01df rosa fesca

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dario fo & rose accioly & paulo michelotto

misterio buffo

rosa fresca aulentissima


Ator     "Mistério"é o termo que se empregava nos séculos II0 e III0 Para indicar um espetáculo, uma representação sacra. Ainda hoje aonde se reza terço se ouve o padre ou a beata dizer: "No primeiro mistério gozoso... no segundo mistério gozoso..." e assim um após outro. ( Entendam bem, a beata diz gozoso, e não, gozado...) Mistério significa pois: representação sacra...e Mistério buffo significa: espetáculo grotesco... Foi o povo quem inventou o mistério buffo. Desde os primeiros séculos depois de Cristo, o povo se divertia - e nào era apenas diversão     fazendo, jogando, como se dizia, espetáculos de forma irônico- grotesca... E isso porque para o povo o teatro e o teatro grotesco em particular, sempre foi o meio principal de expressão, de comunicação, mas também de provocação e agitação de idéias. O teatro era o jornal falado e dramatizado do povo.


ROSA FRESCA AULENTISSIMA     No que diz respeito à nossa história, ou melhor à história de nosso povo, um dos textos essenciais do teatro cômico-grotesco, satírico, chama-se: ROSA FRESCA AULENTISSIMA, de Ciullo ( OU Cielo ) d’Alcamo.     Bem, por que queremos falar hoje desse texto? Porque é o texto mais distorcido que se conhece na história da literatura italiana, pois sempre foi apresentado de maneira distorcida. Quando os professores nos apresentam essa obra, nos proporcionam o mais gigantesco tédio de toda a história do ensino ... Antes de mais nada nos fazem acreditar que é um texto escrito por um autor aristocrátrico, da Academia. Alguém que sé escreveu numa linguagem, vulgar, quis demonstrar que era capaz de transformar barro em ouro. Conseguiu portanto escrever uma obra de arte: mediante a graça que só um poeta aristocrático como ele poderia possuir... Que talento e nobreza não são requeridos para se elevar um tema tão trivial quanto o do " amor carnal" aos níveis extraordinários da poesia "culta", própria da classe "superior"!!!!!! etc etc...     Ajunte-se a esse esforço para nos fazer ver a obra como um momento de pura inspiração da mais alta espiritualidade de nosso autor, o esforço paralelo de se ir interpretando-a com tudo o que se podia meter dentro dela, digamos todos os truques e saltos mortais dos autores sagrados burgueses , dos textos escolásticos, desde de Sanctis até Ovídio. E Dante foi certamente o maior


de todos tediosos, ao afirmar de forma mais ou menos explícita em seu De Vulgari Eloquentia, que "claro, há uma certa "aspereza" nesse "contraste", algo aí é um pouco tosco, rude, boçal, mas certamente o autor é um erudito, uma pessoa culta." Não vamos nem, tentar mencionar o que falaram os autores dos séculos XVII e XIX, sobre a origem "culta" desse texto. O cúmulo foi certamente sob o fascismo, mas um pouco antes dos fascistas a coisa também já era uma tremenda enrolada. Benedetto Croce, lembram-se deste filósofo liberal? Pois. Ele mesmo diz que tá na cara que ‘é um autror aristocrático, porque a poesia do povo é um ato mecânico, é um ato de repetição em de rimas... O povo, já se sabe, é incapaz de se elevar acima da banalidade, da brutalidade, da vulgaridade e então o máximo que consegue é copiar de maneira "mecânica"...Esse é o sentido de mecânico do Croce. Só um autor aristocrata, culto e evoluido tem a possibilidade de desenvolver artisticamente qualquer tema. O povo, estupidarrão e abestalhado consegue no máximo imitar. E pronto. Croce credo! Um belo raciocínio, porém, coube a dois sem vergonhas - sem vergonha no sentido carinhoso da palavra - sem vergonhas para a cutura burguesa e aristocrática: um tal de Toschi e um tal de De Bartholomeis. E dois católicos para ser exato. Ambos fizeram um autêntico tratado, demonstrando que o "contraste" em questão é um texto extraordinário, contudo obra indiscutível do povo.   Como? Basta examinarmos com atenção. Comecemos por decifrar direitinho o que que nos diz esse jogral ( já que quem fala é um jogral ). DIZ: "Rosa fresca y perfumada que apareces pelo verão". Quem diz isso é um funileiro, mais precisamente aquele cujo trabalho consiste em consertar buracos de panelas nos mercados. Hoje na Sicília são chamados de "bávaros"- porque


