DOMINGOS VAZ CHAVES
DIREITOS
FUNDAMENTAIS E DOS CIDADÃOS O Autor Domingos Vaz Chaves 1ª.EDIÇÃO
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O AUTOR
DOMINGOS VAZ CHAVES, nasceu a 3 de Agosto e foi registado a 16 do mesmo mês, do ano de 1954, na freguesia de Gralhas, concelho de Montalegre, onde foi baptizado, pelo Padre Avelino da Mota. Viveu com os seus avós maternos até aos 7 anos de idade. É filho de José Fernandes Chaves e de Teresa Vaz Chaves, neto paterno de José Fernandes Chaves e de Maria Dias e materno, de Domingos Vaz e de Maria da Glória Gonçalves Carneiro, todos naturais da dita freguesia de Gralhas, do concelho de Montalegre. Na sua aldeia, iniciou a instrução primária, tendo rumado a Lisboa, onde actualmente vive, quando frequentava a 2.ª classe e se juntou a seus pais que aí residiam e trabalhavam. Em 1965, após concluir a 4.ª classe e efectuado o então necessário e obrigatório exame de admissão para acesso ao ensino secundário, inicía os seus estudos no extinto Liceu Nacional de Gil Vicente, também em Lisboa.
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Sempre apegado às suas origens e inadaptado ao ambiente da capital, em 1969 regressa à sua terra e aí passa a frequentar o Externato Liceal de Montalegre. Após reprovação no então chamado exame do 2.º ciclo (5.º ano), élhe imposto o retorno a Lisboa, facto que o leva à recusa de continuar os estudos. Começa então a trabalhar num escritório sediado na Avenida do Brasil, auferindo um vencimento de novecentos escudos mensais. Anos mais tarde, trabalhando e estudando alternadamente, veio a concluir o Curso Geral dos Liceus em Julho de 1974, no Liceu D. Dinis. Tinha então 19 anos de idade. Em termos profissionais, ingressou na Policia de Segurança Pública no ano de 1981, a qual surgiu no seu percurso, através de um concurso público. Após a respectiva candidatura e a prestação das necessárias provas, deu entrada na Escola Prática de Policia, em Outubro desse mesmo ano, tendo frequentado o Curso de Formação de Agentes na cidade de Torres Novas. Concluído o mesmo, é colocado em Lisboa, local onde permanece até Outubro de 1985, data em que regressa à Escola Prática de Policia, para frequentar um curso de promoção a chefe. Após frequência do mesmo com aproveitamento, regressa de novo a Lisboa, onde volta a ser colocado. A partir daí reíniciou os seus estudos e após conclusão do 12º. Ano no Liceu D.Pedro V, no ano de 1989 entra na Faculdade de Direito de Lisboa, onde frequentou o respectivo curso. Sindicalista desde os tempos do Estado Novo, foi um dos principais activistas da causa sindical na PSP, e enquanto co-fundador, ainda na clandestinidade, da primeira Associação na Instituição – a Associação Sócio Profissional da Policia-, foi um dos principais intérpretes e impulsionadores da chamada “Batalha de Lisboa”, revolta ocorrida em 21 de Abril de 1989, que 3
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colocou Policias contra Policias no Terreiro do Paço em Lisboa e que levou à demissão do então Ministro da Administração Interna, Silveira Godinho, do Governo de Cavaco Silva. Em finais de 1994, deixa a actividade operacional da Policia e passa a desempenhar funções na área da formação. Em 1995, por despacho do Ministro Alberto Costa, é nomeado para o desempenho de funções na Inspecção Geral da Administração Interna e passa a trabalhar em ligação com o então Inspector Geral, Doutor Rodrigues Maximiano. Em Novembro de 1996, através de sufrágio directo, é eleito para vogal do Conselho Superior de Justiça e em 1999, faz a denúncia no Parmento Europeu, junto da Comissão Parlamentar de Direitos Liberdades e Garantias, da violação de direitos sindicais e constitucionais por parte do Governo português. Paralelamente à sua actividade, leccionou na Universidade Lusiada, tendo nos últimos anos dedicado algum do seu tempo à escrita, da qual se destacam para além desta pequena obra, Gralhas-Minha Terra Minha Gente, uma monografia da sua aldeia natal, História da Policia em Portugal-Formas de Justiça e Policiamento, Moralidade e Ética Policial e Relatos e Crimes do Arco da Velha.
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INTRODUÇÃO
Noção geral e preliminar de direitos fundamentais Dada a complexidade e delicadeza de uma definição de direito e, particularmente, de direitos fundamentais, tem-se procurado antes encontrar uma ideia tão precisa quanto possível desta categoria de direitos. Começaremos por distinguir os direitos fundamentais em sentido formal e em sentido material. São direitos fundamentais em sentido formal os que a Constituição específica como tais; em sentido material são os que constituem a base jurídica da vida humana no seu nível actual de dignidade, as bases principais da situação jurídica de cada pessoa, quer estejam consagrados na Constituição, nas leis, ou nas regras aplicáveis de direito internacional.
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Podemos dizer que são direitos abonados e avaliados pela consciência colectiva dos cidadãos. Repare-se que na noção apresentada se inclui o termo “ actual “, o que indicia um elemento temporal. Quer isto dizer que a amplitude e a natureza daqueles direitos não permaneceu estática; antes evoluiu historicamente, enriquecendo-se com as conquistas e transformações das ideias e do pensamento da colectividade. As transformações espirituais e materiais que as sociedades e as criaturas experimentaram com o desenrolar da história, foram alterando o sentido do essencial, do inalienável, do imprescindível e do intocável. Daí a influência do temporal na formação aceite e incontestada de um direito que a consciência e a técnica jurídica impedem a classificação de fundamental. É esse relativismo no tempo que se quer significar com a palavra “ actual “. Esses direitos têm-se apresentado ao longo da história, com outras denominações “ direitos essenciais “ ou “ direitos primários “, “ direitos inatos “ e “ direitos originários “- por acompanharem o homem desde o seu nascimento. “ direitos inalienáveis “ ou “ direitos indisponíveis “ , em virtude de, por inerentes ao homem, não poder deles dispor ou a eles renunciar. Todas estas expressões contribuem para aclarar a ideia de direitos fundamentais que vimos referindo. Importa também termos presente duas noções: a primeira é a de os direitos fundamentais serem próprios das Ordens Jurídicas Internas, de cada Estado, que os consagra e protege. Se essa consagração e protecção se transferir 6
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para a Ordem Jurídica Internacional, então estaremos perante os chamados “ Direitos do Homem “. A Segunda refere-se aos direitos fundamentais em sentido formal e está conectada com o nosso direito positivo o qual nos permite adiantar, desde já, que eles comportam dois corolários : a ) Não são suprimíveis pela lei ordinária nem pela vontade das partes; b ) São oponíveis ao próprio Estado, o que os caracteriza em certa medida, como reduto dos cidadãos em relação ao poder político. Aliás a garantia daqueles direitos é uma das tarefas fundamentais do Estado. Abordagem histórica A compreensão correcta do conceito de direitos fundamentais só será convenientemente atingida com o estudo dos factos e correntes do pensamento que ao longo do tempo foram conduzindo o homem e as sociedades para a sua consagração e respeito. O homem pós-glaciar, na busca dos meios de subsistência, na luta pelo domínio da natureza e salvaguarda da vida, teve de se unir para ser mais forte e ir evoluindo do nomadismo à organização sedentária, da caça e colheita de frutos naturais à gradual domesticação de animais e, por fim, ao cultivo da terra e à armazenagem dos produtos. Por outro lado, o imperativo biológico que fez dele o ser mais longamente dependente dos seus progenitores durante os primeiros anos de vida, propiciaram a formação da célula social mais antiga de que se tem conhecimento : a família.
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Os grupos rivais e as catástrofes naturais eram inimigos que exigiam força e homogeneidade do grupo e daí a união de famílias que, ulteriormente, deram as tribos e os clãs. Sociedades insipientes e frágeis, exigiam disciplina rigorosa e a inquestionável hierarquização era condição imprescindível . Questões de direitos individuais que, por ventura tentassem perturbar a eficiência de todo o conjunto, não seriam certamente preocupação importante para ninguém. Mas a interdependência entre o chefe e os seus súbditos encarregar-se-ia de equilibrar a coexistência e respeito, mais para manter a paz, a solidez e a fortaleza do grupo, do que por razões de justiça. Esta era uma das características das sociedades primárias em que o domínio do mais forte foi lei natural que se impôs de forma imediata, dispondo da sorte dos mais fracos e dependentes. Tratava-se sempre de mera condescendência, de concessão paternalista que o chefe permitia com vista à coesão do grupo. Pode dizer-se, portanto, que o direito era a vontade do chefe e todas as cedências, mercês e privilégios se situavam fora de imperativos de reconhecimento de direitos pessoais. Daí o poder afirmar-se que, em sociedades destas, conceitos de direitos limitativos do poder, não teriam qualquer relevância. Foi nessas sociedades antigas que apareceram as primeiras codificações onde podemos, com segurança colher elementos sobre o conhecimento e interpretação das situações de relação entre o Poder e os membros dos respectivos grupos ou comunidades. Desde o aparecimento da escrita entre o IVº e o IIIº milénio, na suméria, onde já constavam algumas ordens e disposições relativamente à ordem jurídica das sociedades do tempo, passando pela Idade do Ferro ( onde os
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Babilónios tinham uma compilação de leis- o famoso Código de Hamurabi, do ano 1790 A. C. ), verificamos que o interesse colectivo era o valor supremo, mesmo para além do campo jurídico, entrando até na esfera religiosa. Na articulação do binário Poder-Súbditos daqueles tempos, o esquema era geralmente o mesmo : os direitos dependiam da benevolência ou da sedimentação do poder. Mas onde os direitos individuais conheceram a sua origem foi nas civilizações mediterrânicas, designadamente nas cidades gregas e em Roma. Dizemos “ cidades gregas “ porque a Grécia era, na realidade, um conjunto de cidades também chamadas cidades-estados. Vejamos o caso dos direitos fundamentais : Situemo-nos no séc. V a. C., onde todos os manuais referem o exemplo clássico, da tragédia Antígona, de Sófocles, quando Antígona, princesa de Tebas, enfrenta a ordem do rei de não sepultar o irmão, morto em combate, referindo “... os vossos decretos não podem prevalecer sobre a vontade dos Imortais, sobre leis que não estão escritas nem podem ser abolidas. Não são de ontem nem de hoje : são de todos os tempos e ninguém pode dizer quando nasceram. “ Referiase, pois, a leis inerentes ao homem, invioláveis e inalteráveis, a que os Romanos chamaram depois de Direito Natural, por fazer parte da própria natureza do homem. Por outro lado em Roma, era publicada a Lei das XII Tábuas. Esta limitava o poder do legislador proibindo leis prossecutórias ou de privilégio em relação a cidadãos romanos, o que equivalia ao princípio actual de a lei Ter de ser 9
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geral e abstracta. Com esta chamada de atenção para o séc. V a. C., pretende-se frisar que nele tomou forma, tanto na Grécia como em Roma, em cada um à sua maneira, a ideia de direitos fundamentais. Seguiu-se a época de Roma. A aculturação dos valores da sociedade grega, a luta entre patrícios e plebeus com vista à aquisição da igualdade plena entre romanos culminou com a Lei Hortênsia, que veio acabar com muitos dos privilégios de classe existentes na Lei das XII Tábuas. Agora passava a ser o povo a traçar o Direito da sua cidade. O direito Romano possuía um rigoroso enquadramento lógico, preenchia escrupulosamente o sentimento natural de justiça e era formulado com grande precisão de conceitos. Diz-se que a Grécia era a pátria da filosofia e da liberdade, enquanto Roma se apresenta como a pátria da ordem e do direito. Foi Cícero que mais se dedicou e distinguiu na exaltação e definição da lei natural e proclamou a necessidade de lhe subordinar a consciência das leis e do direito. Neste, distinguiu-se entre o Jus Civile, constituído pelo conjunto de normas aplicáveis aos romanos ; o Jus Gentium, para os estrangeiros ; e o Jus Naturale, o que a natureza ensina a todos os seres vivos. É nesta categoria que vamos encontrar a raiz dos nossos direitos fundamentais. Aqui Cícero faz uma distinção entre o “ Direito Natural “,- o que é justo por natureza, “ a suma razão ínsita das coisas ; a lei que não está escrita “ e o “ Direito Positivo “ o que é justo por convenção ou por lei, isto é, por vontade dos homens. Ao pensamento tradicional da filosofia romana veio depois o cristianismo acrescentar o elemento novo que era “ o amor ao próximo “ e nobilitar a universalidade do homem. Ao mesmo tempo, a nova doutrina atribuía 10
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ao direito natural, aos direitos do homem, um cariz transcendental de carácter divino. Era a Revolução Cristã, que trouxe a mais profunda e duradoura transformação da história da humanidade. Perene e sempre actual, a palavra de Cristo penetrou profundamente, não apenas no campo religioso, mas também no filosófico, político, moral, jurídico, nos usos e costumes e na cultura de mais de metade da população mundial e, reflexamente, na vida de todos os homens na terra. A nova doutrina pregava a pureza do corpo, exaltando a castidade como uma das maiores virtudes cristãs. Três séculos durou a luta pela implantação da Igreja até que em 313, pelo Édito de Milão, o imperador Constantino estabeleceu a liberdade religiosa. Seguiu-se a condenação da morte do escravo e a proibição da luta entre gladiadores. A penetração dos princípios cristãos na actualização do velho direito romano levou à introdução de normas fundamentais nas várias ordens jurídicas da Idade Média, cuja fonte inspiradora foram os ensinamentos de cristo. Assim, todo o direito antigo conforme com a lei natural, acrescido da igualdade e dignificação de todos os homens, que o cristianismo trouxe, ganharia a mesma categoria de fundamentalidade e que o poder deveria acatar, respeitar e defender como imperativo essencial, isto é : a excelência de um direito não dependeria da fonte ou da sua génese, mas da sua conformidade com a natureza e a doutrina divina que o cristianismo veiculava. 11
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Com S. Tomás de Aquino ( 1225-1274 ) esboça-se uma concepção orgânica da cidade terrena, em que cada elemento que a compõe possui uma actividade e personalidade próprias que lhe permitem, mesmo sob a dependência do poder, actuar e resistir como membro da comunidade política em que participa e à qual naturalmente pertence. Embora durante a Idade Média a concepção filosófica do direito estivesse mais concentrada no divino e no direito natural do que no homem em si, como hoje acontece, não se pode deixar de dar o devido realce a essa época longa e importante no fluir da evolução da ideia de direitos fundamentais. A Igreja, através da sua obra foi pioneira naquilo que, nos nossos dias, constituiu os chamados direitos fundamentais sociais, mediante acções junto dos hospícios e lazaretos, no campo da saúde, em acções de caridade junto de abadias e mosteiros e muito importante também na outorga ao homem servo de um dos mais preciosos direitos fundamentais : o da liberdade física, jurídica e social. Este último aspecto fruto das invasões, em que os soldados vendiam os cativos de guerra como escravos e que, posteriormente a Igreja adquiria, para os tornar homens livres, mediante trabalho remunerado nas abadias, até perfazerem a quantia dispendida. Sendo o nosso ordenamento jurídico herdeiro das civilizações Grega e Romana, convém falar da influência deste último na Península Ibérica. Praticando uma política de assimilação pela tolerância, a colonização romana acabou por alterar a sociedade hibérica, fazendo entrar a Espanha no seio das nações europeias, suprimindo a tribo, que imperava na organização dos povos hibéricos, pelas suas instituições e o seu direito. Com a completa subordinação à 12
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Pax Romana , cessaram as hostilidades entre grupos locais, procedeu-se à construção de obras públicas e abertura de estradas que a todos ligavam ao coração do império. Foi penosa e difícil , porém a ocupação do território peninsular pelas legiões romanas. A luta foi iniciada em 137 a. C. e a pacificação só se deu em 19 a. C. César outorgou a cidadania e igualdade civil às cidades de Lisboa, Évora, Mértola, E Salácia ( Alcácer do Sal ). Mérida, Beja , Alcântara e Santarém foram colónias. Se estes factos provam a importância da Península no contexto imperial, também deles se infere a precocidade do usufruto dos direitos civis e políticos pelos seus habitantes em relacção às outras partes do império. Isto não se traduziu na imposição forçada de uma nova ordem jurídico-política, mas na concessão de um honorável benefício, pois foi premissa do espírito do direito romano que salus populi suprema lex esto ( que o bem-estar do povo seja a lei suprema ). Se para preservar esse bem-estar, a paz e a harmonia social, fosse necessário salvaguardar o direito indígena, naquilo que não ofendesse a tranquilidade pública, Roma não hesitava em o conservar. Com a divisão do império, dão-se as invasões bárbaras, que estavam ávidos da prosperidade hibérica.
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A reconquista é tentada pelos Visigodos, por intermédio de Recaredo que, convertido ao catolicismo, permitiu que mais tarde se instalasse um novo direito hispânico pós romano, fortemente impregnado do espírito cristão. É então que a Igreja conhece a sua grande força. As dificuldades e morosidade no estabelecimento de contactos com Roma- sede de toda a cristandade-, proporcionava às autoridades locais, nomeadamente bispos e abades, grande poder de influência sobre o poder temporal, numa Espanha que desde 589 se torna oficialmente católica. Durante os dois séculos de monarquia visigótica o esquema de equilíbrio do poder temporal e do poder espiritual perdurou sempre nos seguintes moldes : os reis eram os protectores da Igreja e esta a força justificadora e sancionatória da acção destes. Contudo, não deixava de vigorar o sistema a que hoje chamamos de legalidade, pois o rei devia acatamento às leis. Apresenta-se este período como sendo de maior supremacia dos costumes como fonte de direito, do que a vontade do soberano. No ano de 711, dá-se a invasão árabe, com os serracenos a ocuparem a Península durante quatro séculos. Foi característica da ocupação a coexistência com as instituições autóctones, principalmente de direito civil. Só com a reconquista cristã veio a ser reentroduzido em plenitude o direito anterior. Podemos então referir alguns documentos, que são considerados pela doutrina como os mais significativos e precursores dos direitos fundamentais universais do nosso tempo. São eles a Magna Carta, outorgada em 1215, por João Sem Terra, onde algumas classes dignatárias como juízes, abades, condes, 14
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ministros, etc., exigiram ao soberano a garantia de certas prerrogativas, tais como protecção de herdeiros, a protecção da vida, a liberalização do comércio. Costuma-se citar também a Tallage ( imposto sobre o uso de terras da Coroa ). Estes instrumentos apresentaram-se, pois, como limitações ao poder régio que os monarcas aceitaram durante o século XIII. E, por isso mesmo, são apresentados como percursores dos direitos fundamentais entendidos como limitações ao exercício do poder, como redutos capazes de proteger os cidadãos da tentação totalitária por parte do poder político.
E em Portugal ?
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A legislação da antiga monarquia foi compilada nas Ordenações Afonsinas, publicadas em 1446, sob a regência do Infante D. Pedro, durante a menoridade de Afonso V e abrange leis em vigor desde o início da nacionalidade. Já nessa compilação se falava de direitos fundamentais, no sentido em que hoje os encaramos, senão vejamos : determinava-se que o tratamento dos presos e detidos se fizesse com humanidade, devendo ser encarcerados nas celas em segurança. Desde o princípio se impôs a obrigação de submeter a detenção do arguido, no mais breve prazo, à apreciação de um magistrado judicial capaz de se pronunciar sobre o que hoje se designa de “ legalização da detenção “. Determinou-se que “ quando alguém for preso pelo Alcaide ou por algum dos seus homens, de noite ou a tais horas que o não possam levar ao castelo ou a uma prisão, o levem a casa do Alcaide menor ou a outra casa que ele ordene e aí durma essa noite bem guardado de tal maneira que no outro dia o dito Alcaide o apresente ao juiz “. E essa apresentação tinha de ser imediata,- “ mandamos que aquele que assim for preso de noite, seja levado no outro dia, pela manhã, perante o juiz, e se o feito for de tal qualidade que deva ser solto, soltem-no sem ir ao castelo ou à prisão “. D. Fernando, sabedor de que alguns nobres, nas suas sortidas e caçadas pelos montados e aldeias do reino, se apossavam indevidamente dos animais domésticos dos lavradores ou, a pretexto de correrem javalis, lhes destruíam as hortas e plantações, ordenou que essas “ malfeitorias que fidalgos e pessoas poderosas fazem pelas terras por onde andam “ se abstivessem de as praticar e por elas fossem punidos, procedendo-se às respectivas indemnizações aos lesados.
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Quanto à execução de mandados judiciais, as regras eram também rigorosas na defesa da inviolabilidade domiciliária. No volume IV existem disposições quanto ao direito à paga pelo trabalho prestado, que hoje se identifica com o direito ao salário. Uma novidade legislativa para a época foi a determinação de Afonso III poupando a prisão por dívidas “ ao que não tivesse por onde pagar “. Dois acontecimentos do séc. XV vieram alterar profundamente o quadro e o ritmo da história : os descobrimentos marítimos,- que estabeleceram novos parâmetros geográficos ao comércio mundial e abriram todos os continentes ao convívio universal ; e a Imprensa-, que trouxe os meios técnicos para a transmissão de ideias em moldes até então desconhecidos. Na época predominava a influência da Igreja no chamado mundo civilizado. Os descobrimentos foram protagonizados pelos reis cristãos, que estabeleceram entre si os limites das suas esferas de acção, pelo tratado de Tordesilhas de 1494, confirmado pela Bula Ea quae pro bono pacis, do Papa Júlio II. Já em bulas anteriores o domínio sobre terras achadas e os mares descobertos havia sido confirmado por Pontífices, cominando penas severas a quem perturbasse a posse ou interceptasse a navegação e comércio autorizado pelos reis de Portugal.
