Artigo inédito
Avaliação da aplicabilidade de um padrão cefalométrico norte-americano em pacientes brasileiros submetidos à cirurgia ortognática Fernando Paganeli Machado Giglio*, Eduardo Sant’Ana**
Resumo Objetivo: estudar a aplicabilidade de um padrão cefalométrico norte-americano em pacientes
brasileiros submetidos à cirurgia ortognática, por meio da comparação dos traçados cefalométricos pós-tratamento ortodôntico-cirúrgico de 29 pacientes que passaram por cirurgia de maxila e mandíbula, com o padrão cefalométrico utilizado como orientação para o planejamento dos casos. Métodos: os traçados foram gerados pelo programa Dolphin Imaging 9.0 a partir de telerradiografias em norma lateral digitalizadas, nas quais foram marcados 48 pontos de referência dentários, ósseos e tegumentares. Dessa forma, obteve-se 26 grandezas cefalométricas lineares e angulares para posterior comparação com os valores normativos, considerando-se o dimorfismo sexual e as eventuais modificações feitas no planejamento em virtude de necessidades individuais de cada caso e das possíveis diferenças étnico-raciais. Os dados da amostra foram confrontados com o padrão por meio da comparação das médias e desvios-padrão pelo teste t de Student. Resultados: os resultados mostraram que, para os homens, as médias da amostra foram significativamente diferentes do padrão em cinco das grandezas estudadas; enquanto, para as mulheres, nove apresentaram diferenças estatisticamente significativas. No entanto, apesar da similaridade das médias na maioria das medidas em ambos os gêneros, os dados mostraram grandes variações individuais. Conclusão: a análise dos resultados obtidos sugere que o padrão cefalométrico norte-americano empregado é aplicável como referência para o planejamento de casos ortodôntico-cirúrgicos de pacientes brasileiros, desde que se atente às variações individuais de acordo com as necessidades de cada paciente. Palavras-chave: Cirurgia ortognática. Análise facial. Padrão cefalométrico.
INTRODUÇÃO Nos últimos anos, observa-se um aumento na demanda por tratamentos ortodôntico-cirúrgicos para a correção de discrepâncias ósseas severas. As principais razões para isso são a crescente preocupação estética, a grande quantidade de pacientes
adultos com necessidade de correções oclusais e o aprimoramento das técnicas cirúrgicas7. O plano de tratamento das mudanças faciais é complexo, especialmente pela necessidade de integração com a correção oclusal, devendo englobar: o julgamento clínico, a observação das
* Mestre e Doutor em Estomatologia pela FOB-USP. ** Mestre em Diagnóstico Bucal e Doutor em Periodontia pela FOB-USP. Professor Livre-Docente de Cirurgia da FOB-USP.
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Avaliação da aplicabilidade de um padrão cefalométrico norte-americano em pacientes brasileiros submetidos à cirurgia ortognática
relações funcionais entre os tecidos duros e moles, o conhecimento das respostas tegumentares às movimentações dentoesqueléticas, a experiência dos profissionais envolvidos e os anseios dos pacientes em relação ao tratamento. Assim, a oclusão e a estética facial são interdependentes, devendo ser tratadas como um objetivo simultâneo do tratamento18. As análises cefalométricas baseadas nas telerradiografias em norma lateral desempenham um importante papel no diagnóstico, planejamento, prognóstico e proservação de casos que envolvem Ortodontia e Cirurgia Ortognática21. Diversas análises foram propostas com o intuito de se qualificar e/ou quantificar perfis faciais estéticos. No entanto, diagnósticos baseados somente na cefalometria podem não gerar resultados estéticos satisfatórios, pois enfocam principalmente estruturas dentoesqueléticas, com pouca ou nenhuma atenção dada aos tecidos moles suprajacentes4. Particularmente importantes, valores cefalométricos normativos têm sido buscados para guiar o diagnóstico e as decisões quanto às movimentações ósseas e dentárias2. Contudo, apesar de contribuírem para a determinação dos objetivos do tratamento, deve-se considerar que a aparência dos tecidos moles é apenas parcialmente dependente dos tecidos duros subjacentes. Por isso, vários autores têm sugerido a necessidade de uma detalhada análise dos tecidos moles para guiar o tratamento das más oclusões e das mudanças estéticas faciais, em associação às radiografias, fotografias e modelos3. Diversos autores, das mais variadas regiões do mundo, estabeleceram padrões cefalométricos de normalidade para tecidos duros e moles específicos para suas populações, com o propósito de guiar o planejamento dos tratamentos de acordo com as características peculiares de cada grupo étnico-racial17. Dentre eles, Arnett et al.5 lançaram sua análise cefalométrica dos tecidos moles, baseada no exame clínico de traços faciais laterais e frontais2,3, desenvolvida para servir de guia para
