Diplomática n.º 10

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´ Diplomatica

Nº10 MAIO/AGOSTO 2011 4 (Cont.)

business & diplomacy

Diplomática 10 • maio a Agosto 2011

José Eduardo dos Santos

Angola 35 Anos Em destaque: Jorge Braga de Macedo Reflexos do Maio 68 Primeiras Damas de Portugal Mário Lúcio Sousa José Marcos Barrica - Embaixador de Angola

With English & French Texts

1 • Diplomática - Junho/Julho 2008




Nota do Editor

Editor's note

O Silêncio do mundo

Desejaram matá-lo porque sonhava e pregava uma forma muito diferente de viver. O “sacrilégio” daquele jovem que se atrevia a dizer que éramos todos irmãos não convinha nada à civilização dominante. Jesus foi crucificado. O Santuário de Fátima nunca teve tantos peregrinos como neste Maio de 2011. No altar do mundo pedíamos paz enquanto um país do oriente era bombardeado sem dó nem piedade por interesses que a maioria desconhece. E há 2011 anos Jesus foi crucificado e os cristãos perseguidos. Fátima também se chamava a filha de Maomé. Entre a multidão, no cimo daquele andor repleto de flores, a Senhora de Fátima, rainha de Portugal, vestida em trajes do Oriente, era para nós a mãe de Jesus e a nossa mãe. Tal como o apóstolo universal, recentemente beatificado, Papa João Paulo II, todos nós pedíamos-lhe paz! Confirmaram-se as profecias, mas a falta de estrutura moral comanda os dias de hoje. Com esta política de olho por olho… alguém dizia que acabaremos todos cegos… Mais do que nunca a missão do diplomata torna-se de uma importância extrema porque o verdadeiro diplomata deverá ser um mensageiro do entendimento. A guerra nasce de ambições e injustiças quando a diplomacia falha…

. mariabraganca@gabinete1.pt

The silence of the world They wished to kill Him because he dreamt and preached a different way to live. The “sacrilege” of that young man that dared to say that we were all brothers was less than appealing to the dominant civilization. Jesus was crucified. The Sanctuary of Fátima never had so many pilgrims as it did this May of 2011. In the altar of the world people prayed for peace whilst at the same time a country back east, for reasons unknown to most, was being mercilessly bombed. 2011 years ago Jesus was crucified and all Christians were persecuted. Fatima also was the name of Muhammad’s daughter. Amongst the crowds, on top of a palanquin filled with flowers, the Lady of Fátima, queen of Portugal, dressed in oriental robes, presented Herself as the mother of Jesus and our mother. Just like the universal apostle, the recently beatified Pope John Paul II, everyone was praying for peace! The prophecies were confirmed, but the absence of moral structure is still in charge in our days. With this policy of an eye for an eye… somebody said that we’ll end up all blind… More than ever the mission of the diplomat becomes one of extreme importance, since the true diplomat must be a messenger of understanding. War is born out of ambition and injustice precisely when diplomacy fails…

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Assuntos Summary

Carta ao leitor. Letter to the reader.

4

Dossier. Angola – 35 anos, cinco décadas de esperança. Da utopia ao desenvolvimento. Dossier. Angola – 35 years, five decades of hope. From utopia to the economic development.

7

A força das efemérides em Angola . Rescaldo dos 35 anos de independência. The power of the ephemeris in Angola. The aftermath of 35 years of independence.

21

Entrevista a José Marcos Barrica. Embaixador de Angola em Portugal. Interview with José Marcos Barrica. Angola Ambassador to Portugal.

23

Empresa portuguesa na vanguarda do desenvolvimento. Conduril aposta na formação em Angola. A Portuguese company at the forefront of development. Conduril focus on training in Angola.

30

Entrevista a Jorge Tropa, Director Geral da Siemens Angola Interview with Jorge Tropa, Siemens Angola CEO.

34

Entrevista a Miguel Vieira, Director Geral da Elite Angolan Careers Interview with Miguel Vieira, Elite Angolan Careers CEO.

38

Memória. Maio, tempos de utopia. Memory. May and the times of utopia.

40

O mundo está a mudar: Ali Kaya Savut. Embaixador da Turquia em Portugal, Norbert Konkol. Embaixador da Hungria em Portugal e Valeriu Turea. Embaixador da Moldávia em Portugal The world is changing: Ali Kaya Savut. Turkey Ambassador to Portugal, Norbert Konkol. Hungary Ambassador to Portugal e Valeriu Turea. Moldavia Ambassador to Portugal

44

Jorge Braga de Macedo. Presidente do Instituto de Investigação Científica Tropical. Jorge Braga de Macedo. President, Institute of Tropical Research.

50

A crise financeira – uma perspectiva. The financial crisis – an overview.

56

"Troika" traçou diagnóstico do país e estabelece compromisso para empréstimo de 78 mil milhões. "Troika" drew diagnosis of the country and establishes commitment to loan 78 billion.

63

Fernando Mendes, Administrador-delegado da Legrand. Uma viagem ao futuro. Fernando Mendes, Legrand Managing director. A journey into the future.

64

Quinta da Aveleda: o prazer de um encontro. Sinta o momento. E deixe o tempo parar. Quinta da Aveleda: the pleasure of a meeting. Feel the moment. And let time stand still.

67

Turismo em Angola. Clima de paz e desenvolvimento propiciou aumento da procura. Tourism in Angola. Climate of peace and development led to increased demand.

70

Crónica de uma visita. Roderick Micallef, director geral do Corinthia Hotel Lisbon. Chronicle of a visit. Roderick Micallef, Corinthia Hotel Lisbon CEO.

74

As Primeiras Damas de Belém. Memórias e confissões das mulheres dos Presidentes da República em democracia retratadas em livro apresentado no Jardim da Cascata, no palácio de Belém. The First Ladies of Belém. Memories and confessions from the ex-Presidents of the Portuguese Republic portrayed in a book presented at the Jardim da Cascata, in the Belém Palace.

78

Mala Diplomática. Dia Nacional do Paquistão. Diplomatic pouch. Pakistan National Day.

81

Mala Diplomática. Dia Nacional da Sérvia. Festa em ambiente…clássico. Diplomatic pouch. Serbia National Day. A very classic party.

83

Soroptimist International. Mulheres solidárias despertam consciências. Soroptimist International. Supportive women awaken consciences.

84

Mário Lúcio de Sousa. O Ministro artista. Mário Lúcio de Sousa. The minister-artist.

86

Portugal-Tailândia: uma aliança com 500 anos. Portugal-Thailand: a 500 years alliance.

88

Livros. “ Compreender + África”, Rui Moreira de Carvalho. “A Rainha Vitória” de Jacques Langlade. “A Primavera do Rei Cosroe: Vinte Séculos de Civilização Iraniana”, Pedro Citati. Books. “ Compreender + África”, Rui Moreira de Carvalho. “A Rainha Vitória” de Jacques Langlade. “A Primavera do Rei Cosroe: Vinte Séculos de Civilização Iraniana”, Pedro Citati.

91

Traduções. Translations.

95

DIRECTOR: Maria da Luz de Bragança PRODUÇÃO: César Soares PROPRIEDADE: Maria da Luz de Bragança EDIÇÃO: Gabinete 1 Editor nº 211 326. Av. Engº Duarte Pacheco, nº1 - 4º Esq. – 1070-100 Lisboa. Marketing & Publicidade: Gabinete 1 - e-mail:gabinete1@gabinete1.pt Tel.: 21 322 46 60 a 76 Fax: 21 322 46 79 IMPRESSÃO: Madeira & Madeira, S.A. DISTRIBUIÇÃO: Logista - Alcochete - Telefone: 21 926 78 00 Fax: 21 926 78 45 ISSN 1647-0060 – Depósito Legal nº 276750/08 – Publicação registada na Direcção Geral da Comunicação Social com o nº 125395

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Dossier - Angola

Angola – 35 anos, cinco décadas de esperança Da utopia ao desenvolvimento

De país aparentemente ingovernável – como assim era visto há 20 anos – Angola revela-se nação de futuro e grande potência económica de África e do Mundo. Estado independente há 35 anos – desde 11 de Novembro de 1975 –, aqui se faz o retrato de cinco décadas de esperança de um povo que continua a sua marcha imparável de libertação

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Angola – 35 anos, cinco décadas de esperança

O sonho angolano, iniciado na longínqua década de cinquenta, pa-

rece agora, nesta segunda década do novo milénio, arrastar a utopia da libertação política para os terrenos da libertação económica e do desenvolvimento. A figura de estilo do gigante que desperta aplica-se legitimamente a esta década e, mais ainda, projecta-se para além desta afirmando Angola como nova potência emergente do século XXI. E este sonho, sendo angolano, é lufada de ar fresco contra essa visão trágica – as mais das vezes preconceituosa – que procura apresentar o continente africano como uma impossibilidade. Nesse sentido, Angola dá um sinal claro de uma África que começa a despertar das malhas apertadas do colonialismo e do fatalismo. A Angola moderna que agora se afirma é indissociável da figura de José Eduardo dos Santos, para muitos o grande obreiro da consolidação democrática e do crescimento económico, cuja visão de futuro começa a ser reconhecida e respeitada, pese a discrição da sua personalidade, pouco dada a exuberâncias, e algumas deturpações do seu papel na Angola da modernidade. A luta de libertação nacional Em 1956, com a fundação do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), resultado da fusão de vários grupos políticos que contestavam o colonialismo português, inicia-se a epopeia de um povo em marcha pela sua libertação e dignidade. Depositário de várias gerações do nacionalismo angolano, o MPLA conta, no seu surgimento, com figuras gratas da intelectualidade africana, de estudantes no exterior – que pululavam em particular na Casa dos Estudantes do Império, em Lisboa –, e combatentes contra o colonialismo obrigados ao exílio por um regime deslocado do tempo e estanque aos ventos da História. Sob a direcção de Agostinho Neto, médico, poeta e intelectual prestigiado a nível internacional, que assume a presidência do movimento; e com Viriato da Cruz, nome grande da poesia lusófona, como secretário-geral, o MPLA empreende no final dos anos cinquenta intensa actividade clandestina em Angola e Portugal, e começa a desenvolver uma inteligente estratégia diplomática, levando os seus dirigentes às principais capitais mundiais, capitalizando apoios estratégicos fundamentais à sua acção política. A esta nova vertente do trabalho político, não é alheia a eleição de Lúcio Lara como secretário-geral, após a saída de Viriato da Cruz, em 1961,resultante das divergências que assolavam o universo comunista, nomeadamente por via da polémica estabelecida entre a então União Soviética de Brejnev e a emergente República Popular da China de Mao Zedong. Pouco antes, um outro movimento, dirigido por Holden Roberto, a Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA) havia iniciado acções armadas, e embora tenha sido tentado um acordo com vista à unificação, MPLA e FNLA mantiveram-se afastados de qualquer acção concertada, inviabilizando a unidade dos nacionalistas em torno de um objectivo comum. Em 1966 surge um outro movimento: a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) – dirigida por Jonas Savimbi

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Dossier

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Angola – 35 anos, cinco décadas de esperança Luanda - capital política e pólo de desenvolvimento

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Dossier

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Angola – 35 anos, cinco décadas de esperança Encontro de homólogos

Relações com Portugal, passados os contragimentos de uma guerra colonial que antagonizou dois povos irmãos – por força da estreiteza devisão da ditatura de salazarista –, estão no seu melhor momento. Muito por força da empatia e amizade que liga os dois presidentes.

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Dossier

– que, segundo alguns – mas sem ter sido, até hoje, ancorado em

qualquer prova material – teria sido inspiração da polícia política da ditadura portuguesa. À divisão dos nacionalistas, no seu conjunto, acrescem as dissensões internas do MPLA, inauguradas pela saída de Viriato da Cruz que se exila voluntariamente na China – onde falece precocemente em circunstâncias nunca esclarecidas. Mas a crise mais grave ocorre em 1970 por via da constituição de duas facções divergentes da linha de orientação de Agostinho Neto, nomeadamente, a “Revolta Activa”, encabeçada por Mário Pinto Leite de Andrade, e a “Revolta do Leste” (ou facção Chipenda) sob inspiração de Daniel Chipenda. Só quatro anos depois, em encontro realizado na Zâmbia, a divisão bicéfala é superada, pese embora ter originado expulsões e saídas voluntárias de militantes, deixando marcas profundas no movimento, sem no entanto obstar à ascensão da influência que se registou daí para a frente. No rescaldo da luta de libertação nacional, por eclosão do movimento dos capitães em Portugal que levou ao golpe de Estado militar do 25 de Abril de 1974, o então presidente do MPLA, António Agustinho Neto, proclamou perante a África e o mundo a independência do país, sem que no entanto os três movimentos se entendessem com vista à governação da nova nação. O MPLA, no entanto, detentor de maior apoio das populações, particularmente das urbanas, desde então tem vindo, nos últimos anos através de sufrágio popular, a governar o país concitando o apoio e a legitimidade avalizadas pela comunidade internacional. Os anos de fogo Os tempos não foram fáceis para o novo poder, a mãos com a guerra civil que, numa primeira fase, cercou a cidade de Luanda e, posteriormente, se entrincheirou a norte do país por acção da UNITA que, ao mesmo tempo, capitalizou apoios de potências ocidentais, da então racista África do Sul e da China; e maleável às pressões resultantes da guerra fria que opunham as duas grandes superpotências (EUA e URSS), o MPLA teve ainda de se haver com uma tentativa de golpe de Estado, perpetrada por Nito Alves, e debelada com a ajuda das tropas cubanas que, entretanto, já se encontravam no país. No rescaldo da tentativa de golpe e das purgas subsequentes que, segundo se pensa, provocaram milhares de vítimas entre os contundentes, o MPLA – muito por responsabilidade das potências ocidentais - ensaia uma aproximação a Moscovo, na altura aliado do regime juntamente com os países do leste europeu e Cuba. Nessa linha de aproximação, o partido do poder passa a chamar-se MPLA – Partido do Trabalho, enfatizando a matriz marxista-leninista. Até ao início da década de 90, particularmente até 1991 – com a abertura política –, o partido mantém-se no poder sem eleições democráticas, espelho de um tempo e de uma época onde a exacerbação da ideologia, promovida e instigada pelas superpotências, quedou o desenvolvimento e amarrou os dirigentes angolanos a um projecto que – não sendo o seu – os tornou reféns de jogos geoestratégicos. Em 1992 o país vive tempos de euforia, a abertura democrática coloca o debate político no centro da vida angolana e as primeiras

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Angola – 35 anos, cinco décadas de esperança Construindo um país

Acordos de Lusaka - na senda da criação do Estado Angolano, 1974

Acto de tomada de posse no primeiro mandato de José Eduardo dos Santos, 1979

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Dossier

Cimeira dos Líderes Angolanos em Nakuru - 1975

Eleições Gerais Multipartidarias em Angola 1992

Chegada de Agostinho Neto a Lunda, 1974

Cimeira realizada em Gbadolite, Zaíre, juntou 18 Chefes de Estado africanos foram várias as tentativas para a Paz, 1989

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Angola – 35 anos, cinco décadas de esperança

eleições livres pareciam anunciar um novo ciclo para a fustigada

nação. Nas eleições legislativas, o MPLA, apesar de estar há vários no poder, é incontestado vencedor e, nas presidenciais, José Eduardo dos Santos fica à frente de Jonas Savimbi, mas não consegue maioria absoluta que lhe permita evitar segunda volta. Savimbi não aceita o resultado e, apesar de as eleições serem consideradas justas pelos observadores internacionais, desencadeia a segunda guerra civil, que só chega ao fim após uma década, após a morte em combate do líder do “galo negro” – nome pelo qual a UNITA também é conhecida, numa alusão à simbologia da organização. Consolidação democrática O ano de 2002 repõe a esperança frustrada uma década atrás. Os acordos de Luena, realizados no início de Abril, registam a assinatura de um tratado de paz entre os beligerantes: o Governo legítimo de Angola e a direcção da UNITA que, fragilizada e decapitada do líder, abandona a luta armada e decide integrar-se numa sociedade que, já então, começara a dar passos seguros na senda de um Estado de Direito democrático. As eleições, realizadas seis anos depois – a 5 de Setembro de 2008 –, ocorrem de acordo com o que se espera ser uma consulta democrática. Consideradas livres e justas pela comunidade internacional, dão esmagadora vitória ao MPLA: 82 por cento dos eleitores votam no partido liderado por José Eduardo dos Santos. A UNITA, surpreendentemente contrariando a previsão da maioria dos observadores, fica-se pelos 10 pontos percentuais. Um desaire que enfatiza uma possível leitura: cansado da guerra, o povo de Angola optou por apostar na continuidade, penalizando um partido que durante décadas rejeitou a via da luta política democrática. Obreiro da paz e do progresso José Eduardo dos Santos, presidente da República de Angola, desde 21 de Setembro de 1979, sucedeu a Agostinho Neto, pouco antes falecido em Moscovo por razões de saúde. À época, este engenheiro de petróleos era praticamente desconhecido, porém uma esperança da nova geração de quadros nascidos com a luta de libertação. E foi no estrangeiro, corria o início da década de 60, que Santos centra o essencial da actividade política no quadro da Juventude do MPLA, de que foi um dos fundadores. Anos depois, entre 1970 e 74, é um dos responsáveis pelos Serviços de Telecomunicações do MPLA, em Cabinda. A independência empurra Eduardo dos Santos para os mais altos cargos no partido. É eleito para o Bureau Político do MPLA, coordena as relações exteriores do movimento e o Departamento de Saúde. A morte de Neto abre-lhe as portas para o mais alto cargo da nação, sob a influência dos históricos do partido que viam no seu nome uma via de oportunidade para a renovação. Aos poucos vai-se afirmando com voz própria, sacudindo o “manto protector” dos históricos e afirmando-se na cena internacional. A queda do Muro de Berlim, o fim da guerra fria e o desmantelamento do bloco soviético – amigo tradicional do MPLA –, impelem este homem determinado e de rara inteligência ao entendimento dos novos

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Dossier

Acordos de Bicesse abriram horizonte de esperanรงa, 1990

Encontro dos Estados maiores das FAPLA e FALA - foram vรกrios os esforรงos para a Paz

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Angola – 35 anos, cinco décadas de esperança Influência e prestígio internacional

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Dossier

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Angola – 35 anos, cinco décadas de esperança

ventos da História, empreendendo autêntica cruzada de pacificação

do país e de construção de um regime democrático moderno. Os resultados esmagadores das vitórias eleitorais do MPLA relevam a importância política do caminho trilhado pelo presidente, fazendo dele o político angolano com maior prestígio internacional, pesem embora as insinuações, as brumas e incompreensões… Mas um mérito não lhe poderá ser furtado: a paz em Angola e a construção da democracia devem-se, em primeiro lugar, à determinação, perspicácia e ousadia de José Eduardo dos Santos que, ao que se diz, prepara as condições para a retirada do Palácio Presidencial à Cidade Alta, dando a vez e a voz à nova geração de políticos caldeados na democracia. Na senda do desenvolvimento Angola é, hoje, um dos países do mundo com maior crescimento, mas, paralelamente, assinala baixo índice de desenvolvimento humano. É, aparentemente, uma contradição incompreensível. Mas, anos de experimentação social, décadas de instabilidade e de guerra não permitiram construir rumos de desenvolvimento sustentados, elevando a qualidade de vida material, cultural e intelectual de um povo que – reflexo da guerra civil prolongada – invadiu as cidades, particularmente Luanda, trazendo por arrasto uma malha urbana caótica e gravíssimos problemas sociais, dos quais o maior é o desemprego. Mas, consolidada a batalha do crescimento económico, Angola começa a dar os primeiros passos no desenvolvimento social, de que é expressão maior o esforço governamental com a Educação, a Cultura e a Formação – trilogia fundamental para o progresso que todos os angolanos almejam. Beneficiando de uma década de paz social e de consolidação democrática, Angola é um dos países do Mundo mais atraentes para o investimento. A crise económica que varre o planeta, desde 2008, parece não ter beliscado muito os índices de desenvolvimento da economia. A taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) correspondente a esse ano foi, surpreendentemente, de 15,6 por cento. E mesmo o abrandamento do ritmo de crescimento, resultante da crise internacional, situou-o nos seis por cento – quando todos os indicadores apontavam para uma descida mais acentuada. As novas políticas, incrementadas pelo Governo, têm conseguido aguentar a economia e levado investimento para Angola, através de incentivos à iniciativa privada, contrariando a clássica dependência das receitas petrolíferas, retomando paulatina e segura aproximação ao boom de crescimento verificado entre 2002 e 2008 – os anos de glória do milagre económico angolano. A juventude da população é, de igual modo, uma grande mais-valia para o desenvolvimento do país, aliada, como já se disse, ao investimento havido na formação profissional e na meritocracia. Por outro lado, a criação de infra-estruturas, nomeadamente transportes e comunicações – outra das apostas do governo –, torna Angola um país mais apetecível e um garante de investimento seguro para quem se mova por critérios empresariais a prazo. Porque quem espera fazer fortuna fácil, para as “empresas toca e foge”, o melhor é irem bater a outra porta…

n

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Dossier - Angola

A Força das efemérides em Angola Rescaldo dos 35 anos de independência Das utopias à independência, sucederam-se 35 anos de

e valores patrióticos. A força das nações reside nessa

perseverança e árduo trabalho, contados a partir de 11

alma, que vai passando para novas gerações como he-

de Novembro de 1975, quando Angola soltou do mastro

ranças, à medida que o tempo se esgota para uns e se

a sua bandeira da liberdade conseguida pelo sangue,

apresenta útil para os outros, filhos da mesma nação,

suor, medos e coragem dos intelectuais e emancipalistas

através da cidadania e liberdade democrática.

angolanos, com adesão da “arraia miúda” que no qua-

Essa é a meu ver o resgate da dignidade de um povo,

dro das opções e escolhas, elevou um homem que de

que tem como veículo cultural importante a língua, pre-

entre os militantes da mudança, viria a ser o “líder” desta

sente através do ensino e da educação.

nação criança, que tendo sido criança noutros tempos,

História ao vivo: uma das componentes da celebração

voltou a usar as fraldas do crescimento exponencial e

desta efeméride, é o que os historiadores chamam de

desenvolvimento sustentado. Nem tudo foram rosas e

“história ao vivo”, isto é: os autores e os protagonistas

humanamente falando só o que custa é que reluz.

da nossa independência, de uma ou de outra maneira

Comemorar 35 anos de paz e progresso, significa apos-

falaram das suas lutas e vitórias vividas no sabor da

tar num futuro próspero e seguro, em que a construção

juventude e do pragmatismo para a libertação do país e

e a reconstrução da identidade e do país, não são

consolidação da paz. Além disso, numa extraordinária

tarefas simples nem vãs por se basearem no resgate

pedagogia, de solidariedade regional e mundial, dife-

dos valores perdidos e no desenvolvimento sustentável

rentes países desfilaram lúcidas nos ecrãs de televisão,

encorajado pela solidariedade nacional e internacional

exibindo claramente os modelos das suas convicções e

contemporânea.

experiências. Foram sem sombra de dúvidas as gran-

Tivemos que evoluir para o alcance da paz interna e a

des vedetas da aproximação ao vivo entre o passado e

partir de 2002, o Presidente Engenheiro José Eduardo

o presente.

dos Santos emergiu naturalmente com o epíteto do “ar-

Farol da cultura: é no confronto com a crise mundial,

quitecto da Paz”, assim distinguido pelo entendimento

que o mundo caminha firme para a redução da pobreza

popular.

e das assimetrias sociais gritantes, como factor da cul-

As actuais democracias são uma clara resposta às exi-

tura de solidariedade humana. Criar um “homem novo”

gências da “aldeia global” e é aos políticos que compete

e reduzir as assimetrias da pobreza, eis a questão que

tomar posições iluministas sobre a devida aplicabilidade

pesa na balança da igualdade entre os humanos e os

em diferentes quadrantes do espaço cultural, social e

povos de todas as nações. Por isso, valeu a pena ter-

económico, enquanto instrumentos da história do Ho-

mos celebrado os 35 anos de independência em clima

mem, em que o engajamento de todos é uma exigência

de paz e de esperança num futuro que se avizinha

na produção do acontecimento e dos factos históricos.

breve, por ordem natural da sucessão dos tempos e das

Duas gerações: a da emancipação e mudança, e a do

gerações. Parabéns Angola!

n

desenvolvimento na ciência e tecnologia, iniciados na modernidade com fraca participação do autóctone, ao longo dos 5 séculos de cultura e evangelização. Imbuídos da mesma força anímica na transmissão e aquisição do legado cultural e identitário, estas duas gerações confraternizaram, conscientes da herança e memória histórica e das responsabilidades acrescidas às realizações das civilizações que nos precederam no tempo e no espaço. Hoje integrados nesta nova dimensão humana, social e política, os jovens de há 35 anos, ainda altivos, garbosos e lúcidos, com muito para dar, aos 70, ditando as regras do jogo, como bibliotecas vivas, dos saudosos tempos do sonho e das utopias. Memória colectiva: É inquestionavelmente verdade que todas as nações se alimentam de uma memória colectiva, carregada das mesmas convicções, lembranças

Palmira Tjipilica Professora Universitária

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Diplomacia na 1ª pessoa

José Marcos Barrica

por de Nuno Trinta de Sá, fotos de André Garrido

Embaixador de Angola em Portugal “Portugal tem um espaço reservado no coração de Angola” Vai para dois anos que chefia a Missão Diplomática de Angola em Portugal. O Embaixador José Marcos Barrica, que foi ministro angolano da Juventude e Desportos durante uma década, é benfiquista, não falta à missa dominical e ao passeio com a família, gosta de peixe grelhado e saladas, vinho tinto, visitar o país de norte a sul e ouvir Fado

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José Marcos Barrica

Faz um balanço «positivo» de

vez mais.

