a r t e D e S I G N C U Lt U r a C O N t e M P O r â N e a t e C N O L O G I a
laurel nakadate aaron koblin felipe cama arne svenson wolfgang tillmans
ditadura do agora
gam es sociais
Publicamos petabytes em sites que podem deixar de existir a qualquer momento
Meditação psicodélica entre jujubas e bombons explosivos JaNeLa iNdiscreta
eNtrevista Lev maNovich
Artistas usam cenas banais para criar imagens extraordinárias
O impacto das redes sociais na cultura visual contemporânea
Nata L cuLt
Presenteie com obras de arte de 100 a 5000 reais
dez/jan 2014 anO 04 edIÇÃO 15 R$ 14,90
exemplaR de assInante venda proibida
Tucson #1, da série Star Portraits (2011), Laurel Nakadate
playground
Facebook faz 10 anos e transforma a cultura dentro e fora das redes
GLOBAL
Centro Cultural Banco do Brasil Brasília
a or m e d a d A felici da mesmice. bem longe ra lá. p se e d u M
@bancodobrasil
/bancodobrasil
Central de Atendimento BB 4004 0001 ou 0800 729 0001 • Ouvidoria BB 0800 729 5678 • Serviço de Atendimento ao Consumidor - SAC 0800 729 0722 • Deficiente Auditivo ou de Fala 0800 729 0088 @bancodobrasil /bancodobrasil
O BOM DA VIDA Bom é ser feliz com cada experiência. Porque os momentos mais simples também podem ser especiais. Bom é poder contar com um banco que apoia a cultura e o esporte para você viver o lado bom da vida. Instale o BBCode no seu smartphone.
bb.com.br/estilo
6
42 ensaio
Salve-Se quem puder Uma quantidade avassaladora de dados e informações pessoais é despejada a cada segundo nas redes sociais. Entre vídeos, fotos e comentários está sendo escrita a história do século 21. Mas quem garante que essa memória pode ser recuperada?
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Coluna móvel
entrevista
design
mídia
Cultura digital
IconomIa Na sociedade
Lev manovIch
Interface InvIsíveL
LeItores seguIdores
Web profunda
contemporânea, associar
Teórico das redes fala
A experência toma o lugar
Redes sociais
A internet que nem o
valor a um ícone é
sobre big data e novos
da função e a forma se
determinam
Google acessa esconde
condição de existência
formatos de comunicação
dissolve em conceito no
os novos modos de fazer
o que não quer ser
social e de riqueza
e cultura
novo design de interface
e ler jornal
encontrado
SELECT.ART.BR
OUT/NOV 2013
100
seções
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E d i to R i A l
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C A R tA s
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sElECts
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ColuNA MóvEl
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M uNdo CodiF iCA d o
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dElEtE
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obituáRio
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EM CoNstRução
c o m P o r tA m e n to
gAmes Jogos do Facebook que proliferam, viciam e geram cifras astronômicas
104 reVieWs
chris burden Retrospectiva no New Museum reúne a memorável e diversificada obra de um dos mais inquietos artistas contemporâneos
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Portfólio
Artes VisuAis 96 96 96
AAron Koblin
JAnelA indiscretA
Filmes em rede e poéticas do código aberto do artista de 33 anos que já tem obras em grandes museus como o MoMA
96 96 96
Fotos: reprodução, márion strecker, aaron koblin e arne svenson/cortesia julie saul gallery, nyc. na página ao lado: divulgação
Artistas subvertem a banalidade do cotidiano e criam imagens fora do senso comum
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colaboradores
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gilson schwartz
silas Martí
Professor da Escola de Comunicações e Artes da USP e diretor da rede Games for Change América Latina (www.gamesforchange.org.br). – colunas móveis P 36
Jornalista da Folha de S.Paulo, escreve sobre artes visuais e arquitetura no caderno Ilustrada. Também colabora com Artforum, Frieze e The Art Newspaper. – reviews P 104
Érico araujo liMa
pedro Matallo
Mestre em Arquitetura e Urbanismo, jornalista de moda e curador independente. – design selects p 24
nina gazire
sergio roMagnolo Artista visual e professor, com participações na Bienal Internacional de São Paulo em 1977, 1983, 1987 e 1991. – mídia p 78
Felipe guiMarães
ludovic carèMe
Designer gráfico e ilustrador do estúdio criativo Duquegalo 250. – cultura digital 92
Fotógrafo francês, radicado no Brasil, publica regularmente em jornais e revistas como Libération, The New York Times, The Guardian e Rolling Stone, entre outros. – sexo p 72
Mariel zasso
lucas raMpazzo
Jornalista e psicóloga, foi repórter online de seLecT. É ativista do conhecimento compartilhado, da liberdade na internet e, é claro, do Software Livre. – mundo codificado P 38
Designer gráfico, trabalhou ao lado de Ricardo van Steen no estúdio Tempo Design e, em 2011, realizou residência artística em Roterdã. Atualmente é designer freelancer e músico experimental. – mundo codificado p 38
Mujica saldanha
DEZ/JAN 2014
ricardo oliveros
Foi editor dos cadernos Ilustrada e Mais! da Folha de S.Paulo. É autor de 1922 – A Semana Que Não Terminou (Cia das Letras, 2012). – mídia P 78
Mario gioia
Atua em fotografia, ilustração e cenografia. Trabalhou nas revistas Trip, Tpm, Bravo! e Status. É sócio do Estúdio Luzia e diretor de arte da revista 2016. – obtuário e delete P 112
SELECT.ART.BR
Marcos augusto gonçalves
Crítica de arte, jornalista e curadora. Vive e trabalha em Paris desde 1991. Foi curadora-geral da 18a e 19a Bienais de São Paulo. – reviews p 104
Jornalista, crítico e curador. Colabora para a revista Trópico e o portal UOL, entre outros veículos. É coautor de Roberto Micoli (Bel Editora). – reviews 104
Mestrando em Comunicação Social da Universidade Federal do Ceará (UFC), escreve críticas no blog Sobrecinema e integra o Laboratório de Estudos e Experimentações em Audiovisual da UFC (LEEA). – selects 16
Atua como fotógrafo desde os anos 80. Em 2012, lançou o livro 80’s Fotografias Analógicas. Prepara o próximo, Na Batida dos Anos 90, para 2014. – em construção P 114
sheila leirner
Mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, foi repórter de artes visuais da IstoÉ e da seLecT. – cultura digital p 92
E D I TO R I A L
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Curadoria da informação Like it or dislike it, fato é que as redes sociais não são simplesmente simulacros da vida. Sim, concordamos que são espaços de ócio, trabalho, pesquisa, informação, comunicação ou azaração. Via mídias sociais, a sociedade debate os grandes temas da atualidade – e também fomenta bobagens monumentais. Ao produzir esta edição, reconhecemos a dimensão de autonomia que esses meios de comunicação conquistaram em relação ao mundo “real”. A grande imprensa, por exemplo. Em reportagem de Nova York, Marcos Augusto Gonçalves aponta de que forma os periódicos tradicionais estão promovendo o conceito de “jornalismo aberto” para renovar sua imagem no ambiente interativo da blogosfera e assim fazer frente ao avanço de estatísticas desafiadoras: hoje, 30% dos adultos que vivem nos EUA consomem informações jornalísticas no Facebook. A maior das redes sociais faz 10 anos em 2014. E quando os índices de conteúdos postados na internet chegam à escala dos petabytes, insistimos que o jornalismo tem, entre suas funções primordiais, a de curadoria da informação. Nesta edição dedicada ao absoluto transbordamento das mídias, a revista se coloca como um dique. Em seLecT 15, analisamos os maiores aglutinadores das redes, os games sociais;
Paula Alzugaray
detectamos no trabalho do artista e designer Aaron Koblin uma nova linguagem cultural, os filmes sociais; e ouvimos uma autoridade em cultura visual contemporânea, o teórico Lev Manovich. Em entrevista a Giselle Beiguelman, o autor do referencial The Language of New Media (2001) adverte que as redes sociais possibilitam uma comunicação visual em alto nível, mas não estão expandindo nossa imaginação. Cabe, portanto, aos artistas a indicação dos usos criativos das redes. Trazemos aqui o trabalho recente da artista norte-americana Laurel Nakadate, capa desta edição, que convidou amigos de amigos do FB para participar de uma nova série fotográfica, Star Portraits. Usuários e protagonistas do dia a dia das redes também não poderiam deixar de estar presentes e estão contemplados na reportagem de Luciana Pareja Norbiato sobre os aplicativos de relacionamento e sexo. Last but not least, não perca a chance de se indispor com esse estado geral das coisas, participando de uma das redes antissociais destacadas por seLecT.
Paula Alzugaray Diretora de Redação
Ricardo van Steen
Giselle Beiguelman
Marion Strecker
Luciana Pareja Norbiato
Hassan Ayoub
Michel Spitale
Luciana Fernandes
Roseli Romagnoli
Guilherme Kujawski
SELECT.ART.BR
DEZ/JAN 2014
ILuSTRAçõES: RICARDo vAN STEEN, A pARTIR Do ApLICATIvo fACE youR mANgá
21.NOV.13 - 11.JAN.14
TER-SAB 10h-19h
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rua gomes de carvalho 842 são paulo sp brasil 04547003 F 5511 38420634 F 5511 38420635
c a r ta s
I am now reading your fab english supplement within seLecT: superb!
A R T E D E S I G N C U LT U R A C O N T E M P O R â N E A T E C N O L O G I A
MIRA SCHENDEL HANS HAACKE GUSTAVO VON HA EDWIN SANCHEZ LUISA STRINA
2431876509 615 30 0 83 89 03 0 0 63
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7 7 20 12 03 46
02 12 03 46 - 83 89 03 59
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OUT / NOV 2013
Inserção em Circuitos Ideológicos, de Cildo Meireles, 2013
mERCAdO
OUT/NOV 2013 ANO 03 EDIÇÃO 14 R$ 14,90
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Curadora independente e membro do corpo docente do RCA (Royal College of Art) WWW.SELECT.ART.BR
Como são feitos os preços das obras, o prestígio dos artistas e de que forma o circuito comercial muda e é desafiado
14
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seLecT é a melhor revista de variedades, não me canso de repetir. Estou usando a última edição pra me preparar pra redação do Enem. @almost01elf Estudante, via Twitter Gostaria de cumprimentá-los pelo último número da revista. Adorei, foi um daqueles exemplares que li do começo ao fim. Mai Carvalho, Diretora da A4 Comunicação Mais um ano bem abastecida: @revistaselect devidamente renovada! Stefânia Masotti (@smasotti) via Twitter
Recebi minha @revistaselect ... a capa está incrível! Darlan J. Schmitt (@ darlanjs) via Twitter @revistaselect eu amo o conteúdo inteligente de vocês e fico aguardando ansiosa dois meses para mergulhar... Quando sai a nova edição? Martha Terenzzo (@ marthaterenzzo9) via Twitter Conheci a revista na banca, gostei e resolvi assinar em maio deste ano. Cada edição que recebo eu gosto ainda mais. A última está de uma qualidade impecável. PARABÉNS à equipe da casa. O trabalho de vocês é a prova de que, quando se quer, é possível fazer um trabalho
de qualidade. Vida longa à seLecT! Um abraço a todos. Janete Domingues Susin Jornalista Adorei a última edição de seLecT. Parabéns! Fabio Cypriano Crítico e repórter do jornal Folha de S.Paulo Está maravilhosa a última edição da revista. Vou levar um monte de exemplares pra minha aula sobre mercado da arte na Casa do Saber. Fernanda Feitosa Diretora da SP-Arte Acho que a cada edição mando um e-mail dando os parabéns à revista.
FOi MaL Na página 76 (seção Design) da seLecT 14, o texto referente à cadeira Lina Bo Bardi tem dados imprecisos. O texto correto é o que segue: A cadeira Frei Egydio, desenhada por Lina Bo Bardi e pelos arquitetos Marcelo Suzuki e Marcelo Ferraz, faz a releitura de uma cadeira Florentina do século 15. Sua geometria minimalista é resultado de um desenho simplificado, calcado em apenas três peças estruturais. É produzida comercialmente pela Marcenaria Baraúna, desde 1987, o ano em que foi criada. SELECT.ART.BR
DEZ/JAN 2014
FoTo: PAULo VAINER
Desculpem o repeteco, o bis, mas é que está cada vez melhor, mesmo. Ainda não conferi tudo, mas os trechos que li ao acaso dão o tom da coisa. Meus parabéns! Pedro Vieira Coordenação Cultural – SP-Arte A última edição da seLecT está uma coisa, hein? Vocês são demais. Malu andrade Curadora do Festival BaixoCentro (via Facebook)
24/09/13 12:48
Escreva-nos Rua Itaquera, 423, Pacaembu, São Paulo - SP CEP 01246-030 revistaselect revistaselect www.select.art.br faleconosco@select.art.br
A última edição ficou o máximo. Puxa, me sinto muito honrada por estar ali no mundo inspirador e incrível de seLecT. Patricia Weiss CEO da Agência Be Wanted
seLecT expandida EDição iPaD
Leitores na web select
Galerias Slide shows do making of de Light Echoes, de Aaron Koblin, e imagens de Wolfgang Tillmans e Arne Svenson.
Delete os feicechatos Acesse on.fb.me/1jhdzC6 e complete o texto. O melhor perfil de feicechato ganha uma assinatura da seLecT.
arte e redes sociais Uma curadoria do que mais de interessante acontece no mundo da arte colaborativa.
Sua foto na seLecT A melhor foto com o tema Meu Museu Pessoal vai para nossa edição de FEV/MARÇO. Poste no Instagram e não esqueça de incluir a hashtag #revistaselect
R. Dr. Virgílio de Carvalho Pinto, 74 SP�SP Brasil 05415�020 55 11 2628�1943 galeriajaquelinemartins.com.br
EXPEDIENTE
EDITOR E DIRETOR RESPONSÁVEL: DOmINgO ALzugARAy EDITORA: CÁTIA ALzugARAy PRESIDENTE-ExECuTIVO: CARLOS ALzugARAy
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DIRETORA DE REDAçãO: PAuLA ALzugARAy EDITORA-ChEfE: gISELLE bEIguELmAN DIREçãO DE ARTE : RICARDO VAN STEEN EDITORA CONVIDADA: mÁRION STRECkER EDITOR míDIAS DIgITAIS: guILhERmE kuJAwSkI REPóRTER: LuCIANA PAREJA NORbIATO COLABORADORES
Érico Araujo Lima, felipe guimarães, gilson Schwartz, Lucas Rampazzo, Ludovic Carème, marcos Augusto gonçalves, mariel zasso, mario gioia, mujica Saldanha, Nina gazire, Ricardo Oliveros, Sérgio Romagnolo, Sheila Leirner e Silas martí
pROjEtO gRáfiCO DESigNER DiAgRAmAçãO SECREtáRiA DE REDACãO
Ricardo van Steen e Cassio Leitão michel Spitale Luciana fernandes Roseli Romagnoli
pESQUiSA DE fOtOgRAfiA
Letícia Palaria
COpy-DESk E REviSãO
hassan Ayoub
pRé-impRESSãO
Retrato falado
CONtAtO SERviçOS gRáfiCOS mERCADO LEitOR ASSiNAtURAS
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DIRETOR: gregorio frança. SECRETÁRIA ASSISTENTE: yezenia Palma. gERENTE: Renan balieiro. COORDENADOR DE PROCESSOS gRÁfICOS: marcelo buzzo. ANALISTA: Luiz massa. ASSISTENTE: Daniel Asselta. AuxILIAR: Indianara Andrade. COORDENADORAS DE LOgíSTICA E DISTRIbuIçãO DE ASSINATuRAS: karina Pereira e Regina maria. ANALISTA JR.: Denys ferreira. AuxILIAR: Cesar william. OPERAçõES LAPA: Paulo henrique Paulino.
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SELECT (ISSN 2236-3939) é uma publicação da EDITORA bRASIL 21 LTDA., Rua william Speers, 1.000, conj. 120, São Paulo - SP, CEP: 05067-900, Tel.: (11) 3618-4200 / fax: (11) 3618-4100. COmERCIALIzAçãO: Três Comércio de Publicações Ltda.: Rua william Speers, 1.212, São Paulo - SP; DISTRIbuIçãO ExCLuSIVA Em bANCAS PARA TODO O bRASIL: fC Comercial e Distribuidora S.A., Rua Dr. kenkiti Shimomoto, 1678, Sala A, Osasco - SP. fone: (11) 3789-3000 ImPRESSãO: Log & Print gráfica e Logística S.A.: Rua Joana foresto Storani, 676, Distrito Industrial, Vinhedo - SP, CEP: 13.280-000 www.SELECt.ARt.BR
SELECT.ART.BR
DEZ/JAN 2014
janeiro/fevereiro
exposição de verão 11ª edição curadoria kiki mazzucchelli março
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marcius galan
agenda rua das acácias, 104 - gávea rio de janeiro - rj tel. 21 2521-0426 www.silviacintra.com.br
EXPOS
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RIo De JAneIRo
MeMória auditiva Matriz de Voz, até 9/14, Casa Daros, Av. Lauro Sodré, 150, RJ, www.casadaros.net A instalação Matriz de Voz, criada pelo artista mexicano Rafael Lozano-Hemmer em 2011, funciona como um banco de dados sonoro e brilhante: o espectador é convidado a deixar em microfones seu padrão vocal, que depois ganha tradução nas luzes de um painel que ocupa a extensão da parede onde é instalado. Cada intervenção gravada se junta às já armazenadas, o que vai tornando a resposta luminosa cada vez mais performática. Até março, a Casa Daros expõe também instalação de Rosângela Rennó, desenhos de Pablo Helguera e vídeos de Lázaro Saavedra. Instalação Matriz de Voz (2011), de Rafael Lozano-Hemmer, na Casa Daros, é um banco de dados sonoro e brilhante
S ã o PA u Lo
Nova geração 45 Anual de Arte Faap, até 9/14, MAB-Faap, R. Alagoas, 903, SP, www.faap.br
À esquerda, Concept (1972), serigrafia sobre papel, de Julio Plaza; à direita, obra sem título de Amaury (2012) que está na mostra da Faap
O sangue novo da Faap dá as caras nas 34 obras de sua tradicional mostra anual, que traz 27 alunos do curso de visuais da faculdade. Os trabalhos foram selecionados pelo professor Marcos Moraes e uma comissão julgadora. Anaísa Franco e Daniel de Paula abrem ao público o resultado da passagem que tiveram pela Cité des Arts, em Paris, pelo programa de residência artística que a instituição paulistana mantém desde 1997. Ambos exibem obras e material de registro de seus processos de criação na Cidade Luz.