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Esse direito internacional efectivo vigente entre os príncipes cristãos só adquiria força obrigatória se confirmado pela autoridade papal, por todos reconhecida e obedecida. Um evento súbito veio, porém, desencadear um movimento contestatário do predomínio e respeitabilidade da autoridade do papado no que se referia à extensão dos seus poderes e acatamento das suas ordens na comunidade cristã, chegando a pôr em causa a qualidade de representante de Cristo. Era a Reforma. O comércio europeu intensificava-se com as cidades da Flandres, enriquecidas e reforçadas com a presença dos judeus expulsos pelos reis de Espanha e Portugal. A Holanda, tal como outros países e praças da Europa, não abdicava de entrar, custasse o que custasse, na disputa pelo entreposto e negócio de especiarias e riquezas proporcionadas pelos territórios recém descobertos alémmar. Estava, portanto, criado o ambiente de base económica e política favorável à mobilização de interesses no sentido de alterar o estado de coisas e os fundamentos de semelhante situação. E a contestação à autoridade do Papa, partindo do seio da própria Igreja, era um acontecimento de grande importância e que não podia ser desperdiçado pelos centros do poder europeu. A grande ruptura dá-se com Henrique VIII, em 1534, com a fundação da Igreja Anglicana, separando-se da fidelidade a Roma, o que veio a deixar ainda mais enfraquecida a autoridade papal no campo do direito internacional. A Reforma trouxe uma nova fundamentação : o Primado da Razão, que veio contra o Primado do direito Divino. Trazia um elemento novo à definição da 18
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palavra divina : a liberdade de o homem a interpretar, de a ouvir e de entender a mensagem que ela encerra. O diálogo devia ser entre o cristão e o texto, entre o homem e Deus. Não seria mais a Igreja e os seus dogmas a fixar o correcto entendimento bíblico, mas o próprio destinatário da Palavra : o homem, o indivíduo. Este individualismo, e consequente racionalismo, já que passava a ser pela razão que cada homem ficaria a entender a palavra de Deus, foi a porta aberta para, nos dois séculos seguintes, várias correntes filosóficas, explicassem o porquê de ser a razão o fundamento das explicações para a vida real e para o entendimento da palavra de Deus, destacando-se o jusnaturalismo preconizado por Grócio ( 1583-1645 ), Hobbes ( 1588-1679 ) e Locke ( 1632-1704 ). Partia-se de um pressuposto : o homem é, por impulso inato, estimulado a viver em sociedade. Essa natureza, de carácter imutável, implica um correlativo direito : o direito natural, autónomo, que decorre da razão e só por esta é clara e concretamente explicado e exigido, não se confundindo com o direito divino. O direito natural renascentista apresenta-se, pois, como autónomo e racional, existindo de forma absoluta. Assim, também as bases lógicas homologadas pela razão não poderão ficar à mercê de artifícios metafísicos que lhes comprometam a existência e o seu absolutismo. Esta ideia de direito natural, de cariz essencialmente natural e, portanto humano, esteve na base da evolução posterior dos conceitos de direito que historicamente se lhe seguiram. À supremacia da razão ficou ligada toda a
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filosofia que, por isso mesmo, se denominou de humanista, despregando-se de toda a fundamentação divina. A consequência mais directa foi, no campo do direito, a de procurar na razão humana a justificação de todos os ordenamentos jurídicos. Grócio transformou as regras tradicionais. Dizia ele que a razão é a única via possível quando se confrontam partes que não reconhecem a mesma autoridade, como sucedia nos diferendos entre príncipes cristãos e protestantes. Defendeu a sua tese num opúsculo intitulado Mare Liberum. Resultado foi o apresamento de um navio português pela Companhia Holandesa das Índias, que entretanto tinha pedido a Grócio um parecer. Resultado prático foi o estabelecimento da liberdade dos mares, do comércio e da perda do direito de achamento ou descoberta dos territórios do ultramar, cujo domínio passaria para quem tivesse a posse efectiva pela ocupação. O jusnaturalismo desenvolveu-se posteriormente por diversas correntes, todas elas com o objectivo prático e final de limitar o poder político pelo direito natural. Não se pode passar sem referir a introdução, no pensamento inicial da revolução francesa, do direito natural subjectivo, inerente a uma visão individualista. A este propósito a explanação mais completa ficou a dever-se a Kant. Para ele o respeito de tais direitos baseava-se no imperativo categórico revelado a cada homem como um dever-direito absoluto, através da razão prática. “ Procede sempre como se o teu acto devesse ser um ditame universal “.
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Todas estas ideias, muitas vezes fomentadas em núcleos de agitação social e favorecidas por condicionalismos vivenciais e históricos, acabaram por resultar em duas grandes revoluções : a revolução americana contra o domínio britânico; e a revolução francesa. Da primeira saiu a Declaração da Independência, da outra a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Impregnadas de ideias reformistas e liberalizantes, que entretanto se tinham espalhado pela Europa, tinham como espírito e princípios filosóficos a hegemonia dos direitos individuais fundamentais, senão vejamos . Relativamente à Declaração da Independência : “ Consideramos por si mesmas evidentes as verdades seguintes : todos os homens são criaturas iguais; todos são dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis, como a vida, a liberdade e a busca da felicidade. Os governos são estabelecidos entre os homens para assegurar esses direitos e os seus justos poderes derivam do consentimento dos governados; quando qualquer forma de governo se torna ofensiva destes fins, é direito do povo alterá-la ou aboli-la e instituir um novo governo, baseando-o nos princípios e organizando os seus poderes pela forma que lhe pareça mais adequada e promover a sua segurança e felicidade...”. A grande matriz de toda a legislação europeia, no que respeita aos direitos fundamentais é, porém, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, proclamada pela Assembleia Constituinte da França, reunida em Paris de 20 a 26 de Agosto de 1789 e que constituiu um dos mais importantes actos solenes de todo o processo que foi a Revolução Francesa.
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Vejamos, pois, o texto da Declaração que, além de um preâmbulo tem 17 artigos: “ Os representantes do povo francês, constituídos em Assembleia Nacional, considerando que a ignorância, o esquecimento ou o desprezo dos direitos são as únicas causas dos malefícios públicos e da corrupção dos governantes, decidiram expor numa Declaração os direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem, a fim de que esta Declaração, constantemente presente a todos os membros do corpo social, lhes recorde sem cessar os seus direitos e os seus deveres; a fim de que os actos do poder legislativo e os do poder executivo, podendo ser a cada instante comparados com o objectivo de cada instituição política, sejam mais respeitados; a fim de que as reclamações dos cidadãos, fundadas em princípios simples e incontestáveis, contribuam sempre para a manutenção da constituição e a felicidade de todos. Em consequência, a Assembleia Nacional reconhece e declara, em presença e sob os auspícios do Ser Supremo, os seguintes direitos do homem e do cidadão :
I. Os homens nascem e permanecem livres e iguais em direitos; as distinções sociais só podem ser fundadas na utilidade comum. II. O objectivo de toda a associação política é a conservação dos direitos naturais e imprescritíveis do homem; estes direitos são a liberdade, a prosperidade, a segurança e a resistência à opressão. III. O princípio de toda a soberania reside essencialmente na nação; ninguém pode exercer autoridade que dela não dimane expressamente.
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IV. A liberdade consiste em poder fazer tudo o que não prejudique outrém. Assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem só tem como limite os que asseguram aos outros membros da sociedade o exercício desses mesmos direitos: esses limites só podem ser determinados por lei. V. A lei só tem o direito de proibir as acções prejudiciais à sociedade. Tudo o que não é proibido pela lei não pode ser impedido e ninguém pode ser obrigado a fazer o que a lei não ordena. VI. A lei é a expressão da vontade geral; todos os cidadãos têm o direito a concorrer pessoalmente, ou através dos seus representantes, para a sua formação; ela deve ser a mesma para todos, quer quando protege quer quando pune. Sendo todos os cidadãos iguais aos seus olhos, eles têm igual acesso a todas as dignidades, lugares ou empregos públicos, segundo a sua capacidade e sem outras distinções além das decorrentes das suas virtudes e das suas aptidões. VII. Nenhum homem pode ser acusado, preso ou detido, a não ser nos casos determinados na lei e segundo as formas por ela prescritas. Aqueles que executem, solicitem, ou façam executar ordens arbitrárias devem ser punidos; mas todo o cidadão convocado ou detido à luz da lei deve obedecer imediatamente; tornar-se-á culpado se resistir. VIII. A lei só deve estabelecer penas estrita e evidentemente necessárias e ninguém pode ser punido a não ser em virtude de uma lei estabelecida e promulgada anteriormente ao delito e legalmente aplicada.
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IX. Todo o homem é considerado inocente até que seja declarado culpado; se for indispensável detê-lo, todo o rigor que não seja julgado necessário para assegurar a sua detenção deve ser severamente reprimido pela lei. X. Ninguém pode ser molestado pelas suas opiniões, mesmo religiosas, desde que a sua manifestação não perturbe a ordem pública estabelecida pela lei. XI. A livre comunicação das ideias e das opiniões é um dos direitos mais preciosos do homem; portanto, todo o cidadão pode falar, escrever e imprimir livremente; mas terá de responder pelo abuso desta liberdade nos casos determinados por lei. XII. A garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de uma força pública; esta força é por isso instituída em benefício de todos e não para a utilidade particular daquele a quem é confiada. XIII. Para a manutenção da força pública e despesas da administração é indispensável uma contribuição comum; esta deve ser igualmente repartida por todos os cidadãos, em função das suas disponibilidades. XIV. Os cidadãos têm o direito de verificarem por eles próprios ou pelos seus representantes a necessidade de contribuição pública, de a aprovar livremente, de acompanhar a sua utilização e de lhe determinar a prestação, o fundamento, a cobrança e a duração. XV. A sociedade tem o direito de pedir contas a todo o agente público pela sua administração.
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XVI. Toda a sociedade na qual a garantia dos direitos não está assegurada, nem determinada a separação dos poderes, não possui constituição. XVII. Sendo a propriedade um direito inalienável e sagrado, ninguém pode dela ser privado, a não ser que a necessidade pública, legalmente verificada, o exija claramente e na condição de uma justa e prévia indemnização “. Para que estes princípios viessem a ter incontestada eficácia prática, passaram a constituir texto constitucional, a partir de 1791. A partir de 1789 a expressão “ direitos do homem “ obteve a consagração plena, um pouco em detrimento de “ direito natural “. Mas isso não alterou a realidade material e essencial que lhe estava subjacente e que através dos séculos foi o ponto de apoio de todas as ordens jurídicas. A razão desta alteração semântica pode ser encontrada no espírito essencialmente humanista que impregnou a filosofia revolucionária de 1789, em que o HOMEM é apresentado como o centro de todas as coisas e a sua felicidade como o fim último da sociedade. Liberdade, Igualdade e Fraternidade, foi a trilogia propagada pelo ideal revolucionário. A Revolução Francesa foi uma revolução essencialmente burguesa, talvez a virada decisiva para as grandes transformações que se passaram no mundo nos séculos XIX e XX, tanto no campo político como no social, filosófico, jurídico, moral, tecnológico e artístico.
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A igualdade originária, a liberdade, a propriedade e a segurança como direitos naturais pacificamente reconhecidos; a subordinação ao bem comum; a inequívoca devolução da soberania à Nação; a adopção expressa da denominação “ direitos do homem e do cidadão “, vistos como os direitos do homem individual, do homem antropológico e, concomitantemente, do homem social integrado, do homem político, não terão sido somente nomes novos para fórmulas velhas, desde que levemos em conta que passaram a constituir direitos fundamentais constitucionalmente protegidos, adquirindo assim a força de matéria limitativa da acção do Poder face à sociedade civil, da Nação perante o Estado. No que respeita ao nosso país, os ideais da revolução vieram reflectir-se na ordem jurídica interna logo após 1820, a nível constitucional. Assim, no que toca a Direitos, Liberdades e Garantias, elas passaram a constar das leis Fundamentais de Portugal. A constituição de 1822 fala em “ Direitos e Deveres Individuais “; na Carta Constitucional de 1826, referem-se os “ Direitos Civis e Políticos “; na Constituição de 1838, especificam-se os “ Direitos e Garantias “; após a implantação da República, a Constituição de 1911 designou-os “ Direitos e Garantias Individuais “; a Constituição da II.ª República, de 1933, Chamou-lhes “ Direitos, Liberdades e Garantias Individuais “; e finalmente, a Constituição vigente utiliza a denominação de “ Direitos, Liberdades e Garantias “, colocando-os no quadro dos direitos fundamentais. A Declaração de 1789 debruçava-se essencialmente sobre os direitos do indivíduo. A evolução deu-se porém, de forma mais abrangente, passando a falar-
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se igualmente dos direitos básicos dos grupos, em moldes de lhes conferir a dignidade e a protecção em termos semelhantes às garantias individuais. O século XIX foi época de revoluções; do movimento operário; da democratização da ciência e do ensino; do aparecimento da Sociologia que permitiu formar juízos até então impensáveis e foi considerado o século da extinção de uma instituição que vem dos primórdios da sociedade humana : a escravatura Costuma-se indicar a Mensagem de 8 de Janeiro de 1918, do Presidente Wilson, como um marco inovador e importante na marcha evolutiva dos direitos colectivos, pois nela se falava em supressão das barreiras económicas e no respeito pelas soberanias, chegando-se a criar uma Sociedade das Nações ( com resultados muito fracos ). Após o conflito mundial de 1914-1918 , com o sucesso bélico, por parte das forças aliadas, a cisão ideológica que crescera durante o intervalo entre as duas grandes guerras não foi debelado. E só não desapareceu como veio a culminar, atingindo a sua maior expressão, com a criação dos dois blocos antagónicos, militares, que são a N.A.T.O. e o extinto Pacto de Varsóvia. Contudo, a referida cisão ideológica não impediu que fosse assinada a Carta das Nações Unidas, em 26 de Junho de 1945, na cidade de S. Francisco. A ideia da criação daquela organização, para substituir a fracassada Sociedade das Nações, surgira durante o desenrolar da 2ª guerra mundial.
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As Nações Unidas, que nasceram da coesão dos Aliados contra as forças do eixo, acabaram por se tornar extensivas a todas as outras nações, dela fazendo parte agora as próprias nações que constituíram o Eixo. Já não existe, portanto, qualquer conotação ligada à sua origem, tratando-se antes de uma verdadeira organização universal de todas as nações. O Poder e os Direitos fundamentais O Poder e Autoridade O Poder nasce da organização social. A palavra “ poder “, engloba vários sentidos, dependendo do contexto em que a empregarmos. Mas dela transparece sempre a faculdade de agir, de dispor e de impor. Convém distinguir “poder” de “autoridade”. Esta é a faculdade de influir na conduta alheia, de orientar, de se fazer respeitar. No campo político-jurídico o conceito de poder adquire uma acuidade especial, pois todo o homem quer saber quem manda nele e porquê, com que fundamento e em que medida, enfim, o que legitima e delimita o poder . No estudo da legitimidade iremos encontrar o fundamento do exercício do poder; na sua delimitação, entraremos na análise dos direitos fundamentais. No sentido político, o poder consubstancia-se na capacidade de obrigar o destinatário a adoptar uma conduta, de se portar de certa forma dentro da sociedade global; há uma relação de domínio, que será legítimo, se assentar no
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reconhecimento e aceitação por parte da comunidade sobre que é exercido; e de facto, se apoiado apenas na força. No sentido jurídico, o poder traduz-se, para além de definir a aplicação do direito, na faculdade de impor directamente uma obrigação de fazer ou não fazer alguma coisa sob pena da coercibilidade, ou seja, da susceptibilidade de reacção coerciva, pela força. O poder político sedia-se, organicamente, num aparelho de Estado, constituído por pessoas com a capacidade funcional para determinar e fazer cumprir essas determinações pelo emprego da força pública. O âmbito do poder, a sua forma de exercício e a justificação para a sua existência não constituem quadros determinados e fixos, nem no tempo, nem no lugar, nem nos grupos humanos. Existe toda uma evolução de métodos, conceitos e práticas, a cujo estudo se dedica a historiografia político-jurídica. O poder político é uma relação entre o seu detentor e aqueles sobre quem se exerce. Mas essa relação só se manifesta e, portanto, só existe, na medida em que obriga, ou pelo menos influencia de maneira relevante, os elementos do grupo e os leva a adoptarem o comportamento e a conduta que se deseja. Por vezes nem é necessária a efectivação da acção; basta a ameaça, ou a simples presença da força pública, para o sentido da vontade geral ou de um grupo específico ser conduzido e se comportar na direcção desejada pelo poder. Esta última prática verifica-se principalmente em regimes totalitários.
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O Poder na sua tridimensionalidade No aspecto político o poder é exercido pelo Estado. Noutra perspectiva podemos afirmar, correlativamente, que o Estado manifesta e concretiza a sua acção funcional mediante as prerrogativas do Poder. Na visão que mais nos interessa, ou seja, na gênese e enquadramento dos direitos fundamentais, o poder deve ser examinado por um prisma a que Adriano Moreira chama de “tridimensional”: a sua forma, a sede e a ideologia. 1. A forma traduz-se no regime que a comunidade adopta para orientação e resolução da estrutura do Estado, - entendido este como nação politicamente organizada e habitando um território -, com toda a arquitectura política destinada a regularizar a convivência social na sua maior amplitude. O regime surge, assim, como “a solução que uma sociedade adopta para a sua convivência política” obviamente que deverá haver uma concordância e observância dessa solução com a prática real do poder, como é próprio de um regime de direito. De contrário cair-se-á no sofisma do poder normativo, voluntarista e ilegítimo. Por isso se diz, que a Constituição formal deve coincidir com a Constituição real. E isto é de capital importância para nós, pois nela vêm consagrados os direitos fundamentais, que têm de ser ressalvados e respeitados por todo o corpo de normas que constituem a ordem jurídica. A solução adoptada pela sociedade pode ser vista em dois planos principais:
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a) O sistema de governo, que nos dá a estrutura do aparelho de Estado, ou seja, a organização política e órgãos de uma sociedade. b) O regime político, que nos perspectiva o ideário das relações fundamentais entre o indivíduo e o Estado, ideário esse que inspirará a ordem jurídica e nos esclarecerá sobre o espírito que domina o funcionamento do sistema. No que respeita ao regime político, - o outro plano em que deve ser analisada a solução adoptada pela comunidade para a sua convivência política -, temos de o ligar à posição do indivíduo face à sociedade em que se integra. Procura-se saber a posição relativa do cidadão perante o Estado, que valores estarão na base do relacionamento e dependência entre ambos, qual a estrutura político-filosófica que os rege, até onde o poder pode ir na esfera jurídica das pessoas, enfim, “será o indivíduo que vive para o Estado, ou o Estado existe para o indivíduo”? A resposta a estas questões depende do ideário político-filosófico que estiver na base do regime e o condicione. E aqui debatem-se dois regimes-tipo, ou orientações: o personalismo e o transpersonalismo. A concepção personalista vê o Estado ao serviço do cidadão. Toda a estrutura estatal existe e deverá funcionar como o meio mais eficaz para a realização dos fins próprios de cada pessoa. Por isso, cada cidadão pode prosseguir os seus interesses livremente e dispor da acção da sociedade política nesse sentido. O Estado só poderá restringir
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os fins e os meios dos cidadãos na medida restrita da manutenção da disciplina social e da ordem pública. Numa orientação transpersonalista o indivíduo é visto como elemento do todo que é a sociedade de que faz parte. Fora desta, o seu valor é nulo; e contra ela, será um marginal a extirpar por perturbador do fim colectivo para o qual o Estado trabalha e por via do qual existe. O interesse do Estado estará sempre sobre o de cada cidadão, independentemente de reivindicações de moral e de justiça que terão forçosamente de decorrer do interesse colectivo . Daqui se retiram duas grandes ideias : para o personalismo terá sempre a primazia o respeito pelos direitos individuais, a liberdade pessoal e o sistema de governo deverá revestir o tipo liberal; para o transpersonalismo, ao contrário, é um ideal, um propósito, uma missão, um fim a dominar o interesse e as preocupações de cada cidadão, nem que para tanto tenha de sacrificar posições de garantia dos direitos dos mesmos. No primeiro caso impera a liberdade, no segundo a autoridade. 2. A sede é de onde dimana a relação de domínio que se concretiza no exercício do poder, ou seja, o órgão ou entidade com capacidade para expedir a ordem, o comando, que deve ser cumprido. Esse comando vai traduzir-se em leis que funcionam como instrumentos do poder. Mas são também elementos essenciais para a harmonia e subsistência pacífica e ordeira do grupo. Sem elas corre-se o risco da anarquia havendo, neste caso, necessidade de intervenção da força.
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Como em muitos outros aspectos da prática política, põem-se aqui questões de imagem, de rosto, com que as coisas se apresentam à sociedade em geral. A mais importante é a distinção entre sede formal e sede material do poder. A sede formal, que se apresenta como a sede de exercício, é constituída pelos órgãos do governo, nestes compreendendo os três poderes. É neles que está a fonte do poder. São eles que, de maneira ostensiva e directa, expedem e concretizam, a vontade subjectiva do poder, através das leis e das ordens de carácter administrativo. Mas as verdadeiras sedes, por vezes, estão fora da imagem visível do poder, antecedem ou estão deslocados da sede formal; actuam no arranjo e composição da estrutura e contextura política e têm influência determinante na formação e constituição da sede de exercício. São as chamadas sedes de apoio. Elas podem revestir a forma activa, actuante e determinada; ou passiva, mais afeita à influência discreta, marginal, silenciosa e pressionante. Portanto, a sede do poder sustenta-se na sede de apoio e mostra-se na sede de exercício. À congregação da sociedade de apoio activo e da sede de exercício dá-se o nome de comunidade política, abrangendo, consequentemente, os que concorrem para a constituição efectiva do topo da pirâmide do poder. São geralmente sedes de apoio, entre outras: Os grupos de interesse e os grupos de pressão.
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São um fenómeno particularmente relevante na nossa época, de grande força e difusão em sistemas democráticos. A diferenciação entre os dois grupos pode ser estabelecido tomando por base a forma de actuação. O grupo de interesse procura influenciar o poder de modo discreto, manobrando com precaução e recorrendo a inquestionáveis técnicas de sedução. Pretende que os órgãos do poder se sensibilizem com a importância dos interesses que patrocinam e das consequências favoráveis ou desfavoráveis, conforme as circunstâncias, que daí advirão para um determinado sector da vida pública ou mesmo da sociedade em geral. Já o grupo de pressão se apresenta de feição mais frontal, mais aberto e aguerrido, exigindo, reclamando, impondo. Com carácter de maior pertinência e às vezes até de autêntica militância, apresentam-se em defesa de posições de natureza moral, ecológica, económica, social, religiosa, doutrinária, política e de outros tipos, não se poupando a grandes movimentos e acções publicitárias e de mobilização de modo a levar o poder receoso a orientar-se e decidir no sentido pretendido. Na prática os grupos de interesse jogam com a actuação dos grupos de pressão, por vezes em acções concertadas . Os partidos políticos.
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Estes grupos estão vocacionados para a luta no sentido da aquisição e manutenção do poder político, ou seja, para a obtenção da sede de exercício. Portanto, embora possam actuar como grupos de pressão ou grupos de interesse, a sua actividade não se esgota na satisfação de um qualquer interesse de um sector representado por um grupo, pontual ou esporádico. A sua representação e autoridade exerce-se através dos seus membros hierarquizados, submetidos a uma disciplina interna, com os seus estatutos próprios, os seus programas e os seus princípios políticos. Estabelecem uma linha de pensamento e acção consentâneos com o que julgam ser uma necessidade para a vida política do país e, para a sua concretização, procuram ocupar os lugares no poder que julguem indispensáveis. A força sindical. Destina-se a defender os interesses dos seus associados, dentro do sector do trabalho. Não têm de estar ligados ou dependentes de um partido político. Não têm, nem devem. Quando um sindicato se constituir, ou puser, na dependência de um partido político, corre o risco de subverter a sua verdadeira natureza, pois passa a subordinar a sua missão essencial, - a defesa dos interesses dos trabalhadores seus associados -, à estratégia de outra entidade que tem objectivos e fins diferentes: a conquista do poder. O aparelho militar. Não deve confundir-se com a Instituição Militar. O aparelho militar foi sempre muito influente, - na maior parte dos casos mesmo decisivo -, no destino político de uma comunidade, sobretudo em países onde a intervenção das outras sedes de apoio tenha tendência para ultrapassar as chamadas “ regras do jogo” democrático. Os excessos, os abusos e as omissões do poder político instalado 35
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levam, geralmente, ao descontrole da vida da sociedade civil, o que proporciona ou incita e incentiva os militares a tomarem a sede de exercício por períodos de duração variável. Isto acontece mais nos países de deficiente sedimentação social, como o chamado “terceiro mundo”. As Igrejas. Como instituições confessionais que são, integradas na comunidade com vista à doutrinação dos fiéis, - nalguns casos chegando mesmo a serem declaradas como “religiões do estado” -, acabam por se transformar necessariamente em grupos de pressão. Acontece até, por vezes, não aparecerem com o seu verdadeiro rosto no contexto político e social, mas sim subsumidas noutras instituições ou grupos de reacção . A comunicação social.
