Nintendinho), verdadeiro divisor de águas entre os jogos que exigiam uma imaginação muito fértil, como os da era do Atari, e os que viriam a seguir, com uma sensação realista de “história sendo contada” e com progresso visível entre as fases. Eu mesmo tive um Atari, e é engraçado pensar hoje em como nós, ainda crianças, nos contentávamos com pouco. Certos jogos eram graficamente tão simplórios que a ação deles era praticapratica mente indiscernível. Por outro lado, Pitfall foi o jogo que começou minha paixão por videogames. Meu carinho pelos personagens da Nintendo só foi aparecer em 1992, quando eu ganhei meu Super Nintendo, que veio com os sensacionais Super Mario World – game gigante de 96 fases que eu admito: nunca terminei 100% – e Super Mario Kart, game único de corrida que já foi igual e infinitainfinita mente copiado. Já em 1994, a Nintendo lançou os quatro games da sésé rie Super Mario Bros. reunidos em Super Mario All-Stars, a coletânea “gamística” definitiva, com gráficos atualizados, novas opções de controle e de como salvar o progresso nos jogos. Foi um verdadeiro presente aos seus jogadores nascinasci dos há mais de dez anos. »»

1999

2001

2007


Mas antes mesmo de eu nascer, esta companhia

Foi só em ‘85 que as coisas entraram nos eixos

japonesa havia lançado um jogo que foi uma febre – e

e o Nintendinho, com seus poderosíssimos 8 bits se

referência no meio até hoje – no qual um certo encana-

tornou, durante mais de uma década, o console mais

dor bigodudo tinha que escalar prédios em construção

vendido do mundo.

para salvar sua donzela em perigo de um gorila gigante que lhe atirava barris.

Super Mario Bros., primeiro da série que inaugurou o formato de linearidade das fases neste ano, foi um

Por mais absurdo que isso pareça, Donkey Kong, o

fenômeno de crítica e se tornou, por sua vez, o game

primeiro sucesso da (hoje) gigante Nintendo, fez misé-

mais vendido do mundo – até poucas semanas atrás,

ria em um 1981 no qual os videogames ainda engati-

quando Wii Sports, também da Nintendo, ultrapassou

nhavam e, ao mesmo tempo, criou o que seria conhe-

sua marca.

cido um pouco mais tarde como o gênero de “jogos de plataforma”.

SMB é um jogo muito simples e, na verdade, não foge muito da mecânica de Mario Bros., em que se

Mario, que na época era apenas chamado de

corre e pula. A diferença é que você derrota inimigos

Jumpman (super original, não?) após sequências com

pulando em cima deles. O jogo – para a época – tinha

menos expressão, encontrou em 1983 seu irmão Luigi

ótimos design e diversidade nas fases, e desafio na

no esquisito, mas eternamente celebrado Mario Bros.,

medida certa para agradar jogadores novatos e vete-

game simples de disputa em que os inimigos eram

ranos até hoje.

derrotados batendo embaixo das suas plataformas.

Introduzindo vários personagens novos e sua pró-


Donkey Kong | Arcade e NES

Super Mario Bros. 3 | NES

Mario Bros.| NES

Super Mario Bros. 2 | NES

Super Mario World | SNES

Super Mario Galaxy | Wii

pria mitologia, SMB apresentou a “história padrão” de

especial chamada Super Mario Bros. Deluxe, que in-

mais de 90% das sequências da série: Bowser, um hí-

cluía as 64 fases dos dois jogos (32 de cada), além de

brido de dragão e tartaruga e rei dos Koopas, captura

modos de desafios e para dois jogadores.

a princesa do reino de Toadstool, Peach, para ser sua rainha.

