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SERVIÇO SOCIAL DO COMÉRCIO Administração Regional no Estado de São Paulo
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Reitor Vahan Agopyan
Presidente do Conselho Regional Abram Szajman Diretor Regional Danilo Santos de Miranda Conselho Editorial Ivan Giannini Joel Naimayer Padula Luiz Deoclécio Massaro Galina Sérgio José Battistelli Edições Sesc São Paulo Gerente Iã Paulo Ribeiro Gerente adjunta Isabel M. M. Alexandre Coordenação editorial Cristianne Lameirinha, Clívia Ramiro, Francis Manzoni, Jefferson Alves de Lima Produção editorial Maria Elaine Andreoti Coordenação gráfica Katia Verissimo Produção gráfica Fabio Pinotti Coordenação de comunicação Bruna Zarnoviec Daniel
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Vice-reitor Antonio Carlos Hernandes Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária Pró-reitor Maria Aparecida de Andrade Moreira Machado Pró-reitora adjunta Margarida Maria Krohling Kunsch Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin Diretor Carlos Alberto de Moura Ribeiro Zeron Vice-diretor Alexandre Moreli Publicações BBM Editor Plinio Martins Filho Editora assistente Millena Santana
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organização
Alexandre Macchione Saes Alexandre de Freitas Barbosa
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© Alexandre Macchione Saes, 2021 © Alexandre de Freitas Barbosa, 2021 © Edições Sesc São Paulo, 2021 Todos os direitos reservados Edição Preparação Composição Capa Revisão
Plinio Martins Filho Claudia Alejandra Sarmiento Moreno, Isabella Silva Teixeira, Millena Santana Millena Santana Machado Dalton Bertini Ruas Plinio Martins Filho
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Ficha catalográfica elaborada pelo Serviço de Biblioteca e Documentação da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBMUSP) B238c Celso Furtado e os 60 anos de Formação Econômica do Brasil / organizadores: Alexandre de Freitas Barbosa; Alexandre Macchione Saes. – São Paulo: Edições Sesc, 2021. 468 p.; 16 x 23 cm. ISBN Edições Sesc: 978-65-86111-26-2 1. Celso Furtado. 2. História econômica. 3. Brasil. I. Organizadores. II. Título. CDD: 330.0981 Bibliotecário Repr. Téc.: Rodrigo M. Garcia, CRB8ª: SP-007584/O
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Sumário
Faróis na Escuridão – Danilo Santos de Miranda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 Prefácio – Rosa Freire d’Aguiar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9 Apresentação – Alexandre Macchione Saes & Alexandre de Freitas Barbosa . . . . . . . . . . 17
i. Formação Econômica do Brasil e o Gênero de “Formação” 1. Um Certo “Ar de Família”: Formação, Inserção, Linhagens, Sequências – André Botelho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25 2. História, Economia e Projeto Político em Formação Econômica do Brasil – Vera Alves Cepêda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51 3. Os 60 Anos de Formação Econômica do Brasil: Pensamento, História e Historiografia – Alexandre Macchione Saes & Rômulo Manzatto . . . . . . . . . . . . . . . 83
ii. Da Economia Brasileira para a História Econômica: Os Debates Historiográficos Herdados de Formação Econômica do Brasil 4. Formação Econômica do Brasil: Celso Furtado como Historiador Econômico – Flávio Rabelo Versiani . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 121 5. Formação Econômica do Brasil e a Nova Historiografia Econômica Brasileira – Flávio Saes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 163 6. Celso Furtado, Douglass North e a Nova História Econômica – Mauro Boianovsky . . . 197
iii. Teoria e Método em Formação Econômica do Brasil 7. Celso Furtado e o Estruturalismo como Método – Pedro Cezar Dutra Fonseca . . . . . . 225
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8. Formação Econômica do Brasil: Economia e História – Mauricio C. Coutinho. . . . . 237 9. Os Usos da História em Formação Econômica do Brasil – Roberto Pereira Silva . . . . 253
