24 SUSPENSÃO
CONDICIONAL
DO
PROCESSO
____________________________ 24.1 GENERALIDADES A Constituição Federal de 1988, no art. 98, I, assim dispôs: “A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão: I – juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução das causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau.” Atendendo ao mandamento constitucional, o legislador ordinário elaborou e o Presidente da República sancionou a Lei nº 9.099, de 26-9-1995, que criou os juizados especiais cíveis e criminais, incumbidos do julgamento, respectivamente, das causas cíveis de menor complexidade e das infrações penais de menor potencial ofensivo. No âmbito do direito penal e processual penal, a Lei nº 9.099 foi saudada pela quase unanimidade da doutrina brasileira como a maior revolução dos últimos anos. Para uns, a lei “trouxe renovadas esperanças a todos os segmentos da sociedade no sentido de que, enfim, haverá no Brasil uma Justiça Criminal mais célere e acessível”1, para outros, “ocasionará, possivelmente, uma modificação de mentalidade do cidadão brasileiro que irá se defrontar com procedimentos céleres, visando ao ressarcimento dos danos sofridos pela vítima lesada pela prática infracional, bem como com a aplicação de penas restritivas de direitos ou de multa”2.
1
SOARES, Olavo Berriel. Lei nº 9.099/95: uma nova política criminal. Boletim do IBCCrim, nº 35, nov. 1995. 2
BRAGA, Vera Regina de Almeida. Justiça penal: celeridade da Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995. Boletim IBCCrim, nº 35, nov. 1995.
2 – Direito Penal – Ney Moura Teles ALBERTO SILVA FRANCO, todavia, foi, talvez, quem mais lucidamente a compreendeu: “Antes de tudo, torna-se imprescindível desmitizar a Lei nº 9.099/95. É falacioso o argumento de que a Justiça Penal, com ela, está salva. O diploma legal não cuida da criminalidade que tensiona o cidadão e a coletividade. Trata apenas da pequena criminalidade. É preciso que não se vendam ilusões.”3 A lei representa significativo avanço e, certamente, seu maior mérito é, num tempo em que foram elaboradas a Lei dos Crimes Hediondos (nº 8.072/90) e a chamada Lei do Crime Organizado (nº 9.034/95), ambas de inspiração autoritária, simplesmente ter sido votada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República. Seu advento, com os defeitos e qualidades que tem, por si só, é um alento para a construção de um Direito Penal de intervenção mínima, democrático e tutelar. Além de definir as chamadas infrações penais de menor potencial ofensivo e criar os juizados especiais incumbidos da conciliação, julgamento e execução dos processos relativos a essas infrações, permitindo a composição de danos, com aplicação de penas não privativas de liberdade, a Lei nº 9.099/95 criou um novo instituto, que é a maior novidade positiva no Direito Penal brasileiro nos últimos anos: a suspensão condicional do processo. Apesar de ser um instituto que é estudado em profundidade no âmbito do direito processual penal, a suspensão condicional do processo, conquanto conduza à extinção da punibilidade, deve ser também examinada, ainda que superficialmente, dentro do estudo do Direito Penal.
24.2 CONCEITO A suspensão condicional do processo penal, considerada por grande parte dos estudiosos do Direito Penal como a maior novidade introduzida no Direito brasileiro pela Lei nº 9.099/95, está assim regulada no art. 89 do mencionado diploma legal: “Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde
3 FRANCO, Alberto Silva. Questionamentos provocados pela Lei nº 9.099/95. Boletim do IBCCrim, nº 35, nov. 1995.
Suspensão Condicional do Processo - 3 que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal). § 1º Aceita a proposta pelo acusado e seu defensor, na presença do Juiz, este, recebendo a denúncia, poderá suspender o processo, submetendo o acusado a período de prova, sob as seguintes condições: I – reparação do dano, salvo impossibilidade de fazê-lo; II – proibição de freqüentar lugares; III – proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do Juiz; IV – comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades. § 2º O juiz poderá especificar outras condições a que fica subordinada a suspensão, desde que adequadas ao fato e à situação pessoal do acusado. § 3º A suspensão será revogada se, no curso do prazo, o beneficiário vier a ser processado por outro crime ou não efetuar, sem motivo justificado, a reparação do dano. § 4º A suspensão poderá ser revogada se o acusado vier a ser processado, no curso do prazo, por contravenção, ou descumprir qualquer outra condição imposta. § 5º Expirado o prazo sem revogação, o Juiz declarará extinta a punibilidade. § 6º Não correrá a prescrição durante o prazo de suspensão do processo. § 7º Se o acusado não aceitar a proposta prevista neste artigo, o processo prosseguirá em seus ulteriores termos.” É, efetivamente, a maior novidade num ordenamento jurídico que, consagrando o princípio da obrigatoriedade da ação penal, jamais tinha contemplado a transação como instrumento de realização dos interesses da justiça. A suspensão condicional do processo, chamada por DAMÁSIO E. DE JESUS de “sursis processual”, em virtude de suas semelhanças com a suspensão condicional da pena, constitui importante instrumento de despenalização, que será atingida de forma indireta, pela via do processo, e que vai atingir, também indiretamente, mediante o cumprimento de certas condições, o jus puniendi, o direito de o Estado punir o infrator da norma penal. O sistema criado permite a transação entre o acusado de infringir a norma e o titular da ação penal – o órgão do Ministério Público – e não alcança diretamente a aplicação da pena, mas o andamento do processo. Por ela, o processo é obstado, suspenso, paralisado, impondo-se ao acusado algumas condições a serem cumpridas em determinado tempo – o período de prova –, após o que, se não houver revogação, o Estado renunciará a seu direito de perseguir para obter a punição do infrator da norma penal. O acusado aceita o cumprimento do período de prova sem admitir a culpa,
4 – Direito Penal – Ney Moura Teles obtendo, ao fim do período de prova, a extinção da punibilidade, assegurando sua condição de primário, não podendo o fato objeto do processo suspenso, que não chegou a termo algum, ser levado em conta em nenhuma hipótese, no futuro. Verdadeira transação bilateral, entre o órgão da acusação e o acusado da prática do crime, a suspensão condicional do processo não é um instituto puro do direito processual penal, porque contém um componente de direito material, uma vez que constitui uma causa de extinção da punibilidade. Levada a termo a suspensão, cumpridas as condições e encerrado o período de prova sem revogação, a punibilidade restará extinta. Nesse sentido, atinge o jus puniendi do Estado, fulminando a possibilidade de aplicação da norma penal incriminadora. É um direito subjetivo do acusado que realizar seus pressupostos, e não uma simples faculdade do órgão do Ministério Público.
24.3 PRESSUPOSTOS PARA A CONCESSÃO A suspensão condicional do processo só é cabível na hipótese da prática de todas as contravenções penais e de crimes, cuja ação penal for pública, incondicionada ou condicionada, cuja pena mínima cominada seja igual ou inferior a um ano. Para a verificação do enquadramento do crime nas hipóteses em que a lei permite a suspensão, devem-se considerar os casos de tentativas de crimes, com aplicação do redutor máximo, de dois terços, pois que aqui, diferentemente do que ocorre quando se examina a prescrição em abstrato, o fim da norma é a despenalização, e não se cuida de atingir, diretamente, o jus puniendi. Não obstante a norma confira ao Ministério Público o direito de pedir a suspensão do processo, é certo que, se o acusado preencher todos os seus pressupostos, será um direito subjetivo dele, ficando o juiz obrigado a concedê-la, desde que presentes todos os requisitos legais. Segundo manda a lei, o órgão da acusação, no momento em que oferece a denúncia, quando dá início ao processo, deve pedir sua suspensão. O acusado deve realizar os seguintes pressupostos: a)não ter sido condenado definitivamente pela prática de outro crime, nem esteja sendo processado por outro crime. Neste primeiro pressuposto, são duas as exigências. Quanto à primeira, deve-se entender que só impede a suspensão condicional do processo a condenação que tenha
