correlação a ser pensada entre o modo de se apresentar do crítico e a sua própria escrita, comentados neste trabalho de Sérgio Alpendre e Laura Loguercio Cánepa, Inácio Araujo assume desde logo em seu texto alguma voz que parece nos falar de perto como sendo um amigo educado, que nos conhece e buscaria quiçá apenas uma interlocução civilizada. Afinal, já nos basta a barbaridade dos dias que correm ao nosso redor e acabam por nos atingir; diríamos até, ao redor daquele artigo seu no jornal. Sua espécie de elegância discreta, às vezes algo reticente, e mesmo num raro mau-humor, põe em dificuldades o editor sensacionalista que quer de todo modo, por meio do título, chamar atenção para a matéria usando alguma de suas palavras. O viés sintético de sua prosa procura sempre dar uma ideia dos embaraços da fita pelo jeito mais simples e compreensível, como na fala “ao rés-do-chão” que
Inácio Araujo tem uma trajetória peculiar entre os críticos de cinema. Antes de se fixar na crítica, atuou como cineasta, escrevendo roteiros, dirigindo e montando filmes, entre outras atividades. Também revelou-se notável escritor de ficção, como atesta o artigo de Alcir Pécora neste livro. Sua coluna de críticas na Folha de S.Paulo, onde, além de cinema, também comentava os programas de TV, tornou-o conhecido do público. Outros artigos, de Liciane Mamede, Ugo Giorgetti, Luciana Corrêa de Araujo, Ruy Gardnier, Fábio Camarneiro, José Geraldo Couto e dos próprios organizadores, contam essa história de uma vida dedicada ao cinema. Toda essa experiência pode ter contribuído para torná-lo um crítico ponderado, que aprecia o cinema de arte e o cinema marginal, de Ozualdo Candeias, por exemplo, mas também consegue enxergar as qualidades de uma comédia como Débi & Loide ou de um sexploitation como Showgirls sem preconceitos, com seus olhos livres para ver. Além de uma seleção de críticas de Inácio Araujo publicadas na Folha e em outros veículos, este livro traz críticas inéditas e alguns de seus textos literários.
INÁCIO ARAUJO OLHOS LIVRES PARA VER LAURA CÁNEPA E SÉRGIO ALPENDRE (ORG.)
Independentemente de haver alguma
SÉRGIO ALPENDRE LAURA LOGUERCIO CÁNEPA (ORG.)
Nos seus indisfarçáveis traços bonômicos, como na fala cordial, quando logo podem vir misturar-se as sombras de um rigor severo, adivinha-se já a própria
INÁCIO ARAUJO OLHOS LIVRES PARA VER
fisionomia do seu estilo crítico. Dado a escutar respeitosamente possíveis alteridades e cogitações discrepantes, são esses atributos que o alojam já do lado da melhor cinefilia, a apreciadora de novos mundos, sejam eles controversos ou adversos. Sua virtude maior é transmitir a mesma coisa a quem o ouve ou apenas o lê, sem o conhecer, ou seja, sem nunca o ter visto: apenas e tão somente pelo seu texto. Ora, o que mais podemos esperar de um bom crítico, além da mais franca abertura para o que lhe aconteça pela frente, e um bom fundo de reservas para repercutir conosco em palavras bem pensadas? Claro, além de conhecer muito bem o seu métier... A lisura de sua comunicação, ainda quando dificultosa, como grande
distinguiria para Antonio Candido o
parte dos melhores críticos, acaba
melhor da crônica brasileira. Inácio
revelando um talento literário.
mostra-nos que falar de um filme é
Alguns, como Inácio, acabam
(e não é) tão simples quanto parece.
publicando suas próprias ficções – contos, romances –, caso não tão raro quanto parece. Inversamente, não é
Rubens Machado Jr.
à toa que certos ficcionistas só mais
Professor titular em História,
tarde se revelaram bons críticos
Crítica e Análise do Audiovisual
de cinema, como Borges, Moravia,
na ECA-USP, lidera o grupo de estudos História da Experimentação
Cabrera Infante, Claude Ollier, ISBN 978-85-9493-254-9
García Márquez, Carpentier.
no Cinema e na Crítica.
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