Anais 2006 seminaruinac

Page 1

REDE BRASILEIRA DO BAMBU ‐ RBB

Anais do I Seminário Nacional do Bambu

estruturação da rede de pesquisa e desenvolvimento 13, 14 e 15 de setembro de 2006 Brasília, DF

2ª Edição

Organizadores: Jaime Gonçalves de Almeida Anelizabete Alves Teixeira

Brasília, DF Março, 2011


ANAIS DO I SEMINÁRIO NACIONAL DO BAMBU: Estruturação da Rede de Pesquisa e Desenvolvimento Realização do Seminário: Universidade de Brasília Faculdade de Arquitetura e Urbanismo - FAUUnB Projeto Cantoar: Arquitetura e Fibras Naturais Promoção do Seminário: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq Ministério da Ciência e Tecnologia - MCT Programa Nacional de Florestas – PNF Ministério do Meio Ambiente - MMA Organizadores: Jaime Gonçalves de Almeida e Anelizabete Alves Teixeira Promoção da 2ª Edição dos Anais: Centro de Pesquisa e Aplicação de Bambu e Fibras Naturais - CPAB Revisão da 2ª Edição dos Anais: Ana Cristina Tinôco Verçosa de Magalhães Revisão Ortográfica e Gramatical: Edna Francischetti Apoio de Organização dos Anais da 1ª Edição: Luciana Kaviski Peixoto Apoio de Secretaria-FAUUnB do Seminário: Soemes Barbosa de Souza Apoio Institucional: FAUUnB, PNF/MMA, CNPq/MCT, FUBRA (Fundação Universitária de Brasília) Programação Visual: Geraldo Benício FICHA CATALOGRÁFICA

S471

I Seminário Nacional do Bambu: Estruturação da Rede de Pesquisa e Desenvolvimento (1. : 2006 : Brasília, DF.) Anais do I Seminário Nacional do Bambu. 2. ed. / org. por Jaime Gonçalves de Almeida e Anelizabete Alves Teixeira. Brasília: CPAB, Universidade de Brasília, 2011. 196p. ISSN 2179-7722 1. Bambu – Seminário – Brasil. 2. Rede de Pesquisa. I. Almeida, Jaime Gonçalves de. II. Teixeira, Anelizabete Alves. III. Título. CDU 691.12(81)

CEDIARTE/FAU/UnB/LOURDES ANTONIAZZI/CRB-01-640

Comissão Organizadora: Alejandro Luis Pereira da Silva Dalva Graciano Ribeiro Jaime Gonçalves de Almeida (Coordenador) Marlúcia Almeida Felinto Sérgio Alberto de Oliveira Almeida Tarciso S. Filgueiras Comitê Científico: Jaime Gonçalves de Almeida (Presidente) Dalva Graciano Ribeiro Julio Eustaquio de Melo Sérgio Alberto de Oliveira Almeida Tarciso S. Filgueiras


Equipe técnica: Abel Machado dos Anjos Ana Maria Corsini Velloso Ana Schramm Anatel Bennet Carlos Augusto Soares de Melo Eleudo Esteves de Araújo Silva Júnior Gabriella Nepomuceno Cunha Lima Joselho Rocha Batista Luciano Vieira Brandão Luiza Castello Branco Pereira da Silva Maria Odília Andrade R. de Oliveira Paulo Sérgio Parrini Glória Rejânia Felício Tavares Renata Corsini Bernardo Sérgio Luiz Pereira Rodrigues Tatiana de Araújo Espíndola Valmor Cerqueira Pazos Willian Souza Viana


APRESENTAÇÃO DA 2ª EDIÇÃO

Decidimos reeditar o livro dos Anais do I Seminário Nacional do Bambu: Estruturação da Rede de Pesquisa e Desenvolvimento de 2006. Essa decisão foi tomada durante a preparação e organização do II Seminário Nacional do Bambu: Consolidação da Rede Brasileira do Bambu – RBB ocorrido em 2010, em Rio Branco, Estado do Acre. A reedição deste livro veio em boa hora. Estes Anais se revestem de importância para o bambu no Brasil, pois esse Seminário foi o primeiro do gênero no país a publicar trabalhos culturais e técnico-científicos sobre o bambu. Além disto, no intervalo entre os dois Seminários, recebemos vários pedidos deste livro vindo de diferentes partes do Brasil, que não atendemos por falta de exemplares. Esta reedição somente foi possível com o apoio do CNPq/MCT. Fixamos como atividade prioritária a revisão ortográfica e gramatical do material publicado, pois verificamos que o procedimento por nós adotado na 1ª Edição do livro não surtiu efeito. Havíamos deixado a critério dos autores a correção de seus próprios textos. A tarefa de reedição que tínhamos pela frente se prolongou por mais tempo e deparamos com o imponderável. Devido ao longo intervalo entre a publicação da primeira e da segunda edição do livro, tivemos dificuldades em contatar alguns autores que mudaram de endereço ou de foco de interesse distanciando-se do artigo publicado, e, também, no envolvimento de outros autores na revisão de seus textos. O tempo foi escasso para realizar as tarefas de revisão deste livro e, simultaneamente, a preparação do livro do II Seminário. No entanto, contamos com uma equipe de trabalho que não poupou esforços para concluir a tarefa a tempo e com qualidade. Aproveitamos a oportunidade e cadastramos este livro no ISSN (International Standart Serial Number), o que é uma exigência das instituições públicas de pesquisa e de fomento, para, respectivamente, cadastro de produção técnico-científica e submissão de projetos por parte dos autores. Assim, vocês têm em mãos um livro revisado com muito zelo e paciência. Que tirem dele o melhor proveito.

Brasília, março de 2011 (jga)

4


APRESENTAÇÃO

A realização do Seminário Nacional do Bambu: Estruturação da Rede de Pesquisa e Desenvolvimento é parte de um processo de articulação e organização de profissionais, técnicos, pesquisadores e lideranças administrativas vinculados às mais diferentes instituições nacionais do setor público, privado e terceiro setor, interessados na difusão, na pesquisa e no desenvolvimento tecnológico da cultura do bambu no Brasil. O bambu é um dos mais antigos ou tradicionais ativos ambientais que desempenha no mundo contemporâneo importante papel estratégico. A nível local, essa matéria-prima, juntamente com outras fibras naturais, assegura às populações pobres das regiões tropicais e subtropicais renda complementar, geração de emprego e, sobremaneira, identidade cultural. E, a nível internacional, o bambu é responsável por uma cadeia de produção e valor que contribui significativamente para a sustentabilidade dessas populações. O Seminário mostrou que o Brasil possui potencialidades como, por exemplo, condições climáticas, biodiversidade, práticas e saberes tradicionais e, sobretudo, conhecimento técnico-científico para a utilização dessa matéria-prima nos diferentes setores e atividades socioeconômicas. Entretanto, para que tais condições possam contribuir de forma efetiva para o desenvolvimento do país, o Seminário vislumbrou na organização cooperativa das instituições envolvidas com o bambu um meio para se atingir tal fim. Algumas metas relacionadas foram levantadas no evento tais como: a expansão da atual capacidade técnico-científica, o desenvolvimento tecnológico voltado ao cultivo e à propagação de espécies nativas e cultivadas e, finalmente, o estabelecimento de políticas públicas voltadas para a expansão do negócio do bambu no país comprometido sobremaneira com a criação de postos de trabalho. Nessa direção, o Seminário tornou público o trabalho dos profissionais, técnicos e pesquisadores e das instituições que lidam com o bambu no país e, mais importante, apoiou as bases do novo patamar proposto para a organização desse setor por meio de uma Rede Brasileira do Bambu - RBB. O evento tornou público ainda o atual estado d'arte da cultura do bambu no Brasil no tocante à pesquisa, ao desenvolvimento tecnológico e à aplicação dessa matéria-prima. Esse cenário é bastante promissor em termos técnicos e científicos e confirma a importância que tem o conhecimento científico, tecnológico e cultural do bambu para o atendimento das demandas provenientes dos setores social, público e industrial. O Seminário deu início também a uma discussão sobre o desenvolvimento e sustentabilidade socioambiental com foco na geração de emprego e renda. Três áreas se destacaram entre os diversos setores potenciais da aplicação do bambu no Brasil, quais sejam: a construção civil, o artesanato e a produção de energia ou bioenergia a partir do bambu. Seus participantes e o grupo que examinou a proposta da Rede apresentada pela Universidade de Brasília manifestaram na Carta de Brasília o seu apoio e, também, levantaram a necessidade de se implementar ações articuladas entre os futuros integrantes da Rede a ser criada com o fito de lhes assegurar uma governança cooperativa. Concluída essa primeira etapa, a realização desse Seminário, a Universidade de Brasília por meio do Projeto Cantoar da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, apresentará ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) um projeto de Rede acompanhado de um orçamento para a sua implantação no prazo de dois anos. Nessa implantação da Rede, a UnB envolverá os principais técnicos, profissionais e pesquisadores, eventualmente as suas instituições, bem como as lideranças administrativas que participaram do evento. Esse trabalho será coordenado por uma equipe técnica do Centro de Pesquisa e Aplicação de Bambu e Fibras Naturais (CPAB) que está sendo criado pela Universidade de Brasília. (jga, 30/10/2006 - atualizado em 12/2010).

5


SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO DA 2ª EDIÇÃO

4

APRESENTAÇÃO

5

1 Carta de Brasília

8

2 Rede Brasileira do Bambu

9

2.1 Proposta para a Implantação de uma Rede Brasileira do Bambu JAIME GONÇALVES DE ALMEIDA

9

3 Conclusões dos Grupos de Trabalho

23

4 Artigos sobre Biodiversidade e Ecologia

27

4.1 A Giant of New Guadua (Poaceae:Bambusoideae) from Central Brazil TARCISO S. FILGUEIRAS; XIMENA LONDOÑO

27

4.2 Bambus Nativos no Brasil: Oportunidades e Desafios para seu Conhecimento TARCISO S. FILGUEIRAS; ANA PAULA SANTOS GONÇALVES

33

4.3 Bambus (Bambusoideae: Poaceae) do Parque Estadual do Rio Doce, Minas Gerais: Florística e Morfologia ANA PAULA SANTOS GONÇALVES; RITA MARIA DE CARVALHO OKANO; MILENE FARIA VIEIRA; TARCISO S. FILGUEIRAS

43

4.4 Florestas Dominadas por Tabocas Semi-escandentes do Gênero Guadua, no Sudoeste da Amazônia BRUCE WALKER NELSON; ÁTILA CRISTINA DE OLIVEIRA; DANIELA VIDALENC; MAIRA SMITH; EULER MELO NOGUEIRA

49

4.5 Inovações Tecnológicas para a Propagação de Espécies de Bambu EURICO EDUARDO PINTO DE LEMOS; FERNANDA KARINA PEREIRA DA FONSECA; JAQUELINE FIGUEREDO DE OLIVEIRA; IVENS BARBOZA LEÃO; LEILA DE PAULA REZENDE; CYNTHIA DINIZ DE SOUZA; TARCISO S. FILGUEIRAS; MAURO DE OLIVEIRA FERREIRA

56

4.6 Diversidade e Conservação dos Bambus Herbáceos (Poaceae:Bambusoideae:Olyreae) da Mata Atlântica, Brasil REYJANE P. DE OLIVEIRA; HILDA M. LONGHI-WAGNER; JOMAR G. JARDIM

62

4.7 Roteiro Mínimo para Estudo Anatômico dos Bambus (Poaceae:Bambusoideae) DALVA GRACIANO RIBEIRO; TARCISO S. FILGUEIRAS; ANA PAULA SANTOS GONÇALVES

69

4.8 Taquaruçu (Guadua sp.): Caracterização da Planta e do Ambiente de Ocorrência na Bacia do Rio Crixás-Açu, Goiás, Brasil ROBERTO MAGNO DE CASTRO SILVA; TARCISO S. FILGUEIRAS; RONALDO VELOSO NAVES; LÁZARO JOSÉ CHAVES

5 Artigos sobre Cultivo e Manejo

75 89

5.1 Os Benefícios Socioambientais das Florestas de Bambu (Bambusa vulgaris), no Nordeste do Brasil OSMARINO BORGES; GERMAN H. GUTIÉRREZ-CÉSPEDES

89

5.2 Projeto Bambu: Manejo e Produção do Bambu Gigante (Dendrocalamus giganteus) Cultivado na Unesp de Bauru/SP e Determinação de Características Mecânicas de Ripas Laminadas MARCO ANTÔNIO R. PEREIRA

6

93


6 Artigos sobre Aplicações

106

6.1 O Bambu e seu Potencial para Aplicações na Construção Civil 106

JOSÉ DAFICO ALVES

6.2 Bambu: Madeira Ecológica para Habitações de Baixo Custo 114

KHOSROW GHAVAMI

6.3 Panorama da Construção Civil com Bambu no Rio Grande do Sul a Partir de um Comparativo dos Custos de Construção de Bambu e Madeira ALEX MALTESE KLEIN; ANDRÉ GUSTAVO COSTA CHALUPPE; DIEGO DE CASTRO FETTERMANN; FELIPE CARON

129

6.4 Bambu no Brasil: Uma Matéria-Prima Celulósica e Energética 135

ANTÔNIO LUIZ DE BARROS SALGADO

6.5 O Bambu como Insumo no Processo Industrial de Pré-Moldados para Construção Civil 143

EDSON DE MELLO SARTORI

6.6 Painéis de Bambu para Habitações Econômicas: Avaliação do Desempenho de Painéis Revestidos com Argamassa 151

ANELIZABETE ALVES TEIXEIRA; JAIME GONÇALVES DE ALMEIDA

7 Artigos sobre Políticas Públicas e Inclusão Social

161

7.1 Artesanato de Bambu na China: Relato e Reflexões Sobre um Curso de Treinamento na Província de Sichuan 161

JAIME GONÇALVES DE ALMEIDA

7.2 O Bambu na Interação Academia-Comunidade em Projetos Sociais 170

ELOY FASSI CASAGRANDE JUNIOR

8 Divulgação

180

8.1 Bambu Brasileiro e Grupo Bambu-Brasil, o Bambu na Rede Brasileira 180

RAPHAEL MORAS DE VASCONCELLOS

9 Resumos de Artigos

184

9.1 Uso do Bambu no Processo Terapêutico e Pedagogia da Eutonia 184

BETTY FEFFER

9.2 Entre Empíricos e Acadêmicos 186

CELINA LLERENA; CAMILA MELLO

9.3 A Fitorremediação como Exemplo das Possibilidades de Políticas Públicas de Inclusão Social FRANCISCO DE ASSIS MACHADO; ALEJANDRO LUIZ PEREIRA DA SILVA; DARIO JOÃO DE MENDONÇA BERNARDES

187

10 Participantes das Mesas-Redondas e Conferências

188

11 Apresentações de Atividades e Experiências

189

12 Composição da Mesa de Abertura do Seminário

190

13 Instituições Presentes no Seminário Nacional do Bambu

191

14 Lista dos Inscritos no Seminário

194

7


1 CARTA DE BRASÍLIA

Estruturação da Rede de Pesquisa e Desenvolvimento do Bambu No Seminário Nacional do Bambu, realizado entre os dias 13 e 15 de setembro de 2006, no Hotel San Marco da cidade de Brasília, houve uma congregação de diversos atores sociais representantes de instituições de ensino e pesquisa, de organizações não governamentais, do setor privado e de trabalhadores autonômos que vêm trabalhando com o bambu no Brasil, em suas diversas áreas de atuação. O objetivo desta reunião foi avaliar e contribuir para a elaboração da proposta de criação e constituição de uma Rede Brasileira do Bambu, que será constituída sob a forma de uma organização de domínio público, tarefa encomendada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia à Universidade de Brasília, com o apoio do Ministério do Meio Ambiente. Houve concordância unânime entre os participantes em que, a partir da presente data, inicia-se uma nova era para o conhecimento e aproveitamento do bambu no Brasil, através de uma forma cooperativa e organizada em todos os níveis das cadeias de valor e produção. O Brasil é detentor da maior diversidade de bambus das Américas, além de existirem em seu território espécies introduzidas de alto potencial socioeconômico, que já estão incorporadas à economia nacional. O uso dos recursos nativos, abundantes no território nacional, implica especial atenção às espécies das categorias de plantas raras, endêmicas e ameaçadas de extinção. Ademais, para que o bambu contribua para o desenvolvimento socioeconômico do país, incentivando a inclusão social e a diminuição da pobreza, deve-se ampliar e difundir o conhecimento sobre esse ativo ambiental, promover a qualificação humana em todos os níveis educacionais para seu aproveitamento, e estabelecer relações de cooperação internacional com entidades e países já adiantados no uso desta matéria-prima. Exemplos de sucesso econômico do uso do bambu podem ser vistos em países como o Equador, que implantou um programa de construção de habitação social, ou a Colômbia, onde a avançada arquitetura desenvolvida em torno do bambu é reconhecida mundialmente. Já nos países asiáticos, estima-se que a cadeia produtiva do bambu envolva mais de um bilhão de postos de trabalho. Atualmente no Brasil há necessidade de aglutinação de esforços no intuito de colocar em evidência todos os trabalhos desenvolvidos pela comunidade científica, que até o momento já alcança reconhecimento internacional em pesquisa original. Porém, o potencial desse conhecimento não está sendo devidamente explorado: falta organização desse conhecimento no âmbito governamental e institucional, e também se constatou que os saberes tradicionais e empíricos não se beneficiam de uma interação com o conhecimento formal. A criação e o funcionamento da Rede vêm exatamente ao encontro das necessidades de organização, ação conjunta, relacionamento e informação dos atores e instituições que já atuam no setor do bambu no Brasil. Além de prosseguir na realização dessas funções, a Rede será o foro ideal para a discussão e disseminação de propostas de políticas públicas que apoiem as iniciativas anteriormente mencionadas. Propõe-se que se dê ciência desta carta a todos os ministérios, em especial àqueles que investiram e continuam investindo na estruturação da Rede, e que se promova sua ampla difusão para todos os setores da sociedade brasileira. Brasília, 15 de setembro de 2006

8


2 REDE BRASILEIRA DO BAMBU 2.1 PROPOSTA PARA A IMPLANTAÇÃO DE UMA REDE BRASILEIRA DO BAMBU1 Jaime G. de Almeida2

INTRODUÇÃO A expansão do mercado de produtos derivados de fibras naturais provenientes de países asiáticos como, por exemplo, a China, as Filipinas, a Índia, a Indonésia e o Nianmar, tem colocado no Brasil inúmeros produtos. Tais produtos, especialmente aqueles derivados do bambu, apresentam duas características marcantes. A primeira compreende a ampla diversidade de objetos produzidos a partir desse ativo ambiental. Essa produção engloba uma variedade enorme de objetos feitos exclusivamente com o bambu e consorciados com outras matérias-primas. A segunda característica, entretanto, abarca igualmente uma variedade notável de sistemas e estruturas de produção e comercialização de diferentes formas e dimensões organizadas em matrizes artesanais tradicionais e modernas ou industriais avançadas. Historicamente as atividades em torno do bambu são reconhecidas pela sua contribuição sociocultural e, especialmente, pelos seus inúmeros benefícios diretos enquanto fonte de renda, emprego e sustento de populações étnicas, tradicionais, entre outras. Essas populações associam o emprego de uma tecnologia artesanal com a sustentabilidade ambiental e econômica. Hoje, no entanto, com a expansão dos processos tecnológicos e a necessidade constante de inovação que a comercialização de produtos e serviços exige, colocam-se novos desafios ao processo tradicional da produção do bambu. Entre eles, podem ser destacados o melhoramento da capacidade tecnológica dessa produção e a qualidade de seus produtos e, sobretudo, novas formas organizacionais dessa produção em nível nacional e internacional. Duas medidas devem ser pensadas para que o Brasil possa reverter aquele quadro. A primeira se refere à necessidade do estabelecimento de políticas públicas que garantam a universalização dos frutos resultantes do desenvolvimento produtivo do bambu nacional. E a segunda está diretamente relacionada com desenvolvimento tecnológico em consonância com essas políticas públicas. Nesse sentido, uma inciativa importante já foi tomada pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA). Em abril de 2005, a "Reunião de Avaliação e Perspectivas do Uso Sustentável do Bambu no Brasil", encontro de representantes de instituições de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), do setor industrial, profissional e do terceiro setor ocorrida em Brasília, promovida pelo Programa Nacional de Florestas da Secretaria de Biodiversidade e Florestas do MMA, estabeleceu como prioridades, entre outros pontos de consenso, a realização de um estudo sobre o estado da arte do bambu no Brasil e a promoção de um encontro para a implantação de uma Rede Brasileira do Bambu. O Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) tomou outra inciativa por meio da Secretaria de Ciência e Tecnologia para Inclusão Social ao encomendar à Universidade de Brasília (UnB) uma proposta para a implantação da referida Rede. Para tanto, a UnB designou a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAUUnB), que decidiu realizar um seminário nacional, coordenado pelo Projeto Cantoar, para para discutir as bases da proposta preliminar da Rede bem como colher subsídios para o seu planejamento e a sua constituição. Vale notar que o Projeto Cantoar vem, desde a década de 1990, trabalhando com a aplicação de bambus na arquitetura e construção e, nessa atividade, associa a pesquisa e o desenvolvimento com a qualificação de graduandos universitários e de populações urbanas e rurais. Este documento apresenta a proposta inicial para a estruturação da Rede Brasileira do Bambu. Ele será discutido com pesquisadores, técnicos, profissionais e artesãos vinculados às mais diferentes instituições públicas e privadas do país, que estarão presentes no Seminário Nacional que se realizará em Brasília, nos dias 13, 14 e 15 de setembro de 2006. O Seminário pretende ainda divulgar a importância da referida Rede para os técnicos, profissionais, pesquisadores e, sobretudo, para a sociedade brasileira representada pelas instituições públicas govenamentais ou não governamentais e privadas que estarão participando do evento.

1 Esta proposta recebeu contribuições valiosas do arquiteto Alejandro Luiz Pereira da Silva, do engenheiro

florestal Sérgio Alberto de Oliveira Almeida do LPF-Ibama/Brasília, dos botânicos Tarciso S. Filgueira do IBGE/Brasília e Dalva Graciano da UnB, bem como de técnicos da Coordenação Geral do Programa de Pesquisa do CNPq/MCT. E contou também com a leitura e avaliação criteriosa do professor Ricardo Bentes de Azevedo do Decanato de Pesquisa e Pós-graduação da Universidade de Brasília (DPP/UnB). 2 Arquiteto, professor Adjunto PhD da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília (FAUUnB). E-mail: (cpab@unb.br).

9


Observa-se, portanto, que a realização deste Seminário é uma iniciativa da UnB com o apoio do MCT e do MMA. Já a idéia da criação de uma rede nacional destinada ao bambu é da Secretaria de Ciência e Tecnologia para Inclusão Social do MCT e da Secretaria dos Fundos Setoriais do MCT, em decorrência das sugestões de pesquisadores e entidades interessadas no negócio do bambu no Brasil. Com base nos resultados alcançados no evento, a Universidade coordenará, em conjunto com representantes de instituições presentes no Seminário, a elaboração do projeto e do orçamento, que deverão ser encaminhados ao MCT ou a outro órgão por ele designado, para financiamento da implantação da referida Rede em dois anos, a partir de 2007. Vale salientar que as linhas gerais da proposta de Rede tiveram como referência básica textos de outras redes nacionais reconhecidas pelo CNPq cujas informações estão disponibilizadas nos seus portais da "Web". Dessa forma, há muitos pontos em comum entre esta proposta e outras redes, cujas linhas de ação foram consultadas para a elaboração deste trabalho. Um dos principais documentos analisados foi o trabalho de autoria de Luiz A. B. de Castro, pesquisador do Cenargen/Embrapa, sobre o Programa Renordfbio (Rede Nordeste/DF de Biotecnologia), datado de junho de 2003. Todavia, a proposta da Rede se diferencia em muitos aspectos da proposta de Rede daquele pesquisador. Os problemas da biotecnologia não se confundem com os do bambu. Ao contrário daquela atividade, o bambu é uma matéria-prima milenar. Está presente no dia a dia da humanidade desde os seus primórdios. Além disso, o bambu envolve não somente uma gama variada de competências disciplinares especializadas como, também, saberes práticos industriais e artesanais. São elas tecnologias diferenciadas daquela intrínseca da biotecnologia. Grosso modo, o trabalho com o bambu engloba tecnologia sofisticada ou high-tech, e, também, a não sofisticada ou low-tech. Em suma, este documento objetiva apresentar, de forma bastante sintética, para discussão no Seminário, as principais matérias relacionadas com a implantação de uma rede de pesquisa e desenvolvimento do bambu. O texto está organizado em duas grandes partes ou blocos principais. A primeira parte (PARTE I) traça um panorama geral da problemática e das potencialidades do bambu no Brasil, apresenta a justificativa, a definição e os objetivos da Rede assim como delimita os seus campos de atuação, relaciona os princípios orientadores de seu funcionamento e conclui expondo os principais impactos da criação da Rede. A segunda parte (PARTE II) versa sobre a proposta da UnB para o planejamento da estruturação da Rede a ser apresentada ao MCT. Essa matéria, após a sua discussão no Seminário, conforme o que foi acentuado anteriormente, será desenvolvida e detalhada pela UnB com o apoio de uma equipe técnica interna e de consultores externos. Ademais, este documento incorpora ainda contribuições valiosas procedentes de técnicos da Coordenadoria Geral do Programa de Pesquisa do CNPq/MCT, em particular, da sua Coordenação do Programa de Pesquisa em Agropecuária e Agronegócio e da Coordenação de Biotecnologia e Recursos Genéticos. Observações provenientes do grupo de trabalho organizado pelo Cantoar/FAUUnB para a realização do Seminário foram também incorporadas ao presente texto.

Compõem este documento as seguintes seções: INTRODUÇÃO PARTE I: SOBRE A REDE - BRASIL 1 CONTEXTO E JUSTIFICATIVA DA REDE 2 DEFINIÇÃO E CAMPOS DE ATUAÇÃO DA REDE 3 PRINCÍPIOS NORTEADORES DA REDE 4 OBJETIVOS DA REDE 5 IMPACTOS ESPERADOS DA REDE PARTE II: O PROGRAMA DE IMPLANTAÇÃO DA REDE - BRASIL 6 METODOLOGIA DE IMPLANTAÇÃO DA REDE 7 METAS E ATIVIDADES DA IMPLANTAÇÃO DA REDE 8 SUSTENTABILIDADE FINANCEIRA DA REDE

10


PARTE I: SOBRE A REDE - BRASIL 1 CONTEXTO E JUSTIFICATIVA DA REDE O bambu é um dos recursos da biodiversidade biológica que oferece aos países em desenvolvimento oportunidades de geração de emprego e renda sendo capaz de responder às demandas da economia local. Sendo o bambu uma das plantas com alto crescimento vegetativo, produz em consequência um volume considerável de biomassa, fixa CO2 e, sobretudo, enriquece a estrutura física e química dos solos. O ciclo de consolidação da lignina no colmo do bambu é curto, completa-se a partir do terceiro ano após o plantio, o que propicia a sua colheita. Diferentemente da madeira, a colheita de colmos do bambu equivale a uma poda. Seu poder regenerativo é grande, algumas espécies alcançam uma vida útil superior a 100 anos. No mundo, aproximadamente 1 bilhão de pessoas tiram o seu sustento direta ou indiretamente do bambu. O consumo mundial de produtos derivados dessa planta é da ordem de 10 bilhões de dólares americanos e, segundo o Governo da Índia, até 2015 esse valor duplicará. A comissão do governo indiano responsável pelos negócios do bambu afirma que essa planta gera cerca de 8,6 milhões de empregos e ajuda na sobrevivência de 5 milhões de famílias pobres. Por outro lado, os produtos industriais derivados do bambu como, por exemplo, o MDF, o OSB e o Plyboo possibilitam a substituição corrente das madeiras. Assim, o emprego industrial dessa matériaprima com a oferta da chamada madeira ecológica pode concorrer para se evitar o desmatamento das florestas tropicais. Os valores caloríficos do bambu são comparáveis aos de várias madeiras, o que o torna atraente como fonte renovável de energia e substituto de combustíveis fósseis. Além dessa utilização, o bambu é fonte de biomassa para a produção de celulose e papel. No Brasil, a utilização de uma das espécies mais comuns (Bambusa vulgaris vulgaris) possibilitou o desenvolvimento de uma tecnologia da produção de papel de bambu superior à utilizada por países como a China e Índia. A cadeia produtiva do bambu oferece ainda oportunidades de negócios concretos, imediatos, com grande potencial de mercado e inúmeros benefícios sociais e, sobretudo, ambientais. Foram identificadas mais de 1.200 espécies e mais de 1.000 aplicações do bambu. Nas Américas, o Brasil é detentor da maior variedade de espécies de bambus nativos: 34 gêneros e 232 espécies. Por exemplo, no sudoeste da Amazônia, especialmente nos Estados do Acre e Amazonas, há respectivamente 70 mil e 20 mil Km² de bambus nativos inexplorados comercialmente. Se esse potencial for devidamente identificado, preservado e utilizado de forma sustentável, certamente esses Estados terão ganhos significativos em termos de desenvolvimento regional. No Brasil, o interesse pelo bambu é crescente. Verificam-se inúmeros grupos dedicados ao estudo, à aplicação e divulgação dessa matéria-prima como, por exemplo, o Instituto do Bambu em Alagoas, a Escola de Engenharia da UFMG em Minas Gerais, a ESALQ, o IAC e Escola de Engenharia da Unicamp no estado de S. Paulo, a FAU e o IB da UnB, o IBGE e o IBAMA do Distrito Federal, a Engenharia Civil da UFMS em Mato Grosso do Sul, a Arquitetura da UEG em Goiás, o Desenho Industrial e a Engenharia Civil da PUC no Rio de Janeiro, a UFAC no Acre e a UNESP em Bauru e Piracicaba no estado de S. Paulo. Muitos outros profissionais, grupos e até pequenas empresas públicas e privadas estão trabalhando pelo Brasil afora com os bambus nativos e os introduzidos que, por falta de uma associação nacional, permanecem desconhecidos do público em geral. Há que se destacar dentre esses esforços o portal do bambu sediado no Rio de Janeiro, o www.bambubrasileiro.com. Esse portal disponibiliza ao público em geral informações sobre o bambu e promove diálogos entre os pesquisadores, técnicos e profissionais entre si e desses com o público. No Diretório dos Grupos de Pesquisa da Plataforma Lattes do CNPq comparecem 5 grupos de pesquisa e 500 nomes de pesquisadores, profissionais e técnicos relacionados com o termo bambu. A inclusão do bambu nas cadeias de valor e produtiva tornará o nosso país competitivo em relação às nações industrializadas que não dispõem de um ativo natural tão versátil como esse nosso, que pode ser utilizado na alimentação, na construção, na produção de energia, na indústria, no artesanato e nos serviços ambientais. 1.1 Problemas ou ameaças que afetam o negócio do bambu no Brasil A percepção do público em geral a respeito do bambu ainda é restrita ao artesanato tradicional, associada à confecção de móveis e de peças de decoração. Concorrem para esse quadro inúmeras causas. Entre elas, há, por exemplo, a falta de massa crítica de pesquisadores, técnicos e profissionais.

11


As competências e as capacidades científicas, técnicas e culturais existentes no país acham-se dispersas. E, a industrialização do bambu no país é incipiente. Se o Brasil for comparado nesses termos com países asiáticos como a China, Índia e até mesmo com alguns países latino-americanos a exemplo do Chile, da Colômbia e do Equador, a situação se agrava. Há, na base dessa problemática, um conjunto de questões mais ou menos relacionadas entre si. Por exemplo, falta ao país uma prática corrente de agregação de valor a espécies vegetais e produtos estratégicos, tradicionais e históricos como é o caso do bambu. O país dispõe de pouquíssimas coleções dessa planta. Uma das exceções é o Instituto Agronômico de Campinas (IAC) do Estado de S. Paulo que possui uma coleção notável. Os parques de bambu para visitação pública inexistem. As informações sobre o bambu no Brasil são escassas. Não há dados estatísticos sobre as demandas socioeconômicas e o consumo dessa matéria-prima. Boa parte dos estudos existentes sobre o bambu que evidenciam a sua importância e o seu mérito científico, cultural e tecnológico está restrita ao âmbito acadêmico. Faltam ainda uma legislação sobre patentes, proteção de espécies estratégicas, incentivos fiscais e, principalmente, um modelo de desenvolvimento do bambu no país que leve em conta as suas peculiaridades. Por exemplo, o bambu é fonte de matéria-prima tradicional utilizada artesanalmente em produtos destinados aos afazeres domésticos e rurais e, ao mesmo tempo, na indústria, onde se verifica o emprego de tecnologia avançada para a produção de laminados e compensados. Nesse sentido, a constituição de uma Rede, além de ser oportuna, é, sobretudo, estratégica para o desenvolvimento do Brasil. Para agravar essa situação, não há comprometimento institucional de autoridades governamentais e universitárias, por exemplo, lideranças administrativas, reitores, coordenadores e diretores de cursos, com a formação de pesquisadores sobre esse ativo ambiental. Verifica-se que os estudos sobre o bambu no país são produzidos pelas universidades federais e pelos institutos de pesquisa envolvendo esporadicamente outros atores sociais. Se forem examinados esses estudos, grande parte deles não envolve a questão do desenvolvimento tecnológico e social e, tampouco, os mercados. Concorrem para essa situação três variáveis principais: Em primeiro lugar, a pouca expressividade do status nacional do bambu, em termos de P&D e Ciência e Tecnologia (C&T), nos cursos de pós-graduação onde, em geral, as pesquisas estão concentradas em pouquíssimos Estados do país. A divulgação pública dos resultados dessas pesquisas ocorre de modo disperso e restrito devido à falta de veículos exclusivos para esse fim. O modus operandi e a matriz de P&D do bambu no país são calcados na produção individual do pesquisador, técnico, ou da instituição promotora, apresentando pouca interface com as demandas sociais e, especialmente, com o setor produtivo e social. Esse modelo de P&D dispensa a prática de projetos cooperativos e ações transversais envolvendo diferentes capacidades científicas, culturais, profissionais e técnicas disponíveis no país. Em segundo lugar, não há, no Brasil, políticas específicas para o custeio de pesquisa e desenvolvimento tecnológico do bambu (P&D). Em contrapartida, há uma expressiva aplicação do bambu na produção de pasta celulósica para a fabricação de papel pelo Grupo João Santos, nos Estados de Pernambuco e Maranhão, que, entretanto, não contribui de forma significativa no cenário nacional de P&D. E, em terceiro lugar, falta uma estratégia de coordenação de ações e de projetos que considere o ciclo inteiro da cadeia produtiva e de valor do bambu. Essa visão holística deve relacionar a fase laboratorial com o desenvolvimento e o desenho do produto, com a inovação e a comercialização e, sobretudo, o usuário final. As demandas socioeconômicas do bambu pressupõem novos desafios como, por exemplo, maior agilidade, sustentabilidade e, sobretudo, inovação tecnológica. Nesse contexto, a competitividade do bambu e a atração de capital de risco para a sua inclusão econômica dependem, entre outros condicionantes, de uma mudança de paradigma. Essa mudança de paradigma implica o emprego intensivo de conhecimento tecnológico industrial e também artesanal na produção do bambu, tendo em vista a redução do consumo social e industrial de materiais não-sustentáveis. Nesse aspecto, o bambu oferece inúmeras vantagens sobre os produtos industriais correntes. Em suma, o bambu tem alto poder regenerativo, facilidade de colheita, transporte, armazenagem e meios de produção. As ações governamentais em nível federal e estadual voltadas para o bambu são, em contrapartida, ações contingenciais, esporádicas e isoladas não havendo entre elas nenhuma articulação. As consequências dessa falta de convergência são visíveis. Por um lado, o país deixa de usufruir de um dos recursos mais importantes de sua biodiversidade e, por outro lado, esse ativo ambiental tende a desaparecer com expansão da fronteira agrícola que se utiliza da derrubada das florestas para o cultivo na forma de monoculturas, como a soja, ou de pastagens para criação de gado bovino. Por outro lado, não há dados precisos nem informações disponíveis da situação do bambu no Brasil, especialmente sobre as suas reservas e aplicações. Por exemplo, na indústria da construção, o

12


bambu está ausente, não sendo considerado material construtivo. Provavelmente, concorre para esta situação a falta de normas técnicas para a sua efetiva aplicação nesse importante setor econômico. No Brasil, a indústria da construção é responsável pelo maior número de empregos diretos. Os programas governamentais e os da iniciativa privada do país voltados para a construção de casas econômicas não utilizam o bambu, mesmo sendo ele uma solução viável do ponto de vista ambiental, social, tecnológico e econômico para cobrir o deficit de habitação existente. A Colômbia e o Equador na América Latina já reverteram esse quadro. Nesses países, o bambu tem sido efetivamente empregado na construção de habitações populares, além de outros usos relevantes. Em síntese, para que o país possa redirecionar esse quadro adverso para a utilização do bambu nas suas principais atividades socioeconômicas, algumas decisões devem ser tomadas. Uma delas é a constituição de uma Rede Brasileira do Bambu voltada para a pesquisa e desenvolvimento tecnológico. Num cenário globalizado como o atual, as organizações em rede desempenham um importante papel na convergência dos mais diferentes atores (econômicos, sociais, ambientais, P&D, entre outros) em torno da cadeia produtiva do bambu.

2 DEFINIÇÃO E CAMPOS DE ATUAÇÃO (OU DEMANDAS SOCIAIS) DA REDE A Rede será uma organização social de natureza pública constituída por instituições públicas, não públicas e privadas, por um conjunto de meios (comunicação e informação, infra-estrutura e equipamentos) e de ações estratégicas voltadas para a articulação de esforços e, sobretudo, para a gestão cooperativa ou consorciada de projetos de P&D e C&T desenvolvidos por pessoal técnicoprofissional e pesquisadores vinculados às instituições associadas. Sua missão será, portanto, a de criar pontes e facilitar o intercâmbio entre as instituições associadas e os esforços de capacitação humana em ciência e tecnologia. A atuação da Rede englobará, além da ciência e do desenvolvimento tecnológico na forma de ações sistemáticas para aplicações do bambu pela sociedade, a qualificação e capacitação humana, a difusão cultural do bambu no Brasil e o desenvolvimento do artesanato brasileiro com o bambu. As principais modalidades de atuação externa da Rede serão os programas e projetos organizados de acordo com as demandas socioeconômicas e culturais, cujas ações envolverão setores produtivo e institucional de P&D, toda a cadeia produtiva, assim como os usuários finais com suas preferências e expectativas. As ações sistemáticas para aplicação do bambu poderão ocorrer por meio das seguintes formas: a) atividades de parceria do tipo plataforma, onde os setores envolvidos e articulados entre si, por exemplo, o setor público, produtivo e institucional, identificarão os problemas e definirão conjuntamente as demandas e prioridades de tecnologia e suas estratégias de atendimento; b) atividades cooperativas ou projetos cooperativos serão uma modalidade de trabalho pela qual a Rede buscará subvenções financeiras no setor público e privado para a execução daqueles projetos delineados pelas plataformas; c) ações experimentais ou projeto piloto serão voltadas para a avaliação de proposições e demandas "espontâneas" provenientes de pesquisadores, profissionais e da comunidade em geral. Essa modalidade de projeto estará voltada para a viabilização técnica daquelas demandas e sua inserção nos projetos cooperativos; d) ações de assistência técnica serão programas de apoio a diferentes atores sociais, especialmente as cooperativas e as pequenas e médias empresas de base industrial, tecnológica ou artesanal. Tais ações visam o plantio do bambu, a melhoria e sustentabilidade da sua aplicação nesse contexto e, sobremaneira, a introdução de inovação tecnológica proveniente das instituições de P&D, especialmente universidades e institutos de pesquisa; e e) as ações de capacitação humana acompanharão as demandas e as modalidades de projetos assinaladas anteriormente. Em linhas gerais, a atuação ou o papel da Rede visa sobremaneira aumentar a competitividade do bambu no mercado interno e externo de produtos naturais e, ao mesmo tempo, criar condições para a geração de emprego e renda para as populações pobres e marginalizadas. Entre as principais demandas sociais às quais a Rede dará especial atenção, destacam-se as seguintes: a) treinamento e capacitação - a Rede pretende atuar fortemente na formação, capacitação e qualificação de quadros técnico-científicos, de profissionais, artesãos e pesquisadores em todos os níveis. Merece especial atenção da Rede a divulgação de novos métodos de conservação, cultivo

13


e propagação dos bambus nativos e aproveitamento dos cultivados, dado que uma das limitações para a industrialização do bambu no Brasil é a indisponibilidade de matéria-prima; b) energia - a Rede dará ênfase ao aproveitamento da biomassa do bambu para conversão de energia para fins industriais e domésticos; c) meio ambiente (natural e criado) - uma das prioridades da Rede é a utilização do bambu como recurso florestal - por um lado, para a recuperação de solos e de áreas degradadas e, por outro lado, para o sustento e fonte de renda das populações que vivem nas reservas nacionais. Não menos importante é o emprego dessa matéria-prima no contexto urbano. Vale destacar temas como, por exemplo, o ciclo de vida e a sustentabilidade ambiental relacionados com a indústria da construção; d) saúde - uma das atuações prioritárias da Rede consiste na utilização do bambu para a melhoria das condições ambientais, especialmente na promoção de higiene e saúde humana e animal. Esse ativo ambiental tem sido empregado, com este propósito, nas áreas urbanas e rurais de muitos países. Um desses usos consiste no tratamento de efluentes sanitários e industriais (fitorremediação). Normalmente, o bambu é também empregado como barreira de contenção sonora (atenuação de ruídos) no caso dos aeroportos, e como agente de fixação de gás carbônico contribuindo para a despoluição ambiental.

3 PRINCÍPIOS NORTEADORES DA REDE 3.1 Interdisciplinaridade O bambu é uma matéria-prima transversal. Possui uma gama variada e ampla de aplicações como também de práticas profissionais especializadas. O estudo desse ativo ambiental requer sobremaneira o envolvimento de inúmeras áreas de conhecimento tais como a agronomia e engenharia florestal, as artes, o desenho industrial e a arquitetura, a biologia, a engenharia civil e a química. Entretanto, a confluência dessas áreas é uma necessidade não somente por esse motivo mas particularmente para a otimização da aplicação de recursos materiais e financeiros que, no Brasil, são escassos. 3.2 Adesão de instituições A Rede será composta por instituições que se vincularão a ela voluntariamente. Entretanto, os indivíduos (por exemplo, pesquisadores, profissionais, técnicos e artesãos) participarão dela por intermédio de suas instituições promotoras. 3.3 Divulgação ampla e domínio público de seus resultados As informações sobre as ações desenvolvidas, as decisões tomadas bem como os resultados alcançados pela Rede serão de livre acesso das instituições associadas e, sobretudo, do público em geral. Ressalta-se, porém, que os produtos desenvolvidos pela Rede com financiamento público serão de domínio também público, salvo casos onde houver sido estabelecido termo de compromisso entre a Rede e algum ente do setor produtivo para empreendimento de alguma ação exclusiva. 3.4 Definição de prioridades A escolha de projetos deverá ser feita em conformidade com o mérito da proposta e relevância segundo as demandas socioeconômicas, observando as espécies e produtos de bambu em que podem ser agregados valores estratégicos e regionais. 3.5 Bambu enquanto ativo natural A Rede adotará a abordagem sistêmica e co-evolutiva, idéia atribuída à Fundação Zeri (Zero Emissions Research and Iniciatives) na qual o bambu é considerado parte importante de um conglomerado de atividades socioeconômicas com vistas à construção de capital social. 3.6 Apoio aos usos históricos do bambu Merecerão atenção especial da Rede as comunidades tradicionais e étnicas (moradores da floresta, etnias indígenas, quilombolas, ribeirinhos, entre outras populações), pois elas são historicamente pioneiras no uso do bambu e outras fibras vegetais no Brasil. Há subjacente, especialmente nos usos artesanais que elas fazem dessas matérias-primas para a produção de habitações e utensílios domésticos e de trabalho, processos e técnicas originais que necessitam de proteção enquanto patrimônio histórico-cultural.

14


Observa-se, no entanto, que muitas dessas populações vivem em unidades de conservação ambiental onde há espécies de bambu que ainda não foram descritas cientificamente, documentadas e devidamente estudadas. 3.7 Proteção do patrimônio genético do país A Rede dedicará especial atenção aos bambus nativos. Entretanto, dará também ênfase à conservação dos bambus existentes no território nacional, especialmente àqueles da categoria de espécies raras, endêmicas e ameaçadas de extinção. Isto, entretanto, não significa descartar a possibilidade de a Rede vir a trabalhar com as espécies de bambu cultivadas no Brasil que são originárias de outros países, especialmente do continente asiático. Esses bambus foram introduzidos no Brasil ao longo de sua história, particularmente no seu período colonial. Eles se encontram adaptados, sendo a sua utilização um fato incontestável. 3.8 Atuação não exclusiva As atividades da Rede não serão limitadas a esta ou aquela categoria de instituição. A Rede trabalhará tanto com as solicitações provenientes dos setores produtivos empresariais e dos entes públicos quanto com as dos sindicatos, das associações de trabalhadores dos vários ramos econômicos e, também, das populações organizadas. 3.9 Regras claras de gestão e administração de conflitos de interesse A Rede terá um regimento interno e será administrada por um Conselho Gestor que, em regime paritário, cuidará de forma democrática dos seus recursos materiais ou físicos, imateriais e financeiros. Esse Conselho será eleito pelos componentes da Rede e terá alternância de representação e de coordenação.

4 OBJETIVOS DA REDE 4.1 Objetivo de longo alcance - horizonte A Rede, uma iniciativa de diferentes setores envolvidos e interessados na cultura e na difusão do bambu no Brasil, tem por objetivo o desenvolvimento do país e, especialmente, a melhoria de vida de sua população. 4.2 Objetivo geral Congregar interesses e articular demandas sobre o bambu, envolvendo instituições públicas e não públicas de pesquisa e desenvolvimento, ciência e tecnologia, de qualificação humana, e demais agentes sociais. Para isso, apoia-se em um sistema de comunicação, de competências e capacidades científicas, profissionais, tecnológicas, culturais, bem como de qualificação humana, em consonância com as demandas socioeconômicas. 4.3 Objetivos específicos: a) proporcionar condições organizacionais, operacionais, de qualificação humana, bem como de informação; b) dar especial atenção às interfaces entre a produção de conhecimento, a formação de quadros, o desenvolvimento tecnológico, com inovação das instituições de C&T e P&D, e as demandas típicas dos seguintes setores socioeconômicos: - setor produtivo (fabril e artesanal), o desenvolvimento tecnológico e sustentável da produção, - comunitário, a geração de emprego e renda, bem como o fortalecimento da economia local ou regional para a erradicação da pobreza e miséria, - terceiro setor, a disponibilização de informações articulando ações conjuntas de qualificação humana e assistência técnica a projetos de interesse social, - institucional ou governamental, a formulação de políticas públicas nacionais e regionais para a utilização sustentável do bambu nos serviços ambientais, c) incentivar pessoal técnico-profissional, pesquisadores e estudantes a buscarem novas formas de atuação utilizando-se de projetos cooperativos, interdisciplinares e interinstitucionais como, por exemplo, as parcerias, os consórcios e as plataformas.

15


Essas formas de trabalho visam sobremaneira estreitar os laços entre as atividades de P&D e a sociedade como um todo e, em decorrência disso, aumentar os aportes financeiros necessários à realização de projetos e outras ações; d) estabelecer convênios de intercâmbio técnico, científico e cultural com instituições de P&D e C&T (universidades, institutos e órgãos de fomento) objetivando o aumento de pessoal qualificado, a oferta de bolsas de estudo e, também, o número de patentes industriais; e) criar condições operacionais para a realização de cursos de pós-graduação interinstitucional e interdisciplinar, com o reconhecimento de créditos obtidos pelos estudantes em cursos de quaisquer estabelecimentos de pesquisa e ensino conveniados com a Rede; f) sensibilizar o Ministério da Indústria e Comércio (MIC) para a criação de normas para o emprego do bambu na indústria da construção, bem como nos demais setores produtivos, e o Ministério da Educação (MEC) para a inclusão de atividades com o bambu nos currículos escolares de ensino fundamental e básico; g) articular, com as agências de fomento do governo federal, programas de cooperação nacional e internacional de natureza técnica e científica, profissional, empresarial e cultural com instituições e países com alta competência científica e técnica em bambu; h) incentivar a proposição de programas de apoio ao artesanato nacional visando o aprimoramento de seus processos técnicos e organizacionais, a atualização de técnicas de produção, melhoria dos produtos e, sobretudo, possibilitar a formação de todos os envolvidos na cadeia produtiva.

5 IMPACTOS ESPERADOS DA REDE O principal impacto esperado da criação da Rede será especialmente a articulação das instituições de P&D com as cadeias de valor e produtiva do bambu a fim de que possa ser superado o quadro de problemas ou ameaças que inibem a cultura do bambu no Brasil. Imagina-se que essa congregação de esforços, de instituições e de meios na Rede impulsione a formação interinstitucional e, sobretudo, eleve a qualidade e a quantidade de profissionais envolvidos nessa matéria. Essa medida dará maior velocidade e uma nova sinergia na cadeia produtiva do bambu. A capacitação humana em combinação com investimentos na área certamente criarão condições propícias para que mais espécies nativas sejam catalogadas e estudadas. Uma oportunidade que se configura como viável para deslanchar essa atividade é o inventário florestal que o Brasil realizará nos próximos anos. A implantação da Rede poderá ainda desempenhar um papel estratégico no aumento da competitividade do bambu em termos econômicos nos mercados interno e externo. A Rede poderá também motivar e catalisar os interesses da sociedade para o aproveitamento do bambu. Num mundo globalizado como o atual, o conhecimento científico, o desenvolvimento tecnológico e a cultura são ingredientes importantes para sobrevivência dos países não centrais como o Brasil. Por meio da Rede, as instituições de P&D das regiões detentoras de importantíssimos recursos naturais, a exemplo dos Estados do Acre e do Amazonas, poderão levantar fundos para o financiamento de pesquisas e desenvolvimento tecnológico para o aproveitamento dos bambus. E, finalmente, por intermédio da Rede, eles poderão se consorciar com outras instituições nacionais e internacionais que detém know-how em bambu. A agregação de valor em produtos naturais é outra condição básica para se obter renda e gerar emprego. Assim, a Rede poderá implementar ações para viabilizar no país o bambu como material de construção acessível à população em geral. O campo de utilização do bambu na construção é enorme. O deficit brasileiro de habitações é da ordem de 10.000.000 de unidades. Essas ações não somente beneficiarão as populações que vivem no campo, mas, sobretudo, os favelados e os trabalhadores urbanos que vivem pessimamente na periferia das grandes cidades brasileiras. Como foi citado anteriormente, a Rede poderá ainda promover estudos em conjunto com as instituições públicas, particulares e de interesse social objetivando o uso ambiental dos bambus na recuperação de solos degradados, nos serviços ambientais voltados para a melhoria da qualidade de vida da população e, sobretudo, na criação de oportunidade de emprego e geração de renda para a sustentabilidade de populações carentes.

16


PARTE II: PROGRAMA DE IMPLANTAÇÃO DA REDE – BRASIL Esta seção apresenta os aspectos principais da proposta da Universidade de Brasília para a estruturação da Rede. A proposta, após ser discutida no Seminário Nacional, será desenvolvida e orçada pela UnB, em parceria com outras instituições nacionais. Posteriormente, a proposta será apresentada ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) para a implantação da Rede. Observa-se, no entanto, que a proposta contida neste documento não contém o orçamento relativo à implantação da Rede no prazo de dois anos. Porém, tal orçamento será definido e detalhado pela equipe técnica da Universidade de Brasília, tendo por base este documento e as sugestões do Seminário. Vale notar ainda que, no processo de planejamento da Rede, será assegurada a participação de instituições nacionais que serão convidadas pela UnB a fazer parte da equipe de planejamento e implantação da Rede.

6 METODOLOGIA DE IMPLANTAÇÃO DA REDE A consolidação de uma rede de pesquisa e desenvolvimento tecnológico voltada para o bambu num país com dimensões geográficas e enormes disparidades sociais como o Brasil exige uma boa estratégia de trabalho e, sobretudo, um planejamento rigoroso. Os desafios existentes no país não se limitam somente às suas grandes distâncias físicas. Mas envolvem outras dimensões ou disparidades não menos importantes entre a oferta de matéria-prima e a concentração de profissionais qualificados em determinadas regiões do país, especialmente nas regiões sul e sudoeste. Agrava essa situação o papel marginal ou inexpressivo que o bambu desempenha na pesquisa, qualificação humana e, sobretudo, economia nacional. A Universidade de Brasília, ciente dessas dificuldades, apresenta esta proposta de trabalho, uma proposta preliminar, para fazer frente àquelas dificuldades. O ponto central da proposta é a convergência de esforços, mediante a organização, ou melhor, a articulação em rede das capacidades científicas, técnicas e culturais existentes no país, em torno da idéia do ecodesenvolvimento do bambu. O atual momento no país é mais do que favorável à concretização dessa idéia, pois se verifica um crescente interesse e mobilização da sociedade brasileira pelo bambu. Algumas instituições públicas nacionais colocaram no rol de suas prioridades a utilização como, também, a proteção desse ativo ambiental. É o caso da Embrapa, que incluiu o bambu como uma das fontes energéticas para pesquisa, e do PNF do MMA que, por indicação da FAO/ONU, o colocou no inventário nacional das florestas nacionais. A implantação da Rede pela Universidade será conduzida de forma progressiva e interativa observando a incorporação pari passu de seus parceiros institucionais. No período de dois anos estabelecido pelo MCT para essa implantação, será realizado o planejamento geral, bem como a orçamentação das atividades que o comporão. Como foi ressaltado anteriormente, tal planejamento será feito em regime de parceria com instituições nacionais convidadas pela UnB. O MCT, ao solicitar à Universidade de Brasília a apresentação de uma proposta de Rede e sua organização, se comprometeu a disponibilizar recursos financeiros para a realização dessa tarefa. No ensejo, a UnB está criando um Centro denominado Centro de Pesquisa e Aplicação de Bambu e Fibras Naturais (CPAB), que coordenará e apoiará esses trabalhos. O processo de implantação da Rede deverá culminar com a instalação e a posse do conselho gerencial (Conselho Gestor) e da secretaria da Rede (Secretaria Executiva Administrativa e Técnica). A partir desse estágio, a Rede passará a administrar a si própria com plena autonomia. 6.1 Grupos de Trabalho para a Implantação da Rede A primeira medida administrativa a ser tomada pela Universidade de Brasília para dar início aos trabalhos de planejamento da Rede será a institucionalização de dois grupos de trabalho que funcionarão articulados entre si e sob a coordenação do Centro de Pesquisa e Aplicação de Bambu e Fibras Naturais (CPAB) da UnB. O principal objetivo desses grupos é, naquele prazo estipulado pelo MCT, criar as condições operacionais, administrativas e políticas para o funcionamento da Rede. Um desses grupos será denominado de Grupo Técnico 1 (GT1). Esse grupo cuidará principalmente dos aspectos administrativos e técnico-operacionais daquela implantação e terá um caráter transitório ou pro tempore. O GT1 será composto principalmente por técnicos e pesquisadores vinculados ao CPAB da UnB e preferencialmente residentes em Brasília. Isto se deve aos altos custos operacionais de deslocamento e, também, ao curto tempo para a implantação da Rede.

17


O outro grupo, o Grupo Técnico 2 (GT2) também pro tempore, será formado por representantes de instituições convidadas pela UnB, que poderão vir a ser os primeiros e futuros parceiros institucionais ou nós da Rede. O GT2 funcionará como uma equipe consultora da UnB e tratará ainda da articulação da UnB com as demais entidades envolvidas com o bambu no Brasil. Em apoio a esses grupos de trabalho está prevista a contratação de serviços técnicos especializados e de consultores para colaborarem com a UnB no projeto e na organização da Rede.

7 METAS E ATIVIDADES DA IMPLANTAÇÃO DA REDE Esta seção trata do programa de trabalho que os grupos referidos executarão para viabilizar o planejamento e a implantação da Rede. São também incluídas nela as metas de trabalho a serem cumpridas bem como as suas atividades. O número total de metas a serem cumpridas é de sete, quais sejam: 7.1 Primeira Meta: Implantação de infra-estrutura física, técnica e administrativa dos grupos de trabalho. 7.2 Segunda Meta: Elaboração de um plano de divulgação da Rede. 7.3 Terceira Meta: Estabelecimento de diretrizes para o estudo do estado da arte do bambu no Brasil 7.4 Quarta Meta: Organização de um diretório nacional de pesquisadores, técnicos, profissionais e artesãos do bambu com vistas à criação de bases para o estabelecimento de um programa de capacitação humana de nível técnico e de pós-graduação. 7.5 Quinta Meta: Criação de meios para a instalação do Conselho Gestor. 7.6 Sexta Meta: Definição de parâmetros e procedimentos para a organização de uma carteira de projetos. 7.7 Sétima Meta: Proposição de uma metodologia para o estabelecimento de um plano de assistência técnica abrangendo os setores comunitários e artesanais e os produtivos e industriais de pequeno e médio porte.

Descrição dessas metas e das atividades correspondentes: 7.1 Primeira Meta: Implantação de infra-estrutura física, técnica e administrativa dos grupos de trabalho Esta meta de trabalho tem por finalidade a criação de meios e condições físicas e humanas para o trabalho de implantação da Rede. Trata-se da instalação dos grupos de trabalho no CPAB/UnB. A Universidade de Brasília se apresenta como uma instituição adequada para sediar tal Secretaria do Programa. Ela se localiza na Capital Federal, região central do país, portanto equidistante das demais regiões do país. Além disto, a UnB, principal universidade pública federal da cidade de Brasília, dispõe de trabalhos desenvolvidos na área do bambu. Outra grande vantagem para a implementação do programa reside no fato de Brasília abrigar as instituições governamentais responsáveis pelas políticas públicas e pelo fomento da P&D e C&T no país. Soma-se a isto, o fato de a Universidade de Brasília ser uma das primeiras universidades do país em termos da alta qualidade técnica e científica de seus cursos, pesquisadores e técnicos. Em termos de atividades a serem realizadas nesta meta, destacam-se as seguintes: a) implantação de meios administrativos e operacionais como, por exemplo, a adequação dos ambientes existentes, montagem da equipe de apoio, aquisição de mobiliário, equipamentos (hardware) e programas (software) incluindo a sua manutenção, contratação de consultores e a organização de um programa de reuniões técnicas com instituições a serem envolvidas no trabalho; b) a elaboração de uma proposta orçamentária, além do planejamento geral da Rede, prevendo recursos financeiros para pessoal, custeio e capital; c) a elaboração de documentos para a criação da organização social, as minutas do regimento interno e dos manuais operativos no que tange ao Conselho Gestor e à Secretaria Executiva e, sobretudo, ao modus operandi da Rede.

18


7.2 Segunda Meta: Proposição de um plano de divulgação da Rede O objetivo desse plano é sensibilizar as instituições nacionais sociais e governamentais para a importância da Rede para o país e, sobretudo, atrair seus pesquisadores e pessoal técnico-profissional. Outro alcance desse plano é, por um lado, atingir as instituições de fomento e gerenciamento de pesquisa, desenvolvimento e formação humana e, por outro lado, atrair futuros parceiros de trabalho no sistema socioeconômico. Esta meta contará com as seguintes atividades: a) criação de um sistema "web" com a elaboração de um programa (software) para operacionalização da Rede bem como de uma página ou portal na rede internacional de informações (internet); b) criação de um boletim de âmbito nacional visando a edição de uma revista indexada da Rede. O boletim será uma publicação impressa e virtual. Terá a missão de divulgar o andamento dos trabalhos entre os participantes internos e externos da criação da Rede. Visa ainda estreitar os laços entre os grupos de trabalho e as instituições interessadas na criação da Rede. O boletim continuará a existir, mesmo com a publicação da revista indexada; c) planejamento, execução gráfica e envio de impressos e comunicações eletrônicas para as instituições públicas, privadas e do terceiro setor; d) definição de uma política de editorial para a publicação de obras relevantes como, por exemplo, manuais técnicos, folhetos, livros baseados em dissertações e teses sobre o bambu, entre outros.

7.3 Terceira Meta: Estabelecimento de diretrizes para o estudo do estado da arte do bambu no Brasil É uma das prioridades da Rede a divulgação de informações a respeito da situação do bambu no Brasil para, entre outras finalidades, embasar a tomada de decisões sobre projetos e demais atividades de formação humana do Conselho Gestor da Rede. Para isto, se faz necessário o conhecimento do estado da arte, isto é, a situação em que se encontra esse ativo ambiental no país. Essas informações servirão também às instituições nacionais para a caracterização das demandas bem como a definição de prioridades de investimento em termos de pesquisa e formação humana. Quanto às atividades relativas a esta meta, evidenciam-se as seguintes: a) elaboração de um termo de referência denominado Documento Básico de Levantamento, com definição de metodologia, de parâmetros e principais etapas de trabalho a serem empregados no diagnóstico ou estudo do estado da arte do bambu no Brasil. Esse documento se destinará às agências governamentais, comunitárias, ONGs bem como às demais entidades produtivas que estão envolvidas direta ou indiretamente com o bambu. Ele será avaliado em seminário nacional que terá a participação do conjunto de instituições envolvidas no negócio do bambu no Brasil; b) realização de Seminários e Encontros de Trabalho com a participação de consultores e instituições nacionais, por exemplo, CADE, CACEX, Embrapa, IBGE, IPEA, e outros especialistas em mercado. Deverá ser prevista a participação, nesses seminários e encontros, de especialistas internacionais provenientes de agências governamentais de países como a China, Colômbia e Índia para avaliação daquele Documento Básico. Este trabalho será publicado na forma de um livro. Esse livro terá indicadores metodológicos para a avaliação socioeconômica, ambiental (ecologia e biodiversidade), técnica, científica e cultural do bambu no Brasil e, também, para determinação de prioridades e demandas de P&D provenientes dos setores socioeconômicos brasileiros.

7.4 Quarta Meta: Organização de um diretório nacional de competências relativo à pesquisadores, técnicos, profissionais e artesãos sobre o bambu, objetivando a criação de um programa de capacitação humana desde o nível técnico até cursos de pósgraduação Esse diretório nacional será organizado com base na Plataforma Lattes do CNPq e outras fontes de informação governamentais com vistas a criar na Rede dois núcleos com foco centrado no bambu. São eles os Núcleos de P&D e de Formação Humana, à semelhança dos que existem em países desenvolvidos como, por exemplo, os Estados Unidos. Os núcleos tratarão ainda da organização de projetos e ações cooperativas para o intercâmbio técnico, científico e cultural do Brasil com países mais avançados na utilização do bambu.

19


Esses núcleos serão formados por representantes de instituições públicas e particulares de pósgraduação (pesquisa, desenvolvimento tecnológico e humano) as quais integrarão o programa. Sua função principal é a articulação ou a convergência, em nível nacional, de grupos de pesquisa e de capacitação humana sobre o bambu. Os núcleos se responsabilizarão pela elaboração de programas de pesquisa e desenvolvimento como também pela prática corrente internacional do reconhecimento de créditos a estudantes de pósgraduação (mestrado e doutorado) afora a organização de encontros periódicos e a divulgação de informações geradas por essas atividades. O núcleo destinado a qualificação humana se articulará com os programas e cursos de graduação e pós-graduação das universidades e dos centros de pesquisa. Essa articulação se dará por meio de acordos e convênios firmados pela Rede com as instituições responsáveis por tais programas. As disciplinas que comporão os cursos serão ofertadas em conjunto pelas instituições associadas à Rede e, quando da sua execução, poderão apresentar-se como atividades presenciais ou à distância. As matérias principais que comporão os currículos desses cursos serão provenientes de áreas como, por exemplo, arquitetura, administração, agronomia, artes, desenho industrial, biologia, engenharia civil e florestal, informática e química. Uma das principais atividades do Núcleo de Capacitação é a promoção de cursos de capacitação e de divulgação técnico-científica e cultural sobre o bambu, para pesquisadores nacionais, internacionais, assim como para a população em geral. Essas ações certamente envolverão o estabelecimento de cooperação técnica, cultural e científica com universidades e institutos nacionais e estrangeiros de pesquisa e qualificação humana. As atividades de pesquisa e capacitação dos Núcleos se utilizarão da infra-estrutura instalada, especialmente a de pessoal, de comunicação e infra-estrutura física dos programas de pós-graduação existentes, respeitando a sua autonomia. Em termos de atividades, a instalação dos Núcleos será precedida pela elaboração de um documento básico contendo o programa, as diretrizes, o orçamento financeiro e os meios necessários para a sua instalação. O documento conterá indicações preliminares sobre programas de pós-graduação (mestrado, doutorado e pós-doutorado) das universidades e dos centros de pesquisa públicos e particulares nacionais e internacionais e de interesse da Rede, para a montagem do programa de cooperação técnicocientífica. Serão também incluídos nessa sondagem programas governamentais como, por exemplo, do Ministério da Ciência e Tecnologia (CNPq), Ministério da Educação (CAPES) e das Relações Exteriores voltados para o apoio institucional e financeiro (fomento) à pesquisa e qualificação de estudantes, pesquisadores e pessoal técnico-profissional, por meio de ações interinstitucionais.

7.5 Quinta Meta: Criação de meios para a instalação do Conselho Gestor Como foi acentuado anteriormente, a gestão do programa será paritária assim como a avaliação, o acompanhamento de suas atividades e a seleção dos projetos que farão parte da carteira da Rede. A sua coordenação e o seu gerenciamento ficarão sob a responsabilidade de representantes eleitos pelas instituições integrantes do programa, oriundas dos setores comunitário, governamental, nãogovernamental e produtivo. Esses representantes constituem o Conselho Gestor, que gerenciará a Rede com base no regimento citado anteriormente. Esse Conselho terá a incumbência, por exemplo, de estabelecer prioridades da Rede bem como analisar o mérito dos projetos de pesquisa e desenvolvimento tecnológico a serem incluídos na sua carteira de projetos para a obtenção de apoio dos órgãos de fomento e financiamento. E cuidará ainda dos convênios para a realização de cursos e de processos de patentes, assim como da proteção de seus direitos e propriedades intelectuais de acordo com as normas vigentes para a propriedade intelectual. Em termos de atividades para a instalação do Conselho Gestor da Rede, os grupos de trabalho elaborarão uma minuta de regimento interno estabelecendo os critérios de adesão à Rede. Para tanto, serão promovidas reuniões com instituições que potencialmente comporão a Rede. Nesta primeira reunião, representantes de alta competência nacional em P&D, C&T e produção industrial e artesanal, convidados pela Universidade de Brasília, elegerão o primeiro Conselho da Rede. Este, por sua vez, deliberará sobre a natureza de organização social e dispositivos administrativos e operacionais da Rede.

20


7.6 Sexta Meta: Definição de parâmetros e procedimentos para a organização de uma carteira de projetos Essa carteira de projetos dará ênfase à inovação tecnológica no atendimento das demandas apresentadas pelos setores social e produtivo. Complementarmente, esses projetos contribuirão para a manutenção das atividades da Rede. A consecução desta meta pressupõe as seguintes atividades: a) elaboração de um termo de referência para a montagem de plataformas de trabalho, envolvendo integrantes dos setores social e econômico, e de instituições de P&D para a indicação de áreas e produtos potenciais e prioritários para a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico; b) montagem de um documento para a avaliação do potencial humano existente no país em termos de qualificação, capacitação e quantidade de pesquisadores e pessoal técnico-profisissonal. Nessa avaliação deverá ser incluído o exame das tendências evolutivas do setor com base no Currículo Lattes do CNPq, no banco de teses da Capes e nas informações disponibilizadas pelos programas de pós-graduação das universidades e dos institutos de pesquisa, E, também, a criação de um instrumento para levantamento das condições ambientais e operativas da infra-estrutura instalada, considerando-se laboratórios, oficinas, bibliotecas, entre outros.

7.7 Sétima Meta: Proposição de uma metodologia para o estabelecimento de um plano de assistência técnica direcionado para os setores comunitário e artesanal extensivamente para os setores produtivo e industrial (pequenas e médias empresas) A assistência técnica a ser desenvolvida pela Rede será uma atividade com duplo objetivo. Em primeira mão, a assistência técnica visa a introdução de tecnologias inovadoras no meio social. Em segunda mão, a Rede procurará, com essa atividade, complementar a sua manutenção, em termos financeiros. A Rede, portanto, apoiará iniciativas sociais focadas em problemas relevantes e localizadas em regiões estratégicas do país. Tal ação poderá ainda ser configurada como projeto piloto da Rede para os setores sociais interessados na iniciativa. Quanto às atividades a serem executadas para o cumprimento desta meta, há, por exemplo, a realização de um termo de referência objetivando orientar a Rede na sua tomada de decisões sobre o plano de assistência técnica. A montagem desse termo de referência contará com a participação de consultores e especialistas convidados. Entre os seus principais itens há, por exemplo: a proposição de um plano de divulgação nacional de assistência técnica da Rede, a realização de um cadastro das entidades acompanhado dos critérios de seleção de projetos e das iniciativas socioeconômicas envolvidas.

8 SUSTENTABILIDADE FINANCEIRA DA REDE O fundo para a manutenção das atividades da Rede contará, em termos de antevisão, com as seguintes proposições de fontes orçamentárias: a) Quanto a P&D e capacitação humana (treinamento e especialização de estudantes, pesquisadores, pessoal técnico-profissional, artesãos entre outros agentes), a Rede poderá contar com os programas de apoio à realização de eventos (conferências, encontros, mesas-redondas, seminários e exposições) e atividades formadoras (bolsas de pesquisa), e com as agências locais responsáveis pelo fomento de P&D regional, a exemplo da FAPDF de Brasília, da FAPESP de S. Paulo e da FUNTAC do Acre. A Rede contará também com programas de apoio à pesquisa provenientes de instituições nacionais como, por exemplo, o CNPq e outras secretarias ministeriais responsáveis pelos fundos setoriais de P&D. Entretanto, no âmbito internacional, a Rede buscará apoio de programas internacionais para a transferência, intercâmbio e de cooperação técnica e científica envolvendo estudantes de graduação (iniciação científica) e de pós-graduação (mestrado, doutorado e pósdoutorado), pesquisadores e pessoal técnico-profissional. b) Quanto à implementação do negócio do bambu no setor produtivo brasileiro, a Rede contará com recursos complementares de sua carteira de projetos. Essa carteira visará as empresas públicas e privadas de pequeno, médio e grande porte segundo a Lei da Inovação Tecnológica. O estabelecimento de contratos de prestação de serviços incluirá, além das empresas nacionais que atuam no meio ambiente, os governos municipais.

21


Por exemplo, um programa que poderá ser objeto desses contratos é aquele que trata das ações compensatórias com a utilização do bambu. Além dos serviços ambientais voltados para a melhoria das condições físicas ambientais do lugar, o bambu promove a geração de emprego e renda para as populações afetadas. A Rede poderá contar ainda com a negociação, com o setor produtivo, de patentes desenvolvidas pelas instituições associadas a ela. Outra fonte de recursos, não menos importante, será o intercâmbio técnico, científico e cultural, e de capacitação humana com órgãos federais que lidam com populações especiais a exemplo da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) do Ministério da Justiça (MJ), do Instituto Nacional de Colonização Agrária (INCRA) do Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA) e da Secretaria Nacional de Habitação (PBQPHabitat) do Ministério das Cidades (MCidades). c) Quanto à cooperação internacional especialmente com países afiliados à International Network of Bamboo and Rattan (INBAR), essas atividades poderão contar com o suporte de editais do CNPq por meio da Assessoria de Cooperação Internacional-Ascin e dos programas da Agência Brasileira de Cooperação do Ministério das Relações Exteriores. d) Quanto à manutenção administrativa da Secretaria da Rede, a complementação das despesas com pessoal administrativo, material permanente e de consumo, deslocamentos (diárias e passagens) entre outros gastos operacionais como, por exemplo, a manutenção do programa, da página (internet), da revista indexada e compra de software, a Rede poderá contar com as seguintes fontes de recursos: - o provável apoio da instituição que sediará a Secretaria da Rede, no caso, a Fundação Universidade de Brasília (FUB), - outros instrumentos de financiamento de agências públicas como, por exemplo, o CNPq, a Fundação do Banco do Brasil, Furnas e Petrobrás, e, - a publicação de livros e manuais técnicos provenientes de estudos realizados pelas instituições associadas especialmente por seus pesquisadores e pessoal técnico-profissional. Brasília, 06 de setembro de 2006 - atualizado em dezembro de 2010

22


3 CONCLUSÕES DOS GRUPOS DE TRABALHO 3.1 APRESENTAÇÃO DA PROPOSTA DA REDE BRASILEIRA DO BAMBU Jaime Gonçalves de Almeida – Cantoar/FAUUnB 3.2 GRUPO DE TRABALHO 1 – GT1 Objetivo: Obter subsídios para a elaboração da estratégia de atuação da Rede Moderação: Maria Odília Andrade Ribeiro de Oliveira PROPOSTAS PARA A REDE Ao realizar o fechamento das propostas para a Rede, os participantes do grupo consideraram que não havia sentido em dividi-las em “meio ambiente” e “cadeia produtiva”, mas que seria mais apropriado trabalhar ambos os itens de forma conjunta. Foram elas agrupadas em temas, com sugestões de respectivas ações. Os temas propostos foram: produção e disseminação de informações de P&D, estabelecimento de políticas públicas, proposição de normas técnicas, formação de técnicos e pesquisadores, matéria-prima suficiente, disponibilização de incentivos, e reflorestamento de matas ciliares e recuperação de áreas degradadas. A seguir, estão apresentadas as ações relativas a cada tema: A) Produção e disseminação de informações – P&D a) criar banco de dados que dê suporte técnico à difusão do bambu; b) elaborar normas de manejo em reserva legal e APP; c) criar Centro de Referência de Informações; d) manter maior intercâmbio de informações para evitar duplicação de estudos e potencializar resultados; e) criar ferramentas de mídia acessíveis a não especialistas; f) criar um fundo de divulgação para publicações em revistas e jornais de grande circulação; g) elaborar cartilhas e manuais sobre o bambu; h) realizar periodicamente seminários e feiras do bambu; i) participar de eventos e feiras com stands da Rede; j) fazer o marketing do bambu do Brasil. B) Estabelecimento de políticas públicas a) b) c) d) e)

sensibilizar dirigentes governamentais, empresariais e de bancos; fornecer suporte técnico aos gestores de políticas públicas; apoiar centros de pesquisa existentes; obter que agências de fomento façam editais específicos para o bambu; buscar integração com redes internacionais.

C) Proposição de normas técnicas a) propor normas técnicas de uso do bambu. D) Formação de técnicos e pesquisadores a) fazer gestões no sentido de que seja introduzido o ensino do uso do bambu a partir do ensino fundamental; b) formar profissionais em bambu no nível técnico e universitário, incluindo pós-graduação; c) incentivar o desenvolvimento de pesquisas científicas e operacionais; d) obter acordo com o MEC para que seja introduzido o ensino de técnicas não convencionais de construção no ensino universitário. E) Matéria-prima suficiente a) identificar e mapear espécies e populações existentes em todo o país; b) ampliar a área de plantio do bambu.

23


F)

Disponibilização de incentivos a) identificar instituições que possam introduzir a questão do bambu em seu escopo de trabalho; b) obter linhas de crédito; c) buscar financiamento externo.

G) Reflorestamento de matas ciliares e recuperação de áreas degradadas a) indicar o bambu como alternativa para reflorestamento de matas ciliares e recuperação de áreas degradadas. H) O grupo deixou ainda registrada a seguinte recomendação: a) I)

que a Rede seja um órgão certificador.

Estabelecimento de Prioridades a) b) c) d) e) f) g)

matéria-prima disponível; produção e disseminação de informações; estabelecimento de políticas públicas; formação de técnicos e pesquisadores; incentivos disponibilizados; proposição de normas técnicas; reflorestamento de matas ciliares e recuperação de áreas degradadas.

3.3 GRUPO DE TRABALHO 2 – GT2 Objetivo: Obter subsídios para elaboração da estratégia de atuação da Rede e propiciar o intercâmbio e a troca de informações Moderação: Tatiana Espíndola PROPOSTAS PARA A REDE A) Normatização e legislação a) catalogar normas existentes; b) criar banco de dados sobre bambu e disponibilizá-lo na Rede; c) instituir um comitê nacional interdisciplinar dos agentes envolvidos para discussão e desenvolvimento de normas técnicas, com a participação da ABNT; d) realizar workshops via web para reciclar conhecimentos e informações sobre legislação; e) articular ou adequar a legislação específica para a utilização do bambu em replantio, áreas degradadas, fomento, agrofloresta, construção, crédito de carbono, carvão vegetal, proteção e outros usos sustentáveis; f) apoiar a continuidade do trabalho da Associação Brasileira de Materiais e Tecnologias NãoConvencionais (ABMTENC), fomentando a participação de pesquisadores. B) Meio Ambiente a) b)

desenvolver cartilhas específicas de plantio e manejo das diferentes espécies de bambu; formar e capacitar técnicos especializados para atuarem como multiplicadores.

C) Fomento (criação de linhas de crédito, incentivos e tecnologia) a) estimular a implantação de políticas de fomento para o desenvolvimento da cadeia produtiva do bambu.

24


D) Qualificação e Tecnologia a) disponibilizar as informações sobre os bambus para os centros de assistência técnica (Emater, Embrapa, entre outros); b) absorver tecnologia, adequar e desenvolver equipamentos e ferramentas considerando a realidade brasileira, por meio de parcerias. E)

Educação a) estimular o uso do bambu utilizando protótipos multidisciplinares (exemplos); b) propiciar a mudança de paradigmas relativos ao bambu; c) instituir a semana nacional de bambu a ser realizada anualmente para mobilizar entidades e a sociedade, em benefício da difusão e popularização do bambu; d) aproximar a sociedade dos bambus, incentivando campanhas educacionais nas escolas, assentamentos, e universidades; e) articular, estimular e apoiar a realização de cursos técnicos de capacitação profissional, formando profissionais para o mercado de trabalho.

F)

Produção e Beneficiamento a) fomento do plantio do bambu em pequena, média ou larga escala de forma sustentável, com suporte técnico; b) definir diretrizes para elaboração de planejamento estratégico capaz de identificar e organizar os atores da cadeia produtiva, incentivando demandas por regiões; c) estimular a cadeia produtiva do bambu em todas as etapas.

G)

Pesquisas a) fazer mapeamento e inventário das espécies, áreas de ocorrência natural, viveiros, áreas potenciais, bancos genéticos, entre outros; b) criar biblioteca virtual no portal da Rede para divulgação da produção do conhecimento (artigos, teses, revistas, etc); c) articular, junto às agências de fomento como CNPq, Embrapa, Capes, a criação de uma linha de pesquisa do bambu, com enfoque nas áreas de produção, mercado, agregação de valor, certificação, e outras; d) articular, junto ao CNPq, o uso das bolsas de extensão para pesquisas com o bambu; e) realizar encontros, seminários, congressos e fóruns para divulgação das pesquisas.

H)

Comercialização a) definir diretrizes para elaboração de planos de marketing dos usos do bambu, considerando a sustentabilidade ambiental e as especificidades para a utilização de cada espécie.

I)

Síntese das ações a) articular, estimular e apoiar a realização de cursos técnicos de capacitação profissional, formando profissionais para o mercado de trabalho; b) formar e capacitar técnicos especializados para atuarem como multiplicadores; c) fazer mapeamento e inventário das espécies, áreas de ocorrência natural, viveiros, áreas potenciais, banco genéticos; d) articular o uso das bolsas de extensão do CNPq para pesquisas com o bambu; e) estimular a implantação de políticas de fomento para o desenvolvimento da cadeia produtiva do bambu; f) instituir a semana nacional de bambu a ser realizada anualmente, para mobilizar entidades e a sociedade, em benefício da difusão e popularização do bambu; g) propiciar a mudança de paradigmas relativos ao bambu; h) definir diretrizes para elaboração de planejamento estratégico capaz de identificar e organizar os atores da cadeia produtiva, incentivando demandas por regiões; i) desenvolver cartilhas especificas de plantio e manejo das diferentes espécies de bambu; i) instituir um comitê nacional interdisciplinar dos agentes envolvidos para discussão e desenvolvimento de normas técnicas, com a participação da ABNT;

25


j) realizar encontros, seminários, congressos e fóruns para divulgação das pesquisas; k) realizar workshops via web para reciclar conhecimentos e informações sobre legislação; l) articular ou adequar a legislação específica para a utilização do bambu em replantio, áreas degradadas, fomento, agrofloresta, construção, crédito de carbono, carvão vegetal, proteção, e outros usos sustentáveis; m) absorver tecnologia, adequar e desenvolver equipamentos e ferramentas considerando a realidade brasileira, por meio de parcerias; n) apoiar a continuidade do trabalho da ABMTENC, fomentando a participação de pesquisadores; o) aproximar a sociedade aos bambus, incentivando campanhas educacionais nas escolas, assentamentos e universidades; p) articular, junto às agências de fomento como CNPq, Embrapa, Capes, a criação de uma linha de pesquisa do bambu, com enfoque nas áreas de produção, mercado, agregação de valor, certificação, e outras; q) catalogar normas existentes; r) criar um banco de dados sobre bambu e disponibilizá-lo na Rede; s) criar uma biblioteca virtual no portal da Rede para divulgação da produção do conhecimento (artigos, teses, revistas, etc); t) definir diretrizes para elaboração de planos de marketing dos usos do bambu, considerando a sustentabilidade ambiental e as especificidades para a utilização de cada espécie; u) disponibilizar as informações sobre os bambus aos centros de assistência técnica (Emater, Embrapa); v) estimular a cadeia produtiva do bambu em todas as etapas; w) estimular o uso do bambu utilizando protótipos multidisciplinares; x) fomentar, com suporte técnico, o plantio em pequena, média ou larga escala de forma sustentável.