A História traz-nos memórias,

21 meses como Embaixador. Quer

A 5 de Junho de 2009, na sua

afectos, coisas mais e menos

«reforçar as relações de coope-

oficialização como chefe da

positivas. Há uma geração

ração e buscar mais espaços de

missão diplomática de Angola

com alguns traumas, rastilhos

intervenção, quer na perspectiva

em Lisboa, teve uma audiência

da guerra colonial. Na relação

governamental, quer na perspecti-

com o Presidente da República

entre os dois países, apesar

va dos diferentes agentes sociais

Portuguesa, Cavaco Silva. Abor-

dos resquícios, o que nos une

que estão nos dois países.»

dou a cooperação bilateral nos

continua a ser superior ao que

Acha que o país que representa

vários domínios (político, eco-

nos divide?

em Lisboa, junto com o Brasil e

nómico, comercial, cultural, so-

Sim, é verdade. Na relação entre

Portugal, integra um «triângulo

cial). Celebram-se os 9 anos da

Angola e Portugal, importa su-

virtuoso» que terá «uma posição

Paz e Reconciliação Nacional,

blinhar que, no actual contexto,

de charneira no desenvolvimento

o 4 de Abril é o pano de fundo.

há mais pontos que nos unem do

da economia da CPLP e, quiçá,

O estreitamento das relações

que aqueles que eventualmente

do Mundo.»

entre os dois países é a sua

nos desunem. Há que agirmos

A entrevista, quando se celebram

grande meta, a sua prioridade

no sentido de reforçar os laços

9 anos do 4 de Abril que ditou a

estratégica a nível diplomático?

atados na base do positivo e

conquista da paz em Angola.

A nossa missão pode ser vista

pelo positivo, embora tenhamos

Que balanço faz destes quase

em duas vertentes fundamentais.

presente o facto de que, entre as

dois anos de trabalho, aqui,

Para além da função clássica

diferentes gerações, subsistirão,

na Avenida da República, em

da diplomacia que consistirá na

aqui e acolá, alguns resquícios de

Lisboa?

busca permanente do estreita-

um passado que teceu clivagens

Primeiro, é um privilégio ser

mento de relações de amizade e

e alimentou preconceitos... É com

Embaixador de Angola num país

cooperação entre o país que re-

grande pesar registar que ainda

como Portugal, pelas relações

presento e o de acolhimento, há,

hoje há quem, movido por interes-

históricas, seculares, que nos

também, toda uma actividade a

ses estranhos aos ventos do pre-

caracterizam. Depois, é a primeira

desenvolver com a própria comu-

sente, acirre ideias passíveis de

vez que desenvolvo a actividade

nidade angolana residente. Mas,

sustentar rancores, complexos...

diplomática como chefe de missão

sim, a nossa missão fundamen-

Mas contenta-nos saber que os

e calhou bem ter sido logo em

tal é, como disse,

Portugal, pois os sacrifícios às

reforçar as relações

N

vezes decorrentes de processos

de cooperação e

Angola e Portugal,

menos expressivos. A

de adaptação nessas circunstân-

buscar mais espa-

importa sublinhar

força que sustenta tais

cias, ficaram minimizados pelo

ços de intervenção

que no actual con-

preconceitos é cada

conhecimento prévio que tinha do

quer na perspectiva

texto, há mais pon-

vez menor, fica diluída

país, assim como pelas relações

governamental, quer

tos que nos unem

nas brumas do tempo.

multifacetadas existentes entre

na perspectiva dos

do que aqueles

As novas gerações, os

os dois países e povos. Estes

diferentes agentes

que eventualmente

novos momentos, as

vinte e tal meses em que estou à

sociais que estão nos

nos desunem

novas acções intencio-

frente da missão diplomática em

dois países; agentes

Portugal têm sido positivos, bons.

tais como os académicos, econó-

e orientadas no sentido de buscar

O trabalho em si tem sido ajudado

micos - neste caso, empresários -,

a aproximação, provam que há,

também pelo clima favorável que

investidores e demais empreende-

de facto, mais pontos unificadores

reina entre Angola e Portugal em

dores que são um grande suporte

do que os susceptíveis à divisão.

vários domínios – político, diplo-

para o desenvolvimento social

Aliás, do ponto de vista histórico,

mático, económico, comercial,

e económico que, estou certo,

sabemos que o complexo colo-

social, científico e cultural. De

todos nós queremos. Precisamos

nizador versus colonizado existe

facto, este relacionamento salutar

de fazer um trabalho conjugado

em todo o Mundo e de uma forma

favorece, facilita o nosso trabalho.

e integral, para que possamos

mais grave noutras culturas,

O nosso desejo é manter este ní-

realizar, no fundo, um sonho que

noutras latitudes. No nosso caso,

vel de relações e melhorá-lo cada

capitalize os dois povos.

felizmente, julgo que esse

24 • Diplomática - maio/agosto 2011

que corporizam essa

a relação entre

legião, são cada vez

nalmente organizadas


Retrato de um cidadão

Universidade, estive em várias outras ‘frentes’, mas destaco a comissão de gestão e reorganização da Universidade em

Antes de ser Embaixador, foi ministro da Juventude

1988/89, etc. Para grande surpresa minha, sou nomeado

e Desportos. Tem 48 anos, é professor universitário,

Ministro (risos). Ministro da Juventude e Desportos.

doutorado em Psicologia Evolutiva e da Educação pela

Cumpri dois mandatos (1999-2002 e 2002-2008). Foi, na-

Universidade de Valência, membro do Comité Central

turalmente, uma experiência muito interessante que ajudou

do MPLA. Foi deputado. Chefiou, em Março de 2008, os

a moldar a minha personalidade como cidadão, homem e

observadores da África Austral nas Eleições Harmoni-

político. Integrei o elenco governativo num momento crucial

zadas do Zimbabué. É um homem dedicado a causas

da História recente de Angola – 1999 um dos momentos

sociais: presidiu a uma ONG angolana, a Kandengues

de recrudescimento da guerra pós-eleitoral. É com grande

Unidos, integra a Comissão Nacional Executiva da Cruz

orgulho que revejo a minha integração e participação numa

Vermelha. Fale-nos um pouco mais de si: da infância,

equipa governativa com uma forte e perspicaz liderança.

da juventude, deste percurso.

Digo e direi sem quaisquer veleidades: uma liderança escla-

Isto de falar de nós mesmos tem a sua complexidade... Ora

recida, paciente e coerente, muito inteligente exercida pelo

bem, eu nasci em Cabinda, a província mais ao norte de

Presidente José Eduardo dos Santos. Só assim se percebe

Angola, num bairro da periferia da cidade capital. Na altura,

que, apesar de tantas e tantas dificuldades e adversidades

chamava-se Povo Cristão; agora, é o Bairro 4 de Fevereiro.

de uma guerra tão inclemente e tão devastadora, Angola

Pertenço a uma família religiosa, católica. Por esta Igreja fui

tenha conseguido algo, eu diria mesmo, miraculoso: a

baptizado, recebi a primeira comunhão, crismado, confir-

indivisibilidade do país, a estabilidade política e social, a

mado e posteriormente casei. Em Cabinda, fiz a instrução

permanente vontade e alegria de viver. Na verdade, com

primária, o ciclo preparatório e o ensino secundário. Julgo

a imensidão do seu território e variedade cultural e étnica

que tive uma infância e uma juventude felizes, embora com

Angola manteve-se e permanece unido na diversidade; a

certas dificuldades, próprias do tempo e da condição social

nação forma-se e consolida-se, e não há do que se ouve fa-

da minha família. Uma família modesta, humilde mas muito

lar noutras paragens, sobretudo, do nosso continente, sobre

laboriosa. Muito cedo, nós os petizes da família, tornámo-

lutas inter-étnicas, inter-tribais. E, passo a passo, de acordo

nos “pau para toda obra”: desde as lides domésticas,

com a nossa realidade e nossa História, a democracia está

auxiliar os trabalhos oficinais do pai carpinteiro, os trabalhos

sendo consolidada rumo à construção de um verdadeiro

nos pomares com o pai, nas lavras com a mãe e irmãs, a

Estado pacificado, moderno, próspero e de justiça social.

escola, a catequese, os jogos, enfim... tempos de apren-

Que nada e ninguém perturbe, jamais, a nossa Paz, tão

dizagem autêntica... Digamos que estou à-vontade para

duramente conquistada.

estar no campo e na cidade, conheço as realidades rural e

Do ponto de vista pessoal, como está a correr a sua

urbana. Infelizmente, a minha descendência não tem essa

adaptação a Portugal?

natural ligação, não têm esse capital.

Bem. Eu já conhecia Portugal antes; por cá vinha passar

Depois, fiz o ensino pré-universitário e universitário no

férias, em missões de trabalho ou em trânsito. Portugal é a

Lubango, sul do país. Em 1986, ano da minha licenciatura,

tal placa giratória. Tem belezas e encantos, tem um povo

tinha 24 anos, fui eleito, a nível nacional, presidente da as-

maravilhoso, acolhedor. A gastronomia diversificada é-nos

sociação de estudantes do ensino superior. Já no secundá-

familiar, tal como a extraordinária variedade de vinhos

rio, criáramos os grupos dinamizadores para o movimento

portugueses. Mas a minha predilecção são os grelhados.

associativo estudantil. Nas diferentes escolas fui desde

Peixe preferencialmente e, apesar disso, prefiro vinho tinto.

delegado de turma, de curso, a de ano. Fundamos também

Quanto à música, gosto de ouvir o Fado - do lado sentimen-

em 1981 a associação dos alunos do ensino médio. Como

tal, da saudade, da meditação desta música típica. Rotina?

entrei na política? Às vezes não sabemos exactamente

A nossa missão impõe um ritmo intenso, sobretudo numa

quando caímos nas malhas da política [risos].

praça político-diplomática como esta. Mas há espaço, tem

Mas interpreto que o embrião da política partidária remonta

de haver, para a família. Aos Domingos a primeira activi-

dos tempos da organização de pioneiros e do movimento

dade é o tributo ao Senhor. Ir à Missa e, depois, quando

associativo estudantil. Ao longo desse percurso somos soli-

possível, continuar a conhecer mais e melhor os cantos e

citados aqui e acolá, vamos trabalhando de modo animado

recantos naturais e históricos de Portugal; há monumentos

e desinteressado nas escolas por onde se foi estudando...

e sítios fabulosos muitos quais só ouvia falar deles e os co-

e, diga-se, em tudo isto somos observados, embora não

nhecia apenas através da História e Geografia de Portugal

agíssemos para isso... Depois, já em Luanda, sou eleito em

estudadas há já algum tempo. Mas existem outros atrac-

1986 representando a juventude, a deputado à Assembleia

tivos dos tempos modernos que são um deleite. Também

do Povo e posteriormente a membro do Conselho da Repú-

há o desporto, o futebol em especial, as idas ao estádio da

blica - órgão de consulta do Presidente da República. Após

luz…Em resumo, para além da experiência profissional ser

as primeiras eleições legislativas do país em 1992, deputa-

interessante, também a nível pessoal, eu e a minha família

do à Assembleia Nacional. Para além das lides docentes na

sentimo-nos bem neste belo e heróico Portugal.

maio/agosto 2011 - Diplomática • 25


José Marcos Barrica

"O nosso desejo é manter este nível de relações e melhorá-lo cada vez mais"

Angola. Estes dossiês continu-

desenvolvidas ou a desenvolver,

am a ter muita relevância, são

incluem não só o esforço interno

as relações entre Angola e Portu-

prioridades imediatas?

do país, mas, também, o apoio de

gal e respectivos cidadãos.

Sim, falamos também disso. O

outros países com os quais An-

Informou Cavaco Silva sobre

processo de reconstrução de

gola tem estabelecidas relações

o processo de reconstrução e

Angola está a acontecer, respei-

de cooperação. E, como sabe, em

construção de infra-estruturas

tando diferentes fases e etapas.

matéria de cooperação com Ango-

económicas e sociais. E falou

Esse processo vai, naturalmente,

la, Portugal se pontifica. O tema

da questão dos vistos de entra-

levar algum tempo mais. Temos

de desenvolvimento económico e

da de cidadãos portugueses em

de admitir que as diversas tarefas

social é actual, está sempre em

fenómeno não tem perturbado,

nem afectado de modo negativo,

26 • Diplomática - maio/agosto 2011


cima da mesa, em conversas

ordinários deixará de estar na

divisão, no geral, artificial, que

com os parceiros, sobretudo os

agenda do dia como preocupação.

permitiu, por exemplo, que uma

estratégicos.

Contudo, também devo referir os

mesma família fosse separada

Quanto à outra questão que co-

inúmeros casos em que as pes-

por uma linha imaginária. É um

locou, importa desde logo referir

soas interessadas não respeitam

aspecto de difícil tratamento, e

que a análise da questão da mo-

os requisitos, as formalidades e

de difícil compreensão por parte

bilidade ou circulação de cidadãos

sobretudo os prazos legalmente

de algumas franjas das nossas

dos nossos países, nos dois sen-

requeridos e, depois, refractando

populações. Há pessoas que,

tidos, é válida tanto para um lado

as suas próprias responsabilida-

devido ao seu nível cultural, não

como para o outro. Isto pressupõe

des e faltas, contestam injusta-

entendem por que razão não

falar da necessidade de estabe-

mente em desabono aos nossos

devem transitar livremente de um

lecimento de mecanismos mais

serviços consulares. Temos feito

lado para outro de uma mesma

flexíveis que, reconhece-se, não

apelos para que os interessados

porção de terra, ou para a aldeia

existiram num passado recente.

colaborem cumprindo as regras,

vizinha... É preciso muita infor-

Comparativamente, o quadro ac-

as normas estabelecidas. As au-

mação, muito diálogo. No caso

tual alterou para o melhor. Foram

toridades angolanas estão atentas

vertente, a principal preocupação

superadas as principais dificulda-

e empenhadas para que sejam ul-

das autoridades angolanas é a

des. Foram instalados modernos

trapassados os constrangimentos

deslocação ilegal de cidadãos de

sistemas tecnológicos que permi-

que persistam neste domínio.

outros países, vizinhos ou não,

tem, com celeridade, em tempo

O Senhor Embaixador advertiu

ao território nacional movidos

útil, tratar dos vistos. Reconheço

para a possibilidade de sucede-

por fins e interesses estranhos à

que, apesar disso, aqui e acolá,

rem conflitos se Angola não es-

mera circulação isolada ou incau-

ainda persistam algumas dificul-

tiver atenta aos problemas das

ta de pessoas. São movimenta-

dades. As competentes entidades

suas fronteiras. No ano ante-

ções massivas, conscientemente

continuam a trabalhar no sentido

passado, registaram-se alguns

organizadas e preparadas para

de aperfeiçoar os mecanismos

graves incidentes travados com

praticar actos de devastação de

e adequar a legislação afim aos

o Congo, país que partilha com

recursos naturais; actos capazes

novos tempos, pois, e como sabe,

Angola uma fronteira de 2 mil

de fazer perigar a economia e a

Angola viveu até há pouco um

quilómetros. Como resolver o

segurança nacionais. Angola está

passado de conflito armado, de

problema fronteiriço?

de braços abertos para acolher

conturbação; obviamente, na-

Angola é um país inserido numa

quem quer que seja, mas com a

quelas circunstâncias, algumas

sub-região onde subsistem alguns

condição de ser pessoa de bem.

medidas não foram nem poderiam

conflitos inter-estatais, e intra-

Os conflitos havidos, nos últi-

ser adoptadas por uma questão

estatais, que podem afectar a

mos tempos, com os Congos,

de defesa da soberania e da

nossa segurança nacional. Sabe

mas principalmente com a RDC

integridade do espaço territorial.

que na região dos grandes lagos,

situaram-se, no essencial, nesse

Mas agora o contexto é outro. Daí

ainda existem alguns focos de

quadro. O nosso Governo to-

estarmos a configurar toda a le-

tensão, havendo repercussões ao

mou as providências que achou

gislação inerente à política migra-

longo da nossa fronteira com a

convenientes para evitar que as

tória. É o caso, por exemplo, da

República Democrática do Con-

repercussões negativas imediatas

consagração da figura de vistos

go [RDC] que podem causar-nos

continuassem. Houve da parte de

múltiplos, que permitam que de-

sérios problemas. Estamos, por

vizinhos medidas de retaliação, de

terminada categoria de cidadãos

isso, preocupados com a situação

resto, despropositadas e despro-

cuja actividade implica desloca-

e todo o trabalho tem de ser feito

porcionais, lamentavelmente...

ções permanentes circulem com a

no sentido de minorar essa possi-

apesar disso, tem havido diálogo,

maior facilidade possível. Estou a

bilidade.

buscam-se caminhos para se

pensar nos homens de negócios,

Como resolver o problema do con-

encontrar uma solução duradoi-

nos académicos, cientistas, auto-

flito fronteiriço? Em primeiro lugar,

ra. Esses caminhos prosseguem

ridades eclesiásticas, entre ou-

não se deve perder de vista que a

entre os países implicados: há

tros. Há um trabalho neste sentido

divisão do continente africano foi

contactos regulares no âmbito de

e julgo que o assunto de vistos

feita “a régua e esquadro”. Uma

comissões mistas. Há, no ardor

maio/agosto 2011 - Diplomática • 27


José Marcos Barrica

das discussões, quem advoge

É um esforço essencialmente

Quando se fala no crescimento de

que os Tratados e Acordos referen-

interno, das instituições do Estado

África, Angola tornou-se um país

tes às fronteiras têm de ser revis-

angolano; mas temos plena cons-

incontornável. Mas há na região

tos. Se isto equivaler à revisão dos

ciência de que, por mais recursos

da África Austral, onde se insere

limites geográficos herdados do

que o país tenha e por enorme

esse grande país, um grande mer-

colonialismo, Angola não se revê,

que seja a vontade de realizar

cado, que é a África do Sul. São

certamente, nessa posição. Em

coisas boas, precisaremos sem-

potencialidades que podem ser

homenagem aos princípios de boa

pre de parceiros, das parcerias

aproveitadas por Portugal, que é

vizinhança e de respeito à sobera-

privadas, sejam elas nacionais ou

solicitado por vários países euro-

nia e integridade dos outros Esta-

estrangeiras.

peus para facilitar-lhes a entrada

dos, Angola quer e vai continuar a

Portugal tem um espaço reser-

em África, assim como Angola é

desenvolver o diálogo construtivo,

vado no coração de Angola. O

solicitada por países africanos

para evitar situações mais difíceis.

investimento, no âmbito da coope-

que pretendem entrar na Europa,

Em tempos de paz, como olha

ração estratégica, deve ser feito

tendo como referencial o seu rela-

para a recuperação económica

em vários domínios, sobretudo em

cionamento com Portugal. Os dois

de Angola, país que, apesar da

sectores estruturantes da eco-

países têm, ainda a língua co-

crise global, é visto, por empre-

nomia. Neste particular, Portugal

mum como instrumento de grande

sários portugueses, da Diáspo-

tem vindo a fazer isso. É preciso

valia para as relações entre as

ra e de todo o Mundo, como “o

um pouco mais de

caminho das pedras”? E o que

ousadia e agressivi-

falta melhorar na relação entre

dade (no sentido po-

Luanda e Lisboa?

sitivo) dos investido-

É com satisfação que nós, angola-

res. Angola adequou

nos, acompanhamos o fenómeno

a legislação de modo

do crescimento económico de An-

a estimular os investi-

gola, com indicadores positivos,

dores privados. Criou

sendo uma das economias que

facilidades de inves-

pessoas. Estendo, a

O

questão da língua, ao

maior desa-

fio do Executivo nacional é transformar esse crescimento económico em desenvolvimento e progresso social sustentado

Brasil - um gigante do Mercosul. Assim, conjugando, na nossa comunidade linguística, o potencial das economias emergentes (Angola e Brasil, no

mais cresceu, nos últimos cinco

timento, benefícios,

anos, no Mundo. Apesar da crise

incentivos no domínio

económica e financeira global,

fiscal e tributário a fim de possi-

dições seculares em expedições,

que também se abateu sobre o

bilitar a repatriação dos respecti-

forma-se aí um triângulo virtuoso.

país, a economia angolana con-

vos dividendos, ou seja, adoptou

Este triângulo, Angola - Brasil -

tinuou a crescer, não obstante a

políticas e medidas de protecção

Portugal, vai ter uma posição de

relativa desaceleração no último

e segurança aos investimentos

charneira no desenvolvimento

ano. O maior desafio do Execu-

e investidores, tudo para atrair

da economia da CPLP e, quiçá,

tivo nacional é transformar esse

o investimento externo de que a

do Mundo. Portanto, não será a

crescimento económico em de-

nossa economia tanto precisa.

acção de um país isolado que vai

senvolvimento e progresso social

Do ponto de vista geopolítico (e

transformar o Mundo. São as ac-

sustentado. Os cidadãos devem

não tem nada a ver com o Padre

ções conjugadas nas relações de

sentir, no seu dia-a-dia, os bene-

António Vieira, o Agostinho da

dependência e interdependência

fícios desse crescimento. Mais

Silva e as teorias do V Império),

que constituem o canal directo e a

do que estatístico, deve ser um

Angola e Portugal são a “pon-

ponte segura do desenvolvimento

crescimento real, vivido e sentido,

te”, o “canal” entre África e

sustentado das nações e povos.

que signifique a redução da fome,

Europa?

Com um universo de mais de 250

e dos índices de pobreza; que

Hoje em dia, Portugal, na pers-

milhões de pessoas irmanadas

signifique a melhoria das con-

pectiva de muitos europeus, é a

numa mesma comunidade de inte-

dições de vida das populações.

porta de entrada para Angola e ao

resses, é crível de que os nossos

Esse esforço está a ser realizado.

continente africano. Esta posição

países pertencem realmente a

Há indicadores, a todos os níveis,

privilegiada, que decorre da rela-

um espaço geopolítico importante

que nos dizem estarmos no bom

ção entre Portugal e África, pode

para desenvolver as respectivas

caminho.

ser explorada convenientemente.

economias.

28 • Diplomática - maio/agosto 2011

caso), com Portugal país europeu com tra-

n



Empresas internacionais

Empresa portuguesa na vanguarda do desenvolvimento Conduril aposta na formação em Angola É um caso de sucesso e um orgulho para Portugal. A empresa nortenha não se rendeu às dificuldades e apostou forte no mercado angolano, investindo, também, na formação e dotando o sistema de ensino de uma nova mais-valia: a CONDURIL Academy

Ganha a aposta de consolidação no merca-

médios e superiores”, integrando as acções

do angolano, e caldeado por duas décadas

de “certificação de competências formais e

de trabalho persistente e rigor profissional,

informais do universo CONDURIL”.

o Grupo CONDURIL acorre, agora, a um

Actualmente, a academia é, e será perma-

dos maiores desígnios para o desenvolvi-

nentemente, o organismo da CONDURIL

mento e progresso de Angola: a formação

responsável por garantir em Angola a for-

profissional de referência.

mação profissional do seu pessoal, a todos

A apresentação deste pólo de ensino

os níveis, com credenciação e reconheci-

profissional permite colmatar uma lacuna

mento de competências, tendo para isso

no sector da Construção Civil, dotando a

sido construídas instalações autónomas

empresa de uma escola de profissionais

adequadas, com sede em Benguela. No

com formação de excelência e colocando

entanto, a área de actuação da CONDU-

à disposição de jovens angolanos com-

RIL Academy não se restringe a Benguela,

petências técnico-profissionais que lhes

estando já implementada a sua actividade

permitam integração segura no mercado

em todo o território nacional angolano, com

de trabalho e ajudar às necessidades de

pólos de desenvolvimento distribuídos pelo

desenvolvimento do país.

universo de operações do grupo, nomeada-

A CONDURIL Academy, sediada na ci-

mente, em Luanda, Cabinda e Zaire, Bengo

dade de Benguela, aposta em “cursos de

e Uíge, Kwanza Sul, Malange, Kwanza

formação tecnológica, com homologação e

Norte, Huambo e Bié, Lunda Norte, Lunda

equivalência à conclusão do ensino médio

Sul e Moxico, Namibe, Huíla e Cunene,

angolano, formação profissional de quadros

bem como no Cubango.

30 • Diplomática - maio/agosto 2011


Uma empresa de referência no empreendedorismo e inovação Com sede em Ermesinde, a poucos quilómetros do

to ao fundador da nação, Dr. Agostinho Neto, em

Porto, a CONDURIL – ENGENHARIA, S.A., é uma

Luanda; reabilitação do Hospital Psiquiátrico, em

das pioneiras no investimento na novel e promissora

Luanda; reabilitação da ponte sobre o Rio Kwanza,

economia Angolana, onde marca presença desde

em Cangandala, Malange; construção da nova ponte

1990, e actua em todos os ramos da Engenharia

sobre o Rio Cavaco, em Benguela; Etar de Viana;

Civil, nomeadamente, na construção de estradas

estrada EN 100, Barra do Dande/Libongos; projecto

e auto-estradas, hidráulica, construção civil, obras

e execução da Ponte Cais e construção de spoolba-

subterrâneas, barragens, geotecnia, saneamento e

se do Dande.

pontes.