iv. Da História Econômica para a Economia Brasileira: o Projeto Político de Formação Econômica do Brasil 10. Modelo Analítico e Projeto Político de Formação Econômica do Brasil – Pedro Paulo Zahluth Bastos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 281 11. Luta de Classes Inibida? Furtado e a Especificidade da Estrutura Social Brasileira – Fernando Rugitsky. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 327 12. Sessenta Anos de Formação Econômica do Brasil: da Pré-Revolução Brasileira à Construção Interrompida – Carlos Alberto Cordovano Vieira. . . . . . . . . . . . . . . . . 357
v. A Atualidade de Formação Econômica do Brasil 13. O Bonde Perdido do Desenvolvimento: Complexidade Econômica e a Atualidade de Formação Econômica do Brasil – Fernanda Graziella Cardoso. . . . . . 371 14. A Dimensão de Futuro em Formação Econômica do Brasil – Gilberto Bercovici. . . . . 395 15. Formação Econômica do Brasil, 60 Anos Depois – Alexandre de Freitas Barbosa. . . . . . . 405
vi. O Arquivo de Celso Furtado no Instituto de Estudos Brasileiros 16. O Arquivo Pessoal de Celso Furtado: Relações e Relacionamentos para Além dos Bastidores da História Econômica – Elisabete Marin Ribas. . . . . . . . . . . . . . . 437 Sobre os Autores. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 461
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Faróis na Escuridão ◆
Danilo Santos de Miranda Diretor do Sesc São Paulo
A presença de um farol nas proximidades de uma praia, montanha, ou mesmo aeroporto, possibilita achegar-se com segurança e tranquilidade. Ao longo da história, tal dispositivo foi sendo aperfeiçoado para orientar os viajantes por terras, mares e ares desconhecidos. Dispor de um facho de luz em meio à escuridão contribuiu para que muitos acidentes fossem evitados. Nesse sentido, uma das funções dos faróis é servir de referência e, naturalmente, apontar caminhos e possibilidades de percurso até um destino determinado. No campo das ideias e das ciências humanas, esse papel é desempenhado pelos clássicos, isto é, obras e estudos que atravessaram gerações estimulando novos trabalhos e pesquisas na tentativa de refutar, superar ou continuar suas teses. Clássicos, portanto, são saberes e conhecimentos legados por nossos antepassados. Memórias de valor incalculável que merecem ser visitadas, discutidas, analisadas e permanentemente disponibilizadas. No Brasil, os intelectuais e pensadores considerados clássicos, por suas interpretações e explicações dos processos históricos, socioeconômicos, políticos e culturais, formam um clube especial. Dentre estes, podemos citar Sérgio Buarque de Holanda, Gilberto Freyre, Caio Prado Jr., Roberto Simonsen, Antonio Candido, Paulo Freire; e, ao lado destes, Celso Furtado, cuja biografia, produção intelectual, atuação na cepal – Comissão Econômica para a América Latina – e, posteriormente, suas inúmeras participações na administração pública em diferentes governos, o tornaram figura de proa do pensamento contemporâneo brasileiro. É nessa perspectiva de aprofundamento dos conhecimentos e do debate público que o Centro de Pesquisa e Formação do Sesc, em parceria com centros de 7
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estudos e pesquisadores de várias instituições, vem promovendo ciclos e jornadas sobre diversos autores e obras seminais, apresentando panoramas ampliados por meio de abordagens multidisciplinares. Foi este o caso de Celso Furtado e uma de suas obras mais influentes: Formação Econômica do Brasil. O evento “Celso Furtado e os 60 anos de Formação Econômica do Brasil ”, organizado junto à Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin e ao Instituto de Estudos Brasileiros – ieb, ambos da usp, contou com a participação de 22 estudiosos discorrendo sobre a vida e a obra de Celso Furtado, incluindo seus arquivos pessoais e sua biblioteca. Grande parte das contribuições apresentadas naquela oportunidade ganham, agora, permanência e acessibilidade com a presente edição, publicada com o apoio cultural da bbm. Nesses tempos de leituras apressadas e superficiais, trata-se de uma oportunidade de mergulhar no universo das ideias e dos projetos para a nação com base em um aprofundado programa de estudos, análises críticas, preservação e difusão de saberes. Ao mesmo tempo, investir em educação e cultura aproxima os cidadãos de uma participação ativa nas soluções de problemas atuais e futuros. Pois tem sido nessa seara que o Sesc tem atuado desde 1946, buscando fortalecer os valores democráticos em nossa sociedade.