S ã o PA u Lo
Fábrica de seNtidos Julio Plaza Indústria Poética, até 27/7/14, MAC-USP Nova Sede, Av. Pedro Álvares Cabral, 1.301, SP, www.mac.usp.br Com obras, documentos e registros sobre a profícua colaboração do artista espanhol com o MAC-USP, a mostra Julio Plaza Indústria Poética explora as diversas facetas de sua produção multimídia. Com curadoria de Cristina Freire, a exposição mostra como a pesquisa com dispositivos tecnológicos formou uma rede de colaboradores internacionais, entre eles Walter Zanini, primeiro diretor do museu paulistano, Regina Silveira e Haroldo de Campos. SELECT.ART.BR
DEZ/JAN 2014
FoToS: DivuLgAção MAC uSP/ CoRTESiA DARoS LATiNAMERiCA, CoRTESiA Do ARTiSTA/ANTiMoDuLAR RESEARCh E DivuLgAção. NA PágiNA Ao LADo: CoRTESiA Do ARTiSTA
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PoRto ALegRe
Zero: criação eM rede, aNtes da web Zero, Fundação Iberê Camargo, de 6/12 a 4/3/14, Av. Padre Cacique, 2.000, Porto Alegre, Alguns grandes acontecimentos fazem dos anos 1950 um dos mais férteis e radicais períodos de renovação da arte. Em escala mundial. É o momento em que surgem novas linguagens, como performance, instalação, filme de artista e a incorporação das novas mídias no instrumental da arte. É quando o espectador é convidado a participar do trabalho, e quando a criação passa a ser feita em redes de colaboradores. Esses grandes fatos podem ser reconhecidos no grupo neoconcreto brasileiro ou no japonês Gutai. Em 1958, em Düsseldorf, na Alemanha, surge o grupo Zero, concebido pelos artistas Heinz Mack e Otto Piene, buscando uma virada total na arte alemã do pós-Guerra. Como estratégia de renovação, o grupo elege trabalhar com a desmaterialização do objeto em luz. Assim como o grupo Fluxus, o Zero transcendeu as fronteiras nacionais e ganhou adeptos e interlocutores na França, Itália, Japão e até no Brasil. Considerando que o grupo elaborou sua linguagem monocromática, pictórica e instalativa com luz e reflexos, não é de se estranhar que Abraham Palatnik tenha entrado na rede do Zero. O pioneiro da arte cinética no Brasil, nascido em Natal, em 1928, e residente no Rio de Janeiro, é um dos 24 artistas presentes na mostra Zero, em cartaz na Fundação Iberê Camargo até março. Com curadoria da historiadora de arte Heike van den Valentyn, de Colônia, a exposição mostra que a vontade de “zerar” foi compartilhada entre europeus e latino-americanos, entre os quais, Yves Klein, Günther Uecker, Otto Piene, Heinz Mack, Lucio Fontana, Almir Mavignier e Jesús Rafael Soto. Pa
Instalação História de Incêndio (19681971), do alemão Otto Piene, um dos fundadores do grupo Zero, reúne quatro esculturas de luz
EXPOS
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S ã o PA u Lo
NelsoN Felix: travelogue Poético Verso (Meu Ouro, Deixo Aqui), até 9/2/14, Instituto Tomie Ohtake, R. dos Coropés, 88, SP www. institutotomieohtake.org.br Verso, até 20/12, Galeria Millan, R. Fradique Coutinho, 1.360, SP, www.galeriamillan.com.br Nelson Felix andou ausente por nove anos do circuito de artes de São Paulo, mas, desde o dia 5 de novembro, com a abertura da exposição Verso, na Galeria Millan, o artista interrompe o hiato e apresenta à capital paulista o resultado de seu último projeto, espécie de travelogue poético e psicogeográfico. Enquanto na Millan prevalecem os elementos de demarcação territorial presentes em viagens realizadas por duas ilhas localizadas nos oceanos Pacífico e Atlântico, no Instituto Tomie Ohtake o público tem a chance de admirar, na exposição Verso (Meu Ouro, Deixo Aqui), os desenhos realizados durante essas peripécias.
À esq., desenho da série Verso (Meu ouro, Deixo Aqui), de nelson Felix; abaixo, fotografia da série this is not a House, de edgar Martins
RIo De JAneIRo
Questão de Moradia Edgar Martins, até 21/12, Galeria Laura Marsiaj, R. Teixeira de Melo, 31c, RJ, www.lauramarsiaj.com.br O português radicado em Londres Edgar Martins faz do registro de casas o estopim para trazer à tona questões que colocam em xeque o sistema econômico vigente e as formas de convivência adotadas na atualidade. Em Isto Não É uma Casa e Uma Pesquisa Metafísica sobre Moradias Britânicas, respectivamente, a crise das hipotecas nos EUA e um condomínio londrino falso, usado para o treinamento da polícia britânica, são a base de sua reflexão, que ganha contornos poéticos. SELECT.ART.BR
DEZ/JAN 2014
FoToS: DivuLgAção iSTiTuTo ToMiE ohTAkE E DivuLgAção gARCiA MARSiAJ. NA PágiNA Ao LADo: guiLhERME SiLvA
PeRFIL
FaZer do FilMe uMa balada: o ciNeMa de leoNardo MouraMateus FotoBienal 2013, de 13/12 a 13/4/14, Museu Oscar Niemeyer, R. Marechal Hermes, 999, Curitiba, www.museuoscarniemeyer.org.br É fundamental estar em movimento. Ir à balada nunca foi tão importante. Os filmes de Leonardo Mouramateus se desdobram a partir do movimento do corpo em cena. Dançar, contaminar-se pela música e inventar maneiras singulares de se mover são estratégias de toda a sua produção. Desde Fui à Guerra e Não Te Chamei (2010), em cartaz na FotoBienal Masp 2013, em itinerância no Museu Oscar Niemeyer, em Curitiba, até Charizard (2012), prêmio de melhor curta-metragem na IV Semana dos Realizadores, festival dedicado a filmes de caráter autoral, no Rio. E ainda em Lição de Esqui (2013), codirigido por Samuel Brasileiro, premiado este ano como melhor curtametragem de ficção no Festival de Brasília. A obra expressa uma vontade de experimentação da cidade, com corpos que se abraçam para simular uma briga, com pés que entram aos
Frame do vídeo Fui à Guerra e Não Te Chamei (2010), do jovem cineasta cearense Leonardo Mouramateus, em cartaz na FotoBienal, em Curitiba
poucos na lagoa, vacilantes. O jovem realizador Leonardo Mouramateus estuda no curso de graduação em Cinema e Audiovisual na Universidade Federal do Ceará (UFC), em Fortaleza. Vive em Maraponga, bairro que tem importância central em obras como Mauro em Caiena (2012), premiado no 35º Cinéma du Réel, em Paris. Para Mouramateus, fazer filmes é uma festa. Mas também uma questão política que diz respeito a maneiras de ocupar o mundo. Seus filmes são bastante emblemáticos de um movimento que envolve parceiros no processo de criação. Vontade de cinema e de invenção que contamina a própria cidade. Porque filmar tornou-se uma necessidade para Mouramateus e tantos outros amigos que mergulham na fabricação de filmes em Fortaleza. érico araújo lima
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EXPOS
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MIAMI
Porta da FreNte Brazil Art Fair, 4 a 8/12, NE Midtown Boulevard e 36th St, Miami, www.brazilartfair.com Jose Marton é quem assina a instalação da entrada da primeira edição da Brazil Art Fair, realizada na Miami Art Week entre 4 e 8/12, paralelamente à Art Basel Miami. Intitulada Penélope e realizada com material inflável, a obra monta uma crítica aos padrões europeus embutidos no modernismo brasileiro e as semiesferas típicas do Congresso Nacional. Marton Estúdio assina também a expografia da feira, que tem 15 galerias expositoras – todas do Rio e de São Paulo –, e exibe trabalhos de design art da série Híbridos. O viés crítico à imagem do Brasil é também marca da curadoria Tempo Suspenso, assinada por Luisa Duarte, com obras de forte teor político, como as de Berna Reale.
S ã o PA u Lo
YouNg british art: Nova geração Eddie Peake, Caustic Community (Masks and Mirrors), até 8/2/14, White Cube São Paulo, R. Agostinho Rodrigues Filho, 550, SP, www.whitecube.com Conhecido por suas performances homoeróticas (como Touch, de 2012, literalmente uma “pelada” de futebol de salão), o jovem artista britânico eddie Peake também se aventura em outras expressões, tais como escultura, coreografia e pintura. Atualmente, ele realiza sua primeira mostra na América do Sul, na filial paulista da White Cube, a maior galeria de arte do Reino Unido. Com 19 obras inéditas, a mostra estabelece um diálogo entre duas séries recentes de pinturas, que se referem a máscaras e espelhos. Além disso, Peake produziu uma série inédita, dispondo formas e letras de grafite laqueadas com tinta spray em aço polido.
Acima, à esq., frame do vídeo Ingests the throat Wrenching gravity of (2013), de eddie Peake; acima, desenho da instalação inflável Penélope, de Jose Marton para a Brazil Art Fair; à esq., escultura de Vitor Mizael
S ã o PA u Lo
alta estação The Summer Is On, 7/12 a 7/2/14, Blau Projects, R. Fradique Coutinho, 1.464, SP A coletiva de verão da nova galeria Blau Projects, especializada na recente arte contemporânea, faz um apanhado da produção de seu cast: Vitor Mizael e seus desenhos de animais deformados, Renata Cruz e suas ilustrações do cotidiano, Marga Puntel com a série Paisagem Transportada − Capa, e Marcone Moreira. Além deles, a convidada Fernanda Chieco exibe desenhos da série Fishermen’s Throne, criada em uma temporada na China. SELECT.ART.BR
DEZ/JAN 2014
FoToS: CoRTESiA WhiTE CuBE, DivuLgAção E viToR MiSAEL. NA PágiNA Ao LADo: MATThEW SEPTiMuS/ CoRTESiA MoMA
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RIo De JAneIRo
exPo 1: Meio aMbieNte Na Mira da arte Expo 1: Rio, de 17/12 a 6/3/14, MAM Rio, Av. Infante D. Henrique, 85, RJ, www.mamrio.com.br De que forma a arte de nossos dias reflete os desafios ambientais no século 21? O supercurador Hans Ulrich Obrist e o curador-chefe do MoMA e diretor do MoMA PS1, Klaus Biesenbach, partiram dessa premissa para conceber a Expo 1. A mostra ocupou o PS1 – afiliado experimental do Museum of Modern Art – e outros pontos de Nova York entre maio e setembro de 2013 com uma profusão de obras de nomes exponenciais da produção atual. Entre eles Chris Burden, Mircea Cantor, João Maria Gusmão e Pedro Paiva, Taiyo Kimura, Katharina Sieverding, Mikhael Subotzky e Liu Wei, com trabalhos que traduziam o tema dark optimism suscitado pelo clima de catástrofe ecológica e crise econômica do início deste século. A partir de
17/12, eles poderão ser vistos no recorte made in Brazil da mostra, que o MAM Rio sedia. O curador Luiz Camillo Osorio é o responsável pelo staff nacional que será incluído na nova edição, com artistas como Cao Guimarães, Claudia Andujar, Jarbas Lopes, Rivane Neuenschwander e Thiago Rocha Pitta. Trazendo uma seleção de obras nas mais variadas técnicas, a exposição vai ocupar não só o Espaço Monumental do museu, mas também a área externa. Nada melhor que a paisagem do Aterro do Flamengo como palco para se colocar em cena uma perspectiva curatorial “que reconhece a falência dos ideais utópicos do Modernismo, mas mantém a esperança de que a inovação humana trará consigo o desejo por um amanhã melhor”, nas palavras de Biesenbach. lPN
Vista da instalação Hopeless Lands (2008), de Liu Wei, em cartaz na Expo 1: Rio
C U LT U R A C O N T E M P O R Â N E A
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A P L i C AT i Vo s
snapchat, Vine e philo: as últimas febRes da Rede
ArQUiTETUrA
Vista panoRâmica www.arquigrafia.org.br Para quem é aficionado por arquitetura, o projeto Rede Social Arquigrafia é um prato cheio – de imagens. O banco de dados de fotografias arquitetônicas criado pela FAU, ECA e IME (todos da USP) vem disponibilizando, desde 2009, o acervo histórico da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e é também plataforma para a inclusão de novas imagens pelos usuários. Um cadastro simples dá acesso às atuais 2.858 fotos protegidas pelo Creative Commons, permitindo selecionar no perfil e baixar as favoritas.
Estritamente baseados em imagens e menos condicionadas aos esquemas de autopromoção e marketing pessoal, novos aplicativos e redes sociais são rápidos e enxutos. Nessa leva destacam-se o Vine, aplicativo para gravar e publicar vídeos de 6 segundos em loop, que já está criando todo um perfil de artistas especializados, e o Snapchat para troca de mensagens exclusivamente baseadas em fotos e desenhos feitos sobre elas e que são apagadas em 24h. Mas se esses aplicativos são fenômenos consolidados, preste atenção no Philo, plataforma de TV criada por dois estudantes em Harvard, nos EUA, que já é comentada nos canais de mídia e negócios como o “novo” Facebook.
Acima à esq., foto de Eduardo Kneese de Mello no site Arquigrafia; à esqu., perfil do Breaking Bad em Lego no aplicativo Vise
LiVros
Regina VateR: sobRe aRte e jaRdins Regina Vater: Quatro Ecologias, F10 Editora, Oi Futuro, 230 págs., R$ 68
imagem da obra ovo Cósmico (1980),poesia visual impressa em casca de ovo
SELECT.ART.BR
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Para o crítico britânico Guy Brett, a lentidão do circuito de arte brasileiro em dar o devido valor e evidência à obra de Regina Vater deve-se precisamente à sua multiformidade. “Essa independência é uma virtude”, escreveu Brett em texto para o livro Regina Vater: Quatro Ecologias, organizado por Paula Alzugaray. Com lançamento em dezembro no Rio de Janeiro, o livro vem preencher uma lacuna na bibliografia sobre a arte contemporânea brasileira. Resultado de dois anos de pesquisa e de uma curadoria no Oi Futuro Flamengo, em maio de 2012, o livro divide a obra da artista em quatro regiões, recorrendo às dinâmicas de sociabilidade, subjetivação, transformação e renovação implícitas em seus processos de trabalho, desde os anos 1970 até hoje. Concomitantemente, será lançado o livro Bill Lundberg, organizado por Alberto Saraiva, sobre a obra em vídeo do artista norteamericano, marido de Regina Vater. E, como resultado do processo de legitimação que o trabalho de Vater vive nos últimos anos, a Galeria Jaqueline Martins levará um projeto da artista para Frieze New York, em maio de 2014.
foToS: DivuLgAção
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C U LT U R A D I G I TA L
Um terreno na lUa Moon by Ai Wei Wei & Olafur Eliasson, www.moonmoonmoonmoon.com E se fosse possível delimitar um quadradinho na face da lua para chamar de seu? No mundo virtual, isso virou realidade pela imaginação de Ai Weiwei e Olafur Eliasson que, no projeto Moon, disponibilizaram para qualquer pessoa com um computador conectado na rede pequenas cotas de uma enorme lua virtual a serem preenchidas pela criatividade de cada um. Não há limite de participação: o usuário pode usar quantos quadrados quiser, basta criar uma conta. O processo é rápido e pode ser feito por login através de Facebook e Twitter, nos quais há a opção de compartilhar na timeline o desenho ou o texto. É possível criar desenhos microscópicos ou ilustrações maiores utilizando quadrados adjacentes, e conforme os espaços vão sendo ocupados, mais interessante vai se tornado a enorme figura lunar girando em seu eixo. A ideia dos artistas é criar uma obra relacional, em que os usuários conectam-se entre si em um movimento contínuo. Cada figura interage com as demais, em um jogo de acasos que vão se complementando. Como diz o texto de apresentação do projeto, “seu desenho é uma ligação entre você, todos os outros e o universo”. lPn
ARQUITETURA | DESIGN
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por Ricardo Oliveros
A escAlA dA renovAção É do diálogo entre antigas e novas estruturas que a urbe define seu destino. Numa época de intervenções polêmicas no Rio de Janeiro e São Paulo, é bom começar a se aprofundar sobre o assunto e participar dos Conselhos da Cidade para pensar qual o futuro que queremos. #Participar é a hashtag urgente do Urbanismo.
superkilen (copenhague) superflex Superkilen é um parque público em Nørrebro, um distrito de Copenhague, na Dinamarca. Projetado pelo coletivo artístico Superflex, com a colaboração de Bjarke Ingels Grupo e Topotek1, um escritório de arquitetura e paisagismo alemão. O parque destina-se a celebrar a diversidade. Repleto de objetos de todo o mundo, é concebido como uma espécie de exposição afetiva para os habitantes locais, que compreende um grupo de 50 nacionalidades, que contribuíram com suas próprias ideias e objetos para o projeto. Ao longo do percurso, que inova no uso de cores e nas surpresas dos trajetos, tem 108 plantas e objetos, que ilustram a diversidade étnica da população local. O Superflex desenvolveu um app onde é possível conhecer a história por detrás de cada objeto, quando você aponta o celular para cada uma das peças instaladas e ele reconhece a imagem.
centro cultural station red Bull (sP) Triptyque Localizado na Praça da Bandeira, o Red Bull Station ocupa a antiga subestação Riachuelo, desativada desde 2004. O prédio foi construído nos anos 1920 e tombado, desde 2002, pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp). O escritório Triptyque, que assina o projeto de arquitetura e reforma, e supervisionou os trabalhos de restauro do prédio, é responsável por intervenções contemporâneas - como as escadas externas e a marquise da cobertura, que vai criar um novo ambiente no topo do prédio, com vista para o Centro da cidade. A reforma também restaura e reativa um antigo chafariz que fica no topo do edifício. SELECT.ART.BR
OUT/NOV 2013
londres 2031 O plano de Londres para 2031 é um dos maiores planejamentos urbanos em curso, atingindo de forma integrada a economia, o ambiente, o transporte e a estrutura social. Ele leva em conta a intervenção de grandes áreas, especialmente com terrenos industriais abandonados e partes degradadas. Para se ter uma ideia da grandiosidade do Plano, somente em King Cross, uma das áreas escolhidas para intervenção, serão 50 novos edifícios, 2 mil novas casas, 20 novas ruas, 10 novas praças públicas, atingindo diretamente 45 mil pessoas que vivem, trabalham e estudam na área. Em outros lugares, arquitetos de renome internacional, como Renzo Piano e Terry Farrel, estão projetando os novos marcos da cidade. FOTOS: DIVULGAÇÃO
Interação na vIda real As redes sociais não revolucionaram somente a forma como nos comunicamos com o mundo. Diferentes produtos e gadgets são criados a partir de ações no Facebook, Twitter, Pinterest, Instagram e afins. Outros, aderem à lógica da “nanoaudiências” das redes ou exploram formatos mais confortáveis de estar conectado. De todos pontos de vista, uma coisa é certa: #interagir é a hashtag do momento no design.
aBSolUt originality Da forma como interagimos nas REDES SOCIAIS, costumizar a informação de forma pessoal se tornou uma rotina. Para individualizar ao extremo seus produtos, a vodca Absolut desenvolveu um processo (fusão em alta temperatura de uma gota azul cobalto adicionada ao vidro quando cristalizado) com resultados que não podem ser controlados, tornando cada garrafa única e exclusiva.
Fliiken (projeto da Start Up francesa Smiirl) O aparelho exibe em tempo real o número de “likes” de uma página do FACEBOOK. Basta conectá-lo à rede Wi-Fi e configurar sua conta no site. Pode ser usado em um escritório ou uma vitrine de loja, para mostrar a crescente popularidade e o sucesso de um negócio.