Do outro lado do pacífico, a Nintendo resolveu não lançar esta versão porque a considerou difícil demais

Assim, cabe a Mario e seu macacão-representante-

para o mercado americano, e acabou pegando o jogo

do-proletariado salvá-la passando por diversos mun-

Doki Doki Panic, que foi um sucesso – e não se pa-

dos com um castelo no final de cada um, na esperança

rece em nada com os do Mario –, e modificou-o com

de que ela esteja lá... mas Toad, um cogumelo falante

4 personagens jogáveis e com estilos bem diferentes:

que seria “assessor” da Peach, sempre aparece pra

Mario, Luigi, Peach e Toad.

avisar que ela está no próximo. O que os irmãos Mario tem a ver com a Princesa, ninguém sabe. No ano seguinte, foi lançado somente no Japão Su-

Além disso, personagens hoje conhecidos e recorrentes da série como o Shy Guy, são de Doki Doki Panic.

per Mario Bros. 2, que possuía o mesmo design gráfi-

O jogo era todo muito estranho: Você devia arran-

co das fases, mas estas eram bem mais difíceis e, por

car legumes e outros itens do chão e jogar nos seus

isso mesmo, é bastante popular entre os usuários de

imigos. Por outro lado, se você pulasse em cima deles,

emuladores.

em vez de destruir, você podia erguê-los e atirá-los em

Em 1999, o Game Boy Color recebeu uma edição

outros inimigos.»»


nes

super nes

nintendo 64

gamecube

gameboy color

Wii

nintendo DS

Mais estranho do que isso é que, devido à conver conver-

variedade no design das fases entre os mundos.

são do jogo original, a história de SMB2 não passa de

Super Mario Bros. foi tão popular que além de vários

um sonho na cabeça do Mario. Anticlimático, alguém?

produtos licenciados, gerou um desenho animado, o

Mas a Nintendo se redimiu e, no início de 1990, lan-

“Super Mario Bros. Super Show”, que durou duas tem-

çou Super Mario Bros. 3, um jogo totalmente original

poradas na TV americana e era sempre introduzido por

e excelente, considerado por muitos o melhor jogo de

uma cena curta em live-action. Fantástico.

todos os tempos.

Toda a série Super Mario Bros. foi de uma gigante

SMB3 disponibilizou, pela primeira vez, o “Overworld”

inspiração não só para o mercado de games de plata-

– mapa 2D de cada mundo, mostrando o caminho entre

forma, como os de Sonic, Metroid e Castlevania, mas

as fases, inclusive as secretas – e apresentou uma co-

serviu como base para futuros jogos de ação e aventu-

leção enorme de itens para Mario e Luigi, como roupas

ra 3D, estilo Tomb Raider e Metal Gear.

especiais e objetos para pular de fase, o que expandiu

Dos últimos dois anos para cá, estes jogos retrô es-

a jogabilidade assustadoramente, inclusive estabele-

tão em mais evidência do que nunca, graças às lojas

cendo um sistema de inventário.

virtuais e aos sistemas de armazenamento dos conso-

Até hoje, nenhum outro game da série Super Mario

les desta última geração. Toda a série SMB está dispo-

(excluindo os RPGs) teve tantos itens reunidos. Isso

nível hoje para download através do Virtual Console do

sem falar da proliferação de novos inimigos e uma maior

Nintendo Wii.



pg36Ensaio

Ruína










CrĂŠdito Foto Luiza Cavalcante Modelo Yanna Tally


pg46Cinema


Por Mayara Luma

A alma inquieta de todos nós

E

m quase trinta anos de carreira

hora de criar suas películas. E da vida que passou a se

e dezesseis excelentes filmes no

esforçar para viver, conseguiu ver luxo onde muitos só

currículo, o diretor Pedro Almodó-

veriam miséria; e ouro, muito ouro, onde qualquer um

var se tornou sinônimo de criativi-

veria apenas lama.

dade e eterna inovação.

Enfrentando inúmeras dificuldades, sem emprego,

O ditador espanhol Francisco

sem dinheiro e longe da família, o jovem conheceu de

Franco poderia ter mudado a história do cinema caso

perto tudo o que a ditadura de Franco não mostrava de

decidisse, no ano de 1967, manter aberta a Escola

Madrid: sujeira, poluição e pobreza. Mas tudo isto não

Oficial de Cinema, em Madrid. Se isto acontecesse, o

o fez pior. Muito pelo contrário, a falta do conhecimento

mundo deixaria de conhecer um dos maiores gênios

técnico do fazer cinematográfico aliada à necessidade

da sétima arte: Pedro Almodóvar, que, nesse mesmo

de viver plenamente, e não apenas sobreviver, fizeram

ano, mudava-se da cidade onde morava com sua fa-

de Almodóvar o que ele é hoje: um gênio inquieto, cria-

mília, Extremadura, para a capital do país, com o obje-

tivo e espontâneo.

tivo único e exclusivo de fazer cinema.