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Prefácio ◆
Rosa Freire d’Aguiar
Em janeiro de 1959 chegava às livrarias a primeira edição de Formação Econômica do Brasil, de Celso Furtado. O volume tinha capa dura azul-marinho e sobrecapa vermelha com letras amarelas. O autor era um economista mais conhecido em outros plagas da América Latina do que no Brasil. Vinha de longa permanência em Santiago do Chile, onde por quase dez anos chefiara a Divisão de Desenvolvimento da Cepal. O editor apostou alto no novo livro do economista. A primeira edição foi de cinco mil exemplares – uma grande tiragem, à época, para um livro de não ficção –, esgotados em quatro meses, com o livro ocupando o terceiro lugar na lista dos mais vendidos; a segunda, de outros cinco mil; a terceira, no ano seguinte, de dez mil. Passado mais de meio século, Formação teve trinta e tantas edições e reimpressões, foi traduzido em nove línguas – espanhol, inglês, polonês, italiano, japonês, francês, alemão, romeno e chinês –, mereceu uma edição de luxo em seu cinquentenário1. Chega aos sessenta anos com o vigor das obras que integram a seleta de títulos seminais e fundadores do pensamento brasileiro. Nesse percurso, Formação inspirou dezenas de teses, trabalhos, controvérsias, críticas elogiosas e reticentes. Sua permanência se deve, sem dúvida, ao pioneirismo do enfoque adotado pelo autor, bem como às intuições e pistas que abriu. É o que se percebe com clareza ao final da leitura deste volume. Seus organizadores, os jovens e competentes professores Alexandre de Freitas Barbosa e Alexandre 1. Formação Econômica do Brasil, Edição Comemorativa dos 50 Anos, Organização e Apresentação de Rosa Freire d’Aguiar, Introdução Luiz Felipe de Alencastro, São Paulo, Companhia das Letras, 2009.
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Macchione Saes, reuniram aqui os papers do seminário “Celso Furtado e os 60 anos de Formação Econômica do Brasil”, iniciativa conjunta da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin e do Instituto de Estudos Brasileiros da usp, realizado em novembro de 2019 no Centro de Pesquisa e Formação do Sesc. Assisti a algumas das nove mesas do encontro, participei de uma. Em todas surpreendeu-me o alto nível das releituras críticas feitas por cientistas sociais que, aqui e ali, me lembravam entomologistas de olhos apurados tentando desvendar a estrutura, as nervuras, os interstícios do objeto de estudo. Atrevo-me a dizer que todos captaram esse “modo amplo de ser e de ver” que um dia o historiador Francisco Iglesias atribuiu à obra de Celso Furtado, e muito em especial a Formação Econômica do Brasil. “Formação”, justamente: a palavra por pouco inexistente. Explico-me: Formação foi escrito à mão no ano sabático em que Celso passou em Cambridge. No manuscrito que guardo em casa lê-se o título Introdução à Economia Brasileira. Como ele mesmo contou2, quando levava o manuscrito ao correio um colega – cujo nome infelizmente ele esqueceu – lhe sugeriu tentar reproduzi-lo na universidade. Foi feito um microfilme. Semanas depois, sem notícias do pai – o primeiro leitor de seus originais – nem do editor, Celso constatou que o gordo envelope enviado ao Rio de Janeiro extraviara-se. Pôs-se então a projetar o microfilme na parede de uma sala da biblioteca e a datilografar cada imagem em negativo, página por página, na Olivetti que então comprara na Itália. No momento de enviar a nova versão, soube por um amigo que pouco antes saíra o livro do economista Ignacio Rangel, Introdução ao Desenvolvimento Econômico Brasileiro3. Não hesitou: pediu que o irmão Jorge Furtado comunicasse ao pai a mudança do título. O livro se chamaria Formação Econômica do Brasil 4. Se a mudança visava evitar alguma confusão com o título escolhido por seu colega economista, é verdade que Celso já tinha em mira a definitiva palavra “formação”, que logo passou a empregar para anunciar o novo livro. Foi o que verifiquei ao iniciar, em 2018, o projeto de publicação de seus diários e li seus quase cinquenta cadernos de anotações. Num deles, em 18 de julho de 1958, escreve Celso: 2. Obra Autobiográfica de Celso Furtado, São Paulo, Companhia das Letras, 2014. 3. Ignacio Rangel, Introdução ao Desenvolvimento Econômico Brasileiro, Salvador, ufba, 1957. 4. “Vejo que o título que eu havia combinado com o português [o editor Mario de Moura] já foi tomado pelo Rangel (Introdução ao Estudo etc.). Resolvi mudar de título: Formação Econômica do Brasil. Por favor não o espalhe de imediato, para que não tenha a sorte do primeiro” (Carta de Celso Furtado a Jorge Furtado, Cambridge, 23 de junho de 1958).