Esta força viu-se acrescida e agigantada com o desenvolvimento actual das técnicas de imprensa, da rádio e da televisão. A sua força é de tal ordem que é 36
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também conhecida como o 4.º poder. Embora na sua estrutura a comunicação social acabe por ser apenas um meio instrumental ao serviço das outras forças, a verdade é que o estatuto, unanimemente reconhecido hoje àquela força, de liberdade e autonomia, - a ponto de constituírem um autêntico direito fundamental na maioria das ordens jurídicas ocidentais -, confere-lhe o carácter de instituição, perfeitamente autónoma, portanto. Daí a individualizarão que dela fazemos como um dos exemplos de grupo de interesse e grupo de pressão. Poderíamos até acrescentar tratar-se do grupo de pressão por excelência, pois está generalizada entre os jornalistas a convicção de que estão especialmente vocacionados para representarem a força critica dos cidadãos. A opinião pública. Em boa verdade, é também sobre esta que as pressões se exercem no sentido de a captar e obter o seu aplauso ou condenação. Em democracia, quem tiver a seu favor a opinião pública, terá assegurado o acesso ao poder. Por isso a sede de exercício se preocupa particularmente com a sua figura perante a opinião pública e de forma alguma está interessada em criar uma má imagem, pois isso significará, no próximo sufrágio, a perda do poder. Mas a sede por excelência que realmente detém o poder e de onde ele dimana é a sociedade civil. As constituições modernas, desde a nossa (artigo 108.º) à da antiga URSS (artigo 2.º), ou à dos USA (logo no preâmbulo), chamam-lhe “ povo”. A constituição de 1933, na senda da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, falava em “Nação”.
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Por isso, seja qual for a denominação adoptada, a ideia é sempre a mesma: o detentor real do poder é a sociedade civil,. A expressão “sociedade civil” é formal e materialmente mais perfeita e conforme com a realidade, pois nela cabem os indivíduos que a compõem e as instituições que no seu seio se formam Este conceito de “sociedade civil” foi lançado por Thomas Hobbes, no De Cive e pretendeu retratar uma realidade que ía para além da simples sociedade de cidadãos . É no parágrafo IX, do cap. V, da secção II, do De Cive, que o, conceito de sociedade civil vem formalmente explanado. Depois de afirmar que “pessoa civil” é a pessoa jurídica e não a mera pessoa física, diz que a vontade de todas as pessoas civis numa sociedade constitui, por força de um pacto entre elas, uma realidade autónoma que se exprime como se de uma só se tratasse . Os interesses particulares de cada cidadão não se confundem com a vontade dessa sociedade civil e esta vontade existirá “para o bem da paz e para a defesa comum”. Todo este pensamento de Hobbes partia de um pressuposto: o estado natural dos homens, fora da sociedade, era um bellum omnium contra omnes, ou seja, de guerra de uns contra os outros. Isto porque “ todos têm igual direito a todas as coisas e bens da natureza, a mesma necessidade de se alimentar e subsistir”. Daqui resulta, forçosamente, a perpétua competição e a luta interminável entre as pessoas.
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Para sair deste estado, o homem só encontra uma via: renunciar à sua lei natural e constituir-se em sociedade, passar do status naturalis ao status civilís. O raciocínio justificativo da constituição dessa sociedade civil é exposto por Hobbes nestes termos lineares: “O homem pôde reduzir-se à condição de escravatura privada em proveito de quem bem lhe pareceu. Isso era permitido pela lei hebraica e pela lei romana. Então, por que não há-de ser permitido a um povo, que só depende de si, submeter-se a um ou vários indivíduos, de modo a transferir-lhes completamente o direito de governar”? O Estado seria, pois, a única salvaguarda dos indivíduos que lhes permitia viverem em paz. Ora é na constituição desse status civilis que o filósofo discorre sobre a sociedade civil nós termos indicados. Deste apanhado histórico da composição do conceito de sociedade civil se vê que nele se englobam o conjunto de indivíduos que compõem uma sociedade, como pessoas jurídicas, tradicional e culturalmente congregados por laços e vínculos especiais de interdependência, bem como as instituições que nela se formam como componente constitutiva. Fica-nos, portanto, a síntese de que a sociedade civil é constituída pelos cidadãos, surgindo e exprimindo-se não apenas nas suas opiniões e convicções individuais, mas também como membros componentes de instituições que desempenham o seu papel na comunidade social . É, pois, segundo esta perspectiva, onde se situa a fonte da legitimação do poder, longe daquela que o classifica de ilegítimo e usurpador.
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Já falámos, em diversos passos, na realidade política que é a chamada conquista do poder. Hoje todos os países têm a sua Constituição, da qual constam as regras a observar para um disciplinado e ordeiro acesso ao poder. A sua violação com o fim de se apossar do comando do aparelho político pode revestir a forma de Golpe de Estado, se a estrutura e o esquema governativos forem mantidos, mudando apenas os homens que exercem o poder. Esses golpes podem ser mais ou menos palacianos e traduzem-se na criação de situações de gravidade e desequilíbrio institucional e político, em termos que aos detentores do poder não fique outra alternativa aceitável senão a retirada pura e simples, - em certas situações, talvez condicionada -, de modo a que certas aparências ou reservas sejam respeitadas e garantidas pelos novos ocupantes. Isto é: o sistema permanece; os dirigentes é que mudam. Se se verificar resistência, ou se os assaltantes do aparelho de Estado utilizarem a força com a rapidez e eficiência necessárias para neutralizarem os focos de oposição armada, então teremos o golpe militar ou a insurreição, conforme o carácter militar ou civil dos seus protagonistas. Claro que, nestas coisas pode haver sempre interpenetrações , pois a experiência ensina não ser viável este tipo de acções sem o apoio ou a garantia da neutralidade de pelo menos boa parte das forças armadas .
Há depois a revolução . No sentido sócio-político a revolução é a alteração brusca, por vezes violenta e até sangrenta, da ordem política 40
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estabelecida. Se a alteração não for brusca, poderá integrar a figura da evolução, normal em qualquer sociedade política, mas em ritmo mais acelerado do que seria natural. A revolução tem sempre um projecto, um plano , o que desde logo a distingue da insurreição. Além disso, procura neutralizar, ou mesmo destruir, a ordem social e institucional que, de algum modo, entrave os propósitos revolucionários. Sempre organizadas, são cautelosa e pacientemente preparadas, por vezes em países estrangeiros, com a participação activa de cidadãos nacionais e utilizando recursos de diversas proveniências, mesmo estrangeiras. Um factor importante com que a organização revolucionária conta é de natureza psico-sociológica: o suporte passivo e temeroso da maioria ordeira e burguesa, que muito preza a ordem e tranquilidade pública. O terror, os raptos, os sequestros, os assassínios de entidades do exercício político ou de alto gabarito social, os assaltos, a morte indiscriminada ou selectiva de simples agentes da autoridade, transformam-se em instrumentos de luta para a conquista revolucionária do poder. Mais profunda e radical do que a revolução é o que modernamente se chama de contracultura. Traduz-se ela na implantação de novos sistemas de crença e valores, fora dos esquemas de persuasão próprios da doutrinação, que deixe ao homem a faculdade e a liberdade de aderir ou não. Não se trata de procurar arrastar ou conseguir a simples movimentação ou manifestação de massas. É algo mais do que isso. Procura-se introduzir uma transformação intrínseca da sociedade e da sua vida tradicional e cultural pela imposição de valores novos e violentação da estrutura social a todos os níveis. No campo 41
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religioso, por exemplo, busca-se implantar um sincretismo de neutralização e não a liberdade de escolha de uma fé ou devoção. A doutrinação vem impregnada, insistente e pertinazmente, da força dissolvente do slogan, sempre de fácil veículação pela simplicidade e imediação. A preparação mental das massas para a tolerância acobardada da vontade, como aconteceu nos países mais prósperos nas décadas de 60 e 70, fez-se com movimentos juvenis, procurando o desmantelamento da urbanidade e respeito mútuo apodando-os de preconceitos, ao mesmo tempo que se oferecia a libertação pela droga. Por outro lado, forças poderosas propiciaram que a música, o teatro, a literatura, o cinema e outras actividades de propagação de ideias se perfilassem como meios de protesto para obtenção da revolução pacífica Tudo isto visa muito mais do que as simples mudanças de governo ou de regime, mas das próprias estruturas político-jurídicas, morais, culturais e do normal e pacífico convívio social e podem pôr em perigo os fundamentos e a existência da garantia dos direitos fundamentais. 3 - A ideologia é o terceiro elemento da tridimensionalidade do poder.
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Etimologicamente, o termo significa “estudo das ideias”. Mas a realidade objectiva que tem traduzido, o conceito ontológico, tem-se afastado muito deste sentido. Contudo, - e paradoxalmente -, a teorização ideológica não deixou de, nalguns casos, cair mesmo na formulação de soluções utópicas, absolutamente divorciadas da realidade. Daí a denominação usus ideologicus no sentido de que toda a ideia é passiva, e pouco pode ter a ver com a proposição sensualista, de índole eminentemente prática. Quer isto dizer, portanto, que a ideologia pode ser também a via prática para a utopia. O sentido da fixação semântica da palavra ideologia, comporta três núcleos principais: a crença, a doutrina e a acção. Todos eles, porém, ficam subordinados à coerência e à imediacão. A crença traduz-se na convicção íntima, na fé de que a ideia proposta é a solução certa e oportuna. Não interessa a justeza ou verdade da ideia, mas sim que esta seja havida como tal. Julien Benda sustenta até que as ideologias, quer se apresentem como promotoras de reformas, quer como defensoras de sistemas estabelecidos, só desempenham a sua função se atingirem a multidão e movimentarem as massas, sem cuidar se foram ou não previamente deformadas . 43
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A crença é, pois, uma realidade pragmática: o que interessa é o resultado, isto é, que se imponha e seja aceite na amplitude pretendida. A doutrina, resume-se na ideia a incutir, a convencer, a promover, a persuadir, a inspirar a conduta prática por parte daqueles a quem se destina. Invade a vida individual e colectiva de modo a criar a imagem de um universo paralelo, justificativo da luta pela prossecução do fim atingir e seu quadro de valores. A acção é um elemento imprescindível no quadro ideológico. Para desempenhar o papel que lhe cabe, a acção concretizar-se-á mediante um programa operacional decidido, pouco propenso à tolerância, basicamente agressivo, para o qual o diálogo só tem cabimento se se conformar com a ortodoxia unilateral final a que se propõe. No caso de a ideologia visar reformas de estrutura, será implacável na crítica e demolição da ordem existente. Se apenas procurar sustentar e perpetuar o sistema em vigor, então realçará as suas virtudes e procurará as adesões e sustentáculos possíveis, reagindo pertinazmente e sem quartel a toda a acção, crença ou doutrina rival. É afinal, a acção activa da luta ideológica. Com a expressão “acção activa”, pretende-se representar a perseverança, a obstinação, tenacidade na imposição da ideia a incutir, recorrendo à acção que poderá estar muito para além do debate frontal de simples ideários. Existe mesmo uma metodologia já implantada. Assim, muitas vezes se recorre à agressão psicológica ou ao afrontamento da consciência crítica e das reservas morais da comunidade. Para defender a legitimidade dessa actuação invocam-se princípios de liberdade, ou do direito à diferença. 44
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Mas a coerência da ideia é essencial. Não é indispensável a seriedade e a verdade. Basta a coerência lógica. Como se sabe, o raciocínio lógico nem sempre conduz à verdade. A imediação é também característica importante da ideologia. A ideia tem de penetrar facilmente e de forma atraente nas massas, nem, sempre dadas à meditação e ao espírito crítico de uma tese sedutora. A abstracção, a generalização e outras formas de viciação do pensamento são fórmulas de aplicação corrente no imediatismo da acção ideológica. A utilização do slogan e dos símbolos facilitam a fixação da ideia. OS DIREITOS FUNDAMENTAIS NA CONSTITUIÇÃO PORTUGUESA
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DOS DIREITOS E DEVERES FUNDAMENTAIS EM GERAL Vamos estudar agora o regime jurídico geral dos direitos e deveres fundamentais na Constituição. Trata-se, obviamente, dos deveres e dos direitos fundamentais em sentido formal. Colocação dos deveres fundamentais na Constituição
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Começaremos por realçar a particularidade de aos direitos fundamentais não se contraporem, em moldes lineares ou de correspondência, os chamados deveres fundamentais. Assim, estes são situações jurídicas passivas constantes da Constituição, mas independentes da sua qualificação como obrigações ou deveres cívicos. Não se trata, pois, de contrapartidas a direitos, as situações activas, o que bem se compreende por ser da natureza do constitucionalismo o reconhecimento de direitos e não a sujeição a deveres, como se viu na apreciação histórica. Contudo, a Constituição não deixa de nos dar exemplos de ónus, interdições e vinculações que, de algum modo, poderão revestir a roupagem de autênticos deveres para com a comunidade. São casos paradigmáticos o dever de os pais educarem os filhos (artigo 36.º, n.º 5); o dever cívico de sufrágio (artigo 49.º, n.º 2); o dever de defender e promover a saúde (artigo 64º, n.º 1 ); o dever de defender o ambiente (artigo 66.º, n.º 1); o dever de preservar, defender e valorizar o património cultural (artigo 78.º, n.º 1); o dever de colaboração com a administração para efeitos eleitorais (artigo 113.º, n.º 4); o dever de obediência dos funcionários às ordens dos superiores hierárquicos, dever esse que cessa sempre que o cumprimento implique a prática de um crime (artigo 271.º, n.ºs 2 e 3); o dever de isenção partidária das Forças Armadas (artigo 275.º, n.º 4); e o dever para todos os portugueses de defesa da Pátria, expressamente considerado fundamental (artigo 276.º,n.º 1). Mas os direitos fundamentais propriamente ditos, os direitos fundamentais em sentido técnico e que se configuram na epígrafe da Parte I e no,
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respectivo Título III, esses são predominantemente deveres do Estado para com os cidadãos . Repare-se que não existe na Constituição uma norma que disponha para os “deveres” em termos semelhantes aos que estatui para os “ direitos”. Por isso não existe também uma paralela, categoria dos deveres em sentido material. Daí se infere que os deveres fundamentais são apenas os constantes da Constituição. Isto compreende-se bem se tomarmos em consideração que os direitos, liberdades e garantias se nos apresentam como garantias dos cidadãos face ao Poder, sendo o seu alargamento característica própria dos Estados democráticos, essencialmente vocacionados para a liberdade e sua defesa, bem como para a intensificação e ampliação da participação dos cidadãos na vida política. Regime dos direitos fundamentais Classificação dos direitos fundamentais Temos de partir de um pressuposto: teremos direitos fundamentais comuns e direitos fundamentais especiais. Os primeiros, direitos comuns, são atribuídos ao homem enquanto tal, no seu axioma antropológico, quer esteja integrado numa ou noutra ordem jurídica e social, ou mesmo em nenhuma. Um estrangeiro ou um apátrida não deixarão por isso de ser sujeitos desses direitos. Os direitos fundamentais especiais, “derivam essa especialidade do bem tutelado, da forma especial da configuração desse direito, cuja tutela se faz depender de uma organização especial da sociedade”.
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Para melhor se entender o mecanismo da diferenciação, tomemos um exemplo: o direito à vida. Há aqui duas formas de protecção. A defesa da integridade do cidadão; e a defesa da vida pelos cuidados de saúde. Em ambos os casos se está a proteger o direito à vida. Simplesmente, nesta segunda hipótese, a força das coisas impõe a existência de condições materiais para a vida dos indivíduos poder ser defendida mediante uma boa organização dos serviços de saúde. É o direito à saúde que, obviamente, se integra na criação complexa de um serviço próprio, com hospitais e material adequado, pessoal competente e tudo o mais necessário à conservação da vida e tratamento de cada um na doença. O mesmo se passa em relação ao ensino, à habitação e outros direitos sociais: são, portanto, bens individuais que, pela sua forma de tutela, implicam um certo posicionamento e acção de índole social que o Estado fica obrigado a providenciar e cumprir em primeira linha. Se analisarmos as disposições vigentes na Constituição, somos levados a concluir que os direitos fundamentais comuns se reconduzem aos direitos, liberdades e garantias. Os direitos fundamentais especiais são os económicos, sociais e culturais, que comportam, pelas considerações atrás feitas, os correspondentes deveres do Estado da sua prossecução. Enquadramento dos direitos fundamentais na Constituição Com a revisão de 1989 da Constituição, a estabilização deu-se com a consagração dos direitos fundamentais nos termos do artigo 16.º n.º 1, ou seja, além dos constantes na Parte I, há que acrescentar a possibilidade de outros serem classificados como tal, ainda que dispersos em leis e regras aplicáveis de direito internacional.
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Como lei supletiva, integradora e de orientação interpretativa, temos a Declaração Universal dos Direitos do Homem , como determina o n.º 2 do mesmo artigo. É na Parte I, sujeita, aliás, à epígrafe “ Direitos e Deveres Fundamentais”, que encontramos a maior parte daquela espécie de direitos. Os “ princípios gerais” que a eles dizem respeito vêm regulados no Título I. No Título II formulam-se os “Direitos, Liberdades e Garantias”, repartidos por três capítulos. No primeiro deles temos os de natureza pessoal e, por isso mesmo, designados por “ Direitos, liberdades e garantias pessoais”, que preenchem os comandos dos artigos 24.º a 47.º. No capítulo II desenvolvem-se os “ Direitos, liberdades e garantias de participação política”, regulamentados dos artigos 48.º a 52.º. No capítulo III especificam-se os “Direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores”. Finalmente, o Título III dá-nos o quadro dos direitos especiais, também subdividido em três capítulos: o primeiro correspondente aos “Direitos e deveres económicas”; o segundo, aos “Direitos e deveres sociais”; e o terceiro, aos “Direitos e deveres culturais”. Este Título III comporta as determinações dos artigos 58.º a 79.º. Outros direitos fundamentais existem, porém, espalhados por outros diversos pontos da Constituição. Apenas para citar alguns havidos como incontestáveis, referiremos: o artigo 114.º n.º 2, em que é reconhecido às minorias o direito de oposição democrática; o artigo 263.º n.º 1, que permite a constituição de organizações de moradores em áreas inferiores à da respectiva freguesia, com o fim de intensificar a participação das populações na vida administrativa local; o artigo 265.º n.º 1, que garante às organizações de moradores direitos de petição e participação a nível local; o artigo 268.º, sobre os direitos e garantias dos administrados, todo ele um repositório de protecção dos cidadãos e que, pela sua importância, merecerá estudo mais aprofundado noutro
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passo destas lições; e o artigo 269.º que regula o regime da função pública, assegurando aos seus agentes meios jurídicos de protecção e defesa. Temos, pois, e em resumo esquemático, os direitos fundamentais da Parte I, - a que poderíamos chamar de direitos fundamentais por excelência -, e ainda, por força do dito artigo 16.º, os previstos noutros locais disperses pela própria Constituição; os direitos fundamentais à luz da Declaração Universal dos Direitos do Homem; e, por fim, os direitos fundamentais previstas noutras leis e regras de direito internacional aplicáveis na nossa ordem jurídica. Hierarquização dos direitos fundamentais Por uma questão de critério valorativo, baseado na ideia do direito expresso na sistematização da Constituição, a doutrina refere que os direitos fundamentais se podem dispor segundo a seguinte hierarquia: em primeiro lugar, os direitos, liberdades e garantias que o artigo 19.º n.º 6 exclui de quaisquer restrições mesmo durante o período de declaração do estado de sítio e do estado de emergência, que são, o direito à vida, à integridade pessoal, à capacidade civil e à cidadania, a não retroactividade da lei criminal, o direito de defesa dos arguidos e a liberdade de consciência e de religião. São, afinal, os históricos direitos naturais ou primários. Em segundo lugar vêm os restantes direitos, liberdades e garantias, constitucionalmente dotados de um regime especial . Em terceiro lugar perfilam-se as diversas normas classificadas como direitos fundamentais de natureza análoga nos termos do artigo 17.º da Constituição. 51
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Em quarta posição teremos os direitos fundamentais garantidos pelo condicionamento de revisão constitucional, do artigo 288.º. E, finalmente, na última posição se nos deparam os demais direitos fundamentais económicos, sociais e culturais, cuja única garantia está na protecção comum das normas constitucionais, designadamente na sua fiscalização. Regime comum dos direitos fundamentais Princípio do Estado de direito democrático É na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão que o vamos encontrar esboçado, ao estabelecer-se aí que só seria constitucional a ordem jurídica que assegurasse a garantia dos direitos naturais e praticasse a tripartição de poderes (II e XVI) , tendo passado para o nosso direito interno pela Constituição de 1838. A tripartição assentava: na fonte material de onde dimanava o direito, - o poder legislativo; no aparelho executor das imposições do direito legislado, - o poder executivo; e no órgão que fiscalizava a aplicação desse direito, definindo-o nos casos omissos ou de interpretação duvidosa que na prática iam surgindo, - o poder judicial . Além da fiscalização por parte dos tribunais, as actuais ordens jurídicas encarregam o próprio órgão gerador dessas leis, através de uma fiscalização parlamentar. Por outro lado, os governos vão mais além. A par da sua função característica do poder executivo, exercem também actividade legislativa
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específica, fruto de uma evolução histórica e por necessidade das exigências da vida moderna e da nova técnica da política governativa no campo prático. Os três poderes, porém, exerciam as suas funções subordinados à supremacia de uma lei rígida: a Constituição. Da conjugação de todos estes elementos se estabeleceu o princípio que configura o Estado de direito como aquele que se submete às suas próprias leis , ao seu direito. O Estado cria as leis e, a partir daí, todos os cidadãos e ele próprio ficam obrigados a cumpri-las e a respeita-las. Mas, sendo o Estado a criar o direito, a elaborar as leis e a promulgá-las, não será paralogismo falar em submissão à lei? Que lei? Doutrinariamente a questão põe-se no sentido de saber se existirá uma forma eficaz de submeter o poder, os governantes, às normas jurídicas que lhes limitem a capacidade de dispor, definam atribuições e disciplinem o seu exercício. No direito positivo, esse limite será o estabelecido na tal lei rígida, só alterável por um processo especial e formal de revisão periódica, que é uma Constituição. Mas a questão pode ser aprofundada um pouco mais e debater se não terá a vontade do legislador, seja qual for o seu nível, - constituinte ou simples legislador ordinário -, de acatar regras que a razão impõe e desperta na consciência de todo o homem são.
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A isto responde um outro conceito doutrinário de Estado de direito, em que o próprio legislador, ainda que seja constituinte, está vinculado a princípios superiores e anteriores que não lhe permitem dispor arbitrariamente dos valores individuais e sociais geralmente havidos como invioláveis. As regras de direito natural, portanto. Temos assim, no Estado de direito, dois planos de vinculação do legislador: nas leis ordinárias, à Constituição rígida; e quanto ao poder constituinte, às regras superiores de direito natural que a razão impõe sob pena de se cair no arbítrio intolerável . A reacção contra o arbítrio intolerável tende hoje, no nosso Tribunal Constitucional, a fundamentar-se na confiança que um Estado de direito deve merecer aos cidadãos, ao serviço dos quais e para os quais ele existe. Se o conteúdo de uma lei violar intoleravelmente essa confiança, o Estado irá comprometer seriamente a relação poder-cidadão e, por isso, a este assiste o direito de pedir ao Tribunal Constitucional que declare a inconstitucionalidade daquela norma com base na violação do princípio do Estado de direito . Na Constituição vigente, o princípio do Estado de direito vem consagrado, em referência expressa, logo no “ Preâmbulo” e desenvolve-se depois pelos artigos 2.º e 9.º, alínea b). E dizemos em referência expressa porque também o art.º 3.º, n.º 2, ao determinar que o Estado se subordina à Constituição, reflete a natureza do Estado de Direito subordinação à lei rígida que é a Constituição. No preâmbulo garante-se a decisão do povo português “ de assegurar o primado do Estado de Direito democrático”. Depois o artigo 2.º proclamado 54
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como um dos princípios fundamentais da Constituição Portuguesa , que o artigo 9.º engloba como uma das tarefas fundamentais do Estado, logo a seguir à de garantir a independência nacional. Portanto, o Estado de direito na ordem jurídica portuguesa reveste a característica de Estado de direito democrático. Segundo Jorge Miranda, “ o Estado de direito democrático traduz a confluência do Estado de direito com a democracia” . a) A definição rigorosa e a garantia efectiva, no mínimo, dos direitos à vida e à integridade pessoal, da liberdade física e da segurança individual, da liberdade de consciência e religião, bem como a regra da igualdade jurídica entre as pessoas; b) A pluralidade de órgãos governativos, independentes ou interdependentes quanto à sua subsistência, e com funções distintas, competindo, nomeadamente, ao Parlamento o primado da função legislativa; c) A reserva da função jurisdicional aos tribunais, independentes e dotados de garantias de independência dos juízes; d) O princípio da constitucionalidade, com fiscalização, de preferência jurisdicional, da conformidade das leis com a Constituição; e) O princípio da legalidade da Administração, com anulação contenciosa dos regulamentos e actos administrativos ilegais ; f) A responsabilidade do Estado pelos danos causados pelos seus órgãos e agentes.