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ortodontistas e cirurgiões como ferramenta diagnóstica e de planejamento para pacientes com más oclusões associadas ou não a discrepâncias esqueléticas. Os autores empregaram a linha vertical verdadeira20 (LVV) como principal parâmetro para determinação das relações anteroposteriores. Essa linha é perpendicular ao plano horizontal, determinado pela posição natural da cabeça, passando pelo ponto subnasal, como ilustrado na figura 1, numa radiografia utilizada para a obtenção do erro do método. Uma das particularidades dessa análise é o enfoque objetivo ao posicionamento final dos tecidos moles componentes do perfil, para posterior planejamento das mudanças dentárias e ósseas necessárias para alcançar os objetivos estéticos. É uma das análises mais completas empregadas atualmente em Cirurgia Ortognática e se baseia em valores cefalométricos normativos propostos pelos próprios autores, obtidos de uma população norte-americana, do estado da Califórnia (EUA). A proposta do presente trabalho é avaliar a aplicabilidade desse padrão cefalométrico norteamericano5 em pacientes brasileiros submetidos à cirurgia ortognática, considerando as eventuais adaptações feitas ao planejamento devido às possíveis diferenças entre as populações, comparando-se o resultado pós-operatório com o padrão cefalométrico empregado no planejamento. MATERIAL E MÉTODOS Amostra A amostra foi colhida dentre pacientes adultos, leucodermas, que passaram por tratamento ortodôntico-cirúrgico, com cirurgia bimaxilar, analisados e planejados com auxílio do programa Dolphin Imaging 9.0 (Dolphin Imaging Systems), seguindo o padrão cefalométrico proposto por Arnett et al.5 Foram selecionadas 29 telerradiografias em norma lateral tomadas após a finalização ortodôntica. Para ser incluídas, as radiografias deviam ser de boa qualidade, permitindo adequada identificação dos pontos cefalométricos de interesse, além de apresentar padronização durante a sua tomada, com a cabeça
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cirúrgicos, que permite a inserção e a comparação de radiografias e fotografias intra e extrabucais e de modelos, servindo como ferramenta de armazenamento e gerenciamento de casos de maneira prática e organizada10,16. Para a inserção no programa, as radiografias foram digitalizadas em um scanner de transparências (HP Scanjet 4C/T), com resolução de 300 dpi e manipuladas no Adobe Photoshop 7.0 para ajustes no brilho e contraste, melhorando a visualização das estruturas de interesse. Seguindo os passos indicados pelo programa, procedeu-se à determinação, com auxílio do mouse, dos 48 pontos cefalométricos dentários, ósseos e tegumentares para a elaboração do traçado cefalométrico, a saber: pório, orbitário, pterigomaxilar, sela, násio, básio, glabela mole, násio mole, ápice nasal, ponte do nariz, subnasal, “A” mole, lábio superior, stomion superior, stomion inferior, lábio inferior, “B” mole, pogônio mole, mentoniano mole, gnátio mole, pescoço/mandíbula, “B”, pogônio, mentoniano, gnátio, gônio, ramo mandibular, ramo médio, chanfradura sigmoide, articular, côndilo, espinha nasal anterior, “A”, espinha nasal posterior, oclusal do primeiro molar superior (Mx6), oclusal do primeiro molar inferior (Md6), distal do Mx6, mesial do Mx6, distal do Md6, mesial do Md6, junção amelo-cementária (JAC) vestibular do incisivo central inferior (Md1), incisal do Md1, ápice radicular do Md1, JAC lingual do Md1, JAC vestibular do incisivo central superior (Mx1), incisal do Mx1, ápice radicular do Mx1 e JAC lingual do Mx1. Todos os traçados foram elaborados pelo mesmo operador. Após a marcação de todos os pontos, o programa os uniu para o desenho do traçado (Fig. 2). Automaticamente, surgem sobre a imagem radiográfica os valores respectivos a cada uma das medidas, lineares ou angulares. A ferramenta de medidas do software fornece a listagem de todos os dados cefalométricos aferidos, bem como a comparação com a norma e seu respectivo desvio-padrão (Fig. 3).