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Acabo de escrever um livro praticamente novo sobre o desenvolvimento econômico do Brasil. Aproveitei só uns 15% do texto do livro anterior, e desenvolvi substancialmente a análise do século xix e do período colonial. Usei bastante material de história econômica comparativa e me esforcei para dar uma ideia do processo geral de formação econômica do país5.
Dias antes, em carta ao economista Roberto Campos, comenta quase o mesmo: Acabo de escrever um livro sobre o desenvolvimento da economia brasileira; do anterior aproveitei uns quinze por cento. Desta vez esforcei-me para apresentar uma visão de conjunto de todo o processo de formação econômica do país6.
A “formação” de Formação não estava sozinha. O historiador Luiz Felipe de Alencastro lembrou que, não por acaso, “datam do governo Kubitschek os três livros mais importantes do pós-guerra”: Formação da Literatura Brasileira, de Antonio Candido, Os Donos do Poder: Formação do Patronato Político Brasileiro, de Raymundo Faoro, e Formação Econômica do Brasil, de Celso Furtado”7. Eram tempos em que o otimismo embalava o país e seus intelectuais destrinchavam nossa identidade – na esteira de outras “formações” como a Formação do Brasil Contemporâneo, publicada anos antes por Caio Prado Jr. “Caio Prado Jr.”, justamente: a referência inexistente. Explico-me (uma segunda vez) recorrendo às palavras de Celso, que são conhecidas de seus exegetas mas que não custa trazer para este livro comemorativo, à guisa de lembrete. Disse ele em diversas ocasiões que, quando redigiu Formação, longe do país, sua ideia era “escrever um livro que explicasse o Brasil aos não brasileiros”, pois, trabalhando nas Nações Unidas sobre outros países, “surpreendia-me a inexistência de livros que me ajudassem a entendê-los”8. Complementando esse pensamento, encontro em seus Diários: 5. Diários Intermitentes de Celso Furtado. 1937-2002, Organização, Apresentação e Notas de Rosa Freire d’Aguiar, Prefácio de João Antonio de Paula, São Paulo, Companhia das Letras, 2019 (grifo meu). 6. Carta de Celso Furtado a Roberto Campos, Cambridge, 14.7.58. Arquivo pessoal. O livro anterior é A Economia Brasileira, Rio de Janeiro, Valverde, 1954. 7. Cf. Luiz Felipe de Alencastro, “Introdução”, Formação Econômica do Brasil, Edição Comemorativa dos 50 Anos. 8. “Há Trinta Anos, um Livro para Explicar o Brasil”, entrevista a Jefferson Barros, O Estado de S. Paulo, 18.2.1989.
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Sempre que na Cepal eu começava a estudar a economia de um país, procurava um livro que me desse uma ideia de conjunto do processo histórico que havia levado à situação atual. Quase nunca encontrei esse tipo de livro. Pois minha ideia foi escrevê-lo com respeito ao Brasil9.