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tatuagem eletrônica A Motorola conseguiu registrar a patente de uma tatuagem eletrônica localizada no pescoço e que seria capaz de se comunicar via WIRELESS com um smartphone ou tablet. Ela poderia ter um microfone embutido para os comandos de voz e mesmo para atender uma ligação. Mais do que ficção científica, representa uma tendência de instalar chips embutidos na pele, pílulas com suas senhas digitais, na nova versão de ciborgue do século XXI. um guia de compras formado a partir das opiniões dos internautas.
topshop A campanha de Natal da “fast-fashion”inglesa Topshop é baseada no PINTEREST. A ideia é que os clientes possam “pinar” os produtos e compartilhar suas escolhas com amigos e familiares. As lojas de Londres e Nova York contarão com grandes telas touchscreen que mostram as peças que mais fazem sucesso na plataforma virtual e se transformam em um guia de compras formado a partir das opiniões dos internautas.
CONSUMO por Ricardo Oliveros
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Arte presente O mercado de arte no Brasil está em alta, tanto que movimentou cerca de R$ 1,3 bilhão, em 2012, de acordo com o relatório divulgado pela Fundação Europeia de Belas Artes. Mas você não precisa ser milionário para comprar uma obra para dar de presente a alguém muito especial, ou para começar uma coleção. Desde múltiplos de nomes consagrados até peças únicas de jovens artistas, existe muita coisa interessante para ser encontrada com valores até R$ 5 mil. A arte não serve para nada, no sentido de sua utilidade prática, mas, parafraseando o crítico e poeta Ferreira Gullar, arte existe porque o presente não basta.
regina silveira
Flora Assumpção A artista trabalha com temáticas relacionadas ao elemento natural e ao fantástico (sobrenatural). Na série Fósseis, evoca a forma de animais – principalmente de serpentes e répteis. Neste objeto em resina, ela elege a serpente, um dos animais mais representados em mitologias antigas, para preservar esse conhecimento ancestral. Série Fósseis 2012 Resina cristal e metal R$ 1.000 Galeria Emma Thomas (Tel. 11 3063-2193)
Clube Hall
Uma das artistas brasileiras contemporâneas de maior renome internacional, Regina faz instalações, objetos e obras bidimensionais e múltiplos, como o pendente Eye.
Clubes de arte são opções para começar uma coleção. No Clube Hall são cinco artistas a cada edição e os sócios têm direito a cinco trabalhos com tiragem de 50, assinados e numerados e acompanhados de um certificado de autenticidade. As obras são entregues bimestralmente no ateliê do artista com um bate-papo.
Eye (2013) , Objeto Pendente de prata. No centro do círculo, uma imagem que remete a um planeta azul, iluminado desde o interior por uma pequena luz de LED. Edição de 30. R$ 4,5 mil. Carbono Galeria (Tel. 11 4564-8400)
Vicente de Mello, Maçã Envenenada, da Série Quantas Asas Tem um Pixel? (2009) Backlight (Obra da segunda edição do Clube Hall). Anuidade R$ 5,4 mil ou em até 10 vezes.
SELECT.ART.BR
DEZ/JAN 2014
paulo Climachauska
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A arquitetura é um de seus grandes temas. No múltiplo Cadango, que consiste em uma marmita com o símbolo do Palácio da Alvorada, contendo um tijolo, o artista propõe uma reflexão sobre o que está na base não apenas do trabalho de Oscar Niemeyer, mas de toda a esfera do poder político. Candango, 2013 Marmita de alumínio e argila Edição: Ed. 40 (5/40) R$ 2.500 Galeria Leme (Tel. 11 3814-8184)
Artur Lescher Elipses fazem parte de uma série de obras de variadas dimensões que refletem a preocupação do artista com a relação entre a escultura e o contexto. Nesse múltiplo, a apreensão da forma se modifica a partir da posição do observador em relação à obra. Elipse Vertical (2006) resina preta ed 11/15 R$ 5 mil Galeria Nara Roesler (Tel. 11 3063-2344)
tales Bedeschi Matriz perdida é uma técnica de gravura em que uma mesma matriz dá origem a diferentes estampas em diversos estágios. Essa técnica foi desenvolvida por Picasso, por volta de 1958, devido às dificuldades que enfrentou ao decidir imprimir uma linoleogravura colorida com várias matrizes. Matriz Perdida Invertida I a VIII, 2010 Xilogravura,Tiragem 4 R$ 1,5 mil Gravura Brasileira (Tel. 11 3624-0301) FoToS: DIVULGAÇÃo
CONSUMO
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Bijari O trabalho do coletivo BijaRi é voltado às narrativas, discursos e antagonismos da paisagem urbana. Nas recentes manifestações públicas nas grandes cidades brasileiras, ganhou um caráter transcendental no múltiplo Poderes. A obra propõe uma reflexão sobre os papéis da polícia e da Igreja, sintetizadas em um só objeto. Poderes, 2013 2 tonfas de PVC, caixa de acrílico cristal de 8 mm com espaçadores de borracha 66 x 40 cm R$ 2,5 mil Choque Cultural (Tel. 11 2678-6600)
José Diniz O projeto fotográfico que José Diniz realizou sobre o mar ganhou o Prêmio Marc Ferrez da Funarte, em 2012. A série Maresia é composta de linhas de fortes geometrias, em contraste com a organicidade das ondas e marés. Série Maresia Pigmento mineral sobre papel-algodão Tiragem 1/6 R$ 2,5 mil DOC Galeria (Tel. 11 3938-0130)
SELECT.ART.BR
DEZ/JAN 2014
João Aires Ao percorrer milhares de quilômetros, o artista percebeu que a estrada é comparável a uma rede. Usando em sua pintura materiais recolhidos desse percurso, Aires realiza uma pequena arqueologia da imagem retratada. Ashes and Roads, Continuous and Segmented Trails 2013 Cinzas, carvão, areia, terra, acrílico sobre tela R$ 1,7 mil Myrine Vlavianos Arte Contemporânea (Tel. 48 3232-2234)
Leo sombra O artista usa papéis fotográficos vencidos e técnicas de pinhole. Em Banco na Floresta nos mostra como a imagem já produzida e apropriada pode ser ressignificada. Banco na Floresta, 2013 Tiragem: 1/10 Técnica: Fotografia em câmera compacta, negativo 35 mm/impressão jato de tinta sobre papel-algodão R$ 2 mil Galeria Mezanino (Tel. 11 3436-6306)
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Kevin simón Mancera A partir de um projeto de peregrinação por países da América Latina para encontrar a Felicidade, o artista colombiano Kevin Simón Mancera criou esse livro de artista com desenhos de sua experiência. Felicidade Edições Tijuana e Jardín Publicaciones, 2012 impressão off-set Edição: 400 exemplares 276 págs. R$ 120 Tijuana (Tel. 11 3138-1520)
renato Leal De longe uma paisagem, de perto uma infinidade de círculos que recobrem toda a superfície da tela. Por entre diferentes diâmetros e luminosidades, nosso olhar é conduzido para formar a imagem desta pintura de Renato Leal. S/Título, da série Oceano, 2013 Acrílica e nanquim sobre tela R$ 5 mil Central Galeria (Tel. 11 2645-4480) FoToS: DIVULGAÇÃo
LINKS
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Redes antissociais Nenhum homem é uma ilha, mas haja paciência para viver eternamente em conexão. Desenvolvedores de aplicativos, artistas e humoristas procuram contornar a situação com programas e projetos, a fim de garantir a reclusão dos mortais que não querem mais amigos nem precisam de seguidores.
Path
nextdoor
Rede social de imagens limita o número de compartilhamento de contatos a 150 por pessoa, apostando que menor quantidade implica melhor qualidade. https://path.com/
Anunciado como o aplicativo perfeito para monitorar e proteger sua família, é uma rede fechada que só permite que você se conecte com seus parentes e vizinhos. O cadastramento exige verificação de residência para garantir que seus círculos sejam apenas de conhecidos e amigos reais. Mami is watching you! http://www.life360.com/
Hatebook
Rando Plataforma experimental para compartilhamento de fotos, tem como público-alvo artistas e fotógrafos. Você posta uma foto e recebe outra de volta. Não admite comentários, curtidas ou coraçõezinhos encantados. http://ustwo.com/
Myfrienemies Parte do pressuposto de que as pessoas são mais honestas e têm mais afinidades a partir daquilo que não gostam. Encontre sua alma gêmea cadastrando seus “dislikes”. http://www.myfrienemies.com/ SELECT.ART.BR
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Hell is other People Use as armas das redes para livrar-se rapidamente dos seus amigos online nas ruas das cidades. Com este aplicativo, você visualiza, via FourSquare, onde eles estão e foge. Como dizia J. P. Sartre, “o inferno são os outros”. http://hell.j38.net/
Com o sugestivo slogan “os inimigos de seus inimigos são seus amigos, encontreos”, aqui você é convidado a difamar pessoas e leva de brinde a possibilidade de receber as piores fofocas sobre quem não gosta. http://www.hatebook.org/
nextt Radical, o Nextt é uma rede social (ainda em teste fechado) que tem todas as suas funcionalidades orientadas para o encontro das pessoas fora da internet. Seus desenvolvedores acabam de receber um aporte de US$ 700 mil. O lema do produto: #getbusyliving. http://www.getnextt.com/ FoToS: DIVULGAÇÃo
C O PA
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Foto de 2011 que enfoca dois irmãos batendo uma bola à beira do Lago Ness, na Escócia
BoLa de meia O fotógrafo Caio Vilela fez de sua visão da pelada de rua um projeto que se desdobra em livros e exposições ao redor do mundo Foi por acaso que o fotojornalista Caio Vilela começou a fotografar futebol – mais especificamente peladas de rua ao redor do mundo. Durante uma viagem ao Irã, em 2004, se encantou com moleques batendo bola diante de uma fachada islâmica na cidade de Yazd e largou seu lanche na mesa para fazer o clique. “Nem parei para caprichar muito, foi super de repente, queria registrar aquela cena”, conta. De lá para cá, a curiosidade pelas partidas amadoras de rua deixou de ser alimentada apenas por intervalos entre uma reportagem e outra e virou sua ocupação full time. Isso aconteceu quando o jornalista e editor Marcelo Duarte, outro aficionado pelo esporte bretão, ficou impressionado com as imagens de Vilela e o convidou para publicar seu primeiro livro, Futebol Sem foto: caio vilela
Fronteiras, em 2009, com mata-matas clicados em mais de 60 países. Ora, Bolas!, exposição no Museu do Futebol, em 2010, que contou com 37 imagens de Vilela, acabou por consagrá-lo como retratista oficial dos jogos amadores nos cenários mais improváveis, como as pirâmides do Egito e o Lago Ness, na Escócia. Com outro livro lançado no ano passado, Futebol-Arte do Oiapoque ao Chuí, enfocando só bate-bolas em território nacional, e a mostra A Bola É Um Mundo, que itinerou por unidades do Sesc-SP ao longo de 2013, Vilela é o cara no ano da Copa do Mundo brasileira. Sua agenda para 2014 está concorrida. Já tem previstas mostras nas embaixadas brasileiras, Roma em Pequim, no Ano Cultural do Brasil no Catar e no Consulado de Israel no Brasil. Tudo no primeiro semestre, no embalo da competição. Também inaugura entre maio e junho a mostra Futigrafias, no SescBelenzinho (SP), com fotos sacadas bem
de perto, de dentro das partidas, que vão ganhar ampliações gigantes. “E começo a fotografar meu projeto Donas da Bola, só com jogos de mulheres no Brasil”. Show de bola. LPN
PATROCÍNIO
No trabalho David (2013), o artista questiona a passagem do tempo e a duração da obra de arte
s u s t e n ta b i l i d a d e
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Nada se cria, tudo se traNsforma Na mostra Destino Traçado, Rodrigo Bueno reafirma sua poética de integração entre homem e natureza com imagens alteradas pela ação de organismos vivos
Destino Traçado, Rodrigo Bueno, até 11/1, Galeria Emma Thomas, R. Estados Unidos, 2.205, SP, www.emmathomas.com.br
Com uma poética comprometida com a ecologia e a sustentabilidade, Rodrigo Bueno coordena o Ateliê Mata Adentro, um galpão no bairro paulistano da Lapa, onde são articulados processos colaborativos com resíduos da cidade. São restos de madeira e elementos orgânicos que se transformam em móveis, esculturas, instalações e suportes para plantas, servindo também de tela para as pinturas. Ali, a força da natureza se impõe ao material construído pelo homem na forma de vegetação e animais, como insetos e fungos, que se esgueiram até mesmo nos objetos do artista. A partir da observação das traças, cupins e mofo invadindo seus livros de arte antigos, Bueno extraiu as imagens de sua mostra Destino Traçado, em cartaz na Galeria Emma Thomas. Ele incorpora esse movimento natural à cultura
humana, numa compreensão do mundo como um todo, em que as diversas esferas podem e devem conviver harmonicamente. Depois de fotografar as imagens modificadas pela ação natural, o artista emoldurou as fotos em caixas de madeira reaproveitada, nas quais foram inseridos novamente fungos, traças e cupins, continuando a deixar suas marcas típicas sobre elas. O resultado traz em si a reflexão sobre a passagem inexorável do tempo, os processos de vida e de morte e a transformação a que tudo está sujeito, até mesmo o produto da ação humana. Essas premissas também dão o tom da instalação criada a partir do espaço físico da galeria, em que a vegetação briga por seu espaço, dominando madeiras, objetos e fendas no concreto. LPN e Pa PAT RO C Í NI O
Foto: cortesia galeria emma thomas
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Co lu n a m ó v e l
Gilson schwartz
Facebook versus black blocs: Valor da iconomia No meio do saNduíche social coNtemporâNeo, Nós, iNterNautas, leitores, ativistas, artistas e cidadãos, ficamos à mercê de imageNs da sociedade que mais e mais Nos aproximam da coNdição purameNte espetacular. progresso é siNôNimo de hackear a rede social. entre o íntimo e o anônimo, o secreto vira público: da sociedade líquida à ordem wikilíquida, ícones e máscaras confundem-se em bailes e jogos de linguagem publicitária, científica e jornalística. onde está de verdade a sociedade? como ela é tão espetacularmente transformada e abduzida pela rede, pela voz e pela alma? todo facebook será castigado. Na sociedade do controle espetacular de volumes crescentes de informação (meus cliques, meus prontuários eletrônicos, minhas pizzas e fugidas para o sul de minas), o “big data” torna-se “big stick”. fala-se muito da agência Nacional de segurança dos eua e das escutas ilegais da correspondência eletrônica da petrobras e até da presidência da república. Na união europeia, a chapa esquentou com o lançamento aberto de suspeitas quanto às práticas de due dilligence (inspeção de contas) e fiscalização das autoridades financeiras norte-americanas. o fato é que a economia europeia está em pedaços, os estados nacionais resistem como podem ao receituário do fmi, que, como sabeSELECT.ART.BR
dEz/jAn 2014
mos há décadas, produz desnacionalização, concentração do poder econômico e doses cavalares de exclusão social. é o lado B ou negro da força, pois sem esse sacrifício no altar da ortodoxia financeira as empresas e os governos tornam-se incapazes de continuar vinculados ao circuito internacional de irrigação de dólares (a política kiwi do fed, uma espécie de wiki financeiro global às avessas). enquanto isso, nós, brasileiros, continuamos lavando a alma no facebook, gerando altas audiências para certas baboseiras no twitter (#prontofalei) e ganhando campeonatos mundiais de consumo de lixo digital, do gangnam style ao número de horas em games. algo mais está acontecendo nesse fluxo de informações sobre a própria forma de gerar novas arquiteturas de transformação social, e esse algo é de natureza econômica. é algo econômico novo que se apresenta nas redes sociais e, assim sendo, pode ser apropriado por empreendedores. a informação pode tornar-se capital na sociedade do espetáculo. Nessa sociedade fluida, associar valor a um ícone é a condição de existência social. quando apenas redes são capazes de produzir ícones, surge a iconomia. Na iconomia, a empresa que sabe criar e gerenciar redes sociais tem a chave da arca do tesouro do valor. os Black Blocs jamais serão desmascarados, mas nunca serão capazes de criar riqueza.
Plural na leitura. Independente no conteúdo. Nas bancas ou assine3.com.br istoe.com.br
Democrática, Plural & Independente ISTOÉ é uma revista democrática, plural e independente, que está disponível nos formatos impresso, tablet, web e celular. Conteúdo acessado de várias formas por mais de 1 milhão e meio* de formadores de opinião como você, Leitor. Porque opinião independente, você acessa no plural. *Fonte: Ipsos Estudos Marplan/EGM, 13 Mercados (janeiro a setembro/12). Projeção Brasil. IVC, Fevereiro/2013.
M U NM DO U NCDOOD ICFO I CDAI FDIO CADO
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A Internet é umA rede de computAdores pessoAs Mariel Zasso
Estima-se que 62% de todo o tráfego de dados na internet no Brasil seja realizado via redes sociais. Desde 2012, o topo do ranking é ocupado pelo Facebook. O fenômeno repetese em 50 países. Com mais de 1,15 bilhão de usuários e 37 escritórios ao redor do mundo, tornou-se a maior plataforma de compartilhamento de conteúdo. Mas nem sempre foi assim. Ativistas e artistas estão na origem do fenômeno das mídias sociais.
I N F O G R A F I A l U C a s r a M Pa Z Z o
ArqueologiA ArqueologiA dAs dAs redes redes sociAis sociAis 2004 - oRkut Começou como um projeto independente e continuou a ser desenvolvido por seu criador dentro do Google. O impacto da rede social no Brasil fez com que seu escritório principal desse produto específico passasse a ser em terras tupiniquins. Chegou a superar 34 milhões de usuários.
2003 - linkedin Inaugurando as redes “de nicho”, a nova rede social não tinha como foco a simples integração por afinidades. Promovendo a interação profissional, é a virtualização do “networking” e conta atualmente com 135 milhões de usuários.
2003 - MYspace “Um lugar para amigos”, o MySpace foi a primeira grande rede social: ao longo de três anos (2005 a 2008) manteve-se como a mais visitada do mundo e, em junho de 2006, superou o Google como site mais visitado nos EUA. A novidade era o grau de interatividade, com a possibilidade de inserir músicas, fotos e um blog personalizado na página de cada usuário.
2002 - FRiendsteR A primeira rede social que propunha conexão online entre amigos do “mundo real” chegou a ter 3 milhões de usuários, número alcançado em apenas três meses.
2003 - delicious Serviço de social bookmarks, inaugura as redes de troca de referências, onde os usuários seguem outros para ter acesso às suas sugestões de links, sejam textos, vídeos ou imagens.
2004 - Facebook Nasceu tímido, como “uma versão acadêmica do Friendster”. Só em 2009 ultrapassou o MySpace, e no ano seguinte passou a ser a rede social mais utilizada no mundo.
2005 - Youtube
colaboRativa... 2001 - Wikipedia O potencial colaborativo reunido na internet é a matéria-prima do acervo de mais de 30 milhões de artigos em 277 idiomas. Os Wikipedians, colaboradores voluntários da enciclopédia online, formam uma comunidade de mais de 1,7 milhão em todo o mundo.
