UMA NOVA INTRODUÇÃO À ARTE DO SÉCULO XX

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segurança com a qual o autor revê, escrutina e

O ato de leitura atravessado pela reflexão crítica acerca da experiência do contemporâneo:

reavalia as principais postulações estéticas das

assim podemos definir o movimento que nos

artes moderna e contemporânea, desconfiando

convida à fruição das páginas de Uma nova

Daí a importância da perspectiva crítica adotada por Domecq sobre o vasto material que se propõe a examinar. Diante da grande

Nesta nova introdução à arte do século XX, o irônico e polêmico

introdução à arte do século XX, de Jean-Philippe

sustentação, somos convidados, no aqui-agora,

Jean-Philippe Domecq vale-se da desconfiança e do ceticismo

Domecq, obra cuja natureza entrelaça com

não somente a pensar em novas tensões a

para tratar do senso comum que circunda o olhar à arte

sensibilidade e inteligência ímpares, sem se furtar à

respeito daqueles modos de sensibilidade, como

do século passado.

também a ressignificar o regime de percepção

O autor propõe reconsiderar a história da arte tendo em vista

por meio do qual procuramos compreendê-los.

a aceleração do tempo e nossa compreensão desse fato, questões

“O que mantém a arte viva?” é o tipo de

fundamentais para o entendimento da rápida passagem do

indagação subliminar que faz com que um livro

espírito moderno ao extremo contemporâneo. Para Domecq,

dedicado ao século XX acabe também falando

é preciso mensurar as consequências desse processo tanto na

muito de nós, coetâneos do século XXI. Vale notar

percepção histórica como na criação artística.

a esse respeito a quase obrigatória publicação

Ao discorrer sobre Pablo Picasso, Henri Matisse, Marcel

do ensaio “A Arte do Contemporâneo acabou”,

Duchamp, Mark Rothko, René Magritte, Piet Mondrian, Alberto

ao fim do presente volume, a título de posfácio.

Giacometti, Charles Baudelaire, entre outros, o ensaísta francês

Nele, fazendo uso de uma prosa elíptica, repleta

aborda desde a pintura até a escultura e a literatura e propõe

de marcas de subjetividade e cujo estilo contrasta

a desconstrução das reflexões sobre a arte e sua crítica a partir

com a sóbria elegância vazada no texto de

de pontos de vista pouco convencionais.

introdução, Domecq se propõe a encenar uma impagável “comédia da crítica”, por meio da

Esta edição traz também o controverso ensaio “A Arte do Contemporâneo acabou”.

qual o leitor adentra o terreno do “fascínio da

Uma nova introdução à arte do século XX

do processo de mitificação que lhes dá

polêmica e ao debate, os principais temas ligados à

Jean-Philippe Domecq Uma nova introdução à arte do século XX

história da arte e à crítica cultural do último século e meio, se entendermos que muitas das bases das principais manifestações artísticas que tomaram corpo no Novecento começaram a se desenvolver, por sua vez, na segunda metade do século XIX. Hoje, para todos os interessados em arte, cultura e educação – seja em âmbito profissional, universitário ou por puro diletantismo –, uma questão incontornável se apresenta: como estudar, em plena pós-modernidade, um conjunto de eventos e de criações tratado como canônico pela historiografia oficial e já devidamente pasteurizado para consumo seguro, e inócuo, por parte dos meios de comunicação de massa e da indústria cultural? Ao risco de nos tornarmos deferentes demais ao futurismo, ao dadaísmo,

heresia” (a expressão cunhada por Peter Gay para

Jean-Philippe Domecq

sintetizar a aventura modernista) a fim de chegar a tempo de assistir às exéquias da crítica cultural contemporânea, atividade sem a qual (nunca é demais lembrar) não se pode interromper o moto-perpétuo alienante que há muito tempo, pautando nossas vidas, segue seu curso.

ao surrealismo, à body art, à performance e à videoarte, por exemplo, dentre tantas outras experiências de vanguarda que se propuseram a revolucionar o século que presenciou a eclosão de duas guerras mundiais e a chegada do homem à Lua, corresponde a atitude de não termos mais nada a dizer sobre elas ou, pior, de tratá-las por meio de uma fraseologia a meio caminho entre o senso comum e a obtusidade.

