Publicação do Centro Espírita Dr. Bezerra de Menezes | Santo André - SP - Ed. 77 - Jul/Ago/Set - 2015
Uma re exão sobre a maioridade penal “Se nos permitimos usar a justiça como vingança, nada impedirá que um dia usemos a vingança como justiça” Está na pauta do Congresso Nacional a discussão sobre a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos, com o intuito de dar uma resposta à sociedade em relação a uma aparente onda de crimes violentos praticados por jovens nessa faixa etária. Eu digo aparente porque a incidência estatística é realmente baixa, de modo que o sentimento que as pessoas têm hoje, de que por trás dos grandes crimes estão os delinquentes juvenis é um grande equívoco. O criminoso adulto ainda é o responsável por mais de 99% dos delitos praticados no Brasil. Quando nos limitamos aos crimes que envolvem morte, veri ca-se que apenas 0,5% deles têm menores como autores. Qual o problema então? Ocorre que crimes praticados por menores de 18 anos recebem um destaque maior da mídia, especialmente pela ênfase que é dada de que eles não serão presos, ou pelo menos, não pelo tempo su ciente para “pagar” o valor de uma vida, ou ainda para entender que o crime não compensa. Estão erradas as pessoas que clamam pela redução da maioridade penal? Sob o ponto de vista da criminologia moderna e da própria estatística creio que sim, mas não é esse o ponto crucial da questão. O que incomoda a sociedade é o sentimento de injustiça, ou seja, um crime bárbaro foi cometido, uma vítima inocente pagou com a vida e nada vai acontecer. Essa é a questão crucial: trata-se de uma resposta. Uma resposta emocional com pouco ou quase nenhum alcance prático. Será dada uma resposta política à sociedade e nada mais vai ser feito onde realmente se encontra a origem do problema, ou seja, na educação, na inclusão social e até mesmo no envolvimento de outros atores no processo, hoje assistindo como se não tivessem nada com isso.
Faltam leis? Não creio. Falta vontade de cumpri-las. O Champinha, assassino juvenil, normalmente citado para justi car a redução da maioridade penal está preso há mais tempo do que caria se fosse maior. E cará para todo sempre. Há juízes no Brasil que processam pais que não cuidam da educação dos lhos, recolhem crianças que perambulam nas ruas após as 10 horas da noite, e uma série de outras iniciativas que podem e estão sendo implementadas com fundamento na legislação atual. O problema é que dá trabalho. Mudar a lei é mais fácil e ainda dá para fazer política em cima. A economia americana já sente o peso de ter a maior população carcerária do planeta e já está partindo para reverter o processo, diminuindo acentuadamente a relação de encarcerados por 100 mil habitantes. O Brasil, quarto país no planeta no mesmo quesito, há muito não investe na área e apenas joga os infratores em depósitos humanos até chegar a hora deles saírem livres. É um círculo vicioso que só se interromperá abrindo mais escolas do que presídios. Hoje estamos fazendo o contrário. Reduzir a maioridade penal vai fazer com que as pessoas se sintam um pouco vingadas por alguns momentos, mas será o maior atestado de fracasso que a sociedade brasileira poderá dar a si própria. Visão espírita Na questão 153 do livro “O Consolador”, ditado por Emmanuel a Chico Xavier, encontramos a pergunta: “Se a hora da morte não houver chegado, poderá o homem perecer sob os perigos que o ameacem?” Resposta: “...desde que o espírito encarnado proceda de conformidade com os ditames da consciência retilínea e do coração bem-intencionado, sem a impon-
deração dos precipitados e sem o egoísmo dos ambiciosos, toda e qualquer defesa do homem reside em Deus”. Esse ensinamento afasta, portanto, o papel da vítima como a entendemos, ou seja, daquele anjo sem quaisquer débitos com a vida ou com a própria consciência, que de repente é atacado e morto à revelia da Proteção Divina. Todos temos nossos débitos e todos estamos sob a soberania onipotente, onipresente e onisciente do Pai. Se algo aconteceu, há uma relação direta com a conduta da “vítima” nesta ou em outra oportunidade; encarnação até. Quanto ao agressor, nasce ali um novo compromisso do qual ele prestará contas, mas não pode passar pela nossa cabeça que, se o criminoso, no caso um menor de idade, estivesse preso, tal fato não ocorreria. Se assim não fosse, mais valeria um colete à prova de balas do que a proteção de Deus. Queremos colher paz amanhã? Tratemos de semear amor hoje! Ao sermos “vítimas” de um crime, temos que nos colocar na posição de quem recebe uma carta com uma notícia de cobrança. Não adianta matar o carteiro. Deve-se entender a origem do débito e saldá-lo como bons pagadores. Havendo maturidade, que o exemplo sirva para evitar novas dívidas, caso contrário, haja carteiro para eliminar!
Por Edson Sardano Foto: Divulgação