Nas primeiras linhas da Introdução à obra Celso esclareceu que ela pretendia ser “somente um esboço do processo histórico de formação da economia brasileira”10. É indiscutível que Formação é muito mais que um “esboço”. Ele também advertiu que, por tratar-se de análise de processos econômicos e não de reconstituição de fatos históricos, omitia “quase totalmente a bibliografia histórica brasileira”11. Certos comentaristas, contudo, parecem ter omitido a advertência do autor, o que explicaria as críticas que dele cobraram uma bibliografia mais extensa que escapa ao gênero ensaístico. Quando propus à Companhia das Letras a edição comemorativa dos cinquenta anos do livro, li toda a fortuna crítica que Celso guardara em seus arquivos. Dos quase cinquenta artigos que tínhamos em duas pastas, selecionei 21, que dividi em quatro blocos: contemporâneos à publicação das primeiras edições; prefácios das edições estrangeiras; artigos divulgados no exterior à medida que surgiram as traduções; resenhas atuais. Na leitura dos que escolhi como dos que deixei de lado, perpassava a questão bibliográfica. Uns a reprovavam por não ser suficientemente extensa. Tamás Szmrecsányi, por exemplo, apontou uma “base bibliográfica muito precária”, embora supondo trabalhos que “quase certamente” Celso conhecia, ou que “muito provavelmente” levou em conta ao escrever o livro12. Outros, ao contrário, minimizavam a questão. Houve quem criticasse a bibliografia por não citar nennum brasileiro. E quem o fizesse por citar abundantemente os estrangeiros13. Vale referir a contagem feita por Francisco Iglesias, cujo escore indicou que Formação cita 46 estrangeiros e 5 brasi9. Diários Intermitentes de Celso Furtado. 1937-2002. 10. Celso Furtado, Formação Econômica do Brasil, Rio de Janeiro, Editora Fundo de Cultura, jan 1959. 11. Idem. 12. Cf. “Sobre a Formação de Formação Econômica do Brasil”, Estudos Avançados, vol. 13, n. 37, 1999. Reproduzido na edição comemorativa dos cinquenta anos, op. cit. 13. Cf. minha Apresentação e a Fortuna Crítica de Formação Econômica do Brasil, Edição Comemorativa dos 50 Anos, op. cit.
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leiros: Roberto Simonsen, João Ribeiro, Visconde de Mauá, Alice Canabrava e o próprio Celso14. Entre as ausências notadas (e notáveis), foi destacada a de Caio Prado Jr. A “referência inexistente” a que me referi acima constituiu, assim, um mistério sobremodo estudado por Szmrecsányi. O rigoroso pesquisador que ele era esquadrinhou um dos pontos de partida de Formação, a saber, a tese de doutoramento de Celso defendida na Universidade de Paris, em 1948: L’Économie Coloniale au Brésil aux 16è et 17è siècles. Lá encontrou as referências a Caio Prado Jr., justamente as faltantes em Formação15. Também Francisco de Oliveira observou que Caio Prado Jr. estava presente na tese mas ausente no “esboço”16. Como, aliás, Capistrano de Abreu, Nelson Werneck Sodré, Henri Pirenne e Jaime Cortesão, entre outros. Quem melhor entendeu a noção de “esboço” foi, a meu ver – e também aos olhos de Celso, conforme comentou tantas vezes em conversas –, Francisco Iglesias. A esse historiador tão primoroso quanto arguto me remeto, e homenageio, por ter sido o primeiro com acuidade bastante para descortinar que […] a falta de referências bibliográficas que comprovassem esse conhecimento [do processo histórico brasileiro] só engana o leitor ligeiro. Se elas são omitidas, é que não foi propósito do autor a reconstituiçao sistemática; faz-se apenas o levantamento do que é indispensável para compreensão do processos econômico17.
Muitos anos depois, na virada do século, Tamás Szmrecsányi esteve em nossa casa no Rio. Foi uma conversa afável, num final de manhã. Ele queria falar da publicação da tese de doutoramento de Celso. Já em 2000 lhe escrevera comunicando que dela detinha uma cópia, em francês. Celso possuía outra, encaminhada alguns anos antes por Maria Eugenia Guimarães, então doutoranda de Francisco de Oliveira. Mas não pensara em publicá-la em português. Szmrecsányi, disse que 14. Francisco Iglesias, “Prefácio”, Formação Econômica do Brasil, Brasília, Editora unb, 1963, coleção Biblioteca Básica Brasileira. 15. “Sobre a Formação de Formação Econômica do Brasil”. 16. “Formação Econômica do Brasil: Gênese, Importância e Influência Teóricas”, de Francisco de Oliveira, em Introdução ao Brasil – Um Banquete no Trópico, org. Lourenço Dantas Mota, São Paulo, Senac, 1999. 17. Francisco Iglesias, “Prefácio”, Formação Econômica do Brasil.