segundo parece esse trabalho é uma concessão e foi um rei bourbom que a deu aos bávaros, à gente da Baviera. Antigamente esses personagens que hoje se chamam, por exemplo "guardas municipais" tinham um nome bastante imaginoso: cegonhas. Por quê? Porque levavam um livro, um registro, preso à mula por uma correia e quando tinham que guardar dinheiro, ou anotar a quantia e o nome daquele que pagava o imposto que devia ao senhor pelas terras arrendadas, se colocavam numa posição bastante cômoda para escrever: , ou seja, apoiavam, o pé direito no estribo esquerdo, ficando de pé sobre uma perna só, exatamente como cegonhas e garças. ( Esses agentes do fisco eram cegonhas e não garças, apesar da pose, pois se a coisa se passasse em França, ficava muito mal chamar a um policial de garça, visto que lá isso significa prostituta.... O que seria uma afronta, mas não uma mentira...) Nesse momento de nosso texto, este garça está declarando seu amor a uma jovem. E como? Ocultando o livro que leva na mula com uma volta de sua capa, se fazendo assim passar por um nobre e rico. Por sua vez, quem está na janela, passando-se pela filha do proprietário? Uma criada, uma qualquer. O que é que a desmascarou para nós? Exatamente uma ironia do rapaz que em dado momento diz:   "desde que te vi vestida de avental, tão formosa, des deste dia meu coração foi ferido" Esse avental era próprio de frades e também monjas, mas aqui na realidade seu significado é burlesco: aqui se refere a uma espécie de camisola sem mangas que, por ser engomada, protegiam uma lavadeira para que não se molhasse toda quando se abaixavam para bater a roupa.


Aha! Agora sabemos em que postura se colocam as lavadeiras... Bem, os que já viram uma lavadeira sabem como é... Hoje temos lavadoras, máquinas de lavar roupa, e já não se move mais uma das coisas mais formosas da natureza. Me refiro a essa redondez carnuda e macia que se bamboleava ao mover-se e que desta graciosa maneira era oferecida aos passantes. Por isso o jogral, malicioso, diz:       " quando ví - te ao lavar roupa... quando estavas de roupão, bunda ao ar... malemolência... apaixonei-me logo, então, por tua grande inteligência ... Enamorou-se como diz Brecht "daquilo que o Criador criou com majestosa graça e elegância" criou no sétimo dia e descansou, porque necessitou de toda a concentração possível para criar semelhante perfeição dinâmica, o X de toda a Criação, o eixo do mundo.       "Foi por esse X que me apaixonei"- é o que o jogral está dizendo... Agora conhecemos a origem social de nossos dois personagens: a mocinha que se gaba de sua posição...social, e o rapaz que também se gaba da posição, da posição .... etc.   O jovem então declama:     "Rosa fresca aulentissima ch’ apari..." • o

que é uma linguagem palaciana, refinada, própria de quem quer fazer-se passar por nobre. Ele está caricaturando, mas essa não é sua intenção, pois logo logo veremos a verdadeira razão de tudo isso.


      "Rosa fresca aulentissima ch’ apari inver la state Le donne ti disiano, pulzell’e maritate..." • • • o

Italiano medieval, que traduzido dá nisso:       " És tão formosa que até as mulheres, donzelas ou casadas, gostariam de fazer amor contigo... "

Isso sem falar nas viuvas, mas porque para elas, claro, isso é normal! Seria uma loucura! Vocês conseguem imaginar, no colégio, o pobre professor de arte educação que tivesse que explicar as coisas tal como são ditas?!     " É natural, meninos... Na idade Média as mulheres se guiliguiliguili frequentemente" ???!!!!!!! Peidos para todo lado, daqueles de te deixar pálido, risadas abertas e francas... Claro, voce vai acabar expulso de todos os colégios de nossa República Democrática ( sim, porque estamos numa democracia...) e estamos conversados! Eis aqui porque o pobre professor, que além de tudo é um pai de família, não tem outro remédio senão mentir descaradamente... E prestem atençào, essa necessidade de esconder a verdade nasce logo logo que se diz o nome do autor. Já sabemos que é sempre citado como Ciullo d’Alcamo ou como como sendo o mesmo que Cielo d’Alcamo, que significa Céu de Alcamo, um belíssimo e espiritual pseudônimo. Mas atenção redobrada`: as pessoas lá do norte sabem o que significa o termo CIULLO, que nos deu também o abrandado CHULO. Sem querer


ensinar padre nosso a vigários, estou apenas lhes relembrando que "ciulo" é o nome chulo do sexo masculino. E na Sicilia também, lá na cidade de Alcamo, quando perguntei o significado de Ciullo...Hahaha ..todos morriam de rir! Agora, voltemos ao Colégio. Já se deram conta do tamanho do problema que terá nosso professor? Vai ter que cortar, remendar, reescrever, interpretar...porque não tem outro jeito, esse nome aí está errado, claro! Conhecidos investigadores fizeram mão de todas os truques possíveis para indicar outra leitura. Pois se esse pseudônimo estivesse certo, o autor certamente seria um jogral, já que todos os jograis tinham apelidos bastante interessantes e apimentados. Veja o caso de Ruzzante. A nosso ver, ele pode ser considerado o último dos jograis e seu apelido vem, de ruzzare que significa cavalgar. ( Alguém aqui se lembra dum cavalo chamado Rocinonte? É o mesmo têrmo...).. E se voce for da região de Pádua que nem Santo Antônio- lembra como ele gostava de animais? - saberá que ruzzare significa cavalgar, mas não no sentido de sair por aí dando um passeio a cavalo, senão como poderia o Rocinonte de D. Quixote cavalgar? "Ruzzare" significa acoplar-se com animais, como animais, "cavalgá-los", " montá-los", seja em dias de festa seja nos períodos apropriados de cio - o que certamente os animais preferem de longe, provavelmente... Então, fica mais que demonstrado que não se pode dizer que o autor de Rosa Aulentissima se chame Sr. Caralho! Ainda mais numa escola como a nossa, onde a hipocrisia e a sujeira começam a ser produzidas já desde pequenininhos.... Eu também já estive entre os pequenininhos quando eu era menor e me lembro de quando uma menininha via um menininho fazendo pipi.     - " Ui, ui, senhorita professora...olhe...o que se passa com o Julinho