26


4 ARTIGOS SOBRE BIODIVERSIDADE E ECOLOGIA 4.1 A GIANT NEW GUADUA (POACEAE: BAMBUSOIDEAE) FROM CENTRAL BRAZIL Tarciso S. Filgueiras1, Ximena Londoño2

Resumo Descreve-se e ilustra-se uma nova espécie de Guadua Kunth (G. magna Londoño & Filg.), proveniente do Estado de Goiás. A nova espécie é morfologicamente próxima a G. chacoensis (Rojas) Londoño & P.M. Peterson e G. angustifolia Kunth, porém difere em vários caracteres vegetativos. Conhecida regionalmente como “taquaruçu”, esta guadua gigante (12.6-23.4 m x 6-13 cm) é usada para várias finalidades no meio rural onde ocorre. São apresentados dados ecológicos sobre a espécie, discutidos aspectos conservacionistas e as pesquisas atualmente em andamento sobre a nova espécie. Palavras-chave: Gramíneas. Gramineae. Bambu. “Taquaruçu”. Goiás. Campos Verdes. Santa Teresinha de Goiás. Flora do Estado de Goiás. Abstract A new species of Guadua Kunth (G. magna Londoño & Filg.), from the state of Goiás, Brazil, is described and fully illustrated. The new species is morphologically close to G. chacoensis (Rojas) Londoño & P.M.Peterson and G. angustifolia Kunth but they differ by a series of morphological traits. Locally known as “taquaruçu”, this new giant guadua (12.6-23.4 m x 6-13 cm) is widely used in the rural areas where it occurs. Ecological data on the new species are presented, conservation issues and the ongoing research projects dealing with the new species are discussed. Key words: Gramineae. Grasses. Bamboo. “Taquaruçu”. Goiás. Campos Verdes. Santa Teresinha de Goiás. Flora of Goiás.

INTRODUCTION Guadua Kunth is the third largest bamboo genus in Brazil (FILGUEIRAS; SANTOS-GONÇALVES, 2004) with about 24 described species (LONDOÑO; JUDZIEWICZ, 1991; LONDOÑO, 1992; JUDZIEWICZ et al., 1999) plus a few undescribed ones (LONDOÑO, unpublished data). Field work conducted in 2003-2004 in central Brazil yielded yet another undescribed species, a giant plant, locally known as “taquaruçu”, which is herein described as new to science, albeit in its vegetative state. The new species is fully illustrated. Guadua magna Londoño & Filgueiras sp.nov. Type. BRAZIL. Goiás: Campos Verdes, 14º18'45”S-49º33'24” W, margem de Mata de Galeria. Bambu arbóreo, formando touceiras densas, colmo lignificado, armado, 15-23 m de compr., verde, com manchas brancas nos nós, altitude 351 m, 20 de julho de 2004. Leg. T.S. Filgueiras, R. Magno & L. Roitman 3667 (holotype: IBGE; isotypes: K, ICN, ISC, MO, SP, TUL, US). Figures 1-3. Haec species nova Guaduae chacoensi (Rojas) Londoño & P.M. Peterson et G. angustifoliae Kunth magnitudine culmorum, ramis basalibus spinescentibus et longis, brunneis, triangularibus, hispidis, persistentibus culmorum foliis similis, sed culmorum diam.minore (6.3-13 cm), ligula interna foliorum culmorum curvata, ciliata, leviter ad fortiter asymmetrica, ante margines terminata (rare margine singuli terminata), pseudopetiolis infra et supra glabris, vaginis foliorum culmorum 1-6 auriculis munitis distincta. Synflorescentia autem desiderata. Woody, armed bamboo, culms closely together, resulting in a congested clump, the clumps 3.1032.5 m around, with 56-77 culms. Rhizomes sympodial, strongly pachymorph, characteristically crocodiliform, i.e., tapering at the extremities and expanded at about the middle, 30.8-55.2 cm x 12.7-17.5 cm, often with a few branches coming out of the ground and functioning as butresses. Culms 12.6-23.4 m (-25 m) tall, 6.3-13 cm in diam., erect, green to yellowish when exposed to the sun, with whitish to dark, irregular waxy spots; internodes cylindrical, 7.6-30.4 cm long, hollow, initially covered with brown, irritating hairs, then glabrous, with thick walls, the walls 1.2-3.1 cm thick; presence of typical white markings just below the nodes; nodes solitary, glabrous, the lower ones with adventitious roots, the nodal line horizontal to slightly curved; supra and infra nodal lines present; bud solitary. Thorns 1-3 (-4) per node, rigid, erect to curved, tapering, 1.3-4.5 cm long, with 1-5 “nodes”. Culm leaves coarse, conspicuous, dark brown, broadly triangular, persistent or tardily deciduous, the basal ones rotting in place with their bases remaining 1 Reserva Ecológica do IBGE, CX.P. 08770, Brasília-DF 70312-970. E-mail: (tfilg@uol.com.br). 2 Instituto Vallecaucano de Investigaciones Científicas- INCIVA, Apartado Aéreo 5660, Cali, Colombia.

27


attached to the nodal line, the outer surface covered by hispid, irritating hairs, inner surface glabrous, shining, 65.2-80.1 cm x 40.1-50.5 cm at mid culm; sheaths 59.1-63.8 x 40.1-50.5 cm, strongly striate, the margins ciliate to glabrous; external ligule none; inner ligule membranous, curved, slightly to strongly asymmetrical, c.1 mm long, ciliate at the apex, not ending before the margins, rarely ending at one margin only; auricles none, external appendages none; blades erect, triangular, 6.1-16.3 cm x 7.2-11.6 cm, strongly striate, dark brown, outer surface covered with dark, irritating hairs to glabrescent, rough, inner surface strongly striate, rough, margins ciliate to glabrous; fimbriae none. Branching intravaginal, subintended by a series of prophyllla; prophylla 3-5 cm long, strongly 2-keeled, conspicuously ciliate along the keels, the outer surface glabrous to pilose, the inner surface glabrous and conspicuously cross-veined; branch complement with 1-4 branches; lower branches short and thick, bent downwards then, progressively becoming longer, thinner and upright, reaching c. 90ยบ at about mid-culm, the upper ones reaching 10ยบ-82ยบ; first-order branches 3.80-8.20 m long, covered with whitish to dark, irregular waxy spots, one side flatish, provided with 18-52 nodes; second-order branches 23-280 cm long, covered with whitish to dark, irregular waxy spots, one side flatish, provided with 9-25 nodes; third-order branches 3-97 cm long, with 3-12 nodes; fourth-order.branches, if present, 2.1-3.2 cm long, with 1-3 nodes. Foliage leaves 28 per branch, commonly 4-5, appearing only on third or fourth-order branches; lower foliage leaves readily deciduous. Pseudopetiole, minute, 0.5-2 mm long, glabrous on both surfaces; leaf-sheaths tightly attached to the culm branch, 2.8-4 cm long, glabrous, shinning; external ligule present; inner ligule c.1 mm long, membranous, apex ciliate; lateral appendages 1-6 mm long, pale to yellowish; pseudopetiole 0.5-2 mm long, glabrous on both surfaces; blades linear to linear-lanceolate, 11.1-15.5 cm x 6-11 mm (-20.1-21-1 cm x 28-38 mm), strongly striate, central nerve prominent, lateral nerves closely packed along one margin, surface rough, glabrous to sparingly glabrescent on both surfaces, base narrowly cuneate, apex longacuminate to acute. Synflorescences not seen.

Figure 1. Guadua magna: A. Rhizome and culm base. B. Middle portion of the culm. C. Nodal area. D. Nodal area with branch complements. E. Nodal area with 2 thorns. F. Branch fragment showing nodes with 2-3 thorns. G. Culm leaf (abaxial view, a. sheath margin, b. internal ligule not ending at the sheath margin. H. Culm leaf (adaxial view), a trichomes. I. Upper portion of a culm leaf, showing upper portion of sheath, inner ligule, and blade (abaxial view). Based on Filgueiras et al 3667.

28


Figure 2. Guadua magna: A. Fragment of a branch complement with foliage leaves. B. Nodal area of a 3rd order branch complement with a thorn at the base. C. Upper portion of a blade of a foliage leaf. D. Middle portion of a blade of a foliage leaf. E. Upper portion of a foliage leaf showing sheath, inner ligule, pseudopetiole and base of the blade. Based on Filgueiras et al 3667.

Figure 3. Seedlings of Guadua magna: A. Habit (note the rhizobia-like nodules attached to the roots). B. Fragment of a culm and leaf, showing the upper portion of a sheath, conspicuous fimbriae, pseudopetiole, and the base of a blade. C. Less developed seedling with spikelet parts still attached to it. D. Part of the root system of seedling in Fig 3A, showing rhizobialike nodules magnified. Based on Filgueiras et al. 3684 (IBGE).

29


Table 1. Comparison of morphological features of Guadua angustifolia, G. chacoensis and G. magna. Character

G. chacoensis

G. magna

G. angustifolia

Culm size

10-20 m x 8-15 cm

12-25 m x 6-13 cm

15-25 m x 10-20 cm

Internode

15-40 cm

7-31 cm

12-40 cm

Inner ligule of culm leaf

Slightly curved and ending at the margins.

Curved, slightly to strongly asymmetrical.

0.8-1 mm long, ciliolate

ca. 1 mm long, ciliate, ending at the margins (rarely ending at one margin only)

Convex and ending before the margins. 1-2.5 mm long, ciliate

Pseudopetiole

2-3 mm, addax. Pilose to glabrous; abaxially glabrous.

Glabrous

2-5 mm, adaxially. short pubescent; abaxially glabrous

Blade size of foliage leaves

10-24 cm x 5-25 mm

11-15.5 cm x 6-11 mm

11-21 cm x 10-20 cm

L:W ratio

11-26:1

2.5-18: 1

5-18:1

Form (blade of foliage leaves)

Linear

linear to linear-lanceolate

Linear to lanceolateovate

Adaxial surface

Glabrous to sparsely hispid, the Glabrous to sparingly hairs 0.5-1 mm long glabrescent

With a few fine, hyaline hairs below and thick, sparse, hyaline hairs above.

Abaxial surface

Glabrous with sparsely coarse, rigid, hyaline hairs mainly along the midnerve

Glabrous to sparingly glabrescent

With scattered, strigose hairs ca. 1 mm long on both surfaces.

Sheath of foliage leaves

Non auriculate

Auriculate, 1-6 mm long

Non auriculate

1 DISCUSSION 1.1 AFFINITIES The species of Guadua are generally recognized by a combination of vegetative and reproductive characters where the sinflorescences play an important role. Although this new species is known only in its vegetative state, it has a combination of vegetative features that distinguish it from all the other 35 species in the genus. Amongst others, the most evident ones are: a) a big size culm, up to 25 m tall and up to 13 cm in diameter, with internodes 7-31 cm in length; b) the branch complement with 1-4 branches per node, reaching 90Âş at mid-culm and with the basal branches solitary and thorny; c) the huge culm leaves, 65-80 x 40-50 cm, and the 1/3 basal ones rotting in place with their bases remaining attached to the nodal line; d) a pseudopetiole 0.5-2 mm long, adaxially, and abaxially glabrous e) the blades of foliage leaves linear to linear-lanceolate, 11-16 cm x 6-11 mm, glabrous to sparingly glabrescent on both surfaces and bearing auricles 1-6 mm long at the summit of the foliage leaves sheath. Guadua magna appears to be morphologically closely related to G. chacoensis (Rojas) LondoĂąo & P.M.Peterson and to G. angustifolia Kunth (Table 1). In these three species the size of the culm is over 18 m in length and 10 cm in diameter, the culm leaves are broadly triangular, brown, with comparative small culm leaf blade, covered by hispid, irritating hairs on the adaxial surface, and with thorny branches at the basal portion of the culm. However, Guadua magna and G. chacoensis seem to be even more morphologically similar, as they share the following characters: 1) culm leaves strongly attached to the culms, the basal ones rotting in place; and 2) the indumenta of the blade leaf glabrous to sparsely hispid on both surfaces. Guadua mangna differs from G. chacoensis by having shorter internodes (up to 31 cm vs. 40 cm); curved and slightly to strongly asymmetrical inner ligule of the culm leaves, c.1 mm long, ciliate (vs. slightly curved, 0.8-1 mm, ciliolate); pseudopetiole 0.5-2 mm long, glabrous on both surfaces; foliage leaf sheath bearing auricles 1-6 mm long (vs. non auriculate); and narrower foliage leaf blade (6-11 mm vs. 5-25 mm wide).

30


The geographic distribution and habitat of G. magna also appear to be quite distinct from those of G. angustifolia, which occurs in moist inter-Andean valleys of northwestern South America, whereas G. magna occurs in river banks along gallery forests in central Brazil. Guadua magna can be further distinguished from G. angustifolia by having 1) culm diameters up to 13 cm (vs. up to 25 cm); 2) the inner ligule of the culm leaves slightly to strongly asymmetrical, not ending before the margins, rarely ending at one margin only (vs. curved and always ending before the margins); 3) a pseudopetiole glabrous on both surfaces (vs. pilose on both surfaces); and 4) the presence of auricles at the foliage leaf sheath (vs. auricles none). At least two other described species of Guadua (G. refracta Munro, and G. maculosa (Hack.) E.G.Camus) also occur in the state of Goiás but studies undertaken by the junior author of this paper show that these two species form a distinct group (with G. paniculata Munro) which has relatively shorter, slender culms. However, Guadua virgata (Trin.) Ruprecht, a species from Minas Gerais, known only from the type specimen, seems to be a bamboo with large culms. G. virgata can be distinguish from G. magna by having blade leaf up to 17 mm wide, abaxially tomentose (vs. up to 11 mm wide, glabrous to sparingly glabrescent, in G. magna); pubescent leaf-sheath, marginally strongly ciliate (vs. glabrous, marginally denticulate to ciliate in G. magna); pseudopetiole pilose on both surfaces (vs. glabrous in G. magna). Both species share the presence of falcate-lanceolate auricles at the summit of the foliage leaf sheath. In G. magna the auricles are straight or lightly wavy, with a broad base. 1.2 FIELD AND ECOLOGICAL NOTES The plant is locally known as “taquaruçu”, a name derived from “taquara” that signifies “large taquara”. The latter is an indigenous word used to name some woody bamboos with hollow culms such as some species of Guadua and Merostachys Spreng. (FILGUEIRAS; SANTOS-GONÇALVES, cf. paper in this publication). Ten populations of G. magna were located, all in two neighboring municipalities (Campos Verdes and Santa Terezinha de Goiás) in the state of Goiás. Some were quite large and thriving whereas others were decimated by logging and general environmental destruction. Morphological and ecological data were taken from all ten populations visited, but botanical vouchers were taken only from one (Campos Verdes). No population is, so far, under legal protection of any sort. All the plants in the natural populations grew along gallery forests, very close to the margins of the river so that old culms frequently fell on the river or creek, sometimes reaching the other margin, thus functioning as a kind of natural bridges for small animals. The soil was always rather wet or damp. The large, handsome leafy culms could be easily spotted from the road nearby because they resemble, from a distance, the clumps of Bambusa vulgaris Schrad. ex J.C.Wendl. in general gestalt. Thick cohorts of seedlings of G. magna (Figure 3) were observed in the immediate vicinity of some the wild populations seen. The seedlings were 60-100 cm tall, displayed conspicuous fimbriae (Figure 3B) and looked rather similar to the seedlings of Guadua angustifolia known elsewhere in South America as “chusquiños”. Upon digging some of these seedlings, it was found that some of them were still attached to the spikelet that originated them (Figure 3C). To the collectors´ surprise, the root system of these seedlings was crowded with nodule-like structures. These structures are currently being studied by a nodule expert at Departmento de Agronomia of Universidade Federal de Goiás, in Goiânia. The expectation is that they represent colonies of rhizobial bacteria (Figure 3D). The thorns are rather conspicuous in this species. They are clearly derived from modified branches that became leafless and spinescent. The longer ones present several “nodes” (Figure 1F). Several interactions of G. magna with other organisms were observed in the field. Two ant species were found inside old culms. Both species were quite aggressive and defended their home space vigorously. Local inhabitants also informed the authors that a small, non-poisonous snake, locally known as “cobra cipó”, lays its eggs inside old culms that have been perforated by birds, insects or other animals. Young snakes were seen emerging from those holes. They also reported the existence of a large rodent locally called “rataquara” that feed on young culms of the new species. Castro et al. (cf. paper in this publication) tentatively identified this “rataquara” as Dactylomys dactylinus (DEMAREST 1817). This rodent is described as shy, nocturnal, with a long tail, and about the size of a wild rabbit. 1.3 USES The new species has obvious potential uses in civil engineering, housing, furniture, general farm uses, etc. Several local artists and artisans are looking for alternative uses for the culms of “taquaruçu”. In the rural areas around where it occurs, it is traditionally used to build rustic homes, and other farm constructions, such as barns, fences, etc. The use of G. magna for constructions and other uses are currently under investigation by Castro e Silva (pers. comm.). Castro e Silva et al. (cf. paper in this publication) have studied the dispersal mechanism of this species. Also, IBAMA (the Brazilian environmental agency) has started a project aiming to investigate the physical, chemical and biological properties of this new species (Almeida, pers. comm.).

31


The anatomy of G. magna is currently under investigation by Dr. Dalva Graciano Ribeiro (Universidade de Brasília) and her students (Graciano Ribeiro, pers.comm.). G. magna is also quite ornamental. The culms are tall and elegant, green to yellowish, slightly curved towards the apex; the foliage leaves are luxuriant. A few plants are currently being cultivated on the grounds of “Fundação Pro-Cerrado”, in Goiânia, state of Goiás and also as part of the Cerrado Bamboo Collection, at Reserva Ecológica do IBGE, Distrito Federal. In both instances, the plants originated from large, crocodilean rhizomes that were obtained from the original population (Filgueiras et al. 3667) and are growing well. The plant in Goiânia was planted by chance when a rhizome left in R. Magno´s porch as a decoration item, started to sprout. A clump of G. magna was located under cultivation on a small farm in the vicinity of the town of Nerópolis, state of Goiás. That clump has been under cultivation for about 20 years. According to the owner of the property, a rhizome of this plant was brought about 20 years ago from a farm in the municipality of Rubiataba, state of Goiás, and planted by him. The plant had formed a large clump but had never bloomed. The owner regularly harvests the older culms to sell as a kind of cash crop, together with the culms of Phyllostachys bambusoides Siebold & Zucc. cultivated on his farm. 1.4 ORIGIN OF EPITHET The reason for the specific epithet is double. Firstly, it refers to the enormous height of the plant, the tallest of all described Guaduas in central Brazil. Secondly, it honors the discoverer of the species, the agronomist Roberto Magno de Castro e Silva, a bamboo enthusiastic and researcher who first collected the plant and called our attention to its existence.

ACKNOWLEDGEMENTS Many persons helped us along the different stages of this research. We gratefully thank Roberto Magno de Castro e Silva, Dr Sergio Almeida, Dr. Dalva Graciano Ribeiro, Tarciso Farias de Albuquerque, João José de Oliveira, and the enthusiastic “mateiro” (guide) Ailton Alves de Oliveira. The illustrations were drawn by Solange Carolina Sousa e Silva. IBAMA helped with financial and legal support during the field trips and paid for the illustrations.

REFERENCES FILGUEIRAS, T. S.; SANTOS-GONÇALVES, A. P. A Checklist of the Basal Grasses and Bamboos in Brazil (Poaceae). Bamboo Science & Culture. USA: American Bamboo Society, v. 18, p. 7-18, 2004. JUDZIEWICZ, E.; CLARK, L. G.; LONDOÑO, X.; STERN, M. J. American Bamboos. Washington/DC: Smithsonian Institution Press, 1999. 392 p. LONDOÑO, X. Guadua Chacoensis (Poaceae:Bambusoideae), its Taxonomic Identity, Morphology, and Affinities. Novon. USA: Missouri Botanical Garden Press, v. 2, p. 41-47, 1992. LONDOÑO, X.; JUDZIEWICZ, J. A New Species of Guadua, G. calderoniana (Poaceae:Bambusoideae) with Notes on the Genus in Bahia, Brazil. Novon. USA: Missouri Botanical Garden Press, v. 1, p. 27-39, 1991.

32


4.2 BAMBUS NATIVOS NO BRASIL: OPORTUNIDADES E DESAFIOS PARA SEU CONHECIMENTO Tarciso S. Filgueiras1, Ana Paula Santos Gonçalves2

Resumo Os autores apresentam um panorama geral dos estudos botânicos sobre bambus brasileiros. São discutidos os diversos nomes brasileiros dessas plantas, uma breve história dos estudos taxonômicos, o estado da arte dos conhecimentos na área, as oportunidades e desafios para seu conhecimento, incluindo desde os levantamentos florísticos, taxonomia, filogenia, conservação, distribuição geográfica, coleções científicas (herbário e coleções vivas), estudos aplicados, financiamento de pesquisas e formação de recursos humanos. Abstract The authors present an overview of the botanical studies on the Brazilian bamboos. The several Brazilian names used for these plants are presented, together with a brief history of the taxonomic studies on them, the state of the art of these studies, the opportunities and challanges to be faced by the students of the Brazilian bamboos, including floristic surveys, taxonomy, phylogeny, distribution, conservation, scientific collections (both herbarium and live plants), applied sciences, financing and the training of human resources.

INTRODUÇÃO Poaceae é uma das maiores e mais importantes famílias de angiospermas, com cerca de 700 gêneros e, no mínimo, 10 mil espécies (JUDD et al., 1999; JUDZIEWICZ et al., 1999; GPWG, 2001), cujos representantes mais antigos conviveram com os dinossauros e, provavelmente, serviam-lhes de alimento (PRASAD et al., 2005). Os bambus constituem um grupo monofilético dentro de Poaceae (Gramineae) e podem ser reconhecidos através de suas características morfológicas, anatômicas, embriológicas (incluindo características de plântulas), fisiológicas, citológicas, macromoleculares e ecológicas. Na verdade, todos os conjuntos de dados acima citados são atualmente empregados pelos pesquisadores para reconhecer, qualificar, caracterizar, recomendar usos, nomear e classificar as diversas espécies que compõem esse rico e diversificado grupo de plantas. Eles habitam, preferencialmente, os ambientes florestais, sendo componentes típicos de florestas tropicais e subtropicais (CALDERÓN; SODERSTROM, 1980). Muitos têm preferências por locais úmidos. Demonstrando impressionante capacidade de adaptação, certas espécies colonizam ambientes inóspitos, tais como topos de montanhas, tanto úmidos e frios quanto secos e quentes. São, portanto, plantas ecologicamente ecléticas. Porém o grupo, como um todo, apresenta impressionante amplitude ecológica, ocorrendo em estado nativo, entre as latitudes 46° N e 47° S (ZHANG; CLARK, 2000), desde o nível do mar até cerca de 4.300 m. No entanto, sob cultivo, esses limites podem ser ultrapassados por algumas espécies. Reconhecidos e usados por diversos povos, desde a gênese da civilização, os bambus têm acompanhado a humanidade há mais de seis mil anos. Os primeiros escritos chineses foram feitos em tabuinhas de bambus ligadas por cordões de seda, antes mesmo da invenção do papel. A própria palavra livro em chinês (ts´s) significa exatamente isso, um punhado de tabuinhas amarradas por cordão (TSIEN, 1962). Como objeto preferido por muitos artistas para expressar emoções estéticas, o bambu se destaca desde longínquas eras. Embora bambu seja um tema recorrente na história da arte oriental, especialmente na China e Japão, foi durante o reinado das dinastias Yüan (1280-1368) e Ming (13681644) que a chamada “pintura de bambu” alcançou seu mais alto esplendor. Uma amostra da importância do bambu para esse período da história está demonstrada no fato de um pintor desse período, chamado Li K`an (1245-1320) haver produzido uma obra, em três volumes, sobre a arte de pintar bambus, intitulada “Systematic treatise on bamboos” (SULLIVAN, 1965). Para os pintores desse período, o bambu representava o ideal do praticante do Confucionismo, porque ele é forte, porém flexível, pode ser dobrado, mas não se quebra, cede, mas resiste, se decepado, rebrota e quando “morre”, ressurge com inquebrantável vigor!

1 Reserva Ecológica do IBGE, Cx. Postal 08770, Brasília-DF CEP 70312-970. E-mail: (tfilg@uol.com.br). 2 Departamento de Botânica da Unicamp. Cx. Postal 6109, Campinas-SP. E-mail: (lanciflora@ibest.com.br).

33


Na verdade, por serem extremamente plásticos, os bambus se prestam a uma imensa gama de distintos usos, que vão desde a proverbial vara de pescar, passando pela indústria da construção civil (casas, prédios, etc.), militar (pontes, abrigos, etc.), polpa para fabricação de papel, celulose, carvão, móveis, artesanato, alimentação humana e animal, indústria farmacêutica e cosmética, usos agrícolas, paisagismo, controle de erosão, reabilitação ecológica de áreas degradadas, além de inúmeros outros usos, atuais ou potenciais dessas fascinantes plantas. Estudos recentes da indústria automotiva japonesa têm demonstrado, por exemplo, a possibilidade do desenvolvimento em larga escala do chamado “plástico verde”, junção entre uma resina de plantas conhecida como sucinato de polibutileno (PBS) e fibras do bambu. Em testes de laboratório, o “plástico verde” produz até 50% menos dióxido de carbono que o polipropileno, plástico derivado do petróleo. Porém, apesar de fascinantes, estudar bambus não é fácil. Qualquer trabalho a ser desenvolvido com essas plantas requer conhecimento, paciência, dedicação e uma boa dose de afeição. Requer, sobretudo, vocação. Não seria exagero dizer que os bambus “elegem” com quem querem compartilhar seus segredos. Neste breve artigo, vamos compartilhar com os leitores alguns desses “segredos”.

1 BREVE HISTÓRIA DO ESTUDO DOS BAMBUS DO BRASIL Bambu é palavra de origem malaia, mas seu étimo é considerado impreciso. Admite-se que se tenha originado do neo-árico, língua falada na Índia, Paquistão, Irã, Bengladesh e alguns outros países vizinhos. No português arcaico, escrevia-se mambu (séc. XV), mas já no século XVI aparecem mumbum e bambu. Uma grande população dessas plantas chama-se bambual ou bambusal (HOUAISS, 2001). No português do Brasil, geralmente não se usa o termo bambu para nomear as espécies nativas. Para estas, usa-se uma nomenclatura especial. Ou seja, uma série de nomes é empregada, todos de origem indígena, em geral do tupi-guarani. Este fato atesta a grande afinidade das diversas etnias autóctones com esse grupo de plantas. Segundo Rizzini e Mors (1976), o poderosíssimo veneno curare de tubo dos índios recebe este nome por ser transportado em varas de bambu. Flechas, facas, cestos, “navalhas” e outros objetos cortantes eram confeccionados pelos indígenas a partir do colmo de tabocas e taquaras (ver terminologia abaixo). Em seguida, será feita uma correlação entre a nomenclatura popular e a científica, na tentativa de nomear espécies e grupos de espécies de bambus nativos no Brasil (cf. BUENO, 1982, para o significado dos nomes em tupi-guarani). Alguns nomes populares (a maioria indígena) empregados para designar os bambus nativos no Brasil: Cambaúba ou Cambaúva – designa bambus de colmos finos, verdes ou amarelados quando maduros, típicos de Actinocladum verticillatum (Nees) McClure ex Soderstr. e Filgueirasia Guala. Cará (talo, tronco) - denominação comum para inúmeras espécies de Chusquea Kunth e algumas Aulonemia Goudot no sul do Brasil. As diversas espécies de Chusquea, especialmente, recebem curiosos nomes populares registrados na “Flora Ilustrada Catarinense”, tais como: capim-lambe-rosto, carámimoso, cará-trepador, cará-de-vara, corda-de-viola, criciúma, gurixima, lambedor, putinga, quixiúma e taquarembó (SMITH; WASSHAUSEN; KLEIN, 1981). Criciúma – denominação usada no sul do Brasil para espécies de Aulonemia Goudot e Chusquea (ver anterior). Cambajuva - designa Aulonemia ulei (Hack.) McClure & L.B.Sm., enquanto que Capim-zebra nomeia Reitzia smithii Swallen, restrita a Santa Catarina e São Paulo. Taboca (cana) - designa bambus lignificados, de porte médio, colmo sólido ou com lúmen pequeno, com ou sem espinhos, do tipo encontrado em espécies de Arthrostylidium Rupr., Chusquea, Guadua Kunth e alguns outros gêneros. As variações “Taboca-mansa”, “Taboca-de-fogo”, “Taboquinha”, etc. também aparecem para designar distintas espécies desses mesmos gêneros ou de gêneros afins. Taquara (cana-brava) – designa, geralmente, bambus de porte médio, colmos ocos, desprovidos de espinhos, como os encontrados em espécies de Merostachys Spreng., Rhipidocladum McClure e alguns outros gêneros. As variações “Taquara-mansa”, “Taquara-de-fogo”, “Taquara-poca”, “Taquara-lixa” e “Taquarinha” também são usadas para distinguir diferentes espécies. Taquinha – designa, geralmente, bambus herbáceos (com colmos não lignificados), de porte pequeno, como os encontrados em espécies de Olyra L., Raddia Bertol. e outros de hábito semelhante. Pode designar também plantas de colmos lignificados, porém com diâmetro reduzido, como em espécies de Colanthelia McClure & E. W. Sm. Taquari - designa uma taquara de pequeno porte. O nome é aplicado tanto a Actinocladum verticillatum quanto a espécies de diversos outros gêneros (Olyra, Chusquea, etc.). Também empregado para nomear espécies de Lasiacis Hitchc., gênero não bambusóide de gramíneas que apresenta aparência de bambu, daí ser incluído no grupo chamado de “mímicos de bambu” por Filgueiras e SantosGonçalves (2004).

34


Taquaruçu - designação que se dá aos bambus nativos de porte alto e diâmetro grande, colmos ocos, com ou sem espinhos, como os encontrados em Apoclada simplex MCclure & L. B. Sm. e algumas espécies de Guadua, como por exemplo, Guadua chacoensis (Rojas) Londoño & P. M. Peterson e Guadua superba Huber. O adjetivo “manso” indica ausência de espinhos, como é o caso do “taquaruçumanso” (= Apoclada simplex), em Santa Catarina (SMITH; WASSHAUSEN; KLEIN, 1981). Analisados em conjunto, esses nomes populares, especialmente os de base etimológica indígena, sugerem curiosas deduções. Primeiro, o nome da planta baseia-se, principalmente, no colmo e seus caracteres, provavelmente porque este era a parte da planta de uso mais frequente pelas comunidades indígenas. Segundo, os termos cará e taboca são usados para bambus de colmos cheios, enquanto que taquara designa os bambus de colmos fistulosos (ocos), mais quebradiços. Os bambus sempre foram vistos como membros distintos dentro da família das gramíneas. Houve até uma tentativa para classificá-los numa família à parte, Bambusaceae (NAKAI, 1943 apud JUDZIEWICZ et al., 2000). Mas, logo a proposta foi rejeitada porque se percebeu que todos os bambus cabem perfeitamente dentro da circunscrição da família, embora constituindo um grupo claramente distinto por uma série de características. Mas, isso não melhorou a situação dos bambus, que continuaram sendo olhados com desconfiança por quem se dedicava ao estudo das Poaceae em geral. De certa maneira, esta dicotomia ocorre ainda hoje, isto é, quem se dedica ao estudo dos bambus não estuda as outras gramíneas e quem estuda as gramíneas não bambusóides não se ocupa do estudo dos bambus. São raros os exemplos de pesquisadores botânicos que cruzam essa sutil linha divisória. O primeiro estudo sobre bambus nativos no Brasil foi publicado pelo botânico italiano Bertoloni, em 1819. Neste pequeno, porém importante trabalho (Piante del Brasile), o autor descreve algumas espécies de bambus nativos, a maioria coletada nas matas do Rio de Janeiro. Em seguida, apareceu Agrostografia brasiliensis, da autoria de outro italiano, Raddi (1823), logo seguido pelo quase homônimo Agrostologia brasiliensis, de Nees (1829). Marco fundamental nesta história, foi a publicação do volume 2 da Flora brasiliensis de Martius (1871-1883), com trabalhos elaborados por Döll (1877) e por Hackel. Inúmeras espécies foram descritas e ilustradas nesses importantíssimos tratamentos. Outros trabalhos se seguiram, publicados tanto por botânicos nacionais (e.g., SILVEIRA, 1919 apud SORENG et al., 2000) e estrangeiros (p.ex., MUNRO,1868) que incluíam bambus nativos do Brasil. Já no século XX, outro marco importante na história desses estudos foi a publicação da Flora Ilustrada de Santa Catarina, cujos volumes sobre gramíneas foram elaborados por dois botânicos norteamericanos, o especialista em bambus McClure e seu colega Lyman Smith e colaboradores. Depois disso, os trabalhos de Burman e Soderstrom (1990), Calderón e Soderstrom (1980), Clark (1990, 1992, 1996), Judziewicz et al. (1999), Soderstrom e Calderón (1980), Soderstrom e Londoño (1987, 1988), Soderstrom e Zuloaga (1985), Soderstrom et al. (1988), Sendulsky (1992, 1995, 1997), Burman e Filgueiras (1993), Guala (1995, 2003), dentre muitos outros, trouxeram cada qual sua contribuição para o conhecimento dos bambus nativos do Brasil. Recentemente, com apoio da FAPESP (Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo), foi publicado um volume com a descrição de todas as espécies nativas de Poaceae encontradas naquele Estado, incluindo mais de 40 espécies de bambus ( LONGHIWAGNER, 2001). Há um crescente interesse da sociedade brasileira pelos bambus, tanto nativos quanto exóticos. Prova concreta são as sociedades e grupos que se formam com o intuito de divulgar, estudar, compartilhar informações e utilizar essas fascinantes plantas das mais diferentes maneiras possíveis. Citam-se os seguintes grupos, com páginas na internet: www.bambubrasileiro.com, www.agenciabambu.com.br; www.institutodobambu.org.br; http://br.groups.yahoo.com/group/agabambu/. Além desses, há, evidentemente, outros grupos, incluindo artesãos, artistas plásticos, arquitetos, engenheiros, professores e uma gama de outros profissionais cujo eixo principal de interesse gira em torno dos bambus e suas múltiplas utilizações.

2 ESTADO DA ARTE Uma nova fase no estudo dos bambus nativos iniciou-se com formação de uma nova geração de pesquisadores nos cursos de pós-graduação da Universidade Federal de Viçosa (Viçosa-MG), Universidade Estadual de Campinas (Campinas-SP) e da Universidade Estadual de Feira de Santana (Feira de Santana-BA). Duas dissertações (SANTOS-GONÇALVES, 2000; OLIVEIRA, P. R., 2001) e duas teses de doutoramento (SANTOS-GONÇALVES, 2005; OLIVEIRA, 2006) foram defendidas, sendo estas as primeiras no país sobre a taxonomia dos bambus nativos. Recentemente, uma dissertação sobre a anatomia dos órgãos vegetativos de Filgueirasia arenicola (McClure) Guala foi defendida na Universidade de Brasília (SILVA FILHO, 2006). Dissertações sobre ecologia de bambus nativos foram defendidas em algumas universidades brasileiras, especialmente no sudeste da Amazônia ( SMITH, 2000; VIDALENC, 2000), mas também em Goiás (SILVA et al., 2006) apontando para o interesse que essas plantas despertam regionalmente.

35


Um resumo de todos os dados taxonômicos anteriormente citados até aqui pode ser visto no trabalho de Filgueiras e Santos-Gonçalves (2004), que apresenta uma lista com 34 gêneros e 232 espécies nativas de bambus. O trabalho traz ainda informações sobre endemismos e distribuição geográfica das espécies por grandes biomas, com destaque para a Mata Atlântica (65%), Amazônia (26%) e Cerrado (9%). São listados os nomes das 20 espécies mais cultivadas no país e dos mímicos de bambus (espécies com aparência bambusóide, porém não pertencentes à subfamília ou, às vezes, pertencentes a outras famílias botânicas), com seus respectivos nomes científicos e comuns. O Brasil apresenta grandes áreas que ainda não foram exploradas sob o ponto de vista botânico, especialmente no que se refere aos bambus. Por isso, há grandes lacunas no conhecimento dessas plantas. Quando se exploram essas áreas, é comum descobrir-se espécies novas, que estão sendo constantemente descritas. Em todas as duas dissertações e teses sobre taxonomia anteriormente citadas, são apresentadas descrições, chaves e ilustrações das espécies reconhecidas, além do mapeamento de populações amostradas e o estudo dos padrões de distribuição, além de novas ocorrências. Fato comum a esses quatro estudos é a descrição de espécies novas. Isto significa que existe grande potencial para novas e espetaculares descobertas, além de novas ocorrências e outras novidades científicas. Quem gosta de descobrir novidades, deve dedicar-se ao estudo dos bambus!

3 OPORTUNIDADES Muito resta a ser feito para conhecermos os bambus brasileiros. Na verdade, estamos apenas arranhando a superfície nessa área do conhecimento. Por outro lado, as oportunidades e desafios são enormes. O tempo está maduro para se organizar, implementar e implantar um programa nacional de exploração e estudos sobre os bambus nativos. A seguir são discutidas, brevemente, as distintas linhas de pesquisa que, na opinião destes autores, deverão fazer parte de um programa a ser executado, em âmbito nacional, durante as próximas décadas. 3.1 INVENTÁRIO SISTEMÁTICO DAS ESPÉCIES (FLORÍSTICA E TAXONOMIA) Um programa de levantamentos sistemáticos de todas as espécies nativas é fundamental. As populações nativas deverão ser localizadas e mapeadas, com ajuda do sistema GPS. Coleta de material para estudos científicos (amostras para herbários, estudos de anatomia, citogenética, filogenia, etc.) e cultivo deverá ser feita. Também deverão ser feitas imagens das plantas e das populações que, juntamente com os demais dados coletados, farão parte de um banco de dados a ser discutido adiante. Dada a imensa extensão territorial do Brasil, áreas prioritárias para a realização desses estudos deverão ser eleitas. Numa primeira etapa, deverão ser incluídas a Mata Atlântica (fragmentos litorâneos no nordeste, sudeste e sul), o Parque Estadual do Rio Doce (Minas Gerais) e partes da Amazônia (especialmente Acre, Rondônia, norte do Mato Grosso e norte do Tocantins). Revisões taxonômicas de determinados grupos são altamente desejáveis. Somente estudos dessa natureza, com abordagem moderna e crítica podem delimitar os táxons, mapear sua distribuição geográfica, determinar seu status conservacionista e, dessa maneira, avançar com bases sólidas no conhecimento científico dos distintos grupos. O alcance desse tipo de estudo é enorme tanto para a área básica quanto para a conservação e utilização dos recursos advindos das populações naturais das espécies mais promissoras. O estudo de ecologia de populações é outra necessidade inadiável, especialmente no Acre, onde ocorrem as maiores florestas contínuas de bambus nativos no Novo Mundo (ca. 600 mil hectares!). Para poder manejar esses tabocais é necessário conhecer suas estratégias reprodutivas, taxas de crescimento, além das intrincadas relações entre os bambus e as demais espécies vegetais (OLIVEIRA FILHO et al., 1994; OLIVEIRA, 2001) e animais da comunidade. 3.2 CONSERVAÇÃO Sabidamente, o Brasil é um país megadiverso (LEWINSON, PRADO, 2005; GIULIETTI et al., 2005). No entanto, para que as gerações futuras venham a desfrutar dos possíveis benefícios oriundos do uso destes recursos, a conservação da biodiversidade é política fundamental. No caso específico dos bambus não é diferente. Segundo Filgueiras e Santos-Gonçalves (2004), 74% das espécies nativas no Brasil são endêmicas, algumas com distribuição extremamente restrita. Advoga-se aqui a criação de unidades de conservação (conservação in situ), tanto pela iniciativa privada (Reserva Particular do Patrimônio Natural, RPPN) quanto por órgãos públicos, dos diversos níveis de governo (municipal, estadual e federal). A criação de unidades de uso indireto deve ser especialmente encorajada ao longo da Mata Atlântica e também no centro-oeste, no Bioma Cerrado, ao passo que as de uso indireto (por exemplo, Florestas Nacionais, Florestas Extrativistas) são altamente desejáveis onde ocorrem grandes populações naturais de tabocas e taquaras, como no Acre, onde ocorrem os famosos tabocais ( FILGUEIRAS, SANTOSGONÇALVES, 2004). Nestes tipos de florestas, a exploração sustentada de populações naturais de

36


tabocas e taquaras poderá ser fator fundamental na criação de emprego e geração de renda para populações marginalizadas econômica e socialmente nos Estados do Acre e Rondônia (conservação on farm). 3.3 COLEÇÕES CIENTÍFICAS Coleções de herbário são fundamentais como documentação científica da biodiversidade vegetal. Sem elas quase nada pode ser feito, pois são as bases fundamentais dos estudos de morfologia, taxonomia, nomenclatura, distribuição geográfica, anatomia, etc. Tudo começa com as exsicatas de herbário. O problema é que os herbários brasileiros dispõem de um reduzido número de coleções de bambus. Pior ainda: grande parte das coleções existentes é fragmentária, com poucas informações essenciais para estudos detalhados. Pouco ou quase nada adianta uma exsicata com um fragmento de colmo e um ramo vegetativo com a identificação de, por exemplo, Guadua paniculata Munro. É preciso muito mais. Existe uma explicação para a pobreza de dados nas coleções de bambus. Primeiramente, coletar bambus é trabalhoso, consome tempo e exige que o coletor siga um rígido protocolo na tomada de dados, incluindo amostras do sistema subterrâneo, do colmo, de todos os demais órgãos aéreos da planta (SODERSTROM, YOUNG, 1983) e do ambiente onde ela cresce. Fotografias, coordenadas geográficas e outros detalhes são também fundamentais para a utilização proveitosa dos dados de herbário. É necessário aumentar a quantidade e qualidade das coleções de herbário de bambus nativos. Somente com dados bem coletados será possível montar um banco de dados realmente útil para toda a sociedade. O estabelecimento de coleções de plantas vivas (conservação ex situ) é outra estratégia na conservação da biodiversidade. Além disso, elas são fatores de grande alcance para o desenvolvimento dos estudos sobre bambus. Sugere-se que as coleções vivas sejam regionais, pelo menos em sua fase inicial. Coleções regionais têm maior chance de sucesso. Muitas espécies têm estreita amplitude ecológica e algumas requerem condições especiais para cultivo. Tais coleções servirão de base para uma série de estudos, que vão desde a formação de mudas para simples multiplicação, passando por plantios comerciais, cultura de tecido, treinamento de recursos humanos, estudos de auto-ecologia, práticas agronômicas e florestais. O cultivo de espécies raras, endêmicas e ameaçadas de extinção deverá ser um aspecto prioritário nas políticas de conservação da biodiversidade dos bambus brasileiros. 3.4 FILOGENIA Os avanços na área de estudos genéticos têm sido espetaculares nas últimas décadas. A capacidade de se obter sequências gênicas ampliou-se de maneira nunca antes imaginada, através de novas técnicas e equipamentos automatizados. Grande parte desses conhecimentos foi gerada a partir do vitorioso Projeto Genoma Humano que desenvolveu e vulgarizou protocolos, reagentes, equipamentos e softwares adequados para tais análises. As técnicas moleculares de análise genômica são conhecidas como marcadores moleculares, pois detectam a variação de sequência de DNA. Sua grande importância reside no fato de permitirem identificar a variabilidade na sequência do DNA dos indivíduos em um nível de resolução muito acima do nível detectável unicamente pelas análises morfológicas (FERREIRA, GRATTAPAGLIA, 1998; FERREIRA, 2001). As técnicas de detecção da variabilidade genética podem se basear na análise dos produtos gênicos (pós-transcricionais ou traducionais) ou no sequenciamento direto do DNA (pré-transcricionais). Apesar de terem custo relativamente elevado (tanto equipamentos quanto reagentes são geralmente importados e caros), os dados moleculares podem ser de grande valor em estudos de filogenia, especialmente quando utilizados em conjunto com dados de outra natureza. Sequências gênicas podem ser obtidas a partir do DNA presente no núcleo (nDNA), cloroplastos (cpDNA), ribossomos (rDNA) ou mitocôndrias (mDNA). O uso de abordagens moleculares, especialmente o sequenciamento do espaçador interno transcrito do DNA ribossomal nuclear (ITS), do espaçador intergênico do genoma plastidial trnD-T e do gene ndhF, tem apresentado resultados encorajadores para o estudo de diversos gêneros de bambus, tanto do grupo dos lignificados (CLARK, ZHANG, WENDEL, 1995) quanto dos herbáceos (OLIVEIRA, 2006). Os trabalhos realizados nesta linha de abordagem são geralmente elaborados com base em uma gama de caracteres advindos de dados morfoanatômicos, micromorfológicos e macromoleculares, os quais fornecerão subsídios para análises posteriores que, por sua vez, possibilitarão o uso de critérios mais objetivos nas delimitações das diversas categorias taxonômicas. No Brasil, os estudos de filogenia de bambus são recentes e raros, devendo-se ressaltar os de Santos-Gonçalves (2005 e pesquisa em andamento) que abordam o clado Arthrostylidiinae + Guaduinae, um grupo de bambus lignificados endêmico do Brasil e os de Oliveira (2006), que abordam os complexos detectados em Raddia e diversos outros gêneros de bambus herbáceos do Brasil.

37


Apesar de apenas ensaiar os primeiros passos nessa área, o grupo brasileiro tem um futuro promissor, pois faz parte de um time internacional de cientistas de bambus chamado “The Bamboo Phylogeny Group” (BPG). O BPG é liderado pela Dra. Lynn G. Clark, da Iowa State University, EUA e conta com 18 membros, entre os quais vários brasileiros. O objetivo principal do projeto é gerar uma árvore evolutiva para os bambus, tomando como base dados de sequenciamento do DNA e características morfológicas, usando uma abordagem analítica rigorosa. O BPG visa, ainda, estabelecer um banco de dados (“The Bamboo Biodiversity Web site”) para os bambus, com descrições, chaves interativas para identificações a partir de qualquer órgão da planta, imagens, sequências gênicas e outras informações úteis. O banco de dados terá acesso gratuito, para toda a sociedade. O projeto teve início em 2005 e deve ser concluído em 2009. O endereço do futuro banco de dados (já com algumas informações preliminares) é http://www.eeob.iastate.edu/research/bamboo/index.html. O BPG tem fortes associações com outro grupo maior denominado “Grass Phylogeny Working Group” - WPWG (2001) que tem produzido classificações para todas as Poaceae baseadas em conjuntos de dados morfológicos e macromoleculares. 3.5 ESTUDOS APLICADOS Como enfatizado anteriormente, os bambus podem ser utilizados em centenas de diferentes maneiras. Todos os usos já conhecidos dos bambus devem ser explorados e expandidos. A procura de novos usos deverá ser fortemente incentivada e apoiada. Artesãos, artistas, inventores, curiosos, técnicos, pesquisadores, todos são bem-vindos para testar materiais, criar tecnologias, adaptar maquinarias já existentes ou criar novas. Tudo isso no intuito de documentar, detalhar, ampliar e expandir os mais interessantes usos dessas admiráveis plantas. Um grande número de espécies de bambus nativos apresenta floração do tipo monocárpico, isto é, a planta cresce por um número limitado de anos (sete, 15, 35, etc.), floresce profusamente, produz grandes quantidades de sementes e, sem seguida, morre (JANZEN, 1976; FILGUEIRAS, 1988). A floração cíclica dos bambus nativos merece investigação especial por parte de fisiologistas e ecólogos, pois o conhecimento dessa fenofase é crucial na compreensão do comportamento reprodutivo dessas espécies. As implicações econômicas, sociais e ecológicas decorrentes de um possível controle da floração dos bambus são assuntos que merecem longa reflexão por parte de cientistas, agrônomos e agricultores. O impacto de tal conhecimento seria mais notável, especialmente para aquelas espécies que apresentam potencial para produção de grãos e forragem para o gado, como é o caso de Actinocladum verticillatum e Filgueirasia cannavieira. Um curioso efeito colateral da floração cíclica de certas espécies de carás, tabocas, taquaras e assemelhados é o fenômeno chamado de ratada, conhecido desde a época do Brasil Império ( DERBY, 1879), mas que ainda não foi objeto de um estudo científico. Como dito anteriormente, na floração cíclica, há enorme produção de grãos que atraem variada fauna que deles se alimenta. Entre eles, os ratos. Em certas circunstâncias, o número desses roedores é tão grande que, quando o alimento começa a escassear, eles deixam as matas nativas e invadem fazendas, povoados, vilas e cidades circunvizinhas (DERBY, 1879; DUTRA,1938; FILGUEIRAS, 1988). O fenômeno parece ser mais comum no sul e sudeste do Brasil, mas pode ocorrer também em outras regiões. Relatos de tais eventos, vez por outra, aparecem na mídia nacional e internacional e causam certo pavor na população. As implicações potenciais desse fenômeno natural para a saúde pública merecem atenção especialíssima dos órgãos oficiais pertinentes, notadamente do Ministério da Saúde e do Ministério do Meio Ambiente. Peste bubônica e hantavirose são doenças que têm como vetores ratos silvestres contaminados que entram em contato com populações humanas, especialmente no ambiente rural. As áreas onde ocorrem grandes populações naturais de carás, tabocas, taquaras e outros bambus de floração gregária devem ser especialmente selecionadas para tais estudos. O Brasil precisa estar preparado para esse tipo de ocorrência antes que um desastre ocorra. À medida que as cidades avançam em direção ao campo, ou seja, à medida que as populações humanas se adensam nas áreas suburbanas e rurais, esse tipo de “outbreak” tende a ocorrer com maior frequência, com consequências imprevisíveis para a saúde pública. 3.6 BANCO DE DADOS Faz-se urgente e necessária a criação de um banco de dados sobre os bambus nativos do Brasil, com acesso eletrônico gratuito a todos os interessados. A estrutura e composição mínima desejada do banco deverão ser objeto de profícua discussão entre os interessados e os experts nessa poderosa ferramenta. O banco de dados poderá ser formalmente ligado ao Ministério do Meio Ambiente, porém universidades, institutos de pesquisa e a iniciativa privada deverão opinar sobre seu conteúdo, montagem e utilização.

38


3.7 BAMBUS INTRODUZIDOS Existem mais de 20 espécies de bambus exóticos introduzidos no Brasil. Algumas introduções ocorreram ainda no período colonial, enquanto outras são recentes ( FILGUEIRAS, SANTOS-GONÇALVES, 2004; FILGUEIRAS, 2005). Sugere-se aqui que as populações (plantações) mais extensas das espécies de maior expressão econômica e ecológica (por exemplo, Bambusa tuldoides Munro, Bambusa vulgaris Schrad, Dendrocalamus giganteus Munro, Phyllostachys bambusoides Siebold & Zucc., Phyllostachys aurea Carrière ex Rivière & C. Rivière, Phyllostachys nigra (Lodd ex Lindl.) Munro, etc.) deverão ser localizadas, mapeadas com auxílio do GPS e, eventualmente, incorporadas à matriz econômica do país. 3.8 RECURSOS HUMANOS A formação de recursos humanos para atuar em todas as áreas acima mencionadas deverá ser prioridade. De nada adiantará incentivar os itens acima discutidos se não houver pessoas treinadas e aptas para executar as diversas funções. A formação deverá ocorrer em todos os níveis, desde os mais básicos (coletores, viveiristas, etc.), passando pelo nível técnico (artistas, artesãos, etc.), cursos de especialização, até a formação de mestres e doutores nos cursos de pós-graduação. Chama-se aqui a atenção para o baixo número de botânicos brasileiros com especialização em bambus. Deverá ser implementado incentivo especial nos cursos de pós-graduação, com bolsas específicas para a formação de pesquisadores nessa área. Nota-se um crescente interesse da juventude universitária brasileira em estudar essas fascinantes plantas, porém esse interesse inicial precisa ser direcionado e apoiado através de ações específicas.

4 DESAFIOS São muitos e de variados matizes. Qualquer pessoa de bom senso que atue nessa área poderá elaborar uma longa lista deles. No entanto, neste breve espaço, queremos apenas apontar as linhas gerais dessa problemática. Sob a nossa óptica, um dos mais críticos problemas a ser enfrentado é a formação de recursos humanos. Sem pessoas treinadas nenhum dos aspectos anteriormente discutidos poderá ser eficazmente implementado. Outro grande desafio é a obtenção de recursos para financiar as diversas etapas dos programas a serem implantados. Tais recursos deverão ser buscados no âmbito dos governos federal, estadual e municipal e também através da iniciativa privada. Em alguns casos, a iniciativa privada talvez seja ainda mais promissora que as fontes oficiais, embora estas nunca devam ser excluídas. Existe um grande filão a ser explorado pela iniciativa privada que ainda permanece intocado: a formação de mudas de bambus ornamentais para a exportação. Há enorme interesse internacional pelos bambus nativos do Brasil. Estes recursos podem fazer parte da nossa matriz de exportação, como qualquer outro item exportável. No entanto, é fundamental que tudo seja feito observando-se todas as normas oficiais (legais) para comercialização dos produtos oriundos da nossa biodiversidade. O combate à chamada “biopirataria” passa pelo estabelecimento de regras claras, fiscalização efetiva e educação para o exercício ético da profissão. Muitos aspectos dessas atividades ainda não têm legislação específica. Isto tem, de certo modo, freado o desenvolvimento desse segmento na política brasileira para obtenção dos benefícios da biodiversidade nacional, mas não tem evitado o contrabando. Prova disso é que mudas de alguns herbáceos brasileiros (Raddia spp.) já são comercializados em pequena escala nos Estados Unidos. Cultivadores e admiradores estrangeiros dos bambus brasileiros aguardam, com ansiedade, a liberação desse comércio, em bases legais, com certificados de origem, identificação científica segura, garantia fitossanitária e demais requisitos necessários aos produtos de exportação.

5 CONCLUSÕES O Brasil é o país de maior biodiversidade do Planeta. Dentre os países do Novo Mundo, o Brasil detém o maior número de espécies nativas de bambu (ca. 240 spp.) e também de gramíneas basais (8 spp.). Além disso, temos as maiores florestas naturais de bambus nativos de todas as Américas (tabocais do Acre). No entanto, pouco sabemos sobre essas espécies. Quantas realmente são? Onde se localizam? Qual o tamanho das populações naturais? Qual sua estrutura genética? Que usos podem ter as diferentes espécies? Onde estão e quais são as espécies endêmicas, raras e em perigo de extinção? Qual será a política a ser adotada para proteção efetiva dessa importante parcela da biodiversidade vegetal brasileira? Quem vai estudar o quê? De onde virão os recursos que subsidiarão esses estudos? Em resumo, o que o Brasil pretende fazer com seus bambus nativos?

39


As perguntas acima dão uma idéia aproximada das diversas abordagens sobre os bambus nativos e podem, acima de tudo, nortear programas de estudos dessas plantas. Apesar dos importantes avanços verificados na última década, muito resta a ser feito. Os desafios estão lançados. As gerações futuras serão os juízes de nossa atuação frente a esses maravilhosos recursos naturais com que a Natureza nos favoreceu.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BAMBOO PHYLOGENY GROUP. “No Prelo”. The Bamboo Phylogeny Project. Disponível em: http://www.eeob.iastate.edu/research/bamboo/index.html. BERTOLONI, G. Piante del Brasile. Bologna Opusc. Sci, 1819. 3: 410 BUENO, F. S. Vocabulário Tupi-guarani Português. São Paulo: Gráfica Nagy Ltda, 1982. BURMAN, A. G.; FILGUEIRAS, T. S. A Review of the Woody Bamboo genera of Brazil (Gramineae:Bambusoideae:Bambuseae). Thaiszia Journal of Botany. Eslováquia: Safarik University, v. 3, p.53-88, 1993. BURMAN, A. G.; SODERSTROM, T. R. In search of the world's oddest bamboo: Glaziophyton mirabile. Botanic Gardens Conservation News. v. 1, n. 6, p. 27-31, 1990. CALDERÓN, C. E.; SODERSTROM, T. R. The genera of Bambusoideae (Poaceae) of the American continent: keys and comments. Washington: Smithsonian Institution Press, 1980. 27 p. Smithsonian Contributions to Botany nº 44. CLARK, L. G. Diversity and Biogeography of Neotropical Bamboos (Poaceae: Bambusoideae). Acta Botanica Brasilica. Brasil: Sociedade Botânica do Brasil, v. 4, p. 125-132, 1990. ________. Chusquea sect. Swallenochloa (Poaceae:Bambusoideae) and allies in Brazil. Brittonia. USA: New York Botanical Garden Press, v. 44, n. 4, p. 387-422, 1992. ________.Four new species of Chusquea (Poaceae:Bambusoideae) from Brazil and Ecuador. Brittonia. USA: New York Botanical Garden Press, v. 48, n. 2, p. 250-262, 1996. CLARK, L. G.; ZHANG, W.; WENDEL, J. F. A Phylogeny of the Grass Family (Poaceae) Based on ndhF Sequence Data. Systematic Botany. USA: American Society of Plant Taxonomist, v. 20, n. 4, p. 436-460, 1995. DERBY, O. A. Rats in Brazil and their Connection with the Flowering of the Bamboo. Indian Forester. [S.l.: s.n.], v. 5, p. 177-178, 1879. DÖLL, J. C. Gramineae II, Tribus III: Paniceae. In: MARTIUS, C.F.P. (Ed.). Flora brasiliensis. Monachii: Frid. Fleischer, v. 2, n. 2, p. 313-340, 1877. DUTRA, J. Les Bambusées de Rio Grande du Sud. Revista Sudamericana de Botánica. Montevideo: [s.n.], v. 5, p. 145-152, 1938. FERREIRA, M. E. Técnicas e Estratégias para a Caracterização Molecular e Uso de Recursos Genéticos. In: GARAY, I.; DIAS, B. F. S. (Eds.) Conservação da Biodiversidade em Ecossistemas Tropicais. Petrópolis: Vozes, 2001. p. 233-267. FERREIRA, M. E.; GRATTAPAGLIA, D. Introdução ao uso de marcadores moleculares em análise genética. Brasília: Embrapa-Cenargen, 1998. 220 p. FILGUEIRAS, T. S. A Floração dos Bambus e seu Impacto Ecológico. Eugeniana. Petrópolis: [s.n.], v. 15, p.1-8, 1988. ________. Asiáticas no Brasil: Gramíneas (Poaceae) introduzidas da Ásia. Eugeniana. Petrópolis: [s.n.], v. 28, p.3-18, 2005. FILGUEIRAS, T. S.; SANTOS-GONÇALVES, A. P. A checklist of the basal grasses and bamboos in Brazil (Poaceae). Bamboo Science & Culture. Albany: American Bamboo Society, v. 18, p. 7-18, 2004. GIULIETTI, A. M.; HARLEY, R. M.; QUEIROZ, L. P. de; WANDERLEY, M. das G.; VAN DEN BERG, C. Biodiversidade e Conservação de Plantas no Brasil. Megadiversidade (ed. especial). [S.l.]: Conservação Internacional, v. 1, n. 1, p. 52-61, 2005. GRASS PHYLOGENY WORKING GROUP. Phylogeny and Subfamilial Classification of the Grasses (Poaceae). Annals of the Missouri Botanical Garden. St. Louis: Missouri Botanical Garden, v. 88, n. 3, p. 373-457, 2001. GUALA, G. F. A Cladistic Analysys and Revision of the Genus Apoclada (Poaceae:Bambusoideae:Bambusodae). Systematic Botany. USA: American Society of Plant Taxonomists, v. 20, n. 3, p. 207-223, 1995. ________. A New Genus of Bamboos from the Cerrados of Brazil. Bamboo Science & Culture. Albany: American Bamboo Society, v. 17, n. 1, p. 1-13, 2003. HOUAISS, A. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. 1ª ed.

40


JANZEN, D. H. Why Bamboos Wait so Long to Flower? Annual Review of Ecology and Systematics. Philadelphia: University of Pennsylvania, v. 7, p. 347-391, 1976. JUDD, W. S.; CAMPBELL, C. S.; KELLOGG, E. A.; STEVENS, P. F.; DONOGHUE, M. J. Plant Systematics: A Phylogenetic Approach. Sunderland: Sinauer Associates, Inc., 1999. JUDZIEWICZ, E. J.; CLARK, L. G.; LONDOÑO, X.; STERN, M. J. American Bamboos. Washington/D.C.: Smithsonian Institution Press, 1999. 392 p. JUDZIEWICZ, E. J.; SORENG, R. J.; DAVIDSE, G.; PETERSON, P. M.; FILGUEIRAS, T. S.; ZULOAGA, F. O. Catalogue of the New World Grasses (Poaceae): I Subfamilies Anomochloideae, Bambusoideae, Ehrhartoideae, and Pharoideae. Contributions from the United States National Herbarium. Washington/D.C.: Department of Botany, National Museum of Natural History, v. 39, p. 1-128, 2000. LEWINSOHN, T.; PRADO, P. I. Quantas Espécies há no Brasil? Megadiversidade (edição especial). [S.l.]: Conservação Internacional, v. 1, n. 1, p. 36-42, 2005. LONGHI-WAGNER, H. M. In: WANDERLEY, M.G.L.; SHEPHERD, G.J.; GIULIETTI, A.M. (Coord.). Flora Fanerogâmica do Estado de São Paulo. São Paulo: Fapesp/Hucitec, 2001. vol. 1 (Poaceae). MUNRO, W. A Monograph of the Bambusaceae, Including Descriptions of all Species. Transactions of the Linnean Society of London. [S.l.]: Wiley, v. 26, n. 1, p.1-157, 1868. NEES VON ESENBECK, C. G. D. Agrostologia brasiliensis. In: MARTIUS, C. F. P. (Ed.). Flora Brasiliensis. Stuttgartiae et Tubingae: Sumptibus J.G. Cottae, v. 2, pt. 1, 1829. OLIVEIRA-FILHO, A. T.; VILELA, E. A.; GAVILANES, M. L.; CARVALHO, D. A. Effect of flooding regime and understorey bamboos on the physiognomy and tree species composition of a tropical semideciduous Forest in Southeastern Brazil. Plant Ecology. Netherlands: Kluwer Academic Publishers, v. 113, n. 2, p. 99-124, 1994. OLIVEIRA, L. C. Efeito do Processo de Fragmentação Florestal sobre a Biomassa e Composição Florestal em Ecossistemas no Sudeste e Sudoeste Acreano. Dissertação (Mestrado em Ciências de Florestas Tropicais) - Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Manaus, 2001. OLIVEIRA, R. P. A tribo Olyreae (Poaceae:Bambusoideae) no Estado da Bahia. Dissertação (Mestrado) Universidade Estadual de Feira de Santana, 2001. 190 p. ________. Estudos Taxonômicos, Filogenéticos e Biossistemáticos em Raddia Bertol. (Poaceae:Bambusoideae:Olyreae). Tese (Doutorado) - Universidade Estadual de Feira de Santana, 2006. 336 p. PRASAD, V. C. A.; STRÖMBERG, C. A.; ALIMOHAMMADIAN, H.; SAHNI, A. Dinosaur Coprolites and Early Evolution of Grasses and Grazers. Science. USA: American Association for the Advancement of Science, v. 310, n. 5751, p. 1177-1180, 2005. RADDI, G. Agrostografia Brasiliensis. Lucca: Bertini, 1823. RIZZINI, C. T.; MORS, W. B. Botânica Econômica Brasileira. São Paulo: E.P.U-EDUSP, 1976 SANTOS-GONÇALVES, A. P. Bambus (Bambusoidee s.l.: Poaceae) no Parque Estadual do Rio Doce, MG-Brasil. Dissertação (Mestrado em Botânica) - Universidade Federal de Viçosa, 2000. 91 p. ________. Estudos Taxonômicos e Morfoanatômicos em Colanthelia (Poaceae: Bambusoideae:Bambuseae). Tese (Doutorado em Biologia Vegetal) - Universidade Estadual de Campinas, 2005. 159 p. SENDULSKY, T. Merostachys burmanii (Poaceae: Bambusoideae: Bambuseae), a new species from Brazil. Novon. USA: Missouri Botanical Garden, v. 2, n. 2, p. 111-113, 1992. ________.Merostachys multiramea (Poaceae:Bambusoideae: Bambuseae) and similar species from Brazil. Novon. USA: Missouri Botanical Garden, v. 5, n. 1, p. 76-96, 1995. ________.Twelve new species of Merostachys (Poaceae: Bambusoideae: Bambuseae) from Brazil. Novon. USA: Missouri Botanical Garden, v. 7, n. 3, p. 285-307, 1997. SILVA, R. M. de C; FILGUEIRAS, T. S.; NAVES, R. V.; CHAVES, L. J. Taquaruçu (Guadua sp.): Caracterização da Planta e do Ambiente de Ocorrência na Bacia do Rio Crixás-Açu, Goiás, Brasil. In: SEMINÁRIO NACIONAL DO BAMBU: ESTRUTURAÇÃO DA REDE DE PESQUISA E DESENVOLVIMENTO, 1., 2006, Brasília. Anais... Brasília: Universidade de Brasília, 2006. v. 1, p. 72-85. SILVA FILHO, J. P. B. Caracterização Anatômica de Filgueirasia arenicola (McClure) Guala (Poaceae:Bambusoideae:Arthrostylidiinae). Dissertação (Mestrado em Botânica) - Universidade de Brasília, 2006. SMITH, L. B.; WASSHAUSEN, D. C.; KLEIN, R. M. Gramíneas (Gêneros:1.Bambusa até 44. Chloris). In: REITZ, R. Flora Ilustrada Catarinense. Itajaí: Herbário Barbosa Rodrigues, 1981.

41


SMITH, M. Efeito de Perturbações sobre Abundância, Biomassa e Arquitetura de Guadua weberbaueri Pilg. (Poaceae:Bambusoideae) em uma Floresta Dominada por Bambu no Sudeste da Amazônia. Dissertação (Mestrado em Ecologia) - INPA/UA, Manaus, 2000. 86 p. SODERSTROM, T. R.; CALDERÓN, C. E. In Search of the Primitive Bamboos. National Geographic Society Research Reports. [S.l.:s.n.], v. 12, p. 647-654, 1980. SODERSTROM, T. R.; LONDOÑO, X. Two new genera of brazilian bamboos related to Guadua (Poaceae:Bambusoideae:bambuseae). American Journal of Botany. USA: Botanical Society of America, Inc., v. 74, n. 1, p. 27-39, 1987. ________. A Morphological Study of Alvimia, a New Brazilian Bamboo Genus with Fleshy Fruits. American Journal of Botany. USA: Botanical Society of America, Inc., v. 75, n. 6, p. 819-839, 1988. SODERSTROM, T. R.; YOUNG, S. M. A Guide to Collecting Bamboos. Annals of the Missouri Botanical Garden. St. Louis: Missouri Botanical Garden, v. 70, n. 1, p. 128-136, 1983. SODERSTROM, T. R.; ZULOAGA, F. Diandrolyra tatianae (Poaceae: Olyreae), a New Herbaceous Bamboo from Brazil. Brittonia. USA: New York Botanical Garden Press, v. 37, n. 1, p. 1-5, 1985. SODERSTROM, T. R.; JUDZIEWICZ, E. J.; CLARK, L. G. Distribution Patterns in Neotropical Bamboos. In: PROCEEDINGS OF THE NEOTROPICAL BIOTIC DISTRIBUTION PATTERN WORKSHOP, 1987, Rio de Janeiro. Anais… Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Ciências, 1988. p. 121157. SULLIVAN, M. The Book of Art: A Pictorial Encyclopedia of Painting, Drawing, and Sculpture. New York: Grolier, 1965. v. 9 (Chinese and Japanese Art), 296 p. TSIEN, T. Written on Bamboo and Silk. Chicago: The University of Chicago Press, 1962. VIDALENC, D. Distribuição das Florestas Dominadas pelo Bamboo Guadua weberbaueri em Escala de Paisagem no Sudeste da Amazônia e Fatores Edáficos que Afetam sua Densidade. Dissertação (Mestrado em Biologia) - INPA/UA, 2000. 92 p. ZHANG, W.; CLARK, L. G. Phylogeny and classification of the Bambusoideae (Poaceae). In: JACOBS, S. W. L.; EVERETT, J. (Eds.). Grasses: Systematics and Evolution. Melbourne: CSIRO, 2000. vol. 2, p. 35-42.

42


4.3 BAMBUS (BAMBUSOIDEAE: POACEAE) DO PARQUE ESTADUAL DO RIO DOCE, MINAS GERAIS: FLORÍSTICA E MORFOLOGIA1 Ana Paula Santos Gonçalves2, Rita Maria de Carvalho Okano3, Milene Faria Vieira3, Tarciso S. Filgueiras4

Resumo Os bambus são plantas de grande importância econômica, ecológica, cultural e científica. O presente estudo objetivou inventariar e caracterizar morfologicamente as espécies nativas de Bambusoideae ocorrentes na região central do Parque Estadual do Rio Doce. São reconhecidos nove gêneros e 15 espécies. Registra-se pela primeira vez a ocorrência de Athroostachys, Cryptochloa, Eremitis e Eremocaulon em Minas Gerais. Além disso, duas espécies novas de Merostachys Spreng. foram descobertas. A riqueza de espécies encontradas na área em estudo evidencia o Estado de Minas Gerais como um importante centro de diversidade de bambus no Brasil. Abstract Bamboos are plants of great economic, ecological, cultural and scientific importance. The aims of the present study were to recognize and to characterize morphologically the native species occurring in the central region of the Parque Estadual do Rio Doce. Nine genera and 15 species are recognized. The occurrence of the genera Athroostachys, Cryptochloa, Eremitis and Eremocaulon in the state of Minas Gerais is recorded for the first time. In addition, two new species of Merostachys Spreng. were discovered. The richness of species found in the study area point to the state of Minas Gerais as an important center of bamboo diversity in Brazil.

INTRODUÇÃO Os bambus são conhecidos, principalmente, por sua grande importância econômica, ecológica e cultural. Em todo o mundo, são registrados diferentes usos para essas plantas, encontrando-se, dentre eles, usos na construção civil, no controle de erosão, na fabricação de papel e de instrumentos musicais, na alimentação humana e animal, em artesanatos diversos, e também o seu uso como plantas ornamentais (JUDZIEWICZ et al., 1999). o o Ocorrem como plantas nativas entre 46 N e 47 S (ZHANG; CLARK, 2000), e estão tipicamente associados às florestas tropicais e subtropicais (CALDERÓN; SODERSTROM, 1980). No entanto, existem espécies adaptadas a outros ambientes, tais como, o Cerrado, Campo de Altitude e Campo Rupestre. A subfamília Bambusoideae, como tradicionalmente circunscrita, incluía os bambus lignificados e os herbáceos e um grupo de plantas agora conhecido como "gramíneas basais" (JUDZIEWICZ et al., 1999). Atualmente, as Bambusoideae compreendem apenas os bambus lignificados (tribo Bambuseae), com cerca de 60-70 gêneros e 1.100 espécies de ampla distribuição, e os herbáceos (tribo Olyreae), com cerca de 21 gêneros e 108 espécies distribuídas, principalmente, nas regiões subtropicais e tropicais americanas (GPWG, 2001). No presente trabalho foi adotada essa última classificação. No Novo Mundo, são reconhecidos cerca de 38 gêneros e 356 espécies de bambus (JUDZIEWICZ et al., 1999). O Brasil é o país com a maior diversidade e endemismo de espécies, apresentando cerca de 34 gêneros e 232 espécies, das quais cerca de 204 são consideradas endêmicas (FILGUEIRAS; SANTOSGONÇALVES, 2004). Os bambus apresentam características morfológicas, anatômicas, fisiológicas e ecológicas peculiares. As espécies de Bambuseae apresentam, como caracteres morfológicos diagnósticos, a ocorrência de sistema subterrâneo rizomatoso bem desenvolvido, composto de nós e entrenós cobertos por folhas reduzidas denominadas catáfilos, colmo lignificado, folhas dos ramos com lígula externa e lâmina foliar decídua, e florescimento cíclico com intervalos geralmente longos. As espécies de Olyreae (bambus herbáceos) caracterizam-se por apresentarem espiguetas unissexuais, rizomas pouco desenvolvidos e por serem geralmente pluricárpicas (OLIVEIRA, 2006).

1 Parte da Dissertação de Mestrado do primeiro autor desenvolvida na Univ. Federal de Viçosa, MG. 2Pós-Doutoranda FAPESP (Proc. 04/15628-6), Pesquisadora Colaboradora Voluntária Unicamp. Endereço

atual: Univ. Estadual de Campinas, Cid. Univ. Zefferino Vaz, C. P.: 6109. E-mail: (santosgon@bol.com.br). 3Universidade Federal de Viçosa, Departamento de Biologia Vegetal, Viçosa, MG, CEP 36570-000. 4Reserva Ecológica do IBGE, Cx. Postal 08770, Brasília-DF, CEP 70312-970.

43


Nos bambus lignificados, a gema nodal, protegida pela folha do colmo, ao se desenvolver, origina o complemento de ramo, determinando três tipos de ramificação: intravaginal, extravaginal e infravaginal (MCCLURE, 1966; JUDZIEWICZ et al., 1999). A ramificação é dita intravaginal quando os ramos do complemento de ramo emergem de dentro da folha do colmo sem romper a bainha; extravaginal quando rompem a bainha da folha do colmo e crescem divergentes ao colmo; infravaginal quando nascem abaixo da linha nodal e, consequentemente, da folha do colmo. Tanto as folhas dos ramos como as folhas do colmo dos bambus lignificados podem apresentar fímbrias, ou seja, cerdas que se desenvolvem na junção entre a bainha e a região ligular. Dentre os bambus herbáceos, as fímbrias ocorrem apenas nas folhas dos ramos das espécies da subtribo Parianinae (JUDZIEWICZ et al., 1999). No Brasil, os estudos abordando as Bambusoideae são raros e de cunho florístico (e.g. FILGUEIRAS, 1988; SANTOS-GONÇALVES, 2000; OLIVEIRA, 2001; LONGHI-WAGNER, 2001), ecológico (FILGUEIRAS; PEREIRA, 1988) e taxonômico (BURMAN; FILGUEIRAS, 1993; SENDULSKY, 1992, 1995, 1997; FILGUEIRAS; SANTOS-GONÇALVES, 2004; SANTOS-GONÇALVES; FILGUEIRAS, aceito 2006; SANTOSGONÇALVES, 2005; OLIVEIRA, 2006). Para o estado de Minas Gerais, estudos que incluam as Bambusoideae são ainda mais raros, sendo este o primeiro estudo de cunho florístico com espécies desta subfamília. Os objetivos do presente estudo foram reconhecer os gêneros e espécies nativas de Bambusoideae que ocorrem no Parque Estadual do Rio Doce (PERD) e destacar os seus caracteres morfológicos diagnósticos de maior peso taxonômico.

1 MATERIAL E MÉTODOS O Parque Estadual do Rio Doce (PERD) abrange uma área total de 36.000 ha e é o maior remanescente de floresta do domínio atlântico do Estado de Minas Gerais. Está situado na região do 0 0 0 0 “Vale do Aço”, entre os meridianos 42 38’ 30” e 48 28’ 18” W e os paralelos 19 48’ 18” e 19 29’ 24” S, em áreas abrangidas pelos municípios de Timóteo, Marliéria e Dionísio (IEF, 1994). Realizaram-se excursões mensais ao PERD durante o período de fevereiro a julho de 1998 e de março de 1999 a fevereiro de 2000. As coletas, realizadas em uma área de cerca de 5.000 hectares, na região central do Parque, foram feitas de acordo com a metodologia de Soderstrom e Young (1983). As espécies foram identificadas com base na literatura especializada, consulta a especialistas e visita aos herbários IBGE, SP e VIC. Os acrônimos citados estão de acordo com o Index Herbariorum (HOLMGREN; HOLMGREN; BARNETT, 1999). O material coletado foi herborizado e, posteriormente, incluído nos herbários VIC, PERD e IBGE.

2 RESULTADOS E DISCUSSÃO Foram reconhecidas 10 espécies subordinadas a cinco gêneros da tribo Bambuseae e cinco espécies subordinadas a quatro gêneros da tribo Olyreae (Tabela 1). Os gêneros mais representativos foram Merostachys Spreng. (duas espécies e cinco morfo-espécies) e Olyra L. (duas espécies). Os demais gêneros foram representados por apenas uma espécie (Tabela 1). Foi registrada, para o estado de Minas Gerais, a primeira citação de ocorrência de quatro gêneros: Athroostachys Benth., Cryptochloa Swallen, Eremitis Döll e Eremocaulon Soderstr. & Londoño. Eremitis parviflora e Eremocaulon aureofimbriatum, espécies consideradas endêmicas do estado da Bahia (JUDZIEWICZ et al., 1999), tiveram a sua distribuição geográfica ampliada. Duas espécies de Merostachys, novas para a ciência, foram coletadas. Os resultados obtidos demonstram a riqueza de espécies encontradas em uma pequena área (cerca de 5.000 ha) no estado de Minas Gerais e o desconhecimento sobre a flora mineira de bambus. Vale ressaltar que em trabalhos recentes sobre distribuição de bambus neotropicais (SODERSTROM; JUDZIEWICZ; CLARK, 1988; CLARK, 1990), nos quais o Brasil se destaca como a maior área de diversidade e endemismo do grupo, o estado de Minas Gerais não foi sequer incluído.

44


Tabela 1. Tribos e espécies de bambus nativos ocorrentes no Parque Estadual do Rio Doce, Minas Gerais e principais caracteres morfológicos. Bambuseae Athroostachys capitata (Hook. f.) Benth. Chusquea capituliflora Trin. var. capituliflora Eremocaulon aureofimbriatum Soderstr. & Londoño Guadua tagoara (Nees) Kunth. Merostachys riedeliana Doell Merostachys ternata Nees Merostachys sp. nov. 1 Merostachys sp. nov. 2 Merostachys sp. morfoespécie 1 Merostachys sp. morfoespécie 2 Olyreae Cryptochloa capillata (Trin.) Soderstr. Eremitis parviflora (Trin.) C. E. Calderón & Soderstr. Olyra latifolia L. Olyra sp. Parodiolyra micrantha (Kunth) Davidse & Zuloaga

3 MORFOLOGIA Todas as espécies de bambus lignificados coletadas no PERD apresentaram o padrão de ramificação do rizoma do tipo paquimorfo (sensu MCCLURE, 1966; Figura 1). Entretanto, no gênero Eremocaulon foi registrada uma variação desse padrão, denominada longo-paquimorfo, na qual o “pescoço” é extremamente longo, ou seja, os entrenós sólidos que compõem o rizoma alcançam 1,5 a 3,0 metros de comprimento. Os bambus, em geral, têm apenas uma gema na região nodal, que se origina alternadamente nos nós, em arranjo dístico, tal como observado na maioria das espécies estudadas. Dentre os bambus lignificados, apenas Chusquea capituliflora var. capituliflora apresentou gemas múltiplas e dimórficas (Figura 2), na região dos nós do colmo, apresentando uma única gema central arredondada, de tamanho maior em relação às demais, circundada por várias gemas de forma irregular e tamanho menor. Os demais gêneros (Tabela 1) apresentaram apenas uma gema por nó. Dentre estes, Merostachys pode ser reconhecido pelo arranjo apsidado (em forma de “leque”) de inserção dos ramos (Figura 3), no qual os eixos individuais do arranjo de primeira ordem emergem em arco. Nos nós dos bambus lignificados, ocorrem estruturas especializadas denominadas folhas do colmo (Figuras 4 e 5); nos bambus herbáceos, essas estruturas inexistem. As folhas do colmo são homólogas às folhas do ramo, mas modificadas para proteção da gema. São variáveis com relação ao tamanho, posição e morfologia; consistem em uma porção expandida, a bainha, e uma lâmina modificada ou reduzida (Figuras 4 e 5). Na junção da lâmina com a bainha, em geral, encontra-se a lígula interna, uma diminuta extensão apical da bainha, situada na face adaxial. A lígula externa situa-se na face abaxial e é uma estrutura revelada pela abscisão do pseudopecíolo (uma constrição na base da lâmina foliar), podendo estar presente ou não. A bainha e a lâmina das folhas do colmo podem apresentar projeções laterais; as da bainha são denominadas apêndices laterais (Figura 4) e as da lâmina, aurículas (Figura 5), de acordo com a terminologia de Soderstrom e Young (1983). Essas projeções são denominadas indistintamente por outros autores (MCCLURE, 1966; MCCLURE; SMITH, 1967; JUDZIEWICZ et al., 1999; SENDULSKY, 1997) apenas como aurículas ("auriculate"). Dentre os bambus lignificados, Eremocaulon aureofimbriatum foi a única espécie a apresentar aurículas. Geralmente, na região ligular, a folha do colmo pode apresentar as fímbrias, isto é, cerdas que se desenvolvem na junção da bainha e da lâmina foliar. Dentre os gêneros ocorrentes no PERD, Athroostachys e Merostachys apresentaram a lâmina da folha do colmo pseudopeciolada, ao passo que, em Chusquea, Eremocaulon e Guadua, a folha do colmo é confluente com o ápice da bainha, formando uma estrutura única (Figuras 4 e 5). Athroostachys capitata e Merostachys ternata, apresentaram fímbrias caracteristicamente longas (Figura 6), distinguindo-se amplamente das registradas para as demais espécies de bambus do PERD. Dentre os bambus lignificados coletados no PERD, apenas Chusquea apresentou padrão de ramificação infravaginal (Figura 8); os demais gêneros apresentaram padrão de ramificação intravaginal (Figura 7), segundo a classificação de McClure (1966) e Judziewicz et al. (1999).

45


Dentre os bambus herbáceos coletados no PERD, apenas Eremitis parviflora apresentou as referidas fímbrias; dentre os bambus lignificados, apenas Chusquea não apresentou fímbrias tanto na folha do colmo quanto na folha do ramo. De acordo com Clark (1989, 1995, 1997), os caracteres gemas múltiplas e dimórficas nos nós, colmo cheio e ausência de fímbrias tanto nas folhas dos ramos como nas folhas do colmo representam sinapomorfias morfológicas para as espécies do gênero Chusquea. Portanto, este conjunto de caracteres permite tanto ao especialista como ao leigo facilmente distinguir Chusquea dos demais gêneros de bambus nativos neotropicais.

4 CONCLUSÕES O levantamento florístico das Bambusoideae no PERD permitiu reconhecer 15 espécies de bambus numa pequena área do estado de Minas Gerais evidenciando o referido estado como um importante centro de diversidade de bambus no Brasil. No presente trabalho, registrou-se pela primeira vez a ocorrência de quatro gêneros para o referido estado (Athroostachys, Cryptochloa, Eremitis e Eremocaul). Dois anteriormente considerados endêmicos para o estado da Bahia tiveram seus limites de distribuição geográfica ampliados (Eremitis parviflora e Eremocaulon aureofimbriatum) e duas espécies novas foram descobertas (Merostachys sp.nov. 1 e Merostachys sp.nov.2). Dada a área total do PERD (36.000 ha) e a área relativamente pequena amostrada neste estudo (5.000 ha), bem como a própria extensão do estado de Minas Gerais, sugere-se a continuação destes estudos como estratégia para o conhecimento científico mais aprofundado dos bambus nativos do Brasil.