Criada em 1959, a CONDURIL – Construtora Du-

Pólo de várias empresas associadas, o Grupo

riense, S. A., foi adquirida pelos actuais accionistas

CONDURIL, através da sua sucursal em Angola e da

em 1970, tendo um capital social de 10 milhões

Métis Engenharia, Lda., gere um universo de 2 mil

de euros, estando cotada em Bolsa. Com sede em

colaboradores, sendo que 95 por cento são ango-

Ermesinde, Porto, Portugal, a empresa apostou na

lanos. Apostado em “ficar a trabalhar eternamente

internacionalização, marcando presença em Angola,

em Angola” – segundo as palavras dos seus respon-

Moçambique, Marrocos, Botswana e Cabo Verde

sáveis –, o grupo tem vindo a implementar moder-

sendo que o responsável de cada um destes países

nas técnicas e avançadas políticas de excelência,

tem lugar no Conselho de Administração.

nomeadamente, respeitantes ao controlo laboratorial,

Apostando em inovadoras técnicas de gestão de

higiene e saúde no trabalho.

qualidade, a CONDURIL dispõe de um Laboratório

Presente em todas as províncias da República de

Central, desde 1974. A excelência do trabalho ali

Angola, o grupo CONDURIL possui delegações

desenvolvido, valeu-lhe, em 2001, a acreditação

provinciais com autonomia e capacidade técnica,

pelo IPAC – Instituto Português de Acreditação, que

sendo responsável pela execução de grandes obras

reconheceu “a competência técnica e isenção” do

de referência, das quais destacamos: reabilitação

laboratório.

da estrada Ganda-Catengue, em Benguela; estaleiro

Empresa de referência, foi por oito vezes premiada

naval de Porto Amboím, no Kwanza Sul; monumen-

pelo rigor da revista Exame.

maio/agosto 2011 - Diplomática • 31


Conduril

Numa segunda fase, em que os forman-

de Condução, visando a necessidade

dos também serão recrutados no universo

permanente do aumento de qualificações

exterior à CONDURIL, está prevista a cons-

dos motoristas de veículos pesados e dos

trução de um Campus Escolar, também em

manobradores de máquinas, com sessões

Benguela, mas num local a definir, numa

de simulação e de aprendizagem prática

área não inferior a 7 hectares, com capaci-

em pista especial criada no futuro Campus

dade para ministrar cursos em simultâneo a

Escolar.

240 alunos por ano.

A academia de formação contempla, ainda,

Diversificação de valências

a construção de um estaleiro destinado a

A apresentação da CONDURIL Academy e

aulas de prática simulada para as diversas

a entrega dos primeiros diplomas a 70 mo-

áreas, bem como a criação de laboratórios

toristas, em Outubro de 2010, marcaram o

com capacidade de resposta às necessi-

início de um caminho que se auspicia fértil.

dades do ensino ministrado, enquadrados

O ousado projecto contempla várias valên-

numa linha ousada de multidisciplinaridade

cias, procurando abarcar todas as áreas

global.

de formação do sector, nomeadamente:

Nesta fase de arranque, a CONDURIL

Escola Técnico-Profissional, onde serão

está empenhada na organização de todo o

ministrados cursos de nível médio, entre o

processo de constituição formal da aca-

técnico superior e o trabalhador qualificado,

demia, que passa necessariamente pelo

no ramo da indústria e obras públicas, com

recrutamento da equipa dirigente, do corpo

duração média de quatro anos, abrangendo

docente e auxiliar, criando, de igual modo,

as áreas de Construção Civil, Electrotecnia/

uma bolsa de formadores e monitores. A

Mecânica, Manobradores/Motoristas, Dese-

construção do espaço físico e a homologa-

nho e Topografia, Qualidade e Segurança,

ção oficial da academia enquanto escola

Laboratório, bem como técnicos adminis-

técnico-profissional são, de igual modo,

trativos, de secretariado e de tecnologias

linhas de forças que norteiam os responsá-

de comunicação; Escola Técnica Especial

veis do Grupo CONDURIL.

32 • Diplomática - maio/agosto 2011

n



Empresas internacionais

Jorge Tropa, CEO da Siemens Angola “Estamos em Angola para ficar” Com uma actividade no País que remonta aos anos 60/70, a Siemens Angola tem-se destacado pelos padrões de qualidade e inovação tecnológica, num mercado cada vez mais exigente e competitivo. Nos objectivos da empresa mais imediatos contam-se a diversificação das áreas de actuação, com destaque para a Energia, Indústria e Saúde.

34 • Diplomática - maio/agosto 2011


Terra de futuro e de desenvolvi-

presença da empresa teve me-

em 190 países com mais 400.000

mento, Angola revela-se como um

nor relevância até que, em 2005,

colaboradores, pelo que estamos

destino emergente para o investi-

entrou novamente no país com

habituados a uma concorrência

mento e instalação de empresas

projectos essencialmente na área

global e sabemos como lidar com

estrangeiras. Nesse âmbito, a Sie-

das telecomunicações. Em 2010, a

ela.

mens apostou no mercado angola-

Siemens Angola passou a ser uma

Para além dos sectores referi-

no, provavelmente numa altura em

Regional Company independente

dos, quais as áreas potenciais

que, para muitos, essa estratégia

em África. A Siemens reconheceu

de crescimento da empresa?

poderia ser considerada um risco.

a importância e as características

A área mais relevante para a

Tem valido a pena essa aposta?

próprias do mercado Angolano,

economia angolana, ou seja com

Claramente. Os clientes da Sie-

pelo que decidiu constituir-se de

maior peso no Produto Interno Bru-

mens já são muitos em Angola, a

pleno direito em Angola e indepen-

to, é naturalmente o Petróleo, pelo

nossa tecnologia chega por dver-

dente da região Sul-africana onde,

que esperamos assistir ao desen-

sos canais e de diferentes partes

no passado, estava inserida. Este

volvimento da indústria petroquími-

do mundo. Ao escolher a Siemens,

mercado é muito importante para a

ca e também do gás. Os recursos

os clientes procuram elevados

empresa.

são abundantes e Angola, ao ga-

padrões de qualidade e inovação

Num contexto de forte concor-

nhar a confiança dos investidores,

tecnológica e um nível de serviço

rência dos mercados, as áreas

conseguiu posicionar-se e crescer

equivalente. Isto só se consegue

de especialização da Siemens,

continuamente até ser hoje um dos

com uma presença local. É mui-

nomeadamente na Energia, Saú-

principais exportadores de África.

to recompensador surpreender

de e Indústria, em que medida

A cadeia logística e de serviços

os nossos clientes com a nossa

constituem mais-valias e mar-

locais nesta industria está a fun-

presença nos locais mais remotos

cam a diferença no emergente

cionar e a criar postos de trabalho,

do País e dizer-lhes que estamos

gigante de África?

pelo que mais projectos nesta área

em Angola para os servir. Esta-

Angola é o país que mais cresceu

são críticos para o desenvolvimen-

mos também a criar emprego e a

na última década. O potencial de

to continuado do sector, nomeada-

contribuir para o desenvolvimento

crescimento não se esgotou, e

mente produção e engenharia.

de sectores estruturais no domí-

foram estabelecidos objectivos

Angola tem a oportunidade de

nio social e económico de Angola.

concretos para o desenvolvimento

crescer com a Siemens na En-

Factor importante: partilhamos en-

das infra-estruturas. O Programa

genharia Eléctrica, Automação e

genharia e competências técnicas

de Investimento Público de 2011

Petrolífera, entre outras. Se somos

e de gestão de várias áreas com a

de Angola elege sectores priori-

o principal fornecedor de serviços

Siemens Portugal, promovendo um

tários de desenvolvimento, entre

de engenharia para a Petrobrás

elevado valor acrescentado nas re-

os quais a energia, a água e os

no Brasil, porque não em Angola?

lações comerciais entre estes dois

transportes, áreas onde a Siemens

Falamos todos Português e Angola

países, especialmente nas áreas

detém ou a liderança ou ocupa

necessita destas competências

Eléctrica e da Energia.

segundo lugar a nível mundial.Os

para se desenvolver, conforme de-

No universo da empresa, qual a

padrões de exigência de parte dos

monstram as recentes aquisições

relevância de Angola nos seus

consumidores e dos governantes

de empresas de engenharia por

negócios?

são elevados, e, em Angola, por

parte da Sonangol.

A Siemens AG é accionista da

vezes até mais elevados do que,

Tem sido fácil a relação com as

Siemens Angola, da mesma forma

por exemplo, na Europa. Sabemos

entidades reguladoras e organis-

que é accionista da Siemens

que existe um segmento crescente

mos oficiais nas áreas de inter-

Portugal. Temos, por isso, que dar

que irá procurar a Siemens em al-

venção da Siemens?

contas ao accionista comum pelos

ternativa a outros fabricantes mais

Sim, somos bem recebidos. É

resultados da nossa actividade.

baratos, isto porque já tiveram más

notória a vontade generalizada

A Siemens tem actividade em

experiências com produtos sem

de se fazer cumprir os objectivos

Angola desde os anos 60/70. Na

fiabilidade e com níveis de serviço

traçados, que são muito ambicio-

altura, era procurada como um

sofríveis. Estamos em Angola para

sos. Os desafios organizacionais,

dos principais fornecedores para

ficar. Isto é uma corrida de fundo.

logísticos e humanos para realizar

a indústria. Durante a guerra, a

A rede Siemens continua a crescer

os projectos são muitos. As

maio/agosto 2011 - Diplomática • 35


Jorge Tropa

Que oportunidades de negócio

e Torres do Atlântico – e temos

melhor que ninguém, pelo que a

se encontram em curso, e que

boas perspectivas nos transportes

Siemens representa, neste contex-

perspectiva tem para o próximo

e aeroportos. Destacam-se ainda

to, uma alternativa credível e com

quinquénio?

projectos com as empresas eléc-

um serviço de qualidade.

Temos projectos em todas as áre-

tricas Angolanas – EDEL, ENE e

É importante realçar o aumento da

as atrás referidas, incluindo a in-

GAMEK no sector da Energia.

transparência e da competitividade

dústria e a saúde. Destaco o Ango-

Faz parte do nosso projecto imple-

no mercado devido às novas re-

la LNG no Soyo, a Clínica Sagrada

mentar com sucesso a estratégia

gras de concurso público, que em

Esperança, a Clínica Girassol,

da empresa na área das Cidades.

muito, facilitam a relação da Sie-

assim como edifícios de referên-

Os desafios resultantes do cresci-

mens com as diversas entidades.

cia em Luanda - como o ESCOM

mento das grandes cidades estão

entidades conhecem a realidade

36 • Diplomática - maio/agosto 2011


a ser estudados pela Siemens

a eficiência energética dos edifí-

América Latina e Ásia, e até ao

cios, os níveis de emissão de CO2,

final de 2011 será publicado um

Isto não é trivial. Neste sentido

e qual o seu impacto ambiental.

trabalho semelhante para as urbes

lançámos um programa a que

Com base numa série de catego-

africanas mais relevantes. Luanda

apelidámos “Green City Index”.

rias, as administrações municipais

pode ser considerada uma mega-

Este programa investiga e avalia

são informadas dos resultados do

cidade, tem hoje mais de 8 milhões

as principais cidades mundiais de

desempenho das suas cidades e

de habitantes e continua a crescer.

acordo com os níveis relativos de

em conjunto são discutidas solu-

A capital angolana vai estar inclu-

sustentabilidade das suas infra-

ções sustentáveis. Até à data já

ída no estudo comparativo, uma

estruturas Estuda-se, por exemplo,

foram publicados estudos sobre

vez que já recolhemos a informa-

de que forma é possível comparar

as principais cidades da Europa,

ção de base.

no sentido de encontrar soluções.

n

maio/agosto 2011 - Diplomática • 37


Empresas Internacionais

Miguel Vieira Director Geral da Elite Angolan Careers "Diálogo com as empresas é fundamental no recrutamento de quadros"

A Elite Angolan Careers lidera mercado de recrutamento em Angola. Em declarações à Diplomática, Miguel Vieira, Director Geral da empresa, sustenta que a necessidade de quadros e profissionais especializados ainda é maior que o número de formados pelas universidades angolanas, traçando os objectivos da EAC com uma aposta muito forte na ampliação das operações de oferta em Angola, assim como também a expansão noutros mercados, como é o caso da na América Latina e a Ásia.

A Elite Angolan Careers foi

Director Geral de África do Sul e

recrutamento, para depois rumar

criada em 2008 com o objectivo

da América Latina, especificando

até ao maior certame em Luanda

de se tornar uma empresa de

que «os serviço mais procura-

– onde participam habitualmente

referência no recrutamento de

dos pelos clientes são os fóruns

cerca de 50 empresas – seguin-

recursos humanos para mercados

de recrutamento que organiza-

do depois para Cape Town, na

emergentes.

mos em cidades como Luanda,

África do Sul.

Lisboa, Washington DC, Lagos

Grande parte das empresas

locais que estejam fora do seu

(Nigeria), Bahrain (UAE), Londres

participantes do Fórum de Re-

pais natal e apoiamos os nossos

e Barcelona”.

crutamento estão ligadas à área

clientes com os seus respectivos

Ainda recentemente, em Março

petrolífera, o que leva a que os

processos de localização de mão

passado, decorreu pela terceira

pedidos de candidatos se con-

de obra”, refere Miguel Vieira,

vez em Lisboa, este fórum de

centrem nessa temática –

“Concentramo-nos

no recrutamento de candidatos

38 • Diplomática - maio/agosto 2011


no, verificam que há dificuldade

Biografia

em encontrar perfis dentro do mercado angolano e solicitam os

Nascido em Angola, em 1977, Miguel Vieira foi viver

nossos serviços”, acrescenta o

nos anos noventa para a Florida, USA, com o intuito

responsável da EAC.

de seguir a carreira profissional de ténis na academia

A Elite Careers disponibiliza

Nick Bollettieri Tennis Academy. Ao acabar o liceu na

aos seus clientes serviços nas

Bayshore Highschool de Bradenton em 1995, Florida,

áreas dos Fóruns de recrutamen-

decidiu seguir carreira académica e licenciou-se em

to local, projectos de recrutamen-

Educação Secundária pela University of South Flori-

to e Outsourcing, jornadas de re-

da em 2000. Após concluir os estudos universitários,

crutamento, testes psicotécnicos,

optou por viver em Barcelona, Espanha, onde traba-

formação & desenvolvimento,

lhou como professor de liceu e director de activida-

campanhas de recrutamento (Se-

des extra-curriculares na American School até 2005.

arch & Selection). Tem ao seu

Completou mais tarde o seu MBA pela Universidad

serviço dezoito funcionários em

Pompeu Fabra de Barcelona, onde foi o primeiro can-

Londres e três em Luanda e uma

didato Africano a concluir esse grau académico no

politica equilibrada e rigorosa de

historial daquela universidade. Em 2005 começou a

gestão faz com que apresente

trabalhar para Marcus Evans em Barcelona, uma das

lucros desde o ano da sua cons-

maiores empresas a nível mundial no que diz respei-

tituição.

to a organização de conferências, fóruns e eventos

Apesar da existência de uma

corporativos, e em 2006, com o seu MBA terminado,

nova geração de jovens angola-

foi contratado por GCC, uma empresa britânica, para

no altamente especializados.,

liderar a equipa de vendas e recrutamento para o

Miguel Vieira sustenta que “a

mercado Africano, e em concreto o de Angola. Em

necessidade de quadros e pro-

2008 nasceu a Elite International Careers, com sede

fissionais especializados ainda é

em Londres, empresa dedicada a recrutamento para

maior que o número de quadros

mercados emergentes como Nigeria, Arábia Saudita,

formados pelas universidades

Brasil e Angola. Em 2010 a Elite abriu escritório em

angolanas, pelo que acredita-

Luanda.

mos que ainda estamos longe de

poder ser autosuficientes com os quadros ’produzidos` pelas nossas instituições locais” engenheiros da área petrolífera,

sos de recrutamento”.

“ Estamos muito melhor que há 5

reservas de petróleo, mecânica,

A empresa pretende ser um

anos atrás, mas ainda estamos

electro-mecânica.

verdadeiro parceiro internacional

longe da situação ideal” observa.

Segundo refere Miguel Vieira, “a

com uma visão local e apoiar de

Nos projectos futuros para a Elite

missão da Elite Internationa Ca-

forma contínua todos os seus

Careers contam-se a ampliação

reers visa apoiar os nossos clien-

clientes nos vários mercados

das operações de oferta em

tes no que diz respeito às suas

emergentes onde os mesmos

Angola, assim como também a

necessidades de capital humano

tenham operações, “Existe um

expansão em relação a merca-

local; criamos valor ao ser o elo

diálogo permanente entre a

dos para os quais a EAC opera,

de ligação entre ambos, empre-

Elite e as empresas. Quando as

nomeadamente, na América

gadores e candidatos, apoiando-

empresas chegam a Angola têm

Latina e potencialmente, a Ásia

os nos seus respectivos proces-

necessidades de capital huma-

no futuro.

n

maio/agosto 2011 - Diplomática • 39


Memória

Maio, tempos de utopia Uma maior generosidade, humanismo, ecolo-

É uma resposta digna da juventude hitleriana”,

gia e nacionalismo são alguns dos conceitos

respondeu-lhe o estudante, levando a que os

herdados do movimento contestatário desig-

seus colegas se insurgissem. Assim, depois de

nado por Maio 68, antecâmara da realidade

repetidos incidentes, entre os quais a ocupação

dos anos 70 e 80, prenúncio do levantamento

pelos estudantes, a Faculdade de Nanterre

da contestação agora em voga da chamada

foi fechada a 2 de Maio. Grupos de esquerda,

«geração à rasca». Os princípios, os valores e

revoltados “contra a sociedade de consumo”,

as reivindicações são praticamente as mesmos,

o ensino tradicional e a insuficiência de saídas

quatro décadas depois…

profissionais, decidem opor-se pela “contesta-

A “crise” de Maio de 1968 começou por ser

ção permanente”. Inicia-se logo aí o movimento

uma contestação estudantil francesa ao Estado

dirigido por Daniel Cohn-Bendit, designado por

autoritário do general de Gaulle que teve répli-

“22 de Março”. Os estudantes ocupam, depois,

cas nos demais países desenvolvidos, desde

a Universidade da Sorbonne - encerrada pelas

os EUA ao Japão. Curiosamente, nessa época,

autoridades a 3 de Maio -, sofrendo uma dura

os franceses viviam como que ofuscados pela

intervenção policial.

sociedade de consumo ( aqui, um paralelo com

Geram-se tumultos e focos de tensão, com as

o que aconteceu recentemente em Portugal,

primeiras barricadas nas ruas - nomeadamente

com o povo também mergulhado no êxtase

no Quartier Latin (confrontos de que resultam

consumista e que despoletou a crise resolvida

805 feridos, entre os quais 345 polícias) -,

de forma draconiana pelo FMI). Agora, como

entrando-se num ciclo de provocação e repres-

nesses tempos, havia uma corrida desenfrea-

são. A 9 de Maio, contra esta tendência, tem lu-

da à compra dos chamados “bens burgueses”,

gar no Boulevard St. Michel, uma manifestação

carros, frigoríficos a prestações, traçavam-se

pacífica. No dia seguinte, regressa a violência,

planos aliciantes de destinos para férias.

com a famosa “noite das barricadas”, carros em

Mas, por detrás desta embriaguez consumista

chamas, agitação na Sorbonne. Segue-se uma

“petite bourgeoise”, algo entediante, havia uma

gigantesca manifestação estudantil em Paris, a

certa inquietude no ar: greves violentas nas

13 de Maio, com cerca de 600 000 estudantes.

fábricas, protestos na rua contra a guerra do

O conflito alarga-se, porém, ao sector social,

Vietname, ao mesmo tempo que a Primavera

com manifestações sindicais nesse mesmo dia,

que despontava em Praga fazia soprar ventos

acompanhadas de greves que paralisaram mais

de um socialismo mais humanizado. Tudo isto

de 10 milhões de trabalhadores em França.

conjugado com os novos gostos culturais da

Apesar do envolvimento da classe operária, o

geração mais nova, que tinha por ícone musical

Partido Comunista Francês e a CGT (Confede-

os “Beatles”, ou absorvendo o espírito revolu-

ração Geral do Trabalho) adoptam uma posição

cionário de Che Guevara, introduziam factores

calculista, classificando as revoltas estudantis

de uma nova inquietude entre os mais novos.

e a greve geral como uma “aventura” e concen-

O detonador de todo este “caldeirão” onde

trando-se apenas em reivindicações profissio-

“cozinhavam” em lume brando as legítimas

nais e laborais, em contraponto às exigências

aspirações da juventude teve o seu epicentro

de reformas estruturais dos estudantes (ma-

em Nanterre, nos arredores da capital fran-

oistas, anarquistas, trotskistas...). Entretanto,

cesa, tradicionalmente apelidada de feudo

o primeiro-ministro Georges Pompidou reabre

“esquerdista”. Durante uma visita que fez a

a Sorbonne a 14 de Maio, dizendo que era

estas instalações o ministro da Educação para

“proibido proibir”. A Renault entra também em

inaugurar uma piscina, um estudante ruivo de

greve. Esta pressão laboral conduzirá aos acor-

origem alemã, Daniel Cohn-Bendi, interpelou-o

dos de Grenelle, a 25-27 de Maio, nos quais a

sobre os “problemas sexuais” da juventude. O

classe patronal garantirá um aumento de 10%

membro do Governo aconselhou-o a “dar um

dos salários e de 35% do salário mínimo. Os

mergulho na piscina, para refrescar as ideias”.”

sindicatos aceitam, mas as suas bases

40 • Diplomática - maio/agosto 2011


Um combate pela liberdade que lançou sementes para o futuro

Jean Paul Satre e Simone Beauvoir, dois dos

Tumultos e focos de tensão nas ruas opuseram estudantes à Policia

contestatários

e a revolta alastrou a outros estratos sociais

maio/agosto 2011 - Diplomática • 41


Maio, tempos de utopia

operárias mantêm a greve. Apesar deste

(União Democrática Republicana) e um claro

primeiro passo para a paz social, o presidente

recuo dos partidos de esquerda, apesar da cri-

Charles de Gaulle considera a situação in-

se de Maio ter feito “tremer” o poder do general

controlável, propondo um referendo. Não é,

Gaulle, demonstrando a insatisfação crescente

porém, escutado e ao mesmo tempo dão-se

da juventude e das forças sociais face ao con-

distúrbios nas ruas. A crise torna-se cada vez

servadorismo do regime. Para muitos analistas,

mais política, inquietando-se os ministros com

o medo suscitado pelas convulsões daquela

a possibilidade de ruptura e queda do Governo,

altura permitiu a manutenção da ordem estabe-

perante rumores da formação de um Executivo

lecida, que acenava com projectos de reforma

provisório, de crise. Em 24 de Maio, de Gaulle

moderada da vida política francesa.

dissolvia a Assembleia.

Apesar do sucesso das eleições de Junho e

A violência nas ruas começa, entretanto, a

das tentativas de reforma do governo de Couve

incomodar a França “profunda”, mais conser-

de Murville (primeiro-ministro gaullista eleito em

vadora. Teme-se o peso crescente do Partido

Junho de 68), de Gaulle sofrerá uma derrota

Comunista, acusado de instigador, apesar da

política no referendo de Abril de 1969 sobre

demarcação política desenhada logo no come-

a Regionalização e a Reforma do Senado.

ço dos distúrbios. Crê-se mesmo numa revolu-

Demite-se entretanto, abandonando a política.

ção nacional. Entretanto, ninguém sabe de de

“Nada será como antes de Maio de 68”. Passa-

Gaulle, acreditando mesmo Pompidou que o

dos alguns anos, esta ideia mantém-se viva: o

regime estava a chegar ao fim. Porém, numa

ano primeiro da contestação e das mudanças

alocução ao país via rádio a 30 de Maio - como

terá começado durante essa época conturbada.

nos tempos da ocupação alemã da França,

As instituições políticas não caíram mas treme-

encorajando os compatriotas -, de Gaulle apela

ram, e os franceses repensaram o seu próprio

à ordem e anuncia eleições legislativas para

futuro. Houve, acima de tudo, uma alteração

Junho. No mesmo dia, junto ao Arco do Triunfo,

das mentalidades, com o aparecimento de mu-

os gaullistas organizam uma manifestação de

danças há muito esperadas em França. Os cos-

apoio ao regime. A propósito do comunicado

tumes evoluem, com a permissividade a abrir

do presidente da Repíublica à nação, diz Jean

caminho na sociedade francesa. Os conserva-

Lacoutoure: “Antes das 16h 30, estava-se em

dores mantêm o poder, mas a abertura a novas

Cuba; depois das 16h 35 estava-se quase na

ideias é cada vez maior, aumentando a contes-

Restauração”. Depois de uma situação que ten-

tação por parte dos intelectuais: o aparecimen-

dia para a anarquia e para uma via socialista,

to e a divulgação de trabalhos efectuados na

consegue-se recuperar o caminho da demo-

área das ciências sociais e humanas é uma re-

cracia e evitar uma agudização dos aconteci-

alidade cada vez mais forte no mundo científico

mentos. Apesar dos protestos da esquerda e

francês. A voz das minorias começa a levantar-

de alguma violência, a França votará. A 16 de

se. Há uma crescente emancipação das mu-

Junho, durante os distúrbios no Quartier Latin,

lheres. O próprio clero inicia também uma auto

morre Gilles Tautin, de 17 anos. É o fim da cri-

- reflexão. Estavam lançadas as sementes da

se estudantil: a situação política, essa, continuará

liberdade, prenúncios da queda do socialismo a

agitada.

Leste, dos novos tempos que sopram na China

O centro e a direita anti-gaullista colocam-se

e em Cuba, do que haveria de acontecer em

gradualmente ao lado do Governo, que as-

Abril, em Portugal. Um ideal que só tem como

sim vê surgir uma base de apoio inesperada,

contraponto, na actualidade, o desenvolvimento

dispondo então de uma maioria esmagadora.

de um capitalismo financeiro internacional cada

Esta plataforma política conservadora des-

vez mais actuante, estendendo os seus longos

confia da vontade de reformar do presidente,

braços a várias Nações. A utopia deu lugar à

exigindo mesmo a constituição rápida de um

sobrevivência, espezinhando os mais elemen-

novo Governo e novas eleições legislativas.

tares direitos cívicos e humanos. Mas essas

Em parte, estas condições serão satisfeitas.

são contas de outro rosário, a que o Maio de 68

Nas eleições de 23 e 30 de Junho, o regime

será sempre e eternamente imune. Ficaram as

gaullista sai reforçado, com uma vitória da UDR

sementes para amadurecer no futuro…

42 • Diplomática - maio/agosto 2011

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Espaço diplomático

O Mundo está a mudar?

Moldávia

Turquia

Hungria

Convidámos os Embaixadores da Turquia, Moldávia e Hungria a pronunciarem-se sobre as mudanças políticas que marcam a actualidade.