Reservado, Almodóvar não costuma falar em qual-

Com a escola de cinema fechada, Almodóvar não

quer entrevista sobre sua infância - vivida primeira-

teve outra solução senão se dedicar a viver. Viver o

mente na província de Ciudad Real, onde nasceu, e

máximo que pudesse, para que de todas as experiên-

depois em Extremadura, onde estudou com padres

cias pudesse extrair alguma coisa que lhe fosse útil na

Franciscanos e Salesianos – mas admite que as expe- »»


O diretor com o elenco feminino de ‘Volver’

riências desse período o marcaram profundamente e

para fazer a abertura oficial do evento. Polêmico, o fil-

influenciam, até hoje, sua obra. A má-educação, como

me trata da história de dois garotos que se descobrem

ele mesmo diz, que recebeu dos padres antiéticos com

apaixonados em um colégio religioso e cuja relação é

quem estudou deu origem ao filme “La Mala Educaci-

acompanhada de forma muito peculiar por um padre-

ón” (2004), que, mesmo não sendo uma autobiografia,

professor. Mesmo sem a intenção, o filme arranca risa-

mostra muito da vida real do diretor.

das rasgadas em uma das primeiras cenas, quando o

“La Mala Educación” é uma obra-prima, como foi considerado ao redor de todo mundo, inclusive pelos

superstar Gael García Bernal aparece como uma perfeita mulher na pele do travesti protagonista.

responsáveis pelo Festival de Cannes de 2004, quan-

No entanto, “La Mala Educación” não representa os

do pela primeira vez um filme espanhol foi o escolhido

filmes almodovarianos em sua totalidade. Fora as co-


Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos [1988] Sinopse Atriz de TV que passa por crise afetiva é surpreendida quando sua casa é invadida pela mulher e o filho de seu amante, pela namorada do rapaz e por uma amiga que tem um caso com um terrorista.

res estouradas e o enredo para lá de absurdo, a película é uma exceção na produção do cineasta, pois não aborda sua marca registrada: as questões femininas. Homossexual assumido, Almodóvar é um amante incondicional do universo da mulher. Em todas as suas outras 15 obras, as loucuras femininas estão em primeiro plano. Apesar de exagerado e um tanto escrachado, Almodóvar retrata tão bem o mundo feminino que há quem diga que ele nasceu homem por um en-

Ata-me! [1990] Sinopse Homem sai de hospital psiquiátrico com o desejo de ter uma vida normal, mas a primeira atitude é raptar uma atriz de filmes eróticos com quem pretende se casar e ter filhos.

gano do destino. E como não há enredo que faça sucesso sem atores talentosos, Carmen Maura, sua primeira parceira profissional, merece metade dos louros que, hoje, Almodóvar leva na cabeça. Presente no elenco dos filmes produzidos nos sete primeiros anos de carreira do diretor – com exceção de “Laberinto de Pasiones” (1982)- , a atuação exagerada e brega (porém de indiscutível talento) de Carmen contribuiu consideravelmente para Almodóvar ser alçado ao rol dos grandes diretores. A verdade é que de parceiros que contribuíram

Tudo Sobre Minha Mãe [1999] Sinopse Na noite em que seu filho morre em acidente, Manuela lê as últimas linhas que ele havia escrito, e que falavam do desejo que tinha de conhecer seu pai. A mulher decide ir a Barcelona, em busca do pai biológico do filho, um travesti que sequer sabe tê-la engravidado uma noite, 18 anos antes. Melhor diretor em Cannes e Oscar de melhor filme estrangeiro.

para seu sucesso, Almodóvar não careceu. Em 1983, quando decidiu criar a produtora El Deseo, que, hoje, produz não só seus filmes como de outros diretores,

Fale com Ela [2002]

principalmente espanhóis, contou com o irmão Agus-

Sinopse Enfermeiro solitário e jornalista viram amigos após se conhecerem em hospital. Ambos estão apaixonados por mulheres em estado de coma.

