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Renovação antecipada das concessões atrairá R$ 30 bilhões em investimentos somente nos primeiros 5 anos
MRS Logística
EXPANSÃO DO MODAL FERROVIÁRIO VAI PROMOVER 40 MIL EMPREGOS DIRETOS, NO PRIMEIRO MOMENTO, E GERAR UMA ONDA DE IMPACTOS POSITIVOS PARA A ECONOMIA Por Paulo Espírito Santo
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“O mercado ferroviário de cargas no Brasil vive talvez o seu melhor momento dos últimos 30 anos. Em grande medida, isso se deve a projetos que estavam previstos para o setor há alguns anos e que agora começaram a sair do papel, ganhando corpo e velocidade.” A avaliação é de Fernando Simões Paes, Diretor-Executivo da Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF). Para ele, as renovações antecipadas das concessões são a “locomotiva” desta nova fase de desenvolvimento, responsáveis por dar novo fôlego às operadoras e ao setor. “A pauta já vinha sendo discutida desde 2015, quando foi incluída no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), do Governo Federal, ainda na gestão Dilma Rousseff. Seu objetivo é reforçar a coordenação das políticas de investimentos em infraestrutura, por meio de parcerias com a iniciativa privada, e estimular a expansão do modal ferroviário. É o que, felizmente, está acontecendo”, celebra Paes. De acordo com estudo realizado pelo Grupo de Economia da Infraestrutura e Soluções Ambientais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), com as prorrogações antecipadas, estima-se um aumento do volume transportado em cerca de 70 milhões de toneladas/ano, o que contri-
buirá para uma redução de aproximadamente 30% dos custos de transporte. Outro benefício é a redução do número de acidentes e de emissão de gases poluentes, como conseqüência da migração de cargas das rodovias para as ferrovias. O estudo foi realizado em março de 2018 e atualizado em agosto de 2020. Quando se trata de geração de empregos, a estimativa é a de criação de 40 mil empregos diretos e milhares de vagas indiretas. Para Fernando Paes, as prorrogações antecipadas deverão, ainda, promover investimentos acima de R$ 30 bilhões, somente nos primeiros cinco anos dos novos contratos, valores que serão aplicados na expansão da capacidade da malha, para atender as atuais e futuras demandas. Esses recursos serão responsáveis por impactos benéficos e imediatos de muitas outras naturezas, mas igualmente relevantes. Os primeiros atingirão os fornecedores de material rodante, de máquinas, equipamentos e serviços para a construção, recuperação e ampliação da via permanente, já instalados no Brasil, calcula o diretor da ANTF. Espera-se, por exemplo, um significativo aumento de demanda por novos vagões e locomotivas, ou pela recuperação e modernização da frota existente, bem como um crescimento no fornecimento de dormentes e trilhos e outros componentes da via permanente, de sistemas de comunicação e sinalização, entre outros. “Sob o ponto de vista da competitividade, os investimentos permitem ao País transportar produtos de forma muito mais eficiente, especialmente commodities agrícolas e minerais, que compõe grande parte das exportações brasileiras. Como resultado, o setor contribui para a redução do “Custo Brasil”, barateando os produtos para o consumidor final e aumentando a produtividade da economia como um todo”, calcula Paes. NOVO PARADIGMA Embora estivesse nos planos do Governo Federal desde 2015, o primeiro contrato de prorrogação só foi assinado em 27 de maio de 2020, envolvendo a Rumo Malha Paulista. Com 1.989 km de extensão, ligando Santa Fé do Sul (SP) ao Porto de Santos, a Malha Paulista transporta principalmente grãos (milho e soja), farelo de soja, álcool, açúcar, derivados de petróleo e contêineres. O contrato original venceria em 2028, mas foi renovado por mais 30 anos, mediante uma série de contrapartidas. Pelo acordo firmado com o Poder Concedente, a concessionária deverá investir mais de R$ 6 bilhões em obras, trilhos, vagões e locomotivas, nos primeiros cinco anos de contrato. Com isso, a malha deverá aumentar sua capacidade de transporte dos atuais 35 milhões para 75 milhões de toneladas, podendo chegar futuramente aos 100 milhões de toneladas. Somente em outorgas, a União arrecadará R$ 2,9 bilhões com o novo contrato. Além disso, segundo o Ministério da Infraestrutura, a realização dos investimentos previstos trará cerca de R$ 600 milhões aos cofres públicos nos próximos seis anos, mediante a arrecadação de tributos Fernando Paes entende que o processo de renovação do contrato com a Malha Paulista serviu como pa-
SOB O PONTO DE VISTA DA COMPETITIVIDADE, OS INVESTIMENTOS PERMITEM AO PAÍS TRANSPORTAR PRODUTOS DE FORMA MUITO MAIS EFICIENTE, ESPECIALMENTE COMMODITIES “ AGRÍCOLAS E MINERAIS, QUE COMPÕE GRANDE PARTE DAS EXPORTAÇÕES BRASILEIRAS. COMO RESULTADO, O SETOR CONTRIBUI PARA A REDUÇÃO DO “CUSTO BRASIL”, BARATEANDO OS PRODUTOS PARA O CONSUMIDOR FINAL E AUMENTANDO A PRODUTIVIDADE DA ECONOMIA COMO UM TODO.