44 • Diplomática - maio/agosto 2011


Ali Kaya Savut - Embaixador da Turquia

mulation of experience and assess possible contributions, Turkey is actively employing its diplomatic efforts since the beginning of the events. The President of Turkey has been the first President to visit Egypt after February 11. The Turkish Foreign Minister paid visits to Syria, Tunisia and Bahrain in order to discuss best possible way towards the future. We have organized several other consultations and contacts with governmental and non-governmental actors in the region. On the other hand, the reaction of the international community will also play a critical role in this process. Turkey does not support foreign involvement in internal affairs when opposition movements fail to bring about a regime change. Indeed, external involvement would further complicate the developments on the ground and the prospects for indigenous democracy would be severely undermined. The role of international community is being tested in the case of Libya today. Turkey, considers the protection of sovereignty, territorial integrity and restoration of security as The so-called Arab spring, we are witnessing today is a new

the main goals of the current international action towards

era of change: A change that was long due, but at the same

Libya. The political transformation process has to be initi-

time astonishing us all with its pace and energy. Modern

ated in order to establish a democratic system in which only

facilities of technology, helping people communicate and

Libyan people will have the authority to decide about the

network instantaneously have not only accelerated global

future of their own country. Any action contrary to this will

transformation but also strengthened the waves of change.

have negative implications blocking the democratization

The chaotic tempo of events may represent an era of riots

process in the region. What the people in the region need

which understandably brings legitimate concerns.

to see now is a success story that can be written with the

The recent uprisings in the Middle East and North Africa

support and encouragement of the international commu-

should be understood on their own merits. Winds of change

nity rather than a bloodshed which would leave a negative

in the Middle East are not blowing from outside. They are

legacy.

stemming from the will of the people out in the streets who

Another imperative task that the world community has to

aspire to more dignity, more economic prosperity and more

face is providing humanitarian relief to the civilians that

democracy. Years of inertia and denial of freedom of expres-

have been caught in the conflict. Turkey evacuated over 20

sion has pushed especially the young generation to fight for

thousand Turkish citizens and 3.500 foreigners from Libya

reforms. As a result, the domino effect became inevitable in

and sent three ships carrying humanitarian relief material to

the area.

Benghazi since the beginning of the conflict. A Turkish hos-

Turkey, since the beginning has supported democratisation

pital ship has picked up hundreds of wounded people from

process and reforms through peaceful transformation, not

Misurata. We believe continuous and coordinated efforts

through violence and instability. The leaders of the countries

of the international community to ease the pain of those

have a critical role to play, as Turkish Foreign Minister Prof.

who suffer also help alleviate the traumas that will impede

Ahmet Davutoğlu pointed out “Wise leaders in the region

transformation process.

should lead this process rather than try to prevent it.” Es-

The rapid developments we are witnessing indicate that we

tablishment of an institutional infrastructure is a priority to

are now in a new era which is bringing many challenges,

promote democracy culture in these countries.

many opportunities and many risks. In this context, Turkey

Having gone through a long process of democratic trans-

will continue to be the staunch supporter of the nations

formation itself, Turkey could be regarded as a source of

demanding for democratic change and a member of the

inspiration for these movements. In order to share its accu-

international community ready to fulfil its responsibilities. ■

maio/agosto 2011 - Diplomática • 45


Espaço diplomático

Valeriu Turea - Embaixador da República da Moldávia

A República da Moldávia no seu 20º aniversário

Moldávia e Portugal são, geograficamente falan-

último ano e meio. Mas a Moldávia deseja que lhe

do, dois extremos do mundo latino na Europa,

seja reconhecida não só a vocação, mas também

mas estes extremos esquecem as distâncias e

a perspectiva clara de adesão ao espaço comuni-

convergem em direcção aos mesmos ideais.

tário. Naturalmente, não solicitamos que nos sejam

Este ano, a República da Moldávia celebra dois

concretizados os prazos precisos da adesão à UE,

decénios de independência estatal. Não sei em que

porque estamos perfeitamente cientes de que a

medida esta data é determinante para a história de

adesão propriamente dita depende da forma como

um jovem Estado, mas penso que o feito mais im-

lograremos fazer o trabalho de casa. Sim, muitas

portante que o meu país conseguiu realizar – a ní-

coisas dependem também da conjuntura política,

vel de opção estratégica, mas também no plano do

mas pensamos que o cumprimento dos critérios da

início das reformas de princípio – foi definir a sua

adesão desempenha, não obstante, o papel princi-

identidade. Ao longo dos anos, a Moldávia seguiu

pal.

um destino complicado, com circunstâncias histó-

A República da Moldávia compreende que os seus

ricas nem sempre favoráveis e animadoras. Mas o

trâmites a respeito da integração sobrepõem-se

equívoco a respeito da orientação estratégica que

com um período difícil para a mesma União Euro-

dominava o estado de ânimo das elites políticas

peia, que está seriamente preocupada por superar

nos primeiros anos de independência foi superado

a crise pela qual atravessam actualmente alguns

e hoje a República da Moldávia é um Estado com

Estados membros. O eurocepticismo é uma reali-

uma clara vocação europeia.

dade que não pode ser negligenciada. Fala-se de

A União Europeia reconhece esta vocação, apre-

um sentimento de fadiga que moeria os recursos de

ciando os esforços reformadores do Governo

capacidade da União Europeia. Com tudo isso, não

pro-europeu de Chisinau empreendidos durante o

creio que a Europa entrou numa fase de confusão

46 • Diplomática - maio/agosto 2011


conceptual. Pode parecer um pouco estranho,

mas – arrisco afirmar – que a República da Moldávia está tentada a tornar-se na criança terrível (enfant terrible) da União Europeia. No sentido de que está disposta a demonstrar que pode realmente ser uma peça de resistência, lógica e natural na paisagem comunitária e, através de abordagens mais imaginativas, de desafios com um bom sentido características dos estados ainda jovens, não deixar que a Europa se canse… Moldávia, pelos logros realizados nos últimos tem-

O meu país deseja entrar

pos, transmitiu uma mensagem clara de que pode-

na Europa, não pela porta

ria interpretar com sucesso este papel. O meu país

de atrás, mas pela porta

deseja entrar na Europa não pela porta de atrás,

da frente, tendo todos os

mas pela porta da frente, tendo todos os documen-

documentos em ordem.

tos em ordem. E o fato de estar a ser considerada “a história de sucesso” da Parceria de Leste, é prova convincente da seriedade destas intenções. O problema mais grave com o qual se está a confrontar na actualidade a República da Moldávia e o conflito transdniestrense (da região Transdnístria). Os esforços internacionais empreendidos com vistas a sua solução deixam lugar à esperança de que, no final, poderia ser identificada uma solução inteligente e duradoura. Uma coisa muito animadora é o fato de que neste esquema chegou a ser

título especial – Portugal continua a apoiar a ideia

muito mais significativo o papel da União Europeia.

do alargamento da União Europeia aos Estados

As discussões entre o Chanceler alemão Ângela

aspirantes que cumpram os critérios de adesão, de

Merkel e o Presidente russo Dmitri Medvedev sobre

forma que apoia também a integração europeia da

este tema sugerem univocamente que o conflito

República da Moldávia. Estas coisas pesam forte

transdiestrense está na agenda estratégica das re-

na balança, sobretudo agora. Portugal conservou a

lações UE-Rússia e representa um teste sério, um

sua memória histórica, não se esquece que no tem-

“papel de girassol” do diálogo entre estes dois acto-

po devido contou com bons amigos que o apoiaram

res primordiais no contexto da solução dos proble-

nas suas aspirações democráticas e europeias, de

mas de segurança em Europa. A solução definitiva

modo que conhece o preço da solidariedade amigá-

do conflito constituiria uma vitória extremamente

vel.

importante, com valor simbólico, em igual medida

Quero sublinhar que esta atitude das autoridades

para a União Europeia, a Moldávia e a Rússia.

portuguesas está bem conhecida na Moldávia e

Enquanto Estado jovem, a República da Moldávia

é apreciada pelo justo valor. No só a nível oficial,

precisa de amigos e é sensível quando sente ao

mas também ao nível da sociedade, onde existe

seu lado um ombro no qual pode apoiar-se. Os mol-

uma grande simpatia tanto para com o Portugal his-

davos e os portugueses têm um provérbio comum:

tórico como também para com o Portugal moderno.

Um amigo na necessidade é amigo de verdade.

Acredito piamente que este sentimento é recíproco.

Durante todos estes 20 anos de independência,

Moldávia e Portugal são, geograficamente falando,

Portugal apoiou Moldávia nas suas aspirações de-

dois extremos do mundo latino na Europa, mas es-

mocráticas e nos esforços da reintegração territorial

tes extremos esquecem as distâncias e convergem

do país. Mais – e quero sublinhar este momento a

em direcção aos mesmos ideais.

maio/agosto 2011 - Diplomática • 47


Espaço diplomático

Norbert Konkol - Embaixador da Hungria

ser mais forte e mais profunda no final da presidência húngara do que foi no início. Isto é um grande sucesso, mas não essencialmente da presidência, mas de todos nós, da Europa. Ao lado da gestão da crise, as outras tarefas podem perder a sua visibilidade, apesar de terem a mesma importância. Do ponto de vista da política energética comum, os acordos assumidos no Conselho Europeu de 4 de Fevereiro são de grande importância. Os acontecimentos no Norte de África (fonte importante da energia consumida na Europa) e o grave acidente nuclear no Japão comprovaram a justificada preocupação da nossa presidência. Temos que continuar a trabalhar a sério no reforço da segurança energética da Europa. Ao lado dos avanços no terreno da energia, alcançamos importantes compromissos quanto ao futuro da política agrária comum (PAC) e a política da coesão, um dos pilares fundamentais de toda a União Eu-

Lema da presidência húngara: Europa Forte

ropeia, uma política que é fruto da solidariedade europeia e é de primordial importância, tanto para Portugal, como para a Hungria.

Desde 1 de Janeiro de 2011, e durante seis meses, a Hun-

Felicitamo-nos pela boa aceitação da cooperação macro

gria assumiu a presidência rotativa do Conselho Europeu

– regional, designada por Estratégia do Danúbio, que se

da União Europeia. É a primeira vez que somos presiden-

tornou um modelo que outros países e regiões querem se-

tes e olhamos para Portugal, que tem dimensões e popula-

guir. A Presidência Húngara lançou a Estratégia Romã que

ção semelhante à nossa, como um exemplo a seguir, dado

procura uma resposta a nível europeu e um quadro para

que é um estado-membro que já cumpriu com sucesso

solucionar os problemas da minoria cigana.

três períodos presidenciais.

Ficaram na agenda ainda muitos desafios: a questão da

De onde vem o sucesso de uma presidência? – é uma

imigração divide fortemente os estados-membros. A Presi-

pergunta recorrente .

dência Húngara entende a importância política deste tema.

Essencialmente, do facto de não deixar cair, de não perder

Quanto à adesão da Roménia e da Bulgária à área Schen-

o legado que nos foi confiado. Levar por diante esse pro-

gen, a Presidência Húngara procura um compromisso que

jecto, num bom rumo, de forma a encontrar as soluções,

seja aceitável para todos. Fechar as negociações sobre

e, ao mesmo tempo, não esquecer que a alma da Europa

a adesão da Croácia à União Europeia foi e será sempre

não reside nos dados macroeconómicos, mas sim dentro

uma prioridade da nossa presidência.

nós.

A presidência rotativa oferece uma oportunidade para o

Em 2011, o Mundo, e, naturalmente, a União Europeia,

país se apresentar. Temos muito gosto em receber os

atravessam grandes mudanças, inesperadas. A crise eco-

nossos parceiros europeus no palácio favorito da Rainha

nómica global, o colapso de sistemas que pareciam infalí-

Sissi – bem conhecida também pelos portugueses – em

veis, os novos desafios, determinam as tarefas. O Tratado

Gödöllő, que foi restaurado e renovado justamente para

de Lisboa marca o quadro de actuação para a presidência.

acolher as reuniões da Presidência Húngara. É bem-vin-

A Presidência Húngara tem sucesso? – questionam – nos.

do o crescente interesse pela política e pela economia da

Definimos como padrão de sucesso, desde o início, o

Hungria. E, aspecto que também não se deve esquecer,

reforço da integração, propósito ao qual se relaciona

respeita à gastronomia húngara, os deliciosos pratos e os

o lema da nossa presidência: uma Europa Forte. As

bons vinhos das nossas regiões vinícolas.

decisões do Conselho Europeu de Março definiram: com

Até agora sentimos a simpatia e o apoio moral e profis-

as medidas tomadas com o objectivo de evitar a crise

sional dos nossos parceiros europeus, a cooperação é

económica e a sua repetição, a integração europeia vai

exemplar. Desde já agradecemos a todos. ■

48 • Diplomática - maio/agosto 2011



grande Entrevista

Jorge Braga de Macedo

por António Alte Pinho e Maria da Luz de Bragança, fotos de Lígia Correia

Presidente do Instituto de Investigação Científica Tropical «Angola é a minha segunda pátria!» É infindável o curriculum do Prof. Dr. Braga de Macedo, mas, normalmente, as pessoas comuns reconhecem-no por ter sido ministro das Finanças, um cargo que, provavelmente, a ele colou a imagem “sisuda” que lhe construíram. Mas é de uma simpatia extrema e de um refinadíssimo sentido de humor. A conversa correu solta e rápida, porque, logo a seguir, fomos, na companhia de um diplomata brasileiro, visitar a fantástica exposição “Viagens e Missões Científicas nos Trópicos – 1883/2010”, patente no Palácio Condes da Calheta, no Jardim Botânico Tropical, em Belém, sob a égide do Instituto a que preside.

50 • Diplomática - maio/agosto 2011


A maior parte das pessoas,

do] – com quem me correspondia

Sim, ele conta isso – também esta-

quando ouvem falar do seu

– lançou-me o desafio de Direito.

va por essas andanças –, e tenho

nome, associam-no logo à Eco-

Foi interessante sugestão, porque

por ele também muita considera-

nomia, mas a sua formação ini-

o meu avô, que era economis-

ção.

cial é o Direito. Acabou o curso

ta – José Macedo, que escreveu

Talvez seja altura de falarmos na

em 1971 e foi contemporâneo de

sobre a autonomia de Angola –,

ligação do senhor professor ao

Marcelo Rebelo de Sousa e de

tinha convencido o meu pai a ir

Instituto de Investigação Cientí-

Carlos Veiga, ex Primeiro-Minis-

para Direito. Mas ele resistiu: “não

fica Tropical (IICT).

tro de Cabo Verde…

quero, quero ir para História”. Mas

Entrei no Instituto para dirigir um

Sim, com o Veiga encontro-me

o meu pai disse para ir para Direi-

centro de investigação, que é

muitas vezes nos aeroportos, mas

to. Tive de fazer uma secção de

coisa que os professores fazem

também já nos encontramos fora

Letras do liceu português e entrei

com muita regularidade. Havia um

deles.

na faculdade. A, minha primeira

convénio muito interessante que

Mas, voltando ao seu curso.

incursão em Economia foi com o

o Reitor da Universidade Nova da

Percorreu a parte final dos anos

professor João Lumbrales, que

altura, o professor Alfredo de Sou-

60, tempos de grande agitação.

era muito rigoroso e exigente, mas

sa, trouxe para a Nova, com meu

Sentiu-a à sua volta?

deu-me a nota mais alta que até

predecessor aqui, professor Cruz

Bom, é preciso compreender que,

então havia dado. E, a partir daí,

e Silva, indicando pessoas que

naquela altura, a escola de Econo-

decidi que queria fazer Economia.

estavam a dar aulas para também

mia em Portugal – o ISCEF – es-

Só que havia três, quatro cursos

fazerem investigação nas áreas

tava a decair aceleradamente para

no meio de uma vintena. E, en-

tropicais. Fui convidado, vim aqui,

uma baixa qualidade de ensino.

tão – claro que podia ter ido logo

achei interessante e, depois, a

Embora eu não tivesse bem a

para Económicas, mas iria para um

certa altura, quando isto começou

noção do que era a Economia, e o

sítio péssimo –, acabei o curso de

a funcionar bem – ainda por cima

meu pai até era historiador econó-

Direito. E, durante muitos anos, fui

o meu primeiro director, professor

mico. Mas, por qualquer razão des-

o único estudante português que,

Luís Albuquerque, era historiador e

conhecida, eu estava interessado

dois meses depois da licenciatura,

matemático, conhecia bem o meu

nas ciências experimentais, porque

já estava nos Estados Unidos a

pai, demo-nos, muito bem -, fui

no liceu era nessa alínea que esta-

estudar Economia para doutora-

ficando. Até porque quando estava

va inscrito. Aliás, ainda estive um

mento. A decisão estava tomada.

nos Estados Unidos tinha estado,

mês inscrito em Medicina.

Só para compreender que foi muito

também, num centro sobre ques-

E em que liceu é que esteve?

importante a minha passagem pela

tões da Economia do Desenvolvi-

No liceu francês.

faculdade, indiscutivelmente, foi lá

mento.

Pois, ali nas Amoreiras…

que já se viviam ao rubro as agi-

Há uma história interessante:

Sim. E tive uma grande sorte com

tações estudantis, com o Alberto

quando fui convidado pelo profes-

os professores que lá tive. Estava

Costa, com o Durão Barroso – que

sor Alfredo de Sousa – que era

na área de ciências. A minha ideia

ainda foi meu aluno – e o Ribeiro

uma pessoa muito frontal –, agra-

era, na altura, fazer Medicina,

Santos [assassinado pela PIDE,

deci-lhe muito e ele respondeu-me:

Psiquiatria, Psicologia… qualquer

em Económicas, em 12 de Outubro

“não me agradeça porque não

coisa nessa linha. Também adora-

de 1972 – nr], que também tive

havia mais ninguém interessado”

va Biologia, gostei muito de Físi-

ocasião de conhecer.

[risos].

ca… Mas o que aconteceu foi que

Chegaram, até, a viver próximo

Foi de uma frontalidade demoli-

não tinha formação de ciências

um do outro.

dora…

sociais, até porque, naquela altura,

Sim, os meus pais moravam na

Mas isto é revelador. Sendo nós

não havia. Mas gostava, também,

freguesia de Santa Isabel e a

um país, enfim, com responsabili-

muito de História, Geografia…

família dele na freguesia de San-

dades na globalização, no desen-

E foi viver para Paris um tempo.

tos. Conheci-o perfeitamente e

volvimento – quer de nós próprios

Pois fui. Nos anos 60 [risos]. E,

chegamos a falar muito. E conheci,

quer de outros territórios –, esta

de facto, senti essas experiências

embora mais tarde o José Lamego.

área está esquecida. E, portanto,

que referiu. Mas decidi voltar, e o

Baleado, também, na altura da

ninguém queria. E para um econo-

meu pai [Jorge Borges de Mace-

morte de Ribeiro Santos…

mista promissor – entre aspas

maio/agosto 2011 - Diplomática • 51


Jorge Braga de Macedo

«Quando fui convidado pelo professor Alfredo de Sousa – que era uma pessoa muito frontal –, agradeci-lhe muito e ele respondeu-me: ‘não me agradeça, porque não havia mais ninguém interessado’»

–, na área da economia e finan-

que ele se lembrasse de mim. E

cendo a parte institucional, esque-

ças internacionais, que é aquela

dei aulas em Angola, durante o

cendo a História, por exemplo. E

em que investigo e escrevo mais, o

serviço militar… portanto, o desen-

é curioso que já o meu avô tinha

desenvolvimento está um bocado

volvimento é uma paixão e uma

essa visão, o meu pai também…

ao lado, não é central. Mas, quan-

coisa muito interdisciplinar. Não se

Quer dizer, enquadrava bem nesse

do ele me falou, percebi que isto

pode analisar o desenvolvimento

universo de referências. Mas,

tinha interesse e fiquei muito grato

só pela parte económica, esque-

curiosamente, não está na moda.

52 • Diplomática - maio/agosto 2011


«Não se pode analisar o desenvolvimento só pela parte económica, esquecendo a parte institucional, esquecendo a História, por exemplo. E é curioso que já o meu avô tinha essa visão, o meu pai também… Mas, curiosamente, não está na moda»

Não estava na moda há 30 anos

vimento do milénio, que é a nossa

grupo da CPLP, mas a verdade é

– quando cheguei aqui ao IICT -, e

missão -, e tem um guineense,

que ninguém liga nenhuma. E isso,

continua a não estar. Ao ponto de

aluno do curso de Estudos Afri-

se quiser, reforça-me na convicção

termos agora uma exposição na

canos da Faculdade de Letras, a

de que é, de facto, uma área que

Faculdade de Letras – que é uma

dizer que considera a CPLP uma

tem de ser desenvolvida porque a

combinação entre os mestres de

instituição fantasma. E o homem

juventude percebe a importância

letras e os objectivos do desenvol-

disse a verdade. Há um pequeno

que tem a parte extra europeia.

maio/agosto 2011 - Diplomática • 53


Jorge Braga de Macedo

«Na tropa fui mobilizado para Angola, nunca até então tinha ido a África e, quando desembarco em Luanda, tenho o chamado déjà vu – eu já aqui estive! Não tinha estado nada»

54 • Diplomática - maio/agosto 2011


A geração mais antiga ainda tem

milénio. E, sem desprimor para

Francês, tenho dado aulas em

estados de espírito a pensar “se eu

Cabo Verde, em Bissau foi apro-

França nos últimos dez anos, vivi

acho que a lusofonia e os países

vada uma declaração sobre os

dez anos nos EUA, onde nasceram

emergentes são importantes, isso

objectivos do milénio, mostrando

os meus filhos… E por qual razão

quer dizer que sou menos euro-

que para os atingir, para além da

há-de ser Angola? Por um lado

peu” – uma visão bisonha! E nesse

vontade política, para além dos

há o meu avô, ele era republicano

aspecto – e fez bem em começar

fundos (medidos como percen-

e foi para lá exilado – e em 1910

por aí –, a minha formação predis-

tagens de ajuda sobre o produto

publicou até um livro intitulado “Au-

põe à interdisciplinaridade. Tenho

interno bruto), há o “conhecimento

tonomia de Angola”, que já vai na

uma área mais bicuda onde traba-

mútuo”. Quando se diz “não es-

terceira edição –, mas há também

lho mais, na investigação, mas nos

quecer Bissau”, está a falar-se de

uma razão muito afectiva: na tropa

outros aspectos serve-me muito.

um conhecimento mútuo que não

fui mobilizado para Angola, nunca

Por exemplo, este Instituto está

é só uns dos outros, mas uns dos

até então tinha ido a África e, quan-

integrado num grupo suportado

outros para chegar a posições co-

do desembarco em Luanda, tenho

pelo Banco Mundial, que apoia a

muns. E isto não é tão trivial como

o chamado déjà vu – eu já aqui

investigação agrícola.

possa parecer.

estive! Não tinha estado nada. E foi

Essa questão que colocou,

Suponha que – como alguma gen-

uma sensação tão forte que amigos

sobre a CPLP é interessante – e

te pouco esclarecida diz – “temos

que conheci lá, nessa altura, ango-

tem a ver sobre o que as pes-

de encontrar posições comuns

lanos e portugueses, continuam a

soas pensam da sua posição

no comércio”. Isso é impossível:

ser meus amigos, continuamos a

no mundo –, nós pensamos que

Portugal nessa matéria tem tudo

ter relações. E não duvido, por um

somos portugueses e só numa

determinado pela Comissão Eu-

momento que seja, que Angola é a

segunda linha pensamos ser

ropeia, o Brasil é um daqueles

minha segunda pátria.

europeus. Antes do europeu

países emergentes que – como

Senti o mesmo quando estive

vem a noção de fazermos parte

a China – estão a abocanhar o

em Santo Antão [Cabo Verde].

de um mundo que fala em portu-

comércio internacional, e depois

Já são dois déjà vu… isto tem de

guês. E parece-me que em Cabo

temos os países africanos que

ficar na entrevista [risos].

Verde está primeiro – como nós

ainda não aproveitam tanto como

Fixando-nos na sua segunda

– a identidade nacional, logo a

deveriam. Como seria possível

pátria. Angola é hoje um dos

seguir a consciência lusófona e

encontrar uma posição comum?

países com maiores índices de

lá no fim a identidade africana.

Aí não! Mas nos objectivos de

crescimento da Economia, mas,

Nós introduzimos uma expressão

desenvolvimento do milénio penso

paralelamente, o desenvolvimen-

para capturar isso, que é a lusofo-

que é possível. E, igualmente, são

to social não tem acompanhado

nia global. Porque a lusofonia – e é

possíveis posições comuns em

a vertente económica, embora

isso que vem no tratado constituti-

matéria de ciência e tecnologia.

pareça que nos últimos tempos

vo da CPLP – é a amizade comum.

Há uma declaração dos ministros

tenha sido feito algum esforço

É um bocadinho retórico, mas é

desta área, datada de 2003, que

para resolver essa contradição.

exactamente isso: são memórias e

envolve este Instituto nessa par-

Exactamente. É um fenómeno

histórias comuns. E é só para sa-

ceria, nessa colaboração. Foram,

sub-regional na África Austral, é

lientar que a lusofonia, como toda

curiosamente, os ministros da

um fenómeno atlântico, e é um

a organização multilateral baseada

Ciência e Tecnologia da CPLP que

fenómeno mundial que todos

numa língua comum, é falar uns

se interessaram pelo património

reconhecem. Enfim, houve guerra,

com os outros. Mas aquilo que es-

deste Instituto.

houve muita destruição. E há falta

tou a tentar promover, em colabo-

É sabido que tem uma relação

de informação sobre a realidade

ração estreita com o Secretariado

muito especial com Angola…

concreta que impede uma aprecia-

Executivo da CPLP é a lusofonia

É a minha segunda pátria, tenho

ção mais objectiva. Por isso, temos

global. E o que é isso? São os

que o dizer.

acordos com as universidades

oito países tentarem encontrar

Bebeu água do Bengo?

angolanas para tentar melhorar

posições comuns sobre problemas

É isso. Vou-lhe explicar, são várias

o conhecimento e, naturalmente,

internacionais, particularmente os

razões e todas elas importantes.

nisso o IICT está em conjunto com

objectivos de desenvolvimento do

Como lhe disse, estive no Liceu

uma série de outras instituições.

maio/agosto 2011 - Diplomática • 55


Economia & Finanças

Patrick Siegler-Lathrop is a French-American consultant living in Portugal, with a more than 30-year career as a Wall Street investment banker, entrepreneur, industrialist and professor, having taught at INSEAD and Paris University, Dauphine. He is a founding member of the international NGO Action Contre la Faim.