ele tem um dedinho a mais e no lugar errado" - " É uma doença feíssima, nem pense em tocar que lhe nasce um também...." - " Nem olhe... "- repreendia a fessôra -" vamos...vamos... faça logo um sinal da cruz, vai!" É assim a nossa escola.... E temos que compreender o drama de nossos profesores... Voltando para nossa     "rosa fresca e aulentissima ch’apari inver la state le donne ti disiano, pulsell’e maritate " Como vamos resolver isso aí? Compreendam que essa é um tipo de frase feita da Sicília, onde para se fazer um elogia a uma moça, se diz:     Bedda tu si, fighiuzza, che anco altri fighiuzze a tia vurria ‘mbrazzari’    

até as outras moças querem te abraçar,     de tão formosa que és"

Isso é dito sem malícia alguma, mas em nossa escola não se pode... E então o que é que inventam? Uma rápida viravolta de 60 graus para regular a questão. O professor ensina ( e veja que são anotações que se encontram em todos os textos):     " não se deve entender o texto assim, tal qual, temos que tentar especificá-lo...


Quando dizemos isso, dizemos: és tào formosa que até as outras mulheres donzelas ou casadas querem se parecer contigo" Não é que te queiram a ti! querem é se parecer contigo, parecer como és, formosa, distinta de todas as outras mulheres...." E assim, meninos e meninas começam logo a aprender a ser hipócritas, e a dizer em suas casas:     "Mammy quero uma maçã.... não, não quero uma maçã no sentido de querer comê-la, mas quero no sentido de ficar parecida com uma maçã, redonda e vermelha, para que os outros tenham uma vontade doida de me comer..." Se continuarmos por aí descobriremos outro jogo bastante brutal desse modelo. Continua o texto:     " tragemi d’este focora, si t’este a bolantate..." - deixa-me sair deste fogo, se tens vontade, moça * - roga o jovem... Já sabemos perfeitamente como as meninas conseguem que os meninos saiam do fogo e do desejo quando estão com vontade de fazê-lo...bem, mas aqui, não se trata disso, parece, o texto nada diz... são coisas que não interessam a todos...bem, vamos deixar para lá.... Mas em seguida vem a resposta da moça que toma o rapaz um tanto ao pé da letra e revela não ser uma moça tão fina assim de trato, já que se expressa mais ou menos assim:     " Podes ir arar o mar e semear o vento, Comigo fazer o amor não conseguirás jamais..


Todo o dinheiro, todos os tesouros dessa terra podes ajuntar mas não haverás de fazer amor comigo E mais, te direi que se insistes em vez de aceitar fazer amor contigo li cavelli m’aritonno " • • • •

me faço rapar os pelos: me viro monja     e assim não te verei mais... Ah, como serei feliz!!! "

E o rapaz contesta:   " Ah é? Vais rapar os pelos? Então eu também me ajeito a cabeça me viro frade, vou a teu convento, te confesso... e no momento oportuno , NHAC!" Esse NHAC fui eu que, acrescentei, mas está implícito... A moça empalidece e grita:   - És o anticristo, um ser vergonhoso Como te atreves? Antes de aceitar tua violência me atiro no mar e me afogo""


- "Te afogas? Eu também... Não, não me afogo Me jogo ao mar eu também Te vou a buscar lá no fundo Te arrasto até a praia e afogada e tudo e etc... NHAC!! Faço amor contigo!" - "Comigo, afogada?" - "Sim!" - " Péraí..."- diz-lhe a moça com muita candura mas não se sente prazer algum fazendo amor com afogados! Ela sabe tudo, tá na cara! Uma prima sua se afogou, passou um cara por lá, deu uma olhada para ver se alguém olhava...   "Vou dar uma provadinha" Provou.   " Mamma mia, que asco...é muito melhor com um peixe espada !!!" Seja lá como for a mocinha se escandaliza profundamente e ameaça:   "Cuidado! Como te atreves sozinho a me fazer violência? Meus parentes virão e Te matam na porrada..."


Arrogante, o jovem lhe contesta: ( Não esqueçamos que está interpretando o personagem de um rico aristocrata   " Se teus parentes me encontram Quando eu acabar de te violar ou enquanto estou a te violar, que podem me fazer? Dou-lhes uma Defesa de dois mil augustários" Um momento, por favor !. . . • o

Augustário era a moeda de Augusto, pois assim se referiam a Frederico II. E , com efeito, estamos em 1231-1232, quando na Sicília governava Frederico II da Suávia. Dois mil augustários davam mais ou menos 75.000 libras, uns setenta e cinco dólares.