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Reflexo do Estado de Direito será também o art.º 266.º, n.º 2 da Constituição, completado agora pelo Código do Procedimento Administrativo cujos princípios gerais, - designadamente o da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da imparcialidade, da justiça, da prossecução do interesse público e da protecção dos direitos e interesses dos cidadãos -, constituem a base de enquadramento da actividade administrativa do poder Central em relação aos cidadãos, aos particulares. Assim, o princípio da legalidade passa a ser entendido na sua acepção mais ampla, o que implica a submissão ao direito, a todo o direito e não apenas à lei no sentido formal ou material, como vinha sendo a prática usual. Isto significará uma maior aproximação a critérios de justiça, - também ela princípio geral a observar pela Administração Pública. - Por outro lado, a prossecução do interesse público no respeito pelas direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos são as duas realidades que num Estado de Direito “ se encontram indissociavelmente ligados, não sendo possível, sob pena de ilegalidade, a realização do interesse público sem a devida consideração dos direitos e interesses dos particulares”. Isto é: num Estado de Direito a Administração não pode ir por aí fora e praticar os actos que bem entender sob a justificação de que são do interesse público, se com isso violar direitos e interesses legítimos dos particulares. Princípio da Universalidade Todos os cidadãos gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres consignados na Constituição. É o n.º 1 do artigo 12.º que assim dispõe. E o n.º 2 vem completar o princípio esclarecendo que as pessoas colectivas gozam dos direitos e estão sujeitas aos deveres compatíveis com a sua natureza.
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Por “todos”, entende-se os destinatários das normas, pelo que essa expressão deve ser havida como os que pertencem à mesma categoria de pessoas. Isto é imposto por dados de índole natural e nada tem a ver com qualquer ideia de reserva discriminatória em relação a direitos ou regalias. Quando, por exemplo, o artigo 122.º determina que só os cidadãos portugueses originários, maiores de 35 anos, são elegíveis para a Presidência da República, não está, obviamente, a ferir o princípio da universalidade pelo facto de excluir da corrida à presidência quem não haja atingido ainda aquela idade, embora possua já a condição de cidadão eleitor. Por isso se fala em “categorias” de pessoas, no sentido de abranger todos os cidadãos que preencham os requisitos legais para usufruir de um direito. Diga-se, contudo, que a universalidade é imperativo de toda a norma de direito. E tanto ele como os princípios da igualdade e da protecção de direitos concernem, não apenas com os direitos fundamentais, mas a todos os direitos em geral. Este princípio da universalidade radica-se na dignidade da pessoa humana. Disso mesmo decorrem diversas disposições constitucionais, designadamente a extensão aos apátridas dos direitos dos cidadãos portugueses, como determina o artigo 15.º; a inexistência da pena de morte, artigo 24.º n.º 2; a manutenção do habeas corpus contra o abuso de poder, por virtude de prisão ou detenção ilegal, artigo 31.º n.º 1; a proibição de extradição, se no país requisitante vigorar a pena de morte, artigo 33.º n.º 4; a ressalva dos direitos primários do artigo 19.º n.º 6, mesmo em estado de sítio ou estado de emergência; a proibição de penas cruéis, degradantes ou desumanas, artigo 25.º
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n.º 2; a inviolabilidade da integridade moral e física das pessoas, artigo 25.º n.º 1; e de uma maneira geral, todo o capítulo I, do Título II da Parte I. São também muitos os preceitos da Constituição em que a consagração genérica do princípio da universalidade é patente e permite havê-lo como regra no nosso direito. Citaremos, apenas: o artigo 10.º n.º 1, a estabelecer o sufrágio universal; o artigo 20.º, garantindo o acesso ao direito e aos tribunais; o direito de resistência, do artigo 21.º; o direito à liberdade e à segurança, do artigo 27.º; o direito à constituição de família, do artigo 36, etc. Princípio da igualdade Começaremos por realçar que nem sempre é simples e fácil a distinção límpida entre a universalidade e a igualdade. Para se perceber melhor a diferença temos de recorrer ao critério da separação entre os “ destinatários “ e o “ conteúdo “ das normas. O princípio da universalidade diz respeito aos destinatários das normas e então todos têm todos os direitos e deveres, e o princípio da igualdade centra-se no conteúdo dessas normas e, daí, todos têm os mesmos direitos e deveres. A dificuldade resulta, antes de mais, por haver a tendência para esquecer que a Constituição expressamente refere que se trata da “igualdade” perante a lei. Depois porque o artigo 13.º, norma que consagra o princípio da igualdade, o liga à afirmação de que todos os cidadãos têm a mesma dignidade social, - o que é expressão do princípio da universalidade. Debruçando-nos sobre a Constituição, - por ser o documento que mais nos interessa agora -, vemos que o princípio da igualdade está em conexão com a dignidade social, enquanto a universalidade visa mais a dignidade da pessoa humana . 58
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A dignidade social aqui deve ser entendida como o elemento que permite a realização individual de cada um dentro da sociedade e decorre do artigo 29.º n.º 1 da Declaração Universal. São exemplos: o capítulo III do Título II da Parte I e ainda o artigo 76.º n.º 1, em que é garantida a igualdade no regime de acesso ao ensino superior; o estímulo da actividade cooperativa, do artigo 85º; a promoção da melhoria da situação económica dos que trabalham a terra, do artigo 96.º n.º 1; os apoios preferenciais aos pequenos agricultores, do artigo 97º, n.º 1; e a diminuição das desigualdades pela política fiscal, do artigo 104.º n.º 1 . Temos, pois, a igualdade perante a lei e a igualdade como objectivo do Estado Social que está presente em diversas disposições da nossa Constituição, designadamente: artigo 9.º d), onde se considera tarefa fundamental do Estado a promoção do bem-estar e a igualdade real entre os portugueses; o artigo 20.º, que exclui a desigualdade perante a justiça e a falta de acesso a ela por insuficiência de meios económicas; todo o corpo de normas dos artigos 67.º a 72.º, onde se contempla especificadamente a protecção da família, da maternidade, da infância, da juventude, dos deficientes e dos idosos . Quanto à igualdade perante a lei, ou igualdade jurídica, há a acrescentar aos casos já referidos atrás, o artigo 10.º n.º 1, que estabelece o sufrágio universal, igual, directo, secreto e periódico para todo o povo, que é como quem diz, para todo o cidadão; a igualdade dos cônjuges, do artigo 36.º n.ºs 1 e 3; e o n.º 4 do mesmo artigo, em relação aos filhos havidos dentro ou fora do casamento, interditando-se designações discriminatórias relativas à filiação; a garantia de igualdade e eficácia no direito de resposta e de rectificação, que o artigo 37.º n.º 4 a todos reconhece, quer se trate de pessoas singulares quer de pessoas colectivas;
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a igualdade em matéria de religião e culto, que claramente resulta do artigo 41.º, etc. Que a igualdade é um elemento apaziguador das relações humanas, parece não haver dúvidas, como dúvidas não oferece o seu papel na realização integral do homem na sociedade moderna. O n.º 2 do artigo 13.º determina, dentro do espírito e da letra dos grandes Instrumentos Universais dos direitos do homem, que ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social. Não podemos deixar de referir que a negação de privilégios é hoje indiscutível, particularmente se fundados em razões de ascendência, - ou de nascimento, como se diz no artigo 2.º da DUDH e no artigo 14.º da CEDH -, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social. Porém, o artigo 13.º n.º 2 não se fica pela negação de privilégios; vai mais além e rejeita que se possa ser “beneficiado”, “prejudicado”, “privado de qualquer direito” ou “isento de qualquer dever” em razão daquelas qualidades e situações. De facto, a própria Constituição faz depender da situação económica a imposição fiscal (artigos 103.º e 104.º) e os benefícios derivados dos direitos sociais para os mais desfavorecidos (artigos 63.º n.º 3, 64.º n.º 3, 65.º n.º 3, 72.º, etc.) com vista à efectivação de uma das tarefas fundamentais do Estado, que é a do artigo 9.º, alínea d). 60
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As questões da raça, religião e do território de origem são, nos dias de hoje, dos problemas mais prementes e relevantes que, de algum modo podem indubitavelmente ensombrar a efectivarão prática da igualdade jurídica e real entre os cidadãos . A regra da igualdade ascende, portanto, a nível de princípio constitucional a ser observado tanto pelo legislador, como pela Administração Pública e pelos tribunais. A igualdade não se confunde com uma outra figura a que a Constituição chama de princípio da imparcialidade. Os contornos de cada uma destas figuras, - igualdade e imparcialidade -, devem ser procurados no agente. Explicando melhor: a propósito das campanhas eleitorais, o artigo 113.º n.º 3, alínea c) determina que elas se devem reger, entre outros princípios, pelo da imparcialidade das entidades públicas perante as candidaturas; por outro lado, o artigo 266.º n.º 2 refere que os órgãos e agentes administrativos devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade. Ora, como se viu, a igualdade provém da dignidade social derivada da própria dignidade do homem. Consubstancia-se numa relação entre os indivíduos, por virtude da qual todos eles são titulares dos mesmos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana. Na imparcialidade entra a conduta do agente ou do órgão da Administração, que intervirá no estrito e isento cumprimento da lei, sem submeter ou deixar influenciar a sua decisão por interesses ou critérios alheios ao espírito da lei. Esta e só esta determinará e orientará a sua conduta decisória. 61
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Portanto, a igualdade perante a lei concerne aos mesmos direitos e deveres para todos os cidadãos, não existindo privilégio de uns em relação aos outros; a imparcialidade dirige-se às entidades públicas e seus agentes que, subordinados ao sentido da igualdade dos cidadãos perante a lei, devem actuar com toda a isenção. Isto é: embora as decisões judiciais e os actos definitivos e executórios da Administração fixem titularidade de direitos, subordinados ao princípio da imparcialidade, é o princípio da igualdade que a sua intervenção se propõe estabelecer. Ou, de outra forma: a igualdade respeita aos cidadãos; aos agentes do Estado, a imparcialidade.
Princípio da protecção jurídica
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É princípio geral de direito adjectivo ou processual a regra de que a todo o direito corresponde uma acção, destinada a fazê-lo reconhecer em juízo ou a realizá-lo coercivamente bem como as providências necessárias para acautelar o efeito útil da acção . Tal é a tarefa, por excelência, dos tribunais judiciais que, com as restantes categorias de tribunais (artigo 211.º), são órgãos de soberania e administram justiça em nome do povo, incumbindo-lhes assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, dirimir conflitos de interesses públicos e privados e reprimir a violação da legalidade democrática, assistindolhes, para tanto, o direito à coadjuvação das outras autoridades (artigo 202, n.º 1, n.º 2 e n.º 3 ). É regra sagrada da função jurisdicional a sua independência e os juizes apenas estão sujeitos à lei (artigo 205.º), cabendo-lhes fiscalizar também a constitucionalidade das leis, não as aplicando nos feitos submetidos a julgamento se elas infringirem o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados (artigos 3.º n.º 3 e 204.º). Além disso, as decisões dos tribunais são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer outras autoridades (artigo 205.º n.º 2), - como é próprio de um Estado de direito. Mas de protecção jurídica são também outras garantias de defesa do cidadão perante a Administração Pública que vêm consagradas na Constituição e na lei. Ambas as tutelas, - jurisdicional e graciosa -, constituem o objecto deste número e vamos pois estudá-las.
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Tutela jurisdicional Na nossa Constituição é o artigo 20.º que, subordinado à epígrafe “acesso ao direito e aos tribunais”, declara que a todos é assegurado o direito de defesa e o recurso aos tribunais para fazer valer os seus direitos e interesses legítimos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicas do cidadão ( referido também no artº 8, da D.U.D.H. e artgs. 6º e 13º da C.E.D.H. ). Surge-nos aqui um elemento de ordem social que é o de assegurar a administração da justiça mesmo àqueles sem recursos económicas para implementar a máquina judicial, em regra dispendiosa. Regulam esta matéria o Decreto-Lei n.º 387-B/87, de 29 de Dezembro, que estabelece o regime de acesso ao direito e aos tribunais e o Decreto-Lei n.º 391/88, de 26 de Outubro, que regulamenta o sistema de apoio judiciário. O que mais interesse tem para nós é o acesso ao direito e aos tribunais, desenvolvimento directo do artigo 20.º da Constituição. - Dispõe a lei que o sistema de acesso ao direito e aos tribunais se destina a promover os meios e as condições para que a ninguém seja dificultado ou impedido, em razão da sua condição social ou cultura, bem como por insuficiência de meios económicas, de conhecer, fazer valer ou defender os seus direitos. Temos, pois, os dois elementos: informação jurídica e protecção jurídica.
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A informação será desenvolvida gradualmente pelos serviços de acolhimento que forem sendo criados nos tribunais e serviços judiciários; a protecção jurídica revestirá as modalidades de consulta e de apoio judiciário. Segundo o artigo 7.º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 387-B/87, têm direito a protecção jurídica (consulta jurídica e apoio judiciário) as pessoas singulares que demonstrem não dispor de meios económicas bastantes para suportar os honorários dos profissionais forenses ( advogados por exemplo ) devidos por efeito da prestação dos seus serviços, e bem assim para custear, total ou parcialmente, os encargos normais de uma causa judicial. Quanto à consulta jurídica, será ela estabelecido pela cooperação entre a Ordem dos Advogados e o ministério da Justiça, com vista à montagem de gabinetes que cubram todo o país. No que respeita ao apoio judiciário, traduz-se na dispensa total ou parcial dos preparos e do pagamento de custas e dos honorários dos patronos. O procedimento processual para o deferimento do apoio vem regulado nos artigos 15.º e seguintes do citado decreto-lei. Na tutela jurisdicional e dentro do princípio da protecção jurídica cabe ainda, de forma especificado, o Habeas Corpus, já nosso conhecida, que tem por objecto obstar ao abuso do poder por prisão ilegal, a interpor perante tribunal judicial ou militar, consoante os casos, providência que pode ser requerido pelo próprio preso ou detido ilegalmente, ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos. Assim determina o artigo 31.º.
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A forma processual para implementar o pedido de Habeas Corpus vem regulamentada nos artigos 220.º a 224.º do Código Processo Penal. Aí se distingue duas situações: se se trata de detenção ilegal, ou de prisão ilegal. No primeiro caso, o detido à ordem de qualquer autoridade, que entenda estar excedido o prazo para ser entregue ao poder judicial, que a detenção se mantém fora de local legalmente permitido, que foi ordenada ou efectuada por entidade incompetente, ou que a detenção foi motivada por facto pelo qual alei anão permite, Pode requerer ao juiz de instrução da área onde se encontra que ordene a sua imediata apresentação à autoridade judicial competente. Se alguma autoridade levantar obstáculo ilegítimo à apresentação do requerimento, ou à sua remessa ao juiz, ficará incurso no crime de abuso de poder. Se se tratar de pessoa ilegalmente presa, a petição será dirigida, em duplicado, ao presidente do Supremo Tribunal de Justiça e apresentada à autoridade à ordem da qual se mantenha preso. A lei indica os fundamentos da petição: ter sido efectuada ou ordenada por entidade incompetente; ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite; e manter-se para além dos prazos fixados na lei ou na decisão judicial. Tal como a todo o direito corresponde uma acção destinada a torná-lo efectivo, também a toda a violação de um direito fundamental, ou a prática de um acto ilegal pela Administração, corresponde o direito ao recurso contencioso. Igualmente é sempre garantido aos administrados o acesso à justiça administrativa para tutela dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos. Estas garantias têm assento no artigo 268.º n.ºs 4 e 5 da Constituição. E, quanto à actividade administrativa, o novo Código do Procedimento Administrativo veio
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mesmo conferir a categoria de princípio geral ao citado acesso à justiça administrativa, como se vê do art.º 12.º do aludido Código. A doutrina vai já no sentido de considerar o princípio de acesso à justiça como a ponte para a legislação reguladora do contencioso administrativo. Tutela graciosa Contrapõe-se ou acompanha os meios contenciosos, próprios dos tribunais. A tutela graciosa visa a reconsiderarão de uma decisão anterior tomada por um órgão competente, ou uma diligência que ponha termo à sua inércia O artigo 52.º da Constituição consagra o direito de petição. Permite ele que todos os cidadãos possam apresentar, individual ou colectivamente, aos órgãos de soberania ou a quaisquer autoridades públicas, com excepção dos tribunais, petições, representações, reclamações ou queixas para defesa dos seus direitos, da Constituição, das leis ou do interesse geral. O exercício do direito de petição vem regulado na Lei n. 43/90, de 10 de Agosto, publicado no Diário da República n.º 184, I Série ( alterada pela Lei n.º 6/93, de 1 de Março ). Aí se garante o exercício desse direito e se indicam os respectivos procedimentos processuais, começando pela definição de cada um daqueles instrumentos. Assim, entende-se por petição, em geral, a apresentação de um pedido ou de uma proposta no sentido de ser tomada, adoptada ou obtida superiormente determinada medida.
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A representação será a exposição destinada a manifestar opinião contrária à perfilhada por qualquer entidade ou a chamar a atenção de uma autoridade pública relativamente a certa situação ou acto, com vista à sua revisão ou à ponderação dos seus efeitos. A reclamação destina-se à impugnarão de um acto perante o órgão, funcionário ou agente que o praticou, ou perante o seu superior hierárquico. Finalmente, a queixa consiste na denúncia de qualquer inconstitucionalidade ou ilegalidade, bem como do funcionamento anómalo de qualquer serviço, com vista à adopção de medidas contra os responsáveis. Cada um destes instrumentos diz-se “ colectivo” quando apresentado por um conjunto de pessoas; será em nome colectivo se provier de uma pessoa colectiva em representação dos respectivos membros. Assinalemos que o direito de petição é cumulável com outros meios de defesa de direitos e interesses previstos na Constituição e na lei e não pode ser limitado ou restringido no seu exercício por qualquer órgão de soberania ou autoridade pública. O art.º 9.º do Código do Procedimento Administrativo veio impor aos órgãos administrativos, - cf. art.º 2.º n.º 2 e art.º 13.º do mesmo Código -, o dever da decisão, o qual só deixará de existir quando o órgão competente tenha praticado, há menos de dois anos, um acto administrativo sobre o mesmo pedido formulado pelo mesmo particular e com os mesmos fundamentos. É o chamado princípio da decisão. Enquanto instrumento democrático de participação política, o direito de petição é exclusivo dos cidadãos portugueses. Contudo, aos estrangeiros e aos 68
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apátridas residentes em território português é assegurado o direito de petição para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos. Em matéria de direito de petição a nossa ordem jurídica impõe rigoroso princípio de liberdade, determinando expressamente que nenhuma entidade, pública ou privada, pode proibir, ou por qualquer forma impedir ou dificultar, o exercício do direito de petição, designadamente na livre recolha de assinaturas e na prática dos demais actos necessários. A garantia vai ao ponto de ser assegurado que ninguém pode ser prejudicado, privilegiado ou privado de qualquer direito em virtude do exercício do direito de petição, ficando a entidade destinatária da petição obrigada a recebê-la e examiná-la e a comunicar a decisão que for tomada . Direito de queixa ao Provedor de Justiça Trata-se de um dos direitos fundamentais dos cidadãos, consagrados no Título I da Parte I da Constituição. É o artigo 23.º que no seu n.º 1 determina que os cidadãos podem apresentar queixas ao Provedor de Justiça, por acções ou omissões dos poderes públicos, o qual as apreciará sem poder decisório, dirigindo aos órgãos competentes as recomendações necessárias para prevenir e reparar injustiças. O Provedor de Justiça tem o seu Estatuto na Lei n.º 9/91, de 9 de Abril, que alterou a anterior Lei n.º 81/77, de 23 de Novembro. A função principal do Provedor é a defesa e promoção dos direitos, liberdades e garantias e interesses legítimos dos cidadãos, assegurando, através de meios informais, a justiça e a legalidade do exercício dos poderes públicos. 69
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Gozando de total independência, autonomia, inamobilidade e as imunidades próprias do cargo, o seu campo de acção estende-se aos serviços da administração pública central, regional e local, das Forças Armadas, dos institutos públicos, das empresas públicas ou de capitais maioritariamente públicos ou concessionárias de serviços públicos ou de exploração de bens do domínio público. Nos termos legais, compete-lhe, além de integrar o Conselho de Estado e requerer ao Tribunal Constitucional a apreciação da inconstitucionalidade ou a ilegalidade de normas, nos termos dos artigos 281.º e 283.º da Constituição, dirigir recomendações às entidades competentes com vista à correcção de actos ilegais ou injustos dos poderes públicos, ou melhoria dos respectivos serviços; assinalar as deficiências de legislação que verificar, emitindo recomendações para a sua interpretação, alteração ou revogação, ou sugestões para a elaboração de nova legislação, as quais serão enviadas ao presidente da Assembleia da República ao primeiro ministro e aos ministros directamente interessados, ou as autoridades competentes das Regiões Autónomas; emitir parecer, a solicitação da Assembleia da República, sobre quaisquer matérias com a sua actividade relacionadas; promover a divulgação do conteúdo e da significação de cada um dos direitos e liberdades fundamentais, bem como da finalidade da instituição do Provedor, dos direitos de acção de que dispõe e de como a ele se pode fazer apelo; e intervir, nos termos da lei aplicável, na tutela dos interesses colectivos ou difusos, quando estiverem em causa entidades públicas. Para tanto, a lei atribui-lhe poderes para efectuar, com ou sem aviso, visitas de inspecção a todo e qualquer sector da actividade da administração central, regional ou local, designadamente a estabelecimentos prisionais civis ou
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militares, ouvindo os respectivos órgãos ou agentes e pedindo as informações e exibição dos documentos que reputar convenientes; proceder às investigações e inquéritos que considerar necessários e adoptar, em matéria de recolha e produção de provas, todos os procedimentos que forem razoáveis e não colidam com os direitos e interesses legítimos dos cidadãos; e procurar, em colaboração com os órgãos e serviços competentes, as soluções mais adequadas à tutela dos interesses legítimos dos cidadãos e ao aperfeiçoamento da acção administrativa. Há que ter bem atenção ao facto de a intervenção do Provedor não estar limitada pela utilização de meios graciosos ou contenciosos, ou pela pendência desses meios, sem prejuízo dos seguintes limites: a) O Provedor não tem competência para anular, revogar ou modificar os actos dos Poderes Públicos e a sua intervenção não suspende o decurso de quaisquer prazos, designadamente os de recurso hierárquico e contencioso. b) Estão excluídos dos poderes de inspecção e fiscalização do Provedor os órgãos de soberania, as assembleias legislativas regionais e os governos das Regiões Autónomas, com excepção da sua actividade administrativa e dos actos praticados na superintendência da Administração. c) As queixas relativas à actividade judicial que, pela sua natureza, não estejam fora do âmbito da actividade do Provedor de Justiça, serão tratadas através do Conselho Superior da Magistratura, do Conselho Superior do Ministério Público, ou do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, conforme os casos. 71
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Vejamos agora como se processa a acção do Provedor de Justiça. Antes de mais, pode depender dele mesmo a iniciativa, se se tratar de factos que por qualquer modo cheguem ao seu conhecimento. É a iniciativa própria que, neste caso, estará na base da sua actuação. Mas pode a sua acção desencadear-se face a “queixa” que lhe seja apresentada por qualquer cidadão, ou grupo de cidadãos. Determina a lei que essas queixas não dependem de interesse directo, pessoal e legítimo, nem estão sujeitas a quaisquer prazos. Nem tão pouco estão subordinadas a formulários essenciais, pois podem ser apresentadas oralmente ou por escrito, ainda que por simples carta. Devem apenas referir a identidade e morada do queixoso e, se apresentadas por escrito, a sua assinatura, a menos que esta não possa figurar. Se forem feitas oralmente, deverão ser reduzidas a escrito em laudo próprio ou auto. As queixas podem ser apresentadas directamente ao Provedor ou ao Ministério Público, que lhas transmitirá imediatamente. Pode também a Assembleia da República, as Comissões Parlamentares e os deputados solicitar ao Provedor as diligências necessárias à prossecução das petições ou queixas que lhes sejam enviadas. Recebidas as queixas, são elas objecto de uma apreciação preliminar e, se forem de manifesta má-fé ou desprovidas de fundamento, serão fogo indeferidas liminarmente. No caso contrário, inicia-se a respectiva instrução, sem regras especiais de produção de prova. Pode, para tanto, solicitar directamente aos
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agentes do Ministério Público, ou quaisquer outras entidades públicas, com carácter de prioridade e urgência, as diligências que julgue necessárias. Esse dever de cooperação com o Provedor é extensivo às entidades públicas e militares em geral, sendo apenas de assinalar as restrições legais respeitantes ao segredo de justiça, ou ao interesse superior do Estado em questões de segurança, defesa ou relações internacionais e, ainda assim, devidamente justificadas. A Polícia, portanto, está sujeita também ela a esse dever de cooperação. Sem prejuízo do procedimento disciplinar que ao caso couber, o incumprimento injustificado do dever de cooperação por parte dos funcionários ou agentes, comina o crime de desobediência. Com igual incriminação ficarão indiciados os cidadãos que se recusem a prestar depoimentos ou faltarem no dia, hora e local para que forem convocados pelo Provedor para serem ouvidos. Nestes casos, as despesas de deslocação e outras que, a pedido do convocado, forem autorizadas pelo Provedor, correrão por conta da Provedoria. Quando o Provedor conclua que a queixa é infundada, que as ilegalidades ou injustiças invocados já foram reparadas, ou que o caso está fora da sua competência, mandará arquivar as queixas. Se o Provedor reconhecer que o queixoso tem ao seu alcance um meio gracioso ou contencioso, especialmente previstos na lei para aquele caso, pode limitar-se a encaminhá-lo para a entidade competente. Independentemente disso, porém, o Provedor deve informar sempre o queixoso dos meios contenciosos que estejam ao seu alcance. Se o caso for de pequena gravidade e sem carácter continuado, pode limitar-se a uma simples chamada de atenção ao órgão ou
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serviço competente, ou dar o assunto por encerrado com as explicações fornecidos. Quando resultarem do processo indícios suficientes da prática de infracções criminais, disciplinares, ou de contra-ordenações, o Provedor deve dar conhecimento delas à entidade competente para impulsionar o respectivo procedimento. Se as circunstâncias o aconselharem, pode o Provedor ordenar a publicação de comunicados ou informações sobre as conclusões alcançadas nos processos. Diga-se ainda que o Provedor deve ouvir os órgãos ou agentes postos em causa, permitindo-lhes que prestem os esclarecimentos necessários, antes de ele formular as suas conclusões. E se, no final do processo, o Provedor de Justiça entender que a queixa tinha razão de ser? Nessa altura, ele deverá dirigir ao órgão competente para corrigir o acto ou a situação irregular, as suas recomendações. O órgão destinatário da recomendação deve, no prazo de 60 dias a contar da sua recepção, comunicar ao Provedor a posição que assume quanto a ela. O não acatamento da recomendação tem de ser sempre fundamentado. Se as recomendações não forem atendidas, pode o Provedor dirigir-se ao superior hierárquico competente. Se a Administração não actuar de acordo com
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as suas recomendações, pode, então, dirigir-se à Assembleia da República expondo os motivos da sua tomada de posição. Os actos do Provedor são insusceptíveis de recurso. Se ele entender que certa queixa foi feita de má-fé, poderá levar o facto ao conhecimento do Ministério Público para instaurar procedimento criminal, se for caso disso. Refira-se ainda que o Provedor de Justiça tem honras, direitos e garantias idênticas às dos Ministros da República, não pode ser detido ou preso sem autorização da Assembleia da República, salvo tratando-se de crime punível com pena de prisão superior a 3 anos e em flagrante delito. Para o coadjuvar, o Provedor tem um gabinete de pessoal próprio e dois provedores-adjuntos, podendo solicitar das autoridades e seus agentes o auxílio de que necessitar para o bom desempenho das suas funções. Finalmente, como a própria Constituição determina, o Provedor de Justiça é designado para o exercício das suas funções pela Assembleia da República, artigo 163.º, alínea i ).