Patrick Siegler-Lathrop obteve graduações em Princeton, no Institut d’Etudes Politiques de Paris e em Harvard e deu início à sua carreira como banqueiro na área dos investimentos em Wall Street, Nova Iorque. O seu trabalho teve como foco central projectos internacionais ao nível dos países em desenvolvimento, tendo depois vindo a ocupar, em Paris, a posição de co-director na área dos investimentos num banco árabe-internacional. De seguida dedicou-se à indústria em França e mais tarde aceitou os cargos de Professor na Universidade de Paris, Dauphine, e no INSEAD, onde leccionou emprendedorismo de negócios. Juntamente com Françoise Giroud, Jacques Attali, Bernard-Henri Levy e outros nomes bem conhecidos, foi um dos membros fundadores da ONG internacional Acção Contra a Fome, organização essa a que deu o seu apoio durante mais de trinta anos. Actualmente reside em Portugal e trabalha como consultor internacional.

The Financial Crisis

A Crise Financeira

An Overview

Uma Perspectiva

Here we are in the spring of 2011 and the

Porque haveremos nós, europeus, de sofrer os ex-

Western world is still reeling from the effects of

cessos dos E.U.A? Não foi culpa nossa. É isto que

the financial crisis of 2008. What is going on?

ganhamos com a globalização?

Aren't things supposed to be better by now?

Eis-nos na Primavera de 2011 e o mundo Ocidental

What is most surprising is that we are surprised.

ainda se vê a braços com os efeitos da crise finan-

The financial crisis of 2008 is universally

ceira de 2008. O que se passará? Não deveríamos

recognized as the worst since the 1930's. A

estar melhor agora?

crisis of these dimensions causes years of

Antes de mais, o que surpreende é que esta situ-

disruption. It takes many years before economies

ação ainda nos surpreenda. A crise financeira é

fully recover.

universalmente reconhecida como a pior desde a

How did we get into this mess? The U.S. Share

década de 30 do século XX; e vários estudos mos-

of Responsibility

tram que estas crises provocam períodos de pertur-

As we know, the financial crisis began with

bação, levando vários anos para que as economias

an "asset bubble" in the U.S. housing market.

se restabeleçam .

Homeowners in the U.S. were encouraged to

Como chegámos a este descalabro? Os E.U.A par-

borrow against the inflated value of their homes,

tilham responsabilidades.

even to use the money elsewhere (a practice

Como sabemos, a crise financeira começou com a

which is illegal in France). As housing prices

chamada «Bolha» do mercado imobiliário, tendo ha-

continued to rise to exaggerated levels (in the

vido uma sobreavaliação dos preços das casas nos

8 years 1998-2006, prices of homes in the U.S.

E.U.A., alimentada pelo empréstimo maciço para

rose an unprecedented 86%), lenders continued

suportar esses valores exagerados (em 8 anos – de

56 • Diplomática - maio/agosto 2011


to provide more and more loans, ignoring to

1998 a 2006 – o preço real das casas nos E.U.A.

impose minimal qualifications for borrowers, who

aumentou uns sem precedentes 86%).

continued to borrow based solely on the inflated

O colapso dos preços das casas começou em 2007

value of their homes, even though they did not

desbaratando 8 biliões de dólares em termos de

have the income to pay the loans back.

riqueza imobiliária e levou a uma enorme perda de

The collapse of housing prices beginning in

confiança nas instituições financeiras. A falência do

2007 wiped out $8 trillion in home ownership

Lehman Brothers, um dos maiores bancos de inves-

wealth and revealed the gaping hole between

timento, despoletou uma queda maciça nos preços

the quantity of debt and the real value of

das acções em cerca de 55% nos 17 meses subse-

houses, generating huge potential losses and

quentes, gerando dezenas de biliões de dólares em

a complete collapse of confidence in financial

perdas adicionais.

institutions. The bankruptcy of one of the largest

A Administração Republicana decidiu inicialmente

investment banks involved, Lehman Brothers, in

não salvar o banco Lehmans Brothers mas, face ao

September, 2008, triggered a massive - about

impacto devastador dessa decisão, expurgou-se

55% - drop in stock prices over the next 17

da habitual ortodoxia a fim de evitar o colapso total

months, representing tens of trillions of dollars in

do sistema financeiro. Basicamente acabou por

additional losses.

nacionalizar os principais credores das hipotecas,

The U.S. Republican Administration had at the

assim como a maior companhia de seguros (a AIG)

time decided not to save Lehman Brothers.

garantindo um financiamento avultado de forma a

But observing the devastating impact of that

salvar os bancos mais importantes.

decision, they threw out prevailing orthodoxy to

Mas o mal estava feito: paralelamente ao declínio

avoid a total collapse of the financial system and

da actividade bolsista global, as economias dese-

basically nationalizing the principal mortgage

quilibraram-se, as falências multiplicaram-se por

lenders and the largest insurance company (AIG)

todo o lado, o desemprego e a pobreza afectaram

and extending massive financing to save the

dezenas de milhões. Nos E.U.A., a queda na activi-

leading investment and commercial banks.

dade económica não só coloca os bancos em risco,

However, the harm was done, and it had

mas também os gigantes industriais - a General

major global consequences. Everywhere,

Motors e a Chrysler estão já à beira da falência

stock markets declined, economies faltered,

em Dezembro de 2008. O governo dos E.U.A. foi

bankruptcies increased, unemployment and

obrigado a intervir com programas de estímulo para

poverty struck tens of millions. The worse

salvar bancos e grandes indústrias, injectando cen-

recession in 80 years spread throughout the

tenas de biliões de dólares para evitar que a grave

world. In the U.S., the drop in economic activity

recessão se transformasse numa grande depressão

put not only banks at risk, but industrial giants

económica.

as well - both General Motors and Chrysler were

Esta situação não acontece subitamente, foi-se

on the verge of bankruptcy in December, 2008.

avolumando durante décadas, começando com

The U.S. Government was obliged to step in with

uma mudança fundamental na filosofia económica

massive stimulus programs to save banks and

E.U.A. aquando da eleição do presidente Ronald

major industries, pumping hundreds of billions

Reagan em 1980 que, junto com Alan Greenspan,

of dollars to prevent a serious recession from

introduziu uma era de desregulamentação, em es-

becoming a major depression.

pecial do sector financeiro. O resultado foi a criação

These events didn't happen overnight, they were

de um pequeno número altamente lucrativo e muito

in the making for decades, beginning with a

poderoso de bancos comerciais e de investimento.

fundamental shift in U.S. economic philosophy

O seu crescimento espelhou um crescente domínio

at the election of President Ronald Reagan

da finança na economia Americana, com a Wall

in 1980, who, along with Alan Greenspan,

Street a ganhar um enorme poder e a finança a

introduced an era of deregulation, particularly of

eclipsar todos os sectores da economia – por exem-

the financial sector. The result was the creation

plo, em 2008, 40% do rendimento das 500 maiores

of a small number of enormous, hugely profitable

empresas americanas proveio da actividade finan-

and very powerful investment and commercial

ceira (e não da venda de produtos e serviços). Hou-

banks.

ve também uma mudança paulatina e invasiva

maio/agosto 2011 - Diplomática • 57


The Financial Crisis A Crise Finaceira

Their growth mirrored an increasing dominance

na Banca: os bancos comerciais costumavam

of finance in the U.S. economy, with Wall Street

focar-se na protecção dos depósitos dos seus

gaining enormous power and finance eclipsing

clientes e no financiamento do crescimento das

any sector of the economy – for example, in

empresas e comunidades, ao passo que os bancos

2008, 40% of the income of the 500 largest U.S.

de investimento serviam, sobretudo, para financiar

listed companies came from financial activity

a suas empresas e as empresas públicas. Gerar

(and not from selling products and services).

dinheiro era importante, mas a banca era ainda

There was also a gradual but pervasive shift

uma empresa de serviços. Tal já não acontece. Na

in banking: it used to be that commercial

viragem do século, a banca tornou-se num negócio

banks were focused on protecting their clients’

cujo único interesse era o de gerar dinheiro para si

deposits and financing the growth of companies

mesma.

and communities, just as investment banks

Isto terá sido, porventura, uma consequência da

sought to serve their company and government

maior aceitação da filosofia “greed is good” (a cobi-

clients by providing financing. Making money

ça é boa) nos E.U.A., com as subidas espectacula-

was important, but banking remained a service

res na renumeração dos banqueiros de investimen-

industry. No longer. By the turn of the century,

tos e gestores de empresas, com uma crescente fé

banking had become a business solely geared to

no mercado de capitalista selvagem enquanto único

generating profits for itself.

sistema económico viável, com a vontade de uma

This was perhaps a bi-product of a greater

cada vez menor intervenção do Estado (a queda do

acceptance of a "greed is good" philosophy in

muro de Berlim em 1989 e o colapso da ex-União

the U.S., with spectacular rises in remuneration

Soviética vieram solidificar essa fé quase religiosa

of top investment bankers and company

dos americanos nas forças de mercado). Paralela-

managers, an increasing U.S. faith in unbridled

mente dá-se uma maior tolerância em relação ao

market capitalism as the only efficient economic

endividamento, quer do Estado quer da banca, quer

system, with the less Government intervention,

mesmo dos cidadãos.

the better (the fall of the Berlin wall in 1989 and

Estas tendências fundamentais criaram, sem dúvi-

the collapse of the USSR only solidified the

da, um ambiente permissivo, mas a “Bolha” do mer-

U.S.' virtually religious faith in market forces).

cado imobiliário terá sido também alimentada por

In parallel followed a greater tolerance for high

medidas específicas nos últimos anos, incluindo:

levels of debt, be it for governments, banks or

- uma iniciativa estatal do governo americano de

individuals.

promoção à aquisição de casa própria;

These fundamental trends no doubt created a

- as taxas excessivamente baixas do Banco Central

permissive environment, but the housing bubble

Americano;

was also fed by specific measures over the past

- a criação e crescimento desmedido de novos

few years, including:

instrumentos financeiros, que ninguém realmente

- a U.S. Government intent to promote home

percebia ou conhecia o real valor, que providencia-

ownership;

ram um financiamento adicional à enorme subida

- a U.S. Central Bank providing exceedingly low

de empréstimos imobiliários apoiado pelo aumento

interest rates;

do valor nominal das propriedades;

- the creation and enormous growth of new

- Avaliações positivas dadas (alguns diriam, irres-

financial instruments, which no one really

ponsavelmente) pelas agências de rating a esses

understood or knew how to value, providing

novos instrumentos financeiros que, por seu turno,

additional funding for a huge increase in real

deram maior confiança aos investidores para inves-

estate lending backed by rising nominal housing

tir em produtos financeiros que em poucos meses

valuations;

seriam considerados como «lixo tóxico»;

- Rating Agencies (many would say,

- a aceitação, por parte do bancos comerciais e

irresponsibly) providing positive judgments on

de investimento, de uma alavancagem excessiva

these new financial instruments, giving investors

(empréstimos com pouco suporte de capital) em

confidence in investments that would only

número cada vez maior;

months later suddenly be deemed "toxic assets";

- o gasto sem limite dos consumidores americanos

- banks and investment banks accepting

que pediam empréstimos excessivos baseados no

58 • Diplomática - maio/agosto 2011


excessive leverage (borrowing on a low capital

valor empolado das propriedades imobiliárias;

base), substantially increasing their risks;

Tudo isto levou a uma exposição desmesurada do

- U.S. consumers spending without limits,

sistema financeiro ao hipotecar empréstimos de

borrowing excessively on the basis of

credores insolventes tornando-se num “cocktail”

exaggerated housing valuations,all of the above

explosivo.

leading to a huge exposure of the financial

Uma «bolha» acontece quando o mercado, ou seja

system to mortgage loans to unworthy creditors,

a soma da procura e da oferta, acredita que os

an explosive cocktail.

valores continuaram a subir perante uma lógica que

An asset bubble occurs when "the market" - the

sugere precisamente o contrário. Em determinada

sum of buyers and sellers - believes that values

altura, surge um momento de concretização da

will continue to rise in the face of reasonable

antiga parábola «O rei vai nu»: o mercado perde

logic which suggests the opposite. At some

confiança, a “bolha” rebenta e o valor colapsa. E

point, there comes a moment of realization

com o mercado a oscilar, poderá ser excessivamen-

that "the emperor has no clothes", the market

te positivo haver confiança. A perda desta acarreta

loses confidence, the bubble bursts, and values

custos igualmente excessivos.

collapse. And just as "market swings" may be

E isso foi o que aconteceu em 2008 e, como tal,

excessively positive when there is confidence,

estamos a sentir ainda os efeitos e continuaremos a

loss of confidence leads to losses which are just

senti-los por mais algum tempo.

as extreme.

Como chegámos a isto? Quais as responsabilida-

That is what happened in 2008; we are still

des da Europa?

feeling the effects, and will continue to do so for

Porque haveremos nós, europeus, de sofrer os

some time.

excessos dos E.U.A.? Não foi culpa nossa. É isto

How did we get into this mess? What is the

que ganhamos com a globalização?

Responsibility of Europe?

É fácil, e muitos diriam até legítimo, colocar a culpa

Why should we Europeans suffer from U.S.

inicial e principal da crise financeira no sistema

excesses? It was not our fault. Is this what we

Americano, com todas as partes a contribuírem

get from Globalization?

para os excessos: o Estado, reguladores legais,

It is easy, and many would say quite legitimate,

banqueiros gananciosos, agências de rating irres-

to place the initial and principal blame for the

ponsáveis e consumidores perdulários, mas os

financial crisis on the U.S. system, with all

Europeus não são chamados à responsabilidade,

parties seeming to contribute to the excesses:

particularmente nas fases subsequentes da crise.

the Government, lax regulators, greedy bankers,

O que significa a globalização? Significa que as

irresponsible rating agencies and spendthrift

comunicações são tão fluidas que é fácil para um

consumers, but Europeans are not bereft of

banco em Frankfurt ou Reykjavik participarem

responsibility, particularly in the subsequent

em negócios em Nova Iorque. Muitos dos bancos

phases of the crisis.

europeus foram tão activos quanto os seus pares

What does globalization mean? It means that

americanos na compra de investimentos america-

communications are so fluid that it is easy for

nos «tóxicos». Tanto os bancos americanos como

a bank in Frankfurt, or Reykjavik, to participate

europeus espalharam agressivamente o modelo

in deals in New York, so many European

americano pela Europa, onde o empréstimo exaus-

banks were just as active as their American

tivo também levou ao aumento do preço das casas

counterparts in purchasing U.S. "toxic assets".

excessivamente em países como a Irlanda, a Espa-

Both U.S. and European banks aggressively

nha e o Reino Unido.

spread the U.S. model to Europe, where

A mutuários europeus não solventes foram igual-

expansive lending also pushed up housing

mente oferecidos termos de dívida generosa por

prices excessively in Ireland, Spain, the U.K.

parte dos bancos em toda a Europa, seguindo o

Non-creditworthy European borrowers were also

exemplo dos E.U.A. de aumentar a sua alavanca-

offered generous debt terms by banks all over

gem (emprestando mais sobre uma pequena base

Europe following the U.S. example of increasing

de capital), o seu perfil de risco, e a sua rentabilida-

their leverage (borrowing more on a small capital

de.

base), their risk profile, and their profitability.

A globalização significa também que se houver o

maio/agosto 2011 - Diplomática • 59


The Financial Crisis A Crise Finaceira

What globalization also means is if there is a

mais pequeno pânico no mercado imobiliário ame-

wind of panic in the U.S. housing market, and

ricano ou na Wall Street, imediatamente terá efeitos

on Wall Street, it will immediately affect the

psicológicos no resto do mundo e a não ser que

psychology of the rest of the world, and unless

haja razões locais fortes para travar a tendência, o

there are strong local reasons to buck the trend,

medo torna-se global.

then the fear becomes global as well.

Com o advento da recessão global e com os riscos

With the advent of a global recession, and risks

para a banca e para a indústria disseminados, os

to the banking and industrial sectors everywhere,

governos de todo o mundo seguiram o exemplo

governments all over the world followed the U.S.

americano de contrair cada vez mais empréstimos,

example of borrowing more to pump money into

de forma a injectar dinheiro na economia a fim de

the economy, to save banks and industries.

salvar bancos e indústrias.

But in Europe, greater government borrowing

Porém, na Europa, os empréstimos públicos não

could not have come at a worse time. Because

poderiam ter vindo em pior altura. Devido ao bai-

of lackluster growth in many European

xo crescimento em muitas das economias euro-

economies over the past decade, governments

peias ao longo da última década, os governos já

had already been running deficits beyond

se tinham tornado deficitários para além de seus

their means. The European social model was

meios. O modelo social europeu ficou claramente

clearly under considerable pressure, with many

sob considerável pressão, com muitos observado-

considering that Europe could no longer afford

res a considerarem que a Europa não podia mais

excessively generous publicly financed pension

pagar os generosos regimes de pensões, finan-

schemes growing in cost for markedly older

ciados publicamente, a uma crescente população

populations. With the effects of global recession,

significativamente mais velha. Com os efeitos da

all European governments were faced with the

recessão global, todos os governos europeus foram

additional problem of declines in revenues (from

confrontados com o problema adicional de queda

lower tax receipts) and increases in expenditures

na receita (de menores receitas fiscais) e aumentos

(to cover higher unemployment), so already high

nos gastos (para cobrir o aumento do desemprego).

government deficits grew substantially, requiring

Desta forma, os défices orçamentais já elevados

still more government borrowing.

aumentaram substancialmente, exigindo ainda mais

Borrowing large amounts is not necessarily

empréstimos do governo.

bad, if markets are confident the borrower has

O financiamento de grandes quantias de dinhei-

the long-term ability to reimburse the debt. But

ro não é necessariamente mau, se os mercados

countries such as Greece, Ireland and Portugal

confiarem que o mutuário tem a capacidade a longo

not only have very high levels of government

prazo para reembolsar a dívida. Mas países como a

debt, but structural weaknesses in their

Grécia, Irlanda e Portugal não só têm níveis muito

economies - fragile banks, relatively high labor

altos de dívida pública, como também apresentam

costs, high individual debt, poor tax collection,

grandes debilidades estruturais nas suas econo-

expensive pension regimes, a declining share

mias - os bancos frágeis, os custos laborais relati-

of exports and large current account deficits -

vamente elevados de dívida alta, impostos baixos,

leading to the market’s reaction reflecting some

regimes de pensão caros, um declínio de exporta-

doubt about the ability of these countries to

ções e os grandes deficits em conta corrente - que

continue to pay off high and increasing levels of

leva à reacção do mercado, reflectindo uma certa

debt.

dúvida sobre a capacidade desses países de conti-

As always with markets, once confidence is

nuar a pagar crescentes níveis de dívida.

lost, values decline dramatically: for example,

Como sempre acontece com os mercados, uma

as market fears around Portuguese debt grew,

vez que a confiança é perdida, os valores declinam

the value of Portuguese debt securities declined

dramaticamente. Por exemplo, como os receios do

precipitously and the cost of borrowing rose

mercado em torno da dívida portuguesa cresceram,

quickly to an unsustainable level.

o valor de títulos de dívida portuguesa caiu vertigi-

What can a country like Portugal do to get out

nosamente e o custo dos empréstimos subiu rapi-

of the mess? Under normal circumstances,

damente a um nível insustentável.

Portugal would almost certainly consider a

60 • Diplomática - maio/agosto 2011

O que pode um país como Portugal fazer para sair


large devaluation of its currency, combined

desta situação? Em circunstâncias normais, Por-

with imposing much higher interest rates and

tugal quase certamente consideraria uma grande

government fiscal discipline. Such an approach,

desvalorização da sua moeda, combinada com a

although not without pain, would if applied with

imposição de taxas de juros muito mais elevados

discipline, almost certainly provide the basis

e disciplina fiscal do governo. Essa abordagem,

for an attractive medium-term solution for the

embora não sem dor, se aplicada com disciplina,

country.

certamente fornece a base para uma solução atrac-

However, Portugal is in the Euro zone, it has lost

tiva a médio prazo para o país.

control over exchange rate and monetary policy

No entanto, Portugal está na zona do euro, que per-

to the European Central Bank in Frankfurt, so

deu o controlo sobre a taxa de câmbio e a política

neither devaluation nor raising of interest rates is

monetária do Banco Central Europeu em Frankfurt.

possible.

Por isso, nem a desvalorização ou a elevação dos

What about rescheduling its debt? This is not

juros é possível.

an option for the moment, as it would close

E quanto à renegociação da dívida? Esta não é uma

off access to financing, which the country

opção no actual momento, uma vez que iria impedir

desperately needs to refinance existing maturing

o acesso ao financiamento, que o país necessita

debt. And since much of the Government debt

desesperadamente para refinanciar a dívida existen-

is owned by banks (domestic and foreign),

te em maturação. E uma vez que grande parte da

rescheduling would add a major risk to the

dívida do governo é da propriedade de bancos (na-

banking system.

cionais e estrangeiros), o reescalonamento acrescen-

So long as it is in the Euro zone, the Portuguese

taria um grande risco para o sistema bancário.

Government has had no other choice but to turn

Enquanto estiver na zona do euro, o Governo Por-

to the European Union, the European Central

tuguês parece não ter outra escolha senão recorrer

Bank and the IMF to ask for help, which has

à União Europeia e ao FMI para pedir ajuda, o que

led to the recently announced agreement for a

levou ao estabelecimento do acordo recentemente

78 billion bailout over three years. Is it a "good

anunciada de 78 milhares de milhão de euros com

agreement for Portugal", as outgoing Prime

resgate nos próximos três anos. "É um bom acordo

Minister Jose Socrates has said? It is too early

para Portugal", como disse o demissionário Primei-

to say.

ro Ministro, José Sócrates? É cedo demais para

But just as Portugal initially gained from

dizer isso. Mas após Portugal ter inicialmente ga-

participating in the Euro zone, recent events

nho ao participar na zona euro, os acontecimentos

show that when things become more difficult, the

recentes mostram que, quando as coisas se tornam

Euro may be as much of a burden as it has been

mais difíceis, o euro passa a ser mais um fardo do

a benefit.

que um benefício.

n

n

1 See for example the excellent study by Reinhart and Rogoff, "The Aftermath of Financial Crises", a paper prepared for a meeting of the American Economic Association on January 3, 2009. 1 Vide “The Aftermath of Financial Crises” de Reinhart and Rogoffr, artigo publicado aquando a reunião da Associação Americana de Economia ao 3º de Janeiro de 2009; 2 In the U.S. financial market, debt instruments are given a "rating", like a grade, by supposedly independent Rating Agencies, which rating generally determines the value the market gives to the debt. The three dominant Rating Agencies, Moody's, Standard and Poor's and Fitch, often gave their highest "AAA" rating to debt instruments secured by real estate assets which proved to be hugely overvalued. 2 No Mercado financeiro Americano, aos instrumentos de dívida é dada uma classificação (rate) pelas supostamente independentes agências de rating que servem para avaliar o valor de mercado da dívida. A três agências mais importantes - Moody's, Standard and Poor's and Fitch – bastas vezes deram a cotação máxima de AAA a instrumentos de crédito suportados pelo calor de propriedades imobiliárias que vieram a se verificar como muito sobrevalorizados. 3 It is troublesome, although not surprising, to note that not a single person in the U.S. has been prosecuted, among those having contributed to the loss of ten of trillions of dollars and the huge increase in poverty, and although certain measures have been taken, for example, to reduce the level of leverage or borrowing that banks may take on, none of the measures the U.S. has put into place addresses the fundamental cause of the financial crisis. It is back to business as usual with spectacular profitability for the leading banks. 3 Nestas convulsões, apesar de não ser surpresa nenhuma, nenhuma pessoa, entre aqueles que contribuíram para a perda de dez biliões de dólares e acentuado aumento dos níveis de pobreza nos E.U.A, foi indigitada. Pese embora algumas medidas tenham sido tomadas como, por exemplo, a redução do nível de alavancagem ou de empréstimo que os bancos podem aceitar, nenhuma se dirige directamente às causas fundamentais da crise financeira. 4 The current account is a country’s net balance of exports and imports, plus current financial flows, but excluding capital accounts. Portugal's current account deficit has remained around a dangerously high 10% of GDP for the past decade. 4 A conta corrente é o saldo líquido de um país das importações e exportações, além dos actuais fluxos financeiros, mas excluindo as contas de capital. O défice de Portugal em conta corrente manteve-se em torno de um perigosamente alto 10% do PIB na última década.

maio/agosto 2011 - Diplomática • 61



Economia & Finanças

«Troika» traçou diagnóstico do País e estabeleceu compromisso para empréstimo de 78 mil milhões

Chegaram a ser designados por Cavaleiros

depressa possível», afirmou Poul Thomsen,

do Apocalipse, mas, na verdade, as equi-

que liderou essa equipa. O FMI irá contribuir

pas lideradas por Jürgen Kröger (Comissão

com um terço do valor do pacote de ajuda a

Europeia), Rasmus Rüffer (Banco Central

Portugal (26 mil milhões de euros), naquele

Europeu) e Poul Thomsem (Fundo Monetá-

que será o terceiro maior empréstimo actual

rio Internacional), nos poucos dias em que

da instituição em 58 países, depois da Grécia

estiveram em Portugal, ouviram diversas

e México.