FiGurA 1 - representação da linha vertical verdadeira.
em posição natural (PNC), a oclusão em relação cêntrica (RC) e os lábios em repouso2. A amostra foi composta por 14 pacientes do gênero masculino e 15 do gênero feminino, com idades entre 16 e 44 anos (média de 27,2). Todos os pacientes eram descendentes de mediterrâneos e oriundos de cidades dos estados de São Paulo e Paraná, tendo sido tratados por quatro experientes ortodontistas e operados pelo mesmo cirurgião. Sobre as cirurgias realizadas, em 13 pacientes foi realizada cirurgia de maxila, mandíbula e mento; enquanto nos outros 16 pacientes não foi realizada intervenção no mento. É válido ressaltar que todos os pacientes foram tratados sem extrações de pré-molares e que não houve critérios referentes ao padrão facial para a inclusão na amostra. As técnicas cirúrgicas empregadas incluíram: osteotomia Le Fort I para a maxila, com ou sem multissegmentação; osteotomia sagital bilateral da mandíbula, associada ou não à osteotomia de linha média; e mentoplastia. Elaboração dos traçados cefalométricos O Dolphin Imaging 9.0 é um programa para análise facial e geração de traçados cefalométricos para diagnóstico, planejamento, prognóstico e proservação de pacientes ortodônticos e/ou
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FiGurA 2 - Traçado cefalométrico concluído.
FiGurA 3 - Todas as medidas listadas.
Erro do método O Dolphin Imaging, conforme descrito, exige que o operador marque com o mouse os pontos de referência de interesse na telerradiografia para a confecção do traçado. Apesar da clara definição de cada um dos pontos, pode haver subjetividade nas marcações. Com o intuito de verificar a presença ou não de tais variações, fez-se necessária a avaliação do erro ou confiabilidade do método. Para o cálculo do erro do método foram utilizadas 24 telerradiografias em norma lateral, aleatoriamente selecionadas dos arquivos da disciplina de Cirurgia da Faculdade de Odontologia de Bauru, da Universidade de São Paulo, obedecendo a um único critério: apresentarem boa qualidade quanto à imagem. Todas as radiografias foram digitalizadas e submetidas ao programa da mesma forma que as da amostra, para a obtenção de dois traçados cefalométricos cada uma, com um intervalo de 15 dias entre ambos. A determinação do erro do método consistiu na análise das diferenças entre os valores obtidos nas duas ocasiões, utilizando 25 medidas cefalométricas lineares. Calcularam-se os erros sistemático (teste “t” pareado) e casual (Dahlberg). Os resultados do cálculo do erro do método estão sumarizados na tabela 1 e mostram que não houve diferenças estatisticamente significativas entre os traçados, sugerindo que o erro inerente
ao método não demonstrou capacidade de influenciar os resultados da pesquisa.
