´ Diplomatica
Nº10 MAIO/AGOSTO 2011 4 (Cont.)
business & diplomacy
Diplomática 10 • maio a Agosto 2011
José Eduardo dos Santos
Angola 35 Anos Em destaque: Jorge Braga de Macedo Reflexos do Maio 68 Primeiras Damas de Portugal Mário Lúcio Sousa José Marcos Barrica - Embaixador de Angola
With English & French Texts
1 • Diplomática - Junho/Julho 2008
Nota do Editor
Editor's note
O Silêncio do mundo
Desejaram matá-lo porque sonhava e pregava uma forma muito diferente de viver. O “sacrilégio” daquele jovem que se atrevia a dizer que éramos todos irmãos não convinha nada à civilização dominante. Jesus foi crucificado. O Santuário de Fátima nunca teve tantos peregrinos como neste Maio de 2011. No altar do mundo pedíamos paz enquanto um país do oriente era bombardeado sem dó nem piedade por interesses que a maioria desconhece. E há 2011 anos Jesus foi crucificado e os cristãos perseguidos. Fátima também se chamava a filha de Maomé. Entre a multidão, no cimo daquele andor repleto de flores, a Senhora de Fátima, rainha de Portugal, vestida em trajes do Oriente, era para nós a mãe de Jesus e a nossa mãe. Tal como o apóstolo universal, recentemente beatificado, Papa João Paulo II, todos nós pedíamos-lhe paz! Confirmaram-se as profecias, mas a falta de estrutura moral comanda os dias de hoje. Com esta política de olho por olho… alguém dizia que acabaremos todos cegos… Mais do que nunca a missão do diplomata torna-se de uma importância extrema porque o verdadeiro diplomata deverá ser um mensageiro do entendimento. A guerra nasce de ambições e injustiças quando a diplomacia falha…
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. mariabraganca@gabinete1.pt
The silence of the world They wished to kill Him because he dreamt and preached a different way to live. The “sacrilege” of that young man that dared to say that we were all brothers was less than appealing to the dominant civilization. Jesus was crucified. The Sanctuary of Fátima never had so many pilgrims as it did this May of 2011. In the altar of the world people prayed for peace whilst at the same time a country back east, for reasons unknown to most, was being mercilessly bombed. 2011 years ago Jesus was crucified and all Christians were persecuted. Fatima also was the name of Muhammad’s daughter. Amongst the crowds, on top of a palanquin filled with flowers, the Lady of Fátima, queen of Portugal, dressed in oriental robes, presented Herself as the mother of Jesus and our mother. Just like the universal apostle, the recently beatified Pope John Paul II, everyone was praying for peace! The prophecies were confirmed, but the absence of moral structure is still in charge in our days. With this policy of an eye for an eye… somebody said that we’ll end up all blind… More than ever the mission of the diplomat becomes one of extreme importance, since the true diplomat must be a messenger of understanding. War is born out of ambition and injustice precisely when diplomacy fails…
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Assuntos Summary
Carta ao leitor. Letter to the reader.
4
Dossier. Angola – 35 anos, cinco décadas de esperança. Da utopia ao desenvolvimento. Dossier. Angola – 35 years, five decades of hope. From utopia to the economic development.
7
A força das efemérides em Angola . Rescaldo dos 35 anos de independência. The power of the ephemeris in Angola. The aftermath of 35 years of independence.
21
Entrevista a José Marcos Barrica. Embaixador de Angola em Portugal. Interview with José Marcos Barrica. Angola Ambassador to Portugal.
23
Empresa portuguesa na vanguarda do desenvolvimento. Conduril aposta na formação em Angola. A Portuguese company at the forefront of development. Conduril focus on training in Angola.
30
Entrevista a Jorge Tropa, Director Geral da Siemens Angola Interview with Jorge Tropa, Siemens Angola CEO.
34
Entrevista a Miguel Vieira, Director Geral da Elite Angolan Careers Interview with Miguel Vieira, Elite Angolan Careers CEO.
38
Memória. Maio, tempos de utopia. Memory. May and the times of utopia.
40
O mundo está a mudar: Ali Kaya Savut. Embaixador da Turquia em Portugal, Norbert Konkol. Embaixador da Hungria em Portugal e Valeriu Turea. Embaixador da Moldávia em Portugal The world is changing: Ali Kaya Savut. Turkey Ambassador to Portugal, Norbert Konkol. Hungary Ambassador to Portugal e Valeriu Turea. Moldavia Ambassador to Portugal
44
Jorge Braga de Macedo. Presidente do Instituto de Investigação Científica Tropical. Jorge Braga de Macedo. President, Institute of Tropical Research.
50
A crise financeira – uma perspectiva. The financial crisis – an overview.
56
"Troika" traçou diagnóstico do país e estabelece compromisso para empréstimo de 78 mil milhões. "Troika" drew diagnosis of the country and establishes commitment to loan 78 billion.
63
Fernando Mendes, Administrador-delegado da Legrand. Uma viagem ao futuro. Fernando Mendes, Legrand Managing director. A journey into the future.
64
Quinta da Aveleda: o prazer de um encontro. Sinta o momento. E deixe o tempo parar. Quinta da Aveleda: the pleasure of a meeting. Feel the moment. And let time stand still.
67
Turismo em Angola. Clima de paz e desenvolvimento propiciou aumento da procura. Tourism in Angola. Climate of peace and development led to increased demand.
70
Crónica de uma visita. Roderick Micallef, director geral do Corinthia Hotel Lisbon. Chronicle of a visit. Roderick Micallef, Corinthia Hotel Lisbon CEO.
74
As Primeiras Damas de Belém. Memórias e confissões das mulheres dos Presidentes da República em democracia retratadas em livro apresentado no Jardim da Cascata, no palácio de Belém. The First Ladies of Belém. Memories and confessions from the ex-Presidents of the Portuguese Republic portrayed in a book presented at the Jardim da Cascata, in the Belém Palace.
78
Mala Diplomática. Dia Nacional do Paquistão. Diplomatic pouch. Pakistan National Day.
81
Mala Diplomática. Dia Nacional da Sérvia. Festa em ambiente…clássico. Diplomatic pouch. Serbia National Day. A very classic party.
83
Soroptimist International. Mulheres solidárias despertam consciências. Soroptimist International. Supportive women awaken consciences.
84
Mário Lúcio de Sousa. O Ministro artista. Mário Lúcio de Sousa. The minister-artist.
86
Portugal-Tailândia: uma aliança com 500 anos. Portugal-Thailand: a 500 years alliance.
88
Livros. “ Compreender + África”, Rui Moreira de Carvalho. “A Rainha Vitória” de Jacques Langlade. “A Primavera do Rei Cosroe: Vinte Séculos de Civilização Iraniana”, Pedro Citati. Books. “ Compreender + África”, Rui Moreira de Carvalho. “A Rainha Vitória” de Jacques Langlade. “A Primavera do Rei Cosroe: Vinte Séculos de Civilização Iraniana”, Pedro Citati.
91
Traduções. Translations.
95
DIRECTOR: Maria da Luz de Bragança PRODUÇÃO: César Soares PROPRIEDADE: Maria da Luz de Bragança EDIÇÃO: Gabinete 1 Editor nº 211 326. Av. Engº Duarte Pacheco, nº1 - 4º Esq. – 1070-100 Lisboa. Marketing & Publicidade: Gabinete 1 - e-mail:gabinete1@gabinete1.pt Tel.: 21 322 46 60 a 76 Fax: 21 322 46 79 IMPRESSÃO: Madeira & Madeira, S.A. DISTRIBUIÇÃO: Logista - Alcochete - Telefone: 21 926 78 00 Fax: 21 926 78 45 ISSN 1647-0060 – Depósito Legal nº 276750/08 – Publicação registada na Direcção Geral da Comunicação Social com o nº 125395
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Dossier - Angola
Angola – 35 anos, cinco décadas de esperança Da utopia ao desenvolvimento
De país aparentemente ingovernável – como assim era visto há 20 anos – Angola revela-se nação de futuro e grande potência económica de África e do Mundo. Estado independente há 35 anos – desde 11 de Novembro de 1975 –, aqui se faz o retrato de cinco décadas de esperança de um povo que continua a sua marcha imparável de libertação
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Angola – 35 anos, cinco décadas de esperança
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O sonho angolano, iniciado na longínqua década de cinquenta, pa-
rece agora, nesta segunda década do novo milénio, arrastar a utopia da libertação política para os terrenos da libertação económica e do desenvolvimento. A figura de estilo do gigante que desperta aplica-se legitimamente a esta década e, mais ainda, projecta-se para além desta afirmando Angola como nova potência emergente do século XXI. E este sonho, sendo angolano, é lufada de ar fresco contra essa visão trágica – as mais das vezes preconceituosa – que procura apresentar o continente africano como uma impossibilidade. Nesse sentido, Angola dá um sinal claro de uma África que começa a despertar das malhas apertadas do colonialismo e do fatalismo. A Angola moderna que agora se afirma é indissociável da figura de José Eduardo dos Santos, para muitos o grande obreiro da consolidação democrática e do crescimento económico, cuja visão de futuro começa a ser reconhecida e respeitada, pese a discrição da sua personalidade, pouco dada a exuberâncias, e algumas deturpações do seu papel na Angola da modernidade. A luta de libertação nacional Em 1956, com a fundação do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), resultado da fusão de vários grupos políticos que contestavam o colonialismo português, inicia-se a epopeia de um povo em marcha pela sua libertação e dignidade. Depositário de várias gerações do nacionalismo angolano, o MPLA conta, no seu surgimento, com figuras gratas da intelectualidade africana, de estudantes no exterior – que pululavam em particular na Casa dos Estudantes do Império, em Lisboa –, e combatentes contra o colonialismo obrigados ao exílio por um regime deslocado do tempo e estanque aos ventos da História. Sob a direcção de Agostinho Neto, médico, poeta e intelectual prestigiado a nível internacional, que assume a presidência do movimento; e com Viriato da Cruz, nome grande da poesia lusófona, como secretário-geral, o MPLA empreende no final dos anos cinquenta intensa actividade clandestina em Angola e Portugal, e começa a desenvolver uma inteligente estratégia diplomática, levando os seus dirigentes às principais capitais mundiais, capitalizando apoios estratégicos fundamentais à sua acção política. A esta nova vertente do trabalho político, não é alheia a eleição de Lúcio Lara como secretário-geral, após a saída de Viriato da Cruz, em 1961,resultante das divergências que assolavam o universo comunista, nomeadamente por via da polémica estabelecida entre a então União Soviética de Brejnev e a emergente República Popular da China de Mao Zedong. Pouco antes, um outro movimento, dirigido por Holden Roberto, a Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA) havia iniciado acções armadas, e embora tenha sido tentado um acordo com vista à unificação, MPLA e FNLA mantiveram-se afastados de qualquer acção concertada, inviabilizando a unidade dos nacionalistas em torno de um objectivo comum. Em 1966 surge um outro movimento: a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) – dirigida por Jonas Savimbi
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Dossier
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Angola – 35 anos, cinco décadas de esperança Luanda - capital política e pólo de desenvolvimento
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Dossier
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Angola – 35 anos, cinco décadas de esperança Encontro de homólogos
Relações com Portugal, passados os contragimentos de uma guerra colonial que antagonizou dois povos irmãos – por força da estreiteza devisão da ditatura de salazarista –, estão no seu melhor momento. Muito por força da empatia e amizade que liga os dois presidentes.
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Dossier
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– que, segundo alguns – mas sem ter sido, até hoje, ancorado em
qualquer prova material – teria sido inspiração da polícia política da ditadura portuguesa. À divisão dos nacionalistas, no seu conjunto, acrescem as dissensões internas do MPLA, inauguradas pela saída de Viriato da Cruz que se exila voluntariamente na China – onde falece precocemente em circunstâncias nunca esclarecidas. Mas a crise mais grave ocorre em 1970 por via da constituição de duas facções divergentes da linha de orientação de Agostinho Neto, nomeadamente, a “Revolta Activa”, encabeçada por Mário Pinto Leite de Andrade, e a “Revolta do Leste” (ou facção Chipenda) sob inspiração de Daniel Chipenda. Só quatro anos depois, em encontro realizado na Zâmbia, a divisão bicéfala é superada, pese embora ter originado expulsões e saídas voluntárias de militantes, deixando marcas profundas no movimento, sem no entanto obstar à ascensão da influência que se registou daí para a frente. No rescaldo da luta de libertação nacional, por eclosão do movimento dos capitães em Portugal que levou ao golpe de Estado militar do 25 de Abril de 1974, o então presidente do MPLA, António Agustinho Neto, proclamou perante a África e o mundo a independência do país, sem que no entanto os três movimentos se entendessem com vista à governação da nova nação. O MPLA, no entanto, detentor de maior apoio das populações, particularmente das urbanas, desde então tem vindo, nos últimos anos através de sufrágio popular, a governar o país concitando o apoio e a legitimidade avalizadas pela comunidade internacional. Os anos de fogo Os tempos não foram fáceis para o novo poder, a mãos com a guerra civil que, numa primeira fase, cercou a cidade de Luanda e, posteriormente, se entrincheirou a norte do país por acção da UNITA que, ao mesmo tempo, capitalizou apoios de potências ocidentais, da então racista África do Sul e da China; e maleável às pressões resultantes da guerra fria que opunham as duas grandes superpotências (EUA e URSS), o MPLA teve ainda de se haver com uma tentativa de golpe de Estado, perpetrada por Nito Alves, e debelada com a ajuda das tropas cubanas que, entretanto, já se encontravam no país. No rescaldo da tentativa de golpe e das purgas subsequentes que, segundo se pensa, provocaram milhares de vítimas entre os contundentes, o MPLA – muito por responsabilidade das potências ocidentais - ensaia uma aproximação a Moscovo, na altura aliado do regime juntamente com os países do leste europeu e Cuba. Nessa linha de aproximação, o partido do poder passa a chamar-se MPLA – Partido do Trabalho, enfatizando a matriz marxista-leninista. Até ao início da década de 90, particularmente até 1991 – com a abertura política –, o partido mantém-se no poder sem eleições democráticas, espelho de um tempo e de uma época onde a exacerbação da ideologia, promovida e instigada pelas superpotências, quedou o desenvolvimento e amarrou os dirigentes angolanos a um projecto que – não sendo o seu – os tornou reféns de jogos geoestratégicos. Em 1992 o país vive tempos de euforia, a abertura democrática coloca o debate político no centro da vida angolana e as primeiras
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Angola – 35 anos, cinco décadas de esperança Construindo um país
Acordos de Lusaka - na senda da criação do Estado Angolano, 1974
Acto de tomada de posse no primeiro mandato de José Eduardo dos Santos, 1979
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Dossier
Cimeira dos Líderes Angolanos em Nakuru - 1975
Eleições Gerais Multipartidarias em Angola 1992
Chegada de Agostinho Neto a Lunda, 1974
Cimeira realizada em Gbadolite, Zaíre, juntou 18 Chefes de Estado africanos foram várias as tentativas para a Paz, 1989
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Angola – 35 anos, cinco décadas de esperança
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eleições livres pareciam anunciar um novo ciclo para a fustigada
nação. Nas eleições legislativas, o MPLA, apesar de estar há vários no poder, é incontestado vencedor e, nas presidenciais, José Eduardo dos Santos fica à frente de Jonas Savimbi, mas não consegue maioria absoluta que lhe permita evitar segunda volta. Savimbi não aceita o resultado e, apesar de as eleições serem consideradas justas pelos observadores internacionais, desencadeia a segunda guerra civil, que só chega ao fim após uma década, após a morte em combate do líder do “galo negro” – nome pelo qual a UNITA também é conhecida, numa alusão à simbologia da organização. Consolidação democrática O ano de 2002 repõe a esperança frustrada uma década atrás. Os acordos de Luena, realizados no início de Abril, registam a assinatura de um tratado de paz entre os beligerantes: o Governo legítimo de Angola e a direcção da UNITA que, fragilizada e decapitada do líder, abandona a luta armada e decide integrar-se numa sociedade que, já então, começara a dar passos seguros na senda de um Estado de Direito democrático. As eleições, realizadas seis anos depois – a 5 de Setembro de 2008 –, ocorrem de acordo com o que se espera ser uma consulta democrática. Consideradas livres e justas pela comunidade internacional, dão esmagadora vitória ao MPLA: 82 por cento dos eleitores votam no partido liderado por José Eduardo dos Santos. A UNITA, surpreendentemente contrariando a previsão da maioria dos observadores, fica-se pelos 10 pontos percentuais. Um desaire que enfatiza uma possível leitura: cansado da guerra, o povo de Angola optou por apostar na continuidade, penalizando um partido que durante décadas rejeitou a via da luta política democrática. Obreiro da paz e do progresso José Eduardo dos Santos, presidente da República de Angola, desde 21 de Setembro de 1979, sucedeu a Agostinho Neto, pouco antes falecido em Moscovo por razões de saúde. À época, este engenheiro de petróleos era praticamente desconhecido, porém uma esperança da nova geração de quadros nascidos com a luta de libertação. E foi no estrangeiro, corria o início da década de 60, que Santos centra o essencial da actividade política no quadro da Juventude do MPLA, de que foi um dos fundadores. Anos depois, entre 1970 e 74, é um dos responsáveis pelos Serviços de Telecomunicações do MPLA, em Cabinda. A independência empurra Eduardo dos Santos para os mais altos cargos no partido. É eleito para o Bureau Político do MPLA, coordena as relações exteriores do movimento e o Departamento de Saúde. A morte de Neto abre-lhe as portas para o mais alto cargo da nação, sob a influência dos históricos do partido que viam no seu nome uma via de oportunidade para a renovação. Aos poucos vai-se afirmando com voz própria, sacudindo o “manto protector” dos históricos e afirmando-se na cena internacional. A queda do Muro de Berlim, o fim da guerra fria e o desmantelamento do bloco soviético – amigo tradicional do MPLA –, impelem este homem determinado e de rara inteligência ao entendimento dos novos
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Dossier
Acordos de Bicesse abriram horizonte de esperanรงa, 1990
Encontro dos Estados maiores das FAPLA e FALA - foram vรกrios os esforรงos para a Paz
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Angola – 35 anos, cinco décadas de esperança Influência e prestígio internacional
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Dossier
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Angola – 35 anos, cinco décadas de esperança
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ventos da História, empreendendo autêntica cruzada de pacificação
do país e de construção de um regime democrático moderno. Os resultados esmagadores das vitórias eleitorais do MPLA relevam a importância política do caminho trilhado pelo presidente, fazendo dele o político angolano com maior prestígio internacional, pesem embora as insinuações, as brumas e incompreensões… Mas um mérito não lhe poderá ser furtado: a paz em Angola e a construção da democracia devem-se, em primeiro lugar, à determinação, perspicácia e ousadia de José Eduardo dos Santos que, ao que se diz, prepara as condições para a retirada do Palácio Presidencial à Cidade Alta, dando a vez e a voz à nova geração de políticos caldeados na democracia. Na senda do desenvolvimento Angola é, hoje, um dos países do mundo com maior crescimento, mas, paralelamente, assinala baixo índice de desenvolvimento humano. É, aparentemente, uma contradição incompreensível. Mas, anos de experimentação social, décadas de instabilidade e de guerra não permitiram construir rumos de desenvolvimento sustentados, elevando a qualidade de vida material, cultural e intelectual de um povo que – reflexo da guerra civil prolongada – invadiu as cidades, particularmente Luanda, trazendo por arrasto uma malha urbana caótica e gravíssimos problemas sociais, dos quais o maior é o desemprego. Mas, consolidada a batalha do crescimento económico, Angola começa a dar os primeiros passos no desenvolvimento social, de que é expressão maior o esforço governamental com a Educação, a Cultura e a Formação – trilogia fundamental para o progresso que todos os angolanos almejam. Beneficiando de uma década de paz social e de consolidação democrática, Angola é um dos países do Mundo mais atraentes para o investimento. A crise económica que varre o planeta, desde 2008, parece não ter beliscado muito os índices de desenvolvimento da economia. A taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) correspondente a esse ano foi, surpreendentemente, de 15,6 por cento. E mesmo o abrandamento do ritmo de crescimento, resultante da crise internacional, situou-o nos seis por cento – quando todos os indicadores apontavam para uma descida mais acentuada. As novas políticas, incrementadas pelo Governo, têm conseguido aguentar a economia e levado investimento para Angola, através de incentivos à iniciativa privada, contrariando a clássica dependência das receitas petrolíferas, retomando paulatina e segura aproximação ao boom de crescimento verificado entre 2002 e 2008 – os anos de glória do milagre económico angolano. A juventude da população é, de igual modo, uma grande mais-valia para o desenvolvimento do país, aliada, como já se disse, ao investimento havido na formação profissional e na meritocracia. Por outro lado, a criação de infra-estruturas, nomeadamente transportes e comunicações – outra das apostas do governo –, torna Angola um país mais apetecível e um garante de investimento seguro para quem se mova por critérios empresariais a prazo. Porque quem espera fazer fortuna fácil, para as “empresas toca e foge”, o melhor é irem bater a outra porta…
n
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Dossier - Angola
A Força das efemérides em Angola Rescaldo dos 35 anos de independência Das utopias à independência, sucederam-se 35 anos de
e valores patrióticos. A força das nações reside nessa
perseverança e árduo trabalho, contados a partir de 11
alma, que vai passando para novas gerações como he-
de Novembro de 1975, quando Angola soltou do mastro
ranças, à medida que o tempo se esgota para uns e se
a sua bandeira da liberdade conseguida pelo sangue,
apresenta útil para os outros, filhos da mesma nação,
suor, medos e coragem dos intelectuais e emancipalistas
através da cidadania e liberdade democrática.
angolanos, com adesão da “arraia miúda” que no qua-
Essa é a meu ver o resgate da dignidade de um povo,
dro das opções e escolhas, elevou um homem que de
que tem como veículo cultural importante a língua, pre-
entre os militantes da mudança, viria a ser o “líder” desta
sente através do ensino e da educação.
nação criança, que tendo sido criança noutros tempos,
História ao vivo: uma das componentes da celebração
voltou a usar as fraldas do crescimento exponencial e
desta efeméride, é o que os historiadores chamam de
desenvolvimento sustentado. Nem tudo foram rosas e
“história ao vivo”, isto é: os autores e os protagonistas
humanamente falando só o que custa é que reluz.
da nossa independência, de uma ou de outra maneira
Comemorar 35 anos de paz e progresso, significa apos-
falaram das suas lutas e vitórias vividas no sabor da
tar num futuro próspero e seguro, em que a construção
juventude e do pragmatismo para a libertação do país e
e a reconstrução da identidade e do país, não são
consolidação da paz. Além disso, numa extraordinária
tarefas simples nem vãs por se basearem no resgate
pedagogia, de solidariedade regional e mundial, dife-
dos valores perdidos e no desenvolvimento sustentável
rentes países desfilaram lúcidas nos ecrãs de televisão,
encorajado pela solidariedade nacional e internacional
exibindo claramente os modelos das suas convicções e
contemporânea.
experiências. Foram sem sombra de dúvidas as gran-
Tivemos que evoluir para o alcance da paz interna e a
des vedetas da aproximação ao vivo entre o passado e
partir de 2002, o Presidente Engenheiro José Eduardo
o presente.
dos Santos emergiu naturalmente com o epíteto do “ar-
Farol da cultura: é no confronto com a crise mundial,
quitecto da Paz”, assim distinguido pelo entendimento
que o mundo caminha firme para a redução da pobreza
popular.
e das assimetrias sociais gritantes, como factor da cul-
As actuais democracias são uma clara resposta às exi-
tura de solidariedade humana. Criar um “homem novo”
gências da “aldeia global” e é aos políticos que compete
e reduzir as assimetrias da pobreza, eis a questão que
tomar posições iluministas sobre a devida aplicabilidade
pesa na balança da igualdade entre os humanos e os
em diferentes quadrantes do espaço cultural, social e
povos de todas as nações. Por isso, valeu a pena ter-
económico, enquanto instrumentos da história do Ho-
mos celebrado os 35 anos de independência em clima
mem, em que o engajamento de todos é uma exigência
de paz e de esperança num futuro que se avizinha
na produção do acontecimento e dos factos históricos.
breve, por ordem natural da sucessão dos tempos e das
Duas gerações: a da emancipação e mudança, e a do
gerações. Parabéns Angola!
n
desenvolvimento na ciência e tecnologia, iniciados na modernidade com fraca participação do autóctone, ao longo dos 5 séculos de cultura e evangelização. Imbuídos da mesma força anímica na transmissão e aquisição do legado cultural e identitário, estas duas gerações confraternizaram, conscientes da herança e memória histórica e das responsabilidades acrescidas às realizações das civilizações que nos precederam no tempo e no espaço. Hoje integrados nesta nova dimensão humana, social e política, os jovens de há 35 anos, ainda altivos, garbosos e lúcidos, com muito para dar, aos 70, ditando as regras do jogo, como bibliotecas vivas, dos saudosos tempos do sonho e das utopias. Memória colectiva: É inquestionavelmente verdade que todas as nações se alimentam de uma memória colectiva, carregada das mesmas convicções, lembranças
Palmira Tjipilica Professora Universitária
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Diplomacia na 1ª pessoa
José Marcos Barrica
por de Nuno Trinta de Sá, fotos de André Garrido
Embaixador de Angola em Portugal “Portugal tem um espaço reservado no coração de Angola” Vai para dois anos que chefia a Missão Diplomática de Angola em Portugal. O Embaixador José Marcos Barrica, que foi ministro angolano da Juventude e Desportos durante uma década, é benfiquista, não falta à missa dominical e ao passeio com a família, gosta de peixe grelhado e saladas, vinho tinto, visitar o país de norte a sul e ouvir Fado
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José Marcos Barrica
Faz um balanço «positivo» de
vez mais.