entidades públicas e privadas, analisaram as

O impacto do plano sobre a economia vai ser

condições financeiras do país, o estado dos

severo. O país estará em recessão pelo me-

sectores da economia com maiores dificul-

nos até 2012 – com uma contracção do PIB

dades e traçaram o diagnóstico da situação,

de 2% –, o desemprego vai subir até aos 13%

delineado num memorando de medidas de

em 2013 e a dívida pública disparará cerca de

compromisso para, em troca, o país receber

50%, passando de 83,3% do PIB (151 mil mi-

uma ajuda financeira de 78 mil milhões de

lhões de euros) para 130% (229 mil milhões).

euros. Contrapartidas definidas pela troika

Contas feitas, Portugal irá deter a segunda

«como ambiciosas, equilibradas e realistas»

dívida pública mais alta da Europa, a seguir à

e que irão permitir a Portugal voltar a crescer

Grécia (150% do PIB), ultrapassando países

em 2013 e regressar aos mercados «o mais

como Itália, Irlanda, Bélgica e Islândia.

n

maio/agosto 2011 - Diplomática • 63


gestores internacionais

Fernando Mendes,

Administrador-delegado da Legrand por António Alte Pinho, fotos Lígia Correia

Uma viagem ao futuro Um país constrói-se com a força e capacidade empreendedora dos homens. E não deve ceder ao conformismo. Fernando Mendes é uma voz contra a resignação

64 • Diplomática - maio/agosto 2011


Uma visita à Casa Domótica é

preenchida com a satisfação do de-

onde produzi sempre os melhores

um momento inesquecível. E, se as

ver cumprido, por isso as palavras

produtos fabricados na Europa ou

nossas memórias recuarem no tem-

saem soltas e firmes, ininterruptas,

no mundo. De maneira que, agora

po, ficaremos com a ideia de termos

como que antevendo as perguntas

também na Legrand, é mais um

entrado numa série de ficção cien-

do jornalista que, avisadamente, o

desses casos”, dispara como que a

tífica. Só que não é! Passados os

deixa continuar a oratória, quase

desafiar aqueles que fazem da im-

primeiros momentos de surpresa,

não o interrompendo.

potência forma de estarem na vida.

descemos à Terra e damos por nós

Percebe-se o amor que o liga ao

E percebe-se outra coisa, o nos-

dentro da “casa inteligente” da Le-

país, a sua vontade em ajudar a

so interlocutor tem uma confiança

grand, em Carcavelos – uma casa

superar as dificuldades que to-

fundada na mão-de-obra que ajuda

“de verdade” que Fernando Men-

dos atravessamos, sem nunca

ao crescimento da empresa e à sua

des, o Administrador delegado da

se render ao fatalismo daqueles

posição referencial no mercado.

multinacional francesa em Portugal,

que se entregam às dificuldades

“As tomadas e os interruptores que

nos mostra sem esconder o orgulho

colocando-se do lado da doença.

fabricamos são, muito possivelmen-

de estar a fazer história. A ficção já

Por isso acredita na capacidade

te, os melhores produtos do mundo

era. O futuro é uma realidade!

produtiva nacional e nas energias

na sua área”. Uma visita às insta-

A conversa começa dentro da

positivas que podem enfrentar a cri-

lações fabris permite-nos perceber

própria casa modelo da Legrand. O

se. “Sempre vi as unidades indus-

que a cadeia produtiva está assen-

Administrador-delegado não perde

triais do país a produzirem óptimos

te em elevados padrões tecnológi-

tempo em frases de circunstância,

produtos. De maneira que aquele

cos. A linha de montagem está cen-

porque para este homem o tempo

discurso, para mim perfeitamente

trada na robotização, os operários

é coisa preciosa que tem de ser

idiota, de que em Portugal não se

mais parecem “cientistas” caídos ali

administrada com parcimónia… E

produz nada como deve ser é um

de um filme de ficção científica. O

vai direito ao assunto: “Exportamos

discurso que não compreendo, não

controlo de qualidade rege-se por

80 por cento da nossa produção.

aceito… é o discurso de pessoas

elevados patamares de rigor e todo

Contrariamente a muitos dos meus

que não querem ou não sabem de-

o processo está concebido para

concorrentes, sou um exportador de

senvolver o nosso país”, diz com a

que as pessoas não sejam peças

produtos, não sou um exportador

segurança de quem não se entrega

de uma engrenagem mas técni-

de divisas” – só para que, logo no

a depressões nem espera que os

cos habilitados que emprestam à

início, tudo fique claro. E di-lo com o

outros venham resolver por si. A

tecnologia o olhar cuidado de uma

orgulho de alguém que sabe serem

sua confiança nesta, estranhamente

formação contínua – grande aposta

difíceis estes tempos e a economia

sempre tão esquecida capacidade

da empresa.

precisa do dedicado esforço de

empreendedora dos portugueses,

A menina dos olhos

todos.

está presente em cada palavra dita

Sem dúvida, a Casa Domótica é a

Fernando Mendes trabalha em

e na firmeza de um olhar que nunca

sua menina dos olhos. Uma casa

Portugal desde 1979. A sua história

se refugia na impotência: “tive a

que “permite aos portugueses vive-

de vida profissional é muito rica e

sorte de dirigir unidades industriais

rem de uma forma mais cómoda, de uma forma mais segura. Uma casa

Um homem dos “sete instrumentos”

inteligente, comandada através

Fernando Mendes, um engenheiro electrotécnico formado no Instituto

de um telemóvel, de forma remota

Superior Técnico, está ligado ao sector eléctrico desde sempre. Após

de qualquer ponto do mundo”. E

acabar o curso (1975), ruma à Suécia, especializando-se na área de

de tal forma assim é que, a título

protecção de redes eléctricas. Em 1979 regressa a Portugal onde traba-

de exemplo, imagine-se na China,

lha ligado à área de equipamentos de energia, nomeadamente no sector

tocam-lhe à campainha da sua

de redes eléctricas. Após a experiência, mantém-se cinco anos na área

casa de Lisboa e, surpresa das sur-

dos telefones móveis e, posteriormente, no comando e controlo de

presas, remotamente e através do

centrais eléctricas e infra-estruturas de telecomunicações. Passou pela

telemóvel você mesmo pode falar

Sorefame, com competências de gestão, e ali se manteve até aceitar

com o visitante, vendo em tempo

uma proposta da Legrand para dirigir a empresa em Portugal, corria o

real essa pessoa. É o utilizador que

ano de 1996.

programa todo o sistema de acordo ➤

maio/agosto 2011 - Diplomática • 65


Fernando Mendes

“Aquele discurso, para mim perfeitamente idiota, de que em Portugal não se produz nada como deve ser é um discurso que não compreendo, não aceito… é o discurso de pessoas que não querem ou não sabem desenvolver o nosso país”

com as suas necessidades.

monitorização da segurança, o céu

Moçambique e Cabo Verde, um

“Mesmo técnicos que têm um co-

parece ser o limite e, com o andar

volume de negócios para exporta-

nhecimento avançado, chegam aqui

dos tempos e o aumento da procu-

ção na ordem dos 35 milhões de

e dizem: ‘mas pensávamos que isto

ra, a Casa Domótica poderá vir a

euros – o que, em plena recessão

era o futuro’. E nós dizemos: não,

estar à disposição de bolsas mais

não deixa de ser um valor surpreen-

com a Legrand, isto já é o presen-

modestas, “democratizando-se” o

dente. Em 1981 a Legrand, adquire

te”. E é mesmo! As opções são pra-

universo de consumidores.

a empresa J. B. Corsino e, em 88,

ticamente ilimitadas, com soluções

Um colosso empresarial

adquire a Sociedade Industrial de

acessíveis facilmente programadas

Com mais de 160 unidades es-

Produtos Eléctricos, cuja fábrica é

e reprogramadas pelos usuários.

palhadas pelo mundo, o grupo

a que a empresa francesa agora

Após uma breve explicação do fun-

Legrand aposta forte no mercado

ocupa, transformando duas unida-

cionamento e da compreensão da

nacional, cuja fábrica de Carcave-

des de nível médio num grande acti-

sua lógica, os técnicos da Legrand

los tem considerável autonomia.

vo de produção, como já se disse,

tornam-se dispensáveis. Das tare-

No plano internacional, a fábrica

fundamentalmente virado para a

fas mais comezinhas como abrir e

nacional exporta para 50 a sessen-

exportação, dotando o país de uma

fechar estores, desligar e ligar elec-

ta países de todos os continentes,

unidade de excelência no sector de

trodomésticos, até à manipulação

nomeadamente países africanos de

infra-estruturas eléctricas e tecnolo-

de sistemas de rega de jardins e

língua portuguesa, como Angola,

gias de informação para edifícios.

66 • Diplomática - maio/agosto 2011

n


One of the best

O Prazer de um Encontro Sinta o momento. E deixe o tempo parar.

Convidamo-lo a acompanhar-nos até à Quinta da Aveleda numa viagem dos sentidos.

maio/agosto 2011 - Diplomática • 67


Quinta da Aveleda

Produzir uma grande aguardente como a Adega Velha, requer tempo, mas não só. É

necessário muito mais. Tudo começa nas vinhas da Quinta da Aveleda, em Penafiel, onde são seleccionadas as uvas que estão na origem de um vinho equilibrado na acidez e rico no aroma. É esse vinho que vai ser posteriormente submetido a duas lentas e cuidadas destilações em alambique Charentais, trazido especialmente da região de Cognac, em França. Na penumbra da adega, ao som de cânticos gregorianos, cada fenda, cada recanto testemunha o profundo sono de 10 anos deste precioso néctar. A magnífica cor âmbar e a riqueza do bouquet são o resultado do repouso longo e preguiçoso em cascos de carvalho da região de Limousin, famosos pelas características únicas da sua madeira. São ao todo 398 pipas. A aguardente mais antiga é de 1974, a mais recente de 2009.

No centro do corredor estreito da adega está em exposição a primeira garrafa da Aguardente Adega Velha, datada de 12 de Maio de 1971. Ao lado, também em mostra, está a garrafa, trazida da Rússia por um antepassado da Família Guedes, que serviu de inspiração ao modelo actual.

68 • Diplomática - maio/agosto 2011


Com uma tonalidade intensa e sabor suave e equilibrado, a Adega Velha apresenta

uma riqueza de aroma a lembrar bagas e flores silvestres, envolvida por uma sensação delicada de aroma e travo a madeira nobre. A sua origem em uvas aromáticas e frescas com baixo grau alcoólico, provenientes da Região Demarcada dos Vinhos Verdes, confere-lhe a suavidade, o aveludado e a complexidade aromática tão apreciados.

Ligações Perfeitas A Aguardente Adega Velha é ideal para servir como digestivo, acompanhada de chocolate preto com canela e por um Charuto Montecristo n.º 4 ou uma cigarrilha VegaFina. Deve ser servida a uma temperatura entre os 18 e 20º C.

Um hino aos sentidos e à vida. Uma obra-prima que se escreve lentamente e que vale a pena partilhar com aqueles de quem mais gostamos.

n

maio/agosto 2011 - Diplomática • 69


Crónica de uma visita

Roderick Micallef,

director geral do Corinthia Hotel Lisbon

Requinte e bom gosto

A manhã começara pouco auspiciosa, as

o homem do volante apresentou-se falador

trovoadas nocturnas, a insónia e mais dois

e dado à chalaça. Pois… – dizia eu a cada

ou três textos que me haviam sobrado

invectiva do “fogareiro”. Por fim, lá percebeu

pela madrugada, anunciavam um dia para

que o cliente havia acordado com os pés de

esquecer. Eis que, inesperadamente, o

fora e, logo de seguida, acelerou a máquina

telemóvel toca. Era a Directora…

empreendendo louca corrida pelas ruas de

…Se eu podia passar pelo Corinthia, ali na

Lisboa.

Columbano Bordalo Pinheiro, o Director-geral

Chegados ao hotel, o porteiro simpático e

do hotel aguardava-me para pequena con-

formal logo se adestrou a abrir a porta do

versa. E logo nesse dia. Apanhei um táxi,

carro. Saí, olhei para cima e não me

70 • Diplomática - maio/agosto 2011


Corinthia Hotel Lisbon

agradou muito o que vi. O edifício é com-

tempo frágil e firme, de quem me interpe-

pacto bloco de betão, vidro e altura irrom-

lava. Teresa de Châtillon apresentava-se-

pendo pelo céu adentro, qual foguetão.

me com um sorriso envolvente e a postura

De pé atrás, lá entrei e os meus olhos

sóbria de Directora de Relações Públicas. O

reviraram-se num misto de surpresa e en-

dia começava a nascer, abrindo a esperan-

cantamento. A arquitectura exterior, própria

ça de uma visita inesquecível ao hotel de

de uma época em que “ser moderno” era

Sete Rios.

construir para cima rompendo o infinito

A passos cadenciados, acertando o ritmo

na ostentação de grandeza, confrontava-

com a conversa anfitriã, lá nos fomos diri-

se com o refinado gosto da arquitectura

gindo, eu, a Teresa e a Lígia – a fotógrafa

interior, da escolha elegante dos móveis, da

da revista que, entretanto, chegara -, para

exímia combinação de quadros e bibelôs,

o majestático elevador espelhado e am-

da criteriosa arrumação de

plo que nos conduziu ao

equipamentos e discreto

A arquitectura exterior, própria

Executiv Club onde, numa

profissionalismo dos fun-

de uma época em que “ser mo-

ampla sala de reuniões,

cionários.

derno” era construir para cima

nos aguarda Roderick Mi-

Segunda surpresa: o rodo-

rompendo o infinito na ostenta-

callef – o jovem Director-

pio de hóspedes, pagando

ção de grandeza, confrontava-

geral da unidade hoteleira.

contas ou fazendo o check

se com o refinado gosto da ar-

Terceira surpresa! Aliada

in, induzia ao pensar – en-

quitectura interior, da escolha

à simpatia de Roderick,

ganador – de estarmos no

elegante dos móveis, da exímia

a vista sobre Monsanto

átrio de um aeroporto, tal

combinação de quadros e bibe-

quase me roubou a fala.

era o número de pessoas.

lôs, da criteriosa arrumação de

Do alto daquela torre que,

O que é contraditório. O

equipamentos

à chegada, havia olhado

Corinthia é um hotel de

num misto de surpresa e

cinco estrelas, um tipo particularmente não

desencantamento, o parque natural parecia

dado a afluências massivas… Puro engano!

entrar pela vidraça adentro e, por momen-

Ao requinte do luxo – discreto e elegante,

tos, vivenciei memórias de caminhada

diga-se de passagem – alia-se a “demo-

remota por socalcos e veredas, inalando

cracia” dos preços, abrindo portas a várias

o cheiro campestre e retendo o estridente

bolsas e fazendo da unidade hoteleira refe-

som dos pássaros anunciando o retempero

rencial para estadias de trabalho e breves

breve de energias e a exaltação da alma.

passagens turísticas por Lisboa.

A vista é deslumbrante, fazendo-nos até

Anunciei-me a um dos recepcionistas, que

irrelevar a tendência arquitectónica que,

se me dirigiu com um sorriso discreto e uma

tapando o horizonte da cidade, encheu

elegância própria a tratamento de príncipes.

Lisboa de elegias pungentes dessas criatu-

Tamborilando os dedos por uma das mesas

ras que, com razão ou sem ela, atazanam,

do foyer, reclinando-me na confortável

não raras vezes insanas, a paciência de

cadeira e olhando de soslaio o vai e vem da

quem lê jornais e faz zapping pela pasma-

entrada, aos poucos, começou a apagar-se

ceira noticiosa das televisões… Adiante. O

a incomodidade de uma manhã que previa

arquitecto do espaventoso edifício estava

pouco auspiciosa.

perdoado. Razões maiores de paisagem

A voz da senhora, aveludada e firme,

sobrepunham-se à discutível estética.

despertou-me do vaguear mental a que me

Conhecer Roderick foi a quarta surpresa! O

entregara. Levantei-me, percorri o olhar a

seu precário português, entrecruzando-se

três quartos de mim e, numa segunda sur-

com o meu limitado inglês – com vantagem

presa, vislumbro a graciosidade, ao mesmo

para ele pelas melhores razões –,

maio/agosto 2011 - Diplomática • 71


Corinthia Hotel Lisbon

1

2

3

1. Um bar acolhedor 2. Uma vista sobre Lisboa 3. O requinte de uma sala privada do Executive Club ➤

abriu caminho à conversa solta. Logo no

com os clientes, foi assimilando as contingên-

início desmanchamo-nos a rir. Falávamos de

cias de um negócio que, pese embora uma

nacionalidades e o Director-geral atirou: “sou

passagem de sete anos pela auditoria e con-

maltês”… Inicialmente não percebeu a graça,

sultadoria de contabilidade, se lhe entranhou

mas, com tacto e diplomacia lá lhe fui dizen-

na pele como coisa inexorável.

do que nesta língua de Camões a designa-

E tanto é assim que, num impulso, respondeu

ção quer dizer… vadio, vagabundo. Agora,

a anúncio da maior empresa hoteleira do seu

foi ele que se desmanchou e logo anunciou:

país, precisamente a Corinthia, e veio a assu-

“vou passar a dizer que sou de Malta”. É

mir o cargo de director financeiro. Anos mais

que, como dizia o outro, o português é muito

tarde, chega a Portugal como representante

traiçoeiro…

da empresa na sociedade partilhada de ou-

A hotelaria entrou-lhe cedo pela vida adentro.

tras unidades hoteleiras. De seguida – como

A família era proprietária de um pequeno ho-

uma inevitabilidade – é nomeado Director-

tel – em Malta, naturalmente – e Roderick foi

geral do Corinthia Hotel Lisbon.

“pau para toda a obra”. Mas nesse universo

Há oito anos que Lisboa é sede do lar que

familiar, na partilha de saberes e no convívio

partilha com a mulher e os filhos. A capital

72 • Diplomática - maio/agosto 2011


4

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6

4. O charme discreto do bom gosto 5 e 6. Malo SPA, o paraíso aqui tão perto

acolheu-o generosa, nesse velho abraçar

e acanhadas ideias. Ou, ainda, no Malo SPA

de culturas que são linha genética da alma

– seguramente o melhor da capital -, espa-

portuguesa. Sente-se em casa!

ço de tratamento do corpo e ambiência zen

E em casa senti-me eu, percorrendo os

apelativa à introspecção. Ao início da noite,

corredores amplos do Corinthia, recolhendo

a mestria gourmet do Corinthia espera-nos

em cada detalhe a perenidade do bom gosto

envolvente, permitindo viagem deslumbrada

que, mesmo com o passar dos anos, sempre

pela gastronomia de autor, ou, para gostos

fica como memória colectiva e imagem de um

mais simples, a jóia aconchegante da gastro-

estilo que, seguramente, será ainda o mote

nomia nacional.

de quem - partindo aqueles que hoje “aqui”

À saída, a certeza de que a manhã desse dia

moram - segurará o manifesto elegante de

que parecia aziago, foi momento único, pela

um conceito de hotelaria já com meio século

envolvência do espaço, o prazer da conversa

de história.

e a corrente de afectos que fruiu no conheci-

Vale a pena ir. Nem que seja para beber um

mento mútuo e na afinidade do bom gosto.

n

copo, ao final da tarde, no magnífico jardim

Texto: António Alte Pinho

traseiro – coisa única nesta Lisboa de betão

Fotos: de Lígia Correia

maio/agosto 2011 - Diplomática • 73


Viagens & Lazer

Turismo em Angola Clima de paz e desenvolvimento propiciou aumento da procura

Cachoeiras do Binga Praias deslumbrantes, uma fauna e flora inigualáveis, excelente gastronomia, são alguns dos atractivos que o turista encontra em Angola. Para fazer face à crescente procura, o Governo aposta em mais unidades hoteleiras, formação de quadros qualificados e num plano estratégico de “marketing” e promoção.

Um sector em crescente desenvolvimento, eis como

Para fazer face à procura, o Executivo angolano prevê

pode ser encarado o Turismo em Angola. De acordo

criar, em 2011, um plano estratégico de marketing e

com o Ministério do Planeamento, o país vai registar,

promoção para o turismo, que visa a divulgação das

em 2011, um movimento de cerca de 500 mil turistas.

potencialidades turísticas do país

Estes números constam do relatório do Ministério

Estes dados optimistas já tinham sido objecto de refe-

do Planeamento sobre o Plano Nacional 2011/2012,

rência por parte do vice-ministro angolano da Hotela-

apresentado no Seminário Nacional sobre Sistema de

ria e Turismo, Paulino Baptista, ao visitar a Bolsa de

Planeamento, Sistema Estatístico Nacional e Orçamen-

Turismo de Lisboa de 2011, que decorreu em Fevereiro

to Geral do Estado (OGE).

passado, na FIL.

O relatório refere que para este ano está previsto um in-

Paulino Baptista, que foi acompanhado pelo embaixador

cremento de 82 mil visitantes. Em 2010, visitaram Ango-

de Angola em Portugal, José Marcos Barrica, e de altos

la 397 904 turistas, já em 2009 o número de visitantes

funcionários do seu ministério, disse que o turismo é

foi 365 784 e em 2008 ainda menos, 294 258 turistas.

“essencial” para o contínuo crescimento da economia

Ou seja, uma procura sempre em crescendo!

do país, exortando a importância do seu fomento.

74 • Diplomática - maio/agosto 2011


Fendas de Tundavala

O governante angolano lembrou “que a qualidade do

Além destes elementos típicos da cultura, fauna e flora

turismo em Angola, ainda em fase de crescimento, tem

angolanas, alguns recursos naturais e monumentos

aumentado nos últimos anos, graças ao clima de paz,

históricos, tais como a figura do pensador (símbolo ori-

estabilidade e desenvolvimento que o país vive”.

ginário da cultura tchokwé), a Palanca Negra Gigante,

Durante os cinco dias do certame, Angola esteve repre-

o embondeiro e outros símbolos de interesse turístico

sentada por mais de 30 operadores do ramo hoteleiro e

estiveram patentes no evento, através de cartazes, pos-

de agências de viagem, possibilitando firmar parcerias

tais, fotografias e guias turísticos.

de investimentos e financiamentos, capazes de aumen-

Durante a feira foi também promovida a cultura, com

tar a importância económica do turismo. No certame,

peças de artesanato e danças, os hotéis, restaurantes

Angola apresentou as zonas turísticas como as Fendas

e sítios, assim como troca de experiência com inves-

de Tundavala e Serra da Leba, na província da Huíla,

tidores e turistas de países dos continentes africano,

as Quedas de Calandula, de Mussequele e Pedras de

europeu, americano e asiático.

Pungo Andongo (Malanje), as Quedas do Mupa (Huam-

A capacidade hoteleira angolana – um dos problemas do

bo), as Cachoeiras do Binga (Kwanza Sul).

sector com uma maior procura versus oferta por parte

maio/agosto 2011 - Diplomática • 75


Turismo em Angola

Mussulo

das unidades turísticas – está a ser reforçada com a

perímetro. Numa primeira fase, os pólos serão imple-

conclusão, em 2011, de cinco novos hotéis nas provín-

mentados nas localidades de Calandula,na província

cias de Luanda, Benguela, Cabinda, Huíla e Namibe,

de Malanje, Cabo Ledo ( Bengo) e Okavango ( Kuando

projectadas inicialmente para apoiarem o Campeonato

Kubango).

Africano das Nações (CAN). A par disso, o arranque da

Não faltam atractivos

edificação de escolas para as formação hoteleira e turis-

Angola é um país de riquezas naturais e ambientais

mo em Benguela e Huíla,Luanda está na sua fase final,

deslumbrantes, comportando, desde os seus 1650 Km

sinal de que existe uma procura de qualidade da oferta,

de costa ao interior, inúmeras riquezas naturais. Estão

nos seus Vários níveis, por parte dos responsáveis do

lá as grandes florestas tropicais, rios, lagos, quedas

sector.

d’água, montanhas, formações rochosas extraordiná-

Entre as principais metas do Ministério da Hotelaria e

rias, cavernas e grutas, desertos e praias belíssimas.

Turismo para este ano, de relevar a reclassificação dos

O território angolano abriga também uma fauna extensa

hotéis já existentes em função dos serviços já prestados

que inclui elefantes, antílopes de diversas espécies,

e a melhoria dos serviços nos empreendimentos hotelei-

leões, zebras, gazelas, rinocerontes, hipopótamos, gira-

ros e similares, regulando e disciplinando as actividades

fas, avestruzes, macacos, gorilas etc.

de acordo com os padrões internacionalmente aceites.

Destaques

Outro dos objectivos para 2011 é o início da criação de

Ao sul de Luanda, encontra-se a “ilha” do Mussulo, na

pólos turísticos em pontos do País com potencialidades

realidade uma restinga envolvida por uma série de pe-

naturais atraentes em conformidade com a especifici-

quenas ilhas. O visitante pode escolher: o lado continen-

dade de cada região, integrando em cada projecto a

tal, de águas calmas, ideais para a prática de desportos

edificação de hotéis, restaurantes e lodges num mesmo

náuticos, e característica cobertura de coqueiros;

76 • Diplomática - maio/agosto 2011


Paços do Concelho, Benguela, Parque Nacional de Kissama e Pedras de Pungo Andongo

ou o lado oceânico, com o mar de águas limpas mais

Lobito. Nas principais cidades é possível encontrar um

agitado, quebrando junto à praia de areia branca e qua-

povo alegre e receptivo. Pode-se conhecer ainda repre-

se deserta, habitada apenas por pescadores nativos.

sentantes legítimos de grupos étnicos que conservam

Parque Nacional de Kissama (província do Bengo)

suas tradições originais, como os mucubais (província

Actualmente, o que apresenta melhor estrutura para re-

do Namibe, sudoeste do país), os cuanhamas (Cunene,

ceber o turista, já que contou com vultuosos investimen-

no sul) e mumuílas (Huíla, sul).

tos do governo e pelo facto de estar próximo de Luanda.