Mas que diabos é uma DEFESA? • o

Faz parte de um grupo de leis promulgadas em favor dos nobres, dos ricos, chamadas "leis melfitanas", boladas exatamente pelo Frederico II, para facilitar aos nobres um maravilhoso previlégio, o de defesa....

Assim um rico podia violar, no maior sossêgo, uma jovem; bastava que, no momento em que o marido ou os parentes descobrissem, o violador pegasse seus 75 reais,. Os colocase ao lado do corpo da violada, levantasse os braços para o céu e gritasse:      " Viva o imperador, deus seja louvado!" Isso era o suficiente para salvá-lo. Era como se estivesse avisando:      " Vão com calma...Vejam bem o que pretendem fazer


Aqueles que puserememem mim as mãos porão o pescoço na corda, sem precisar julgamento" E era isso que acontecia a quem tentasse pôr as mãos no nobre que houvesse pago a Defesa: era enforcado imediatamente, no lugar mesmo dos fatos ou um pouco mais adiante se houvesse carência de árvore... Dá para imaginar a cena toda... O figurino do violador medieval era bem prático, pois nessa época os bolsos não faziam parte das calças, como hoje, mas eram umas bolsas que se colocavam na cintura como uma pochete, como uma capanga. Isso lhe dava duas vantagens. Primeiro podia pagar tudo com moedinhas recolhidas pelos Garças do Imposto- o que faria volume, mas não lhe arriaria a tôa as calças Depois, lhe permitia uma condição vantajosa: ficava completamente nú, com aquele saco enorme dependurado às vêzes com aqueles dois sacos enormes dependurados, e no caso em que: "Ai meu deus, esse barulho é dos tamancos de meu marido!" Zas! Pega-se no saco, espalha-se a Defesa ao redor do corpo, "Viva o Imperador, pela graça de deus!" e está tudo em ordem.... Claro, claro, levava-se o dinheiro já contado, não daria tempo de: "25,26,27... Desculpe-me... espere um momento... 28, 29... não estou pedindo desconto, não... 30, 31 ..." ou pior: " Poderia me trocar uma de quinhentos, por favor?"


ou pior ainda: " Rapidinho, rapidinho...bota ai mesmo... senão...não vai dar tempo de contar o dinheiro!" Mães preocupadas com o futuro de seus filhos ( ...mães nobres, não é?):   " Já estás saindo? Não se esqueça de levar a Defesa meu filho!..." Pais liberais de filhos liberais: - " Já tens a Defesa? - " Não, pode deixar, papi, vou apenas me encontrar com uns amigos - " Toma mais algumas Defesas, meu filho a noite é criança e voce bem merece..." Sim , porque a Defesa valia também para a violência à base de facas e punhais... Estão me acompanhando? Frederico II não era nenhum doutor Froid, mas já percebia esse negócio de simbolismo... Assim que, se um nobre mete-se num camponês em vez de numa camponesa; e nesse caso um punhal, em vez do Don Ciullo...   " Defesa! Viva o Imperador pela graça de deus etc...." E se matasse o burro do camponês, além do camponês? Bastava arredondar a quantia para 80 dólares...


    ‘Viva Frederico II, Imperador pela graça de deus etc etc...." Isso já vos deve ter feito perceber qual era a chave das "leis" dos senhores medievais: a brutalidade de uma corja que permitia se livrar da culpa de qualquer violência cometida pelos que detinham o poder - e por isso mesmo acabavam donos também da violência... Claro, claro, nosso não esquecido arte-educador em seu pequeno e reprimido colégio não explicará nunca isso a nós quando pequeninos... Lembro-me até que em nosso livro de texto- e isso já no bacharelado toda essa estrofe havia desaparecido... Em outros textos aparecia a estrofe augustária, mas ninguém explicava nada e ninguém acabava entendendo como é que 75 dólares pudesse se constituir defesa de violadores ou de assassinos e o texto virava "teatro do absurdo" em vez de medieval. Por quê não explicavam nada? Simples...através da comprerensão desse texto pode-se deduzir quem era o seu autor. Só podia ser gente do povo! • o

o

O jogral que se apresentava em praça pública abria diante do povo a visão de sua própria condição, a condição de "corneado, fudido e mal pago" como se diz popularmente até hoje essa belíssima expressão medioeva.... Porque essa lei lhe impunha precisamente o engôdo, além do cabresto.

Bem, claro que havia outras leis...mas eram todas igualmente nobres.... Assim não resta muita dúvida que o jogral fosse alguém que, na Idade Média, pertencesse ao povo. Como diz Muratori, o jogral nascia do povo e com o povo tomava raiva, para devolvê-la de novo ao povo, filtrada através do grotesco, da " razão", para que o povo pudesse tomar consciência de sua condição. Essa também, é a razão pela qual , na Idade Média, se matava jograis com tanta abundância, ou os dezossavam, ou cortava-se-lhes a língua para não falar de outros adornos que se gostava de cortar...