A História traz-nos memórias,
21 meses como Embaixador. Quer
A 5 de Junho de 2009, na sua
afectos, coisas mais e menos
«reforçar as relações de coope-
oficialização como chefe da
positivas. Há uma geração
ração e buscar mais espaços de
missão diplomática de Angola
com alguns traumas, rastilhos
intervenção, quer na perspectiva
em Lisboa, teve uma audiência
da guerra colonial. Na relação
governamental, quer na perspecti-
com o Presidente da República
entre os dois países, apesar
va dos diferentes agentes sociais
Portuguesa, Cavaco Silva. Abor-
dos resquícios, o que nos une
que estão nos dois países.»
dou a cooperação bilateral nos
continua a ser superior ao que
Acha que o país que representa
vários domínios (político, eco-
nos divide?
em Lisboa, junto com o Brasil e
nómico, comercial, cultural, so-
Sim, é verdade. Na relação entre
Portugal, integra um «triângulo
cial). Celebram-se os 9 anos da
Angola e Portugal, importa su-
virtuoso» que terá «uma posição
Paz e Reconciliação Nacional,
blinhar que, no actual contexto,
de charneira no desenvolvimento
o 4 de Abril é o pano de fundo.
há mais pontos que nos unem do
➤
da economia da CPLP e, quiçá,
O estreitamento das relações
que aqueles que eventualmente
do Mundo.»
entre os dois países é a sua
nos desunem. Há que agirmos
A entrevista, quando se celebram
grande meta, a sua prioridade
no sentido de reforçar os laços
9 anos do 4 de Abril que ditou a
estratégica a nível diplomático?
atados na base do positivo e
conquista da paz em Angola.
A nossa missão pode ser vista
pelo positivo, embora tenhamos
Que balanço faz destes quase
em duas vertentes fundamentais.
presente o facto de que, entre as
dois anos de trabalho, aqui,
Para além da função clássica
diferentes gerações, subsistirão,
na Avenida da República, em
da diplomacia que consistirá na
aqui e acolá, alguns resquícios de
Lisboa?
busca permanente do estreita-
um passado que teceu clivagens
Primeiro, é um privilégio ser
mento de relações de amizade e
e alimentou preconceitos... É com
Embaixador de Angola num país
cooperação entre o país que re-
grande pesar registar que ainda
como Portugal, pelas relações
presento e o de acolhimento, há,
hoje há quem, movido por interes-
históricas, seculares, que nos
também, toda uma actividade a
ses estranhos aos ventos do pre-
caracterizam. Depois, é a primeira
desenvolver com a própria comu-
sente, acirre ideias passíveis de
vez que desenvolvo a actividade
nidade angolana residente. Mas,
sustentar rancores, complexos...
diplomática como chefe de missão
sim, a nossa missão fundamen-
Mas contenta-nos saber que os
e calhou bem ter sido logo em
tal é, como disse,
Portugal, pois os sacrifícios às
reforçar as relações
N
vezes decorrentes de processos
de cooperação e
Angola e Portugal,
menos expressivos. A
de adaptação nessas circunstân-
buscar mais espa-
importa sublinhar
força que sustenta tais
cias, ficaram minimizados pelo
ços de intervenção
que no actual con-
preconceitos é cada
conhecimento prévio que tinha do
quer na perspectiva
texto, há mais pon-
vez menor, fica diluída
país, assim como pelas relações
governamental, quer
tos que nos unem
nas brumas do tempo.
multifacetadas existentes entre
na perspectiva dos
do que aqueles
As novas gerações, os
os dois países e povos. Estes
diferentes agentes
que eventualmente
novos momentos, as
vinte e tal meses em que estou à
sociais que estão nos
nos desunem
novas acções intencio-
frente da missão diplomática em
dois países; agentes
Portugal têm sido positivos, bons.
tais como os académicos, econó-
e orientadas no sentido de buscar
O trabalho em si tem sido ajudado
micos - neste caso, empresários -,
a aproximação, provam que há,
também pelo clima favorável que
investidores e demais empreende-
de facto, mais pontos unificadores
reina entre Angola e Portugal em
dores que são um grande suporte
do que os susceptíveis à divisão.
vários domínios – político, diplo-
para o desenvolvimento social
Aliás, do ponto de vista histórico,
mático, económico, comercial,
e económico que, estou certo,
sabemos que o complexo colo-
social, científico e cultural. De
todos nós queremos. Precisamos
nizador versus colonizado existe
facto, este relacionamento salutar
de fazer um trabalho conjugado
em todo o Mundo e de uma forma
favorece, facilita o nosso trabalho.
e integral, para que possamos
mais grave noutras culturas,
O nosso desejo é manter este ní-
realizar, no fundo, um sonho que
noutras latitudes. No nosso caso,
vel de relações e melhorá-lo cada
capitalize os dois povos.
felizmente, julgo que esse
24 • Diplomática - maio/agosto 2011
que corporizam essa
a relação entre
legião, são cada vez
nalmente organizadas
➤
Retrato de um cidadão
Universidade, estive em várias outras ‘frentes’, mas destaco a comissão de gestão e reorganização da Universidade em
Antes de ser Embaixador, foi ministro da Juventude
1988/89, etc. Para grande surpresa minha, sou nomeado
e Desportos. Tem 48 anos, é professor universitário,
Ministro (risos). Ministro da Juventude e Desportos.
doutorado em Psicologia Evolutiva e da Educação pela
Cumpri dois mandatos (1999-2002 e 2002-2008). Foi, na-
Universidade de Valência, membro do Comité Central
turalmente, uma experiência muito interessante que ajudou
do MPLA. Foi deputado. Chefiou, em Março de 2008, os
a moldar a minha personalidade como cidadão, homem e
observadores da África Austral nas Eleições Harmoni-
político. Integrei o elenco governativo num momento crucial
zadas do Zimbabué. É um homem dedicado a causas
da História recente de Angola – 1999 um dos momentos
sociais: presidiu a uma ONG angolana, a Kandengues
de recrudescimento da guerra pós-eleitoral. É com grande
Unidos, integra a Comissão Nacional Executiva da Cruz
orgulho que revejo a minha integração e participação numa
Vermelha. Fale-nos um pouco mais de si: da infância,
equipa governativa com uma forte e perspicaz liderança.
da juventude, deste percurso.
Digo e direi sem quaisquer veleidades: uma liderança escla-
Isto de falar de nós mesmos tem a sua complexidade... Ora
recida, paciente e coerente, muito inteligente exercida pelo
bem, eu nasci em Cabinda, a província mais ao norte de
Presidente José Eduardo dos Santos. Só assim se percebe
Angola, num bairro da periferia da cidade capital. Na altura,
que, apesar de tantas e tantas dificuldades e adversidades
chamava-se Povo Cristão; agora, é o Bairro 4 de Fevereiro.
de uma guerra tão inclemente e tão devastadora, Angola
Pertenço a uma família religiosa, católica. Por esta Igreja fui
tenha conseguido algo, eu diria mesmo, miraculoso: a
baptizado, recebi a primeira comunhão, crismado, confir-
indivisibilidade do país, a estabilidade política e social, a
mado e posteriormente casei. Em Cabinda, fiz a instrução
permanente vontade e alegria de viver. Na verdade, com
primária, o ciclo preparatório e o ensino secundário. Julgo
a imensidão do seu território e variedade cultural e étnica
que tive uma infância e uma juventude felizes, embora com
Angola manteve-se e permanece unido na diversidade; a
certas dificuldades, próprias do tempo e da condição social
nação forma-se e consolida-se, e não há do que se ouve fa-
da minha família. Uma família modesta, humilde mas muito
lar noutras paragens, sobretudo, do nosso continente, sobre
laboriosa. Muito cedo, nós os petizes da família, tornámo-
lutas inter-étnicas, inter-tribais. E, passo a passo, de acordo
nos “pau para toda obra”: desde as lides domésticas,
com a nossa realidade e nossa História, a democracia está
auxiliar os trabalhos oficinais do pai carpinteiro, os trabalhos
sendo consolidada rumo à construção de um verdadeiro
nos pomares com o pai, nas lavras com a mãe e irmãs, a
Estado pacificado, moderno, próspero e de justiça social.
escola, a catequese, os jogos, enfim... tempos de apren-
Que nada e ninguém perturbe, jamais, a nossa Paz, tão
dizagem autêntica... Digamos que estou à-vontade para
duramente conquistada.
estar no campo e na cidade, conheço as realidades rural e
Do ponto de vista pessoal, como está a correr a sua
urbana. Infelizmente, a minha descendência não tem essa
adaptação a Portugal?
natural ligação, não têm esse capital.
Bem. Eu já conhecia Portugal antes; por cá vinha passar
Depois, fiz o ensino pré-universitário e universitário no
férias, em missões de trabalho ou em trânsito. Portugal é a
Lubango, sul do país. Em 1986, ano da minha licenciatura,
tal placa giratória. Tem belezas e encantos, tem um povo
tinha 24 anos, fui eleito, a nível nacional, presidente da as-
maravilhoso, acolhedor. A gastronomia diversificada é-nos
sociação de estudantes do ensino superior. Já no secundá-
familiar, tal como a extraordinária variedade de vinhos
rio, criáramos os grupos dinamizadores para o movimento
portugueses. Mas a minha predilecção são os grelhados.
associativo estudantil. Nas diferentes escolas fui desde
Peixe preferencialmente e, apesar disso, prefiro vinho tinto.
delegado de turma, de curso, a de ano. Fundamos também
Quanto à música, gosto de ouvir o Fado - do lado sentimen-
em 1981 a associação dos alunos do ensino médio. Como
tal, da saudade, da meditação desta música típica. Rotina?
entrei na política? Às vezes não sabemos exactamente
A nossa missão impõe um ritmo intenso, sobretudo numa
quando caímos nas malhas da política [risos].
praça político-diplomática como esta. Mas há espaço, tem
Mas interpreto que o embrião da política partidária remonta
de haver, para a família. Aos Domingos a primeira activi-
dos tempos da organização de pioneiros e do movimento
dade é o tributo ao Senhor. Ir à Missa e, depois, quando
associativo estudantil. Ao longo desse percurso somos soli-
possível, continuar a conhecer mais e melhor os cantos e
citados aqui e acolá, vamos trabalhando de modo animado
recantos naturais e históricos de Portugal; há monumentos
e desinteressado nas escolas por onde se foi estudando...
e sítios fabulosos muitos quais só ouvia falar deles e os co-
e, diga-se, em tudo isto somos observados, embora não
nhecia apenas através da História e Geografia de Portugal
agíssemos para isso... Depois, já em Luanda, sou eleito em
estudadas há já algum tempo. Mas existem outros atrac-
1986 representando a juventude, a deputado à Assembleia
tivos dos tempos modernos que são um deleite. Também
do Povo e posteriormente a membro do Conselho da Repú-
há o desporto, o futebol em especial, as idas ao estádio da
blica - órgão de consulta do Presidente da República. Após
luz…Em resumo, para além da experiência profissional ser
as primeiras eleições legislativas do país em 1992, deputa-
interessante, também a nível pessoal, eu e a minha família
do à Assembleia Nacional. Para além das lides docentes na
sentimo-nos bem neste belo e heróico Portugal.
■
maio/agosto 2011 - Diplomática • 25
José Marcos Barrica
"O nosso desejo é manter este nível de relações e melhorá-lo cada vez mais"
Angola. Estes dossiês continu-
desenvolvidas ou a desenvolver,
am a ter muita relevância, são
incluem não só o esforço interno
as relações entre Angola e Portu-
prioridades imediatas?
do país, mas, também, o apoio de
gal e respectivos cidadãos.
Sim, falamos também disso. O
outros países com os quais An-
Informou Cavaco Silva sobre
processo de reconstrução de
gola tem estabelecidas relações
o processo de reconstrução e
Angola está a acontecer, respei-
de cooperação. E, como sabe, em
construção de infra-estruturas
tando diferentes fases e etapas.
matéria de cooperação com Ango-
económicas e sociais. E falou
Esse processo vai, naturalmente,
la, Portugal se pontifica. O tema
da questão dos vistos de entra-
levar algum tempo mais. Temos
de desenvolvimento económico e
da de cidadãos portugueses em
de admitir que as diversas tarefas
social é actual, está sempre em
➤
fenómeno não tem perturbado,
nem afectado de modo negativo,
26 • Diplomática - maio/agosto 2011
➤
cima da mesa, em conversas
ordinários deixará de estar na
divisão, no geral, artificial, que
com os parceiros, sobretudo os
agenda do dia como preocupação.
permitiu, por exemplo, que uma
estratégicos.
Contudo, também devo referir os
mesma família fosse separada
Quanto à outra questão que co-
inúmeros casos em que as pes-
por uma linha imaginária. É um
locou, importa desde logo referir
soas interessadas não respeitam
aspecto de difícil tratamento, e
que a análise da questão da mo-
os requisitos, as formalidades e
de difícil compreensão por parte
bilidade ou circulação de cidadãos
sobretudo os prazos legalmente
de algumas franjas das nossas
dos nossos países, nos dois sen-
requeridos e, depois, refractando
populações. Há pessoas que,
tidos, é válida tanto para um lado
as suas próprias responsabilida-
devido ao seu nível cultural, não
como para o outro. Isto pressupõe
des e faltas, contestam injusta-
entendem por que razão não
falar da necessidade de estabe-
mente em desabono aos nossos
devem transitar livremente de um
lecimento de mecanismos mais
serviços consulares. Temos feito
lado para outro de uma mesma
flexíveis que, reconhece-se, não
apelos para que os interessados
porção de terra, ou para a aldeia
➤
existiram num passado recente.
colaborem cumprindo as regras,
vizinha... É preciso muita infor-
Comparativamente, o quadro ac-
as normas estabelecidas. As au-
mação, muito diálogo. No caso
tual alterou para o melhor. Foram
toridades angolanas estão atentas
vertente, a principal preocupação
superadas as principais dificulda-
e empenhadas para que sejam ul-
das autoridades angolanas é a
des. Foram instalados modernos
trapassados os constrangimentos
deslocação ilegal de cidadãos de
sistemas tecnológicos que permi-
que persistam neste domínio.
outros países, vizinhos ou não,
tem, com celeridade, em tempo
O Senhor Embaixador advertiu
ao território nacional movidos
útil, tratar dos vistos. Reconheço
para a possibilidade de sucede-
por fins e interesses estranhos à
que, apesar disso, aqui e acolá,
rem conflitos se Angola não es-
mera circulação isolada ou incau-
ainda persistam algumas dificul-
tiver atenta aos problemas das
ta de pessoas. São movimenta-
dades. As competentes entidades
suas fronteiras. No ano ante-
ções massivas, conscientemente
continuam a trabalhar no sentido
passado, registaram-se alguns
organizadas e preparadas para
de aperfeiçoar os mecanismos
graves incidentes travados com
praticar actos de devastação de
e adequar a legislação afim aos
o Congo, país que partilha com
recursos naturais; actos capazes
novos tempos, pois, e como sabe,
Angola uma fronteira de 2 mil
de fazer perigar a economia e a
Angola viveu até há pouco um
quilómetros. Como resolver o
segurança nacionais. Angola está
passado de conflito armado, de
problema fronteiriço?
de braços abertos para acolher
conturbação; obviamente, na-
Angola é um país inserido numa
quem quer que seja, mas com a
quelas circunstâncias, algumas
sub-região onde subsistem alguns
condição de ser pessoa de bem.
medidas não foram nem poderiam
conflitos inter-estatais, e intra-
Os conflitos havidos, nos últi-
ser adoptadas por uma questão
estatais, que podem afectar a
mos tempos, com os Congos,
de defesa da soberania e da
nossa segurança nacional. Sabe
mas principalmente com a RDC
integridade do espaço territorial.
que na região dos grandes lagos,
situaram-se, no essencial, nesse
Mas agora o contexto é outro. Daí
ainda existem alguns focos de
quadro. O nosso Governo to-
estarmos a configurar toda a le-
tensão, havendo repercussões ao
mou as providências que achou
gislação inerente à política migra-
longo da nossa fronteira com a
convenientes para evitar que as
tória. É o caso, por exemplo, da
República Democrática do Con-
repercussões negativas imediatas
consagração da figura de vistos
go [RDC] que podem causar-nos
continuassem. Houve da parte de
múltiplos, que permitam que de-
sérios problemas. Estamos, por
vizinhos medidas de retaliação, de
terminada categoria de cidadãos
isso, preocupados com a situação
resto, despropositadas e despro-
cuja actividade implica desloca-
e todo o trabalho tem de ser feito
porcionais, lamentavelmente...
ções permanentes circulem com a
no sentido de minorar essa possi-
apesar disso, tem havido diálogo,
maior facilidade possível. Estou a
bilidade.
buscam-se caminhos para se
pensar nos homens de negócios,
Como resolver o problema do con-
encontrar uma solução duradoi-
nos académicos, cientistas, auto-
flito fronteiriço? Em primeiro lugar,
ra. Esses caminhos prosseguem
ridades eclesiásticas, entre ou-
não se deve perder de vista que a
entre os países implicados: há
tros. Há um trabalho neste sentido
divisão do continente africano foi
contactos regulares no âmbito de
e julgo que o assunto de vistos
feita “a régua e esquadro”. Uma
comissões mistas. Há, no ardor
➤
maio/agosto 2011 - Diplomática • 27
José Marcos Barrica
das discussões, quem advoge
É um esforço essencialmente
Quando se fala no crescimento de
que os Tratados e Acordos referen-
interno, das instituições do Estado
África, Angola tornou-se um país
tes às fronteiras têm de ser revis-
angolano; mas temos plena cons-
incontornável. Mas há na região
➤
tos. Se isto equivaler à revisão dos
ciência de que, por mais recursos
da África Austral, onde se insere
limites geográficos herdados do
que o país tenha e por enorme
esse grande país, um grande mer-
colonialismo, Angola não se revê,
que seja a vontade de realizar
cado, que é a África do Sul. São
certamente, nessa posição. Em
coisas boas, precisaremos sem-
potencialidades que podem ser
homenagem aos princípios de boa
pre de parceiros, das parcerias
aproveitadas por Portugal, que é
vizinhança e de respeito à sobera-
privadas, sejam elas nacionais ou
solicitado por vários países euro-
nia e integridade dos outros Esta-
estrangeiras.
peus para facilitar-lhes a entrada
dos, Angola quer e vai continuar a
Portugal tem um espaço reser-
em África, assim como Angola é
desenvolver o diálogo construtivo,
vado no coração de Angola. O
solicitada por países africanos
para evitar situações mais difíceis.
investimento, no âmbito da coope-
que pretendem entrar na Europa,
Em tempos de paz, como olha
ração estratégica, deve ser feito
tendo como referencial o seu rela-
para a recuperação económica
em vários domínios, sobretudo em
cionamento com Portugal. Os dois
de Angola, país que, apesar da
sectores estruturantes da eco-
países têm, ainda a língua co-
crise global, é visto, por empre-
nomia. Neste particular, Portugal
mum como instrumento de grande
sários portugueses, da Diáspo-
tem vindo a fazer isso. É preciso
valia para as relações entre as
ra e de todo o Mundo, como “o
um pouco mais de
caminho das pedras”? E o que
ousadia e agressivi-
falta melhorar na relação entre
dade (no sentido po-
Luanda e Lisboa?
sitivo) dos investido-
É com satisfação que nós, angola-
res. Angola adequou
nos, acompanhamos o fenómeno
a legislação de modo
do crescimento económico de An-
a estimular os investi-
gola, com indicadores positivos,
dores privados. Criou
sendo uma das economias que
facilidades de inves-
pessoas. Estendo, a
O
questão da língua, ao
maior desa-
fio do Executivo nacional é transformar esse crescimento económico em desenvolvimento e progresso social sustentado
Brasil - um gigante do Mercosul. Assim, conjugando, na nossa comunidade linguística, o potencial das economias emergentes (Angola e Brasil, no
mais cresceu, nos últimos cinco
timento, benefícios,
anos, no Mundo. Apesar da crise
incentivos no domínio
económica e financeira global,
fiscal e tributário a fim de possi-
dições seculares em expedições,
que também se abateu sobre o
bilitar a repatriação dos respecti-
forma-se aí um triângulo virtuoso.
país, a economia angolana con-
vos dividendos, ou seja, adoptou
Este triângulo, Angola - Brasil -
tinuou a crescer, não obstante a
políticas e medidas de protecção
Portugal, vai ter uma posição de
relativa desaceleração no último
e segurança aos investimentos
charneira no desenvolvimento
ano. O maior desafio do Execu-
e investidores, tudo para atrair
da economia da CPLP e, quiçá,
tivo nacional é transformar esse
o investimento externo de que a
do Mundo. Portanto, não será a
crescimento económico em de-
nossa economia tanto precisa.
acção de um país isolado que vai
senvolvimento e progresso social
Do ponto de vista geopolítico (e
transformar o Mundo. São as ac-
sustentado. Os cidadãos devem
não tem nada a ver com o Padre
ções conjugadas nas relações de
sentir, no seu dia-a-dia, os bene-
António Vieira, o Agostinho da
dependência e interdependência
fícios desse crescimento. Mais
Silva e as teorias do V Império),
que constituem o canal directo e a
do que estatístico, deve ser um
Angola e Portugal são a “pon-
ponte segura do desenvolvimento
crescimento real, vivido e sentido,
te”, o “canal” entre África e
sustentado das nações e povos.
que signifique a redução da fome,
Europa?
Com um universo de mais de 250
e dos índices de pobreza; que
Hoje em dia, Portugal, na pers-
milhões de pessoas irmanadas
signifique a melhoria das con-
pectiva de muitos europeus, é a
numa mesma comunidade de inte-
dições de vida das populações.
porta de entrada para Angola e ao
resses, é crível de que os nossos
Esse esforço está a ser realizado.
continente africano. Esta posição
países pertencem realmente a
Há indicadores, a todos os níveis,
privilegiada, que decorre da rela-
um espaço geopolítico importante
que nos dizem estarmos no bom
ção entre Portugal e África, pode
para desenvolver as respectivas
caminho.
ser explorada convenientemente.
economias.
28 • Diplomática - maio/agosto 2011
caso), com Portugal país europeu com tra-
n
Empresas internacionais
Empresa portuguesa na vanguarda do desenvolvimento Conduril aposta na formação em Angola É um caso de sucesso e um orgulho para Portugal. A empresa nortenha não se rendeu às dificuldades e apostou forte no mercado angolano, investindo, também, na formação e dotando o sistema de ensino de uma nova mais-valia: a CONDURIL Academy
Ganha a aposta de consolidação no merca-
médios e superiores”, integrando as acções
do angolano, e caldeado por duas décadas
de “certificação de competências formais e
de trabalho persistente e rigor profissional,
informais do universo CONDURIL”.
o Grupo CONDURIL acorre, agora, a um
Actualmente, a academia é, e será perma-
dos maiores desígnios para o desenvolvi-
nentemente, o organismo da CONDURIL
mento e progresso de Angola: a formação
responsável por garantir em Angola a for-
profissional de referência.
mação profissional do seu pessoal, a todos
A apresentação deste pólo de ensino
os níveis, com credenciação e reconheci-
profissional permite colmatar uma lacuna
mento de competências, tendo para isso
no sector da Construção Civil, dotando a
sido construídas instalações autónomas
empresa de uma escola de profissionais
adequadas, com sede em Benguela. No
com formação de excelência e colocando
entanto, a área de actuação da CONDU-
à disposição de jovens angolanos com-
RIL Academy não se restringe a Benguela,
petências técnico-profissionais que lhes
estando já implementada a sua actividade
permitam integração segura no mercado
em todo o território nacional angolano, com
de trabalho e ajudar às necessidades de
pólos de desenvolvimento distribuídos pelo
desenvolvimento do país.
universo de operações do grupo, nomeada-
A CONDURIL Academy, sediada na ci-
mente, em Luanda, Cabinda e Zaire, Bengo
dade de Benguela, aposta em “cursos de
e Uíge, Kwanza Sul, Malange, Kwanza
formação tecnológica, com homologação e
Norte, Huambo e Bié, Lunda Norte, Lunda
equivalência à conclusão do ensino médio
Sul e Moxico, Namibe, Huíla e Cunene,
angolano, formação profissional de quadros
bem como no Cubango.
30 • Diplomática - maio/agosto 2011
➤
Uma empresa de referência no empreendedorismo e inovação Com sede em Ermesinde, a poucos quilómetros do
to ao fundador da nação, Dr. Agostinho Neto, em
Porto, a CONDURIL – ENGENHARIA, S.A., é uma
Luanda; reabilitação do Hospital Psiquiátrico, em
das pioneiras no investimento na novel e promissora
Luanda; reabilitação da ponte sobre o Rio Kwanza,
economia Angolana, onde marca presença desde
em Cangandala, Malange; construção da nova ponte
1990, e actua em todos os ramos da Engenharia
sobre o Rio Cavaco, em Benguela; Etar de Viana;
Civil, nomeadamente, na construção de estradas
estrada EN 100, Barra do Dande/Libongos; projecto
e auto-estradas, hidráulica, construção civil, obras
e execução da Ponte Cais e construção de spoolba-
subterrâneas, barragens, geotecnia, saneamento e
se do Dande.
pontes.
Criada em 1959, a CONDURIL – Construtora Du-
Pólo de várias empresas associadas, o Grupo
riense, S. A., foi adquirida pelos actuais accionistas
CONDURIL, através da sua sucursal em Angola e da
em 1970, tendo um capital social de 10 milhões
Métis Engenharia, Lda., gere um universo de 2 mil
de euros, estando cotada em Bolsa. Com sede em
colaboradores, sendo que 95 por cento são ango-
Ermesinde, Porto, Portugal, a empresa apostou na
lanos. Apostado em “ficar a trabalhar eternamente
internacionalização, marcando presença em Angola,
em Angola” – segundo as palavras dos seus respon-
Moçambique, Marrocos, Botswana e Cabo Verde
sáveis –, o grupo tem vindo a implementar moder-
sendo que o responsável de cada um destes países
nas técnicas e avançadas políticas de excelência,
tem lugar no Conselho de Administração.
nomeadamente, respeitantes ao controlo laboratorial,
Apostando em inovadoras técnicas de gestão de
higiene e saúde no trabalho.
qualidade, a CONDURIL dispõe de um Laboratório
Presente em todas as províncias da República de
Central, desde 1974. A excelência do trabalho ali
Angola, o grupo CONDURIL possui delegações
desenvolvido, valeu-lhe, em 2001, a acreditação
provinciais com autonomia e capacidade técnica,
pelo IPAC – Instituto Português de Acreditação, que
sendo responsável pela execução de grandes obras
reconheceu “a competência técnica e isenção” do
de referência, das quais destacamos: reabilitação
laboratório.
da estrada Ganda-Catengue, em Benguela; estaleiro
Empresa de referência, foi por oito vezes premiada
naval de Porto Amboím, no Kwanza Sul; monumen-
pelo rigor da revista Exame.