Fernando Paes - Diretor-Executivo da ANTF
radigma para os seguintes. “A partir do processo da Rumo, foram desenvolvidos parâmetros e uma metodologia padrão. Mais importante, foram testadas soluções para questões as mais diversas, mas sempre de maneira técnica e muito objetiva, com a participação de profissionais de todas as áreas — do governo e da iniciativa privada. A questão da devolução de trechos identificados como efetivamente antieconômicos foi uma delas, e chegou-se a uma definição que contempla a defesa do interesse público sem, contudo, causar qualquer tipo de risco para o equilíbrio dos contratos” afirma o executivo.
Esses parâmetros e metodologia foram usados em dezembro do mesmo ano, quando da renovação dos contratos da Estrada de Ferro Vitória-Minas e da Estrada de Ferro Carajás, ambas operadas pela Vale. Os novos contratos prevêem investimentos de R$ 21 bilhões, sendo R$ 8,5 bilhões na EFVM e R$ 9,8 bilhões na EFC, além do uso do mecanismo de investimento cruzado, que permite aplicar parte do valor de outorga para a construção de novas ferrovias com investimento privado. CONTRAPARTIDAS MUDAM O JOGO Rafael Barros Pinto de Souza, especialista em Infraestrutura e superestrutura ferroviária, concorda com Fernando Paes que um grande trunfo, nesse processo de antecipação dos contratos foi a inclusão das contrapartidas no bojo das negociações. Para ele, o Governo Federal teve grande habilidade ao definir de que formas a sociedade poderia se beneficiar com as antecipações. No caso da Vale, Barros cita a construção da Ferrovia de Integração do Centro-Oeste (Fico). Com investimentos de R$ 2,7 bilhões do valor de outorga, e previsão de gerar 4,6 mil empregos, a nova linha férrea terá 383 km de extensão e ligará Mara Rosa (GO) a Água Boa (MT). “A Vale terá ainda que construir o ramal de 72 km da EF 118, entre Cariacica (ES) e Anchieta (RJ), que deverá ser incorporado à concessão da EF Vitória a Minas. Outra obrigatoriedade negociada pelo Poder Concedente com a Vale, como contrapartida, foi a solução de 55 conflitos urbanos, como passagens de nível, em cidades cortadas pelas ferrovias”, lembra Rafael Barros. Isso afeta diretamente a quem vive às margens das ferrovias, mas também a sociedade de uma maneira geral. A expectativa do diretor da ANTF, agora, é com a conclusão, nos próximos meses, do processo de renovação antecipada da Malha Regional Sudoeste, operada
A VALE TERÁ AINDA QUE CONSTRUIR O RAMAL DE 72 KM DA EF 118, ENTRE CARIACICA (ES) E ANCHIETA (RJ), QUE DEVERÁ SER INCORPORADO À CONCESSÃO DA EF VITÓRIA A MINAS. OUTRA OBRIGATORIEDADE NEGOCIADA PELO PODER CONCEDENTE COM A VALE, COMO CONTRAPARTIDA, FOI A SOLUÇÃO DE 55 CONFLITOS URBANOS, COMO PASSAGENS DE NÍVEL, EM CIDADES CORTADAS PELAS FERROVIAS
Rafael Barros Pinto de Souza, coordenador de cursos de Pós-Graduação em Engenharia Ferroviária e Metroferroviária
pela MRS Logística. A proposta foi aprovada, no final de outubro de 2021, pela Agência Nacional de Transportes (ANTT) e, em seguida, submetida à análise do Tribunal de Contas da União (TCU). Se for aceita, será assinado com a União o termo aditivo do contrato de concessão, estabelecendo o valor da outorga da concessão em aproximadamente R$ 2,9 bilhões, com validade até 2058. Originalmente, a concessão venceria em 2028. Com base no termo aditivo do contrato, os investimentos a serem feitos pela operadora estão estimados em R$ 6,1 bilhões. A MRS prevê duplicar sua capacidade de transporte em cargas gerais da ferrovia, de 30% para 60%. Pelo mesmo caminho devem seguir os processos de prorrogação dos contratos da Ferrovia Centro-Atlântica (FCA), administrada pela VLI Logística, que já passou por audiência pública, e da Malha Sul, também da Rumo. “Este é o processo mais incipiente. Contudo, prevê-se que a ferrovia apresentará, após estudos, um plano de negócios bastante robusto, que seja interessante tanto para ela quanto para a sociedade, para