Mas já é hora finalmente de voltarmos a nosso autêntico "MISTÉRIO BUFFO". ( apresentação de slides, ou telões....) 1. Essa é uma sequência de bufonadas, ou seja, uma espécie de preparação para os espetáculos irônico-grotescos, nos quais o povo também participava, maquiado e disfarçado. Era gente do povo...dá para ver....Esse aqui vai disfarçado de "mamuttones". O que é?   Uma máscara muito muito antiga, metade cabra, metade diabo. Ainda hoje em dia na Sardenha em algumas festas os camponeses se vestem com essas estranhas peles, se penduram esses guizos de boi e saem a passear com máscaras muito parecidas com as da imagem. Vereis que quase todos são diabos. Esse aqui é um jogral, esse o personagem chamado Jolly, o louco ( alegoria do povo ), esse outro um diabo, esse diabo... diabos! está cheio de diabos! 2. Temos aqui outra sequência   Diabos, bruxas e um frade de passagem pelo slide, como decoração. Notai outro detalhe: todos levam instrumentos para fazer barulho, porque o jogo do estrépido, do alvoroço, era essencial nessas festas... (indicando um personagem do slide) Esse leva um ciucciué, e outros nomes que lhe dão em Nápoles. São umas peles de couro achatadas e esticadas que emitem uns peidos horrendos.


( indicando outro personagem) Aqui temos um com a perna levantada, que não precisa de instrumento musical, ele mesmo produz seu ruido... deve ser ator da corrente de interpretação naturalista... Esses aqui emitem outros ruidos.   Estes personagens mascarados se reuniam todos na praça e celebravam uma espécie de processo, fazendo uma simulação dos nobres , dos poderosos, dos ricos, emnfim, dos senhores em geral. Entre eles, mercadores, imperadores, agiotas, banqueiros- o que dá no mesmo... Havia também bispos e cardeais. Nunca compreendi bem porque, na Idade Média, situavam os bispos e cardeais ao lado dos poderosos e senhores... São atitudes tão singulares que não nos demos ao trabalho de verificar a razão dessa injustiça... Sem dúvida esses eram falsos bispos, falsos cardeais, falsos ricos ..... Podemos tambem saber porque os ricos não demonstravam a menor boa vontade em brincar com o povo nessas encenações. Era gente do povo que se disfarçava, organizava uma espécie de processo penal, bastante violento, a base de acusações concretas..." Fizeste isso. Roubaste. Exploraste o povo. Assassinaste" etc... Mas o momento mais emocionante era o final. Era uma espécie de inferno, no qual se jogavam, em falsos panelões com falso óleo fervendo, depois de um massacre , um desossamento, se jogavam os nobres, ricos e senhores. Os ricos de verdade ficavam em suas casas nesses dias... já pensou na situação:    " Ai, ai, ai, estás me descendo o cacête!! " Óh, desculpa-me, pensei que eras um falso rico...." OU:    " Mas isso é óleo fervendo de verdade, socorro!!!" " Bem, mas você é um rico de verdade!!!"


Assim, para evitar que fossem tomados por falsos ricos e severamente castigados, eles se entrincheiravam em suas casas e não saiam nem que a vaca tussisse ou o peito de Santa Edwiges vertesse leite Ninho em pó . E tem mais. E quem conta cheio de má intenção é esse grande historiador alsaciano, Bloch, assassinado pelos nazistas por ser comunista. Garante ele que as persianas ou venezianas foram inventadas nessa época para que os ricos pudessem brechar todas essas manifestações na praça sem ter que ir vêlas lá embaixo, ao vivo....

Toda essa gente, esse jograis, esses bufões, ao terminar a festa entravam na igreja. A Igreja da Idade Média respeitava o significado original de seu nome, ecclesia, ou seja, lugar de reunião. É por isso que entravam nesse lugar ao cabo dos 8 a 11 dias que durava essa bufonada, que acontecia em geral em dezembro,continuando a tradição das festas Fesceninas, o famoso Carnaval romano. Assim que entravam nesse lugar de reunião, lá no fundo, perto do altar os esperava o Bispo. Este por sua vez, se despojava de suas vestes e as oferecia ao chefe dos jograis, que por sua vez subia ao púlpito e fazia o sermão, no mesmo modelo do sermão do Bispo, quer dizer, o imitava. Não apenas imitava seus tiques como seus textos, todo seu discurso de fundo, demonstrando assim por um jogo, o jogo de enganos, de hipocrisia, o jogo do poder. E eram tão hábeis em remedar e sobretudo em imitar os modelos de hipocrisia e paternalismo que se conta de São Zeno de Verona- que era até uma boa pessoa- que um jogral o imitou tão bem , que durante seis meses, cada vez que subia ao púlpito para pronunciar seus sermões, não conseguia terminá-los...após as tres primeiras frases, tartamudeava qualquer coisa e ia se embora. É que sempre começava:


    "Meus queridos fiéis, eu, humilde pastor, vos trag..." E todos danavam a rir, rir e parafrasear:     "O cordeirinho... " Bée...." E o pobre diabo do santo tinha que abandonar o púlpito.

