VIOLÃO-CANÇÃO

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ISBN 978-85-9493-096-5

diálogos entre o violão solo e a canção popular no Brasil

Chico Saraiva

Violão canção

Gil Jardim Maestro e professor livre-docente de música na USP, é autor de O estilo antropofágico de Heitor Villa-Lobos: Bach e Stravinsky na obra do compositor.

Chico Saraiva

Penso que isso seja também aplicável à ação de Chico Saraiva no desenvolvimento desta obra – que, procurando com seus mestres as respostas para suas inquietudes, se mistura e se encontra.

diálogos entre o violão solo e a canção popular no Brasil

Eu pego o violão para […] lembrar uma coisa de alguém. E então começo a tocar a canção do meu jeito, já que não leio partitura. Eu não sei exatamente que acorde o sujeito está fazendo, mas eu tenho uma ideia, que começo a desenvolver. E é nessa procura pelo outro que você se acha. O bonito é que você acaba entrando no outro e desaparecendo com ele,
o que me lembra de um samba que fiz com Aldir no disco Não vou pro céu, mas já não vivo no chão, em que num verso ele diz: “Entrava no livro que lia e sumia”. […] No fundo é isso, todos nós entramos em uma coisa e queremos desaparecer lá dentro, porque admiramos aquele universo e queremos nos perder ali dentro. E é exatamente se perdendo ali que a gente está se achando.

Chico Saraiva olha para o Brasil, país de musicalidade original, tributária de suas raízes indígenas, africanas e europeias. Elege um instrumento símbolo da nossa música – o violão, em sua relação íntima com a canção – e parte para campo. Vai interrogar mestres sobre melodia, harmonia e ritmo, naturalidade e precisão, gesto musical, processo criativo, tradição escrita e não escrita. Que mestres? Guinga, João Bosco, Elomar, Luiz Tatit, Paulo César Pinheiro, Sérgio Assad, Paulo Bellinati, Marco Pereira. Numa sequência inspirada na montagem cinematográfica, que conduz os personagens pelos temas do enredo, Saraiva oferece ao leitor um percurso de conversas. Uma pergunta do músico cancionista Tatit é habilmente levada pelo autor até o músico instrumentista Pereira. Bosco se achega na conversa estruturada pelo livro e sem saber complementa a resposta de Pereira. Pinheiro conta de sua parceria com Pixinguinha e do convívio com Baden Powell. Assad fala da composição para violão erudito; Bellinati comenta o violão sofisticado, o “violão-piano”. Guinga diz que “a canção vem pela voz” e Elomar completa: o violão sustenta o canto.

violão canção

Por vezes é possível identificar no senso comum os hábitos de contrapor os conceitos da música clássica e os da música popular como se não fosse possível procurar complementaridades; e de, no universo da música popular, confrontar condições técnicas de quem possui domínio do código musical e de quem não o possui, como se a história da música popular brasileira não fosse escrita pelos dois tipos de profissional. É a essa espécie de percepção crítica, para além dos primeiros propósitos, que as entrelinhas de Violão-canção nos conduzem. Antecipo um depoimento de João Bosco, que a certa altura de sua entrevista nos diz:

Estou orgulhoso de apresentar este excelente trabalho do violonista e compositor Chico Saraiva. Meu primeiro contato com o material se deu ainda na proposta de pesquisa de mestrado, uma semente que tive o privilégio de ver germinar e se transformar nessa espécie de inflorescência, dado o grande número de flores e frutos colhidos. Chico se propõe a investigar o ato criativo na canção brasileira com foco especial na intersecção existente entre o universo do violão solo – associado à música erudita ou de concerto – e o do violão que acompanha a voz, ligado à canção popular. Para tanto, realizou entrevistas com oito mestres de reconhecida atuação nos universos abordados: Sérgio Assad, Marco Pereira e Paulo Bellinati, da prática do violão solo; João Bosco, Paulo César Pinheiro e Luiz Tatit, do universo da canção popular; e Guinga e Elomar, atuantes na face de contato entre os campos estudados. O resultado transcende o projeto inicial. As entrevistas são riquíssimas e geram entrelinhas maravilhosas, reflexões que extrapolam o previsto, suscitando elaborações que, muito felizmente, são contrárias à fixação de normas ou diretrizes composicionais. Elimina-se a possibilidade de ranquear resultados, evitando definitivamente o estabelecimento de hegemonias e privilegiando a abundância dos processos criativos. Esta obra relaciona-se com máximas de acadêmicos como John Blacking e Robert Hatten, entre outros; contudo, amplia o espaço de abordagem para outros cantos, seja no amplo cenário cultural e mercadológico, seja no dia a dia do criador musical, discutindo a arte e a beleza da criação em seus muitos processos. Eis a característica fascinante deste livro: trazer, em discurso acessível e envolvente, intimidades do ato da criação musical na voz de vários craques da música brasileira. Por isso é um trabalho com aura de ineditismo, que revela algo pouco visível ao público – o próprio compositor externando seus processos de criação, pela via científica ou por meio da sensibilidade intuitiva de cada um dos presentes nessa grande conversa.

6/25/18 1:07 PM


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