reconectar a malha ferroviária do Sul às de outras regiões do país”, analisa Fernando Paes POTENCIALIZANDO BENEFÍCIOS ”A ideia das contrapartidas é potencializar os notórios benefícios sociais e ambientais advindos do modal ferroviário. Com elas ganham a economia e a sociedade brasileiras, com mais obras, trabalho e renda além de novos e cada vez mais eficientes corredores de exportação”, conclui Fernando Paes. Ele lembra que ferrovias de carga têm um papel essencial para países continentais com forte vocação para o comércio exterior. “É o caso do Brasil, onde a ferrovia tem uma participação crescente no volume transportado anualmente. Para se ter uma ideia da importância das ferrovias na logística, mais de 92% dos minérios chegam aos portos brasileiros pelos trilhos. O modal responde pelo transporte de mais de 46% dos granéis sólidos agrícolas exportados e 42% de todo açúcar exportado. Apesar do transporte de minério e carvão representarem mais de 70% do volume total, as ferrovias têm diversificado suas cargas transportadas. A movimentação de contêineres, por exemplo, tem revelado uma expansão bastante positiva. Desde 1997, a movimentação de contêineres cresceu quase 135 vezes. Em 2020, foram 468 mil TEUs (unidade equivalente a um contêiner de 20 pés) transportados por ferrovias, uma pequena redução, de 0,4%, em relação a 2019 (470 mil TEUs), se considerados os impactos setoriais e as restrições impostas pela pandemia. “De acordo com o Plano Nacional de Logística (PNL), recentemente anunciado pelo Governo Federal, 21,5% de tudo o que é transportado no país passa pelos trilhos de nossas associadas. Mas é possível chegar a 30% em cinco anos, desde que os investimentos da iniciativa privada continuem. O potencial de cresci-
Estrada de Ferro Carajás
mento é indiscutível, evidente, e a meta, bastante factível” afirma o dirigente. A FERROVIA ENCOLHEU Durante o processo de renovação antecipada dos contratos de concessão, identificou-se que cerca de 40% da malha ferroviária brasileira estava não operacional. Dos cerca de 31 mil km de ferrovias existentes no Brasil, cerca de 18 mil km são considerados não -operacionais. Isso foi detectado em trechos da Malha Sul, da Malha Oeste, e trechos da FCA entre Minas Gerais e Bahia. De acordo com Rafael Barros, esses trechos foram objetos de discussão com as concessionárias, durante o processo de renovação. “Foi o caso da MRS, em São Paulo. A malha possui pequenos trechos não operacionais, de 8 ou 9 km, que a concessionária não tinha mais interesse em operar. Não havia cargas nem movimentação. Nesses casos, a operadora entra em contato com o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) responsável por todo o patrimônio remanescente da antiga Rede Ferroviária Federal. A concessionária informa que não tem interesse no trecho e pede um estudo para avaliar quanto deve pagar à União pela sua devolução. Esse estudo avalia em que situação essa malha se encontrava no momento em que foi concedida, e compara com o estado atual. A concessionária é obrigada a devolver a malha no mesmo estado em que recebeu. Mas, se for constatado que houve depreciação, uma equipe do governo entra em ação a fim de calcular o prejuízo existente, para que esse valor seja ressarcido aos cofres públicos. Portanto, automaticamente, esse trecho não entra na renovação antecipada. Todas as outras ferrovias devem seguir esse mesmo procedimento. Esse processo só não é adotado na renovação dos contratos das ferrovias Vale, que não pertenceram à antiga Rede Ferroviária Federal. A maior parte da malha não operacional se encontra hoje sob o controle da FCA, no trecho entre Minas e Bahia e da Rumo, na Malha Sul e na Malha Oeste. Muito provavelmente, essa Malha Oeste vai ser devolvida integralmente para a União. A Rumo não tem interesse em fazer a renovação dessa malha que uma vez devolvida para a União, deverá ser objeto de um novo leilão para concessão.