Patricia Palumbo
cantar sem a máscara do belo”. Rompendo o jejum virtual, a perene iconoclasta Rita Lee, entrevistada “ao vivo”, reconhece ter despertado a curiosidade pública pelas letras explícitas de suas parcerias românticas com o marido Roberto de Carvalho, como “Mania de você” e “Banho de espuma”: “As pessoas perguntavam: vocês faziam aquilo mesmo?”. Essas e muitas outras revelações e insights são extraídos pelo fino bisturi da jornalista Patricia Palumbo na estonteante sequência de entrevistas deste Vozes do Brasil: entrevistas reunidas. Dona de cultura abrangente, não raro ela recorre a outros ramais da arte para estimular o entrevistado a sair da zona de conforto das respostas padronizadas, habituais na mídia de massa. E tem mais, muito mais. São 33 encontros das artes jornalísticas de Patricia com ases de nossa música de diferentes latitudes estéticas. Um passeio intenso e divertido pelo que se produz de superlativo e desafiador na cultura do país.
2ª edição revista e ampliada
ISBN 978-85-9493-142-9
TÁRIK DE SOUZA
é jornalista, crítico musical e poeta, com livros publicados nessas áreas. Trabalhou em alguns dos principais veículos da mídia nacional.
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Patricia Palumbo
Em nova edição revista e ampliada, Vozes do Brasil: entrevistas reunidas apresenta um pouco da vida e da obra de algumas personalidades da MPB por meio de entrevistas realizadas pela jornalista Patricia Palumbo, que há vinte anos comanda o programa de rádio homônimo e acompanha a cena musical do país. Os textos compilados neste volume revisitam conversas que ocorreram desde o início dos anos 2000 até outras mais recentes – e inéditas –, trazendo ao leitor um panorama musical contemporâneo.
Cabelo esticado, saia longa, sapatinho, a indômita Mart’nália, creiam, encarou na adolescência um recital de piano clássico. E entrega que o pai, Martinho da Vila, “não toca violão, não toca cavaquinho, não toca piano, não toca nada, ele toca o pandeirinho dele e muito que ruim, e um tamborinzinho de mão, ele nunca pegou num instrumento pra valer”. Por isso, o classifica como “fenômeno”: “A melodia que ele faz é tudo torta e tudo lindo”. A mística Elba Ramalho não quer mais ser julgada pelo que representa na cultura nordestina ou na cultura popular brasileira, “mas pelo quanto me dou ao próximo”. Itamar Assumpção recusou-se a falar de poesia (“não sou poeta, não”) e reconheceu ter lido muito pouco: “A música leva a um universo sem palavras. Percebi a transa entre o espírito e a fala humana. É só o invisível”. Por sua vez, Cássia Eller tinha uma fixação: “Tudo acontece em tempo de compasso musical. O tempo que se tem pra atravessar a rua até aquele carro chegar aqui, fico pensando em música. Não é trilha. São cálculos matemáticos”. Para Marina Lima, “a música é o mar, as embarcações são as letras”. Mestre percussivo, o pernambucano Naná Vasconcelos decretou: “Batuque não é comigo. Som é timbre. Normalmente, quando estou com outras pessoas tocando música delas principalmente, procuro fazê-las entender que toco mais quando não toco”. Refinada cantora, Ná Ozzetti hierarquiza a voz como primeiro instrumento: “O resto é consequência do que você absorve, de como você vê, do reflexo do momento, de como você se sente”. Ícone da nova MPB, Mônica Salmaso, sumidade canora que age como instrumentista, ouviu muito Beatles, Stevie Wonder, The Mamas and The Papas, Simon & Garfunkel e desvelou ainda mais inesperadas paixões ocultas por dois escultores vocais: o americano Bobby McFerrin e a portuguesa Maria João. Para Zeca Baleiro, a ideia de permanência da obra do compositor é uma das coisas mais fascinantes: “É como entrar num prédio e ouvir o porteiro assobiando Noel Rosa”. Em sua linguagem hiperbólica, o rapper Criolo descreve o transe do palco: “Eu acho que o corpo expurga, o corpo sofre, porque o verbo ainda é falho para descrever o sentimento”. Já a cantautora Adriana Calcanhotto (“minha música não é cinema, minha música é imagem”) confessa ter procurado fugir ao estereótipo: “Quando comecei a fazer os meus espetáculos, o que fiquei buscando foi um experimento com a coisa de cantar, sem pensar no canto. Eu queria
2/1/19 2:53 PM