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2004 - FlickR Serviço para armazenagem e compartilhamento de fotos, permite que o usuário crie um perfil pessoal e o utilize para adicionar contatos, formar grupos de interesse e trocar comentários.
O mais popular site para compartilhamento de vídeos também permite criar e seguir canais, playlists e fazer redes de contatos. A cada minuto, 100 novas horas de vídeo são disponibilizadas, enquanto 6 bilhões de horas são assistidas por mês. Dá uma hora por habitante da Terra.
USUáRIOS DE INTERNET qUE PARTICIPAM DE SITES DE RELACIONAMENTO
73 %
pRéhistóRia...
PORCENTAGEM DE EMPRESAS NO PAíS qUE POSSUEM PERFIL EM ALGUMA REDE SOCIAL:
PEqUENAS
MéDIAS
GRANDES
36 %
43 %
50%
no bRasil
1973 - bbs
1979 - usenet
Os BBS (Bulletin Board System) permitiam trocar mensagens, arquivos, conversar em chats, participar de fóruns de discussão e também jogos em rede. Um dos primeiros ensaios de ponto de encontro virtual, são o embrião das redes sociais online.
Com textos publicados pelos usuários e agrupados em categorias e assuntos, a Usenet funda a cultura geek, criando a ideia de comunidade virtual.
1988 - iRc (inteRnet RelaY chats) Primeiro protocolo de comunicação instantânea em grupo. Foi criado pelo programador finlandês Jarkko Oikarinen. Extremamente popular na década de 1990, tem canais (as salas de bate-papo) utilizados até hoje pelos saudosistas.
1991 - linux Foi também nos BBS e listas de e-mail que nasceu o Linux, sistema operacional construído e distribuído de forma colaborativa. Um núcleo de sistemas, o Linux foi escrito originalmente pelo finlandês Linus Torvalds em 1989. Compartilhado online em 1991, desde então vem sendo constantemente aperfeiçoado e reinventado com a ajuda de vários programadores voluntários através da rede – da Usenet à internet.
a Rede é social... 1999 - blogs
1996 - icq
Embora os blogs tenham surgido como diários online, acabaram por organizar comunidades em torno de temas. A “Blogosfera” define uma (ou várias) redes de blogs com forte componente de troca e interação, incluindo a troca de referências (“blogs amigos”) e comentários.
O primeiro “mensageiro instantâneo” bomba e alcança 4 milhões de usuários já em 1997, diminuindo a popularidade do IRC. Diferente do ancestral, ele permitia aos usuários buscas por novos (ou velhos) contatos selecionando características, para depois adicioná-los à sua rede.
2006 - tWitteR Rede social de microblogging, revoluciona ao propor atualizações breves de 140 caracteres. O uso subverte a função original e a perguntatítulo “o que você está fazendo?” é substituída por “o que está acontecendo?” Tem 225 milhões de usuários cadastrados, e uma média de 190 milhões de postagens por dia.
1994 - geocities Serviço de hospedagem gratuita de sites do portal Starmedia, foi um estouro de popularidade na década de 1990. Os sites eram agrupados em “bairros” e “cidades”, conforme seus temas, formando uma rede.
Redes Móveis e visíveis...
Fo ntes : htt p ://envi s i o ni ngtech.com/e nvisioning2012
1994 - FóRuns Evolução dos BBS, os fóruns são a versão web das listas de discussão em email, e até hoje funcionam agregando discussões públicas e reunindo interessados em torno de uma mesma temática.
1993 - Wiki Formato de texto que vale o tom da próxima era da web: colaboração ágil e, claro, hiperlinkada, de edição coletiva. Criada a partir de uma ideia do programador Ward Cunningham. “Wiki wiki” significa “extremamente rápido” em havaiano.
2009 - FouRsquaRe
2010 - instagRaM Um aplicativo que basicamente oferece um pacote de filtros para fotos torna-se o centro da comunicação baseada exclusivamente em imagens.
Rede social da era mobile, baseia a interação em check-ins em qualquer local onde a pessoa se encontre, recurso oferecido como facilitador de interação tête-à-tête, já que é possível saber quem está por perto.
2010 - pinteRest Inaugura nova era no social bookmark, na qual uma postagem sem uma imagem (ou vídeo) é uma postagem invisível.
http: //revistapiau i.estadao.com.b r/e dicao-4 3/so-no-site /ray-ku rz we il-e- o - m u nd o - q u e- nos- esp era
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M U NM DO U NCDOOD ICFO I CDAI FDIO CADO
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redes de ArtistAs Os primeiros coletivos online foram diretamente ligados ao surgimento da netart e outras formas de artemídia. BBSs, grupos de troca de e-mails e sites como o Nettime, The Thing, Syndicate e Rhizome, despontam em meados dos anos 1990 e constituem capítulo importante da socialização da internet. Vários de seus fundadores tornaramse artistas consagrados, curadores, diretores de museus, galerias e centros de mídia que mudaram os rumos da arte nas últimas duas décadas
1991 - the thing
1994 - alt.aRt.coM
1995 - nettiMe
Criada inicialmente como um BBS, no fim dos anos 1990, a comunidade já reunia websites de atores diversos, e o primeiro site dedicado à Net Art, o bbs.thing.net. Organizou diversos eventos sobre arte e novas mídias, privacidade na rede e robótica.
Grupo que utilizava a rede Usenet, foi o primeiro espaço de troca de alguns importantes articuladores da artemídia, como Mark Tribe, que viria a fundar a Rhizome.
Fundada durante a Bienal de Veneza, foi proposta como um espaço para experimentar uma nova forma de discurso crítico sobre e com as redes. Em 1997, a Nettime promoveu um de seus mais célebres encontros presenciais, na Documenta X, em Kassel, recebendo “100 convidados em 100 dias” no laboratório temporário Hybrid Workspace.
WolFgang staehle pioneiro da net art, iniciou suas pesquisas explorando a videoarte, ainda nos anos 1970. Em 11 de setembro de 2001, fazia uma captura para uma instalação em vídeo em Nova York quando acabou filmando o ataque ao World Trade Center. é diretor-executivo do The Thing e como artista é representado pela galeria Postmasters de Nova York.
geeRt lovink um dos teóricos do conceito de mídia tática, fundou em Amsterdã, em 2004, The Institute of Network Cultures (INC), centro universitário de pesquisa de mídia que é uma referência no campo.
uM dia no Facebook
80%
DOS USUáRIOS REGULARES DE FACEBOOK SãO DE FORA DOS EUA E CANADá
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70%
DOS ACESSOS A REDES SOCIAIS NO BRASIL SãO AO FACEBOOK*
DE 76 Milhões DE USUáRIOS NO BRASIL,
60% ACESSAM PELO CELULAR
4,5 bilhões DE CURTIDAS
4,7 bilhões DE POSTAGENS
10
bilhões DE MENSAGENS
1996 - RhizoMe Criada como uma organização para suporte à criação, apresentação, preservação e crítica das práticas artísticas emergentes envolvendo tecnologias, a comunidade Rhizome articulou-se por lista de e-mails, fóruns de discussão e rede social. Hoje tem uma sede física no New Museum em NY. rhizome.org
1996 FuRtheRField Criada em Londres, foca na “artware” – desenvolvimento de softwares para criar arte. Em 2004, cria uma galeria: a HTTP, que funciona fisicamente exibindo arte com novas mídias.
1996 - sYndicate Lista de discussão de artistas e ativistas, teve papel importante no desenvolvimento de redes de pessoas na Europa pósMuro e extinta em 2011.
2000 - canal conteMpoRâneo
2003 MetaReciclageM
2005 netbehaviouR
Maior rede de arte brasileira. Mobilizou a comunidade no caso da construção do museu Guggenheim no Rio de Janeiro e a legitimação das artes tecnológicas no Ministério da Cultura.
Atua de forma totalmente descentralizada e aberta em prol da apropriação crítica e da desconstrução da tecnologia, propondo transformação social através delas. Tem um conjunto extenso e difuso de “fundadores” – entre eles Felipe Fonseca, Hernani Dimantas, Tatiana Wells, Drica Veloso, Paulo Bicarato, Dalton Martins, Daniel Pádua, Cris Dias – e também já se desdobrou em outros “esporos”, projetos como o Descentro e o Mutirão da Gambiarra.
Reúne uma comunidade engajada nos processos de compartilhamento da rede, envolvendo abordagem crítica e métodos e ideias focados em torno das práticas de artemídia contemporâneas. netbehaviour.org/ Também fundada por Ruth Catlow e Marc Garrett.
MaRk tRibe é um
MaRc gaRRett
inke aRns acumula
patRicia canetti
artista que explora a intersecção entre tecnologia, arte e política. Atualmente ele é o chefe do Departamento de Pós-graduação em Belas Artes na School of Visual Arts, em Nova York.
midiartista, netartista, escritor e ativista, está por trás também da Furthernoise e da netbehaviour, comunidades sobre arte, tecnologia e hacking. Atua hoje como curador em diversas exibições de Media Arts.
vasto currículo como curadora independente, pesquisadora e autora, com foco em media art. é diretora do Hartware MedienKunstVerein, em Dortmund, Alemanha, desde 2005.
artista e ativista, desenvolve pesquisa sobre visualização de dados e cursa mestrado em Tecnologias da Inteligência e Design Digital na PUC-SP.
dalton MaRtins designer de redes sociais e pesquisador. Desenvolve tecnologias voltadas ao estímulo da aprendizagem e inovação.
tatiana Wells pesquisadora e praticante de projetos relacionados à produção digital colaborativa, tecnologias livres e experimentação com narrativas locais.
Ruth catloW artista e teórica, é hoje, além de curadora da Furtherfield, diretora na Writtle School of Design.
edneY souza em
paRa aléM do Facebook: Redes sociais alteRnativas As redes sociais alternativas garantem que o dono dos seus dados pessoais é você. projetos de software livre têm seu código-fonte público. Nelas é possível espiar “dentro da caixa” e saber exatamente como suas informações são tratadas diáspoRa
FacepopulaR
sneeR
n-1/loRea
Descentralização, liberdade e privacidade são os pilares desta plataforma, construída colaborativamente, com o código-fonte público, para criar várias redes. Ela armazena os dados pessoais no computador de cada internauta e foi pensada para ser uma alternativa livre ao Facebook. diasporafoundation.org
O antagonismo latino-americano aos EUA move a rede criada na Argentina, com servidores hospedados no país. A “alternativa bolivariana ao Facebook” utiliza Face no nome também como um acrônimo: “Frente Alternativa Contra o Establishment”. facepopular.net
Uma rede social onde o P2P (peer-to-peer, literalmente “par-apar”) é soberano: em lugar de um ou mais servidores como nós principais da troca de dados, uma estrutura descentralizada, não hierárquica, onde cada usuário funciona como um de seus múltiplos braços. sneer.me
Um “viveiro experimental de redes sociais”, o Lorea surge da necessidade de articulação online das Primaveras europeias de 2011. é uma plataforma livre que oferece uma ferramenta alternativa para a criação de redes de diversos movimentos sociais e grupos ativistas, como o N-1, que serviu para organizar as manifestações de diversos países. n-1.cc
soFtWaRe livRe. oRg/noosFeRo Iniciativa da comunidade brasileira de Software Livre, reúne funcionalidades de rede social, blogs, e-portfólio, e é desenvolvida sobre a plataforma livre Noosfero, que busca atualmente colaboradores para transformá-la em uma rede social federada. softwarelivre.org
2005 deixou o cargo de gerente de sistemas para viver apenas de seu blog, o InterNey.net. é consultor independente, professor e curador de eventos.
dRica veloso atuou no Mídia Tática Brasil, no Estúdio Livre, no projeto Cultura Digital do Ministério da Cultura, e hoje é especialista em Design de Interação na UNB.
Felipe Fonseca pesquisador e articulador de projetos relacionados a redes de produção colaborativa e livre, mídia independente, software livre e apropriação crítica de tecnologia.
heRnani diMantas artista e pesquisador, é autor dos livros Linkania: uma Teoria de Redes (2010) e Marketing Hacker (2003). Foi coordenador do Acessa SP e Acessa Escola.
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en saio
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A internet não esquece, mas o Facebook não nos deixa lembrar. Produzimos e publicamos em escalas de petabytes em serviços que podem desaparecer a qualquer momento. Que memória estamos construindo nas redes? Giselle BeiGuelman
As redes não têm tempo. nelAs prevAlece um regime de urgênciA permAnente. A publicAção mAis recente é, supostAmente, mAis relevAnte que A Anterior. o que conta é o agora. e esse agora é de uma intensidade cada vez maior. experimente encontrar aquele comentário tão importante postado por seu amigo 30 dias atrás no Facebook, aquela foto que você “curtiu” em algum dia remoto de 2012, ou aquele evento tão marcante, no qual você compartilhou um vídeo nos idos de 2008. nem tente. A não ser que você seja dotado de uma extrema paciência de Jó, turbinada por uma sorte de dar inveja ao gastão do Walt disney, não vai encontrar. tornou-se senso comum dizer que a internet não esquece. os escândalos relacionados à vigilância eletrônica assinam embaixo. mas isso está longe de signi-
Photography in Abundance (2011), do artista holandês Erik Kessels, que baixou e imprimiu todas as fotos postas no Flickr em 24 horas. FoTo: divuLgAção
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ficar que tenhamos direito de lembrar o que queremos e quando queremos sobre nós mesmos. o Facebook, a maior das redes atuais, não nos permite acessar nossa memória, apesar de, paradoxalmente, ser o lugar central por onde escoamos boa parte da nossa história pessoal e onde fatos marcantes recentes, como as manifestações de junho, no brasil, a primavera Árabe e a eleição de obama, foram estrategicamente articulados. e não pense que sua alardeada busca social vai resolver o enigma do “onde está aquilo que eu postei”, pois não é essa sua função. Ainda em versão fechada para teste e só disponível em inglês (é preciso cadastrar-se e ficar em uma lista de espera), tem como objetivo fomentar buscas contextuais, como “que músicas meus amigos estão escutando agora”, “restaurantes em londres em que meus amigos estiveram”, “pessoas que curtem ciclismo e que são da minha cidade”. em síntese, é uma busca semântica e não factual. seu mote é o presente e as relações dedutíveis a partir do seu círculo de amizades e não a consulta retrospectiva de caráter arquivístico. não que os modelos de catalogação e recuperação de dados tradicionais sejam melhores ou os únicos possíveis. eles são engendrados historicamente e respondem a formas de poder e a instâncias políticas, sociais e culturais que definem os critérios de conservação, as formas de institucionalizar os lugares da memória e o que fica ou não para ser contado como história. não à toa, o protagonista de um dos mais geniais contos de Jorge luis borges – o livro de Areia – escolhe justamente a biblioteca nacional para perder o livro que o atormentava. colocá-lo em uma prateleira qualquer era como ocultar uma folha em um bosque. Jamais poderia ser reencontrado. OverdOse dOcumental mas essa escala humana e contida por instituições é abalada hoje por uma overdose de produção documental sem precedentes na história. se há alguma dúvida com relação a essa afirmação, façamos uma comparação entre os volumes de dados armazenados no acervo da maior biblioteca do mundo – A biblioteca do congresso norte-americano – e a Wayback maSELECT.ART.BR
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Detalhe da instalação Face to Facebook (2011), de Alessandro Ludovico e Paolo Cirio, que extraiu 1 milhão de perfis do Facebook para alimentar um site de encontros virtuais
Entre o momento em que você abriu esta página e leu estas poucas palavras, 100 horas de vídeo entraram no YouTube. Nesse processo de canibalização da tela, emergem outras estéticas e também novos protagonistas sociais
A maior parte desses registros diz respeito a eventos fugazes e todos os analistas de marketing social são unânimes em mostrar que posts com fotos são os mais populares. várias pesquisas mostram que a maior parte do conteúdo compartilhado refere-se à própria pessoa. em diversos estudos de psicólogos afirma-se que há uma relação direta entre narcisismo, comportamento exibicionista e uso frequente de redes sociais. para paula sibilia, do departamento de estudos culturais e mídia da universidade Federal Fluminense, a questão é mais complexa e ambivalente. em seu livro o show do eu: A intimidade como espetáculo (2008), ela perguntava: “será que estamos sofrendo um surto de megalomania consentida e até mesmo estimulada? ou, ao contrário, nosso planeta foi tomado por uma repentina onda de extrema humildade, isenta de maiores ambições, uma modesta reivindicação de todos nós e de ‘qualquer um’? o que implica esse súbito resgate do pequeno e do ordinário, do cotidiano e das pessoas ‘comuns’? não é fácil compreender para onde aponta essa estranha conjuntura, que, mediante uma incitação permanente à criatividade pessoal, à excentricidade e à procura constante da diferença, não cessa de produzir cópias descartáveis do mesmo”. chine, um serviço do internet Archive que arquiva a internet diariamente. A Wayback machine, que é uma pequena parte do internet Archive, contém 3 petabytes de dados (o que equivale a cerca de 700 mil dvds lotados). A biblioteca do congresso, se tivesse todo seu acervo de livros digitalizado (32 milhões de volumes) teria 32 terabytes arquivados, considerando-se 1 megabyte por livro escaneado. A Wayback machine foi criada em 1996. A coleção de livros da bibilioteca do congresso é de 1815. A Wayback machine cresce 100 terabytes por mês, o que praticamente é três vezes, em bytes, todo o acervo bibliográfico da biblioteca do congresso acumulado em quase 200 anos. esses dados quantitativos, apesar de impressionantes, não contemplam o manancial de conteúdos postados nas redes sociais. entre o momento em que você abriu esta página e leu estas poucas palavras, 100 horas de vídeo entraram no Youtube. estamos em novembro de 2013 e é isso o que acontece em 1 minuto na internet. nesse mesmo espaço de tempo, cerca de 3.025 fotos foram postadas no Flickr, enquanto outros 20 milhões de imagens são visualizadas nesse mesmo serviço e 3.600 imagens são compartilhadas no instagram. o Facebook, um “planeta” de 1,15 bi de pessoas, registra, em um dia, a média de 650 milhões de publicações diversas. dessas, 350 milhões são fotos. dos 500 milhões de usuários do twitter, quase 300 milhões estão em atividade, postando diariamente uma média de 400 milhões de mensagens. FoTo: divuLgAção
nOvOs prOtagOnistas por outro lado, não se pode deixar de notar uma subversão essencial que reside nessas práticas. nesse processo de canibalização da tela, do qual tratamos em outra edição da seLecT (acesse a edição nº 6 no Arquivo em select.art.br), é indiscutível que outras estéticas emergem e também novos protagonistas. desde seus primórdios, no século 16, coleções pessoais, em geral, e imagens, em particular, estiveram diretamente relacionadas a instâncias de classe e gênero e significavam, acima de tudo, uma escala de força, sendo reservadas primeiramente a reis, aristocratas, papas e figuras sagradas e, depois, a políticos e burgueses abastados. Ao longo do século 20, as comunicações de massa expandiram sobremaneira o raio de quem podia se transformar em imagem publicada e passível até de ser arquivada, multiplicando a quantidade, o espectro social e cultural dos registros imagéticos.