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se dispunha a traduzi-la. Também propunha que a tese fosse editada pela Associação Brasileira de Pesquisadores em História Econômica, que ele então presidia. Semanas depois, a resposta de Celso: Recebi a sua carta de 17 de julho acompanhada do texto da tradução para o português do primeiro capítulo de minha tese. O problema que se colocará diz respeito aos textos que foram por mim traduzidos para o francês de originais em língua portuguesa. Trata-se de citações de autores brasileiros e portugueses. [...] Desde já estou disposto a doar os meus direitos autorais da primeira edição para a abphe18.
No ano seguinte, 2001, encontramos em seus arquivos o original da tese, manuscrita com uma caneta Pelikan de tinta verde e arquivada num fichário preto. O orientador da tese, professor Maurice Byé, compreendia perfeitamente português desde que morara no Brasil, e assim Celso pôde redigi-la em sua língua, para fazê-la traduzir só no momento da defesa. Meio século depois, encontrado o original em português, já não fazia sentido retraduzir o exemplar em francês. Semanas mais tarde, estávamos diante da tela do computador, Celso a ler a tese e eu a digitá-la. Completamos certas referências bibliográficas, em especial com indicação de ano e local das publicações. Ademais, traduzi num Anexo o conjunto de citações em outros idiomas presentes no texto e nas notas de rodapé, publicando-o no final do volume19. A certa altura da conversa, Szmrecsányi comentou a polêmica em torno da bibliografia, a seu ver algo sucinta, de Formação. Celso não se esquivou e repetiu o que dissera em outras ocasiões: sua ideia fora ensaiar algumas hipóteses e interpretações, aproximando episódios e tempos distintos de nossa formação; seu objetivo fora fazer um livro de síntese; sua conclusão fora de que não cabia dar crédito a todos os que haviam contribuído para os estudos da história do país. O pesquisador pareceu convencer-se. É de supor que o mal-entendido tenha se esclarecido. No último parágrafo de Formação, Celso arriscou-se a olhar para o horizonte do final do século xx e descortinou um Brasil que “ainda figurará como uma das 18. Carta de Celso Furtado a Tamás Szmrecsányi, Rio de Janeiro, 6.8.2000. 19. Celso Furtado, Economia Colonial no Brasil nos Séculos xvi e xvii, Hucitec/abphe, São Paulo, 2001.
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grandes áreas da Terra em que maior é a disparidade entre o grau de desenvolvimento e a constelação de recursos potenciais”. Em 1998, quando prefaciou a nova edição em francês de seu livro, concluiu prevendo que “hoje, no limiar de um novo século, não posso senão constatar que essa hipótese se mostra confirmada”20. O olhar, agora, parecia eivado de pessimismo – ou de realismo –, mas a rebatê-lo está a insistência com que Celso Furtado, até o fim da vida, afirmou que as deformações do subdesenvolvimento, tão estudadas em Formação Econômica do Brasil, não são uma fatalidade a que um país esteja condenado.