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Grandezas cefalométricas aferidas Após a obtenção dos dados, iniciou-se a interpretação dos mesmos. Para tanto, seguem as 26 grandezas cefalométricas consideradas para a comparação dos resultados pós-operatórios da amostra com o padrão empregado no planejamento: 1. ângulo entre o Mx1 e o plano oclusal da maxila, 2. projeção do Mx1 à LVV, 3. ângulo entre o Md1 e o plano oclusal da mandíbula, 4. projeção do Md1 à LVV, 5. overjet, 6. overbite, 7. altura anterior da maxila (Sn-Mx1), 8. altura anterior da mandíbula (Md1-Me’), 9. altura do lábio superior, 10. espaço interlabial, 11. altura do lábio inferior, 12. altura do terço inferior da face (Sn-Me’), 13. altura facial total (Na’-Me’), 14. exposição do Mx1, 15. espessura do lábio superior, 16. espessura do lábio inferior, 17. espessura do mento (Pog-Pog’), 18. projeção nasal à LVV,
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Aplicou-se o teste t de Student para comparação das médias das medidas pós-operatórias dos pacientes com o padrão para cada uma das grandezas cefalométricas, sempre considerando o dimorfismo sexual.
19. 20. 21. 22. 23. 24. 25.
projeção do ponto A’ à LVV, projeção do lábio superior à LVV, ângulo nasolabial, projeção do lábio inferior à LVV, projeção do ponto B’ à LVV, projeção do ponto Pog’ à LVV, distância tegumentar maxilomandibular (A’-B’), 26. distância horizontal entre os lábios superior e inferior.
RESULTADOS As tabelas 2 e 3 mostram os resultados obtidos para os gêneros masculino e feminino, respectivamente.
TAbElA 1 - Erro do método (erros sistemático e casual - valores em mm). Radiografias
1º traçado
2º traçado
erro
t
p*
35,29
1,831
0,077
0,54
16,40
28,51
1,856
0,074
0,98
17,82
33,78
1,804
0,082
0,91
30,64
20,64
30,63
2,027
0,052
0,27
32,73
18,06
32,86
1,586
0,124
0,93
16,38
29,89
16,44
30,84
0,228
0,821
0,78
15,45
31,23
15,34
31,54
0,428
0,672
0,83
rx 8
19,43
32,79
19,50
33,07
0,414
0,682
0,55
rx 9
17,55
33,89
17,53
33,20
0,117
0,907
0,65
rx 10
16,92
31,04
17,16
30,94
1,270
0,214
0,62
rx 11
20,56
35,70
20,01
35,50
1,967
0,059
0,96
rx 12
14,61
30,73
14,65
30,26
0,161
0,873
0,71
rx 13
13,10
30,28
13,23
31,01
0,428
0,672
0,95
rx 14
17,07
35,04
16,68
35,15
1,339
0,191
0,95
rx 15
15,20
30,27
15,58
30,66
1,742
0,092
0,72
rx 16
16,24
32,11
16,48
32,66
1,206
0,238
0,67
rx 17
16,03
35,11
15,68
35,69
1,519
0,140
0,75
rx 18
15,52
36,10
15,77
36,00
0,811
0,424
0,98
rx 19
16,75
35,24
17,23
34,90
1,892
0,068
0,85
rx 20
17,16
30,15
16,96
30,22
1,850
0,075
0,36
rx 21
15,65
29,54
15,56
29,59
0,650
0,521
0,41
rx 22
12,02
26,77
12,05
26,79
0,113
0,911
0,67
rx 23
17,92
32,66
17,93
33,47
0,027
0,979
0,94
rx 24
15,67
30,91
15,62
30,17
0,208
0,837
0,73
média
d.p.
média
d.p.
rx 1
18,96
35,16
18,66
rx 2
16,95
28,30
rx 3
17,33
33,92
rx 4
20,48
rx 5
17,61
rx 6 rx 7
* Significância para p < 0,05 e Dahlberg > 1.
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(Dahlberg)*
Avaliação da aplicabilidade de um padrão cefalométrico norte-americano em pacientes brasileiros submetidos à cirurgia ortognática
TAbElA 2 - resultados para o gênero masculino. Grandeza
Amostra
d.p.
Padrão
d.p.