AGRADECIMENTOS Os autores agradecem aos funcionários do Parque Estadual do Rio Doce pela ajuda inestimável nos trabalhos de campo. A primeira autora é especialmente grata ao Departamento de Botânica da Universidade Federal de Viçosa (UFV) por ter fornecido toda a infraestrutura necessária à realização dos trabalhos e, em especial, aos Profs. Dra. Rita Maria de Carvalho-Okano, Dr. Tarciso S. Filgueiras e Dra. Milene Faria Vieira pela orientação e preciosa colaboração durante todo o período de seu curso de mestrado na UFV. Os autores agradecem ainda a Reinaldo Pinto Monteiro pela elaboração das ilustrações.

Figuras 1-3. Aspectos morfológicos do rizoma e gemas da região nodal em espécies de bambus. 1-Rizoma paquimorfo em Merostachys sp. (Santos-Gonçalves et al. 206). 2-Gemas múltiplas e dimórficas em Chusquea capituliflora Trin. var. capituliflora (Santos-Gonçalves et al. 135.). 3-Gema única no nó do mediocolmo em Merostachys sp. (SantosGonçalves et al. 206) com inserção apsidada ("em arco").

46


Figuras 4-8. Aspectos da folha do colmo, folha dos ramos e padrão de ramificação em espécies de bambus. 4. Folha do colmo com apêndices laterais (modificado de Soderstrom & Young, 1983). 5. Folha do colmo com aurículas (modificado de Soderstrom & Young, 1983). 6. Fímbrias em folhas dos ramos de Athroostachys capitata (Hook. f.) Benth. (Santos-Gonçalves et al. 81). 7. Ramificação intravaginal em Eremocaulon aureofimbriatum Soderstr. & Londoño (Santos-Gonçalves et al. 186). 8. Ramificação infravaginal em Chusquea capitulifloraTrin. var. capituliflora (Santos-Gonçalves et al. 135).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BURMAN, A. G.; FILGUEIRAS, T. S. A Review of the Woody Bamboo genera of Brazil (Gramineae:Bambusoideae:Bambuseae). Thaiszia Journal of Botany. Eslováquia: Safarik University, v. 3, p.53-88, 1993. CALDERÓN, C. E.; SODERSTROM, T. R. The genera of Bambusoideae (Poaceae) of the American continent: keys and comments. Washington: Smithsonian Institution Press, 1980. 27 p. Smithsonian Contributions to Botany nº 44. CLARK, L. G. Diversity and Biogeography of Neotropical Bamboos (Poaceae: Bambusoideae). Acta Botanica Brasilica. Brasil: Sociedade Botânica do Brasil, v. 4, p. 125-132, 1990. ________. Diversity and distribution of the Andean woody bamboos (Poaceae: Bambusoideae). In: CHUSCHILL, S. P., BALSLEV, H., FORERO, E., LUTEYN, J. Biodiversity and conservation of neotropical montane forests. Bronx: New York Botanical Garden, 1995. p. 501-512. ________. Diversity, biogoegraphy and evolution of Chusquea. In: CHAPMAN, G. P. The bamboos. London: Academic press, 1997. p. 33-44. ________. Systematics of Chusquea section Swallenochloa, section Verticillatae, section Serpentes and section Longifoliae (Poaceae: Bambusoideae). Systematic Botany Monographs. USA: American Society of Plant Taxonomists, v. 27, 1989. 127 p. FILGUEIRAS, T. S. Bambus nativos do Distrito Federal, Brasil (Gramineae:Bambusoideae). Revista Brasileira de Botânica. São Paulo: Sociedade Botânica de São Paulo, v.11, n.1, p.47-66, 1988. FILGUEIRAS, T. S.; PEREIRA, B. A. S. On the flowering of the Actinocladum verticillatum (Gramineae:Bambusoideae). Biotropica. USA: Association for Tropical Biology, Inc., v. 20, n. 2, p.164-166, 1988. FILGUEIRAS, T. S.; SANTOS-GONÇALVES, A. P. A checklist of the basal grasses and bamboos in Brazil (Poaceae). Bamboo Science & Culture. Albany: American Bamboo Society, v. 18, p. 7-18, 2004. GRASS PHYLOGENY WORKING GROUP. Phylogeny and Subfamilial Classification of the Grasses (Poaceae). Annals of the Missouri Botanical Garden. St. Louis: Missouri Botanical Garden, v. 88, n. 3, p. 373-457, 2001. HOLMGREN, P. K.; HOLMGREN, N. H.; BARNETT, L. C. E. K. Index Herbariorum: Part 1: The herbaria of the world (Regnum Vegetabile). New York: New York Botanical Garden, v. 120, 1999. 693 p. IEF - Instituto Estadual de Florestas. Pesquisas prioritárias para o Parque Estadual do Rio Doce, Brasil. Belo Horizonte: IEF. 1994. 35 p. JUDZIEWICZ, E. J.; CLARK, L. G.; LONDOÑO, X.; STERN, M. J. American Bamboos. Washington/D.C.: Smithsonian Institution Press, 1999. 392 p. LONGHI-WAGNER, H. M. In: WANDERLEY, M.G.L.; SHEPHERD, G.J.; GIULIETTI, A.M. (Coord.). Flora Fanerogâmica do Estado de São Paulo. São Paulo: Fapesp/Hucitec, 2001. vol. 1 (Poaceae). MCCLURE, F. A. The bamboos: a fresh perspective. Cambridge: Harvard University Press, 1966. 347 p. MCCLURE, F. A.; SMITH, L. B. Gramíneas (Suppl. Bambúseas). In: REITZ, R. Flora ilustrada Catarinense. Itajaí: Herbário Barbosa Rodrigues, 1967. 78 p.

47


OLIVEIRA, R. P. A tribo Olyreae (Poaceae:Bambusoideae) no Estado da Bahia. Dissertação (Mestrado) Universidade Estadual de Feira de Santana, 2001. 190 p. ________. Estudos Taxonômicos, Filogenéticos e Biossistemáticos em Raddia Bertol. (Poaceae:Bambusoideae:Olyreae). Tese (Doutorado) - Universidade Estadual de Feira de Santana, 2006. 336 p. SANTOS-GONÇALVES, A. P. Bambus (Bambusoidee s.l.: Poaceae) no Parque Estadual do Rio Doce, MG-Brasil. Dissertação (Mestrado em Botânica) - Universidade Federal de Viçosa, 2000. 91 p. ________. Estudos Taxonômicos e Morfoanatômicos em Colanthelia (Poaceae: Bambusoideae:Bambuseae). Tese (Doutorado em Biologia Vegetal) - Universidade Estadual de Campinas, 2005. 159 p. SANTOS-GONÇALVES, A. P.; FILGUEIRAS, T. S. Two new species of Merostachys from Brazil. Novon. USA: Missouri Botanical Garden, aceito, 2006. SENDULSKY, T. Merostachys burmanii (Poaceae: Bambusoideae: Bambuseae), a new species from Brazil. Novon. USA: Missouri Botanical Garden, v. 2, n. 2, p. 111-113, 1992. ________.Merostachys multiramea (Poaceae:Bambusoideae: Bambuseae) and similar species from Brazil. Novon. USA: Missouri Botanical Garden, v. 5, n. 1, p. 76-96, 1995. ________.Twelve new species of Merostachys (Poaceae: Bambusoideae: Bambuseae) from Brazil. Novon. USA: Missouri Botanical Garden, v. 7, n. 3, p. 285-307, 1997. SODERSTROM, T. R.; YOUNG, S. M. A Guide to Collecting Bamboos. Annals of the Missouri Botanical Garden. St. Louis: Missouri Botanical Garden, v. 70, n. 1, p. 128-136, 1983. SODERSTROM, T. R.; JUDZIEWICZ, E. J.; CLARK, L. G. Distribution Patterns in Neotropical Bamboos. In: PROCEEDINGS OF THE NEOTROPICAL BIOTIC DISTRIBUTION PATTERN WORKSHOP, 1987, Rio de Janeiro. Anais… Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Ciências, 1988. p. 121157. ZHANG, W.; CLARK, L. G. Phylogeny and classification of the Bambusoideae (Poaceae). In: JACOBS, S. W. L.; EVERETT, J. (Eds.). Grasses: Systematics and Evolution. Melbourne: CSIRO, 2000. vol. 2, p. 35-42.

48


4.4 FLORESTAS DOMINADAS POR TABOCAS SEMI-ESCANDENTES DO GÊNERO GUADUA, NO SUDOESTE DA AMAZÔNIA Bruce Walker Nelson1, Átila Cristina de Oliveira2, Daniela Vidalenc3, Maira Smith4, Euler Melo Nogueira5

Resumo São apresentados aspectos da ecologia das florestas de terra firme dominadas por tabocas semiescandentes do gênero Guadua, incluindo: a extensão geográfica destas florestas; o ciclo de vida das tabocas, suas ondas de florescimento e seus ecotipos, todos detectados com imagens de sensoriamento remoto; a morfologia das plantas e suas estratégias de crescimento vegetativo; a preferência por solos ricos em cátions, com argilas 2:1 e que sofrem altas taxas de erosão mecânica; a geomorfologia e fertilidade deste substrato; a influência das tabocas sobre a estrutura e biomassa da floresta; e recomendações para futuras pesquisas ecológicas e aplicadas. Palavras-chave: Bambu. Biomassa Florestal. Sensoriamento Remoto. Tabocais. Abstract This work describes some aspects of the ecology of Amazonian terra firme forests dominated by climbing bamboos of the genus Guadua, including: the geographic extent of this vegetation type; bamboo life cycle, flowering waves and ecotypes all detected using remote sensing; the bamboo's morphology and vegetative growth strategy; preference for highly erodible soils with 2:1 clays rich in cations; geomorphology and fertility of this peculiar substrate; the bamboo's influence on forest structure and biomass; and finally some recommendations for future ecological and applied studies. Keywords: Bamboo. Forest Biomass. Remote Sensing. Tabocais.

INTRODUÇÃO Neste trabalho são apresentadas as principais conclusões de cinco dissertações desenvolvidas no INPA (entre 1998 e 2005) que se referem à ecologia de florestas de terra firme dominadas por tabocas do gênero Guadua, nos estados do Acre e Amazonas. As dissertações foram realizadas por Átila Cristina de Oliveira (2000), Daniela Vidalenc (2000), Maira Smith (2000), Mabiane Batista França (2002) e Milton Carlos Bianchini (2005). São acrescidas observações do orientador (BWN) e de outros colaboradores. Outros importantes estudos não sumarizados aqui, que tratam de ecologia dos tabocais amazônicos no Acre e no Peru respectivamente, foram realizados por Marcos Silveira (2001) na Universidade de Brasília e Bronson Griscom (2003) na Escola de Ciências Florestais da Universidade de Yale. As espécies de taboca que dominam na floresta de terra firme no sudoeste da Amazônia são Guadua weberbaueri Pilg., G. sarcocarpa Londoño & P.M.Peterson e possivelmente outras do mesmo gênero. Os trabalhos de campo das dissertações foram realizados em um raio de 50 km de Sena Madureira, cidade localizada na fronteira entre os estados do Acre e Amazonas, local próximo da confluência dos rios Iaco e Purus. As informações sobre solo são baseadas nessa região, onde predomina a taboca provisoriamente identificada como G. sarcocarpa. As informações sobre morfologia e hábito de crescimento são referentes a esta espécie. Como muitos bambus lignificados, G. sarcocarpa reproduz-se apenas uma vez na vida e de forma sincronizada. As populações próximas a Sena Madureira morreram em 1988 e 1989, depois de florescerem e produzirem uma grande quantidade de sementes. Os trabalhos de campo foram iniciados com a nova coorte a partir dos dez anos de idade.

1 Coordenação de Pesquisas em Ecologia; Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia; Av. André Araújo

2936; 69060-001 Manaus, AM. E-mail: (bnelson@inpa.gov.br). 2 Projeto CI-TEAM; Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia; Av. André Araújo 2936; 69060-001 Manaus, AM. E-mail: (atilaoli@inpa.gov.br). 3 Rua Padre Estanislau Trzebiatowski n°532 sobrado 02; Boqueirão; 81750-390 Curitiba, PR. E-mail: (danielav@grupoboticario.com.br). 4 Doutoranda em Política e Gestão Ambiental pelo CDS/Universidade de Brasília; SQS 305 Bloco E Apto. 402 – Asa Sul; 70352-050 Brasília, DF. E-mail: (mairasmith17@yahoo.com.br). 5 Bolsista Pós-Doutorado: Coordenação de Ciências Florestais Tropicais; Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia; Av. André Araújo 2936; 69060-001 Manaus, AM. E-mail: (euler@inpa.gov.br).

49


1 MORFOLOGIA E ESTRATÉGIA DE CRESCIMENTO VEGETATIVO Os colmos são eretos na base e flexíveis na parte superior. Quando cresce livre, a planta é fortemente arqueada e raramente excede 12 m de altura. Os nós dos ramos superiores são providos de espinhos recurvos que facilitam o hábito semi-escandente quando a planta cresce entre árvores, que é a situação mais comum. O colmo é oco, com uma parede fina que racha facilmente quando seco, ao sol. Os colmos adultos de G. sarcocarpa apresentam diâmetro na altura do peito entre 5,7 e 7,0 cm, ou menores, quando rebrotam do rizoma após corte. A parte basal do colmo pode ser armada com espinhos ou completamente livre de espinhos. Os espinhos são ramos modificados e alguns ainda apresentam a morfologia de nós e entrenós, formando um pequeno ramo rígido em forma de ziguezague. Os colmos crescem isolados ou em pequenos grupos, sempre conectados por rizomas subterrâneos. Cada colmo, com seu complemento de ramos, é um ramet efêmero, que dura de 3-5 anos. O genet é o conjunto de colmos produzidos vegetativamente mais os rizomas, ou seja, o indivíduo derivado de uma semente. Smith (2000) escavou as malhas de rizomas de 20 genets e sempre encontrou o ponto de origem, onde a semente havia germinado. A base do primeiro colmo da plântula e seus primeiros rizomas permaneceram intactos e conectados dentro do solo, dez anos após a germinação. A forma de expansão vegetativa é do tipo guerrilha, com colmos infiltrados entre as árvores. O rizoma é do tipo paquimorfo com pescoço comprido. Um novo colmo é lançado a uma distância de até 12 m do colmo-mãe (mais comumente 2-5 metros) e atinge o dossel antes de produzir folhas, recebendo sustentação pelo rizoma. Aos 10 anos de idade, muitos colmos da coorte já alcançam o dossel ensolarado da floresta. Isto permite acelerar a produção de novos colmos mais altos. Nesta fase de seu ciclo de vida, a coorte rapidamente reconquista espaço temporariamente cedido às árvores pioneiras, com a morte da geração anterior. Dos 10 aos 13 anos de idade, a densidade de colmos vivos da coorte de G. sarcocarpa passou -1 de 1.060 para 1.900 caules ha , em uma parcela de floresta de 50 x 50 m. Os colmos da coorte ainda estavam aumentando seu diâmetro médio após os 10 anos de idade, pois a área basal do tabocal 2 -1 2 -1 aumentou ainda mais nesse período de três anos, passando de 2,1 m ha para 4,9 m ha .

2 CICLO DE VIDA, EXTENSÃO GEOGRÁFICA E ECOTIPOS Recentemente, o INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) disponibilizou mais de 200 imagens do sensor orbital Landsat TM para a região dos tabocais no Acre, Amazonas e parte do Peru. Estas imagens foram captadas entre 1985 e 2005. Somadas a um acervo de imagens Landsat MSS também disponibilizado gratuitamente pelo INPE, e às imagens do sensor MODIS disponíveis desde o ano 2001, tornou-se possível examinar com muito mais detalhe o comportamento espectral no tempo, o comprimento do ciclo de vida, o tamanho de cada população, e a extensão geográfica total dos tabocais no sudoeste da Amazônia. Na fase madura, quando a taboca domina o dossel da floresta, sua densa camada de folhas reflete mais fortemente do que a floresta sem taboca, em todas as bandas da região óptica do espectro. A alta reflectância é mais pronunciada nas faixas do infravermelho-próximo e -médio, conferindo um padrão espectral similar àquele das capoeiras. Quando morre de forma sincronizada, cada população de taboca torna-se espectralmente distinta de seus vizinhos, devido aos ramos secos iluminados no dossel da floresta. Este padrão espectral é efêmero, pois os ramos e colmos mortos apodrecem rapidamente na umidade amazônica. Durante 8-15 anos após a reprodução e mortalidade, a nova coorte nascida de sementes é confinada ao sub-bosque. Isto torna a presença de uma população de taboca invisível para sensores orbitais, na fase juvenil. É necessário examinar imagens com aproximadamente 15 anos de intervalo para detectar todas as florestas com dominância de Guadua. Com base na interpretação visual de imagens Landsat TM de apenas uma data em cada uma de 22 "cenas" do satélite, a extensão das florestas dominadas por guaduas semi-escandentes, em todo o 2 sudoeste da Amazônia (Brasil, Peru e Bolívia), foi primeiro estimada em 180.000 km (NELSON, 1994; incluindo dados não publicados de Risto KALLIOLA). Com base na interpretação visual dos mosaicos Landsat Geocover obtidos em ~1990 e ~2000 e de imagens MODIS captadas em julho de 2001 – e 2 descontando áreas desmatadas até 2001 – Bianchini (2005) estimou a área total em 161.000 km (Figura 1). O exame de imagens em sete datas ao longo de 28 anos dentro de uma única cena do Landsat demonstrou que esta extensão ainda está subestimada (NELSON; BIANCHINI, 2005). Estes mesmos autores inferiram um ciclo de vida de 28 a 30 anos, utilizando o grau de congruência espacial entre as populações na fase madura, mapeadas em sete momentos ao longo de 28 anos. Até hoje, foram observados diretamente apenas dois casos de ciclos completos. Utilizando imagens Landsat MSS e MODIS, uma mesma mancha de taboca foi observada morrendo entre 1975 e 1976, e também entre 2003 e 2004, um ciclo de 28 anos. Outra população morreu entre 2004 e 2005, no mesmo espaço de uma mancha de taboca recém-morta, visível 32 anos antes, em imagem Landsat MSS. Dentro de uma população, todos os genets florescem, frutificam e morrem de forma sincronizada. Quando uma população morre, sua forma e extensão são detectadas claramente em imagens de 2 4 2 sensores orbitais. Cada população internamente sincronizada ocupa uma área grande, de 10 a 10 km .

50


Na maioria dos casos, a área de cada população é espacialmente contínua. Algumas populações são fragmentadas na sua margem com uma população vizinha. Esta configuração sugere que aquela população com borda fragmentada esteja sendo substituída pela expansão da população vizinha. Possivelmente, as duas populações são espécies distintas. A fragmentação foi observada apenas em imagens orbitais, sem verificação de campo ou coletas botânicas. No estado do Acre existe também um ecotipo ou espécie de taboca confinada a vales e vertentes. Cada população do ecotipo dos vales -- reconhecida pela sincronia de sua reprodução -- é também fragmentada. Os fragmentos ocupam vales separados, com outro ecotipo ou espécie fazendo-se presente como matriz no espaço entre os vales.

3 ONDAS DE FLORESCIMENTO Por serem monocárpicos e dominantes na floresta, os bambus de longa vida sofrem forte pressão evolutiva para a sincronia reprodutiva entre genets (JANZEN, 1976). O indivíduo que antecipar ou atrasar seu florescimento não receberá pólen de outra planta e, mesmo se produzir sementes, sua prole será sombreada ou pelos adultos (se antecipar) ou pelas outras plântulas da coorte (se atrasar). A sincronia se manifesta na zona de contato entre duas populações, onde se observa uma linha demarcadora nítida entre uma determinada população A, que acaba de frutificar e morrer, e outra população vizinha B, ainda viva e assíncrona em relação à população A. Na escala de observação possibilitada pelo pixel de 30 m do Landsat, cada genet na área de contato aparenta conformar-se estritamente ao ciclo de A ou de B. Isso sugere que a troca gênica entre populações vizinhas deve ser mínima ou inexistente. No entanto, os ciclos de algumas populações vizinhas não são inteiramente independentes. Se uma população se reproduzir e morrer hoje, há uma maior probabilidade de seus vizinhos se reproduzirem e morrerem um ou dois anos antes ou depois. Esta assincronia imperfeita manifesta-se, em alguns casos, como ondas de florescimento (Figura 2). As populações contíguas morrem em uma sequência com estrutura temporal e espacial, tal qual uma fileira de dominós caindo. Este padrão indica que há alguma informação compartilhada entre populações vizinhas, mesmo que não ocorra troca gênica evidente. Ondas contagiosas de florescimento foram também reportadas para os bambus da Índia (TROUP, 1921). Ondas temporalmente estruturadas, mas espacialmente desorganizadas, foram documentadas para Bambusa arnhemica, no norte tropical úmido da Austrália (FRANKLIN, 2004). Este último autor citado postulou que as distintas populações dentro de uma onda de florescimento constituem casos incipientes de especiação alocrônica.

4 RELAÇÃO COM SOLO E TOPOGRAFIA A influência de solo e topografia sobre a presença e a densidade de Guadua foi estudada por Vidalenc (2000) e Bianchini (2005). O ambiente ótimo para alta densidade de colmos de G. sarcocarpa é uma paisagem suavemente ondulada, com colinas de baixa amplitude vertical e alta frequência horizontal: 200-500 m entre os topos das colinas. Seus solos contêm a argila expansiva smectita, um mineral com alta capacidade de troca catiônica. Tais argilas são confinadas, nas outras partes da Amazônia, aos sedimentos mais profundos ou aos depósitos de várzea recém-carreados dos Andes. No estado do Acre esta argila típica de várzea é encontrada perto da superfície, em terra firme. Alguns táxons de árvores típicos de várzea são também encontrados na terra firme dos tabocais: Couropita sp., Ceiba pentandra, Calycophyllum sp, Hura crepitans e Triplaris sp. As argilas expansivas encolhem no período seco, criando fendas com ~25 cm de profundidade, uma estrutura típica de vertissolos. Nos tabocais mais densos, as fendas no solo são mais pronunciadas. Elas causam a mistura de matéria orgânica e enegrecimento do solo até 35 cm de profundidade. A smectita expande no período chuvoso, diminuindo a permeabilidade do solo e estimulando o escoamento superficial. Como consequência, há uma alta taxa de remoção mecânica de solo na província dos tabocais e as nascentes dos rios Purus e Juruá tornam-se barrentas na época das chuvas. A alta carga de sedimentos e os sinais de remoção mecânica são observados nos córregos dentro dos tabocais. A baixa permeabilidade do solo no período chuvoso provavelmente impede a recarga da água profunda. Consequentemente, os córregos de primeira e segunda ordem secam completamente no verão amazônico. Mesmo os rios maiores, como o Acre, Iaco e alto Purus, tornam-se muito rasos na estiagem. A remoção mecânica impede a formação de horizontes fortemente lixiviados nos solos dos tabocais perto de Sena Madureira. Próximo à superfície, ocorrem sedimentos relativamente ricos em cátions de sais solúveis como cálcio, magnésio e potássio (VIDALENC, 2000). São depósitos sedimentares não consolidados, marinhos ou estuarinos, de idade Mioceno (RÄSÄNEN et al., 1995). Altas concentrações de sais nos solos da província das tabocas trepadeiras são também evidenciadas pela condutividade da -1 água nos rios que ali nascem. Santos e Ribeiro (1988) reportaram valores de 310, 190 e 270 µS.cm , para os rios Iaco, Caeté e Chandless, respectivamente. Para tributários do rio Acre entre Brasiléia e Assis -1 Brasil, Mascarenhas et al. (2004) detectaram uma média 412 µS.cm . Estes valores superam por uma a

51


duas ordens de grandeza os níveis típicos de águas que drenam solos intemperizados de terra firme na Amazônia. Nos substratos ocupados por taboca na região de Sena Madureira, os poços rasos cavados pelos moradores frequentemente apresentam água salgada, um fenômeno normalmente restrito a regiões de clima árido. Guadua cf sarcocarpa é excluída de solos fortemente intemperizados, com baixos teores de cátions, baixa capacidade de troca catiônica e um horizonte-A mais arenoso. Os solos que excluem a taboca são encontrados em paisagens tabulares com baixa densidade de drenagem. O substrato é permeável e sofre pouca remoção mecânica quando coberto por floresta. A taboca é presente, mas ocorre em baixa densidade, em platôs de menor altitude, ou nas partes superiores de catenas, onde a remoção mecânica tem sido menos intensa. Três densidades de colmos de taboca na floresta – alta, baixa ou ausente – correspondem a reflectâncias progressivamente menores nas bandas do infravermelho do Landsat (BIANCHINI, 2005). O grau de deciduidade das árvores, detectado em imagens Landsat, é maior nos vertissolos com argila expansiva (adequados para taboca), do que no topo das catenas e nos baixos platôs com latossolo podzólico (onde a taboca é excluída). Não se sabe ainda se este estresse hídrico é consequência da menor recarga de água profunda dos vertissolos no período chuvoso, de algum impedimento de raízes profundas, ou do rasgo das raízes superficiais das árvores pelas fendas formadas no vertissolo em cada verão. As tabocas não se tornam decíduas no período seco, sendo, portanto, tolerantes ao estresse hídrico dos vertissolos.

5 EFEITOS SOBRE A ESTRUTURA, COMPOSIÇÃO E BIOMASSA DA FLORESTA Perto de Sena Madureira (Acre), as populações de taboca ainda não ocupam totalmente as paisagens colinosas com solos vérticos. Esta situação permitiu a Oliveira (2000) e França (2002) excluir o efeito de substrato e examinar apenas o efeito da taboca sobre a estrutura e biomassa da floresta e sobre a abundância de outras formas de vida. Oliveira (2000) realizou 10 inventários na floresta sem taboca, e outros 10 inventários na floresta com taboca. As palmeiras em todas as classes de tamanho sofreram forte rarefação na presença da taboca G. sarcocarpa (Figura 3A). Algumas espécies (Euterpe precatoria, Iriartea deltoidea) foram praticamente eliminadas. Árvores dicotiledôneas maiores de 60 cm de circunferência ao nível do peito sofreram rarefação, mas árvores menores foram pouco afetadas (Figura 3B). As tabocas trepadeiras são agentes de perturbação da floresta, pesando sobre as árvores maiores e amassando o sub-bosque sob camadas de ramets senescentes. Como os ramets duram apenas 3-5 anos, eles funcionam como armas descartáveis, naturalmente substituídas pelos colmos novos que nascem do rizoma. A abertura do dossel facilita a reconquista de espaço pela taboca, em um processo de retro-alimentação positiva. A perturbação ocasionada pela taboca ocorre em toda a floresta, mas não de forma homogênea. Clareiras irregulares são criadas pela derrubada de árvores grandes e estes espaços são ocupados mais densamente pela taboca. Há uma relação inversa entre a densidade de colmos e a porcentagem do dossel ocupada pelas árvores (SMITH, 2000). Dentro das clareiras densamente ocupadas por taboca, ocorrem algumas árvores altas e finas, com copas pequenas, casca lisa e sem galhos abaixo dos 15 m de altura. Esta arquitetura constitui uma estratégia de "escape". Os ramos superiores de taboca não alcançam seus galhos e deslizam pelo tronco. Uma estratégia de convivência com a taboca é apresentada por aquelas árvores menores dotadas de capacidade de rebrotar repetidas vezes após quebra da copa ou do tronco. As árvores pioneiras ou de crescimento rápido são favorecidas na presença da taboca (OLIVEIRA, 2000). Consequentemente, a densidade média da madeira à altura do peito nas árvores da floresta com -3 -3 taboca é apenas 0,51 g cm , significativamente menor que a densidade de 0,60 g cm na floresta livre de taboca (FRANÇA, 2002). Para duas árvores com o mesmo diâmetro, aquela na floresta com taboca tende a ter menor altura (FRANÇA, 2002). O efeito conjunto da rarefação das árvores grandes, da menor densidade de madeira e da menor altura foi um estoque de biomassa seca de apenas 113 toneladas por hectare na floresta primária dominada pela coorte de G. sarcocarpa com 10 anos de idade. Na floresta sem taboca, o estoque foi 227 toneladas por hectare. Estes valores são referentes à biomassa seca de todos os caules vivos em pé, maiores que 5 cm de DAP (Diâmetro à Altura do Peito), incluindo, portanto, a biomassa da própria taboca. O efeito líquido da presença da taboca é uma perda de 50% da biomassa florestal, em relação ao potencial de estoque sem a taboca. As estimativas de biomassa foram baseadas em uma relação alométrica apropriada para floresta densa (CHAMBERS et al., 2001) adaptada para a relação altura-diâmetro e a densidade básica da madeira em florestas com e sem taboca perto de Sena Madureira (FRANÇA, 2002; NOGUEIRA, 2003; NELSON et al., 2004). Perturbações alóctones favorecem a taboca. Após corte raso (SMITH, 2000) e após um fogo rasteiro, o restabelecimento das tabocas foi mais rápido e mais bem sucedido do que as rebrotas de outras formas de vida.

52


6 RECOMENDAÇÕES A identificação taxonômica é difícil para as espécies de Guadua semi-escandentes no estado estéril. Por outro lado, a grande quantidade de imagens Landsat e MODIS disponível hoje permite delimitar a área de ocorrência de ecotipos, de populações, e as ondas de florescimento. Usando as imagens como ponto de partida, recomenda-se explorar as ferramentas de genética molecular para resolver os problemas taxonômicos, examinar a diversidade intra-específica, e testar a hipótese de especiação alocrônica. Steege et al. (2006) apontam a fertilidade do solo, a intensidade de perturbação natural da floresta, e a duração da estiagem como importantes preditores dos gradientes de diversidade beta das árvores amazônicas, em grande escala espacial. As tabocas na região de Sena Madureira são indicadoras de solos mais férteis (VIDALENC, 2000) e constituem agentes de perturbação com forte influência sobre a estrutura e a composição da floresta (OLIVEIRA, 2000), mas os estudos descritos aqui são preliminares, com dados de campo restritos a uma pequena área geográfica. As identificações botânicas de árvores foram baseadas no nome vulgar informado por um mateiro. Sugere-se ampliar os estudos sobre solo e composição das florestas com e sem tabocas, para outras partes da província dos tabocais no sudoeste da Amazônia, incluindo inventários com identificação botânica mais confiável. Atualmente não há aproveitamento significativo das guaduas semi-escandentes no sudoeste amazônico. Os colmos apodrecem rapidamente, são fracos e racham com facilidade. Não são úteis como elemento de suporte em estruturas. Pelos irritantes nas bainhas caulinares dificultam a coleta e o processamento mecanizado. Se a floresta com taboca é derrubada usando-se trator-de-esteira, os pelos penetram na roupa do operador e são insuportáveis. Até uma altura de poucos metros, o colmo pode ser colhido manualmente, sem muita dificuldade. Como as tabocas crescem misturadas entre árvores, e presas às suas copas, seria difícil extrair toda a planta da floresta sem danificar as árvores. Possivelmente, as guaduas semi-escandentes possam ser aproveitadas para o artesanato. Elas são nativas, muito abundantes e rebrotam rapidamente quando cortadas. É importante investigar todas as possibilidades para se encontrar alternativas de uso econômico, com retorno social, para esse abundante recurso nativo da Amazônia.

Figura 1. Extensão das florestas de terra firme dominadas por tabocas trepadeiras do gênero Guadua, no sudoeste da Amazônia, excluindo áreas desmatadas até 2001. Interpretação visual de imagens Landsat Geocover de ~1990 e ~2000, e de uma imagem MODIS de 2001. Fonte: Bianchini (2005).

53


Figura 2. Onda de florescimento e mortalidade de tabocas no extremo oeste do Acre, progredindo de norte a sul em intervalos de um a dois anos. Interpretação visual de imagens Landsat cedidas pelo INPE.

Figura 3. Efeito da taboca sobre as outras formas de vida. A) As palmeiras são drasticamente reduzidas em todas as classes de circunferência à altura do peito (CAP). B) A rarefação do conjunto de todas as formas de vida que não são tabocas (árvores + palmeiras + cipós) é mais pronunciada nas classes maiores. Fonte: Oliveira (2000).

54


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BIANCHINI, M. C. Florestas Dominadas por Bambu (gênero Guadua) no Sudoeste da Amazônia: Extensão, comportamento espectral e associação com o relevo. Dissertação (Mestrado em Ecologia) - INPA/Universidade do Amazonas, Manaus, 2005. 75 p. CHAMBERS, J. Q. et al. Tree Damage, Allometric Relationships, and above-ground net Primary Production in a Central Amazon Forest. Forest Ecology and Management. Netherlands: Elsevier BV., v. 152, n. 1-3, p. 73-84, 2001. FRANÇA, M. B. Modelagem de Biomassa Florestal através do padrão espectral no Sudoeste da Amazônia. Dissertação (Mestrado) - Universidade do Amazonas/INPA, Manaus, 2002. 106 p. FRANKLIN, D. C. Synchrony and Asynchrony: Observations and hypotheses for the flowering wave in a long-lived semelparous bamboo". Journal of Biogeography. United Kingdom: Blackwell Publishing Inc., v. 31, n. 5, p. 773-786, 2004. GRISCOM, B. W. The Influence of Bamboo (Guadua sarcocarpa and Guadua weberbaueri) on Stand Dynamics in Lowland Terra Firme Forests of Southeastern Peru. Tese (Doutorado in Forestry) Yale School of Forestry/Yale University, New Haven, 2003. 294 p. JANZEN, D. H. Why Bamboos Wait so Long to Flower? Annual Review of Ecology and Systematics. Philadelphia: University of Pennsylvania, v. 7, p. 347-391, 1976. MASCARENHAS, A. F. S. et al. Avaliação da Concentração de Mercúrio em Sedimentos e Material Particulado no Rio Acre. Acta Amazonica. Acre: Instituto Nacional de Pesquisas da Amazonia, v. 34, n. 1, p. 61-68, 2004. NELSON, B. W. Natural Forest Disturbance and change in the Brazilian Amazon. Remote Sensing Reviews. [S.l.]: Taylor & Francis, v. 10, n. 1-3, p. 105-125, 1994. NELSON, B. W.; BIANCHINI, M. C. Complete Life Cycle of Southwest Amazon Bamboos (Guadua spp) Detected with Orbital Optical Sensors. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE SENSORIAMENTO REMOTO, 12., 2005, Goiânia. Anais… São José dos Campos: INPE, 2005. p. 1629-1636. NELSON, B. W. et al. Effects of Wood Density and the Height-x-Diameter Relationship on Biomass Differences Between Three Widespread Amazonian Forest Types. In: Conferência Científica do LBA, 3., 2004, Brasília. Anais... Brasília: LBA, 2004. Resumo 33.16-P (painel). NOGUEIRA, E. M. Biomassa de Árvores na Amazônia Central: Densidade de Madeira, Volume do Fuste e Ocorrência de Oco. Dissertação (Mestrado em Ciência Florestal Tropical) - Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia - Universidade do Amazonas, Manaus, 2003. 96 p. OLIVEIRA, A. C. A. Efeitos do Bambu Guadua weberbaueri Pilger Sobre a Fisionomia e Estrutura de uma Floresta no Sudoeste da Amazônia. Dissertação (Mestrado em Ecologia) - Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia - Universidade do Amazonas, Manaus, 2000. 71 p. RÄSÄNEN, M. E. et al. Late Miocene Tidal Deposits in the Amazonian Foreland Basin. Science. USA: American Association for the Advancement of Science, v. 269, n. 5222, p. 386-390. 1995. SANTOS, U. M.; RIBEIRO, M. N. G. A Hidroquímica do Rio Solimões - Amazonas. Acta Amazonica. Acre: Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, v. 18, n. 3-4, p. 145-172, 1988. SILVEIRA, M. A. Floresta Aberta com Bambu no Sudoeste da Amazônia: Padrões e Processos em Múltiplas Escalas. Tese (Doutorado em Ecologia) - Universidade de Brasília, Brasília, 2001. 121 p. SMITH, M. Efeito de Perturbações sobre Abundância, Biomassa e Arquitetura de Guadua weberbaueri Pilg. (Poaceae:Bambusoideae) em uma Floresta Dominada por Bambu no Sudeste da Amazônia. Dissertação (Mestrado em Ecologia) - INPA/UA, Manaus, 2000. 86 p. STEEGE, H. T. et al. Continental-scale Patterns of Canopy Tree Composition and Function Across Amazonia. Nature. United Kingdom: Nature Publishing Group, v. 443, p. 444-447, 2006. TROUP, R. S. The Silviculture of Indian Trees. Oxford: Clarendon Press, 1921. v. III Lauraceae to Coniferae. VIDALENC, D. Distribuição das Florestas Dominadas pelo Bambu Guadua weberbaueri em Escala de Paisagem no Sudeste da Amazônia e Fatores Edáficos que Afetam sua Densidade. Dissertação (Mestrado em Biologia) - INPA/UA, 2000. 92 p.

55


4.5 INOVAÇÕES TECNOLÓGICAS PARA A PROPAGAÇÃO DE ESPÉCIES DE BAMBU Eurico Eduardo Pinto de Lemos1, Fernanda Karina Pereira da Fonseca2, Jaqueline Figueredo de Oliveira2, Ivens Barboza Leão2, Leila de Paula Rezende1, Cynthia Diniz de Souza2, Tarciso S. Filgueiras3, Mauro de Oliveira Ferreira2

INTRODUÇÃO O termo genérico “cultura do bambu” é utilizado para designar o cultivo mais ou menos organizado e intencional de espécies nativas ou exóticas de plantas da subfamília Bambusoideae (Poaceae). Até o presente momento, pouquíssimas espécies de bambus, dentre as centenas existentes de grande porte, têm sido de fato cultivadas no Brasil. Entre as que despertam maior interesse estão Bambusa vulgaris, Bambusa vulgaris var. vittata, B. tuldoides, Phyllostachis aurea, Phyllostachis pubescens, Dendrocalamus giganteus e Guadua angustifolia, seja pelo aspecto ornamental, seja pelo seu valor como produtoras de celulose, material para construção, artesanato, alimento, ou como controladoras de erosão, etc. De um modo geral, a propagação dessas fascinantes plantas ainda encera dificuldades, quando se trata de multiplicação rápida e em grandes quantidades. Na maioria dos casos, a multiplicação de bambus lenhosos de grande porte demanda grande apoio logístico no que diz respeito à mão de obra, recipientes, substrato e transporte (SALGADO; GREGO, 2002). De uma maneira geral, a moderna indústria de propagação tem evoluído nos últimos 30 anos no sentido de elevar a qualidade genética e fitossanitária das mudas, mas ao mesmo tempo reduzir os custos de produção, transporte e implantação das novas áreas de cultivo. Somente quando se tenta estabelecer grandes áreas cultivadas com bambu se tem a verdadeira noção dos custos envolvidos no processo de produção ou aquisição de mudas de qualidade. No estado de Alagoas, a criação do Instituto do Bambu impulsionou o cultivo dessas plantas e proporcionou a formação de uma pequena coleção de bambus lignificados de grande porte. A dificuldade inicial de se atender a demanda por mudas levou a Universidade Federal de Alagoas, parceira do Instituto do Bambu, a iniciar alguns projetos de pesquisa para incrementar a multiplicação das espécies de interesse para os produtores. Esse trabalho, inicialmente limitado à espécie Guadua angustifolia, foi posteriormente ampliado para diversas espécies exóticas e nativas do Brasil. A principal linha de trabalho estabelecida foi a micropropagação, por se entender que os maiores custos de produção de mudas e implantação de novas áreas estão justamente na logística necessária à obtenção de propágulos no campo, na estrutura de viveiro, no volume de substrato, no tipo de recipiente e transporte das mudas para o campo (HERRERA; OSPINA, 1999; HIDALGO-LOPEZ, 2003). Pensando nisso, propomos pesquisar a possibilidade de se reduzir drasticamente o tamanho convencional dos propágulos e acelerar a sua multiplicação utilizando pequenos volumes de substrato e, consequentemente, reduzindo o custo do transporte. A micropropagação, que utiliza pequenas porções de tecidos para propagar rapidamente plantas sob condições assépticas, tem sido pesquisada em vários países da Ásia (RAO, 1985; HIRIMBUREGAMA; GAMAGE, 1995; BAG et al., 2000; LIN et al., 2004). As experiências com a micropropagação do bambu no ocidente são mais raras. No gênero Guadua dois trabalhos são conhecidos (MARULANDA et al., 2002; RODRÍGUEZ, 2003) que declaram ter alcançado a regeneração de plantas por organogênese direto de explantes de segmentos nodais. No Brasil, embora existam trabalhos preliminares, não existem relatos científicos de grupos trabalhando com a cultura de tecidos de bambus. Para tanto, foram estabelecidos alguns experimentos de propagação vegetativa in vitro utilizando pequenas brotações oriundas de gemas axilares próximas à base das plantas. O desafio de gerar plantas em profusão a partir desses propágulos obtidos de plantas conhecidas poderá servir no futuro para estabelecer novos rumos para a redução dos custos de implantação de novas áreas de cultivo.

1 MATERIAIS E MÉTODOS Trabalhos de micropropagação por cultura de tecidos (in vitro) foram conduzidos no Laboratório de Biotecnologia Vegetal do CECA/UFAL em Maceió, Alagoas. Como padrão da propagação in vitro será descrita a metodologia utilizada para a micropropagação das espécies Guadua angustifolia em trabalho anterior descrito por Oliveira (2005). As demais espécies seguiram a mesma metodologia de coleta de

1 Professores Associados, Dr., CECA/UFAL. E-mail: (eepl@uol.com.br; leilarezende02@hotmail.com). 2 Eng. Agrônomos, MSc. CECA/UFAL. E-mail: (fkpf2003@yahoo.com.br; jaquelinefigueredo@hotmail.com;

ivensleao@hotmail.com; cyntia_diniz@hotmail.com; maurooferreira@hotmail.com). 3 Dr., Reserva Ecológica do IBGE-DF. E-mail: (tfilg@uol.com.br).

56


explantes (propágulos iniciais), com exceção para os casos em que se utilizaram cariopses (Filgueirasia canavieira e Bambusa nutans).

2 COLETA DE EXPLANTES (MATERIAL VEGETAL) Mudas propagadas convencionalmente por divisão de touceiras a partir de matrizes da coleção de bambus do CECA/UFAL (Figura 1) foram selecionadas e cultivadas em vasos plásticos com capacidade para 2 litros de substrato (barro e torta de filtro 2:1), em viveiro telado (Figura 2).

Figura 1. Planta de Guadua angustifolia, com cerca de dois anos de idade, cultivada na coleção de bambus do CECA-UFAL, 2006.

Figura 2. Muda de Guadua angustifolia utilizada como doadora de segmentos nodais para multiplicação in vitro, 2006.

Segmentos nodais dos colmos laterais foram excisadas de ramos jovens, tenros e vigorosos e lavados em água corrente por 10 minutos. Em seguida, os ramos tiveram as folhas removidas e foram cortados em pedaços contendo 2 a 4 nós. Os segmentos foram levados para o laboratório e, em -1 condições assépticas, mergulhados por 30 minutos em fungicida Ridomil (3 g.L ). Após a lavagem em fungicida, os segmentos foram postos em solução de água sanitária pura (2% de hipoclorito de sódio) por 20 minutos. No final, foram efetuadas três lavagens em água estéril para remoção da solução desinfestante. Após a desinfestação, os explantes foram seccionados com bisturi em segmentos nodais de cerca de 2 a 3 cm de comprimento e inoculados em frascos de vidro contendo meio de cultura básico de MS -1 -1 (MURASHIGE; SKOOG, 1962), enriquecido com 30 g.L de sacarose e gelificado com 2,5 g.L de gelrite, e que teve seu pH ajustado para 5,8 antes de ser autoclavado a 121C por 20 minutos (Figura 3). O meio foi ainda enriquecido com diferentes tipos de hormônios vegetais (citocininas e auxinas) isolados ou combinados, para estimular a brotação das gemas e dar início ao processo propagativo.

57


Os explantes foram sempre mantidos em sala de crescimento sob intensidade luminosa de 50 -2 -1 mol.m .s , proveniente de lâmpadas frias Philips TDL. O fotoperíodo utilizado foi de 16 horas e a temperatura da sala ajustada para 25C (Figura 4).

Figura 3. Introdução de gemas auxiliares de nós de colmos de Guadua angustifolia em meio de cultura MS enriquecido, 2006.

Figura 4. Vista geral da sala de crescimento do BIOVEG, 2006.

3 UTILIZAÇÃO DE CARIOPSES COMO EXPLANTE INICIAL A propagação de espécies de bambu por sementes (cariopse) não é comum, visto que o florescimento, para a maioria das espécies de importância econômica, é um fenômeno raro que leva muitos anos para ocorrer. Todavia, eventos como esses podem ocorrer, o que torna a utilização dos propágulos viável e interessante quando se busca variabilidade genética. O Laboratório de Biotecnologia Vegetal – CECA – UFAL recebeu cariopses de Bambusa nutans provenientes da coleção do Instituto Agronômico de Campinas, doadas pelo Dr. Antônio Salgado, e cariopses de Filgueirasia cannavieira provenientes de plantas nativas da Chapada dos Veadeiros, Goiás, coletadas pelos autores (Figuras 5 e 6).

Figura 5. Panícula de Filgueirasia cannavieira no Cerrado, em Cavalcante, Goiás

Figura 6. Touceira de Filgueirasia cannavieira no Cerrado, em Cavalcante, Goiás

Em cada um dos casos, as sementes com ou sem espiguetas e cariopses foram desinfestadas em solução de água sanitária pura por 20 minutos e em seguida lavadas em água estéril. Em seguida, as sementes foram tratadas ou não com solução de 50 ou 100 mg de ácido giberélico (GA 3) por litro. Nas duas espécies, uma parte das sementes foram postas para germinar em papel de filtro umedecido dentro de placas de filtro esterilizadas em autoclave e a outra parte foi posta para germinar em frascos contendo 30 mL de substrato semi-sólido de agar-água.

58


Foram utilizadas 12 sementes por placa de petri e 6 placas para cada tratamento. As sementes foram postas em câmara de germinação escura com temperatura controlada de 25C. À medida que as sementes foram germinando, iam sendo retiradas e postas em meio de cultura de MS para desenvolver as plântulas. A multiplicação das plântulas foi possível em meio MS enriquecido com concentrações diversas de citocininas.

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO 4.1 MICROPROPAGAÇÃO DE GUADUA ANGUSTIFOLIA Os resultados obtidos nesse trabalho mostraram que a dificuldade inicial em se obter explantes livres de contaminantes in vitro foi superada após várias tentativas e ajustes no protocolo de desinfestação. Observações preliminares apontaram a necessidade de se utilizar um fungicida e um antibiótico na etapa inicial de desinfestação. O fungicida Ridomil (3 g/L) por 10 minutos controlou a contaminação por fungos em cerca de 20% dos frascos, mas não as evitou completamente. A possível presença de fungos e leveduras no interior dos tecidos vegetais, principalmente nos espaços intercelulares (apoplasto), possibilitou o crescimento dos mesmos nos meios de cultura após a inoculação dos explantes. A contaminação das culturas por bactérias em cerca de 95% dos frascos apontou a necessidade de tratamento com antibiótico antes da inoculação dos explantes nos meios. Exames laboratoriais indicaram a contaminação por bactérias gram negativas, o que motivou uma passagem dos explantes por 30 minutos em solução estéril do antibiótico tetraciclina (500 mg/100 mL). Com os ajustes efetuados, foi possível se obter cerca de 30% de explantes com pleno desenvolvimento em cultura; não obstante, ainda se detectou a presença de microorganismos associados aos tecidos vegetais. Essa associação, possivelmente simbiótica, aconteceu pacificamente e aparentemente não interferiu na brotação e crescimento dos explantes nos frascos. O estímulo à brotação e crescimento dos explantes em cultura foi obtido combinando-se meios contendo a citocinina bezilaminopurina (BAP) em concentrações variáveis entre 1 e 5 mg/L (Figura 7). A utilização da cinetina (CIN) nas mesmas concentrações também estimulou o aparecimento de brotações nos segmentos nodais de Guadua angustifolia. A associação destas citocininas com as auxinas ácido indol butírico (AIB) e ácido naftaleno acético (ANA) em concentrações entre 0,1 e 1,0 mg/L proporcionaram resultados erráticos e de difícil interpretação. Os subcultivos dos explantes ocorreram a cada 45 dias e foi possível obter de 3 a 5 novos brotos por subcultivo.

Figura 7. Gemas de Guadua angustifolia brotadas de explantes nodais em meio MS + 2 mg/L BAP.

O enraizamento dos explantes foi possível somente após várias tentativas com e sem a utilização de auxinas no meio MS. As brotações com comprimento superior a 3 cm tiveram maior facilidade de enraizar do que brotos menores. A aclimatização dos explantes foi feita em câmara úmida, em bandejas com substrato esterilizado de fibra de coco e torta de filtro (1:1).

59


4.2 MICROPROPAGAÇÃO DE FILGUEIRASIA CANNAVIEIRA A germinação in vitro das sementes sem cariopses ocorreu rapidamente entre 6 e 18 dias atingindo o total de 74%. A germinação das sementes com cariopses e com espiguetas somente iniciouse aos 24 dias e prosseguiu linearmente até os 60 dias quando atingiu 49% e 39%, respectivamente. O índice de contaminação foi relativamente baixo variando entre 5 e 23% sendo sempre maior nas sementes envolvidas pelas espiguetas. Esse resultado era de certa forma esperado, pois as possibilidades de eficiência da solução desinfestante sobre as estruturas das espiguetas e cariopses eram menores. Da mesma forma, o estímulo à germinação proporcionado pelo contato do embrião com a umidade do substrato pode ter sido reduzido nas sementes cobertas por cariopses e espiguetas, o que atrasou e diminuiu a percentagem de germinação das mesmas. O tratamento com as duas concentrações do ácido giberélico não interferiu significativamente nos resultados da germinação em relação à testemunha. As sementes eram na sua maioria viáveis e germinaram no escuro sem dificuldades quando removidas as cariopses e postas em ambiente com umidade e temperatura adequadas. O estímulo de giberelinas à germinação de sementes ocorre, em geral, em sementes fisiologicamente imaturas, o que não parece ser o caso da espécie aqui estudada. Resultados semelhantes de maior percentagem e velocidade de germinação foram obtidos por Felippe e Filgueiras (1986) estudando a germinação de sementes sem cariopses da espécie de bambu nativo do Cerrado Actinocladum verticillatum. Eles observaram que as sementes livres das cariopses iniciaram a germinação aos 8 dias chegando ao máximo de 39% aos 40 dias; enquanto que sementes com cariopses iniciaram a germinação aos 16 dias e atingiram o máximo de cerca de 13% após 40 dias. A utilização de ácido giberélico também não influenciou a germinação das sementes que se mostraram mais responsivas no claro do que no escuro. A multiplicação posterior das plântulas foi rara e errática. Nenhuma das combinações de meio de cultivo utilizadas foi adequada para promover a múltipla brotação de gemas nas plântulas germinadas. Uma das possíveis explicações para esse fato é decorrente da baixa adaptação das plântulas ao rico meio de MS, ou ainda às concentrações e/ou combinações hormonais utilizadas. A aclimatização das plântulas germinadas in vitro ocorreu sem problemas, mas o seu crescimento, mesmo em viveiro, não foi possível. Neste caso, parece que há uma baixa adaptação dessa espécie à altitude de Maceió (nível do mar) em relação ao seu ambiente natural (> 1.000 m); ou ainda, as condições de substrato foram também inadequadas ao seu desenvolvimento. 4.3 MICROPROPAGAÇÃO DE BAMBUSA NUTANS A micropropagação dessa espécie se deu com sucesso em meio de cultivo de MS enriquecido com 2 mg/L BAP. O enraizamento ocorreu sem a necessidade de adição de auxinas ao meio, visto que os explantes foram originários de embriões que já possuíam raízes pré-formadas. 4.4 MICROPROPAGAÇÃO DE OUTRAS ESPÉCIES DE BAMBUS Diversas outras espécies de bambus vêm sendo trabalhadas com relativo sucesso no Laboaratório de biotecnologia Vegetal – CECA – UFAL, sendo as principais Bambusa vulgaris, Dendrocalamus giganteus. A expectativa é de se obter protocolos de micropropagação para a rápida multiplicação de espécies de interesse dos produtores brasileiros em geral. Além disso, essa linha de pesquisa do Laboratório visa estabelecer as bases para a regeneração de plantas in vitro que possam ser geneticamente transformadas e servir como ferramenta de auxílio em programas de melhoramento genético de bambus.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BAG, N; CHANDRA, S; PALNI, L. M. S; NANDI, S. K. Micropropagation of Dev-ringal [Thamnocalamus spathiflorus (Trin.) Munro] - a Temperate Bamboo, and Comparison Between in Vitro Propagated Plants and Seedlings. Plant Science. Netherlands: Elsevier BV., v. 156, n. 2, p. 125-135, 2000. FELIPPE, G. M.; FILGUEIRAS, T. S. Germination of Actinocladum verticillatum (Nees) McClure ex Soderstrom, a Bamboo from the Brazilian ‘Cerrado’ Vegetation. Hoehnea. São Paulo: Instituto de Botânica, v. 13, p. 95-100, 1986. HERRERA, E. G.; OSPINA, A. S. Una Alternativa Sostenible La Guadua: Técnicas de Cultivo y Manejo. Colombia: Corporación Autónoma regional del Quindío, 1999. HIDALGO-LÓPEZ, O. Bamboo: the gift of the gods. Bogota: Oscar Hidalgo-López Editor, 2003. 553 p. HIRIMBUREGAMA, K.; GAMAGE, N. Propagation of Bambusa vulgaris (Yellow Bamboo) Through Nodal Bud Culture. Journal of Horticultural Science. [S.l.: s.n.], v. 70, n. 3, p. 469-475, 1995.

60


LIN, C-S; LIN, C-C; CHANG, W-C. Effect of Thidiazuron on Vegetative Tissue-derived Somatic Embryogenesis and Flowering of Bamboo Bambusa edulis. Plant Cell, Tissue and Organ Culture. Netherlands: Klumer Academic Publishers, v. 76, n. 1, p. 75-82, 2004. MARULANDA, M. L.; CARVAJALINO, M; VARGAS, C; LONDOÑO, X. La Biotecnología Aplicada al Estudio y Aprovechamiento de la Guadua. In: SEMINARIO - TALLER AVANCES EN LA INVESTIGACIÓN SOBRE GUADUA, 2002, Pereira. Anais… Pereira: Universidad Tecnológica de Pereira, 2002. p. 16-18. MURASHIGE, T.; SKOOG, F. A Revised Medium for Rapid Growth and Bio Assays with Tobacco Tissue Cultures. Physiologia Plantarum. United Kingdom: Blackwell Publishing Inc., v. 15, n. 3, p. 473497, 1962. OLIVEIRA, J. F. Desenvolvimento de métodos de micropropagação para produção de mudas de bambu (Bambusa nutans). Trabalho (Conclusão de Curso) - UFAL-CECA, Rio Largo, 2005. 33 p. RAO, A. N. Anatomical Studies on Certain Bamboos Growing in Singapore. In: RECENT RESEARCH ON BAMBOO: PROCEEDINGS OF INTERNATIONAL BAMBOO WORKSHOP, 1985, Hangzhou. Anais… Beijing: Chinese Academy of Forestry, 1987. RODRÍGUEZ, N. Propagación in Vitro de Guadua angustifolia Kunth (bambú), Importancia y Ventajas Comparativas. In: SEMINARIO INTERNACIONAL DEL BAMBÚ: PROGRAMA AGRICULTURA TROPICAL SOSTENIBLE, 3., 2003, Venezuela. Anais… Venezuela: Ministerio del Ambiente y de los Recursos Naturales/Fundación Polar/Gobernación del Estado Yaracuy/Fundación para la Investigación Agrícola DANAC, 2003. SALGADO, A. L.; GREGO, C. R. A Utilização do Bambu como Alternativa Econômica para o Semi-árido. In: 10ª AGRINORDESTE, 2002, Recife. Anais... [S. l.: s.n.], 2002. p. 7-8.

61


4.6 DIVERSIDADE E CONSERVAÇÃO DOS BAMBUS HERBÁCEOS (POACEAE: BAMBUSOIDEAE: OLYREAE) DA MATA ATLÂNTICA, BRASIL1 Reyjane P. de Oliveira2, Hilda M. Longhi-Wagner3, Jomar G. Jardim4

Resumo Os bambus herbáceos constituem a tribo Olyreae (Poaceae: Bambusoideae) e incluem plantas exclusivas de ambientes florestais. A maior diversidade do grupo é encontrada no Brasil, onde ocorrem 16 dos 21 gêneros da tribo. Dos 13 gêneros registrados para a Mata Atlântica até o momento, quatro são endêmicos (Reitzia, Sucrea, Diandrolyra e Eremitis), sendo o maior número de espécies e as mais altas taxas de endemismo encontradas nos remanescentes deste bioma no sul do estado da Bahia. Por causa de suas populações geralmente pequenas, estas espécies estão se tornando cada vez mais raras e ameaçadas, pela fragmentação da Mata Atlântica e de outras florestas tropicais onde ocorrem. Palavras-chave: Gramíneas. Conservação. Endemismo. Abstract Herbaceous bamboos constitute the tribe Olyreae (Poaceae: Bambusoideae), including plants restricted to forest environments. The greatest diversity of this group is found in Brazil, where 16 of the 21 genera occur. Four of the 13 genera recorded for the Atlantic Rain Forest are endemic (Reitzia, Sucrea, Diandrolyra and Eremitis), whith the largest number of species and the highest rates of endemism occur in the southern of Bahia State. Because of their often small populations, they are becoming increasingly rare and threatened, due the fragmentation of the Atlantic Forest and other tropical forests where they occur. Key words: Grasses. Gramineae. Conservation. Endemism.

INTRODUÇÃO A Mata Atlântica originalmente distribuía-se em um continuum ao longo da costa leste brasileira, desde o Rio Grande do Norte até o Rio Grande do Sul, com amplas extensões para o interior, recobrindo cerca de 13% do território nacional (CAPOBIANCO, 2002). Representa um dos mais ricos conjuntos de ecossistemas do planeta em termos de diversidade biológica e foi considerado por Myers et al. (2000) como o principal hotspot brasileiro, ou seja, uma área com alto nível de biodiversidade e para onde as ações de conservação seriam mais urgentes. Estimativas recentes indicam a existência de cerca de 20.000 espécies de plantas nativas deste bioma, aproximadamente 35% do total de Angiospermas ocorrentes no Brasil (GIULIETTI et al., 2005). Além da exuberância desta floresta e da alta diversidade encontrada, cerca de metade das plantas vasculares conhecidas neste bioma ocorre como plantas endêmicas de determinadas localidades. Isso tem atraído a atenção dos pesquisadores para conhecer sua composição biológica e demais aspectos relacionados à biologia dos seus organismos. Todo o processo de colonização do Brasil desenvolveu-se a partir do litoral, e a Mata Atlântica vem sofrendo até hoje sérios problemas de desmatamento. Como resultado, existem poucos remanescentes florestais, localizados principalmente em locais de topografia muito acidentada que impede qualquer ocupação. Na Região Nordeste, por exemplo, esses remanescentes são da ordem de 2%, encontrandose na Bahia sua porção mais representativa (BARBOSA; THOMAS, 2002). Mesmo com tantos problemas de perda de habitat, essas áreas têm sido continuamente indicadas como o principal centro de diversidade de bambus nas Américas, especialmente o sul da Bahia (SODERSTROM; JUDZIEWICZ; CLARK, 1988; CLARK,1990).

1 Dados extraídos da dissertação de Mestrado e tese de Doutorado da primeira autora. 2 Universidade Federal da Bahia, Instituto de Biologia, Departamento de Botânica, Av. Adhemar de Barros s/n,

Ondina, CEP 40170-110, Salvador, BA. E-mail: (rpatricia.oliveira@gmail.com) (autora para correspondência). 3 Departamento de Botânica, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Av. Bento Gonçalves, 9500, CEP 91501-970, Porto Alegre, RS, Brasil. E-mail: (hmlw@plugin.com.br). 4 Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Biociências, Departamento de Biologia, Lagoa Nova, CEP 59072-970, Natal, RN. E-mail: (jgjard@yahoo.com.br).

62


Os bambus são representantes da família das gramíneas (Poaceae), reunidos na subfamília Bambusoideae, e estão entre os componentes mais importantes das florestas tropicais, sendo fundamentais para o desenvolvimento econômico e industrial de algumas regiões. De modo geral, as espécies de bambus apresentam folhas lanceoladas e pseudopecioladas, e são atualmente incluídas em dois grandes grupos, as tribos Bambuseae e Olyreae, que correspondem aos bambus lignificados (ou lenhosos) e herbáceos, respectivamente. Bambuseae é composta por plantas com colmos lignificados, denominadas por alguns autores como "bambus verdadeiros". Apresenta sistema de rizomas bem desenvolvido, espiguetas bissexuadas e são geralmente monocárpicas, desenvolvendo-se vegetativamente por vários anos, até o florescimento, muitas vezes sincrônico, das populações. Ao contrário, os bambus herbáceos apresentam espiguetas unissexuais distribuídas em diferentes partes em uma mesma planta, têm rizomas curtos, e florescem geralmente ao longo de cada ano. Tais caracteres produzem nos bambus herbáceos uma morfologia bastante distinta dos demais bambus e mesmo das gramíneas mais típicas. Algumas espécies com grande número de folhas em cada colmo, lembram pequenas pteridófitas, como alguns representantes de Raddia Bertol. (Figuras 1 e 2) e Raddiella Swallen. Outros gêneros apresentam folhas menos numerosas, mas tão longas e largas, como em Olyra L. e Sucrea Soderstr. (Figuras 3 e 4), que as tornam vegetativamente semelhantes a certas espécies de Marantaceae. Os bambus herbáceos são popularmente conhecidos como “taquarinhas” e habitam o interior e bordas de florestas (OLIVEIRA, 2001). Como são muito exigentes quanto às condições ecológicas dos locais onde se desenvolvem, apenas raramente são encontrados em matas com subbosque alterado ou menos sombreado. De forma geral, crescem em áreas com baixas altitudes, normalmente até 500 m.s.n.m., mas algumas espécies são encontradas ocorrendo em até 1.000 m.s.n.m. Apesar de as gramíneas terem sido tradicionalmente utilizadas como exemplos de plantas anemófilas, Soderstrom e Calderón (1980) afirmaram que o fato de os bambus herbáceos viverem confinados em florestas, onde em geral há pouco vento, pode indicar a existência de polinização através de outros meios, envolvendo especialmente animais. Vários autores apontam entomofilia para Pariana Aubl. (Figura 5) e Olyra, cujas espécies apresentam inflorescências grandes e vistosas, atraindo insetos que provavelmente atuam como polinizadores efetivos (SODERSTROM; CALDERÓN, 1971). Nesse caso, os insetos se alimentariam de material polínico e o transportariam entre as plantas que visitam. O pólen de Pariana apresenta, inclusive, variações em relação ao padrão básico encontrado em gramíneas (SALGADO-LABORIAU; RINADI, 1990).

1 DESENVOLVIMENTO Judziewicz et al. (1999) e Filgueiras e Santos-Gonçalves (2004) referiram a existência, no Brasil, de aproximadamente 70 espécies de bambus herbáceos, distribuídas em 16 gêneros, quatro dos quais exclusivos da Mata Atlântica. Reitzia Swallen é um gênero monotípico e foi descrito inicialmente para Santa Catarina, tendo sido posteriormente registrado também para São Paulo. Populações da sua única espécie, Reitzia smithii Swallen, foram recentemente localizadas no Estado do Rio de Janeiro, aumentando o conhecimento sobre sua distribuição. Sucrea também é endêmico deste bioma, incluindo três espécies bem delimitadas, que ocorrem da Bahia ao Rio de Janeiro ( OLIVEIRA, 2001). Dentre elas, Sucrea monophylla Soderstr. (Figura 3) é endêmica do sul da Bahia, S. maculata Soderstr. é conhecida da Bahia ao Rio de Janeiro, e S. sampaiana (Hitchc.) Soderstr. (Figura 4) foi descrita apenas para o Espírito Santo. Soderstrom (1981) e Judziewicz et al. (1999) consideraram esta última espécie como provavelmente extinta na natureza, mas uma pequena população foi localizada no final de 2003, em um fragmento de Mata Atlântica, no norte do Rio de Janeiro. Inclui, aparentemente, menos de 100 indivíduos, numa área completamente cercada por amplas pastagens e é a única população desta espécie conhecida atualmente. O gênero Diandrolyra Stapf apresenta padrão semelhante de distribuição, mas não se tem certeza do número real de espécies que inclui. Três espécies foram descritas até o momento, Diandrolyra bicolor Stapf (Figura 6) e D. tatianae Soderstr. & Zuloaga e D. pygmaea Soderstrom & Zuloaga ex R.P.Oliveira & L.G.Clark, descrita mais recentemente (OLIVEIRA; CLARK, 2009). A primeira ocorre na Bahia e Rio de Janeiro, a segunda, da Bahia a São Paulo (OLIVEIRA, 2001), e a terceira é endêmica da Bahia, mas estas espécies não são ainda bem definidas e podem incluir mais que um táxon em sua delimitação. Pelo menos três outras espécies têm sido sugeridas para este gênero, mas a grande variação encontrada entre as populações conhecidas e a falta de caracteres diagnósticos entre os grupos morfológicos detectados ainda não permitiram a tomada de decisões quanto à sua taxonomia. A presença de inflorescências pouco conspícuas, em geral escondidas na face abaxial de uma lâmina foliar especializada, e encontradas em colmos menores que os vegetativos (Figura 6) fazem as plantas de Diandrolyra terem aparência “sempre estéril” (OLIVEIRA; CLARK, 2009).

63


Eremitis Döll ocorre de Pernambuco ao Rio de Janeiro, com apenas uma espécie validamente descrita (Eremitis parviflora (Trin.) Calderón & Soderstr.), e pelo menos quatro inéditas (HOLLOWELL, 1987; OLIVEIRA, 2001). Este gênero é um dos que apresenta morfologia mais incomum dentre os bambus herbáceos. Suas inflorescências ocorrem tipicamente em colmos decumbentes, que crescem paralelos ao solo, parcial a totalmente enterrados. Segundo Judziewicz et al. (1999), já foi documentada a ocorrência de cleistogamia neste gênero. Embora seja muito relacionado ao gênero Pariana, de acordo com dados morfológicos e moleculares (OLIVEIRA, 2006), não apresenta espiguetas vistosas com estames numerosos, típicos de Pariana. Problemas de delimitação específica neste gênero também estão sob análise (F.M. FERREIRA, dados não publicados). Além destes gêneros endêmicos, espécies de outros gêneros de bambus herbáceos com distribuição mais ampla também ocorrem na Mata Atlântica, em geral em disjunção com a Amazônia e/ou América Central. Neste grupo estão incluídos membros de Olyra (nove das 24 espécies ocorrem na Mata Atlântica), Raddia (9 de 9), Piresia Swallen (4 de 5), Pariana (3 de 40), Parodiolyra Soderstr. & Zuloaga (2 de 5), Cryptochloa Swallen (1 de 8), Arberella Calderón & Soderstr. (1 de 7), Lithachne P. Beauv. (2 de 4) e Raddiella (1 de 7). Raddia é um gênero bem diversificado na Mata Atlântica, mas algumas de suas espécies estendem sua distribuição para fora desse bioma, como R. guianensis (norte e noroeste da América do Sul), R. portoi e R. angustifolia (matas secas da Região Nordeste e norte de Minas Gerais). A distribuição de Raddia brasiliensis Bertol. (Figura 2), do Ceará ao Mato Grosso do Sul, se dá basicamente em áreas de Mata Atlântica. R. distichophylla (Schrad. ex Nees) Chase (Figura 1) é endêmica da Mata Atlântica do sul da Bahia (OLIVEIRA, 2006). Mais quatro espécies foram descritas recentemente para a Mata Atlântica, uma delas com distribuição semelhante à de R. brasiliensis (R. soderstromii R.P.Oliveira, Clark & Judz.), uma endêmica do sul da Bahia (R. stolonifera R.P.Oliveira & Longhi-Wagner), uma do sul da Bahia e norte do Espírito Santo (R. megaphylla R.P.Oliveira & Longhi-Wagner), e a outra exclusiva desta última área (R. lancifolia R.P.Oliveira & Longhi-Wagner) (OLIVEIRA; BORBA; LONGHI-WAGNER, 2008) Olyra também apresenta grande diversidade na Mata Atlântica, e das nove espécies que ocorrem nesse bioma, três são endêmicas (Olyra filiformis Trin., Olyra latispicula Soderstr. & Zuloaga e Olyra bahiensis R.P. Oliveira & Longhi-Wagner, descrita na última década por OLIVEIRA; LONGHI-WAGNER, 2005), incluindo ainda O. glaberrima Raddi, O. latifolia L., O. humilis Nees, O. fasciculata Trin., O. ciliatifolia Raddi e O. ecaudata Döll, espécies amplamente distribuídas na América do Sul. Boa parte das espécies de Piresia ocorre em disjunção na Mata Atlântica e Amazônia, como Piresia leptophylla Soderstr. & Zuloaga, P. macrophylla Soderstr. e P. sympodica (Döll) Swallen. Uma nova espécie foi indicada como endêmica da Mata Atlântica da Bahia por Oliveira (2001) e outros morfotipos têm sido localizados em campo, estando em avaliação quanto à sua delimitação (M.L.S. Carcalho, dados não publicados). Já Pariana é predominantemente Amazônico e está representado no leste do Brasil por Pariana carvalhoi R.P. Oliveira & Longhi-Wagner e Pariana lanceolata Trin., endêmicas da Mata Atlântica do sul da Bahia, além de P. multiflora R.P. Oliveira, Longhi-Wagner & Hollowell, ocorrente em um remanescente florestal no Espírito Santo (OLIVEIRA et al., 2008). Parodiolyra ramosissima (Trin.) Soderstr. & Zuloaga (Figura 7) é endêmica da Mata Atlântica da Bahia, ao contrário das demais espécies congenéricas, que ocorrem apenas no norte do Brasil e/ou América Central. Exceção a isso se dá em P. micrantha (Kunth) Davidse & Zuloaga, uma das espécies de bambus herbáceos mais comumente encontradas na América do Sul, inclusive na Mata Atlântica. Arberella bahiensis Soderstr. & Zuloaga também foi considerada endêmica do sul da Bahia, mas Judziewicz et al. (1999) indicaram sua ocorrência também no sudeste da Venezuela, o que ainda não foi confirmado. Lithachne possui duas espécies endêmicas de pequenas áreas na América Central, além de L. pauciflora (Sw.) P. Beauv. (Figura 8), amplamente distribuída nas Américas Central e do Sul, e L. horizontalis Chase, conhecida como tendo distribuição apenas no sudeste do Brasil, inclusive na Mata Atlântica. No caso de L. pauciflora, coletas recentes realizadas pela primeira autora em matas úmidas do Ceará, as quais são indicadas como remanescentes de Mata Atlântica ( DOSSIÊ MATA ATLÂNTICA, 2001), registraram pela primeira vez sua ocorrência no nordeste do Brasil, o que pode indicar ser esta uma das rotas de dispersão desta espécie, da América Central para as demais áreas da América do Sul. Raddiella esenbeckii (Steud.) Calderón & Soderstr. também apresenta distribuição neotropical e é a única espécie deste gênero que ocorre na Mata Atlântica, embora pouco comum nesse bioma e mais abundante nas matas associadas a cadeias montanhosas, como a do Espinhaço.

64


Figuras 1 a 8. Bambus herbáceos ocorrentes na Mata Atlântica. Figura 1. Raddia distichophylla (Schrad. ex Nees) Chase. Figura 2. R. brasiliensis Bertol. Figura 3. Sucrea monophylla Soderstr. Figura 4. S. Sampaiana (Hitchc.) Soderstr. Figura 5. Pariana multiflora R.P. Oliveira, Longhi-Wagner & Hollowell. Figura 6. Diandrolyra bicolor Stapf. Figura 7. Parodiolyra ramosissima (Trin.) Soderstr. & Zuloaga. Figura 8. Lithachne pauciflora (Sw.) P. Beauv. Fotos: R. P. Oliveira.

2 CONCLUSÕES Existem na literatura poucos levantamentos em áreas de Mata Atlântica envolvendo espécies de bambus herbáceos. Entretanto, as revisões de herbários e as coletas que têm sido realizadas confirmam a maior diversidade destas plantas no estado da Bahia, como estimado por Soderstrom, Judziewicz e Clark (1988) para bambus em geral. Oliveira (2001) indicou 11 gêneros e 36 espécies para esta área, o que representa mais da metade dos gêneros e espécies previamente citados para o Brasil. Destas, 14 foram consideradas endêmicas e restritas ao sul do Estado, e oito foram propostas como novas espécies,

65


incluindo Pariana carvalhoi (OLIVEIRA; LONGHI-WAGNER; HOLLOWELL, 2004) e Olyra bahiensis (OLIVEIRA; LONGHI-WAGNER, 2005), recentemente descritas, enquanto as demais estão em fase de publicação. Também ocorrem neste bioma taxons endêmicos do grupo de “gramíneas basais”, anteriormente classificados como “gramíneas bambusóides”. Destaca-se, dentre eles, Anomochloa Brongn., um gênero monotípico que inclui apenas Anomochloa marantoidea Brongn. Esta é hoje considerada como a mais basal entre as gramíneas (subfamília Anomochlooideae), e é conhecida de apenas duas pequenas populações, sendo considerada criticamente ameaçada, de acordo com os critérios da IUCN (2004). Ao contrário da maioria dos bambus lignificados, que ocorrem cobrindo amplas extensões, os grupos herbáceos apresentam populações geralmente pequenas, no que diz respeito ao número de indivíduos e área ocupada, sendo alguns deles conhecidos de uma única população. Geralmente estão confinados ao estrato herbáceo das florestas e como a vegetação herbácea é a primeira a ser removida durante o desmatamento de uma área, as Olyreae estão se tornando cada vez mais raras, pela fragmentação não só da Mata Atlântica, mas das outras florestas tropicais onde ocorrem, incluindo a Floresta Amazônica. Há quase três décadas, Pohl (1977) já chamou à atenção para o fato destas gramíneas bambusóides desaparecerem rapidamente após a abertura de clareiras nas florestas, ou nos casos de substituição destas por pastagens. Na lista oficial de espécies da flora brasileira ameaçada de extinção elaborada pela Sociedade Botânica do Brasil (MELLO-FILHO; SOMMER; PEIXOTO, 1992) juntamente com o IBAMA, nenhuma espécie de Olyreae ou qualquer outra gramínea havia sido citada como ameaçada. A lista de espécies ameaçadas do Espírito Santo organizada recentemente (PASSAMANI; FRAGA, dados não publicados) também não apontou qualquer gramínea. Entretanto, Lithachne horizontalis foi incluída na lista vermelha de espécies de Minas Gerais (MENDONÇA; LINS, 2000) e Olyra filiformis e O. latispicula, endêmicas da Bahia, estão citadas na lista de ameaçadas da Base de Dados Tropical (www.bdt.org.br). Oliveira (2001) indicou como ameaçadas também Eremitis parviflora, Pariana lanceolata, Pariana carvalhoi, Raddia angustifolia e Raddia distichophylla, todas endêmicas do sul da Bahia. Na mais recente atualização da lista da flora brasileira ameaçada de extinção ( MMA, 2008) foram incluídas apenas 14 espécies de Poaceae, dentre as quais três são representantes de Olyreae (O. latispicula, R. angustifolia e S. sampaiana). Porém, na lista de espécies raras de Poaceae do Brasil, só de Olyreae, Oliveira et al. (2009) indicaram 14 espécies, das quais A. bahiensis, O. bahiensis, O. latispicula, P. carvalhoi, P. multiflora, R. lancifolia e S. sampaiana, exclusivas da Mata Atlântica, foram reafirmadas como microendêmicas. A grande preocupação em relação aos problemas de perda de habitat em áreas de Mata Atlântica está relacionada ao fato de o desmatamento afetar diretamente a distribuição geográfica e alguns aspectos biológicos das espécies ocorrentes nesse bioma. Essas espécies tendem a apresentar distribuição fragmentada de suas populações devido à formação de ilhas de vegetação em geral muito afastadas umas das outras. A distância instalada entre esses remanescentes resulta na diminuição ou mesmo impossibilita as trocas genéticas (polinização e dispersão) necessárias à manutenção dos níveis adequados de variabilidade, dentro e entre as populações. Por sua vez, isso provoca uma maior diferenciação entre elas, tornando-as cada vez mais restritas a determinadas áreas. No caso do sul da Bahia, muitas espécies crescem associadas a plantações de “cacau-cabruca”, um sistema de cultivo do cacau (Theobroma cacao L.) implantado sob a mata nativa. Essas áreas mantêm parcialmente a estrutura florestal e não devem ser consideradas como apenas mais um sistema agrícola, pois a sua importância para a conservação ambiental é muito grande ( SAMBUICHI, 2002). Alguns bambus herbáceos foram inclusive citados por Silva, Vinha e Pereira (1988) como invasores destas plantações, incluindo espécies endêmicas, como Pariana lanceolata, Eremitis parviflora, Sucrea monophylla e Raddia distichophylla. O declínio da cultura de cacau na região e a necessidade de optar por outras estratégias agrícolas, que nem sempre necessitam de coberturas sombreadas, a exemplo das vastas plantações de pupunha (Bactris gasipaes Kunth) e café (Coffea arabica L.), vêm expondo as espécies de Olyreae ao dessecamento e subsequente redução das populações (OLIVEIRA, 2001). No caso das áreas onde os proprietários optaram por atividades de pastagens, as florestas foram completamente dizimadas e as populações de Olyreae anteriormente encontradas já foram extintas. E ainda, como a maioria das espécies endêmicas não está em unidades de conservação, a situação deste grupo na natureza torna-se mais preocupante. Existe uma preocupação dos órgãos governamentais no sentido de tentar minimizar as perdas nos remanescentes da Mata Atlântica, através da indicação de áreas prioritárias para conservação. Para Silva (2005), a estratégia para selecionar novas áreas protegidas inclui ‘áreas com alta importância biológica’ e ‘áreas sob forte pressão antrópica’. Através da Lei 9.985, de 18 de julho de 2000 (Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC - IBAMA, 2000), foram sugeridas novas áreas de conservação sob jurisdição do governo, sendo também incentivada a implementação de unidades de conservação em áreas particulares (Reserva Particular do Patrimônio Natural). Ainda assim, as poucas reservas existentes e as ações insuficientes na fiscalização das mesmas não têm conseguido garantir a conservação em seu ambiente natural, tanto dos bambus herbáceos quanto dos demais bambus e outras plantas ocorrente na Mata Atlântica.

66


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARBOSA, M. R. V.; THOMAS, W. W. Biodiversidade, Conservação e Uso Sustentável da Mata Atlântica no Nordeste. In: ARAÚJO, E. L.; MOURA, A. N.; SAMPAIO, E. V. S. B.; GESTINARI, L. M. S.; CARNEIRO, J. M. T. (Eds.). Biodiversidade, Conservação e Uso Sustentável da Flora do Brasil. Recife: Universidade Federal Rural de Pernambuco/Sociedade Botânica do Brasil, 2002. p. 1922. CAPOBIANCO, J. P. R. Artigo base sobre os biomas brasileiros (Mata Atlântica). In: CAMARGO, A.; CAPOBIANCO, J. P. R.; OLIVEIRA, J. A. P. (Eds.). Meio Ambiente Brasil: avanços e obstáculos pós Rio 92. São Paulo: Estação Liberdade, 2002. p. 117-188. CLARK, L. G. Diversity and Biogeography of Neotropical Bamboos (Poaceae: Bambusoideae). Acta Botanica Brasilica. Brasil: Sociedade Botânica do Brasil, v. 4, p. 125-132, 1990. DOSSIÊ MATA ATLÂNTICA. Projeto Monitoramento Participativo da Mata Atlântica. São Paulo: Rede de ONGs da Mata Atlântica/Instituto Socioambiental/Sociedade Nordestina de Ecologia, 2001. FILGUEIRAS, T. S.; SANTOS-GONÇALVES, A. P. A checklist of the basal grasses and bamboos in Brazil (Poaceae). Bamboo Science & Culture. Albany: American Bamboo Society, v. 18, p. 7-18, 2004. GIULIETTI, A. M.; HARLEY, R. M.; QUEIROZ, L. P.; WANDERLEY, M. G. L.; VAN DEN BERG, C. Biodiversity and Conservation of Plants in Brazil. Conservation Biology. United Kingdom: Blackwell Publishing Inc., v. 19, n. 3, p. 632-639, 2005. HOLLOWELL, V. C. Systematics of the subtribe Parianinae (Poaceae: Bambusoideae: Olyreae). Thesis (Ph.D.) - University of South Carolina, Columbia, 1987. INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS IBAMA. Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação Nº 9.985, de 18 de julho de 2000. Disponível em: <www.mma.gov.br>. Acesso em: jun. 2006. IUCN (THE WORLD CONSERVATION UNION). 2004 IUCN Red List of Threatened Species. Disponível em: <www.redlist.org>. Acesso em: nov. 2005. JUDZIEWICZ, E. J.; CLARK, L. G.; LONDOÑO, X.; STERN, M. J. American Bamboos. Washington/D.C.: Smithsonian Institution Press, 1999. 392 p. MELLO FILHO, L. E.; SOMMER, G. V.; PEIXOTO, A. L. Centuria Plantarum brasiliensium exstintionis minitata. Brasília: Sociedade Botânica do Brasil/IBAMA, 1992. 167 p. MENDONÇA, M. P.; LINS, L. V. (Org.) Lista Vermelha das espécies ameaçadas de extinção na Flora de Minas Gerais. Belo Horizonte: Fundação Biodiversitas e Fundação Zoo-Botânica de Belo Horizonte, 2000. MMA - MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Lista oficial das espécies da flora brasileira ameaçadas de extinção. Anexo I. Brasília: Fundação Biodiversidade, 2008. p. 20. MYERS, N.; MITTERMEIER, R. A.; MITTERMEIER, C. G.; FONSECA, G. A. B.; KENT, J. Biodiversity hotspots for conservation priorities. Nature. United Kingdom: Nature Publishing Group, v. 403, p. 853-858, 2000. OLIVEIRA, R. P. A tribo Olyreae (Poaceae:Bambusoideae) no Estado da Bahia. Dissertação (Mestrado) Universidade Estadual de Feira de Santana, 2001. 190 p. ________. Estudos Taxonômicos, Filogenéticos e Biossistemáticos em Raddia Bertol. (Poaceae:Bambusoideae:Olyreae). Tese (Doutorado) - Universidade Estadual de Feira de Santana, 2006. 336 p. OLIVEIRA, R. P.; CLARK, L. G. A tiny new Brazilian species of Diandrolyra (Poaceae: Bambusoideae: Olyreae), with notes on Systematics of this genus. Novon. USA: Missouri Botanical Garden, v. 19, n. 2, p. 209-214, 2009. OLIVEIRA, R. P.; LONGHI-WAGNER, H. M. Olyra bahiensis (Poaceae – Olyreae): Uma Nova Espécie para a Mata Atlântica do Estado da Bahia, Brasil. Revista Brasileira de Botânica. São Paulo: Sociedade Botânica de São Paulo, v. 28, n. 4, p. 835-839, 2005. OLIVEIRA, R. P.; BORBA, E. L.; LONGHI-WAGNER, H. M. Morphometrics of herbaceous bamboos of the Raddia brasiliensis complex (Poaceae – Bambusoideae): implications for the taxonomy of the genus and new species from Brazil. Plant Systematics and Evolution. Germany: Springer Verlag, v. 270, n. 3-4, p. 159-182, 2008. OLIVEIRA, R. P.; LONGHI-WAGNER, H. M.; HOLLOWELL, V. C. A New Species of Pariana Aubl. (Poaceae: Bambusoideae: Olyreae) Endemic to the Atlantic Moist Forest in the State of Bahia, Brazil. Novon. USA: Missouri Botanical Garden, v. 14, n. 2, p. 206-209, 2004. OLIVEIRA, R. P.; LONGHI-WAGNER, H. M.; LEITE, K. R. B.; HOLLOWELL, V. C. Pariana multiflora (Poaceae: Bambusoideae: Olyreae), a new species from Eastern Brazil, with notes on the leaf anatomy of this genus. Systematic Botany. USA: American Society of Plant Taxonomists, v. 33, n. 2, p. 262-266, 2008.