■
maio/agosto 2011 - Diplomática • 31
Conduril
➤
Numa segunda fase, em que os forman-
de Condução, visando a necessidade
dos também serão recrutados no universo
permanente do aumento de qualificações
exterior à CONDURIL, está prevista a cons-
dos motoristas de veículos pesados e dos
trução de um Campus Escolar, também em
manobradores de máquinas, com sessões
Benguela, mas num local a definir, numa
de simulação e de aprendizagem prática
área não inferior a 7 hectares, com capaci-
em pista especial criada no futuro Campus
dade para ministrar cursos em simultâneo a
Escolar.
240 alunos por ano.
A academia de formação contempla, ainda,
Diversificação de valências
a construção de um estaleiro destinado a
A apresentação da CONDURIL Academy e
aulas de prática simulada para as diversas
a entrega dos primeiros diplomas a 70 mo-
áreas, bem como a criação de laboratórios
toristas, em Outubro de 2010, marcaram o
com capacidade de resposta às necessi-
início de um caminho que se auspicia fértil.
dades do ensino ministrado, enquadrados
O ousado projecto contempla várias valên-
numa linha ousada de multidisciplinaridade
cias, procurando abarcar todas as áreas
global.
de formação do sector, nomeadamente:
Nesta fase de arranque, a CONDURIL
Escola Técnico-Profissional, onde serão
está empenhada na organização de todo o
ministrados cursos de nível médio, entre o
processo de constituição formal da aca-
técnico superior e o trabalhador qualificado,
demia, que passa necessariamente pelo
no ramo da indústria e obras públicas, com
recrutamento da equipa dirigente, do corpo
duração média de quatro anos, abrangendo
docente e auxiliar, criando, de igual modo,
as áreas de Construção Civil, Electrotecnia/
uma bolsa de formadores e monitores. A
Mecânica, Manobradores/Motoristas, Dese-
construção do espaço físico e a homologa-
nho e Topografia, Qualidade e Segurança,
ção oficial da academia enquanto escola
Laboratório, bem como técnicos adminis-
técnico-profissional são, de igual modo,
trativos, de secretariado e de tecnologias
linhas de forças que norteiam os responsá-
de comunicação; Escola Técnica Especial
veis do Grupo CONDURIL.
32 • Diplomática - maio/agosto 2011
n
Empresas internacionais
Jorge Tropa, CEO da Siemens Angola “Estamos em Angola para ficar” Com uma actividade no País que remonta aos anos 60/70, a Siemens Angola tem-se destacado pelos padrões de qualidade e inovação tecnológica, num mercado cada vez mais exigente e competitivo. Nos objectivos da empresa mais imediatos contam-se a diversificação das áreas de actuação, com destaque para a Energia, Indústria e Saúde.
34 • Diplomática - maio/agosto 2011
➤
➤
Terra de futuro e de desenvolvi-
presença da empresa teve me-
em 190 países com mais 400.000
mento, Angola revela-se como um
nor relevância até que, em 2005,
colaboradores, pelo que estamos
destino emergente para o investi-
entrou novamente no país com
habituados a uma concorrência
mento e instalação de empresas
projectos essencialmente na área
global e sabemos como lidar com
estrangeiras. Nesse âmbito, a Sie-
das telecomunicações. Em 2010, a
ela.
mens apostou no mercado angola-
Siemens Angola passou a ser uma
Para além dos sectores referi-
no, provavelmente numa altura em
Regional Company independente
dos, quais as áreas potenciais
que, para muitos, essa estratégia
em África. A Siemens reconheceu
de crescimento da empresa?
poderia ser considerada um risco.
a importância e as características
A área mais relevante para a
Tem valido a pena essa aposta?
próprias do mercado Angolano,
economia angolana, ou seja com
Claramente. Os clientes da Sie-
pelo que decidiu constituir-se de
maior peso no Produto Interno Bru-
mens já são muitos em Angola, a
pleno direito em Angola e indepen-
to, é naturalmente o Petróleo, pelo
nossa tecnologia chega por dver-
dente da região Sul-africana onde,
que esperamos assistir ao desen-
sos canais e de diferentes partes
no passado, estava inserida. Este
volvimento da indústria petroquími-
do mundo. Ao escolher a Siemens,
mercado é muito importante para a
ca e também do gás. Os recursos
os clientes procuram elevados
empresa.
são abundantes e Angola, ao ga-
padrões de qualidade e inovação
Num contexto de forte concor-
nhar a confiança dos investidores,
tecnológica e um nível de serviço
rência dos mercados, as áreas
conseguiu posicionar-se e crescer
equivalente. Isto só se consegue
de especialização da Siemens,
continuamente até ser hoje um dos
com uma presença local. É mui-
nomeadamente na Energia, Saú-
principais exportadores de África.
to recompensador surpreender
de e Indústria, em que medida
A cadeia logística e de serviços
os nossos clientes com a nossa
constituem mais-valias e mar-
locais nesta industria está a fun-
presença nos locais mais remotos
cam a diferença no emergente
cionar e a criar postos de trabalho,
do País e dizer-lhes que estamos
gigante de África?
pelo que mais projectos nesta área
em Angola para os servir. Esta-
Angola é o país que mais cresceu
são críticos para o desenvolvimen-
mos também a criar emprego e a
na última década. O potencial de
to continuado do sector, nomeada-
contribuir para o desenvolvimento
crescimento não se esgotou, e
mente produção e engenharia.
de sectores estruturais no domí-
foram estabelecidos objectivos
Angola tem a oportunidade de
nio social e económico de Angola.
concretos para o desenvolvimento
crescer com a Siemens na En-
Factor importante: partilhamos en-
das infra-estruturas. O Programa
genharia Eléctrica, Automação e
genharia e competências técnicas
de Investimento Público de 2011
Petrolífera, entre outras. Se somos
e de gestão de várias áreas com a
de Angola elege sectores priori-
o principal fornecedor de serviços
Siemens Portugal, promovendo um
tários de desenvolvimento, entre
de engenharia para a Petrobrás
elevado valor acrescentado nas re-
os quais a energia, a água e os
no Brasil, porque não em Angola?
lações comerciais entre estes dois
transportes, áreas onde a Siemens
Falamos todos Português e Angola
países, especialmente nas áreas
detém ou a liderança ou ocupa
necessita destas competências
Eléctrica e da Energia.
segundo lugar a nível mundial.Os
para se desenvolver, conforme de-
No universo da empresa, qual a
padrões de exigência de parte dos
monstram as recentes aquisições
relevância de Angola nos seus
consumidores e dos governantes
de empresas de engenharia por
negócios?
são elevados, e, em Angola, por
parte da Sonangol.
A Siemens AG é accionista da
vezes até mais elevados do que,
Tem sido fácil a relação com as
Siemens Angola, da mesma forma
por exemplo, na Europa. Sabemos
entidades reguladoras e organis-
que é accionista da Siemens
que existe um segmento crescente
mos oficiais nas áreas de inter-
Portugal. Temos, por isso, que dar
que irá procurar a Siemens em al-
venção da Siemens?
contas ao accionista comum pelos
ternativa a outros fabricantes mais
Sim, somos bem recebidos. É
resultados da nossa actividade.
baratos, isto porque já tiveram más
notória a vontade generalizada
A Siemens tem actividade em
experiências com produtos sem
de se fazer cumprir os objectivos
Angola desde os anos 60/70. Na
fiabilidade e com níveis de serviço
traçados, que são muito ambicio-
altura, era procurada como um
sofríveis. Estamos em Angola para
sos. Os desafios organizacionais,
dos principais fornecedores para
ficar. Isto é uma corrida de fundo.
logísticos e humanos para realizar
a indústria. Durante a guerra, a
A rede Siemens continua a crescer
os projectos são muitos. As
➤
maio/agosto 2011 - Diplomática • 35
Jorge Tropa
Que oportunidades de negócio
e Torres do Atlântico – e temos
melhor que ninguém, pelo que a
se encontram em curso, e que
boas perspectivas nos transportes
Siemens representa, neste contex-
perspectiva tem para o próximo
e aeroportos. Destacam-se ainda
to, uma alternativa credível e com
quinquénio?
projectos com as empresas eléc-
um serviço de qualidade.
Temos projectos em todas as áre-
tricas Angolanas – EDEL, ENE e
É importante realçar o aumento da
as atrás referidas, incluindo a in-
GAMEK no sector da Energia.
transparência e da competitividade
dústria e a saúde. Destaco o Ango-
Faz parte do nosso projecto imple-
no mercado devido às novas re-
la LNG no Soyo, a Clínica Sagrada
mentar com sucesso a estratégia
gras de concurso público, que em
Esperança, a Clínica Girassol,
da empresa na área das Cidades.
muito, facilitam a relação da Sie-
assim como edifícios de referên-
Os desafios resultantes do cresci-
mens com as diversas entidades.
cia em Luanda - como o ESCOM
mento das grandes cidades estão
➤
entidades conhecem a realidade
36 • Diplomática - maio/agosto 2011
➤
a ser estudados pela Siemens
a eficiência energética dos edifí-
América Latina e Ásia, e até ao
cios, os níveis de emissão de CO2,
final de 2011 será publicado um
Isto não é trivial. Neste sentido
e qual o seu impacto ambiental.
trabalho semelhante para as urbes
lançámos um programa a que
Com base numa série de catego-
africanas mais relevantes. Luanda
apelidámos “Green City Index”.
rias, as administrações municipais
pode ser considerada uma mega-
Este programa investiga e avalia
são informadas dos resultados do
cidade, tem hoje mais de 8 milhões
as principais cidades mundiais de
desempenho das suas cidades e
de habitantes e continua a crescer.
acordo com os níveis relativos de
em conjunto são discutidas solu-
A capital angolana vai estar inclu-
sustentabilidade das suas infra-
ções sustentáveis. Até à data já
ída no estudo comparativo, uma
estruturas Estuda-se, por exemplo,
foram publicados estudos sobre
vez que já recolhemos a informa-
de que forma é possível comparar
as principais cidades da Europa,
ção de base.
➤
no sentido de encontrar soluções.
n
maio/agosto 2011 - Diplomática • 37
Empresas Internacionais
Miguel Vieira Director Geral da Elite Angolan Careers "Diálogo com as empresas é fundamental no recrutamento de quadros"
A Elite Angolan Careers lidera mercado de recrutamento em Angola. Em declarações à Diplomática, Miguel Vieira, Director Geral da empresa, sustenta que a necessidade de quadros e profissionais especializados ainda é maior que o número de formados pelas universidades angolanas, traçando os objectivos da EAC com uma aposta muito forte na ampliação das operações de oferta em Angola, assim como também a expansão noutros mercados, como é o caso da na América Latina e a Ásia.
A Elite Angolan Careers foi
Director Geral de África do Sul e
recrutamento, para depois rumar
criada em 2008 com o objectivo
da América Latina, especificando
até ao maior certame em Luanda
de se tornar uma empresa de
que «os serviço mais procura-
– onde participam habitualmente
referência no recrutamento de
dos pelos clientes são os fóruns
cerca de 50 empresas – seguin-
recursos humanos para mercados
de recrutamento que organiza-
do depois para Cape Town, na
emergentes.
mos em cidades como Luanda,
África do Sul.
Lisboa, Washington DC, Lagos
Grande parte das empresas
locais que estejam fora do seu
(Nigeria), Bahrain (UAE), Londres
participantes do Fórum de Re-
pais natal e apoiamos os nossos
e Barcelona”.
crutamento estão ligadas à área
clientes com os seus respectivos
Ainda recentemente, em Março
petrolífera, o que leva a que os
processos de localização de mão
passado, decorreu pela terceira
pedidos de candidatos se con-
de obra”, refere Miguel Vieira,
vez em Lisboa, este fórum de
centrem nessa temática –
“Concentramo-nos
no recrutamento de candidatos
38 • Diplomática - maio/agosto 2011
➤
no, verificam que há dificuldade
Biografia
em encontrar perfis dentro do mercado angolano e solicitam os
Nascido em Angola, em 1977, Miguel Vieira foi viver
nossos serviços”, acrescenta o
nos anos noventa para a Florida, USA, com o intuito
responsável da EAC.
de seguir a carreira profissional de ténis na academia
A Elite Careers disponibiliza
Nick Bollettieri Tennis Academy. Ao acabar o liceu na
aos seus clientes serviços nas
Bayshore Highschool de Bradenton em 1995, Florida,
áreas dos Fóruns de recrutamen-
decidiu seguir carreira académica e licenciou-se em
to local, projectos de recrutamen-
Educação Secundária pela University of South Flori-
to e Outsourcing, jornadas de re-
da em 2000. Após concluir os estudos universitários,
crutamento, testes psicotécnicos,
optou por viver em Barcelona, Espanha, onde traba-
formação & desenvolvimento,
lhou como professor de liceu e director de activida-
campanhas de recrutamento (Se-
des extra-curriculares na American School até 2005.
arch & Selection). Tem ao seu
Completou mais tarde o seu MBA pela Universidad
serviço dezoito funcionários em
Pompeu Fabra de Barcelona, onde foi o primeiro can-
Londres e três em Luanda e uma
didato Africano a concluir esse grau académico no
politica equilibrada e rigorosa de
historial daquela universidade. Em 2005 começou a
gestão faz com que apresente
trabalhar para Marcus Evans em Barcelona, uma das
lucros desde o ano da sua cons-
maiores empresas a nível mundial no que diz respei-
tituição.
to a organização de conferências, fóruns e eventos
Apesar da existência de uma
corporativos, e em 2006, com o seu MBA terminado,
nova geração de jovens angola-
foi contratado por GCC, uma empresa britânica, para
no altamente especializados.,
liderar a equipa de vendas e recrutamento para o
Miguel Vieira sustenta que “a
mercado Africano, e em concreto o de Angola. Em
necessidade de quadros e pro-
2008 nasceu a Elite International Careers, com sede
fissionais especializados ainda é
em Londres, empresa dedicada a recrutamento para
maior que o número de quadros
mercados emergentes como Nigeria, Arábia Saudita,
formados pelas universidades
Brasil e Angola. Em 2010 a Elite abriu escritório em
angolanas, pelo que acredita-
Luanda.
mos que ainda estamos longe de
■
poder ser autosuficientes com os quadros ’produzidos` pelas nossas instituições locais” engenheiros da área petrolífera,
sos de recrutamento”.
“ Estamos muito melhor que há 5
reservas de petróleo, mecânica,
A empresa pretende ser um
anos atrás, mas ainda estamos
electro-mecânica.
verdadeiro parceiro internacional
longe da situação ideal” observa.
➤
Segundo refere Miguel Vieira, “a
com uma visão local e apoiar de
Nos projectos futuros para a Elite
missão da Elite Internationa Ca-
forma contínua todos os seus
Careers contam-se a ampliação
reers visa apoiar os nossos clien-
clientes nos vários mercados
das operações de oferta em
tes no que diz respeito às suas
emergentes onde os mesmos
Angola, assim como também a
necessidades de capital humano
tenham operações, “Existe um
expansão em relação a merca-
local; criamos valor ao ser o elo
diálogo permanente entre a
dos para os quais a EAC opera,
de ligação entre ambos, empre-
Elite e as empresas. Quando as
nomeadamente, na América
gadores e candidatos, apoiando-
empresas chegam a Angola têm
Latina e potencialmente, a Ásia
os nos seus respectivos proces-
necessidades de capital huma-
no futuro.
n
maio/agosto 2011 - Diplomática • 39
Memória
Maio, tempos de utopia Uma maior generosidade, humanismo, ecolo-
É uma resposta digna da juventude hitleriana”,
gia e nacionalismo são alguns dos conceitos
respondeu-lhe o estudante, levando a que os
herdados do movimento contestatário desig-
seus colegas se insurgissem. Assim, depois de
nado por Maio 68, antecâmara da realidade
repetidos incidentes, entre os quais a ocupação
dos anos 70 e 80, prenúncio do levantamento
pelos estudantes, a Faculdade de Nanterre
da contestação agora em voga da chamada
foi fechada a 2 de Maio. Grupos de esquerda,
«geração à rasca». Os princípios, os valores e
revoltados “contra a sociedade de consumo”,
as reivindicações são praticamente as mesmos,
o ensino tradicional e a insuficiência de saídas
quatro décadas depois…
profissionais, decidem opor-se pela “contesta-
A “crise” de Maio de 1968 começou por ser
ção permanente”. Inicia-se logo aí o movimento
uma contestação estudantil francesa ao Estado
dirigido por Daniel Cohn-Bendit, designado por
autoritário do general de Gaulle que teve répli-
“22 de Março”. Os estudantes ocupam, depois,
cas nos demais países desenvolvidos, desde
a Universidade da Sorbonne - encerrada pelas
os EUA ao Japão. Curiosamente, nessa época,
autoridades a 3 de Maio -, sofrendo uma dura
os franceses viviam como que ofuscados pela
intervenção policial.
sociedade de consumo ( aqui, um paralelo com
Geram-se tumultos e focos de tensão, com as
o que aconteceu recentemente em Portugal,
primeiras barricadas nas ruas - nomeadamente
com o povo também mergulhado no êxtase
no Quartier Latin (confrontos de que resultam
consumista e que despoletou a crise resolvida
805 feridos, entre os quais 345 polícias) -,
de forma draconiana pelo FMI). Agora, como
entrando-se num ciclo de provocação e repres-
nesses tempos, havia uma corrida desenfrea-
são. A 9 de Maio, contra esta tendência, tem lu-
da à compra dos chamados “bens burgueses”,
gar no Boulevard St. Michel, uma manifestação
carros, frigoríficos a prestações, traçavam-se
pacífica. No dia seguinte, regressa a violência,
planos aliciantes de destinos para férias.
com a famosa “noite das barricadas”, carros em
Mas, por detrás desta embriaguez consumista
chamas, agitação na Sorbonne. Segue-se uma
“petite bourgeoise”, algo entediante, havia uma
gigantesca manifestação estudantil em Paris, a
certa inquietude no ar: greves violentas nas
13 de Maio, com cerca de 600 000 estudantes.
fábricas, protestos na rua contra a guerra do
O conflito alarga-se, porém, ao sector social,
Vietname, ao mesmo tempo que a Primavera
com manifestações sindicais nesse mesmo dia,
que despontava em Praga fazia soprar ventos
acompanhadas de greves que paralisaram mais
de um socialismo mais humanizado. Tudo isto
de 10 milhões de trabalhadores em França.
conjugado com os novos gostos culturais da
Apesar do envolvimento da classe operária, o
geração mais nova, que tinha por ícone musical
Partido Comunista Francês e a CGT (Confede-
os “Beatles”, ou absorvendo o espírito revolu-
ração Geral do Trabalho) adoptam uma posição
cionário de Che Guevara, introduziam factores
calculista, classificando as revoltas estudantis
de uma nova inquietude entre os mais novos.
e a greve geral como uma “aventura” e concen-
O detonador de todo este “caldeirão” onde
trando-se apenas em reivindicações profissio-
“cozinhavam” em lume brando as legítimas
nais e laborais, em contraponto às exigências
aspirações da juventude teve o seu epicentro
de reformas estruturais dos estudantes (ma-
em Nanterre, nos arredores da capital fran-
oistas, anarquistas, trotskistas...). Entretanto,
cesa, tradicionalmente apelidada de feudo
o primeiro-ministro Georges Pompidou reabre
“esquerdista”. Durante uma visita que fez a
a Sorbonne a 14 de Maio, dizendo que era
estas instalações o ministro da Educação para
“proibido proibir”. A Renault entra também em
inaugurar uma piscina, um estudante ruivo de
greve. Esta pressão laboral conduzirá aos acor-
origem alemã, Daniel Cohn-Bendi, interpelou-o
dos de Grenelle, a 25-27 de Maio, nos quais a
sobre os “problemas sexuais” da juventude. O
classe patronal garantirá um aumento de 10%
membro do Governo aconselhou-o a “dar um
dos salários e de 35% do salário mínimo. Os
mergulho na piscina, para refrescar as ideias”.”
sindicatos aceitam, mas as suas bases
40 • Diplomática - maio/agosto 2011
➤
Um combate pela liberdade que lançou sementes para o futuro
Jean Paul Satre e Simone Beauvoir, dois dos
Tumultos e focos de tensão nas ruas opuseram estudantes à Policia
contestatários
e a revolta alastrou a outros estratos sociais
maio/agosto 2011 - Diplomática • 41
Maio, tempos de utopia
➤
operárias mantêm a greve. Apesar deste
(União Democrática Republicana) e um claro
primeiro passo para a paz social, o presidente
recuo dos partidos de esquerda, apesar da cri-
Charles de Gaulle considera a situação in-
se de Maio ter feito “tremer” o poder do general
controlável, propondo um referendo. Não é,
Gaulle, demonstrando a insatisfação crescente
porém, escutado e ao mesmo tempo dão-se
da juventude e das forças sociais face ao con-
distúrbios nas ruas. A crise torna-se cada vez
servadorismo do regime. Para muitos analistas,
mais política, inquietando-se os ministros com
o medo suscitado pelas convulsões daquela
a possibilidade de ruptura e queda do Governo,
altura permitiu a manutenção da ordem estabe-
perante rumores da formação de um Executivo
lecida, que acenava com projectos de reforma
provisório, de crise. Em 24 de Maio, de Gaulle
moderada da vida política francesa.
dissolvia a Assembleia.
Apesar do sucesso das eleições de Junho e
A violência nas ruas começa, entretanto, a
das tentativas de reforma do governo de Couve
incomodar a França “profunda”, mais conser-
de Murville (primeiro-ministro gaullista eleito em
vadora. Teme-se o peso crescente do Partido
Junho de 68), de Gaulle sofrerá uma derrota
Comunista, acusado de instigador, apesar da
política no referendo de Abril de 1969 sobre
demarcação política desenhada logo no come-
a Regionalização e a Reforma do Senado.
ço dos distúrbios. Crê-se mesmo numa revolu-
Demite-se entretanto, abandonando a política.
ção nacional. Entretanto, ninguém sabe de de
“Nada será como antes de Maio de 68”. Passa-
Gaulle, acreditando mesmo Pompidou que o
dos alguns anos, esta ideia mantém-se viva: o
regime estava a chegar ao fim. Porém, numa
ano primeiro da contestação e das mudanças
alocução ao país via rádio a 30 de Maio - como
terá começado durante essa época conturbada.
nos tempos da ocupação alemã da França,
As instituições políticas não caíram mas treme-
encorajando os compatriotas -, de Gaulle apela
ram, e os franceses repensaram o seu próprio
à ordem e anuncia eleições legislativas para
futuro. Houve, acima de tudo, uma alteração
Junho. No mesmo dia, junto ao Arco do Triunfo,
das mentalidades, com o aparecimento de mu-
os gaullistas organizam uma manifestação de
danças há muito esperadas em França. Os cos-
apoio ao regime. A propósito do comunicado
tumes evoluem, com a permissividade a abrir
do presidente da Repíublica à nação, diz Jean
caminho na sociedade francesa. Os conserva-
Lacoutoure: “Antes das 16h 30, estava-se em
dores mantêm o poder, mas a abertura a novas
Cuba; depois das 16h 35 estava-se quase na
ideias é cada vez maior, aumentando a contes-
Restauração”. Depois de uma situação que ten-
tação por parte dos intelectuais: o aparecimen-
dia para a anarquia e para uma via socialista,
to e a divulgação de trabalhos efectuados na
consegue-se recuperar o caminho da demo-
área das ciências sociais e humanas é uma re-
cracia e evitar uma agudização dos aconteci-
alidade cada vez mais forte no mundo científico
mentos. Apesar dos protestos da esquerda e
francês. A voz das minorias começa a levantar-
de alguma violência, a França votará. A 16 de
se. Há uma crescente emancipação das mu-
Junho, durante os distúrbios no Quartier Latin,
lheres. O próprio clero inicia também uma auto
morre Gilles Tautin, de 17 anos. É o fim da cri-
- reflexão. Estavam lançadas as sementes da
se estudantil: a situação política, essa, continuará
liberdade, prenúncios da queda do socialismo a
agitada.
Leste, dos novos tempos que sopram na China
O centro e a direita anti-gaullista colocam-se
e em Cuba, do que haveria de acontecer em
gradualmente ao lado do Governo, que as-
Abril, em Portugal. Um ideal que só tem como
sim vê surgir uma base de apoio inesperada,
contraponto, na actualidade, o desenvolvimento
dispondo então de uma maioria esmagadora.
de um capitalismo financeiro internacional cada
Esta plataforma política conservadora des-
vez mais actuante, estendendo os seus longos
confia da vontade de reformar do presidente,
braços a várias Nações. A utopia deu lugar à
exigindo mesmo a constituição rápida de um
sobrevivência, espezinhando os mais elemen-
novo Governo e novas eleições legislativas.
tares direitos cívicos e humanos. Mas essas
Em parte, estas condições serão satisfeitas.
são contas de outro rosário, a que o Maio de 68
Nas eleições de 23 e 30 de Junho, o regime
será sempre e eternamente imune. Ficaram as
gaullista sai reforçado, com uma vitória da UDR
sementes para amadurecer no futuro…
42 • Diplomática - maio/agosto 2011
n
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Espaço diplomático
O Mundo está a mudar?
Moldávia
Turquia
Hungria
Convidámos os Embaixadores da Turquia, Moldávia e Hungria a pronunciarem-se sobre as mudanças políticas que marcam a actualidade.
