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Walesca Cassundé
FÉ CEGA; FACA AMOLADA
Vai embora ano desgraçado! - arrematou Maria com um suspiro após desejarmos a ela um ano novo de bênçãos e paz. A assertividade com que ela se expressou me causou impacto. Tentei contemporizar: - Veja Maria, 2021 já está chegando e tudo vai melhorar. Deus é grande! - Deus?, - ela gritou, e todos os olhos da sala se voltaram para nós; - o mesmo que deixou a polícia atirar no meu filho que estava trabalhando e nunca cometeu crime algum? Senti todo o peso da minha incapacidade diante da miserável condição humana. Como convencer esta mãe que Ele é justo? E discorrer sobre esperança e fé a alguém que perdeu seu filho unigênito tão tragicamente? Olhei em volta e vi as faces se contorcendo em caras e bocas, algumas sussurrando de forma ensurdecedora: Blasfêmia! A fada empática me tomou inteira e abracei Maria - humilhada, intimidada e emudecida; subjugada pelos juízes da fé. Lembrei-me imediatamente de Nietzsche: - o meu Deus está morto!
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Walesca Cassundé
Nome literário de Walesca de Araújo Cassundé, cuiabana, residente em Campo Grande-MS. Formada em direito pela FUCMT. Advogada por opção e criminalista por vocação. Poeta por catarse, libertação física e purgação espiritual. Em março de 2017, lançou “Confissões Essenciais”, pela Ed. Gráfica Ruy Barbosa.