Suspensão Condicional do Processo - 5 eficácia para gerar a reincidência. Assim, nos termos do art. 64, I, do Código Penal, não prevalecerá condenação anterior a cinco anos. Quanto à segunda, de não estar o acusado sendo processado por outro crime, correto é o pensamento de LUIZ FLÁVIO GOMES: “Com a devida venia, nessa parte, o art. 89 conflita flagrantemente com o princípio constitucional da presunção de inocência. Estando o processo em curso o acusado é reputado inocente. Logo, não pode o legislador tratá-lo como se condenado fosse. A regra de tratamento derivada da presunção de inocência impede que o ‘acusado’ seja tratado como ‘condenado’. A existência de outro processo em curso, destarte, levará o juiz a um exame mais aprofundado das chamadas condições judiciais (culpabilidade, conduta social, personalidade, motivos etc.), mas por si só não pode ser obstáculo à suspensão do processo. Em virtude de um juízo negativo (fundamentado) das condições judiciais torna-se possível o indeferimento da mencionada via alternativa. Tal não poderá ocorrer, no entanto, com a invocação ‘seca’ da existência de processo em curso. As normas constitucionais ocupam hierarquia superior e não são meras peças de decoração.”4 b) culpabilidade, antecedentes, conduta social e personalidade, motivos e circunstâncias do fato devem ser de moldes a autorizar a concessão da suspensão. Apesar da exigência legal, correto é o pensamento segundo o qual não se pode admitir exame de culpabilidade, que é um juízo de valor possível apenas após a instrução do processo, que não terá sido feita. A lei, ao referir-se ao art. 77 do Código Penal, não atentou para o fato de que ali o processo já se terá encerrado, com o acusado considerado culpado. Se aqui não se instrui o processo, evitando-se seu prosseguimento e, ao fim e ao cabo, extinguindo-se a punibilidade sem que o acusado seja considerado culpado, é um contra-senso falar-se em examinar culpabilidade, para conceder a suspensão. Não devem, ademais, o órgão do Ministério Público, nem o juiz, considerar as outras circunstâncias com o mesmo espírito que os inspiram no momento das alegações finais e da sentença final, pois que nestas ocasiões estão examinando as mesmas circunstâncias após terem formulado o juízo de condenação. Aqui, cuidam de proporcionar ao acusado a possibilidade de furtar-se ao processo, para não se ver condenado por um fato de gravidade apenas média, em troca do 4
Suspensão condicional do processo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995. p. 159.
6 – Direito Penal – Ney Moura Teles cumprimento de um período de prova em que terá oportunidade de mostrar sua capacidade de viver em sociedade sem causar-lhe prejuízos. Não se exigirão aquelas circunstâncias amplamente favoráveis, apenas que não sejam totalmente desfavoráveis.
24.4 PERÍODO DE PROVA Após verificar a presença dos pressupostos que autorizam a suspensão do processo, o juiz deverá, desde que o acusado aceite, suspender o curso do processo, submetendo-o a um chamado período de prova, que é o espaço de tempo dentro do qual deverá cumprir as condições estabelecidas. O período de prova será fixado entre dois e quatro anos. Para MAURÍCIO ANTONIO RIBEIRO LOPES, “será tanto maior o período de prova para a suspensão condicional do processo quanto menos permitirem presumir as condições subjetivas do argüido, que este não incidirá novamente no cometimento de ilícitos penais”.5 LUIZ FLÁVIO GOMES entende que “justifica-se propor maior período de prova conforme a natureza e gravidade da infração”, lembrando ainda que “na suspensão do processo o que vale é a pena em abstrato”6. Para DAMÁSIO E. DE JESUS, o juiz deve levar em conta “a natureza do crime e personalidade do denunciado” e “a cominação abstrata da pena”7. O certo é que o prazo somente será fixado acima do mínimo quando o fato imputado ao acusado for de maior gravidade e as circunstâncias definidas no art. 77 do Código Penal – exceto a culpabilidade, cujo exame nem se fará, como já demonstrado – forem induvidosamente desfavoráveis. Não basta o juiz fixar o prazo do período de prova, pois é necessário que o acusado o aceite. A suspensão do processo é, não se olvide, uma transação, e depende da aceitação do acusado. A fixação de um período de prova por prazo superior ao mínimo pode significar tamanha aflição que o acusado pode preferir submeter-se ao processo e, na pior das
5 6 7
Comentários à lei dos juizados especiais cíveis e criminais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995. p. 395. Op. cit. p. 180. Lei dos juizados especiais criminais anotada. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 89.
Suspensão Condicional do Processo - 7 hipóteses, condenado, obter um sursis mais favorável. É óbvio que, neste último caso, perderá a primariedade, mas, a seu juízo, pode ser mais favorável. Até porque poderá ser absolvido. Em síntese, a suspensão deve ser fruto do consenso entre as partes.