67


OLIVEIRA, R. P.; LONGHI-WAGNER, H. M; FILGUEIRAS, T. S.; MOTA, A. C.; VIANA, P. L. Poaceae. In: GIULIETTI, A. M.; RAPINI, A.; ANDRADE, M. J. G.; QUEIROZ, L. P.; SILVA, J. M. C. (Orgs.). Plantas Raras do Brasil. Belo Horizonte: Conservação Internacional/Universidade Estadual de Feira de Santana, 2009. p. 326-340. POHL, R. L. Cultivation of tropical rain forest grasses. Annals of Botany. United Kingdom: Oxford University Press, v. 41, n. 3, p. 665-666, 1977. SALGADO-LABORIAU, M. L.; RINALDI, M. Palinology of Gramineae of the Venezuelan Mountains. Grana. United Kingdom: Taylor & Francis, v. 29, p. 119-128, 1990. SAMBUICHI, R. H. R. Fitossociologia e Diversidade de Espécies Arbóreas em Cabruca. (Mata Atlântica Raleada sobre Plantação de Cacau) na Região Sul da Bahia, Brasil. Acta Botanica Brasilica. São Paulo: Sociedade Botânica do Brasil, v. 16, n. 1, p. 89-101, 2002. SILVA, L. A. M.; VINHA, S. G.; PEREIRA, R. C. Gramíneas Invasoras de Cacauais. Ilhéus: Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira, 1988. 108 p. Boletim Técnico nº 159. SILVA, M. The Brazilian Protected Areas Program. Conservation Biology. United Kingdom: Blackwell Publishing Inc., v. 19, n. 3, p. 608-611, 2005. SODERSTROM, T. R. Sucrea (Poaceae: Bambusoideae), a New Genus from Brazil. Brittonia. USA: New York Botanical Garden Press, v. 33, n. 2, p. 198-210, 1981. SODERSTROM, T. R.; CALDERÓN, C. E. Insect Pollination in Tropical Rain Forest Grasses. Biotropica. USA: Association for Tropical Biology, Inc., v. 3, n. 1, p. 1-16, 1971. ________. In Search of the Primitive Bamboos. National Geographic Society Research Reports. [S.l.: s.n.], v. 12, p.647-654, 1980. SODERSTROM, T. R.; JUDZIEWICZ, E. J.; CLARK, L. G. Distribution Patterns in Neotropical Bamboos. In: PROCEEDINGS OF THE NEOTROPICAL BIOTIC DISTRIBUTION PATTERN WORKSHOP, 1987, Rio de Janeiro. Anais… Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Ciências, 1988. p. 121157.

68


4.7 ROTEIRO MÍNIMO PARA ESTUDO ANATÔMICO DOS BAMBUS (POACEAE: BAMBUSOIDEAE) Dalva Graciano Ribeiro1, Tarciso S. Filgueiras2, Ana Paula Santos Gonçalves3

Resumo Nas últimas décadas, a evidência anatômica tornou-se importante ferramenta nos estudos taxonômicos dos bambus. No entanto, ainda não existe uma padronização na tomada de dados anatômicos, especialmente no Brasil. O presente trabalho apresenta um roteiro mínimo para o estudo proveitoso das preparações anatômicas dos bambus, incluindo todos os principais órgãos vegetativos (raiz, rizoma, colmo e folhas) desse grupo de plantas. Palavras-chave: Anatomia. Raiz. Rizoma. Colmo. Folhas. Gramíneas. Abstract In the last decades, the anatomical evidence has increasingly grown in importance as an important tool in the study of the bamboos. However, especially in Brazil, the authors do not follow a consistent pattern in gathering their anatomical data. This paper presents the suggestion of a guide to be used during the analyses of the anatomical preparations of the vegetative organs of the bamboos (root, rhizome, culm, and leaf). Key words: Anatomy. Root. Rhizome. Culm. Leaf. Gramineae. Grasses. Bamboos.

INTRODUÇÃO Embora o botânico francês Duval-Jouve (1875) tenha, provavelmente, sido o primeiro pesquisador a usar dados anatômicos de gramíneas (Poaceae) como evidência taxonômica, os trabalhos seminais de Prat (1932, 1935, 1936, 1948), Arber (1934), Brown (1958), Metcalfe (1960) e Jacques-Félix (1962) foram os primeiros a usar extensivamente caracteres anatômicos para caracterizar gêneros, espécies ou grupos de espécies. Dentre eles, os primeiros a incluir especificamente bambus em suas investigações foram Arber (1934) e Metcalfe (1960). Desde então, os bambus têm merecido dos pesquisadores variados graus de atenção, de tal modo que todos os sistemas de classificação recentemente elaborados tanto para as gramíneas em geral como para os bambus, em particular, levam em consideração caracteres anatômicos. No Brasil, os estudos anatômicos relativos aos bambus são ainda incipientes e relativamente escassos. Deve-se, entretanto, ressaltar aqueles realizados por Gomes (2002), que investigou a anatomia da lâmina foliar de 13 espécies de Merostachys Spreng. do sudeste brasileiro, Vieira et al. (2002), que pesquisaram a anatomia da lâmina foliar de Cryptochloa e de Raddia brasiliensis, Souza, GracianoRibeiro e Coradin (2004) e Souza et al. (2004), que realizaram o estudo anatômico da lâmina foliar de três espécies de Olyra ocorrente no Distrito Federal, Paiva, Graciano-Ribeiro e Coradin (2004) e Paiva et al. (2004), com o estudo anatômico da lâmina foliar de Actinocladium verticillatum, Guadua paniculata, Merostachys filgueirasii e Raddiella esenbeckii, Santos-Gonçalves (2005), que também investigou a anatomia da lâmina das 12 espécies de Colanthelia McClure & E. W. Sm., De-Souza et al. (2005), que realizaram o estudo anatômico do colmo de Actinocladum verticillatum, Filgueirasia cannavieira, Guadua sp e Merostachys filgueirasii, Silva et al. (2005 a e b), que fizeram a análise comparativa da anatomia foliar do gênero Olyra, Silva-Filho (2006), que caracterizou anatomicamente os órgãos vegetativos de Filgueirasia arenicola (McClure) Guala, enquanto que Oliveira (2006) estudou a lâmina foliar de bambus herbáceos do gênero Raddia Bertol. Montti, Graciano-Ribeiro e Goldstein (2006) investigaram a anatomia comparativa dos órgãos vegetativos do gênero Chusquea dos bosques subtropicais de Misiones (Argentina) e recentemente Graciano-Ribeiro e Filgueiras (2006) pesquisaram a anatomia da raiz de Filgueirasia arenicola, Filgueirasia cannavieira, Guadua sp, Merostachys filgueirasii e Actinocladum verticillatum. Para estudo de caracteres anatômicos de bambu não se tem roteiro ou esquema para auxiliar/normatizar as descrições. Procurando preencher essa lacuna, elaboramos um roteiro/guia para as descrições anatômicas de órgãos vegetativos baseando-nos principalmente nos nossos trabalhos realizados com bambus nativos.

1 Dept. de Botânica, Universidade de Brasília. E-mail: (graciano@unb.br). 2 Reserva Ecológica do IBGE. E-mail: (tfilg@uol.com.br). 3 Dept. de Botânica, Unicamp. E-mail: (santos_gon@terra.com.br).

69


1 DESENVOLVIMENTO Usando-se o conjunto de dados anatômicos atualmente disponíveis, é possível definir a subfamília Bambusoideae, à qual todos os bambus pertencem, através das seguintes características de seus órgãos vegetativos: RAIZ: São raros os trabalhos com raiz, portanto, ainda não foram diagnosticados caracteres distintivos para a subfamília. Entretanto, Goller (1977) classificou as raízes das Gramineae em três tipos: 1) Raízes Panicoides – as células corticais internas são arranjadas radialmente com espaços intercelulares tetragonais; diâmetro do estelo maior que 200 μm; espaços intercelulares presentes na medula, usualmente com mais de 7 vasos de metaxilema; 2) Raízes Pooides – células corticais com espaços intercelulares triangulares, diâmetro do estelo menor que 450 μm, espaços intercelulares na medula ausentes, e geralmente 2-6 vasos de metaxilema ou somente um central rodeado por 3-10 polos de protoxilema; 3) Raízes Oryzoides – esse tipo é intermediário com caracteres de ambos os grupos. RIZOMA: As estruturas anatômicas do rizoma em corte transversal aproximam-se daquelas encontradas nos rizomas de monocotiledôneas em geral, não havendo ainda estudos suficientes que permitam o reconhecimento de caracteres diagnósticos para a subfamília Bambusoideae. COLMO: os bambus não apresentam crescimento secundário. A estrutura anatômica do colmo é caracterizada pelo formato, tamanho, organização e número de feixes vasculares, assim como pela distribuição percentual de células parenquimáticas, de feixes vasculares, e de fibras (LIESE, 1998). LÂMINA FOLIAR EM CORTE TRANSVERSAL: O Mesófilo apresenta-se disposto em camadas horizontais, de forma não radiada, com células paralelas à epiderme; presença no mesófilo de células invaginantes, fusóides e raquimorfas; na epiderme, presença de células buliformes na face adaxial e microtricomas em ambas as faces; sistema vascular da nervura principal geralmente complexo, embebido em esclerênquima; feixes vasculares de primeira, segunda e terceira ordens apresentando duas bainhas: a interna, geralmente composta por células fortemente lignificadas de diâmetro pequeno, e a externa geralmente composta por células parenquimáticas amplas. (METCALFE, 1956, 1960; SODERSTROM; ELLIS, 1987; LONDOÑO, 1990; LONDOÑO et al., 2002; JUDZIEWICZ et al., 1999; MOTOMURA, FUJII, SUZUKI, 2000). EPIDERME FOLIAR EM CORTE PARADÉRMICO: Face adaxial: presença de células silicificadas contendo corpos silicosos verticais, células buliformes e papilas amplamente distribuídas sobre os diversos tipos de células epidérmicas; Face abaxial: praticamente semelhante à adaxial, exceto pela ausência das células buliformes.

2 ROTEIRO PARA COLETA DE DADOS ANATÔMICOS EM BAMBUS Considerando-se, portanto, a relevância dos estudos anatômicos para a compreensão profunda da subfamília Bambusoideae e tendo em vista a escassez de estudos anatômicos de bambus no Brasil e a necessidade de se uniformizar minimamente a coleta de dados para as observações anatômicas, apresenta-se, a seguir, um roteiro mínimo a ser observado pelo pesquisador que se dispõe a estudar essas interessantes e desafiadoras gramíneas (nomenclatura baseada em METCALFE, 1960, 1961; e ELLIS, 1976, 1979). 2.1 RAIZ (CORTE TRANSVERSAL) DEVE-SE DESTACAR: a) formato – geralmente cilíndrica; se possível medir o diâmetro, observar as associações ou injúrias; b) cutícula – Presença/ausência, ornamentações, e breve descrição; c) epiderme – Uniestratificada/não estratificada, tipos celulares, formato das células, espessamento da parede celular e distribuição, especial atenção à presença/ausência de pelos absorventes, e breve descrição; d) córtex externo: - exoderme – Presença/ausência, número de camadas, forma das células, espessamento da parece celular, e descrição, - anel parenquimático ou esclerenquimático – Presença/ausência, número de camadas, formato das células, espessamento da parede celular, e descrição, e) córtex interno: - parênquima – Tipos de parênquima (geralmente mais de um tipo), número de camadas, formato e disposição das células, espessamento da parede celular, e descrição, - cavidades aeríferas – Presença/ausência, formato, localização, e descrição, - endoderme - Número de camadas, forma das células, espessamento da parede celular, e descrição,

70


f) periciclo – Presença/ausência, contínuo/interrompido, número de camadas, formato das células, espessamento da parede celular, e descrição; g) arcos de proto e metaxilema – Número de arcos, distribuição, e descrição; h) floema – Distribuição, e descrição; i) medula – Presença/ausência, formato das células, espessamento da parede celular, formato dos espaços intercelulares, e descrição. 2.2 COLMO (CORTE TRANSVERSAL): a) formato – Geralmente cilíndrico, se possível medir o diâmetro, observar as associações ou injúrias; b) cutícula – Presença/ausência, ornamentação; c) epiderme – Uniestratificada/não uniestratificada, tipos celulares epidérmicos, formato das células, espessamento da parede celular, distribuição, e descrição; d) córtex – Tipos de tecidos (geralmente contém mais de um tipo), número de camadas, formato das células, espessamento das paredes celulares, conteúdo citoplasmático, e descrição; e) bainha amilífera – Presença/ausência, tipo de tecido, número de camadas, formato das células, espessamento da parede celular, conteúdo citoplasmático, e descrição; f) periciclo – Presença/ausência, número de camadas, formato das células, espessamento da parede celular, e descrição; g) sistema vascular – Tipo, formato, distribuição e descrição com ênfase nos tipos celulares do xilema e floema; h) medula – Presença/ausência, tipo de tecidos, formato das células, espessamento da parede celular, formato dos espaços intercelulares, e descrição. 2.3 RIZOMA: UTILIZA-SE A MESMA SEQUÊNCIA DO COLMO 2.4 EPIDERME FOLIAR (EPIDERME ADAXIAL EM VISTA PARADÉRMICA) Na epiderme adaxial deve-se observar, principalmente: células longas, células curtas, células silicificadas, células suberosas, tricomas, macrotricomas, microtricomas, papilas, estômatos e células buliformes. Devem ser destacadas: a) zonas costais e intercostais - A lâmina foliar está dividida em duas zonas longitudinais, sendo uma costal (que consiste geralmente de células longas e curtas que estão sobre as nervuras), e uma zona intercostal (compreende principalmente as células longas e estômatos que estão sobre o tecido clorenquimático). Devemos ainda diferenciar na zona costal a região que contém os feixes vasculares de 1ª ordem da região e que contém os de 2ª e 3ª ordem, levando em conta o tipo de feixe vascular. Nessas zonas devemos observar o número de fileiras, tipos celulares, distribuição, e apresentar breve descrição; b) células longas intercostais – Presença/ausência, número de fileiras, formato das células, espessamento das paredes celulares, conteúdo citoplasmático, distribuição, e descrição; c) células curtas intercostais – Presença/ausência, número de fileiras, formato das células, espessamento das paredes celulares, conteúdo citoplasmático, distribuição, e descrição; d) células longas costais – Presença/ausência, número de fileiras, formato das células, espessamento das paredes celulares, conteúdo citoplasmático, distribuição, e descrição; e) células curtas costais – Presença/ausência, número de fileiras, formato das células, espessamento das paredes celulares, conteúdo citoplasmático, distribuição, e descrição; f) células silicificadas costais - Presença/ausência, número de fileiras, formato, distribuição, e descrição; g) células silicificadas intercostais - Presença/ausência, número de fileiras, formato, distribuição, e descrição; h) células suberosas - Presença/ausência, formato, distribuição, localização, e descrição; i) papilas – Presença/ausência, localização, formato, quantidade por célula, e descrição; j) estômatos – Presença/ausência, número de fileiras, formato das células subsidiárias, distribuição, e descrição; k) células buliformes – Presença/ausência, número de fileiras, formato das células, espessamento das paredes celulares, distribuição, e descrição; l) microtricomas - Presença/ausência, formato, distribuição, localização, e descrição; m) macrotricomas – Presença/ausência, tipo de macrotricoma, distribuição, localização, e descrição;

71


n) ganchos – Presença/ausência, distribuição, localização, e descrição; o) espinhos – Presença/ausência, distribuição, localização, e descrição. 2.5 EPIDERME FOLIAR (EPIDERME ABAXIAL EM VISTA PARADÉRMICA) Deve ser adotado o mesmo conjunto de observações apresentado para a caracterização da face abaxial. Deve-se ressaltar que a estrutura da epiderme abaxial diferencia-se da adaxial pela ausência de células buliformes e presença evidente das nervuras na zona costal. 2.6 LÂMINA FOLIAR Inicialmente devemos fazer uma breve descrição do formato e contorno da lâmina foliar. Entretanto, ao se examinar um corte transversal da lâmina foliar de bambu devemos separar a lâmina foliar em ALA, NERVURA PRINCIPAL E BORDO. 2.6.1 Na ALA, devemos analisar: a) cutícula – Presença/ausência, ornamentações, e breve descrição; b) células epidérmicas adaxiais – Citar e fazer breve descrição dos tipos celulares; c) células epidérmicas abaxiais – Citar e comparar com os tipos celulares presentes na face adaxial; d) mesofilo – Tipo e descrição. Especial atenção para a disposição (radiada ou não), formato das células, espessamento das paredes, conteúdo citoplasmático, e breve descrição; e) células invaginantes – Presença/ausência, formato, espessamento da parede celular, conteúdo citoplasmático, e breve descrição; f) células fusóides – Presença/ausência, formato, espessamento da parede celular, e breve descrição; g) células raquimorfas – Presença/ausência, formato, espessamento da parede celular, e breve descrição; h) células parenquimáticas – Presença/ausência, tipo de parênquima, localização, formato das células, espessamento da parede celular, e breve descrição; i) esclerênquima – Presença/ausência, descrição do formato, e localização em relação às faces adaxial e abaxial; j) fibras intercostais – Presença/ausência, descrição do formato, e localização em relação às faces adaxial e abaxial; k) distância intervenal – Contagem das células parenquimáticas entre dois feixes vasculares, independente da ordem de grandeza; l) sistema vascular – Tipos de feixes, breve descrição dos feixes vasculares encontrados na Ala quanto à sua ordem de grandeza (primeira, segunda ou terceira ordem), localização, distribuição, quantidade, e descrição (formato e tipos celulares constituintes do xilema e floema); m) bainha dos Feixes Vasculares – Simples/dupla, completa/incompleta, tamanho, formato e quantidade de células, conteúdo citoplasmático, e breve descrição; n) extensão da bainha de feixes vasculares – Presença/ausência, esclerenquimática/parenquimática, formato das células, espessamento das paredes, localização em relação às faces adaxial e abaxial; o) células distintivas/incolores – Presença/ ausência desse tipo celular, descrição do formato, e localização das mesmas. 2.6.2 Na NERVURA PRINCIPAL/QUILHA, devem ser feitas as seguintes análises (a descrição da nervura principal segue a terminologia utilizada na descricão do Colmo): a) nervura principal – Presença/ausência, breve descrição do formato da NP com ênfase nas concavidades; b) cutícula – Comparar com a estrutura presente nas Alas; c) células epidérmicas adaxiais – Comparar com os caracteres presentes nas Alas; d) células epidérmicas abaxiais – Comparar com os caracteres presentes nas Alas; e) córtex – Tipos de tecidos (geralmente mais de um tipo), salientando número de camadas, formato das células, espessamento das paredes, conteúdo citoplasmático, e breve descrição; f) sistema vascular da nervura principal - Simples/complexa (geralmente é complexa), em estágio primário/secundário, formato do sistema vascular, localização, e descrição; g) medula – Presença/ausência, tipo de tecido, formato, espessamento da parede celular, formato dos espaços intercelulares, conteúdo citoplasmático, e descrição.

72


2.6.3 No BORDO, breve descricão dos bordos salientando seu formato (geralmente diferem entre si) e tipos celulares. Especial atenção à epiderme e ao mesofilo. Concluídas as observações, estabelecem-se comparações objetivas entre os diversos grupos estudados. Com base nessas análises, pode-se concluir quais características possuem valor diagnóstico para os diversos níveis taxonômicos. Por exemplo, os caracteres que aparecem em síndrome podem caracterizar gêneros ou grupos de espécies, enquanto que certas autopomorfias podem ser usadas como marcadores anatômicos extremamente úteis no pronto reconhecimento de espécies.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARBER, A.R. The Gramineae: a Study of Cereal, Bamboo and Grass. Cambridge: University Press, 1934. 480 p. BROWN, W. V. Leaf Anatomy in Grass Systematics. Botanical Gazette. Chicago: University of Chicago Press, v. 119, n. 3, p. 170-178, 1958. DE-SOUZA, F.; GRACIANO-RIBEIRO, D.; CORADIN, V. T. R.; FILGUEIRAS, T. S. Caracterização Anatômica e Morfológica do Colmo de Quatro Espécies de Bambus Lenhosos (Poaceae: Bambusoideae: Bambusae) Nativos do Cerrado, e suas Aplicações. Brasília: Universidade de Brasília, 2005. Relatório final de PIBIC. DUVAL-JOULE, M. J. Histotaxie des feuilles de graminées. In: BRONGNIART, A.; DECAISNE, J. Annales des Sciences Naturelles. Paris: Librairie de G. Masson, 1875. Tomo 1, Sexiéme série. p. 294382. ELLIS, R. P. A Review of Comparative Leaf Blade Anatomy in the Systematics of Poaceae: the Past Twenty-five Years. In: SODERSTROM, T. R.; HILU, K. W.; CAMPBELL, C. S.; BARKWORTH, M. E. (Eds.). Grass Systematics and evolution: an International Symposium held at the Smithsonian Instituition, Washington, D. C., July 27-31, 1986. Washington: Smithsonian Institution Press, 1987. p. 3-10. ________. A Procedure for Standardizing Comparative Leaf Anatomy in the Poaceae. I. The leaf-blade as viewed in transverse section. Bothalia. South Africa: National Botanical Institute, v. 12, n. 1, p. 65109, 1976. ________. A Procedure for Standardizing Comparative Leaf Anatomy in the Poaceae. II. The epidermis as seen in surface view. Bothalia. South Africa: National Botanical Institute, v. 12, n. 4, p. 641-671, 1979. GOLLER, H. Beiträge zur anatomie adulter Gramineenwurzeln im Hinblick auf taxonomische Verwendbarkeit. Beiträge zur Biologie der Pflanzen. [S.l.: s.n.], v. 53, p. 217-307, 1977. GOMES, D. M. S. Anatomia Foliar de Espécies de Merostachys Spreng. (Poaceae: Bambusoideae) no Sudeste Brasileiro. Tese (Doutorado) - Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2002. 137 p. GRACIANO-RIBEIRO, D.; FILGUEIRAS, T. S. Anatomia da Raiz de Cinco Espécies de Bambus Lignificados (Poaceae:Bambusoideae). In: IX CONGRESSO LATINOAMERICANO DE BOTÂNICA, 2006, República Dominicana. Anais... Santo Domingo-República Dominicana: Asociación Latinoamericana de Botánica, 2006. Resumo. JACQUES-FELIX, H. Les Graminees (Poaceae) d’Afrique tropicales. Paris: Institut de Recherches Agronomiques Tropicales et des Cultures Vivieres, 1962. JUDZIEWICZ, E. J.; CLARK, L. G.; LONDOÑO, X.; STERN, M. J. American Bamboos. Washington/D.C.: Smithsonian Institution Press, 1999. 392 p. LIESE, W. The Anatomy of Bamboo Culms. Beijing: Internacional Network for Bamboo and Rattan, 1998. 204 p. INBAR Technical Report Nº 18. LONDOÑO, X. Aspectos sobre la distribution y la ecologia de los bambues de Colombia (Poaceae: Bambusoideae). Caldasia. Colombia: Universidad Nacional de Colombia, v. 16, n. 77, p. 139-153, 1990. LONDOÑO, X.; CAMAYO, G. C.; RIAÑO, N. M.; LÓPEZ, Y. Characterization of the anatomy of Guadua angustifolia (Poaceae: Bambusoideae) culms. Bamboo Science & Culture. Albany: American Bamboo Society, v. 16, n. 1, p. 18-31, 2002. METCALFE, C. R. Some thoughts on the structure of bamboo leaves. Botanical Magazine. Tokyo: [s.n.], v. 69, p. 391-400, 1956. ________. Anatomy of the Monocotyledons. I. Gramineae. [S.l.]: Oxford University Press, 1960. 731 p. ________. The Anatomical Approach to Systematics. General introduction with special reference to recent work on monocotyledons. In: INTERNATIONAL BOTANICAL CONGRESS, 9., RECENT

73


ADVANCES IN BOTANY, 1959, Montreal. Anais… Toronto: Toronto University Press, 1961. p. 146-150. MONTTI, L.; GRACIANO-RIBEIRO, D.; GOLDSTEIN, G. Anatomía Comparada de dos especies de bambúes nativos del Bosque Atlántico. Género Chusquea (Poaceae: Bambusoideae). In: CONGRESSO LATINOAMERICANO DE BOTÁNICA, 9., 2006, Santo Domingo-República Dominicana. Anais... República Dominicana: Amigo del Hogar, 2006. Resumo. MOTOMURA, H.; FUJII, T.; SUZUKI, M. Distribution of Silicified Cells in the Leaf Blades of Pleioblastus chino (Franchet et Savatier) Makino (Bambusoideae). Annals of Botany. United Kingdom: Oxford University Press, v. 85, n. 6, p. 751-757, 2000. OLIVEIRA, R. P. Estudos Taxonômicos, Filogenéticos e Biossistemáticos em Raddia Bertol. (Poaceae:Bambusoideae:Olyreae). Tese (Doutorado) - Universidade Estadual de Feira de Santana, 2006. 336 p. PAIVA, A. O.; GRACIANO-RIBEIRO, D.; CORADIN, V. T. R. Caracterização Anatômica e Morfológica de Quatro Espécies de Poaceae do Cerrado - Actinocladum verticillatum, Guadua paniculata, Merostachys filgueirasii e Raddiella esenbeckii. Brasília: Universidade de Brasília, 2004. Relatório final de PIBIC. PAIVA, A. O.; GRACIANO-RIBEIRO, D.; CORADIN, V. T. R.; FILGUEIRAS, T. S. Caracterização Anatômica da Lâmina Foliar de Merostachys filgueirasii (POACEAE: BAMBUSOIDEAE) Nativa do Distrito Federal-Brasil. In: CONGRESSO NACIONAL DE BOTÂNICA, 55., 2004, Viçosa. Anais... Viçosa: Sociedade Brasileira de Botânica, 2004. Resumo. PRAT, H. L'epiderme des Graminees. Etude anatomique et systematique. In: COSTANTIN, M. J. Annales des Sciences Naturelles, Botanique. França: Masson et Cie, Éditeurs, Ser. 10, Tomo 14, p. 117324, 1932. ________. Recherches sur la structure et le mode de croissance des chaumes. In: COSTANTIN, M. J. Annales des Sciences Naturelles, Botanique. França: Masson et Cie, Éditeurs, Ser. 10, Tomo 17, p. 81-145, 1935. ________. La Systématic des Graminées. In: COSTANTIN, M. J. Annales des Sciences Naturelles, Botanique. França: Masson et Cie, Éditeurs, Ser. 10, Tomo 18, p. 165-258, 1936. ________. General Features of the Epidermis in Zea mays. Annals of the Missouri Botanical Garden. St. Louis: Missouri Botanical Garden, v. 35, n. 4, p. 341-351, 1948. SANTOS-GONÇALVES, A. P. Estudos Taxonômicos e Morfoanatômicos em Colanthelia (Poaceae: Bambusoideae:Bambuseae). Tese (Doutorado em Biologia Vegetal) - Universidade Estadual de Campinas, 2005. 159 p. SILVA, L. S.; GRACIANO-RIBEIRO, D.; CORADIN, V. T. R.; FILGUEIRAS, T. S. Análise Comparativa da Anatomia Foliar do Gênero Olyra (Poaceae - Bambusoideae) ocorrente no Cerrado do Distrito Federal. Brasília: Universidade de Brasília, 2005a. Relatório final de PIBIC. ________. Análise Comparativa da Anatomia Foliar do Gênero Olyra (Poaceae - Bambusoideae) Ocorrente no Cerrado do Distrito Federal. In: CONGRESSO NACIONAL DE BOTÂNICA, 56., 2005, Curitiba. Anais... Curitiba: UFPR, 2005b. Resumo. SILVA FILHO, J. P. B. Caracterização Anatômica de Filgueirasia arenicola (McClure) Guala (Poaceae:Bambusoideae:Arthrostylidiinae). Dissertação (Mestrado em Botânica) - Universidade de Brasília, 2006. 143 p. SODERSTROM, T. R.; ELLIS, R. P. The Position of Bamboo Genera and Allies in a System of Grass Classification. In: SODERSTROM, T. R.; HILU, K. W.; CAMPBELL, C. S.; BARKWORTH, M. E. (Eds.). Grass Systematics and evolution: an International Symposium held at the Smithsonian Instituition, Washington, D. C., July 27-31, 1986. Washington: Smithsonian Institution Press, 1987. p. 225-238. SOUZA, R. Q.; GRACIANO-RIBEIRO, D.; CORADIN, V. T. R. Caracterização Morfológica e Anatômica de Quatro Espécies de Poaceae do Cerrado - Olyra humilis, Olyra latifolia, Olyra taquara e Pharus lappulaceus. Brasília: Universidade de Brasília, 2004. Relatório final de PIBIC. SOUZA, R. Q.; GRACIANO-RIBEIRO, D.; CORADIN, V. T. R.; FILGUEIRAS, T. S. Descricão Anatômica da Epiderme Foliar de Olyra taquara swalen (POACEAE: BAMBUSOIDEAE: OLYREAE) ocorrente no Cerrado do Distrito Federal. In: CONGRESSO NACIONAL DE BOTÂNICA, 55., 2004, Viçosa. Anais... Viçosa: Sociedade Brasileira de Botânica, 2004. Resumo. VIEIRA, R. C.; GOMES, D. M. S.; SARAHYBA, L. S.; ARRUDA, R. C. O. Leaf Anatomy Of Three Herbaceous Bamboo Species. Brazilian Journal of Biology. Brasil: International Institute of Ecology, v. 62, nº 4b, p. 907-922, 2002.

74


4.8 TAQUARUÇU (Guadua sp.): CARACTERIZAÇÃO DA PLANTA E DO AMBIENTE DE OCORRÊNCIA NA BACIA DO RIO CRIXÁS-AÇU, GOIÁS, BRASIL Roberto Magno de Castro e Silva1, Tarciso S. Filgueiras2, Ronaldo Veloso Naves3, Lázaro José Chaves4

Resumo Em 1998, descobriu-se, nas matas de galeria dos municípios goianos de Santa Terezinha de Goiás e Campos Verdes, uma espécie de bambu do gênero Guadua Kunth, conhecido regionalmente como taquaruçu, porém ainda desconhecido da ciência (espécie nova). O presente trabalho teve por objetivos caracterizar o ambiente em que se encontra o taquaruçu e identificar os fatores ambientais que atuam sobre a sua dispersão. Foi verificada a presença de plântulas do taquaruçu nas proximidades das touceiras adultas, ainda com vestígios de sementes entre as raízes. Foram levantados os seguintes dados: presença de brotos, folha do colmo, perímetro da touceira; número de colmos por touceira; comprimento do colmo; diâmetro da base do colmo; comprimento dos entrenós (base, meio e ápice); espessura das paredes dos entrenós (base, meio e ápice); resistência mecânica dos colmos, temperatura (média mensal e histórica de 10 anos); precipitação pluviométrica, insolação, propriedades químicas e físicas dos solos. A ação antrópica foi avaliada por meio de sinais de fogo, tipo de cultura adjacente às populações naturais do taquaruçu, desmatamento e extração de colmos para usos locais. Os resultados obtidos permitem concluir que o taquaruçu ocorre exclusivamente em matas de galeria e, preferencialmente, nas áreas com curto período de inundação no ano. A baixa fertilidade e a disponibilidade hídrica insuficiente dos solos parecem ser os principais fatores de exclusão do taquaruçu nas terras altas como Cerradão e Cerrado stricto sensu. A pressão antrópica, especialmente o desmatamento, parece ser o principal fator contrário à dispersão desta espécie na região. Palavras-chave: Matas de Galeria. Bambu no Cerrado Brasileiro. Flora de Goiás. Taquaruçu. Abstract In 1998, it was discovered in gallery forests of the municipalities of Santa Terezinha de Goiás and Campos Verdes, in the State of Goiás, Brazil, a type of bamboo of the genus Guadua Kunth, locally called “taquaruçu”, but not yet scientifically described (new species). The goals of the present work were the characterization of the environment where taquaruçu is found and the identification of the environmental factors that act upon its dispersion. Seedlings of taquaruçu were found growing in the vicinity of the mother clump, still with vestiges of spikelet parts and seeds attached to them. The following field data were gathered: presence of young shoots, culm leaves, perimeter of the clump, number of culms per clump; length of the culm, diameter of the culm at the base; length of internodes (base, mid-culm and tip); thickness of the walls of the internodes (base, mid-culm and tip), mechanical resistance of the culms, average monthly temperature, rainfall precipitation, sunshine, chemical and physical properties of the soils, anthropic action was evaluated by the of signs of fire, type of crops adjacent to taquaruçu natural populations, deforestation and extraction of culms for local uses. The results obtained allow the following conclusions: taquaruçu occurs exclusively in gallery forests and mainly in areas submitted to a short period of flood during the year. Low soil fertility and insufficient water availability appear to be the main factors for exclusion of taquaruçu in Cerradão and cerrado stricto sensu. Anthropic pressure, principally the destruction of the gallery forests, appears to be the main factor against the dispersion of this species in the region. Keywords: Gallery Forest. Bamboo in the Brazilian Cerrado. Flora of Goiás. Taquaruçu.

INTRODUÇÃO O bambu é uma gramínea com ampla distribuição geográfica, encontrado na forma nativa em todos os continentes, com exceção da Europa. Embora o Brasil tenha uma grande diversidade de bambus nativos e exóticos plenamente adaptados em todo o território nacional (FILGUEIRAS; SANTOS-GONÇALVES, 2004), este potencial não é devidamente explorado. São poucos os trabalhos de pesquisa relacionados ao cultivo e aproveitamento do bambu no Brasil e isto repercute no pouco uso industrial desta planta. 1 Roberto Magno de Castro e Silva, Associação Banco Florestal. Rua 91, 460. Setor Sul, Goiânia – Goiás.

CEP. 74 083 150. E-mail: (roberto@embambu.com.br). 2 Tarciso Filgueiras, IBGE. CX.P. 08770, Brasília, DF. CEP 70312-970. E-mail: (tfilg@uol.com.br). 3 Ronaldo Veloso Naves, EA/UFG - Escola de Agronomia e Engenharia de Alimentos – UFG, Goiânia – Goiás. Cx postal 131. E-mail: (ronaldo@agro.ufg.br). 4 Lázaro José Chaves, EA/UFG - Escola de Agronomia e Engenharia de Alimentos – UFG, Goiânia – Goiás. Cx postal 131. E-mail: (lxaves@agro.ufg.br).

75


Apesar disso, a produção de celulose de bambu vem crescendo gradativamente e uma só indústria no Maranhão cultiva aproximadamente cem mil hectares de Bambusa vulgaris para este fim (ITAPAGÉ, 2005). O Brasil possui uma grande diversidade de espécies de bambus nativos e exóticos. Filgueiras e Santos-Gonçalves (2004) documentaram a presença de 232 espécies nativas e 20 exóticas. Somente na APA de São Bartolomeu no Distrito Federal, Filgueiras (1988), após seis anos de coleta identificou dez espécies de bambus nativos. A despeito de toda esta riqueza, em Goiás o uso do bambu se restringe praticamente ao meio rural, onde é empregado como tutor na olericultura, e numa cestaria bastante rudimentar. Em alguns centros urbanos existe uma incipiente exploração de Phyllostachys aurea na produção de móveis, e de Bambusa vulgaris na produção de palitos para churrasco. Em 1989, o primeiro autor encontrou uma população de um bambu do gênero Guadua Kunth, em matas ciliares dos municípios goianos de Santa Terezinha e Campos Verdes, conhecida regionalmente por taquaruçu. Esta espécie apresenta semelhanças com Guadua chacoensis (Rojas) Londoño & P.M.Peterson e Guadua angustifolia Kunth, porém, segundo Filgueiras e Londoño (2006) trata-se de uma espécie nova para a ciência. Percebeu-se que as populações de taquaruçu naqueles municípios estavam em declínio. A morte natural pelo florescimento sincrônico e as pressões antrópicas eram apontadas como as prováveis causas deste declínio. A compreensão das condições ambientais em que se encontra o taquaruçu no estado nativo, além de contribuir para uma estratégia conservacionista para esta espécie, pode ser o primeiro passo para a sua futura domesticação. Este trabalho tem por objetivo caracterizar o ambiente em que se encontra o taquaruçu, e verificar quais os fatores que exercem influência sobre sua dispersão.

1 MATERIAL E MÉTODOS O estudo foi realizado em alguns tributários do Rio Crixás-Açu nos municípios de Santa Terezinha de Goiás e Campos Verdes, distante aproximadamente 360 km da cidade de Goiânia, capital do Estado de Goiás. As áreas estudadas estão localizadas em pequenas e médias propriedades rurais à esquerda da GO 465, sentido Santa Terezinha – Campinorte, Latitude: S 14°18' 5,00", Longitude: WO 49° 33' 28" e Altitude: 338 m (Figura 1A). O material estudado pertence a uma espécie de Guadua, nativa do Estado de Goiás, pertencente ao complexo de espécies que inclui G. angustifolia, G. ciliata, G. paraguayana e G. superba. A espécie em tela é, muito provavelmente, nova para a ciência e, portanto, não tem ainda descrição completa nem tampouco status formal, de acordo com o Código Internacional de Nomenclatura Botânica ( GREUTER et al., 2000). O material botânico desta espécie está sendo estudado por dois especialistas em bambus, Tarciso S. Filgueiras (Brasil) e Ximena Londoño (Colômbia) (FILGUEIRAS; LONDOÑO, Comunicação Pessoal, 2005). Uma vez observada a região de ocorrência da espécie em estudo, estabeleceram-se os seguintes critérios para a eleição das dez áreas de estudo: a) cada área deveria ter pelo menos cinco touceiras em bom estado de conservação; b) as cinco touceiras dentro de cada área deveriam estar relativamente próximas, num raio máximo de 50 m do seu epicentro; c) deveriam ser representativas do taquaruçu que ocorre na região de Santa Terezinha e Campos Verdes. O material foi coletado e herborizado no Laboratório de Botânica do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Goiás e posteriormente enviado para a Reserva Ecológica do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para identificação. A forma de dispersão foi investigada por meio do arranquio de plântulas com o auxílio de um enxadão para verificar possíveis vestígios de sementes, fragmentos de rizomas ou colmo de plantas adultas ligadas às suas raízes. Após o arranquio, a terra contida nas raízes foi eliminada por lavagem em água para melhorar a visualização sem que para isso danificasse o sistema radicular. Alguns rizomas, pedaços de colmos e plântulas foram cultivados em viveiro com o objetivo de se verificar a viabilidade de cada um. Foram observadas as características referentes ao estágio fenológico das plantas nas touceiras, tais como presenças de brotos, folha do colmo, e flores. Os brotos presentes foram contados e a presença ou ausência de inflorescências foi observada com o auxílio de um binóculo de longo alcance. Para a coleta dos dados considerou-se cada touceira como uma planta ou indivíduo. Primeiramente tomou-se a medida do perímetro de cada touceira e da base de todos os colmos. Para evitar a duplicidade na contagem e medida dos colmos, todos foram pintados com uma tinta acrílica na cor vermelha assim que eram contabilizados e medidos. Os perímetros das bases dos colmos foram convertidos em diâmetros, dividindo-se por 3,1416 (π) (Figuras 1B, 1C e 1D). Cortou-se em cada área um colmo (o mais alto) que, depois de tomado o seu comprimento total, foi dividido em três partes: base, meio e ponta; e tomou-se então a medida das espessuras das paredes e o comprimento dos entrenós da base, do meio e ponta. Em seguida, amostras foram enviadas ao

76


Laboratório de Resistência de Materiais para a avaliação das resistências a tração, compressão e cisalhamento. Na projeção de cada touceira foram perfurados cinco pontos para a coleta de solo nas profundidades de 0 a 20 cm. A partir destas sub-amostras, obteve-se uma amostra composta de cada touceira que representava uma parcela. Em um dos pontos já perfurados, aprofundando-se mais na escavação, foram obtidas outras amostras de 20 a 40 e de 40 a 60 cm de profundidade. Destas amostras, nas respectivas faixas de profundidades, obteve-se uma amostra composta representativa de cada área. Desta forma, foram obtidas, no final, 50 amostras compostas na profundidade de 0 a 20 cm, 10 amostras compostas na profundidade de 20 a 40 cm e 10 amostras compostas na profundidade de 40 a 60 cm, que foram submetidas às análises químicas e físicas de solo, de acordo com a metodologia adotada pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA, 1997). Para a caracterização da temperatura do ar, foram utilizados os dados da Estação climatológica de Goianésia-GO, por ser a que mais conciliava proximidade e consistência de dados. Os dados da temperatura média mensal, mínima e máxima, foram extrapolados com base nas coordenadas dessa estação. Latitudes e longitudes da área mais próxima do epicentro das áreas de estudo e altitude média destas áreas (Tabela 1), foram obtidas conforme a metodologia disponível em http//www.meteorgo. Para a precipitação e luminosidade foi utilizado o Atlas Climatológico do Estado de Goiás. A pressão das atividades humanas sobre as populações de Guadua sp. estudadas foi avaliada pela observação da presença de sinais de fogo, tipo de cultura adjacente, desmatamento e extração de colmos para usos locais. A análise dos dados obedeceu a um modelo que considera diferença entre áreas amostradas (populações) e as diferentes touceiras de cada população como repetições, em um esquema hierárquico correspondente ao delineamento experimental inteiramente casualizado.

2 RESULTADOS E DISCUSSÃO 2.1 CARACTERIZAÇÃO DA PLANTA Nas condições locais, o taquaruçu se apresenta como um bambu de densas e vigorosas touceiras, facilmente visíveis ao longo das matas de galeria. Os colmos são eretos, com manchas amareladas e, em alguns, as folhas dos colmos são persistentes. Dos colmos surge um grande número de ramificações laterais com espinhos pontiagudos que dificultam a penetração humana no interior da touceira (Figura 2J). Diversos colmos cortados apresentavam água armazenada no seu lúmen. Parte dos rizomas surge perpendicularmente aos colmos e se curvam em direção ao solo. As folhas das ramificações persistem aparentemente na mesma quantidade ao longo do ano. Apresentam coloração que se aproxima do verdeclaro ao verde-amarelado. Na projeção de diversas touceiras encontra-se um grande número de plântulas de taquaruçu que diferem das demais plântulas de outras espécies existentes na área devido às suas fímbrias bastante proeminentes (Figura 2I). Foi observado que essas plântulas continham em suas raízes vários nódulos de bactérias, possivelmente fixadoras de nitrogênio (Figura 2K). Foi encontrado também vestígio de espiguetas (“sementes”) nas raízes das plântulas (Figura 2G). Estas plântulas, em todas as situações estavam sob fortes condições de sombreamento e normalmente se encontravam na projeção da touceira matriz. Não foram observados indícios de propagação por fragmentos da touceira matriz. Do ponto de vista fitossanitário é comum, nas plântulas, a presença de folhas com sintomas de ataques de fungos e insetos cortadores, condição que raramente foi encontrada em plantas adultas. Foram observados, nas touceiras, colmos brocados, quebrados e muitos brotos mortos. Uma grande parte dos brotos ou colmos novos estava danificada ou totalmente quebrada pela ação, segundo os moradores da região, de um rato grande denominado rataquara. Este ataque concentrava-se numa altura média de 2 m. A partir deste ponto, surgiam com frequência brotações laterais (Figuras 2L, 2O e 2P). Não foi possível coletar o rataquara. Entretanto, possivelmente se trate da espécie Dactylomys dactylinus (DEMAREST 1817), observada por Costa e Silva Jr. (2001), na região de Cerrado. Os autores examinaram 26 espécimes coletados em Serra da Mesa, GO, e um espécime de Tocantinópolis, TO, entre setembro de 1995 e julho de 2000. A literatura relata como área de abrangência desta espécie a Amazônia, contudo estes autores sugerem a extensão de sua distribuição para o Cerrado, em direção ao sul do Brasil, até a região de Serra da Mesa, Goiás, na bacia do Rio Tocantins. Como ambos os rios, Araguaia e Tocantins, pertencem à Bacia Amazônica, é provável que a espécie que lá ocorre seja Dactylomys dactylinus. O grande número de colmos supostamente danificados pelo rataquara, não dá sustentação à idéia de uma pressão contrária deste herbívoro sobre o taquaruçu em termos populacionais. A emissão de novos colmos é maior que os danos ocasionados pelo ataque pontual do rato. Além disso, nas condições

77


locais, o ataque ocorre de forma concentrada em algumas touceiras. Não foi estimado o dano provocado devido à dificuldade, em alguns casos, de distingui-lo de outros danos naturais ou antrópicos. Seria de grande valia fazer investigações no sentido de qualificar com precisão o tipo de dano causado pelo rataquara, para que possa ser mensurado o seu impacto sobre a dispersão do taquaruçu. Em florestas naturais ou cultivadas de Guadua angustifolia, este rato não parece ter o status de praga, uma vez que não foi encontrada qualquer referência sobre ele em literatura ou consulta pessoal a especialistas em bambu no Brasil e Colômbia. 2.2 DADOS BIOMÉTRICOS Considerando os dados originais e não as médias, a maior parte dos diâmetros das bases dos colmos, correspondente a 29,58%, variou entre 11,14 e 13,70 cm (Figura 3). Morales e Kleinn (2004), em florestas naturais de Guadua angustifolia na Colômbia, medindo o diâmetro na altura do peito, encontraram 53,01% dos colmos medidos numa faixa de 8 a 12 cm e 35,75% entre 12 e 16 cm. Considerando a forma cônica do bambu, os diâmetros encontrados por estes autores são ligeiramente maiores que os diâmetros do taquaruçu nas áreas estudadas. A média geral dos dados originais foi de 10,35 cm e as áreas com maiores diâmetros médios tenderam a apresentar menores quantidades de colmos em relação aos perímetros das touceiras (Tabela 3). A relação entre diâmetro e densidade de colmos coincide com as observações de Garcia (2004), que encontrou uma relação negativa entre estas duas variáveis. Ao contrário, Morales e Kleinn (2004) não observaram correlação entre diâmetro e quantidade de colmos por hectare. Estes autores sugerem que esta divergência pode estar relacionada com algum tipo de manejo silvicultural aplicado nas áreas estudadas. Contudo, levando-se em conta a capacidade limitada de oferta de nutrientes por planta, é previsível que a capacidade de suporte da planta se restrinja a uma determinada biomassa. Deve-se considerar ainda que os colmos na condição de broto possuem menor capacidade fotossintética e são parcialmente dependentes da planta-mãe. Como a biomassa individual do colmo é proporcional ao seu diâmetro, espera-se que diâmetro do colmo e quantidade de colmos por unidade de área sejam grandezas inversamente proporcionais. As dimensões dos colmos do taquaruçu encontradas neste estudo, assim como a sua baixa curvatura são características que qualificam esta espécie para o uso na construção civil, fabricação de móveis e parquetes. Porém, as resistências mecânicas, biológicas e o seu comportamento em condições de cultivo são características que também devem ser avaliadas. 2.3 ASPECTOS REPRODUTIVOS Foi encontrada na projeção de diversas touceiras uma grande concentração de plântulas de taquaruçu (Figura 2H), aqui designada como coorte de plântulas. Objetivando identificar a forma de propagação que deu origem a estas plântulas, algumas foram arrancadas com o auxílio de um enxadão. Posteriormente a terra aderida a elas foi eliminada com água para evitar a danificação do sistema radicular. Em algumas plântulas foram encontrados vestígios de espiguetas (“sementes”) presas em suas raízes (Figuras 2M e 2G). Foi observado também que novas brotações eram emitidas a partir dos pequenos rizomas das plântulas sendo que este comportamento foi confirmado ao perceber-se que plântulas transplantadas e cultivadas em viveiro e que apresentavam a parte aérea morta continuavam a originar novos brotos a partir dos rizomas. Estas observações conduzem à hipótese de que, nas condições estudadas, o taquaruçu apresenta duas estratégias principais de dispersão: propagação sexuada, numa primeira fase, a partir das “sementes” lançadas ao solo pela planta mãe, e propagação assexuada a partir da emissão de novas brotações originadas dos rizomas das plântulas, aumentado-se, desta forma, o número de indivíduos no processo de colonização. Estas duas estratégias poderiam fundirse numa só, se for adotado o conceito de Smith (2000), que chamou de falange a estratégia dos bambus do Acre, que formam um grande aglomerado com o objetivo de consolidar uma ocupação do espaço, impedindo a entrada de invasores. Nossas coortes seriam componentes vitais dessas falanges. A dispersão por fragmentos de rizomas de plantas adultas, embora não seja a forma preferencial, não deve ser descartada uma vez que, em condições de viveiro, foram obtidas facilmente novas plantas por este processo. Por outro lado, o fato de não se ter obtido sucesso em várias tentativas de propagação com fragmentos de colmos leva a crer que, em condições naturais, este seja um evento raro. 2.4 RESISTÊNCIA MECÂNICA Quase a totalidade dos bambus cortados para a caracterização física e mecânica em laboratório murchou e rachou do interior para o exterior da parede, o que inviabilizou esta parte do estudo (Figura 2Q). Como as amostras colhidas em épocas secas e chuvosas tiveram este mesmo comportamento, é improvável que a umidade relativa do ar tenha influenciado na murcha do taquaruçu pós-corte. Fato semelhante foi observado por Nieto (2004), na Colômbia, que percebeu que a maior disponibilidade de água na planície, devido ao alto nível do lençol freático do Rio Cauca, faz o G. angustifolia inchar e se tornar “fofo” por menor conteúdo de sólidos em sua estrutura, em comparação com o G. angustifolia das zonas de cordilheiras, que têm menor disponibilidade de água e colmos mais sólidos e resistentes ( NIETO,

78


2004). As áreas de taquaruçu estudadas têm condições bem semelhantes às descritas pelo autor, uma vez que se localizam nas vazantes dos cursos d’água e permanecem alagadas por aproximadamente dois meses.

3 TAQUARUÇU versus FATORES AMBIENTAIS 3.1 ASPECTOS GERAIS As formas vegetacionais mais presentes na região de estudo são: cerrado stricto sensu, cerradão e os ambientes de matas. São comuns as planícies denominadas “varjões”, que permanecem alagadas por um período do ano. Nas áreas estudadas e de prospecção, a flora é bastante rica, com um bom índice de cobertura vegetal quando comparado com outros municípios do Estado. Realizou-se o levantamento das espécies arbóreas que ocorreram com mais frequência nas áreas em estudo próximas às populações de taquaruçu (Tabela 2). As áreas de estudo localizam-se nas matas de galerias do Córrego Taquaruçu e seus tributários. O conceito de mata de galeria aqui aplicado é aquele estabelecido por Ribeiro e Walter (2001), quando se define: “mata de galeria é a vegetação florestal que acompanha os riachos de pequeno porte e córregos dos planaltos do Brasil Central, formando corredores fechados, galerias, sobre o curso de água”. Pelo fato de a região estudada pertencer à Bacia Amazônica, é provável que receba algum tipo de influência deste bioma. O fluxo gênico seria possível principalmente pelos corredores ecológicos que ocorrem ao longo dos rios (PINTO; BARROS, 1996). 3.2 OS FATORES ANTRÓPICOS O impacto da agropecuária no ambiente natural do município de Santa Terezinha de Goiás é mais brando que em regiões onde a agricultura moderna é praticada. A explicação para esta situação não se pode dar pela vocação dos solos que atendem aos quesitos da agricultura moderna, com boa topografia e fertilidade mediana. Por outro lado, o fato de o município ter pouco mais de quarenta anos e ter tido o garimpo por uma década como atividade principal pode ser responsável, em parte, pela significativa área de cobertura nativa ainda presente. Outro fator que provavelmente contribuiu para esta situação foi a coincidência do aumento da fiscalização ambiental com a época em que a conversão das terras do município para a atividade agropecuária ainda era baixa. Contudo, este fator só atua nas áreas de reserva legal correspondentes a 20% de cada propriedade e áreas de preservação permanente que, segundo a lei estadual, correspondem às matas ciliares e morros cuja inclinação supera 45º ( ESTADO DE GOIÁS, 1995). A pressão antrópica exercida sobre as populações de taquaruçu se dá principalmente através da agropecuária. Em muitas situações foram observadas “touceiras testemunhas”, circundadas por pastagem, que são remanescentes, segundo moradores, de uma grande população de taquaruçu (Figura 2B). Não foram observados sinais de fogo nas touceiras, fato este que leva a concluir que na atualidade este não é um fator contrário à dispersão das populações. Mas, segundo os moradores mais antigos na região, o fogo foi empregado na conversão das áreas de taquaruçu em pastagens e lavouras. A pouca tradição do uso do taquaruçu na região reflete na pequena quantidade de colmos cortados encontrados nas touceiras. No passado, o taquaruçu foi mais empregado como um recurso no meio rural local. A falta de tradição e conhecimento no uso do bambu nesta região pode ter levado esta planta ao desprezo. Por outro lado, em outras situações, no Cerrado, o extrativismo descontrolado e sem o estudo da capacidade de suporte tem exercido uma pressão negativa sobre diversas espécies nativas deste bioma (RIBEIRO; SILVA, 1996). As áreas de ocorrência do taquaruçu se restringem às matas de galerias, que são protegidas por lei que as considera como áreas de preservação permanente ( ESTADO DE GOIÁS, 1995). Porém, o desconhecimento da legislação e a falta de fiscalização levam à conversão ilegal destas áreas devido a sua maior fertilidade. Esta lei seria também uma barreira ao aproveitamento desta planta pela comunidade local mesmo que para uso interno na propriedade, já que a legislação brasileira não permite qualquer tipo de uso, direto ou indireto, em áreas de preservação permanente. Portanto, qualquer forma de exploração legal desta planta teria que ser feita por meio de cultivo nas áreas agrícolas ou na reserva legal, onde é permitido o uso com base num plano de manejo no qual não se permite o corte raso (ESTADO DE GOIÁS, 1995). 3.3 TEMPERATURA E ALTITUDE Considerando a temperatura média mensal e histórica de 10 anos, em apenas três anos a temperatura média mínima mensal foi inferior a 17ºC, mesmo assim com uma diferença muito pequena, 16,9°C (Tabela 5). Referindo se a Guadua angustiflolia, Antia Arroyave (1983) afirma que temperaturas inferiores a 17ºC se apresentam como limites e críticas para as fases de desenvolvimento. Este mesmo autor relata que o crescimento ótimo ocorre entre: temperatura média 23-24°C, temperatura máxima

79


média 29-31°C e temperatura mínima média 17-18°C. A temperatura máxima média em diversos momentos esteve acima dos valores ótimos apresentados nesses estudos. As altitudes das áreas estudadas (Tabela 1) estão todas abaixo daquela faixa indicada como mais adequada para o desenvolvimento do Guadua angustifolia nos estudos realizados por Nieto (2004), nas condições do Valle El Cauca, Colômbia. O autor observou que o melhor desempenho ocorreu nos locais com altitudes entre 1.300 m e 1.500 m. Contrariamente, nas altitudes inferiores a 1.000 m e superiores a 1.700 m, esta espécie não apresentava bom desenvolvimento. Dados bastante próximos são apresentados por Sierra e Garcia (2004) quando afirmam que as melhores altitudes para crescimento do Guadua angustifolia na região cafeeira da Colômbia se evidenciam em cultivos localizados em altitudes entre 1.200 m e 1.500 m. 3.4 PRECIPITAÇÃO A intensidade das chuvas ao longo do ano na área de estudo se assemelha àquelas relatadas como ideais para o desenvolvimento de Guadua angustifolia na Colômbia, que está entre 2.000 mm e 1.000 mm (NIETO, 2004). De acordo com os dados históricos de 1945 a 1990, a precipitação anual acumulada na área estudada variou de 1.563 mm a 1.839 mm (Tabela 6). A forma como a chuva se distribui ao longo do ano, com três meses de deficit hídrico, com a precipitação variando de 3 mm a 11 mm mensais, sugere que o taquaruçu, em relação à precipitação, tem um comportamento diferente de Guadua angustifolia, uma vez que Nieto (2004) afirma que períodos de estiagem iguais ou superiores a três meses são impróprios para esta espécie. Contudo, o fato de se ter encontrado água, mesmo nos meses de estiagem, em grande parte dos buracos cavados com 60 cm de profundidade na projeção da copa do taquaruçu pode elucidar esta aparente diferença. Considerando que a influência da precipitação está diretamente relacionada com a umidade do solo, um período de estiagem de até três meses se torna menos relevante, uma vez que o taquaruçu só ocorre junto aos cursos de água. Desta forma, a água da chuva drenada na bacia estaria disponível para o taquaruçu na zona de raiz ao longo dos períodos secos. Vidalenc (2000) observou que outra espécie, Guadua weberbaueri, no Estado do Acre, se manteve verde mesmo em condições de deficit hídrico devido à capacidade do seu sistema radicular de explorar água nos horizontes mais profundos, que certamente incluiria a faixa de 60 cm. Os estudos relacionados à influência das águas de inundação realizados por Nieto (2004) levaram a conclusão de que estas águas são favoráveis ao desenvolvimento do Guadua angustifolia em condição de solos franco-arenosos e que apresentem uma velocidade de escoamento suficiente para o arejamento. Ambas as condições são encontradas nas áreas de estudo, que são coincidentes com as vazantes dos cursos d’água. A capacidade das plantas de tolerar a inundação depende de características intrínsecas da espécie, mas também das variações temporais do nível da água. Frequentemente, plântulas muito jovens não toleram a submersão total, mas, em estágio mais avançado de desenvolvimento, conseguem tolerar inundações parciais, com a água cobrindo raízes, parte do caule, ou apenas o sistema radicular (FERREIRA; RIBEIRO, 2001). 3.5 LUZ A insolação total normal anual de Santa Terezinha de Goiás nos períodos entre 1961 e 1990 variou de 2.394 a 2.538 horas anuais (LOBATO et al., 2002). Nas condições locais, uma parte das populações de taquaruçu estudadas encontrava-se sob uma concorrência de luz com árvores de grande porte. Algumas populações encontravam-se isoladas por pastagens cultivadas e em boas condições de luminosidade (Figura 2B). As plântulas encontradas na projeção das touceiras estavam sob forte sombreamento, tanto pela própria planta-matriz como por outras espécies arbóreas (Figura 2H). Numa avaliação visual, o fator luz não demonstrou uma correlação direta com a altura, densidade da touceira e diâmetro dos colmos. As touceiras sob dossel arbóreo apresentavam o mesmo vigor que as touceiras isoladas, coincidindo com as observações de Vidalenc (2000) nos seus estudos com Guadua weberbaueri no Estado do Acre. Ali, novos colmos surgiam indiferentemente em lugares sombreados e a plena luz. O fato de o bambu ser uma planta muito eficiente no uso da energia solar ( LONGHI; RODRIGUEZ, 1998) pode explicar parte desta relativa indiferença observada do taquaruçu a uma determinada intensidade de sombreamento. Vidalenc (2000) propõe uma outra teoria em que o comportamento clonal assegura ao bambu uma vantagem competitiva na obtenção de luz quando nutre os novos colmos através das reservas da planta matriz, sem que tenha a necessidade de realizar fotossíntese até que supere o dossel. 3.6 SOLO Como na prospecção não foi encontrado o taquaruçu em ambientes naturais de terras altas, suspeita-se que algum fator ambiental é excludente para esta espécie nesta condição. A alta fertilidade e

80


a disponibilidade de água no solo na época seca podem ser os fatores que levam à preferência do taquaruçu pelas matas de galeria, se considerarmos que os demais fatores como temperatura, precipitação e luminosidade não se alteram de forma significativa entre estes ambientes. O estudo de correlação entre o taquaruçu e o solo na área de projeção das touceiras, leva a uma pergunta: estaria o solo influenciando o taquaruçu ou o taquaruçu influenciando o solo? A grande deposição de matéria orgânica por queda das folhas, serapilheira, e o emaranhado de raízes que se forma principalmente no horizonte superficial, além de ser um condicionar físico do solo, podem também interferir de forma positiva no teor de nitrogênio e outros elementos. Esta possibilidade é confirmada por Correia et al. (2001), quando afirmam que, nos solos de matas de galeria, além da contribuição de nutrientes lixiviados das partes mais altas, a deposição de folhas, galhos e frutos sobre estes solos somada às boas condições de umidade, favorece a manutenção de uma camada de matéria orgânica bem maior do que em solos de cerrado stricto sensu. A influência do bambu sobre as características físico-químicas do solo, principalmente nos primeiros 50 cm, foi também sugerida por Vidalenc (2000). Estudando os fatores edáficos sobre matas de galeria no bioma Cerrado, Ribeiro e Walter (2001) ressaltam que a quantidade de serapilheira que permanece na camada superficial do solo, bem como seu conteúdo de nutrientes, influenciam no desenvolvimento das plantas, já que as raízes finas das árvores exploram a camada da serapilheira em decomposição para a absorção de nutrientes. Acrescenta-se a isto o fato de o bambu ser uma gramínea e ter nas suas folhas uma relação C/N que retarda a sua decomposição. Daí, uma das razões de se ter encontrado uma grande quantidade de folhas de taquaruçu sobre o solo, em todas as visitas a campo. Visando isolar as influências do Guadua weberbaueri no solo, Vidalenc (2000) sugere que seja realizado um estudo do solo numa profundidade que fuja da influência da atividade biológica do próprio bambu. Correia et al. (2001) considera que em solos de mata de galeria o estudo do solo também deve contemplar as camadas mais profundas pelas mesmas razões da autora anterior, mas também pelas frequentes variações dos teores de areia, silte e argila que ocorrem no solo. Se considerarmos o estudo do solo de forma isolada, é aceitável a sugestão dos dois autores. Contudo, se o objetivo do estudo for a correlação do solo com a planta, uma questão deve ser levantada: qual seria esta profundidade? Para o Guadua weberbaueri, Vidalenc (2000) sugere que seja superior a 50 cm e, seguindo este raciocínio, para Guadua angustifolia seria aproximadamente um metro, considerando que Nieto (2004) reporta que esta espécie restringe o seu sistema radicular a uma profundidade inferior a um metro. Mas, se o objetivo for averiguar a influência do solo sobre a planta, não seria uma incongruência estudar este solo numa profundidade inacessível às raízes? Estatisticamente não houve diferença entre as áreas no que refere às variáveis biométricas do taquaruçu a 5% de significância (Tabela 4). Isto significa que as diferenças estatísticas dos solos entre as áreas (Tabela 7) não influenciaram nas médias das variáveis biométricas entre as áreas. Conforme a Tabela 7, para a variável pH, os valores médios das áreas estudadas estão abaixo daqueles definidos por Nieto (2004) como ideais para Guadua angustifolia que, segundo o autor, estão entre 5,9 e 6,9. Uma resposta para esta questão seria a possibilidade de o taquaruçu estar mais adaptado a uma condição de solos mais ácidos, o que parece ser válido também para a Guadua paniculata, que ocorre tanto em mata de galeria como no cerrado stricto sensu, onde o pH, segundo dados de Naves (1999), é consideravelmente mais baixo. Por outro lado, devido à grande área ocupada pelo sistema radicular do taquaruçu, é possível que valores extremos não só para o pH como para os nutrientes, na projeção da touceira, sejam mais importantes que os valores médios por área. Neste contexto, Smith (2000) lembra que é importante considerar o tamanho do indivíduo clonal e a sua capacidade de translocar nutrientes entre as suas partes. Com relação à matéria orgânica, os valores encontrados estão acima daquele relatado por Naves (1999) em solos de Cerrado, cujo valor médio foi de 2,04%. Este alto teor de matéria orgânica por regra deveria estar influenciando na disponibilidade de vários nutrientes, mas, principalmente, nos teores de nitrogênio. A presença de bactérias, possivelmente fixadoras de nitrogênio nas raízes de plântulas do taquaruçu (Figura 2K), é um indício que esta seja uma outra fonte deste nutriente nas condições locais. As bactérias Kebisiella pneumoniae e Bacillus polymixa foram encontradas nos bambus das espécies Phyllostachys pubenscens, P. meyeri, Dendrocalamus latiflorus, Neosinocalamus beeche e Bambusa textilis na China (XIAOPING; XIAOLI, 1998). Devido à dificuldade, nas condições locais, de avaliar a influência das diversas propriedades do solo de forma isolada sobre o taquaruçu, não é inválida, mas questionável, qualquer correlação com os dados biométricos. Provavelmente a interação entre estas propriedades é mais importante do que as suas influências de forma isolada. Conclusão similar é a de Nieto (2004) quando, referindo-se à influência da textura sobre o desenvolvimento do Guadua angustifolia, afirma “Uma textura arenosa é desfavorável para o guadua devido à sua baixa retenção de água e capacidade de intercâmbio catiônico, mas pode ser compensada por outros fatores, tais como grande profundidade do solo, lençol freático acessível ou alta precipitação. Por outro lado, uma textura argilosa denota condições físicas pobres para o crescimento, mas, em um solo argiloso rico em colóides, o guadua pode crescer melhor”. Estas condições propostas

81


por Nieto (2004) são convergentes com as das áreas estudadas, no que se refere ao lençol freático e riqueza de colóides no solo. Estes poderiam estar compensando o alto teor de areia presente. Em plantas de Guadua weberbaueri de dez anos de idade, Vidalenc (2000) observou que maiores teores de areia, aos 85 cm de profundidade, têm efeito positivo sobre a densidade de colmos, enquanto a contração do solo, baixa permeabilidade, influi negativamente. A alta densidade do taquaruçu e a predominância da fração areia ao longo do perfil do solo até 60 cm de profundidade conduzem ao entendimento de que este comportamento é também válido para o taquaruçu. Contudo, vale reafirmar que esta hipótese é difícil de ser confirmada sem que se isolem os diversos fatores relacionados ao desenvolvimento do taquaruçu.

4 CONCLUSÕES A análise de todos os dados apresentados permite concluir que: a) o taquaruçu ocorre próximo aos cursos de água, nas matas de galeria, tendo uma adaptação a curtos períodos de inundação e não é encontrado em outras fitofisionomias; b) as diferenças estatísticas encontradas nas características dos solos nas áreas estudadas não se refletiram no desenvolvimento das plantas; c) a dispersão desta espécie se dá, preferencialmente, por sementes; d) o taquaruçu convive com uma espécie de rato de grande porte (rataquara) que se alimenta de brotos e colmos novos, provocando ramificações laterais nos colmos predados; e) a principal pressão antrópica contrária às populações do taquaruçu é a conversão das matas de galeria em áreas para a agropecuária; f) o taquaruçu é um bambu de grande porte que apresenta potencial para o uso na construção civil, artesanato e fabricação de móveis.

Figura 1A. Localização do Município de Santa Terezinha no Estado de Goiás.

Figuras 1B, 1C e 1D. Levantamento dos dados biométricos.

82


Figura 2. Aspectos gerais do taquaruçu nas áreas de estudo: A. Taquaruçu na mata ciliar; B. Touceiras a plena luz; C. Touceira densa; D. Colmo em crescimento e desprovido de folhas; E. Colmo liberando folha do colmo; F. Taquaruçu junto ao curso d’água; H. Plântulas; I. Plântula com fímbrias; J. Aspecto das ramificações; K. Nódulos de bactérias; L, O, P. Sintomas do ataque do rataquara; M, G. Plântulas com vestígios de sementes; N. Plântula emitindo novos colmos; Q. Colmo murcho; R. Rizoma.

Figura 3. Frequências e classes dos diâmetros das bases dos colmos de taquaruçu nas dez áreas estudadas no município de Santa Terezinha de Goiás, 2005.

83


Tabela 1. Nomes, localização e altitudes das áreas estudadas com taquaruçu na Bacia do Rio Crixás-Açu, no Norte do Estado de Goiás. Áreas

Latitude

Longitude

Altitude (m)

1

Riacho das Pedras

S 14º 14’ 19,00”

WO 49º 32’ 55,00”

310

2

Arara I

S 14º 20’ 54,00”

WO 49º 34’ 8,51”

340

3

Tiúba I

S 14º 18’ 6,80”

WO 49º 34’ 31,10”

348

4

Tiúba - Porto Francia

S 14º 18’ 3,30”

WO 49º 33’ 22,50”

331

5

Arara II

S 14º 19’ 25,50”

WO 49º 34’ 8,00”

328

6

Buchinha

S 14º 18’ 43,30”

WO 49º 33 23,9”

353

7

Fazenda N. Sª da Abadia

S 14º 18’ 45,50"

WO 49º 33’ 27,70”

351

8

Tiúba II

S 14º 13’ 29,00”

WO 49º 34’ 34,50”

320

9

Água Branca I

S 14º 24’ 4,30”

WO 49º 36’ 6,70”

360

10 Água Branca II

S 14º 24’ 5,20”

WO 49º 35’ 58,90”

338

Tabela 2. Espécies arbóreas observadas com maior frequência próximas às plantas de taquaruçu, no município de Santa Terezinha de Goiás, 2004.

84

Nome popular

Nome científico

Angico branco

Anadenanthera colubrina (Vell.)

Bacuri

Scheelea phalerata (Mart.) Burret

Bingueiro

Cariniana estrellensis (Raddi) Kuntze

Buriti

Mauritia flexuosa L.f.

Cajazinho

Spondias lutea L.

Cedro

Cedrela fissilis Vell.

Chichá

Sterculia striata A. St. Hil. & Naudin

Copaíba

Copaifera langsdorffii Desf.

Garapa

Apuleia leiocarpa (Vogel) J.F. Macbr.

Genipapo

Genipa americana L.

Guapeva

Pouteria torta (Mart.) Radlk.

Ingá

Inga marginata Willd.

Ipê roxo

Tabebuia heptaphylla

Jatobá

Hymenaea courbaril L.

Mamica-de-porca

Zanthoxylum hasslerianum (Chodat)

Maria-pobre

Dilodendron bipinnatum Radlk.

Mutamba

Guazuma ulmifolia Lam.

Paineira

Chorisia speciosa

Pau-formiga

Triplaris brasiliana Cham.

Pau-jangada

Apeiba tibourbou Aubl.

Periquiteira

Trema micrantha (L.) Blume

Peroba

Aspidosperma parvifolium A. DC.

Sangra d'água

Croton urucurana Baill.

Taboca

Guadua paniculata (Munro)

Taquari

Actinocladum verticillatum (Nees)

Taquarinha

Olyra sp

Tarumã

Vitex cymosa Bert.

Tucum

Bactris inundata Mart.


Tabela 3. Perímetro da touceira, número de colmos e diâmetro médio dos colmos do taquaruçu, Guadua sp., estudado no município de Santa Terezinha de Goiás. VARIÁVEIS

PER. DA TOUCEIRA (m)

Nº DE COLMOS

DIÂMETRO DO COLMO (cm)

ÁREAS

MÍN

MÉD

MÁX

MÍN

MÉD

MÁX

MÍN

MÉD

MÁX

1

5,10

8,76 a

11,8

11,00

33,6 a

75,00

7,50

9,11 a

11,41

2

5,60

9,26 a

15,08

11,00

29,2 a

68,00

7,16

9,01 a

26,39

3

4,90

13,68 a

30,05

9,00

29,4 a

69,00

6,70

11,93 a

14,88

4

6,80

13,82 a

32,5

23,00

37,2 a

86,00

6,36

7,89 a

9,76

5

4,20

9,86 a

18,9

11,00

24,8 a

44,00

6,85

9,69 a

12,78

6

11,60

15,84 a

20,7

32,00

46,2 a

68,00

10,21

11,88 a

12,96

7

12,10

15,19 a

21,45

30,00

55,2 a

82,00

5,63

10,05 a

10,01

8

3,10

8,67 a

12,3

8,00

16,2 a

25,00

10,11

11,45 a

13,20

9

3,60

10,56 a

18

11,00

49,4 a

39,00

6,38

8,50 a

12,98

10

5,60

13,26 a

16,5

8,0

44,4 a

46,00

10,30

10,90 a

11,36

MÉDIAS

6,26

11,89

19,73

15,40

36,56

60,20

7,72

10.04

13,57

CV (%)

51,22

72,06

20,55

TESTE F

1,02ns

1,07ns

2,45*

Tabela 4. Dados biométricos, em cm, dos colmos de taquaruçu representantes de cada área de estudo no município de Santa Terezinha de Goiás, 2005. ÁREAS

COMP COLMO

DIAM. BASE

DIAM MEIO

DIAM ÁPICE

ESP BASE

ESP MEIO

ESP ÁPICE

CE BASE

CE MEIO

CE ÁPICE

1

13,32

11,93

8,12

4,45

2,40

1,50

2

15,00

10,18

8,12

5,09

2,00

1,20

0,50

8,00

28,00

24,00

1,80

12,00

26,00

3

18,70

15,90

10,18

5,41

4,10

33,00

1,20

1,00

11,00

32,50

4

17,80

12,73

7,63

4,77

24,00

4,50

1,50

1,20

7,00

37,00

38,00

5

16,20

12,09

7,63

6

15,20

11,14

8,43

4,13

3,00

1,40

1,00

11,5

26,00

36,00

7,16

1,50

1,10

0,90

7,50

33,00

7

17,10

12,00

33,50

7,96

5,72

2,00

1,50

0,90

19,00

27,00

8

17,40

25,50

9,54

5,88

3,34

2,10

0,70

0,50

10,00

42,00

40,00

9

16,00

10,02

7,48

5,57

3,50

0,80

0,60

11,00

38,00

34,00

10

14,40

10,18

6,36

4,45

1,80

1,00

0,90

11,00

27,00

28,50

MÉDIA

16,11

11,57

7,78

5,01

2,69

1,19

0,83

10,8

31,65

28,25

COMP = COMPRIMENTO; DIAM = DIÂMETRO; ESP = ESPESSURA DAS PAREDES DOS COLMOS; CE= COMPRIMENTO DO ENTRENÓ

85


Tabela 5. Médias das temperaturas mensais, máximas (parte superior) e mínimas (parte inferior) corrigidas, da área de estudo, no município de Santa Terezinha de Goiás, Goiás. Ano

Jan

Fev

Março

Abril

Maio

Junho

Julho

Agosto

Set

Out

Nov

Dez

1994 1995

31,9

31

32,4

31,8 32,1

32,5 32,1

31,2 31,1

31,6 32,3

34,5 34,7

36,9 35,9

35,7 35,4

32,2 32,1

30,9 31,2

1996

32,6

33,4

32,5

32,4

-

-

33,3

35,4

35,7

33,8

31,6

32,7

1997

30,3

32,8

30,2

31,3

31,2

31,2

32

35

36,8

36,2

34,7

32,8

1998

32,8

33,6

34,6

35,5

34

33,6

34,4

37,2

38,1

35,1

32,0

32,3

1999

32,6

33

32,6

34,1

33,1

33,8

33,7

0,35

35,9

0,35

0,3

31,1

2000

31,6

31,7

31,7

33,2

33,3

33,1

33,2

35,7

34,5

36,2

31,1

31,6

2001

32,6

33,3

32,1

33,3

33

32,6

33,8

33,8

35,5

32,7

32,0

31,5

2002

31,1

32,1

33

34,0

33,9

32,7

34,2

36,2

36,3

37,4

33,8

32,8

2003

31,7

32,9

32,1

33,2

32,4

32,7

32,5

35,7

36

35

33,2

34,4

2004

30,2

30,7

32,3

32,5

32,9

31,6

32

35,7

37,4

36,1

34,1

32,9

1994

-

-

-

21,6

20,5

17,8

17,6

19,3

22,4

22,5

23,1

22,7

1995

21,9

21,9

22,1

22,2

20,7

17,4

18,3

19,8

22,1

22,9

22,6

22,6

1996

21,6

22,1

22

21,5

20,3

16,9

17,7

20,7

22,5

22,4

22,8

22,6

1997

22

21,6

21,9

21,2

19,1

17

16,9

18,9

21,8

22,9

23,2

22,8

1998

22,6

23,1

23,1

21

18,6

18,2

19,8

22

22,6

22,6

21,5

22,5

1999

21,9

22

22,3

21,4

19,4

18,8

19,1

19,6

22,6

22,7

22,0

22,8

2000

21,9

21,6

21,9

21,5

19,7

18

17,5

20,8

22,2

22,9

22,5

22,7

2001

21,6

21,7

21,5

21,0

19,8

18,6

18,2

18,6

22,2

21,8

22,4

22,5

2002

22

21,5

21,6

21,3

19,9

18,5

19,4

20,5

21,8

23,0

22,4

23,0

2003

22,3

21,6

21,4

21,8

19,3

17,9

16,9

20,3

21,9

22,3

22,4

22,9

2004

22,4

21,9

21,7

21,8

21,1

18,1

17,7

19,4

21,8

23,1

23,3

23

Fonte: http/www.meteorgo.com.br Latitude: S 14º 18’ 6,80”, WO 49º 34’ 31,10”, Altitude: 338 m

Tabela 6. Médias das precipitações pluviais mensais (mm pluviométricos), de 1945 a 1990, do município de Santa Terezinha de Goiás. MESES JAN FEV VOL. MÍN 430 220 VOL. MÁX 480 270 FONTE: Lobato et al., 2002.

86

MAR 180 230

ABR 73 93

MAIO 20 25

JUN 3 6

JUL 3 6

AGO 6 11

SET 34 44

OUT 150 160

NOV 144 164

DEZ 300 350

ANUAL 1.563 1.839


Tabela 7. Análise química do solo na projeção do taquaruçu, 0 a 20 cm, 0 a 40 cm e 0 a 60 cm, nas áreas de estudo em Santa Terezinha de Goiás, Estado de Goiás, 2004. Variáveis (mE/100ml)

(ppm)

Áreas

Ca

Mg

HAL

K

P

Zn

MO (%)

CTC

V (%)

1

5,22 bc

1,58 abc

2

5,08 bc

1,64 abc

3

7,1 ab

4

8,96 a

5

pH

2,74 cd

37,4 b

3,36 ab

3,46 b

2,94 bcd

9,63 cde

70,4 2ab

5,6 a

3,06 cd

45,6 ab

7,1 a

6,62 b

3,92 bc

9,68 cde

67,61 ab

5,52 a

1,88 ab

2,96 cd

43,8 ab

2,52 b

4,66 b

4,68 ab

12,05 bcde

75,28 a

5,82 ab

1,96 a

4,74 abc

87,6 a

6,14 ab

50,96 a

6,08 a

15,88 ab

70,36 ab

5,38 b

6,32 abc

1,64 abc

4,2 abcd

88,4 a

3,82 ab

13,36 b

3,38 bcd

12,58 a bcde

66,13 ab

5,12 b

6

6,42 abc

1,5 abc

5,6 ab

59 a b

2,6 b

9,14 b

3,9 bc

13,67 abc

59,4 b

4,88 b

7

5,26 bc

1,26 bc

2,24 d

39,8 b

3,1 b

3,62 b

2,74 cd

8,86 de

73,53 ab

6,42 a

8

3,96 c

1,1 c

3,18 cd

37,2 b

4,92 ab

2b

1,84 d

8,34 e

62,19 ab

5,04 b

9

8,5 ac

1,86 ab

6,08 a

71,6 ab

7,26 a

4,64 b

4,44 abc

16,62 a

63,79 ab

4,96 b

10

7,02 ab

1,62 abc

3,94 cd

50,2 ab 4,88 ab

2,86 b

4,46 abc

12,71 abcd

69,33 ab

5,28 b

CV.(%)

22,25

19,48

24,94

37,65

41,09

84,32

22,97

16,72

10,82

8,93

Teste F

6,12

3,73

8,71

4,43

4,5

14,89

9,08

10,24

2,33

4,67

Teste F: Significância a 5% de probabilidade

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANTIA ARROYAVE, A. Estudio de Aptitud de los Suelos para el Cultivo de la Guadua (Guadua angustifolia Kunth) em el Departamento de Caldas. Revista de La Universidad de Caldas. Colômbia: Universidad de Caldas, v. 4, n. 1, p. 61-70, 1983. CORREIA, J. R.; HARIDASAN, M.; REATTO, A.; MARTINS, E. S.; WALTER, B. M. T. Influência de Fatores Edáficos na Distribuição de Espécies Arbóreas em Matas de Galeria na Região do Cerrado: Uma Revisão. In: RIBEIRO, J. F.; FONSECA, C. E. L.; SILVA, J. C. S. (Eds.). Cerrado: Caracterização e recuperação de Matas de Galeria. Planaltina: Embrapa Cerrados, 2001. Capítulo 2, p. 51-78. COSTA, M. C.; SILVA JÚNIOR., N. J. da. Ocorrência de Dactylomys dactylinus (Mammalia: Rodentia; Echimyidae) no Cerrado Brasileiro. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE MASTOZOOLOGIA, 1., 2001, Porto Alegre. Anais... Porto Alegre: Sociedade de Mastozoologia, 2001. ESTADO DE GOIÁS. Lei Florestal do Estado de Goiás, Lei n° 12 596, de 14 de março de 1995. FILGUEIRAS, T. S. Bambus nativos do Distrito Federal, Brasil (Gramineae:Bambusoideae). Revista Brasileira de Botânica. São Paulo: Sociedade Botânica de São Paulo, v.11, n.1, p.47-66, 1988. FILGUEIRAS, T. S.; LONDOÑO, X. A Giant of New Guadua (Poaceae: Bambusoideae) from Central Brazil. In: SEMINÁRIO NACIONAL DO BAMBU: ESTRUTURAÇÃO DA REDE DE PESQUISA E DESENVOLVIMENTO, 1., 2006, Brasília. Anais... Brasília: Universidade de Brasília, 2006. v. 1, p. 27-32. FILGUEIRAS, T. S.; SANTOS-GONÇALVES, A. P. A checklist of the basal grasses and bamboos in Brazil (Poaceae). Bamboo Science & Culture. Albany: American Bamboo Society, v. 18, p. 7-18, 2004. ITAPAGÉ. Informações disponíveis em: <http://www.itpage.com/html/a_fabrica_p.htm>. Acesso em: 10 fev. 2005. LOBATO, E. J. V.; SACRAMENTO, G. L.; ANDRADE, R. S.; ALEIXO, V.; GONÇALVES, V. A. Atlas Climatológico do Estado de Goiás. Goiânia: Universidade Federal de Goiás, 2002. 99 p. MORALES, D.; KLEINN, C. Inventario de las Existencias de Guadua angustifolia en el Eje Cafetero de Colombia. In: SIMPOSIO INTERNACIONAL GUADUA, 2004, Pereira. Anais… Pereira: Universidad Tecnológica de Pereira, 2004. NAVES, R. V. Espécies frutíferas nativas dos cerrados de Goiás: caracterização e influências do clima e dos solos. Tese (Doutorado em Produção Vegetal - Escola de Agronomia) - Universidade Federal de Goiás, 1999. 206 p. NIETO, C. F. Factores Del Sitio que Influyen en el Crecimiento y Desarrollo de la Guadua (Guadua angustifolia Kunth) y su Incidência en la Rentabilidad y Riesgos Operacionales Relacionados com su Aprovachamiento Forestal em La Zona Andina Colombiana. In: SIMPOSIO INTERNACIONAL GUADUA, 2004, Pereira. Anais… Pereira: Universidad Tecnológica de Pereira, 2004.