Gastronomia

Parque Nacional do Iona

Destacamos o prato típico de Angola, o funge, uma

Região do deserto do Namibe (na província de mesmo

espécie de polenta cremosa feita com farinha de man-

nome, ao sudoeste do país). Nas proximidades, há ain-

dioca ou de milho. O acompanhamento pode ter: a

da a Reserva do Namibe

quisaca (folhas do pé de mandioca maceradas, cozidas

Palmeirinhas

e temperadas); o peixe fresco ensopado; o peixe seco

A grande praia de Palmeirinhas, também ao sul de

cozido ou assado; a galinha cabidela (ao molho pardo);

Luanda, com suas ondas mais pronunciadas, fica a

a muamba (prato à base de galinha, amendoim, quiabos

base do Miradouro da Lua, uma formação de falésias

e outros temperos); ou o feijão preparado no óleo de

que permite desfrutar uma bela vista do mar angolano,

palma (tipo de azeite de dendê), entre outros.

principalmente no pôr-do-sol.·

Para quem gosta de frutos do mar o destaque vai para

Benguela

os pratos preparados à base de lagosta ou camarão,

Na província de Benguela, destaque para as praias de

que podem ser encontrados a preços convidativos em

Caota, Caotinha, Baía Azul e Baía Farta, ao sul da ca-

vários restaurantes e bares da cidade e também na orla

pital. Ao norte da cidade de Benguela, fica a restinga do

da “ilha” do Cabo (na baía de Luanda).

n

maio/agosto 2011 - Diplomática • 77


Diplomacia no feminino

As Primeiras Damas de Belém Memórias e confissões das mulheres dos presidentes da República em democracia retratadas em livro que foi apresentado no Jardim da Cascata, no Palácio de Belém

Elas foram testemunhas fundamentais dos primórdios da democracia em Portugal, contactaram com protagonistas célebres da vida contemporânea, protagonizaram histórias e lembranças, tornaram-se vanguardistas de causas sociais, cúmplices e apoiantes nos bastidores das decisões dos maridos. “As Primeiras Damas” deste país estão, pela primeira vez, retratadas no livro da jornalista Alberta Marques Fernandes, apresentado em lugar condigno, no Jardim da Cascata, do Palácio de Belém. Um evento que contou com a presença inesperada de Aníbal Cavaco Silva, que fez questão de cumprimentar a autora que respondeu a um desafio lançado pela Esfera dos Livros. Um desafio bem sucedido. Coube a Leonor Beleza fazer a apresentação da obra, destacando a “dignidade e sobriedade” das personalidades em foco e o facto de “escolherem a sua visibilidade para ajudarem as pessoas e uma enorme força para dar apoio aos respectivos maridos na sua função e para criarem o seu próprio papel na sociedade”. Quatro Primeiras-Damas do pós-25 de Abril, cujas memórias foram recolhidas pela jornalista, estiveram ali pela primeira vez reunidas, partilhando um momento único, carregado de emoção , é claro, de memórias. Manuela Eanes, Maria Barroso, Maria José Ritta (Jorge Sampaio também assistiu à cerimónia) e Maria Cavaco Silva (ladeada pela filha, Patrícia, e pelos netos, Mariana e Afonso). Alberta Marques Fernandes teve a sua lado a filha, Luísa, cujo crescimento acompanhou o desenvolver deste livro. Na fotografia de grupo da capa do livro faltam Maria Helena Spínola, a mulher discreta do primeiro Presidente da República do pós-revolução, general António de Spínola e Maria Estela Costa Gomes, que, segundo se lê no livro, estabeleceu uma “relação inquebrável” do marechal Costa Gomes, o sucessor de Spínola e que chegou a confessar os seus “dias de tédio” em Belém. Ambas já desaparecidas, preferiram , na altura, permanecer na sombra dos maridos, enquanto as restantes quatro encontraram nas suas funções uma oportunidade única de ajudar quem mais necessitava, abraçando causas solidárias várias. Mas todas elas, sem excepção, foram testemunhas privilegiadas dos momentos mais marcantes desta jovem democracia (a entrada para a CEE, por exemplo), privando com os protagonistas mais célebres da História contemporânea, como foi o caso de Margareth Thatcher, François Mitterrand, os Papas João Paulo II e Bento XVI, Nelson Mandela, Madre Teresa de Calcutá e os reis de Espanha e do Reino Unido, com quem estabeleceram até relações de profunda amizade, que privilegiam até hoje. Em conversas especiais, únicas mesmo, Maria Alberta Fernandes recolheu as suas memórias, algumas nunca contadas, lembranças que as paredes do Palácio Belém tinham guardadas em bom recato e que jamais esquecerão. As quatro, sem excepção, revelaram que as decisões do Presidente são sempre muito solitárias e que, politicamente,

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maio/agosto 2011 - Diplomรกtica โ ข 79


As Primeiras Damas

não procuraram influenciar as decisões dos maridos. Preferiram mesmo

dedicar-se às causas sociais, ainda que Manuela Ramalho Eanes tenha admitido que é muito diferente ser mulher do Presidente a seguir a uma revolução, do que quando a democracia já está estabilizada. Opinião semelhante manifestou Maria Barroso, que entende que agora se vive uma época difícil, em que é preciso dar as mãos e deixar de lado as ideologias políticas de forma a vencer as dificuldades - esse um factor comum que parece agora unir estas quatro Primeiras-Damas, sinais que continuam atentas ao Mundo que as rodeia e aos seus factores de crise.

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Texto: Maria Dulce Varela Fotos: Presidência da República / Luís Catarino

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Mala diplomática

Dia Nacional do Paquistão

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Por ocasião do Dia Nacional do seu

que congratula a adopção de uma

1. Embaixadores do Paquistão

país, o Embaixador do Paquistão,

resolução que teve lugar na cidade

2. António Alvim e Ana de Brito

Albert Matondang, convidou para

histórica de Lahone, em 1940, e

a sua recepção, que teve lugar no

que votou pelo estado independen-

Hotel Tivoli em Lisboa, persona-

te do Paquistão. Sete anos depois,

4. Dom Duarte de Bragança

lidades dos mais diversos meios

sob a liderança de Quaid-i- Azam

5. Paula Bobone e Ana Calheiros

sociais, diplomáticos, económicos e

Muhammad Ali Jinnah, a 14 de

6. Lénia Godinho e Për Störm

políticos.

Agosto de 1947 nasceu um país.

7. Embaixadores de França

Apesar das recentes dificuldades

A reunião decorreu num ambiente

devido à catástrofe que assolou o

de grande cordialidade, os convida-

Paquistão, o Embaixador não quis

dos desfrutaram de um magnífico

deixar de comemorar o Dia Nacio-

cocktail, repleto de sabores e tem-

nal do seu país. Um aniversário

peros típicos.

3. Alice Mateus, Embaixadora do Paquistão, Ana Caetano e António de Macedo

n

maio/agosto 2011 - Diplomática • 81


mala diplomática

Dia Nacional da Sérvia Festa em ambiente… clássico

Prestes a deixarem Portugal, os

a Sérvia e Portugal: a passagem do

embaixadores Dusko e Nina Lopan-

centenário da aplicação do primeiro

dic receberam os inúmeros amigos

Tratado Comercial assinado entre

e membros do Corpo Diplomático

os dois países, ratificado em 1911;

no Palácio Foz, Lisboa

e terem decorrido 70 anos desde a

Por ocasião do Dia Nacional da

entrada do então Reino da Jugos-

Sérvia, a Embaixada daquele país

lávia na Segunda Guerra Mundial,

em Lisboa organizou um recital,

facto que também teve algumas

seguido de cocktail, no Palácio Foz,

consequências importantes nas re-

Lisboa.

lações bilaterais dos países, como

Aleksandar Vujic, pianista, compo-

lembrou o diplomata:. “Foi a partir

sitor e director de orquestra sérvio,

de Lisboa que, em Maio de 1941,

iniciou o recital com seis peças

um grupo de cidadãos jugoslavos,

da sua autoria. Na segunda parte,

no qual se incluiam alguns diploma-

o cantor baixo-barítono Svetozar

tas, foi evacuado de vários países

Vujic, interpretou obras de Scarlatti,

da Europa ocupada num comboio

Mozart, Williams, Isidor Bajic, Taj-

especial. Lembramos que no grupo

cevic e A. Vujic. O programa incluiu

de diplomatas contavam-se dois

ainda, como artista convidada, a

grandes poetas e escritores sérvios:

pianista Ivana Talijan, cidadã sérvia

Milos Crnjanski e Jovan Ducic. Este

residente em Lisboa, que interpre-

último foi, inclusivamente, envia-

tou Rigoletto de Liszt.

do diplomático da Jugoslávia para

O evento contou com a presença

Portugal».

de cerca de 200 convidados, entre

Apontando, em seguida, alguns dos

destacou as áreas da cooperação, em crescendo, entre a Sérvia e Portugal, desde a Política, Assuntos Militares à area Científica, sublinhando que a Cultura pode ser um bom veículo para que os povos dos

os quais se encontravam membros

objectivos políIticos e económicos

do Corpo Diplomático acreditado

do seu país – entre os quais, se

em Portugal, personalidades da

inclui a integração na União Euro-

vida política portuguesa, da área

peia – Dusko LopandiK destacou as

económica, da cultura e membros

áreas da cooperação, em crescen-

da comunidade sérvia em Portugal

do, entre a Sérvia e Portugal, desde

(diáspora).

a Política a Assuntos Militares, da

Os actuais Embaixadores, Dusko

Cultura à área Científica.

e Nina Lopandic, estão em Portu-

“Faremos todos os esforços para

gal há cerca de quatro anos e irão

que essa tendência continue. Esta-

abandonar o país brevemente.

mos todos empenhados em que a

Ambos estabeleceram ao longo dos

Sérvia não seja conhecida apenas

últimos anos um elevado número de

pelos seus excelentes jogadores

relações e amizades em Portugal,

de ténis ou por Emir Kusturica. É

primando pela simpatia no trato.

necessário que os dois povos se co-

Vão, certamente, deixar sauda-

nheçam melhor, e a cultura é o me-

des…

lhor meio, na minha opinião, para

O embaixador Dusko Lopandic

que tal aconteça. Gostaria apenas

proferiu algumas palavras alusivas

de lembrar que, no ano passado,

ao acto, lembrando que, em 2011,

organizámos exposição colectiva

se comemoram dois acontecimen-

de pintores jugoslavos, sob o nome

tos importantes nas relações entre

“Carrefour”, em Lisboa», disse.

82 • Diplomática - maio/agosto 2011

O embaixador Dusko Lopandik

n➤

dois países se conheçam melhor


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1. Embaixador da Sérvia Dusko Lopandic e sua esposa, Embaixatriz Nina Lopandic 2. Embaixatriz do Luxemburgo Nadine Schmitt, Embaixatriz da França Pascalle Teixeira da Silva e Christina Gillies 3. Nuno Vaz de Moura e Embaixador da Croácia Zeljko VUkosav 4. A estilista Gertrudes Évora Turner com a Embaixadora da Noruega Inga Magistad 5. O futebolista sérvio Vukasin Devic e sua noiva. 6. Conselheira Katarina Milenkovic

maio/agosto 2011 - Diplomática • 83


Solidariedade

Soroptimist International Mulheres solidárias despertam consciências “Soroptimist International é a mais antiga e a maior

ências para este flagelo, que contou com a presen-

organização mundial de Mulheres Profissionais que

ça do Ministro da Administração Interna Rui Pereira

nasceu em Oakland, Califórnia em 1921, hoje com

que fez uma brilhante e instrutiva alocução sobre

mais de 90.000 membros em todo o mundo, organi-

este crime, e ainda com as interessantíssimas

zadas em Clubes locais congregados nacionalmen-

palestras da Senhora Secretária de Estado Para a

te numa União que reporta a uma das cinco Fede-

Igualdade Elza Pais, da Directora do Observatório

rações mundiais geograficamente organizadas, que

do Tráfico de Seres Humanos Joana Wrabetz, da

por sua vez reportam à Presidente Mundial.

Inspectora Luisa Maia Gonçalves que tem no SEF

Os objectivos desta organização mundial são os da

altas responsabilidades, do Director Executivo do

promoção dos Direitos Humanos e, em particular

Centro Europeu que define a policy para a Europa

o estatuto da Mulher, a protecção das Crianças,

nesta matéria Peter von Bethlenfalvy , de Manuel

manter vivo e activo o espírito de serviço e de soli-

Albano - Coordenador a nível nacional do Tráfico

dariedade contribuindo para a compreensão interna-

de Seres Humanos sob a égide da Secretária de

cional e amizade universal, assumindo a função de

Estado para a Igualdade e da Presidência do Con-

alertar consciências para a necessidade de ajudar à

selho de Ministros, do Director-Geral no Ministério

eliminação da pobreza, da discriminação de género,

dos Negócios Estrangeiros da Turquia na área do

do tráfico de seres humanos, de formas de violência

Asilo, Vistos e Tráfico de Seres Humanos Berlan

contra mulheres e crianças e para a promoção da

Pars Alan e de Teresa Rosmaninho, membro do

igualdade de acesso à educação e à saúde.

Clube Soroptimista Porto Invicta, que fundou e

O primeiro Clube em Portugal que se constituiu em

dirige a Casa Porto de Abrigo que recolhe Mulheres

1985, foi o SI Clube Lisboa Fundador, actualmente

Vítimas de Violência e de Tráfico. Presidiu à sessão

Presidido pela Advogada Lénia Godinho Lopes,

a Presidente Mundial do Soroptimist International

que em iniciativa conjunta com a Embaixatriz da

Hanne Jensbo e foram Moderadoras das Mesas a

Áustria Joana Wrabetz, organizaram uma recolha

Presidente da União de Portugal Graça Viegas e

de fundos a favor da CAP – Centro de Acolhimento

a Presidente do SI Clube Lisboa Fundador Lénia

e Protecção a Vítimas de Tráfico de Seres Huma-

Godinho Lopes. Os assistentes a esta Conferencia

nos, através de um jantar oferecido pela Senhora

foram muito participativos tendo-se destacado a in-

Embaixatriz na Residência Oficial dos Embaixado-

tervenção do Embaixador da Suécia, país que tem

res da Áustria, que além de ter recolhido fundos

sido pioneiro em legislação que tem como objectivo

e proporcionado uma agradável confraternização

combater este tipo de criminalidade.

entre todos os presentes, permitiu a divulgação da

Seguiu-se um Recital de Piano por Teresa da

obra que a CAP está a desenvolver no acolhimen-

Palma Pereira no Palácio Foz, uma jovem Pianista

to de Mulheres Vitimas de Tráfico, tendo havido

já com créditos dados a nível internacional e que

também uma mostra de vários objectos feitos pelas

muito orgulha o nosso país nos vários concursos

Mulheres acolhidas nesse Centro, que foram ad-

internacionais em que tem ficado em primeiro lugar.

quiridos pelas participantes, revertendo o produto

A fechar as comemorações do quarto de século de

de tal venda a favor das suas autoras, dando-lhes

Soroptimismo em Portugal realizou-se o jantar que

assim, além de um pequeno benefício pecuniário,

teve lugar no Palácio Magalhães, com um espec-

estimulo e integração. O jantar contou também com

táculo produzido por Telmo Miranda, cuja voz, bem

uma interessante palestra de Ana Vicente, que

como a de Ana Lains e a intervenção do mágico

falou sobre A Mulher e a República, tendo sido feita

Ricardo, proporcionaram ao evento lindíssimos

uma retrospectiva do papel da Mulher na República

momentos, tendo terminado com a alegre, divertida

e dos avanços e recuos do seu estatuto durante

e muito profissional actuação da Tuna de Farmá-

estes cem anos.(ver fotos).

cia, para gáudio dos participantes portugueses e

No âmbito das comemorações do 25ºAniversário

estrangeiros, sendo que para esta Conferencia

do SI Clube Lisboa Fundador, foi também organiza-

Internacional e eventos, vieram a Portugal repre-

da uma Conferência Internacional sobre Tráfico de

sentantes de doze países estrangeiros, com uma

Seres Humanos, com o propósito de alertar consci-

forte participação dos Países nórdicos.

84 • Diplomática - maio/agosto 2011

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1. Jantar comemorativo dos 25 anos do Soroptimismo no Palácio Magalhães 2. A pianista Teresa Palma Pereira com as flores entregues por Lenia Lopes, presidente do SI Lisboa Fundador 3. Maria da Luz de Bragança com Isabel Ernani Lopes 4. A Embaixatriz da Austria, presidente do Soroptimismo em Portugal com a Dra. Lenia Lopes 5. A Embaixatriz e Dra. Ana Vicente que falou sobre a" Mulher e a Répública"

maio/agosto 2011 - Diplomática • 85


Cultura

Mário Lúcio Sousa

por António Alte Pinho, foto de José Ramos

O ministro artista

Precocemente, riscava no chão térreo, com o pequeno dedo de menino de 5 anos, as palavras mágicas que, já soletrando, lia de rótulos de embalagens de banha, de manteiga ou azeite, arquitectando uma estrutura mental de analogias com as aventuras de criança

com clara visão de um projecto de Cultura activo, mobilizador e eficaz. Andarilho deste nosso Mundo de diversidades, de miscigenações e cruzamento de culturas, Mário Lúcio Sousa cedo se amanhou no universo das letras. Precocemente, riscava no chão térreo, com o pequeno dedo de menino de 5 anos, as palavras mágicas que, já soletrando, lia de rótulos de embalagens de banha, de manteiga ou azeite, arquitectando uma estrutura mental de analogias com as aventuras de criança. Prenúncio seguro de outras aventuras – coisas É um dos nomes maiores da cultura cabo-verdia-

mais “sérias” de adulto –, o ministro, na pacatez

na. Músico, compositor, cantor, escritor, drama-

mansa de um de hotel da cidade da Praia, vai

turgo, poeta… o universo de Mário Lúcio Sousa

para meio ano, explicou com os olhos brilhantes

espraia-se por quase todas as áreas da cultura e,

das memórias do passado: “Lda., que surgia no

ao que dizem, a sua acidental passagem por telas

rótulo da banha junto a um braço forte, era para

e pincéis não foi de todo irrelevante. Exigente, o

nós ‘braço forte, lida’, de lidar, pelejar. Havia mui-

recém-empossado ministro da Cultura de Cabo

ta viagem na minha cabeça”.

Verde, decidiu suspender – esperemos que não

A adversidade, porém, tocou-lhe cedo à porta da

ad eternum – a sua experiência nas artes plás-

vida. Aos 12 anos, órfão e desesperado pela des-

ticas, por considerar ter mais engenho noutras

dita, foi colocado sob tutela do Exército – corriam

artes.

os primeiros anos da independência – e viveu

Que me recorde, antes de Mário Lúcio, só outro

num quartel, inaugurando aí os primeiros contac-

artista abraçou a pasta da Cultura de uma nação

tos com a música que, anos mais tarde, o haviam

– refiro-me, obviamente, a Gilberto Gil, convida-

de levar ao fantástico grupo Simentera. Antes,

do por Lula da Silva –, pelo que a sua nomeação

ainda, a guarida do Estado havia de lhe proporcio-

para a pasta suscitou, de imediato, alta expecta-

nar a primeira grande aventura de viagem: Cuba.

tiva nos meios culturais das ilhas da Morabeza.

No país de Pablo Milanés – terra semeada por

É que o novo ministro é visto como homem de

escravos, nisso comum às ilhas distantes da Mo-

diálogo, não permeável a sectarismos bacocos e

rabeza –, Mário cursa Direito, convive com

86 • Diplomática - maio/agosto 2011


O Novíssimo Testamento «No tempo em que os Portugueses imperavam sobre o arquipélago de Cabo Verde, aconteceu num domingo de Páscoa, na minúscula freguesia do Lém, estar a morrer a mulher mais beata que a ilha de Santiago conhecera. Interpelandoa as netas sobre a sua última vontade, não quis ela, como seria de esperar, chamar o padre, respondendo em vez disso que gostaria de ser fotografada. Porém, assim que o flash disparou, um mistério inexplicável varreu a ilha de lés a lés; e, quando, ao fim de muitas peripécias, a fotografia foi finalmente revelada, a surpresa foi tão impossível que não houve, no mundo inteiro, uma só alma que conseguisse manter a boca fechada. A ilha quase ia ao fundo com a confusão… Se o Antigo Testamento anuncia a vinda do

sempre polémica vida de Cristo. E se Jesus ressus-

Messias e o Novo Testamento narra a vida, a

citasse mulher? – é a interrogação enfatizada numa

morte e a ressurreição de Jesus, este Novíssimo

obra fundamental de ler por crentes e não crentes.

Testamento é uma autêntica revolução: pois dá

Obra onde se confirma que, para além da música,

testemunho da reencarnação de Jesus no corpo

Mário Lúcio, é uma revelação referencial na litera-

de uma mulher – ilhéu e africana – que parece

tura lusófona. Ou não tivesse ele sido vencedor do

ter vindo inaugurar a Terceira Idade do Mundo,

Prémio Literário Carlos de Oliveira, em 2009.

mas não está livre de enfrentar os preconceitos

E que dizer de “Kreol” – o seu último trabalho

sociais, religiosos e políticos do seu tempo.» [da

discográfico –, navegando no mar encrespado dos

Sinopse]

sons, tendo por companheiros de mareagem figu-

ras como Milton Nascimento, Pablo Milanés, Harry Belafonte, Pedro Joia, Teresa Salgueiro e Cesária músicos e abre o seu espírito às sonoridades

Évora, entre outros? Magnífico! Viagem pelas dife-

quentes da América Latina, o cruzamento perfeito

renças colectivas que, na fusão do convívio e dos

com os sons da música cabo-verdiana, que cultiva.

afectos, fazem de nós mole humana de crioulos, de

Chegado a Cabo Verde, o recém-licenciado abre

navegadores da diversidade universal – o que só

escritório de advogado e inicia carreira que pare-

nos enriquece.

cia promissora, mas o universo da música e das

Regressando ao bar do hotel, tempo ainda para

letras plasma-se inexorável na trajectória do ju-

recordar as palavras do novo ministro: “Somos pou-

rista. Simentera, o Quintal da Música – espaço de

cos, somos pequeninos e temos, necessariamente,

artistas, gastronomia e irreverências – são vulcão

de aprender com os outros e absorver. Foi isso que

de emoções que não mais o abandonou. Antes,

me levou, hoje em dia, a falar abertamente com os

muito antes - ainda jovem imberbe - ensaia breve

africanos para que aceitem que não somos só afri-

passagem pelo jornalismo, outro prenúncio pelo

canos. E falar abertamente com os europeus, para

chão consistente das letras, terra de que medra-

que aceitem que nós somos também de origem eu-

ram várias incursões nos contrafortes da poesia,

ropeia. É esse o fenómeno da crioulização”. É esse

da dramaturgia e do romance, de que o revelador

o pano de fundo de “Kreol”, muito bem expresso

“O Novíssimo Testamento” é expressão prenhe

nas palavras finais de Mário Lúcio, nessa tarde de

de uma narrativa cuidada e surpreendentemente

cavaqueira que partilhou com o jornalista: “Viver no

simples, navegando num mundo mágico e trans-

planeta mais pequeno do sistema solar e confinar-

cendente de interrogações sobre a enigmática e

me a uma esquina, seria muito triste”.

n

maio/agosto 2011 - Diplomática • 87


Cultura

nha igualmente funções de leitora do IC na Universidade de Chulalongkorn. Os tailandeses, acrescenta, «reconhecem» essa aliança «como ímpar na sua relação com o ocidente. Não só é a mais antiga, como tem a virtude de nunca ter sido ensombrada por qualquer tentativa de soberania». O facto de coincidir com os 500 anos da tomada de Malaca pelos portugueses nem sequer constitui verdadeiramente um problema. Afinal, Albuquerque, ao apoderarse daquele porto crucial no comércio com as Molucas, a China e o Extremo Oriente – a única entidade política que na península malaia escapava então à soberania do Sião – procurou a aliança dos tailandeses. Para o embaixador de Portugal em Banguecoque, Jorge Torres Pereira, «quanto mais cultivada a consciência de como ocorreram efetivamente certos factos históricos, e tentando colocar as reações a determinados eventos (como a consolidação dum ponto estratégico como Malaca num empreendimento tão complexo como a expansão do comércio marítimo entre a Europa e a Ásia) no seu devido tempo histórico e enquadramento geopolítico mais se evitará exacerbar sensibilidades, que, temos consciência, estão bem presentes». O facto de se falar em aliança não é uma mera bravata histórica. Durante séculos, existiu na Tailândia uma comu-

Portugal – Tailândia:

nidade portuguesa, cuja autorização de permanência no

Uma aliança com 500 anos

país vinha de uma longa série de serviços prestados aos monarcas siameses. «Fernão Mendes Pinto, na sua pas-

Não é todos os dias que vemos dois países tão distantes

sagem por Ayutthaya, a que chamou Veneza do Oriente,

entre si – pelo menos geograficamente –, como Portugal e

relata a contribuição dada pelos soldados de fortuna por-

a Tailândia, assinalarem os 500 anos do primeiro contacto,

tugueses nas diversas campanhas siamesas contra os rei-

especialmente se tivermos em conta que os primórdios do

nos vizinhos; a guarda pessoal dos reis siameses integrou

relacionamento entre ocidentais e asiáticos nem sempre

soldados portugueses pelo valor do seu conhecimento na

gozam dos favores das historiografias locais. Só que as

utilização das armas de fogo e o bairro português chegou

relações tecidas entre Portugal e a Tailândia, o então o rei-

a contar cerca de 2.000 pessoas», diz Luía Dutra.

no do Sião, foram, a todos os títulos, peculiares ao longo

O primeiro tratado entre o Sião e um país ocidental – Por-

dos séculos.

tugal – data de 1516. Nos seus termos, «os portugueses

O que se está então concretamente a comemorar? Muito

acordaram em fornecer armas e munições ao Sião em tro-

simplesmente «a chegada de Duarte Fernandes, enviado

ca da autorização do estabelecimento de feitorias comer-

de Afonso de Albuquerque, durante o cerco a Malaca, à

ciais em Ayutthaya, Ligor, Patani, Tenasserim e Mergui.

corte do rei Rama Tibhodi II», em Ayutthaya (a capital à

Também lhes foi concedida a liberdade de culto religioso»,

época), diz Luísa Dutra, responsável pelo Centro Cultural

segundo descreve o historiador inglês John Villiers, um

Português/Instituto Camões (CCP/IC) em Banguecoque,

especialista na região.

entidade que tem estado empenhada, desde novembro –

A comunidade portuguesa no Sião foi florescente, como

quando da passagem pela cidade do navio-escola Sagres,

atestam as escavações levadas a cabo no âmbito da res-

visitado por 20 mil tailandeses em 5 dias –, nas comemo-

tauração da Igreja de São Domingos em Ayutthaya. Houve

rações, organizadas com as autoridades tailandesas.

querelas, como seria de esperar num tão longo relaciona-

«Nesse encontro, segundo relatam as fontes, o enviado

mento, mas como sublinha Villiers, «em termos gerais, os

português foi muito bem recebido, dando-se início a uma

portugueses não se imiscuíram na política complicada e

aliança histórica entre os dois países em termos militares,

perigosa da corte siamesa». E quando Ayutthaya foi des-

comerciais e políticos», explica Luísa Dutra, que desempe-

truída em 1767, em consideração da ajuda dada nas ➤

88 • Diplomática - maio/agosto 2011


guerras contra o rei birmanês, receberam uma conces-

siamês a Portugal para o estabelecimento de uma feitoria

são de terrenos em Banguecoque, «tendo assim podido

e residência do cônsul.

continuar uma longa tradição de presença portuguesa no

Os vestígios são também visíveis nos bairros circundantes

reino do Sião».

das igrejas da Imaculada Conceição e de Santa Cruz, de

Sessão em Banguecoque

onde são oriundas várias famílias luso-siamesas, cujos

Assim, não admira que o governo de Banguecoque tenha

apelidos nalguns casos remontam a mais de 400 anos –

constituído «uma comissão interministerial para levar a

adianta Luísa Dutra.

cabo uma comemoração condigna», uma ideia que o em-

Os ecos dessa «forte presença humana» evidenciam-se

baixador de Portugal diz remontar a 2009. Ainda segundo

em tradições de diversos domínios e até no vocabulário.

o diplomata, «há algum tempo que está anunciada a oferta

«Não podemos esquecer que a língua portuguesa sub-

de um pavilhão em estilo tailandês (Salathai) a Portugal.

sistiu aqui como língua franca até meados do séc. XIX, a

Trata-se de um pavilhão em teca que será instalado no

ponto de ter sido adotada em 1833, a par do mandarim, no

jardim fronteiro ao Palácio de Belém». Para além desta

primeiro tratado de amizade, comércio e navegação entre

«significativa contribuição», «está prevista a oferta de uma

o Sião e os Estados Unidos, visto que nenhuma das par-

edição sobre as relações diplomáticas entre os dois paí-

tes conhecia suficientemente a língua nacional da outra».

ses, encomendada pelas autoridades tailandesas a uma

Programa comemorativo

instituição cultural crucial deste país (a Siam Society Under

O lançamento do livro sobre o Tratado Luso-Siamês de

Royal Patronage)».