ISBN 978-85-9493-017-0

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SERVIÇO SOCIAL DO COMÉRCIO Administração Regional no Estado de São Paulo Presidente do Conselho Regional Abram Szajman Diretor Regional Danilo Santos de Miranda Conselho Editorial Ivan Giannini Joel Naimayer Padula Luiz Deoclécio Massaro Galina Sérgio José Battistelli

Edições Sesc São Paulo Gerente Marcos Lepiscopo Gerente adjunta Isabel M. M. Alexandre Coordenação editorial Cristianne Lameirinha, Clívia Ramiro, Francis Manzoni Produção editorial Simone Oliveira, Thiago Lins Coordenação gráfica Katia Verissimo Produção gráfica Fabio Pinotti Coordenação de comunicação Bruna Zarnoviec Daniel Cet ouvrage a bénéficié du soutien des programmes d’aides à la publication de l’Institut français. Este livro contou com o apoio à publicação do Institut français.

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Jean-Philippe Domecq Uma nova introdução à arte do século XX posfácio A Arte do Contemporâneo acabou Tradução Eric R. R. Heneault

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Título original: Une nouvelle introduction à l’art du XXe siècle © Jean-Philippe Domecq, 2011 © Pocket, un départment d’Univers Poche, 2011 © Edições Sesc São Paulo, 2017 Todos os direitos reservados Preparação Karen Amaral Sacconi Revisão Elen Durando, Lígia Gurgel do Nascimento Projeto gráfico e capa Victor Burton Diagramação Natali Nabekura Foto de capa SFIO CRACHO/Shutterstock.com

D7121u Domecq, Jean-Philippe Uma nova introdução à arte do século XX / Jean-Philippe Domecq; Tradução de Eric R. R. Heneault. – São Paulo: Edições Sesc São Paulo, 2017. – 200 p.

Posfácio: A Arte do Contemporâneo acabou. ISBN 978-85-9493-017-0

1. Artes Plásticas. Heneault, Eric R. R.

2. Arte Contemporânea. 3. Século XX. I. Título. II. CDD 709

Edições Sesc São Paulo Rua Cantagalo, 74 – 13º/14º andar 03319-000 – São Paulo SP Brasil Tel. 55 11 2227-6500 edicoes@edicoes.sescsp.org.br sescsp.org.br/edicoes /edicoessescsp

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A Guilhem

“A arte alcança o objetivo que não tem.” — B enjamin Constant

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Sumário

Nota à edição brasileira > 10

Introdução > 13

1 O século XX e o tempo > 17 2 O outro lugar e o hoje > 21 3 Lascaux, a África… > 31 4 … o Oriente, o louco > 51 5 O olho de Eros, de Picasso a Bellmer > 79 6 Matisse ou o decorativo, Bonnard sutil > 96 7 Por que a abstração pictórica encerrou seu ciclo em três quartos de século > 106 8 Além da abstração > 116 9 Marcel, fator de sorte, René, pensador que sonha > 130 10 O modelo interior do surrealismo > 145 11 Teorismo e renascimento > 161 12 Uma arte contemporânea de qualquer época e civilização > 164

O afresco que Fellini deixa > 175

Posfácio: A Arte do Contemporâneo acabou > 179

Sobre o autor > 197

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Nota à edição brasileira O século XX distinguiu-se pelas experimentações nas artes, nas ciências e na política. Aos “ismos” que marcaram as artes plásticas, como o dadaísmo, o surrealismo e o cubismo, somaram-se as duas grandes guerras, o holocausto, a bomba atômica e o poder do mercado como regulador dos valores e da própria vida. No âmbito das revoluções artísticas, esse século legou para o futuro uma arte contemporânea “uniformemente planetária”. Foi também o período de reconhecimento da etnologia e da mestiçagem cultural. Assim, ao entrar em contato com outras civilizações, parte significativa dos artistas europeus se viu fortemente influenciada pelas culturas africanas e orientais, bem como pela arte primitiva, encontrada, por exemplo, em Lascaux, na França. Em Uma nova introdução à arte do século XX, Jean-Philippe Domecq analisa o impacto de influências externas apreendidas por artistas europeus consagrados para, em seguida, desconstruir a crítica comumente elogiosa, não raro incontestável, erigida em torno deles. Esta edição também conta com o posfácio “A Arte do Contemporâneo acabou”. Valendo-se, sobretudo, da estética, a arte contemporânea alcança a aura de mito, fato que promove a intensificação das rupturas em relação à duração histórica. Esse ritmo conduz o homem ao vazio, concretizando-se, por exemplo, na ausência de tempo para a maturação e/ou fruição do que se poderia chamar de obra-prima. j ean-ph i l i ppe domecq

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Para o autor, não se pode caracterizar o contemporâneo como algo em si mesmo, mas como uma ideia em contínua transformação que, aplicada à arte, relaciona-se a um tempo determinado, respondendo aos questionamentos artísticos, políticos e sociais em voga naquele período. Por esse motivo, Domecq prefere valer-se do termo “Arte do Contemporâneo”. O leitor encontrará neste livro um processo instigante de desconstrução das reflexões sobre a arte e sua crítica, ambas legitimadas por artistas e pela sociedade. Trata-se de um convite à dúvida e ao incômodo típicos de quem deseja retirar-se da zona de conforto intelectual e ampliar suas perspectivas em torno do pensar.