tín como sócio. De lá para cá, os dois nunca mais se deixaram. Grande produtor, porém extremamente reservado, o que o faz muitas vezes viver à sombra do irmão, Agustín é nome recorrente nos créditos dos filmes de Almodóvar. O Oscar vai para... Mas, afinal, o que é que Almodóvar tem que outros não têm e que o faz tão especial? A resposta é simples: sua capacidade de fazer um sem-fim de filmes »»

Volver [2006] Sinopse Após sua morte, uma mãe retorna a sua casa para resolver problemas que ficaram pendentes durante sua vida. Aos poucos seu fantasma vai lentamente se tornando um conforto para as filhas, assim como para a neta.


excelentes, de ter no currículo 16 obras-primas de sua

Film Festival, e uma Palma de Ouro, no Festival de

autoria. Muita gente consegue fazer um filme bom e

Cannes.

ser aclamado por isso. O difícil é dar continuidade à

“Volver” (2006, 121 min)

excelência e não ser esquecido para sempre depois

É uma ode a todas as mulheres que passaram pela

dos 15 minutos de glória. E esquecido é a última coisa

vida de Almodóvar, inclusive aquelas a quem não co-

que Almodóvar será algum dia.

nheceu pessoalmente, mas que se dedicaram a apre-

Além dos filmes que dirigiu e escreveu, Almodóvar

ciar suas películas. Aqui, o universo feminino e a figura

também produziu outros onze. Ver todas essas pelí-

da mulher como a grande heroína do mundo chegam a

culas é uma das cem coisas que todo mundo precisa

seu ápice. “Volver” é, definitivamente, um filme sobre

fazer antes de morrer. Mas como não dá para assistir

mulheres, feito por mulheres e para mulheres.

tudo hoje, agora e nem o mais rápido possível, já que

Falar sobre a história de Volver é quase tão difícil

vivemos atarantados de todo tipo de tarefas, é preciso

quanto explicar para uma criança que cegonha não

começar aos poucos, pelos melhores dos melhores.

existe. Habitam no enredo três gerações de mulhe-

“Todo sobre mi madre” (1999, 105 min)

res, com diferentes necessidades e anseios, mas que

É a obra-prima das obras-primas do diretor. Hila-

acabam ligadas pelos fortes laços familiares quando

riamente dramático, o filme conta a história de uma

uma delas, já falecida, volta para dar fim definitivo aos

mãe solteira que, depois de perder o filho no dia de

problemas que deixou pendentes em vida. Uma histó-

seu 17º aniversário, decide procurar o pai do garoto

ria tragicômica, marcada pela estonteante beleza de

para contar-lhe sobre a paternidade. A piada e, ao

Penélope Cruz, pela indiscutível atuação de Carmen

mesmo tempo, o drama residem no fato de esse pai

Maura – que não trabalhava com Almodóvar desde

ser um travesti. “Todo...” é uma clara homenagem às

1987, em “Mujeres Al Bordo de um Ataque de Ner-

mulheres: a todas que precisam dia após dia mentir e

vios” – e cenas incrivelmente tocantes.

ocultar para evitar grandes tragédias, às que carregam o fardo de ser mães solteiras e, principalmente, às que

Quem não conhece Almodóvar, vale começar por

não são atrizes, mas que precisam levar a vida como a

esses dois filmes, sempre se lembrando de que as-

melhor encenação do espetáculo final.

sistir aos outros é uma experiência indispensável. Até

Com excelentes atores, Cecilia Roth, Toni Cantó e

porque, viver a vida sem o vermelho-paixão, o amare-

Antonia San Juan nos papéis principais, o filme é o

lo-fogo, o exagero e o nonsense significa, com certe-

mais premiado de toda a carreira de Almodóvar. Entre

za, ser um pouco mais triste e incompleto. Almodóvar

os prêmios que recebeu estão o Oscar de melhor fil-

é o grito e o descontrole presente na alma inquieta de

me estrangeiro, o Prêmio da Audiência, no European

todos nós.



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Ilustração Rodrigo Cantalicio


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