44 • Diplomática - maio/agosto 2011
➤
Ali Kaya Savut - Embaixador da Turquia
mulation of experience and assess possible contributions, Turkey is actively employing its diplomatic efforts since the beginning of the events. The President of Turkey has been the first President to visit Egypt after February 11. The Turkish Foreign Minister paid visits to Syria, Tunisia and Bahrain in order to discuss best possible way towards the future. We have organized several other consultations and contacts with governmental and non-governmental actors in the region. On the other hand, the reaction of the international community will also play a critical role in this process. Turkey does not support foreign involvement in internal affairs when opposition movements fail to bring about a regime change. Indeed, external involvement would further complicate the developments on the ground and the prospects for indigenous democracy would be severely undermined. The role of international community is being tested in the case of Libya today. Turkey, considers the protection of sovereignty, territorial integrity and restoration of security as The so-called Arab spring, we are witnessing today is a new
the main goals of the current international action towards
era of change: A change that was long due, but at the same
Libya. The political transformation process has to be initi-
time astonishing us all with its pace and energy. Modern
ated in order to establish a democratic system in which only
facilities of technology, helping people communicate and
Libyan people will have the authority to decide about the
network instantaneously have not only accelerated global
future of their own country. Any action contrary to this will
transformation but also strengthened the waves of change.
have negative implications blocking the democratization
The chaotic tempo of events may represent an era of riots
process in the region. What the people in the region need
which understandably brings legitimate concerns.
to see now is a success story that can be written with the
The recent uprisings in the Middle East and North Africa
support and encouragement of the international commu-
should be understood on their own merits. Winds of change
nity rather than a bloodshed which would leave a negative
in the Middle East are not blowing from outside. They are
legacy.
stemming from the will of the people out in the streets who
Another imperative task that the world community has to
aspire to more dignity, more economic prosperity and more
face is providing humanitarian relief to the civilians that
democracy. Years of inertia and denial of freedom of expres-
have been caught in the conflict. Turkey evacuated over 20
sion has pushed especially the young generation to fight for
thousand Turkish citizens and 3.500 foreigners from Libya
reforms. As a result, the domino effect became inevitable in
and sent three ships carrying humanitarian relief material to
the area.
Benghazi since the beginning of the conflict. A Turkish hos-
Turkey, since the beginning has supported democratisation
pital ship has picked up hundreds of wounded people from
process and reforms through peaceful transformation, not
Misurata. We believe continuous and coordinated efforts
through violence and instability. The leaders of the countries
of the international community to ease the pain of those
have a critical role to play, as Turkish Foreign Minister Prof.
who suffer also help alleviate the traumas that will impede
Ahmet Davutoğlu pointed out “Wise leaders in the region
transformation process.
should lead this process rather than try to prevent it.” Es-
The rapid developments we are witnessing indicate that we
tablishment of an institutional infrastructure is a priority to
are now in a new era which is bringing many challenges,
promote democracy culture in these countries.
many opportunities and many risks. In this context, Turkey
Having gone through a long process of democratic trans-
will continue to be the staunch supporter of the nations
formation itself, Turkey could be regarded as a source of
demanding for democratic change and a member of the
inspiration for these movements. In order to share its accu-
international community ready to fulfil its responsibilities. ■
maio/agosto 2011 - Diplomática • 45
Espaço diplomático
Valeriu Turea - Embaixador da República da Moldávia
A República da Moldávia no seu 20º aniversário
Moldávia e Portugal são, geograficamente falan-
último ano e meio. Mas a Moldávia deseja que lhe
do, dois extremos do mundo latino na Europa,
seja reconhecida não só a vocação, mas também
mas estes extremos esquecem as distâncias e
a perspectiva clara de adesão ao espaço comuni-
convergem em direcção aos mesmos ideais.
tário. Naturalmente, não solicitamos que nos sejam
Este ano, a República da Moldávia celebra dois
concretizados os prazos precisos da adesão à UE,
decénios de independência estatal. Não sei em que
porque estamos perfeitamente cientes de que a
medida esta data é determinante para a história de
adesão propriamente dita depende da forma como
um jovem Estado, mas penso que o feito mais im-
lograremos fazer o trabalho de casa. Sim, muitas
portante que o meu país conseguiu realizar – a ní-
coisas dependem também da conjuntura política,
vel de opção estratégica, mas também no plano do
mas pensamos que o cumprimento dos critérios da
início das reformas de princípio – foi definir a sua
adesão desempenha, não obstante, o papel princi-
identidade. Ao longo dos anos, a Moldávia seguiu
pal.
um destino complicado, com circunstâncias histó-
A República da Moldávia compreende que os seus
ricas nem sempre favoráveis e animadoras. Mas o
trâmites a respeito da integração sobrepõem-se
equívoco a respeito da orientação estratégica que
com um período difícil para a mesma União Euro-
dominava o estado de ânimo das elites políticas
peia, que está seriamente preocupada por superar
nos primeiros anos de independência foi superado
a crise pela qual atravessam actualmente alguns
e hoje a República da Moldávia é um Estado com
Estados membros. O eurocepticismo é uma reali-
uma clara vocação europeia.
dade que não pode ser negligenciada. Fala-se de
A União Europeia reconhece esta vocação, apre-
um sentimento de fadiga que moeria os recursos de
ciando os esforços reformadores do Governo
capacidade da União Europeia. Com tudo isso, não
pro-europeu de Chisinau empreendidos durante o
creio que a Europa entrou numa fase de confusão
46 • Diplomática - maio/agosto 2011
➤
➤
conceptual. Pode parecer um pouco estranho,
mas – arrisco afirmar – que a República da Moldávia está tentada a tornar-se na criança terrível (enfant terrible) da União Europeia. No sentido de que está disposta a demonstrar que pode realmente ser uma peça de resistência, lógica e natural na paisagem comunitária e, através de abordagens mais imaginativas, de desafios com um bom sentido características dos estados ainda jovens, não deixar que a Europa se canse… Moldávia, pelos logros realizados nos últimos tem-
O meu país deseja entrar
pos, transmitiu uma mensagem clara de que pode-
na Europa, não pela porta
ria interpretar com sucesso este papel. O meu país
de atrás, mas pela porta
deseja entrar na Europa não pela porta de atrás,
da frente, tendo todos os
mas pela porta da frente, tendo todos os documen-
documentos em ordem.
tos em ordem. E o fato de estar a ser considerada “a história de sucesso” da Parceria de Leste, é prova convincente da seriedade destas intenções. O problema mais grave com o qual se está a confrontar na actualidade a República da Moldávia e o conflito transdniestrense (da região Transdnístria). Os esforços internacionais empreendidos com vistas a sua solução deixam lugar à esperança de que, no final, poderia ser identificada uma solução inteligente e duradoura. Uma coisa muito animadora é o fato de que neste esquema chegou a ser
título especial – Portugal continua a apoiar a ideia
muito mais significativo o papel da União Europeia.
do alargamento da União Europeia aos Estados
As discussões entre o Chanceler alemão Ângela
aspirantes que cumpram os critérios de adesão, de
Merkel e o Presidente russo Dmitri Medvedev sobre
forma que apoia também a integração europeia da
este tema sugerem univocamente que o conflito
República da Moldávia. Estas coisas pesam forte
transdiestrense está na agenda estratégica das re-
na balança, sobretudo agora. Portugal conservou a
lações UE-Rússia e representa um teste sério, um
sua memória histórica, não se esquece que no tem-
“papel de girassol” do diálogo entre estes dois acto-
po devido contou com bons amigos que o apoiaram
res primordiais no contexto da solução dos proble-
nas suas aspirações democráticas e europeias, de
mas de segurança em Europa. A solução definitiva
modo que conhece o preço da solidariedade amigá-
do conflito constituiria uma vitória extremamente
vel.
importante, com valor simbólico, em igual medida
Quero sublinhar que esta atitude das autoridades
para a União Europeia, a Moldávia e a Rússia.
portuguesas está bem conhecida na Moldávia e
Enquanto Estado jovem, a República da Moldávia
é apreciada pelo justo valor. No só a nível oficial,
precisa de amigos e é sensível quando sente ao
mas também ao nível da sociedade, onde existe
seu lado um ombro no qual pode apoiar-se. Os mol-
uma grande simpatia tanto para com o Portugal his-
davos e os portugueses têm um provérbio comum:
tórico como também para com o Portugal moderno.
Um amigo na necessidade é amigo de verdade.
Acredito piamente que este sentimento é recíproco.
Durante todos estes 20 anos de independência,
Moldávia e Portugal são, geograficamente falando,
Portugal apoiou Moldávia nas suas aspirações de-
dois extremos do mundo latino na Europa, mas es-
mocráticas e nos esforços da reintegração territorial
tes extremos esquecem as distâncias e convergem
do país. Mais – e quero sublinhar este momento a
em direcção aos mesmos ideais.
■
maio/agosto 2011 - Diplomática • 47
Espaço diplomático
Norbert Konkol - Embaixador da Hungria
ser mais forte e mais profunda no final da presidência húngara do que foi no início. Isto é um grande sucesso, mas não essencialmente da presidência, mas de todos nós, da Europa. Ao lado da gestão da crise, as outras tarefas podem perder a sua visibilidade, apesar de terem a mesma importância. Do ponto de vista da política energética comum, os acordos assumidos no Conselho Europeu de 4 de Fevereiro são de grande importância. Os acontecimentos no Norte de África (fonte importante da energia consumida na Europa) e o grave acidente nuclear no Japão comprovaram a justificada preocupação da nossa presidência. Temos que continuar a trabalhar a sério no reforço da segurança energética da Europa. Ao lado dos avanços no terreno da energia, alcançamos importantes compromissos quanto ao futuro da política agrária comum (PAC) e a política da coesão, um dos pilares fundamentais de toda a União Eu-
Lema da presidência húngara: Europa Forte
ropeia, uma política que é fruto da solidariedade europeia e é de primordial importância, tanto para Portugal, como para a Hungria.
Desde 1 de Janeiro de 2011, e durante seis meses, a Hun-
Felicitamo-nos pela boa aceitação da cooperação macro
gria assumiu a presidência rotativa do Conselho Europeu
– regional, designada por Estratégia do Danúbio, que se
da União Europeia. É a primeira vez que somos presiden-
tornou um modelo que outros países e regiões querem se-
tes e olhamos para Portugal, que tem dimensões e popula-
guir. A Presidência Húngara lançou a Estratégia Romã que
ção semelhante à nossa, como um exemplo a seguir, dado
procura uma resposta a nível europeu e um quadro para
que é um estado-membro que já cumpriu com sucesso
solucionar os problemas da minoria cigana.
três períodos presidenciais.
Ficaram na agenda ainda muitos desafios: a questão da
De onde vem o sucesso de uma presidência? – é uma
imigração divide fortemente os estados-membros. A Presi-
pergunta recorrente .
dência Húngara entende a importância política deste tema.
Essencialmente, do facto de não deixar cair, de não perder
Quanto à adesão da Roménia e da Bulgária à área Schen-
o legado que nos foi confiado. Levar por diante esse pro-
gen, a Presidência Húngara procura um compromisso que
jecto, num bom rumo, de forma a encontrar as soluções,
seja aceitável para todos. Fechar as negociações sobre
e, ao mesmo tempo, não esquecer que a alma da Europa
a adesão da Croácia à União Europeia foi e será sempre
não reside nos dados macroeconómicos, mas sim dentro
uma prioridade da nossa presidência.
nós.
A presidência rotativa oferece uma oportunidade para o
Em 2011, o Mundo, e, naturalmente, a União Europeia,
país se apresentar. Temos muito gosto em receber os
atravessam grandes mudanças, inesperadas. A crise eco-
nossos parceiros europeus no palácio favorito da Rainha
nómica global, o colapso de sistemas que pareciam infalí-
Sissi – bem conhecida também pelos portugueses – em
veis, os novos desafios, determinam as tarefas. O Tratado
Gödöllő, que foi restaurado e renovado justamente para
de Lisboa marca o quadro de actuação para a presidência.
acolher as reuniões da Presidência Húngara. É bem-vin-
A Presidência Húngara tem sucesso? – questionam – nos.
do o crescente interesse pela política e pela economia da
Definimos como padrão de sucesso, desde o início, o
Hungria. E, aspecto que também não se deve esquecer,
reforço da integração, propósito ao qual se relaciona
respeita à gastronomia húngara, os deliciosos pratos e os
o lema da nossa presidência: uma Europa Forte. As
bons vinhos das nossas regiões vinícolas.
decisões do Conselho Europeu de Março definiram: com
Até agora sentimos a simpatia e o apoio moral e profis-
as medidas tomadas com o objectivo de evitar a crise
sional dos nossos parceiros europeus, a cooperação é
económica e a sua repetição, a integração europeia vai
exemplar. Desde já agradecemos a todos. ■
48 • Diplomática - maio/agosto 2011
grande Entrevista
Jorge Braga de Macedo
por António Alte Pinho e Maria da Luz de Bragança, fotos de Lígia Correia
Presidente do Instituto de Investigação Científica Tropical «Angola é a minha segunda pátria!» É infindável o curriculum do Prof. Dr. Braga de Macedo, mas, normalmente, as pessoas comuns reconhecem-no por ter sido ministro das Finanças, um cargo que, provavelmente, a ele colou a imagem “sisuda” que lhe construíram. Mas é de uma simpatia extrema e de um refinadíssimo sentido de humor. A conversa correu solta e rápida, porque, logo a seguir, fomos, na companhia de um diplomata brasileiro, visitar a fantástica exposição “Viagens e Missões Científicas nos Trópicos – 1883/2010”, patente no Palácio Condes da Calheta, no Jardim Botânico Tropical, em Belém, sob a égide do Instituto a que preside.
50 • Diplomática - maio/agosto 2011
➤
A maior parte das pessoas,
do] – com quem me correspondia
Sim, ele conta isso – também esta-
quando ouvem falar do seu
– lançou-me o desafio de Direito.
va por essas andanças –, e tenho
nome, associam-no logo à Eco-
Foi interessante sugestão, porque
por ele também muita considera-
nomia, mas a sua formação ini-
o meu avô, que era economis-
ção.
cial é o Direito. Acabou o curso
ta – José Macedo, que escreveu
Talvez seja altura de falarmos na
em 1971 e foi contemporâneo de
sobre a autonomia de Angola –,
ligação do senhor professor ao
Marcelo Rebelo de Sousa e de
tinha convencido o meu pai a ir
Instituto de Investigação Cientí-
Carlos Veiga, ex Primeiro-Minis-
para Direito. Mas ele resistiu: “não
fica Tropical (IICT).
tro de Cabo Verde…
quero, quero ir para História”. Mas
Entrei no Instituto para dirigir um
Sim, com o Veiga encontro-me
o meu pai disse para ir para Direi-
centro de investigação, que é
muitas vezes nos aeroportos, mas
to. Tive de fazer uma secção de
coisa que os professores fazem
também já nos encontramos fora
Letras do liceu português e entrei
com muita regularidade. Havia um
deles.
na faculdade. A, minha primeira
convénio muito interessante que
Mas, voltando ao seu curso.
incursão em Economia foi com o
o Reitor da Universidade Nova da
Percorreu a parte final dos anos
professor João Lumbrales, que
altura, o professor Alfredo de Sou-
60, tempos de grande agitação.
era muito rigoroso e exigente, mas
sa, trouxe para a Nova, com meu
Sentiu-a à sua volta?
deu-me a nota mais alta que até
predecessor aqui, professor Cruz
Bom, é preciso compreender que,
então havia dado. E, a partir daí,
e Silva, indicando pessoas que
naquela altura, a escola de Econo-
decidi que queria fazer Economia.
estavam a dar aulas para também
mia em Portugal – o ISCEF – es-
Só que havia três, quatro cursos
fazerem investigação nas áreas
tava a decair aceleradamente para
no meio de uma vintena. E, en-
tropicais. Fui convidado, vim aqui,
uma baixa qualidade de ensino.
tão – claro que podia ter ido logo
achei interessante e, depois, a
Embora eu não tivesse bem a
para Económicas, mas iria para um
certa altura, quando isto começou
noção do que era a Economia, e o
sítio péssimo –, acabei o curso de
a funcionar bem – ainda por cima
meu pai até era historiador econó-
Direito. E, durante muitos anos, fui
o meu primeiro director, professor
mico. Mas, por qualquer razão des-
o único estudante português que,
Luís Albuquerque, era historiador e
conhecida, eu estava interessado
dois meses depois da licenciatura,
matemático, conhecia bem o meu
nas ciências experimentais, porque
já estava nos Estados Unidos a
pai, demo-nos, muito bem -, fui
no liceu era nessa alínea que esta-
estudar Economia para doutora-
ficando. Até porque quando estava
➤
va inscrito. Aliás, ainda estive um
mento. A decisão estava tomada.
nos Estados Unidos tinha estado,
mês inscrito em Medicina.
Só para compreender que foi muito
também, num centro sobre ques-
E em que liceu é que esteve?
importante a minha passagem pela
tões da Economia do Desenvolvi-
No liceu francês.
faculdade, indiscutivelmente, foi lá
mento.
Pois, ali nas Amoreiras…
que já se viviam ao rubro as agi-
Há uma história interessante:
Sim. E tive uma grande sorte com
tações estudantis, com o Alberto
quando fui convidado pelo profes-
os professores que lá tive. Estava
Costa, com o Durão Barroso – que
sor Alfredo de Sousa – que era
na área de ciências. A minha ideia
ainda foi meu aluno – e o Ribeiro
uma pessoa muito frontal –, agra-
era, na altura, fazer Medicina,
Santos [assassinado pela PIDE,
deci-lhe muito e ele respondeu-me:
Psiquiatria, Psicologia… qualquer
em Económicas, em 12 de Outubro
“não me agradeça porque não
coisa nessa linha. Também adora-
de 1972 – nr], que também tive
havia mais ninguém interessado”
va Biologia, gostei muito de Físi-
ocasião de conhecer.
[risos].
ca… Mas o que aconteceu foi que
Chegaram, até, a viver próximo
Foi de uma frontalidade demoli-
não tinha formação de ciências
um do outro.
dora…
sociais, até porque, naquela altura,
Sim, os meus pais moravam na
Mas isto é revelador. Sendo nós
não havia. Mas gostava, também,
freguesia de Santa Isabel e a
um país, enfim, com responsabili-
muito de História, Geografia…
família dele na freguesia de San-
dades na globalização, no desen-
E foi viver para Paris um tempo.
tos. Conheci-o perfeitamente e
volvimento – quer de nós próprios
Pois fui. Nos anos 60 [risos]. E,
chegamos a falar muito. E conheci,
quer de outros territórios –, esta
de facto, senti essas experiências
embora mais tarde o José Lamego.
área está esquecida. E, portanto,
que referiu. Mas decidi voltar, e o
Baleado, também, na altura da
ninguém queria. E para um econo-
meu pai [Jorge Borges de Mace-
morte de Ribeiro Santos…
mista promissor – entre aspas
➤
maio/agosto 2011 - Diplomática • 51
Jorge Braga de Macedo
«Quando fui convidado pelo professor Alfredo de Sousa – que era uma pessoa muito frontal –, agradeci-lhe muito e ele respondeu-me: ‘não me agradeça, porque não havia mais ninguém interessado’»
–, na área da economia e finan-
que ele se lembrasse de mim. E
cendo a parte institucional, esque-
ças internacionais, que é aquela
dei aulas em Angola, durante o
cendo a História, por exemplo. E
em que investigo e escrevo mais, o
serviço militar… portanto, o desen-
é curioso que já o meu avô tinha
desenvolvimento está um bocado
volvimento é uma paixão e uma
essa visão, o meu pai também…
ao lado, não é central. Mas, quan-
coisa muito interdisciplinar. Não se
Quer dizer, enquadrava bem nesse
do ele me falou, percebi que isto
pode analisar o desenvolvimento
universo de referências. Mas,
tinha interesse e fiquei muito grato
só pela parte económica, esque-
curiosamente, não está na moda.
➤
52 • Diplomática - maio/agosto 2011
➤
«Não se pode analisar o desenvolvimento só pela parte económica, esquecendo a parte institucional, esquecendo a História, por exemplo. E é curioso que já o meu avô tinha essa visão, o meu pai também… Mas, curiosamente, não está na moda»
➤
Não estava na moda há 30 anos
vimento do milénio, que é a nossa
grupo da CPLP, mas a verdade é
– quando cheguei aqui ao IICT -, e
missão -, e tem um guineense,
que ninguém liga nenhuma. E isso,
continua a não estar. Ao ponto de
aluno do curso de Estudos Afri-
se quiser, reforça-me na convicção
termos agora uma exposição na
canos da Faculdade de Letras, a
de que é, de facto, uma área que
Faculdade de Letras – que é uma
dizer que considera a CPLP uma
tem de ser desenvolvida porque a
combinação entre os mestres de
instituição fantasma. E o homem
juventude percebe a importância
letras e os objectivos do desenvol-
disse a verdade. Há um pequeno
que tem a parte extra europeia.
➤
maio/agosto 2011 - Diplomática • 53
Jorge Braga de Macedo
«Na tropa fui mobilizado para Angola, nunca até então tinha ido a África e, quando desembarco em Luanda, tenho o chamado déjà vu – eu já aqui estive! Não tinha estado nada»
54 • Diplomática - maio/agosto 2011
A geração mais antiga ainda tem
milénio. E, sem desprimor para
Francês, tenho dado aulas em
estados de espírito a pensar “se eu
Cabo Verde, em Bissau foi apro-
França nos últimos dez anos, vivi
acho que a lusofonia e os países
vada uma declaração sobre os
dez anos nos EUA, onde nasceram
emergentes são importantes, isso
objectivos do milénio, mostrando
os meus filhos… E por qual razão
quer dizer que sou menos euro-
que para os atingir, para além da
há-de ser Angola? Por um lado
peu” – uma visão bisonha! E nesse
vontade política, para além dos
há o meu avô, ele era republicano
aspecto – e fez bem em começar
fundos (medidos como percen-
e foi para lá exilado – e em 1910
por aí –, a minha formação predis-
tagens de ajuda sobre o produto
publicou até um livro intitulado “Au-
põe à interdisciplinaridade. Tenho
interno bruto), há o “conhecimento
tonomia de Angola”, que já vai na
uma área mais bicuda onde traba-
mútuo”. Quando se diz “não es-
terceira edição –, mas há também
lho mais, na investigação, mas nos
quecer Bissau”, está a falar-se de
uma razão muito afectiva: na tropa
outros aspectos serve-me muito.
um conhecimento mútuo que não
fui mobilizado para Angola, nunca
Por exemplo, este Instituto está
é só uns dos outros, mas uns dos
até então tinha ido a África e, quan-
integrado num grupo suportado
outros para chegar a posições co-
do desembarco em Luanda, tenho
pelo Banco Mundial, que apoia a
muns. E isto não é tão trivial como
o chamado déjà vu – eu já aqui
investigação agrícola.
possa parecer.
estive! Não tinha estado nada. E foi
Essa questão que colocou,
Suponha que – como alguma gen-
uma sensação tão forte que amigos
sobre a CPLP é interessante – e
te pouco esclarecida diz – “temos
que conheci lá, nessa altura, ango-
tem a ver sobre o que as pes-
de encontrar posições comuns
lanos e portugueses, continuam a
soas pensam da sua posição
no comércio”. Isso é impossível:
ser meus amigos, continuamos a
no mundo –, nós pensamos que
Portugal nessa matéria tem tudo
ter relações. E não duvido, por um
somos portugueses e só numa
determinado pela Comissão Eu-
momento que seja, que Angola é a
segunda linha pensamos ser
ropeia, o Brasil é um daqueles
minha segunda pátria.
europeus. Antes do europeu
países emergentes que – como
Senti o mesmo quando estive
vem a noção de fazermos parte
a China – estão a abocanhar o
em Santo Antão [Cabo Verde].
de um mundo que fala em portu-
comércio internacional, e depois
Já são dois déjà vu… isto tem de
guês. E parece-me que em Cabo
temos os países africanos que
ficar na entrevista [risos].
Verde está primeiro – como nós
ainda não aproveitam tanto como
Fixando-nos na sua segunda
– a identidade nacional, logo a
deveriam. Como seria possível
pátria. Angola é hoje um dos
seguir a consciência lusófona e
encontrar uma posição comum?
países com maiores índices de
lá no fim a identidade africana.
Aí não! Mas nos objectivos de
crescimento da Economia, mas,
Nós introduzimos uma expressão
desenvolvimento do milénio penso
paralelamente, o desenvolvimen-
para capturar isso, que é a lusofo-
que é possível. E, igualmente, são
to social não tem acompanhado
nia global. Porque a lusofonia – e é
possíveis posições comuns em
a vertente económica, embora
isso que vem no tratado constituti-
matéria de ciência e tecnologia.
pareça que nos últimos tempos
vo da CPLP – é a amizade comum.
Há uma declaração dos ministros
tenha sido feito algum esforço
É um bocadinho retórico, mas é
desta área, datada de 2003, que
para resolver essa contradição.
exactamente isso: são memórias e
envolve este Instituto nessa par-
Exactamente. É um fenómeno
histórias comuns. E é só para sa-
ceria, nessa colaboração. Foram,
sub-regional na África Austral, é
lientar que a lusofonia, como toda
curiosamente, os ministros da
um fenómeno atlântico, e é um
a organização multilateral baseada
Ciência e Tecnologia da CPLP que
fenómeno mundial que todos
numa língua comum, é falar uns
se interessaram pelo património
reconhecem. Enfim, houve guerra,
com os outros. Mas aquilo que es-
deste Instituto.
houve muita destruição. E há falta
tou a tentar promover, em colabo-
É sabido que tem uma relação
de informação sobre a realidade
ração estreita com o Secretariado
muito especial com Angola…
concreta que impede uma aprecia-
Executivo da CPLP é a lusofonia
É a minha segunda pátria, tenho
ção mais objectiva. Por isso, temos
global. E o que é isso? São os
que o dizer.
acordos com as universidades
oito países tentarem encontrar
Bebeu água do Bengo?
angolanas para tentar melhorar
posições comuns sobre problemas
É isso. Vou-lhe explicar, são várias
o conhecimento e, naturalmente,
internacionais, particularmente os
razões e todas elas importantes.
nisso o IICT está em conjunto com
objectivos de desenvolvimento do
Como lhe disse, estive no Liceu
uma série de outras instituições.