24.5 CONDIÇÕES Durante o período de prova, o acusado deverá cumprir algumas condições fixadas na lei (art. 89, § 1º, Lei nº 9.099/95) e outras determinadas pelo juiz, adequadas ao fato e à situação pessoal do acusado (art. 89, § 2º, Lei nº 9.099/95).
24.5.1
Condições legais (obrigatórias)
Há muito se esperava do ordenamento jurídico brasileiro preocupação mais objetiva e eficaz com a vítima, por longo tempo fora do centro das atenções do Direito Penal. Da mais alta importância a exigência, pois o direito agredido da vítima pode, muitas vezes, ser reparado, o que em última instância é um dos fins do Direito. Deve o juiz, verificando as condições do acusado, fixar o valor da reparação do dano, podendo determinar prazo para o cumprimento da obrigação de indenizar. A impossibilidade de indenizar, devidamente comprovada, não impedirá a suspensão do processo. A vítima poderá promover a ação indenizatória civil. Se o acusado dispuser-se a efetuar o pagamento de determinado valor do dano dentro de suas possibilidades, a fim de obter a suspensão do processo, a vítima poderá recebê-lo sem, necessariamente, dar a quitação do crédito que considerar possuir, podendo demandar, no juízo cível, pela diferença que considerar devida. Além da reparação do dano, o juiz deverá proibir o acusado de freqüentar determinados lugares. Ao fazê-lo, levará em conta as circunstâncias do fato típico praticado e as condições pessoais do acusado, com vistas na prevenção. Finalmente, imporá a obrigação de não se ausentar da comarca onde reside, sem autorização judicial, e a de comparecer mensalmente em juízo para informar e justificar suas atividades.
24.5.2
Condições judiciais (facultativas)
8 – Direito Penal – Ney Moura Teles Também poderá o juiz determinar outras condições para serem cumpridas durante o período de prova, dentro de seu prudente arbítrio, subordinando-se, exclusivamente, à adequação que devem guardar com o fato e com a situação pessoal do acusado. É conveniente que os juízes exerçam essa faculdade com a maior seriedade e preocupação com a recuperação do acusado, e não como uma mera formalidade processual. Muitas vezes assoberbados pelo excesso de trabalho, os juízes não atentam para a importância da fixação dessas condições, o que já foi observado quando da abordagem da concessão do sursis. Acabam determinando tarefas absurdas, arbitrárias, outras inócuas e até cômicas. Para fixá-las, o juiz deve nortear-se para os objetivos propostos: prevenção e educação. Prevenir a ocorrência de novos fatos típicos e proporcionar informações e formação ao acusado acerca da necessidade de respeitar os valores ético-sociais cultivados pela sociedade. Todas as condições deveriam orientar-se pela necessidade de educar e socializar. O juiz deve com ampla liberdade descobrir as melhores idéias, levando em conta as características do acusado e do fato por ele praticado. A enorme diversidade de situações dificulta a apresentação de sugestões, pelo que se abraça a lição de MAURÍCIO ANTONIO RIBEIRO LOPES, que apresenta um catálogo de muito do que não deve ser imposto como condição da suspensão condicional do processo: “proibição de porte de armas ofensivas; proibição de freqüentar espetáculos noturnos; proibição de ingerir bebidas alcoólicas; pagamento de custas; apresentação de atestado de boa conduta; obrigação de dotar a ofendida em crimes contra os costumes; pagamento de pensão; proibição de dirigir veículos; obrigação de freqüentar auto-escola; submissão a novo exame de habilitação; proibição de porte de material contravencional; apresentação de relatório de ocorrências presenciadas em pronto-socorro; apresentação de redação sobre os perigos de dirigir imprudentemente; carregar pessoalmente latas d’água para dependência pública; limpeza de repartição pública; proibição de andar em más companhias; abandonar a prostituição; recolhimento em hora certa; visitas trimestrais a vítimas de acidentes em hospitais; cooperar para instituições beneficentes; freqüentar ou proibir que se freqüente culto religioso; apresentar mensalmente certidão de antecedentes; pagamento de dias-multa; proibição de
Suspensão Condicional do Processo - 9 não delinqüir; comparecer a clínicas de recuperação de traumatizados; doação de sangue”8.