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Abaixor, o pioneiro Listening Post (2001) , instalação de Mark Hansen e Ben Rubin, que reproduz em texto e áudio, conversas capturadas em salas de bate-papo e fóruns online. Na página seguinte, still do vídeo Mass Ornament (2009), de Natalie Boochkin, que compõe uma coreografia inédita, utilizando apenas imagens postadas no YouTube de pessoas dançando para as câmeras. Assista em http://vimeo.com/5403546.
Diante da avalanche midiática que produzimos cotidianamente no Facebook e em outras redes sociais similares, como escolher o que será guardado?
contudo, até o fim do século 20, restrições orçamentárias, “em sua sabedoria”, escreveu michel melot, uma das maiores sumidades mundiais em arquivística e biblioteconomia, impediam que as instituições literalmente transbordassem. em um artigo sugestivamente intitulado os Arquivos considerados como substância Alucinógena (1986), ele ponderava sobre o que aconteceria se cada cidadão se transformasse em colecionador e conservador e pudéssemos guardar absolutamente tudo em nome dos historiadores do futuro. chegaríamos a um paradoxo, conclui nesse texto,
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publicado na saudosa revista francesa traverses em número inteiramente dedicado aos arquivos (36): “A História enfim produzida exclusivamente para os historiadores e por eles mesmos bloqueada, como o cirurgião imobiliza seu paciente para poder operá-lo.” Afinal, pensar, como já aprendemos em outro conto de borges (Funes, o memorioso), é generalizar, não apenas arquivar e adicionar mais e mais dados. salve-se quem puder em um ensaio antológico – A operação Historiográfica – michel de certeau (1925-1986) fez uma concisa História da Historiografia e sintetizou em uma frase no que consiste essa operação: “em história, tudo começa com o gesto de separar, de reunir, de transformar em ‘documentos’ certos objetos distribuídos de outra maneira”. essa separação, contudo, é feita sempre posteriormente ao trabalho do arquivista, que é o responsável pela seleção e organização dos documentos que serão guardados em detrimento dos que serão descartados. mas, diante da avalanche midiática que produzimos cotidianamente no Facebook e em outras redes sociais similares, como escolher o que será armazenado? e como lidar com as dificuldades de manuseio das nossas
próprias memórias depositadas aí em ritmo alucinante e que se somam aos 55 milhões de fotos por dia publicadas no instagram (uma rede social de imagens que também é propriedade do Fb)? e se elas forem simplesmente deletadas por um erro de sistema ou descontinuidade do produto? As redes sociais não serão eternas e é possível que não comemoremos os 20 anos do Facebook. outros dispositivos virão. mas no tempo da apropriação corporativa da memória, em que o capital afetivo de nossas relações pessoais – exagero dizer “amizades”, certo? – flui pelos canais existentes do império de mark Zuckerberg, parece urgente perguntar: onde ficaram os suspiros, tristezas e felicidades que deixamos nas comunidades do orkut (a “velha” rede todo-poderosa do google)? é hora de pensar nisso ou salve-se quem puder.
O resgate do banal e do cotidiano na obra de cinco artistas
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CENAS COMUNS, IMAGENS EXTRAORDINÁRIAS L u c i a n a Pa r e j a n o r b i at o e Pa u L a a L z u g a r ay
Muito antes das redes sociais, dos reality shows, das webcaMs e dos sMartphones, a câMera de cineMa de alfred hitchcock já havia revelado que é nas frestas do banal e do coMuM que aconteceM os fatos extraordinários. Munidos de lentes telescópicas ou softwares de busca, artistas problematizam a cultura do espetáculo, desvendando seus mecanismos, revertendo seus efeitos, reinventando as relações sociais e propondo novos regimes de ver e ser visto. Wolfgang Tillmans: a foTografia relacional quando wolfgang tillmans começou a fotografar, nos anos 1990, o mundo ainda não havia sido inundado por registros feitos com smartphones. o calor e o frescor da vida cotidiana não escoavam em redes sociais, mas em revistas de cultura contemporânea, música, moda e comportamento, como a inglesa i-d. clubes, revistas independentes e fanzines eram os pontos nevrálgicos de uma rede social por onde circulavam jovens artistas, estilistas e designers. o retrato – mais precisamente o retrato de amigos e grupo social –, considerado por tillmans “uma troca humana direta” e “um ato artístico fundamental”, é a célula original das fotoinstalações que o artista desenvolve há duas décadas. organizadas nas paredes de forma não hierárquica, similar às redes, as fotoinstalações aproximam imagens de proceSELECT.ART.BR
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dências diversas: retratos, stills, naturezas-mortas, cenas da vida cotidiana, cartões-postais, clippings de suas próprias fotos publicadas em revistas e imagens abstratas, resultantes de manipulação química sobre papel fotográfico. na última exposição individual, central nervous system, realizada em novembro, tillmans aprofundou sua pesquisa sobre o retrato e, diferentemente dos trabalhos anteriores, organizou nas paredes da Maureen paley Gallery, em londres, imagens de uma só pessoa. a abordagem desse sujeito único, no entanto, continua sendo múltipla e constelar. ao fragmentar o corpo e a vida cotidiana de seu objeto em enquadramentos intimistas e generalistas, o artista opera com a mesma paixão amadorística, intenção jornalística e interesse científico implícitos em suas constelações fotográficas. Acesse galeria de imagens na edição tablet.
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Outer Ear (2012), fotografia da sĂŠrie recente de Wolgang Tillmans apresentada em Londres, aprofunda pesquisa sobre o retrato
FOTOS: wOLFgANg TILLmANS/CORTESIA mAuREEN pALEy, LONDRES
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Karl, Utoquai 9 (2012) é parte integrante da série que Tillmans exibiu entre outubro e novembro deste ano na Maureen Palley Gallery
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arne svenson: nas bordas da ficção realizada pelo fotógrafo arne svenson, a partir da visão dos moradores de um edifício em frente ao seu apartamento no bairro de tribeca, em nova york, a série the neighbours (2012) é frequentemente associada à pintura. suas imagens não raro despertam comparações com os chiaroescuro de caravaggio, os retratos íntimos de vermeer ou o voyeurismo melancólico de edward hopper. de fato, as barras metálicas das janelas do edifício, que atravessam o campo visual das fotografias em cortes bruscos, evocam o enquadramento da pintura, que no século 19 evoluiu para o quadro fotográfico. a alta definição das fotografias e sua meticulosa composição fazem com que se assemelhem a ficções cinematográficas. expostas lado a lado, essas imagens se comportam como stills de um filme da vida real, registrado ao longo de 18 meses. em sua crônica da vida cotidiana, svenson já retratou, em séries anteriores, presidiários e autistas. ao ser entrevistado sobre a decisão da suprema corte de nova york a seu favor em um processo movido pelos vizinhos fotografados sem consentimento, svenson declarou: “eu raramente, senão nunca, fecho minhas cortinas”. Acesse galeria de imagens na edição tablet
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Acima, Neighbours #1 (2012) e , à direita, Neighbours #28 (2012), fotografias da série de Arne Svenson realizada a partir da observação das janelas de um edifício vizinho
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FOTOS: ARNE SvENSON/CORTESIA JuLIE SAuL gALLERy, NyC
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Com a série Neighbours, que engloba a imagem ao lado, Svenson causou polêmica ao problematizar as fronteiras entre público e privado
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Acima, pinturas da série Notícias de Lugar Nenhum (Made in China) (2010), que incorpora fotos de pessoas diante da Cidade Proibida; à direita, instalação Search: Ericka (2009), realizada por Felipe Cama a partir da busca de uma pessoa real na internet
felipe cama: linha do Tempo invenTada felipe cama tem uma obra calcada em procedimentos da cultura das redes que evidenciam ambivalências de sua velocidade e de seu imediatismo. no trabalho search: ericka (2009), partiu de um nome para criar a biografia fictícia de uma pessoa real, em buscas no Google. “eu estava pesquisando que tipo de história a internet conta, por seu próprio meio”, explica. o resultado são 35 pinturas que dão forma aos dados encontrados. “nessas buscas sobre pessoas comuns, não se encontram tragédias. só há bons momentos, o que acaba padronizando todo mundo”, pondera. como se analisasse sua linha do tempo no facebook, o artista criou a série autorretratos estatísticos (2012), em que seus estados de humor, hemogramas e até as vezes em que esteve com a filha são computados em um certo período de tempo, transformados em gráficos e depois pintados ou impressos, em um resultado visual geométrico e, por vezes, construtivista, num jogo poético sobre o que define uma pessoa. na série de pinturas notícias de lugar nenhum (Made in china), de 2010, incorpora a ação em rede ao reunir diversas fotos de pessoas defronte à cidade proibida, da china (uma delas, um autorretrato), para depois serem executadas em óleo sobre tela por uma fábrica de pintura de lá. “encomendei as pinturas, 40 no total, paguei no cartão de crédito e em 20 dias elas chegaram. sem internet isso não seria possível”, diz. SELECT.ART.BR
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FOTOS: ROgERIO mIRANDA/CORTESIA FELIpE CAmA E gALERIA LEmE, Sp
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FOTOS: LAuREL NAkADATE/ CORTESIA LESLIE TONkONOw ARTwORkS + pROJECTS, NEw yORk
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laurel nakadaTe: a disTância enTre eu e ouTro no verão de 2011, laurel nakadate começou a convidar amigos do facebook – e amigos de amigos – para encontrá-la à noite, em cantos remotos dos estados unidos e da europa. desses encontros surgiu a série star portraits (2011), em que retrata seus interlocutores contra céus escuros, em longas exposições. no mesmo verão, a artista – nascida no texas e de origem japonesa-americana – fez um teste de dna para descobrir detalhes de sua origem materna. ao frequentar sites de correspondência com estranhos que compartilham do mesmo dna, laurel nakadate começou a conformar outro corpo de trabalho. relations series (2011-2013) é um álbum de familiares desconhecidos que retrata parentes genéticos distantes: mulheres, homens e crianças de backgrounds raciais, religiosos e socioeconômicos diversos, localizados em 31 estados dos eua. na pesquisa, nakadate teve a satisfação de descobrir, por exemplo, uma relação ancestral com a líder feminista anne hutchinson. star portraits e relations series investigam os espaços e as distâncias entre ela e os outros, reproduzindo um pouco o que acontece nas redes sociais, quando compartilhamos nossa identidade com estranhos. comprometidos com questões existenciais sobre solidão e sociabilidade, ambos os trabalhos dão continuidade a uma pesquisa que começou em 2000, quando a artista se autorretratava em interação com homens contatados em classificados de jornais. “nos meus primeiros vídeos, eu aparecia fisicamente no trabalho. nesses novos retratos, é meu dna que aparece no corpo de desconhecidos. de alguma forma, essas imagens são autorretratos modernos”, diz ela. SELECT.ART.BR
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Na página anterior, em sentido horário, fotografias da série Relations: Tyler, Texas #1 (2013); Carolina Beach, North Carolina #1 (2013); Gainesville, Georgia #1 (2013); St. Louis, Missouri #1 (2013). Acima, Tyler, Texas #1 (2013), de Laurel Nakadate
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A obra Fax Performance (1985), é um dos exemplos da utilização pioneira de meios tecnológicos pelo artista Paulo Bruscky, que já trabalhava com processos relacionais bem antes do advento da rede virtual
paulo bruscky: arTe em rede anTes da inTerneT “eu já fazia arte em rede muito antes da internet.” a afirmação não deixa dúvidas quando se sabe que seu autor é o recifense paulo bruscky, um dos pais brasileiros da utilização de novas mídias na arte. Mimeógrafo, xerocópia, correio, fax, e-mail e mesmo aparatos da medicina, como eletrocardiograma e eletroencefalograma, são “companheiros” nas experiências radicais do artista em busca de uma poética em total relação com a vida. “agradeço sempre às máquinas pelas parcerias criadoras. acho que o papel do artista é colocar ‘alma’ nas máquinas e subvertê-las de suas ‘funções’, trabalhando sempre com o acaso e a ousadia.” a dinâmica de troca que hoje vemos nas redes sociais circunscrevia-se às possibilidades de conexão via fax. na ação cobra de várias cabeças, bruscky protagonizou a primeira transmissão entre artistas no país, ao lado de roberto sandoval (1980). eles passaram 24 horas trocando fax com dez artistas de diferentes localidades, e cada um devolvia os fax recebidos com novas intervenções, gerando exposições distintas. apesar de seu pioneirismo na arte relacional, prefere ausentar-se do facebook e congêneres, argumentando que a potência política é pulverizada nas redes sociais. “não gosto, prefiro responder e-mails, é mais direto, não tem aquele monte de coisas supérfluas.” FOTO: CORTESIA gALERIA NARA ROESLER
P o r tPfo贸rLti f o贸 L i o
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Giselle BeiGuelman
Diretor de arte do Google Labs, o artista tem obras no acervo do MoMA e coloca a est茅tica dos bancos de dados no campo da hist贸ria da arte
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Pense nos Projetos mais interessantes que você viu na internet nos últimos anos. o videocliPe de the house of cards do radiohead e o “social film” dedicado a johnny cash (the johnny cash Project) vão estar entre eles. alguém vai lembrar também dos vídeos interativos do arcade fire (the Wilderness downtown e just a reflektor), as mobilizadoras campanhas colaborativas para produzir uma nota de u$ 100 com 10 mil centavos ou um coral de 2.800 vozes cantando daisy Bell pela internet (Bicycle Built for 2000). outras vão mencionar a escultura interativa do aeroporto de san jose (califórnia) que muda de
Na interveção, Light Echoes (2013), a passagem de um trem é documentada por uma projeção a laser que inscreve no solo o pulso dos dados
FOTOS: AARON KOBLIN & BEN TRICKLEBANK
cor, alimentada por dados de temperatura de várias cidades do mundo, ou o trem que ao passar escreve com laser nos trilhos a história do pulso dos dados. de portes e estilos muito variados, esses projetos todos têm um denominador comum: formas inusitadas de reinventar a narrativa audiovisual e um mesmo nome que se repete em todas as fichas técnicas, aaron Koblin. ocupando os cargos de diretor de criação ou de tecnologia em todos esses projetos, Koblin, 33 anos, é hoje o diretor do departamento de arte dos dados do Google e expressão maior do que o capital informacional pode gerar como dividendo simbólico e patrimônio cultural coletivo.
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Desenhos De DaDos
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aaron Koblin surpreendeu em 2008 quando gravou um clipe inteiro do radiohead utilizando apenas sensores e lasers e nenhuma câmera. Parceria com o diretor james frost, assinou a direção de tecnologia do projeto que criou o primeiro “music video 3d de dados” da história. lançado como projeto open source, rendeu indicações ao Grammy e ao British design museum awards. o código-fonte é livre e está disponível no Google code (https://code.google.com/p/ radiohead/), onde foi desenvolvido. no começo de outubro, novamente voltou ao laser, agora em parceria com Ben tricklebank, para realizar a série de fotos de longa exposição light echoes. a obra faz referência explícita ao fenômeno astronômico dos ecos de luz. nele, a luz de uma estrela que explodiu continua a se propagar para o espaço por meio de uma nuvem de poeira que a envolve, fazendo com que a luz reverbere como se fosse um eco. instalando um laser, montado em um guindaste feito especialmente para o projeto, que rola lentamente ao longo de trilhos de trem, projeta no solo uma imagem, pixel por pixel, registrando a passagem do trem na terra, depois de sua travessia, ou, como diz Koblin, documentando os dados na forma de luz, ecoando a matéria e a terra. light echoes retoma, em dimensões de land art, estratégias que se tornaram características da obra de Koblin, profundamente marcada pelo trabalho de dar visualidade aos dados, como feito no premiadíssimo flight Patterns, que mapeia o tráfego aéreo dos eua, por densidade, fabricante e modelo, e new york talk exchange (ambos de 2008). esse último, exposto no moma de nova york, quando ele integrava a equipe do seseable lab do massachusetts institute of technology (mit), mostrava o fluxo das conversas dos habitantes de manhattan com o mundo. no meio disso tudo fica a escultura dinâmica, como ele denomina, e-cloud. instalação feita em equipe que envolveu o designer nik hafermaas, do estúdio ubersee, e dan Goods, da nasa, ocupa a área entre os portões 22 e 23 do aeroporto internacional de san jose. É um conjunto de placas de policarbonato que oscilam entre a transparência e a opacidade, a partir de dados sobre a temperatura coletados, via internet, em tempo real, no mundo todo. SELECT.ART.BR
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FOTOS: AARON KOBLIN. NA págINA AO LADO: DIVULgAÇÃO
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Diversificados e cruzando diferentes linguagens, os projetos de Koblin combinam elegância formal com novos formatos narrativos
Na página anterior, imagens dos premiados projetos de visualização de informações New York Talk Exchange e Flight Patterns. Nesta página, frame do videoclipe de House of Cards, uma projeção a laser tridimensional
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De rebanho a multiDão outro traço relevante no conjunto da obra de Koblin são os processos colaborativos abertos à participação do público que transforma espaços de trabalho alienado em lugares de produção criativa e crítica. um deles é o mechanical turk da amazon, um sistema de crowdsourcing destinado ao uso corporativo, que permite às empresas disponibilizar tarefas simples online. os contribuintes são pagos, mas não sabem para o que estão trabalhando, mantendo-se concentrados apenas na tarefa que têm a desempenhar. foi justamente esse sistema que Koblin usou em the sheep market (2006) e ten thousand cents (2008). no primeiro, pedia que as pessoas desenhassem, usando um sistema de ferramentas básico disponível no website do projeto, uma ovelha virada para a esquerda. os “trabalhadores” receberam apenas 2 centavos para o seu trabalho e não foram autorizados a criar mais que cinco ovelhas. em 40 dias, Koblin recebeu 10 mil ovelhas. o sistema não recebe mais colaborações, mas o alegre rebanho segue online e as ovelhinhas estão à venda por u$ 100 cada uma e os lucros são doados a associações de caridade. o mesmo sistema foi usado um ano depois e ten thousand cents, projeto desenvolvido com takashi Kawashima, pagava 1 centavo a cada pessoa que pintasse uma pequena área de uma superfície retangular, sem que ela tivesse ideia do que seria feito com isso, nem do que faziam as outras pessoas que se engajaram no processo. elas estavam pintando uma reprodução de uma nota de u$ 100 feita a praticamente “10 mil mãos”. a nota, de tamanho de impressão variável, quando ampliada, revela a diversidade de padrões usados pelos colaboradores anônimos e um vídeo registra interessantes close-ups de cada microrretângulo da cédula pixelizada. o projeto, indicado a prêmios do porte do south by southwest e internet creative award, promovidos pelo yahoo japão, explora, segundo seus artífices, “as circunstâncias em que vivemos, numa combinação inexplorada de mercados de trabalho digitais, crowdsourcing, economias virtuais e reprodução digital”.