87


RIBEIRO, J. F.; SILVA, J. C. S. Manutenção e Recuperação da Biodiversidade do Bioma Cerrado: O Uso de Plantas Nativas. In: SIMPÓSIO SOBRE O CERRADO: BIODIVERSIDADE E PRODUÇÃO SUSTENTÁVEL DE ALIMENTOS E FIBRAS NOS CERRADOS, 8., 1996, Brasília. Anais... Planaltina: Embrapa-CPAC, 1996. SILVA, L. F. B. M. Ecologia do rato do bambu, Kannabateomys amblyonyx (Wagner, 1845), na Reserva Biológica de Poço das Antas, Rio de Janeiro. Dissertação (Mestrado em Ecologia, Conservação e Manejo da Vida Silvestre) - Universidade Federal de Minas Gerais, 1993. SMITH, M. Efeito de Perturbações sobre Abundância, Biomassa e Arquitetura de Guadua weberbaueri Pilg. (Poaceae:Bambusoideae) em uma Floresta Dominada por Bambu no Sudeste da Amazônia. Dissertação (Mestrado em Ecologia) - INPA/UA, Manaus, 2000. 86 p. VIDALENC, D. Distribuição das Florestas Dominadas pelo Bambu Guadua weberbaueri em Escala de Paisagem no Sudeste da Amazônia e Fatores Edáficos que Afetam sua Densidade. Dissertação (Mestrado em Biologia) - INPA/UA, 2000. 92 p. XIAOPING, G.; XIAOLI, W. Investigation and Determination of Bamboo Associated Nitrogen Fixation. In: INTERNATIONAL BAMBOO WORKSHOP, 6., CONGRESO INTERNATIONAL BAMBOO CONGRESSO, 5., 1998, San José/Costa Rica. Anais… [S.l.: s.n.], 1998.

88


5 ARTIGOS SOBRE CULTIVO E MANEJO 5.1 OS BENEFÍCIOS SOCIOAMBIENTAIS DAS FLORESTAS DE BAMBU (Bambusa vulgaris), NO NORDESTE DO BRASIL Osmarino Borges1, German H. Gutiérrez-Céspedes2

Resumo O bambu é um produto florestal que apresenta uma infinidade de utilidades que, na sua grande maioria, são desconhecidas no Brasil. A espécie Bambusa vulgaris, com ampla distribuição no Brasil, tem excelente capacidade de rebrota após o corte, não floresce, não é afetado por pragas, e tem um comprimento de fibras classificadas como longas, o que permite seu aproveitamento na fabricação de papel para sacaria. Com isto, foi gerada uma nova alternativa de utilização nas áreas não mecanizáveis do nordeste do Brasil, permitindo gerar renda fixa para a população rural circunvizinha. Neste trabalho são apresentados os benefícios desta floresta, os mesmos que motivaram um Grupo Empresarial a investir nesta nobre planta, assim, como a metodologia de cultivo do bambu, resultado das pesquisas desse grupo. Palavras-chave: Floresta de Bambu. Bambusa vulgaris. Fibra Celulósica. Keywords: Forest Bamboo. Bambusa vulgaris. Cellulosic Fibers.

INTRODUÇÃO Os bambus são considerados uma das mais diversas e importantes subfamílias das gramíneas, que reúne um total de 80-90 gêneros e de 800-1.000 espécies distribuídas em todos os continentes excluindo a Europa, que não tem espécies nativas (SALGADO, 1990; LONDOÑO, 1992). Na região 2 Amazônica são encontradas florestas nativas de bambu que cobrem uma área de 180.000 km , metade delas estando localizada no Brasil (GRISCOM; ASHTON, 2003). Sua ocorrência natural existe normalmente em associação com floresta nativa em proporções que variam de 20 a 80% (SALGADO; AZZINI, 1992). No mundo, as florestas de bambu cobrem aproximadamente 14 milhões de hectares ( EMBAYE, 2003). Estudos comprovam que existem mais de 1.500 usos desta planta documentados (PEREIRA, 2002). O bambu é um produto florestal não madeireiro (AGENDA 21, [?]; FAO, 1992), de rápido crescimento, com comprimento de fibra superior ao do eucalipto (MONTALVÃO FILHO; GOMIDE; CONDE, 1984).

1 VANTAGENS DO BAMBU EM RELAÇÃO ÀS ARVORES LENHOSAS As vantagens do bambu podem ser divididas em cinco grupos: 1.1 CICLO DE CORTE Uma das principais vantagens que o bambu tem em relação às outras essências florestais é o ciclo de corte. Na Tabela 1, podemos ver que o bambu em 13 anos pode ser explorado (nº de rotação) 6 vezes, antes de ocorrer a primeira exploração do Pinus. Esse mesmo tempo coincide com o da segunda exploração do eucalipto. Com isto, o retorno econômico do investimento na cultura do bambu é muito mais vantajoso. Seu ciclo permite cortes periódicos anuais e bianuais, o que representa a maior produção de matéria-prima celulósica quando se usa como critério a área de plantação e o tempo. O reduzido tempo de corte se deve a que os novos colmos de bambu brotam assexuadamente ano após ano, sendo seu crescimento máximo atingido em alguns meses (REDKO; NISHIMURA, 1972). 1.2 PERPETUAÇÃO DA FLORESTA O bambu (Bambusa vulgaris), pela sua forma de crescimento entouceirante, limitado a sua área circunvizinha, e por não haver registros da produção de semente sob nossas condições, é sempre propagado vegetativamente. Este conjunto de características fazem dela uma espécie “não invasora”. Tem a fabulosa capacidade de rebrotar rapidamente após o corte, lançando novas hastes. Nesse 1E-mail: (oborges@joaosantos.com.br). 2E-mail: (germangutierrez@joaosantos.com.br).

89


compasso, existem florestas comerciais de bambu que vêm sendo exploradas de forma ininterrupta por mais de 25 anos, sem que tenham sido apresentados indícios de necessidade de renovação. Outras culturas como o eucalipto e o Pinus, para produção de celulose, precisam ser renovadas a cada 21 e 14 anos, respectivamente (Tabela 1). Por outra parte, a produtividade se mantém alta (Tabela 2), e o número de plantas de bambu é um sexto (1/6) do número de plantas de Pinus. Tabela 1. Ciclo de corte de algumas essências florestais. Nº de Nº de anos Rotação após o plantio 1 3 2 5 Bambu (Bambusa vulgaris) (1) Celulose 3 7 n... n... 6 13 1 6 (2) Celulose 2 13 Eucaliptus spp. 3 21 Serraria 1 20 Celulose 1 14 Pinus spp. (2) Serraria 1 20 Araucaria (2) Serraria 1 45 Fonte: (1) Relatório de Pesquisa – Grupo Industrial João Santos (2005); (2) Resumo Público de Certificado de Klabin s/a (2003). Espécie

Finalidade

Tabela 2. Espaçamento e produtividade do bambu em relação às duas principais espécies produtoras de celulose. Espaçamento Número de Produtividade adotado (m) plantas/ha (1) Ton/ha/ano Bambu (1) 7 x 3,5 408 25 -35 (2) Eucalipto 2 x 2,5 2.000 32 – 43 (2) Pinus (2) 2x2 2.500 23,2 (2) Fonte: (1) Relatório de Pesquisa – Grupo Industrial João Santos (2005); (2) Resumo Público de Certificado de Klabin s/a (2003). Espécie

1.3 TIPOS DE FIBRAS As fibras de celulose podem ser divididas em fibras curtas (produzidas pelo eucalipto), e fibras longas (produzidas pelo Pinus e pelo bambu), esta última escassa no mundo. Ao considerar-se a celulose semi-química, observa-se que o bambu apresenta rendimento superior a 55% e com características mecânicas similares às do Pinus quando destinado à fabricação de embalagens. Na Tabela 3, se infere o elevado comprimento das fibras de bambu, assim como a sua elevada relação comprimento/largura. Isso as torna adequadas para a confecção de papéis fortes e de elevada porosidade, como papéis para sacos de cimento, papéis para embalagens biodegradáveis com alta resistência, entre outros. Devido à finura de suas fibras, a impressão obtida é de alta qualidade. Tabela 3. Dimensões das fibras. Fibra

Comprimento (mm) Bambu 1,16 – 6,16 Eucalipto 0,70 – 1,40 Pinus 1,55 – 4,68 Fonte: D'Almeida (1981).

Largura (mm) 7,5 – 29,2 11,0 – 24,8 21,5 – 42,8

Espessura de parede (mm) 2,75 – 13,2 2,00 – 8,00 2,80 – 19,6

1.4 BENEFÍCIOS AMBIENTAIS Nas florestas comerciais ou de reflorestamento com fins industriais, o cultivo do bambu protege melhor o solo e o meio ambiente do que os cultivos de eucalipto. Isto ocorre pelos seguintes motivos: a) o bambu não é atacado por nenhuma praga ou doença, consequentemente não há necessidade de aplicação de agrotóxicos prejudiciais ao meio ambiente;

90


b) grande quantidade de matéria orgânica é depositada no solo durante o crescimento das touceiras, e, no corte, a totalidade das folhas fica no campo. Desta forma, a presença de suas folhas e bainhas no solo, além de auxiliar na preservação deste, ajuda no seu enriquecimento e no combate às ervas daninhas, conserva a umidade, evita a incidência de raios solares, assim como o impacto dos pingos de chuva diretamente sobre o terreno (SALGADO, 1988); c) após o corte, o bambu cresce muito mais rápido do que as árvores, protegendo rapidamente o solo da erosão como nenhuma espécie lenhosa seria capaz de realizar; d) o sistema radicular fasciculado e bastante extenso, é uma eficiente proteção contra a erosão (CATI, 1997; SALGADO, 1988); e) a morfologia dos seus rizomas e o sistema de redes nos primeiros 50-100 cm do solo facilitam a conservação do mesmo, realizando de forma muito eficiente a contenção de ladeiras e a prevenção da erosão produzida pelo escoamento superficial, ventos fortes e desmoronamentos (LONDOÑO, 1992); f) o bambu é uma planta que ajuda a regular o meio ambiente como protetora das águas, do solo e por acolher a fauna (CASTAÑO; LONDOÑO; PRIETO, 1982) e flora microbiana; g) graças ao elevado poder calorífico do bambu, o mesmo é utilizado como biomassa, principalmente nas próprias fabricas de papel, bem como nas cerâmicas do estado de Alagoas. Desta forma, evita-se a exploração predatória da vegetação nativa. 1.5 BENEFÍCIOS SOCIOECONÔMICOS Por ser cultivado em áreas declivosas, o bambu tem a necessidade de ser colhido em grande parte de forma manual, sendo desnecessário o emprego de maquinaria pesada ( MURPHY, 2002), o que permite a geração de empregos fixos. Geração de emprego de forma continua e não sazonal, já que o bambu é tratado e colhido o ano todo.

2 A HISTÓRIA DAS PRIMEIRAS FLORESTAS COMERCIAIS DE BAMBU NO BRASIL Desde os trabalhos realizados em laboratório pelo Instituto Agronômico de Campinas – IAC, onde se comprovava a qualidade do bambu como excelente matéria-prima para a fabricação de papel, até a implantação propriamente dita do primeiro hectare da floresta de bambu, foi pago um alto preço pelo pioneirismo. O desconhecimento do tipo de adubação, do espaçamento ideal, da melhor idade para sua exploração, etc. teve seu custo e seu tempo. No Nordeste do Brasil, são cultivados 40 mil hectares de bambu, distribuídos entre os estados de Pernambuco, Paraíba, Maranhão e Piauí. Nesta região se encontram duas fábricas de papel à base de fibras virgens de bambu, conferindo a seus produtos alta resistência físico-mecânica. A seguir é apresentado um resumo das condições ideais de plantio e tratos culturais implantados nas florestas comerciais de bambu no Nordeste do Brasil.

3 CONDIÇÕES EDAFOCLIMÁTICAS IDEAIS PARA O CULTIVO DO BAMBU O Bambu é planta de ampla adaptabilidade e rusticidade. Levantamentos realizados na região nordeste têm encontrado touceiras de Bambusa vulgaris predominantemente na zona da mata. Porém, também foram encontradas algumas touceiras da mesma espécie em regiões mais áridas como o agreste pernambucano, comprovando sua rusticidade. Atualmente, no nordeste, seu cultivo é recomendado para áreas marginais, como é o caso das áreas declivosas, e é nessas áreas que o bambu torna-se uma alternativa de substituição da cana-de-açúcar, que não é competitiva em terrenos íngremes (JORNAL DO COMÉRCIO - PE, 1999).

4 O PLANTIO O plantio pode ser realizado de forma mecanizada ou totalmente manual, conforme a situação topográfica da área. O espaçamento recomendado é de 7 x 3,5 m. As covas são abertas em 40 x 40 x 40 cm. A adubação de fundação é realizada com torta de filtro ou substituto, e fosfato natural (gafta). O replantio é realizado um mês depois do plantio, geralmente não ultrapassa os 5%. As mudas são produzidas assexuadamente, por estaquia, já que o bambu utilizado para produção de celulose (Bambusa vulgaris) apresenta raríssimos casos de floração esporádica, e, quando o faz, não tem sido registrada a presença de sementes, fato este que tem dificultado os trabalhos de melhoramento genético.

91


5 TRATOS CULTURAIS De forma geral, o bambu requer menos tratos que as outras culturas. Esses tratos se iniciam no segundo mês após o plantio, com a roça do mato e coroamento das mudas, operação repetida até o segundo ano de plantio, época em que as ervas indesejáveis terão seu crescimento reduzido por conta das sombras das touceiras de bambu. É neste período que se realiza uma adubação de cobertura com NK.

6 CONCLUSÃO O Brasil tem muitas espécies nativas de bambu, as mesmas que devem ser pesquisadas para ver seu potencial florestal. Atualmente, as florestas comerciais de bambu, pelas suas qualidades ambientais, ecológicas, sociais e industriais, são excelentes fontes de geração de recursos e de empregos, principalmente para os municípios envolvidos com o seu cultivo e aproveitamento no nordeste do Brasil.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS AGENDA 21 – Cap. 11. Combate ao Desflorestamento. [?]. CASTAÑO, F. N.; LONDOÑO, X.; PRIETO, L. Introducción al Estúdio Fitoecologico de los Guadales Del Valle Geográfico Del Rio Cauca em Colombia. In: SIMPOSIO LATINOAMERICANO DEL BAMBU, 2., 1982, Gauyaquil. Anais… Ecuador: Universidad Laica Vicente Rocafuerte de Guayaquil, 1982. CATI – Coordenadoria de Assistência Técnica Integral. Setembro. 1997. D'ALMEIDA, M. L. O. (Coord.). Celulose e Papel: Tecnologia de Fabricação da Pasta Celulósica. São Paulo: SENAI - Serviço Nacional da Indústria Escola Theobaldo de Negris e IPT - Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo, 1981. v. 1, 492 p. EMBAYE, K. Ecological aspects and resource management of bamboo forests in Ethiopia. Tese (Doutorado do Departamento of Short Rotation Forestry) - Swedish University of Agricultural Sciences, 2003. FAO. Productos Forestales no Madereros; Posibilidades Futuras. Roma: Estúdio FAO Montes, 1992. n° 97. GRISCOM, B. W.; ASHTON, P. M. S. Bamboo control of forest succession: Guadua sarcocarpa in Southeastern Peru. Forest Ecology and Management. Netherlands: Elsevier BV., v. 175, n. 1-3, p. 445-454, 2003. JORNAL DO COMERCIO – PE. Portela procura parceria para cultivar bambu na Zona da Mata. Jornal do Comércio - PE, Pernambuco, 26 dez. 1999. Caderno Economia. LONDOÑO, X. Distribución, Morfología, Taxonomía, Anatomía, Silvicultura y Usos de los Bambúes del Nuevo Mundo. Cespedesia. Colômbia: Inciva, v. 19, n. 62-63, p. 87-137, 1992. MONTALVÃO FILHO, A.; GOMIDE, J. L.; CONDÉ, A. R. Variabilidade da Constituição Química e das Características Dimensionais das Fibras do Bambusa vulgaris. Revista Árvore. Viçosa: Sociedade de Investigações Florestais, v. 8, n. 1, p. 12-27, 1984. MURPHY, D. Mais do que Comida de Panda. Far Eastern Economic Review. Hong Kong: [s.n.], May. 23, 2002. PEREIRA, M. A. dos R. Bambu é Opção para Usos Múltiplos. Revista da Madeira (Wood Magazine). [S.l.]: Grupo REMADE, v. 12, n. 66, p. 60-64, 2002. REDKO, B. V. P.; NISHIMURA, M. Celulose de Bambu. São Paulo: Boletim ABCP, abril, p.38-44, 1972. RELATÓRIO DE PESQUISA. Grupo Industrial João Santos. Relatório de Pesquisa e Desenvolvimento Florestal, 2005. RESUMO PÚBLICO DE CERTIFICAÇÃO DE KLABIN S/A (Klabin Florestal Paraná). Certificado no: SWFM/COC-NTFP038. Agosto 2003. SALGADO, A. L. B. Revestimento Vegetal. Palestra apresentada no Centro de Treinamento da PETROBRAS- SETAD. São Sebastião /SP, junho, 1988. ________. Bambu e seus Múltiplos Usos. In: SIMPÓSIO MATERIAL ALTERNATIVO-FUNDART, 1990, Ubatuba/SP. Anais... [S.l.: s.n.], 1990. 15 p. SALGADO, A. L. B.; AZZINI, A. Bambusa Guadua no Brasil. In: CONGRESSO MUNDIAL DE BAMBU GUADUA, 1., 1992, Pereira/Colômbia. Anais... [S.l.: s.n.], 1992.

92


5.2 PROJETO BAMBU: MANEJO E PRODUÇÃO DO BAMBU GIGANTE (Dendrocalamus giganteus) CULTIVADO NA UNESP DE BAURU/SP E DETERMINAÇÃO DE CARACTERÍSTICAS MECÂNICAS DE RIPAS LAMINADAS Marco Antonio R. Pereira1

Resumo Com o crescente desmatamento e pressão sobre as florestas tropicais, bem como sobre as áreas de reflorestamento, torna-se cada vez mais necessária a busca por materiais renováveis e soluções alternativas capazes de atenuar em parte este processo. A cultura do bambu, embora seja milenar em nosso planeta, tem sua utilização e pesquisa, em sua maioria, restritas aos países orientais, sendo que, ultimamente, no ocidente, uma maior atenção vem sendo dedicada a esta cultura. O bambu é uma cultura predominantemente tropical, renovável, perene, de produção anual, de rápido crescimento, com centenas de espécies espalhadas por todo o planeta e com milhares de aplicações. Considerado um rápido sequestrador de carbono atmosférico, possui, ainda, características físicas e mecânicas que o tornam apto a ser utilizado no desenvolvimento de produtos normalmente produzidos com madeira nativa ou de reflorestamento, tais como: componentes da construção civil e da indústria moveleira, cabos para ferramentas agrícolas, painéis, chapas, entre outros. Este trabalho teve por objetivo o acompanhamento do desenvolvimento e da produção de colmos, e a determinação de características de resistência mecânica de colmos processados na forma de ripas laminadas. Os colmos utilizados são oriundos de plantio próprio existente no Laboratório de Experimentação com Bambu, de onde foram colhidos apenas colmos maduros. Estes foram processados para a obtenção de ripas laminadas, cuidando-se de que esse material fosse retirado da região o mais próximo possível da casca, e ao longo do seu comprimento, que foi subdividido em três partes consecutivas e de igual comprimento, a partir da base, fazendo-se amostras dessas três regiões dos colmos com a presença de nós e sem a presença de nós. Palavras-chave: Manejo. Ripas Laminadas. Características Mecânicas. Abstract With the growing of our forest deforestation it is becoming necessary to search alternative materials and solutions that can help to reduce this process. The bamboo culture is millenary in our planet but has its utilization and research restrict mainly to oriental countries. The bamboo is a tropical culture, renew resource, with fast growing, annual production and hundred of species and thousands of applications sprayed around the word. The bamboo is considered a great carbon sequester and with physical and mechanical characteristics that makes possible to use it as products usually made with wood, as to : civil construction components, furniture, tools, panels, etc. This work intended to follow the development and production of culms and to determine some mechanical resistance characteristics and elasticity modulus of the laminated bamboo using mature culms from a local cultivation of this specie. The culms were processed to obtain the laminated bamboo strip through the length of the culms and nearest possible to the skin part. The length was divided in three parts from the base in direction to the top part and samples were obtained with and without the node presence. Keywords: Management. Laminated Strip. Mechanical Characteristics.

INTRODUÇÃO Historicamente, o bambu tem acompanhado o ser humano fornecendo alimento, abrigo, ferramentas, utensílios e uma infinidade de outros itens. Atualmente, estima-se que contribua para a subsistência de mais de um bilhão de pessoas. Igualmente importante, ao lado dos usos tradicionais, tem sido o desenvolvimento de usos industriais do bambu. (SASTRY, 1999). Com o crescente desmatamento e pressão sobre as florestas tropicais, bem como sobre as áreas de reflorestamento, torna-se cada vez mais necessária a busca por materiais renováveis e soluções alternativas capazes de atenuar em parte esse processo. Hoje em dia, poucos duvidam de que os problemas ecológicos vão condicionar cada vez mais o desenvolvimento, os processos industriais e os assentamentos humanos, sendo já considerado o século XXI como o século do meio ambiente. Assim, a busca por materiais renováveis e fontes energéticas não convencionais tem sido convertida em uma prioridade mundial neste início de século (SALEME; VIRUEL, 1995).

1 Professor Assistente Doutor, Departamento de Engenharia Mecânica /Unesp - Bauru-S.P.

E-mail: (pereira@feb.unesp.br).

93


De acordo com Zhou (2000), nos últimos 50 anos o ritmo de devastação de florestas foi de 24,9 milhões de ha/ano, ou o equivalente a 47,41 ha/minuto, condição que deve contribuir também para o aumento da área cultivada de bambu no mundo, que hoje é de cerca de 22 milhões de hectares. Reportagem do jornal Folha de S. Paulo (09/08/2002), cita dados da FAO onde é apresentada para o período de 1990 a 1997 uma velocidade de desmatamento equivalente a 12,17 ha/minuto. Outra reportagem (FOLHA DE S. PAULO, 09/09/2002), citando dados fornecidos pela Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento e dados da Sociedade Brasileira de Silvicultura, aponta uma queda de 5% na área reflorestada do estado de São Paulo e avalia como necessária à duplicação do plantio anual de madeira de reflorestamento no país. Pauli (1996, 2001), destaca ser o bambu um eficiente fixador de carbono, convertendo-o através da fotossíntese em celulose, hemicelulose e lignina, com crescimento e colheitas rápidas, fibras longas e fortes e elevada resistência mecânica com um mínimo de gasto energético, tendo ainda a possibilidade de se desenvolver todo um conglomerado industrial ao redor do bambu. O bambu é o recurso natural que menos tempo leva para ser renovado, não havendo qualquer outra espécie florestal que possa competir em velocidade de crescimento e aproveitamento de área (JARAMILLO, 1992). O decréscimo da quantidade e qualidade dos recursos florestais tem aumentado o interesse por materiais renováveis e de baixo custo como o bambu, com aplicações envolvendo painéis compostos de bambu e madeira, bem como bambu laminado colado, esteiras entrelaçadas, chapas de bambu laminadas, pratos de bambu feitos por molde de pressão, chapa de partículas de bambu, compostos de bambu-epoxi e bambu-polímero. No entanto, para maximizar a utilização do bambu, é necessário que suas propriedades físicas e mecânicas sejam melhores compreendidas (LEE; BAI; PERALTA, 1994). Produtos à base de bambu laminado tais como pisos, chapas, painéis, cabos de ferramentas, compensados, móveis, componentes da construção civil, entre outros, podem ser explorados através do processamento do colmo. Embora não se pense no bambu como uma solução exclusiva para os problemas relacionados ao meio ambiente e/ou a diminuição acentuada de nossos recursos florestais, ele pode ser considerado e estudado como uma alternativa ou um material alternativo e de baixo custo a ser explorado. A produção de colmos é rápida, sem a necessidade de replantio, podendo ser imediatamente implementada sua cultura e exploração no campo (PEREIRA, 2001). Muito embora o bambu seja utilizado e estudado há séculos nos países orientais, China National Bamboo Research Center (CNBRC, 2001) destaca que a partir dos anos 80 tem havido uma intensificação do uso do bambu em diversas áreas industriais, destacando-se alimento, papel, engenharia, química, cujos produtos a base de bambu processado (madeira de bambu) podem evitar o corte e substituir o uso de florestas tropicais. Entre esses produtos, destacam-se o carvão, carvão ativado, palitos, chapas, painéis, produtos a base de bambu laminado colado (BLC), esteiras, compósitos, chapas de fibra orientada (OSB), componentes para construção/habitação e indústria moveleira, entre outros. Na China são pesquisados e fabricados industrialmente diversos produtos a base de bambu, tais como: pisos, forros, lambris, móveis, chapas de tiras e laminados para assoalho, cortinas, chapas de aglomerado e chapas entrelaçadas como formas para concreto (compensado de bambu). (QISHENG; SHENXUE, 2001). A produção de colmos de bambu é rápida, sem a necessidade de replantio, podendo ser imediatamente implementada sua cultura e exploração no campo. Para se ter uma noção da rapidez do estabelecimento desta cultura, o Projeto Bambu, iniciado no ano de 1990 na Unesp/Campus de Bauru, conta com plantação própria, introduzida na Área Experimental Agrícola no verão de 1994-1995, ou seja, apenas 11 anos atrás, e que desde o ano de 1998 vem produzindo colmos com dimensões adequadas para o processamento e utilização em pesquisa (PEREIRA; GARBINO, 2002). Pesquisas com o material bambu na forma de laminados ainda são incipientes em nosso meio. Dados de laboratório, referentes a determinação das características de resistência mecânica, são importantes para a avaliação da qualidade do material e seu potencial tecnológico, visando posterior uso em aplicações. Como são escassos os dados sobre manejo, desenvolvimento e produção da cultura do bambu em nosso meio, bem como sobre as características de resistência mecânica dos colmos, torna-se essencial à determinação destas características para futuras utilizações.

94


1 DESENVOLVIMENTO 1.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS O bambu é um material diferente das madeiras em termos de sua anatomia, morfologia, crescimento e propriedades de resistência, tendo variações significativas em suas propriedades, tanto na direção vertical – altura (da base do colmo em direção a sua ponta), como na direção horizontal espessura (através da parede do colmo). Variações essas que ocorrem também em função da espécie estudada, das condições locais de cultivo e principalmente em função da idade dos colmos. Desse modo, neste trabalho, alguns parâmetros devem ser fixados, para padronizar a obtenção dos corpos-de-prova em função da idade do colmo, da localização das amostras ao longo da altura do colmo e em função da sua posição através da parede do colmo. Assim, serão fixados neste momento os seguintes parâmetros: Idade do Colmo: Fixada em 3,5 anos por ser a mais citada pelos principais autores ( LIESE, 1998; HIDALGO LOPEZ, 2003; BERALDO et al., 2004; CUSACK, 1999, JANSSEN, 2000; ZHOU, 2000; e CNBRC, 2001), como aquela em que os colmos estão maduros em termos de suas características de resistência mecânica. Altura Útil do Colmo: Definida como aquela em que a espessura da parede seja de no mínimo 8 mm, maximizando desta maneira a utilização do colmo em termos de sua altura. A espessura de 8 mm é a mínima necessária para as operações de processamento e obtenção das lâminas finais que comporão os estudos, que deverão ter espessura entre 5 e 6 mm, de acordo com a experiência preliminar desenvolvida (GONÇALVES; PEREIRA; GONÇALVES, 2000). Partes do Colmo ao Longo da Altura: Serão definidas 3 regiões consecutivas a partir da base do colmo, denominadas A, B, C correspondentes às regiões basal, mediana e apical em relação à altura útil do colmo. Posição através da Parede do Colmo: Serão confeccionadas amostras para as três regiões com material proveniente de posições o mais próximo possível da casca, buscando-se assim a região mais rica em fibras e teoricamente mais resistente ao longo da parede, sendo descartado nesse momento o material proveniente das regiões mais internas, mais ricas em parênquima e teoricamente menos resistentes. A parte mais externa da parede do colmo (casca) será também descartada, pois a casca do bambu é coberta por duas camadas de cera e uma de sílica que a tornam impermeável, dificultando assim a colagem das ripas. Presença de Nós: Serão confeccionadas amostras com a presença de nós e sem a presença de nós, buscando-se, para as condições anteriormente definidas, aquelas com os menores e os maiores valores de resistência. Espessura dos Laminados/Ripas: Definida neste momento como sendo entre 5 e 6 mm, como forma de maximizar o aproveitamento da altura do colmo e garantir as condições necessárias para o processamento das ripas laminadas. Largura dos Laminados/Ripas: Definida neste momento como sendo 20 mm (considerando a espécie de bambu objeto deste estudo e suas características físicas de diâmetro e espessura de parede), como forma de se retirar o material que comporá as amostras o mais próximo possível da região mais externa da parede (região da casca), minimizando também as perdas em função da curvatura da parede. Dimensões dos Corpos-de-Prova e Umidade: As dimensões dos corpos-de-prova serão baseadas nas normas de chapa de madeira compensada e na norma de madeira, fazendo-se adaptações quando necessário. Todos os corpos-de-prova serão confeccionados com os bambus na Umidade de Equilíbrio. 1.2 LOCALIZAÇÃO Os trabalhos de manejo e desenvolvimento das moitas estão sendo realizados no Laboratório de Experimentação com Bambu da UNESP/Campus de Bauru, sendo o processamento dos colmos e os ensaios de laboratório realizados no Laboratório de Processamento de Madeiras/Departamento de Engenharia Mecânica e no Laboratório de Materiais de Construção Civil/Departamento de Engenharia Civil da Unesp/Campus de Bauru. 1.3 ESPÉCIE DE BAMBU UTILIZADA O Laboratório de Experimentação com Bambu, possui uma coleção com aproximadamente 23 espécies de bambu, sendo 13 delas consideradas prioritárias (INBAR, 1994). A espécie utilizada neste trabalho é o bambu gigante (Dendrocalamus giganteus), relativamente comum em nosso meio rural. As 23 moitas deste bambu foram plantadas no verão dos anos 1994-1995. A Figura 1 mostra uma moita da espécie cultivada. Como uma moita possui colmos de várias idades à época do corte (6 meses, 1,5 anos, 2,5 anos, 3,5 anos, etc), a idade é conhecida pela marcação anual dos colmos à medida que nascem (Figura 2).

95


Figura 1. Moita de bambu gigante.

Figura 2. Identificação da idade do colmo.

1.4 PARTES DO COLMO A SEREM ESTUDADAS Para o estudo das características físicas, os colmos foram subdivididos em três regiões consecutivas a partir da base e que serão denominadas parte A (inferior), parte B (intermediária) e parte C (superior), conforme se vê na Figura 3.

Figura 3. Partes do colmo.

As ripas ou lâminas serão igualmente retiradas das partes A, B e C, mantendo-se o padrão da seção transversal 5-6 mm x 20 mm, para comparação entre as 3 diferentes regiões. 1.5 PROCESSAMENTO DOS COLMOS Após o corte, os colmos serão processados da seguinte forma: a) desdobro em serra circular destopadeira (corte transversal) de cada seção (A, B e C) em subseções com 90 cm de comprimento; b) desdobro em serra circular refiladeira dupla (corte longitudinal), para obtenção de ripas com largura de aproximadamente 23 mm; c) beneficiamento inicial em Plaina 4 faces para a remoção da protuberância provocada pela presença dos nós internamente e externamente; d) armazenamento das ripas para secagem ao ar até a umidade de equilíbrio; e) beneficiamento final em Plaina 4 faces para a obtenção de ripas com as dimensões de 5 a 6 mm de espessura e 20 mm de largura. 1.6 ENSAIOS MECÂNICOS EFETUADOS Os ensaios mecânicos foram efetuados em corpos-de-prova secos ao ar e na umidade de equilíbrio (aproximadamente 12%) com a velocidade de carga especificada na respectiva norma.

96


1.6.1 Compressão paralela - Projeto de norma (2004) http://www.abimci.com.br/

30 mm mm 5 – 6 mm 20 mm

1.6.2 Tração paralela - NBR 7190 (1997) 20 mm

60 mm

10 mm 5 mm

300 mm

1.6.3 Flexão estática - NBR 9533 (1986)

175 mm mm 5 – 6 mm 20 mm

25

125

25

175 mm

97


2 RESULTADOS E DISCUSSÃO 2.1 MANEJO E PRODUÇÃO DE COLMOS As Figuras 4, 5, 6, 7 e 8 apresentam graficamente o desenvolvimento anual das 23 moitas cultivadas na Unesp/Bauru em termos de número total de colmos, número médio de colmos por moita (N), diâmetro médio na altura do peito (DAP), altura média (H) e biomassa verde, respectivamente.

Desenvolvimento Anual dos Colmos 250

Nº Colmos

193

200

227

205

233

216

196

197

175

150 100 50 0 1988 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 Figura 4. Desenvolvimento anual das moitas - número total de colmos.

Número de Colmos por Moita (N)

12 10 8

10,1

9,9

8,9

8,4

9,4

8,5

8,6

7,6

6 4 2 0 1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

Figura 5. Desenvolvimento anual – número médio de colmos por moita (N).

Desenvolvimento Anual do Diâmetro (DAP) DAP (cm)

14 12 10 8

11,7 8,2

8,9

1999

2000

9,9

11,3

12,1

11,9

2004

2005

6,9

6 4 2 0

1998

2001

2002

2003

Figura 6. Desenvolvimento anual das moitas - diâmetro na altura do peito (DAP).

98


Desenvolvimento Anual da Altura h (m)

20 15

13,8

14,6

1999

2000

17,5

17,7

17,4

2001

2002

2003

18,6

18,4

2004

2005

11,7

10 5 0 1998

Figura 7. Desenvolvimento anual das moitas – altura média dos colmos (H).

Desenvolvimento da Biomassa Verde (Ton) 14

12 10 8 6 4 2 0

12,4

6,9

11,3

8,2

4,2

1998

1990

2000

2001

2002

Figura 8. Desenvolvimento anual das moitas – biomassa verde.

Observa-se que, embora haja alguma variação na produção anual de colmos, o que depende das condições locais, esta se mantém em média sempre acima de 8 colmos/moita/ano, confirmando Liese (1998) que comenta ser a produção anual dos bambus da ordem de 8 a 10 colmos/moita/ano. Mostram ainda que o diâmetro na altura do peito (DAP), a altura dos colmos e a biomassa verde mostram uma tendência à estabilização, podendo-se considerar que, após 10 anos de plantio, as moitas estão atingindo maturidade em termos de suas dimensões. 2.2 COMPRESSÃO PARALELA A Figura 9 mostra o ensaio de compressão realizado.

Figura 9. Ensaio de compressão paralela.

99


A Figura 9 mostra o padrão de rompimento observado nos corpos-de-prova sem nó (centro) e com nó (direita) com rompimento diagonal (45º mais ou menos). Observa-se que o padrão de rompimento de corpos-de-prova com nó, assemelha-se mais ao padrão observado em madeiras. A Tabela 1 mostra os valores médios obtidos nos 16 ensaios de compressão para as três regiões do colmo estudadas. Tabela 1. Valores médios da resistência (fco) e do módulo de elasticidade longitudinal (Eco) obtidos no ensaio de compressão paralela.

Região do colmo A B C Colmo Desvio C.V. (%)

fco (MPa) 68,5 70,8 71,5 70,3 5,86 8,3

Compressão paralela Sem Nó N = 16 Eco U (Gpa) (%) 2,7 11,9 2,8 11,8 3,1 11,9 2,9 11,9 0,36 12,6

Com Nó N = 16 Eco (Gpa) 3,2 3,3 3,5 3,3 0,29 8,6

fco (MPa) 59,1 65,4 65,6 63,4 5,97 9,4

U (%) 11,9 11,9 12,0 11,9

Através da análise de variância efetuada, foi verificada diferença significativa na resistência para as ripas provenientes da região A, que tiveram em média valores aproximadamente 9,5% menores quando comparadas as regiões B e C. Considerando o colmo de maneira global (regiões A, B e C juntas) observa-se um valor médio de 70,3 MPa para amostras sem nó e de 63,4 MPa para as amostras com nó. Quanto ao módulo de elasticidade longitudinal, os valores obtidos mostraram-se aquém do esperado. Uma possível explicação para os baixos valores obtidos pode ser devida às pequenas dimensões dos corpos-de-prova utilizados, e a não colocação de um extensômetro em corpos-de-prova destas dimensões. A Figura 10 mostra graficamente os valores médios obtidos para a resistência no ensaio de compressão paralela.

Resistênci a à C om pressão

(MPa) 80

R egião A R egião B

60

R egião C

40 20 0 sem nó

com nó

Figura 10. Valores médios de resistência à compressão em ripas de bambu.

2.3 FLEXÃO ESTÁTICA A Figura 11 mostra o padrão de rompimento observado. No centro, o padrão de rompimento observado nos corpos-de-prova sem nó e, à direita, mostra os corpos-de-prova com nó. A Tabela 2 mostra os valores médios obtidos no ensaio de flexão.

Figura 11. Ensaio de flexão.

100


Tabela 2. Valores médios da resistência (fco – MOR) e do módulo de elasticidade longitudinal (Eco – MOE). Flexão Região do colmo A B C Colmo Desvio C.V. (%)

Sem Nó N = 16 ffo (MOR) Efo (MOE) (MPa) (Gpa) 169,1 15,5 161,1 16,0 170,7 15,3 167,0 15,6 19,7 1,3 11,8 8,3

U (%) 11,9 11,9 11,9 11,9

ffo (MOR) (MPa) 118,7 104,9 111,9 112,1 18,0 16,1

Com Nó N = 16 Efo (MOE) (Gpa) 12,6 12,3 12,0 12,3 1,2 9,4

U (%) 12,0 11,9 11,9 11,9

Através da análise de variância efetuada, não foi verificada diferença significativa na resistência à flexão e no módulo de elasticidade longitudinal entre as regiões do colmo utilizadas seja nas amostras sem nó, seja nas amostras com nó. As Figuras 12 e 13 mostram graficamente os valores médios obtidos para a resistência e o módulo de elasticidade no ensaio de flexão.

Resistência à Flexão (MPa)

Região A

200

Região B

150

Região C

100 50 0 sem nó

com nó

Figura 12. Resistência à flexão de ripas de bambu.

Módulo de Elasticidade na Flexão (GPa)

Região A

20

Região B

15

Região C

10 5 0 sem nó

com nó

Figura 13. Módulo de elasticidade longitudinal na flexão em ripas de bambu.

2.4 TRAÇÃO PARALELA A Figura 14 mostra o ensaio de tração realizado.

Figura 14. Ensaio de tração paralela.

101


A Figura 14 mostra o padrão de rompimento observado nos corpos-de-prova de tração: no centro, o padrão de rompimento observado nos corpos-de-prova sem nó e, à direita, mostra o padrão de rompimento observado nos corpos-de-prova com nó. Observou-se que, nas amostras com nó, o rompimento sempre ocorreu no nó, independentemente de este estar ou não deslocado do centro. A Tabela 3 mostra os valores médios obtidos no ensaio de flexão. Tabela 3 – Valores médios da resistência (fco) e do módulo de elasticidade longitudinal (Eco) obtidos no ensaio de tração paralela. Tração Região do colmo A B C Colmo Desvio C.V. (%)

Sem Nó Eto (Gpa) 20,1 20,7 20,7 20,5 1,7 8,3

fto (MPa) 240,1 250,0 246,8 245,4 22,5 9,2

U (%) 12,0 12,0 11,9 12,0

Com Nó Eto (Gpa) 16,9 18,6 19,5 18,3 2,2 12,2

fto (MPa) 103,3 117,5 114,4 111,9 14,5 13,0

U (%) 11,9 11,9 12,0 11,9

Através da análise de variância efetuada entre as partes ou regiões do colmo utilizadas (região A, região B e região C), não foi verificada diferença significativa na resistência à tração e no módulo de elasticidade longitudinal nas amostras sem nó, havendo diferença na região A para as amostras com nó. Considerando o colmo inteiro (regiões A, B e C juntas), observa-se que os valores da resistência e do módulo de elasticidade longitudinal obtidos no ensaio de tração paralela foram 119% e 12% respectivamente maiores nas amostras sem nó, do que nas amostras com nó. As Figuras 15 e 16 mostram graficamente os valores médios obtidos para a resistência e o módulo de elasticidade no ensaio de tração.

Resistência à Tração (MPa)

Região A

250

Região B

200

Região C

150 100 50 0 sem nó

com nó

Figura 15. Resistência à tração de ripas de bambu.

Módulo de Elasticidade na Tração (GPa)

Região A 20

Região B

16

Região C

12 8 4 0 sem nó

com nó

Figura 16. Módulo de elasticidade longitudinal no ensaio de tração.

102


Considerando os ensaios e a análise estatística efetuados, observa-se que, de uma forma geral, a região do colmo que mostrou uma maior variação foi à região A, muito embora essa diferença não tenha sido muito superior a 10% na maioria dos casos. Deste modo, as regiões B e C podem ser consideradas mais homogêneas em relação às características mecânicas estudadas. No entanto, de um ponto de vista prático e de aproveitamento tecnológico do colmo, podemos considerar que as três regiões estudadas (região A, região B e região C ao longo do colmo) e processadas da mesma maneira (a partir da casca, eliminando-se a parte mais interna da parede) poderiam ser utilizadas conjuntamente, considerando assim o colmo em sua totalidade (regiões A, B e C juntas). A Tabela 4 resume os valores médios obtidos para as características de resistência e módulo de elasticidade longitudinal das ripas laminadas considerando o colmo inteiro. Tabela 4 – Características mecânicas das ripas laminadas e massa específica considerando o colmo inteiro (regiões A, B e C).

Tração Flexão Compressão

Características mecânicas das ripas – Colmo inteiro Sem Nó fO EO U fO (MPa) (Gpa) (%) (MPa) 245,4 20,5 12,0 111,9 167,0 15,6 11,9 112,1 70,3 2,9 11,9 63,4

Com Nó EO (Gpa) 18,3 12,3 3,3

U (%) 11,9 11,9 11,9

Pode-se observar pela Tabela 4 que todas as características mecânicas de resistência e módulo de elasticidade sofreram uma diminuição com a presença do nó (exceto para o módulo de elasticidade à compressão), podendo-se considerar a presença do nó como um ponto fraco e de diminuição nas características de resistência das ripas. A Figura 17 mostra graficamente os valores da resistência mecânica das ripas laminadas obtidos nos ensaios de compressão, flexão e tração, considerando o colmo inteiro (média das regiões A, B e C juntas).

Resistência Geral do Colmo

(MPa) Compressão

250

Flexão

200

Tração

150 100 50 0 sem nó

com nó

Figura 17 – Resistência geral das ripas de bambu considerando o colmo inteiro.

3 CONCLUSÕES De acordo com as condições em que o trabalho foi desenvolvido pode-se considerar que: A espécie de bambu utilizada, Dendrocalamus giganteus, mostrou-se satisfatória para a confecção de ripas laminadas. As dimensões adotadas para os corpos-de-prova para os ensaios mecânicos mostraram-se satisfatórias e adequadas para obtenção dos resultados. As três regiões do colmo utilizadas, A (inferior), B (média) e C (superior) não apresentaram diferenças quanto ao processamento e obtenção de ripas laminadas. O limite estabelecido para a altura útil do colmo (parede com no mínimo 8 mm de espessura) foi satisfatório para o processamento e aproveitamento máximo em altura do colmo. A plaina 4 faces utilizada para o processamento final das ripas mostrou-se muito adequada para este fim.

103


Para as condições estabelecidas no trabalho (espessura das ripas e ripas sempre próximas à casca), as ripas provenientes da região A mostraram maior variação e resultados um pouco inferiores em relação às regiões B e C, que se mostraram mais homogêneas. Porém, de um ponto de vista prático e tecnológico as três regiões poderiam ser utilizadas em conjunto. A presença do nó reduziu significativamente os resultados das propriedades de resistência mecânica observados, mostrando ser o nó um ponto de maior fraqueza nas ripas.

AGRADECIMENTOS À Fapesp pelo apoio financeiro ao desenvolvimento deste projeto.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA INDÚSTRIA DA MADEIRA PROCESSADA MECANICAMENTE ABIMCI. Projeto de norma de compensado. Disponível em: <http://www.abimci.com.br/>. Acessado em: 2004. 71 p. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 7190: Projeto de estruturas de madeira. Anexo B. Rio de Janeiro, 1997. 107 p. ________. NBR 9484: Compensado - Determinação do Teor de Umidade - Método de Ensaio. Rio de Janeiro, 1986. 2 p. ________. NBR 9485: Compensado - Determinação da Massa Específica Aparente - Método de Ensaio. Rio de Janeiro, 1986. 3 p. ________. NBR 9533: Compensado - Determinação da Resistência Flexão Estática - Método de Ensaio. Rio de Janeiro, 1986. 5 p. ________. NBR 9535: Compensado - Determinação do Inchamento - Método de Ensaio. Rio de Janeiro, 1986. 3 p. BERALDO, A. L.; AZZINI, A.; GHAVAMI, K.; PEREIRA, M. A. dos R. Bambu: Características e Aplicações. In: FREIRE, W. J.; BERALDO, A. L. (Coord.). Tecnologias e Materiais Alternativos de Construção. Campinas: Editora Unicamp, 2003. 333 p. CNBRC - CHINA NATIONAL BAMBOO RESEARCH CENTER. Cultivation & Integrated Utilization on Bamboo in China. Hangzhou/China: CBRC, 2001 CUSACK, V. Bamboo World: The Growing and use of Clumping Bamboo. Australia: Kangaroo Press, 1999. 224 p. FOLHA DE S. PAULO. Área Reflorestada tem Queda de 5% em SP. Folha de S. Paulo, São Paulo, 09 set. 2002. Folha Cotidiano, p. C1. ________. Preservação Pode Ser Excelente Negócio. Folha de S. Paulo, São Paulo, 09 set. 2002. Folha Ciência, p. A16. GONÇALVES, M. T. T.; PEREIRA, M. A. dos R.; GONÇALVES, C. D. Ensaios de resistência mecânica em peças laminadas de bambu. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA AGRÍCOLA, 29., 2000. Fortaleza. Anais… [S.l.: s.n.], 2000. CD-ROM. HIDALGO-LÓPEZ, O. Bamboo: the gift of the gods. Bogota: Oscar Hidalgo-López Editor, 2003. 553 p. INTERNATIONAL NETWORK FOR BAMBOO AND RATTAN (INBAR). Priority Species of Bamboo and Rattan. New Delhi/India: INBAR IDRC, 1994. 68 p. JANSSEN, J. J. A. Designing and Building with Bamboo. Beijing/China: Inbar - International Network for Bamboo and Rattan, 2000. 207 p. Technical Report nº 20. JARAMILLO, S. V. La guadua en los grandes proyectos de inversion. In: CONGRESSO MUNDIAL DE BAMBU GUADUA, 1., 1992, Pereira/Colômbia. Anais... [S.l.: s.n.], 1992. LEE, A. W. C; BAI, X. S.; PERALTA, P. N. Selected Physical and Mechanical Properties of Giant Timber Bamboo Grown in South Carolina. Forest Products Journal. USA: Forest Products Society, v. 44, n. 9, p. 40-46, Sep. 1994. LIESE, W. The Anatomy of Bamboo Culms. Beijing: Internacional Network for Bamboo and Rattan, 1998. 240 p. INBAR Technical Report Nº 18. PAULI, G. Emissão Zero: a busca de novos paradigmas: o que os negócios podem oferecer à sociedade. Porto Alegre: Pontifica Universidade Católica do Rio Grande do Sul – EDIPUCRS, 1996. 312 p. ________. Upsizing: Como gerar mais renda, criar mais postos de trabalho e eliminar a poluição. Porto Alegre: Fundação Zeri Brasil, 2001. 3 ed. 356 p.

104


PEREIRA, M. A. dos R. Bambu: Espécies, Características e Aplicações. Bauru: Departamento de Engenharia Mecânica/Unesp, 2001. 56 p. Apostila. PEREIRA, M. A. dos R.; GARBINO, L. V. Projeto bambu: Desenvolvimento do Bambu Gigante (Dendrocalamus giganteus) na Unesp/campus de Bauru–SP., com vistas à sua utilização na Engenharia Agrícola. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA AGRÍCOLA, 32., 2002, Salvador. Anais... Salvador: UFBA, 2002. CD-ROM. QISHENG, Z.; SHENXUE, J. Bamboo based panels in China. Nanjing/China: Bamboo Engineering Research Center/Nanjing Forestry University, 2001. SALEME, H.; VIRUEL, S. C. de. Estructuras de Bambu en la Arquictetura Moderna. In: JORNADAS SUDAMERICANAS DE INGENIERIA ESTRUCTURAL, 27., 1995, Tucuman/Argentina. Anais… [S.l.: s.n.], 1995. st SASTRY, C. B. Bamboo: Timber for the 21 Century. [S.l.]: Inbar. Disponível em: <www.inbar.org.cn/timber.asp>. Acesso em: 30 nov. 1999. ZHOU, F. Selected Works of Bamboo Research. China: Research Editorial Committee/Nanjing Forestry University, 2000. p. 164.

105


6 ARTIGOS SOBRE APLICAÇÕES 6.1 O BAMBU E SEU POTENCIAL PARA APLICAÇÕES NA CONSTRUÇÃO CIVIL José Dafico Alves1

Resumo Este trabalho tem como objetivo apresentar algumas propriedades do bambu, visando seu potencial na construção civil. Determinou-se a umidade do vegetal verde e seco ao ar, procedendo-se, então, às avaliações das resistências à compressão e tração, seguindo procedimento do Anexo B da NBR 7190/97. Após as avaliações preliminares, as propriedades do concreto armado com tiras de bambu foram testadas, verificando-se os desempenhos na compressão, tração, ensaios de peças de concreto armado com tiras de bambu e avaliação de moirões de concreto. Palavras-chave: Armadura. Bambu. Caracterização. Concreto. Propriedades mecânicas. Abstract This work aim to present some properties of the bamboo as a potential material for engineering buildings. The humidity of the green and dryed bamboo was determined followed by the compression and tensile strenght, acording the Brazilian standars, NBR 7190/97, Appendix B. After the preliminary evaluations, the properties of the reinforced concrete with bamboo stripes inside was tested the in compression and tensile stress performances; also, concrete fence-forts evaluation was made. Keywords: Reinforcement. Bamboo. Characterization. Concrete. Mechanical Properties.

INTRODUÇÃO O bambu é uma planta conhecida e usada pelo homem, desde tempos pré-históricos, como alimento, vestimentas, instrumentos musicais, armas, na construção civil, no transporte de materiais, na fabricação de papel, de móveis e de objetos de uso doméstico, dentre outros. Na construção civil, nos interessa o colmo, que é segmentado por nós e entrenós. A estrutura do colmo é constituída de células alinhadas no sentido axial e envolvidas por fibras de alta resistência à tração. Uma característica importante do bambu é que a parte mais resistente é a superficial. Pode-se referenciar a resistência do bambu à tração como sendo cerca de 1/5 da resistência do aço CA-50. Com estas características, o bambu pode ser utilizado até como reforço ao concreto, em substituição ao aço tradicionalmente empregado como armadura de peças dessa natureza. A resistência mecânica e o grau de dureza do colmo, por outro lado, dependem de sua idade e do seu grau de amadurecimento. Os bambus variam em altura e diâmetro, havendo aqueles que crescem até mais de 30 m de altura e outros que não passam de arbustos, com diâmetros variando de 0,5 até 30 cm. O colmo cilíndrico e oco torna-o um material leve e flexível, com massa específica aparente variável de 500 à 790 kg/m³ (média de 650 kg/m³). A elevada relação resistência/peso, associada ao baixo custo do material, tem levado os pesquisadores a utilizá-lo na construção civil, em substituição à madeira e ao próprio aço de construção. Como componente de construção, o bambu pode ser utilizado na forma inteira (roliça) e, neste caso, empregado na construção de tesouras, pilares, vigas, etc.; na forma partida (talisca), como reforço ao concreto; e, na forma de placas de réguas de bambu trançado, empregado na construção de muros, paredes, forros, assoalhos, etc. Permite ainda, o bambu, associação com outros materiais de construção, tais como, solo-cimento, argamassa armada, concreto e gesso. Dentro do perímetro urbano, a construção com bambu está impedida por um dispositivo legal (Decreto Lei n° 38.382/51, RGEU das Edificações Urbanas, Título II, Capítulo II, artigos 30 e 42 e Título V, Cap. III, artigos 153 e 156) que proíbe o uso de materiais de fácil combustão, embora já se possa tratá-lo de modo a reduzir sua combustibilidade através da mineralização. No meio rural, todavia, o uso do bambu é ilimitado, satisfazendo a quase todas as exigências e necessidades. Pode-se dizer que o bambu é um material viável, de fácil aplicação e pronta disponibilidade, adequado para o uso em construções rurais. Suas outras inúmeras utilidades, aliadas ao fato de ser um material abundante nos trópicos, fazem dele a solução para um sem número de problemas encontrados por pequenos e médios agricultores (Figuras 1a e 1b). 1 Professor (Doutor) Titular Aposentado da UFG. Professor do Departamento de Engenharia Agrícola da UEG;

Br 153, Km 98, Campus Henrique Santilo, Fone (62) 3328-1162. CEP 75001-970; Anápolis GO. Professor Colaborador do Mestrado em Engenharia Civil da UFG. E-mail: (jdafico@ueg.br).

106


1 CARACTERIZAÇÃO Na caracterização, usaram-se os procedimentos prescritos no Anexo B da NBR 7190/97, embora não sejam adequados para algumas avaliações, tais como: resistência à tração e à compressão. Uma questão que deverá ser verificada em uma posterior revisão, quando se tratar de ensaios de bambu. Na primeira fase, os resultados foram: Resistência à compressão: COLMOS VERDES – fck = 26,76 MPa. COLMOS SECOS - fck = 57,01 MPa. Resistência à tração: COLMOS VERDES – ftk = 127,37 MPa. COLMOS SECOS - ftk = 131,82 MPa. Densidade média: COLMOS VERDES – δ = 1,1 kg/dm³. COLMOS SECOS – δ = 0,073 kg/dm³. Teor de umidade: COLMOS VERDES – H% = 89,10 COLMOS SECOS – H% = 9,54. Foram preparadas vigas prismáticas de concreto com e sem armaduras de bambu para avaliação de seu desempenho. 1.1 TRAÇO DO CONCRETO O concreto foi dosado com areia natural e brita 0 de granulito e colorido com xadrez vermelho cujo traço foi: 1:1,75:2,205:0,50:0,04 (cimento:areia nat.:brita 0:a/c:xadrez vermelho). Os resultados das resistências deste concreto foram: Aos sete dias de idade: fc7 = 19,6 MPa. ft7 = 4,97 MPa. Aos vinte e oito dias de idade: fc28 = 24,37 MPa ft28 = 5,98 MPa. Com este concreto foram moldados corpos-de-prova prismáticos de 15 x 15 x 50 cm e ensaiados à compressão e à flexão, sendo que para cada tipo de ensaio foram avaliados corpos-de-prova com armadura de quatro tiras e estribos a cada 15 cm, conforme Figuras 2a e 2b, e, ainda, corpos-de-prova não armados, obtendo os seguintes resultados médios a seguir: Resistência à compressão aos sete dias de idade: Sem armadura: (fc7) = 19,38 MPa (fc28) = 26,22 MPa. Com armadura: (fc7) = 21,83 MPa. (fc28) = 31,13 MPa.

107


Resistência à flexão com duas cargas nos terços médios das vigas, conforme Figuras 3a e 3b: Sem armadura: (ff7) = 3,45 MPa. (ff28) = 3,63 MPa Com armadura: (ff7) = 4,13 MPa. (ff28) = 6,64 MPa. No ensaio de compressão dos corpos-de-prova prismáticos, a eficiência da armadura aos vinte e oito dias de idade foi de 18% e no ensaio de flexão, a eficiência da armadura aos vinte e oito dias de idade foi de 82%. Pode-se concluir que, tanto na compressão quanto na flexão, a armadura de bambu melhorou o desempenho das peças.

Figuras 1a e 1b. Mostrando as mudas e as touceiras de bambu.

Figuras 2a e 2b. Mostrando a armadura pronta e o preparo do concreto.

Figuras 3a e 3b. Mostrando a realização do ensaio de flexão das vigas prismáticas.

108


2 SUGESTÕES PARA DIMENSIONAMENTO DE PEÇAS DE CONCRETO ARMADO COM BAMBU Foram preparadas algumas peças de concreto armado com tiras de bambu, sendo três pilares de 15 x 15 cm de seção transversal e 200 cm de comprimento e três vigas com 10 x 20 cm de seção transversal e 180 cm de vão livre. Nestas peças foram utilizadas, como armaduras, tiras de bambu cujas características avaliadas foram: Resistência característica à tração (ftok) = 100 MPa. Resistência de cálculo (ftod) = kmod x ftok = 0,70x100 = 70 MPa. Resistência característica à compressão (fcok) = 15,1 MPa. Tensão de aderência por arrancamento entre 0,23 a 0,80 MPa. O concreto utilizado tinha resistência à compressão aos vinte e oito dias de idade (f c28) = 25,7 MPa, e fck = 20 MPa. Com os dados dos materiais, foram calculados os valores teóricos das resistências das peças e comparados com os valores apresentados nos ensaios.

3 RESULTADOS NA COMPRESSÃO DOS PILARES Adotando-se o mesmo procedimento do dimensionamento com armadura de aço, tem-se a seguinte fórmula da equação 1 a seguir: γc γb P = Ac f cd + A b fc0d

(Eq. 1)

Onde: γc = coeficiente de minoração da NBR 6118/01. γb = coeficiente de minoração da NBR 7190/97. kmod = 0,70 (tabela 12 da NBR 7190/97). Ac = área de concreto da seção transversal do pilar Ab = área das tiras longitudinais de bambu. Preparando-se a equação 1 para calcular os valores teóricos, com os dados dos materiais, tem-se: f cd / γc γb = 20/1,96 = 10,2 MPa. fc0d / γc γb = 15,1/1,96 = 10,7 MPa. P = 10,2x Ac + 10,7 x A b

(Eq. 2)

Tabela 1. Resultados das resistências de ensaio e das resistências calculadas dos pilares. Pilares

Seção Bambu mm²

Área conc. mm²

Resist. do Ensaio (N)

Resist. Teórica (N)

P1

1.120

23.560

349.000

252.296

P2

890

23.560

350.000

249.835

P3

1.160

24.010

268.000

257.314

109


Resultados dos ensaios das vigas e dos cálculos teóricos, segundo as equações 3 e 4 a seguir:

P l M  x   2 3

(Eq. 3)

Onde: M = momento de ruptura do ensaio P = carga de ruptura l = vão entre os apoios.

 Sbftod  Mcalc   ftodSb d  2 bfck  

(Eq. 4)

Onde: Mcalc = momento calculado ftod = resistência à tração de cálculo do bambu = 70 MPa. Sb = área das tiras longitudinais do bambu d = distância do centro de gravidade da armadura até a borda superior da seção transversal da viga, que é de 18 cm. fck = resistência característica à compressão do concreto = 20 MPa.

Tabela 2. Resultados dos ensaios de flexão das vigas e dos valores calculados dos momentos fletores. Viga

Sb mm²

C. Rupt. (N)

M. rup. (Nmm)

M. cálc. (Nmm)

V1

248

13.120

32.800

28.234

V2

244

14.620

36.550

27.797

V3

295

11.120

28.125

32.905

4 FABRICAÇÃO DE POSTES Após vários estudos de utilização do bambu como armaduras para concreto, foram realizadas algumas pesquisas para fabricação de postes para cercas com excelentes desempenhos. O bambu apresenta características físicas que nos incentivam a aplicá-lo como substituto do aço no concreto em estruturas médias, atendendo às muitas necessidades no meio rural. De acordo com estudos com bambu da espécie Phyllostachys bambusoides: - Teor de umidade da espécie após o abate: H% = 89,1 - Teor de umidade após a secagem natural à sombra: H% = 9,54 - Densidade após o abate = 1,10 g/cm³ - Densidade após a secagem natural = 0,74 g/cm³ - Resistência à compressão logo após o abate: fck = 26,76 MPa - Resistência à compressão após a secagem natural: fck = 57,01 MPa - Resistência à tração logo após o abate: ftk = 127,37 MPa - Resistência à tração após a secagem natural: ftk = 131,82 MPa

110


O bambu, para ser usado como armadura, deve estar maduro, com idade de três anos e colhido há pelo menos um mês, quando já terá perdido 90% da umidade inicial. As tiras para armadura dos postes devem ter largura de 2,5 cm para permitir espaço para preenchimento com concreto. Após o corte das tiras, estas devem ser tratadas em uma solução de cloreto de cromo ou de cobre a 3%, devendo ser mergulhadas na solução por 24 horas. Recomenda-se ainda a mineralização, segundo Alves (2002a) numa calda rala de cimento e água na relação 1:5, também durante 24 horas e estará pronta para ser colocada na forma para lançamento do concreto. Os estribos recomendados são compostos de dois fios de arame galvanizado, n° 14 (Ø2,11 mm), sendo distribuídos a cada 10 cm ao longo da peça. Esta recomendação se deve a Alves (2002a), por apresentar maior facilidade de confecção e melhor desempenho da armadura (Figura 4).

Figura 4 – Croqui da armadura de bambu para o poste.

5 TRAÇO E CARACTERÍSTICAS DO CONCRETO PARA POSTES O concreto deve ser obtido com brita mais fina, brita 0, com diâmetro máximo de 12,5 mm, para melhor desempenho na concretagem. Sendo uma peça de concreto aparente, também o volume de argamassa no traço deve atender a recomendações para este tipo de material. O uso de aditivo superplastificante permite que a mistura se torne autoadensável, necessitando de muita pouca energia para acomodação e envolvimento da armadura, resultando numa peça bem compacta e acabamento superficial muito bom. Um traço adequado para concretagem de postes deve ter as seguintes características: - Volume de argamassa por metro cúbico de concreto, de aproximadamente 660 litros. - Consumo de água no metro cúbico de concreto, em torno de 230 litros. O uso de pigmentos é uma boa alternativa para colorir o concreto. O cimento tipo CP II F, o CP III e o CP IV aceitam as cores: vermelha, verde e preta. A dosagem do pigmento é de 4% da massa de cimento. O traço de concreto foi dosado de acordo com as características analisadas dos agregados, que são: Areia natural Massa específica = 2,63 g/cm3 Massa unitária = 1,51 kg/dm3 Módulo de finura = 2,29 Brita 0 (granulito de caturaí) Massa específica = 2,67 g/cm3 Massa unitária = 1,44 kg/dm3 Módulo de finura = 5,69 Ømáx. = 12,5 mm Xadrez vermelho (4%) = 16,8 kg

__________ NOTA 1. A quantidade de tiras, ou melhor, a seção longitudinal da armadura deverá ser aumentada para dimensões e comprimentos diferentes dos postes para garantir sua capacidade de carga de serviço.

111


A metodologia para dosagem foi a de Alves (2002b), cujo traço ajustado foi: Cimento = 440 kg Areia natural = 697,8 kg Brita 0 = 921,1 kg Água = 220 kg Pigmento (Xadrez) = 17,6 kg Superplastificante = 4,4 kg O traço unitário em massa é: 1:1,585:2,093:0,50:0,04:0,01 (cimento:areia natural:brita 0:a/c:pigmento:superplastificante).

6 CONCRETAGEM Após a dosagem do concreto, foram avaliadas suas propriedades para, em seguida, moldar os poste de concreto, conforme fotos a seguir:

Figura 5. Forma de madeira com as armaduras de bambu prontas para concretagem.

Figura 6. Concretagem dos postes com concreto colorido.

Figura 8. Poste já colocado para receber o arame.

112

Figura 7. Aspecto do poste após sete dias de cura úmida e já pronto para uso.

Figura 9. Poste de concreto colorido verde com bambu.


7 CONCLUSÕES Mostramos neste trabalho algumas de tantas aplicações do bambu na construção, necessitandose apenas de incentivo para cultivar as espécies adequadas à finalidade a que se destina, e difundir as tecnologias já existentes no Brasil. É necessário também implantar cursos para ensinar como aproveitar todo o potencial do bambu, bem como técnicas de aplicação. O bambu como armadura para concreto poderá ser empregado num grande número de obras civis. Pode-se usar nas construções de habitações, galpões, etc. As universidades e os Centros de Pesquisa têm o dever de apropriar-se dos conhecimentos já existentes e desenvolver novas pesquisas focalizando as aplicações do bambu para os vários setores industriais.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, J. D. Concretos Alternativos para Obras Rurais. In: CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO, 44., 2002, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte, [s.n.], 2002 (a). CD-ROM. ________. Manual de Tecnologia do Concreto. Goiânia: Editora da UCG, 2002 (b). 4ª ed. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6118: Projeto de estruturas de concreto Procedimento. Rio de Janeiro, 2001. ________. NBR 7190: Projeto de estruturas de Madeira. Rio de Janeiro, 1997. AZZINI, A. Aspectos agronômicos da produção do bambu industrial. O Papel. São Paulo: ABTCP, v. 41 p. p. 87-95, 1980. BARBOSA, N. P.; CHAGAS FILHO, M. B. Resultados Comparativos do Ensaio Experimental de Vigas de Concreto Laterítico Armado. Revista Estrutura. Rio de Janeiro: [s.n.], v. 115, p. 80-86, 1986. BARBOSA, N. P.; TOLEDO FILHO, R. D. Vigas de Concreto Laterítico Reforçadas com Bambu. In: CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO, 33., 1991, Santos/SP. Anais... Santos: IBRACON, 1991. BRASIL. Decreto Lei n° 38.382, de 7 de agosto de 1951. Aprovado em 14 de fevereiro de 1903. RGEU Regulamento Geral das Edificações Urbanas; Alterado por: Decreto 38.888, de 29 de agosto de 1952. Disponível em: <http://www.cultalg.pt/Recrutamento Pessoal, Aviso_DR_arquiteto. Pdf>. Acesso em: 05 abr. 2010. CULZONI, R. A. M. Características dos Bambus e sua utilização como Material Alternativo no Concreto. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - PUC-Rio, 1986. 134 p. GHAVAMI, K.; MARINHO, A. B. Propriedades Físicas e Mecânicas do Colmo Inteiro do Bambu da Espécie Guadua angustifolia. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental. Campina Grande/PB: Asociación Latinoamericana y del Caribe de Ingeniería Agrícola - ALIA, v. 9, n. 1, p. 107-114, 2005. SALGADO, A. L. B.; et al. Instruções Técnicas sobre o Bambu. Campinas: Instituto Agronômico, 1992. Boletim Técnico n° 143.

113


6.2 BAMBU: MADEIRA ECOLÓGICA PARA HABITAÇÕES DE BAIXO CUSTO Khosrow Ghavami1

Resumo Para o uso do bambu em grande escala, como material de engenharia economicamente viável e com possível industrialização, faz-se necessário um estudo científico sistemático analisando os processos de plantação, colheita, cura, tratamento e pós-tratamento, além de uma análise estatística completa das propriedades físicas, mecânicas e microestruturais do colmo inteiro de diferentes espécies de bambu. Desde 1979, a PUC-Rio, sob a orientação do autor, desenvolve um programa de pesquisa voltado principalmente para estabelecer as propriedades dos bambus existentes no Brasil e criar novos elementos estruturais usando bambu na construção rural e civil. O presente trabalho tem como objetivo mapear as propriedades físicas e mecânicas de colmos inteiros e determinar o módulo de resistência e a tensão na superfície do colmo devidos ao momento de flexão dos bambus das espécies Dendrocalamus giganteus proveniente da PUC-Rio e Guadua angustifolia proveniente do Jardim Botânico-RJ, Guadua angustifolia e Guadua tagoara provenientes de Guarulhos-SP, e Phyllostachys heterocycla pubescens (mossô) e Phyllostachys bambusoides (matake), provenientes de Presidente Prudente-SP. Este estudo possibilita estabelecer critérios de dimensionamento nos processos industriais viabilizando economicamente o uso do bambu. Os resultados apresentados preliminarmente permitem selecionar as dimensões requeridas, como diâmetro, espessura, distância internodal e as tensões de flexão apresentadas através das figuras e derivadas de equações matemáticas. Palavras-chave: Bambu. Propriedades Físicas. Propriedades Mecânicas. Microestrutura. Abstract In order to use bamboo on a large scale as an engineering material, economically feasible, with a possible industrialization, it becomes necessary to study scientifically the cultivation, harvesting, curing and treatment processes. After this initial stage, a complete statistical and probabilistic analysis of the physical, mechanical and micro-structural properties of whole bamboo culms of different species should be carried out. Since 1979, the research programs at PUC-Rio, supervised by the author, were mainly concerned with the establishing the properties of the existing bamboo in Brazil and creating new structural elements using bamboo for civil and rural construction. The presented paper has as its main objective to establish the physical and mechanical properties of whole bamboo culms in addition to determining the second moment of inertia and the surface bending stresses of the entire bamboo culms. The bamboo species studied were Dendrocalamus giganteus take from the PUC-Rio and Guadua angustifolia, take from the Botanical Garden of Rio de Janeiro, Guadua tagoara and Guadua angustifolia taken from Guarulhos in the state of São Paulo, Phyllostachys heterocycla pubescens (mossô) and Phyllostachys bambusoides (matake) from the city of Presidente Prudente in the state of São Paulo. These prepreliminary results will allow the user to select the required dimensions such as diameter, thickness, inter-nodal distances and the bending stresses through the presented figures and the derived mathematical equations. Keywords: Bamboo. Physical Properties. Mechanical Properties. Micro-structures.

INTRODUÇÃO Na era da industrialização, a escolha dos materiais passou a se basear principalmente no preço e na facilidade de produção ou processamento. Os materiais industrializados têm aplicação em todos os setores e em qualquer lugar do mundo onde existe estrada, sendo que, nas aplicações de engenharia, os materiais principais são o cimento Portland e o aço. Na última metade do século XX foi notável o desenvolvimento de materiais avançados constituídos de polímeros sintéticos, como Rayon, Nylon, Poliéster e Aramida, que são usados como reforço em compósitos. Os materiais industrializados mobilizam vastos recursos financeiros, consomem uma enorme quantidade de energia e requerem um processo de gerenciamento centralizado. Em consequência disto, além de outros efeitos, ocorre o problema de desemprego e habitacional em áreas rurais e igualmente em pequenas cidades e, ainda, os materiais não-renováveis são aproveitados incorretamente, causando permanente poluição. Neste sentido, torna-se evidente que os materiais ecológicos satisfazem algumas exigências fundamentais tais como: minimização do consumo de energia, conservação dos recursos naturais, redução da poluição e manutenção de um ambiente saudável (GHAVAMI, 2001). Assim, são intensas as pesquisas em andamento sobre estes materiais não-poluentes, como fibras vegetais, bambu e solo, os quais estão sendo estudados em todos os aspectos do comportamento e utilização, e apresentados como materiais não-convencionais na construção e encontrados em abundância localmente. Também, está sendo 1 PhD, F. ASCE, Professor Titular, PUC-Rio de Janeiro. E-mail: (ghavami@puc-rio.br).

114


investigado o uso de resíduos agrícolas, minerais e industriais de forma que possam vir a se tornar uma alternativa como material de construção. O bambu, presente constantemente na paisagem brasileira e em toda a zona tropical e parte da zona subtropical da terra, é uma resistente gramínea não devidamente apresentada aos povos ocidentais. Constando com mais de 1.200 aplicações no oriente (GHAVAMI; HOMBEECK, 1981; GHAVAMI, 1992; HIDALGO-LÓPEZ, 1984), este grupo de plantas é um potencial latente à espera de uso. Dentre suas várias características favoráveis à função estrutural, podem-se citar: a) baixa energia de produção, se comparada à de outros materiais, como aço, concreto e madeira, o que resulta em baixo custo; b) grande e constante produtividade por bambuzal; c) baixo peso específico, o que reduz o custo de seu manuseio e transporte; d) forma tubular acabada, estruturalmente estável e com diversas aplicações construtivas, inclusive como tubos hidráulicos; e) resistência mecânica compatível com os esforços solicitantes a que estaria submetida em estruturas adequadamente dimensionadas; f) vida útil dentro das expectativas normais de vida dos materiais convencionais, relativamente às condições ambientais onde é utilizado, seja ao ar livre ou envolvido por outros materiais. Para o uso do bambu em grande escala como material de engenharia economicamente viável e com possível industrialização, faz-se necessário um estudo científico sistemático, considerando os processos de plantação, colheita, cura, tratamento e pós-tratamento, além de uma completa análise estatística das propriedades físicas e mecânicas no nível meso, micro e nano do colmo do bambu inteiro. A partir desses estudos, será possível criar critérios confiáveis de dimensionamento e emprego de processos industriais viabilizando economicamente o uso do bambu em grande escala.

1 PESQUISAS NA PUC-RIO/GMTENC Neste artigo, pretende-se apresentar o estudo das características mecânicas dos bambus das espécies Phyllostachys heterocycla pubescens (mossô) e Phyllostachys bambusoides (matake), Guadua tagoara, Guadua angustifolia e Phyllostachys aurea, através de ensaios de tração, compressão de elementos curtos, cisalhamento interlaminar e transversal, flambagem de segmentos de colmo, levandose em consideração variáveis predominantes, como espécie, idade, teor de umidade, origem, e local do colmo de onde a amostra foi extraída. Este é o primeiro trabalho realizado no Brasil no qual se fez o mapeamento das propriedades físicas e mecânicas destes bambus. É feito um estudo microscópico do bambu como material compósito, analisando-se o volume de fibras e sua variação ao longo do colmo de espécies diferentes. Em tubos de bambu, foram realizados vários tipos de impregnação, visando conseguir um aumento substancial da capacidade de resistência à pressão interna e durabilidade, de modo a se poder utilizá-lo na construção de redes hidráulicas. Finalmente, para uso desses materiais na prática, foram apontadas recomendações e normas brasileiras para inclusão na ABNT. Isto foi feito em forma de artigos que foram apresentados no IC-NOCMAT (International Conference on Non–Conventional Materials and Technologies) e IAC –NOCMAT 2003 e 2005 (Inter-American Conference of NOCMAT in the EcoConstruction and Infra-structure) e agora serão discutidos no Brasil-NOCMAT 2006, Salvador/Bahia. Baseados nos resultados obtidos das pesquisas sobre bambu durante as quase três últimas décadas em várias partes do mundo, incluindo o Brasil, foi possível criar as primeiras normas para tal utilização. Sabe-se que o conhecimento das normas é importante não apenas para o uso seguro mas, também, para divulgação de um material. O International Network for Bamboo and Rattan INBAR (1999), da qual o autor deste artigo foi um dos mentores e membros fundadores, além de ser um dos membros principais do Comitê técnico de Normas de Bambu, usou os resultados do grupo de materiais e tecnologias não-convencionais da PUC-Rio e resultados das pesquisas realizadas em nível mundial, e propôs normas para a determinação das propriedades físicas e mecânicas dos bambus. As normas propostas pelo INBAR são agora parte integrante das normas de ISO. As mesmas foram analisadas pelo ICBO - International Conference of Building Officials e publicadas no relatório AC 162 Acceptance Criteria for Structural Bamboo, em março de 2000 (ICBO, 2000), que permite a aplicação do bambu na construção nos Estados Unidos da América. Esta norma está traduzida para língua portuguesa pelo grupo de GMTENC (Materiais e Tecnologias Não-Convencionais) da PUC-Rio, permitindo seu uso por engenheiros, técnicos e leigos de toda parte do País que utilizam o bambu na construção civil. Pesquisas científicas isoladas e esporádicas da aplicação do bambu na engenharia datam de 1914, na China e Estados Unidos e, posteriormente, na Alemanha, Japão, Índia, Filipinas entre outros países. No Brasil, os primeiros estudos científicos relativos ao bambu tiveram início em 1979 ( GHAVAMI; HOMBEECK, 1984; CULZONI, 1986; GHAVAMI; ZIELINSKI, 1988) no Departamento de Engenharia Civil da PUC-Rio, sob a orientação do autor deste artigo. Desde então, foram desenvolvidos vários programas de

115


investigação do uso do bambu e de fibras naturais (sisal, coco, piaçava e polpa celulósica de bambu) como materiais de baixo custo empregados na construção, principalmente no que diz respeito à utilização do bambu como alternativa para o aço em estruturas de concreto e estruturas espaciais ( GHAVAMI; HOMBEECK, 1984; GHAVAMI, 1986, 1989, 1995; GHAVAMI, MOREIRA, 1993; Navarro, 2002; ROSA, 2002). Os ensaios desenvolvidos para estabelecer as propriedades mecânicas dos bambus que foram realizados pelo grupo de pesquisa GMTENC na PUC-Rio estão mostrados nas Figuras 1-8.

Figura 1. Ensaio de Tração em corpos-de-prova de bambu. Leitor de deformação conectado ao corpo-de-prova para tração (Clip gage). (1e4)-Carga aplicada ao corpo-de-prova. (2)-Dispositivo para acionar a carga. (3)-Corpo-de-prova. (5)-Vischay.

Figura 2. Dimensões e posicionamento do corpo-de-prova para realização do ensaio de Compressão.

Figure 3. Nova proposta e dimensões do corpo-de-prova de ensaio de cisalhamento.

116


Figura 4. Ensaio em treliça espacial de bambu.

Figura 5. Falha de ligações de estruturas espaciais de bambu.

Figura 6. Ensaio de pilares de concreto com seção circular e quadrada, reforçados com varas de bambu.

Figura 7. Ensaio de flexo-torção de bambu inteiro.

117


Figura 8. Lajes de concreto com forma permanente de bambu. (a)-Forma permanente de bambu antes de concretagem. (b)-Forma permanente de bambu usando diafragma inteiro como conector. (c)-Laje de concreto com forma permanente de bambu antes do ensaio. (d)-Montagem do ensaio Push-Out.

No Brasil, o bambu tem sido objeto de estudos nos últimos trinta anos, dos quais, a maior parte, foi dedicada ao desenvolvimento de metodologias visando sua aplicação em treliças planas, espaciais, tubos de água, esgoto e elementos estruturais de concretos armados com armadura de bambu, como vigas, lajes e colunas (GHAVAMI; ZIELINSKI, 1988; CULZONI, 1986; GHAVAMI, 1995). Com este programa de pesquisa foram estudadas as propriedades físico-mecânicas de onze espécies de bambu. Resultados das pesquisas de bambu são apresentados tendo sido estudados os seguintes bambus: Guadua tagoara, oriundo de uma fazenda localizada em Presidente Prudente - SP, Guadua angustifolia proveniente do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, mossô (Phyllostachys heterocycla pubescens) e matake (Phyllostachys bambusoides), oriundos da propriedade do Sr Takashi Miyzaki, em Guarulhos - SP e Phyllostachys aurea, proveniente da Serra da Bocaina – RJ. Para aumentar a capacidade de resistência às pressões internas e durabilidade em tubos de bambu, foram realizados vários tipos de impregnação, visando conseguir um aumento substancial, de modo a se poder utilizá-lo na construção de redes hidráulicas. Todos estes ensaios mecânicos foram realizados em bambus naturais e tratados, dos quais se extraíram curvas comparativas de resistência e custo. A variação da fração volumétrica das fibras na espessura do colmo do bambu mossô pode ser vista na Figura 9 (GHAVAMI; RODRIGUES, 2002).

Figura 9. Variação da fração volumétrica das fibras na espessura do colmo do bambu mossô.

118


Este trabalho apresenta os resultados de mapeamento das propriedades físicas de colmos inteiros e a determinação da tensão na superfície do colmo devido ao momento de flexão dos bambus das seguintes espécies: Dendrocalamus giganteus, Guadua angustifolia, Guadua tagoara, Phyllostachys heterocycla pubscens (mossô) e Phyllostachys bambusoides (matake), de modo a permitir ao engenheiro civil, agrícola, florestal e arquiteto, ou usuário do bambu, escolher com facilidade os bambus já analisados, com as dimensões e propriedades necessárias para seus projetos.