24.6 REVOGAÇÃO E PRORROGAÇÃO DO PERÍODO DE PROVA A suspensão poderá ser revogada retomando-se o curso do processo penal, vindo o acusado a ocupar novamente a posição de perseguido, de réu.
24.6.1
Revogação obrigatória
Estabelece o § 3º, do art. 89 da Lei nº 9.099/95, que a suspensão do processo será, obrigatoriamente, revogada em duas hipóteses: (a) o acusado vem a ser processado por outro crime; (b) não repara o dano, podendo fazê-lo. A primeira causa de revogação obrigatória tem enfrentado a pecha de inconstitucional, por violar o princípio da presunção da inocência. Se apenas foi iniciado um processo contra o acusado, não pode ele sofrer quaisquer conseqüências como se já estivesse condenado. É verdade, a Constituição Federal assegura a presunção da inocência, a todo acusado que como inocente deve ser tratado enquanto não transitar, contra si, sentença penal condenatória. O Código Penal, ao cuidar do sursis, dá um tratamento mais coerente com o preceito constitucional quando, no § 2º do art. 81, determina a prorrogação do período de prova na hipótese de o beneficiado vir a ser processado por outro crime. Melhor é o entendimento de que a simples instauração de outro processo penal contra o beneficiado pela suspensão do processo não acarretará, obrigatoriamente, a revogação do benefício, mas apenas a prorrogação do período de prova. Porquanto violadora do preceito constitucional da presunção da inocência, não tem validade a norma do § 3º do art. 89 que manda revogar a suspensão diante da simples instauração de novo processo penal contra o acusado beneficiado com a suspensão. Só se dará a revogação obrigatoriamente se houver condenação transitada em julgado por outro crime. A segunda causa, sim, justifica a revogação. Se o acusado, podendo ressarcir o
8
Op. cit. p. 395-396.
10 – Direito Penal – Ney Moura Teles dano, podendo pagar a indenização, mesmo assim, não o faz, deverá arcar com a revogação do benefício e o reinício do processo, com todas as suas conseqüências.
24.6.2
Revogação facultativa
Determina o § 4º do art. 89 da Lei nº 9.099/95 que, se vier a ser instaurado processo por contravenção penal contra o beneficiado, ou se este vier a descumprir qualquer outra das condições impostas, a suspensão do processo poderá ser revogada. Como se vê, a ocorrência dessas causas poderá autorizar o juiz a revogar a suspensão do processo. É certo que, se o beneficiado não cumpre as condições estabelecidas para o período de prova, deverá merecer reprimenda do juiz que até poderá revogar o benefício, determinando o reinício do processo. É óbvio que somente o fará em circunstâncias especiais, quando ficar evidenciada a necessidade de retomar-se o curso da persecução penal. O acusado deverá sofrer as conseqüências de revogação do benefício somente quando mostrar não merecer as benesses da suspensão, por indiferença para com as conseqüências do processo, por desconsideração para com os benefícios a si concedidos, ou por revelar atitude desrespeitosa para com o direito.
24.6.3
Prorrogação do período de prova
No sursis, o período de prova será prorrogado se o beneficiado vier a ser processado por outro crime e contravenção. Também na suspensão condicional do processo, apesar de não haver dispositivo expresso nesse sentido, deve-se entender que, em vez de revogação obrigatória do benefício, o período de prova será obrigatoriamente prorrogado, se o processo for pela prática de crime, ou, facultativamente, se o processo for por contravenção. Se houver condenação definitiva, revoga-se obrigatoriamente a suspensão, reinstaurando-se e prosseguindo no processo, até o final. Se houver absolvição, extinguindo-se o período de prova, extinguir-se-á a punibilidade.
24.7 EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE Se o prazo do período de prova expirar sem que tenha havido sua revogação,
Suspensão Condicional do Processo - 11 deverá o juiz declarar extinta a punibilidade do fato. Extinta a punibilidade, não se fará mais qualquer referência ao fato praticado pelo agente, que restará apagado, como se nunca tivesse acontecido. Não se falará em reincidência, nem em maus antecedentes. Como não houve processo, nem condenação e como o Estado renunciou ao direito de perseguir o agente, renunciando ao direito de puni-lo, o fato desaparece da história, como se nem tivesse ocorrido.