Fala de bicho, fala de gente

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Cristina Martins Fargetti

CA N TO R A S DA S CA N TI GA S D E N I N A R J U R U N A

Hῖ, Xutã, Nuyã, Kuxinã, Tupi, Tabananã, Dayadumã, Dayawá, Xibidu, Kudaximã, Kahadu, Taperida, Sedu, Yarupi, Kabaya, Kadealu, Ma’ayu, Kabayaku e Duyadi G R AVA Ç Ã O  realizada em Tubatuba/Maitxiri, Estúdio da

Mata, em setembro de 2011, por Cristina Martins Fargetti (coordenação) e Juliana Nazatto Mondini (técnica de som)

Desde a década de 1980, a linguista Cristina Martins Fargetti estuda a

E D I Ç Ã O D O C D   Cristina Martins Fargetti

por juruna. Ao longo desses anos, ela adquiriu profundo conhecimento

língua e a cultura do povo yudjá, mais conhecido entre os não indígenas e proximidade com os membros da etnia, encontrando particularidades

T E M P O D E D U R A Ç Ã O : 4 6  M I N 3 9  S

culturais como o tipo de humor característico e a presença de uma categoria de animais nomeada bichos-gente, que remontam à cosmologia ancestral juruna. Além de todo o trabalho de pesquisa acadêmica – boa parte referenciada neste livro –, foram reunidas e gravadas 49 cantigas

Fala de bicho,

M A S T E R I Z A Ç Ã O D O C D   Celso Rocha e Estúdio Apache

modo, resistem ao processo de aculturação que ameaça os povos originários desde o contato com os brancos. A obra apresenta, ainda, um estudo e partituras compostos pela musicista Marlui Miranda e um CD com as cantigas gravadas com as vozes das mulheres yudjá.

I N C L U I C D E PA R T I T U R A S

fala de gente

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CA NTI GAS D E N I N A R D O P OVO J U R U N A

Cristina Martins Fargetti PA R T I C I PA Ç Ã O D E

de ninar, cantadas por mães e avós que embalam suas crianças e, desse

ISBN 978-85-9493-031-6

Fala de bicho, fala de gente Marlui Miranda

Aproveitem os leitores a viagem extraordinária pelos yudjá do Parque Indígena do Xingu, também conhecidos como juruna, pelos sons e letras de Cristina Martins Fargetti, com a colaboração de Marlui Miranda. Duas grandes pesquisadoras, que a música e o amor por um mesmo povo tornam irmãs. Cristina Martins Fargetti, linguista e musicista, autora do livro, dedica-se a eles desde 1989. Enquanto o saudoso professor Aryon Dall’Igna Rodrigues, verdadeira enciclopédia para os estudiosos das nossas línguas, indicava em 1986 que a língua juruna era quase desconhecida, Cristina, ao longo dos anos, trabalhou com professores juruna na escrita, com eles desvendando significados, aprendendo o idioma, registrando rituais, músicas, mitos, organização socioeconômica, sempre com autoria da comunidade. Tem uma íntima ligação com o povo. No novo trabalho, sua atenção recai sobre um gênero musical pouco estudado nas pesquisas de diferentes profissionais: as cantigas de ninar. Antes de entoar as juruna, ela nos dá vontade de aprender as do repertório de Portugal, as menos numerosas brasileiras, as de García Lorca, as europeias. Fala das indígenas, ainda na sombra. E nos pega de surpresa: as crianças são envoltas em seres assustadores, cantigas de mães adúlteras, lamentos de pobreza... hão de adormecer não pelas letras e pelo conteúdo, mas por misteriosa magia de embalos e sons. Foi um desejo dos yudjá gravar, escrever e traduzir as cantigas de ninar, não incluídas em projetos anteriores. São as 49 que constam deste Fala de bicho, fala de gente. Com eles, Cristina organizou oficinas, observou, viveu junto de mães e crianças, utilizou tecnologia avançada para o registro. Pela música, surge um universo cósmico. Há gente, os humanos, e os que ela traduziu como bicho-gente, entes misturados, que não podemos classificar de animais mas também o são. Marlui Miranda, que já trabalhara com os yudjá, participou de algumas oficinas do projeto, orientou colaboradores de Cristina na tecnologia das gravações, deve ter cantado muito com sua voz dourada nascida do além, quem sabe dos Alapa, habitantes juruna dos céus, cantadores de gêneros musicais etéreos, mas não de ninar. Foi dela a gigantesca proeza de escrever as partituras de todas as cantigas do livro. Tive o privilégio de viajar muito com Marlui; pesquisamos juntas, desde 1978, a música de vários povos. Sei do dom que ela tem de se tornar indígena, com afeto e amizade, extraindo raízes musicais e instrumentais como se estivesse arrancando a mandioca na roça com as outras mulheres. No capítulo que escreveu, ela revela uma face nova: de filósofa, escritora, consumada estudiosa de teorias musicais, analista sofisticada. Os musicistas hão de apreciar as novidades que traz. Com Cristina Fargetti e Marlui Miranda, refletimos como é fundamental valorizar a oralidade – aí compreendida a música – em coexistência com a escrita e a notação musical. Fala, voz, melodia, canto de belos artistas que não escrevem nem leem viram arte a exibir, expressão tão preciosa como a de escritores e músicos. Afinal, todo mundo sabe cantar, mesmo os iletrados; mas quantos cantores e compositores populares dominam a passagem a partituras? Betty Mindlin – antropóloga, com doutorado pela PUC-SP, e economista, com mestrado pela Universidade de Cornell, trabalha há anos em projetos de pesquisa e apoio a numerosos povos indígenas da Amazônia e outras regiões. Autora de diversos livros, entre eles Moqueca de maridos (Record, 1997), traduzido para diversos idiomas.

21/09/2017 12:33


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