➤
■
maio/agosto 2011 - Diplomática • 55
Economia & Finanças
Patrick Siegler-Lathrop is a French-American consultant living in Portugal, with a more than 30-year career as a Wall Street investment banker, entrepreneur, industrialist and professor, having taught at INSEAD and Paris University, Dauphine. He is a founding member of the international NGO Action Contre la Faim.
Patrick Siegler-Lathrop obteve graduações em Princeton, no Institut d’Etudes Politiques de Paris e em Harvard e deu início à sua carreira como banqueiro na área dos investimentos em Wall Street, Nova Iorque. O seu trabalho teve como foco central projectos internacionais ao nível dos países em desenvolvimento, tendo depois vindo a ocupar, em Paris, a posição de co-director na área dos investimentos num banco árabe-internacional. De seguida dedicou-se à indústria em França e mais tarde aceitou os cargos de Professor na Universidade de Paris, Dauphine, e no INSEAD, onde leccionou emprendedorismo de negócios. Juntamente com Françoise Giroud, Jacques Attali, Bernard-Henri Levy e outros nomes bem conhecidos, foi um dos membros fundadores da ONG internacional Acção Contra a Fome, organização essa a que deu o seu apoio durante mais de trinta anos. Actualmente reside em Portugal e trabalha como consultor internacional.
The Financial Crisis
A Crise Financeira
An Overview
Uma Perspectiva
Here we are in the spring of 2011 and the
Porque haveremos nós, europeus, de sofrer os ex-
Western world is still reeling from the effects of
cessos dos E.U.A? Não foi culpa nossa. É isto que
the financial crisis of 2008. What is going on?
ganhamos com a globalização?
Aren't things supposed to be better by now?
Eis-nos na Primavera de 2011 e o mundo Ocidental
What is most surprising is that we are surprised.
ainda se vê a braços com os efeitos da crise finan-
The financial crisis of 2008 is universally
ceira de 2008. O que se passará? Não deveríamos
recognized as the worst since the 1930's. A
estar melhor agora?
crisis of these dimensions causes years of
Antes de mais, o que surpreende é que esta situ-
disruption. It takes many years before economies
ação ainda nos surpreenda. A crise financeira é
fully recover.
universalmente reconhecida como a pior desde a
How did we get into this mess? The U.S. Share
década de 30 do século XX; e vários estudos mos-
of Responsibility
tram que estas crises provocam períodos de pertur-
As we know, the financial crisis began with
bação, levando vários anos para que as economias
an "asset bubble" in the U.S. housing market.
se restabeleçam .
Homeowners in the U.S. were encouraged to
Como chegámos a este descalabro? Os E.U.A par-
borrow against the inflated value of their homes,
tilham responsabilidades.
even to use the money elsewhere (a practice
Como sabemos, a crise financeira começou com a
which is illegal in France). As housing prices
chamada «Bolha» do mercado imobiliário, tendo ha-
continued to rise to exaggerated levels (in the
vido uma sobreavaliação dos preços das casas nos
8 years 1998-2006, prices of homes in the U.S.
E.U.A., alimentada pelo empréstimo maciço para
rose an unprecedented 86%), lenders continued
suportar esses valores exagerados (em 8 anos – de
56 • Diplomática - maio/agosto 2011
➤
➤
➤
to provide more and more loans, ignoring to
➤
1998 a 2006 – o preço real das casas nos E.U.A.
impose minimal qualifications for borrowers, who
aumentou uns sem precedentes 86%).
continued to borrow based solely on the inflated
O colapso dos preços das casas começou em 2007
value of their homes, even though they did not
desbaratando 8 biliões de dólares em termos de
have the income to pay the loans back.
riqueza imobiliária e levou a uma enorme perda de
The collapse of housing prices beginning in
confiança nas instituições financeiras. A falência do
2007 wiped out $8 trillion in home ownership
Lehman Brothers, um dos maiores bancos de inves-
wealth and revealed the gaping hole between
timento, despoletou uma queda maciça nos preços
the quantity of debt and the real value of
das acções em cerca de 55% nos 17 meses subse-
houses, generating huge potential losses and
quentes, gerando dezenas de biliões de dólares em
a complete collapse of confidence in financial
perdas adicionais.
institutions. The bankruptcy of one of the largest
A Administração Republicana decidiu inicialmente
investment banks involved, Lehman Brothers, in
não salvar o banco Lehmans Brothers mas, face ao
September, 2008, triggered a massive - about
impacto devastador dessa decisão, expurgou-se
55% - drop in stock prices over the next 17
da habitual ortodoxia a fim de evitar o colapso total
months, representing tens of trillions of dollars in
do sistema financeiro. Basicamente acabou por
additional losses.
nacionalizar os principais credores das hipotecas,
The U.S. Republican Administration had at the
assim como a maior companhia de seguros (a AIG)
time decided not to save Lehman Brothers.
garantindo um financiamento avultado de forma a
But observing the devastating impact of that
salvar os bancos mais importantes.
decision, they threw out prevailing orthodoxy to
Mas o mal estava feito: paralelamente ao declínio
avoid a total collapse of the financial system and
da actividade bolsista global, as economias dese-
basically nationalizing the principal mortgage
quilibraram-se, as falências multiplicaram-se por
lenders and the largest insurance company (AIG)
todo o lado, o desemprego e a pobreza afectaram
and extending massive financing to save the
dezenas de milhões. Nos E.U.A., a queda na activi-
leading investment and commercial banks.
dade económica não só coloca os bancos em risco,
However, the harm was done, and it had
mas também os gigantes industriais - a General
major global consequences. Everywhere,
Motors e a Chrysler estão já à beira da falência
stock markets declined, economies faltered,
em Dezembro de 2008. O governo dos E.U.A. foi
bankruptcies increased, unemployment and
obrigado a intervir com programas de estímulo para
poverty struck tens of millions. The worse
salvar bancos e grandes indústrias, injectando cen-
recession in 80 years spread throughout the
tenas de biliões de dólares para evitar que a grave
world. In the U.S., the drop in economic activity
recessão se transformasse numa grande depressão
put not only banks at risk, but industrial giants
económica.
as well - both General Motors and Chrysler were
Esta situação não acontece subitamente, foi-se
on the verge of bankruptcy in December, 2008.
avolumando durante décadas, começando com
The U.S. Government was obliged to step in with
uma mudança fundamental na filosofia económica
massive stimulus programs to save banks and
E.U.A. aquando da eleição do presidente Ronald
major industries, pumping hundreds of billions
Reagan em 1980 que, junto com Alan Greenspan,
of dollars to prevent a serious recession from
introduziu uma era de desregulamentação, em es-
becoming a major depression.
pecial do sector financeiro. O resultado foi a criação
These events didn't happen overnight, they were
de um pequeno número altamente lucrativo e muito
in the making for decades, beginning with a
poderoso de bancos comerciais e de investimento.
fundamental shift in U.S. economic philosophy
O seu crescimento espelhou um crescente domínio
at the election of President Ronald Reagan
da finança na economia Americana, com a Wall
in 1980, who, along with Alan Greenspan,
Street a ganhar um enorme poder e a finança a
introduced an era of deregulation, particularly of
eclipsar todos os sectores da economia – por exem-
the financial sector. The result was the creation
plo, em 2008, 40% do rendimento das 500 maiores
of a small number of enormous, hugely profitable
empresas americanas proveio da actividade finan-
and very powerful investment and commercial
ceira (e não da venda de produtos e serviços). Hou-
banks.
ve também uma mudança paulatina e invasiva
➤
➤
maio/agosto 2011 - Diplomática • 57
The Financial Crisis A Crise Finaceira
➤
Their growth mirrored an increasing dominance
➤
na Banca: os bancos comerciais costumavam
of finance in the U.S. economy, with Wall Street
focar-se na protecção dos depósitos dos seus
gaining enormous power and finance eclipsing
clientes e no financiamento do crescimento das
any sector of the economy – for example, in
empresas e comunidades, ao passo que os bancos
2008, 40% of the income of the 500 largest U.S.
de investimento serviam, sobretudo, para financiar
listed companies came from financial activity
a suas empresas e as empresas públicas. Gerar
(and not from selling products and services).
dinheiro era importante, mas a banca era ainda
There was also a gradual but pervasive shift
uma empresa de serviços. Tal já não acontece. Na
in banking: it used to be that commercial
viragem do século, a banca tornou-se num negócio
banks were focused on protecting their clients’
cujo único interesse era o de gerar dinheiro para si
deposits and financing the growth of companies
mesma.
and communities, just as investment banks
Isto terá sido, porventura, uma consequência da
sought to serve their company and government
maior aceitação da filosofia “greed is good” (a cobi-
clients by providing financing. Making money
ça é boa) nos E.U.A., com as subidas espectacula-
was important, but banking remained a service
res na renumeração dos banqueiros de investimen-
industry. No longer. By the turn of the century,
tos e gestores de empresas, com uma crescente fé
banking had become a business solely geared to
no mercado de capitalista selvagem enquanto único
generating profits for itself.
sistema económico viável, com a vontade de uma
This was perhaps a bi-product of a greater
cada vez menor intervenção do Estado (a queda do
acceptance of a "greed is good" philosophy in
muro de Berlim em 1989 e o colapso da ex-União
the U.S., with spectacular rises in remuneration
Soviética vieram solidificar essa fé quase religiosa
of top investment bankers and company
dos americanos nas forças de mercado). Paralela-
managers, an increasing U.S. faith in unbridled
mente dá-se uma maior tolerância em relação ao
market capitalism as the only efficient economic
endividamento, quer do Estado quer da banca, quer
system, with the less Government intervention,
mesmo dos cidadãos.
the better (the fall of the Berlin wall in 1989 and
Estas tendências fundamentais criaram, sem dúvi-
the collapse of the USSR only solidified the
da, um ambiente permissivo, mas a “Bolha” do mer-
U.S.' virtually religious faith in market forces).
cado imobiliário terá sido também alimentada por
In parallel followed a greater tolerance for high
medidas específicas nos últimos anos, incluindo:
levels of debt, be it for governments, banks or
- uma iniciativa estatal do governo americano de
individuals.
promoção à aquisição de casa própria;
These fundamental trends no doubt created a
- as taxas excessivamente baixas do Banco Central
permissive environment, but the housing bubble
Americano;
was also fed by specific measures over the past
- a criação e crescimento desmedido de novos
few years, including:
instrumentos financeiros, que ninguém realmente
- a U.S. Government intent to promote home
percebia ou conhecia o real valor, que providencia-
ownership;
ram um financiamento adicional à enorme subida
- a U.S. Central Bank providing exceedingly low
de empréstimos imobiliários apoiado pelo aumento
interest rates;
do valor nominal das propriedades;
- the creation and enormous growth of new
- Avaliações positivas dadas (alguns diriam, irres-
financial instruments, which no one really
ponsavelmente) pelas agências de rating a esses
understood or knew how to value, providing
novos instrumentos financeiros que, por seu turno,
additional funding for a huge increase in real
deram maior confiança aos investidores para inves-
estate lending backed by rising nominal housing
tir em produtos financeiros que em poucos meses
valuations;
seriam considerados como «lixo tóxico»;
- Rating Agencies (many would say,
- a aceitação, por parte do bancos comerciais e
irresponsibly) providing positive judgments on
de investimento, de uma alavancagem excessiva
these new financial instruments, giving investors
(empréstimos com pouco suporte de capital) em
confidence in investments that would only
número cada vez maior;
months later suddenly be deemed "toxic assets";
- o gasto sem limite dos consumidores americanos
- banks and investment banks accepting
que pediam empréstimos excessivos baseados no
58 • Diplomática - maio/agosto 2011
➤
➤
➤
excessive leverage (borrowing on a low capital
➤
valor empolado das propriedades imobiliárias;
base), substantially increasing their risks;
Tudo isto levou a uma exposição desmesurada do
- U.S. consumers spending without limits,
sistema financeiro ao hipotecar empréstimos de
borrowing excessively on the basis of
credores insolventes tornando-se num “cocktail”
exaggerated housing valuations,all of the above
explosivo.
leading to a huge exposure of the financial
Uma «bolha» acontece quando o mercado, ou seja
system to mortgage loans to unworthy creditors,
a soma da procura e da oferta, acredita que os
an explosive cocktail.
valores continuaram a subir perante uma lógica que
An asset bubble occurs when "the market" - the
sugere precisamente o contrário. Em determinada
sum of buyers and sellers - believes that values
altura, surge um momento de concretização da
will continue to rise in the face of reasonable
antiga parábola «O rei vai nu»: o mercado perde
logic which suggests the opposite. At some
confiança, a “bolha” rebenta e o valor colapsa. E
point, there comes a moment of realization
com o mercado a oscilar, poderá ser excessivamen-
that "the emperor has no clothes", the market
te positivo haver confiança. A perda desta acarreta
loses confidence, the bubble bursts, and values
custos igualmente excessivos.
collapse. And just as "market swings" may be
E isso foi o que aconteceu em 2008 e, como tal,
excessively positive when there is confidence,
estamos a sentir ainda os efeitos e continuaremos a
loss of confidence leads to losses which are just
senti-los por mais algum tempo.
as extreme.
Como chegámos a isto? Quais as responsabilida-
That is what happened in 2008; we are still
des da Europa?
feeling the effects, and will continue to do so for
Porque haveremos nós, europeus, de sofrer os
some time.
excessos dos E.U.A.? Não foi culpa nossa. É isto
How did we get into this mess? What is the
que ganhamos com a globalização?
Responsibility of Europe?
É fácil, e muitos diriam até legítimo, colocar a culpa
Why should we Europeans suffer from U.S.
inicial e principal da crise financeira no sistema
excesses? It was not our fault. Is this what we
Americano, com todas as partes a contribuírem
get from Globalization?
para os excessos: o Estado, reguladores legais,
It is easy, and many would say quite legitimate,
banqueiros gananciosos, agências de rating irres-
to place the initial and principal blame for the
ponsáveis e consumidores perdulários, mas os
financial crisis on the U.S. system, with all
Europeus não são chamados à responsabilidade,
parties seeming to contribute to the excesses:
particularmente nas fases subsequentes da crise.
the Government, lax regulators, greedy bankers,
O que significa a globalização? Significa que as
irresponsible rating agencies and spendthrift
comunicações são tão fluidas que é fácil para um
consumers, but Europeans are not bereft of
banco em Frankfurt ou Reykjavik participarem
responsibility, particularly in the subsequent
em negócios em Nova Iorque. Muitos dos bancos
phases of the crisis.
europeus foram tão activos quanto os seus pares
What does globalization mean? It means that
americanos na compra de investimentos america-
communications are so fluid that it is easy for
nos «tóxicos». Tanto os bancos americanos como
a bank in Frankfurt, or Reykjavik, to participate
europeus espalharam agressivamente o modelo
in deals in New York, so many European
americano pela Europa, onde o empréstimo exaus-
banks were just as active as their American
tivo também levou ao aumento do preço das casas
counterparts in purchasing U.S. "toxic assets".
excessivamente em países como a Irlanda, a Espa-
Both U.S. and European banks aggressively
nha e o Reino Unido.
spread the U.S. model to Europe, where
A mutuários europeus não solventes foram igual-
expansive lending also pushed up housing
mente oferecidos termos de dívida generosa por
prices excessively in Ireland, Spain, the U.K.
parte dos bancos em toda a Europa, seguindo o
Non-creditworthy European borrowers were also
exemplo dos E.U.A. de aumentar a sua alavanca-
offered generous debt terms by banks all over
gem (emprestando mais sobre uma pequena base
Europe following the U.S. example of increasing
de capital), o seu perfil de risco, e a sua rentabilida-
their leverage (borrowing more on a small capital
de.
base), their risk profile, and their profitability.
A globalização significa também que se houver o
➤
➤
maio/agosto 2011 - Diplomática • 59
The Financial Crisis A Crise Finaceira
➤
What globalization also means is if there is a
➤
mais pequeno pânico no mercado imobiliário ame-
wind of panic in the U.S. housing market, and
ricano ou na Wall Street, imediatamente terá efeitos
on Wall Street, it will immediately affect the
psicológicos no resto do mundo e a não ser que
psychology of the rest of the world, and unless
haja razões locais fortes para travar a tendência, o
there are strong local reasons to buck the trend,
medo torna-se global.
then the fear becomes global as well.
Com o advento da recessão global e com os riscos
With the advent of a global recession, and risks
para a banca e para a indústria disseminados, os
to the banking and industrial sectors everywhere,
governos de todo o mundo seguiram o exemplo
governments all over the world followed the U.S.
americano de contrair cada vez mais empréstimos,
example of borrowing more to pump money into
de forma a injectar dinheiro na economia a fim de
the economy, to save banks and industries.
salvar bancos e indústrias.
But in Europe, greater government borrowing
Porém, na Europa, os empréstimos públicos não
could not have come at a worse time. Because
poderiam ter vindo em pior altura. Devido ao bai-
of lackluster growth in many European
xo crescimento em muitas das economias euro-
economies over the past decade, governments
peias ao longo da última década, os governos já
had already been running deficits beyond
se tinham tornado deficitários para além de seus
their means. The European social model was
meios. O modelo social europeu ficou claramente
clearly under considerable pressure, with many
sob considerável pressão, com muitos observado-
considering that Europe could no longer afford
res a considerarem que a Europa não podia mais
excessively generous publicly financed pension
pagar os generosos regimes de pensões, finan-
schemes growing in cost for markedly older
ciados publicamente, a uma crescente população
populations. With the effects of global recession,
significativamente mais velha. Com os efeitos da
all European governments were faced with the
recessão global, todos os governos europeus foram
additional problem of declines in revenues (from
confrontados com o problema adicional de queda
lower tax receipts) and increases in expenditures
na receita (de menores receitas fiscais) e aumentos
(to cover higher unemployment), so already high
nos gastos (para cobrir o aumento do desemprego).
government deficits grew substantially, requiring
Desta forma, os défices orçamentais já elevados
still more government borrowing.
aumentaram substancialmente, exigindo ainda mais
Borrowing large amounts is not necessarily
empréstimos do governo.
bad, if markets are confident the borrower has
O financiamento de grandes quantias de dinhei-
the long-term ability to reimburse the debt. But
ro não é necessariamente mau, se os mercados
countries such as Greece, Ireland and Portugal
confiarem que o mutuário tem a capacidade a longo
not only have very high levels of government
prazo para reembolsar a dívida. Mas países como a
debt, but structural weaknesses in their
Grécia, Irlanda e Portugal não só têm níveis muito
economies - fragile banks, relatively high labor
altos de dívida pública, como também apresentam
costs, high individual debt, poor tax collection,
grandes debilidades estruturais nas suas econo-
expensive pension regimes, a declining share
mias - os bancos frágeis, os custos laborais relati-
of exports and large current account deficits -
vamente elevados de dívida alta, impostos baixos,
leading to the market’s reaction reflecting some
regimes de pensão caros, um declínio de exporta-
doubt about the ability of these countries to
ções e os grandes deficits em conta corrente - que
continue to pay off high and increasing levels of
leva à reacção do mercado, reflectindo uma certa
debt.
dúvida sobre a capacidade desses países de conti-
As always with markets, once confidence is
nuar a pagar crescentes níveis de dívida.
lost, values decline dramatically: for example,
Como sempre acontece com os mercados, uma
as market fears around Portuguese debt grew,
vez que a confiança é perdida, os valores declinam
the value of Portuguese debt securities declined
dramaticamente. Por exemplo, como os receios do
precipitously and the cost of borrowing rose
mercado em torno da dívida portuguesa cresceram,
quickly to an unsustainable level.
o valor de títulos de dívida portuguesa caiu vertigi-
What can a country like Portugal do to get out
nosamente e o custo dos empréstimos subiu rapi-
of the mess? Under normal circumstances,
damente a um nível insustentável.
Portugal would almost certainly consider a
60 • Diplomática - maio/agosto 2011
➤
O que pode um país como Portugal fazer para sair
➤
➤
large devaluation of its currency, combined
➤
desta situação? Em circunstâncias normais, Por-
with imposing much higher interest rates and
tugal quase certamente consideraria uma grande
government fiscal discipline. Such an approach,
desvalorização da sua moeda, combinada com a
although not without pain, would if applied with
imposição de taxas de juros muito mais elevados
discipline, almost certainly provide the basis
e disciplina fiscal do governo. Essa abordagem,
for an attractive medium-term solution for the
embora não sem dor, se aplicada com disciplina,
country.
certamente fornece a base para uma solução atrac-
However, Portugal is in the Euro zone, it has lost
tiva a médio prazo para o país.
control over exchange rate and monetary policy
No entanto, Portugal está na zona do euro, que per-
to the European Central Bank in Frankfurt, so
deu o controlo sobre a taxa de câmbio e a política
neither devaluation nor raising of interest rates is
monetária do Banco Central Europeu em Frankfurt.
possible.
Por isso, nem a desvalorização ou a elevação dos
What about rescheduling its debt? This is not
juros é possível.
an option for the moment, as it would close
E quanto à renegociação da dívida? Esta não é uma
off access to financing, which the country
opção no actual momento, uma vez que iria impedir
desperately needs to refinance existing maturing
o acesso ao financiamento, que o país necessita
debt. And since much of the Government debt
desesperadamente para refinanciar a dívida existen-
is owned by banks (domestic and foreign),
te em maturação. E uma vez que grande parte da
rescheduling would add a major risk to the
dívida do governo é da propriedade de bancos (na-
banking system.
cionais e estrangeiros), o reescalonamento acrescen-
So long as it is in the Euro zone, the Portuguese
taria um grande risco para o sistema bancário.
Government has had no other choice but to turn
Enquanto estiver na zona do euro, o Governo Por-
to the European Union, the European Central
tuguês parece não ter outra escolha senão recorrer
Bank and the IMF to ask for help, which has
à União Europeia e ao FMI para pedir ajuda, o que
led to the recently announced agreement for a
levou ao estabelecimento do acordo recentemente
78 billion bailout over three years. Is it a "good
anunciada de 78 milhares de milhão de euros com
agreement for Portugal", as outgoing Prime
resgate nos próximos três anos. "É um bom acordo
Minister Jose Socrates has said? It is too early
para Portugal", como disse o demissionário Primei-
to say.
ro Ministro, José Sócrates? É cedo demais para
But just as Portugal initially gained from
dizer isso. Mas após Portugal ter inicialmente ga-
participating in the Euro zone, recent events
nho ao participar na zona euro, os acontecimentos
show that when things become more difficult, the
recentes mostram que, quando as coisas se tornam
Euro may be as much of a burden as it has been
mais difíceis, o euro passa a ser mais um fardo do
a benefit.
que um benefício.
n
n
1 See for example the excellent study by Reinhart and Rogoff, "The Aftermath of Financial Crises", a paper prepared for a meeting of the American Economic Association on January 3, 2009. 1 Vide “The Aftermath of Financial Crises” de Reinhart and Rogoffr, artigo publicado aquando a reunião da Associação Americana de Economia ao 3º de Janeiro de 2009; 2 In the U.S. financial market, debt instruments are given a "rating", like a grade, by supposedly independent Rating Agencies, which rating generally determines the value the market gives to the debt. The three dominant Rating Agencies, Moody's, Standard and Poor's and Fitch, often gave their highest "AAA" rating to debt instruments secured by real estate assets which proved to be hugely overvalued. 2 No Mercado financeiro Americano, aos instrumentos de dívida é dada uma classificação (rate) pelas supostamente independentes agências de rating que servem para avaliar o valor de mercado da dívida. A três agências mais importantes - Moody's, Standard and Poor's and Fitch – bastas vezes deram a cotação máxima de AAA a instrumentos de crédito suportados pelo calor de propriedades imobiliárias que vieram a se verificar como muito sobrevalorizados. 3 It is troublesome, although not surprising, to note that not a single person in the U.S. has been prosecuted, among those having contributed to the loss of ten of trillions of dollars and the huge increase in poverty, and although certain measures have been taken, for example, to reduce the level of leverage or borrowing that banks may take on, none of the measures the U.S. has put into place addresses the fundamental cause of the financial crisis. It is back to business as usual with spectacular profitability for the leading banks. 3 Nestas convulsões, apesar de não ser surpresa nenhuma, nenhuma pessoa, entre aqueles que contribuíram para a perda de dez biliões de dólares e acentuado aumento dos níveis de pobreza nos E.U.A, foi indigitada. Pese embora algumas medidas tenham sido tomadas como, por exemplo, a redução do nível de alavancagem ou de empréstimo que os bancos podem aceitar, nenhuma se dirige directamente às causas fundamentais da crise financeira. 4 The current account is a country’s net balance of exports and imports, plus current financial flows, but excluding capital accounts. Portugal's current account deficit has remained around a dangerously high 10% of GDP for the past decade. 4 A conta corrente é o saldo líquido de um país das importações e exportações, além dos actuais fluxos financeiros, mas excluindo as contas de capital. O défice de Portugal em conta corrente manteve-se em torno de um perigosamente alto 10% do PIB na última década.
maio/agosto 2011 - Diplomática • 61
Economia & Finanças
«Troika» traçou diagnóstico do País e estabeleceu compromisso para empréstimo de 78 mil milhões
Chegaram a ser designados por Cavaleiros
depressa possível», afirmou Poul Thomsen,
do Apocalipse, mas, na verdade, as equi-
que liderou essa equipa. O FMI irá contribuir
pas lideradas por Jürgen Kröger (Comissão
com um terço do valor do pacote de ajuda a
Europeia), Rasmus Rüffer (Banco Central
Portugal (26 mil milhões de euros), naquele
Europeu) e Poul Thomsem (Fundo Monetá-
que será o terceiro maior empréstimo actual
rio Internacional), nos poucos dias em que
da instituição em 58 países, depois da Grécia
estiveram em Portugal, ouviram diversas
e México.