2 MATERIAIS E MÉTODOS O presente trabalho foi realizado no Laboratório de Estruturas e Materiais do Departamento de Engenharia Civil da PUC-Rio pelo grupo GMTENC. Foram utilizados colmos dos bambus Dendrocalamus giganteus, proveniente de um bambuzal localizado às margens do rio Rainha, que atravessa o Campus da PUC-Rio; Phyllostachys heterocycla pubescens (mossô) e Phyllostachys bambusoides (matake), oriundos de Presidente Prudente–SP, Guadua angustifolia, proveniente do Jardim Botânico-RJ e Guadua angustifolia e Guadua tagoara, oriundos de Guarulhos-SP. Todos os bambus foram cortados com idade média de três anos. A determinação das propriedades físicas foi feita através das normas propostas pelo INBAR (1999) e avaliadas pelo ICBO (2000). O comprimento dos internós dos bambus (l) estudados foi medido com relação às coordenadas, definidas na Figura 10a. O diâmetro externo (D) de cada internó foi determinado a partir dos valores medidos do perímetro. Para determinar a espessura da parede (t), perfuraram-se três furos em cada internó com uma furadeira elétrica com diâmetro de 5 mm, como pode ser visto na Figura 10b, fazendo-se as medições através de um medidor de espessura desenvolvido para este fim (Figura 10c ). A partir dos valores obtidos dos diâmetros externos (D), espessura da parede (t) e comprimento internodal (l) para os respectivos números de internós (n), determinou-se o momento fletor médio (Mm) devido ao carregamento da carga de vento, o módulo de resistência da seção (Zm) e a tensão adimensional na superfície do colmo (  b ) devido ao momento de flexão para os bambus das espécies já citadas.

Figura 10. (a)-Eixos de coordenação. (b)-Furos ao longo do bambu. (c)-Aparelho medidor de espessura desenvolvido pelo grupo GMTENC.

O momento de deflexão médio devido ao carregamento da carga de vento é dado pela equação 1:

Mm 

M M max

(1)

onde M é o momento de flexão calculado para cada trecho do internó, dado pela equação 2, e Mmax é o momento na base, ou seja, em z = 0.

M

p ( L  z )2 2

(2)

onde p carga de vento como pode ser visto na Figura 10 a; L comprimento total do colmo; z altura do ponto de referência (base) até o ponto desejado.

119


O módulo de resistência Zm de uma seção oca cilíndrica adimensional do bambu é definido pela equação 3:

Z m  Z med 

Zm

(3)

Z m,max

onde Zm é dado pela equação 4 e Zm,max é o módulo máximo da seção em z = 0 (equação 4).

Zm 

 32

D 

4

  D  2t  D

4

(4)

A partir dos valores do momento fletor médio (Mm) e do módulo de resistência da seção (Zm) podese determinar a tensão de flexão adimensional na superfície do colmo devido ao momento de flexão através da equação 5. O valor de



Mm Zm

b 

  max

 b será normalizado através da equação 6. (5)

(6)

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO As curvas que representam o comportamento do comprimento do internó do colmo inteiro do bambu das espécies Dendrocalamus giganteus, Phyllostachys heterocycla pubescens (mossô), Phyllostachys bambusoides (matake), Guadua angustifolia de São Paulo e Rio de Janeiro, e Guadua tagoara são apresentadas na Figura 11. Observa-se um comportamento bem definido, ou seja, na parte basal os comprimentos internodais são menores, observando-se que, na parte central do colmo, atingiram o valor máximo, e, na parte superior, decresceram. Esse comportamento ocorre em todas as espécies de bambu estudadas, nas quais, o comprimento internodal atinge seu valor máximo sempre na parte intermediária do colmo, sendo que nas extremidades dos mesmos os comprimentos decrescem.

Figura 11. Comprimento internodal em função dos internós ao longo do colmo do bambu.

120


As relações entre diâmetro externo e espessura da parede com o número de internó do bambu estão apresentadas nas Figuras 12 e 13, respectivamente. O diâmetro externo apresenta um comportamento quase linear, com os valores diminuindo da base para o topo (Figura 12). Já a espessura da parede (t), Figura 13, apresenta grande variação ao longo do colmo, e entre as espécies estudadas, sendo a variação mais acentuada para Guadua tagoara, Guadua angustifolia e Phyllostachys bambusoides (matake). Essa variação pode ter sido provocada pela baixa sensibilidade do aparelho de medição, que é de 0,1 cm e que ainda precisa ser aperfeiçoado. Guadua angustifolia do Jardim BotânicoRJ, apresenta maior diâmetro externo, ou seja, de 13,5 cm. Guadua tagoara e Guadua angustifolia do Jardim Botânico-RJ apresentaram espessura média da parede de 0,15 cm e 0,12 cm, respectivamente. Ghavami e Toledo Filho (1992) estudaram várias espécies de bambu no Rio de Janeiro e na Paraíba, dentre elas Dendrocalamus giganteus. Para os bambus do Rio de Janeiro, os autores obtiveram valores médios de diâmetro, comprimento internodal e espessura da parede na parte intermediária do colmo de 11 cm, 54 cm e 0,9 cm, respectivamente. Para a mesma espécie de bambu proveniente da Paraíba, foram obtidos diâmetro de 12 cm, comprimento internodal de 56 cm, e espessura da parede de 0,11 cm. Amada et al. (1996), ao estudar as propriedades físicas do mossô (Phyllostachys edulis Riv.) do Japão, obteve resultados semelhante ao mossô (Phyllostachys heterocycla pubescens) cultivado em São Paulo.

Figura 12. Diâmetro externo em função do número de internós ao longo do colmo dos bambus.

Figura 13. Espessura da parede em função do número ao longo do colmo dos bambus.

A partir das Figuras 11, 12 e 13, observa-se que ocorrem diferenças entre colmos da mesma espécie, porém, desenvolvidos em locais diferentes. Exemplo disso é o Guadua angustifolia de São Paulo e o mesmo plantado no Jardim Botânico do Rio de Janeiro, os quais apresentam diferenças de valores no comprimento internodal, espessura da parede e diâmetro externo. Essa diferença pode ocorrer em função da variação de clima, vegetação e relevo em ambos os Estados onde essas espécies são cultivadas. Baseados nos dados obtidos, fez-se uma análise de regressão do comportamento normal da distribuição da espessura da parede e do diâmetro externo, em função do comprimento ao longo do colmo do bambu, definindo-se uma equação matemática para determinar o diâmetro externo (D) e a espessura da parede (t) em função da posição (z) ao longo do colmo para cada espécie de bambu estudada. A partir das equações matemáticas, para um comprimento de 600 cm de qualquer das espécies de bambu estudadas, obteve-se a espessura da parede entre 0,11 e 0,14 cm, e o diâmetro externo, entre 8,5 e 11,5 cm. As equações estão apresentadas nas Tabelas 1 e 2, e as curvas do diâmetro externo e da espessura em função do comprimento do colmo, com suas respectivas linhas de tendência, podem ser vistas nas Figuras 14 e 15, respectivamente.

121


Tabela 1. Equações matemáticas que determinam a espessura da parede em função do comprimento do colmo. Espécie de Bambu Phyllostachys heterocycla pubescens-mossô Phyllostachys bambusoides-matake

Equação da espessura t = f(z)

t  0,0092 z 3  0,297 z 2  3,607 z  22,75 t  0,0014 z3  0,056 z 2  1,341z  17,44

Guadua angustifolia (SP)

t  3 105 z 3  0,013z 2  0,872 z  15,303 t  3,832 ln z   16,475

Guadua angustifolia (RJ)

t  15,93z 0, 2257

Guadua tagoara

t  0,0002 z 3  0,030 z 2  1,348z  22,96

Dendrocalamus giganteus

Tabela 2. Equações matemáticas que determinam o diâmetro externo em função do comprimento do colmo. Espécie de Bambu Phyllostachys heterocycla pubescens-mossô Phyllostachys bambusoides-matake Dendrocalamus giganteus Guadua angustifolia (SP) Guadua angustifolia (JB) Guadua tagoara

Equação do diâmetro D = f(z)

D  0,0475z 2  5,061z  118,95 D  0,193z 2  1,072 z  114,4 D  0,019 z 3  0,169 z 2  3,176 z  130,19 D  0,0004 z 4  0,041z 3  1,308z 2  7,425z  87,63 D  0,0654z 2  4,596 z  142,62 D  0,137 z 2  1,944 z  108,96

Figura 14. Espessura das paredes em função dos comprimentos dos colmos dos bambus estudados.

z

Figura 15. Diâmetros externos em função dos comprimentos dos colmos dos bambus estudados.

122


As curvas referentes ao momento fletor ( M m ), módulo de resistência ( Z m ) e as tensões de flexão (

Mm

e

b

) ao longo dos colmos dos bambus estudados estão apresentadas na Figura 16. Os valores de

Zm

são parâmetros importantes de resistência a serem utilizados para o dimensionamento de

estruturas em bambu; ao longo do colmo;

Mm

Zm

independe da espécie de bambu, pois relaciona a altura total com os internós

relaciona as características geométricas do bambu, diferenciando-se quanto à

espécie e quanto ao local de cultivo; b representa a variação da tensão de flexão ao longo do colmo. A partir desse valor, pode-se definir a variação da resistência à flexão ao longo do colmo do bambu.

b ,

b

, ,

m m

b ,

b , b

, ,

m

b

, m

m

m ,

b

b ,

b , b

,

m

,

m

m

m ,

,

Figura 16. Módulo de resistência (m), momento fletor (m ) e tensão de flexão () não dimensional ao longo dos colmos dos bambus estudados.

123


Os resultados mostram que as curvas do momento fletor ( M m ) apresentam comportamento semelhante para todas as espécies de bambu estudadas. Como o módulo de resistência ( Z m ) é função do diâmetro e espessura, a representação gráfica variou para cada bambu. Já a curva da tensão de

flexão ( b ), que é a relação entre o momento e o módulo, apresentou comportamento diferente para cada espécie de bambu. A Tabela 3 apresenta os valores adimensionais aproximados do momento fletor ( M m ), do módulo

de resistência ( Z m ) e da tensão de flexão ( b ), nas posições da base, intermediária, e topo, correspondendo às alturas aproximadas de 2, 7 e 12 m para os bambus analisados. Resultados aproximados foram obtidos por Amada et al. (1996) ao estudar o comportamento do bambu Phyllostachys edulis Riv. (mossô) com idade média de dois anos, no Japão. Para os comprimentos de colmos (z) de 2, 7 e 12 m, o autor obteve valores adimensionais de momento fletor de 0,70, 0,22 e 0,02, módulo de resistência de 0,61, 0,20 e 0,02 e tensão de flexão de 0,94, 0,80 e 0,48, respectivamente. Os resultados indicam que, apesar de cultivado em países diferentes e com idade entre dois e três anos, o bambu mantém características mecânicas bem próximas. Na Tabela 3, observa-se também como varia Guadua angustifolia plantado no Estado de São Paulo e no Estado do Rio de Janeiro.

Tabela 3. Momento fletor, Módulo de resistência e Tensão de flexão adimensionais, em três comprimentos ao longo do colmo (z), em função das espécies de bambu analisadas. Momento fletor

Módulo de resistência

( Mm )

( Zm )

Espécie de Bambu z(m) Phyllostachys h. pubescens Phyllostachys edulis Riv Phyllostachys bambusoides G. angustifolia - SP G. angustifolia - JB G. tagoara D. giganteus

2 0,76 0,70 0,82 0,82 0,82 0,78 0,78

7 0,30 0,22 0,44 0,44 0,58 0,29 0,31

12 0,06 0,02 0,17 0,02 0,18 0,04 0,04

2 0,44 0,61 0,71 0,73 0,65 0,78 0,70

7 0,20 0,20 0,41 0,24 0,47 0,46 0,45

12 0,05 0,02 0,15 0,10 0,13 0,20 0,18

Tensão de flexão ( b ) 2 0,91 0,94 0,86 0,83 0,68 0,90 0,99

7 0,82 0,80 0,79 0,53 0,67 0,60 0,62

12 0,68 0,48 0,86 0,15 0,75 0,22 0,21

4 CONCLUSÕES De acordo com os resultados obtidos, pode-se concluir que: a) os bambus têm um gradiente de estrutura hierárquica no diâmetro do colmo, espessura da parede e comprimento internodal; b) o diâmetro externo e a espessura da parede decrescem uniformemente e quase linearmente ao longo do comprimento do colmo; c) para todos os bambus estudados, o comprimento internodal atinge seu valor máximo próximo do ponto médio do comprimento total. Dendrocalamus giganteus apresenta maior comprimento internodal, maior diâmetro e maior altura total do que Guadua angustifolia e Guadua tagoara estudados; d) o momento fletor independe da espécie de bambu, enquanto que o módulo de resistência é função do diâmetro e da espessura da parede, variando de acordo com a espécie estudada; e) o momento fletor, módulo de resistência e tensão de flexão obtidos para Phyllostachys heterocycla pubescens (mossô) de São Paulo e do Japão, apresentaram valores muito próximos, indicando que, apesar de serem cultivados em países diferentes, o bambu mantém as mesmas características de rigidez; f) os resultados obtidos dão subsídios para engenheiros projetarem estruturas de bambu com maior confiabilidade.

No Anexo A são apresentadas fotos das obras construídas usando diretamente as informações geradas pelas pesquisas realizadas na PUC-Rio junto ao grupo GMTENC.

124


AGRADECIMENTOS O autor agradece aos colegas que contribuíram para realização dos ensaios, especialmente Alabanise Marinho Rodrigues, Msc, Eduardo Acha Navarro, Msc, Sergio Luís Vanderley, Eng., Luis Eustaquio Moreira, Dr., Conrado de Souza Rodrigues, Dr., Sylvia Pecegueiro Rosa, Msc e outros alunos e assistentes de pesquisas, além dos técnicos de laboratório que participaram ativamente da realização dos ensaios. Agradece também à FAPERJ, CAPES e CNPq, pelo apoio financeiro dado à pesquisa, e à direção do Jardim Botânico- RJ, por permitir a coleta dos bambus do parque. Agradecimento especial é dado a Ursula Schuler, que sempre está colaborando efetivamente em várias formas para finalizar os trabalhos desenvolvidos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AMADA, S.; MUNEKATA, T.; NAGASE, Y.; ICHIKAWA, Y.; KIRIGAI, A.; ZHIFEI, Y. The Mechanical Structures of Bamboos in Viewpoint of Funcionally Gradient and Composite Materials. Journal of Composite Materials. USA: SAGE Publications, v. 30, n. 7, p. 800-819, 1996. CULZONI, R. A. M. Características dos Bambus e sua utilização como Material Alternativo no Concreto. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - PUC-Rio, 1986. 134 p. GHAVAMI, K. (Ed.), Low-Cost and Energy saving Construction Materials. Rio de Janeiro: EXPED Expressão e Cultura, 1986. v. 2, 300 p. GHAVAMI, K. Application of bamboo as a Low-Cost Energy material in Civil Engineering. In: CIB/RILEM SYMPOSIUM MATERIALS FOR LOW INCOME HOUSING, 3., 1989, Mexico City. Anais... Mexico City: CIB/RILEM, 1989. p. 526-536. ________. Bambu: Um Material Alternativo na Engenharia. Revista Engenharia. São Paulo: Engenho Editora Técnica Ltda, n. 492, p. 23-27, 1992. ________. Ultimate Load Behaviour of Bamboo - Reinforced lightweight concrete beams. Cement and Concrete Composites. Netherlands: Elsevier, v. 17, n. 4, p. 281-288, 1995. ________. Cement Composites Reinforced With Bamboo and Vegetable Fibres. In: INTERNATIONAL CONFERENCE ON CONCRETE AND DEVELOPMENT, 2001, Tehran/Iran. Anais… Tehran: Building and Housing Research Center, 2001. v. 2, p. 445-461. GHAVAMI, K.; HOMBEECK, R. van. Application of Bamboo as a Construction Material. Part I – Mechanical Properties and Water repellent treatment of Bamboo; Part II – Bamboo Reinforced Concrete Beams. In: LATIN AMERICAN SYMPOSIUM ON RATIONAL ORGANIZATION OF BUILDING APPLIED TO LOW-COST HOUSING, 1981, São Paulo/SP. Anais... São Paulo/SP: IPT/CIB, 1981. v. 1, p. 49-66. ________. Application of Coconut Husk as a Low-Cost Construction Material. In: GHAVAMI, K. Low-Cost and Energy Saving Construction Materials. Rio de Janeiro: Envo Publishing Company, INC, v. 1, p. 53-77, 1984. GHAVAMI, K.; MOREIRA, L. E. Double-layer Bamboo Space Structures. In: PARKE, G. A. R.; HOWARD, C. M. (Ed.) Space Structures 4. London: Thomas Telford Services Ltd, 1993. v. 1, p. 573-581. GHAVAMI, K.; RODRIGUES, C. S. Composites with bamboo and Vegetable Fibres: a Contribution to a sustainable Development. In: INTERNATIONAL CONFERENCE ON NON-CONVENTIONAL CONSTRUCTION MATERIALS, 3., 2002, Hanoi/Vietnam. Anais… Hanoi: Construction Publishing House, 2002. p. 54-70. GHAVAMI, K.; TOLEDO FILHO, R. D. Desenvolvimento de Materiais de Construção de Baixo Consumo de Energia Usando Fibras Naturais, Terra e Bambu. Engenharia Agrícola. Campinas: Associação Brasileira de Engenharia Agrícola, v. 12, n. 1, p. 1-19, 1992. GHAVAMI, K.; ZIELINSKI, Z. A. Permanent Shutter Bamboo Reinforced Concrete Slab. Montreal/Canada: Department of Civil Engineering/Concordia University, 1988. Report BRCS1. HIDALGO-LÓPEZ, O. Bambú: su Cultivo y Aplicaciones en Fabricación de Papel, Construcción, Arquitetura, Ingeniería, Artesanía. Cali/Colombia: Estudios técnicos Colombianos, 1984. ICBO - Ac 162: Acceptance Criteria for Structural Bamboo. California: ICBO Evaluation Service, Inc., April, 2000. INBAR – The International Network on Bamboo and Rattan. International Model Building Code for Bamboo. JANSSEN, J. J. A. (Ed.), 1999. NAVARRO, E. H. A. Estudo teórico experimental a flexão de lajes de concreto reforçadas com bambu. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro/PUC-Rio, Rio de Janeiro, 2002.

125


ROSA, S. P. A. P. da. Análise teórica e experimental de Colunas de Concreto Armado com bambu. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro/PUC-Rio, Rio de Janeiro, 2002.

126


ANEXO A Algumas obras de bambu realizadas com a participação do GMTENC Dentre as várias obras já realizadas utilizando o bambu, pode-se citar: casa show construída inteiramente com bambu, incluindo as decorações internas e telhas, localizada em Itanhangá, cidade do Rio de Janeiro, construção esta gerenciada por Alessandra Debeux (Figuras 1a e 1b).

Figuras 1a e 1b. Fachada frontal e lateral da casa de bambu em Itanhangá/Rio de Janeiro.

Como pode ser visto na Figura 1a, coluna estrutural, paredes, portas, janelas, telhas e calhas são de bambu tratado. No litoral de São Paulo, o centro comunitário de Camburi é um modelo vivo da aplicação dos dados técnico-científicos gerados pelo grupo GMTENC sobre o uso do bambu, fibras vegetais, terra, além de outros materiais e tecnologias não-convencionais desenvolvidos durante quase 30 anos na PUC-Rio. Para criar a confiança da comunidade local que nem conhecia bambu e de nenhuma forma acreditava que o mesmo podia ser usado nas obras de engenharia, os recém formados jovens belgas, o arquiteto Sven Mouton, Electronic communication specialist, Hilde Duerink e o engenheiro civil Pieter Loose (que teve a participação no início de projeto no processo de dimensionamento e cálculo estrutural) projetaram e construíram uma ponte de bambu dentro de mata atlântica em Ubatuba, Estado de São Paulo. Após o término da construção da ponte e uso pela comunidade, os moradores começaram a acreditar no bambu como material de construção procurando aprender a tecnologia de uso do bambu e de terra. A segunda obra foi um moderno quiosque na praça da cidade, para a venda dos artesanatos, criado por um membro da comunidade. O projeto foi criado e discutido com os membros do GMTENC, devidamente dimensionado e, posteriormente, foi construído com a participação dos membros dessa comunidade. Após término deste projeto e formação de especialistas locais em uso de materiais e tecnologias nãoconvencionais, o povo local já começou a usar bambu, terra e pedra na construção da suas lojas e casas. Os projetos de construção foram efetuados em parceria entre a ONG belga Bamboostic, a Abmtenc (Associação Brasileira de Materiais e Tecnologias não-convencionais) e a PUC-Rio. Com o respaldo técnico-cientifico adquirido pelos jovens belgas e a criação de novos construtores locais, foi projetado o centro comunitário (Figura 2a). O centro comunitário do Camburi, obra toda realizada segundo os princípios da sustentabilidade, com a utilização de bambu, pedra, terra, cal e outros materiais e tecnologias não-convencionais, toma forma como resultado dos esforços empreendidos pela comunidade do Camburi com o apoio dos arquitetos Seven e Hilde em colaboração com o autor deste artigo possibilitando assim a execução desta obra (Figuras 2, 3 e 4).

Figuras 2a e 2b. Projeto digital do Centro Comunitário do Camburi baseado nos princípios de sustentabilidade.

127


Figuras 3a, 3b e 3c. Centro comunitário de Camburi, no município de Ubatuba.

A Figura 3a mostra a construção de quiosque usando tecnologia de bambu e terra, método pau-apique aperfeiçoado, além de pedras locais. A construção está coberta com teto de palha local. Conforme a Figura 3b, a estrutura de parede de terra utiliza solo estabilizado local compactado, popularmente denominado de “taipa de pilão”. Participaram da construção dessa estrutura os arquitetos Márcia Marcul e Sergio Prado, além de contribuir na construção de algumas paredes utilizando petes de garrafas de refrigerantes de dois litros. A Figura 3c mostra a prova de carga de treliça por membros da comunidade, após a colocação parcial de telhas cerâmicas sem a amarração das peças de ligação. As Figuras 4a, 4b e 4c mostram as três etapas da construção do centro comunitário.

Figuras 4a, 4b e 4c. Centro comunitário de Camburi, no Município de Ubatuba.

Com visão ecológica e sustentável, vários projetos de arquitetura estão sendo desenvolvidos em parceria com outras universidades do Brasil e exterior. Atualmente, um projeto de doutorado do arquiteto Marko Brajovic em colaboração com a Universidade Técnica de Cataluña, em Barcelona/Espanha, está em fase de desenvolvimento.

Figuras 5a e 5b. Nano arquitetura, estruturas ecológicas e sustentáveis para cidades do interior.

Os princípios do desenvolvimento destes projetos são baseados em nano arquitetura. Os projetos iniciais foram desenvolvidos em forma de 3D digital cujas imagens são apresentadas na Figura 5a. O objetivo principal desta iniciativa é gerar projetos utilizando materiais e tecnologias não-convencionais para construções rurais e pequenas cidades. Assim, pode-se prevenir a imigração dos trabalhadores rurais de cidades pequenas do interior para megalópoles.

128


6.3 PANORAMA DA CONSTRUÇÃO CIVIL COM BAMBU NO RIO GRANDE DO SUL A PARTIR DE UM COMPARATIVO DOS CUSTOS DE CONSTRUÇÃO DE BAMBU E MADEIRA Alex Maltese Klein1, André Gustavo Costa Chaluppe2, Diego de Castro Fettermann3, Felipe Caron4

Resumo Diante da perspectiva de incremento da utilização do bambu em substituição à madeira e da carência de dados sobre o material, este trabalho busca levantar e comparar valores entre as construções de madeira e de bambu na cidade de Porto Alegre/RS. A partir de um estudo de caso considerando um único projeto, seis distintos construtores foram consultados. Foram levados em conta somente os custos referentes à mão de obra e matéria-prima utilizadas. Os resultados preliminares demonstram uma grande variação dos valores para construções em bambu e um padrão para os valores das construções em madeira. Os dados obtidos sugerem os seguintes aspectos: a especificidade do conhecimento da carpintaria em bambu e a carência no fornecimento dessa matéria-prima em Porto Alegre. Palavras-chave: Bambu. Construções em Bambu. Custos do Bambu. Abstract Ahead the increasing perspective of bamboo usage in substitution of wood and the lack of information about this material, the present work searchs to raise and compare values between the bamboo and wood constructions in the city of Porto Alegre/RS. In a study case that considered only one project, six distinct constructors had been consulted. It was considered only the referring costs of used labour and raw material. The preliminary results demonstrate a big variation in the values for bamboo constructions and a pattern for the wooden ones. The obtained data suggest the following aspects: the specificity of the knowledge of the carpentry in bamboo and the lack in the supply of this material in Porto Alegre. Keywords: Bamboo. Bamboo Constructions. Bamboo Costs.

INTRODUÇÃO O Brasil é um país de dimensões continentais, assim como a diversidade de espécies de bambu encontradas em seu território. Segundo Filgueiras e Santos-Gonçalves (2004), o Brasil é o país com a maior diversidade de espécies de bambu das Américas. No entanto, dentro deste contexto de abundância de matéria-prima, encontramos um número muito reduzido de cientistas, empresas e ongs desenvolvendo trabalhos e pesquisas na área (PNF, 2005). Sabendo-se das potencialidades do bambu e principalmente da sua capacidade de substituição da madeira em todas suas aplicações ( HIDALGO-LOPEZ, 2003), tornase incompreensível a falta de uma política nacional. Não só países do oriente, como a China - que movimenta bilhões de dólares/ano em exportações de produtos (ZEHUI, 2001) - estão economicamente focados no bambu. Países vizinhos como a Costa Rica e Colômbia se encontram em estágios avançados de desenvolvimento de tecnologias relacionadas ao bambu. A América Latina precisa pesquisar muito e desenvolver produtos baseados nos seus bambus nativos que realmente demonstrem vantagens ou complementem os já existentes produtos chineses que dominam o mercado internacional ( BECKER, 2004). Apesar das grandes atribuições do bambu como sendo uma planta de rápida renovação e ciclo regular, de fácil estabelecimento, manejo e colheita, de múltiplas utilidades e de grande capacidade de captação de carbono da atmosfera, enquanto planta, ele não é encontrado disponível no Brasil na quantidade e situação esperadas. Suas características, que pressupõem grandes cultivos, programas de pesquisa e uso, parecem estar sendo negligenciadas ou ignoradas pela iniciativa privada e, preocupantemente, pelo poder público. No extremo sul do Brasil, a capital do estado do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, não vive um contexto diferente do cenário brasileiro. Os principais motivos desta situação seriam: a carência de estudos científicos, muitas vezes não articulados em programas de pesquisa mais abrangentes, e a disponibilidade de matéria-prima pronta para utilização que, além de escassa, por muitas vezes é trazida de outros estados como Paraná e São Paulo. Outro aspecto significativo é a falta de entidades representativas para agregar os profissionais que trabalham com bambu. 1 Agabambu. E-mail: (bambuzeiro@hotmail.com). 2 FAU/UFRGS. E-mail: (junzichaluppe@yahoo.com). 3 PPGEP/UFRGS. E-mail: (diego@producao.ufrgs.br). 4 PPGEO/UFRGS. E-mail: (caronfelipe@yahoo.com).

129


Dentro desta realidade de falta de organização e informação, encontram-se algumas exceções. São tentativas ainda isoladas de organização e disseminação de conhecimento, como o grupo de discussão Bambu-Brasil, a Associação Catarinense do Bambu (BAMBUSC) e a Associação Gaúcha do Bambu (AGABAMBU). O presente trabalho visa contribuir para o desenvolvimento do conhecimento necessário para a utilização do bambu na construção civil. Em uma análise de caso, foram levantados os valores para as construções que utilizam como matéria-prima o bambu em comparação com a madeira. A partir dessa análise, foi possível somar informações para traçar um panorama da construção civil com bambu no Brasil.

1 METODOLOGIA O estudo se concentra na análise do caso de um projeto de um pergolado coberto. A construção terá o valor da matéria-prima e da mão de obra quantificada por seis diferentes profissionais reconhecidos de Porto Alegre, três utilizarão madeira e o restante, bambu. Entenda-se o critério “profissional reconhecido” como profissional atuante na área e portador de forte relação de confiança com seus contratantes – arquitetos e paisagistas. Visto que as características dos dois materiais são diversas, tais como: cargas admissíveis e detalhes construtivos, o projeto do pergolado coberto (Figuras 1 e 2), primou pela simplicidade. Não é do interesse do presente estudo avaliar as especificidades projetuais, nem tampouco as vantagens de utilização dos materiais segundo suas propriedades físicas. Dessa forma, buscou-se alcançar uma homogeneidade das soluções construtivas utilizadas. O projeto dimensionou os elementos estruturais segundo critérios de proporção, tentando manter o mesmo porte da estrutura tanto em madeira quanto em bambu. Tendo a variável projetual controlada, o estudo foi concentrado nas variações dos valores de matéria-prima e mão de obra.

Figura 1. Pergolado em bambu coberto com policarbonato – planta baixa e vista lateral.

Figura 2. Pergolado em madeira coberto com policarbonato – planta baixa e vista lateral.

130


A seleção dos materiais se deu sob um critério de recorrência de utilização por parte dos profissionais selecionados. No caso da madeira, as espécies mais usuais em Porto Alegre para este tipo de construção são a grápia (Apuleia Ieiocarpa), a itaúba (Mezilaurus itauba) e o ipê (Tabebuia serratifolia). No caso do bambu, foram selecionados o mossô (Phyllostachys pubescens), o gigante (Dendrocalamus giganteus) e o guadua (Guadua angustifolia), muito embora, posteriormente, a partir dos orçamentos, tenha sido verificado que nem todos os fornecedores tinham acesso a todas estas espécies. O critério de escolha para as espécies de bambu passou então a ser não mais o da recorrência e sim o da adequação. Apesar de este estudo, como já foi dito anteriormente, não ter como objetivo principal avaliar a utilização dos materiais segundo suas propriedades físicas, é sabido que as espécies de bambu, assim como as de madeira, apresentam características diferentes quanto à durabilidade, resistência, trabalhabilidade e aparência, que resultarão em patamares de valor claramente diferentes.

2 RESULTADOS E DISCUSSÃO DO EXPERIMENTO Nesta etapa serão apresentados os valores levantados junto aos fornecedores de matéria-prima e de mão de obra. Abaixo, segue a tabela com os valores orçados para execução dos pergolados em madeira (Tabela 1). Tabela 1. Tabela com valores para fornecimento de mão de obra e matéria-prima para execução de pergolado em madeira. grápia material

mão obra

itaúba total

material

mão obra

total

fornecedor1 R$ 1.050

R$ 780

R$ 1.830 R$ 1.130

R$ 780

R$ 1.910 R$ 1.380

R$ 780

R$ 2.160

fornecedor2 R$

985

R$ 850

R$ 1.835 R$ 1.025

R$ 850

R$ 1.875 R$ 1.440

R$ 850

R$ 2.290

fornecedor3 R$

815

R$ 700

R$ 1.515 R$

R$ 700

R$ 1.630 R$ 1.120

R$ 700

R$ 1.820

930

mão obra

ipê total

material

Nesta tabela é possível constatar que não há diferença nos valores de mão de obra de um mesmo fornecedor, independentemente do tipo de madeira utilizada. Embora sabidamente a grápia seja uma madeira mais macia e fácil de trabalhar que as demais, essa diferença não foi traduzida em valores. A variação encontrada entre o maior e o menor valor da mão de obra entre os três fornecedores foi de 17,6%. Dentre os vários fatores que podem influenciar essa variação, pode-se destacar uma possível diferença de qualificação entre os fornecedores. Quanto à matéria-prima, identifica-se uma significativa variação nos valores obtidos. A variação entre o maior e o menor valor do material grápia é de 18,5%, enquanto que, no caso da itaúba, é de 17,7%, e no do ipê, de 18,8%. Apesar de essas variações serem consideráveis, elas apresentam certa uniformidade. As variações e o próprio equilíbrio das mesmas se devem principalmente à utilização de diferentes margens de lucro pelos fornecedores, visto que as matérias-primas são bastante comuns e possuem seu preço bastante regular devido à grande oferta e procura no mercado. Como consequência das variações identificadas no material e na mão de obra, verificam-se resultados semelhantes para os valores totais. A seguir, estão apresentados os valores referentes a material e mão de obra para o pergolado em bambu (Tabela 2). Tabela 2. Tabela com valores para fornecimento de mão de obra e matéria-prima para execução de pergolado em bambu.

fornecedor1 fornecedor2 fornecedor3

material R$ R$ 360 R$ 450

mossô mão obra R$ R$ 300 R$ 600

total R$ R$ 660 R$ 1.050

gigante material mão obra R$ R$ R$ 460 R$ 300 R$ 680 R$ 700

total R$ 1.300 R$ 760 R$ 1.380

guadua material mão obra R$ R$ R$ R$ R$ 750 R$ 800

total R$ R$ R$ 1.550

Nas lacunas da Tabela 2 pode ser verificada ausência de valores. Grande parte dos fornecedores (2/3) não apresentou orçamento para a estrutura em todas as espécies de bambu solicitadas. Por outro lado, a Tabela 1 revela que o mesmo não acontece com os fornecedores de madeira, que orçaram a estrutura segundo todos os dados solicitados. Com isso, já é possível verificar uma maior disponibilidade do fornecimento da madeira em relação ao bambu. Dentre as espécies de bambu relacionadas, apenas o

131


gigante (Dendrocalamus giganteus) foi orçado por todos fornecedores, enquanto o guadua (Guadua angustifolia) foi orçado somente por um. Outro resultado interessante, é que as lacunas encontradas na Tabela 2 não aparecem somente em função de não obtenção do material, mas também pela não decomposição do preço total em mão de obra e matéria-prima. Essa característica se deve principalmente à dificuldade de fornecimento do bambu em Porto Alegre, onde as empresas que fornecem a matéria-prima são desconhecidas do público em geral, tornando-se uma informação específica de cada fornecedor de mão de obra. Esse fornecedor opta, então, por não decompor o valor ou simplesmente colocar um valor com uma grande margem de lucro, pois dificilmente o cliente terá parâmetros para comparar os preços de material. Outro fator a ser considerado neste aspecto é que o fornecedor de mão de obra de bambu tem de ter sua matéria-prima em estoque. As empresas fornecedoras de matéria-prima não estão próximas de Porto Alegre, e obras com quantidades pequenas de material empregado, como o caso em análise, tornam inviáveis os custos de frete somente para esta pequena quantidade. Desconsiderando os valores não informados pelo fornecedor, foi obtida uma variação de 20% nos valores do material mossô (Phyllostachys pubescens) e 32% nos valores do gigante (Dendrocalamus giganteus). Como pode ser visto, foi encontrada uma situação bem diversa da encontrada para a madeira, variações de 18,5%, 17,7% e 18,8%. As variações, além de maiores, não estão em uma mesma faixa de porcentagem. Analisando os dados referentes à mão de obra, também sem levar em conta os valores não informados pelo fornecedor, foram obtidas variações ainda maiores – 50% para a mão de obra com mossô (Phyllostachys pubescens) e 57% para a mão de obra com gigante (Dendrocalamus giganteus). Apesar de desconsiderar os dados não informados para o cálculo das variabilidades, pode-se interpretar as lacunas de informação, junto com os dados anteriores de grande variação na mão de obra, como afirmações da inexistência de uma regra de mercado para este tipo de construção com bambu em Porto Alegre. A comparação dos valores totais segue com indicativos semelhantes aos anteriores. Para o pergolado construído com bambu mossô (Phyllostachys pubescens), existe uma variação, entre o menor e o maior valor fornecido, de 37%. Para o gigante, a variação é de 45%. Para o guadua (Guadua angustifolia), como somente um fornecedor dispunha do material, foi impossível fazer a comparação. Esses valores reafirmam os argumentos expostos anteriormente de inexistência ou baixa regulação do mercado, possibilitando grandes variações de valor e até mesmo exclusividade de fornecimento. Para reforçar visualmente os dados de variação de valor total para as construções discutidos e expostos anteriormente, bem como as diferenças nos cenários de uso da madeira e do bambu na construção civil em Porto Alegre, segue abaixo um gráfico comparativo (Figura 3). No gráfico referente aos valores para pergolados em madeira, nota-se uma homogeneidade de resultados com variações de 15 a 20% entre os maiores e menores valores totais (material + mão de obra) para as mesmas espécies de madeira. Enquanto que, no gráfico para os valores de construções em bambu, percebe-se uma grande variação – 37% para os valores totais com mossô (Phyllostachys pubescens) e 42% para os valores totais com gigante (Dendrocalamus giganteus).

Figura 3. Gráfico comparativo dos valores totais encontrados para os pergolados.

Comparando agora os valores totais de pergolados em madeira e em bambu, chega-se a dados interessantes. Alguns fornecedores de bambu têm preços próximos aos de fornecedores de madeira para um mesmo serviço. O fornecedor de bambu 3 usando guadua (Guadua angustifolia), por exemplo, apresentou valores apenas 15% menores que o fornecedor de madeira 3 usando ipê. Considerando, com

132


base nos relatos dos próprios fornecedores, o ipê como a melhor madeira dentre as 3 escolhidas para o estudo, e o guadua (Guadua angustifolia) como o melhor entre os bambus, é realmente uma diferença muito pequena. A proximidade de valores é espantosa em uma primeira análise, fora do nosso contexto regional, pois o bambu possui menos massa que a madeira e consome menos energia para ser produzido (JANSSEN, 1981). Além disto, renova-se com muito mais rapidez que a madeira. Com os dados colhidos nesta pesquisa, encontra-se uma explicação para tal aproximação de valores. Devido à grande exclusividade do mercado de mão de obra e material, a construção em bambu é exótica, ou melhor, atípica e esta exclusividade é traduzida em valores superiores. Analisando agora o gráfico das contribuições de mão de obra e material na formação do valor final dos pergolados em madeira e bambu (Figura 4), chega-se a um novo dado. O percentual de contribuição da mão de obra em pergolados de bambu é superior àquele encontrado na mesma situação em relação à madeira. O valor percentual médio da contribuição de mão de obra para o valor do pergolado em madeira é de 41%, enquanto que o valor percentual médio desta contribuição para o bambu é de 49%. O caso mais extremo é o do fornecedor 3 para bambu mossô (Phyllostachys pubescens), onde a contribuição percentual de mão de obra chega a 57% do valor final da obra. Para madeira, a maior contribuição de mão de obra encontrada foi de 46% do valor total para os pergolados em grápia, que foi apresentada pelos fornecedores 2 e 3.

Figura 4. Gráfico comparativo das contribuições de valor de material e mão de obra no preço final de pergolados em madeira e bambu.

Interpretando estes dados, chega-se a algumas hipóteses. A mão de obra do bambu representa uma grande fatia do valor final, principalmente se comparada à mão de obra da madeira, por tratar-se de um novo ofício, a carpintaria em bambu. Novos nichos de trabalho agregam conhecimentos específicos que, principalmente por serem inovadores, permitem uma valorização do conhecimento operacional. Outro fator interessante é que a maioria dos fornecedores, trabalhando tanto em bambu quanto em madeira, considerou o valor da mão de obra o mesmo, independentemente do material empregado. Assim, a grápia, teoricamente a madeira mais fácil de ser trabalhada dentre as três escolhidas para o estudo, acabou tendo a maior contribuição de mão de obra na composição do valor final dos pergolados em madeira. Além deste aspecto da trabalhabilidade do material, nota-se que a maior parte dos fornecedores não leva em conta o valor do material empregado na composição do valor de mão de obra, ou seja, não é considerado o risco de perda de material durante a execução.

3 CONCLUSÃO Ao se tentar traçar um panorama da construção com bambu em Porto Alegre através deste simples estudo comparativo com estruturas em madeira, encontra-se um cenário de falta de informação total. O que mais preocupa é que este contexto provavelmente se repete em maior ou menor escala nas demais regiões do Brasil. Há pouca matéria-prima de qualidade disponível para uso. Existem pouquíssimos profissionais que trabalham com o material na área da construção civil. Os profissionais que trabalham têm suas informações obtidas através de redes criadas na grande rede mundial de computadores ou bibliografia importada, e não nas universidades de engenharia civil e arquitetura. As normas ou padronizações de materiais e procedimentos técnicos inexistem. Ao mesmo tempo em que temos este lado do cenário, seguidamente acompanhamos manchetes e reportagens na mídia propagandeando o uso do bambu. Cria-se então, cada vez mais, uma expectativa e procura por artigos de bambu por parte do público em geral. A procura vai desde pequenos objetos de

133


decoração a construções com bambu. O bambu, por não ter uma cultura suficientemente desenvolvida, ao invés de atingir sua possível plenitude de utilização, torna-se artigo de luxo. Um outro reflexo deste contexto de aparição do bambu na mídia sem possibilidade de suprimento da demanda é a utilização do bambu sem o devido conhecimento, na prestação de serviço. Seguindo uma linha de raciocínio: a notícia sobre bambu existe; as pessoas se interessam, querem adquirir os produtos; a matéria-prima é escassa; os profissionais também, além de cobrarem caro pelo seu justo conhecimento específico – surge, então, o profissional desqualificado. Tendo a visão da oportunidade de trabalho e da matéria-prima aparentemente adequada e abundante, lança-se a prestar serviços sem o devido conhecimento e qualificação, cobrando um preço baixo. Os resultados deste processo já descrito por Stamm (2004) na Colômbia, podem inclusive colocar em risco vidas, assim como comprometer o trabalho de profissionais sérios. Apenas a título de esclarecimento, já que anteriormente foi dito que a matéria-prima era escassa e neste último parágrafo usou-se a expressão material adequado e abundante: existem muitos bambus no Brasil – o que falta são espécies adequadas (muitas foram praticamente extintas) e processos adequados de beneficiamento e utilização; enfim, uma política nacional de desenvolvimento desta atividade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BECKER, M.; HELD, C.; VON REITZENSTEIN, E.; STATZ, J. Bamboo Markets in Western Europe: Perspectives for Guadua Products. In: INTERNATIONAL SYMPOSIUM ON GUADUA, 2004, Pereira. Anais… [S.l.: s.n.], 2004. BYSTRIAKOVA, N.; KAPOS, V.; LYSENKO, I. Bamboo Biodiversity. United Kingdom: UNEPWCMC/INBAR, 2004. FILGUEIRAS, T. S.; SANTOS-GONÇALVES, A. P. A checklist of the basal grasses and bamboos in Brazil (Poaceae). Bamboo Science & Culture. Albany: American Bamboo Society, v. 18, p. 7-18, 2004. HIDALGO-LÓPEZ, O. Bamboo: the gift of the gods. Bogota: Oscar Hidalgo-López Editor, 2003. 553 p. JANSSEN, J. J. A. Bamboo in Building Structures. Tese (Doutorado) - Eindhoven University, Eindhoven/Netherlands, 1981. JUDZIEWICZ, E. J.; CLARK, L. G.; LONDOÑO, X.; STERN, M. J. American Bamboos. Washington/D.C.: Smithsonian Institution Press, 1999. 392 p. PNF. I Reunião de Avaliação e Perspectivas do Uso Sustentável do Bambu no Brasil. Brasília: Programa Nacional de Florestas, 2005. STAMM, J. Eco – Ingeniería con Guadua. 2004. VILLEGAS, M. New Bamboo: Architecture and Design. Bogotá: Villegas Editores, 2003. ZEHUI, J. Standards on Bamboo Utilization and International Trends. Sichuan/China: INBAR, 2001.

134


6.4 BAMBU NO BRASIL: UMA MATÉRIA-PRIMA CELULÓSICA E ENERGÉTICA1 Antonio Luiz de Barros Salgado2

Resumo Nos países da Ásia, África e América do Sul o bambu tem sido utilizado há séculos como importante matéria-prima, sendo usado principalmente na alimentação, como material de construção, energético, celulose, papel e outras variadas utilizações. No Brasil, sua utilização é frequente e as espécies exóticas mais empregadas são: Bambusa vulgaris, Bambusa vulgaris var. vittata, Bambusa tuldoides, Dendrocalamus giganteus e Phyllostachys spp. O potencial do bambu, como matéria-prima industrial se deve principalmente a suas características agronômicas e tecnológicas. O objetivo deste trabalho é apresentar alguns dados relacionados com a produção de fibras celulósicas e seu uso como matéria-prima energética. Desde o ponto de vista agronômico, uma plantação de bambu é economicamente interessante por tratar-se de um cultivo perene no qual seus talos se reproduzem assexuadamente ano após ano, sem necessidade de replantio, com grande rendimento anual por unidade de área. Outra vantagem do bambu está relacionada com a rapidez do crescimento dos seus colmos, os quais não representam elementos anatômicos no seu sentido radial e tangencial, somente crescem em altura, diferente das madeiras. Em espécies tropicais como nos gêneros Bambusa, Dendrocalamus, Guadua, etc os colmos alcançam suas dimensões máximas em 6 meses de idade. Do ponto de vista tecnológico, os colmos do bambu, por estarem constituídos por fibras celulósicas circundadas por um tecido parenquimatoso uniforme e rico em substâncias de reserva, podem ser utilizados como matériaprima para produzir e obter: a) celulose e papel, pelo aproveitamento do tecido fibroso em forma de fibras individualizadas; b) álcool etílico, pela formação de açúcares obtidos pela hidrólise dos carboidratos; c) biomassa, pela queima de cavacos ou pedaços de colmo; d) carvão. Considerando a espécie Bambusa vulgaris Schrad., os rendimentos em fibras celulósicas e etanol foram de 495 kg de fibras celulósicas e 136 litros de etanol, a partir de 1 tonelada de bambu seco. O poder calorífico superior dos bambus apresenta uma média de 4.543 kcal/kg, enquanto o carvão apresenta resultados superiores aos da madeira, cuja média é de 7.868 kcal/kg. Palavras-chave: Bambu. Papel. Energia. Abstract For centuries the bamboo has been used as an important raw material in many tropical countries, mainly in Asia, South America and Africa. In these countries the bamboo has been used simulteneously as food, building materials, energy source, pulp and paper and in many other fields. In Brazil, the bamboo utilization is not so high and the natives species are not well known. The most useful species are the foreigns species like: Bambusa vulgaris, Bambusa vulgaris var. vittata, Bambusa tuldoides, Dendrocalamus giganteus and Phyllostachys sp. The only utilization for bamboo in our country is to produce pulp and paper, particularly in the northeast region. The objetive of this paper is to present some data regarding the combined production of cellulosic fibers and ethanol or cellulosic fibers and starch from bamboo culm (Bambusa vulgaris Schrad). The yields of cellulosic fibers and ethanol were determined in shreddered chips after treatment with diluted sulphuric acid solution. For starch extraction it was used laminated chips with reduced trickness (0.5mm). The average combined results obtained from a ton of dry chips were about 495 kgh of cellulosic fibers (cellulose) and 136 liter of ethanol or the same cellulosic fibers quantity and 64 kg of starch. Bamboo biomass superior caloric power is: media 4.543 kcal/kg. Bamboo charcoal presents results superior to wood charcoal: media a 7.868 kcal/kg. Keywords: Bamboo. Paper. Energy.

1 Trabalho apresentado no Seminário Nacional para a Estruturação da Rede de Pesquisas e Desenvolvimento

do Bambu. Universidade de Brasília – Brasília – DF – dias 13,14 e 15 de setembro de 2006. 2 Pesquisador Científico (IAC) e Consultor Técnico. E-mail: (antoniosalgado@uol.com.br).

135


INTRODUÇÃO Ao iniciarmos este trabalho, abordaremos algumas considerações a respeito do BAMBU, uma gramínea tão importante para o ser humano em toda sua existência, que chega até a ser adorado como um Deus em determinadas regiões do nosso mundo. Os bambus são considerados uma das mais importantes subfamílias das gramíneas, reúnem um total de 80 – 90 gêneros e de 1.000 – 1.300 espécies distribuídas em todos os continentes, excluindo a Europa, que não tem espécies nativas. Na região amazônica são encontradas florestas nativas de bambu, cobrindo uma área de 180.000 km², metade no Brasil. Sua ocorrência natural existe normalmente em associação com florestas nativas em proporções que variam de 20 a 80%. No mundo, as florestas de bambu cobrem uma área de 14 milhões de hectares e geralmente um comércio mundial da ordem de US$ 4,5 bilhões. A FAO define como floresta natural ou seminatural “o sistema ecológico com o mínimo de 10% de cobertura vegetal e/ou de bambu, geralmente associado com a flora e fauna em condições naturais de solo e não sujeito às práticas agrícolas”. No Primeiro Relatório Nacional para a Convenção sobre Diversidade Biológica do Brasil, são referidos tipos de vegetação, área absoluta e relativa dos ecossistemas brasileiros considerados para o levantamento das Unidades de Conservação, onde a floresta de bambu é enquadrada no ecossistema Amazônico. Na classificação da vegetação do Brasil, a floresta de bambu se enquadra no tipo de Floresta Ombrófila Aberta (floresta de transição), que apresenta quatro fisionomias: cipoal (floresta de cipó), cocal (floresta de palmeiras) bambuzal (floresta de bambu) e sororocal (floresta de sororoca). Esta última ocupa a maior parte do território rondoniense, principalmente a região central, norte, sul e leste. O Bambu é um produto florestal não madeireiro, de rápido crescimento, com comprimento de fibras superior ao do Eucalipto. O uso de produtos florestais não madeireiros é tão antigo como a civilização humana, e tem sido a principal fonte de alimento, forragem, fibra, medicina, cosméticos, etc. Atualmente 80% da população dos países em desenvolvimento usam os produtos florestais não madeireiros na saúde e no atendimento a suas necessidades nutricionais. As fibras do Bambu têm características ideais para a fabricação de papel e celulose de fibras longas, escassas no mundo, ideais para a fabricação de embalagens biodegradáveis com alta resistência. Devido a estas qualidades, a Philips Lighting, líder mundial em iluminação, investiu 1 milhão de dólares para fabricar embalagens com fibras de bambu. A floresta de bambu exerce um papel vital na preservação da biodiversidade e tem um potencial de purificação dos resíduos orgânicos, devido a sua alta taxa de crescimento e colheita de ciclo curto. Além disso, é uma fonte de material para mobília, construções, polpa, bioenergia, alimentação e medicina natural. Quando se trata de proteger o solo da erosão, o sistema radicular fasciculado e bastante extenso permite ser uma eficiente proteção. Devido à morfologia dos seus rizomas e ao sistema de redes nos primeiros 50 – 100 cm do solo, facilitam a conservação do mesmo, a contenção de ladeiras, e a prevenção da erosão produzida pelo escoamento superficial, ventos fortes e desmoronamento. A presença de suas folhas e bainhas no solo, além de auxiliar na preservação deste, ajuda no seu enriquecimento e no combate às ervas daninhas, conserva a umidade, evita a incidência de raios solares, assim como o impacto dos pingos de chuva diretamente sobre o terreno. Por outra parte, sua presença ajuda a regular o meio ambiente como protetora das águas, do solo, e por acolher a fauna. Desde o ponto de vista da Conservação Ambiental, e nas florestas comerciais ou reflorestamento com fins industriais, o cultivo com bambu agride menos o solo e meio ambiente do que o cultivo de Eucalipto. Cresce muito mais rápido do que árvores e é colhido em ciclos, o que faz com que haja sempre alguma quantidade de bambu em pé, ao contrário do corte de árvores, que, de maneira típica, deixa faixas de terra desnuda em seu rastro. Estudos de quantificação de CO2 atmosférico realizados no Japão com o bambu, têm determinado níveis de captura na ordem de 1,75 toneladas por ha/ano. Nas florestas nativas, as perturbações dos bosques por causas naturais ou antropogênicas podem permitir que algumas espécies aumentem e outras diminuam. Muitas espécies de bambu, e gramíneas, que são fonte de fibras, são favorecidas porque são plantas exigentes de luz, e estas populações aumentam, como resposta aos distúrbios ocasionados, protegendo rapidamente o solo da erosão como nenhum outro vegetal seria capaz de realizar. Na região Amazônica e no caso da Guadua spp., a distribuição do bambu segue a sincronia dos eventos de florescimento e morte. Segundo esses eventos, o bambu pode invadir, ou árvores podem sucessivamente se regenerar para formar uma cobertura de floresta fechada sem bambu. Esse fator aparentemente negativo não pode ser aplicado em floresta comercial, já que esta é propositadamente

136


monocultura, que tem por objetivo maximizar a utilização de uma determinada área, evitando a exploração e impacto na floresta nativa e, assim, permitindo a sua preservação. Novas maneiras de pensar estão fazendo com que o bambu seja utilizado em tudo, do bastão de baseball aos armários de cozinhas, através da tecnologia chamada “flat pack” (pacote achatado). Esta técnica, que consiste em retirar pequenos segmentos do bambu para produzir peças grandes, foi utilizada durante séculos no processamento da madeira. Os pisos de bambu são populares entre os ocidentais preocupados com o meio ambiente, inconformados com a possibilidade da utilização de madeiras tradicionais, como o carvalho e bordo. Na área social, e graças às mil e uma qualidades que o bambu oferece, cria a possibilidade do emprego de mão de obra urbana e rural, como é o caso do Programa de Desenvolvimento do Ciclo do Bambu no Brasil presente em sete Estados (Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Alagoas, Mato Grosso do Sul, Distrito Federal, Espírito Santo e Paraná), onde cinco mil pessoas de baixa renda produzem brinquedos educativos, maletas, bolsas, acessórios, ventiladores, jogos, e móveis de baixo custo e altíssima qualidade. Em 2001, o SEBRAE/AL, despertou a atenção para a utilização do bambu, pela capacidade de gerar empregos adequados no nível da mão de obra existente no Estado, por seus múltiplos usos e por sua notável contribuição para a melhoria das condições ambientais da região. Ao todo, cerca de 350 pessoas foram capacitadas nas Bambuzerias em três cidades. Em 2003, com o aumento da demanda, foi criado o Instituto do Bambu, tendo como objetivo desenvolver bases técnicas e científicas relacionadas ao uso do bambu. Nas florestas cultivadas comercialmente no Nordeste do Brasil, a geração de emprego é contínua e não sazonal como ocorre com a cana-de-açúcar. O Bambu é cultivado em todo tipo de terreno, e colhido em grande parte manualmente, ao contrário do corte da madeira, sendo desnecessário o emprego de maquinaria pesada. Esta cultura tornase vantajosa nas áreas declivosas, em relação à cana-de-açúcar que não é competitiva em terrenos íngremes, pelos seus elevados custos. Por ocasião do seu plantio, ele exige, além da formação das mudas em viveiro, preparo do solo, abertura de covas e fertilização do terreno. Depois, exigirá um coroamento e tratos constantes para impedir a concordância com o mato, roça manual e mecânico, conforme a declividade do terreno. A partir do 3º ano, é feita a colheita. A plantação deverá ser submetida a tratos culturais, roçagem, fertilização, combate às pragas (cupim), e deverá ser sempre mantido limpo. Assim, podemos observar que a plantação de bambu exige cuidado constante no plantio, trato, colheita, corte e beneficiamento, isto é, em todas as operações, além do pessoal envolvido com o transporte, fábrica, comercialização, escritórios, viveiros, etc. Também podemos citar seus usos na alimentação, construção civil, no paisagismo, e com fins medicinais, entre outros. Estudos comprovam que existem mais de 1.500 usos documentados desta planta. Na atualidade, 2,5 bilhões de pessoas, quase a metade da humanidade, utilizam no seu cotidiano produtos derivados do bambu. O corte do bambu não prejudica a floresta, pois dentro de pouco tempo ele se recupera, permitindo colheitas seletivas anuais ou de corte raso total entre 3 – 5 anos, contra 10 – 20 anos na maioria das árvores. Além disto, tolera extremos na precipitação: em Ibimirim/PE, observamos bambu, na maior seca, em pleno desenvolvimento e excelente aspecto. O bambu protege o ambiente e o ar que nós respiramos, e seus campos liberam 4 vezes mais oxigênio que campos de árvores. Chega a sequestrar até 12 toneladas de dióxido de carbono do ar por hectare de bambu, protege o meio ambiente e, no meio de suas plantações, apresenta uma intensidade de luz mais baixa e protege o solo do encontro dos raios ultravioleta. O BAMBU não é uma planta invasora. Ele é rústico, apresenta poucas pragas e doenças, e se adapta às mais diversas adversidades climáticas. O BAMBU jamais deve ser considerado como uma PRAGA, isto ocorre porque as florestas nativas de bambu, em geral compostas por espécies do gênero Guadua, impedem a devastação das matas pelo homem. A destruição da mata e do bambu se prende a interesses comerciais com a finalidade de transformar a área ocupada em PASTAGEM e AGRICULTURA. Já a ser considerado como uma planta invasora, o problema se prende no caso acima na possibilidade de rebrota do bambu arrancado, ou então da exploração de espécies de bambu do Grupo dos ALASTRANTES, plantados em local inconveniente ou indesejável. Convém lembrar que as espécies alastrantes exóticas são predominantemente de clima temperado e que dificilmente se desenvolvem bem em clima tropical como o nordeste e norte do Brasil; casos do Maranhão, Piauí, Pernambuco e Paraíba, onde não se desenvolveram quando levados para os bancos de germoplasma locais.

137


O BAMBU é muito utilizado em numerosos ramos da ciência do trabalho humano por sua rapidez de crescimento, sustentabilidade, seu caráter nutritivo, resistência, flexibilidade, harmonia com o meio ambiente, entre outras importantes características. Após amplos estudos, o Grupo Industrial João Santos, em conjunto com o Instituto Agronômico de Campinas – IAC – SP, também descobriu que o bambu poderia ser bastante útil na produção de papel cartão e de papel Kraft. Utiliza-se essa planta por suas novas características para produção de celulose, além de o bambu ser a matéria-prima mais indicada para a região nordeste. O bambu produz celulose de fibra longa diferentemente do eucalipto, que é composto por fibras curtas. As fibras do bambu são longas como as dos pinheiros e estreitas como as do eucalipto, o que faz com que as fibras se entrelacem, conferindo aos produtos características de resistência física jamais obtida pelas tradicionais matériasprimas utilizadas na produção de celulose e papel. A produção de celulose viabiliza a produção de produtos fibra longa como embalagens industriais – cartões duplex, sacarias mutifolhadas, papel para imprimir e escrever atendendo os segmentos: cimento, cal, polímeros, higiene e limpeza, cosméticos, refrigerantes, alimentício, farmacêutico, etc. O bambu também é usado como um fator de inclusão social. Por exemplo, em Brasília, no dia 03 de junho de 2003, no auditório do IBAMA, em comemoração à Semana do Meio Ambiente – Desenvolvimento Tecnológico Meio Ambiente e Inclusão Social – foi realizada uma mesa redonda “O BAMBU E SUA INCLUSÃO SOCIAL”, com apresentação de trabalhos de professores, entre eles: José Luiz Ripper (PUC Rio de Janeiro), Jaime Almeida (UnB Brasília), Antonio Beraldo (UNICAMP) e A. Silva (SEBRAE Alagoas).

1 O BAMBU, MATÉRIA-PRIMA PARA PAPEL Os principais objetivos das coleções de bambu foram verificar o desenvolvimento das espécies introduzidas em nossas condições ecológicas, assim como determinar suas características agronômicas e tecnológicas. Depois de estabelecida a coleção de bambu, realizaram-se estudos tecnológicos com o fim de caracterizar as diferentes espécies com maior potencialidade para produzir celulose e papel. As primeiras características estudadas foram: dimensões (comprimento e diâmetro) e peso dos colmos; comprimento dos internós, densidade básica, rendimento em celulose, proporção de lignina residual nas fibras (comprimento, largura, diâmetro do lúmen e espessura da parede celular) e propriedades físico-mecânicas da pasta celulósica obtida. Nos resultados obtidos desses estudos tecnológicos, podem-se observar as características de algumas espécies. Com relação ao comprimento das fibras, existe uma ampla variação desde Bambusa vulgaris com fibras de 3,4 mm até Guadua spinosa, com fibras de 1,6 mm de comprimento. Sobre este particular, se bem que a maioria das espécies estudadas ocupa uma posição intermediária entre folhosas e coníferas, existem espécies em que a dimensão das fibras é similar à do Pinus e até superior. Considerando o rendimento em celulose com vistas à produção de pasta sulfato, os resultados obtidos com bambu são inferiores aos obtidos com Pinus. Por outra parte, o bambu, com maior densidade básica que as madeiras, principalmente as coníferas, pode apresentar um maior rendimento industrial: com um mesmo volume no digestor, o peso do material processado é maior. A principal característica da celulose de bambu é sua alta resistência e baixa porosidade. Esta característica é uma consequência da estrutura morfológica de suas fibras, que são compridas, e estreitas, com lumens de paredes espessas. Quanto à posição química do Bambu (Bambusa vulgaris) em comparação com as madeiras, podemos destacar que o bambu apresenta altas proporções de cinzas e pentosanas, baixa proporção de lignina e alta solubilidade em água quente, álcool, benzeno e soda a 1%. Do ponto de vista tecnológico, com relação às dimensões das fibras e às propriedades físicomecânicas da pasta celulósica, se pode afirmar, em particular, que a espécie Bambusa vulgaris, que tem sido a mais utilizada nos programas de reflorestamento, principalmente nas regiões norte e nordeste (Bahia, Pernambuco, Paraíba, Maranhão e Piauí), pode ser empregada como matéria-prima para a produção de excelente celulose de fibras longas. Nas tabelas 1, 2 e 3, podem ser observadas as características estudadas do Bambusa vulgaris em comparação com o Pinus elliottii.

138


Tabela 1. Características estudadas do Bambusa vulgaris e do Pinus elliottii. Características de la Celulosa Bambusa vulgaris

Pinus

Largo de el fibra (mm)

3,43

3,49

Ancho (microns)

1,41

48

Lúmen (mc)

3,73

30

Espessor de la parede (mc)

0,89

1

Celulosa (%)

49,2

55,5

Pentosas (%)

22,3

7,1

Lignina (%)

14,6

26,6

Solubilidad en soda a 1%

33,4

16,9

Solubilidad en agua caliente

16,0

3,8

Solubilidad en alcohol benzeno

5,2

6,7

Cenizas

1,8

0,3

Análise Química

Tabela 2. Propriedades físico-mecânicas. Propiedad físico mecánicas de la celulosa Bambusa vulgaris

Pinus

Rasgado

246

126

Tracción

7.286

9.640

Estallido

6,7

82,6

Doblado

1.607

1.124

Peso especifico aparente

0,542

0,670

Tabela 3. Características agrícolas Bambusa vulgaris

Pinus

rama

semilla

Corte

frequencia

12 anos

Producción

20t/ha/ano

10t/ha/ano

Resiembra

renueva

inevitable

Exigencia del suelo

poco

mucho

Cultivación

inicial

mucho

Plantación

2 O BAMBU COMO MATÉRIA-PRIMA ENERGÉTICA A densidade básica do material utilizado tem importância na questão final do poder calorífico. Isto pode ser observado na próxima tabela em que condensamos alguns dados. Tabela 4. Densidade básica e poder calorífico superior de Bambu x Eucalipto. Material

Densidade básica t/m³

Poder Calorífico k/cal/kg

Eucalipto

0,496

4.531

Bambusa vulgaris vittata

0,744

4.500

Bambusa tuldoides

0,712

4.473

Bambusa vulgaris

0,687

4.219

Dendrocalamus giganteus

0,744

4.462

Guadua angustifolia

0,629

4.458

139


Os valores da densidade básica dos colmos de bambu se mostram superiores quando comparados com a madeira de eucalipto. Essa superioridade foi, em média, de 41,70% sendo que especificamente os maiores valores foram encontrados no caso do Bambusa vulgaris, variedade vittata, e Dendrocalamus giganteus. Verifica-se que os valores de densidade básica obtidos foram de um modo geral superiores aos apresentados na literatura para as espécies e variedades de bambu. Na literatura, são citados, por exemplo: 0,62 g/cm3 para o Bambusa tuldoides, 0,55 g/cm3 para o Dendrocalamus giganteus, 0,55 g/cm3 para o Bambusa vulgaris, em diferentes trabalhos. Porém, os valores estão próximos aos citados no caso do Bambusa vulgaris var. vittata (0,75 g/cm3). As diferenças existentes em geral podem ser explicadas pelas variações apresentadas pelas diferentes espécies em função do material genético, idade da touceira e dos colmos, e das condições locais. No caso do eucalipto, o valor de densidade básica obtido encontra-se dentro dos padrões de valores normalmente encontrados para espécies do gênero. Os maiores valores de densidade básica apresentados pelos bambus são altamente favoráveis em termos do seu emprego para a produção de carvão vegetal, por resultarem em carvões densos, o que é quase sempre desejável em termos de qualidade. Com relação ao PODER CALORÍFICO SUPERIOR mostrado na Tabela 4, não houve variações expressivas entre o valor médio para os colmos de bambu e o valor encontrado para a madeira de eucalipto. No caso específico dos bambus, no entanto, observou-se uma tendência de um resultado mais elevado para o Bambusa vulgaris, variedade vittata. Na literatura, são mencionados valores do poder calorífico para colmos de espécies do gênero Bambusa situados em torno de 4.543 kcal/kg. Para o Bambusa vulgaris é mencionado o valor de 4.530 kcal/kg. O autor considera ainda que, além dos aspectos genéticos, o efeito local – variação geográfica, exerce influência significativa sobre valores de poder calorífico. As espécies que ocorrem em locais de baixa temperatura, menor umidade e latitudes elevadas sempre apresentam maiores valores de poder calorífico, quando comparadas com espécies que ocorrem em locais de alta temperatura, áreas úmidas e baixa latitude. Considerando muito importante a utilização de colmos de bambu para energia, foram encontrados valores de poder calorífico de 4.600 a 5.400 kcal/kg, superiores aos apresentados pelas madeiras japonesas, que se situam entre 3.000 – 4.000 kcal/kg. Podemos, como ilustração, informar que o carvão de bambu apresenta várias vantagens sobre o carvão de madeira, atingindo uma média de 7.868 kcal/kg, com base os seguintes dados: B.v.v. = 8.460; B. tuldoides = 7.922, B. vulgaris = 7.785; D. giganteus = 8.685 e G. angustifolia de 6.460 kcal/kg. Não temos a menor dúvida quanto às vantagens da utilização do Bambu como matéria-prima energética, principalmente em regiões do Brasil onde as florestas naturais há muito já desapareceram ou estão por desaparecer totalmente.

3 CONCLUSÕES O Bambu é, sem dúvida alguma, o vegetal com maiores possibilidades de emprego no mundo atual, embora inúmeras das modalidades de uso dessa gramínea ainda não sejam convenientemente exploradas, ou exploradas apenas regionalmente, principalmente, por falta de material informativo e de divulgação, em grande parte do território nacional. O conhecimento tecnológico desenvolvido para as madeiras, porém, dificilmente de adapta de maneira adequada quando aplicado ao bambu, por se tratar de matéria–prima totalmente diversa em seus aspectos anatômicos, químicos e físicos. A aplicação de conhecimentos tecnológicos inadequados ao bambu tem gerado objeções, com reflexos negativos em sua utilização. Essas objeções não invalidam as grandes possibilidades de utilização dessa espécie vegetal como fonte alternativa de fibras longas, principalmente agora que as madeiras estão cada vez mais escassas e valorizadas. O deficit brasileiro estimado de madeiras é de 15 milhões de metros cúbicos, sendo 5 milhões de madeiras folhosas (fibras curtas) e 10 milhões de madeiras coníferas (fibras longas). Seria desnecessário ressaltar a importância da celulose e do papel para o desenvolvimento econômico, social e cultural de um povo, bastando lembrar que o consumo “per capita” de papel tem sido um dos melhores índices para avaliar o grau de desenvolvimento de um país ou de uma região. Nesse particular, o Brasil pode ser considerado um bom produtor de celulose, mas um péssimo consumidor de papel, quando comparado aos países mais desenvolvidos. As nações tropicais são incapazes de satisfazer sua demanda de polpa celulósica com seus próprios recursos e dependem de importação para preencher a lacuna.

140


A persistir esta situação, o volume de polpa celulósica a ser importada tenderá a aumentar, o que muito favorece a produção de polpa celulósica de bambu e sua exportação pelo Brasil. Embora o bambu tenha sido, e ainda é, pouco utilizado na produção de celulose, as perspectivas de expansão de seu uso para esse fim são grandes, principalmente em decorrência do grande avanço observado na área agrícola e tecnológica na exploração deste vegetal. Economicamente, é possível a redução de custos dos produtos que utilizam o bambu como matéria-prima, especialmente nos casos em que o processamento do bambu representa utilização de energia, pois seu processo em geral consome menos energia em relação a outros produtos com a mesma finalidade. Assim, podemos concluir e recomendar, sem a menor sombra de dúvida, a utilização do bambu como matéria-prima celulósica e energética, pois, além de haver espécies exóticas muito bem adaptadas em todo o Brasil, com possibilidade de produção elevada, de 30 a 100 toneladas de colmos/ha/2 anos, o bambu ainda apresenta baixo custo, ótimo poder calorífico e resultados experimentais favoráveis em todas as pesquisas e utilizações realizadas pelo mundo.

BIBLIOGRAFIA AGENDA 21 – cap. 11. Combate ao Desflorestamento. [?]. AZZINI, A.; SALGADO, A. L. B. Aspectos del aprovechamiento industrial del Bambu en el Brasil. In: SIMPÓSIO LATINO-AMERICANO SOBRE BAMBU, 1., 1981, Manizales/Colômbia. Anais... Manizales: [s.n.], 1981. p. 7-14. ________. Possibilidades Agrícolas e industriais do Bambu. O Agronômico. Campinas: Instituto Agronômico, v. 33, p. 61-80, 1981. ________. Bamboo, A celulosic and energetic raw material. In: INTERNATIONAL BAMBOO WORKSHOP, 6., INTERNATIONAL BAMBOO CONGRESS, 5., 1998, Costa Rica. Anais… Costa Rica: [s.n.], 1998. AZZINI, A.; ARRUDA, M. C. Q. de.; CIARAMELLO, D.; SALGADO, A. L. B.; TOMAZELLO FILHO, M. Produção Conjunta de Fibras Celulósicas e Etanol a partir do Bambu. Bragantia. Campinas: Instituto Agronômico de Campinas, v. 46, n. 1, p. 17-25, 1987. BRITO, J. O.; TOMAZELLO FILHO, M.; SALGADO, A. L. B. Produção e caracterização do carvão vegetal de espécies e variedades de Bambu. IPEF. [S.l.: s.n.], n. 36, p. 13-17, 1987. CATI – Coordenadoria de Assistência Técnica Integral. Setembro. 1997. CIARAMELLO, D.; AZZINI, A. Bambu como matéria-prima para Papel. V- Estudos sobre o emprego de quatro espécies de Dendrocalamus, na produção de celulose sulfato. Bragantia. Campinas: Instituto Agronômico, v. 30, n. 2, p. 199-214, 1971. EMBAYE, K. Ecological aspects and resource management of bamboo forests in Ethiopia. Tese (Doutorado do Departamento of Short Rotation Forestry) - Swedish University of Agricultural Sciences, 2003. FANCHUN, Z. Combustion values of bamboos. In: HSIUNG, W. Y. Bamboo Research. Nanjing: Nanjing Technological College of Forest Products, 1981. p. 99-104. FAO. Productos Forestales no Maderero, Possibilidades Futuras. Roma: Estúdio FAO Montes, 1992. nº 97. FERRÃO, A. M. A.; SALGADO, A. L. B. Metodologia para ensaios de compressão do bambu (Bambusa vulgaris var. vittata e Phyllostachys purpurata). In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ENGENHARIA AGRÍCOLA, 24., 1995, Viçosa. Anais... Viçosa: SBEA/UFV, 1995. p. 1-10. GRISCOM, B. W.; ASHTON, P. M. S. Bamboo control of forest succession: Guadua sarcocarpa in Southeastern Peru. Forest Ecology and Management. Netherlands: Elsevier BV., v. 175, n. 1-3, p. 445-454, 2003. JORNAL DO COMERCIO – PE. Portela procura parceria para cultivar bambu na Zona da Mata. Jornal do Comércio - PE, Pernambuco, 26 dez. 1999. Caderno Economia. MONTALVÃO FILHO, A.; GOMIDE, J. L.; CONDÉ, A. R. Variabilidade da Constituição Química e das Características Dimensionais das Fibras do Bambusa vulgaris. Revista Árvore. Viçosa: Sociedade de Investigações Florestais, v. 8, n. 1, p. 12-27, 1984. SALGADO, A. L. B. As maravilhas que o bambu pode fazer. Guia Rural. [S.l.]: Editora Abril, ano 2, n. 6, p. 79, 1988. ________. Revestimento Vegetal. Palestra apresentada no Centro de Treinamento da PETROBRASSETAD. São Sebastião /SP, junho, 1988.

141


________. Bambu e seus Múltiplos Usos. In: SIMPÓSIO MATERIAL ALTERNATIVO-FUNDART, 1990, Ubatuba/SP. Anais... [S.l.: s.n.], 1990. 15 p. ________. BAMBU. Guia rural. [S.l.]: Editora Abril, p. 32-33, 1990. SALGADO, A. L. B.; AZZINI, A. Bambusa Guadua no Brasil. In: CONGRESSO MUNDIAL DE BAMBU GUADUA, 1., 1992, Pereira/Colômbia. Anais... [S.l.: s.n.], 1992. p. 35-41. SALGADO, A. L. B.; GODOY JÚNIOR, G. O bambu no Brasil, em nossa vida, nossa cultura, seu cultivo e utilização. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL O USO DO BAMBU NA CONSTRUÇÃO CIVIL, 2002, Maceió. Anais... Alagoas: [s.n.], 2002. SALGADO, A. L. B.; SALGADO, C. L. G. T. Bambu: Novas técnicas alternativas de utilização etc. e tal. In: FESTIVAL NACIONAL DE CULTURA ALTERNATIVA, 2., 1992, Pirenópolis/Goiás. Anais... [S.l.: s.n.], 1992. 27 p. SALGADO, A. L. B.; CIARAMELLO, D.; AZZINI, A. Bambu como reforço estrutural em moirões de cerca. O Agronômico. Campinas: Instituto Agronômico, v. 38, n. 2, p. 127-137, 1986. SALGADO, A. L. B.; et al. Bambu – Cultura e Utilização. IAC, 1983. 6 p. Folder. SALGADO, A. L. B.; et al. Instruções Técnicas sobre o Bambu. Campinas: Instituto Agronômico, 1992. Boletim Técnico n° 143.

142


6.5 O BAMBU COMO INSUMO NO PROCESSO INDUSTRIAL DE PRÉ-MOLDADOS PARA CONSTRUÇÃO CIVIL Edson de Mello Sartori1

Resumo O objetivo deste trabalho é demonstrar a viabilidade de implantação de um Sistema de Construção Não-Convencional, baseado na pré-fabricação de elementos construtivos utilizando bambu e resíduos da indústria de recapagem de pneus (raspa de borracha), na obtenção de unidades habitacionais, atendendo a critérios exigíveis no escopo da Mecânica de Estruturas e Ciência dos Materiais, como também privilegiando critérios ambientais na produção dessas unidades, com a obtenção de habitações de qualidade, custo viável real para os padrões de “interesse social” e, ressalte-se, a criação de uma nova atividade econômica local. Dentro do mesmo escopo de industrialização, o bambu aparece como alternativa de insumo renovável na produção de laminados para utilização em estruturas leves e revestimentos. Palavras-chave: Bambu. Pré-moldados. Laminados. Abstract The objective of this work is to demonstrate the viability of the implantation of a Construction System, not conventional, based on a pre-fabrication of constructive elements utilizing bamboo and residues of the re-treading tire industry (rasp of rubber). At the obtainage of housing units, attending the liability of the criteria’s purpose of the Mechanics Structures and Science of the materials. In privileging ambient criteria in the production of these units and obtaining quality housing, viable cost in real for the patterns of “social interest” and standing out, the creation of a new local economic activity. Even though in the same scope of industrialization, the bamboo shows as being an alternative of a renewable supply on the laminated production for utilizing in light structures and recovering. Keywords: Bamboo. Pre-molded. Laminated.

INTRODUÇÃO O desenvolvimento sustentável é cada vez mais discutido em diferentes âmbitos. A criação de agendas locais que promovam arranjos produtivos consistentes, capazes de gerar uma melhor distribuição de renda, com respeito ao meio ambiente, é uma ação possível e de implementação viável. Gerar emprego e renda com valor agregado, permitindo desenvolvimento regional a partir de produtos e vocações locais que sejam apropriadamente estruturadas por um plano de trabalho claro e objetivo é, não só possível, como efetivo na construção de um crescimento real e multiplicável. Desta forma, é importante descobrir vocações locais, aliadas às fontes de matérias-primas disponíveis, e transformá-las em iniciativas produtivas, capazes de oferecer oportunidades de trabalho e ganho financeiro para a sociedade, especialmente suas comunidades mais carentes. Neste sentido, o adensamento de cadeias produtivas feitas de forma coerente e consistente, com respeito às vocações regionais, pode ajudar a desencadear tal processo. Atualmente, não se pode mais conceber apenas a atividade industrial de grande porte como a grande geradora de emprego e desenvolvimento. Duas atividades atuais têm assumido esse papel: a proliferação de micro e pequenas empresas e o agronegócio. No Brasil a opção pelo foco no agronegócio tem-se mostrado consistente. No entanto, para que tais iniciativas tenham uma repercussão ampla, é preciso se pensar em estabelecer arranjos produtivos articulados, de forma a dar opções de ocupação às diversas populações, sobretudo as mais carentes de recursos e tecnologia. Uma das opções que vem sendo crescentemente trabalhada é a do uso do bambu como matériaprima para diferentes empreendimentos. No Brasil, as condições climáticas para o plantio podem ser consideradas favoráveis, permitindo o cultivo e manejo de boa parte da cerca de 1200 variedades encontradas no mundo. Em vários países o uso do bambu já é uma realidade economicamente viável. Aqui mesmo no Brasil já são conhecidas iniciativas com o intuito de criar negócios com esse tipo de material.

1 Engenheiro Civil, MSc., HESA Engenharia Ltda., Consultor, SEBRAE/RJ – Serviço de Apoio às Micro e

Pequenas Empresas do Estado do Rio de Janeiro, Consultor, SEBRAE/MS – Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Estado de Mato Grosso do Sul. E-mail: (sartori@bambubrasileiro.com.br).

143


O que se verifica em outros países (tradicionalmente os orientais e mais recentemente Colômbia, Costa Rica, Equador, Chile, Panamá) é o uso do bambu como matéria-prima substituta para diferentes finalidades produtivas, nos mais diversos setores econômicos (construção civil, artesanato, mobiliário, fabricação de papel, fonte de energia, química, alimento, entre outros). Neste sentido, a utilização dessa gramínea pode ser considerada como elemento capaz de auxiliar num processo de desenvolvimento sustentável, principalmente em países em vias de desenvolvimento. O bambu tem características que favorecem o modelo de produção mais limpa, localizada e barata, inerente ao desenvolvimento sustentável, atendendo às questões econômicas, ecológicas e sociais hoje emergentes no Brasil. Economicamente, é possível a redução de custos dos produtos que utilizam o bambu como matéria-prima, especialmente nos casos em que o processamento do bambu represente utilização de energia (seu processo consome menos energia em relação a outros produtos com a mesma finalidade). No enfoque social, verifica-se que a utilização do bambu facilita a inclusão social de comunidades. Tanto em relação ao seu plantio quanto ao seu processamento, demanda uma tecnologia de fácil absorção por parte dos trabalhadores. Portanto, pode vir a ser de grande potencial em termos de geração de trabalho e renda. Experiências já realizadas e em andamento mostram que comunidades carentes e de baixo nível educacional são capazes de, em pouco tempo, tornarem-se autônomas na fabricação de artefatos de bambu. A grande vantagem brasileira reside no fato de que o país possui a maior diversidade e a maior percentagem de espécies endêmicas da América Latina, com 137 espécies, ou 32% das espécies de bambu desta região. As diversas possibilidades do uso do bambu como matéria-prima permitem seu manejo sustentável em áreas reflorestadas, adicionando-se às vantagens de inclusão social possibilitadas nas cadeias produtivas que têm como base o bambu.

1 DESENVOLVIMENTO 1.1 AS CADEIAS PRODUTIVAS DO BAMBU: POTENCIALIDADES Pode-se definir cadeia produtiva como sendo “... um conjunto de etapas consecutivas pelas quais passam e vão sendo transformados e transferidos os diversos insumos, desde sua origem até o seu mercado consumidor” (KUPFER; HASENCLEVER, 2002). Tendo como base o esquema padrão do que seria uma cadeia produtiva tal como definido por Nogueira e Alves (2002) e aqui adaptado, buscou-se caracterizar, em linhas gerais, os principais elementos das Cadeias Produtivas do Bambu, evidenciando suas inter-relações (Figura 1). Dada a sua flexibilidade e a alta diversidade de utilização do bambu como matéria-prima, verificase que ele pode servir como elemento de base em diferentes cadeias produtivas. O bambu entraria como substituto de outros materiais convencionais e passaria a concorrer no mesmo mercado de outras cadeias produtivas.

Figura 1. Cadeias Produtivas do Bambu. Fonte: Site Agência Bambu de Conhecimento.

