ARQUITETURA DE EXPOSIÇÕES

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entre 1972 e 2003, 35 delas como curadora e arquiteta. interior e no litoral do Brasil, sendo responsável por levar carrancas de São Francisco ao Masp.

Mas Gisela ainda se dedicou a outra temática, a de

apresentar escritores ao grande público dos centros

culturais, transformando textos e histórias em ambientes imersivos. Ela começou com Clarice Lispector, em 1992, e seguiu com Mario Quintana, Mário de Andrade e Hilda Hilst, entre outros.

Muito se deve no Brasil aos experimentos que Lina

Bo Bardi e Gisela Magalhães realizaram no campo da

arquitetura expositiva, uma área de estudos crescente nas histórias das exposições. E este é um ótimo livro para quem quer conhecer melhor os processos de

criação de mostras e, provavelmente, as duas figuras que desenvolveram essa linguagem de forma mais radical no Brasil.

Fabio Cypriano

Doutor em comunicação e semiótica pela PUC-SP, é coordenador do curso de graduação Arte: História, Crítica e Curadoria, da PUC-SP, onde ministra aulas na graduação e no mestrado lato sensu. É ainda crítico de arte da Folha de S.Paulo e colaborador das revistas Frieze (Inglaterra), Flash Art (Itália), Atlántica (Espanha) e ARTE!Brasileiros (Brasil). É autor de Pina Bausch (Cosac Naify, 2005), entre outros.

Pesquisadores, arquitetos, artistas, curadores, produtores culturais e designers, olhem para este livro com atenção. O que se tem em mãos é uma obra de referência para o estudo e a prática da arquitetura de exposições. De forma clara e acessível, César Sartorelli apresenta essa peculiar linguagem arquitetônica, analisando a trajetória de duas de suas maiores representantes no Brasil: Lina Bo Bardi e Gisela Magalhães.

Uma em São Paulo, outra no Rio de Janeiro, elas foram

responsáveis por exposições icônicas da cultura nacional. Lina

apresentando universos particulares no espaço do Sesc Pompeia: os brinquedos, o design, o caipira, a criança; Gisela com seu subjetivo mundo alegórico ao falar de cultura popular, política nacional e grandes escritores.

Arquitetura de exposições brinda o leitor com reproduções de

croquis, plantas e desenhos, acompanhadas de fotos dos ambientes que resultaram desses originais. Pode-se comparar projeto e

execução, plano e espaço. Pode-se observar cada textura, cada curva e cada cor. Pode-se, enfim, contemplar o gênio das duas

grandes artistas, neste exercício de ressignificação do espaço que é a arquitetura expositiva. ISBN 978-85-9493-086-6

LINA BO BARDI E GISELA MAGALHÃES CÉSAR AUGUSTO SARTORELLI

Assim como Lina, Gisela fez uma vasta pesquisa no

ARQUITETURA DE EXPOSIÇÕES

ARQUITETURA DE EXPOSIÇÕES

O mesmo ocorre com Gisela, também ela atenta à

cultura popular, responsável por organizar 48 mostras

“Eu tenho que ser legível quase no escuro”, escreveu Clarice Lispector. A frase foi uma inspiração efetiva para a arquiteta Gisela Magalhães (1930-2003) criar a cenografia da mostra A paixão segundo Clarice

Lispector, no Centro Cultural Banco do Brasil, em 1992.

Poucos conhecem a extensa carreira na área expositiva de Gisela, que iniciou sua vida profissional trabalhando com Oscar Niemeyer e Lucio Costa, na construção de Brasília, e enveredou por um caminho inovador.

Junto com Lina Bo Bardi (1914-92), Gisela criou uma

sólida reflexão e extensa prática na realização de mostras, sem se limitar aos parâmetros convencionais do mundo

dos museus e galerias, tanto na forma como no conteúdo. É isso que explora Arquitetura de exposições: Lina Bo

Bardi e Gisela Magalhães, de César Augusto Sartorelli.

Lina tem reconhecimento internacional, tanto por suas

construções icônicas, como o Masp e o Sesc Pompeia,

LINA BO BARDI E GISELA MAGALHÃES CÉSAR AUGUSTO SARTORELLI

quanto por criar novos dispositivos de exposição, caso

de seus famosos cavaletes de vidro. O que este livro traz de novo é uma minuciosa pesquisa em torno da criação

das mostras, a partir de entrevistas com muitos de seus

colaboradores, que testemunham a paixão por transformar a exposição numa experiência efetiva.