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Introdução Uma foto de 1952, tirada por Kay Bell Reynal, mostra Mark Rothko de pé no ateliê diante de uma de suas telas, a obra No 25. Esta tem cerca de duas vezes o tamanho humano e apresenta, a partir do busto de Rothko, uma grande tela que parece virgem na fotografia em preto e branco. Abaixo, duas listras pretas riscam, na horizontal, um fundo que parece uniformemente cinza e desce até a beira inferior da tela, posta no chão. Acima do quadro, uma tábua de madeira, pontuada por quatro ganchos; mais acima, algumas vigas se perdem na altura. À direita, uma escada; à esquerda, algumas telas viradas, amontoadas umas sobre as outras. O ateliê é amplo, despojado, com a poeira que nunca é varrida completamente nesse tipo de ambiente de trabalho. Do mesmo modo, o branco, o preto e o cinza na tela fotografada são, ao mesmo tempo, nítidos e suaves, pois Rothko pinta por aplicações de cores que ele modula e dilui em direção às margens. Diante dessa grande superfície fosca e nimbada, a silhueta se destaca. Ao homem não falta personalidade, ele usa paletó e calça de corte amplo, a estatura traz uma impressão de força madura. O crânio saliente, parcialmente calvo, recebe a pálida clareza difundida pela parte superior da tela. A armação dos óculos aponta a direção do olhar, absorvido pelo que parece branco, vazio. E a concentração da atitude é confirmada pela mão esquerda suspensa, segurando um cigarro, enquanto a outra mão está no bolso, levantando casualmente o paletó de tecido espesso. Nenhum estereótipo da figura do artista na roupa uma nova i ntrodução à arte do s écu lo xx

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ou na atitude de Rothko; ele poderia ser um filósofo ou crítico de arte que não esqueceu o próprio corpo, que teria vindo para descobrir a obra de um amigo e refletiria diante dela. Assistimos a um trabalho da consciência e da intuição. Rothko era um artista muito consciente. Portanto, muito cético. Ele sabia o valor do que havia realizado, mas ainda assim duvidava que estivesse à altura. À altura do quê? Está além de qualquer resposta, e de qualquer obra, para um artista exigente. Obviamente, para quem conhece sua biografia, o fato de ele se suicidar em 1970 entra na aura do documento. Esse homem hipnotizado pelo vazio, cuja expansão ele pintou, não foi tentado a antecipar o próprio fim? Mas não precisamos disso para sentir o que esse documento tem de hierático e impressionante. Rembrandt, com O filósofo, pintou o momento do pensamento concentrando o quadro na luz de uma lucarna que revela a fronte de um homem idoso no centro do claro-escuro. O quarto é, ao mesmo tempo, o crânio. Entre as múltiplas figurações de santos rezando, algumas chegam a restituir a intuição do êxtase; existe quadro melhor que o de Rembrandt que se aproxime tanto, com tão audaciosa escassez de recursos, do ato de meditar? No caso de Rothko, é a meditação de um artista que é captada, lá também de modo muito apurado, mas apurado pela máquina fotográfica, instrumento de registro mecânico com o qual é árduo filtrar a massa detalhada do real, o que mostra a força artística dessa fotografia. Talvez não exista representação mais surpreendente da interrogação de um criador sobre o que faz: esse constante diálogo consigo mesmo, às vezes firme e às vezes desamparado, jubiloso, torturado, mordaz e seguro, de quem aposta muito, muito mesmo, na própria arte. Aí, estamos sozinhos com o que fizemos, acreditamos ter feito, gostaríamos de fazer e, sobretudo, gostaríamos de fazer muito além das nossas capacidades individuais. “Fazer um livro sobre nada”, dizia Flaubert, um livro que permaneça estranhamente suspenso no decorrer dos séculos: a fórmula se aplicaria perfeitamente à arte de Mark Rothko, não é inadequada ao que se sabe do pintor americano e de sua vontade nietzschiana. E dizemos, recordamos esta evidência: que incrível processo é a criação artística, que parece uma brincadeira sem consequências vitais imediatas, mas que, ainda assim, exige tudo de um homem, até que ele não seja apenas exigente. Mesmo que, aliás, o que fizéssemos fosse genial: e daí? Com essa aventura, ao mesmo tempo elementar e enigmática, todos nós somos confrontados, sem sermos criadores, quando vemos, lemos, ouvimos obras de arte. Por menos que consumamos arte, mas que tenhamos constatado que ela pode mudar nossa percepção e nosso pensamento, ou seja, “mudar j ean-ph i l i ppe domecq