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The Sheep Market (2006) e Ten Thousand Cents (2008) são obras de arte online desenvolvidas com a participação de 10 mil pessoas cada, utilizando uma plataforma corporativa de crowdsourcing
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Vários projetos de Koblin são processos colaborativos que exploram de forma inusitada e criativa as dinâmicas do capitalismo informacional
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teia De imagens complexo, o capitalismo contemporâneo é também cognitivo e por isso depende e engendra uma teia de saberes e trocas de inteligências distribuídas. quem desabrocha um ramo na história do outro pode plantar a sua própria árvore. É o que se conclui a partir de exquisite forest (2012), de Koblin e seu parceiro em mais de uma empreitada, o diretor de cinema chris milk. Projeto realizado a partir de uma parceria deles com a tate modern e o Google labs, é uma plataforma em que qualquer um pode criar uma pequena animação, desde que ela, literalmente, brote de uma história já criada por alguém. representadas por árvores, as narrativas constituem os frutos de um processo de colaboração coletiva, no qual cada ramo é uma micro-história particular e pode ser a semente de uma nova árvore, como já fizeram artistas de renome. alguns milhares de pessoas já passaram por aqui, entre elas olafur eliasson e casey reas. todos assinam suas criações e as liberam sob licença creative commons para serem readaptadas por alguém. essa habilidade de envolver criadores de diferentes perfis para reinventar a história da narrativa audiovisual é um dos trunfos de Koblin. que o digam o genial the johnny cash Project e the Wilderness downtown, ambos de 2010, e parcerias com chris milk, em que assina, respectivamente, as direções de criação e tecnologia. no primeiro, somos convidados a desenhar, a partir do site do projeto, sobre um dos inúmeros retratos de johnny cash disponíveis ali. o desenho é integrado como um dos frames de um interminável videoclipe
Acima, imagens do videoclipe de lançamento de The Wilderness Downtown (2010), do Arcade Fire, que usa imagens do Google Maps relacionadas ao local do nascimento de quem está assistindo ao clipe. À esquerda, versão instalativa de Exquisite Forest (2012), parceria com Chris Milk apresentada na Tate Modern (Londres)
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da música ain’t no Grave do mestre do folk norte-americano. É possível assistir linearmente e mergulhar nas diversas camadas das imagens e visualizar o seu processo de desenvolvimento (desenho). no segundo, the Wilderness downtown, Koblin e milk inseriram seu nome na emergente história do vídeo depois do tubo. convenhamos, tanto se fala na revolução do vídeo depois do youtube, no fim dos modelos tradicionais de televisão e, no final das contas, o que se vê? uma penca de vídeos lineares, que, na melhor das hipóteses, reproduzem o modelão televisivo. sem dúvida que a produção de séries alternativas para web, como as da Porta dos fundos, várias disponíveis na netflix, e esquemas independentes de cobertura jornalística ao vivo, como os feitos pelo mídia ninja, são fatos importantes da história do audiovisual online, especialmente no que diz respeito a novos modelos de produção e distribuição. contudo, do ponto de vista estético, das transformações nos modos e nos regimes de olhar, de perceber e interagir com as imagens, o que eles trazem de novo? É para essa direção que the Wilderness downtown aponta.
Obras audiovisuais como The Exquisite Forest e The Wilderness Downtown apontam para onde vai a imagem depois do tubo
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Just a Reflektor, videoclipe interativo do Arcade Fire, coloca a imagem na era do veja com as mãos, assista com o corpo todo
Acima, imagem de Just a Reflektor (2013), manipulado pelo público com o uso de celulares. A direira, frames de The Johnny Cash Project, tributo colaborativo ao mestre do folk norteamericano (2010) SELECT.ART.BR
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feito para o lançamento do disco homônimo do arcade fire, é um projeto que explora as potencialidades do vídeo em rede, aproveitando os recursos do browser. tendo a faixa We used to Wait como base, exploraram-se as possibilidades de jogar com a cidade em que o “espectador” (na falta de melhor palavra) cresceu, misturando imagens e dados desse local à música. satisfeita, a banda rearticulou a parceria em setembro deste ano para o lançamento do álbum reflektor, que tem direção-geral de vincent morrisset e de criação de Koblin. nesse vídeo interativo, transforma-se a webcam do computador de quem assiste em um olho maquínico. esse “olho” nos liga à história de uma mulher, protagonista do clipe, que transita entre o seu mundo e o nosso. Por meio de um código rastreador – uma senha que se recebe ao se entrar no site e que se deve digitar no celular – o site de reflektor conecta-se ao nosso dispositivo. ao apontar o celular para a webcam, ele é refletido na luz da câmera e se comporta como se fosse um pequeno projetor. a tela se transforma em um espelho (ou, literalmente, um refletor) e, conforme movimentamos o celular ou o mouse, efeitos se produzem nas imagens. Para completar, imagens captadas no haiti e som na caixa. foi dada a largada para a era do audiovisual do veja com as mãos, assista com o corpo todo. Acesse os projetos em aaronkoblin.com e confira galeria de imagens na edição tablet
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S E xo
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AzArACão Ao AlCAnCe de um dedo
L u c i a n a Pa r e j a n o r b i at o F oTo S L u D oV i c c a r È M e
Aplicativos de relacionamento são um Easy Taxi do sexo
Grindr, Tinder, Bender, Scruff, HorneT, Badoo, Brenda, neenBo etc., etc., etc. a lista de aplicativos de relacionamento para celulares e tablets é interminável, mas o princípio é sempre o mesmo: se dar bem no jogo da sedução e encontrar um parceiro, seja do sexo oposto ou do mesmo sexo, seja para sexo ou para algo mais. alguns são campeões de popularidade, caso do Grindr, para homossexuais masculinos, e do Tinder, para heterossexuais. Brenda, para meninas homossexuais, tem a desvantagem de não ter versão para android, apenas para o sistema ioS, mas não é o único para esse público. compete com títulos como Girls date Girls e Lesbian dating. até aí, inês é morta. desde as agências de matrimônio da “era in loco”, sempre existiu quem quisesse dar uma mãozinha ao destino para achar sua cara-metade. a partir do advento da internet, as possibilidades se ampliaram exponencialmente. Quem não se lembra das “pré-históricas” salas de bate-papo dos portais nos anos 1990, ou dos posteriores sites de relacionamento, como o Par Perfeito? em 2004 vieram as redes sociais e virou bagunça. Quem nunca recebeu ou deu uma cantada via orkut, de olho nas fotos do(a) gatinho(a) do perfil ao lado (que quase sempre não era da lista de amigos) que atire a primeira pedra. da mesma forma que o facebook aperfeiçoou várias funções do orkut, permitiu que a azaração online se emancipasse, com mensagens inbox e solicitações de amizade cheias de segundas intenções, além de um display de fotos mais convidativo e da timeline dando pistas sobre quem é o alvo. então, qual é a vantagem dos aplicativos? SELECT.ART.BR
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Ricardo Luz faz parte do time de heterossexuais que não buscam só sexo no Tinder, mas querem conhecer gente para “ver o que rola”
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O contador Marcelo Nabas sentiu diferença no uso do Grindr no Brasil e no exterior: “Aqui o povo quer sexo diretamente, tem pressa”
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A praticidade de escolher possíveis parceiros pela localização geográfica é o maior atrativo de aplicativos para celular como o Tinder
além da gratuidade e da “portabilidade” via celular ou tablet, a seleção de possíveis parceiros pela localização geográfica é o maior atrativo das mais famosas entre essas ferramentas de busca, como Grindr, Scruff, Girls date Girls e Tinder. esteja onde estiver, o localizador GPS do celular é ativado e aponta potenciais parceiros em diferentes raios, dependendo do aplicativo utilizado e da seleção do usuário, seja em Manaus, seja em nova York. o que muitas vezes leva o integrante a buscar sexo de cara, sem meias-palavras. “Lá fora, usa-se (os aplicativos) com a finalidade de conhecer pessoas; se rolarem afinidades, partimos para o sexo. na itália e na espanha, fiz amigos. Já aqui o povo quer sexo diretamente, tem pressa”, afirma o contador Marcelo nabas, 43 anos. ele conheceu os aplicativos Grindr e Scruff, para o público gay masculino, no período em que morou em Madri, em 2011, por intermédio de um amigo. “Mas prefiro conversar primeiro. Quando eu quero sexo direto, vou a uma sauna”, escancara. como no universo “fora da tela”, o mundo gay é mais atirado na procura de sexo. “no Tinder não é tão direto. Você pode ser, mas nem sempre vai ser bem recebido. Se você chegar lá com um pouco mais de calma e conversar o mínimo, aí evolui melhor”, explica Pedro*, 22 anos. ele começou a usar o aplicativo depois do fim de um relacionamento, há cerca de três meses. admite que o primeiro interesse da maioria dos homens que usam o aplicativo é sexo. “Mas, se do sexo evolui pra outra coisa, aí é diferente.” como quando conheceu uma garota em uma viagem ao rio de Janeiro e saíram mais de uma
vez, sexo incluso. até a namoraria, não fosse a distância (ele mora em São Paulo). Mas há rapazes heterossexuais que dizem não fazer da busca do sexo uma premissa no uso dos apps. ricardo Luz, 27 anos, acha que quem usa o Tinder com essa única finalidade está perdendo outras oportunidades. “não acho que esse seja o objetivo final; se é que existe algum, acho que é conhecer pessoas novas, mesmo, e ver o que rola.” Para Malu*, 30 anos, um dos fatores que levam as mulheres a um comportamento mais inibido é a segurança, o que não tem necessariamente a ver só com usuários de aplicativos, mas com qualquer homem que se acabou de conhecer. “uma mulher ir sozinha à casa de um estranho é sempre perigoso, pois, assim como com um homem também pode acontecer algo ruim (em um encontro) com uma mulher ou com outro homem. Mas historicamente… dois homens não se sentem tão vulneráveis quanto uma mulher que está com um homem”, avalia. Gafes na rede o Tinder tem um irmão bem mais explícito no facebook, o Bang With friends, que em maio último lançou versões em android e ioS. o usuário escolhe entre seus amigos aqueles que gostaria de levar para a cama e, quando o amigo em questão usa o aplicativo e também o seleciona, ambos são informados e podem correr com as tratativas para o encontro se realizar. com o epíteto em português “Para de conversa e vai logo dar um tiro na coruja! com qual dos seus amigos você quer dar um bang?” e um logo-
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Micos são comuns entre quem usa os apps, desde a pessoa escolhida não ser bem aquilo que se via na foto até encontros entre conhecidos
tipo pra lá de direto, o aplicativo não quer saber de eufemismos, embora já conte com a opção de selecionar amigos com quem se quer sair, mas não exclusivamente para sexo. apesar de apregoar sua discrição, pois o usuário só sabe quem tem interesse nele se também estiver interessado na pessoa (assim como nos outros apps), uma ferramenta do próprio facebook revelou os usuários do aplicativo em maio deste ano. Micos são comuns entre quem usa os apps, desde a pessoa escolhida não ser bem aquilo que se via na foto até encontros entre conhecidos. “É engraçado cruzar com gente que a gente conhece. dá medo de dar ‘like’ e ver se a pessoa gosta de volta. e se não gostar, já pensou!?”, diz a jornalista adriana rossatti, 37 anos, usuária do Tinder. ela reclama que, assim como na vida real, os rapazes são pouco proativos na hora de evoluir da conversa – etapa posterior ao usuário ter gostado de alguém e receber o aviso de que esse alguém também está interessado – para a vida real. “o cara te adiciona no fB, curte umas fotos, conversa umas vezes pelo chat e não toma uma atitude. e na boa, acho deprê demais ficar implorando para o cara me chamar para sair”, diz. Sem contar os muitos perfis em que se identificam pessoas comprometidas. Às vezes, isso pode comprometer o relacionamento. usuário do Grindr e do Scruff, foi pelos rastros da instalação do segundo em seu celular, mesmo depois de ter deletado o programa, que renato* quase perdeu o namorado de longa data. “Lógico que com tanto tempo de namo-
ro você fica cansado do arroz com feijão. um dia saímos para jantar e ele usou uma desculpa qualquer para olhar meu celular.” esperto, o namorado buscou a evidência da instalação do Scruff no sistema operacional do celular. “o Grindr não tem isso”, explica. a maior crítica de renato* quanto aos apps está ligada à questão da autoestima. Segundo ele, muitas vezes, quando alguém manda fotos de rosto, a pessoa com quem se está conversando bloqueia o outro se ele não tem uma beleza-padrão. “do outro lado da tela você tem uma pessoa com sentimentos que, quando foi te dizer oi, apostou fichas em você por esperar encontrar alguém legal ali. ela, definitivamente, não quer ser bloqueada sem nem ter a oportunidade de dizer algo ou mostrar quem realmente é.” o comentário mostra uma realidade dos aplicativos: nem todo mundo se dá bem no mundo virtual. até mais que na paquera feita pessoalmente, a aparência conta muito nos apps, pois é a primeira triagem pela qual passam os candidatos. Pensando nisso, o aplicativo carrot dating criou uma forma de possibilitar encontros por meio da oferta de presentes, jantares e afins, como forma de atrair a parceira. resvala na ideia machista de que as mulheres querem alguém que tenha dinheiro e pague a conta. Seja ao vivo, seja virtualmente, os meandros da conquista de um parceiro são imprevisíveis. difícil é combinar casais...
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*Os nomes com asterisco são fictícios; o entrevistado preferiu não ser identificado
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Leia a crítica sobre o app Tinder em: http://bit.ly/1aTTbBV
A falta de proatividade dos rapazes na hora de partir do chat para o programa cara-a-cara ĂŠ a queixa da jornalista Adriana Rossatti
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MídIA
M A R c O S A u G u S t O G O N ç A Lv E S , d e N OvA YO R k 78
Praças eletrônicas globais onde todos se encontram, o Facebook e seus congêneres consolidaram uma nova e irresistível maneira de o leitor se relacionar com os jornais I L U S T R A Ç Ã O S E R G I O R O M AG N O L O
Na versão tradicioNal da fábula dos três PorquiNhos, o lobo Mau, dePois de destruir, coM seu Poderoso soPro, as casas de Palha e Madeira de dois dos fofos suíNos, Não obtéM o MesMo sucesso coM a coNstrução de tijolos do terceiro. tenta então entrar pela chaminé, mas é recebido na lareira com um caldeirão de água quente, onde acaba caindo para ser cozido vivo. é desse ponto que parte um festejado comercial do diário britânico the Guardian, vencedor do leão de ouro do festival de cannes de 2012. o filme começa com uma manchete de primeira página da print edition do Guardian: “lobo Mau cozido vivo”. em ritmo de cinema de ação, a polícia invade a casa e prende os porquinhos. a notícia, claro, causa furor na internet. “Na verdade, eles são as vítimas”, resume uma blogueira indignada, em meio a um festival de posts e tuitadas sobre o caso. Na sequência, surge a versão de que o lobo Mau seria asmático, o que o impediria de assoprar as duas casas. No julgamento, os porquinhos terminam por confessar que não tinham condições de pagar suas prestações e armaram uma farsa para receber o dinheiro do seguro. o inesperado desfecho provoca SELECT.ART.BR
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uma onda de passeatas e protestos contra os bancos e suas taxas de juro. No fim, o slogan do jornal: “the Whole Picture” (o quadro inteiro). a ideia do comercial é promover o conceito de “jornalismo aberto”, ao qual o Guardian se associa para difundir sua imagem no ambiente interativo da blogosfera e das redes sociais. espécies de praças eletrônicas globais onde todos se encontram ou podem se encontrar, o facebook e seus congêneres consolidaram uma nova e irresistível maneira de se relacionar. ali se pode fazer, como se sabe, quase tudo: trocar receita de bolo, publicar fotos, postar comentários brilhantes ou estúpidos, organizar manifestações públicas e também ler notícias. uma pesquisa do Pew research center, em colaboração com a john s. and james l. Knight foundation, mostrou que 64% dos adultos que vivem nos estados unidos usam o facebook e 30% “sempre” consomem informações jornalísticas no site, mesmo que não seja esse o propósito original. como sintetizou um dos entrevistados, “o facebook é uma boa maneira de encontrar notícias sem precisar, na verdade, procurar por elas”.
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“Tratamos como uma prioridade e temos tido muito sucesso em fortalecer nossa leitura por esse caminho. O resultado tem sido um aumento dos níveis de adesão ao nosso site – o que inclui mais tempo gasto, mais textos lidos, mais vídeos assistidos e mais anúncios vistos”, diz Linda Zebian, do New York Times
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Em premiado comercial do jornal britânico The Guardian, internautas protestam contra a prisão dos Três Porquinhos. A idéia do comercial é promover o conceito de “jornalismo aberto” SELECT.ART.BR
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Ferramentas de audiência “Mesmo que os veículos não coloquem seus conteúdos lá, o público vai fazer isso”, diz o jornalista ricardo anderáos, diretor de redação do brasil Post, versão nacional do agregador de conteúdos e tabloide online huffington Post, que será lançado em janeiro. “Não apenas os jornais, mas nenhum de nós tem a opção de ficar fora desse jogo, a menos que não nos importemos de viver como eremitas”, completa. linda Zebian, manager da área de comunicações corporativas do New York times, diz à seLecT que as redes sociais são consideradas muito importantes pelo jornal. “Nós tratamos como uma prioridade e temos tido muito sucesso em fortalecer nossa leitura por esse caminho. o resultado tem sido um aumento dos níveis de adesão ao nosso site – o que inclui mais tempo gasto, mais textos lidos, mais vídeos assistidos e mais anúncios vistos.” o diário nova-iorquino, contudo, não segue a mesma cartilha do Guardian, bastante liberal na abertura do noticiário para o público online. sua estratégia, lançada com êxito em março de 2011 e logo copiada por outros veículos, é conhecida pelo esquisito nome de “paywall poroso”: a partir de um determinado número de acessos livres, quem não é assinante esbarra num “muro” e é convidado a começar a pagar pelo que quiser ler. com esse sistema, o jornal pode selecionar conteúdos para liberar no facebook e no twitter, sem abrir mão de seus interesses comerciais. “acreditamos que as redes são fundamentais para nos mantermos como uma parte aberta da web e da conversa global. isso é mais verdadeiro quando se tem em conta o nosso modelo de assinatura digital. todos os nossos links nas redes sociais são gratuitos. temos mais seguidores do que a maioria das empresas de comunicação – cerca de 9,9 milhões no twitter e 4,2 milhões no facebook”, diz Zebian. sérgio dávila, editor-executivo da folha de s.Paulo, acredita que a relação entre os jornais e as redes é, ao menos por ora, um jogo do tipo “ganha-ganha”. “Por um lado, elas oferecem uma grande quantidade de conteúdo produzido graciosamente por seus usuários, mas de baixo valor agregado. o conteúdo de qualidade vem todo da mídia chamada tradicional, que eu prefiro chamar de profissional”, diz ele. em contrapartida, essa mídia “ganha audiência por estar presente em sites como facebook e twitter”. um ponto, porém, na visão das empresas jornalísticas, ainda permanece, segundo dávila, “polêmico”: “as redes sociais monetizam tanto os comentários pessoais dos usuários quanto o conteúdo da mídia profissional, mas FOTOS: REpRODuçãO
não remuneram nem um nem outro pelo uso”. acossados na luta pela sobrevivência por essa espécie de explosão cambriana que ocorre no território das comunicações, os jornais enfrentam uma situação parecida com a que foi vivida pela indústria fonográfica, quando viu o conteúdo de seus cds se transformar em banana na feira livre da internet. ricardo Gandour, diretor de conteúdo do Grupo estado, diz que a mídia, embora se beneficie da audiência das redes, “só tem a perder” em suas receitas de publicidade. “isso porque elas se apropriam da carteira de clientes (fãs, curtidores) dos veículos (e de todas as empresas) e passam a comercializar publicidade com e entre eles”, diz. caminho sem volta Pouco inclinada a ver benefícios no trânsito indiscriminado pela web, a direção do jornal o Globo decidiu-se por uma estratégia menos flexível – não libera seu material nem no facebook nem no twitter. ascânio seleme, diretor de redação do jornal, considera que as redes “usufruem muito mais” dos grandes produtores de conteúdo do que o contrário. “o facebook concorre com os jornais na busca de publicidade em razão do enorme alcance que tem, mas também graças ao conteúdo que não produz, mas distribui”, diz seleme. anderáos, que há anos se dedica ao jornalismo na esfera digital, tem, naturalmente, menos apreensões. “enquanto os jornais se comportarem de maneira tradicional, encarando as redes sociais e outras plataformas digitais como ameaças que podem ser evitadas, sem dúvida facebook, Google+ e congêneres vão levar a melhor”, aposta. “redes sociais e outras plataformas digitais realizaram o potencial da internet: colocar a tudo e a todos em rede e converter qualquer coisa em dados, digitalizando conteúdos, transações e relacionamentos. assustador talvez, eu concordo, mas inevitável.” Para quem quiser se manter vivo, a única saída, em sua opinião, é “adotar a lógica de rede” de maneira radical. “qualquer outra opção não passa de suicídio. um suicídio mais lento e mais sangrento quanto maior for o tamanho do veículo em questão.” tudo indica que, no futuro, vai restar pouca vida para os jornais fora da internet. o fato, no entanto, é que eles ainda não encontraram modelos seguros capazes de bancar operações abertas no ambiente online. Por paradoxal que possa parecer neste admirável mundo cibernético em que vivemos, a velha plataforma de papel, mesmo em declínio, ainda é uma fonte estratégica de receita publicitária para a imprensa tradicional. Não é muito difícil formular hipóteses ou lançar profecias sobre o que virá, mas saber exatamente quando e como esse dilema será superado ainda é um enigma a se decifrar.