Um ótimo exemplo apresentado aqui é a mostra

O belo e o direito ao feio, organizada no Sesc

Pompeia, em 1982, em que Lina foi a responsável pela

programação por três anos. “Não me interessa a beleza, mas a poesia”, dizia a arquiteta a seus assistentes,

apontando como certas categorias são circunstanciais e mutáveis, entre elas o belo e o feio, e outras são

perenes. Nessa toada, sua visão militante em defesa da

cultura popular brasileira contaminou suas mostras com

dispositivos semelhantes aos existentes em feiras de rua ou festas religiosas.

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SERVIÇO SOCIAL DO COMÉRCIO Administração Regional no Estado de São Paulo Presidente do Conselho Regional Abram Szajman Diretor Regional Danilo Santos de Miranda Conselho Editorial Ivan Giannini Joel Naimayer Padula Luiz Deoclécio Massaro Galina Sérgio José Battistelli Edições Sesc São Paulo Gerente Iã Paulo Ribeiro Gerente adjunta Isabel M. M. Alexandre Coordenação editorial Francis Manzoni, Clívia Ramiro, Cristianne Lameirinha Produção editorial Bruno Salermo Rodrigues Coordenação gráfica Katia Verissimo Produção gráfica Fabio Pinotti Coordenação de comunicação Bruna Zarnoviec Daniel

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LINA BO BARDI E GISELA MAGALHÃES CÉSAR AUGUSTO SARTORELLI

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© César Augusto Sartorelli, 2019 © Edições Sesc São Paulo, 2019 Todos os direitos reservados

preparação Thereza Pozzoli, José Ignácio Mendes revisão Marcio Della Rosa, Fátima Couto projeto gráfico e diagramação Mariana Bernd

Sa773L Sartorelli, César Augusto Arquitetura de exposições: Lina Bo Bardi e Gisela Magalhães / César Augusto Sartorelli. – São Paulo: Edições Sesc São Paulo, 2019. – 196 p. il. Bibliografia ISBN 978-85-9493-086-6 1. Arquitetura. 2. Brasil. 3. Arquitetura expositiva. 4. Exposições. 5. Bardi, Lina Bo. 6. Magalhães, Gisela. 7. Biografia. I. Título. II. Bardi, Lina Bo. III. Magalhães, Gisela. CDD 729

Edições Sesc São Paulo Rua Cantagalo, 74 – 13º/14º andar 03319-000 – São Paulo SP Brasil Tel. 55 11 2227-6500 edicoes@edicoes.sescsp.org.br sescsp.org.br/edicoes /edicoessescsp

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Por que não se entregar ao mundo, mesmo sem compreendê-lo? Individualmente é absurdo procurar a solução. Ela se encontra

misturada aos séculos, a todos os homens, a toda a natureza. E até o teu maior ídolo em literatura ou em ciência nada mais fez do que acrescentar cegamente + um dado ao problema. CLARICE LISPECTOR

Correspondência

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SUMÁRIO Sobre a inconstância dos museus   9 Danilo Santos de Miranda

Introdução  10 1

A linguagem da arquitetura expositiva  14 Breve história da arquitetura expositiva  15 A linguagem museal  18

A exposição como obra  21

As três lógicas que intervêm na transformação de um discurso científico  25 Lógica discursiva  26 Lógica espacial  26 Lógica gestual  28

Do espaço institucional ao espaço final  29

Espaço-base simbólico e espaço-base físico  30 Espaço-meio e partido  31 Espaços-frase  32

Som, luz, informações e outros elementos dos espaços-frase  32 Espaço-fim  33

2 Do inventário à ambientação: as exposições de Lina Bo Bardi  36 A arquitetura expositiva de Lina no Sesc Pompeia  54 As pequenas exposições  61 As grandes exposições  67

O design no Brasil: história e realidade (1982)  67 Mil brinquedos para a criança brasileira (1982-1983)  75 Caipiras, capiaus: pau a pique (1984)  82 Entreato para crianças (1985)  95

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3 Do cubo negro à iluminação eloquente: as exposições de Gisela Magalhães  108

Cronologia das exposições de Gisela Magalhães  109 Brasília e as primeiras exposições  112 A mudança para o Rio de Janeiro  117