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a vida”, encontramo-nos, respeitando as devidas proporções, na mesma atitude que Mark Rothko na fotografia em questão. Refletindo sobre os pensamentos, sensações e emoções que as obras despertam em nós, passamos por todos os estados possíveis que a arte condensa. E é isso que proponho compartilhar com o leitor diante das obras do século XX que o calendário, arbitrário, acaba de encerrar: uma forma de reflexão pessoalmente engajada nas obras, engajada no sentido de “que implica e se implica”, mimetizando nisso o que ocorre conosco diante delas, por elas e com elas, e que não é vital apenas para os criadores. Testemunhando o que elas permitem ver e pensar, a escrita restitui a experiência sensível e refletida que podemos ter dessas obras que, a depender delas e de nós, abrem ou fecham o olho e a mente. Vale dizer que o leitor não compartilhará necessariamente as apreciações e reavaliações que resultam disso. Mas, justamente, dou apenas o exemplo daquilo que todos nós praticamos. Simples exercício de livre estudo, este livro é um convite a participar do trabalho da História, que também se faz por nós, e que, inelutavelmente, vai proceder às seleções e revisões que os séculos anteriores também sofreram. Chegou a hora de participar disso da maneira mais livre possível em relação ao que o século em questão realizou, quis e acreditou realizar. Chegou a hora: convite assim para fazer a História não surge a qualquer momento, não temos mais os pés no século XX. A pergunta “o que vai sobrar de tudo isso?” fica ainda mais viva. Contudo, este livro foi escrito no começo do século XXI; isso não permite um grande distanciamento. Passar de um século para outro não faz com que mudemos sistematicamente de período artístico. Porém, em virtude dessa mesma verdade, é perfeitamente possível que a arte dita “moderna” e depois “contemporânea” tenha fechado seu ciclo antes do fim do século. Nesse caso, a perspectiva já seria um pouco mais aprofundada, mais pertinente do que a miopia do presente poderia deixar supor. É uma das hipóteses que será avaliada aqui. Seguindo as linhas de força desse século de arte. Não à maneira de um livro de história da arte, já que se trata de um livro que propõe reconsiderar essa história. Não todas as etapas, portanto, mas a maior parte, e os problemas maiores que os artistas enfrentaram. Tal como a relação com o tempo, que esse século acelerou como nunca antes. De Baudelaire aos anos 1980, passamos do “espírito moderno” ao “extremo contemporâneo”. Há nisso uma precipitação temporal cujas consequências será preciso medir, tanto para a criação como para a percepção histórica que esse século terá tido de si mesmo. uma nova i ntrodução à arte do s écu lo xx

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Como nunca antes, a arte ocidental abriu-se ao que chamo de “Parte Outra”: — parte outra das artes das outras civilizações (a África, o Oriente), que fizeram desse século o século da arte etnológica; — parte outra da arte das primeiras idades da humanidade (foi o século de Lascaux); — parte outra também da “arte dos loucos”; — parte outra, enfim, do inconsciente. Como nunca antes, também, a descoberta do inconsciente levou esse século a explorar o continente do desejo, e veremos isso de Picasso a Bellmer. Mediremos também a contribuição da abstração, que abre o século de forma espetacular, mas que deu seus frutos mais cedo do que se acredita. Mais depressa que a figuração, principalmente. O que obrigará a repensar de outro modo o que se costuma entender por “representação”, da qual a figuração é apenas um subconjunto. E o que adveio, o que vai advir da representação com o surgimento de novas técnicas da imagem: fotografia, cinema, vídeo, multimídia etc.? Vamos identificar alguns impasses, também, em relação à vontade de acabar com a arte e de uni-la à vida. Impasse igualmente da teoria, já que prescreve seus pontos de vista à arte, que, por sua vez, começa a produzir em função dela. Portanto, retornaremos à evolução e ao status da crítica de arte no século XX. Essa interrogação sobre as exigências da crítica destaca a vitalidade experimental e radical de um movimento como o surrealismo. Mesmo que seja apenas para não esquecer no futuro esta pergunta que a arte sempre faz quando não é ordenada nem comedida: O que vem por aí?