144


De acordo com o esquema apresentado acima, há que se considerar que todas as etapas ali representadas são dependentes do uso final que será feito do bambu. As etapas de plantação e extração e secagem são intimamente dependentes do processamento a que se destina. Já as etapas de processamento e distribuição, ficam dependentes do mercado, evidenciando os possíveis usos alternativos do bambu. Considerando-se tais elementos, é necessário escolher algumas das cadeias produtivas do bambu que sofreriam menor resistência de mercado para serem implantadas inicialmente, através de agregação de conhecimento científico e tecnológico, bem como administrativo e mercadológico na comunidade e região envolvidas. Considerando as características das ocorrências verificadas em nosso país, em geral de caráter pré-existente, em áreas remanescentes de propriedades rurais ou periféricas a cursos d’água, deve-se lembrar que as condições de manejo são favoráveis à geração de novas atividades e postos de trabalho. A plantação não sofre grandes alterações pelo clima ou ambiente, tornando-o capaz de ser introduzido em diferentes regiões, e não requer alto nível de mecanização ou grandes aportes de recursos financeiros. A mão de obra pode ser facilmente treinada mesmo junto à população que não possua tradição nesse tipo de cultura. Dessa forma, a facilidade em se estabelecerem polos de utilização do bambu pode ser restrita a iniciativas de agentes locais, como ONGs, prefeituras municipais, institutos específicos e agências de fomento (JIANGHUA; XIAOSHENG, 2001). 1.2 PROSPECÇÃO E MERCADO Seja pela necessidade de criação do seu próprio mercado, ou seja para conquistar mercado de outros produtos a partir do enfoque de custo mais baixo, ou do enfoque ecológico, ou ainda o seu elevado índice de renovabilidade, o bambu, com suas várias potencialidades, possui um grande potencial de mercado para seus produtos. As exportações globais de bambu estão sendo estimadas em US$ 2,7 bilhões. Excetuado o consumo interno, apenas com a exportação, a renda gerada na China em 1992 foi de US$ 329 milhões e nas Filipinas em 1994 foi de US$ 241 milhões (RAO, 1999). Só de brotos do bambu para alimentação, a exportação chinesa correspondeu a US$ 92 milhões e o Japão importou de 1993 a 1997 2,6 toneladas do mesmo produto. Estudos de mercado relacionados diretamente ao bambu são comuns em países asiáticos, pois estes mercados são mais tradicionais na produção e uso do bambu. Porém, existem alguns estudos também no mercado latino-americano, sobretudo na Colômbia, onde o aproveitamento do bambu se faz prioritariamente na área da construção civil e arquitetura. Para nós, em termos de análise, os estudos colombianos são muito mais interessantes, pela proximidade das características culturais do Brasil. Outra vertente de mercado, cujos produtores brasileiros ganham espaço internacional, é a produção de aglomerados e laminados, matéria-prima para indústria de movelaria, que apresenta crescimento continuado, tanto na sua produção quanto no seu consumo, no Brasil nos últimos anos. De 1995 a 2000, a taxa de crescimento médio anual da produção ficou em torno de 15%, enquanto a taxa de crescimento médio do consumo ficou aproximadamente em 17%. Observando-se dados do IBGE, constata-se deficit nessas produções, podendo ser esta lacuna facilmente preenchida com a adoção de aglomerados e laminados de bambu. Numa avaliação preliminar realizada pelo Instituto do Bambu, hoje os focos geográficos de interesse para o desenvolvimento de projetos do bambu no Brasil, podem ser mostrados como na Figura 2. Na região Norte, em especial no Acre, destacam-se as maiores reservas naturais de espécies nativas de bambu do mundo. Já existe aqui uma demanda à geração de energia no que tange à substituição da matéria-prima convencional (madeira) por biomassa do bambu, que está sendo trabalhada pelo grupo Brennand e Koblitz em Itacoatiara - AM. Acredita-se, porém, frente a uma vantagem comparativa tão importante como a descrita primeiramente, na existência de muitas outras possibilidades de aproveitamento industrial deste fabuloso estoque natural. Observe-se que o aproveitamento do bambu, ao contrário da madeira, não mata a planta, mas aplicando um plano de manejo e exploração, esta se revigora, originando melhoria na produção de colmos. É a única espécie madeirável que permite um usufruto continuado e totalmente renovável. Na região Sudeste, principalmente eixo Rio - São Paulo - Minas, o grande atrativo é a diversidade de espécies, a existência de centros de pesquisa de excelência e uma concentração de mercado diferenciada, com iniciativas já de relativo sucesso, que apontam resultados promissores como o programa em implantação no município de Três Rios – RJ, com ações nas áreas de artesanato, mobiliário e construção civil, apoiado pelo Sebrae-RJ. A região da Zona da Mata Nordestina tem como premissa maior a inclusão social e geração de trabalho e renda aos saídos da cultura da cana-de-açúcar. Vale destacar também o pioneirismo da já instalada tecnologia em escala industrial, nesta região, do cultivo do bambu e seu beneficiamento (papel e celulose), liderado pelo Grupo João Santos (também atuando no Maranhão). É só nesta região do país que se observam plantações de bambu em grande escala, com tecnologia desenvolvida.

145


Na região Centro-Oeste destaca-se o Mato Grosso do Sul pela ocorrência massiva de bambus do gênero Guadua, com ocorrência das espécies angustifolia, amplexifolia, superba e weberbauri, bambu nativo de grande aptidão para a construção civil e o processamento industrial. Encontram-se ainda de forma mais esparsa, ocorrências de outros bambus lenhosos como o bambu gigante (Dendrocalamus giganteus), o bambu comum ou bambu verde (Bambusa vulgaris) e a sua variedade, amarela com listras verdes, conhecida como "bambu brasileiro" (Bambusa vulgaris var. vittata), o bambu verde fino (Bambusa tuldoides) e ainda em várias regiões, o bambu de vara de pescar, ou chamado de cana-da-Índia (Phyllostachys aurea).

Figura 2. Distribuição Geográfica de Bambus no Brasil. Fonte: Site Agência Bambu de Conhecimento.

1.3 MATERIAIS PARA A CONSTRUÇÃO CIVIL A estimativa para o ano 2000 era de um deficit habitacional de mais de 6,5 milhões de casas, segundo dados do Ministério das Cidades, que tem como uma de suas atribuições a redução do deficit habitacional. Esse dado distribuído por regiões é apresentado na Tabela 1. Tabela 1. Deficit habitacional no Brasil por regiões em 2000. Regiões da Federação Norte Nordeste Sudeste Sul Centro Oeste Brasil

Deficit Total

Deficit Relativo

372.157 2.609.790 2.412.460 690.312 549.807 6.634.526

5,61% 39,34% 36,36% 10,40% 8,29% 100,00%

Fonte: Coelho (2002).

O deficit habitacional é bastante preocupante nas classes de renda inferiores da população. Tal deficit pode ser classificado em três classes distintas de renda: até três, de três a cinco, de cinco a dez e mais de dez salários mínimos (Tabela 2). Observa-se uma grande concentração na faixa de renda mais baixa, onde 83,2% da população se encaixariam no conceito de deficit habitacional.

146


Tabela 2. Deficit habitacional no Brasil por faixa salarial em 2000. Região Norte Nordeste Sudeste Sul Centro Oeste Brasil

Até 3 SM 84,0% 91,3% 77,6% 80,9% 82,9% 83,2%

de 3 a 5 SM 7,2% 5,1% 11,0% 9,4% 7,8% 8,4%

de 5 a 10 SM 6,9% 2,1% 7,1% 6,7% 6,5% 5,4%

mais de 10 SM 1,6% 0,7% 3,0% 2,5% 2,0% 2,0%

Total 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0% 100,0%

Fonte: Coelho (2002).

Os dados acima apresentados vêm corroborar a importância de programas de habitação popular para diminuir o deficit habitacional. Esse fato reforça a importância das ações projetadas na criação do Instituto do Bambu, que visa promover estudos e protótipos de habitação popular utilizando o bambu, que apresenta custos mais baixos em relação às construções com materiais tradicionais. Os custos parecem especialmente atrativos quando se fala da construção de casas populares com uso do bambu. Um estudo feito pela Funbambú (Chile) revela que dois tipos de casas construídas com 2 2 materiais tradicionais teriam o custo estimado de US$126,22/m (tipo inferior) e US$134,46/m (tipo 2 melhor). Uma casa equivalente em bambu teve seu custo estimado em US$96,63/m (ADAMSON; LÓPEZ, 2001). 2

2

No Brasil, o custo médio na construção civil gira em torno de R$ 450,00/m (US$ 157,89/m )1. Sartori e Cardoso Júnior (1998) desenvolveram um projeto de utilização do bambu em estruturas e na 2 construção civil, que visava a execução de uma casa popular com 54 m , tendo o bambu como o principal componente estrutural (painéis de vedação, parte da laje, forro, divisórias, etc.). O preço final de execução 2 do projeto ficou orçado em US$ 5.405,00, o que representa aproximadamente US$ 100/m . O consumidor tem de ser indagado sobre o uso do bambu na construção de casas populares. O Brasil pode ainda apresentar barreiras culturais que precisam ser trabalhadas para este tipo de mercado. Porém, outros países já adotam o uso do bambu na prática em construção civil e, por isso, seus casos devem ser analisados guardando suas devidas proporções. 1.4 SISTEMA CONSTRUTIVO PRÉ-MOLDADO O sistema desenvolvido pelos profissionais Eng.º Civil Edson de Mello Sartori, Arquiteto Alejandro Luis Pereira e Arquiteto Rubens Cardoso Junior consiste de peças estruturais (vigas e pilares) e painéis para fechamento de paredes pré-moldados com micro-concreto de resíduos, reforçados com bambu triturado, de forma a facilitar a execução do processo construtivo, e estruturados com grelhas de colmos de bambu. Os materiais componentes desse micro-concreto estão indicados na Figura 3. O micro-concreto é constituído por cimento, areia, cal hidratada, raspa de pneus (resíduo de indústrias de recapagem de pneus) e fibra de bambu. A utilização da raspa de borracha resolve um grave problema ambiental, por ser um resíduo impactante produzido em grandes volumes e inadequado à disposição em aterros de resíduos ou aterros sanitários. A utilização da mesma juntamente com a fibra do bambu reduziu o peso da massa em 53%. As peças foram desenvolvidas com encaixes do tipo machofêmea, que facilitam a montagem, alinhamento e engrenamento entre elas, sendo aplicada uma fina camada de nata de cimento entre elas. O sistema foi todo concebido para ser construído por três pessoas, na montagem da unidade. O baldrame foi executado em solo apiloado, em uma base de brita, e somente encaixados os pilares. Depois da cura na fixação dos mesmos foi feito o rejunte dos encaixes com argamassa de cimento e areia. No assentamento dos pilares, foi usada uma grelha de ripas de bambu na base da cavidade onde foram concretados. Essa grelha, além de transmitir adequadamente a carga ao solo, evitando o puncionamento da base, facilita a prumagem dos pilares e diminui a possibilidade de deslocamento do pilar. Após a cura dos rejuntes, os elementos de fechamento (painéis) são colocados. Esses painéis são modulares e foram os criados os tipos: 0,50m de largura por 0,50m de altura por 0,095m de espessura; 0,50m de largura por 1,00m de altura por 0,095m de espessura;

1 Cotação do dólar a R$ 2,85.

147


Alguns dos tipos foram criados para funcionar como placas de ajuste, no caso de serem opostos a um pilar, ou como peças de ajuste na colocação de portas. As vigas de respaldo obedeceram à mesma sequência de montagem das demais peças, e foram fixadas com nata de cimento por sobre os pilares e placas.

A

B

C D

E

F

G

H

I

J

148

Figura 3. A-Materiais constituintes do “micro-concreto” leve (cimento, cal, areia, raspa de borracha e fibra de bambu). BDetalhe da armadura do painel pronta para concretagem, notando-se a alternância das fitas transversais. CDetalhe dos encaixes macho-fêmea dos painéis. D-Prumagem, alinhamento e nivelamento do pilar. E-Concretagem do painel. F-Colocação de argamassa de fixação/vedação dos painéis na viga baldrame. G-Armadura de base de bloco com ripas de bambu. H-Colocação de painel inteiro, por cima, junto ao pilar. IExecução de base das vigas. J-Protótipo finalizado em 7 dias contados a partir da limpeza do terreno.


2 CONCLUSÕES O desenvolvimento do sistema construtivo proposto teve como foco de interesse a viabilização de alguns conceitos claramente definidos. Sob o ponto de vista técnico, a utilização do bambu em um processo construtivo industrializável habilita este material como elemento estruturante em um sistema formal, sem a problemática da variação dimensional e da imunização. A utilização de resíduos e fibras vegetais carrega um conceito ambiental importante. O baixo consumo de energia e a diminuição do peso próprio dos materiais resultam em um produto atrativo economicamente, facilitando o processo construtivo. Mais importante que os aspectos técnicos envolvidos, foi a obtenção de um sistema facilmente reproduzível em um processo de capacitação, que pode ser adotado em comunidades de baixa renda, com deficit habitacional. O custo de implantação da unidade produtiva é baixo e propicia o empreendedorismo com pequeno aporte de recursos. Isto resulta em uma possibilidade de inclusão produtiva, com geração de pequenos negócios, emprego e renda. A finalidade do Instituto do Bambu, em Alagoas, foi plenamente atingida neste processo. A vocação do bambu, como material de excelente performance e de utilização fácil e continuada, resulta, portanto em um sistema que atinge ganhos ambientais marcantes, com uma vertente tecnológica importante, e principalmente que propõe um resgate social real, com aumento na qualidade de vida da população envolvida, com geração de postos de trabalho e melhoria da qualidade de moradia. Pelo exposto acima, conclui-se que o potencial de uso desta gramínea é enorme e as possibilidades de incremento de trabalho, novas atividades econômicas, tecnologia e inclusão social apresentam grandes perspectivas de efetividade em um processo de ação sistêmica para o desenvolvimento econômico e social. Em praticamente todos os aproveitamentos, o manejo do bambu é altamente intensivo em trabalho. Mesmo na sua industrialização possibilita criar um grande número de postos de trabalho permanentes ou no meio rural, contribuindo para a fixação do trabalhador no campo. Aqui todo o processo agro-florestal de produção é feito manualmente, desde a preparação do solo, plantio, adubação, replantio, tratos culturais e finalmente o corte, ou mesmo de manejo silvicultural, numa perspectiva de implantação de um plano de fomento de exploração mista, envolvendo produtores (proprietários rurais) e trabalhadores (exploradores), num modelo operativo de sucesso em países vizinhos como a Colômbia. Seu rápido crescimento, em relação a outras plantas, torna o bambu apropriado para o uso industrial com baixo impacto ambiental. Nas espécies lenhosas, o tempo de estabelecimento de uma plantação varia de 5 a 8 anos, mas já a partir do quarto ano é possível coletar colmos e brotos. Em outras espécies de menor porte a planta alcança sua maturidade entre aproximadamente seis meses e três anos, conforme a espécie sendo considerada perene e de elevado rendimento por área plantada.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABIPA – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PAINÉIS DE MADEIRA. E-mail: abipa@abipa.org.br. ABRACAVE – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE FLORESTAS RENOVÁVEIS. Anuário 2001. Disponível em: <http://www.abracave.com.br/anuario.htm>. Acesso em: 01 jul. 2003. ADAMSON, M.; LÓPEZ, D. Socieconomic study for the Bamboo Sector in Costa Rica. [S.l.]: INBAR, 2001. Disponível em: <http://www.inbar.com.int/publication>. Acesso em: 10 jun. 2003. INBAR Working paper nº 38. BNB – BANCO DO NORDESTE DO BRASIL. Ações para o desenvolvimento do artesanato do Nordeste. [S.l.: s.n.], 2003. Disponível em: <http://www.bnb.gov.br/progCadeias/projArtesanato/Docs>. Acesso em: 07 jun. 2003. BOLETIN DEL BAMBÚ EN CHILE. Boletin informativo nº 3. [S.l.: s.n.], 2001. Disponível em: <http://www.bambu.cl/publicaciones_proyecto.htm>. Acesso em: 14 jul. 2003. CARDOSO JÚNIOR, R.; SARTORI, E. M. Bamboo: a viable alternative for popular housing. Ensaios e Ciência. Campo Grande/MS: [s.n.], v. 2, n. 1, p. 179-192, 1999. COELHO, W. R. O deficit das moradias: instrumento para avaliação e aplicação de programas habitacionais. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) - Escola de Engenharia de São Carlos/USP, 2002. GHAVAMI, K. Desenvolvimento de Elementos Estruturais Utilizando-se Bambu. In: CONGRESSO TÉCNICO CIENTÍFICO DE ENGENHARIA CIVIL, 1996, Florianópolis. Anais... Florianópolis: [s.n.], v. 4, p. 689-700, 1996. IBGE - DIRETORIA DE PESQUISAS, DEPARTAMENTO DE INDÚSTRIA. Pesquisa Industrial Anual Produto 2000. Disponível em: <http://www.ibge/estatistica/economia/industria/pia/produtos/produto2000/tabela_produtos_2000. shtm>. Acesso em: 14 jul. 2006.

149


JIANGHUA, X.; XIAOSHENG, Y. Medium and Large Scale Bamboo Plantations. China: INBAR/RISF, 2001. Disponível em: <http://www.inbar.int/totem/txt/LargeBambooPlantations.htm>. Acesso em: 04 jul. 2003. KUPFER, D.; HASENCLEVER, L. Economia industrial: fundamentos teóricos e práticos no Brasil. Rio de janeiro: Campus, 2002. NOGUEIRA JÚNIOR, S.; NEGRI NETO, A.; NOGUEIRA, E. A. Perspectivas de Consumo de Alimentos para Animais. São Paulo: IEA, 2002. Disponível em: <http://www.iea.sp.gov.br/out/verTexto.php?codTexto=22>. Acesso em: 01 ago. 2006. PROCHNIK, V. Cadeias Produtivas e Complexos Industriais. Rio de Janeiro: UFRJ, nov. 2000. Texto para discussão. RAO, R. Socio-economic Issues and Constraints in the Bamboo and Rattan Sectors: INBAR's Assessment. [S.l.]: INBAR, 1999. Disponível em: <http://www.inbar.com.int/publication>. Acesso em: 04 jul. 2003. INBAR Working paper nº 23. VASCONCELLOS, R. M. Info Bambu – plantio e morfologia. Disponível em: <http://www.bambubrasileiro.com/info/plantio/5.html>. Acesso em: 07 jul. 2003.

150


6.6 PAINÉIS DE BAMBU PARA HABITAÇÕES ECONÔMICAS: AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DE PAINÉIS REVESTIDOS COM ARGAMASSA Anelizabete Alves Teixeira1, Jaime Gonçalves de Almeida2

Resumo O presente trabalho tem como objetivo apresentar um painel de vedação vertical para habitações econômicas, feito de bambu, bem como apresentar características e metodologias para revestimentos de painéis de bambu com argamassa. O trabalho visa contribuir, tecnicamente, para a consolidação do uso do bambu como alternativa viável na arquitetura, além de contribuir para a minimização, ainda que parcial, do problema habitacional existente no Brasil. A proposta arquitetônica do painel de bambu e a aderência da argamassa nos painéis são os principais pontos de abordagem deste artigo. Diante dos resultados obtidos e parâmetros analisados, conclui-se que o desempenho dos painéis argamassados mostra-se adequado para o emprego em habitações econômicas. Palavras-chave: Painéis Pré-fabricados. Arquitetura. Construção. Projeto. Argamassa. Abstract The present study to present a wall for economic habitations in bamboo. Visa contributes technically with the consolidation of the use of bamboo like a practicable alternative in architecture and contribute for the minimization of the habitation trouble that there is in Brazil. The walls architectonic propose and the mortar adherences in the walls were the main points of the investigation and analyses from dissertation. In front of the results and parameters analyzed, in the study, conclude that the redemption of the mortared walls showed adequate for the utilization in economical habitation. Keywords: Prefabricated Walls. Architecture. Building. Design. Mortar.

INTRODUÇÃO Nos dias atuais, observa-se uma notável busca pelo uso de materiais e tecnologias que não agridam o meio ambiente. Nota-se grande interesse pela utilização de tecnologias e recursos alternativos com este propósito, novos materiais têm sido amplamente divulgados. Busca-se, assim, uma nova postura diante da problemática ambiental inserida no ambiente urbano e construído, levando em consideração a tecnologia e a qualidade das produções arquitetônicas voltadas para o habitar, destacando-se a sustentabilidade dessas produções e suas ligações com o tempo-espaço social, cultural e político. O tema escolhido para este artigo parte da necessidade de se inserir, na indústria da construção civil e na arquitetura, o emprego de materiais alternativos, sustentáveis e de baixo custo para a produção de casas econômicas, que possam substituir ou complementar os materiais ou sistemas construtivos tradicionais sem comprometer a durabilidade, o conforto e qualidade das construções, principalmente no caso das habitações econômicas com o uso do bambu. É comprovada cientificamente a eficácia do bambu, porém faz-se necessário que as espécies sejam plantadas em abundância, que sejam feitos tratamentos adequados para prolongar a vida útil do bambu, que se forme mão de obra especializada e, principalmente, que sejam implantadas políticas públicas e industriais de incentivo ao uso do bambu na construção civil, para que ele possa ser utilizado em grande escala e por qualquer segmento da população.

1 Arquiteta e Urbanista, Mestre em Arquitetura e Urbanismo pela UnB com pesquisa científica sobre os

Bambus, Especialista em Gestão e Gerenciamento de Obra pela UFG, Professora Efetiva do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Estadual de Goiás. 2 Arquiteto e Urbanista, Doutor em Arquitetura pela AA/Reino Unido, Mestre em Planejamento Urbano pela UnB, Professor Adjunto do Departamento de Projeto, Expressão e Representação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília (PRO/FAUUnB). E-mail: (cpab@unb.br).

151


Quanto aos objetivos específicos do presente artigo, pode-se descrever os seguintes: a) apresentar e analisar um modelo de painel de bambu para habitações econômicas; b) identificar as facilidades e dificuldades construtivas encontradas na produção do painel de bambu proposto; c) avaliar o desempenho do painel de bambu revestido com argamassa. Quanto à metodologia empregada para atingir aos objetivos propostos, adotaram-se as seguintes atividades: d) revisão da bibliografia sobre o tema dos painéis de vedação vertical dos bambus e estado da arte da produção e utilização dos painéis de bambu; e) desenvolvimento de projeto arquitetônico de habitação econômica, bem como dos painéis de bambu a serem utilizados na referida habitação; f) construção dos corpos-de-prova empregados na avaliação experimental; g) realização de ensaios de avaliação de desempenho dos painéis de bambu argamassados, bem como análise dos resultados obtidos.

1 ESTADO DA ARTE DA PRODUÇÃO E UTILIZAÇÃO DOS PAINÉIS DE BAMBU Os painéis de vedação são considerados como um dos principais componentes construtivos das edificações feitas de bambu. Podem ser executados de diversas maneiras, com o emprego de tecnologias que variam de região para região, levando-se em consideração o clima, a necessidade de vedação total ou parcial da edificação ou dos ambientes, a cultura construtiva da região, dentre outros fatores que condicionam a escolha do tipo de painel. A presente revisão bibliográfica apresenta brevemente o estado da arte dos modelos mais utilizados de painéis de bambu. A utilização do bambu para a produção de painéis de vedação mostra-se bastante vantajosa, pois é econômico, de fácil aplicação, podendo ser executada por pessoas que tenham conhecimento básico das técnicas construtivas necessárias. No caso da Colômbia, as comunidades produzem os painéis de vedação das suas casas sem a intervenção de empresas construtoras ou lojas de materiais de construção. Segundo Vegesack e Kries (2000), o bambu frequentemente é o material escolhido para produzir desde os mais variados tipos de “cercados” até painéis e paredes autoportantes. Os fechamentos verticais feitos com painéis de bambu podem ser projetados e executados de diversas maneiras, com tecnologias e técnicas construtivas distintas. Estes podem utilizar-se de esteiras entrelaçadas, de módulos pré-fabricados com o uso de madeira e de bambu, podem ser rebocados ou não, e suas juntas podem ser recobertas com o uso de cordas ou fibras naturais, conferindo um detalhe a mais aos painéis de bambu. Os painéis de bambu são classificados em duas categorias distintas: artesanais e pré-fabricados, facilitando assim o estudo de seus tipos. Os painéis de bambu artesanais podem ser classificados de acordo com suas características e usos, como painéis de bambu estacados, painéis feitos de esteira, painéis feitos de esteiras com desenhos decorativos, painéis de bambu vazados, painéis preenchidos com barro, painéis do tipo bahareque (taipa) com esteiras duplas, painéis do tipo "tendinous" ou tencionados (Índia e Colômbia). Os painéis de bambu pré-fabricados podem ser divididos em dois grupos distintos, que são: painéis com moldura de madeira e varas de bambu para preenchimento (Figura 1), e painéis préfabricados com "esterillas" de bambu ou bambu planificado (Figura 2). Observa-se, através da pesquisa desenvolvida, que o processo de produção dos painéis de bambu é bastante simples, partindo da pré-fabricação artesanal, não totalmente industrializada. Não é estritamente necessário o uso de mão de obra especializada para a fabricação dos painéis, já que seu sistema construtivo pode ser facilmente apreendido pela população.

2 PROCEDIMENTOS EXPERIMENTAIS 2.1 METODOLOGIA Neste item são descritos os principais materiais utilizados na produção dos corpos-de-prova dos painéis de bambu, bem como a metodologia adotada e as etapas de produção dos corpos-de-prova, elementos fundamentais para a realização dos ensaios de aderência da argamassa. As atividades listadas a seguir caracterizam a metodologia empregada na pesquisa desenvolvida, aqui relatada em forma de artigo, as quais foram: a) desenvolvimento de projeto arquitetônico de habitação econômica, bem como dos painéis de vedação feitos de bambu;

152


b) construção dos corpos-de-prova empregados na avaliação experimental, descrevendo a preparação do material, as etapas de construção e os cuidados necessários no processo; c) realização de ensaios de avaliação de desempenho dos painéis de bambu argamassados, bem como análise dos resultados obtidos. 2.2 PROJETO ARQUITETÔNICO DOS PAINÉIS DA HABITAÇÃO ECONÔMICA Através do desenvolvimento de um modelo de casa econômica de bambu, foi possível criar um tipo específico de painel de vedação executado como parte prática deste trabalho (Figuras 3 e 4). Buscou-se a melhoria da qualidade técnica e construtiva, de acordo com os itens abaixo: a) o painel foi projetado na tentativa de solucionar problemas detectados em painéis de bambu, além de buscar atender às exigências técnicas e funcionais do projeto arquitetônico da casa; b) a matéria-prima (bambu) usada para a produção dos painéis é acessível e facilmente encontrada na região (Goiás); c) o sistema construtivo do painel deve ser simples, facilitando a assimilação da mão de obra sem experiência com o bambu; d) o peso específico do painel é baixo, por exemplo, se comparado com um painel de concreto armado ou painel similar empregando madeira na moldura. As molduras de bambu, além de serem mais leves, são ecologicamente adequadas, contribuindo assim com a preservação das madeiras, haja vista que a grande maioria delas encontra-se em processo de extinção; e) o painel proposto deve ser mais barato, uma vez que as molduras de madeira custam em média 80% a mais do que as molduras de bambu. Os painéis, depois de instalados, vedam verticalmente a casa e podem ser revestidos com argamassa de reboco, que além de proteger a edificação da entrada de insetos pelas frestas dos bambus, confere a ela melhor aspecto estético. Tanto as paredes externas quanto as internas podem ser rebocadas. As paredes, depois de rebocadas, podem receber qualquer tipo de revestimento como pintura ou revestimento cerâmico. 2.3 MATERIAIS UTILIZADOS 2.3.1 Espécies de bambus utilizadas O projeto arquitetônico do painel de bambu proposto é composto de três espécies de bambu colhidas no Estado de Goiás, que são Bambusa tuldoides, Phyllostachys bambusoides e Dendrocalamus giganteus. Os bambus foram selecionados nas touceiras de acordo com seu diâmetro e idade. De acordo com o diâmetro, buscou-se a padronização dos bambus da espécie Bambusa tuldoides, pois, de acordo com seu uso para o preenchimento dos painéis, as varas deviam ter diâmetro padronizado de 3,5 cm. Quanto aos bambus da espécie Dendrocalamus giganteus, não houve a necessidade de padronização das varas, pois estas seriam abertas em tiras para serem utilizadas como peças de travamento dos painéis. O diâmetro das espécies colhidas variou entre 14 e 18 cm. A espécie Phyllostachys bambusoides possui colmos retilíneos e de grande beleza ao ser trabalhado. Esta espécie foi utilizada para a produção das molduras de bambu, sendo selecionados colmos com 5,5 cm de diâmetro. De acordo com a idade, foram selecionados apenas os bambus maduros, com mais de três anos de idade, sendo que, para a detecção da idade, utilizou-se um método empírico de reconhecimento pela aparência. Os bambus foram colhidos com o uso de motosserra e aparados posteriormente com serra circular elétrica, deixando cerca de 50 cm da base da planta no solo, respeitando-se assim a maneira correta de corte, que não permite a retirada da raiz da planta. As varas de bambu foram secas através de um método simples conhecido como secagem ao ar. O tratamento aplicado aos corpos-de-prova de bambu foi a mineralização, procedimento que será descrito no item 2.5. 2.3.2 Ferramentas e equipamentos As ferramentas utilizadas na fase executiva dos corpos-de-prova de bambu são simples, facilmente encontradas e de fácil manuseio, exceto a serra circular. Esta máquina, porém, é responsável pelo bom acabamento do corte das peças de bambu, pois não estilhaça as fibras e faz cortes especiais, como os cortes em 45°. As principais ferramentas utilizadas foram facão ou foice sem bico, martelo, furadeira com serra-copo, serra circular e retífica elétrica (ferramenta da engenharia mecânica).

153


Os principais materiais utilizados, na etapa de execução dos corpos-de-prova, foram arame galvanizado 2,10 mm, bwg 14, rolo de 35 m, parafusos de rosca para máquina de cabeça redonda 5/32” e porca estampada 5/32”. 2.4 PRODUÇÃO DOS CORPOS-DE-PROVA Foram executados seis corpos-de-prova de bambu, com dimensões de 1,00 x 1,00 x 0,06 m, para desenvolvimento de exercício de experimentação do processo construtivo e de demonstração da parte prática do trabalho (Figura 5). Os corpos-de-prova são compostos por três componentes construtivos, todos feitos de bambu: a moldura, as varas de preenchimento e as travessas. A técnica utilizada para a produção destes componentes é simples, não necessitando de ferramentas sofisticadas nem de um espaço físico amplo. Porém, alguns cuidados devem ser tomados para que não ocorram erros ou desperdício de matériaprima. 2.4.1 Molduras de bambu Os corpos-de-prova foram feitos com molduras de bambu em substituição às molduras de madeira. Utilizou-se para as molduras a espécie Phyllostachys bambusoides, selecionada com espessura média de 5,50 cm. Os colmos foram partidos ao meio manualmente, com o auxílio de facão (ou foice sem gavião) e martelo, formando peças de bambu em meia-cana. 2.4.2 Travessas de bambu Trata-se de varas retilíneas, feitas a partir dos colmos da espécie Dendrocalamus giganteus, que são abertas manualmente e auxiliam na montagem e fixação do painel, travando as varas de preenchimento através de parafusos. 2.4.3 Varas de preenchimento Utilizam-se varas finas e roliças, de 3,5 cm de diâmetro, da espécie Bambusa tuldoides, para o preenchimento dos corpos-de-prova. As varas são colocadas em posição horizontal, cumprindo parte da função de vedação. O processo de união e fixação das varas é bastante simples e conta com o auxílio de duas travessas de bambu (parafusadas) e arame galvanizado, que auxiliam na estabilização da estrutura de bambu do corpo-de-prova. 2.5 MINERALIZAÇÃO DOS CORPOS-DE-PROVA A mineralização, primeiro procedimento executado após o término da estrutura de bambu, consiste em um método com pouca bibliografia e divulgação científica no que diz respeito a sua aplicação e eficiência em bambus. De acordo com Alves (1976, p.1), “a mineralização consiste na preparação de uma solução de silicato de sódio que, ao ser aplicada em fibras vegetais, ajuda a eliminar o efeito da absorção de água destes materiais”. Tal procedimento demonstrou ser de fácil aplicação, além de utilizar materiais acessíveis como a água e o cimento. A mineralização é feita mergulhando-se as estruturas de bambu em um tanque com uma calda de cimento e água (relação 1:5, cimento:água), sendo que neste trabalho utilizaram-se 600 litros de água para 120 kg de cimento. Antes de serem mineralizadas, as superfícies das varas de preenchimento, das travessas e da moldura são lixadas, com lixa grossa para madeira, a fim de promover a aderência entre a estrutura de bambu e o revestimento de argamassa. Durante o processo de mineralização, as estruturas de bambu permaneceram 48 horas submersas na calda de cimento (Figura 6). Após este período, foram retirados os corpos-de-prova da calda, deixando que secassem em ambiente coberto, protegido do sol e da chuva, na posição vertical, encostados, por exemplo, em paredes. Adotou-se o procedimento da mineralização com o objetivo de imunizar os colmos de bambu, de solidificar os feixes vasculares e células parenquimáticas dos colmos com micro partículas de cimento diminuindo a absorção de água, e de melhorar a aderência da argamassa de revestimento ao bambu. Portanto, a técnica de mineralização pode influir, beneficamente, na aderência e na imunização. 2.6 ENSAIOS REALIZADOS Os seis corpos-de-prova de bambu produzidos e tratados com calda de cimento foram chapiscados com uma argamassa de traço 1:3:0,5:0,1 (cimento Portland CP II-F : areia artificial : a/c igual a 0,5 : adesivo de base acrílico) e revestidos com uma argamassa de traço 1:0,5:4 (cimento Portland CP II-F : cal hidratada : areia de leito de rio).

154


O desempenho do painel revestido e do revestimento formado pelo chapisco e pela argamassa de revestimento foi avaliado através dos seguintes aspectos: cor do painel e textura do revestimento, presença de defeitos superficiais e fissuras, peso do painel, pulverulência, dureza superficial, resistência ao risco e resistência de aderência à tração. Ressalta-se ainda que, diante da ausência de normas para avaliação do desempenho de painéis de bambu, os procedimentos de avaliação apresentados a seguir ou são baseados em requisitos de desempenho, ou em normas referentes a outros tipos de painéis, tais como os de gesso acartonado ou alvenaria tradicional.

3 RESULTADOS E ANÁLISES DO PAINEL REVESTIDO COM ARGAMASSA 3.1 QUANTO À COR DO PAINEL E TEXTURA DO REVESTIMENTO A avaliação visual é fator importante no momento em que se decide pelo uso de um painel de bambu revestido com argamassa. Após a aplicação e secagem do revestimento, obteve-se um painel de cor cinza claro, com a moldura de bambu aparente (Figura 7). Quanto à textura, o painel apresentou textura áspera e rugosa, equivalente ao revestimento de argamassa empregado em alvenarias de blocos ou tijolos cerâmicos. 3.2 QUANTO À PRESENÇA DE DEFEITOS SUPERFICIAIS E FISSURAS Verificou-se que, em alguns poucos pontos, os resíduos de nós tiveram que ser novamente lixados, antes da aplicação da argamassa de revestimento, para que não ficassem descobertos e aparentes na superfície do painel. O mesmo comentário pode ser feito com relação aos parafusos. No Painel 4, contatou-se a presença, na superfície argamassada, da travessa de amarração. Nestas áreas (nós, parafusos e travessas), foram obtidas pequenas espessuras de revestimento. A pequena espessura de revestimento pode influenciar na resistência de aderência à tração, na presença de fissuras, na permeabilidade e no desempenho geral do painel ao longo da sua vida útil. A Tabela 1 apresenta a avaliação das fissuras nos corpos-de-prova, considerando os seguintes aspectos: número e tipo de fissuras, localização das fissuras, abertura superficial e causa do seu aparecimento. As fissuras por assentamento plástico linear são aquelas que ocorrem devido à presença de um elemento que restringe a movimentação (assentamento) da argamassa, quando a mesma ainda está no seu estado plástico. Este tipo de fissura foi observado nos Painéis de número 2, 3, 4 e 6. Nestes casos, o elemento que restringiu a movimentação da argamassa foi a vara de bambu, empregada como travessa de amarração do painel e as fissuras acabam ocorrendo sobre essas travessas. A baixa espessura de cobrimento (argamassa) sobre este elemento intensifica o fenômeno descrito. Para eliminar as fissuras evidenciadas nos painéis, sugere-se que as travessas sejam inseridas em sulcos, produzidos nas varas de preenchimento (horizontais). Desta forma, o cobrimento de argamassa seria maior, diminuindo a possibilidade de fissuração por assentamento plástico, facilitando o travamento do conjunto de varas que compõe o painel e eliminando a possibilidade das travessas ficarem aparentes ou salientes na superfície revestida com argamassa. 3.3 QUANTO AO PESO Como os corpos-de-prova foram produzidos com 1 m², os valores obtidos podem ser considerados em kg/m2 . Antes de serem revestidos, os painéis de bambu pesaram 12,5 kg, em média. O peso médio dos corpos-de-prova foi de 80,6 kg/m2 e o desvio padrão médio foi de 2,64%, o que significa que o peso individual dos painéis ficou bastante próximo da média. Comparando-se os pesos dos painéis com o peso de uma alvenaria de tijolos maciços, com 240 kg/m2, verifica-se que o painel de bambu é 2,98 vezes mais leve. Em comparação com uma alvenaria de blocos cerâmicos, com 180 kg/m2, o painel de bambu seria 2,23 vezes mais leve. Fazendo-se a mesma comparação com uma divisória de gesso acartonado, com 42 kg/m2, apenas para se ter outro parâmetro e reconhecendo que as funções dos painéis não seriam as mesmas, o painel de bambu seria 1,92 vezes mais pesado que a divisória de gesso acartonado (Tabela 2). 3.4 QUANTO À PULVERULÊNCIA Ao pressionar uma pedra abrasiva de “carburundum”, com movimentos circulares sobre a superfície dos painéis argamassados, ocorreu uma remoção de grãos de agregados e pasta de cimento, equivalente ao que ocorre quando o mesmo ensaio é feito sobre uma alvenaria convencional revestida com argamassa.

155


3.5 QUANTO À DUREZA SUPERFICIAL No ensaio de dureza superficial, uma esfera maciça de aço com massa de 400 g e diâmetro de 47 mm é deixada cair livremente de uma altura de 50 cm sobre a superfície do corpo-de-prova. Após a queda, a esfera de aço deixa sobre a superfície ensaiada uma mossa (impressão). Recomenda-se o uso de papel-carbono para facilitar a leitura do diâmetro da mossa causada pela queda da esfera de aço. O diâmetro da mossa é medido com régua metálica ou paquímetro, com precisão de 1 mm. O diâmetro médio encontrado foi de 6,25 mm, o qual, comparando-se com o limite da ABNT/NBR 14715 (2001), que é de 20 mm, indica que a dureza superficial obtida é bastante superior ao requisito exigido pela norma. 3.6 QUANTO À RESISTÊNCIA AO RISCO A avaliação da resistência ao risco foi feita com um material pontiagudo de aço (parafuso). Considerando que o substrato pode influenciar no desempenho da argamassa de revestimento, bem como na sua composição, após riscada a superfície do painel, esta apresentou uma impressão equivalente à de uma alvenaria convencional. 3.7 QUANTO À RESISTÊNCIA DE ADERÊNCIA À TRAÇÃO Um dos principais requisitos que o proposto painel de bambu deve atender é o de resistência de aderência à tração da argamassa de revestimento sobre o painel de bambu. Para tanto, empregou-se a metodologia preconizada pela ABNT/NBR 13528 (1995), para determinar a resistência de aderência à tração e avaliar a forma de ruptura. A ABNT/NBR 13749 (1996), estabelece como limite mínimo de resistência de aderência à tração para revestimentos externos de camada única o valor de 0,3 MPa. O equipamento empregado para aplicar a tensão de tração foi o DYNA PROCEQ – pull-of tester Z16. Utilizou-se uma furadeira com broca tipo ”serra-copo” para furar o revestimento de argamassa, até atingir o substrato de bambu, delimitando a área de ensaio em três regiões de cada painel. Uma pastilha metálica foi, então, colada com epóxi sobre as regiões delimitadas em cada corpo-de-prova, encontrandose, assim, três valores de resistências de aderência. A forma de ruptura foi avaliada visualmente, comparando-se os perfis de ruptura de cada ensaio. A Tabela 3 mostra os resultados obtidos. Observa-se que a média obtida em cada painel avaliado foi superior a 0,3 MPa. Apenas uma região apresentou valor individual de resistência de aderência inferior ao limite mínimo estabelecido pela ABNT/NBR 13749 (1996). Portanto, os valores obtidos indicam que a argamassa de revestimento pode aderir-se adequadamente sobre o painel de bambu.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS 4.1 QUANTO AO PROJETO ARQUITETÔNICO DOS PAINÉIS DE BAMBU: a) fica evidenciado que a pré-fabricação artesanal destes componentes construtivos promove a facilidade da construção, bem como agiliza o processo produtivo das habitações econômicas; b) a principal inovação apresentada no painel de bambu proposto foi a utilização das molduras de bambu, que funcionam como peças de fechamento. 4.2 QUANTO AO DESEMPENHO DO REVESTIMENTO DO PAINEL: a) constatou-se a presença quase que desconsiderável de fissuras nos painéis, apresentando um resultado satisfatório no que diz respeito ao quesito de aberturas superficiais; b) a pequena espessura de revestimento da argamassa, ou seja, do cobrimento, pode influenciar negativamente na resistência de aderência a tração, na presença de fissuras, na permeabilidade e no desempenho geral do painel, devendo ser evitada; c) os resultados alcançados em relação ao peso dos painéis foi satisfatório (peso médio de 80,6 kg), se comparado com o peso de painéis feitos de outros materiais, na mesma proporção de medidas (1 m²); d) quanto aos ensaios de resistência de aderência à tração da argamassa de revestimento, constatou-se que os valores obtidos confirmam que a argamassa de revestimento pode aderir-se adequadamente sobre os painéis de bambu, desde que os procedimentos sejam semelhantes aos executados neste trabalho.

156


Figura 1. Transporte dos painéis pré-fabricados. Fonte: Foto da autora, no V Congresso Internacional de Bambu, Costa Rica, 1998.

Figura 2. Painel finalizado, feito com esteiras de bambu. Fonte: Foto de Ana Maria França, Hogar de Cristo, Equador, 2001.

Figura 3. Vista frontal externa de alguns dos painéis que compõem a habitação. Fonte: Desenho de Janderson de Oliveira.

157


Figura 4. Detalhe do painel de bambu revestido com argamassa. Fonte: Desenho de Janderson de Oliveira.

Figura 5. Estrutura de bambu do corpo-deprova: (a) Vista frontal; (b) Corte longitudinal; (c) Corte transversal; (d) Detalhe do encontro dos painĂŠis com o pilar de bambu, em corte. Fonte: Desenho de Janderson de Oliveira.

158


Tabela 1. Avaliação da presença de fissuras nos painéis. Painel 1 2

Número de Fissuras e Tipologia Isento 2 fissuras verticais lineares

3

1 fissura vertical linear

4 5

Isento 1 fissura vertical linear

6

2 fissuras verticais lineares

Localização -----Sobre as travessas em ambos os lados do painel Sobre a travessa de amarração -----Sobre a travessa de amarração Sobre as travessas no mesmo lado do painel

Figura 6. Estruturas de bambu imersas na calda de cimento. Fonte: Foto da autora, tirada durante a etapa de execução, 2005.

Abertura Superficial -----0,1 mm e 0,25 mm 0,3 mm -----0,1 mm 0,1 mm

Causa -----Assentamento plástico Assentamento plástico -----Assentamento plástico Assentamento plástico

Figura 7. Aspecto geral de um dos corpos-deprova revestido com argamassa. Fonte: Foto da autora, tirada durante a etapa de execução, 2005.

Tabela 2. Comparação do peso médio de Painéis e de Alvenarias. Painéis e Alvenarias Alvenaria de tijolos maciços Alvenaria de blocos cerâmicos Painel de bambu Painel de gesso acartonado

2

Peso médio (kg/m ) 240,00 150,00 80,60 42,0

Comparações 2,98 vezes mais pesada do que o painel de bambu 2,23 vezes mais pesada do que o painel de bambu Parâmetro da comparação 1,92 vezes mais leve do que o painel de bambu

159


Tabela 3. Resultados obtidos no ensaio de resistência de aderência à tração. Painel

Tensão de Ruptura Média (MPa)

Forma de Ruptura Média (MPa)

0,72 1

0,29

0,48

0,43 0,59 2

0,28

0,51

0,65 0,36 3

0,44

0,33

0,18 1,07 4

0,78 0,66

0,84

Forma de Ruptura 20% no substrato 80% na argamassa 50% no substrato 50% na argamassa 15% no substrato 85% na argamassa 10% no substrato 90% na argamassa 60% no substrato 40% na argamassa

Espessura de Argamassa sobre o Bambu (mm) 14 14

15,30

18 16 14

100% na argamassa 10% no substrato 90% na argamassa 5% no substrato 95% na argamassa 90% no substrato 10% na argamassa

18

100% na argamassa

30

100% na argamassa

26

100% na argamassa

24

16

16 17

16

15 26,70

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, J. D. Influência das Fibras nas Propriedades do Concreto. In: JORNADAS SUL-AMERICANAS DE ENGENHARIA ESTRUTURAL, 18., 1976, Salvador. Anais... Salvador: IBRACON, 1976. 25 p. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13528: Revestimentos de parede e tetos de argamassas inorgânicas – Determinação da resistência de aderência à tração. Rio de Janeiro, 1995. ________. NBR 13749: Revestimentos de parede e tetos de argamassas inorgânicas – Especificação. Rio de Janeiro, 1996. ________. NBR 14715: Chapas de Gesso Acartonado – Requisitos. Rio de Janeiro, 2001. VEGESACK, A. Von.; KRIES, M. Grow your own House: Simón Vélez and bamboo architecture. Balingen/Alemanha: Vitra Design Museum und Autoren, 2000. 255 p.

160


7 ARTIGOS SOBRE POLÍTICAS PÚBLICAS E INCLUSÃO SOCIAL 7.1 ARTESANATO DE BAMBU NA CHINA: RELATO E REFLEXÕES SOBRE UM CURSO DE TREINAMENTO NA PROVÍNCIA DE SICHUAN Jaime Gonçalves de Almeida1

Resumo O treinamento em artesanato de bambu intitulado "International Training Workshop on Bamboo Handicraft - Bamboo Weaving and Furniture Processing Technologies" enfocou técnicas de trançados e manufatura de mobiliário. Foi realizado no Centro denominado Qinshen China Bamboo Art City, do condado de Qinshen, província de Sichuan, República Popular da China. O treinamento foi promovido, organizado e coordenado pelo International Network for Bamboo and Rattan (Inbar). Ocorreu entre os dias 10 e 31 de outubro de 2005. Os principais objetivos do treinamento foram a divulgação de conhecimentos e habilidades práticas sobre técnicas artesanais e tradicionais chinesas para a manufatura de trançados e de móveis de bambu. O texto engloba o relato do curso bem como traz algumas reflexões sobre ele e, em anexo, apresentam-se fotografias sobre as atividades nele desenvolvidas. Palavras-chave: Trançados. Fitas. Habilidades Manuais. Rede. Fábricas Familiares. Abstract The "International Training Workshop on Bamboo Handicraft - Bamboo Weaving and Furniture Processing Technologies" took place in Qinshen China Bamboo Art City in the County of Qinshen, province of Sichuan, China. It was organized by International Network for Bamboo and Rattan (Inbar). The course happened in October between 10 and 31 2005. The mains goals of the training were the teaching people from various places in the world the manual Chinese techniques for the fabric of artesian furniture and small objects. It worked mainly on the production of strips from the colm of bamboo for weaving of mats e making others things and, too, on the fabric of some pieces of furniture. This paper is divided in two parts. The first one presents a description of the course e, the other, contains some considerations and also evaluation of that experience aiming improving the work of similar Brazilian institutions. Keywords: Mat. Strips. Manual Abilities. Network. Familiar Fabric. Este texto está organizado em três principais seções. As seções 1 e 2 apresentam o curso, suas atividades, produtos e outros aspectos correlatos. A seção 3 trata da reflexão e observações sobre o treinamento. São estas as seções que compõem o texto: 1 Programa e Atividades do Treinamento, 2 Exercícios Práticos e, 3 Conclusões. Em anexo encontram-se fotografias de momentos do treinamento e suas atividades paralelas.

1 PROMOTORES, PROGRAMA E ATIVIDADES DO TREINAMENTO 1.1 PROMOTORES DO TREINAMENTO O programa do treinamento foi organizado pelo Inbar e ministrado pelo professor Zhou Zhao Hua e pela diretora de publicações Jin Wei, a qual durante o curso fez a tradução do chinês para o inglês e viceversa, ficando a coordenação das atividades práticas com o mestre Chen Yun Hua, coordenador do Qinshen China Bamboo Art City, ou simplesmente Centro, onde ocorreram as atividades do treinamento. A equipe de artesãos e o pessoal administrativo desse Centro participaram diretamente das diferentes etapas do curso, especialmente de suas atividades práticas e de apoio logístico.

1 Professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de Brasília (FAUUnB), e Diretor do Centro

de Pesquisa e Aplicação de Bambu e Fibras Naturais – CPAB/UnB. O treinamento foi viabilizado pelo apoio do International Network on Bamboo and Rattan (Inbar), do Programa Nacional de Florestas (PNF) da Diretoria de Florestas e Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente (MMA), da Financiadora de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos (Finatec) e da Fundação Universidade de Brasília (FUB). E-mail: (cpab@unb.br).

161


1.2 PARTICIPANTES CONVIDADOS E PROGRAMA DO TREINAMENTO Das atividades do treinamento participaram nove alunos, um representante do Brasil, um representante das Filipinas, dois representantes da Indonésia, um representante do Peru, um representante do Nepal, dois representantes do Neyamar e um representante da Nigéria. O programa de treinamento foi organizado em três unidades básicas ou blocos de atividades que foram ministradas de forma intercalada. A primeira unidade foi constituída de aulas expositivas, a segunda, de visitas técnicas e, a terceira, de exercícios práticos (elaboração de produtos). 1.3 ATIVIDADES PARALELAS AO TREINAMENTO Além dessas atividades formais, o Inbar e o Centro promoveram eventos de natureza social e cultural como a apresentação de grupo folclórico local, a realização de reuniões sociais com autoridades da cidade vizinha ao Centro, com instituições de ensino locais e regionais e com representantes de associações rurais envolvidas na produção do bambu. Foram também realizadas visitas a alguns lugares regionais de interesse turístico. Um desses lugares visitados foi Leshan, uma cidade da província de Sichuan que possui um mosteiro budista onde a principal atração é o conjunto de edificações tradicionais e uma imensa estátua de Budha esculpida no rochedo daquele conjunto. Essa estátua é tida como a maior escultura de Budha. Nesse programa foram incluídas outras cidades como Chengdu e Shon Li, uma das mais antigas cidades chinesas e, também, o centro de reprodução do urso panda. Tive ainda a oportunidade de realizar dois programas extras de interesse profissional e acadêmico que foram as visitas à sede do Inbar, onde tive contatos com a direção dessa rede, e à Cidade Proibida (Palácio Museu) em Beijing. 1.4 TREINAMENTO TÉCNICO As aulas e atividades expositivas foram coordenadas pelo professor Zhou, sendo a maior parte dessas aulas ministrada por esse professor e outras, aquelas de natureza técnica executiva, ficaram sob a responsabilidade do mestre Chen com a tradução e organização de Jin Wei. As aulas do prof. Zhou versaram sobre a tecnologia e a produção do bambu na China, a sua potencialidade e importância socioeconômica, os agentes e o sistema organizacional envolvidos nessa produção e o mercado. Em suma, tal produção chinesa envolve uma cadeira de agentes e setores mais ou menos especializada incluindo-se nela as fábricas familiares, responsáveis pela execução, os setores empresariais, responsáveis pela promoção, comercialização e fomento, e o estatal, no tocante às políticas públicas. 1.5 ATIVIDADES TÉCNICAS ESPECÍFICAS As aulas de conteúdo específico e técnico evidenciaram alguns tópicos de interesse, entre eles o caso do condado de Anji, província de Zhejiang, onde essa matéria-prima desempenha um relevante papel nas condições de vida daquela população e, também, o estado da arte do conhecimento do bambu na China. Para cada parte da planta (bambu enquanto árvore), há uma utilização preferencial ou potencial, por exemplo, uma determinada parte do colmo do bambu é destinada à manufatura de fitas para os trançados diversos, outra para a confecção de objetos decorativos, outra para o mobiliário e os laminados colados e, outra, para a produção de brotos (alimentação). Idêntico procedimento se aplica às demais partes da planta como o rizoma, as folhas e os galhos. Nesse bloco de atividades técnicas foram incluídos dois tópicos especiais, quais sejam: exposição, com projeção e comunicação oral, feita pelos participantes do treinamento sobre as suas realizações com bambu no país de origem. Somente três participantes expuseram trabalho sobre bambu. Nelas, como representante do Brasil, tive a oportunidade de mostrar as realizações do Cantoar/FAUUnB destacando os aspectos concernentes ao desenho e à inovação de componentes e de estruturas arquitetônicas com o bambu. O segundo desses dois tópicos especiais foi a avaliação final do treinamento, que aconteceu sob duas formas, a avaliação oral e a escrita (preenchimento de um formulário sem identificação do avaliador). A oral aconteceu em reunião dos alunos com os organizadores do treinamento. Nela, cada aluno pode expressar a sua opinião a respeito do curso como um todo. 1.6 VISITAS TÉCNICAS As visitas técnicas foram concentradas em três setores da cadeia produtiva de bambu, especialmente a do artesanato. O primeiro setor visitado foi o próprio Centro, onde começamos a perceber o ponto focal do sistema da rede chinesa dessa produção. O Centro funciona como uma empresa voltada para o gerenciamento e a comercialização de produtos, bem como para a inovação em termos de desenho e técnicas de produção. O segundo setor visitado foi o da pequena produção e comercialização de móveis tradicionais de bambu no condado de Qinshen e, o terceiro, as fábricas familiares de produção artesanal de trançados e de pequenos objetos, nesse condado. Quanto ao primeiro setor (o Centro), tivemos a oportunidade de conhecer as suas instalações físicas e os seus principais mecanismos operacionais e empresariais para a manufatura de matéria-prima,

162


a produção e o agenciamento de produtos e serviços relacionados com essa produção de bambu. De um modo esquemático, essa instituição atua em quatro áreas dessa produção. A primeira delas consiste no preparo e fornecimento de matéria-prima (por exemplo, fitas de bambu imunizadas e tingidas ou coloridas) para a produção familiar e semifamiliar (inclusão da vizinhança) instalada no campo e na cidade. A segunda compreende a produção direta de móveis, objetos e bordados de bambu no próprio Centro. A terceira, a oferta de cursos, treinamento e capacitação para um público diversificado procedente tanto do próprio país quanto do exterior (estudantes, artesãos, profissionais, curiosos, etc.). O Centro oferta atividades regulares como estágio e residência técnica. A quarta área de atuação do centro consiste na articulação com outros setores produtivos externos do condado de Qinshen (pequenas indústrias locais) para a complementação de serviços e finalização de produtos não realizados pelo Centro, a exemplo de molduras de madeira para quadros tecidos com fitas de bambu (serviços de marcenaria), fabricação de caixas de embalagem, e acabamento de placas de esteira para revestimento de parede (pintura, envernizamento e embalagens). Em termos de situação predial, o Centro é composto por várias unidades situadas em terreno próprio. Por exemplo, há uma unidade de produção de móveis, uma oficina de bambu completa, com equipamentos elétricos (furadeiras manuais, pinadora, prensa, compressor de ar, máquina para a extração de fitas de bambu, entre outras), prensa para placas (esteiras) e tanques e caldeiras para imunização e tingimento químico de material. Há unidades de composição e bordado de quadros, sendo uma no Centro e outra na cidade vizinha, ambiente de criação de novos produtos, auditório e várias salas de reunião e de aulas, alguns salões de trabalho coletivo para treinamento, um refeitório e alojamento, sede administrativa e depósito, afora outras unidades complementares de apoio, socialização e de recreação de alunos, funcionários e visitantes. Quanto ao segundo setor, visitamos uma indústria de porte médio de mesas e cadeiras de laminado colado de bambu, onde o enfoque da visita foi conhecer o processo artesanal e semi-industrial de fabricação de mobiliário. Essa fábrica não trabalha com móveis tradicionais como faz o Centro, mas sim com desenhos próprios. Pudemos observar que o processo de laminação do bambu é resultado de uma combinação de processo mecânico e artesanal. A colagem das ripas de bambu com bambu e de bambu com madeira é feita artesanalmente; já a prensagem é feita mecanicamente, e os cortes e laminação, industrialmente. Utiliza-se prensa manual a quente e grampos do tipo sargento. Na fabricação e montagem do móvel, os cortes dos blocos e chapas de bambu colado são realizados numa marcenaria. O acabamento do móvel segue o mesmo processo de móveis convencionais de madeira, com lixamentos e aplicação de seladoras e vernizes, entre outros. Fez parte desse módulo a visita ao comércio local de Qinshen, especialmente as principais ruas comerciais de fabricação e venda de móveis artesanais, tradicionais e populares de bambu e ratan. Verificamos que grande parte dos processos e das técnicas como, também, das ferramentas e dos equipamentos de trabalho utilizados por esses pequenos artesãos-comerciantes na fabricação daqueles móveis são idênticos aos empregados pelo Centro. Entretanto, pudemos constatar ainda que toda aquela produção de cadeiras e mesas se destinava ao consumo local, ao contrário dos principais produtos do Centro, que vão para o mercado internacional, especialmente para o americano, europeu e japonês. Na feira ou no mercado, tivemos contato com os produtos populares de bambu. Nele se comercializam essencialmente os de utilidade doméstica, comercial e rural, como, por exemplo, cestos e arupembas para a guarda e limpeza de grãos, para o transporte de material de construção (areia, massa, etc.), para a limpeza de piso, como as vassouras, e de uso pessoal, como os chapéus. Notamos, no entanto, que o processo de trançado utilizado nesses objetos era idêntico ao desenvolvido pelo Centro. A diferença substancial entre eles não se resume ao seu tamanho, mesmo considerando os grandes cestos da feira ou pequenos do Centro, mas, sobretudo, a finalidade e o significado que esses produtos representam para o mercado a que eles se destinam. Grande parte do que é produzido no Centro visa uma clientela mais sofisticada que aprecia em geral a qualidade artística e cultural dos objetos de bambu, ao passo que os produtos da feira servem às necessidades prático-utilitárias da vida. Talvez por isso o Centro reveste seus produtos com uma qualidade invejável de execução, de acabamento, de utilização de padrões de cores e, sobretudo, o emprego de motivos decorativos provenientes da tradição chinesa (imagens de panda, anciões, pássaros, Budas, etc.). Entretanto, essa produção refinada de objetos de bambu é feita em grande escala. O terceiro setor visitado foi a rede de fábricas familiares. De fato, elas são pequenas organizações produtivas sediadas no campo e na cidade coordenadas por empresas. Essas fábricas trabalham exclusivamente com o manufaturamento de produtos de bambu sem se ocuparem com a produção de matéria-prima. Elas se definem a partir das seguintes características organizacionais e produtivas: unidade componente de um sistema maior de produção; especialização em determinado produto ou serviço (divisão técnica de trabalho); são constituídas por pessoas com laços familiares ou de vizinhança; e, remuneração por produção dos participantes. O planejamento territorial adotado no campo pelo governo chinês fez com que as habitações dos agricultores se concentrassem junto ao sistema de circulação viária, criando assim condições favoráveis à

163


circulação de pessoas e de produtos. Além disso, a residência do agricultor conta com uma base física de produção. Há nessa residência um cômodo para guarda de produto e um pátio de trabalho coletivo. No campo e na cidade visitamos seis dessas unidades de trabalho, das quais duas integravam a rede de produção do Centro e eram especializadas em trançados de cestos, de luminárias e de embalagens. Uma dessas unidades fazia parte de uma cadeia de fabricação de abanos cuidando especialmente do corte e do acabamento final do produto como, por exemplo, a costura da borda com tecido e a impressão de estampa colorida. Outra produzia trançado de esteiras para a fabricação de placas para revestimento de paredes e móveis, e a outra, produtos domésticos e rurais como, por exemplo, balaios e vassouras. Na zona urbana, entretanto, a visita ocorreu numa fábrica local de bordado com fios coloridos de bambu em porcelana, cujos produtos se destinam na sua maioria à exportação (vasos, bules, xícaras e outras peças decorativas). 1.7 CONSIDERAÇÕES TÉCNICAS DAS VISITAS Em três dessas visitas foram realizadas reuniões de trabalho envolvendo os alunos, o mestre Chen, o prof. Zhou, a liderança da associação local e da fábrica. Nelas foram abordados temas relacionados com a rede de produção, a divisão de tarefas, a distribuição de matéria-prima, escoamento da produção e outros aspectos técnicos e gerenciais da produção. Nessa oportunidade, verificamos in loco o trabalho realizado pelos diferentes membros da família, dos mais idosos (avós) aos de meia idade (pais) e aos mais jovens (principalmente moças) ou, como na zona urbana, por grupo homogêneo de mulheres jovens. Pudemos observar também a extensão da rede englobando um grande número de pessoas, a nítida divisão de tarefas entre os grupos participantes (artesãos especializados, agricultoresartesãos, pessoal de apoio, etc.), a forma predominante de trabalho por produção, e a longa jornada de trabalho. Provavelmente, o sucesso desse empreendimento pode ser atribuído, salvo outros condicionamentos socioculturais, aos seguintes aspectos: a) simplicidade das operações realizadas pelos agricultores, b) natureza tradicional do produto e das técnicas de trabalho (trançados geometrizantes e repetitivos), c) emprego intensivo de mão de obra; d) número reduzido de ferramentas de trabalho, e) capacidade gerencial do Centro. Adicionalmente, visitamos também uma escola primária que adotava como disciplina curricular práticas básicas de trançados de bambu, execução de pequenos objetos artesanais com fitas de bambu como, por exemplo, figuras de animais relacionados com o mundo infantil (cavalinhos, peixinhos e ursinhos, entre outros).

2 EXERCÍCIOS PRÁTICOS O treinamento requereu ainda dos participantes um conjunto de realizações práticas tendo como finalidade o aprendizado e domínio pessoal dos processos, das técnicas e ferramentas de trabalho disponibilizadas pelo Centro. Os exercícios constituíram um recurso didático e pedagógico importante para os participantes aplicarem ou exercitarem as técnicas básicas do trabalho com o bambu. Cada um desses exercícios teve, antes de sua realização, demonstrações ensaiadas pelo mestre Chen e seus auxiliares. Nesse sentido, foram feitos dois tipos de trabalhos práticos, um destinado aos trançados, e o outro, ao mobiliário. Alguns objetos alvos desses exercícios foram realizados individualmente e outros coletivamente, isto é, em equipes de alunos. 2.1 EXECUÇÃO A execução dos exercícios pelos alunos foi acompanhada pelos coordenadores e apoiada por artesãos-instrutores do Centro. Para cada grupo de estudantes havia um instrutor. Os alunos participaram diretamente de cada uma das fases daquele processo como, por exemplo, preparando o material, fabricando e finalizando, ou dando acabamento final. Entretanto, a imunização de peças e de fitas de bambu bem como o seu tingimento não foram realizados experimentalmente pelos alunos, mas tivemos aulas a esse respeito pelo prof. Zhou e pelo mestre Chen. 2.2 TRABALHO COM FITAS DE BAMBU Quanto ao trabalho com as fitas para trançados (esteiras, cestos, lâmpadas, etc.), o primeiro exercício realizado foi o preparo demonstrativo do material a ser utilizado na execução desses produtos. Essas técnicas básicas que foram ensinadas pelos instrutores abrangeram diferentes aspectos, tais como a extração das fitas de bambu, a limpeza da peça (remoção da parte externa superficial do entrenó), a

164


divisão da ripa em duas partes, a verde (junto à parte externa da ripa) e a amarela (parte interna), a extração das fitas da parte verde da ripa e o trançado bem como os demais acabamentos do produto. Entretanto, os alunos utilizaram na confecção dessas tramas material preparado previamente pelo Centro. 2.3 MANUFATURA DE MOBILIÁRIO Quanto às peças do mobiliário, o segundo exercício prático realizado pelos alunos, da mesma forma que nos trançados, foi precedido por uma aula sobre as técnicas básicas como, por exemplo, a seleção de peças de bambu apropriadas àquele trabalho, a retirada dos nós, a retificação da peça, o enchimento com areia para encurvamento, o uso do maçarico a gás, a remoção da parte externa (superfície verde do colmo), a preparação de gabaritos, o uso de arco de serra, de formão e de furadeira elétrica, e a preparação de superfícies para envernizamento ou lustração. Em termos didáticos, para cada um dos exercícios realizados, havia explicações preliminares pelos coordenadores do treinamento e, em seguida, a realização da tarefa ou a execução de uma peça modelo pelo instrutor pela qual os alunos acompanhavam cada etapa do trabalho observando, perguntando ou anotando. Após a demonstração, os alunos faziam o planejamento da tarefa, separavam os materiais e as ferramentas necessárias para a execução da peça. Quase sempre, as etapas de trabalho eram realizadas mais de uma vez devido a erros de cortes, de execução ou imperfeições no manufaturamento. Os objetos ou produtos executados pelos alunos, visando a aplicação das técnicas ensinadas, no trançado de três modalidades de produtos, um tipo de esteira, um de cesto e um brinquedo e na execução de mobiliário de três produtos: uma cadeirinha, uma mesinha e uma cama. Esta, no entanto, foi o único objeto produzido em equipe, os demais, individualmente.

3 CONCLUSÕES 3.1 SOBRE O ALCANCE DOS OBJETIVOS DO TREINAMENTO O curso atendeu completamente as minhas expectativas. Foi uma ótima oportunidade para o conhecimento da organização, do processo e dos meios utilizados pela rede de produção do bambu e, sobretudo, para a experimentação prática de técnicas chinesas de produção de objetos com essa matéria-prima, especialmente os trançados e móveis tradicionais chineses. O Centro disponibilizou aos alunos a sua infra-estrutura física e, sobretudo, informações sobre o que eles produzem, as técnicas e os meios envolvidos nessa produção. Destacarei alguns aspectos do curso que me chamaram a atenção, que após a devida avaliação, podem ser eventualmente aproveitados pelas instituições e organizações que trabalham com o bambu e outras fibras naturais em Brasília e no Brasil. O objeto desse relato-análise se limita ao artesanato de bambu (produtos de pequenas dimensões), entretanto alguns aspectos do processo socioempresarial de produção podem ser aproveitados por quem quer que se envolva na fabricação de componentes construtivos. 3.2 SOBRE A ESPECIFICIDADE DA EXPERIÊNCIA CHINESA A experiência chinesa com os bambus, principalmente aquela que vivenciei no Centro e no condado de Qinshen, província de Sichuan, deve ser colocada no seu contexto sociohistórico e cultural. Assim, tais experiências não podem e não devem ser transplantadas mecanicamente para outras diferentes situações sociais. Torna-se necessário, portanto, um exame apurado e minucioso das possibilidades reais do contexto em que se deseja implantá-las. 3.3 SOBRE O APROVEITAMENTO TÉCNICO POR INSTITUIÇÕES BRASILEIRAS As três principais questões que o curso evidenciou e que podem ser objeto de trabalho de instituições brasilienses e brasileiras congêneres são: a) a questão da rede socioempresarial tipicamente chinesa, a articulação de parcerias e a divisão operativa de trabalho, b) a questão tecnológica e dos meios de produção, c) a questão do treinamento e da qualificação dos envolvidos na rede. 3.4 SOBRE A REDE SOCIAL E EMPRESARIAL Quanto à rede social e empresarial de produção do artesanato na China, devo observar, antes, que estas foram as minhas impressões no curto espaço de tempo do curso de apenas três semanas. De um modo geral, esse sistema se configura como uma organização extensiva, descentralizada do ponto de vista operacional e predial sendo composta por diferentes agentes sociais tais como empresa, associações e indivíduos. Esse sistema é talvez a grande inovação chinesa na área de produção do

165


bambu, pois combina um programa de inclusão social de trabalhadores urbanos, rurais e famílias de agricultores com um processo produtivo em escala (rede) tocado por empresas. A produção, na grande maioria dos casos, ocorre na residência do agricultor, um dos principais lócus da rede no campo. Comparativamente com a situação brasileira da produção artesanal do bambu, esse sistema poderá vir a enriquecer o projeto de oficinas ou bambuzarias como, por exemplo, as idealizadas por Lúcio Ventania (artesão mineiro de bambu) que estão em curso no país sob a iniciativa de instituições como o Sebrae em Alagoas e no Mato Grosso. Entretanto, a efetivação de um sistema como esse no Brasil pressupõe, como foi ressaltado anteriormente, adaptações e, sobretudo, o estabelecimento de estratégias organizacionais diferenciadas do caso chinês. Por exemplo, as condições básicas de vida dos trabalhadores rurais e da agricultura familiar do entorno do Distrito Federal são diferentes das condições de vida dos agricultores chineses, os quais têm asseguradas condições básicas de vida como, por exemplo, o acesso à terra, à escola, à saúde, ao transporte e, principalmente, à habitação. Entretanto, algumas dessas condições são ainda desafios a serem vencidos no setor agrícola brasileiro, como por exemplo a habitação. Isso pressupõe um programa de rede com algumas especificidades. Por exemplo, a presença do Estado nos níveis municipal, estadual e federal deve ser considerada assim como os programas institucionais existentes voltados para a melhoria de vida no campo. Não menos importante é a presença da universidade que, por meio de suas atividades de pesquisa e desenvolvimento, ensino e conscientização e preservação ambiental, poderá vir a contribuir para a concretização da rede. 3.5 SOBRE O PAPEL DO CENTRO Observamos que a empresa coordenadora e administradora da rede, no caso o Centro, exerce uma ação fortemente centralizadora, o que poderá, com o passar do tempo, transformar a rede em um sistema hierárquico. Atualmente, toca a ela tomar as principais decisões sobre o produto a ser feito, a inovação a ser implementada e o preço dos serviços dos diferentes agentes sociais envolvidos na produção. Assim, a empresa tende a concentrar as atividades geradoras de inovação, de meios de produção (infra-estrutura física, entre outros) num único lugar e, sobretudo, de pessoal qualificado (equipe técnica especializada). No longo prazo, esse sistema de funcionamento produzirá uma ação inibidora entre os principais componentes da rede que são os agricultores e trabalhadores rurais. Ainda que eles tenham margem de autonomia de produção na rede, pois detêm conhecimento sobre o processo e as técnicas de trabalho além dos principais meios de produção como, por exemplo, as ferramentas, o transporte (em geral bicicletas e motocicletas) e espaço, esses agricultores estão privados do acesso direto ao mercado internacional, que é controlado diretamente pela empresa. No Brasil, a constituição de outras formas de organização do trabalho provavelmente reduziriam os problemas no desenvolvimento de uma rede mais equilibrada, isto é, menos hierárquica em termos de participação dos vários agentes na cadeia produtiva. 3.6 SOBRE A IMPLANTAÇÃO DE REDES OU ARRANJOS PRODUTIVOS NO BRASIL A implantação dessas redes no Brasil, enfrenta o problema da extensão territorial e da densidade populacional. No caso de Qinshen, além de ter a densidade populacional necessária ao seu funcionamento, a localização dos agricultores em relação ao Centro não ultrapassa o raio de 50 km. Na região centro-oeste, no entanto, os assentamentos rurais possuem entre si e com as cidades vizinhas maiores distâncias, situação agravada pela precariedade da malha viária (estradas e pontes) e pelas longas distâncias dos centros produtores de tecnologia e de qualificação pessoal (universidades e os institutos de pesquisa). No Estado do Acre, onde existe uma reserva considerável de bambu nativo, as distâncias entre as colocações, os centros tecnológicos, os de comercialização e de consumo de produtos são de magnitudes amazônicas. Entretanto, esse problema territorial não invalida a idéia da possível criação de redes de produção envolvendo diferentes agentes orientados por políticas públicas. Por um lado, o Estado do Acre possui associações e organizações sindicais consolidadas, o que contribui para a organização do trabalho e, por outro lado, esse Estado conta com uma Fundação de Apoio à Pesquisa. Soma-se a isto o fato de as universidades federais brasileiras disporem de um sistema de educação à distância para a qualificação pessoal e o desenvolvimento tecnológico dos produtos, o que concorreriam para reduzir o impacto daquelas dificuldades territoriais na constituição de redes de produção. Entretanto, poderia ser considerada, após a avaliação de lugares potenciais para tal, a realização no curto prazo de uma experiência piloto. No Entorno do Distrito Federal, a situação é bem menos problemática. Por exemplo, os assentados da reforma agrária estão afiliados aos movimentos sociais rurais e participam de programas de apoio governamental para produção e comercialização da agricultura familiar. Há mercado potencial relativamente próximo de Brasília e Goiânia. A área possui densidade populacional e menores distâncias físicas entre os assentados do que as existentes no Estado do Acre. Entretanto, a região não dispõe da quantidade desejada de matéria-prima (bambu e outras fibras naturais) para produção de artesanato em

166


larga escala. Ademais, haverá necessidade de estimular a plantação e o cultivo dessa matéria-prima além do levantamento e preservação das espécies nativas. 3.7 SOBRE A QUESTÃO TECNOLÓGICA A questão tecnológica, os meios e processo de produção, a China, ao incluir a população rural no sistema de produção artesanal do bambu, o fez de forma direta utilizando-se para tanto a simplificação dos meios dessa produção e a descentralização espacial. Não há edifícios semelhantes aos das fábricas tradicionais que abrigam todas as atividades e o pessoal relacionado com essa produção. Por outro lado, os equipamentos e as ferramentas de trabalho são reduzidos e de fácil aquisição. Por exemplo, o agricultor pode facilmente comprar uma pequena faca ou executar por ele mesmo um arco de serra, os quais constituem os principais instrumentos do trabalho artesanal. Aqueles equipamentos suplementares como, por exemplo, formas de madeira para a fabricação de luminárias e cestos, fornecidos a eles pelo Centro-empresa, podem, ainda, ser facilmente comprados no comércio local. Dessa forma, a simplicidade dessa tecnologia cria, por outro lado, condições de autonomia de produção dos agricultores, restando, no entanto, a questão da comercialização. Quanto à matéria-prima para os produtos, que em Qinshen é fornecida pelo Centro-empresa, devido às nossas longas distâncias poderiam ser criados no município por incentivo do governo local, estadual ou federal alguns núcleos para empreendimento dessa natureza, situados nas proximidades das áreas de produção. Com relação às técnicas de trabalho, não haveria problema, pois o sistema de trançado chinês é idêntico aos trançados das etnias indígenas brasileiras, de populações tradicionais e, sobretudo, dos artesãos urbanos. Em síntese, essas matrizes são universais. Entretanto, os chineses por meio da rede socioempresarial, os produzem com alta qualidade técnica e artística colocando-os no mercado internacional. O contato com o Centro e a sua rede de trabalho nos chamou a atenção para alguns aspectos específicos relacionados com a constituição de redes semelhantes a essas no Brasil. São eles: em primeiro lugar, a importância do cultivo, da produção do bambu e, sobretudo, do uso dessa matéria-prima para a fabricação de produtos do dia a dia das populações da cidade e do campo. No condado de Qinshen, o bambu é uma das principais matérias-primas para a confecção, por exemplo, de vassouras, de balaios e de arupembas (peneiras). Em segundo lugar, a questão ambiental do resíduo químico da imunização ou preservação do material, que poderá ser em parte minimizada pelo uso do Método Boulcherie modificado, que emprega solução química de baixo impacto ambiental. E, em terceiro lugar, a questão da segurança do trabalho, onde a educação e as atividades de treinamento são importantes meios de veiculação das recomendações do Ministério do Trabalho a esse respeito. 3.8 SOBRE TREINAMENTO E CAPACITAÇÃO DE ARTESÃOS A questão do treinamento e da qualificação dos artesãos, as ações de natureza educativa fazem parte da cadeia de produção e comercialização do artesanato (produto). A importância da educação e a divulgação de informações são vitais para a existência da rede, pois elas possibilitam ao artesãoagricultor o acesso às técnicas de execução do produto, ao seu controle de sua qualidade, à prevenção de acidentes de trabalho, danos ao ambiente e, acima de tudo, à inovação e comercialização de produtos. O artesanato na China, particularmente o produzido pelo Centro, requer trabalhadores com algum preparo mental, isto é, com raciocínio formal e lógico, pois os trançados contêm princípios matemáticos de construção, e, também, envolvem sensibilidade para composição. O produto, desta forma, engloba duplamente duas áreas: a lógica ou sistemática e a artística. Para tanto, o Centro dispõe no seu quadro de pessoal de dois artistas plásticos que trabalham com pintura tradicional chinesa. São eles: os pintores Yan De Ron e Gu He Men. Sob o ponto de vista construtivo, o produto artesanal exige habilidade manual acompanhada de posturas corporais que, no caso chinês, provavelmente são cultivadas na escola regular. Por outro lado, a sua produção envolve padrões de operação meticulosa de duas naturezas, a saber: a) a geométrica, onde predomina a lógica das simetrias ou de repetições as quais contam com procedimentos pré-estabelecidos que são indistintamente aplicados em diferentes objetos, por exemplo, nos trançados de cestos ou de quadros, b) a artística, onde as decisões são de natureza sensitiva envolvendo composição, uso das cores e escolha de motivos ou temas de trabalho que, no caso chinês, se confunde com a história política e cultural daquele país. A combinação dessas duas dimensões concorre para o sucesso comercial e internacional desses produtos. Entretanto, idênticas características podem ser encontradas nos produtos indígenas brasileiros e latino-americanos cuja potencialidade temática, ao contrário da chinesa, reside na natureza abstrata e geométrica de suas tramas bicolores na sua maioria preto e branco. Em suma, as atividades de treinamento e qualificação técnica e sensitiva são relevantes e devem ser consideradas num possível programa de implantação de redes semelhantes às chinesas no DF e no

167


Brasil. Tais atividades concorrem para a fixação de padrões, por exemplo, de trançados com motivação cultural e histórica. Nesse sentido, o Brasil possui um rico acervo temático entre as populações nativas. A introdução de inovações nesses padrões formais, necessária à comercialização de produtos, pode ser feita com a colaboração de universidades e de seus departamentos ou unidades de artes, de arquitetura e de desenho do objeto. 3.9 SUGESTÕES IMEDIATAS Finalmente, gostaria de sugerir à Universidade de Brasília, ao Programa Nacional de Florestas do MMA que estabelecessem contatos para viabilizar um programa de cooperação técnica com o Inbar e, também, com o Governo da China para a implementação de práticas semelhantes no Brasil. Entretanto, não devemos perder de vista outras frentes de trabalho a exemplo da aplicação de bambu em arquitetura e construção, área na qual alguns países latino-americanos, entre eles a Colômbia, detêm conhecimento e tecnologia avançados.

Figura 1. Da esquerda para direita, de cima para baixo: Um dos exercícios práticos - mini cadeiras; rua principal de Qing Shen, Sichuan-China; esteira trançada de fita de bambu; extração de fita de bambu; fábrica familiar de artesanato de bambu; luminária tradicional chinesa completa e o seu molde. Fotos do autor.

168


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS INTERNATIONAL NETWORK FOR BAMBOO AND RATTAN. Inbar in China and the World. Beijing: China Forest Publishing House, 2004. ________. International Training Workshop on Bamboo Handicraft: Bamboo Weaving and Furniture Processing Technologies. Sichuan/China: INBAR, 2005. JANSSEN, J. J. A. Designing and Building with Bamboo. Beijing/China: Inbar - International Network for Bamboo and Rattan, 2000. 207 p. Technical Report nº 20. PANCHAL, J. A.; RANJAN, M. P. Institute of Crafts: Feasibility Report and Proposal for the Rajasthan Small Industries Corporation. Ahmedabad/India: National Institute of Design (NID), 1994. RANJAN, M. P.; SINGH, M. (Ed.). Bamboo Initiatives: Design Strategies from NID-BCDI. Ahmedabad/India: National Institute of Design (NID)/Bamboo & Cane Development Institute (BCDI), 2004. SCHEER, J. How to Build with Bamboo. Utah/USA: Gibbs Smith, Publisher, 2004. 94 p. UBIDIA, J. A. M. Preservación del Bambú en América Latina, mediante Métodos Tradicionales (Traditional Bamboo Preservation Methods in Latin America). Equador: Inbar - International Network for Bamboo and Rattan, 2002. 70 p. Technical Report nº 25.

169


7.2 O BAMBU NA INTERAÇÃO ACADEMIA-COMUNIDADE EM PROJETOS SOCIAIS Eloy Fassi Casagrande Jr.1

Resumo Este artigo apresenta o projeto desenvolvido com as comunidades de baixa renda do Município de Fazenda Rio Grande, na Região Metropolitana de Curitiba – inicialmente financiado pelo Prêmio Banco Real /Universidade Solidária (UNISOL) – associando atividades de design na utilização da matéria-prima local: o bambu mossô (Phyllostachys pubescens). Com o envolvimento de professores e estudantes da Universidade Tecnológica foi possível formar um grupo de pesquisa em torno da tecnologia do bambu e capacitar a população local em artesanato e design, gerando os primeiros projetos comerciais. Apesar de algumas dificuldades, os resultados positivos demonstram a importância do desenvolvimento de tecnologia social e a possibilidade de abrir novos mercados e gerar empregos através do bambu. Palavras-chave: Tecnologia Social. Bambu. Geração de Renda. Abstract This article presents a project developed in a low income community of the Fazenda Rio Grande, located in the Region Metropolitan of Curitiba - initially financed by the prize of the Banco Real/Universidade Solidária (UNISOL) – where activities of design are associated with the use of bamboo mossô (Phyllostachys pubescens). With the participation of teachers and students from the Technological University it was possible to organize a research team about bamboo technology and to train the local population in art craft and design to produce the first commercial projects. Although some difficulties, the positive results demonstrates the importance in the development of social technology and the possibility to open new markets and generate jobs using bamboo. Keywords: Social Technology. Bamboo. Income Generation.

1 INDUSTRIALIZAÇÃO versus SUSTENTABILIDADE O avanço da ciência e da tecnologia que propiciou a implantação do modelo tecnologia designprodução-consumo iniciado com a Revolução Industrial nos trouxe grandes benefícios, mas também impactou de forma negativa sobre o meio ambiente. Isto foi agravado com o modelo Fordista expandido durante o Século 20 para países do ocidente e oriente, onde assistimos ao uso intenso de energia baseado nos combustíveis fósseis, à exploração inconsequente dos recursos naturais, ao aumento do desmatamento e da poluição em todas as suas formas. Paralelamente, os impactos sociais se multiplicaram ampliando a diferença de classes e os conflitos generalizados. Hoje, na divisão de uso e acesso à tecnologia se observam as consequências do modelo predominante, onde os países mais desenvolvidos - EUA, Japão, Europa Ocidental, Canadá e Austrália -, têm, juntos, 15% da população mundial, mas consomem 61% do alumínio, 59% do cobre e 49% do aço (WWI/UMA, 2004). O paradigma dominante no desenvolvimento dos produtos está muito mais preocupado em atender às exigências estético-culturais e condições técnico-econômicas do mercado do que em suprir as necessidades da sociedade. O sistema se desenvolveu em nossa sociedade industrializada desvinculado do entendimento das necessidades humanas básicas, bem como do funcionamento dos ecossistemas naturais. Somente nos anos 60, vemos designers como Victor Papanek cobrando o desenvolvimento de produtos voltados para as necessidades humanas, isto é, que este fosse baseado na ética e no respeito pela natureza. Engajado com os problemas sociais, Papanek (1984) ressaltava que a única coisa importante do design é como ele se relaciona com as pessoas, mas há outras questões que merecem serem ressaltadas:       

Destruição de recursos naturais não renováveis; A mineração/extração destes produtos gera poluição; O processo de produção gera mais poluição; Este mesmo processo provoca alienação do trabalhador; Embalagem (uma repetição das fases de 1 a 4); O uso do produto gera mais poluição e alienação do usuário; Finalmente, o descarte é mais uma fonte de poluição.