A paixão segundo Clarice Lispector (1992)  118 Curitiba: tempo e caminhos (1993)  134 Glauber Rocha, um leão ao meio-dia (1994)  136 Exposição permanente do Museu do Folclore Edison Carneiro (1994)  139 A trilogia do Museu da República  146 Fala, Getúlio (1994)  146 A ventura republicana (1996)  148 Eu, Getúlio (1999)  155 Exposições do patrimônio histórico pelo Iphan  155 Texto no espaço: escritores e arquitetura expositiva  163 Hilda Hilst 70 anos (2000-2001)  175 Lina e Gisela: aproximações e diferenças  182 Bibliografia  190

Depoimentos e entrevistas  193 Créditos de imagem  194 Sobre o autor  195

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SOBRE A INCONSTÂNCIA DOS MUSEUS

Para muito além da técnica, a arquitetura tem a capacidade de sugerir visões de mundo, enquadramentos e caminhos nos espaços percorridos por nós. O envolvimento das ar-

quitetas Lina Bo Bardi e Gisela Magalhães com arquitetura de exposições, e com a pró-

pria curadoria de exposições, pode ser compreendido a partir do interesse profundo de

ambas pela ressignificação dos ambientes e, portanto, de percepção das pessoas, por meio do refinamento dos projetos expositivos como um todo.

A compreensão de Lina sobre a “arquitetura como ato civilizatório” e a preocupação

das duas arquitetas com a valorização da arte popular e do artesanato brasileiro nos

oferecem algumas marcas de suas trajetórias, entre as quais destaca-se o interesse comum pelas questões sociais. Com base numa visão generosa da arquitetura, Lina e

Gisela compartilhavam o horizonte da educação do olhar, empenhando-se no desenho

de percursos, ambientes e estruturas capazes de instigar novas formas de percepção da arte e da identidade brasileiras.

A análise da linguagem museal ao longo da história revela mudanças nas for-

mas como lidamos com o conhecimento no decorrer do tempo, passando por fases

que estimularam a contemplação e por períodos que favoreceram a análise técnica, ora favorecendo a acumulação de objetos, ora optando pelo minimalismo – e, mais

recentemente, buscando amplificar o poder simbólico das próprias coisas exibidas pelo conjunto de elementos expositivos.

Nesse sentido, a compreensão do complexo de elementos espaciais que nos ofe-

recem obras de arte, palavras e percursos – em resumo, símbolos –, é fundamental para o desenvolvimento pleno de nossa capacidade de interpretação dos espaços

arquitetônicos, bem como para a leitura acurada das sociedades e ideias com as

quais temos contato no mundo globalizado. O presente livro contribui para despertar

o olhar para a constituição das exposições a partir do trabalho de duas importantes

curadoras arquitetas: Lina Bo Bardi e Gisela Magalhães. Os bastidores e a essência de seus projetos estão nestas páginas. Danilo Santos de Miranda

Diretor Regional do Sesc São Paulo

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INTRODUÇÃO Este livro apresenta o trabalho de duas arquitetas que atuaram no Brasil como curadoras de exposições: Lina Bo Bardi e Gisela Magalhães. Por meio de exemplos tirados da

trajetória profissional de ambas, veremos como a linguagem da arquitetura transforma o espaço em que ocorrem as exposições. Ao fazê-lo, a arquitetura contribuiu para que as

exposições se tornassem uma nova forma de mídia, com produções cada vez mais sofisticadas, que se valem de outras mídias para exprimir conhecimentos e visões de mundo.

Nas palavras do pensador francês Jean Davallon1, a exposição de obras tornou-se uma

obra. Por abordá-la do ponto de vista do arquiteto, quando também é curador, este livro enfoca a arquitetura de exposições ou arquitetura expositiva.

O primeiro capítulo pincela a história dos espaços museais e da museografia para

definir a linguagem da arquitetura expositiva, associando-a às formas históricas que assumiu a exposição como obra, relacionando-a com as vanguardas da arte do século xx e destacando os elementos que a compõem. Os capítulos segundo e terceiro apresen-

tam as características e a evolução da linguagem expositiva de, respectivamente, Lina Bo Bardi e Gisela Magalhães, detalhando a realização de suas principais exposições em ordem cronológica. Enfim, uma breve conclusão esboça as aproximações e divergências entre as poéticas das duas arquitetas.