Diferença
Classificação*
t
p**
1
55,2
6,2
57,8
3
2,6
0
1,630
0,1130
2
-12,3
4,8
-12,1
1,8
0,2
0
-0,171
0,8654
3
70,1
7,5
64
4
6,1
+++
3,078
0,0043
4
-14,9
4,5
-15,4
1,9
0,5
0
0,446
0,6589
5
2,6
1,2
3,2
0,6
0,6
0
-1,927
0,0630
6
1,8
1
3,2
0,7
1,4
---
-4,812
0,0000
7
28,3
4,5
28,4
3,2
0,1
0
-0,076
0,9400
8
54,4
2,1
56
3
1,6
0
-1,719
0,0953
9
25,7
3,6
24,4
2,5
1,3
0
1,245
0,2221
10
2,1
1,7
2,4
1,1
0,3
0
-0,626
0,5359
11
53,3
3,1
54,3
2,4
1
0
-1,060
0,2969
12
81
5,6
81,1
4,7
0,1
0
-0,056
0,9553
13
138,7
7,8
138
6,5
0,7
0
0,285
0,7777
14
2,6
1,8
3,9
1,2
1,3
---
-2,532
0,0165
15
14,9
2,5
14,8
1,4
0,1
0
-0,149
0,8824
16
11,9
1,4
15,1
1,2
3,2
---
7,146
0,0000
17
14,5
2,5
13,5
2,3
1
0
-1,204
0,2374
18
17,2
1,8
17
1,7
0,2
0
-0,330
0,7438
19
0,5
1,9
-0,3
1
0,8
0
-1,599
0,1196
20
3,8
2,6
3,3
1,7
0,5
0
-0,679
0,5019
21
103,2
8,7
106
7,7
2,8
0
0,989
0,3299
22
0,6
5,4
1
2,2
0,4
0
-0,299
0,7667
23
-8,2
7,2
-7,1
1,6
1,3
0
0,785
0,4382
24
-3,7
8,8
-3,5
1,8
0,2
0
0,099
0,9215
25
9
6,1
6,8
1,5
2,2
+++
-1,556
0,1294
26
3,1
3,4
2,3
1,2
0,8
0
-0,974
0,3372
* --- = abaixo do padrão; 0 = dentro do padrão; +++ = acima do padrão. ** Diferença estatisticamente significativa para p < 0,05.
ca que, ao alcançá-la, o perfil será sempre equilibrado. É comum encontrar-se um contorno facial equilibrado ainda que uma má oclusão esteja presente e vice-versa15. Isso tem levado ortodontistas e cirurgiões bucomaxilofacias a investir em estudo e recursos para proporcionar um melhor diagnóstico e tratamento a seus pacientes. Nesse contexto, as técnicas de planejamento e visualização do tratamento por meio de programas de computador têm evoluído muito, tornando-se cada vez mais importantes para a comunicação entre pacientes e profis-
DISCUSSÃO Diagnóstico, plano de tratamento e execução do tratamento são os passos envolvidos no cuidado das más oclusões2. Essa tríade é interdependente, de modo que a falha em uma das etapas pode levar ao insucesso do caso. Importante ressaltar que não se deve atentar somente à correção da oclusão, mas também à melhora ou à manutenção dos traços componentes da estética facial, determinados por ossos, tecidos moles e dentes. Uma oclusão normal é importante para a harmonia da face, mas não signifi-
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Giglio FPM, Sant’Ana E
TAbElA 3 - resultados para o gênero feminino. Grandeza
Amostra
d.p.
Padrão
d.p.