1Designer pela PUC-PR (1983); PhD em Engenharia de Recursos Minerais e Meio Ambiente pela Universidade

de Nottingham (Inglaterra, 1996); Professor do Programa de Pós-graduação em Tecnologia – PPGTE e do Departamento Acadêmico de Construção Civil da Universidade Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR, Curitiba.

170


Também vemos surgir na década de 60 a propagação das idéias de Ernest Schumacher, um economista com visão além do seu tempo, que defendia uma tecnologia apropriada para o desenvolvimento de comunidades nos países do Terceiro Mundo não industrializado. Essa tecnologia devia levar em consideração o desenvolvimento local baseado nas habilidades, cultura e recursos de uma comunidade específica, respeitando os limites do seu próprio ambiente e procurando melhorar sua qualidade de vida. No seu livro Small is Beautiful, Shumacher a chama de ‘Tecnologia Apropriada’ - uma tecnologia com face humana, isto é, uma tecnologia que pudesse ser intermediária, contrária a uma tecnologia automatizada de larga escala, controlada por grandes organizações e de alto custo financeiro e alto impacto ambiental. Para Schumacher, a tecnologia dos países industrializados não é compatível com as necessidades básicas do ser humano, tornando-o um escravo da máquina, além de ser altamente consumidora de recursos materiais e energéticos. Sua proposta apresenta uma mudança de enfoque do “serviço da ciência” para a sociedade, onde transformações culturais, sociais e políticas ocorrem para implantarem-se condições para uma produção local com recursos locais e participação direta de uma comunidade, sem a relação de hierarquia que caracteriza a chamada ‘tecnologia de ponta’ (SHUMACHER, 1973). O termo ‘desenvolvimento sustentável’ surge nos anos 80, sendo oficializado pelo relatório da Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, conhecido como a ‘Comissão Brundtland’. Sintetizado no livro ‘Nosso Futuro Comum’ (COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO, 1988), este nos apresenta o desafio da implantação de um desenvolvimento aliado à preservação ambiental, onde os ganhos socioeconômicos não devem comprometer os recursos naturais deste Planeta e o direito das futuras gerações de também poder usufruí-los. Nunca houve tantas opções disponíveis no mercado de tecnologias e materiais que agridem menos o meio ambiente como há hoje, no início do Século 21. Temos acesso hoje à produção de energia a partir de painéis fotovoltáicos, de geradores eólicos e de biomassa, de aproveitando das marés, do gás metano dos aterros sanitários, dos biodigestores, para citar apenas alguns. Como também podemos consumir produtos agrícolas orgânicos e usar produtos biodegradáveis, recicláveis e energeticamente eficientes. No entanto, vivemos sob o domínio de uma economia ortodoxa - leia-se uma geração insuficiente de empregos, baseada ainda na produção, distribuição e consumo de produtos convencionais, poluentes, energointensivos e que geram uma grande quantidade de resíduos no seu descarte. A dificuldade na aceitação de tecnologias e materiais não convencionais que sejam também ecoeficientes por parte da atual sociedade industrial passa pela necessidade de uma mudança não somente de hábitos de consumo, mas também de valores e princípios. Para Capra (2002) uma das estratégias para se alcançar a sustentabilidade está no ecoplanejamento (ecodesign) — um esforço conjugado para reconfigurar nossas estruturas físicas, cidades, tecnologias, e indústrias, de modo a torná-las ecologicamente sustentáveis. Isto é, colocar a economia subjugada às regras da ecologia, aprendendo como ela funciona em rede, sem colocar em risco sua própria sustentação.

2 BAMBU: MATÉRIA-PRIMA DO SÉCULO 21 A expansão do modelo capitalista impõe tecnologias e materiais universais, muitas vezes não apropriados a países que os adotam. No caso da produção de papel, por exemplo, as espécies exóticas como os eucaliptos ou os pinheiros de clima temperado têm sido adotadas por países em desenvolvimento, geralmente localizados nos trópicos. Além dos problemas ambientais que estas espécies representam para os ecossistemas locais, sua reprodução faz com que sejam ignoradas espécies nativas com abundância de fibras. Muitas vezes, as fibras naturais dos trópicos, como o bambu, junco e a cana-de-açúcar, possuem um valor de uso que pode ultrapassar a própria fabricação do papel. Pesquisas conduzidas por Khosrow Ghavami, professor titular do Departamento de Engenharia Civil da PUC-Rio, demonstram que devido, ao formato das fibras do bambu, este pode ser um substituto do aço, especialmente quando for considerada a razão entre sua resistência à tração e sua massa específica. Segundo o pesquisador, o material tem resistência suficiente para ser utilizado na fabricação de estruturas. Nos ensaios realizados na universidade, o bambu apresentou resistência à tração de 200 MPa, índice próximo aos 240 MPa apresentados por uma chapa de aço ( GHAVAMI, 2002). Neste caso, há também a vantagem de seu consumo energético ser infinitamente menor, conforme dados da Tabela 1.

171


Tabela 1. Consumo Energético por Material. Material Aço Concreto Madeira Bambu

Energia (MJ/m3 por N/mm2) 1.500 240 80 30

Fonte: Janssen (1990) apud VÉLEZ (2001).

De acordo com Liese apud Vegesack e Kries (2000), o bambu representa o sustento de mais de um bilhão de pessoas, principalmente nas áreas rurais pobres de países em desenvolvimento da Ásia, América do Sul e Central. Sua aplicação se dá em diversos setores de produção, gerando emprego e renda na área de artesanato, mobiliário, decoração interior, paisagismo, alimentação, produção de laminado para forro e piso, de carvão para tratamento da água e efluentes (o carvão de bambu tem propriedades bactericidas) e na construção civil (solo-fibras, fibrocimento e elementos estruturais). Além de apresentar a vantagem ambiental de ser uma planta C4, que representa o mais alto grau de absorção de carbono no processo de fotossíntese, posicionando-se na mesma categoria da cana-de-açúcar e do milho. Estima-se que haja cerca de 121 gêneros e 1.600 espécies de bambu espalhadas em 25 milhões de hectares de regiões tropicais e sub-tropicais, com apenas 10% localizados em zonas temperadas. Segundo Londoño (1999), o Brasil conta com a maior diversidade e o mais alto índice de florestas endêmicas de bambu em toda a América Latina: são 137 espécies, representando 32% das espécies da América Latina, e 17 gêneros ou 85%, sendo que os estados de São Paulo, Minas Gerais, Santa Catarina, Bahia e Paraná, possuem maior diversidade de florestas de bambu. No entanto, apesar de bons resultados de pesquisas em universidades (BERALDO et al., 2003) e do uso desta matéria-prima por diversos artesãos, ainda não houve no Brasil um programa de desenvolvimento que fosse focado no bambu como, por exemplo, um projeto para se implantar Arranjos Produtivos Locais (APLs) baseados no bambu, em regiões de grande abundância (CASAGRANDE JÚNIOR; UMEZAWA, 2004). Entre as qualidades do bambu que têm atraído a atenção de pesquisadores e empresários, está a rápida propagação e o crescimento acelerado da planta. De acordo com Vegesack e Kries (2000) o bambu cresce 30% mais rápido do que as espécies de árvores consideradas como de rápido crescimento e, graças a esse crescimento vigoroso, seu rendimento em peso por hectare ao ano é 25 vezes maior do que o da madeira. O bambu é um recurso altamente renovável, o que não ocorre com outros materiais que estão se tornando escassos e já ameaçam inviabilizar alguns sistemas de produção, por falta de matéria-prima, implicando no aumento do preço da madeira. Vélez (2001) calculou que o bambu obtido em 1 ha oferece um rendimento anual de 22 a 44 toneladas métricas. Nos trópicos, um terreno de apenas 20 m x 20 m fornece matéria-prima para construir duas casas de 8 m x 8 m, em um período de cinco anos. Na China um programa para substituir a madeira 2 tropical estimulou a implantação de 100 fábricas que produzem anualmente 10 milhões de m de piso de bambu, que tem mercado no Japão, Estados Unidos e Europa (QISHENG; BIN, 2001).

3 O BAMBU COMO TECNOLOGIA SOCIAL Como parte de pesquisa de mestrado de Umezawa (2002), no Programa de Pós-Graduação em Tecnologia da Universidade Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR, foi feita uma avaliação socioeconômica do potencial de uso do bambu encontrado na Colônia Parque Verde, uma área de 416,26 ha, dentro do município de Fazenda Rio Grande, Região Metropolitana de Curitiba, constituída originalmente de 27 pequenas propriedades com extensão variando de 1 alqueire a 9 alqueires pertencentes a famílias de origem japonesa, que têm como atividade a produção hortifrutigranjeira. As diversas possibilidades do uso do bambu na região, dentro de uma cadeia produtiva que poderia em tese melhorar a renda das pessoas na Região, podem ser observadas na Figura 1.

172


Figura 1. Potencial econômico do uso do bambu na Fazenda Rio Grande. Fonte: Umezawa (2002).

Num trabalho de campo, por amostragem, e através de fotos aéreas, foi levantada a quantidade de bambu de 10 propriedades, onde se constatou a existência de aproximadamente 1,5 ha de bambu japonês tipo mossô (Phyllostachys pubescens) plantado nos anos 60, quando da instalação das famílias. Nas visitas ao local, também foi possível verificar o relevo dos terrenos, tipo de solo e possibilidade de eventual expansão das plantações que poderiam ocupar uma média de 20% da área cultivável das propriedades. Atualmente a população de Fazenda Rio Grande está com cerca de 94 mil habitantes, com estimativa de um crescimento de 65,7% até 2010, podendo ultrapassar 150 mil pessoas. De acordo com a Secretaria do Estado do Trabalho, Renda e Promoção Social do Paraná, este município tem um dos mais elevados índices de pobreza, com um índice de desemprego em torno de 20%, Dados estatísticos do ano 2000 concluíram que, entre as pessoas que possuíam alguma ocupação, cerca de 83% não tinham rendimento, ou recebiam até três salários mínimos por mês (CASAGRANDE JÚNIOR, 2004).

4 PROJETO BAMBU BANCO REAL / UNIVERSIDADE SOLIDÁRIA (UNISOL) Dados da dissertação de mestrado de Umezawa e o resultado de quatro anos de pesquisa sobre o bambu embasaram o projeto aprovado no IX Prêmio Banco Real / UNISOL 2004 para propostas de ‘Desenvolvimento Sustentável, com ênfase em Geração de Renda’, tendo o mesmo recebido R$20.000,00 para sua implantação, iniciada em outubro de 2004. Denominado ‘O Bambu como MatériaPrima Sustentável para a Geração de Renda e Inclusão Social no Município de Fazenda Rio Grande – Paraná’, o projeto integra os princípios da Tecnologia Apropriada e do design social com a geração de postos de trabalho através do cooperativismo. A comunidade escolhida para ser capacitada na tecnologia do bambu está organizada em torno da igreja católica local, que cedeu o espaço físico para os cursos de educação e treinamento. Integrando professores e alunos dos cursos de Engenharia e Tecnologia da Construção Civil, Desenho Industrial, Engenharia Mecânica, Química Ambiental da UTFPR, juntamente com professores e alunos do Curso de Agronomia da PUC-PR, que tem um campus avançado no município, foi criada uma cultura interdisciplinar de pesquisa para aplicação do bambu em benefício da comunidade local. Por exigência dos financiadores do projeto, era preciso ter no mínimo 10 alunos voluntários para sua implantação. Para isto, foi realizado um curso de capacitação com 40 alunos inscritos, número este que foi reduzido para 20, através de um processo de seleção. Neste caso, ficou claramente demonstrado que há um grande interesse dos estudantes universitários em participar deste tipo de iniciativa, mesmo não tendo retorno financeiro. O objetivo principal do curso era preparar os estudantes para o trabalho comunitário de campo. Percebeu-se aqui a falta de preparo destes para este tipo de atividade, isto é, compreender o lado

173


humano e social do projeto atribuindo-lhe um valor superior ao da técnica. Para estarem capacitados a trabalhar com pessoas de um nível educacional inferior em áreas de carência social, estudantes com perfis técnicos tiveram aulas que abordavam psicologia, sociologia, questões socioambientais e visitas a outros tipos de projetos comunitários, onde ouviram depoimentos de pessoas beneficiadas pelos projetos. Numa segunda etapa, foi organizada a equipe de professores e os 20 estudantes que iriam trabalhar no projeto, que ainda passaram por três oficinas de 16 horas com artesãos e fabricante de móveis de bambu para poderem dar apoio à capacitação da comunidade, como monitores. Cabe ressaltar que as equipes formadas por estudantes de design interagindo com estudantes de outros cursos tiveram um ótimo desempenho nas suas tarefas, demonstrando a importância da interdisciplinaridade no desenvolvimento dos produtos. Para se conhecer a realidade socioeconômica da região com mais detalhe, foi desenvolvido um questionário básico a fim de levantar a realidade social da comunidade a ser atendida pelo projeto. O questionário foi aplicado no conjunto habitacional popular Jardim Kokubo pelos estudantes, que entrevistaram cerca de 120 famílias. Além de nos dar uma idéia mais real da situação, a aplicação do questionário também se demonstrou um bom ‘exercício social’ para os estudantes conhecerem de perto o seu público alvo. O projeto tinha como premissa levar ao município de Fazenda Rio Grande uma alternativa para o desenvolvimento sustentável, envolvendo a comunidade local através da capacitação em oficinas em que se utilizou o bambu como matéria-prima, facilitando também a conscientização da população para resolver seus problemas sociais, econômicos e ambientais. Assim, também houve capacitação em torno de design de produto, cooperativismo e empreendedorismo, a fim de que o projeto pudesse ser autossustentável após a conclusão das oficinas e fase de acompanhamento. O projeto iniciou suas atividades em outubro de 2004, com um cronograma de 9 meses, que se demonstrou insuficiente para atingir seu propósito. Ao trabalhar-se com comunidade, tem-se que levar em consideração as variáveis humanas do projeto. Entre elas, estão a dificuldade de organização social das pessoas e do trabalho em grupo, a falta de inciativa, a falta de auto-estima percebida nas frases ‘eu não vou conseguir aprender isto porque não tenho suficientes estudos’, entre outras. No entanto, o uso da técnica pela comunidade era assimilado sem muitas dificuldades após três meses de capacitação conduzida por artesãos e produtores de móveis contratados pelo Projeto. As aulas aconteciam duas vezes por semana, de acordo com a disponibilidade das pessoas. Nem sempre era possível conciliar suas atividades profissionais, mesmo que irregulares e instáveis, os afazeres domésticos e o cuidado com os filhos, no caso das mulheres, com os horários das oficinas. Assim um projeto pode levar muito mais tempo do que o planejado. Do ponto de vista do desenvolvimento dos produtos, sob a orientação de professores da área de design, procurou-se orientá-los para a produção de peças que tivessem um bom acabamento e que fossem, no início, de fácil execução (Figura 2), isto é, produtos que pudessem ser rapidamente confeccionados, elegantes e diferenciados pelo design. Atualmente, os produtos são acompanhados de um ‘selo ecossocial’ que explica os princípios do projeto, acrescentando o valor da responsabilidade social (Figuras 3A e 3B). A cooperativa, batizada de ‘Bambuzeria Parque Verde’, estabeleceu uma parceria com a ‘DesignÊre – design e arquitetura sustentável’, uma empresa incubada no Hotel Tecnológico da Universidade Tecnológica Federal do Paraná, que tem auxiliado na comunicação visual do projeto e no desenvolvimento dos produtos. A bambuzeria executou estruturas de bambu desenvolvidas por esta empresa, conforme se vê na Figura 4.

Figura 2. Acabamento dos produtos da Bambuzeria Parque Verde.

174


Figura 3A. Produtos da Bambuzeria Parque Verde – Suportes para plantas.

Figura 3B. Produtos da Bambuzeria Parque Verde -- Luminárias e bandejas.

Figura 4. Estruturas de bambu para eventos. Fonte: Designer Patrícia Peralta e Arquiteta Helena Umezawa.

175


A estratégia de estabelecer parcerias para a bambuzeria é uma forma de contornar um dos grandes problemas do trabalho com cooperativas, que é a comercialização dos seus produtos. Observase, não somente nesta cooperativa, mas em outras com as quais se tem contato, que a comunidade assimila com certa facilidade a técnica para execução dos produtos, mas tem grande dificuldade em vendê-los. Um dos problemas em relação à comercialização é saber colocar preços nos produtos e ter competência para fazer circular a produção. Isto vai desde a falta de preparo como vendedores --- afinal são pessoas de origem humilde e que sempre trabalharam no regime ‘patrão – empregado’, onde alguém decidia por eles e os mandava executar. Uma das estratégias usadas é levá-los para apresentar seus produtos em eventos (Figura 5). A capacitação que está sendo conduzida para superar a barreira do saber colocar o valor de custo e venda do produto, foca no aspecto do tempo que eles levam para executar cada peça, quantas pessoas trabalham em cada peça e quanto é utilizado de matéria-prima. Além, também, de orientá-los para observar no mercado o valor de peças similares.

Figura 5. Divulgação do projeto e seus produtos em eventos. Fonte: I Fórum Paranaense de Fibras Naturais (UTFPR, 2006).

Em 2005, foram encomendados dois trabalhos que exigiam uma produção organizada em série. Um foi o troféu do X Prêmio Banco Real / UNISOL 2005, oportunidade em que 10 ganhadores recebem prêmio em dinheiro e troféu. O outro foi a solicitação da Fundação do Banco do Brasil para também elaborar os 55 troféus dos finalistas e vencedores dos projetos de Tecnologia Social 2005 (Figura 6). Com estes dois desafios a enfrentar, foi possível ver como eles se organizavam para a produção. Os primeiros esboços do design dos troféus foram elaborados na própria bambuzeria sob a orientação da DesignErê, que discutiu com a comunidade os protótipos. Este processo demonstrou ser bastante enriquecedor, uma vez que as pessoas faziam parte também da criação. Após o design final, e sabendo do prazo, foram criados turnos de trabalho, anotando quantas horas cada artesão trabalhava. Ao final foi possível verificar que já haviam assimilado a idéia do trabalho coletivo, havendo uma divisão justa do valor total que receberam pela tarefa, considerando-se as horas trabalhadas.

Figura 6. Troféus Prêmio Banco Real / UNISOL e Prêmio Tecnologia Social / Fundação Banco do Brasil. Fonte: Designers Eloy Casagrande e Patrícia Peralta.

176


5 BAMBU LAMINADO Este projeto permitiu que fossem estimulados outros departamentos da universidade, como o de Mecânica, onde alunos do curso de Tecnologia em Gestão de Manufatura desenvolveram ferramentas para uso da comunidade. Associando os projetos a seus trabalhos de conclusão de curso, a primeira ferramenta manual desenvolvida foi a de corte longitudinal, com base em algumas já utilizadas na China e em outros países, e conhecida como ‘faca estrela’. Anteriormente este corte era realizado na comunidade por meio de facões, sem grande precisão e com risco de acidentes para seus usuários. O projeto dos estudantes levou em consideração o bambu encontrado na região, modelando inicialmente a ferramenta em CAD 3D e, depois, executando o protótipo (Figura 7).

Figura 7. Ferramenta manual de corte longitudinal e protótipo. Fonte: Berndsen (2005).

No teste com diferentes comprimentos, foram usadas amostras de bambu com 25, 50, 75, 100 e 125 cm de diâmetro (Figura 8).

Figura 8. Teste de corte da ferramenta manual, de corte longitudinal.

Nos testes com as amostras de 25 e 50 cm, verificou-se a necessidade de um apoio ao realizar o corte para evitar lesões na região lombar do operador. Por se tratar de comprimentos consideravelmente pequenos, constatou-se não haver qualquer dificuldade. Já no caso do corte com comprimento de 75, 100 e 125 cm, ocorreram dificuldades no corte final. Isto se deve ao fato de que, quando a ferramenta se aproxima do final da vara, o peso superior dificulta no movimento de subida e decida. Portanto, para medidas maiores que 75 cm, verificou-se a necessidade da utilização de um martelo para desferir golpes na parte externa, evitando assim que o usuário necessite levantar a ferramenta com a vara para aplicar golpes contra o apoio (BERNDSEN, 2005). Posteriormente, foi desenvolvida uma máquina também para o mesmo corte do bambu, por meio de duas serras circulares paralelas, para a produção de painéis de bambu laminado. A intenção desta máquina é de evitar uma etapa posterior que é o esquadrejamento lateral das tiras, minimizando também o desperdício, além de propiciar maior segurança e ergonomia ao operador, e ainda melhorando a qualidade das tiras. Outra vantagem deste último equipamento é de que o resíduo gerado vem em forma de serragem e filetes, enquanto que a 'faca estrela' deixa resíduo em formato de filetes triangulares. Assim, é possível utilizar os filetes de bambu para a confecção de um painel chamado PSL - Parallel Strip Lumer ou painel de tiras (filetes) paralelas. A confecção deste painel consiste em colar os filetes, com resinas para compensados, orientados na mesma direção e consolidados através da prensagem a quente (IWAKIRI, 2005). Grande parte das fábricas de piso laminado da China trocaram seus sistemas de rachar os bambus por uma serra elétrica de disco duplo de tungstênio e uma guia paralela em cantoneira ( STAMM, 2002). Com base na concepção proposta por Jörg Stamm, foi gerada uma nova concepção para o desenvolvimento do equipamento, utilizando um motor de 4 CV, com regulagem de altura dos discos de corte para diferentes diâmetros de bambu (Figura 9).

177


Figura 9 – Serra elétrica de disco duplo e varas cortadas. Fonte: Máquina desenvolvida por Rodrigo S. Berndsen (UTFPR).

Os processos subsequentes realizados para a obtenção do painel laminado colado foram: a) remoção dos nós internos e camada externa das tiras. Para estas operações pode ser utilizada uma plaina para a retirada dos nós internos e aplainamento da face. A camada externa das tiras pode ser removida com o uso de uma tupia; Na China existe uma máquina que faz simultaneamente estas duas operações. b) secagem - As tiras devem ser secas a aproximadamente 10% de umidade para evitar uma variação dimensional após a colagem, evitando assim o descolamento das tiras; c) calibragem das tiras - Devido à contração provocada pela secagem as tiras dever ser calibradas formando um ângulo de 90° entre as faces para deferir um boa colagem. Isto pode ser feito com uma lixadeira de mesa e uma tupia; d) colagem - A colagem deve ser feita com o auxílio de uma prensa; e) lixamento - Para remover o excesso de cola e dar o acabamento final, os painéis colados são lixados, chegando-se assim ao produto final.

6 CONCLUSÃO No aprendizado de todas as fases do projeto, a interação academia-comunidade foi bastante rica para ambos. O projeto estimulou, dentro da Universidade Tecnológica, a criação do grupo de pesquisa interdisciplinar em torno do bambu, podendo, assim, também diminuir o preconceito existente em relação à matéria-prima. Até o momento, já foram realizados dois trabalhos de conclusão de curso no âmbito do Curso de Tecnologia de Design de Móveis, dois no Curso de Tecnologia em Química Ambiental envolvendo ensaios do tratamento do bambu, um no curso de Tecnologia em Gestão de Manufatura e ainda temos duas pesquisas de mestrado em andamento que avaliam a questão do laminado colado do bambu, e o bambu como tecnologia social. Ressalta-se que a criação deste tipo de grupo de pesquisa pode ajudar na preparação adequada dos nossos estudantes e profissionais que precisam ser formados para este tipo de envolvimento social. Isto também nos remete à necessidade de rever as grades curriculares dos cursos de ciências exatas, que ainda não contemplam devidamente a questão socioambiental. Também se percebe que a relação da universidade com a realidade das pessoas que vivem nas periferias das grandes cidades pode ser transformada através de projetos desenvolvidos por equipes interdisciplinares. O estímulo ao trabalho coletivo no contexto da tecnologia social colabora para diminuir as diferenças de classes e para unir as pessoas, que passam a discutir também outros problemas da sua comunidade. O design e a organização do trabalho cooperado, neste sentido, colaboram à medida que se tornam mais sociais e buscam soluções para melhorar a qualidade de vidas destas pessoas. No entanto, é importante ressaltar que ainda se faz necessário um programa completo que trate de toda a cadeia produtiva do bambu. Estimular seu uso e o desenvolvimento da tecnologia e design somente pode ter sucesso, se vier acompanhado de projetos de plantio onde se observem as condições favoráveis de cada região antes da escolha das espécies a serem cultivadas. Parcerias com pequenos produtores podem ser um caminho, uma vez que muitos dos imigrantes que se instalam nas periferias das grandes cidades vêm do campo e possuem uma certa experiência com a agricultura.

178


AGRADECIMENTOS Agradeço aqui, por colaboração no projeto, aos professores Helena Akemi Umezawa. Libia Patricia Peralta Agudel e Celso Salamon e aos estudantes Rodrigo Berndsen, Felipe Diogo Teixeira, Elisa Costa, Nelson Marinho, Aloisio Junior, entre tantos outros que também fizeram parte das equipes de trabalho.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BERALDO, A. L.; AZZINI, A.; GHAVAMI, K.; PEREIRA, M. A. dos R. Bambu: Características e Aplicações. In: FREIRE, W. J.; BERALDO, A. L. (Coord.). Tecnologias e Materiais Alternativos de Construção. Campinas: Editora Unicamp, 2003. 333 p. BERNDSEN, R. S. Desenvolvimento de Ferramenta Manual para Corte Longitudinal de Bambu. Trabalho de Conclusão (Curso de Tecnologia em Gestão de Manufatura) - Universidade Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR, 2005. CAPRA, F. As Conexões Ocultas - Ciência para uma Vida Sustentável. São Paulo: Cultrix e Amana-Key, 2002. CASAGRANDE JÚNIOR, E. F. O bambu como Matéria-prima Sustentável para a Geração de Renda e Inclusão Social no Município de Fazenda Rio Grande, PR. IX Prêmio Banco Real/Universidade Solidária – Desenvolvimento Sustentável com ênfase em geração de renda, 2004. CASAGRANDE JÚNIOR, E. F.; UMEZAWA, H. A. Bambu e Arranjos Produtivos Locais Sustentáveis (APLS): Sequestro de carbono, tecnologia social e sustentabilidade. In: CONFERÊNCIA BRASILEIRA DE MATERIAIS E TECNOLOGIAS NÃO-CONVENCIONAIS: HABITAÇÕES E INFRA-ESTRUTURA DE INTERESSE SOCIAL, 2004, Pirassununga. Anais... Rio de Janeiro: ABMTENC, 2004. 11 p. COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nosso Futuro Comum. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1988. GHAVAMI, K. Bambu é Alternativa para a Construção Civil. Rio de Janeiro: Boletim FAPERJ, 26 ago. 2002. IWAKIRI, S. Painéis de madeira reconstituída. Curitiba: FUPEF, 2005. LONDOÑO, X. Evaluation of Bamboo Resources in Latin America. Colômbia: International Network for Bamboo and Rattan, 1999. A Summary of the Final Report of Project N 96-8300-01-4. MEADOWS, D. H.; MEADOW, D. L.; RANDERS, J.; BEHRENS III, W. W. Limites do Crescimento: um relatório para o Projeto do Clube de Roma sobre o dilema da humanidade. São Paulo: Perspectiva, 1972. PAPANEK, V. Design for the Real World: Human Ecology and Social Change. 2 ed. London: Thames and Hudson, 1984. QISHENG, Z.; BIN, X. Bamboo Flooring Manufacturing Unit. Nanjing/China: Bamboo Engineering and Research Center/Nanjing Forestry University, 2001. Transfer of Technology Model-TOTEM. SHUMACHER, E. F. Small is Beautiful. London: Blond & Bridges, 1973. STAMM, J. Laminados de Guadua. In: SEMINÁRIO - TALLER AVANCES EN LA INVESTIGACIÓN SOBRE GUADUA, 2002, Pereira/Colômbia. Anais... Pereira: Faculdad de Ciencias Ambientales de la Universidad Tecnológica de Pereira, 2002. 8 p. UMEZAWA, H. A. Uso do Potencial do Bambu para o Desenvolvimento Local Sustentável: Estudo de Caso da Colônia Parque Verde, Município de Fazenda Rio Grande – PR. Dissertação (Mestrado em Tecnologia) - Programa de Pós-Graduação em Tecnologia, Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Curitiba, 2002. VEGESACK, A. Von.; KRIES, M. Grow your own House: Simón Vélez and bamboo architecture. Balingen/Alemanha: Vitra Design Museum und Autoren, 2000. 255 p. WWI - WORLDWATCH INSTITUTE/UMA - Universidade Livre da Mata Atlântica. Disponível em: <www.worldwatch.org.br>. Acesso em: 10 fev. 2004.

179


8 DIVULGAÇÃO 8.1 BAMBU BRASILEIRO E GRUPO BAMBU-BRASIL, O BAMBU NA REDE BRASILEIRA Raphael Moras de Vasconcellos1

Resumo O grupo de discussão Bambu-Brasil (http://groups.yahoo.com/group/bambu-brasil) foi criado em maio de 2000, e possui mais de 750 membros (agosto de 2006). Seu arquivo contém mais de 15.000 mensagens. O sítio de internet Bambu Brasileiro (http://www.bambubrasileiro.com) foi criado em agosto de 2000 com 60 páginas de informação geral sobre o bambu, seu plantio e suas utilizações, em português e inglês. O sítio Bambu Brasileiro é o primeiro resultado não-patrocinado na ferramenta Google do Brasil para a palavra “bambu”. Assim, exerce uma atração para o grupo Bambu-Brasil, onde a discussão é atual e dinâmica. Esta e outras redes da América Latina e do mundo são a porta de entrada de muitas pessoas para o tema bambu. Seu papel de nó comunicador, informativo e centralizador de conhecimento deve ser mais profundamente compreendido e potencializado. Para isso, o autor (desenhista industrial), junto a Eduardo Giacomazzi (publicitário), criou em março de 2006 a ABC (Agência Bambu de Conhecimento), uma firma limitada que possui entre seus objetivos o de atuar na institucionalização do conhecimento informal sobre bambu existente. Palavras-chave: Bambu. Brasil. Redes de Internet. Abstract The Bambu-Brasil discussion Group (http://groups.yahoo.com/group/bambu-brasil) was created at May 2000, and gathers more than 750 members (August 2006). Its file section has more than 15.000 messages. The Bambu Brasileiro website (http://www.bambubrasileiro.com) was developed at August 2000 with 60 pages of general bamboo information on bamboo, its planting and utilization, in portuguese and english. The Bambu Brasileiro website is the first non-supported weblink result for the word “bambu” at Google of Brazil. Thus it attracts attention to the Bambu-Brasil Group, where the discussion is dynamic and updated. This and other Latin American bamboo networks are the first point for many people interested in the bamboo subject. Its role as a comunicative, informative and centralizing node should be more deeply investigated and analysed. For that the author (designer) and Eduardo Giacomazzi (marketing) have created in March 2006 the Agência Bambu de Conhecimento (Bamboo Knowledge Agency), a limited firm that has, among other objectives, the one of acting over the institutionalization of the existing knowledge about bamboo. Keywords: Bamboo. Brazil. Internet Networks.

INTRODUÇÃO No Brasil existem 21,2 milhões de domicílios que possuem computadores com acesso à internet, 13,2 milhões de pessoas utilizaram a internet em fevereiro de 2006, e estão registrados mais de 880 mil domínios “br”. Progressivamente as pessoas com acesso à internet a utilizam para obter informações, adquirir conhecimento, comunicar-se, e fazer parte do mercado de trabalho e da economia de mercado. Com o assunto bambu, se observa a mesma tendência na internet. Em um país como o Brasil, onde o bambu é um material considerado secundário pela maioria da sociedade, é muito difícil obter informações sobre ele através dos meios de informação tradicionais (impressos e televisão). A internet se mostra um meio muito eficiente de atender a esta demanda.

1 MATERIAIS E MÉTODOS O presente trabalho se fez utilizando materiais obtidos na internet, visto que o tema abarca a experiência pessoal do autor no manejo do Grupo Bambu-Brasil e do sítio Bambu Brasileiro. A ordenação de subtítulos se fez pela cronologia e pela diferenciação de subtemas. O autor realizou uma pesquisa no Grupo Bambu-Brasil (em março de 2006) sobre as opiniões dos participantes em relação ao grupo.

1 Bambu Brasileiro, Brasil. E-mail: (raphael@bambubrasileiro.com).

180


2 RESULTADOS E ANÁLISES 2.1 A CRIAÇÃO DO GRUPO BAMBU-BRASIL E DO SÍTIO BAMBU BRASILEIRO Em 2000, o autor necessitava de informações técnicas e comerciais sobre o uso do bambu, para desenvolver seu empreendimento de produtos de decoração de bambu. Não havia referências bibliográficas suficientes nas bibliotecas do Rio de Janeiro. Portanto, iniciou uma pesquisa sistemática na internet buscando sítios existentes que falassem sobre bambu, em inglês, espanhol ou português. A maioria dos sítios com informações relevantes estavam disponíveis somente em inglês. Por outro lado, não havia uma rede de contatos ou instituições para a difusão e desenvolvimento do conhecimento sobre bambu no Brasil. No começo de 2000, o autor fez parte da lista de discussão da Sociedade Americana do Bambu (Internet Bamboo Group) e, nesta lista, esteve em contato com profissionais estrangeiros e suas metodologias de comunicação via internet. Pela falta de uma rede no Brasil e na América Latina, e observando o positivo desenvolvimento de intercâmbios de informação no Internet Bamboo Group, o autor criou, em maio de 2000, a lista Bambu-Brasil. É uma lista gratuita e aberta a todos os interessados no tema bambu, para mensagens em português, inglês e espanhol. Começou a se comunicar com os profissionais brasileiros, e com participantes latino-americanos do Internet Bamboo Group. O servidor da lista em 2000 foi a empresa E-Groups que, em agosto de 2000 foi comprada pelo grupo YAHOO, e passou a ser YAHOOGROUPS, em fevereiro de 2001. Depois de pesquisar sítios sobre bambu na internet, o autor realizou a produção do sítio Bambu Brasileiro, com cerca de 60 páginas informativas sobre o bambu, em português e inglês. Entre a pesquisa, redação, tradução e programação, a primeira versão do sítio levou 3 meses para ser finalizada em fins de julho de 2000. 2.2 ORGANIZAÇÃO E MODERAÇÃO DO GRUPO BAMBU-BRASIL Como uma forma de potencializar a comunicação entre os membros, em julho de 2000, o autor começou a juntar informações sobre o perfil de cada inscrito, e a reuni-las em um arquivo. Esse arquivo se manteve desorganizado, visto que as pessoas que saíam do grupo não se retiravam do arquivo de membros, e o autor não possuía a metodologia apropriada para manter essa lista atualizada. O envio de arquivos anexos é permitido na lista, e o autor estabeleceu limites de tamanho para cada mensagem. Nos primeiros anos da lista, o limite foi de 100 Kb por mensagem, já que nesse momento muitos usuários de internet ainda possuíam conexões por telefonia convencional, muito lenta se comparada com as existentes atualmente. O limite atual é de 1 Mb, facilmente comportado pelas conexões de banda larga. O primeiro problema com vírus na lista ocorreu em dezembro de 2000. A lista é programada para admitir arquivos anexos, e uma nova onda de vírus Worm tornava-se um problema na rede internet mundial. Alguns computadores de membros da lista foram infectados, e enviaram mensagens com arquivos anexos infectados para a lista. Houve uma discussão entre os membros sobre a relevância dos arquivos anexos. A decisão final do autor, como moderador e proprietário da lista, em consulta aos membros, foi bloquear todos os arquivos anexos por um curto período de tempo, tornando possível a desinfecção dos computadores infectados. Outros problemas similares com vírus aconteceram na lista posteriormente, até que os grandes servidores e o próprio YAHOO passassem a utilizar ferramentas de antivírus em cada mensagem, durante seu trânsito pela rede. Em fins de 2000, com seis meses desde sua criação, a lista contava com 60 membros. No começo de 2001, foi adicionada ao sítio Bambu Brasileiro uma seção do Grupo Bambu-Brasil (como passou a ser chamado o grupo de participantes da lista), com entrevistas, informações sobre eventos, e informações básicas sobre a participação na lista. Foram entrevistados profissionais brasileiros e estrangeiros sobre aspectos do conhecimento e uso do bambu, e as entrevistas foram adicionadas à seção do Grupo Bambu-Brasil no sítio Bambu Brasileiro. Em fevereiro de 2001, com a mudança da E-Groups para YAHOOGROUPS, foram adicionadas algumas ferramentas online ao serviço, como a possibilidade de realizar pesquisas de opinião com resultados automáticos, e a possibilidade de utilizar um canal de chat (conversa escrita online) aberto aos membros do grupo. As pesquisas de opinião e o canal de chat nunca receberam uma participação significativa dentro do Grupo Bambu-Brasil. Em julho de 2001, o autor abriu a possibilidade de membros do grupo de discussão enviarem (upload) arquivos sobre o tema bambu para a pasta “arquivos” do sítio Bambu Brasileiro. Com o tempo, o autor disponibilizou para download (baixar) aproximadamente 40 arquivos, até abril de 2006, entre teses de graduação e pós-graduação, anúncios de eventos, entrevistas com especialistas, e documentos técnicos e informativos, nas línguas portuguesa, espanhola e inglesa.

181


O funcionamento do grupo traz questões que afetam diretamente a qualidade de sua função como facilitador de comunicações e troca de informações pertinentes: a) mensagens não relacionadas ao assunto bambu em geral, ou com pouco ou nenhum conteúdo de informação pertinente; b) mensagens de anúncio de eventos e possibilidades de emprego em áreas como permacultura, bioconstrução, leis, educação e gestão ambientais, onde o bambu não é um tema específico; c) mensagens de assuntos particulares enviadas ao grupo por falta de atenção ou falta de conhecimento de etiqueta na internet (netiqueta); d) mensagens inflamadas (flaming) ou com conteúdo ofensivo; e) mensagens estritamente políticas ou regionalistas; f) mensagens comerciais fora do assunto bambu (SPAM); g) mensagens com vírus (citadas anteriormente); h) mensagens com arquivos anexos maiores que o limite estabelecido; i) mensagens com o assunto diferente do tema abordado; j) mensagens com pedidos particulares de envio de fotos, vídeos e arquivos ofertados publicamente no grupo. Decorrente das necessidades de gestão do grupo, o autor, como moderador, e os participantes enviaram mensagens sobre o próprio funcionamento do grupo. Algumas vezes isso gerou sobrecarga de mensagens fora do tema específico bambu, porém foram essenciais à administração do grupo. Até setembro de 2005, as questões supracitadas foram manejadas em acordo entre o moderador e os participantes. Porém no início de outubro de 2005, depois de uma série de abundantes mensagens fora de tópico, o autor decidiu pela avaliação prévia de todas as mensagens enviadas ao Grupo BambuBrasil. Desde a criação do grupo, o autor e alguns de seus participantes colaboram em outros grupos que surgiram, como: Bamboo-Plantations, criado em agosto de 2000 por Victor Brias (Bélgica) e moderado por um grupo de moderadores de vários países, com mensagens em inglês; Bambu-Ecuador, criado em setembro de 2000 por Nelson Andrade e moderado também por Jorge Morán Ubidia; BambuPlantaciones, criado em agosto de 2001 por Victor Brias como uma versão em espanhol do grupo Bamboo-Plantations; Bambu-Colombia, criado em setembro de 2002 por Francisco Castaño Nieto e por este autor; e Bambuotatea, criado em agosto de 2002 por Alfonso Rangel (México). O Grupo Bambu-Brasil contava, em 22 de agosto de 2006, com 760 membros. 2.3 REFORMULAÇÃO E SITUAÇÃO DO SÍTIO BAMBU BRASILEIRO Em fevereiro de 2002 o sítio Bambu Brasileiro passou por um processo de reformulação de desenho e estrutura. Em 2003, já contava com 6 mil visitas mensais à página, e em março de 2006 chegou a 17 mil visitas. Resultados de março de 2006: segundo resultado no sítio Google em inglês para a palavra “bambu”; primeiro no Google do Brasil; terceiro para o Google do México; quinto para o Google da Colômbia; e sexto para o Google do Equador. Para o sistema de busca Yahoo do Brasil, é o segundo resultado não patrocinado para a palavra “bambu”, e o décimo sétimo para o Yahoo em inglês. É também o primeiro resultado no sistema Altavista Brasil, e o décimo no Altavista em inglês. O sítio Bambu Brasileiro recebe de 20 a 40 mensagens solicitando informações sobre bambu, em média semanal. O autor responde a todas as mensagens, o que demanda significativo tempo de trabalho. Os assuntos das perguntas recebidas variam desde a identificação de espécies, passando pelo seu plantio, colheita, processamento, uso, técnicas, até sua importância econômica, social e ambiental. O autor verifica com isso a grande demanda no Brasil por informações sobre bambu. Atualmente, as informações contidas no sítio Bambu Brasileiro estão defasadas em, aproximadamente, quatro anos. Existe a necessidade de reformular toda a parte informativa, e tornar disponível informação atual e relevante. 2.4 AGÊNCIA BAMBU DE CONHECIMENTO A Agência Bambu de Conhecimento (ABC) é uma firma limitada, estabelecida pelo autor e seu sócio Eduardo Giacomazzi, dentro da Incubadora Cultural de Empresas Instituto Gênesis, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), desde março de 2006. Um dos objetivos da criação desta agência é a profissionalização, potencialização e focalização de atividades comunicadoras e educadoras da rede de interessados e profissionais de bambu no Brasil. A institucionalização destas atividades ajudará a trazer atenção para a matéria-prima bambu e seu potencial social, ambiental e econômico.

182


3 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES O Grupo Bambu-Brasil e o sítio Bambu Brasileiro tiveram um crescimento significativo por três razões principais: seu pioneirismo (informação na internet sobre bambu em português), seu tamanho e variedade de informação básica, e o crescimento das tendências socioambientais na sociedade brasileira e mundial. A moderação individual de mensagens no Grupo Bambu-Brasil garante a qualidade última da informação difundida, porém traz a possibilidade de o autor da mensagem recusada sentir-se isolado, diminuindo sua motivação em participar. As ferramentas de pesquisas de opinião e área de chat não encontram participação ativa visto que a intenção principal dos membros é um envolvimento através de mensagens, às quais se pode responder de forma optativa, a qualquer tempo, sem a necessidade de uma participação online mais aprofundada. A cooperação entre os grupos de bambu da América Latina e do mundo pode ser identificada hoje como uma rede não institucional de profissionais, pesquisadores, empresários e interessados em conhecimento e informações sobre bambu. Apesar de não ser formalizada, esta rede abre possibilidades para os participantes realizarem a comunicação e troca de tecnologias, notícias pertinentes e oportunidades de atividades comerciais ou sem fins lucrativos. A seção informativa do sítio Bambu Brasileiro necessita de atualização. A criação de manuais básicos sobre diferentes áreas profissionais em relação ao bambu podem facilitar as respostas às mensagens solicitando informação, que chegam em grande quantidade para o autor. A Agência Bambu de Conhecimento pode trazer oportunidades de profissionalização e institucionalização de atividades comunicativas, educativas e culturais para o setor do bambu no Brasil.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALTAVISTA. Sunnyvale (California). 06 mar. 2006. Disponível em: <http://www.altavista.com>. Acesso em: 06 abr. 2006. BAMBOO-PLANTATIONS. Lista de discussão. Disponível em: <http://groups.yahoo.com/group/bambooplantations>. Acesso em: 05 abr. 2006. Lista mantida por YAHOOGROUPS. BAMBU-BRASIL. Lista de discussão. Disponível em: <http://groups.yahoo.com/group/bambu-brasil>. Acesso em: 05 abr. 2006. Lista mantida por YAHOOGROUPS. BAMBU BRASILEIRO. Disponível em: <http://www.bambubrasileiro.com>. Foi informada pelo autor, para esta 2ª Edição, a existência do sítio www.bamboo.ning.com, cujo responsável é o Designer Egeu Laus. Neste sítio, estão disponibilizadas informações mais atualizadas que no site Bambu Brasileiro. BAMBU-COLOMBIA. Lista de discussão. Disponível em: <http://groups.yahoo.com/group/bambucolombia>. Acesso em: 05 abr. 2006. Lista mantida por YAHOOGROUPS. BAMBU-ECUADOR. Lista de discussão. Disponível em: <http://groups.yahoo.com/group/bambuecuador>. Acesso em: 05 abr. 2006. Lista mantida por YAHOOGROUPS. BAMBUOTATEA. Lista de discussão. Disponível em: <http://groups.yahoo.com/group/bambuotatea>. Acesso em: 05 abr. 2006. Lista mantida por YAHOOGROUPS. BAMBU-PLANTACIONES. Lista de discussão. Disponível em: <http://groups.yahoo.com/group/bambuplantaciones>. Acesso em: 05 abr. 2006. Lista mantida por YAHOOGROUPS. GOOGLE. Mountain View (California). 06 abr. 2006. Disponível em: <http://www.google.com>. Acesso em: 06 mar. 2006. INTERNET RELEASE. Fevereiro 2006 [do] Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística - São Paulo, 04 abr. 2006. Disponível em: http://www.almanaqueibope.com.br>. Acesso em: 10 abr. 2006. YAHOO. Sunnyvale (California). 06 abr. 2006. Disponível em: <http://www.yahoo.com>. Acesso em: 06 mar. 2006.

183


9 RESUMOS DE ARTIGOS 9.1 USO DO BAMBU NO PROCESSO TERAPÊUTICO E PEDAGOGIA DA EUTONIA Betty Feffer1

Resumo Esta apresentação objetiva divulgar o uso do bambu nos propósitos pedagógicos e terapêuticos, associados ao estudo e prática da Eutonia. Sua inserção será teórica incluindo também uma breve prática. Entre as diferentes aplicações do bambu, o uso terapêutico é um dos menos conhecidos, especialmente o utilizado na Eutonia. Educação psicofísica criada por Gerda Alexander (1908), na Dinamarca, que desenvolveu uma investigação na Fundação Neuropsicológica dos movimentos naturais do homem, olha a consciência e saúde - não apenas a cura mas também a prevenção. A prática da Eutonia é um constante aprendizado e um processo vivo que coloca a pessoa em contato consigo mesma – sendo uma, entre outras possíveis ferramentas de autoconhecimento. Mediante uma minuciosa observação de seu próprio processo de percepção, da sensação da superfície e sensibilidade profunda da pele, distribuição das tensões crônicas do sistema neuromuscular e da estrutura óssea, chega-se a relaxá-las, donde advém a expansão da consciência. Tem sido constatado que o bambu, diferentemente de outros materiais, pode ser usado com resultados surpreendentes. Ver três casos clínicos relatados mais adiante. Simbolicamente, o bambu pode assumir um significado duplo: o externo, enquanto realidade botânica, e sua ação correlata com uma realidade interna como, por exemplo, espaços internos, ossos, pele, contatos que são característicos da Eutonia. É um instrumento importante para ampliação da consciência. O bambu se presta a este trabalho didático e terapêutico, devido a suas características de flexibilidade de pêndulo, resiliência, resistência, catalisador energético, espaço interno, verticalidade, ressonância e reverberação, eletromagnetismo e outros aspectos de sua composição. O trabalho pode ser individual ou em grupo. Recomenda-se que os estudantes se deitem confortavelmente no chão e façam um inventário, radiografando mentalmente, as partes do corpo que se apóiam ou não no piso e suas correspondentes sensações. O bambu é oferecido como um objeto estimulador para ampliar a percepção da pele e das articulações. Um exercício, por exemplo, pode constar de passar o bambu por um lado do corpo através do toque e/ou percussão. O aluno descreve a sensação advinda deste toque, o que em geral, conduz à percepção da sensação da pele ou articulações. Somente depois, comparar e repetir o mesmo processo no outro lado. A diferença pode ser enorme. Os campos físico, emocional, sensorial, afetivo, orgânico, intelectual e artístico podem ser acessados e trabalhados desta maneira. É fundamental tornar esta técnica conhecida, pois foi observado que quando se liberam as tensões crônicas, pode-se chegar à regulação postural, consciência, autoconfiança e respeito a seus próprios limites, independência e liberdade. Esta apresentação termina recomendando a intensificação e aprofundamento das investigações científicas das propriedades terapêuticas do bambu e a descoberta da Eutonia como recurso profilático para o estresse. Se, por um lado, o estresse nos impõe grandes tensões e embota, por outro, a Eutonia desperta… a consciência. Palavras-chave: Eutonia. Bambu. Cuidado com a Saúde.

1 Formada em Letras pela Univerity of London (1965). Formação profissional: Eutonista pela Escola Brasileira

de Eutonia (1994). Atividades: Eutonia, Terapia Somática, e Presidente do Instituto Jatobás e Fazenda dos Bambus. Trata-se de um projeto que abarca o plantio, replicação de mudas, coleção, didática, artesanato e capacitação, arquitetura e construção ecológica com uso do bambu.

184


Abstract This presentation is intended to divulge the use of bamboo for pedagogic and therapeutic purposes, associated to the study and practice of Eutony. Its insertion will be theoretical-practical, also including a brief group exercise. Among the different applications of bamboo, the therapeutic use is one of the least employed. Especially given its importance for Eutony – created by Gerda Alexander (1908), in Denmark, who developed an investigation on the neuropsychological foundations of man’s natural movements. It is a psychophysical education aiming at awareness and health, not only healing, but prevention as well. The practice of Eutony is an ongoing learning and living process that leads the person to get in touch with the Self. It is a powerful tool for self-knowledge. Through the minute observation of its own processes – of perception and sensation of the superficial and deep sensitivity of the skin, the distribution of chronic tensions in the neuromuscular system and the bone structure these tensions can be released, thus promoting expansion of consciousness. Long years of experience, have proven that bamboo – differently from other materials – may be used with surprising results. See three clinical cases that will be mentioned further. Symbolically, bamboo may assume a double meaning – the external and botanical reality, and its correlate action with an internal reality – such as inner space, bones, skin, contact, awareness – Eutony’s basic work. It is an important tool for conscious contact, due to its characteristics of pendulum flexibility, resilience, resistance, energy catalyst, internal space, verticality, resonance and reverberation, electromagnetism, and other aspects of its composition. The work may be individual or in group. It is recommended that the student lies down comfortably on the ground, and makes an inventory, mentally x-raying the parts of the body that touch the ground or don’t, and describe the corresponding sensations. The bamboo is offered as an object for skin and joint stimulation and perception. The drill is to pass it along one side of the body through touch and percussion, observing the sensations it causes, that may lead to awareness, of the skin and/or joints, compare, the differences may be enormous. Repeat the same process on the other side. The physical, emotional, sensorial, affective, organic, intellectual, and artistic fields may be tackled this way. Years of experience have proven that it is fundamental to make this technique known, for through this work chronic tensions have been released and postural regulation, awareness, self-confidence and respecting one’s own limits, independence, and freedom have been achieved. This presentation ends by recommending the intensification and deepening of scientific investigations on therapeutic properties of bamboo, and the disclosure of Eutony as a prophylactic resource for stress. If, on one hand, stress imposes some strain patterns on us, on the other hand, Eutony awakens awareness. Keywords: Eutony. Bamboo. Health Care.

185


9.2 ENTRE EMPÍRICOS E ACADÊMICOS Celina Llerena, Camila Mello

Resumo Qual a importância da experiência empírica? O que pode acontecer se o conhecimento teórico se afastar da prática? Estes são alguns dos questionamentos discutidos neste artigo. A partir do contexto da construção civil moderna e da História do pensamento empírico, propomos aqui a junção harmônica e coesa entre prática e teoria. Através da criação de cursos e escolas que busquem explorar conhecimentos teóricos em estágios práticos, a integração entre o conteúdo e a experiência é possível. Trazendo o exemplo da Ebiobambu – Escola de Bioarquitetura e Centro de Pesquisa e Tecnologia Experimental em Bambu – mostramos que esta união pode viabilizar conquistas importantes no campo da construção civil em prol do desenvolvimento sustentável. Palavras-chave: Bambu. Desenvolvimento Sustentável. Empirismo. Keywords: Bamboo. Sustainable Development. Empirism.

186


9.3 A FITORREMEDIAÇÃO COMO EXEMPLO DAS POSSIBILIDADES DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE INCLUSÃO SOCIAL Francisco de Assis Machado1, Alejandro Luiz Pereira da Silva2, Dario João de Mendonça Bernardes3

Resumo O presente texto é uma notícia técnica sobre o Projeto “A Fitorremediação como Instrumento de Ampliação da Consciência Sanitária pela Prática de Ações de Recuperação e Proteção de Ecossistemas de Pequenas Populações, com a Utilização do Bambu”, iniciativa do Ministério da Saúde com a intervenção da OPAS-OMS, que começa a ser executado pela organização de interesse social – INTERÁGUAS – Agência Interamericana de Cooperação para o Desenvolvimento Sustentável. Conta, na sua execução, com o acompanhamento do CEPIS – Centro Panamericano de Ingenieria Sanitária da OPAS-OMC. Ele visa à elevação da consciência sanitária das populações envolvidas, colocando em prática ações de promoção da saúde, tendo como principal instrumento a utilização do bambu em pequenos projetos demonstrativos de fitorremediação, no tratamento de águas residuais, visando à diminuição da incidência de doenças de veiculação hídrica, e à geração de ocupação e renda. Para isso, pretende-se adequar e desenvolver tecnologias de fitorremediação com os bambus existentes em países europeus e outras originadas em países latino-americanos, testando-as em três áreas selecionadas, de forma a permitir a sua replicação para todo o país, quando da sua aprovação. Palavras-chave: Fitorremediação. Promoção da Saúde. Inclusão Social. Abstract The present text is a technical note on the project "The Phyto-remediation as an instrument of Widening the Sanitation Conscience for the Practices of Small-population Environmental Recuperation and Protection Techniques with the use of Bamboo". This is an initiative of the Ministry of Health with the intervention of the PAHO-WHO, and it is starting to be performed by the Social-Interest Organization INTERÁGUAS – Interamerican Cooperation Agency for the Sustainable Development. In the performance of its duty, the Organization will be followed by PAHO-WHO's CEPIS - Pan-American Center of Sanitation Engineering. CEPIS has as a goal the increasing of the social conscience of the enrolled populations, putting into effect actions of health promotion, having as its main instrument the use of the bamboo in small demonstrative projects of phyto-remediation in the treatment of residual waters, the decreasing of cases of water-carried diseases and in the generation of jobs and income. For that to be done, it is intended to adequate and develop technologies of phyto-remediation with specific species of bamboo from European countries as well as others raised in Latin-American countries, in three selected areas, with the objective of having the ability of replication throughout the country whenever the project gets its approval. Keywords: Phytoremediation. Health Promotion. Social Inclusion.

1 Médico Sanitarista – MSc. 2 Arquiteto / Esp. Desenvol. Urbano. 3 Ass. Social – Sanitarista.

187


10 PARTICIPANTES DAS MESAS-REDONDAS E CONFERÊNCIAS

1 MESA REDONDA: “BIODIVERSIDADE E ECOLOGIA” 1.1 BRUCE WALKER NELSON (Coordenação) Ecologia do Bambu no Sudoeste da Amazônia. 1.2 HUGO GUTIÉRREZ – CESPÉDES Os Benefícios Socioambientais das Florestas de Bambu (Bambusa vulgaris) no Nordeste do Brasil. 1.3 TARCISO S. FILGUEIRAS Bambus Nativos no Brasil: Oportunidades e desafios para seu conhecimento. 1.4 ANTÔNIO LUIZ DE BARROS SALGADO Bambu no Brasil: Uma matéria-prima celulósica e energética. 2 MESA REDONDA: “APLICAÇÕES” 2.1 SÉRGIO ALBERTO DE OLIVEIRA ALMEIDA (Coordenação) 2.2 ELOY FASSI CASAGRANDE JÚNIOR O Bambu na Interação Academia-Comunidade em Projetos Sociais. 2.3 MARCO ANTÔNIO DOS REIS PEREIRA Projeto bambu: Manejo e Produção do Bambu Gigante (Dendrocalamus giganteus) cultivado na Unesp de Bauru/SP e Determinação de Características Mecânicas de Ripas Laminadas. 2.4 JOSÉ LUIZ MENDES RIPPER LIDL – Laboratório de Investigação em Living Design do Departamento de Artes & Arquitetura da PUC – Rio de Janeiro. 3 MESA REDONDA: “CONSTRUÇÃO CIVIL E MADEIRA ECOLÓGICA” 3.1 JOSÉ DAFICO ALVES (Coordenação) O Bambu e seu Potencial para Aplicações na Construção Civil. 3.2 KHOSROW GHAVAMI Non-Conventional Material and Techonologies: Ecological and Sustainble Construction Materials. 3.3 CELINA LLERENA Construção Civil e Madeira Ecológica. 3.4 EDSON DE MELO SARTORI Pré-moldados de Bambu e Resíduos – Sistema alternativo de construção e estruturas. 4 MESA REDONDA: “POLÍTICAS PÚBLICAS E INCLUSÃO SOCIAL” 4.1 ALEJANDRO LUIZ PEREIRA DA SILVA (Coordenação) 4.2 FRANCISCO DE ASSIS MACHADO A Fitorremediação como Instrumento de Ampliação de Consciência Sanitária pela Prática de Ações de Recuperação e Proteção aos Ecossistemas de Pequenas Populações com a Utilização da Cultura do Bambu. 4.3 JOBERTO VELOSO DE FREITAS Programa Nacional de Florestas: Práticas públicas, inclusão social e bambu. 4.4 GERBEN STEGEMAN En Sociedad para un Mundo Mejor.

188


11 APRESENTAÇÕES DE ATIVIDADES E EXPERIÊNCIAS

1 JOSÉ DAFICO ALVES O Potencial do Bambu na Construção Civil. 2 BETTY FEFFER O Uso do Bambu na Terapia e Pedagogia da Eutonia. 3 ANA PAULA GONÇALVES Estudo Filogenético no Cledo Arthostylidiinae + Guaduinae (Poaceae: Bambuseae). 4 ALEX KLEIN Panorama da Construção Civil com Bambu no Rio Grande do Sul a partir de um Comparativo dos Custos de Construção de Bambu e Madeira. 5 RODRIGO DE MENDONÇA Construção de Pavilhão de Bambu. 6 RICARDO NUNES Construção do Centro de Educação Agro-florestal. 7 MÔNICA SMITS Visão Sistêmica do Bambu – ProjetoAkí. 8 ANELIZABETE ALVES TEIXEIRA Painéis de Bambu para Habitação Econômica: Avaliação do Desempenho de Painéis Renováveis com Argamassa.

189


12 COMPOSIÇÃO DA MESA DE ABERTURA DO SEMINÁRIO

PROF. TIMOTHY MULHOLLAND

Reitor da Universidade de Brasília DR. ANICETO WEBER

Ministério da Ciência e Tecnologia para Inclusão Social (MCT) Representando o Ministro Sérgio Rezende do MCT PROF. JOBERTO VELOSO DE FREITAS

Diretor do Programa Nacional de Florestas do Ministério do Meio Ambiente (PNF-MMA) Representando a Ministra Marina Silva do MMA DR. VALMIR GABRIEL ORTEGA

Presidente Substituto do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA/MMA) PROF. ANDREY ROSENTHAL SCHLEE

Diretor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo - FAUUnB PROF. JAIME GONÇALVES DE ALMEIDA

Coordenador do Seminário Nacional do Bambu

190


13 INSTITUIÇÕES PRESENTES NO SEMINÁRIO NACIONAL DO BAMBU (de acordo com os registros nas inscrições dos participantes)

ABMTENC/RJ

Associação Brasileira de Ciências de Materiais e Tecnologias Não Convencionais ACS

Assessoria de Comunicação da UnB/DF AGABAMBU

Associação Gaúcha do Bambu AMERICEL S/A BAMBU BAHIA/BA

Centro de Planejamento e Intercâmbio de Desenvolvimento Sustentável BAMBUZAL BAHIA/BA COLÉGIO SÃO CARLOS/DF CAMPECHE TECNOLOGIA/SC CANTOAR/FAUUnB, DF CERI

Cerimonial da UnB/DF CODEVASF/DF

Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba CPCE

Centro de Produção Cultural e Educativa – UnB/DF DGA ENGENHARIA, DF EBIOBAMBU/RJ

Associação Escola de Bio-Arquitetura e Centro de Pesquisa e Tecnologia Experimental em Bambu HECTA/SP EDITORA RANCAL/BOAESCOLA - DF EMBRAPA - TABULEIROS COSTEIROS/SE

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária ESALQ/USP

Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” ESCOLA BENNET DE INFORMÁTICA LTDA EXÉRCITO BRASILEIRO FAZENDA BOA VISTA/MG FLOWER DESIGN & DECORAÇÃO/DF FUNTAC/ACRE

Fundação de Tecnologia do Acre FURNAS CENTRAIS ELÉTRICAS/RJ

191


IAB – MOGI DAS CRUZES/SP E DO RJ

Instituto de Arquitetos do Brasil IBAMA/DF

Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis INBARLAC/ECUADOR-QUITO-CASILLA

International Network for Bamboo and Rattan (escritório Latino Americano da Inbar) INCOMUN

Instituto de Desenvolvimento Comunitário Sustentável INCRA/DF

Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária INSTITUTO CRIANÇA VIVA/MG INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO COMUNITÁRIO SUSTENTÁVEL/SE INSTITUTO PATULUS/RS INTERÁGUAS/DF

Agência Interamericana de Cooperação para o Desenvolvimento Sustentável ITAIPU BINACIONAL MARCO MARCHETTI S/A HOTÉIS MEAU – UFBA/ BAHIA MCT

Ministério da Ciência e Tecnologia MMA

Ministério do Meio Ambiente NUNES BAMBU E CIA / SP OIMT

Organización Internacional de Las Maderas Tropicales PORTAL DO XINGU PREFEITURA DE APARECIDA DE GOIÂNIA/GO PREFEITURA DE MONTES CLAROS/MG PROSHOPPING/RJ QUARTA PAREDE: ARQUITETURA E CENOGRAFIA/DF RADIOBRÁS

Empresa Brasileira de Comunicação SADIA/DF SEBRAE/AC

Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas SECOM

Secretaria de Comunicação da Presidência da República SEDUH – SUDUR – IREU – GEPAS/DF

Secretaria de Estado de Desenvolvimento Urbano e Habitação

192


SENADO FEDERAL SKOPOS INTERIORES/SP TECPAR/PR

Instituto Tecnológico do Paraná TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO – TST UCG/GO

Universidade Católica de Goiás, GO UEG/GO

Universidade Estadual de Goiás UFAL – GRUPO BAMBUZAL/AL

Instituto do Bambu da Universidade de Alagoas UFRURAL/RJ

Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro UNICEUB/DF

Centro Universitário de Brasília UNIP/DF

Universidade Paulista UNIPLAC/DF

União Educacional do Planalto Central UNIVERSIDADE SANTA ÚRSULA DO RIO DE JANEIRO

193


14. LISTA DOS INSCRITOS NO SEMINÁRIO 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. 19. 20. 21. 22. 23. 24. 25. 26. 27. 28. 29. 30. 31. 32. 33. 34. 35. 36. 37. 38. 39. 40. 41. 42. 43. 44. 45. 46. 47. 48. 49. 50. 51. 52. 53.

194

Abel Machado dos Anjos Adail Dalla Bernardina ­ DGA Engenharia, DF Adhemar Brandini – Brasília, DF Adriana Garcia do Amaral ­ Universidade Estadual de Goiás Adriana Pellegrini Manhães – UFRJ Adriane Menezes de Jesus ­ UniCEUB Adriano Gonçalves Cáceres ­ UnB Adriano Vieira de Paiva ­ UnB Aiuruá Meinako Aldemar dos Santos Maciel ­ SEBRAE/AC Alejandro Luiz Pereira da Silva ­ Consultor / Interáguas / DF Alencar Garlet ­ Lab. de Produtos Florestais – LPF/IBAMA Alex Maltese Klein ­ Porto Alegre Alexandre Rocha da Silva ­ UnB Alexandre Siqueira ­ Quarta Parede ­ Arqu. e Cenografia / DF Alice Leite Flores ­ FAUUnB Alicia Lorieto ­ UnB Aline Lopes Moreira – Brasília, DF Aline Oliveira Hueb Silva – UniCEUB Ana Carolina de Abreu B. Chaves Ana Carolina Silva ­ UnB Ana Cecília Regis Alves – UnB Ana Cristina do Nascimento Fonseca ­ UnB Ana Elisa Hanriot e Bandeira – UniCEUB Ana Maria França – Goiânia ­ GO Ana Maria Ribeiro Pinhal ­ IAB Mogi das Cruzes/SP Ana Paula Santana Barbosa – Brasília, DF Ana Schramm – UnB Ana Virgínia Montenegro Castelo – UnB Anelizabete Alves Teixeira – Goiânia/Goiás André Crispim dos Santos ­ UnB André Fábio Medeiros Monteiro André Luis Rocha Fernandes ­ UNIP­Univ. Paulista/ Brasília André Madeira Azambuja ­ Universidade Santa Úrsula / RJ Andréa Beatriz Welter Ribeiro – Brasília, DF Andrea G. Moreira Bernardes – FAUPLAC/UNIPLAC Brasília Andréa Mello Peres ­ UNIP Andréia Maria Fernandes ­ Brasília Andrey Rosenthal Schlee – FAUUnB Andrezza Barbosa Mendes – FAUUnB Aniceto Weber – Brasília/DF Antonio Carlos Cabral Carpintero ­ FAUUnB Antonio Eustáquio dos Santos ­ Brasília, DF Antonio L. Barros Salgado – São Paulo / SP Antônio R. S. Nunes – Inst. Desenv. Comunit. Sustent./SE Antônio Sérgio Pedreira Franco Sousa Artur Basílio Ferreira ­ Universidade Estadual de Goiás (UEG) Artur Henrique Bernardes ­ Brasilia Artur Henrique Lima de Holanda – Brasília, DF Bey Ayres da Silva ­ SEDUH/GDF Betty Feffer – São Paulo / SP Bruce Walker Nelson – Manaus / Amazonas Brunno Guilherme Barbosa de Sá ­ FAUUnB

54. 55. 56. 57. 58. 59. 60. 61. 62. 63. 64. 65. 66. 67. 68. 69. 70. 71. 72. 73. 74. 75. 76. 77. 78. 79. 80. 81. 82. 83. 84. 85. 86. 87. 88. 89. 90. 91. 92. 93. 94. 95. 96. 97. 98. 99. 100. 101. 102. 103. 104. 105. 106.

Bruno Mulim Venceslau ­ UnB Bruno Piedade Baptista Campos – Brasília, DF Bruno Souto de Azambuja – UNB Camila Pacheco Castro e Silva – UnB Carla Villela de Castro ­ Brasília, DF Carlos Adalberto Estuqui Filho – Brasília, DF Carlos Alberto Lazzarini ­ São Paulo Carlos Augusto Soares de Melo – Grupo Bambuzal / SE Carlos Eduardo Radaik ­ Santa Catarina Carlos Fábio Fernandes Correa ­ Brasília, DF Carlos Francisco Rosseti – IBAMA / DIREF Carolina Duarte Gonçalves Ramos – Brasília, DF Celene Maria da Rocha Brandão ­ IAB­RJ Celina Llerena – Rio de Janeiro / RJ Celina Rubiano da Silva ­ Universidade de Brasília ­ UnB César Bulcão Amorim da Costa ­ UnB Cirineu Jorge Lorensi ­ IBAMA Clécio Gonçalves de Paula ­ Americel S/A Cleriston Milhomens de Oliveira Clévron Milhomens de Oliveira Daniel Correia de Brito ­ UnB Daniella Torres Martins Romeu – UEG/GO Danyelle Cruz ­ UnB Denia Cristinna Teixeira – UNB Denise Faria de Paiva – UNIP Denise Fujiwara Sakamoto ­ Nunes Bambu e Cia / SP Denízia Gonçalves Macedo – UnB Diego Cavalcanti Cunha – Brasília, DF Dilermando Flores Santos Dílson de Oliveira Melo ­ São Paulo Dina Giacoma de Mesquita Viglio ­ SEDUH Divino Eterno Teixeira ­ LPF/IBAMA Dixon Gomes Afonso ­ FUNTAC Donizete José Tokarski ­ Brasília, DF Edgar Novaes Bellinat – Goiânia Edílson Sebastião de Almeida Edson Rangel da Silva Júnior Edson de Mello Sartori Eduardo Romero Eleudo Esteves de Araújo Silva Júnior – Cantoar/FAUUnB Eliana L.C. Ramirez Abrahão ­ Brasília, DF Eloisa Barros Horsth – Brasília, DF Eloy Fassi Casagrande Jr – Curitiba / Paraná Elza Maria Rego Ramalho – Brasília, DF Enrique Ezequiel Villamil Famiglietti – PPG­FAUUnB Enver Santos Mendonça – UEG/GO Erick Mello Maciel ­ Instituto Patulus/RS Estefânia Cardoso Silva Santos ­ IESPLAN Estefânia Uchôa Freire da Fonseca ­ Senado Federal Evandro R. M. de Araújo Júnior ­ Univ. Estad. de Goiás (UEG) Ewandro Magalhães Freitas – Embrapa/DF Fabiana Marques B. Maciel ­ UniCEUB Fabiana Ungaretti Marcondes de Mello – UnB


107. 108. 109. 110. 111. 112. 113. 114. 115. 116. 117. 118. 119. 120. 121. 122. 123. 124. 125. 126. 127. 128. 129. 130. 131. 132. 133. 134. 135. 136. 137. 138. 139. 140. 141. 142. 143. 144. 145. 146. 147. 148. 149. 150. 151. 152. 153. 154. 155. 156. 157. 158. 159. 160. 161. 162.

Fábio A. B. da Silva ­ Min. da Ciência e Tecnologia/MCT 163. Fábio Almeida Ribeiro­ Brasília ­ DF 164. Fabio Manoel Pereira Borba ­ GO 165. Felipe Borges Meneses 166. Fernanda Bittar Homsi ­ UNIP 167. Fernanda Samarco Rodrigues Cecílio ­ UniCEUB 168. Fernando Antonio Rodriguez­ Agência Interáguas/DF 169. Fernando Duboc Bastos – UFRural/RJ 170. Fernando Edmundo Chermont Vidal ­ UnB 171. Fernando Nunes Gouveia ­ LPF – IBAMA 172. Flora Egécia Oliveira Morais – UnB 173. Flora Oliveira Braga ­ Brasília, DF 174. Francisco de Assis Machado – Brasília / DF 175. Francisco Fernando Livino de Carvalho – IBAMA 176. Francisco Marcio Amado Batista ­ UnB 177. Franklin Sánchez Garcia 178. Frederico Orlando Calazans Machado­ CODEVASF 179. Frederico Rosalino da Silva – INCRA/DF 180. Gabriel Schvarsberg – Brasília, DF 181. Gabriela Pereira Galvão 182. Geraldo Benicio de Carvalho Junior – Brasília, DF 183. Geraldo Starling Soares Neto – TST 184. Gerben Stegeman – INBAR LAC/Ecuador 185. Gerson Henrique Sternadt ­ IBAMA/DIREF/LPF 186. Gilberto Terra Ribeiro Alves ­ São Paulo 187. Gilson de Souza ­ Ministério do Meio Ambiente (MMA) 188. Giovanna de Oliveira Cardoso ­ SEDUH 189. Giselle Lúcia Oliveira Paiva ­ FAUPLAC 190. Gitte Storm – Brasília, DF 191. Gladys Schincariol 192. Glécia Virgolino da Silva – UnB 193. Graciete Guerra da Costa – UnB 194. Guilherme A. G. Oliveira – Pref. de Montes Claros/MG 195. Guilherme Vulpe Gil ­ UnB 196. Hamilton Valério Filho ­ Brasília, DF 197. Heleno Rabelo Ferraz ­ Fazenda Boa Vista/MG 198. Helka Capparelli Ribeiro – UniCEUB 199. Hugo Gutiérez­Cespédes – Recife / Pernambuco 200. Hugo Leonardo Oliveira Chaves ­ UnB 201. Iberê Mesquita Filho ­ Brasília, DF 202. Irving Martins Silveira – UnB 203. Isadora Freire ­ UnB 204. Izaías Francisco da Silva – Grupo Bambuzal / SE 205. Jaime Gonçalves de Almeida – Cantoar / FAUUnB 206. Jair Rocha Alves ­ MCT 207. Janilson Pereira do Nascimento ­ Exército Brasileiro 208. Joberto Veloso de Freitas – Brasília, DF 209. João Aparecido Nunes ­ Nunes Bambu e Cia/SP 210. João Augusto Pereira Júnior ­ Brasília, DF 211. João Carlos Hohl Abrahão 212. João Luiz Batista dos Santos ­ Sadia/DF 213. João Maurício Fernandes Souza ­ Universidade Estadual de Goiás 214. João Paulo Franco Assumpção 215. Jorge Augusto de Souza Oliveira ­ Universidade de Brasília ­ UnB 216. Jorge Fernando Vieira ­ Maceió 217. Jorge Luis Gomes de Pinho 218.

Jorge Malleux ­ OIMT Jose Alberto Carneiro da Cunha Cadais – Brasília, DF José Artur Grossi – Pirenópolis / Goiás José Carlos Pedreira de Freitas – Hecta/SP José Dafico Alves – Goiânia / Goiás José Luiz M. Ripper – Rio de Janeiro / RJ Jose Marcondes Olivetti Neto ­ IBAMA/CNPT José Mário Fagundes Bado ­ Campeche Tecnologia/SC José Noguchi Joselho Rocha Batista – Grupo Bambuzal / SE Joselito Marques de Jesus Filho – UnB Juan Llerena – Rio de Janeiro / RJ Julia de Almeida Costa ­ Universidade de Brasília ­ UnB Juliana de Menezes Trindade – Brasília, DF Juliana Ferreira Nina ­ Brasília, DF Juliana Marchezan Leães – UnB Kaisa Annika Agassis Laypold ­ IPA Karen R. Valadares Karla de Abreu Silva Lima Kátia I.C. Gonçalves Khosrow Ghavami – Rio de Janeiro / RJ Laureano Dutra ­ Instituto Criança Viva/MG Lauriane Cristina Triaca – UNIP Leandro Alves Freitas Leila Bueno de Oliveira ­ UniCEUB Lenizza Santana de Andrade – UNIP/ Brasília Leonardo Menezes Xavier ­ Rio de Janeiro / RJ Letícia Marins Villela de Andrade Mendes – UnB Lidiane Cristina Ribeiro Silva – UNB LIdielly de Alencar Borges – UEG/GO Lílian Coelho Eduardo ­ UnB Lílian Rose Nunes Guimarães Lívia Braga Teixeira ­ Rio de Janeiro / RJ Lívia Marques Borges – UnB Lorena Gonçalves Bastos – UniCEUB Lorena Mileib Burgos Castelo Branco ­ Brasília, DF Louise Stephanie Garcia Gaunt ­ UnB Luciana Kaviski Peixoto – PPG ­ FAUUnB Luciana Spinelli Araújo ­ ESALQ/USP Luciano Roitman ­ Flower Design e Decoração Luciano Vieira Brandão – Grupo Bambuzal / SE Luimar José Tozetto ­ CODEVASF Magda de Lurdes Manoel de Oliveira Bessa Filho ­ Codevasf/Min. Integr. Nacional Marcelo Augusto Queiroz Mazzini Calegaro ­ Brasília, DF Marcelo Moraes de Souza Ferreira Silva – UnB Marcelo Tavares de Castro ­ Brasília, DF Márcio Albuquerque Buson ­ FAU/UnB Marco Antônio dos Reis Pereira – Bauru / SP Marcos Antonio Baumgartner ­ Itaipu Binacional Marcos Aurélio Lopes de Arimatéia Marcus Vinicius Rocha Filgueiras – UniCEUB Margarida Maria Corrêa Dalla ­ Câmara dos Deputados Maria Angélica Valério ­ Agência Interáguas/DF Maria Cecília Filgueiras Lima Gabriele ­ Univ. de Brasília ­ UnB Maria de Fátima Araújo Paiva

195


219. 220. 221. 222. 223. 224. 225. 226. 227. 228. 229. 230. 231. 232. 233. 234. 235. 236. 237. 238. 239. 240. 241. 242. 243. 244. 245. 246. 247. 248. 249. 250. 251. 252. 253. 254. 255. 256. 257. 258. 259. 260. 261. 262. 263.

196

Maria de Fátima Marchezan M. da Silva ­ Colégio São Carlos/DF 264. Maria E. P. Quaresma – Pref. Mun. de Aparecida de Goiânia 265. Maria Lucia de Carvalho Lima Neves ­ PCRJ 266. Maria Teresa de Melo Oliveira ­ UniCEUB 267. Mariana de A. Salles 268. Marianna Reis Rocha Santos ­ Brasília, DF 269. Marina Gonçalves Gonzalez ­ Brasília, DF 270. Marlova Mosena 271. Matheus Vicente Ferreira Naves 272. Maurício Lima Cardoso Júnior ­ MEAU – UFBA/ Bahia 273. Mauro Nakashima de Melo – UnB 274. Melina Mikoski – UNIP/ Brasília 275. Mírian de Almeida Costa ­ Universidade de Brasília ­ UnB 276. Mônica Smits ­ Minas Gerais 277. Muryllo Augusto Sousa Pires ­ UCG/GO 278. Myriam Ramos Serejo ­ Brasília, DF 279. Nadia Cristine Freire Alves – Funtac/Acre 280. Nara Abreu Emediato – SEDUH/ GDF 281. Natalia Cabral do Rego Barros ­ UnB 282. Nathalie Moreira Fontana – Inst. Tec. do Paraná (TECPAR) 283. Nicole Evelyne Reiss ­ São Paulo 284. Normando Perazzo Barbosa ­ Univ. Fed. da Paraíba / PB 285. Orlando de Assumpção Filho ­ Ministério do Meio Ambiente 286. Oscar Couto de Souza Filho ­ Proshopping/RJ 287. Oscar Luis Ferreira ­ FAUUnB 288. Patrícia Mussi Sarkis – UNIP/DF 289. Patrick Bruno Ruas Guimarães ­ UnB 290. Paula Ferri Paixão ­ SEDUH 291. Paulo de Tarso Rodrigues Alves 292. Paulo Sérgio Pinhal ­ São Paulo 293. Pedro Daldegan ­ Quarta Parede ­ Arquitetura e Cenografia/DF 294. Pedro Farinha Souto Maior Salgado ­ UnB 295. Pedro Ítalo Tanno Silva ­ Brasília, DF 296. Pedro Seabra Guimarães – UNIP / DF 297. Petronio Diego Silva de Oliveira – UnB 298. Priscila Áurea Mercio da Silveira Sá – Brasília, DF 299. Priscilla Martins Costa ­ Universidade de Brasília/UnB 300. Rafael Brito Pereira ­ UnB 301. Rafael Gomes Lima 302. Rafael Gonçalves de Oliveira – UnB 303. Rafael Siqueira de Brito ­ Brasília, DF 304. Ramiro Portilho de Lima – FAUUnB 305. Raphaela Christina Costa Gomes ­ Universidade Estadual de Goiás 306. Raquel Alves Teixeira – Brasília, DF 307. Renata Bueno Nicola ­ Skopos Interiores/SP

Renata Dalla Bernardina ­ MMA Renata Sene Domingues – UnB Ricardo Faustino Teles ­ UnB Ricardo José Calembo Marra – IBAMA, UnB Rita de Cassia Pereira – IBAMA ­ COPÓM Roberto Gomes do Nascimento ­ SECOM/Presidência da República Roberto Harris Roberto Liberatoscioli de Carvalho – UnB Roberto Souza Guedes ­ UnB Rodrigo de Mendonça – Rio de Janeiro Rodrigo Pinheiro Bastos ­ UnB Rogério Fenner Santos ­ Brasília, DF Rogério Romero Mazzeo ­ ESALQ/USP Rômulo Bonelli – Brasília / DF Rozimeiry Gomes Bezerra ­ Ministério do Meio Ambiente/MMA Rubens Cardoso Junior ­ Mato Grosso do Sul Sandra Lestinge Saulo Glauber Silva Sousa – UnB Sebastião Kengen ­ OIMT Semíramis Rabelo Ramalho Ramos Sérgio Alberto de Oliveira Almeida ­ IBAMA/DIREF/LPF Sérgio Martinez ­ IBAMA/DIREF/LPF Simone Damasceno ­ UniCEUB Simone R.G.Piva ­ Santa Catarina Sônia M.R.Garrida Pereira Sônia Maria Aranha Góes Sônia Pedrão Rio Branco Garrido ­ Bambuzal Bahia Susie Brandão Dourado – UnB Tarciso S. Filgueiras – Brasília / DF Tallyrand Moreira Jorcelino – UnB Tássia Fonseca Latorraca – Brasília, DF Tatão Yawalapiti ­ Xingu Tatiana Soares Chaves Lopes ­ UnB Thaíssa Regina Rosa – Brasília, DF Tiago Leandro Freire Félix ­ UnB Valéria Ferreira de Araújo – UnB Valmor Cerqueira Pazos ­ UnB Vicente Benedito de Menezes Silva ­ UFG/GO Victória Helena Riccioppo Rossetti – SEDUH/ GDF Virgílio Américo Pacheco de Senna ­ Bambuzal Bahia Wolfgang Friedrich Reiber – BAMBUBAHIA Yamira Rodrigues de Souza Barbosa – UnB Ycaro Rafael Machado Araújo ­ Brasília, DF Yucatan Teixeira da Silva ­ Furnas Centrais Elétricas/RJ



Impressão e Acabamento

Formato Papel Tipologia Projeto Gráfico e Formatação

Gráfica e Editora Ideal Ltda. SIG Qd. 8 nº 2268 - Brasília/DF Tel. (61) 3344-2112 21 x 28 cm Capa: Cartão Supremo LD 300 g/m² Miolo: Off Set LD 90 g/m² Capa e Contracapa Libel Suit Texto Arial corpo 9 Geraldo Benício

2011


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.