Lina Bo Bardi (1914-1992) e Gisela Magalhães (1930-2003), arquitetas e curadoras,

apresentam vários pontos em comum. São ambas herdeiras da tradição moderna: Lina

difundiu-a desde o início de sua estada no Brasil, enquanto Gisela iniciou seu trabalho

de arquiteta como assistente de Lúcio Costa na construção de Brasília. Ambas também foram pioneiras e militantes da valorização da arte popular e do artesanato brasileiro, objeto de várias de suas exposições. Por fim, trabalharam para ou em instituições que

fomentaram exposições de importância decisiva para a cultura brasileira. Lina colabo-

1. Cf. Davallon, 2000.

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rou com Pietro Maria Bardi desde a fundação do Masp, na cidade de São Paulo, em 1947, passando pelo MAM de Salvador, voltando ao Masp e depois construindo e integrando o

Sesc Pompeia, como coordenadora da equipe de programação. Gisela começou suas

atividades em 1972, como funcionária do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Na-

cional (Iphan), trabalhou no Ministério da Educação e Cultura, e posteriormente atuou como curadora independente para várias instituições públicas pelo Brasil, sobretudo no Rio de Janeiro; realizou um de seus últimos trabalhos em São Paulo, no Sesc Pompeia, encontrando-se simbolicamente com Lina Bo Bardi no espaço criado por ela.

Ambas tiveram importante papel na história das exposições feitas no país. O trabalho

de Lina, restrito a São Paulo e, por um período breve, à Bahia, exibia contundência e coerência que a tornaram uma das arquitetas mais estudadas no Brasil e no exterior, ampla-

mente reconhecida após sua morte. Gisela, cujas grandes exposições ocorreram após o

falecimento de Lina, obteve repercussão ainda em vida, sobretudo na década de 1990, no apogeu de sua produção, realizada no Rio de Janeiro, em Brasília, Fortaleza, Curitiba e São Paulo, além de Portugal e Itália. Ao contrário do que aconteceu com Lina, cujo acervo foi recolhido e catalogado por um instituto que leva seu nome, sobre o trabalho de Gisela

existem poucos estudos acadêmicos, e o acervo está disperso entre seus colaboradores.

Aproximando os caminhos ora paralelos, ora cruzados das duas arquitetas curadoras, faremos surgir as marcas distintivas da arquitetura expositiva de cada uma.

Além de fontes e referências dispersas, este livro baseou-se em depoimentos dos

colaboradores de Lina e Gisela, essenciais para dar uma visão mais próxima dos seus processos criativos. Afinal, como afirmou Hans Ulrich Obrist2, montar uma exposição é

como reger uma orquestra. As contribuições decisivas que ambas as arquitetas receberam de seus colaboradores reforçam o caráter coletivo do processo de criação e execução de uma exposição.

Para tratar de arquitetura de exposições, precisamos definir o que é arquitetura e o

que é exposição. Lina Bo Bardi baliza arquitetura da seguinte maneira: “A colocação de

uma pedra num determinado local é arquitetura […] a arquitetura é um ato civilizatório”. A

arquitetura não se limita “à arte de construir e, num sentido mais restrito, à construção ci-

vil; ela abrange tudo o que é estrutura e representação”. Assim, “o homem […], servindo-se dos meios que a própria natureza lhe oferecia, no sentido de modificá-la e reorganizá-la, vai criando pouco a pouco arquiteturas […] desde a pedra lascada até o satélite interpla2. Obrist, 2010. 3. Bo Bardi, 1957. Tese apresentada ao concurso da cadeira de Teoria da Arquitetura na FAU-USP.

netário, da caverna ao arranha-céu, do amuleto à catedral”.3 A intervenção humana em

qualquer dimensão do espaço, num ambiente natural preexistente, confere-lhe um significado cultural, em arranjos cada vez mais complexos. As novas estruturas e representa-

ções adquirem valor simbólico, modificando o espaço e conferindo-lhe novos significados. Por exemplo, num local que já era sagrado são erigidos menires, e assim se constitui

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um templo ao ar livre. Portanto, a arquitetura pode ser entendida como a ressignificação do espaço, seja natural, como uma paisagem, seja construído, como as cabanas, casas, ruas, cidades e outras criações humanas que vão desenhando o mundo.

Uma característica da imensa maioria das exposições é sua organização num espa-

ço protegido, devidamente delimitado, separado do espaço externo4. Uma das primeiras

manifestações da arquitetura expositiva enquanto ato civilizatório, que marca o alvorecer da arte, são as pinturas rupestres, que transformam uma gruta em local de culto. Essas

pinturas contam uma história, representando o universo cultural de seus autores. Pode-

mos assimilar essa ressignificação à construção de uma narrativa no espaço, que registra uma memória a ser acumulada, não pela linguagem oral ou pela futura linguagem escrita, mas pela sucessão de imagens organizadas de maneira intencional, uma lingua-

gem visual. Nessa ação estão presentes os quatro elementos básicos da linguagem de arquitetura expositiva: o espaço, os objetos nele inseridos que o ressignificam, a intenção da intervenção e a construção de uma narrativa.