Regime Específico dos direitos, liberdades e garantias Tivemos já ensejo de referir que os direitos, liberdades e garantias são direitos fundamentais que gozam de um regime especial, que têm uma força jurídica mais impositiva dentro da ordem legal estabelecido constitucionalmente, de modo a salvaguardar a esfera jurídica dos cidadãos de eventuais agravos por parte do Poder que, de algum modo, possam pôr em causa a “ eminente dignidade da
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pessoa humana”. São eles os direitos fundamentais que vêm seriados no Título II da Parte I da Constituição e outros de natureza análoga, como se diz no artigo 17.º. São as regras materiais específicas desses direitos liberdades e garantias que passaremos a estudar. Regras Materiais - Aplicação directa e vinculação Pretende-se aqui determinar a imediação da aplicação dos direitos liberdades e garantias e as entidades a eles vinculadas. De forma simples, a resposta vem no n.º 1 do artigo 18.º, determinando-se que esses preceitos são directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas. Da imediação resulta a regra da aplicação directa das normas constitucionais por si mesmas e não mediante lei intermédio ou interposta.
Não significa isto que a matéria dos direitos, liberdades e garantias não deva ser regulada por lei. O que se pretende atingir é que a lei em caso algum poderá restringir ou desviar-se do estrito comando constitucional, designadamente no que ele tiver de essencial. E, se tal acontecer, não se cai apenas na violação do princípio da constitucionalidade das leis, imposto pelo artigo 3.º n.º 3, mas mais do que isso: far-se-á aplicação imediata da letra e do
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espírito da norma constitucional directamente, ultrapassando o comando legal que a adultera ou viola. O novo Código do Procedimento Administrativo veio perseguir com a nulidade os actos que ofendam o conteúdo essencial de um direito fundamental, como se diz no seu art.º 133.º n.º 2.º alínea d). Foi, sem dúvida, um assinalável progresso para a realização da justiça este alargamento expresso de casos de nulidade já que, como é sabido, a regra é a de simples anulabilidade. O mesmo não se passa quanto à aplicação dos direitos fundamentais do Título III - direitos fundamentais económicas, sociais e culturais, pois o seu âmbito e intensidade de aplicação está mitigado pelo condicionalismo prévio da existência de lei que o regulamente, além da necessidade, em muitos casos, da indispensabilidade de meios e infra-estruturas que possibilitem a sua concretizarão. Para promover o ensino para todos, a protecção da saúde, ou a habitação, o Estado terá de construir escolas, hospitais e fomentar a construção social em termos de tornar materialmente viável o cumprimento daqueles direitos fundamentais. Mas as obras materiais não surgem por decreto. É preciso construílas e, para tanto, são necessários meios e tempo para as terminar. Portanto, a própria natureza das coisas obsta a que este tipo de direitos possa ser passivo da imediação; mas já não é de excluir a omissão e daí a existência do citado artigo 283.º. E quanto ao âmbito da vinculação das entidades privadas aos preceitos constitucionais respeitantes a direitos, liberdades e garantias?
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Temos de partir do princípio, incontestável hoje, de que as entidades privadas exercem uma função social. Quando, ao consagrar o princípio da universalidade, o artigo 12.º da Constituição arrasta todos os cidadãos para o gozo dos direitos e sujeição aos deveres nela consignados, baseia-se em razões de dignidade humana quanto aos cidadãos. Mas, para as pessoas colectivas, essa capacidade de gozo e a vinculação aos deveres, vai-se radicar na sua natureza, no objecto e no fim económico-social para que foram criadas. Ora a nossa lei fundamental determina a aplicação directa do regime dos direitos constitucionais se estivermos perante casos de direitos, liberdades e garantias, a ela ficando vinculadas também as entidades privadas. Estas, porém, e dada a sua natureza -, só têm os direitos com esta compatíveis. Isto é: as pessoas colectivas terão apenas os direitos atinentes ao seu objecto, ao seu fim, à sua função social. A situação é, portanto, diferente da consagrada para as pessoas singulares, para os cidadãos. Estes são titulares dos direitos fundamentais em geral, enquanto as pessoas colectivas podem usufruir apenas dos que se adequarem a natureza do seu objecto e função social. Mas as entidades privadas não têm de ser forçosamente pessoas colectivas e o n.º 1 do artigo 18.º refere-se genericamente a entidades privadas. Por isso a questão pode ser rebatida para as relações entre particulares. E, neste âmbito, a regra é a de que “quem exerce direitos fundamentais deverá respeitar idênticos direitos dos outros”. Tratando-se de particulares iguais, ou seja, na mesma posição perante a lei e sem supremacia de um sobre o outro, a doutrina tem. entendido que os direitos fundamentais, como direitos subjectivos, não podem ser dirigidos contra eles, o
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que não significa a sua não aplicação entre eles, pois existe sempre a possibilidade de pedir protecção ao Estado contra a sua violação, protecção essa que tanto pode revestir carácter civil como criminal. Aliás, todos têm de respeitar a lei geral mesmo dentro das relações de direito privado e, como se sabe, aquela tem de estar conforme com o comando constitucional. Não deixa de ser apropriado referir a existência de princípios gerais de direito privado, tais como a boa fé, a ordem pública e os bons costumes, consagrados no Código Civil e que, como lei ordinária, estão conformes com a Constituição. E mesmo nesta, há também repositórios de figuras jurídicas de natureza privada a serem respeitadas pelos indivíduos como entes de direito privado, como são os casos dos artigos 26.º, 34.º e 36.º. Carácter restritivo e excepcional da limitação e suspensão dos direitos, liberdades e garantias Os direitos, liberdades e garantias constitucionalmente assegurados só admitem restrições nos casos que a própria Constituição prevê. Mas, ainda assim, essas restrições devem limitar-se ao necessário para a salvaguarda doutros direitos e interesses constitucionalmente protegidos. É o que o artigo 18.º n.º 2 determina, completando depois o n.º 3 o quadro, ao esclarecer que as leis restritivas destas normas têm de revestir carácter geral e abstracto e não podem ter efeito retroactivo nem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais. No texto constitucional aparecem diversos casos de restrições explícitas, tais como: a aplicação judicial de medidas de segurança, dos. artigos 27.º n.º 2 e 29.º n.ºs 1, 3 e 4; os casos especificados nas alíneas do n.º 3 do artigo 27.º; os limites 79
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das penas e das medidas de segurança do artigo 30.º; as restrições do artigo 34.º; a utilização da informática e ficheiros para tratamento de dados referentes a convicções filosóficas, políticas, filiação partidária, sindical, religiosa ou da vida privada, salvo se destinados à estatística e em termos não individualmente identificáveis, do artigo 35.º; a separação dos filhos em relação aos pais, artigo 36.º n. 6; as limitações à liberdade de associação estabelecidos nos n.ºs 1 e 4 do artigo 46.º; e as impostas à liberdade de escolha da profissão ou género de trabalho do artigo 47.º n.º 1; as restrições à elegibilidade para deputado em virtude de incompatibilidades locais ou de exercício de certos cargos, do artigo 154.º; as incompatibilidades relativas aos funcionários para o exercício de outros cargos, do artigo 269.º n.ºs 4 e 5; e as restrições ao exercício livre dos direitos de expressão, reunião, manifestação, associação e petição colectiva e à capacidade eleitoral passiva dos militares e agentes militarizados, determinada no artigo 270.º. Além destes exemplos de restrições explícitas, outros decorrem implicitamente de diversas disposições de lei, pelo que devem também eles ficar sujeitos ao espírito das regras consagradas no artigo 18.º n.ºs 2 e 3. Como mais abrangente, temos a resultante da colisão de direitos, do artigo 335.º do Código Civil. Na colisão de direitos iguais ou da mesma espécie, devem os titulares ceder o necessário para que todos produzam igualmente os seus efeitos, com o menor detrimento Para cada uma das Partes; se os direitos forem desiguais ou de espécie diferente, prevalece o que deva considerar-se superior.
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O carácter restritivo das próprias restrições aos direitos, liberdades e garantias visa, portanto, salvaguardar o respeito e a observância deles como a maior e mais completa expressão da liberdade do homem, dentro do quadro da complexidade da vida social e jurídica. A rejeição do abuso desses direitos e a busca da solução equilibrada, equitativa e justa nos casos de colisão, devem ser temperadas por critérios de proporcionalidade e observância das razões de fundo que estão na origem da sua consagração. E não é preocupante a escolha do termo para designar essa razão de fundo. “Limite imanente”, “conteúdo essencial”, ou qualquer outro em que a doutrina acorde, deverá traduzir sempre a essência que permita e imponha a tal proporcionalidade, justiça e equilíbrio da aplicação geral desses direitos. Suspensão do exercício dos direitos, liberdades e garantias A complexidade e heterogeneidade da vida social e política dos Estados modernos criam, por vezes, estados de crise, nas quais se geram situações delicadas, por vezes antagónicas, entre a necessidade de salvar a ordem e a paz social e, por outro lado, não cair nos excessos de opressão a que o Poder fica naturalmente tentado. Nestas situações o equilíbrio é fundamental para a própria estabilidade do Estado e da sociedade. Essas conjunturas de crise grupal levam à perturbação do exercício pacífico e integral, no todo ou em parte, dos direitos, liberdades e garantias. Então, limitações ou suspensões desses direitos podem ter de surgir. É dessa matéria que vamos tratar agora. Em caso algum pode alguém ser privado, mesmo temporariamente, de todos os direitos, liberdades e garantias. 81
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Quanto à liberdade física, não pode haver penas ou medidas de segurança privativas ou restritivas da liberdade com carácter perpétuo, salvo se se tratar de perigosidade resultante de grave anomalia psíquica e com impossibilidade terapêutica em meio aberto, mas só e sempre mediante sentença judicial. Decretadas ou não, as sanções ou providências que envolvam a limitação, a suspensão ou a Privação de direitos, liberdades e garantias devem ser sempre susceptíveis de apreciação pelos tribunais. As incapacidades e as privações ou suspensões de direitos só podem ser as que constarem de lei geral. Salvo a jurisdição própria dos tribunais militares, só os tribunais judiciais Podem aplicar medidas restritivas ou privativas da liberdade. Preservação do habeas corpus. As medidas de Polícia estão sempre sujeitas ao princípio da proporcionalidade.
O conteúdo essencial dos direitos, liberdades e garantias terá de ser assegurado a todos os cidadãos em condições normais da vida jurídica. Só nos casos e quanto aos cidadãos que comprometam essa normalidade aquele conteúdo pode ser afectado, como acontece perante comportamentos desviantes passíveis de medidas de segurança especiais e, ainda assim, mediante decisão judicial.
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A nossa Constituição estabelece no artigo 19.º da suspensão do exercício de direitos. A regra, a este propósito, é a de que os órgãos de soberania não podem, conjunta ou separadamente, suspender o exercício dos direitos, liberdades e garantias, salvo em caso de estado de sítio ou estado emergência, declarados nos termos constitucionais. Nunca, Porém, pode ele afectar os direitos à vida, à integridade pessoal, à identidade pessoal, à capa cidade civil e à cidadania, nem determinar a retroactividade da lei criminal, o direito de defesa dos arguidos e a liberdade de consciência e de religião. Gozam de imposição constitucional as normas adjectivos Concernentes à declaração do estado de sítio e do estado de emergência em geral, que a Lei 44/86, de 30 de Setembro, vem depois regulamentar. O estado de sítio e o estado de emergência integram um conceito mais amplo, qual seja o de “Estado de Excepção”, utilizado como epígrafe do artigo 1.º da citada lei. O nome diz tudo: Só excepcionalmente, ou seja, em caso de grave perturbação da vida civil, esse estado poderá ser declarado.
A perturbação pode resultar de calamidade pública, em que a insegurança das pessoas e a destruição, ou sua iminência, dos bens tem origem em causas naturais, como cataclismos, terramotos, inundações e epidemias avassaladoras em termos catastróficos capazes de dizimar grandes manchas populacionais. Nestas circunstâncias é normal surgirem situações de insegurança e de ameaça à paz civil, agravadas por actos de pilhagem praticados por criminosos mais ou menos 83
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contidos e por simples marginais, o que vem enegrecer ainda mais o estado de angústia e ansiedade da população, obrigando as autoridades a um esforço redobrado na luta contra a calamidade. É necessário, então, proceder ao reforço de poderes da administração civil e mesmo, se for caso disso, ao apoio das forças armadas. Terá, portanto, de se recorrer à medida de excepção de declarar o “Estado de Emergência”. Se se tratar de “Estado de Sítio” o quadro é diferente. A ameaça ou verificação de alteração da ordem tem a sua origem em actos de força ou insurreição que vão pôr em perigo a integridade nacional ou o livre exercício da soberania e da ordem. A nossa lei, designadamente nos artigos 8.º e 9.º, bem como o preceito constitucional do artigo 19.º n.ºs 2 e 3, fogem um pouco àquele rigor da origem do estado de excepção nas duas indicados modalidades, situando-as também no parâmetro da gravidade das circunstâncias. Assim, o estado de emergência será declarado quando se verifiquem situações de menor gravidade, designadamente em casos de calamidade pública. O estado de sítio, esse será declarado quando estiver em perigo a ordem constitucional, a independência ou a integridade territorial. A suspensão do exercício dos direitos, liberdades e garantias tem consagração constitucional, como se disse, no artigo 19.º. Só mediante a declaração do estado de sítio ou do estado de emergência essa suspensão pode ter lugar. Vejamos em que termos. A declaração integra-se na competência para a prática de actos próprios do Presidente da República, como se vê do artigo 134.º alínea d) e do artigo 10.º 84
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n.º 1 da Lei n.º 44/86. Para tanto, solicitará à Assembleia da República, em mensagem fundamentada, autorização para o efeito, devendo constar dessa mensagem os factos que justificam tal medida, a menção da audição do Governo e a respectiva resposta, a indicação do âmbito territorial de aplicação, a duração, a especificarão dos direitos, liberdades e garantias cujo exercício fica suspenso ou restringido, a determinação dos poderes conferidos às autoridades militares e o grau de reforço dos poderes das autoridades administrativas civis. Finalmente, serão especificados os crimes que ficam sujeitos à jurisdição dos tribunais militares. É o que vem referido no artigo 14.º da Lei n.º 44/86. Se a Assembleia da República não estiver reunida nem for possível a sua reunião imediata, será a Comissão Permanente daquela Assembleia a pronunciarse, sob a forma de “resolução”, como se pode ver do artigo 179.º n.º 3 alínea f) e n.º 4. Se a Comissão Permanente autorizar a declaração, essa resolução terá de ser ratificado pelo Plenário logo que seja possível reuni-lo, artigo 138.º n.º 2 da Constituição e artigos 25.º e 26.º da Lei n.º 44/86. A declaração do estado de sítio e do estado de emergência carece de referenda do Governo, sob pena de inexistência jurídica (artigo 140.º e alínea f) do artigo 197.º). Os actos processuais do pedido de autorização à Assembleia da República para a declaração do estado de sítio e do estado de emergência vêm regulamentados nos artigos 24.º a 29.º da citada Lei n. 44/86, sendo de realçar o n.º 1 do artigo 28.º que determina que esses actos processuais revestem natureza urgentíssima e têm prioridade sobre quaisquer outros, o que bem se compreende, 85
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dado o carácter de primazia conjuntural e de perigo colectivo que a situação acarreta. Durante a vigência do estado de excepção o Presidente da República não pode dissolver a Assembleia da República (artigo 172.º n.º 1), sendo igualmente interdita a prática de qualquer acto de revisão constitucional (artigo 289.º). Estas limitações compreendem-se para tentar evitar manobras políticas que, de algum modo, possam ser havidas como autênticos golpes de Estado constitucionais. Registe-se ainda que a legislação sobre os regimes do estado de sítio e do estado de emergência é reserva absoluta da competência legislativa da Assembleia da República, como determina o artigo 164.º alínea e). Vejamos agora os ordenamentos quanto à declaração do estado de sítio e do estado de emergência no que concerne aos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. Comecemos por realçar que a declaração jamais pode afectar os direitos à vida, à integridade pessoal, à identidade pessoal, à capacidade civil, à cidadania, à não retroactividade da lei criminal, ao direito de defesa dos arguidos e à liberdade de consciência e de religião. É o artigo 19.º n.º 6 que, na senda da doutrina constitucionalista de todos os povos civilizados e democráticos, imperiosamente o estabelece. Tanto a opção pela declaração do estado de sítio e do estado de emergência, como a sua execução, devem respeitar o princípio da proporcionalidade e limitar-se, quanto à sua extensão e duração, bem como aos meios a utilizar, ao estritamente necessário ao pronto restabelecimento da 86
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normalidade constitucional. Além disso, a suspensão do exercício dos direitos, liberdades e garantias respeitará sempre o princípio da igualdade e a não discriminação, obedecendo aos seguintes limites: a) A fixação de residência ou detenção de pessoas, com fundamento em violação das normas de segurança em vigor, será comunicado ao juiz de instrução competente, no prazo máximo de 24 horas após a ocorrência, assegurando-se designadamente o direito de habeas corpus. b) A realização de buscas domiciliárias e a recolha dos demais meios de obtenção de prova serão reduzidos a auto, na presença de duas testemunhas, sempre que possível residentes na respectiva área e comunicados ao juíz de instrução acompanhadas de informação sobre as causas e os resultados respectivos. c) Quando se estabeleça o condicionamento ou interdição do trânsito de pessoas e da circulação de veículos, cabe às autoridades assegurar os meios necessários ao cumprimento do disposto na declaração, particularmente no tocante ao transporte, alojamento e manutenção dos cidadãos afectados. d) Poderá ser suspenso qualquer tipo de publicações, emissões de rádio, televisão e espectáculos cinematográficos ou teatrais, bem como ser ordenada a apreensão de quaisquer publicações, não podendo estas medidas englobar qualquer forma de censura prévia.
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e) As reuniões dos órgãos estatutários dos partidos políticos, sindicatos e associações profissionais não serão em caso algum proibidas, dissolvidas ou submetidas a autorização prévia . Também a responsabilidade civil por violação de direitos, liberdades e garantias impende sobre a Administração, se esta actuar inconstitucional ou ilegalmente sobre algum cidadão, à sombra da situação decorrente da declaração do estado de excepção, dando mesmo lugar ao direito de exigir o pagamento da correspondente indemnização a título de reparação. É o que determina o artigo 2.º n.º 3 da citada Lei. A duração do estado de excepção está limitada ao tempo necessário à salvaguarda dos direitos e interesses que com ele se visam proteger, como diz o artigo 5.º n.º 1 da Lei n.º 44/86. Ainda assim, não pode ela prolongar-se por mais de 15 dias, sem prejuízo de eventual renovação por um ou mais períodos de igual duração, caso subsistam as causas que deram origem à sua declaração. Sempre que as circunstâncias o permitam, deve a renovação da declaração do estado de sítio ser substituída por declaração do estado de emergência.