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M o da / t e c n o lo g i a
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Vestidos para conectar Interfaces ligadas ao corpo apontam para a associação do nomadismo tecnológico ao circuito da moda
A roupA no seu Aspecto mAis simbólico, desde A AntiguidAde, representA Algum Aspecto dA conexão. se nA religião As vestes sAgrAdAs se conectAm com plAnos superiores, desde o século 15, quando a moda surgiu, ela serve como elemento de identificação e diferenciação de uma determinada classe ou, mais recentemente, de uma tribo contemporânea. Agora, temos o desejo de vestir a tecnologia para estar no mundo. Assim como a arte estabeleceu relações com a tecnologia, a moda agora é concebida não só por um autor, mas pelas conexões que estabelece com engenheiros. A tecnologia passa a ser uma interface vestível.
RicaRdo oliveRos
Dervixes roDopiantes (1273) os dervixes, uma ordem sufi fundada pelo místico turco mevlâna celaleddin rumi, realizam a sema, desde a morte do mestre, em 1273. o ritual consiste em movimentos circulares em torno do seu próprio eixo, representação do movimento cósmico dos planetas. A ampla saia branca simboliza a morte transitória que leva à verdadeira vida, o chapéu cônico representa a destruição do ego, que impede o contato com o sublime. rumi acreditava que a música e a dança seriam um meio de conduzir o homem a um estado de êxtase que o levaria a se libertar da dor da vida diária. SELECT.ART.BR
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FOTOS: ALAmy/gLOwImAgES. NA PágINA AO LADO: DAvID PINZER/CORTESIA DO ARTISTA
e-iansã (2010) obra e-iansã é um vestido que reage à presença dos sinais do celular. Feito de centenas de fitinhas do bonfim que são movidas por 110 lâminas de ventilação de computador e quatro antenas, que captam as ondas eletromagnéticas e fazem com que o vestido se mova. “religião, forças invisíveis, tradição e tecnologia são misturadas para alertar as pessoas sobre a poluição elétrica com o crescimento dos celulares. talvez a moderna iansã, orixá dos ventos, possa controlar os campos eletrônicos”, explica o media artista brasileiro ricardo nascimento, que vem se projetando em eventos relacionados a moda e tecnologia.
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projeto pele (2006) elaborado pela philips design, o skin project compreende o desenvolvimento de uma série de peças que demonstram como a eletrônica pode ser incorporada em tecidos e roupas, a fim de expressar as emoções e a personalidade de quem as usa. Faz parte da pesquisa o foco em tecnologias “sensíveis” em vez de “inteligentes”. bubelle, por exemplo, é um vestido que se comporta como uma membrana iluminada por padrões que mudam dependendo do contato com a pele e se comporta de maneira diferente, dependendo de quem o usa. Frisson é um macacão interativo que reage ao ser soprado acendendo centenas de minúsculos leds, cada um meticulosamente soldado sobre um fio de cobre preso ao tecido.
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FOTOS: PhILIPS PROJETO SkIN. NA PรกgINA AO LADO: J.B. SPECTOR/muSEum OF SCIENCE+INDuSTRy ChICAgO
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pixels vestíveis (2007) no desfile da coleção de outono/inverno 2007 de Hussein chalayan, uma modelo usou um vestido feito de 15 mil leds, que projetavam um vídeo de efeito pixelado colorido, inspirado por uma paisagem urbana. o vestido também pode ser visto a partir do espaço, por meio do google earth. SELECT.ART.BR
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FOTOS: CORTESIA DO ARTISTA. NA PágINA AO LADO: DIvuLgAçãO
o legaDo De tron (2010) o cinema sempre foi um lugar para se olhar o futuro. o figurino do filme tron: legacy, criado por michael Wilkinson e christine bieselin clark, já usava moldes em 3d antes da onda das impressoras tridimensionais hoje em voga. eles escanearam o corpo dos atores e produziram o traje real usando espuma plástica, por meio de tecnologia cnc (computer numerical cutting – corte por computação numérica), criando 140 trajes nesse processo. A luz das peças é feita por lâmpadas eletroluminescentes a partir de um polímero flexível chamado elastômero, alimentado por baterias.
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Para Lev Manovich, especialista em visualização de dados, as redes sociais apontam para uma comunicação visual em alto nível, mas não estão expandindo a nossa imaginação Giselle BeiGuelman, de Riga (Letônia)
Autor do referenciAl the lAnguAge of new MediA (Mit Press, 2001), livro AdotAdo Por dez entre dez cursos de coMunicAção e Arte do Mundo todo, lev MAnovich é russo, nAscido eM Moscou, onde estudou Artes, ArquiteturA e ProgrAMAção. emigrou para os estados unidos nos anos 1980. lá, passou a se interessar por semiótica e linguística, fez mestrado em psicologia e doutorado em estudos culturais. diz que há mais de 30 anos tenta analisar imagens, mas que isso só foi possível de fato com a explosão das redes sociais nos anos 2000, pois permitem visualizar padrões. em 2007, quando era professor da universidade da califórnia, em san diego, fundou o laboratório de estudos de software (software studies initiative) e passou a dedicar-se ao que chama de cultural Analytics (Analítica cultural), análises computacionais e visualização de grandes massas de dados culturais e imagéticos. desde o começo de 2013, é professor do programa de pós-graduação em ciências da computação da universidade da cidade de nova York, onde dirige o laboratório de software studies, também baseado no instituto de telecomunicação e informação da califórnia (calit2). Keynote speaker do 5o Media Art
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history, evento itinerante internacional que em 2013 foi realizado em riga, na letônia, Manovich conversou com seLecT sobre o impacto das redes sociais na cultura visual contemporânea. Como a visualização de dados pode nos ajudar a compreender a cultura do nosso tempo? o crescimento explosivo do conteúdo cultural na web, incluindo as mídias sociais desde 2004 e os esforços de digitalização de museus, bibliotecas e outras instituições, viabilizou um novo paradigma para o estudo das mídias contemporâneas e históricas. em vez de se concentrar apenas em artefatos isolados, podemos usar a análise de dados computacional e técnicas de visualização para estudar os padrões em grandes conjuntos de dados culturais. Por que você decidiu concentrar suas pesquisas em tecnologias de visualização de dados sobre imagens? vivemos rodeados por imagens. elas estão nas redes, nas ruas, nas roupas das pessoas, nos museus. como as olhamos? olhamos a partir de uma pesquisa preliminar, definindo categorias que vão nos permitir organizar e ler essas imagens. Mas as imagens não são apenas inteligíveis
FoTo: CALiT2
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Lev Manovich no Laborat贸rio de Estudos de Software da Universidade da Calif贸rnia, em San Diego
A partir dos 2000 nos tornamos essencialmente visuais e o marco desse processo foram as redes sociais, o lugar para onde escoa a produção imagética contemporânea 90
por meio de categorias, porque não são definíveis apenas por meio de palavras. imagens são cores e formas acima de tudo. então, a grande pergunta da visualização de dados, e o que tem mobilizado a mim e ao meu grupo de pesquisa, é: como explorar essas imagens e entrever parâmetros que não sejam descritos apenas no nível das tags (palavras-chave), mas dos seus elementos visuais? Qual o papel das redes sociais nessa explosão de imagens? central. os anos 1980 e 1990 foram essencialmente textuais, dominados pelos recursos de mensagem instantânea, bate-papo e e-mails. isso tem mais relação com a precariedade das conexões do que com uma preferência coletiva. Basta pensar que a internet só se popularizou a partir do Mosaic, um browser, uma interface gráfica de acesso aos conteúdos online. Mas foi a partir dos 2000 que nos tornamos essencialmente visuais e o marco desse processo foram as redes sociais, o lugar para onde escoa a produção imagética e onde já aparecem redes, superpopulares, como o instagram, onde só circulam imagens. toda a leitura de mundo mudou e a imagem, cada vez mais, precede o texto. hoje, você pode montar sua própria revista com aplicativos como o flipboard, com recursos estritamente visuais. é toda uma mudança no paradigma de comunicação… Por outro lado, há um excessivo domínio dos templates (modelos prontos) e uma padronização da comunicação a partir da visualidade e do design de megaplataformas como o Facebook... sim, podemos dizer que tudo está indo na direção de uma comunicação visual de alto nível, mas não estamos ainda expandindo nossa imaginação. A visualização de dados pode mudar esse panorama? Pode reverter essa tendência de padronização? A visualização de dados a partir de imagens visa entender padrões culturais e não criar novas composições. se analisarmos um conjunto de
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25 mil imagens do Museu de Arte Moderna de nova York (MoMA) e um de mais de 3 milhões extraídas do instagram, o que vamos encontrar? temos maior ou menor diversidade de padrões? não quero julgar, mas analisar. existem tendências na comunicação visual contemporânea? Seu laboratório de pesquisa está envolvido em um projeto que faz o download de 6 mil imagens postadas diariamente no Instagram a partir da cidade de Nova York. Devolvemos, então, a pergunta: existem tendências na comunicação visual contemporânea? na comunicação profissional, sim, há uma tendência: medida. essa é a história do big data, do data mining. isso muda toda a maneira como a mídia opera. As empresas têm um conjunto de ferramentas para otimizar sua produção. no limite, até as pessoas individualmente dispõem desse tipo de recurso, instrumentalizando um google Analytics, por exemplo. toda a indústria da comunicação hoje é testada, tudo passa por um preview e uma comparação preliminar de resultados. será que isso leva a mais padronização? Big data é medida. os milhões de imagens que circulam no instagram, no facebook, no Youtube hoje, talvez sejam meia dúzia de padrões. Isso não contraria a hipótese de que a produção imagética e sua distribuição nas redes sociais apontam para uma democratização do conhecimento? existe essa democratização, mas é indiscutível que há também toda uma nova esfera da produção profissional que está ligada às empresas de computação, hoje muito mais radicais do que as de comunicação. o twitter, por exemplo, que é uma nova tecnologia de escrita, não foi inventado por uma empresa de comunicação. nem o flipboard. As transformações nos modos de publicar e visualizar não estão vindo dos meios tradicionais de comunicação. A inovação não vem, hoje, nem das artes nem da indústria de comunicação, mas das empresas de tecnologia.
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Detalhe do projeto Phototrails, que faz análise comparativa entre as cidades de Bangcoc, Nova York, São Francisco e Tóquio, a partir de 50 mil imagens postadas sobre cada uma delas no Instagram. O objetivo é encontrar padrões culturais, a partir de técnicas de visualização de dados. Para consultar, acesse: phototrails.net/
FoTo: REpRodução
Muito além da superfície, nas profundezas da internet, redes alternativas procuram garantir a navegação anônima e sem rastros na www C U LT U R A d I g I TA L
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O OutrO ladO da rede NiNa Gazire I LUST RA Ç õ E S D u q u e Ga lo 2 5 0
O sOnhO de uma rede livre e baseada em ideais de igualdade de acessO e privacidade nãO é nOvidade na história da internet. “na verdade, ela sempre fOi impulsiOnada pOr um desejO tantO de sigilO quantO pOr de transparência”, escreveu o jornalista andy beckett, no Guardian, ao fazer, em 2009, um dossiê sobre uma parte desconhecida da rede mundial de computadores que foi batizada de deep Web. O termo, que pode ser traduzido em português como “rede profunda” e parece ter saído de um livro de herman melville ou de júlio verne, surgiu no ano 2000, foi cunhado por mike bergman, fundador da bright planet, empresa especializada em vasculhar redes de computadores de difícil acesso. descreve toda a parte da internet (links, websites, fóruns etc.) que não pode ser encontrada por buscadores comuns, como o google ou o bing. estima-se que a deep Web seja 5 mil vezes maior que a rede tradicional de computadores, ou seja, a surface web (rede de superfície), a camada da rede onde navegamos usando protocolos http e onde estão o facebook, o google e grande parte dos sites navegáveis. nos tempos obscuros de nsa (national security agency) que estamos vivendo, é natural que esses números estimulem fantasias e que o fenômeno ganhe contornos sensacionalistas. “mas a deep Web tem a ver com a noção do privado e do anonimato”, pondera silvio rhatto, especialista em segurança de redes e ativista digital brasileiro. “existem mecanismos no facebook que permitem que SELECT.ART.BR
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páginas ou perfis não sejam encontrados por buscadores. eu mesmo não tenho facebook e, por não acessá-lo, ele se torna para mim uma parte da deep Web também. uma intranet ou site com login também entram nessa categoria. O conceito é muito mais amplo do que se pretende”, diz rhatto. Redes independentes caso você não saiba, o meu, o seu, todo e qualquer computador conectado à internet possui um número único e exclusivo chamado ip, que permite que informações sejam trocadas com outros computadores e servidores. essas informações ou comandos são chamados de hypertext transfer protocol (protocolos de transferência de hipertexto) e são a base de dados da World Wide Web, a famosa www, onde as pessoas navegam. navegar pelos protocolos http significa passear pela rede deixando um rastro facilmente identificado por meio desse número chamado ip. mas outros modelos de redes criadas para o compartilhamento e navegação feitas com segurança e direito ao anonimato têm sido propostos. um exemplo é o Occupyhere, projeto que nasceu em 2011, durante o Occupy Wall street, em nova York. enquanto Zuccotti park estava tomado por manifestantes que bradavam contra a desigualdade mundial, o artista e web designer nova-iorquino dan phiffer observou a presença massiva de celulares e outros dispositivos móveis e pensou em criar uma rede anônima, na qual os manifestantes pudes-
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Para além do lado escuro da rede, das estratégias da NSA e de projetos como o PRISM, busca-se uma internet com liberdade de compartilhamento e privacidade de dados 94
sem trocar informações sem ter de usar outras redes mais tradicionais, como o facebook. a partir de roteadores independentes que usam software livre e que não precisam se conectar diretamente à grande rede de computadores, phiffer concebeu um dispositivo que criou uma rede de área local que podia ser acessada a partir de celulares e outros dispositivos com conexão Wi-fi. “a ideia era a de um fórum de discussão e site de compartilhamento de arquivos projetado em torno de um único roteador Wi-fi que funcionava com OpenWrt linux”, explica phiffer em entrevista por e-mail à seLecT. “é um software social que não precisa de internet para funcionar. O roteador Wi-fi não requer uma senha, mas funciona como um portal cativo, redirecionando você para um único site, onde poderá escrever mensagens de forma anônima e compartilhar suas fotos ou vídeos. O projeto começou como uma espécie de intranet para os ocupantes, mas, uma vez que a rede Wi-fi de Zuccotti park foi desativada, comecei a me concentrar em construí-lo com outros nós de redes autônomas e temporárias”, diz o designer. phiffer recebeu recentemente uma bolsa do rhizome comission program, organização sem fins lucrativos voltada para práticas artísticas alinhadas à tecnologia e novas mídias. O incentivo permitirá que o designer, pertencente ao coletivo future archaelogy – grupo engajado em práticas ciberativistas –, dê continuidade ao Occupyhere. daRknet: tRoca anônima de infoRmações na mesma linha de ação, a freenet, criada em 2000 pelo então estudante irlandês ian clarke, possibilita que os computadores conectados funcionem ao mesmo tempo como clientes, servidores e protocolos criptografados que não permitem descobrir a origem ou a direção do compartilhamento de informações. essa característica hermética acabou por enquadrar a freenet em outro conceito conhecido como darknet, que, ao contrário do que se propaga por aí, não diz apenas de redes criadas para trocar arquivos, espalhar vírus ou inSELECT.ART.BR
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formações escusas e duvidosas, mas também denomina redes fechadas que permitem a troca anônima de informações. “é importante perceber que o conceito de rede social é antigo e mais abrangente do que se entende hoje. O facebook é uma rede que traz toda essa ideologia liberal de estar voltada para o indivíduo, porém, todos os seus dados estão guardados nas mãos de poucos”, observa rhatto. “novas redes, como a diaspora, surgem como alternativa a essa proposta, e elas vêm adotando um funcionamento semelhante à internet arcaica: usam os modelos de fóruns anônimos e salas de bate-papo. modelos que também estão presentes em toda deep Web e que prezam pelo direito de governança da rede.” Outras redes surgiram antes da www, lá no início dos anos 1990, e continuam ativas, como é o caso dos servidores irc e outras que usam protocolos diferentes, como o gopher ou o tor. Originalmente um projeto da marinha norte-americana, o tor – sigla para the Onion router – modifica, por meio de criptografia, o protocolo http, criando uma “rede de túneis” sobrejacente à internet, na qual os computadores de usuários comuns são transformados em roteadores. a navegação, então, é feita por meio de camadas, tornando impossível o rastreamento do usuário. posteriormente, o projeto tornou-se uma organização sem fins lucrativos e foi apadrinhado pela electronic frontier foundation, apesar de rumores de que um de seus maiores financiadores seja o governo americano. são relacionados ao tor fatos tenebrosos sobre pedofilia, pornografia, terrorismo e, principalmente, tráfico de drogas, como é o recente caso do silk road. foi ali, também, que surgiram o Wikileaks e os anonymous e é lá o lugar onde a moeda criptografada bitcoin mais cresce. para além do lado escuro da rede, das estratégias da nsa e de projetos como o prism, há de se lembrar que estão na base dessa ambiguidade as tentativas de uma internet apoiada no direito à neutralidade, liberdade de compartilhamento e privacidade de dados. patinamos na ponta de um iceberg que é feito mais de ignorância do que de terror.