No decorrer da história, as narrativas visuais no espaço terão diversas formas de ma-

nifestação, a começar pela arte mural sobre as superfícies que delimitam os espaços construídos do poder temporal (palácios, espaços institucionais de governo) ou religioso

(templos, tumbas e locais sagrados). Essas narrativas nos permitem saber mais sobre civi-

lizações como a creto-micênica, a maia, a da ilha de Páscoa e outras, de que encontramos

apenas registro imagético. Nas civilizações que fizeram uso da escrita como a conhecemos hoje – civilização mesopotâmica, grega, romana, chinesa, védica –, as narrativas visuais

permaneceram em afrescos, baixos-relevos e estátuas, integradas às casas dos membros das elites, registrando os modos de vida de seus habitantes, os hábitos, a mitologia.

A inserção da narrativa visual no espaço conhece uma transformação com o advento

da pintura em cavalete, a partir do Renascimento europeu. Ao desprender-se das paredes e ganhar moldura, a pintura torna-se um objeto independente. O espaço interior da

moldura é separado do espaço exterior, como se fossem universos distintos. Isso não

vai extinguir a pintura mural, mas proporcionará uma portabilidade que permitirá novos arranjos narrativos. A autonomia da pintura permitirá a existência de galerias, salões de arte e futuramente museus, espaços onde se difunde e valoriza a narrativa visual.

Na época do Iluminismo surge o gabinete de curiosidades, onde se misturam as pin-

turas com objetos variados: bichos empalhados, pedras, conchas, falsas sereias etc. Os proprietários levavam os visitantes aos gabinetes para mostrar a riqueza e os conheci-

mentos que haviam acumulado, num espaço que construía uma narrativa visual. A acu-

mulação desses objetos, um ao lado do outro, numa espécie de horror ao vazio, sem delimitação precisa por assunto ou tema, apresentava uma correspondência espacial com a maneira como esses conhecimentos eram assimilados pelos indivíduos.

4. As exposições em espaços abertos, fenômeno mais recente, não deixam de ser uma ressignificação desses espaços, que, embora não estejam protegidos, estão delimitados.

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O gabinete de curiosidades, com o desenvolvimento do pensamento científico, será

sucedido pelos museus de história natural, que estarão preocupados em coletar, organizar e catalogar objetos de várias culturas e países que compõem seu acervo. Eles criaram narrativas supostamente universais, mas que de modo geral sobrepõem uma

visão de mundo racionalista europeia. Esses serão os grandes museus dos séculos XVIII, XIX e início do XX.

O passo seguinte na historiografia da atividade de expor representa um marco: o

surgimento do museu moderno. Ele organiza-se segundo uma museografia, ou seja, um

conjunto de formas e técnicas de exposição associadas a concepções de museu e de ar-

quitetura que se relacionam com a tradição moderna. Esta propunha uma “arte total” que relacionasse a arquitetura do prédio, o programa da exposição e a narrativa construída espacialmente. Essa narrativa receberá influências, num primeiro momento, tanto da ar-

quitetura moderna quanto das vanguardas da arte do final do século xix e início do xx, e posteriormente das mudanças trazidas pela arte contemporânea e pelas novas formas de concepção dos espaços, museais ou não.

A história dos museus não é independente de outras atividades que constroem narrati-

vas em espaços protegidos, desde a arte contemporânea e suas exigências espaciais, nas

galerias de arte, até as feiras universais e a arquitetura de vitrines e espaços comerciais de exibição de objetos. Tais narrativas trocam referências e procedimentos, porque os novos meios de produção de imagens – a fotografia, depois o cinema e o vídeo, por fim as pla-

taformas digitais – acabam incorporados como formas de produção artística para refletir sobre o mundo, como recursos comerciais para produzir e vender imaginários, e por fim como novas formas de expor conceitos e conteúdos para criar narrativas expositivas.

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entre 1972 e 2003, 35 delas como curadora e arquiteta. interior e no litoral do Brasil, sendo responsável por levar carrancas de São Francisco ao Masp.

Mas Gisela ainda se dedicou a outra temática, a de

apresentar escritores ao grande público dos centros

culturais, transformando textos e histórias em ambientes imersivos. Ela começou com Clarice Lispector, em 1992, e seguiu com Mario Quintana, Mário de Andrade e Hilda Hilst, entre outros.

