CIDADES SUL-AMERICANAS COMO ARENAS CULTURAIS

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Carlos A. Ferreira Mar tins Professor titular do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da usp São Carlos.

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Cidades sul-americanas como arenas culturais Adrián Gorelik   Fernanda Arêas Peixoto  org anizadores

(O que provavelmente nossos autores não previram foi a preocupante atualidade dessas reflexões numa quadra em que, não apenas na América do Sul, fortes pressões antimodernizantes arremetem contra as conquistas políticas e culturais da cidadania e, por consequência, exigem o aprofundamento da resistência cultural nas arenas contemporâneas.)

Esta edição brasileira, ilustrada com fotografias, mapas e fac-símiles, traz uma apresentação escrita por Nabil Bonduki.

Gorelik & Peixoto  orgs .

a proposta de Morse de compreender a cidade como “lugar de germinação, de experimentos e de combate cultural”, mas que, sobretudo, avançam no desvendamento dos múltiplos e variados processos pelos quais, como postulam os organizadores, “as cidades e suas representações se produzem mutuamente”. A prudência dos textos ante qualquer afã totalizador não impede nem esconde a ambição de ultrapassar aproximações isoladas em busca de elementos reveladores dos embates e aporias dos processos de modernização das cidades sul-americanas entre o fim do século xix e o início do xxi. Daí resultam duas dimensões fundamentais da contribuição desta obra, repitamos, coletiva, e da potencialidade de seus desdobramentos para além, inclusive, dos campos disciplinares aqui mobilizados. A primeira é a atualização da proposta morsiana de interrogar os ambientes urbanos não como são “descritos e analisados”, mas como foram “vividos e testemunhados”, perspectiva que permite compreender como os sujeitos da representação se constituem em atores e as cidades em arenas. A segunda é a exigência de superação da visão – ainda presente em nossos ambientes culturais e acadêmicos – de nossas cidades, arquiteturas e culturas como reflexos retardados e esmaecidos de processos e modelos originários das áreas centrais do sistema internacional. Ou, em outras palavras, a necessidade de extrair as consequências da compreensão de que a condição econômica periférica ao sistema não traduz necessariamente numa contribuição subalterna à cultura da modernidade.

A inspiração para o livro vem do texto de Richard Morse, “As cidades ‘periféricas’ como arenas culturais”, no qual a cidade é pensada como lugar de germinação, experimentação e combate cultural. A proposta feita aos autores foi que partissem de episódios da vida cultural urbana na América Latina de modo a pensar as relações entre cidade e cultura e a ensaiar uma perspectiva urbana para a história cultural. Quais as características da cidade que conferiram marcas específicas à produção cultural? Em que momentos, espaços e situações a relação entre cidade e cultura se apresentou de forma especialmente produtiva?

Cidades sul-americanas como arenas culturais

Resultado de reuniões periódicas realizadas no Brasil e na Argentina desde 2010, este livro, organizado por Adrián Gorelik e Fernanda Arêas Peixoto, reúne pesquisadores de oito países e diferentes especialidades: antropólogos, historiadores, sociólogos, críticos literários, arquitetos e urbanistas.

A

gora em língua portuguesa, este livro oferece uma oportunidade de reflexão sobre cidades sul-americanas em suas relações com as culturas e os processos de modernização de uma região impactada por intensas transformações sociais e produtivas entre as duas últimas viradas de século. Com mais de duas dezenas de autores de nacionalidades, formações disciplinares e ambientes culturais distintos debruçando-se sobre episódios localizados em quatorze cidades de oito países da América do Sul, seria grande o risco de termos uma obra rica e multifacetada, mas de unidade problemática. No entanto, o leitor logo se dará conta de que não está diante de uma simples coletânea, mas que é desafiado por um trabalho coletivo, fruto da colaboração intelectual estabelecida a partir de uma ideia-força ou “contrassenha” que desafia os autores a colocar suas diferentes formações disciplinares a serviço de um esforço convergente: pensar as cidades como “arenas culturais”, seguindo assim o mote proposto por Richard Morse em um de seus últimos trabalhos dedicados às cidades sul-americanas. Adrián Gorelik e Fernanda Arêas Peixoto, além de apresentar suas próprias leituras sobre Buenos Aires e São Paulo, respectivamente, coordenaram o projeto internacional que resultou na seleção das cidades aqui abordadas e de seus momentos-chave, mas delegando a escolha do objeto e do modo de aproximação às orientações temáticas e estilísticas de cada autor. História cultural, arquitetura e urbanismo, sociologia, antropologia e estudos culturais são parte dos múltiplos saberes e disciplinas que toda reflexão sobre a cidade deve, na expressão dos organizadores, “convocar e conjurar”. Em tempos de insistência acadêmica nas abordagens interdisciplinares, é salutar recordar que as cidades são objetos multi e transdisciplinares por excelência. A cidade na literatura e a atividade literária na cidade; os territórios da boemia; os bairros formais e as favelas; os planos urbanos entre o físico e o simbólico; os embates entre localismo e cosmopolitismo; as disputas entre imigrantes e patrícios; a potência significadora de edifícios ou sítios emblemáticos; a vida urbana nos meios de comunicação de massa; os acontecimentos que marcam a história das cidades – são múltiplas as temáticas e abordagens que desdobram

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