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segurança com a qual o autor revê, escrutina e

O ato de leitura atravessado pela reflexão crítica acerca da experiência do contemporâneo:

reavalia as principais postulações estéticas das

assim podemos definir o movimento que nos

artes moderna e contemporânea, desconfiando

convida à fruição das páginas de Uma nova

Daí a importância da perspectiva crítica adotada por Domecq sobre o vasto material que se propõe a examinar. Diante da grande

Nesta nova introdução à arte do século XX, o irônico e polêmico

introdução à arte do século XX, de Jean-Philippe

sustentação, somos convidados, no aqui-agora,

Jean-Philippe Domecq vale-se da desconfiança e do ceticismo

Domecq, obra cuja natureza entrelaça com

não somente a pensar em novas tensões a

para tratar do senso comum que circunda o olhar à arte

sensibilidade e inteligência ímpares, sem se furtar à

respeito daqueles modos de sensibilidade, como

do século passado.

também a ressignificar o regime de percepção

O autor propõe reconsiderar a história da arte tendo em vista

por meio do qual procuramos compreendê-los.

a aceleração do tempo e nossa compreensão desse fato, questões

“O que mantém a arte viva?” é o tipo de

fundamentais para o entendimento da rápida passagem do

indagação subliminar que faz com que um livro

espírito moderno ao extremo contemporâneo. Para Domecq,

dedicado ao século XX acabe também falando

é preciso mensurar as consequências desse processo tanto na

muito de nós, coetâneos do século XXI. Vale notar

percepção histórica como na criação artística.

a esse respeito a quase obrigatória publicação

Ao discorrer sobre Pablo Picasso, Henri Matisse, Marcel

do ensaio “A Arte do Contemporâneo acabou”,

Duchamp, Mark Rothko, René Magritte, Piet Mondrian, Alberto

ao fim do presente volume, a título de posfácio.

Giacometti, Charles Baudelaire, entre outros, o ensaísta francês

Nele, fazendo uso de uma prosa elíptica, repleta

aborda desde a pintura até a escultura e a literatura e propõe

de marcas de subjetividade e cujo estilo contrasta

a desconstrução das reflexões sobre a arte e sua crítica a partir

com a sóbria elegância vazada no texto de

de pontos de vista pouco convencionais.

introdução, Domecq se propõe a encenar uma impagável “comédia da crítica”, por meio da

Esta edição traz também o controverso ensaio “A Arte do Contemporâneo acabou”.

qual o leitor adentra o terreno do “fascínio da

Uma nova introdução à arte do século XX

do processo de mitificação que lhes dá

polêmica e ao debate, os principais temas ligados à

Jean-Philippe Domecq Uma nova introdução à arte do século XX

história da arte e à crítica cultural do último século e meio, se entendermos que muitas das bases das principais manifestações artísticas que tomaram corpo no Novecento começaram a se desenvolver, por sua vez, na segunda metade do século XIX. Hoje, para todos os interessados em arte, cultura e educação – seja em âmbito profissional, universitário ou por puro diletantismo –, uma questão incontornável se apresenta: como estudar, em plena pós-modernidade, um conjunto de eventos e de criações tratado como canônico pela historiografia oficial e já devidamente pasteurizado para consumo seguro, e inócuo, por parte dos meios de comunicação de massa e da indústria cultural? Ao risco de nos tornarmos deferentes demais ao futurismo, ao dadaísmo,

heresia” (a expressão cunhada por Peter Gay para

Jean-Philippe Domecq

sintetizar a aventura modernista) a fim de chegar a tempo de assistir às exéquias da crítica cultural contemporânea, atividade sem a qual (nunca é demais lembrar) não se pode interromper o moto-perpétuo alienante que há muito tempo, pautando nossas vidas, segue seu curso.

ao surrealismo, à body art, à performance e à videoarte, por exemplo, dentre tantas outras experiências de vanguarda que se propuseram a revolucionar o século que presenciou a eclosão de duas guerras mundiais e a chegada do homem à Lua, corresponde a atitude de não termos mais nada a dizer sobre elas ou, pior, de tratá-las por meio de uma fraseologia a meio caminho entre o senso comum e a obtusidade.

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