entidades públicas e privadas, analisaram as
O impacto do plano sobre a economia vai ser
condições financeiras do país, o estado dos
severo. O país estará em recessão pelo me-
sectores da economia com maiores dificul-
nos até 2012 – com uma contracção do PIB
dades e traçaram o diagnóstico da situação,
de 2% –, o desemprego vai subir até aos 13%
delineado num memorando de medidas de
em 2013 e a dívida pública disparará cerca de
compromisso para, em troca, o país receber
50%, passando de 83,3% do PIB (151 mil mi-
uma ajuda financeira de 78 mil milhões de
lhões de euros) para 130% (229 mil milhões).
euros. Contrapartidas definidas pela troika
Contas feitas, Portugal irá deter a segunda
«como ambiciosas, equilibradas e realistas»
dívida pública mais alta da Europa, a seguir à
e que irão permitir a Portugal voltar a crescer
Grécia (150% do PIB), ultrapassando países
em 2013 e regressar aos mercados «o mais
como Itália, Irlanda, Bélgica e Islândia.
n
maio/agosto 2011 - Diplomática • 63
gestores internacionais
Fernando Mendes,
Administrador-delegado da Legrand por António Alte Pinho, fotos Lígia Correia
Uma viagem ao futuro Um país constrói-se com a força e capacidade empreendedora dos homens. E não deve ceder ao conformismo. Fernando Mendes é uma voz contra a resignação
➤
64 • Diplomática - maio/agosto 2011
Uma visita à Casa Domótica é
preenchida com a satisfação do de-
onde produzi sempre os melhores
um momento inesquecível. E, se as
ver cumprido, por isso as palavras
produtos fabricados na Europa ou
nossas memórias recuarem no tem-
saem soltas e firmes, ininterruptas,
no mundo. De maneira que, agora
po, ficaremos com a ideia de termos
como que antevendo as perguntas
também na Legrand, é mais um
entrado numa série de ficção cien-
do jornalista que, avisadamente, o
desses casos”, dispara como que a
➤
tífica. Só que não é! Passados os
deixa continuar a oratória, quase
desafiar aqueles que fazem da im-
primeiros momentos de surpresa,
não o interrompendo.
potência forma de estarem na vida.
descemos à Terra e damos por nós
Percebe-se o amor que o liga ao
E percebe-se outra coisa, o nos-
dentro da “casa inteligente” da Le-
país, a sua vontade em ajudar a
so interlocutor tem uma confiança
grand, em Carcavelos – uma casa
superar as dificuldades que to-
fundada na mão-de-obra que ajuda
“de verdade” que Fernando Men-
dos atravessamos, sem nunca
ao crescimento da empresa e à sua
des, o Administrador delegado da
se render ao fatalismo daqueles
posição referencial no mercado.
multinacional francesa em Portugal,
que se entregam às dificuldades
“As tomadas e os interruptores que
nos mostra sem esconder o orgulho
colocando-se do lado da doença.
fabricamos são, muito possivelmen-
de estar a fazer história. A ficção já
Por isso acredita na capacidade
te, os melhores produtos do mundo
era. O futuro é uma realidade!
produtiva nacional e nas energias
na sua área”. Uma visita às insta-
A conversa começa dentro da
positivas que podem enfrentar a cri-
lações fabris permite-nos perceber
própria casa modelo da Legrand. O
se. “Sempre vi as unidades indus-
que a cadeia produtiva está assen-
Administrador-delegado não perde
triais do país a produzirem óptimos
te em elevados padrões tecnológi-
tempo em frases de circunstância,
produtos. De maneira que aquele
cos. A linha de montagem está cen-
porque para este homem o tempo
discurso, para mim perfeitamente
trada na robotização, os operários
é coisa preciosa que tem de ser
idiota, de que em Portugal não se
mais parecem “cientistas” caídos ali
administrada com parcimónia… E
produz nada como deve ser é um
de um filme de ficção científica. O
vai direito ao assunto: “Exportamos
discurso que não compreendo, não
controlo de qualidade rege-se por
80 por cento da nossa produção.
aceito… é o discurso de pessoas
elevados patamares de rigor e todo
Contrariamente a muitos dos meus
que não querem ou não sabem de-
o processo está concebido para
concorrentes, sou um exportador de
senvolver o nosso país”, diz com a
que as pessoas não sejam peças
produtos, não sou um exportador
segurança de quem não se entrega
de uma engrenagem mas técni-
de divisas” – só para que, logo no
a depressões nem espera que os
cos habilitados que emprestam à
início, tudo fique claro. E di-lo com o
outros venham resolver por si. A
tecnologia o olhar cuidado de uma
orgulho de alguém que sabe serem
sua confiança nesta, estranhamente
formação contínua – grande aposta
difíceis estes tempos e a economia
sempre tão esquecida capacidade
da empresa.
precisa do dedicado esforço de
empreendedora dos portugueses,
A menina dos olhos
todos.
está presente em cada palavra dita
Sem dúvida, a Casa Domótica é a
Fernando Mendes trabalha em
e na firmeza de um olhar que nunca
sua menina dos olhos. Uma casa
Portugal desde 1979. A sua história
se refugia na impotência: “tive a
que “permite aos portugueses vive-
de vida profissional é muito rica e
sorte de dirigir unidades industriais
rem de uma forma mais cómoda, de uma forma mais segura. Uma casa
Um homem dos “sete instrumentos”
inteligente, comandada através
Fernando Mendes, um engenheiro electrotécnico formado no Instituto
de um telemóvel, de forma remota
Superior Técnico, está ligado ao sector eléctrico desde sempre. Após
de qualquer ponto do mundo”. E
acabar o curso (1975), ruma à Suécia, especializando-se na área de
de tal forma assim é que, a título
protecção de redes eléctricas. Em 1979 regressa a Portugal onde traba-
de exemplo, imagine-se na China,
lha ligado à área de equipamentos de energia, nomeadamente no sector
tocam-lhe à campainha da sua
de redes eléctricas. Após a experiência, mantém-se cinco anos na área
casa de Lisboa e, surpresa das sur-
dos telefones móveis e, posteriormente, no comando e controlo de
presas, remotamente e através do
centrais eléctricas e infra-estruturas de telecomunicações. Passou pela
telemóvel você mesmo pode falar
Sorefame, com competências de gestão, e ali se manteve até aceitar
com o visitante, vendo em tempo
uma proposta da Legrand para dirigir a empresa em Portugal, corria o
real essa pessoa. É o utilizador que
ano de 1996.
programa todo o sistema de acordo ➤
■
maio/agosto 2011 - Diplomática • 65
Fernando Mendes
“Aquele discurso, para mim perfeitamente idiota, de que em Portugal não se produz nada como deve ser é um discurso que não compreendo, não aceito… é o discurso de pessoas que não querem ou não sabem desenvolver o nosso país”
com as suas necessidades.
monitorização da segurança, o céu
Moçambique e Cabo Verde, um
“Mesmo técnicos que têm um co-
parece ser o limite e, com o andar
volume de negócios para exporta-
nhecimento avançado, chegam aqui
dos tempos e o aumento da procu-
ção na ordem dos 35 milhões de
e dizem: ‘mas pensávamos que isto
ra, a Casa Domótica poderá vir a
euros – o que, em plena recessão
era o futuro’. E nós dizemos: não,
estar à disposição de bolsas mais
não deixa de ser um valor surpreen-
com a Legrand, isto já é o presen-
modestas, “democratizando-se” o
dente. Em 1981 a Legrand, adquire
te”. E é mesmo! As opções são pra-
universo de consumidores.
a empresa J. B. Corsino e, em 88,
ticamente ilimitadas, com soluções
Um colosso empresarial
adquire a Sociedade Industrial de
acessíveis facilmente programadas
Com mais de 160 unidades es-
Produtos Eléctricos, cuja fábrica é
➤
e reprogramadas pelos usuários.
palhadas pelo mundo, o grupo
a que a empresa francesa agora
Após uma breve explicação do fun-
Legrand aposta forte no mercado
ocupa, transformando duas unida-
cionamento e da compreensão da
nacional, cuja fábrica de Carcave-
des de nível médio num grande acti-
sua lógica, os técnicos da Legrand
los tem considerável autonomia.
vo de produção, como já se disse,
tornam-se dispensáveis. Das tare-
No plano internacional, a fábrica
fundamentalmente virado para a
fas mais comezinhas como abrir e
nacional exporta para 50 a sessen-
exportação, dotando o país de uma
fechar estores, desligar e ligar elec-
ta países de todos os continentes,
unidade de excelência no sector de
trodomésticos, até à manipulação
nomeadamente países africanos de
infra-estruturas eléctricas e tecnolo-
de sistemas de rega de jardins e
língua portuguesa, como Angola,
gias de informação para edifícios.
66 • Diplomática - maio/agosto 2011
n
One of the best
O Prazer de um Encontro Sinta o momento. E deixe o tempo parar.
Convidamo-lo a acompanhar-nos até à Quinta da Aveleda numa viagem dos sentidos.
➤
maio/agosto 2011 - Diplomática • 67
Quinta da Aveleda
➤
Produzir uma grande aguardente como a Adega Velha, requer tempo, mas não só. É
necessário muito mais. Tudo começa nas vinhas da Quinta da Aveleda, em Penafiel, onde são seleccionadas as uvas que estão na origem de um vinho equilibrado na acidez e rico no aroma. É esse vinho que vai ser posteriormente submetido a duas lentas e cuidadas destilações em alambique Charentais, trazido especialmente da região de Cognac, em França. Na penumbra da adega, ao som de cânticos gregorianos, cada fenda, cada recanto testemunha o profundo sono de 10 anos deste precioso néctar. A magnífica cor âmbar e a riqueza do bouquet são o resultado do repouso longo e preguiçoso em cascos de carvalho da região de Limousin, famosos pelas características únicas da sua madeira. São ao todo 398 pipas. A aguardente mais antiga é de 1974, a mais recente de 2009.
No centro do corredor estreito da adega está em exposição a primeira garrafa da Aguardente Adega Velha, datada de 12 de Maio de 1971. Ao lado, também em mostra, está a garrafa, trazida da Rússia por um antepassado da Família Guedes, que serviu de inspiração ao modelo actual.
68 • Diplomática - maio/agosto 2011
➤
➤
Com uma tonalidade intensa e sabor suave e equilibrado, a Adega Velha apresenta
uma riqueza de aroma a lembrar bagas e flores silvestres, envolvida por uma sensação delicada de aroma e travo a madeira nobre. A sua origem em uvas aromáticas e frescas com baixo grau alcoólico, provenientes da Região Demarcada dos Vinhos Verdes, confere-lhe a suavidade, o aveludado e a complexidade aromática tão apreciados.
Ligações Perfeitas A Aguardente Adega Velha é ideal para servir como digestivo, acompanhada de chocolate preto com canela e por um Charuto Montecristo n.º 4 ou uma cigarrilha VegaFina. Deve ser servida a uma temperatura entre os 18 e 20º C.
Um hino aos sentidos e à vida. Uma obra-prima que se escreve lentamente e que vale a pena partilhar com aqueles de quem mais gostamos.
n
maio/agosto 2011 - Diplomática • 69
Crónica de uma visita
Roderick Micallef,
director geral do Corinthia Hotel Lisbon
Requinte e bom gosto
A manhã começara pouco auspiciosa, as
o homem do volante apresentou-se falador
trovoadas nocturnas, a insónia e mais dois
e dado à chalaça. Pois… – dizia eu a cada
ou três textos que me haviam sobrado
invectiva do “fogareiro”. Por fim, lá percebeu
pela madrugada, anunciavam um dia para
que o cliente havia acordado com os pés de
esquecer. Eis que, inesperadamente, o
fora e, logo de seguida, acelerou a máquina
telemóvel toca. Era a Directora…
empreendendo louca corrida pelas ruas de
…Se eu podia passar pelo Corinthia, ali na
Lisboa.
Columbano Bordalo Pinheiro, o Director-geral
Chegados ao hotel, o porteiro simpático e
do hotel aguardava-me para pequena con-
formal logo se adestrou a abrir a porta do
versa. E logo nesse dia. Apanhei um táxi,
carro. Saí, olhei para cima e não me
70 • Diplomática - maio/agosto 2011
➤
Corinthia Hotel Lisbon
➤
agradou muito o que vi. O edifício é com-
tempo frágil e firme, de quem me interpe-
pacto bloco de betão, vidro e altura irrom-
lava. Teresa de Châtillon apresentava-se-
pendo pelo céu adentro, qual foguetão.
me com um sorriso envolvente e a postura
De pé atrás, lá entrei e os meus olhos
sóbria de Directora de Relações Públicas. O
reviraram-se num misto de surpresa e en-
dia começava a nascer, abrindo a esperan-
cantamento. A arquitectura exterior, própria
ça de uma visita inesquecível ao hotel de
de uma época em que “ser moderno” era
Sete Rios.
construir para cima rompendo o infinito
A passos cadenciados, acertando o ritmo
na ostentação de grandeza, confrontava-
com a conversa anfitriã, lá nos fomos diri-
se com o refinado gosto da arquitectura
gindo, eu, a Teresa e a Lígia – a fotógrafa
interior, da escolha elegante dos móveis, da
da revista que, entretanto, chegara -, para
exímia combinação de quadros e bibelôs,
o majestático elevador espelhado e am-
da criteriosa arrumação de
plo que nos conduziu ao
equipamentos e discreto
A arquitectura exterior, própria
Executiv Club onde, numa
profissionalismo dos fun-
de uma época em que “ser mo-
ampla sala de reuniões,
cionários.
derno” era construir para cima
nos aguarda Roderick Mi-
Segunda surpresa: o rodo-
rompendo o infinito na ostenta-
callef – o jovem Director-
pio de hóspedes, pagando
ção de grandeza, confrontava-
geral da unidade hoteleira.
contas ou fazendo o check
se com o refinado gosto da ar-
Terceira surpresa! Aliada
in, induzia ao pensar – en-
quitectura interior, da escolha
à simpatia de Roderick,
ganador – de estarmos no
elegante dos móveis, da exímia
a vista sobre Monsanto
átrio de um aeroporto, tal
combinação de quadros e bibe-
quase me roubou a fala.
era o número de pessoas.
lôs, da criteriosa arrumação de
Do alto daquela torre que,
O que é contraditório. O
equipamentos
à chegada, havia olhado
Corinthia é um hotel de
num misto de surpresa e
cinco estrelas, um tipo particularmente não
desencantamento, o parque natural parecia
dado a afluências massivas… Puro engano!
entrar pela vidraça adentro e, por momen-
Ao requinte do luxo – discreto e elegante,
tos, vivenciei memórias de caminhada
diga-se de passagem – alia-se a “demo-
remota por socalcos e veredas, inalando
cracia” dos preços, abrindo portas a várias
o cheiro campestre e retendo o estridente
bolsas e fazendo da unidade hoteleira refe-
som dos pássaros anunciando o retempero
rencial para estadias de trabalho e breves
breve de energias e a exaltação da alma.
passagens turísticas por Lisboa.
A vista é deslumbrante, fazendo-nos até
Anunciei-me a um dos recepcionistas, que
irrelevar a tendência arquitectónica que,
se me dirigiu com um sorriso discreto e uma
tapando o horizonte da cidade, encheu
elegância própria a tratamento de príncipes.
Lisboa de elegias pungentes dessas criatu-
Tamborilando os dedos por uma das mesas
ras que, com razão ou sem ela, atazanam,
do foyer, reclinando-me na confortável
não raras vezes insanas, a paciência de
cadeira e olhando de soslaio o vai e vem da
quem lê jornais e faz zapping pela pasma-
entrada, aos poucos, começou a apagar-se
ceira noticiosa das televisões… Adiante. O
a incomodidade de uma manhã que previa
arquitecto do espaventoso edifício estava
pouco auspiciosa.
perdoado. Razões maiores de paisagem
A voz da senhora, aveludada e firme,
sobrepunham-se à discutível estética.
despertou-me do vaguear mental a que me
Conhecer Roderick foi a quarta surpresa! O
entregara. Levantei-me, percorri o olhar a
seu precário português, entrecruzando-se
três quartos de mim e, numa segunda sur-
com o meu limitado inglês – com vantagem
presa, vislumbro a graciosidade, ao mesmo
para ele pelas melhores razões –,
➤
maio/agosto 2011 - Diplomática • 71
Corinthia Hotel Lisbon
1
2
3
1. Um bar acolhedor 2. Uma vista sobre Lisboa 3. O requinte de uma sala privada do Executive Club ➤
abriu caminho à conversa solta. Logo no
com os clientes, foi assimilando as contingên-
início desmanchamo-nos a rir. Falávamos de
cias de um negócio que, pese embora uma
nacionalidades e o Director-geral atirou: “sou
passagem de sete anos pela auditoria e con-
maltês”… Inicialmente não percebeu a graça,
sultadoria de contabilidade, se lhe entranhou
mas, com tacto e diplomacia lá lhe fui dizen-
na pele como coisa inexorável.
do que nesta língua de Camões a designa-
E tanto é assim que, num impulso, respondeu
ção quer dizer… vadio, vagabundo. Agora,
a anúncio da maior empresa hoteleira do seu
foi ele que se desmanchou e logo anunciou:
país, precisamente a Corinthia, e veio a assu-
“vou passar a dizer que sou de Malta”. É
mir o cargo de director financeiro. Anos mais
que, como dizia o outro, o português é muito
tarde, chega a Portugal como representante
traiçoeiro…
da empresa na sociedade partilhada de ou-
A hotelaria entrou-lhe cedo pela vida adentro.
tras unidades hoteleiras. De seguida – como
A família era proprietária de um pequeno ho-
uma inevitabilidade – é nomeado Director-
tel – em Malta, naturalmente – e Roderick foi
geral do Corinthia Hotel Lisbon.
“pau para toda a obra”. Mas nesse universo
Há oito anos que Lisboa é sede do lar que
familiar, na partilha de saberes e no convívio
partilha com a mulher e os filhos. A capital
72 • Diplomática - maio/agosto 2011
➤
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4. O charme discreto do bom gosto 5 e 6. Malo SPA, o paraíso aqui tão perto
➤
acolheu-o generosa, nesse velho abraçar
e acanhadas ideias. Ou, ainda, no Malo SPA
de culturas que são linha genética da alma
– seguramente o melhor da capital -, espa-
portuguesa. Sente-se em casa!
ço de tratamento do corpo e ambiência zen
E em casa senti-me eu, percorrendo os
apelativa à introspecção. Ao início da noite,
corredores amplos do Corinthia, recolhendo
a mestria gourmet do Corinthia espera-nos
em cada detalhe a perenidade do bom gosto
envolvente, permitindo viagem deslumbrada
que, mesmo com o passar dos anos, sempre
pela gastronomia de autor, ou, para gostos
fica como memória colectiva e imagem de um
mais simples, a jóia aconchegante da gastro-
estilo que, seguramente, será ainda o mote
nomia nacional.
de quem - partindo aqueles que hoje “aqui”
À saída, a certeza de que a manhã desse dia
moram - segurará o manifesto elegante de
que parecia aziago, foi momento único, pela
um conceito de hotelaria já com meio século
envolvência do espaço, o prazer da conversa
de história.
e a corrente de afectos que fruiu no conheci-
Vale a pena ir. Nem que seja para beber um
mento mútuo e na afinidade do bom gosto.
n
copo, ao final da tarde, no magnífico jardim
Texto: António Alte Pinho
traseiro – coisa única nesta Lisboa de betão
Fotos: de Lígia Correia
maio/agosto 2011 - Diplomática • 73
Viagens & Lazer
Turismo em Angola Clima de paz e desenvolvimento propiciou aumento da procura
Cachoeiras do Binga Praias deslumbrantes, uma fauna e flora inigualáveis, excelente gastronomia, são alguns dos atractivos que o turista encontra em Angola. Para fazer face à crescente procura, o Governo aposta em mais unidades hoteleiras, formação de quadros qualificados e num plano estratégico de “marketing” e promoção.
Um sector em crescente desenvolvimento, eis como
Para fazer face à procura, o Executivo angolano prevê
pode ser encarado o Turismo em Angola. De acordo
criar, em 2011, um plano estratégico de marketing e
com o Ministério do Planeamento, o país vai registar,
promoção para o turismo, que visa a divulgação das
em 2011, um movimento de cerca de 500 mil turistas.
potencialidades turísticas do país
Estes números constam do relatório do Ministério
Estes dados optimistas já tinham sido objecto de refe-
do Planeamento sobre o Plano Nacional 2011/2012,
rência por parte do vice-ministro angolano da Hotela-
apresentado no Seminário Nacional sobre Sistema de
ria e Turismo, Paulino Baptista, ao visitar a Bolsa de
Planeamento, Sistema Estatístico Nacional e Orçamen-
Turismo de Lisboa de 2011, que decorreu em Fevereiro
to Geral do Estado (OGE).
passado, na FIL.
O relatório refere que para este ano está previsto um in-
Paulino Baptista, que foi acompanhado pelo embaixador
cremento de 82 mil visitantes. Em 2010, visitaram Ango-
de Angola em Portugal, José Marcos Barrica, e de altos
la 397 904 turistas, já em 2009 o número de visitantes
funcionários do seu ministério, disse que o turismo é
foi 365 784 e em 2008 ainda menos, 294 258 turistas.
“essencial” para o contínuo crescimento da economia
Ou seja, uma procura sempre em crescendo!
do país, exortando a importância do seu fomento.
74 • Diplomática - maio/agosto 2011
➤
Fendas de Tundavala
➤
O governante angolano lembrou “que a qualidade do
Além destes elementos típicos da cultura, fauna e flora
turismo em Angola, ainda em fase de crescimento, tem
angolanas, alguns recursos naturais e monumentos
aumentado nos últimos anos, graças ao clima de paz,
históricos, tais como a figura do pensador (símbolo ori-
estabilidade e desenvolvimento que o país vive”.
ginário da cultura tchokwé), a Palanca Negra Gigante,
Durante os cinco dias do certame, Angola esteve repre-
o embondeiro e outros símbolos de interesse turístico
sentada por mais de 30 operadores do ramo hoteleiro e
estiveram patentes no evento, através de cartazes, pos-
de agências de viagem, possibilitando firmar parcerias
tais, fotografias e guias turísticos.
de investimentos e financiamentos, capazes de aumen-
Durante a feira foi também promovida a cultura, com
tar a importância económica do turismo. No certame,
peças de artesanato e danças, os hotéis, restaurantes
Angola apresentou as zonas turísticas como as Fendas
e sítios, assim como troca de experiência com inves-
de Tundavala e Serra da Leba, na província da Huíla,
tidores e turistas de países dos continentes africano,
as Quedas de Calandula, de Mussequele e Pedras de
europeu, americano e asiático.
Pungo Andongo (Malanje), as Quedas do Mupa (Huam-
A capacidade hoteleira angolana – um dos problemas do
bo), as Cachoeiras do Binga (Kwanza Sul).
sector com uma maior procura versus oferta por parte
➤
maio/agosto 2011 - Diplomática • 75
Turismo em Angola
Mussulo
➤
das unidades turísticas – está a ser reforçada com a
perímetro. Numa primeira fase, os pólos serão imple-
conclusão, em 2011, de cinco novos hotéis nas provín-
mentados nas localidades de Calandula,na província
cias de Luanda, Benguela, Cabinda, Huíla e Namibe,
de Malanje, Cabo Ledo ( Bengo) e Okavango ( Kuando
projectadas inicialmente para apoiarem o Campeonato
Kubango).
Africano das Nações (CAN). A par disso, o arranque da
Não faltam atractivos
edificação de escolas para as formação hoteleira e turis-
Angola é um país de riquezas naturais e ambientais
mo em Benguela e Huíla,Luanda está na sua fase final,
deslumbrantes, comportando, desde os seus 1650 Km
sinal de que existe uma procura de qualidade da oferta,
de costa ao interior, inúmeras riquezas naturais. Estão
nos seus Vários níveis, por parte dos responsáveis do
lá as grandes florestas tropicais, rios, lagos, quedas
sector.
d’água, montanhas, formações rochosas extraordiná-
Entre as principais metas do Ministério da Hotelaria e
rias, cavernas e grutas, desertos e praias belíssimas.
Turismo para este ano, de relevar a reclassificação dos
O território angolano abriga também uma fauna extensa
hotéis já existentes em função dos serviços já prestados
que inclui elefantes, antílopes de diversas espécies,
e a melhoria dos serviços nos empreendimentos hotelei-
leões, zebras, gazelas, rinocerontes, hipopótamos, gira-
ros e similares, regulando e disciplinando as actividades
fas, avestruzes, macacos, gorilas etc.
de acordo com os padrões internacionalmente aceites.
Destaques
Outro dos objectivos para 2011 é o início da criação de
Ao sul de Luanda, encontra-se a “ilha” do Mussulo, na
pólos turísticos em pontos do País com potencialidades
realidade uma restinga envolvida por uma série de pe-
naturais atraentes em conformidade com a especifici-
quenas ilhas. O visitante pode escolher: o lado continen-
dade de cada região, integrando em cada projecto a
tal, de águas calmas, ideais para a prática de desportos
edificação de hotéis, restaurantes e lodges num mesmo
náuticos, e característica cobertura de coqueiros;
76 • Diplomática - maio/agosto 2011
➤
Paços do Concelho, Benguela, Parque Nacional de Kissama e Pedras de Pungo Andongo
➤
ou o lado oceânico, com o mar de águas limpas mais
Lobito. Nas principais cidades é possível encontrar um
agitado, quebrando junto à praia de areia branca e qua-
povo alegre e receptivo. Pode-se conhecer ainda repre-
se deserta, habitada apenas por pescadores nativos.
sentantes legítimos de grupos étnicos que conservam
Parque Nacional de Kissama (província do Bengo)
suas tradições originais, como os mucubais (província
Actualmente, o que apresenta melhor estrutura para re-
do Namibe, sudoeste do país), os cuanhamas (Cunene,
ceber o turista, já que contou com vultuosos investimen-
no sul) e mumuílas (Huíla, sul).
tos do governo e pelo facto de estar próximo de Luanda.