Diferença
Classificação*
t
p**
1
54,1
7
56,8
2,5
2,7
---
1,792
0,0809
2
-9,2
3,5
-9,2
2,2
0
0
0,000
1,000
3
67
6,7
64,3
3,2
2,7
0
1,749
0,0882
4
-12,1
3,2
-12,4
2,2
0,3
0
0,355
0,7242
5
2,9
1,1
3,2
0,4
0,3
0
-1,263
0,2142
6
2,2
0,7
3,2
0,7
1
---
-4,406
0,0001
7
26,6
3,9
25,7
2,1
0,9
0
0,964
0,3409
8
50,4
4,2
48,6
2,4
1,8
0
1,753
0,0874
9
23,6
3,1
21
1,9
2,6
+++
3,340
0,0019
10
1,7
1,3
3,3
1,3
1,6
---
-3,796
0,0005
11
49,5
5,1
46,9
2,3
2,6
+++
2,248
0,0303
12
74,8
7,2
71,1
3,5
3,7
+++
2,218
0,0324
13
130,1
8,5
125
4,7
5,1
+++
2,484
0,0174
14
2,9
2,5
4,7
1,6
1,8
---
-2,817
0,0076
15
12,6
2,2
12,6
1,8
0,6
0
0,000
1,000
16
11,2
1,5
13,6
1,4
2,4
---
5,152
0,0000
17
12,9
2,2
11,8
1,5
1,1
0
-1,903
0,0645
18
17,3
1,9
16
1,4
1,3
0
-2,510
0,0163
19
-0,2
1,9
-0,1
1
0,1
0
0,222
0,8258
20
2,9
2,4
3,7
1,2
0,8
0
1,427
0,1616
21
105,6
8,2
104
6,8
1,6
0
-0,673
0,5050
22
1,3
3,8
1,9
1,4
0,6
0
0,729
0,4702
23
-6,1
3,8
-5,3
1,5
0,8
0
0,959
0,3437
24
-2,2
4,5
-2,6
1,9
0,4
0
-0,399
0,6924
25
5,8
3
5,2
1,6
0,6
0
-0,838
0,4069
26
1,6
1,7
1,8
1
0,2
0
0,476
0,6366
* --- = abaixo do padrão; 0 = dentro do padrão; +++ = acima do padrão. ** Diferença estatisticamente significativa para p < 0,05.
e na recuperação dos dados; além da possibilidade de rápida comparação entre dados para a realização de estudos retrospectivos16. No presente trabalho, comparou-se os resultados cefalométricos pós-tratamento de pacientes submetidos à cirurgia ortognática com os valores normativos utilizados como orientação no planejamento dos casos, para se verificar a viabilidade ou não de tal padrão para este grupo de pacientes. Não foi objeto de estudo a análise
sionais antes e durante o tratamento14, principalmente no que tange à previsão dos resultados. Dentre as vantagens dos métodos computadorizados, pode-se citar a possibilidade de manipulação das imagens, permitindo melhor visualização de áreas com baixa resolução ou excesso de sobreposições; economia de tempo; facilidade na escolha e na troca de análises cefalométricas; rapidez na superposição de radiografias seriais; simplicidade no armazenamento
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padrão cefalométrico empregado e o resultado final do tratamento em pacientes submetidos à cirurgia ortognática é muito difícil, devido ao grande número de possíveis fontes de imprecisão, como por exemplo: identificação dos pontos de referência, método de digitalização radiográfica, precisão na transferência das movimentações planejadas para o articulador, exatidão na cirurgia de modelos e na confecção do guia cirúrgico, execução da técnica cirúrgica, capacidade e experiência da equipe (ortodontistas e cirurgiões), assentamento dos tecidos moles sobre as movimentações dentoesqueléticas e recidiva8. Ainda, é importante lembrar que a maioria dos métodos de planejamento trata de representações bidimensionais de estruturas tridimensionais19. O método empregado na confecção deste trabalho visou eliminar, ou ao menos minimizar, as fontes de variação supracitadas. Outro fator a ser considerado é que quanto maiores as movimentações cirúrgicas, maiores as dificuldades de precisão nos resultados1. No presente trabalho, todos os pacientes passaram por cirurgias de maxila e mandíbula, com ou sem mentoplastia; ou seja, tiveram grandes alterações espaciais dentárias, ósseas e de tecidos moles, aumentando a dificuldade de obtenção precisa dos resultados, especialmente a longo prazo. Cirurgias envolvendo apenas a maxila ou a mandíbula são de mais fácil previsibilidade e obtenção dos resultados planejados9. O tempo de proservação dos pacientes também parece influenciar a análise dos resultados. Os estudos que utilizaram radiografias pós-operatórias imediatas tendem a apresentar dados mais precisos e quanto maior o intervalo entre a cirurgia e a tomada radiográfica final, maiores as imprecisões entre os planejamentos e os perfis finais. Um acompanhamento de pelo menos 18 meses é necessário para a coleta de dados estáveis, quando se refere à avaliação dos resultados, pois os dados obtidos a curto prazo estão propensos à grande variabilidade nas mudanças