1820, de Miguel Castelo-Branco, na Siam Society, em

A «cerimónia solene» que assinala as comemorações

fevereiro, e a participação do historiador no simpósio

aconteceu em 11 de Maio último, em Banguecoque, pre-

do National Museum Volunteers sobre os 500 anos dos

sidida pelo ministro dos Negócios Estrangeiros tailandês,

europeus no Sião «foi extremamente importante para

Kasit Pyromira, em que o discurso da parte portuguesa

marcarmos o significado que estas celebrações têm para

esteve a cargo do embaixador Torres Pereira.

Portugal e para a Tailândia», declara Luísa Dutra, respon-

Mas o programa das comemorações é bem mais extenso

sável do CCP/IC de Banguecoque.

e inclui o lançamento de um documentário televisivo sobre

Para além da exposição The Portuguese Historical Heri-

Portugal, a atribuição do prémio ao vencedor do concurso

tage Throughout The World and the Calouste Gulbenkian

do logótipo dos 500 anos, seminários, edição filatélica

Foundation, as comemorações – que tem uma página no

comemorativa, o restauro da capela portuguesa da Igreja

Facebook (http://www.facebook.com/500Years.Portugal-

Conception (Wat Noi), em Banguecoque, o apoio à edição

Thailand) – prevêem uma outra exposição no National Mu-

de livros sobre esta temática. «Fala-se ainda da realiza-

seum, entre julho e o final do ano, que mostra «uma arca

ção, no estádio nacional de Banguecoque, dum jogo de

tailandesa e 3 representações do Menino Jesus, datadas

futebol entre a academia dum clube de futebol português e

do séc. XVII, em marfim, pertencentes à coleção Távora

uma seleção sub-19 tailandesa», refere o diplomata.

Sequeira Pinto, ‘em diálogo’ com peças tailandesas». «As

Afinal, se de Portugal os tailandeses têm, hoje em dia,

figuras do Menino Jesus em posição muito pouco frequen-

«uma ideia algo desfocada no tempo», «para o tailandês

te, evocando as representações do Buda Reclinado, são

comum o país é indissociável dos ídolos do futebol»,

muito interessantes para os historiadores de Arte e signi-

reconhece Luísa Dutra, um facto «agora reforçado pela

ficativas de influências artísticas, nos dois sentidos, entre

contratação de um treinador português, Henrique Calisto,

duas culturas», sustenta Luísa Dutra.

para treinar o atual campeão nacional tailandês». De qual-

Em setembro, parte da coleção Máscaras da Ásia, do

quer forma, sublinha a leitora, «é assinalável a admiração

Museu do Oriente, poderá ser exposta no Bangkok Art

e carinho que [os tailandeses] têm pelos portugueses, não

and Culture Centre, cuja arquitetura evoca o Gugenheim

sei se devido ao facto de terem aprendido na escola que

Museum de Nova Iorque.

estes foram os primeiros ocidentais a chegarem ao Sião,

Em outubro, Kátia Guerreiro participará no prestigiado

se por terem deixado os fios de ovos, muito populares e

Festival Internacional de Dança e Música de Banguecoque

muito apreciados e parte integrante de qualquer ementa

e em novembro, realizar-se-á um seminário internacional

festiva».

de historiadores, coorganizado pelo Instituto Oriente/Uni-

Património português em Banguecoque

versidade Técnica Lisboa e a Universidade Chulalongkorn

Os vestígios da presença portuguesa na Tailândia são vi-

sobre as relações entre Portugal e Tailândia. Em Dezem-

síveis em Banguecoque, segundo refere Luísa Dutra, res-

bro, os luso-descendentes dos três bairros (Sta. Cruz,

ponsável do CCP/IC. O edifício da Embaixada de Portugal

Immaculate Conception e Holly Rosary) serão homenage-

foi construído num terreno cedido em 1820 pelo monarca

ados com as comunidades locais. n IC, IP

maio/agosto 2011 - Diplomática • 89



Livros - novidade

Compreender + África. Fundamentos Para Competir no Mundo de Rui Moreira de Carvalho. Edições Temas e Debates/ Círculo de Leitores.

Moreira de Carvalho resiste à facilidade de um estudo apenas centrado num país e apresenta uma análise da África Subsariana na sua diversidade e enquanto mercado que abriga possibilidades de grande crescimento económico para o sector empresarial. Nesta obra começa-se por propor uma perspectiva histórica africana, desde a sua fase pré-colonial até à formação do Capitalismo e dos Estados Nacionais e consequente desgenerência em países de Terceiro Mundo. Segue-se o estudo dos condicionalismos socioculturais, das tensões específicas das idiossincrasias da sociedade africana, e da multiplicação de modos de vida que resultam numa heterogeneidade difícil de ser transposta, impedindo a consolidação dos EstadosNação. O autor mostra-nos que não podemos pensar, para África, num modelo de competitividade entendido na sua forma absoluta e universal de relação directa com a qualidade. Há que ter em conta as fragilidades das instituições e saber superá-las observando as idiossincrasias de cada um dos países em particular a fim de se formar um modelo de competitividade adequado. Para tal, o estabelecimento de parcerias com investidores autóctones revela-se essencial. A importância do Comércio Internacional para o desenvolvimento da Economia nacional dos países africanos assim como a relação da tecnologia com o desenvolvimento da economia de cada Nação são largamente estudados pelo autor (com suporte nas teorias de Keynes e Laffer), de forma prática e pedagógica, aparecendo quase como um manual didáctico para todos os o que desejam investir no mercado africano mas também para aqueles que, em África, procuram mercados estrangeiros. O lado mais negativo de um continente ainda fragilizado também é abordado. Moreira de Carvalho chama a atenção para a importância da responsabilidade social das empresas na consolidação dos países onde actuam. Depois de pesados os prós e contras, África surge como um território de grandes oportunidades. Segundo o economista, as áreas do turismo, agro-industrial, recursos naturais e pescas serão das mas promissoras. A carência de quadros superiores leva a que a área da consultadoria seja também um bom investimento; assim como o comércio de produtos de baixo índice tecnológico - como os têxteis ou os aparelhos de electrodomésticos – que têm cada vez mais procura. Para quem pensa instalar uma empresa no Continente Africano, esta obra é uma ferramenta indispensável.

n

maio/agosto 2011 - Diplomática • 91


Livros - novidade

A Rainha Vitória de Jacques Langlade. Publicações Europa-América. Com um dos reinados mais longos da história (1837-1901), a Rainha Vitória foi uma das figuras mais relevantes para a formação daquilo que hoje entendemos como britânico. No apogeu do Império Britânico e do domínio mundial do ReinoUnido, a muito jovem e inexperiente Rainha depressa se impõe numa sociedade onde as mulheres são vistas como pouco mais que objectos de decoração. Não sendo ainda casada, a Rainha Vitória é obrigada, pelas convenções sociais a viver com a sua mãe que a oprime com a ajuda do seu amante. Mas Victória depressa mostra o seu carácter forte e decidido e escolhe para marido o príncipe alemão Albert, contra a vontade da mãe, e adquire os seus plenos direitos. Daí em diante mostra-se uma verdadeira mulher de Estado, projectando uma imagem pública de rigor e austeridade: traços que ainda hoje entendemos como victorianos. Em privado, mostra-se uma mulher de caprichos, apreciadora de festas e bailes mas ainda assim, muito mais contida que a demais alta nobreza que se diminui em excessos de alcóol, jogo e prostituição. Dá ao reino nove herdeiros e cultiva uma certa ideia de vida familiar e de recato ao mesmo tempo que exerce os seus deveres públicos com garra e determinação não se coibindo de mostrar as suas divergências com o parlamento quando as suas opiniões e preferências não coincidiam com os demais. Fez-se amar e respeitar pelo seu povo – sobretudo depois da morte de Albert – e contribuiu para o prestígio da Monarquia dentro dos seus domínios e para a imagem da grandeza do Reino Unido para além fronteiras. O infelizmente já falecido Jacques de Langlade, nesta sua biografia, consegue ir para além dos mitos e imagens já sedimentadas sobre a Rainha Vitória e mostra-nos uma outra Vitória, menos bidimensional, com mais contradições; enfim, mais humana e menos personagem histórica. n

A Primavera do Rei Cosroe: Vinte Séculos de Civilização Iraniana de Pietro Citati. Editora Assírio e Alvim. Tendo em conta as recentes perturbações vividas na República Islâmica do Irão – que começaram com os protestos que se seguiram às eleições de 2009-2010 -, as dúvidas internacionais quanto à estabilidade e segurança do país e à ameaça, real ou imaginária, de uma crise nuclear, é premente procurar saber mais sobre o que é esta Nação e como se formou. Pietro Citati propôs-se contar-nos os primeiros vinte séculos desta maravilhosa e complexa cultura de forma quase poética ou de conto das Mil e uma Noites. Desde as primeiras tribos, vindas das gélidas paisagens da Rússia em busca dos ambientes mais amenos do Golfo Pérsico, mil anos antes de Cristo, até à conquista e destruição de Persépolis por Alexandre, O Grande, o texto corre solto relatando a exuberância e fascínio dos Grandes Senhores da Pérsia: Dário, Xerxes, Ardashir, Yazdijird, Cosroe,... Esta é uma obra que mostra a teia e a trama que formam a exuberante tapeçaria que é o povo Persa e à qual o título remete. A Primavera do Rei Cosroe era, na verdade, um sumptuoso tapete, enriquecido com esmeraldas que Cosroe II mandava estender no Inverno para se lembrar das cores e alegrias da Primavera. Nesta altura tão incerta para o Irão, uma obra assim também nos ajuda a lembrar de tempos mais amenos e felizes. n

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English & French texts

7. Angola - 35 years, five decades of hope Angola, a country ravaged by a bloody war, emerges as a nation with prospects of bright futures and as a great economic power of Africa and the world. To mark the 35th anniversary of independence, celebrated in peace and hope, the DIPLOMÁTICA prepared a special issue, tracing the history of the years of struggle for liberation, the peace agreements, through civil war to political openness and relations with the former colonial power, also giving focus to companies that have contributed to the development and modernity, and the strategic focus of Tourism - a rapidly growing sector.

7. Angola - 35 ans, cinq décennies d’espoir Pays ravagé par une guerre sanglante en Angola semble être l’avenir de la nation et une grande puissance économique de l’Afrique et du monde. Pour marquer le 35e anniversaire de l’indépendance, célébré dans la paix et l’espoir, la conférence diplomatique a préparé un número spécial: l’histoire de ces années de lutte pour la libération, les accords de paix, de la guerre civile à l’ouverture politique et les relations avec l’ancienne puissance coloniale, en donnant également l’accent pour les entreprises qui ont contribué au développement et à la modernité, et l’orientation stratégique du tourisme, un secteur en pleine croissance.

23. José Marcos Barrica, Ambassador of Angola in Portugal The Ambassador José Marcos Barrica, two years head of the Diplomatic Mission of Portugal in Angola and former Minister of Youth and Sports, believes that “Portugal has a placeholder in the heart of Angola, “noting that in the current context of bilateral relations with Portugal, there are more points that unite the two countries than those who eventually alienates them, expressing a desire to maintain this level of relations and improve it even more.

23. José Marcos Barrica, l’ambassadeur d’Angola au Portugal Chef de la mission diplomatique du Portugal en Angola dnas les derniers deux ans, l’Ambassadeur José Marcos Barrica, ancien Ministre de la Jeunesse et des Sports pendant une décennie, estime que «le Portugal a un espace réservé au coeur de l’Angola», notant que dans le contexte actuel de relations bilatérales avec le Portugal, il ya plusieurs points qui unissent les deux pays que ceux qui finissent par les aliène, exprimant le désir de maintenir ce niveau de relations et de l’améliorer encore plus.

30. Conduril - a Portuguese company at the forefront of Angola’s development. The Conduril Group has distinguished itself in the development and progress of Angola, in the area of vocational training and it’s a reference company in entrepreneurship and innovation. It is a success and pride for Portugal, having endowed the African country’s education system with a new asset: Conduril Academy, based in Benguela, a bet on technology training courses – with approval and equivalent to Angolan high school completion – professional training of middle and senior management, integrating the formal and informal actions of the company’s global universe.

30. Conduril: Société portugaise à la pointe de l’Angola Le groupe Conduril s’est distingué dans le développement et le progrès de l’Angola, dans le domaine de la formation professionnelle et est devenue une société de référence dans l’esprit d’entreprise et d’innovation. C’est un succès pour le Portugal, ayant doté le système éducatif du pays à un nouvel atout: Conduril Académie, basée à Benguela, un pari sur la technologie des cours de formation - avec l’approbation et équivalent à un diplôme d’études secondaires Angola -, de la formation professionnelle des cadres moyens et supérieurs, en intégrant les actions formelles et informelles de l’univers de l’entreprise.

■ ➤

maio/agosto 2011 - Diplomática • 95


English & French texts

34. Jorge Tropa, CEO of Siemens Angola With an activity in Angola which dates back to the 60’s/70’s, the Siemens Angola has been highlighted by the standards of quality and technological innovation in an increasingly demanding and competitive market. George Tropa, chief executive of the company, talks about the more immediate objectives of the Group that include the diversification of business areas with emphasis on Energy, Industry and Health - contributing factors to enhance the development of the country - garnering a growing number of customers seeking high standards of quality and technological innovation.

34. Jorge Tropa, PDG de SIEMENS Angola. Avec une activité en Angola qui remonte à les années 60/70, l’Angola Siemens a été mis en évidence par les normes de qualité et de l’innovation technologique dans un marché toujours plus exigeant et concurrentiel. Comment Jorge Tropa, président de la direction de l’entreprise, explique : les objectifs plus immédiats du Groupe comprennent à la diversification des secteurs d’activité, en mettant l’accent sur ​​ l’énergie, l’Industrie et la santé, des facteurs qui contribuent à favoriser le développement du pays, attirant un nombre croissant clients qui recherchent des normes élevées de qualité et d’innovation technologique.

38. Miguel Vieira, CEO of Angolan Elite Careers. Elite Angolan Careers was established in 2008 with the aim of becoming a reference company in the recruitment of human resources for emerging markets. Its CEO, Miguel Vieira, outlined the objectives of the group in Angola, with a sustained and strong expansion of supply operations in Angola, as well as expansion into other markets, notably in Latin America and Asia. The most wanted services are the ones related to the recruitment forums EAC organized in Luanda, Lisbon, Washington, Lagos (Nigeria), Bahrain, London and Barcelona.

38. Miguel Vieira, PDG de Elite Angolan Careers Elite Angolan Careers a été créé en 2008 avec l’objectif de devenir une entreprise de référence dans le recrutement des ressources humaines pour les marchés émergents. Son directeur général, Miguel Vieira, a présenté les objectifs du groupe en Angola, avec une expansion forte et durable des opérations d’approvisionnement en Angola, ainsi que l’expansion vers d’autres marchés, notamment en Amérique latine et en Asie. Les services les plus recherchés par les clients rapportent à les forums de recrutement organisés par l’EAC à Luanda, Lisbonne, Washington, à Lagos (Nigeria), Bahreïn, Londres et Barcelone.

40. May ‘68, a time of utopia and restlessness The reflexes of the May 68 uprising in France are still being felt today. Were times of unrest, of generosity, humanism, defence and finding new ideas for a youth that was questioning about their future, foreshadowing the defence now in vogue of the “Geração à Rasca” and the new winds blowing across the African continent . Four decades later, we do the history of those times, from its origins in Nanterre to its worldwide influence. The same seeds of freedom of thought and action still germinate today. This utopia in jeopardy led to the survival against the growing power of the international financial capitalism which imposed a new order.

40. Mai 68, temps de l’utopie et l’agitation Les réflexes de l’insurrection de mai 68 en France, se font encore sentir aujourd’hui. C’étions les temps de troubles, de générosité, d’humanisme, de contestation et de trouver de nouvelles idées pour unne jeunesse qui si a interrogé sur son avenir, préfigurant la défense en vogue de la «Geração à Rasca» (unne geration sans future) et le vent nouveau qui souffle sur le continent africain . Quatre décennies plus tard, nous faisons l’histoire de ces temps, en mai, son histoire qui a commencé à Nanterre et la propagation à travers le monde, semant les graines de la liberté de pensée et d’action, qui germent jusqu’à aujourd’hui. Utopia en

96 • Diplomática - maio/agosto 2011


péril, ce qui a conduit à la survie contre la montée en puissance du capitalisme financier international qui a

imposé un nouvel ordre.

50. Jorge Braga de Macedo, president of the Institute of Tropical Research It’s endless the curriculum of Prof. Dr. Braga de Macedo, but he is best known for having been the Minister of Finance, a position that has granted him an solid image of seriousness as a public figure. As a private one, he appears as a man of extreme politeness and with a refined sense of humour. The conversation ran fast and loose with highlights about the current exhibition being held at the Palace of the Counts Calheta, in the Tropical Botanic Garden in Belém (Lisbon), under the patron of the Institute which he chairs.

50. Jorge Braga de Macedo, Président de l'Institut de Recherche tropicale C'est sans fin le curriculum du professeur Dr. Braga de Macedo, mais il est généralement connue pour avoir été Ministre des Finances, un poste qui sans doute la doné unne image d'un homme "sérieux et grave". Mais il est aussi d'une extrême sympathie et avec un sens de l'humour très poli. La conversation a éte bien réussi avec le passage, de façon inattendue, par l'exposition de brevet dans le Palais des Comtes de Calheta, au Jardin Botanique Tropical à Belém, sous l'égide de l'Institut qu'il préside.

64. Legrand, managing director Fernando Mendes A visit to the Domotic House - Legrand’s Inteligent Automatic House -, in Carcavelos, is an unforgettable moment, worthy of any sci-fi series. But it isn’t fiction. There, the future is already a reality. A house that Fernando Mendes, the Managing Director of the French multinational company, shows us with pride. “the sockets and switches we manufacture are quite possibly the best in the world in their area,” he says with a conviction based on hand workforce that helps the company’s growth and its position in the market benchmark.

64. Legrand, directeur général Fernando Mendes Une visite à la Maison Domotique, la maison intelligent Legrand, à Carcavelos, est un moment inoubliable, une mise en scène digne d’une série de science-fiction. Mais il ne s’agissait pas d’une fiction. L’avenir est déjà une réalité. Une maison que Fernando Mendes, le directeur général de la société multinationale française, nous montre avec fierté. «prises et interrupteurs que nous fabriquons sont très probablement les meilleurs au monde dans leur domaine», dit-il avec une conviction basée sur la main main-d’œuvre qui contribue à la croissance de l’entreprise et sa position dans le repère du marché.

67. Quinta da Aveleda - where time stood still A trip to Quinta da Aveleda, Penafiel, and to the secrets of how to produce the nectar that made the brand famous. In the twilight of winery, listening to the sound of Gregorian chants, every crevice and every nook witnesses the deep sleep of 10 years of the Adega Velha “aguardente(a Portuguese Brandy type beverage), aged in oak casks, the oldest dating back to 1974.

67. Quinta da Aveleda - où le temps s’est arrêté Voyage à Quinta da Aveleda, Penafiel, et les secrets de la façon de produire le nectar qui a fait la célèbre marque. Dans la pénombre de la cave, en écoutent les chants grégoriens, chaque crevasse, tous les témoins coin le profond sommeil de 10 années de «Aguardente» Adega Velha, vieilli en fûts de chêne, les plus anciennes remontent à 1974.

70. Tourism in Angola - Climate of peace and development led to increased demand Tourism can be seen in Angola as a growing sector, foreseeing to register, in 2011, a movement of

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English & French texts

around 500 000 tourists. To meet rising demand, the Angolan government created a strategic marketing

plan and promotion for the sector, targeting the tourism potential. Which are numerous: beautiful natural environments, a large expanse of beaches, varied wildlife parks exclusively for tourists and a unique cuisine.

70. Tourisme en Angola - Le climat de paix et le développement a conduit à une demande accrue Un secteur en pleine croissance dans le développement: voici comment le tourisme peut être considéré en Angola, prévoyant que, en 2011, se enregistrera un mouvement d’environ 500 000 touristes. Pour satisfaire une demande croissante, le gouvernement angolais a créé un plan stratégique de marketing et de promotion pour le secteur, en ciblant le potentiel touristique. Les potentialités sont vraimment nombreuses: beautés de la nature, une grande étendue de plages, parcs faune variée exclusivement pour les touristes, une cuisine unique.

78. The First Ladies of Belém The memoirs and confessions of presidents of the Republic spouses, in democracy, key witnesses of the post April 25 period, stories, contacts and memories with the famous protagonists of contemporary life, the stories of how they became the vanguard of the benefit associations, their accomplices and supporters behind the scenes, the decisions of their husbands… For the first time, four first ladies met at the Belém Palace, sharing a unique, full of emotion that we now register.

78. Les Premières Dames de Belém Mémoires et confessions de l’épouses des président de la République en démocratie, les principaux témoins après le 25 avril. Des histoires, des contacts et des souvenirs de les protagonistes célèbres de la vie contemporaine. Les histoires de la façon dont elles sont devenus l’avant-garde des causes sociales, leurs complices et de sympathisants dans les coulisses les décisions de leurs maris. Pour la première fois, quatre femmes se sont rencontrés au Palais de Belém, partageant une unique, pleine d’émotion que nous constatons ici.

86. Mário Lúcio de Sousa, Minister of Culture of Cape Verde He is one of the biggest names of Cape Verdean culture. Musician, composer, singer, writer, playwright, poet ... the universe of Mário Lúcio reaches almost every area of culture. “We’re few, we’re little and we really have to learn from others and absorb it. That’s what led me today to talk openly with Africans to accept that we are not just Africans. And talk openly with the Europeans to accept that we are also of European origin. This is the phenomenon of creolization,” he says. This interview also reports the memories and thoughts of this multifaceted personality that has a clear vision of an active, mobilizing and effective project for Culture.

86. Mário Lúcio Sousa, Ministre de la Culture du Cap-Vert Il est l’un des plus grands noms de la culture capverdienne. Musicien, compositeur, chanteur, écrivain, dramaturge, poète ... l’univers de Mario Lucio s’étend loin sur presque tous les domaines de la culture. «Nous sommes pas beaucoups, nous sommes petits et nous avons vraiment à apprendre des autres et d’absorber. C’est ce qui me conduit aujourd’hui à parler ouvertement avec les Africains d’accepter que les Africains ne sont pas seulement Africains. Et parler ouvertement avec les Européens à accepter que nous sommes aussi d’origine européenne. C’est le phénomène de créolisation », dit-il dans une interview. Le rappel des souvenirs, des pensées de cette personnalité à multiples facettes et une vision claire d’un projet actif de la Culture, de mobilisation et de manière efficace.

98 • Diplomática - maio/agosto 2011




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