A renovação da declaração do estado de sítio e do estado de emergência, bem como a sua modificação no sentido da extensão, segue os mesmos trâmites da declaração inicial. Já as modificações que reduzam as respectivas providências ou medidas, ou mesmo a sua revogação, operam-se por decreto do Presidente da República, referendado pelo Governo, independente da prévia audição deste e de autorização da Assembleia da República. Isto bem se compreende se atentarmos em que as formalidades para a declaração do estado de excepção, por envolverem 88
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limitação ou suspensão dos direitos dos cidadãos, têm de ser mais cautelosas e passar por um crivo de garantias muito maior do que a sua cessação. É o que resulta das disposições conjugados dos artigos 13.º e 27.º da Lei n.º 44/86. Quanto à execução da declaração do estado de sítio e do estado de emergência compete ela ao Governo que dos respectivos actos manterá informado o Presidente da República e a Assembleia da República, pois estes têm funções de fiscalização, como se vê do artigo 162.º alínea b) da Constituição. Por sua vez, o Conselho Superior de Defesa Nacional, a Procuradoria Geral da República e o serviço do Provedor de Justiça mantêm-se em sessão permanente, desde que abranja todo o território nacional. O artigo 20.º da Lei n.º 44/86, no seu artigo 20.º, regulamenta a execução da declaração se esta tiver âmbito regional ou local. Para efeitos operacionais, as forças de segurança, - e a Polícia de Segurança Pública, portanto -, ficam colocadas sob o comando do Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, por intermédio dos respectivos comandantes-gerais. As autoridades administrativas civis continuarão com a competência própria e que não haja sido cometida na declaração às autoridades militares; deverão, porém, facultar sempre a estas as informações que lhes forem solicitadas. Durante o estado de sítio e do estado de emergência, pode o Governo nomear Comissários seus para assegurar o funcionamento de institutos públicos, de empresas públicas e nacionalizadas e outras de vital importância, como determina o artigo 21.º dá Lei n.º 44/86, sem prejuízo da competência interventiva das autoridades militares.
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Aos tribunais militares competirá a instrução e julgamento dos processos pelos crimes que a declaração especificar, bem como os crimes dolosos directamente relacionados com as causas que fundamentam o estado de excepção e praticados durante a sua vigência, contra a vida, a integridade física, a liberdade das pessoas, o direito de informação, a segurança das comunicações, o património, a ordem e a tranquilidade públicas. Estes crimes são equiparados, para o efeito, aos essencialmente militares, como estabelece o artigo 22.º da citada lei. Isto não impede, claro está, o funcionamento normal dos tribunais comuns dentro da competência e atribuições que lhes são próprias, ressalvando-se apenas a reserva alargada dos tribunais militares durante o período de vigência da declaração. Como já deixámos referido, restabelecido que seja a normalidade constitucional, o estado de sítio e o estado de emergência, - que têm carácter absolutamente excepcional -, deixam de ter razão de subsistir pelo que, o Presidente da República, independentemente de autorização da Assembleia da República, ordenará a sua revogação, mediante decreto referendado pelo Governo. Assim terminará a suspensão do exercício dos direitos, liberdades e garantias que a Constituição garante aos cidadãos.
Direito de resistência
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A consagração específica do direito de resistir à ofensa e violação dos direitos, liberdades e garantias reconhecidos constitucionalmente vem no artigo 21.º da Constituição . Há que começar por referir que a doutrina costuma separar duas espécies de resistência: a resistência colectiva e a resistência individual. Casos de resistência colectiva seriam, por exemplo, o direito dos povos à insurreição contra todas as formas de opressão, nomeadamente contra o colonialismo e o imperialismo, como estipula o artigo 7.º n.º 3, dando-lhe honras de princípio fundamental da Ordem Constitucional Portuguesa; e o direito à greve com proibição do lock-out, do artigo 57.º.
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Parece-nos que o artigo 21.º não se aplica de todo à tal resistência colectiva. As razões deste nosso entendimento podem resumir-se assim: o preceito refere-se a direitos, liberdades e garantias. Estes são os constantes do Título II da Parte I, onde a matéria do artigo 7.º n.º 3 não tem assento. Está também fora do conceito de natureza análoga do artigo 7.º. Por outro lado, o reconhecimento do direito dos povos à insurreição tem mais um cariz programático, de índole política, populista, do que expressão rigorosa que caracterize a ofensa de direitos, liberdades e garantias. O problema já se apresenta menos líquido no que respeita ao direito à greve com proibição de lock-out. Na verdade, o argumento da sistemática adoptada na Constituição não colhe neste caso. A matéria vem tratada no artigo 57.º, portanto dentro do âmbito delimitado pelo artigo 17.º. Por isso convém dizer um Pouco mais sobre o tema da greve Os opositores à defesa do direito à greve sem o correspondente lock-out como forma legítima de resistência colectiva, baseiam-se em argumentos de ética e lógica jurídica que, perfunctoriamente, poderemos resumir assim: a greve é, no seu sentido puro e clássico, a interrupção colectiva e concertada do trabalho por parte dos trabalhadores. Haverá, portanto, uma relação prévia de trabalho, em que uma das partes, - a trabalhadora -, sem a dar por rescindida ou extinta, suspende a sua prestação até a outra parte satisfazer as suas reivindicações laborais. Ficam, portanto, excluídos os autónomos, como os trabalhadores de profissões liberais, os estudantes, etc. Mantendo-se o conceito de greve dentro do espírito e da técnica das relações de trabalho, as chamadas greves políticas e de solidariedade também não cabem no conceito clássico de greve.
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A proibição do lock-out tem, porém, fortes opositores doutrinários. Os seus argumentos podem sintetizar-se assim: ofende-se gravemente o princípio da igualdade perante o Direito e perante a Lei, pois cria-se uma situação de desigual protecção jurídica entre as partes, o que viola o artigo 7.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem; vicia-se o sagrado princípio do direito de defesa por parte da entidade patronal, o que está em oposição com o artigo 10.º da mesma Declaração; só a uma das partes se reconhece o direito de actuação na luta ou oposição entre as duas partes de uma mesma relação jurídica laboral subjacente, sem reconhecer à outra o correlativo direito de resposta; só à parte trabalhadora se concede o direito de definir o âmbito dos interesses a defender através da greve. É neste quadro de desequilíbrio, perante as poderosas e ricas organizações sindicais, que o empresário está em situação de fraqueza relativa, sobretudo tratando-se de pequenas e médias empresas. Na verdade, o artigo 57.º da Constituição inscreve nos direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores, - Capítulo III, do Título II, da Parte I -, não só o direito à greve, mas também a proibição do lock-out. E mais: confere aos trabalhadores a definição do âmbito dos interesses a defender através da greve, não podendo esse âmbito ser limitado pela lei. A Lei n.º 65/77, de 26 de Agosto, - Lei da Greve -, parcialmente alterada pela Lei 30/92, de 20 de Outubro, logo no artigo 1.º n.º 3 declara que o direito à greve é irrenunciável. Assim, será nula toda a cláusula laboral, livremente estipulada ou não, em que o trabalhador renuncie previamente ao direito de greve.
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A lei vigente define o lock-out considerando como tal qualquer decisão unilateral da entidade patronal que se traduza na paralisação total ou parcial da empresa, ou na interdição do acesso aos locais de trabalho a alguns ou à totalidade dos trabalhadores, na recusa de fornecer trabalho, condições e instrumentos que determine, ou possa determinar, a paralisação de todos ou alguns sectores da empresa ou que, em qualquer caso, vise atingir finalidades alheias à normal actividade da .empresa. Refira-se que, por força dos artigos 31.º e 69.º da Lei n.º 29/82, Lei de Defesa Nacional, os militares e os agentes militarizados estão Sujeitos ao dever de isenção sindical, não podendo convocar ou participar em qualquer manifestação de carácter sindical, não lhes sendo aplicáveis as normas constitucionais referentes aos direitos dos trabalhadores. Esta regra está na linha de disposições do direito internacional geral, designadamente o artigo 22.º n.º 2 do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e o artigo 11.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, segundo as quais são legítimas restrições legais ao exercício da liberdade de associação, incluindo a liberdade de filiação em sindicatos para defesa dos seus interesses, aos membros das forças armadas, da polícia e da Administração do Estado. A par da resistência colectiva temos, como acima se disse, a resistência individual dos cidadãos, representada na nossa Constituição no artigo 21.º, que expressamente declara que todos têm o direito de resistir a qualquer ordem que ofenda os seus direitos, liberdades e garantias e de repelir pela força qualquer agressão, quando não seja possível recorrer à autoridade pública.
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O direito de resistência, constitui como que um direito subsidiário, pois a regra para a defesa dos direitos será a protecção jurídica do acesso ao direito e aos tribunais, do artigo 20.º da Constituição. Verificamos nele dois aspectos: resistência a ordens ofensivas dos direitos, liberdades e garantias - em que se pressupõe, obviamente, uma relação de subordinação, essencial ao conceito de ordem -; e resistência pela força nas relações entre particulares, fora dos poderes públicos, quando não seja possível recorrer à autoridade pública para obstar à ofensa ou agressão. No primeiro caso temos a já referida força jurídica própria dos direitos, liberdades e garantias que o resistente pode fazer desencandear e valer quando em presença da sua ofensa ou violação. No segundo caso temos a acção directa e a Legítima defesa. Visto sob certo aspecto, - a obtenção de efeitos práticos -, nele cabe também o estado de necessidade. A doutrina considera a acção directa como “forma de justiça privada, ou seja, recorrer à força com o fim de realizar ou assegurar o próprio direito ”. Dar o formular requisitos que devem estar presentes na acção, tais como: a justificabilidade, por com ela se fazer valer um direito legalmente tutelado; a indispensabilidade, para evitar a inutilizarão prática de um direito; a insubstituibilidade, impossibilidade material de recorrer à força pública; a nacionalidade, não sacrificando interesses superiores àqueles que se pretende assegurar; a adequação, manter a acção reactiva dentro dos limites estritamente necessários para evitar o prejuízo; e a pessoalidade, pois só o próprio direito permite o desencadear da acção directa. 95
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Portanto, a acção directa terá, para ser legítima, de se apresentar como o único meio de evitar a inutilização prática do direito, não sendo possível de todo recorrer aos meios coercitivos normais em devido tempo. A sua razão de base está em evitar o prejuízo irreparável. A matéria vem regulada no Código Civil, artigo 336.º, podendo consistir na apropriação, destruição ou deterioração de uma coisa, na eliminação de uma resistência irregularmente oposta, ou noutro acto análogo. São casos concretos de licitude da acção directa, no que toca a direitos reais, os dos artigos 1277.º (esbulho da posse), o 1314.º (em defesa da propriedade) e 1315.º (a defesa dos direitos reais em geral). Também o estado de necessidade, do artigo 339.º do mesmo código pode actuar como expressão de repulsão pela força, se preenchidos os requisitos indicados acima para a acção directa. Finalmente, temos a legítima defesa, como manifestação por excelência do direito de resistência. O Código Civil, no artigo 337.º, diz que se considera justificado o acto destinado a afastar qualquer agressão actual e contrária à lei contra a pessoa ou património do agente ou de terceiro, desde que não seja possível fazê-lo pelos meios normais e o prejuízo causado pelo acto não seja manifestamente superior ao que pode resultar da agressão. Também o Código Penal vigente nos dá a definição de legítima defesa como o facto praticado, como meio necessário, para repelir a agressão actual e ilícita de quaisquer interesses juridicamente protegidos do agente ou de terceiro. 96
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É o artigo 32.º que a assim estabelece, esclarecendo o artigo seguinte que, se houver excesso dos meios empregados em legítima defesa, o facto será ilícito. Repare-se que a lei exige se trate de agressão actual. Isto significa, como referia o código anterior, que a agressão terá de estar iminente ou em começo de execução, estar iniciada, portanto. Tenhamos em conta que há tipos de agressão que se esgotam e liquidam com um só golpe, por vezes dissimulado e rápido, a ponto de não ter sido pressentido. Não se pode configurar a reacção se o acto agressivo já tiver terminado, se já estiver consumado. Neste caso estaremos fora da legítima defesa. Convém dizer algo sobre o chamado direito de legítima defesa colectiva de toda a Nação Portuguesa, que a nossa ordem jurídica prevê, secundando, aliás, a ressalva reconhecida e garantida no artigo 51.º da Carta das Nações Unidas e considerada no artigo 15.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Das disposições conjugados do artigo 9.º alínea a) com os artigos 273.º e 276.º da Constituição, infere-se que é tarefa fundamental do Estado, com a colaboração obrigatória de todos os cidadãos, garantir a independência nacional, a integridade do território, a liberdade e a segurança das populações contra a ameaça ou agressão externas. Contudo, para dirimir conflitos internacionais, e, obviamente, neles se englobando aqueles que envolvam o nosso pais -, propõe a via do diálogo e da arbitragem, buscando sempre uma solução pacífica que preserve a paz e assegure a justiça nas relações entre os povos. Princípio da responsabilidade das entidades públicas
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É princípio geral de direito que todo aquele que, com dolo ou culpa, violar ilicitamente o direito de outrém, ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios, fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação. Assim dispõe o artigo 483.º n.º 1 do Código Civil. Num Estado de direito como o nosso, não admira que esse princípio fosse consagrado na Constituição, responsabilizando as entidades públicas e o próprio Estado, solidariamente com os titulares dos seus órgãos, funcionários e agentes, por acções ou omissões praticadas no exercício de funções e por causa desse exercício, de que resulte violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrém, como se expressa o artigo: 22.º da Constituição. O critério jurídico a levar em conta no que respeita a este tipo de responsabilidade tem a ver com as disposições do Código Civil sobre responsabilidade por actos ilícitos, ou seja, dos artigos 483.º e 498.º. A responsabilidade pelo risco, dado o seu carácter objectivo, fica subordinada ao estabelecido no artigo 501.º daquele código, em que o Estado e demais pessoas colectivas públicas, quando haja danos causados pelos seus órgãos ou agentes, respondem civilmente por eles, nos mesmos termos dos comitentes em relação aos comissários, se se tratar de exercício de gestão privada. Um dos ilícitos englobados no artigo 22.º é o abuso do direito, definido no artigo 334.º do Código Civil. É um acto reprovado pela ordem jurídica e que se traduz no exercício ilegítimo de um direito pelo excesso manifesto dos limites da boa-fé, dos bons costumes ou do fim social ou económico desse direito, ou seja, para o qual e em razão do qual esse direito existe.
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É da tradição da nossa lei civil, - aliás reforçada a nível constitucional pelo artigo 8.º n.º 17.º e § 1.º da Constituição de 1933 -, que quem exercer o próprio direito não o faca com abuso manifesto, encarado este na sua concepção objectiva, ou seja, independentemente da consciência ou propósito de violar a boa-fé e o fim social e económico, bases desse direito. Basta que os desrespeite para o abuso ferir de ilegitimidade o seu. exercício. Portanto, tanto o abuso de direito como os demais actos ilícitos,. designadamente os de violação dos direitos de personalidade que constituem direitos, liberdades e garantias -, cabem no princípio geral do artigo 483.º do Código Civil, sendo solidariamente responsáveis o Estado e demais entidades públicas com os seus órgãos, funcionários e agentes. O artigo 22.º fala em “acções” e “omissões” praticadas no exercício das funções. Por isso nos parece dever ser feita a ressalva, quanto às omissões, de que a responsabilidade civil só terá lugar se, de harmonia com o artigo 486.º do Código Civil, o agente não praticar o acto que a lei lhe impunha que praticasse . Terá, assim, de haver a obrigação de agir, de praticar o acto. Ainda aqui parecenos também que deverá ter lugar o nexo de causalidade, ou seja, a indemnização ficará dependente da apreciação dos danos resultantes da omissão e que o lesado provavelmente não teria sofrido se ela não tivesse acontecido, como resulta do artigo 563.º do aludido Código. Outros casos existem na Constituição onde especificadamente se estabelece o dever de indemnizar por parte do Estado. São exemplos o artigo 27.º n.º 5 que, na linha do disposto no artigo 5.º n.º 5 da Convenção Europeia, confere ao legado por privação da liberdade contra o disposto na Constituição e
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na lei o direito correspondente indemnização; o artigo 29.º n.º 6, para os injustamente condenados criminalmente; os lesados a que se refere o artigo 52.º n.º 3; a indemnização para os afectados por expropriações por utilidade pública, do artigo 62.º n.º 2; os titulares de cargos políticos, pelos actos e omissões que pratiquem no exercício das suas funções, - artigo 120.º; e o caso mais abrangente, o do artigo 271.º, que nos seus n.ºs 1, 2 e 4, em que se estabelece que os funcionários e agentes do Estado e das demais entidades públicas incorrem em responsabilidade civil pelas acções e omissões que praticarem no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte violação dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos. Se o funcionário ou agente, duvidoso da legalidade de uma ordem ou instruções de superior hierárquico e em matéria de serviço, delas tiver previamente reclamado, ou exigido a sua transmissão ou confirmação por escrito, a responsabilidade impenderá sobre o dito superior. Claro que ao Estado cabe sempre o direito de regresso contra os órgãos, funcionários e agentes que praticarem os actos ou omissões violadores dos direitos dos cidadãos . Regras Orgânicas Matéria sensível como é a da limitação, privação e suspensão dos direitos liberdades e garantias, bem se compreende o cuidado de não deixar ao livre arbítrio do Governo a faculdade de sobre ela legislar. O caminho seguido foi o de cometer à Assembleia da República, órgão legislativo por excelência, a definição das regras concernentes àqueles direitos fundamentais. Como é sabido, a Parte III da Constituição trata da organização do poder político, consagrando o seu Título III as disposições respeitantes à Assembleia da
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República. Dentro deste, o Capítulo II define precisamente a competência própria daquele órgão de soberania. É nos artigos 164.º e 165.º que encontramos arrolados os casos da competência exclusiva da Assembleia da República, competência essa que se desdobra em duas grandes categorias: a competência absoluta e a competência relativa. Em matéria de direitos, liberdades e garantias a regra é a da alínea b) do n.º 1 do artigo 165.º, ou seja, reserva relativa da competência legislativa da Assembleia da República. Esta pode autorizar o Governo a legislar sobre a matéria, devendo a lei de autorização definir o objecto, o sentido, a extensão e a duração da autorização. A autorização não pode ser utilizada mais de uma vez, sem prejuízo da sua execução parcelada. Como é de norma, essas autorizações caducam com a demissão do Governo a que tiverem sido concedidas, com o termo da legislatura ou com a dissolução da Assembleia . A competência da Assembleia da República abrange também a matéria da declaração do estado de sítio e do estado de emergência, tanto na autorização e confirmação desses estados (artigo 161.º alínea l), como na respectiva fiscalização (artigo 162.º alínea b), como ainda, e sobretudo, no estabelecimento do seu regime (artigo 164.º alínea e). Igualmente a legislação sobre a aquisição, perda e reaquisição da cidadania portuguesa (artigo 164.º alínea f) está vinculada à reserva absoluta, matéria respeitante ao direito de cidadania do artigo 26.º n.º 1.
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A liberdade de associação e, com base nela, constituir partidos políticos com vista ao democrático concurso à formação da vontade popular para obtenção do Poder Político, do artigo 51.º, tem também a legislação respectiva reservada de forma absoluta à Assembleia da República (artigo 164.º alínea h). As bases do sistema de ensino, dos artigos 43.º e 74., estão igualmente reservadas de forma absoluta à Assembleia da República (artigo 164.º alínea i). Do mesmo modo, as restrições de direitos (artigo 18.º n.º 2), no que tange ao seu exercício por militares e agentes militarizados (artigos 270.º e 275.º n.º 4), é reserva absoluta da competência legislativa da dita Assembleia, como se vê do artigo 164.º alínea o). Garantias constitucionais dos direitos fundamentais A salvaguarda e respeito dos direitos fundamentais do homem , constituem um dos elementos da própria essência do moderno conceito de Estado. A nossa Constituição é disso paradigma ao proclamar logo no Preâmbulo que é decisão do povo português, através da Assembleia Constituinte, garantir os direitos fundamentais dos cidadãos. Como essa garantia se processa e desenvolve constitucionalmente é o que vamos tentar analisar em seguida.
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A garantia dos direitos fundamentais como tarefa fundamental do Estado É o artigo 9.º alínea b) que determina ser tarefa fundamental do Estado garantir os direitos e liberdades fundamentais e o respeito pelos princípios do Estado de direito democrático. Mais do que tarefa, a efectivarão dos direitos e liberdades fundamentais é a base do Estado, como expressamente se reconhece em termos programáticos no artigo 2.º da Constituição. Como primeiro elemento de garantia temos o princípio da constitucionalidade das leis e dos demais actos do Estado, nele se compreendendo as sedes do poder central, regional e local, como estabelece no artigo 3.º n.º 3. A sua validade dependerá sempre da observância rigorosa da superioridade normativa da Constituição. Este imperativo vem reforçado ainda pelo artigo 277.º n.º 1, o qual comina a inconstitucionalidade de toda a norma que infrinja o disposto na Constituição. A tarefa de garantir os direitos fundamentais expande-se pelos diversos órgãos de soberania e entidades públicas que neles se integram ou deles dependem, subordinando-os a todos ao mesmo fim, qual seja o de preservar a “legalidade democrática”, o respeito pelos preceitos constitucionais e seu espírito. Para tanto, um sistema de complementariedade e dependência foi estabelecido na Constituição de modo a que as leis, para serem válidas e eficazes, tenham de se conformar com a intervenção e fiquem sujeitas à fiscalização dos outros órgãos.