        ( diapositivo) Aqui temos mais um diapositivo de época, no qual vemos dois personagens. São dois MILITES. É a reprodução de um mosaico que se encontra em Santo Ambrósio de Milão, fazendo parte do mosaico do chão da igreja e nem eu mesmo quando aí estive copiando relevos como estudante de arquitetura, pois bem, nem eu mesmo havia percebido esse maravilhoso pedaço de mosaico. São dos jograis disfarçados de milites o que se percebe logo pela teatralização dos gestos. Se metiam bastante vêzes com os milites, pois eram os mais odiados pelo povo. Aos milites pertenciam esses profissionais da ordem estabelecida, que hoje chamamos de chefes de polícia, delegados ou comissàrios. Se, com um pouco de fantasia, tirardes deles a roupagem medieval e os cobrirdes com roupas modernas, vereis que têm sempre as mesmas expressões tão significativas. À vossa esquerda vê-se uma construção. Pois bem: ela não faz parte do cenário. Com efeito toda nossa cena se inscreve no arco. Por quê digo isso?


Porque, evidentemente, a construção fora do arco se compõe de vários andares: 4, 5, seis andares. Outra, pois bem, temos comprovado após muita pesquisa e exames históricos que na Idade Média os Comissariados de Polícia tinham apenas 1 andar . Era para evitar a dipsonomia, uma doença habitual entre comissários de polícia- que pode ser descrita como aquela facilidade que começam a ter, durante os interrogatórios, de enganar-se com a sinalização. Gesticulam tanto, batem tanto com as mãos que a esquerda se converte em direita, a direita em esquerda e aí dizem finalmente:      " Pode sair.... Saia por esta porta...." e nos indicam a janela... Isso ocorreu muitas e muitas vêzes... na Idade Média, claro. Imagina uma saida de cena de seis andares... Por falar em zombar de coisas sérias, dramáticas, ontem um companheiro meu, um advogado, me escreveu para dizer-me que essas alusões a feitos ocorridos recentemente, que acabam em uma grande gargalhada, lhe haviam feito mal. Bem, era exatamente o que pretendíamos: fazer compreender o que permite e permitia ( está na tradição dos jograis ) ao ator do povo arranhar as consciências e deixar um gosto amargo ou ardendo. Toda alusão afogueiras é mero acaso. Se me limitasse a contar ultrages, empregando a chave "trágica" a partir de uma postura retórica ou melancólica, ou dramática ( a tradicional, para que nos entendamos...) resvalaria como a água nas penas dos patos. s em deixar rastro algum. Permití-me este a parte porque geralmente me voltam com esse discurso irritado de que não se deve rir de coisas tão sérias. Mas, foi precisamente o povo que nos deu a lição... Recordemos, a propósito do povo, o que diz Mao Tse Tung sobre a sátira.


Diz ele que ela é a arma mias eficaz que o povo jamais teve em suas mãos para compreender por si mesmo, dentro de sua própria cultura, todas as traquinarias e sacanagens dos senhores.

Seguindo com os diapositivos, esta imagem nos mostra outra representação sacra, desta vez dramática e grotesca ao mesmo tempo. É uma representação em Flandres, lá por 1300. A data está indicada no desenho. Observem com atenção essa mulher aqui com um carneirinho nos braços. Estou indicando isso pois tem a ver com auma parte da representaçào de A matança dos Inocentes Prossigamos. Aqui outra imagem bastante importante, e é Antuérpia em 1465, justo um ano antes do Edito de Toledo. ( foto 5) Esse Edito de Toledo proibiu de maneira definitiva que o povo representasse so msitérios bufos. Vocês já compreendem , só de ver a imagem, o motivo disso tudo. Vejam bem. Aqui está Jesucristo, um ator que representa Jesucristo, aqui dois guardas. Aqui está um pregador, certamente outro ator, e o povo abaixo está contestando a réplica do pregador. E que diz o pregador? Grita:      " A quem quereis na cruz? A Cristo ou Barrabás???" E lá embaixo todo o povo protesta, gritando:      " A Jean Gloughert!! "  Que era o Prefeito da cidade.... Compreende-se que tal ironia, pouco elevada e direta demais, não haveria de agradar ao Prefeito nem a seus amigos, que deram tratos à bola e começaram a pensar:


     " Não seria melhor proibílos????"

Uma representação deste estilo, ou até um pouquinho mais violenta, se quisermos, é essa .        (diapositivo 6 ) É Paris e estamos na Praça do Louvre e é mais ou menso a mesma época da anterior. Agora reparem nesse teatrinho há uma ator que reperesenta Jesucristo e outros atores. Aqui está Pôncio Pilatos com a bacia preparada para lavar as mãos e qaui vemos dois bispos. Olhem bem e verão dois bispos católicos. Deveriam no mínimo andar de roupas hebráicas, não? Com elementos bem diferentes: chapéus redondos, adornos, tranças nos cabelos de um lado e de outro, roupas de outra época, bem distinta, que qualquer um conhece. E no entanto, o povo, fazendo de conta que não entende de figurino, colocou aí dois bispos inteirinhos, quase autênticos, dessa região mesmo..... Como que dizendo: "" Tá certo, isso aconteceu na Palestina, ainda não havia cristãos, tudo bem, todo mundo era judeu, por isso não tem nada aver, esses aí eram bispos judeus, claro, sobretudo isso: eram de outra religião e outra realidade. Certo, certo... mas continuam sendo bispos os que insistiram para que jesus terminasse na cruz.... Ou alguém tem ainda dúvida que sempre, em todos os tempos, em todas as religiões, em todos os lugares, os bispos estejam do lado dos senhores para crucificar aos pobres desgraçados como Cristo?!!!!"