20. Celso Furtado, Formation Économique du Brésil, Paris, Publisud, 1998.
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Sobre os Autores ◆
Alexandre de Freitas Barbosa. Professor Livre-Docente de História Econômica e Economia Brasileira/Internacional do Instituto de Estudos Brasileiros (ieb) da Universidade de São Paulo (usp) e participa do Núcleo de Apoio à Pesquisa Brasil-África da usp. Tem se dedicado a pesquisas sobre o mercado de trabalho e desigualdade no Brasil; o pensamento e a prática do desenvolvimento na história brasileira, especialmente a partir da contribuição do economista Rômulo Almeida; e a inserção externa da economia brasileira, com foco nos impactos trazidos pela China e no potencial das relações Sul-Sul. Desde 2016, possui bolsa produtividade do cnpq, nível 2. Alexandre Macchione Saes. Professor de História Econômica do Departamento de Economia da fea/usp e do Programa de Pós-Graduação em História Econômica da fflch/ usp. Possui graduação em Ciências Sociais pela Unesp/Fclar (2003) e Doutorado em História Econômica pelo Instituto de Economia da Unicamp (2008). Foi presidente da Associação Brasileira de Pesquisadores em História Econômica (2015-2017) e Vice-Diretor da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin – bbm/usp (2017-2020). É pesquisador do cnpq desde 2013. André Botelho. Professor Associado da Universidade Federal do Rio de Janeiro – ufrj. Doutor em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas – Unicamp. Tem experiência na área de Sociologia, com ênfase em Pensamento Social Brasileiro e Teoria Sociológica. Pesquisador do cnpq (pq), é ainda membro da coordenação da Biblioteca Virtual do Pensamento Social (bvps) e editor responsável de Sociologia & Antropologia (ppgsa/ufrj).
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Carlos Alberto Cordovano Vieira. Professor e pesquisador do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (ie-Unicamp). Possui graduação em Economia pela Universidade de São Paulo (fea-usp); mestrado e doutorado em Desenvolvimento Econômico e História Econômica pelo Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (ie-Unicamp). Temas de estudo: transição do feudalismo ao capitalismo; estado absolutista, capital mercantil e sistema colonial; economia colonial e formação econômica do Brasil; imperialismo e pensamento brasileiro. Elisabete Marin Ribas. Possui graduação em Letras e mestrado em Teoria Literária e Literatura Comparada, ambos pela fflch-usp. Tem Especialização em Organização de Arquivos pelo Instituto de Estudos Brasileiros-usp, instituição em que atualmente trabalha, compondo a equipe técnica do Serviço de Arquivo. Na área de organização de acervos, atua com documentação permanente e acervos pessoais. Fernanda Graziella Cardoso. Professora adjunta da ufabc, é doutora em Economia do Desenvolvimento pelo ipe-fea-usp (2012), mestre em Economia da Indústria e da Tecnologia pelo ie-ufrj (2008) e graduada em Economia pela Universidade de São Paulo (2005). Atua principalmente nos seguintes temas: Desenvolvimento Econômico, História Econômica Brasileira e História do Pensamento Econômico. Fernando Rugitsky. Professor do Departamento de Economia da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (fea-usp) e pesquisador associado do Núcleo Direito e Democracia do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap). É doutor (phd) em Economia pela The New School for Social Research (eua), mestre em Direito Econômico pela usp e bacharel em Economia e em Direito pela mesma instituição. Dedica-se, principalmente, ao estudo de Macroeconomia, Economia Política e Economia do Desenvolvimento. Flávio Rabelo Versiani. Professor Titular do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (1993) e Professor Emérito da Universidade de Brasília (2012). Graduado em Ciências Econômicas pela Universidade Federal de Minas Gerais (1963), Master of Arts in Economics – Vanderbilt University, eua (1968) e phd in Economics – Vanderbilt University, eua (1971). Estágios pós-doutorais na Yale University, eua e University of London, Inglaterra. Área principal de pesquisa: História Econômica, atuando principalmente nos seguintes temas: processo de industrialização e economia escravista.