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Assim, essa vigilância e condicionamento mútuo funcionarão como garantia dos cidadãos contra a tentação do poder para desrespeitar os direitos fundamentais. Atentemos, em primeiro lugar, aos órgãos de soberania que, como dispõe o artigo 110.º são o Presidente da República, a Assembleia da República, o Governo e os Tribunais. a) Logo na competência para a prática de actos próprios do artigo 134.º, o Presidente da República pode obstar à inconstitucionalidade de normas, negando a promulgação e publicação delas, - o que implicará a sua inexistência jurídica (artigo 137.º) -, ou requerendo ao Tribunal Constitucional a apreciação preventiva da constitucionalidade ou a sua declaração; ou ainda exercer o direito de veto nos termos do artigo 136.º. b) Também a Assembleia da República, órgão fiscalizador da legalidade democrática, tem poderes de fiscalização sobre a constitucionalidade e, consequentemente, sobre o respeito pelos direitos fundamentais. Legislador por excelência, o órgão de soberania que é a Assembleia da República tem na sua competência, dos artigos 161.º a 165.º, instrumentos de preservação dos direitos fundamentais e, particularmente, a sua função fiscalizadora do artigo 162.º alíneas a) e b). Igualmente, nos termos do artigo 169.º, podem ser submetidos à apreciação daquele órgão colegial os decretos-lei, salvo os aprovados no exercício da competência legislativa exclusiva do Governo, para efeitos de alteração ou de recusa de ratificação, a requerimento de 10 deputados, nas primeiras 10 reuniões plenárias subsequentes à publicação. Mas a fiscalização preventiva pode partir ainda da Assembleia da República, nos termos do artigo 278.º n.º 4, se um quinto dos deputados em efectividade de funções, no prazo de 8 dias a contar do
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envio ao Presidente da República de decreto que deva ser promulgado como lei orgânica, requererem ao Tribunal Constitucional a apreciação da sua constitucionalidade, Isto sem prejuízo da competência para requerer ao mesmo Tribunal a fiscalização abstracta do artigo 281.º n.º 2 f) por um décimo dos deputados, ou, no caso da alínea b), pelo próprio presidente daquele órgão legislativo. c) Tratando-se das Regiões Autónomas, Podem também requerer ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade ou de ilegalidade, com força obrigatória geral, os Ministros da República, as assembleias legislativas regionais, os presidentes das assembleias legislativas regionais, os presidentes dos governos regionais ou um décimo dos deputados às respectivas assembleias legislativas, quando o pedido de declaração de inconstitucionalidade se fundarem violação dos direitos das regiões ou o pedido de declaração de ilegalidade se fundar em violação do estatuto da respectiva região ou de lei geral da República. Assim o estabelece o artigo 281.º n.º 2 alínea g), sendo, portanto, um meio eventualmente posto ao serviço da garantia do respeito dos direitos fundamentais naquelas Regiões. O Governo tem um largo espectro de meios para obstar à ofensa dos direitos fundamentais, como órgão de conduta da Política geral do país (artigo 182.º) logo no estabelecimento do seu programa deve adoptar as medidas que conduzam à plena satisfação dos direitos económicas, sociais e Culturais do Título III da Parte I. Depois, na sua competência Política . d) específica, do artigo 197.º, tem a possibilidade de, pela referenda dos actos do Presidente da República das alíneas h), j ), l), m) e p) do artigo 133., das alíneas b), d) e f) do artigo 134.º e das alíneas a), b), e c) do artigo 135.º, cuja falta implicará a inexistência jurídica do acto (artigo 140.º), assegurar aos Cidadãos
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que em caso algum os seus direitos fundamentais serão tocados.. Finalmente, há toda a sua competência legislativa do artigo 198.º, particularmente a que lhe é exclusiva e a que se refere o n.º 2 desta disposição constitucional. Não menos importante será a fiscalização preventiva da constitucionalidade através do artigo 278.º n.ºs 2 e 4 e artigo 281.º n. 2 alínea c). e) A Administração Pública visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, dentro da subordinação dos órgãos e agentes administrativos à Constituição e à lei, devendo actuar, no exercício das suas funções, observando os princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade. Assim o impõe o artigo 266.º. Mas a própria Constituição cuidou de estabelecer comandos de natureza adjectivo com vista a assegurar alguns direitos e garantias aos administrados. Fê-lo no artigo 268.º. f) Muito deste artigo é desenvolvimento do artigo 20.º, já nosso conhecido: acesso ao direito e à informação jurídica. De facto, logo no n.º 1se afiança a os cidadãos o direito de serem informados, sempre que o requeiram, sobre o andamento dos processos em que sejam directamente interessados, bem como o de conhecer as resoluções definitivas que sobre eles forem tomadas. E o número seguinte vai mais longe, garantindo até o acesso aos arquivos e registos que lhes digam respeito, sem prejuízo, como é curial, da salvaguarda de matérias que envolvam a intimidade das pessoas, a investigação criminal ou a segurança interna. Tudo isto se integra na observância do princípio da transparência administrativa, também ela apanágio de um Estado de direito. Mas não se queda por estas disposições a limpidez de métodos imposta à Administração Pública. Ela fica ainda obrigada a dar as respostas, a prestar as informações que lhe forem pedidas dentro dos
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prazos estabelecidos no Código do Procedimento Administrativo, matéria esta que vem regulada nos seus artigos 54º a 73º. Outra das garantias dos direitos fundamentais constantes do artigo 268.º é a que constitui o n.º 3. Segundo ela, os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados e carecem de fundamentação expressa quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos. Esse direito à fundamentação tem uma importância enorme, a ponto de o Tribunal Constitucional já ter decidido que ele, constitui uma associação natural com o direito ao recurso. Este, por sua vez, vem garantido nos n.ºs 4 e 5 do mesmo artigo e não existe discrepância, nem na doutrina nem na jurisprudência, de que esse direito constitui um direito fundamental de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias ( artgs. 124º a 126º do C.P.A. ). A função administrativa que o Estado exerce desdobra-se em dois sentidos: um, na manutenção da sua personalidade jurídica; o outro, na orientação e satisfação das necessidades colectivas, com vista à paz e ao bem-estar social geral. Daqui podem resultar conflitos de interesses nas vertentes: Administração Pública-Cidadãos e de cidadãos entre si em que, nesta última hipótese, a função administrativa é chamada a dirimir ou, pelo menos, intervir. Tanto num caso como no outro os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e às leis, devendo actuar sempre com respeito pelos já referidos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade, como impõe o artigo 266.º n.º 2. Toda esta actividade se desenrola e efectiva por actos administrativos que se traduzem em condutas voluntárias dos
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órgãos da administração, com vista à aplicação de normas jurídicas a casos concretos. Essas condutas voluntárias implicam acções ou abstenções a que a lei confere efeitos jurídicos e, como voluntárias que são, ficam dependentes do critério dos agentes. É aqui que entra uma prerrogativa própria da Administração: a discricionariedade. Esta só pode ser arguida contenciosamente se estiver ferida de desvio de poder, ou de erro nos pressupostos que levaram à decisão ou à prática do acto administrativo que se impugne, como tem sido entendimento constante do Supremo Tribunal Administrativo. Mas esse direito de impugnar contenciosamente os actos da Administração é que constitui o tal direito fundamental de natureza análoga dos n.ºs 4 e 5 do artigo 268.º. Por isso a Constituição garante sempre aos administrados o acesso à justiça administrativa para tutela dos seus direitos e interesses legalmente protegidos. Como é sabido, os órgãos da Administração Pública são integrados pelos agentes que desempenham as funções que lhes vêm determinadas na lei e têm a sua relação jurídica de emprego regida pelo Decreto-Lei n. 427/89, de 7 de Dezembro. Mas há uma categoria desses agentes que, por muito de perto nos dizer respeito, merece referência especial. Trata-se da polícia, a quem compete defender a legalidade democrática e garantir a segurança interna e os direitos dos cidadãos, como expressamente se diz no artigo 272.º n.º 1da Constituição. A Polícia de Segurança Pública é uma força uniformizada e armada, obedecendo à hierarquia de comando em todos os níveis da sua estrutura organizativa e à qual são legalmente cometidas as atribuições de desempenhar, em situações de normalidade
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institucional, as missões decorrentes da legislação sobre segurança interna e, em situações de excepção, as resultantes da legislação sobre defesa nacional e sobre o estado de excepção, como vimos. Na sua actuação para a manutenção da ordem e da paz pública a PSP adopta as medidas de polícia, as quais são apenas as previstas na lei e não podem ser utilizadas para além do estritamente necessário, respeitando sempre os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. Se, por acções ou omissões praticadas no exercício das suas funções esses direitos, ou interesses legalmente protegidos, forem violados, os agentes são civil, criminal e disciplinarmente responsáveis, não dependendo, a acção ou procedimento, em qualquer fase, de autorização hierárquica. Refira-se, contudo, que é excluída a responsabilidade do agente, tal como a de qualquer funcionário, se actuar no cumprimento de ordens ou instruções emanadas de legítimo superior hierárquico e em matéria de serviço, desde que, previamente, delas haja reclamado ou tiver exigido a sua transmissão ou confirmação por escrito . Mas o dever de obediência cessará, tornando o agente responsável, sempre que o cumprimento das ordens ou instruções implique a prática de crime. Esta doutrina resulta das disposições combinadas dos artigos 22.º, 271.º e 272.º da Constituição. A hierarquia de comando a todos os níveis da estrutura organizativa subsiste tanto em situações de normalidade institucional como em situações de excepção. Por outro lado, é a lei que determina estar a polícia exclusivamente ao serviço do interesse
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público, devendo agir sempre, no exercício das suas funções, de forma isenta, o que implica não poder servir-se da sua qualidade ou função para qualquer intervenção de carácter político ou partidário. A ela cabe manter a ordem e tranquilidade, com à vista à segurança das pessoas, podendo recorrer às medidas policiais restritivas, “ as quais só serão legítimas se necessárias, idóneas, adequadas, eficazes, proporcionadas, tempestivas e de duração limitada à neutralizarão e prevenção do perigo”, como ensina Vieira de Andrade. Tal intervenção decorre e destina-se, a um tempo, à prestação de protecção às pessoas, a que o Estado está constitucionalmente obrigado, como se vê das alíneas b) e d) do artigo 9.º, bem como a cooperar na promoção do bem-estar e qualidade de vida do povo. E não resta dúvida de que estas só se atingem num ambiente de paz pública . Como força de segurança que é, a Polícia de Segurança Pública tem um papel primordial na segurança interna, hoje regulamentada na Lei n.º 20/87, de 12 de Julho. Nesta se define segurança interna como a actividade desenvolvida pelo Estado para garantir a ordem, a segurança e a tranquilidade públicas, proteger pessoas e bens, prevenir a criminalidade e contribuir para assegurar o normal funcionamento das instituições, regular o exercício dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos e o respeito pela legalidade democrática. Essa actividade pauta-se pela observância das regras gerais de Polícia e exerce se com as chamadas medidas de polícia, que o artigo 16.ºda referida lei tipifica.
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g ) Especialmente vinculados à defesa dos direitos, liberdades e garantias estão os tribunais É o artigo 204.º que lhes proíbe a aplicação de normas que infrinjam o disposto na Constituição, nos feitos submetidos a julgamento. Todas as categorias de tribunais estão sujeitas ao cumprimento rigoroso daquela norma sobre a apreciação da constitucionalidade. Um deles, porém, tem a competência específica de administrar a justiça em matérias de natureza jurídico-constitucional, como se diz no artigo 223.º. A parte que mais nos interessa reter é a competência para julgar a fiscalização preventiva do artigo 278.º e a fiscalização abstracta da constitucionalidade ou legalidade do artigo 281.º; e bem assim a fiscalização concreta da constitucionalidade e da ilegalidade das decisões dos tribunais a que se refere o artigo 280.º. Nos dois primeiros casos, a iniciativa da fiscalização pertencerá a qualquer das entidades indicados naqueles artigos. Os particulares não podem recorrer directamente ao Tribunal Constitucional pedindo que seja declarada a inconstitucionalidade ou ilegalidade de um diploma ou de uma norma que, em seu entender, estariam inquinados de um daqueles vícios. Mas já assim não sucede se se tratar de decisões de tribunais, pois aí pode-se recorrer nos termos do artigo 280.º da Constituição. Se for dado provimento ao recurso, ainda que só parcialmente, os autos baixam ao tribunal de onde provieram, a fim de que este, consoante for o caso, reforme a decisão ou a mande reformar em conformidade com o julgamento sobre a questão da inconstitucionalidade ou da ilegalidade.
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Da competência do Tribunal Constitucional é também a declaração da chamada inconstitucionalidade por omissão, do artigo 283.º. Consiste ela na não publicação das medidas legislativas necessárias à exequibilidade das normas constitucionais. É claro que este tipo de inconstitucionalidade não se verificará em relação aos direitos, liberdades e garantias, dado que, nos termos do artigo 18.º n.º 1, são de aplicação directa. Mais natural será, portanto, a sua declaração quanto aos direitos fundamentais do Título III, essencialmente os direitos sociais. Estes implicam adopção de medidas legislativas que os regulamentem e criem as condições práticas indispensáveis à sua efectivação. Um serviço nacional de saúde, a criação de uma rede de estabelecimentos de ensino, ou um programa de habitação inserido em planos de ordenamento do território não se concretizam por decreto. São necessários meios, tempo e trabalho para os executar. Por isso não é de estranhar que este tipo de direitos caiam em situações de estagnação ou, pelo menos, de dilação em termos de poderem ser havidos como de autênticas omissões do não cumprimento por parte do Estado daqueles deveres e direitos fundamentais. Para avaliar dessa inconstitucionalidade lá está precisamente o Tribunal Constitucional que, a requerimento do Presidente da República ou do Provedor de Justiça, se pronunciará sobre a omissão. Se verificar a existência de inconstitucionalidade, disso dará conhecimento ao órgão legislativo a fim de este desencadear as medidas legislativas necessárias para tornar exequíveis as normas constitucionais .
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h) O Ministério Público é também constitucionalmente chamado a desempenhar um papel importante na garantia dos direitos fundamentais. O artigo 219.º n.º 1 é expresso em lhe cometer o papel de defensor da legalidade democrática, - o que implica o respeito por aqueles direitos, e bem assim defender os interesses que a lei determinar. Nestes estão os que aos cidadãos são assegurados pelas normas consagradas na Constituição como direitos fundamentais. Junto dos tribunais a sua acção é importante e é seu dever respeitar e fazer respeitar tais direitos. Nesse sentido vai mesmo o n.º 5 do artigo 280.º, ao impor-lhe a obrigatoriedade de recorrer para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma anteriormente julgada inconstitucional ou ilegal pelo próprio Tribunal Constitucional. Além disso, a alínea e) do n.º 2 do artigo 281.º permite ao Procurador-Geral da República requerer ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade ou de ilegalidade, com força obrigatória geral. Se recordarmos que o artigo 19.º n.º 1proíbe que os órgãos de soberania, conjunta ou separadamente, suspendam o exercício dos direitos fundamentais, fora do caso excepcional do estado de sítio e do estado de emergência, em que é estabelecido um esquema de condições rigoroso, podemos concluir, face à arquitectura das garantias atrás analisadas, que a nossa Constituição esboçou uma rede de interpenetração de competências e funções dos órgãos do Estado, com vista a preservar, salvaguardar e defender os direitos fundamentais do desrespeito, violação ou viciação que o poder possa eventualmente ser tentado a experimentar. 113
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i) Se um cidadão estiver perante uma lei que viole um seu direito fundamental constitucionalmente garantido, tem sempre o expediente prático de violar essa lei, levando a Administração, por exemplo, a praticar um acto susceptível de recurso contencioso e, neste, o particular invocará, então, a almejada inconstitucionalidade. Se esta não for atendida, fará o processo subirem recurso até ao topo da instância. Se, ainda assim, o acórdão lhe for desfavorável, não deixará, por isso, de poder apelar para o Tribunal Constitucional, de harmonia com o citado artigo 280.º da Constituição e artigo 70.º da respectiva lei. Garantias decorrentes de normas de direito internacional vigente na ordem jurídica interna Há que referir a possibilidade de qualquer pessoa singular, organização não governamental, ou grupo de particulares, que se considerem vítimas de violação dos direitos que a Convenção Europeia dos Direitos do Homem consagra, poderem apresentar queixa à Comissão Europeia do Direitos do Homem, mediante petição dirigida ao secretário-geral do Conselho da Europa, nos termos dos artigos 25.º e seguintes da Declaração. Como boa parte desses direitos encontram sequência nos direitos fundamentais constitucionalmente assegurados, o recurso à Comissão e ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem é efectivamente mais uma garantia ao serviço da eficácia daqueles direitos,
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DIREITOS FUNDAMENTAIS EM ESPECIAL O objecto deste capítulo é o estudo dos direitos fundamentais consagrados e referendados expressamente na Constituição. Vimos já que o nosso sistema constitucional não se confina àquele tipo formal de direitos, pois admite que como tais sejam considerados “outros constantes das leis e das regras aplicáveis de direito internacional”, desde que conformes com o seu conceito material. É a chamada “cláusula aberta”. Direitos, Liberdades e Garantias Pessoais e do Direito à vida Trata-se do direito primordial. Sem a preservação da vida, todos os outros direitos são inúteis. É a vida que dá e mantém o ser sujeito e destinatário de direitos. Vamos encontrar a consagração do direito à vida em todos os grandes instrumentos universais dos direitos do homem. Tanto no artigo 3.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, como no artigo 6.º do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, ou ainda no artigo 2.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, completado pelo artigo 1.º do respectivo Protocolo n.º 6. A regra cristã que constitu1o 5.º mandamento do Decálogo, não Matarás -, mantém-se como o ponto de apoio de toda a estrutura jurídica ocidental: o respeito pela vida humana.
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Também a legislação penal vigente, nos artigos 131.º e seguintes, pune quem matar outrém. Esse crime é agravado se se tratar de homicídio de membros de uma comunidade ou grupo, com intenção de o destruir no todo ou em parte. Assim dispõe o artigo 239.º n.º 1alínea a) do Código Penal; se se tratar da vida do Presidente da República - artigo 327.º. O analisado artigo 24.º desdobra-se em dois números. No primeiro expressa-se dizendo que “A vida humana é inviolável”. No segundo afirma que “Em caso algum haverá pena de morte”. Ambos, porém ficam subordinados à epígrafe “Direito à vida”. O direito à vida é, nos nossos dias, um dado universal. O n.º 1, contudo, utiliza a fórmula “a vida humana é inviolável”. Se atentarmos em que, sempre e por toda a parte, a prática de crimes de homicídio tem violado a vida de homens, teremos de concluir que o preceito deve ser entendido como proclamação de um princípio e não como a constatarão de um facto. Daí que a preconizada inviolabilidade se dirija a todos os homens entre si e ao próprio Estado em relação a eles, como reforçadamente se extraído n.º 2, ao proibir a pena de morte. Direito à integridade pessoal Aqui a Constituição seguiu a sistematização adoptada por alguns instrumentos de direito internacional que, sobre a matéria, estão situados a montante: ligação do imperativo da inviolabilidade da integridade moral e física das pessoas, com a proibição da tortura e tratos ou penas cruéis, degradantes ou desumanos.
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Na Declaração Universal dos Direitos do Homem temos a integridade pessoal, com a amplitude explanada no artigo 25.º da Constituição, distribuída pelos artigos 3.º, 4.º e 5.º; no Pacto Internacional sobre Direitos, Civis e Políticos, no artigo 7.º; e na Convenção Europeia dos Direitos do Homem, no artigo 3.º. Especificamente sobre o n.º 2 do artigo 25.º da Constituição cabe estudar a Convenção Contra a Tortura e outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, publicado no Diário da República n.º 118, I Série, de 21de Maio de 1988. Diploma de âmbito universal, encontra-se hoje regionalizado também para a Europa pela Convenção Europeia para a Prevenção da Tortura e Penas ou Tratamentos Desumanos e Degradantes . Naquele instrumento universal se define tortura como “qualquer acto por meio do qual uma dor ou sofrimento agudos, físicos ou mentais, são intencionalmente causados a uma pessoa, com o fim de, nomeadamente, obter dela, ou de uma terceira pessoa, informações ou confissões, a punir por um acto que ela ou uma terceira pessoa cometeu, ou se suspeita que tenha cometido, intimidar ou pressionar essa ou uma terceira pessoa, ou por qualquer outro motivo baseado numa forma de discriminação, desde que essa dor ou esses sofrimentos sejam infligidos por um agente público ou qualquer outra pessoa agindo a título oficial, a sua instigação ou com seu consentimento expresso ou tácito”.
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Naquele conceito de tortura não cabe a dor ou sofrimentos resultantes unicamente de sanções legítimas, inerentes a essas sanções, ou por elas ocasionadas. O artigo 2.º da Convenção tem particular importância e merece cuidada análise. Desdobra-se ele em três ordens de situações: a) Obrigatoriedade de cada Estado adoptar medidas legislativas, administrativas e judiciais com vista a obstar a que actos de tortura sejam cometidos no seu território. A este propósito, o nosso sistema jurídico consagra precisamente o preceito constitucional em análise, o n.º 2 do artigo 25.º - e no actual Código de Processo Penal que no seu artigo 126.º n.º 1e 2, declara nulas, não podendo ser utilizadas, as provas obtidas mediante tortura, coacção ou, em geral, a ofensa da integridade física ou moral das pessoas, especificando-se serem ofensivas da integridade física ou moral as provas obtidas, mesmo que com o consentimento delas, mediante perturbação da liberdade de vontade ou de decisão através de maus tratos, ofensas corporais, hipnose ou outros meios enganosos ou cruéis, ou ainda com perturbação da memória, capacidade de avaliação, utilização da força, ameaça de aplicação de medidas ou usufruto de vantagens legalmente inadmissíveis. Todas estas medidas, aliás, comportam-se na aplicação prática, por via legislativa, do preceito constitucional do artigo 32.º n.º 6, que expressamente declara nulas todas as provas obtidas mediante tortura, coacção, ofensas da integridade física ou moral da pessoa,
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abusiva intromissão na vida privada, no domicilio, na correspondência ou nas telecomunicações. E, como é sabido, tratando-se de um direito, liberdade e garantia, goza da prerrogativa da aplicação directa, por força do artigo I8.º n.º 1. b) Nenhuma situação de excepção, quer se trate de estado de guerra, estado de sítio ou estado de emergência, ou de grave instabilidade política interna, justificará a tortura. Os artigos 243º e 244º do Código Penal catalogam tais procedimentos nos crimes contra a humanidade. c) Nenhuma ordem de superior hierárquico ou de autoridade pública poderá ser invocada para justificar a tortura. É um caso específico que se integra no preceituado no artigo 271.º n.º 3 da Constituição, conjugado com o artigo 36.º n.º 2 do Código Penal. A tortura e a crueldade são agravos e ofensas à dignidade do homem particularmente reprováveis pela consciência moral e colectiva. A sua censurabilidade e perversidade levou o legislador criminal a considerá-las circunstâncias agravantes e qualificativas no crime de homicídio, - artigo 132.º n.º 2, alínea c) -, e pode dizer-se que, na ética policial, o agente da segurança pública torturador enquadra a expressão da cobardia e da indignidade para o são exercício da função em que fo1investido. Por isso se compreende que na própria Convenção contra a tortura se determine, no artigo 10.º, que os Estados deverão providenciar para que a instrução e informação relativas à proibição da tortura devam constituir parte
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integrante dos programas de formação do pessoal civil e militar encarregado da aplicação da lei, entendendo-se dentro desta categoria, obviamente, os agentes da polícia. Também a legislação deverá facilitar as queixas por torturas ou maus tratos, bem como o estabelecimento de reparações e indemnizações às vítimas em termos adequados, bem como facilitar os meios para a sua completa reabilitação pelos traumas físicos e psíquicos que eventualmente hajam sofrido. A Convenção impõe igualmente aos Estados o compromisso de proibirem em todo o território sob a sua jurisdição quaisquer actos que constituam penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, embora não sejam havidos como actos de tortura, tal como esta vem definida acima, sempre que esses actos sejam cometidos por agentes públicos, ou qualquer pessoa agindo a título oficial. Outros direitos pessoais O artigo 26.º da Constituição a todos reconhece os direitos à identidade pessoal, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra e à reserva da intimidade da vida privada e familiar. Cada um destes direitos tem a sua regulamentação na lei civil. Toda a pessoa começa por ter o direito a usar o seu nome, completo ou abreviado, e será o que constar do assento de nascimento, só podendo ser
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alterado mediante autorização especial do ministro da Justiça. Cada um pode opor-se a que outros utilizem ilicitamente a sua identificação. A lei prevê processo especial tendente a impedir o uso prejudicial de nome idêntico, mediante acção que pode ser exercida não só pelo respectivo titular, como também, depois da morte dele, pelo cônjuge sobrevivo ou qualquer descendente, ascendente, irmão, sobrinho ou herdeiro do falecido. É que, embora a personalidade termine com a morte, os direitos de personalidade continuam a gozar de protecção depois da morte do respectivo titular. Neste aspecto, a protecção do bom nome e reputação como que se prolonga para além da morte, acompanhando a pessoa como ser social que é de natureza abstracta. Cf. art.ºs. 71.º e segs. do Código Civil. Também o direito à imagem, segundo o qual o retracto de uma pessoa não pode ser exposto, reproduzido ou lançado no comércio sem o consentimento dela, salvo se a sua notoriedade, o cargo que desempenhe, representatividade social ou razões de polícia ou de justiça o justifiquem, salvaguardando-se sempre a honra, a reputação, o decoro ou o prejuízo para a pessoa retratada. Estas prerrogativas constitucionais podem encontrar a sua fonte nos artigos 2.º, 6.º e 8.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, merecendo também referência a reserva da intimidade da vida privada e familiar, regulada no artigo 80.º do Código Civil e contemplada no artigo 12.º da mesma Declaração, artigo 8.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e artigos 16.º e 17.º do Pacto Internacional dos Direitos Civis Políticos. A Constituição garante ainda que não será permitida a utilização abusiva, ou contrária à dignidade humana, de informações relativas às pessoas e famílias e 121
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que a privação da cidadania e as restrições à capacidade civil só podem efectuar-se nos casos previstos na lei, não podendo ter como fundamento motivos políticos. Sobre esta matéria, além do já referido quanto ao Código Civil, deverá ser compulsado o estabelecido nos artigos 180.º e seguintes do Código Penal e, abarcando os crimes contra a reserva da vida privada, os artigos 190.º a 194.º do mesmo Código. Também é de utilidade o estabelecido nos artigos 174.º e seguintes do Código do Processo Penal e a Lei da Nacionalidade. Direito à liberdade e à segurança
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Trata-se da liberdade pessoal, de não ser preso senão em consequência de sentença judicial condenatória pela prática de acto punido por lei com pena de prisão ou de aplicação judicial de medida de segurança. O n.º 3 do artigo 27.º indica as excepções a este princípio: 1. Prisão preventiva em flagrante delito por fortes indícios de prática de crime doloso a que corresponda pena de prisão cujo limite máximo seja superior a três anos; 2. Prisão ou detenção de pessoa que tenha penetrado ou permaneça irregularmente no território nacional, ou contra a qual esteja em curso processo de extradição ou de expulsão; 123
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3. Prisão disciplinar imposta a militares, com garantia de recurso para o tribunal competente; 4. Sujeição de um menor a medidas de protecção, assistência ou educação em estabelecimento adequado, decretadas pelo tribunal judicial competente; e 5. Detenção por decisão judicial em virtude de desobediência a decisão tomada por um tribunal ou para assegurar a comparência perante a autoridade judicial competente. Relativamente a esta matéria temos no nosso ordenamento jurídico, principalmente nos artigos 40.º e seguintes e 91.º e seguintes do Código Penal; os artigos 500.º e seguintes do Código do Processo Penal; o Decreto-Lei n.º 401/82 de 23 de Setembro, sobre o regime especial de detenção de jovens; o Decreto-Lei n.º 314/78, de 27 de Outubro - Organização Tutelar de Menores e a Lei n.º 5/91, de 18 de Janeiro, que autoriza o Governo a legislar sobre a criação, competência e funcionamento de instituições oficiais não judiciárias incumbidas de tomar medidas relativamente a menores, as formas de execução. O artigo 27.º n.º 4 impõe ainda que toda a Pessoa Privada da liberdade deve ser informada imediatamente e de forma compreensível das razões da sua prisão ou detenção e dos seus direitos. Além disso, como já vimos noutro passo destas lições, a ilegal privação da liberdade constitui o Estado no dever de indemnizar o lesado nos termos da lei. A este propósito, é nos artigos 225.º e 226.º do Código do Processo Penal que se encontra regulamentada a matéria da privação da liberdade ilegal ou injustificada, na prossecução do princípio geral do artigo 22.º e nas disposições 124
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específicas do artigo 27.º n.º 5 e artigo 29.º n.º 6 da Constituição. Assim, quem tiver sofrido detenção ou prisão preventiva manifestamente ilegal pode requerer, perante o tribunal competente, indemnização pelos danos sofridos com a privação da liberdade o mesmo se aplica a quem tiver sofrido prisão preventiva que, não sendo ilegal, venha a revelar-se injustificada por erro grosseiro na apreciação dos pressupostos de facto de que dependia, se a privação da liberdade lhe tiver causado prejuízos anómalos ou de particular gravidade. Ressalva-se o caso de o preso ter concorrido, por dolo ou negligência, para aquele erro. O pedido de indemnização está, porém, sujeito a prazo de caducidade; isto é, terá de ser proposto dentro de um ano sobre o momento em que o detido ou preso foi libertado, ou decidido definitivamente o processo penal respectivo. A lei determina ainda que, em caso de morte do ilegal ou injustificadamente preso ou detido, e desde que este não haja renunciado à sua parte, pode a indemnização ser requerido pelo cônjuge não separado de pessoas e bens, pelos descendentes e pelos ascendentes . A prisão preventiva é ainda objecto de atenção especial na nossa lei fundamental, designadamente no artigo 28.º, que determina o carácter excepcional daquela medida ao ordenar que seja substituída, sempre que possível, por caução ou outra medida mais favorável prevista na lei. Além disso, a decisão judicial que ordene ou mantenha uma medida de privação da liberdade deve ser logo comunicado a familiar ou pessoa da confiança do detido que esta indique. Acresce que a Constituição é rigorosa até ao ponto de estabelecer o prazo máximo de 48 horas para submeter à decisão judicial a prisão sem culpa formada o juiz decidirá, então, da sua validação ou manutenção, depois de conhecer as
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causas da detenção e interrogar o detido sobre o acto que lhe deu origem, proporcionando-lhe assim a oportunidade de defesa. A detenção vem especialmente regulamentada no Código do Processo Penal, dos artigos 254.º a 261.º, convindo desde já reter que a sua finalidade é a de, no prazo máximo de 48 horas, apresentar o detido a julgamento sumário, se for caso disso, ou para o levar perante a autoridade judicial em acto processual, não podendo neste caso a detenção exceder as 24 horas. Tratando-se de flagrante delito, ou seja, se se está ainda a cometer um crime, ou se se acabou de o cometer e o agente for, logo após, perseguido por qualquer pessoa ou encontrado com objectos ou sinais que mostrem claramente que acabou de a cometer ou de nele participar, e o crime for punível com pena de prisão, qualquer autoridade judiciária ou entidade policial procede à detenção; se, porém, nenhuma daquelas estiver presente, nem puder ser chamada em tempo útil, então qualquer pessoa pode proceder à detenção e entregar imediatamente o detido às autoridades competentes. Se o crime depender de queixa para procedimento judicial, a detenção só se manterá quando, em acto a ela seguido, o titular do direito o exerça. Neste caso, a autoridade judiciária ou a entidade policial levantam auto em que a queixa fique logo registada. No caso de crime cujo procedimento dependa de acusação particular, não haverá lugar à detenção em flagrante delito, mas apenas à identificação do infractor. Há ainda o caso do crime permanente, em que o estado de flagrante delito só persiste enquanto se mantiverem sinais que mostrem claramente que o crime está a ser cometido com a participação do seu autor.