da precisão do prognóstico dos resultados. Porém, pode-se extrapolar que, na medida que se guiou o tratamento seguindo determinados valores normativos, espera-se que os resultados alcançados estejam dentro da referida norma. Essa torna-se um prognóstico “gold standard”, sujeito às alterações requeridas para cada caso, que pode ser usado como ferramenta de comunicação entre pacientes e profissionais. Neste trabalho, foi utilizado o programa Dolphin Imaging versão 9.0 (Dolphin Imaging Systems), que gera traçados cefalométricos por meio da marcação de diversos pontos de referência dentários, ósseos e tegumentares, trabalhando-se sobre a imagem radiográfica previamente digitalizada. Esse programa foi escolhido por ser um dos mais completos do mercado. Apesar de todas as vantagens apresentadas e de estes programas representarem, hoje, uma realidade no cuidado às más oclusões, possuem certas limitações, também presentes nos métodos manuais, como a possível imprecisão na identificação dos pontos de referência, podendo alterar o traçado gerado6. A averiguação do erro do método tornou os traçados confiáveis, por constatar a calibração do operador quanto à marcação dos pontos de referência. No que diz respeito às amostras empregadas em estudos desta natureza, a uniformidade das características dos pacientes é bastante importante. Diferenças étnico-raciais, dimorfismo sexual, inclusão de pacientes jovens com potencial de crescimento após o tratamento, ou pacientes com fissuras lábio-palatais, podem comprometer os resultados dos estudos. A amostra colhida para essa pesquisa foi de indivíduos leucodermas, dos estados de São Paulo e Paraná, descendentes de mediterrâneos, separada em grupos quanto ao gênero, tendo sido evitados pacientes que passaram por quaisquer tipos de cirurgias plásticas, corretivas ou reconstrutivas. A determinação da quantidade de discrepância encontrada entre o planejamento ou o
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houve diferenças no ângulo formado pelo incisivo central superior e o plano oclusal da maxila e espaço interlabial — menores que o padrão; altura do lábio superior, altura do lábio inferior, altura do terço inferior da face e altura facial total — maiores que o padrão. Apesar da grande concordância encontrada entre as médias dos resultados obtidos e o padrão, houve grande variação individual, explicitada pelo valor alto dos desvios-padrão da amostra. Uma possível fonte de variação entre os dados obtidos e o padrão, neste trabalho, é que os planejamentos seguiram como guia um padrão cefalométrico específico, entretanto não foram padronizados entre si. Isto pode significar que estavam sujeitos a variações no planejamento de acordo com a necessidade de cada caso, no sentido de se propiciar o melhor resultado possível. Ou seja, após a elaboração do planejamento baseando-se nos valores normativos preconizados por Arnett et al.5, este poderia ser modificado objetivando um melhor resultado em determinada área do perfil facial. Este foi exatamente o propósito deste trabalho, avaliar a viabilidade ou não na prática ortodôntico-cirúrgica da utilização de um padrão cefalométrico norte-americano para o planejamento em cirurgia ortognática de pacientes brasileiros, considerando possíveis alterações feitas no planejamento em virtude de eventuais necessidades específicas de cada caso. Em suma, avaliar se as possíveis diferenças étnico-raciais entre essas duas populações distintas, muito embora intensamente miscigenadas, são suficientes para contraindicar a utilização do padrão cefalométrico de uma para o planejamento de pacientes da outra. Contudo, é válido ressaltar que os padrões devem ser considerados como guias para o planejamento, e não como diretrizes para o tratamento, de modo que sejam respeitadas as necessidades individuais de cada caso. A utilização de reconstruções faciais tridimensionais, por meio de tomografias computadorizadas