E como é natural, esse tipo de discurso não agradava muito aos Bispos e aos cardeais e menos ainda ao Papa, de modo que decidiram reunir-se em Toledo, onde disseram:       " Basta! Não podemos permitir que o povo aproveite desse lazer cênico que parte do sagrado, para achincalhar o sagrado " E foi assim que proibiram não só que se tomasse como pretexto os Evangelhos, como toda a Bíblia. Para se ter uma idéia, tenho aqui um jogral que instrumentaliza os relatos bíblicos. É a representação da famosa Bebedeira de David ( diapositivo 7)

A Bíblia conta que David tomou um pileque tão descomunal que a ressaca durou sete dias.   Durante essa bebedeira se meteu com todomundo: insultou seu pai, sua mãe, a Deus, mas sobretudo atacou seus súditos, ou seja, o povo. Dizia mais ou menos isso:      "meu povo estúpido, desgraçado e come-bosta, por quê crêem nessas histórias? E o jogral retomava o personagem em registro grotesco, gritando para o público:      "Vocês acreditam de verdade que o Altíssimo tenha baixado à terra com todos seus trecos e disse:


bem, basta de discutir a divisão dos bens e das terras pois eu vou dar um jeito nisso. Vamos ver, você aí, venha aqui, é voce aí de barba, me agrada muito, toma essa coroa pois serás o Rei... É tua mulher mesmo essa aí? Hum! Então és a Rainha. Isso, você com essa beiçola de negro: serás um bom imperador....Esse aí com uma cara esbranquiçada de candelabro , vem, vem, serás meu bispo! Esse aqui só dá para mercador...Mercador serás... Tás olhando quanto espaço existe? Vamos tomar conta de tudo, te dou a terra até a beira do rio...e não a deixes por nada, não dê nem empreste a ninguém...Terra a gente segura...Para vocë todo o litoral...Ah és parente do outro? Que bom, fica tudo em família!... Voce também é da família?! Meu deus como procriam esses camponeses...Fica com o direito da pesca. ...Terra e mar acabou....Primo segundo do bIspo cara de vela? Tá bom, tá bom fica com o Jus primae noctis , a primeira noite de todas as vassalas do reino será tua por direito divino. Foda - as bastante! Ah peraí, vocês são uns míseros depauperados. Você, você e Você. Você também e aquele ali mais suas mulheres gatos, cachorros , prole e papagaios...vocês


trabalharão para ele, para ele e para ele. E se houver queixas mando todos para o fundo da panela no trinco dos infernos, ou não me chamo deus...que eu sou deus, por deus! " Esse tipo de representação não soía nada agradável aos que possuiam o verdadeiro poder e foi assim quie se decidiu, ou melhor os bispos decidiram que se um jogral se metesse de novo a interpretar semelhantes baixarias no meio do povo, ali mesmo seria queimado vivo. `Para se ver como às vêzes um ator faz um papel e não sabe mais sair dele - causando grandes prejuizos piscológicos a si mesmo, lembro a respeito dessa proibição o caso de Willian Hans Holden ( foto 8) , famoso jogral alemão, habilíssimo ator na cena da bebedeira de David. Pois bem, ele resolveu atuar após o Edito . Vieram os tiras o pegaram e levaram para a fogueira. No meio do caminho, o pobre ator pensava que os Bispos o ameaçavam de mentirinha, só para assustar, ou mesmo de brincadeira- apesar de um pouco de mau gosto. E lá se foi ele se vangloriamndo e rindo:      " Oh vão me levar para a fogueira!!! Ôba, vão me fazer de frango assado! Etc..." ( Não, não, FRANGO não tinha na Idade Média a conotação que tem hoje quando nos referimos a um ator...) É que o pobre David se equivovou como nunca, pois Bispos nunca brincam e levam tudo muito à sério. E com toda a simplicidade, tocaram fogo nele.

Última lição dos Mistérios é que, apesar de não terem TV, rádio e essa parafernália toda, já haviam inventado um modo de fazer uma boa campanha publicitária dos espetáculos sacros.