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Fora do flagrante delito, a detenção só pode ser efectuada por mandado do juiz ou, nos casos em que for admissível prisão preventiva, do Ministério Público. A entidade policial que proceder a uma detenção terá de a comunicar imediatamente ao juiz que expediu o mandado de detenção, se esta se destinar a conduzir o detido perante o juiz em acto processual. Fora deste caso, a comunicação será feita ao Ministério Público. Vê-se, pois, o rigor e cautelas legais, no que respeita à detenção, com o fim manifesto de evitar excessos, erros e desvios às disposições de lei em matéria tão sensível como é a da liberdade dos cidadãos. Quanto à aplicação da lei criminal também a Constituição adopta medidas de rigor para defesa do direito à liberdade das pessoas, aliás, na senda dos princípios gerais próprios do direito penal, tradicionalmente observados nas ordens jurídicas de inspiração herdada do velho direito romano. Determina o artigo 29.º que ninguém pode ser sentenciado criminalmente senão em virtude de lei anterior que declare punível a acção ou a omissão. É o princípio basilar de direito criminal conhecido doutrinariamente por princípio da legalidade, a que se refere o artigo 1.º do Código Penal, proibindo a analogia para qualificar um facto como crime, definir um estado de perigosidade, ou determinar a pena ou medida de segurança. Também o princípio de ninguém poder ser julgado mais do que uma vez pela prática do mesmo crime, vem salvaguardado no n.º 1, do artigo 29.º. Prevendo a possibilidade da condenação injusta -, pois errar é próprio do homem, o n.º 6 concede ao injustiçado a faculdade de requerer revisão de 127
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sentença transitada em julgado. A matéria vem regulamentada nos artigos 449.º e seguintes do Código do Processo Penal. E, dentro do espírito do artigo 22.º da Constituição, o mesmo n.º 6 reitera o direito à indemnização pelos danos sofridos, se da revisão resultar ganho de causa. Consagrada constitucionalmente está também a personalidade da pena, entendida esta no sentido de ser insusceptível de transmissão a terceiro. Será o condenado a cumpri-la e pena alguma poderá envolver como efeito necessário a perda de direitos civis, profissionais ou políticos. É esta a doutrina dos n.ºs 3 e 4 do artigo 30.º, determinando o número seguinte que os condenados a quem sejam aplicadas medidas de segurança privativas da liberdade, mantêm sempre a titularidade dos direitos fundamentais, ressalvando-se, claro está, e pela própria natureza das coisas, as limitações inerentes ao sentido da condenação e às exigências da execução material da sentença. Tanto as penas como as medidas de segurança têm sempre de comportar duração limitada, isto é, não pode haver privação da liberdade com carácter perpétuo ou indefinido. Mas as medidas de segurança que, por definição, existem para protecção das pessoas, poderão ser sucessivamente prorrogadas, mediante decisão judicial, se a perigosidade do agente se basear em grave anomalia psíquica, com impossibilidade de terapêutica em meio aberto. Finalmente, temos as garantias do processo criminal, que preenchem o artigo 32.º, algumas das quais foram : - Todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença que o condenar, ou seja, quando dela não seja admissível interpor recurso ordinário. 128
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- O arguido deve ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa. - O arguido tem o direito de escolher defensor e ser por ele assistido em todos os actos processuais. - A instrução é da competência de um juiz, o qual não poderá delegar a competência para actos instrutórios noutras entidades se se tratar de direitos fundamentais, ou que com eles se prendam. - O processo criminal tem estrutura acusatória. A audiência de julgamento e os actos instrutórios que a Lei determinar estão subordinados ao princípio do contraditório. Dois outros pontos constituem garantia processual criminal: nos processos derivados de contra-ordenações são assegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa o Decreto-Lei n.º 356/89, que altera o Decreto-Lei n.º 433/82, veio legislar sobre o ilícito de mera ordenação social e o respectivo processo; o outro ponto, já por nós, em parte, focado, é o de serem nulas, não só todas as provas obtidas mediante tortura, coacção, ofensa da integridade física e moral da pessoa arguida no processo, mas também por intromissão abusiva na sua vida privada, no seu domicílio, ou na sua correspondência ou suas telecomunicações. Os artigos 125.º e 126.º do Código do Processo Penal vão no mesmo sentido. Mas no direito à liberdade e à segurança se insere ainda a inviolabilidade do domicilio e da correspondência, bem como a utilização da informática.
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A nossa Constituição alinha-o entre os direitos, liberdades e garantias, como determina o artigo 34.º. A fundamentação desse direito tem sido buscada em diversos princípios, conforme a tradição ou a postura filosófica que lhe está na base. Uns falam em tutelar a “liberdade”, outros a “segurança”, outros ainda “a preservação da dignidade e do respeito pelo homem, a quem assiste o direito primário de ver a sua privacidade defendida da devassa de terceiro”. O Código Penal vigente, no que respeita à inviolabilidade do domicílio, tipifica-o e pune-o nos termos do artigo 190.º. Quanto à violação da correspondência e telecomunicações está distribuída pelos artigos 194.º e 384.º. Há que ter em conta, no que toca à inviolabilidade do domicílio, e à inviolabilidade da correspondência e das telecomunicações, o determinado nos artigos 187.º e seguintes do Código de Processo Penal. Para a definição dos conceitos de domicilio deve-se abordar os artigos 82.º a 88.º do Código Civil e quanto à correspondência, os artigos 75.º e seguintes deste mesmo Código. Para defesa dos direitos à liberdade e segurança dentro do contexto do moderno desenvolvimento tecnológico existe na Constituição o artigo 35.º, subordinado à epígrafe “Utilização da informática”. Nele se determina que todo o cidadão tem direito a tomar conhecimento dos dados constantes de ficheiros ou de registos informáticos a seu respeito, bem como dos fins a que se destinam. Pode mesmo exigir a sua rectificação e actualizarão, ressalvando embora as determinações legais sobre segredos de Estado e do segredo de justiça.
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A informática não poderá ser usada para tratamento de dados referentes a convicções religiosas vida privada, filiação partidária ou sindical, salvo quando se trate de processamento estatístico de dados não individualmente identificáveis. É proibida a atribuição de um número nacional único aos cidadãos. A Lei n.º 67/98, de 26 de Outubro, regula a protecção de dados pessoais. Direitos de expressão e informação
Cabem aqui a liberdade de expressão e informação, a liberdade de imprensa e dos demais meios de comunicação social. A liberdade de informação e expressão vem afirmada no artigo 37.º, constituindo o n.º 1 a estrutura do respectivo direito. Nele se diz que “ todos têm direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra ,pela imagem ou por qualquer outro meio”. É a liberdade de expressão. 131
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O mesmo preceito continua, garantindo a todos “o direito de informar, de se informar e de ser informado, sem impedimentos nem discriminações”. É a liberdade de informação. Em ambos os casos é proibido qualquer tipo de censura. Estas liberdades não excluem, contudo, a correspondente responsabilidade criminal, segundo os princípios gerais daquele ramo do direito, apreciada somente e apenas pelos tribunais. No caso de abuso desses direitos, ao lesado assiste o direito à indemnização pelos danos, eventualmente sofridos. A independência dos órgãos de comunicação social e a liberdade do desempenho das funções dos seus agentes são asseguradas no n.º 4 do artigo 38.º. Essa independência exercer-se-à, não só perante o poder político como também face ao poder económico. Os agentes da comunicação social desempenham um papel primordial na contextura das sociedades democráticas. Fala-se até na sua representação da “consciência cívica da comunidade” em que se integram.
Além da liberdade de imprensa, a liberdade da rádio e da televisão tem também uma função de formação e esclarecimento dos cidadãos em geral, na medida em que transmite critérios, posições e imagens dos factos e das realidades do mundo inteiro, permitindo assim o surgimento de uma opinião pública esclarecido e livre. A própria Constituição, contudo, determina que as estações emissoras de radiodifusão e de televisão só podem funcionar mediante licença a
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conferir por concurso público. Esta limitação visa ordenar, no aspecto técnico, uma concorrência que poderia comprometer o normal funcionamento daquelas estações emissoras. Os partidos políticos, as organizações sindicais e as demais organizações profissionais e representativas de actividades económicas têm direito a tempos de antena, de harmonia com a lei. Este direito, bem como o direito à informação, a liberdade de imprensa, a independência perante o poder político e o poder económico e a possibilidade de confronto e expressão das diversas correntes de opinião, são assegurados pela Alta Autoridade para a Comunicação Social. A sua regulamentação consta da Lei n.º 43/98, de 6 de Agosto, como atrás se indicou.
Direito à liberdade de consciência, religião
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A liberdade de consciência, religião, - englobando aqu1o culto criação e ensino reflecte-se em dois sectores: o da moral religiosa e o do aspecto institucional. Este último é resolvido constitucionalmente pelo n.º 4 do artigo 41.º que dispõe estarem as igrejas e as outras comunidades religiosas separadas do Estado e serem livres na sua organização e no exercício das suas funções e culto. Quanto ao aspecto da moral religiosa, a regra é a da liberdade individual de consciência, de religião e de culto, ninguém podendo ser perseguido, privado de direitos ou isento de obrigações ou de deveres cívicos por causa das suas convicções religiosas. E nem acerca delas podem os cidadãos ser perguntados por qualquer autoridade, salvo para recolha de dados estatísticos e, ainda assim, em moldes não individualmente identificáveis. 134
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Por outro lado, a Constituição assegura a liberdade do ensino religioso no âmbito de qualquer confissão, podendo utilizar os meios de comunicação social apropriados para as suas actividades. A liberdade religiosa encontra ainda protecção no Código Penal, nos artigos 251.º e 252.º - ultrage por motivo de crença ou função religiosa -, sendo de realçar que essa protecção abrange qualquer confissão religiosa. É de referir ainda legislação avulsa, designadamente o Decreto-Lei n.º 323/83, de 5 de Julho, sobre o ensino de religião nas escolas públicas; as Leis n.ºs 6/85, de 4 de Maio e 101/88, de 25 de Agosto que tratam da posição dos objectores de consciência perante o serviço militar obrigatório, já que a estes é garantido constitucionalmente esse direito. Direito de reunião, manifestação e associação Tanto o artigo 20.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, como o artigo 11.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, englobam no mesmo comando o direito de reunião e de associação desde que sejam pacíficas. Em relação à associação, o primeiro daqueles diplomas fá-lo depender da opção voluntária, determinando que ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação. Já o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, tal como a Constituição Portuguesa, enquadram em disposições diferentes cada um daqueles direitos. No Pacto, o direito de reunião vem regulado na artigo 21.º e o direito de se associar livremente integra o artigo 22.º.
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O direito de reunião está constitucionalmente condicionado pelo n.º 1do artigo 45.º a que se exerça “ pacificamente e sem armas”, mesmo em lugares abertos ao público. O decreto-lei n.º 406/74, de 29 de Agosto, garante e regulamenta o direito de reunião, permitindo a todos o livre exercício do direito de se reunirem pacificamente em lugares públicos, abertos ao público e particulares, independentemente de autorização, desde que para fins não contrários à lei, à moral, aos direitos das pessoas e à ordem e tranquilidade públicas. Só poderão ser interditas as reuniões que, pelo seu objecto, ofendam a honra e a consideração devidas aos órgãos de soberania e às Forças Armadas. A liberdade não dispensa a observância de requisitos formais, como o dos promotores das reuniões, comícios, manifestações ou desfiles em lugares públicos, ou abertos ao público, deverem avisar por escrito, com a antecedência mínima de dois dias úteis, o Governador Civil do distrito ou o Presidente da Câmara Municipal, conforme o local da aglomeração se situar ou não na capital do distrito. O aviso deverá ser assinado por três dos promotores, indicando a hora, o motivo da reunião e o local. Se houver desfile será especificado detalhadamente o respectivo trajecto, com vista a que as autoridades possam impedir a realização de contra-manifestações nos mesmos locais e às mesmas horas. As autoridades poderão interromper essas reuniões ou manifestações, se nelas se assumirem posições contrárias à lei ou à moral, ou se perturbarem gravemente a ordem e tranquilidade públicas. As autoridades só poderão estar presentes no recinto fechado, onde a reunião tiver lugar, se forem solicitadas pelos seus promotores. 136
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Há que referir contudo, o disposto no artigo 304.º do Código Penal, pois aí se determina que quem não obedecer à ordem legítima de se retirar de reunião pública, dada por autoridade competente, com a advertência de que a desobediência é criminosa, será punido com prisão, conjugado com o artigo 348.º, do mesmo diploma O direito de manifestação é igualmente reconhecido a todos os cidadãos no n.º 2 do mesmo artigo 45.º. Vejamos agora a liberdade de associação, estabelecido no artigo 46.º, da Constituição. Também sem dependência de qualquer autorização, os cidadãos têm o direito de constituir associações, desde que elas não se destinem a promover a violência e os respectivos fins não sejam contrários à lei. A este propósito, porém, há dois pontos a submeter à consideração, face às disposições do nosso direito positivo aplicáveis ao caso. Assim: 1. O exercício do direito de associação, designadamente o de cada cidadão se poder livremente filiar em sindicatos para defesa do seu interesse, só pode ser objecto de restrições se, previstas estas numa lei de índole democrática, forem consideradas necessárias para a segurança nacional, a segurança pública, a defesa da ordem e prevenção do crime, a protecção da saúde ou da moral, ou ainda para protecção d as liberdades e direitos de terceiros. Daí o n.º 2 da mesma disposição determinar claramente que o ordenamento não proíbe que sejam impostas restrições legítimas ao exercício do
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direito de associação, - incluindo em sindicatos, aos membros das forças armadas, da polícia e da administração do Estado. Tudo dependerá, portanto, de uma questão de perspectiva legislativa e de política interna, absolutamente legítimas ( a este propósito veja-se o artigo 270.º da C.R.P. ). E aqui nos surge a primeira reserva posta por Portugal ao aprovar, para ratificação, a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, pela Lei n.º 65/78, de 13 de Outubro, que no artigo 2.º alínea d), expressamente declarou que o artigo 11.º da Convenção não obstaria à proibição do lockout, em conformidade com o disposto no então artigo 60.º, - hoje artigo 57.º, da Constituição. E também no mesmo artigo 2.º da Lei n.º 65/78, mas na alínea f), o nosso país veio introduzir mais uma “ reserva” na aprovação da Convenção, mas agora em relação ao n.º 4 do artigo 46.º da Constituição, precisamente a disposição em análise. A aludida ressalva ou reserva diz que o artigo 11.º da Convenção não obstará à proibição de organizações que perfilhem ideologia fascista, em conformidade com o disposto no tal n.º 4 do dito artigo. De facto, este preceito não consente associações armadas nem de tipo militar, militarizadas ou paramilitares, - e estas estão obviamente no espírito das disposições internacionais acima referidas -, nem tão-pouco .”organizações que perfilhem a ideologia fascista” . A Lei n. 64/78, de 6 de Outubro, veio preencher o vazio legislativo que era a indefinição, para os efeitos do texto constitucional, do conceito “ fascista”. O artigo 2.º daquela lei considera que existirá uma organização sempre que se verifique qualquer concertação ou conjugação de vontades ou esforços, 138
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com ou sem auxílio de meios materiais, eventual ou permanente, com ou sem personalidade jurídica. Essas organizações perfilharão a ideologia fascista se, pelos seus estatutos, manifestos, comunicados, declarações dos dirigentes ou responsáveis, ou pela sua actuação, mostrem adoptar, defender, pretender difundir efectivamente, os valores e princípios, os expoentes, as instituições e os métodos característicos dos regimes fascistas que a História regista , nomeadamente o belicismo, a violência como forma de luta política, o colonialismo, o racismo, o corporativismo ou a exaltarão das personalidades mais representativas daqueles regimes. O n.º 2 do artigo 3.º considera, nomeadamente, que perfilham a ideologia fascista as organizações que combatem por meios anti-democráticos, designadamente com recurso à violência, a ordem constitucional, as instituições democráticas e os símbolos da soberania, bem como aquelas que perfilhem ou difundam ideias ou adoptem formas de luta contrária à unidade nacional. Convém advertir que, além da perda em favor do Estado dos bens patrimoniais que sejam pertença das organizações declaradas como perfilhando ideologias fascistas, os que as tiverem fundado ou nelas exercido cargos directivos e de responsabilidade serão punidos com penas de prisão de 2 a 8 anos.
2. Outro ponto é o da regra de as associações poderem livremente prosseguir os seus fins, sem interferência da autoridade pública, não podendo ser dissolvidas pelo Estado ou suspensas as suas actividades senão nos casos previstos na lei e mediante decisão judicial. No mais, vale o já anteriormente referido.
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ÍNDICE INTRODUÇÃO
Noção geral de direitos fundamentais 3 Abordagem histórica 3 O poder e os direitos fundamentais 11 O poder e a autoridade 11 O poder na sua tridimensionalidade 12 1. A Forma 12
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2. A Sede 13 3. A Ideologia 17 OS DIREITO FUNDAMENTAIS NA CONSTITUIÇÃO PORTUGUESA DOS DIREITOS E DEVERES FUNDAMENTAIS EM GERAL Colocação dos deveres fundamentais na Constituição 18 Regime dos direitos fundamentais 19 Classificação dos direitos fundamentais 19 Enquadramento dos direitos fundamentais na Constituição 19 Hierarquização dos direitos fundamentais
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20 Regime comum dos direitos fundamentais 20 Princípio do Estado de direito democrático 20 Princípio da universalidade 22 Princípio da igualdade 23 Princípio da protecção jurídica 25 Tutela Jurisdicional 26 Tutela graciosa 26
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Direito de queixa ao Provedor de Justiça 27 Regime específico dos direitos, liberdades e garantias 30 Regras materiais 30 Aplicação directa e vinculação 30 Carácter restritivo e excepcional da limitação e suspensão dos direitos, liberdades e garantias 31 Suspensão do exercício dos direitos, liberdades e garantias 32 Direito de resistência 36 Princípio da responsabilidade das entidades públicas 143
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38 Regras orgテ「nicas 40 Garantias constitucionais dos direitos fundamentais 40 A garantias dos direitos fundamentais com tarefa fundamental do Estado 41 Garantias decorrentes de normas de direito internacional vigente na ordem jurテュdica interna 46 DIREITOS FUNDAMENTAIS EM ESPECIAL
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