Muito se deve no Brasil aos experimentos que Lina

Bo Bardi e Gisela Magalhães realizaram no campo da

arquitetura expositiva, uma área de estudos crescente nas histórias das exposições. E este é um ótimo livro para quem quer conhecer melhor os processos de

criação de mostras e, provavelmente, as duas figuras que desenvolveram essa linguagem de forma mais radical no Brasil.

Fabio Cypriano

Doutor em comunicação e semiótica pela PUC-SP, é coordenador do curso de graduação Arte: História, Crítica e Curadoria, da PUC-SP, onde ministra aulas na graduação e no mestrado lato sensu. É ainda crítico de arte da Folha de S.Paulo e colaborador das revistas Frieze (Inglaterra), Flash Art (Itália), Atlántica (Espanha) e ARTE!Brasileiros (Brasil). É autor de Pina Bausch (Cosac Naify, 2005), entre outros.

Pesquisadores, arquitetos, artistas, curadores, produtores culturais e designers, olhem para este livro com atenção. O que se tem em mãos é uma obra de referência para o estudo e a prática da arquitetura de exposições. De forma clara e acessível, César Sartorelli apresenta essa peculiar linguagem arquitetônica, analisando a trajetória de duas de suas maiores representantes no Brasil: Lina Bo Bardi e Gisela Magalhães.

Uma em São Paulo, outra no Rio de Janeiro, elas foram

responsáveis por exposições icônicas da cultura nacional. Lina

apresentando universos particulares no espaço do Sesc Pompeia: os brinquedos, o design, o caipira, a criança; Gisela com seu subjetivo mundo alegórico ao falar de cultura popular, política nacional e grandes escritores.

Arquitetura de exposições brinda o leitor com reproduções de

croquis, plantas e desenhos, acompanhadas de fotos dos ambientes que resultaram desses originais. Pode-se comparar projeto e

execução, plano e espaço. Pode-se observar cada textura, cada curva e cada cor. Pode-se, enfim, contemplar o gênio das duas

grandes artistas, neste exercício de ressignificação do espaço que é a arquitetura expositiva. ISBN 978-85-9493-086-6

LINA BO BARDI E GISELA MAGALHÃES CÉSAR AUGUSTO SARTORELLI

Assim como Lina, Gisela fez uma vasta pesquisa no

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ARQUITETURA DE EXPOSIÇÕES

O mesmo ocorre com Gisela, também ela atenta à

cultura popular, responsável por organizar 48 mostras

“Eu tenho que ser legível quase no escuro”, escreveu Clarice Lispector. A frase foi uma inspiração efetiva para a arquiteta Gisela Magalhães (1930-2003) criar a cenografia da mostra A paixão segundo Clarice

Lispector, no Centro Cultural Banco do Brasil, em 1992.

Poucos conhecem a extensa carreira na área expositiva de Gisela, que iniciou sua vida profissional trabalhando com Oscar Niemeyer e Lucio Costa, na construção de Brasília, e enveredou por um caminho inovador.

Junto com Lina Bo Bardi (1914-92), Gisela criou uma

sólida reflexão e extensa prática na realização de mostras, sem se limitar aos parâmetros convencionais do mundo

dos museus e galerias, tanto na forma como no conteúdo. É isso que explora Arquitetura de exposições: Lina Bo

Bardi e Gisela Magalhães, de César Augusto Sartorelli.

Lina tem reconhecimento internacional, tanto por suas

construções icônicas, como o Masp e o Sesc Pompeia,

LINA BO BARDI E GISELA MAGALHÃES CÉSAR AUGUSTO SARTORELLI

quanto por criar novos dispositivos de exposição, caso

de seus famosos cavaletes de vidro. O que este livro traz de novo é uma minuciosa pesquisa em torno da criação

das mostras, a partir de entrevistas com muitos de seus

colaboradores, que testemunham a paixão por transformar a exposição numa experiência efetiva.

Um ótimo exemplo apresentado aqui é a mostra

O belo e o direito ao feio, organizada no Sesc

Pompeia, em 1982, em que Lina foi a responsável pela

programação por três anos. “Não me interessa a beleza, mas a poesia”, dizia a arquiteta a seus assistentes,

apontando como certas categorias são circunstanciais e mutáveis, entre elas o belo e o feio, e outras são

perenes. Nessa toada, sua visão militante em defesa da

cultura popular brasileira contaminou suas mostras com

dispositivos semelhantes aos existentes em feiras de rua ou festas religiosas.

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