espaciais entre os tecidos duros e moles ocorridas ao longo do tempo, referentes a adaptações teciduais que seguem-se às abruptas alterações ósseas realizadas na cirurgia13. Na amostra empregada neste trabalho, optou-se por utilizar radiografias obtidas ao final da Ortodontia pósoperatória com o intuito de se minimizar essa variável, uma vez que o tempo médio de finalização ortodôntica foi de 1,4 anos. Na prática ortodôntica, o diagnóstico e o planejamento são determinados, em parte, pela comparação das medidas cefalométricas do paciente com valores normativos, sendo a maioria desses padrões estabelecidos em amostras de pacientes caucasianos europeus ou norte-americanos 11. Devido à extensa variação existente nos valores médios das normas cefalométricas, expressa por grandes valores de desvios-padrão, existe a necessidade de se utilizar os padrões cefalométricos com cautela, considerando sempre os valores dos respectivos desvios-padrão para a realização das análises, diagnósticos e planejamentos 12. Especificamente sobre os dados encontrados, pôde-se verificar que, das 26 grandezas cefalométricas estudadas, houve concordância das médias dos resultados obtidos nos pacientes da amostra com o padrão empregado no planejamento em 21 medidas para os homens, e 17 para as mulheres (80,8% e 65,4%, respectivamente). Para ambos os gêneros, houve diferença estatisticamente significante para o overbite, exposição do incisivo central superior e espessura do lábio inferior, sempre com os dados da amostra menores que o padrão. Para os homens, as outras duas grandezas discrepantes em relação ao padrão foram o ângulo formado pelo incisivo central inferior e o plano oclusal da mandíbula e a distância horizontal entre os pontos A’ e B’ (relação anteroposterior maxilomandibular para tecidos moles), com os pacientes da amostra apresentando valores significativamente maiores que o padrão. Por outro lado, para as mulheres,
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e scanners faciais, está em estudo para que, num futuro próximo, possam aliar-se definitivamente ou até mesmo substituir os atuais modelos bidimensionais. Isso permitiria refinar o planejamento e as previsões de tratamento para os casos de cirurgia ortognática, especialmente no que diz respeito aos tecidos moles22,23. A versão 10 do Dolphin Imaging já apresenta esses recursos 3D.
CONCLUSÃO Após análise e discussão dos dados obtidos, conclui-se que, apesar das grandes variações individuais encontradas, é viável a aplicação do padrão cefalométrico proposto por Arnett et al.5 em pacientes brasileiros submetidos à cirurgia ortognática, ainda que eventuais adaptações sejam feitas ao planejamento em virtude de diferenças étnico-raciais.
Evaluation of the applicability of a North American cephalometric standard to Brazilian patients subjected to orthognathic surgery Abstract Objectives: To study the applicability of a North American cephalometric standard to Brazilian patients subjected to orthognathic surgery by comparing the post-surgical/orthodontic treatment cephalometric tracings of 29 patients who had undergone surgery of the maxilla and mandible with the cephalometric standard used as guidance in planning the cases. Methods: The tracings were generated by the Dolphin Imaging 9.0 computer program from scanned lateral cephalograms in which 48 dental, osseous and tegumentary landmarks were defined. Thus, were obtained 26 linear and angular cephalometric measurements to be compared with normative values, considering sexual dimorphism and possible modifications to the treatment plan to meet the individual needs of each case, as well as any possible ethnic and racial differences. The sample data were compared with the standard using Student’s t-test means and standard deviations. Results: The results showed that for males, the sample means were significantly different from the standard in five of the measurements, while for women, nine were statistically different. However, despite the similarity of the means of most measurements in both genders, the data showed marked individual variations. Conclusions: An analysis of the results suggests that the North American cephalometric standard is applicable as a reference for planning orthodontic-surgical cases of Brazilian patients, provided that consideration is given to variations in the individual needs of each patient. Keywords: Orthognathic surgery. Facial analysis. Cephalometric standard.
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Enviado em: maio de 2007 Revisado e aceito: fevereiro de 2009
Endereço para correspondência Fernando Paganeli Machado Giglio Rua André Rodrigues Benavides nº 67 aptº 403 - Pq. Campolim CEP: 18.048-050 - Sorocaba/SP E-mail: fernando.giglio@uol.com.br
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