Gastronomia
Parque Nacional do Iona
Destacamos o prato típico de Angola, o funge, uma
Região do deserto do Namibe (na província de mesmo
espécie de polenta cremosa feita com farinha de man-
nome, ao sudoeste do país). Nas proximidades, há ain-
dioca ou de milho. O acompanhamento pode ter: a
da a Reserva do Namibe
quisaca (folhas do pé de mandioca maceradas, cozidas
Palmeirinhas
e temperadas); o peixe fresco ensopado; o peixe seco
A grande praia de Palmeirinhas, também ao sul de
cozido ou assado; a galinha cabidela (ao molho pardo);
Luanda, com suas ondas mais pronunciadas, fica a
a muamba (prato à base de galinha, amendoim, quiabos
base do Miradouro da Lua, uma formação de falésias
e outros temperos); ou o feijão preparado no óleo de
que permite desfrutar uma bela vista do mar angolano,
palma (tipo de azeite de dendê), entre outros.
principalmente no pôr-do-sol.·
Para quem gosta de frutos do mar o destaque vai para
Benguela
os pratos preparados à base de lagosta ou camarão,
Na província de Benguela, destaque para as praias de
que podem ser encontrados a preços convidativos em
Caota, Caotinha, Baía Azul e Baía Farta, ao sul da ca-
vários restaurantes e bares da cidade e também na orla
pital. Ao norte da cidade de Benguela, fica a restinga do
da “ilha” do Cabo (na baía de Luanda).
n
maio/agosto 2011 - Diplomática • 77
Diplomacia no feminino
As Primeiras Damas de Belém Memórias e confissões das mulheres dos presidentes da República em democracia retratadas em livro que foi apresentado no Jardim da Cascata, no Palácio de Belém
Elas foram testemunhas fundamentais dos primórdios da democracia em Portugal, contactaram com protagonistas célebres da vida contemporânea, protagonizaram histórias e lembranças, tornaram-se vanguardistas de causas sociais, cúmplices e apoiantes nos bastidores das decisões dos maridos. “As Primeiras Damas” deste país estão, pela primeira vez, retratadas no livro da jornalista Alberta Marques Fernandes, apresentado em lugar condigno, no Jardim da Cascata, do Palácio de Belém. Um evento que contou com a presença inesperada de Aníbal Cavaco Silva, que fez questão de cumprimentar a autora que respondeu a um desafio lançado pela Esfera dos Livros. Um desafio bem sucedido. Coube a Leonor Beleza fazer a apresentação da obra, destacando a “dignidade e sobriedade” das personalidades em foco e o facto de “escolherem a sua visibilidade para ajudarem as pessoas e uma enorme força para dar apoio aos respectivos maridos na sua função e para criarem o seu próprio papel na sociedade”. Quatro Primeiras-Damas do pós-25 de Abril, cujas memórias foram recolhidas pela jornalista, estiveram ali pela primeira vez reunidas, partilhando um momento único, carregado de emoção , é claro, de memórias. Manuela Eanes, Maria Barroso, Maria José Ritta (Jorge Sampaio também assistiu à cerimónia) e Maria Cavaco Silva (ladeada pela filha, Patrícia, e pelos netos, Mariana e Afonso). Alberta Marques Fernandes teve a sua lado a filha, Luísa, cujo crescimento acompanhou o desenvolver deste livro. Na fotografia de grupo da capa do livro faltam Maria Helena Spínola, a mulher discreta do primeiro Presidente da República do pós-revolução, general António de Spínola e Maria Estela Costa Gomes, que, segundo se lê no livro, estabeleceu uma “relação inquebrável” do marechal Costa Gomes, o sucessor de Spínola e que chegou a confessar os seus “dias de tédio” em Belém. Ambas já desaparecidas, preferiram , na altura, permanecer na sombra dos maridos, enquanto as restantes quatro encontraram nas suas funções uma oportunidade única de ajudar quem mais necessitava, abraçando causas solidárias várias. Mas todas elas, sem excepção, foram testemunhas privilegiadas dos momentos mais marcantes desta jovem democracia (a entrada para a CEE, por exemplo), privando com os protagonistas mais célebres da História contemporânea, como foi o caso de Margareth Thatcher, François Mitterrand, os Papas João Paulo II e Bento XVI, Nelson Mandela, Madre Teresa de Calcutá e os reis de Espanha e do Reino Unido, com quem estabeleceram até relações de profunda amizade, que privilegiam até hoje. Em conversas especiais, únicas mesmo, Maria Alberta Fernandes recolheu as suas memórias, algumas nunca contadas, lembranças que as paredes do Palácio Belém tinham guardadas em bom recato e que jamais esquecerão. As quatro, sem excepção, revelaram que as decisões do Presidente são sempre muito solitárias e que, politicamente,
78 • Diplomática - maio/agosto 2011
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maio/agosto 2011 - Diplomรกtica โ ข 79
As Primeiras Damas
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não procuraram influenciar as decisões dos maridos. Preferiram mesmo
dedicar-se às causas sociais, ainda que Manuela Ramalho Eanes tenha admitido que é muito diferente ser mulher do Presidente a seguir a uma revolução, do que quando a democracia já está estabilizada. Opinião semelhante manifestou Maria Barroso, que entende que agora se vive uma época difícil, em que é preciso dar as mãos e deixar de lado as ideologias políticas de forma a vencer as dificuldades - esse um factor comum que parece agora unir estas quatro Primeiras-Damas, sinais que continuam atentas ao Mundo que as rodeia e aos seus factores de crise.
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Texto: Maria Dulce Varela Fotos: Presidência da República / Luís Catarino
80 • Diplomática - maio/agosto 2011
Mala diplomática
Dia Nacional do Paquistão
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Por ocasião do Dia Nacional do seu
que congratula a adopção de uma
1. Embaixadores do Paquistão
país, o Embaixador do Paquistão,
resolução que teve lugar na cidade
2. António Alvim e Ana de Brito
Albert Matondang, convidou para
histórica de Lahone, em 1940, e
a sua recepção, que teve lugar no
que votou pelo estado independen-
Hotel Tivoli em Lisboa, persona-
te do Paquistão. Sete anos depois,
4. Dom Duarte de Bragança
lidades dos mais diversos meios
sob a liderança de Quaid-i- Azam
5. Paula Bobone e Ana Calheiros
sociais, diplomáticos, económicos e
Muhammad Ali Jinnah, a 14 de
6. Lénia Godinho e Për Störm
políticos.
Agosto de 1947 nasceu um país.
7. Embaixadores de França
Apesar das recentes dificuldades
A reunião decorreu num ambiente
devido à catástrofe que assolou o
de grande cordialidade, os convida-
Paquistão, o Embaixador não quis
dos desfrutaram de um magnífico
deixar de comemorar o Dia Nacio-
cocktail, repleto de sabores e tem-
nal do seu país. Um aniversário
peros típicos.
3. Alice Mateus, Embaixadora do Paquistão, Ana Caetano e António de Macedo
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maio/agosto 2011 - Diplomática • 81
mala diplomática
Dia Nacional da Sérvia Festa em ambiente… clássico
Prestes a deixarem Portugal, os
a Sérvia e Portugal: a passagem do
embaixadores Dusko e Nina Lopan-
centenário da aplicação do primeiro
dic receberam os inúmeros amigos
Tratado Comercial assinado entre
e membros do Corpo Diplomático
os dois países, ratificado em 1911;
no Palácio Foz, Lisboa
e terem decorrido 70 anos desde a
Por ocasião do Dia Nacional da
entrada do então Reino da Jugos-
Sérvia, a Embaixada daquele país
lávia na Segunda Guerra Mundial,
em Lisboa organizou um recital,
facto que também teve algumas
seguido de cocktail, no Palácio Foz,
consequências importantes nas re-
Lisboa.
lações bilaterais dos países, como
Aleksandar Vujic, pianista, compo-
lembrou o diplomata:. “Foi a partir
sitor e director de orquestra sérvio,
de Lisboa que, em Maio de 1941,
iniciou o recital com seis peças
um grupo de cidadãos jugoslavos,
da sua autoria. Na segunda parte,
no qual se incluiam alguns diploma-
o cantor baixo-barítono Svetozar
tas, foi evacuado de vários países
Vujic, interpretou obras de Scarlatti,
da Europa ocupada num comboio
Mozart, Williams, Isidor Bajic, Taj-
especial. Lembramos que no grupo
cevic e A. Vujic. O programa incluiu
de diplomatas contavam-se dois
ainda, como artista convidada, a
grandes poetas e escritores sérvios:
pianista Ivana Talijan, cidadã sérvia
Milos Crnjanski e Jovan Ducic. Este
residente em Lisboa, que interpre-
último foi, inclusivamente, envia-
tou Rigoletto de Liszt.
do diplomático da Jugoslávia para
O evento contou com a presença
Portugal».
de cerca de 200 convidados, entre
Apontando, em seguida, alguns dos
destacou as áreas da cooperação, em crescendo, entre a Sérvia e Portugal, desde a Política, Assuntos Militares à area Científica, sublinhando que a Cultura pode ser um bom veículo para que os povos dos
os quais se encontravam membros
objectivos políIticos e económicos
do Corpo Diplomático acreditado
do seu país – entre os quais, se
em Portugal, personalidades da
inclui a integração na União Euro-
vida política portuguesa, da área
peia – Dusko LopandiK destacou as
económica, da cultura e membros
áreas da cooperação, em crescen-
da comunidade sérvia em Portugal
do, entre a Sérvia e Portugal, desde
(diáspora).
a Política a Assuntos Militares, da
Os actuais Embaixadores, Dusko
Cultura à área Científica.
e Nina Lopandic, estão em Portu-
“Faremos todos os esforços para
gal há cerca de quatro anos e irão
que essa tendência continue. Esta-
abandonar o país brevemente.
mos todos empenhados em que a
Ambos estabeleceram ao longo dos
Sérvia não seja conhecida apenas
últimos anos um elevado número de
pelos seus excelentes jogadores
relações e amizades em Portugal,
de ténis ou por Emir Kusturica. É
primando pela simpatia no trato.
necessário que os dois povos se co-
Vão, certamente, deixar sauda-
nheçam melhor, e a cultura é o me-
des…
lhor meio, na minha opinião, para
O embaixador Dusko Lopandic
que tal aconteça. Gostaria apenas
proferiu algumas palavras alusivas
de lembrar que, no ano passado,
ao acto, lembrando que, em 2011,
organizámos exposição colectiva
se comemoram dois acontecimen-
de pintores jugoslavos, sob o nome
tos importantes nas relações entre
“Carrefour”, em Lisboa», disse.
82 • Diplomática - maio/agosto 2011
O embaixador Dusko Lopandik
n➤
dois países se conheçam melhor
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1. Embaixador da Sérvia Dusko Lopandic e sua esposa, Embaixatriz Nina Lopandic 2. Embaixatriz do Luxemburgo Nadine Schmitt, Embaixatriz da França Pascalle Teixeira da Silva e Christina Gillies 3. Nuno Vaz de Moura e Embaixador da Croácia Zeljko VUkosav 4. A estilista Gertrudes Évora Turner com a Embaixadora da Noruega Inga Magistad 5. O futebolista sérvio Vukasin Devic e sua noiva. 6. Conselheira Katarina Milenkovic
maio/agosto 2011 - Diplomática • 83
Solidariedade
Soroptimist International Mulheres solidárias despertam consciências “Soroptimist International é a mais antiga e a maior
ências para este flagelo, que contou com a presen-
organização mundial de Mulheres Profissionais que
ça do Ministro da Administração Interna Rui Pereira
nasceu em Oakland, Califórnia em 1921, hoje com
que fez uma brilhante e instrutiva alocução sobre
mais de 90.000 membros em todo o mundo, organi-
este crime, e ainda com as interessantíssimas
zadas em Clubes locais congregados nacionalmen-
palestras da Senhora Secretária de Estado Para a
te numa União que reporta a uma das cinco Fede-
Igualdade Elza Pais, da Directora do Observatório
rações mundiais geograficamente organizadas, que
do Tráfico de Seres Humanos Joana Wrabetz, da
por sua vez reportam à Presidente Mundial.
Inspectora Luisa Maia Gonçalves que tem no SEF
Os objectivos desta organização mundial são os da
altas responsabilidades, do Director Executivo do
promoção dos Direitos Humanos e, em particular
Centro Europeu que define a policy para a Europa
o estatuto da Mulher, a protecção das Crianças,
nesta matéria Peter von Bethlenfalvy , de Manuel
manter vivo e activo o espírito de serviço e de soli-
Albano - Coordenador a nível nacional do Tráfico
dariedade contribuindo para a compreensão interna-
de Seres Humanos sob a égide da Secretária de
cional e amizade universal, assumindo a função de
Estado para a Igualdade e da Presidência do Con-
alertar consciências para a necessidade de ajudar à
selho de Ministros, do Director-Geral no Ministério
eliminação da pobreza, da discriminação de género,
dos Negócios Estrangeiros da Turquia na área do
do tráfico de seres humanos, de formas de violência
Asilo, Vistos e Tráfico de Seres Humanos Berlan
contra mulheres e crianças e para a promoção da
Pars Alan e de Teresa Rosmaninho, membro do
igualdade de acesso à educação e à saúde.
Clube Soroptimista Porto Invicta, que fundou e
O primeiro Clube em Portugal que se constituiu em
dirige a Casa Porto de Abrigo que recolhe Mulheres
1985, foi o SI Clube Lisboa Fundador, actualmente
Vítimas de Violência e de Tráfico. Presidiu à sessão
Presidido pela Advogada Lénia Godinho Lopes,
a Presidente Mundial do Soroptimist International
que em iniciativa conjunta com a Embaixatriz da
Hanne Jensbo e foram Moderadoras das Mesas a
Áustria Joana Wrabetz, organizaram uma recolha
Presidente da União de Portugal Graça Viegas e
de fundos a favor da CAP – Centro de Acolhimento
a Presidente do SI Clube Lisboa Fundador Lénia
e Protecção a Vítimas de Tráfico de Seres Huma-
Godinho Lopes. Os assistentes a esta Conferencia
nos, através de um jantar oferecido pela Senhora
foram muito participativos tendo-se destacado a in-
Embaixatriz na Residência Oficial dos Embaixado-
tervenção do Embaixador da Suécia, país que tem
res da Áustria, que além de ter recolhido fundos
sido pioneiro em legislação que tem como objectivo
e proporcionado uma agradável confraternização
combater este tipo de criminalidade.
entre todos os presentes, permitiu a divulgação da
Seguiu-se um Recital de Piano por Teresa da
obra que a CAP está a desenvolver no acolhimen-
Palma Pereira no Palácio Foz, uma jovem Pianista
to de Mulheres Vitimas de Tráfico, tendo havido
já com créditos dados a nível internacional e que
também uma mostra de vários objectos feitos pelas
muito orgulha o nosso país nos vários concursos
Mulheres acolhidas nesse Centro, que foram ad-
internacionais em que tem ficado em primeiro lugar.
quiridos pelas participantes, revertendo o produto
A fechar as comemorações do quarto de século de
de tal venda a favor das suas autoras, dando-lhes
Soroptimismo em Portugal realizou-se o jantar que
assim, além de um pequeno benefício pecuniário,
teve lugar no Palácio Magalhães, com um espec-
estimulo e integração. O jantar contou também com
táculo produzido por Telmo Miranda, cuja voz, bem
uma interessante palestra de Ana Vicente, que
como a de Ana Lains e a intervenção do mágico
falou sobre A Mulher e a República, tendo sido feita
Ricardo, proporcionaram ao evento lindíssimos
uma retrospectiva do papel da Mulher na República
momentos, tendo terminado com a alegre, divertida
e dos avanços e recuos do seu estatuto durante
e muito profissional actuação da Tuna de Farmá-
estes cem anos.(ver fotos).
cia, para gáudio dos participantes portugueses e
No âmbito das comemorações do 25ºAniversário
estrangeiros, sendo que para esta Conferencia
do SI Clube Lisboa Fundador, foi também organiza-
Internacional e eventos, vieram a Portugal repre-
da uma Conferência Internacional sobre Tráfico de
sentantes de doze países estrangeiros, com uma
Seres Humanos, com o propósito de alertar consci-
forte participação dos Países nórdicos.
84 • Diplomática - maio/agosto 2011
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1. Jantar comemorativo dos 25 anos do Soroptimismo no Palácio Magalhães 2. A pianista Teresa Palma Pereira com as flores entregues por Lenia Lopes, presidente do SI Lisboa Fundador 3. Maria da Luz de Bragança com Isabel Ernani Lopes 4. A Embaixatriz da Austria, presidente do Soroptimismo em Portugal com a Dra. Lenia Lopes 5. A Embaixatriz e Dra. Ana Vicente que falou sobre a" Mulher e a Répública"
maio/agosto 2011 - Diplomática • 85
Cultura
Mário Lúcio Sousa
por António Alte Pinho, foto de José Ramos
O ministro artista
Precocemente, riscava no chão térreo, com o pequeno dedo de menino de 5 anos, as palavras mágicas que, já soletrando, lia de rótulos de embalagens de banha, de manteiga ou azeite, arquitectando uma estrutura mental de analogias com as aventuras de criança
com clara visão de um projecto de Cultura activo, mobilizador e eficaz. Andarilho deste nosso Mundo de diversidades, de miscigenações e cruzamento de culturas, Mário Lúcio Sousa cedo se amanhou no universo das letras. Precocemente, riscava no chão térreo, com o pequeno dedo de menino de 5 anos, as palavras mágicas que, já soletrando, lia de rótulos de embalagens de banha, de manteiga ou azeite, arquitectando uma estrutura mental de analogias com as aventuras de criança. Prenúncio seguro de outras aventuras – coisas É um dos nomes maiores da cultura cabo-verdia-
mais “sérias” de adulto –, o ministro, na pacatez
na. Músico, compositor, cantor, escritor, drama-
mansa de um de hotel da cidade da Praia, vai
turgo, poeta… o universo de Mário Lúcio Sousa
para meio ano, explicou com os olhos brilhantes
espraia-se por quase todas as áreas da cultura e,
das memórias do passado: “Lda., que surgia no
ao que dizem, a sua acidental passagem por telas
rótulo da banha junto a um braço forte, era para
e pincéis não foi de todo irrelevante. Exigente, o
nós ‘braço forte, lida’, de lidar, pelejar. Havia mui-
recém-empossado ministro da Cultura de Cabo
ta viagem na minha cabeça”.
Verde, decidiu suspender – esperemos que não
A adversidade, porém, tocou-lhe cedo à porta da
ad eternum – a sua experiência nas artes plás-
vida. Aos 12 anos, órfão e desesperado pela des-
ticas, por considerar ter mais engenho noutras
dita, foi colocado sob tutela do Exército – corriam
artes.
os primeiros anos da independência – e viveu
Que me recorde, antes de Mário Lúcio, só outro
num quartel, inaugurando aí os primeiros contac-
artista abraçou a pasta da Cultura de uma nação
tos com a música que, anos mais tarde, o haviam
– refiro-me, obviamente, a Gilberto Gil, convida-
de levar ao fantástico grupo Simentera. Antes,
do por Lula da Silva –, pelo que a sua nomeação
ainda, a guarida do Estado havia de lhe proporcio-
para a pasta suscitou, de imediato, alta expecta-
nar a primeira grande aventura de viagem: Cuba.
tiva nos meios culturais das ilhas da Morabeza.
No país de Pablo Milanés – terra semeada por
É que o novo ministro é visto como homem de
escravos, nisso comum às ilhas distantes da Mo-
diálogo, não permeável a sectarismos bacocos e
rabeza –, Mário cursa Direito, convive com
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O Novíssimo Testamento «No tempo em que os Portugueses imperavam sobre o arquipélago de Cabo Verde, aconteceu num domingo de Páscoa, na minúscula freguesia do Lém, estar a morrer a mulher mais beata que a ilha de Santiago conhecera. Interpelandoa as netas sobre a sua última vontade, não quis ela, como seria de esperar, chamar o padre, respondendo em vez disso que gostaria de ser fotografada. Porém, assim que o flash disparou, um mistério inexplicável varreu a ilha de lés a lés; e, quando, ao fim de muitas peripécias, a fotografia foi finalmente revelada, a surpresa foi tão impossível que não houve, no mundo inteiro, uma só alma que conseguisse manter a boca fechada. A ilha quase ia ao fundo com a confusão… Se o Antigo Testamento anuncia a vinda do
sempre polémica vida de Cristo. E se Jesus ressus-
Messias e o Novo Testamento narra a vida, a
citasse mulher? – é a interrogação enfatizada numa
morte e a ressurreição de Jesus, este Novíssimo
obra fundamental de ler por crentes e não crentes.
Testamento é uma autêntica revolução: pois dá
Obra onde se confirma que, para além da música,
testemunho da reencarnação de Jesus no corpo
Mário Lúcio, é uma revelação referencial na litera-
de uma mulher – ilhéu e africana – que parece
tura lusófona. Ou não tivesse ele sido vencedor do
ter vindo inaugurar a Terceira Idade do Mundo,
Prémio Literário Carlos de Oliveira, em 2009.
mas não está livre de enfrentar os preconceitos
E que dizer de “Kreol” – o seu último trabalho
sociais, religiosos e políticos do seu tempo.» [da
discográfico –, navegando no mar encrespado dos
Sinopse]
sons, tendo por companheiros de mareagem figu-
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ras como Milton Nascimento, Pablo Milanés, Harry Belafonte, Pedro Joia, Teresa Salgueiro e Cesária músicos e abre o seu espírito às sonoridades
Évora, entre outros? Magnífico! Viagem pelas dife-
quentes da América Latina, o cruzamento perfeito
renças colectivas que, na fusão do convívio e dos
com os sons da música cabo-verdiana, que cultiva.
afectos, fazem de nós mole humana de crioulos, de
Chegado a Cabo Verde, o recém-licenciado abre
navegadores da diversidade universal – o que só
escritório de advogado e inicia carreira que pare-
nos enriquece.
cia promissora, mas o universo da música e das
Regressando ao bar do hotel, tempo ainda para
letras plasma-se inexorável na trajectória do ju-
recordar as palavras do novo ministro: “Somos pou-
rista. Simentera, o Quintal da Música – espaço de
cos, somos pequeninos e temos, necessariamente,
artistas, gastronomia e irreverências – são vulcão
de aprender com os outros e absorver. Foi isso que
de emoções que não mais o abandonou. Antes,
me levou, hoje em dia, a falar abertamente com os
muito antes - ainda jovem imberbe - ensaia breve
africanos para que aceitem que não somos só afri-
passagem pelo jornalismo, outro prenúncio pelo
canos. E falar abertamente com os europeus, para
chão consistente das letras, terra de que medra-
que aceitem que nós somos também de origem eu-
ram várias incursões nos contrafortes da poesia,
ropeia. É esse o fenómeno da crioulização”. É esse
da dramaturgia e do romance, de que o revelador
o pano de fundo de “Kreol”, muito bem expresso
“O Novíssimo Testamento” é expressão prenhe
nas palavras finais de Mário Lúcio, nessa tarde de
de uma narrativa cuidada e surpreendentemente
cavaqueira que partilhou com o jornalista: “Viver no
simples, navegando num mundo mágico e trans-
planeta mais pequeno do sistema solar e confinar-
cendente de interrogações sobre a enigmática e
me a uma esquina, seria muito triste”.