Ainda hoje acontece nos grandes santuários religiosos e sobretudo na Apúlia, na festa de São Nicolau de Bari - que foi um Bispo famoso que veio do Oriente e era bem negro.... Basicamente se faz um desfile enorme de povo, com umas cartelas de papelão escritas, servindo para indicar as cenas que seriam representadas nessa mesma noite. Certamente era uma propaganda religiosa, pois atrás- para dar um efeito espetacular à propaganda - vinham os "açoitados", isso é uma ruma de flagelantes e flagelados, que enquanto avançavam se davam tremendas porradas., varadas, chicotadas. Os apenas flagelantes eram os que sofriam mais, pois além de sentir também - misticamente, claro -a dor dos outros, eram acometidos de terríveis ataques de piedade, solidão e fossa. Coisa terrível.... ...Mas religiosa, claro, de alto teor religioso. Depois de arrodear as praças, o desfile publicitário arrodeava o palco aonde ia se desenrolar a representação e dali sublinhavam, indicavam, pontuavam cantando, gritando, lamentando e até respirando em coro, os tempos dramáticos da representação. Insisto nesse detalhe porque de quando em vez , vocês ouvirão- em minhas exibições - umas indicações em forma de canto coral. O canto, mais ou menos, era esse, por exemplo:

LOA DOS AÇOITADOS ( versão para quadra em oitão)

Ai ai açoitai, açoitái ai ai yê yê yê yê ô yê yê yê yê ô yê yê yê yê ô yê yê yê yê ô


Ai ai açoitai, açoitái ai ai

formai companheiros uá longa fila baixai esse pau, baixai à vontade sangrai abundante vossa abundança mas rípai também por sobre a sustança pelados ficai, pirús à amostra, baixai o cacête... oh não esse aí abri muitas chagas, ui ui ai ái ai em troca do céu, aguenta essa bostra

Ai ai açoitai, açoitái ai ai yê yê yê yê ô yê yê yê yê ô yê yê yê yê ô yê yê yê yê ô Ai ai açoitai, açoitái ai ai

      jesus, cristo e deus, sem jaça ou pecado também bom jesus foi todo açoitado meteram-lhe a vara, tacaram o pau fuderam-lhe o pobre, e muito, Uáu! fizeram um bagaço, pobre coitado! A todos assim poude Ele salvar


apanhando à beça mas sem chorar que a vida é do Cão e o Cão é danado...

Ai ai açoitai, açoitái ai ai yê yê yê yê ô yê yê yê yê ô yê yê yê yê ô yê yê yê yê ô Ai ai açoitai, açoitái ai a

( NO ORIGINAL) Ai ai açoitai, açoita-vos, eyayeye! Companheiros formai uma fileira açoitai-vos forte e com gana não vos queixeis dessas pancadas, açoitai não temais ficar pelados não temais chicotes que abrem chagas em carnes rotas e amassadas ayay açoitai, açoita-vos Eyayeye!  o que queira salvação que se açoite e se ranja que se estale bem o couro nada de golpes simular, açoitai


que ao senhor onipotente lhe bateram duramente ayay açoitai,açoitai-vos Eyayeye! Se quereis fazer penitência e expiar a enorme sentença que está próxima, a chegar e ninguém pode evitar: açoitai pois sobre nós cairá ai açoitemos em pesar ayay açoitai, açoitai-vos Eyayeye! Para salvarnos do pecado Jesuscristo foi açoitado e na cruz ele foi pregado e na cara foi humilhado: açoitai-vos! E vinagre lhe deram a beber e são Pedro nada de aparecer Ayai açoitai, açoita-vos Eiayeye! E vos, senhores da usura vós tendes a desventura fostes que lhe cuspistes ao rosto prosperando com tal artifício: açoita-vos vós chupais como uvas a poupança dos que suam


Ai ai açoitai, açoita-vos, eya ye ye! Há alguns anos se organizou perto de Milão, na abadia de Claraval, uma extraordinária exposição de máquinas teatrais. Havia estátuas maravilhosas com todos os membros móveis, articulados, exatamente como as marionetes ou as bonecas. O movimento se regulava mediante uma série de alavancas e ganchos manobrados por um tiriteiro oculto dentro do oco da estátua, que não era completa, pois apenas tinha a parte dianteira. Havia or exemplo uma preciosa virgem com o menino Jesus, do ano 1100, e ambos personagens moviam braços, tronco, cotovelos e até os olhos, produzindo o truque inventado pelos tiriteiros flamengos, conhecido como le déséquilibre, ou simplesmente, o desequilíbrio. Era um belo efeito. Por exemplo, no antebraço: alavancando-o com uma dobradiça articulada dentro da mão fazia-a girar por sobre a munheca, antes de voltar à posição normal, como se estivesse desequilibrada ou meio bêbada. Qualquier golpezinho com a mào ou outra parte do corpo fazia com que as mãos dos bonecos se movessem com extraordinária graça e leveza, girando por sobre a munheca, dando a expressão de algo vivo e gracioso. Mais tarde conhecido exatamente como "desmunhecar". Ator que desmunheca, não tem pois historica e medievalmente falando nada a ver com a graça feminina, mas com a graça das bonecas. Daí também serem conhecidos por este nome.... Segundo o mesmo princípio de alavancas, engrenagens e dobradiças engenhosas foi construida uma peça magnifíca, o Cristo de Aquiléia... O que não se entende é porque anda todo vestido de alto a baixo, com o corpo todo coberto, uma vez que tudo nele é articulado, até mesmo o já aqui, e nele, enormemente famoso Ciullo!!!!    Por quê o povo recorria a essas máquinas para representar a divindade?


( continua )


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