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Flávio Saes. Professor titular da Universidade de São Paulo. Possui graduação em Economia pela Universidade de São Paulo (1971), mestrado em Economia pela Universidade de São Paulo (1973) e doutorado em Sociologia pela Universidade de São Paulo (1977). Tem experiência na área de Economia, com ênfase em História do Pensamento Econômico. Gilberto Bercovici. Professor Titular de Direito Econômico e Economia Política da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (Departamento de Direito Econômico, Financeiro e Tributário). Graduado em Direito pela Universidade de São Paulo (1996), é Doutor em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo (2001) e Livre-Docente em Direito Econômico pela Universidade de São Paulo (2003). A ênfase da sua produção está voltada para as áreas de Direito Econômico, Economia Política, Teoria do Estado, História do Direito Público e Teoria da Constituição, desenvolvendo pesquisas em torno dos temas de Estado e Subdesenvolvimento, Desenvolvimento Econômico, Papel do Estado na Economia, Política Econômica e Soberania. Maurício C. Coutinho. Professor titular da Universidade Estadual de Campinas. Doutor em Ciência Econômica pela Universidade Estadual de Campinas (1984). Tem experiência na área de Economia do Setor Público, com ênfase em Finanças Públicas Brasileiras, inclusive Previdência Social. Pesquisas e publica na área de História do Pensamento Econômico. Mauro Boianovsky. Professor titular da Universidade de Brasília. Possui graduação em Economia pela Universidade de Brasília (1979), mestrado em Economia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (1989) e doutorado em Economia – Cambridge University (1996). Tem experiência na área de Economia, com ênfase em História do Pensamento Econômico e foco em macroeconomia, teoria monetária, crescimento e desenvolvimento econômico e desemprego. Pedro Cezar Dutra Fonseca. Professor Titular do Departamento de Ciências Econômicas e Relações Internacionais da ufrgs, onde foi Coordenador do Pós-Graduação em Economia, Chefe do Departamento, Diretor da Faculdade de Ciências Econômicas, Presidente da Câmara de Pesquisa, Pró-Reitor de Pesquisa e Vice-Reitor. Doutor em Economia pela Universidade de São Paulo – usp. Pesquisador do cnpq desde 1987. Foi Coordenador da Área de Economia da CapesS, Diretor-Presidente da Fundação
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de Amparo à Pesquisa do Rio Grande do Sul (1997-2000) e Presidente da Sociedade Brasileira de Economia Política (2002-2004). Atua como profissional e pesquisador na área de Economia, com ênfase em Economia Brasileira, atuando principalmente nos seguintes temas: Desenvolvimento Econômico, Formação Econômica do Brasil no século xx e História do Pensamento Econômico. Pedro Paulo Zahluth Bastos. Professor do Instituto de Economia da Unicamp. Possui Doutorado em Ciências Econômicas pela Universidade Estadual de Campinas (2001). Foi presidente da Associação Brasileira de Pesquisadores em História Econômica (abphe), entre 2009 e 2011, e chefe do Departamento de Política e História Econômica do Instituto de Economia, da Universidade Estadual de Campinas, entre 2008 e 2012. Tem experiência na área de Economia e Economia Política, com ênfase em Crescimento e Desenvolvimento Econômico, Economia Política da Política Econômica, Economia Brasileira Contemporânea e Formação Econômica do Brasil. Roberto Pereira Silva. Professor Adjunto no Instituto de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Federal de Alfenas. Possui graduação em História na usp (2006). Mestre em História Econômica pelo Programa de Pós-Graduação em Economia do Desenvolvimento do Instituto de Economia da Universidade de Campinas. Doutor pelo o programa de História Econômica da Fac. de Filosofia, Letras e Ciências Humanas – usp. Suas pesquisas se concentram nos campos da historiografia econômica, focalizando na produção brasileira no período 1930-1964, com ênfase na obra de Celso Furtado. No momento trabalha as relações entre história e teoria econômica como chave interpretativa para o surgimento da teoria do desenvolvimento de Celso Furtado. Rômulo Manzatto. Bacharel em Ciências Econômicas pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo e Mestre em Ciência Política no Departamento de Ciência Política da fflch/usp, com a dissertação Formação e Revolução em Caio Prado Jr. e Celso Furtado (2018).
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Vera Alves Cepêda. Professora do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Carlos/ufscar, atuando no Programa de Pós-graduação em Ciência Política e no Programa de Pós-Graduação em Sociologia. Possui mestrado e doutorado em ciência política pela Universidade de São Paulo e pós-doutorado em ciência política pelo iesp/uerj. Desenvolve pesquisas no campo do pensamento político e social brasileiro, em especial nos temas das interpretações sobre o Brasil, na atuação de instituições, intelectuais e teorias ligados ao problema do desenvolvimento, da democracia e das capacidades e ação do Estado em contexto periférico.
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