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n
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Cultura
nha igualmente funções de leitora do IC na Universidade de Chulalongkorn. Os tailandeses, acrescenta, «reconhecem» essa aliança «como ímpar na sua relação com o ocidente. Não só é a mais antiga, como tem a virtude de nunca ter sido ensombrada por qualquer tentativa de soberania». O facto de coincidir com os 500 anos da tomada de Malaca pelos portugueses nem sequer constitui verdadeiramente um problema. Afinal, Albuquerque, ao apoderarse daquele porto crucial no comércio com as Molucas, a China e o Extremo Oriente – a única entidade política que na península malaia escapava então à soberania do Sião – procurou a aliança dos tailandeses. Para o embaixador de Portugal em Banguecoque, Jorge Torres Pereira, «quanto mais cultivada a consciência de como ocorreram efetivamente certos factos históricos, e tentando colocar as reações a determinados eventos (como a consolidação dum ponto estratégico como Malaca num empreendimento tão complexo como a expansão do comércio marítimo entre a Europa e a Ásia) no seu devido tempo histórico e enquadramento geopolítico mais se evitará exacerbar sensibilidades, que, temos consciência, estão bem presentes». O facto de se falar em aliança não é uma mera bravata histórica. Durante séculos, existiu na Tailândia uma comu-
Portugal – Tailândia:
nidade portuguesa, cuja autorização de permanência no
Uma aliança com 500 anos
país vinha de uma longa série de serviços prestados aos monarcas siameses. «Fernão Mendes Pinto, na sua pas-
Não é todos os dias que vemos dois países tão distantes
sagem por Ayutthaya, a que chamou Veneza do Oriente,
entre si – pelo menos geograficamente –, como Portugal e
relata a contribuição dada pelos soldados de fortuna por-
a Tailândia, assinalarem os 500 anos do primeiro contacto,
tugueses nas diversas campanhas siamesas contra os rei-
especialmente se tivermos em conta que os primórdios do
nos vizinhos; a guarda pessoal dos reis siameses integrou
relacionamento entre ocidentais e asiáticos nem sempre
soldados portugueses pelo valor do seu conhecimento na
gozam dos favores das historiografias locais. Só que as
utilização das armas de fogo e o bairro português chegou
relações tecidas entre Portugal e a Tailândia, o então o rei-
a contar cerca de 2.000 pessoas», diz Luía Dutra.
no do Sião, foram, a todos os títulos, peculiares ao longo
O primeiro tratado entre o Sião e um país ocidental – Por-
dos séculos.
tugal – data de 1516. Nos seus termos, «os portugueses
O que se está então concretamente a comemorar? Muito
acordaram em fornecer armas e munições ao Sião em tro-
simplesmente «a chegada de Duarte Fernandes, enviado
ca da autorização do estabelecimento de feitorias comer-
de Afonso de Albuquerque, durante o cerco a Malaca, à
ciais em Ayutthaya, Ligor, Patani, Tenasserim e Mergui.
corte do rei Rama Tibhodi II», em Ayutthaya (a capital à
Também lhes foi concedida a liberdade de culto religioso»,
época), diz Luísa Dutra, responsável pelo Centro Cultural
segundo descreve o historiador inglês John Villiers, um
Português/Instituto Camões (CCP/IC) em Banguecoque,
especialista na região.
entidade que tem estado empenhada, desde novembro –
A comunidade portuguesa no Sião foi florescente, como
quando da passagem pela cidade do navio-escola Sagres,
atestam as escavações levadas a cabo no âmbito da res-
visitado por 20 mil tailandeses em 5 dias –, nas comemo-
tauração da Igreja de São Domingos em Ayutthaya. Houve
rações, organizadas com as autoridades tailandesas.
querelas, como seria de esperar num tão longo relaciona-
«Nesse encontro, segundo relatam as fontes, o enviado
mento, mas como sublinha Villiers, «em termos gerais, os
português foi muito bem recebido, dando-se início a uma
portugueses não se imiscuíram na política complicada e
aliança histórica entre os dois países em termos militares,
perigosa da corte siamesa». E quando Ayutthaya foi des-
comerciais e políticos», explica Luísa Dutra, que desempe-
truída em 1767, em consideração da ajuda dada nas ➤
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guerras contra o rei birmanês, receberam uma conces-
siamês a Portugal para o estabelecimento de uma feitoria
são de terrenos em Banguecoque, «tendo assim podido
e residência do cônsul.
continuar uma longa tradição de presença portuguesa no
Os vestígios são também visíveis nos bairros circundantes
reino do Sião».
das igrejas da Imaculada Conceição e de Santa Cruz, de
Sessão em Banguecoque
onde são oriundas várias famílias luso-siamesas, cujos
Assim, não admira que o governo de Banguecoque tenha
apelidos nalguns casos remontam a mais de 400 anos –
constituído «uma comissão interministerial para levar a
adianta Luísa Dutra.
cabo uma comemoração condigna», uma ideia que o em-
Os ecos dessa «forte presença humana» evidenciam-se
baixador de Portugal diz remontar a 2009. Ainda segundo
em tradições de diversos domínios e até no vocabulário.
o diplomata, «há algum tempo que está anunciada a oferta
«Não podemos esquecer que a língua portuguesa sub-
de um pavilhão em estilo tailandês (Salathai) a Portugal.
sistiu aqui como língua franca até meados do séc. XIX, a
Trata-se de um pavilhão em teca que será instalado no
ponto de ter sido adotada em 1833, a par do mandarim, no
jardim fronteiro ao Palácio de Belém». Para além desta
primeiro tratado de amizade, comércio e navegação entre
«significativa contribuição», «está prevista a oferta de uma
o Sião e os Estados Unidos, visto que nenhuma das par-
edição sobre as relações diplomáticas entre os dois paí-
tes conhecia suficientemente a língua nacional da outra».
ses, encomendada pelas autoridades tailandesas a uma
Programa comemorativo
instituição cultural crucial deste país (a Siam Society Under
O lançamento do livro sobre o Tratado Luso-Siamês de
Royal Patronage)».
1820, de Miguel Castelo-Branco, na Siam Society, em
A «cerimónia solene» que assinala as comemorações
fevereiro, e a participação do historiador no simpósio
aconteceu em 11 de Maio último, em Banguecoque, pre-
do National Museum Volunteers sobre os 500 anos dos
sidida pelo ministro dos Negócios Estrangeiros tailandês,
europeus no Sião «foi extremamente importante para
Kasit Pyromira, em que o discurso da parte portuguesa
marcarmos o significado que estas celebrações têm para
esteve a cargo do embaixador Torres Pereira.
Portugal e para a Tailândia», declara Luísa Dutra, respon-
Mas o programa das comemorações é bem mais extenso
sável do CCP/IC de Banguecoque.
e inclui o lançamento de um documentário televisivo sobre
Para além da exposição The Portuguese Historical Heri-
Portugal, a atribuição do prémio ao vencedor do concurso
tage Throughout The World and the Calouste Gulbenkian
do logótipo dos 500 anos, seminários, edição filatélica
Foundation, as comemorações – que tem uma página no
comemorativa, o restauro da capela portuguesa da Igreja
Facebook (http://www.facebook.com/500Years.Portugal-
Conception (Wat Noi), em Banguecoque, o apoio à edição
Thailand) – prevêem uma outra exposição no National Mu-
de livros sobre esta temática. «Fala-se ainda da realiza-
seum, entre julho e o final do ano, que mostra «uma arca
ção, no estádio nacional de Banguecoque, dum jogo de
tailandesa e 3 representações do Menino Jesus, datadas
futebol entre a academia dum clube de futebol português e
do séc. XVII, em marfim, pertencentes à coleção Távora
uma seleção sub-19 tailandesa», refere o diplomata.
Sequeira Pinto, ‘em diálogo’ com peças tailandesas». «As
Afinal, se de Portugal os tailandeses têm, hoje em dia,
figuras do Menino Jesus em posição muito pouco frequen-
«uma ideia algo desfocada no tempo», «para o tailandês
te, evocando as representações do Buda Reclinado, são
comum o país é indissociável dos ídolos do futebol»,
muito interessantes para os historiadores de Arte e signi-
reconhece Luísa Dutra, um facto «agora reforçado pela
ficativas de influências artísticas, nos dois sentidos, entre
contratação de um treinador português, Henrique Calisto,
duas culturas», sustenta Luísa Dutra.
para treinar o atual campeão nacional tailandês». De qual-
Em setembro, parte da coleção Máscaras da Ásia, do
quer forma, sublinha a leitora, «é assinalável a admiração
Museu do Oriente, poderá ser exposta no Bangkok Art
e carinho que [os tailandeses] têm pelos portugueses, não
and Culture Centre, cuja arquitetura evoca o Gugenheim
sei se devido ao facto de terem aprendido na escola que
Museum de Nova Iorque.
estes foram os primeiros ocidentais a chegarem ao Sião,
Em outubro, Kátia Guerreiro participará no prestigiado
se por terem deixado os fios de ovos, muito populares e
Festival Internacional de Dança e Música de Banguecoque
muito apreciados e parte integrante de qualquer ementa
e em novembro, realizar-se-á um seminário internacional
festiva».
de historiadores, coorganizado pelo Instituto Oriente/Uni-
Património português em Banguecoque
versidade Técnica Lisboa e a Universidade Chulalongkorn
Os vestígios da presença portuguesa na Tailândia são vi-
sobre as relações entre Portugal e Tailândia. Em Dezem-
síveis em Banguecoque, segundo refere Luísa Dutra, res-
bro, os luso-descendentes dos três bairros (Sta. Cruz,
ponsável do CCP/IC. O edifício da Embaixada de Portugal
Immaculate Conception e Holly Rosary) serão homenage-
foi construído num terreno cedido em 1820 pelo monarca
ados com as comunidades locais. n IC, IP
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Livros - novidade
Compreender + África. Fundamentos Para Competir no Mundo de Rui Moreira de Carvalho. Edições Temas e Debates/ Círculo de Leitores.
Moreira de Carvalho resiste à facilidade de um estudo apenas centrado num país e apresenta uma análise da África Subsariana na sua diversidade e enquanto mercado que abriga possibilidades de grande crescimento económico para o sector empresarial. Nesta obra começa-se por propor uma perspectiva histórica africana, desde a sua fase pré-colonial até à formação do Capitalismo e dos Estados Nacionais e consequente desgenerência em países de Terceiro Mundo. Segue-se o estudo dos condicionalismos socioculturais, das tensões específicas das idiossincrasias da sociedade africana, e da multiplicação de modos de vida que resultam numa heterogeneidade difícil de ser transposta, impedindo a consolidação dos EstadosNação. O autor mostra-nos que não podemos pensar, para África, num modelo de competitividade entendido na sua forma absoluta e universal de relação directa com a qualidade. Há que ter em conta as fragilidades das instituições e saber superá-las observando as idiossincrasias de cada um dos países em particular a fim de se formar um modelo de competitividade adequado. Para tal, o estabelecimento de parcerias com investidores autóctones revela-se essencial. A importância do Comércio Internacional para o desenvolvimento da Economia nacional dos países africanos assim como a relação da tecnologia com o desenvolvimento da economia de cada Nação são largamente estudados pelo autor (com suporte nas teorias de Keynes e Laffer), de forma prática e pedagógica, aparecendo quase como um manual didáctico para todos os o que desejam investir no mercado africano mas também para aqueles que, em África, procuram mercados estrangeiros. O lado mais negativo de um continente ainda fragilizado também é abordado. Moreira de Carvalho chama a atenção para a importância da responsabilidade social das empresas na consolidação dos países onde actuam. Depois de pesados os prós e contras, África surge como um território de grandes oportunidades. Segundo o economista, as áreas do turismo, agro-industrial, recursos naturais e pescas serão das mas promissoras. A carência de quadros superiores leva a que a área da consultadoria seja também um bom investimento; assim como o comércio de produtos de baixo índice tecnológico - como os têxteis ou os aparelhos de electrodomésticos – que têm cada vez mais procura. Para quem pensa instalar uma empresa no Continente Africano, esta obra é uma ferramenta indispensável.
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Livros - novidade
A Rainha Vitória de Jacques Langlade. Publicações Europa-América. Com um dos reinados mais longos da história (1837-1901), a Rainha Vitória foi uma das figuras mais relevantes para a formação daquilo que hoje entendemos como britânico. No apogeu do Império Britânico e do domínio mundial do ReinoUnido, a muito jovem e inexperiente Rainha depressa se impõe numa sociedade onde as mulheres são vistas como pouco mais que objectos de decoração. Não sendo ainda casada, a Rainha Vitória é obrigada, pelas convenções sociais a viver com a sua mãe que a oprime com a ajuda do seu amante. Mas Victória depressa mostra o seu carácter forte e decidido e escolhe para marido o príncipe alemão Albert, contra a vontade da mãe, e adquire os seus plenos direitos. Daí em diante mostra-se uma verdadeira mulher de Estado, projectando uma imagem pública de rigor e austeridade: traços que ainda hoje entendemos como victorianos. Em privado, mostra-se uma mulher de caprichos, apreciadora de festas e bailes mas ainda assim, muito mais contida que a demais alta nobreza que se diminui em excessos de alcóol, jogo e prostituição. Dá ao reino nove herdeiros e cultiva uma certa ideia de vida familiar e de recato ao mesmo tempo que exerce os seus deveres públicos com garra e determinação não se coibindo de mostrar as suas divergências com o parlamento quando as suas opiniões e preferências não coincidiam com os demais. Fez-se amar e respeitar pelo seu povo – sobretudo depois da morte de Albert – e contribuiu para o prestígio da Monarquia dentro dos seus domínios e para a imagem da grandeza do Reino Unido para além fronteiras. O infelizmente já falecido Jacques de Langlade, nesta sua biografia, consegue ir para além dos mitos e imagens já sedimentadas sobre a Rainha Vitória e mostra-nos uma outra Vitória, menos bidimensional, com mais contradições; enfim, mais humana e menos personagem histórica. n
A Primavera do Rei Cosroe: Vinte Séculos de Civilização Iraniana de Pietro Citati. Editora Assírio e Alvim. Tendo em conta as recentes perturbações vividas na República Islâmica do Irão – que começaram com os protestos que se seguiram às eleições de 2009-2010 -, as dúvidas internacionais quanto à estabilidade e segurança do país e à ameaça, real ou imaginária, de uma crise nuclear, é premente procurar saber mais sobre o que é esta Nação e como se formou. Pietro Citati propôs-se contar-nos os primeiros vinte séculos desta maravilhosa e complexa cultura de forma quase poética ou de conto das Mil e uma Noites. Desde as primeiras tribos, vindas das gélidas paisagens da Rússia em busca dos ambientes mais amenos do Golfo Pérsico, mil anos antes de Cristo, até à conquista e destruição de Persépolis por Alexandre, O Grande, o texto corre solto relatando a exuberância e fascínio dos Grandes Senhores da Pérsia: Dário, Xerxes, Ardashir, Yazdijird, Cosroe,... Esta é uma obra que mostra a teia e a trama que formam a exuberante tapeçaria que é o povo Persa e à qual o título remete. A Primavera do Rei Cosroe era, na verdade, um sumptuoso tapete, enriquecido com esmeraldas que Cosroe II mandava estender no Inverno para se lembrar das cores e alegrias da Primavera. Nesta altura tão incerta para o Irão, uma obra assim também nos ajuda a lembrar de tempos mais amenos e felizes. n
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English & French texts
7. Angola - 35 years, five decades of hope Angola, a country ravaged by a bloody war, emerges as a nation with prospects of bright futures and as a great economic power of Africa and the world. To mark the 35th anniversary of independence, celebrated in peace and hope, the DIPLOMÁTICA prepared a special issue, tracing the history of the years of struggle for liberation, the peace agreements, through civil war to political openness and relations with the former colonial power, also giving focus to companies that have contributed to the development and modernity, and the strategic focus of Tourism - a rapidly growing sector.
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7. Angola - 35 ans, cinq décennies d’espoir Pays ravagé par une guerre sanglante en Angola semble être l’avenir de la nation et une grande puissance économique de l’Afrique et du monde. Pour marquer le 35e anniversaire de l’indépendance, célébré dans la paix et l’espoir, la conférence diplomatique a préparé un número spécial: l’histoire de ces années de lutte pour la libération, les accords de paix, de la guerre civile à l’ouverture politique et les relations avec l’ancienne puissance coloniale, en donnant également l’accent pour les entreprises qui ont contribué au développement et à la modernité, et l’orientation stratégique du tourisme, un secteur en pleine croissance.
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23. José Marcos Barrica, Ambassador of Angola in Portugal The Ambassador José Marcos Barrica, two years head of the Diplomatic Mission of Portugal in Angola and former Minister of Youth and Sports, believes that “Portugal has a placeholder in the heart of Angola, “noting that in the current context of bilateral relations with Portugal, there are more points that unite the two countries than those who eventually alienates them, expressing a desire to maintain this level of relations and improve it even more.
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23. José Marcos Barrica, l’ambassadeur d’Angola au Portugal Chef de la mission diplomatique du Portugal en Angola dnas les derniers deux ans, l’Ambassadeur José Marcos Barrica, ancien Ministre de la Jeunesse et des Sports pendant une décennie, estime que «le Portugal a un espace réservé au coeur de l’Angola», notant que dans le contexte actuel de relations bilatérales avec le Portugal, il ya plusieurs points qui unissent les deux pays que ceux qui finissent par les aliène, exprimant le désir de maintenir ce niveau de relations et de l’améliorer encore plus.
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30. Conduril - a Portuguese company at the forefront of Angola’s development. The Conduril Group has distinguished itself in the development and progress of Angola, in the area of vocational training and it’s a reference company in entrepreneurship and innovation. It is a success and pride for Portugal, having endowed the African country’s education system with a new asset: Conduril Academy, based in Benguela, a bet on technology training courses – with approval and equivalent to Angolan high school completion – professional training of middle and senior management, integrating the formal and informal actions of the company’s global universe.
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30. Conduril: Société portugaise à la pointe de l’Angola Le groupe Conduril s’est distingué dans le développement et le progrès de l’Angola, dans le domaine de la formation professionnelle et est devenue une société de référence dans l’esprit d’entreprise et d’innovation. C’est un succès pour le Portugal, ayant doté le système éducatif du pays à un nouvel atout: Conduril Académie, basée à Benguela, un pari sur la technologie des cours de formation - avec l’approbation et équivalent à un diplôme d’études secondaires Angola -, de la formation professionnelle des cadres moyens et supérieurs, en intégrant les actions formelles et informelles de l’univers de l’entreprise.
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English & French texts
34. Jorge Tropa, CEO of Siemens Angola With an activity in Angola which dates back to the 60’s/70’s, the Siemens Angola has been highlighted by the standards of quality and technological innovation in an increasingly demanding and competitive market. George Tropa, chief executive of the company, talks about the more immediate objectives of the Group that include the diversification of business areas with emphasis on Energy, Industry and Health - contributing factors to enhance the development of the country - garnering a growing number of customers seeking high standards of quality and technological innovation.
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34. Jorge Tropa, PDG de SIEMENS Angola. Avec une activité en Angola qui remonte à les années 60/70, l’Angola Siemens a été mis en évidence par les normes de qualité et de l’innovation technologique dans un marché toujours plus exigeant et concurrentiel. Comment Jorge Tropa, président de la direction de l’entreprise, explique : les objectifs plus immédiats du Groupe comprennent à la diversification des secteurs d’activité, en mettant l’accent sur l’énergie, l’Industrie et la santé, des facteurs qui contribuent à favoriser le développement du pays, attirant un nombre croissant clients qui recherchent des normes élevées de qualité et d’innovation technologique.
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38. Miguel Vieira, CEO of Angolan Elite Careers. Elite Angolan Careers was established in 2008 with the aim of becoming a reference company in the recruitment of human resources for emerging markets. Its CEO, Miguel Vieira, outlined the objectives of the group in Angola, with a sustained and strong expansion of supply operations in Angola, as well as expansion into other markets, notably in Latin America and Asia. The most wanted services are the ones related to the recruitment forums EAC organized in Luanda, Lisbon, Washington, Lagos (Nigeria), Bahrain, London and Barcelona.
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38. Miguel Vieira, PDG de Elite Angolan Careers Elite Angolan Careers a été créé en 2008 avec l’objectif de devenir une entreprise de référence dans le recrutement des ressources humaines pour les marchés émergents. Son directeur général, Miguel Vieira, a présenté les objectifs du groupe en Angola, avec une expansion forte et durable des opérations d’approvisionnement en Angola, ainsi que l’expansion vers d’autres marchés, notamment en Amérique latine et en Asie. Les services les plus recherchés par les clients rapportent à les forums de recrutement organisés par l’EAC à Luanda, Lisbonne, Washington, à Lagos (Nigeria), Bahreïn, Londres et Barcelone.
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40. May ‘68, a time of utopia and restlessness The reflexes of the May 68 uprising in France are still being felt today. Were times of unrest, of generosity, humanism, defence and finding new ideas for a youth that was questioning about their future, foreshadowing the defence now in vogue of the “Geração à Rasca” and the new winds blowing across the African continent . Four decades later, we do the history of those times, from its origins in Nanterre to its worldwide influence. The same seeds of freedom of thought and action still germinate today. This utopia in jeopardy led to the survival against the growing power of the international financial capitalism which imposed a new order.
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40. Mai 68, temps de l’utopie et l’agitation Les réflexes de l’insurrection de mai 68 en France, se font encore sentir aujourd’hui. C’étions les temps de troubles, de générosité, d’humanisme, de contestation et de trouver de nouvelles idées pour unne jeunesse qui si a interrogé sur son avenir, préfigurant la défense en vogue de la «Geração à Rasca» (unne geration sans future) et le vent nouveau qui souffle sur le continent africain . Quatre décennies plus tard, nous faisons l’histoire de ces temps, en mai, son histoire qui a commencé à Nanterre et la propagation à travers le monde, semant les graines de la liberté de pensée et d’action, qui germent jusqu’à aujourd’hui. Utopia en
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péril, ce qui a conduit à la survie contre la montée en puissance du capitalisme financier international qui a
imposé un nouvel ordre.
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50. Jorge Braga de Macedo, president of the Institute of Tropical Research It’s endless the curriculum of Prof. Dr. Braga de Macedo, but he is best known for having been the Minister of Finance, a position that has granted him an solid image of seriousness as a public figure. As a private one, he appears as a man of extreme politeness and with a refined sense of humour. The conversation ran fast and loose with highlights about the current exhibition being held at the Palace of the Counts Calheta, in the Tropical Botanic Garden in Belém (Lisbon), under the patron of the Institute which he chairs.
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50. Jorge Braga de Macedo, Président de l'Institut de Recherche tropicale C'est sans fin le curriculum du professeur Dr. Braga de Macedo, mais il est généralement connue pour avoir été Ministre des Finances, un poste qui sans doute la doné unne image d'un homme "sérieux et grave". Mais il est aussi d'une extrême sympathie et avec un sens de l'humour très poli. La conversation a éte bien réussi avec le passage, de façon inattendue, par l'exposition de brevet dans le Palais des Comtes de Calheta, au Jardin Botanique Tropical à Belém, sous l'égide de l'Institut qu'il préside.
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64. Legrand, managing director Fernando Mendes A visit to the Domotic House - Legrand’s Inteligent Automatic House -, in Carcavelos, is an unforgettable moment, worthy of any sci-fi series. But it isn’t fiction. There, the future is already a reality. A house that Fernando Mendes, the Managing Director of the French multinational company, shows us with pride. “the sockets and switches we manufacture are quite possibly the best in the world in their area,” he says with a conviction based on hand workforce that helps the company’s growth and its position in the market benchmark.
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64. Legrand, directeur général Fernando Mendes Une visite à la Maison Domotique, la maison intelligent Legrand, à Carcavelos, est un moment inoubliable, une mise en scène digne d’une série de science-fiction. Mais il ne s’agissait pas d’une fiction. L’avenir est déjà une réalité. Une maison que Fernando Mendes, le directeur général de la société multinationale française, nous montre avec fierté. «prises et interrupteurs que nous fabriquons sont très probablement les meilleurs au monde dans leur domaine», dit-il avec une conviction basée sur la main main-d’œuvre qui contribue à la croissance de l’entreprise et sa position dans le repère du marché.
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67. Quinta da Aveleda - where time stood still A trip to Quinta da Aveleda, Penafiel, and to the secrets of how to produce the nectar that made the brand famous. In the twilight of winery, listening to the sound of Gregorian chants, every crevice and every nook witnesses the deep sleep of 10 years of the Adega Velha “aguardente(a Portuguese Brandy type beverage), aged in oak casks, the oldest dating back to 1974.
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67. Quinta da Aveleda - où le temps s’est arrêté Voyage à Quinta da Aveleda, Penafiel, et les secrets de la façon de produire le nectar qui a fait la célèbre marque. Dans la pénombre de la cave, en écoutent les chants grégoriens, chaque crevasse, tous les témoins coin le profond sommeil de 10 années de «Aguardente» Adega Velha, vieilli en fûts de chêne, les plus anciennes remontent à 1974.
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70. Tourism in Angola - Climate of peace and development led to increased demand Tourism can be seen in Angola as a growing sector, foreseeing to register, in 2011, a movement of
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English & French texts
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around 500 000 tourists. To meet rising demand, the Angolan government created a strategic marketing
plan and promotion for the sector, targeting the tourism potential. Which are numerous: beautiful natural environments, a large expanse of beaches, varied wildlife parks exclusively for tourists and a unique cuisine.
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70. Tourisme en Angola - Le climat de paix et le développement a conduit à une demande accrue Un secteur en pleine croissance dans le développement: voici comment le tourisme peut être considéré en Angola, prévoyant que, en 2011, se enregistrera un mouvement d’environ 500 000 touristes. Pour satisfaire une demande croissante, le gouvernement angolais a créé un plan stratégique de marketing et de promotion pour le secteur, en ciblant le potentiel touristique. Les potentialités sont vraimment nombreuses: beautés de la nature, une grande étendue de plages, parcs faune variée exclusivement pour les touristes, une cuisine unique.
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78. The First Ladies of Belém The memoirs and confessions of presidents of the Republic spouses, in democracy, key witnesses of the post April 25 period, stories, contacts and memories with the famous protagonists of contemporary life, the stories of how they became the vanguard of the benefit associations, their accomplices and supporters behind the scenes, the decisions of their husbands… For the first time, four first ladies met at the Belém Palace, sharing a unique, full of emotion that we now register.
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78. Les Premières Dames de Belém Mémoires et confessions de l’épouses des président de la République en démocratie, les principaux témoins après le 25 avril. Des histoires, des contacts et des souvenirs de les protagonistes célèbres de la vie contemporaine. Les histoires de la façon dont elles sont devenus l’avant-garde des causes sociales, leurs complices et de sympathisants dans les coulisses les décisions de leurs maris. Pour la première fois, quatre femmes se sont rencontrés au Palais de Belém, partageant une unique, pleine d’émotion que nous constatons ici.
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86. Mário Lúcio de Sousa, Minister of Culture of Cape Verde He is one of the biggest names of Cape Verdean culture. Musician, composer, singer, writer, playwright, poet ... the universe of Mário Lúcio reaches almost every area of culture. “We’re few, we’re little and we really have to learn from others and absorb it. That’s what led me today to talk openly with Africans to accept that we are not just Africans. And talk openly with the Europeans to accept that we are also of European origin. This is the phenomenon of creolization,” he says. This interview also reports the memories and thoughts of this multifaceted personality that has a clear vision of an active, mobilizing and effective project for Culture.
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86. Mário Lúcio Sousa, Ministre de la Culture du Cap-Vert Il est l’un des plus grands noms de la culture capverdienne. Musicien, compositeur, chanteur, écrivain, dramaturge, poète ... l’univers de Mario Lucio s’étend loin sur presque tous les domaines de la culture. «Nous sommes pas beaucoups, nous sommes petits et nous avons vraiment à apprendre des autres et d’absorber. C’est ce qui me conduit aujourd’hui à parler ouvertement avec les Africains d’accepter que les Africains ne sont pas seulement Africains. Et parler ouvertement avec les Européens à accepter que nous sommes aussi d’origine européenne. C’est le phénomène de créolisation », dit-il dans une interview. Le rappel des souvenirs, des pensées de cette personnalité à multiples facettes et une vision claire d’un projet actif de la Culture, de mobilisation et de manière efficace.
98 • Diplomática - maio/agosto 2011
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