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A simplificAção do complexo
estamos vivendo a era do design do invisível, na qual a experiência toma o lugar da função e a forma se dissolve em conceito
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Ambiente da exposição Tuiteratura (2013), projeto do Estúdio Guto Requena e Atelier MarkoBrajovic realizada no Sesc Santo Amaro, composto por uma tela interativa de 16 metros de comprimento por 3 metros de altura. Sensores captam a presença dos visitantes e espelham suas silhuetas em sombras eletrônicas.
A vidA conectAdA produziu um número e n o r m e d e A pA r e l h o s , controles, tel As, botões, senhAs e um desejo imenso de reunir tudo em um mesmo dispositivo. o design da experiência tem como desafio projetar interfaces que na sua forma são muito simples, mas com um grau altíssimo de complexidade de funções. se hoje com um simples deslizar de dedos em uma tela sensível, você pode fazer operações que antes precisariam de computadores poderosos, amanhã essa tela pode nem existir. “A forma segue a função”, famosa frase do arquiteto louis sullivan, está sendo posta à prova no século 21, devido às novas interfaces disponíveis, aliadas às novas necessidades, que estão transformando a própria noção de objeto. o que estamos vivendo neste momento é a era do design do invisível, na qual a experiência toma o lugar da função, e a forma se dissolve no seu conceito original. conforme definição estabelecida no ano 2000 pelo international council of industrial design (conselho internacional de design industrial) “design é uma atividade criativa, cujo propósito é estabelecer as qualidades multifacetadas de objetos, proFOTOS: VICTOR AFFARO/DIVuLgAÇãO
cessos, serviços e seus sistemas de ciclos de vida. Assim, design é o fator central da humanização inovadora das tecnologias e o fator crucial das trocas econômicas e culturais. (...) design trata de produtos, serviços e sistemas concebidos através de ferramentas, organizações e da lógica introduzidas pela industrialização – não somente quando são produzidos em série”. de fato, um dos grandes desafios do design contemporâneo é lidar com a “humanização da tecnologia” e torná-la algo simples e acessível através de diferentes meios para diversos públicos. de acordo com a Wired, revista especializada em tendências do mundo digital, se até hoje fomos condicionados a criar coisas que podemos ver e sentir, os designers estão criando experiências que não estão centradas em objetos físicos, mas nas experiências que os envolvem. bill buxton, pesquisador-chefe do setor de pesquisas da microsoft, tem um mantra pessoal que define esse conceito: “em última análise, estamos nos iludindo se pensarmos que os produtos que projetamos são as ‘coisas’ que vendemos, em vez da experiência individual, social e cultural que eles geram, e o valor e o impacto que eles têm. projeto que ignora isso não é digno do nome”.
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A interfAce como meio e não como fim o Air clicker, um protótipo de 2012 desenvolvido pelo designer sul-coreano Yeon su Kim, é uma máquina fotográfica e filmadora que utiliza sensor de movimento e comunicação com smartphones via bluetooth. o golpe de mestre foi retirar todos os aspectos desnecessários para um design de câmera digital e resumi-lo em duas peças colocadas nos dedos. para tirar um foto, basta apontar a lente localizada numa espécie de anel no polegar e repetir o gesto de clicar com o dispositivo que fica no indicador, e a imagem fica armazenada no celular. no modo vídeo, basta curvar os dedos como se estivesse fazendo foco na lente e disparar. A tensão do movimento dos dedos aciona o botão do obturador para começo, pausa e fim da gravação. os avanços tecnológicos permitem ao designer um campo de atuação e criação sem precedentes na história. essa questão, na qual a interface fica praticamente invisível, é um assunto que vem sendo tratado, desde a década de 1950, pela artemídia. É o momento em que a materialidade da obra de arte passa por um processo de dissolução do objeto e a maneira como entendemos e interagimos com a obra. entram em cena, as instalações audiovisuais, interativas, táteis, sem que o espectador tenha de ter a mínima noção de computação, interfaces e dispositivos eletrônicos, para interagir com a obra. essa realidade alcançada pela arte é o sonho de todo designer de hoje.
Acima, o Air Clicker; abaixo, o Shot Laser Watch, um protótipo de relógio que, ao aperto de um botão, reflete as horas com laser no pulso do usuário SELECT.ART.BR
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A frase “a forma segue função” está sendo posta à prova no século 21
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SimplicidAde x complexidAde Ao observar uma timeline, para usar um termo atual, sobre o design de um telefone até o celular, por exemplo, podemos ver a evolução do aparelho de Graham bell de 1876, que pesava, aproximadamente, 5 quilos, ante 112 gramas de um smartphone; rever o impacto da passagem entre uma linha fixa e móvel e a evolução da transmissão de voz para a transmissão de dados; ou como se deu a substituição do disco do telefone, pelas teclas até as telas sensíveis ao toque. Além das inúmeras áreas integradas para o desenvolvimento do design e o avanço tecnológico, hoje se levam em conta as mudanças baseadas na experiência do usuário, que contribuem para a criação de interfaces mais simplificadas, para um conteúdo cada vez mais complexo dos aparelhos. pense no que aconteceu desde a criação do primeiro console de videogame, em 1967, e a tecnologia Wii. em 2005, durante a feira de jogos eletrônicos e3, a nintendo anunciou o lançamento de um console revolucionário: o Wii. o FOTOS: DIVuLgAÇãO
Um dos grandes desafios do design contemporâneo é lidar com a “humanização da tecnologia”
nome sonoro, quase uma onomatopeia, contrasta com a tecnologia desse videogame que permite disputar uma corrida no mario Kart Wii com até quatro pessoas na sua sala ou com jogadores conectados em diversas partes do mundo. o Xbox da microsoft levou a tendência do controle sem fio e interação em rede ao limite, combinando sensores de movimento e imagens em três dimensões. Assim, ao disputar uma partida de tênis, o aparelho funciona como raquete e numa luta se transforma em espada. Ao eliminar os botões tradicionais de comando de um joystick e fazer com que o jogador simule na realidade os movimentos que são repetidos na tela, mostra de forma clara como a grande tendência da relação entre tecnologia e design é eliminar cada vez mais etapas da interação entre o usuário e o objeto, com possibilidades da dissolução da forma.
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MEDITACテグ PSICODELICA A SERVICO DO CONSUMO SELECT.ART.BR
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Os jogos do Facebook proliferam e geram cifras astronômicas, mas são armadilhas para o vício e o gasto compulsivo L u c i a n a Pa r e j a n o r b i at o
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No iNício, em juNho de 2009, era o FarmVille, uma emulação mais complexa dos tamagochis dos aNos 1990. No “joguiNho de armar” da FazeNda, o participaNte deVia plaNtar Verduras, criar aNimais e expaNdir sua propriedade. era obrigatório voltar ao jogo em períodos definidos, dependendo da atividade a ser realizada. “suas berinjelas estarão maduras em três horas, volte para fazer a colheita”, ou algo do tipo. em caso de demora, a safra chegava até a apodrecer. em outra onda, o mafia Wars chegou mais ou menos ao mesmo tempo e promoveu um banho de sangue virtual entre gangues rivais, com membros recrutados nas listas de amigos de cada jogador por meio de insistentes convites postados na linha do tempo. dois anos depois, o song pop passou a promover disputas ao estilo “Qual é a música?” entre dois amigos por vez, relembrando gêneros de diversas épocas. sim, são eles, os jogos para Facebook, que crescem a passos de gigante, migraram para as demais redes sociais, como google +, e ganharam versões para android e ios. a pesquisa games pop, do ibope, revelou que 76% dos 18 mil entrevistados de todo o Brasil que usam celular, computador e tablet para jogar o fazem por meio das redes sociais. outra pesquisa, a game mobile Brasil, da espm, mostrou que, de seus 823 respondentes, 71% jogam nas redes; desse número, 71% jogam diariamente. Não dá para fechar uma quantidade exata de títulos hoje no mercado, vindos de majors da produção de games como zynga (FarmVille e mafia Wars) e King (candy crush saga), entre outras. muitos jogos de computador existentes anteriormente em sites de games ganharam uma versão “saga” ou “With Friends” para as redes, aproveitando-se da viralidade e da fidelização que o modelo FB incorpora. a própria navegação dos jogos agrega, no desenrolar das fases, convites a amigos e compartilhamentos de pontuação disfarçados, que o participante não nota ao clicar. em outros casos, como o song pop, o jogo só funciona se houver outro jogador para fazer dupla e, quanto mais pessoas o usuário convida, mais vezes consegue jogar. a fidelização vem em forma de bônus cedidos graças à participação diária. para quem joga no tablet ou celular, os apps conectam-se via rede social e a competição entre amigos persiste.
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Telas dos jogos Candy Crush Saga, Criminal Case e Farmville exploram visual colorido e fofinho – mesmo quando o tema é assassinato
candy crush saga mobiliza mais de 50 milhões de usuários por dia, envolvidos pelo poder hipnótico de jujubas e bombons explosivos
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Candy Crush Mania campeão atual disparado de popularidade, candy crush saga reunia no último dia 23 de outubro, só no Facebook, mais de 50 milhões de usuários diários e mais de 100 milhões de usuários no mês entre aplicativos de várias naturezas (não só, mas na maioria, de jogos), segundo o site app data. surgiu em abril do ano passado, dissolvendo a percepção da realidade do jogador em um mundo lisérgico-fofucho de jujubas e bombons que explodem. o visual vem embalado por uma musiquinha hipnótica, tão açucarada quanto as guloseimas de seu gráfico, além dos efeitos sonoros engraçadíssimos. “o ‘divine!’ é uma delícia”, confessa a atriz mika lins, referindo-se à voz grave que parabeniza o jogador quando ele consegue uma grande sequência de explosões. ela tem uma relação de amor e ódio com games sociais: “Na real, eu não gosto, acabo me viciando (rs). satisfação garantida, como quando fumo um cigarro. Nunca paguei um real, vício do jogo envolvendo dinheiro é como droga pesada”. o mecanismo é simples: alinhar três docinhos ou mais para explodi-los e completar missões como transportar ingredientes até a base da tela, conquistar um número específico de pontos ou explodir toda a gelatina dos quadradinhos. “comecei a jogar através do convite de amigos no FB. o primeiro (e insuportável) foi FarmVille, que logo larguei. muito chato”, declara o ator otavio martins. largou o anterior, mas não outras opções. “eu jogo sinuca, tranca e criminal case. Quando tenho tempo, chego a passar no máximo meia hora, normalmente só jogo uma partida. É ótimo pra passar o tempo e pensar no nada”, afirma. de fato, a jogatina na rede social, por seu caráter de repetição, SELECT.ART.BR
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tem a característica de deixar a mente navegar despreocupadamente, o que pode ser um componente de alívio na rotina estressante do veloz mundo de hoje. tem quem assista a novelas, tem quem jogue nas redes sociais. “Fiquei no candy crush, jogo em ‘esperas’: médico, dentista e esperando o sono chegar. me apeguei à fase 125, já que não saio dela faz tempo. e agora apegada…”, conta a artista raquel Kogan. com nível crescente de dificuldade e de tempo de resolução das fases, esses jogos têm componentes próprios para induzir ao vício e ao prejuízo monetário. Quando empaca em fases capciosas, o usuário é induzido a comprar recursos que facilitam a execução da tarefa proposta ou vida extra para que ele possa continuar jogando.
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“um belo dia, eu não conseguia passar de uma fase (do candy crush) e comprei um pirulito pra quebrar uma gelatina que faltava. No outro dia, comprei mais cinco movimentos pra terminar uma fase. No primeiro mês, gastei uns us$ 15 ou us$ 20, ok. mas no mês passado tomei um choque: chegou a minha fatura e eu tinha gastado us$ 50! aí parei total”, conta o jornalista thiago stivaletti. parou de gastar, mas não parou de jogar, toda noite. “exige uma concentração meio lúdica que esvazia todos os problemas da cabeça. É como uma meditação de nerd.” do luCro ao víCio dos entrevistados desta matéria, apenas stivaletti chegou a pagar para jogar, e por pouco tempo. isso não reflete a realidade do mercado por trás das telas coloridas e nada inocentes. um levantamento feito no ano passado pela empresa de pesquisas norte-americana gartner apontou que, da receita global das redes sociais, estimada em us$ 16,9 bilhões, os jogos foram responsáveis por us$ 6,2 bilhões, ou seja, foram a segunda maior fonte de lucro, atrás apenas da publicidade (us$ 8,8 bilhões). a zynga, que rompeu a parceria com o Facebook confiando em poder manter a boa onda longe da rede social, amargou prejuízo de 31% com relação ao ano anterior em seu balanço do segundo trimestre de 2013, enquanto o Facebook anunciava crescimento no setor dos games de 7% no segundo quadrimestre deste ano. de olho no nicho, até a disney lançou seu piratas do caribe em versão game para Facebook. por trás das cifras astronômicas está o limite tênue entre a FOTOS: REpRODuçãO
diversão e o vício. dos mecanismos utilizados para atingir o psiquismo do jogador, o principal é a redução de sentimentos como angústia e ansiedade. “Você não amplia sua capacidade de enfrentamento desses sentimentos, o jogo é uma forma de escape rápido”, explica dora sampaio goes, psiquiatra do programa de transtornos do impulso do hospital das clínicas. diferentemente de relaxar diante da tevê, o jogo social tem o componente da continuidade de sua ação mesmo quando o usuário não está jogando, desde ações que levam tempo para ser realizadas até os pedidos de vida e de ajuda aos amigos. os jogos produzem dopamina no cérebro em um espaço de tempo similar ao consumo de drogas, o que dá a sensação de prazer e bem-estar. claro que tudo é uma questão de grau. jogar nas redes sociais pode ser um entretenimento tão frugal quanto praticar tênis, desde que não consuma a vida da pessoa. “Quando eu comprometo outras ações da minha vida para ficar jogando, deixo de jogar tênis, de sair com os amigos; quando deixo de comprar um livro para gastar com jogos, aí começa o problema”, diz dora goes. como em qualquer outro vício, jogar nas redes atinge quem “não tem um sistema de breque eficaz”. mas como saber o limite? jogos sociais são divertidos, mas devem ser consumidos moderadamente. Não substituem outras formas de entretenimento e de obtenção de cultura, como uma ida ao cinema e a leitura de um livro. Vale de alerta para todos, em especial esta que vos escreve – que deletou quatro dos seis jogos que usava no Facebook depois de terminar este texto. mas ainda continua no criminal case e no pet rescue, mas sem gastar um centavo.
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Artes visuAis
QuAndo A MAteriAlidAde Pouco iMPortA Márion strecker, de novA york
Em retrospectiva, Chris Burden coloca em questão valores como controle, segurança e o caráter efêmero da arte Enquanto o Brasil discute, acalorado, o decreto que regulamenta o Estatuto dos Museus e visa proteger materialmente obras de arte “icônicas”, o New Museum de Nova York faz uma retrospectiva do artista conceitual Chris Burden (Boston, 1946), célebre por trabalhos “icônicos”, no sentido de memoráveis, representativos, emblemátiSELECT.ART.BR
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Chris Burden: Extreme Measures, até 12/1/14, New Museum, Nova York, newmuseum.org
cos do seu tempo. A mostra traz vídeos, esculturas e instalações, como Porsche with Meteorite (2013), em que Burden equilibra um meteorito comprado no eBay com seu Porsche 914 amarelo de 1974 restaurado. Ou Ghost Ship (2005), um veleiro autoguiado por GPS que fez uma jornada no Mar do Norte e ganhou a fachada do museu. L.A.P.D. Uniforms (1992-1993) são 13 uniformes acima do tamanho normal pendurados com distintivos, cintos, balas e Beretta 92F, iguais aos da polícia de Los Angeles. Vistos a distância parecem normais, mas de perto assumem dimensões desumanas. A Tale of Two Cities (1981) traz 5 mil brinquedos de guerra arrumados sobre base de areia, rodeados por uma floresta de plantas de estufa e binóculos para o público ver os detalhes: uma fantasia sobre o século 21, em que o mundo retornaria a um sistema de Estados feudais. All Submarines of the USA (1987) traz 625 modelos em papel-cartão de toda a frota fabri-
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cada desde os anos 1890, pendurada no ar como um cardume. Além de instalações de cunho político, Burden tem criado obras de engenharia como pontes e edifícios com brinquedos de montar. Os trabalhos impressionam, embora o artista seja mais conhecido pelas mais de 50 performances que fez na vida, algumas de poucos segundos de duração e outras que duraram semanas. Burden foi o sujeito que se fez levar um tiro dentro de uma galeria na Califórnia, em 1971. O que restou da performance, chamada Shoot, foi um vídeo de 8 segundos, disponível também no YouTube, sem graça, mas que deixa pensar: por que um artista faz isso? E por que estamos assistindo? Colocar em risco o próprio corpo é uma forma de manifestação artística? O que se discute, supera ou despreza é também a corporeidade do artista? “Para fazer Shoot tive de me convencer de que a bala ia apenas raspar no meu braço e que só uma gota de sangue ia rolar. A pergunta para mim mesmo era: levei um tiro? Obviamente, a ferida foi maior que isso, mas, como você pode ver, eu estava tentando descobrir qual era o limite”, disse ele muitos anos depois para a revista Flash Art, quando negou enfaticamente ter feito trabalhos suicidas. Outras performances memoráveis de Burden foram Through the Night Softly (1973), quando se arrastou sobre cacos de vidro, Trans-Fixed (1974), quando foi crucificado no teto de um Fusca, e Doomed (1975), quando ficou 45 horas praticamente imóvel ao lado de um relógio de parede, até alguém interferir na cena e ele destruir o relógio com uma martelada. A retrospectiva ocupa os cinco andares do New Museum, com legendas escritas pelo artista. Entre os vídeos, traz o que documentou Beam Drop, gravado pelo brasileiro Pablo Lobato, quando um guindaste de 45 metros de altura derrubou 71 vigas de construção numa vala com cimento fresco no Inhotim, em 2008. É uma performance? É uma escultura? Os dois? Nenhum dos dois? FoToS: MáRIon STRECKER E dIVULGAÇÃo
Na página ao lado, All Submarines of the USA (1987); acima, a instalação A Tale of Two Cities (1981), com 5 mil brinquedos de guerra e plantas de estufa; à dir., Trans-Fixed (1974), performance em que Chris Burden aparece crucificado no teto de um Fusca
São esses pensamentos que seu trabalho suscita. Enfrentando grandes desafios, a imobilidade, privações, riscos físicos, psicológicos e dor, sempre no papel de autor, Chris Burden tem lidado com questões como controle, desejo, repressão e violência. No contexto contemporâneo, a materialidade da obra é o que menos importa.
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cAnteiro de intervenções sheilA leirner, de PAris
Philippe Parreno questiona estruturas expositivas com uma obra transtemporal Os artistas mostram obras em exposição. Philippe Parreno mostra exposição em obras. Ele encara a exposição como instrumento, mas também como espaço poético, experiência global, objeto uno, porém não linear, que se desenvolve e se transforma no tempo. A mostra no Palais de Tokyo é tão imersiva, tão emblemática de sua preocupação em questionar a estrutura expositiva e os códigos mutatórios da obra de arte, e tão operística, que saímos aturdidos com sua atmos-
Vista da exposição Anywhere, Anywhere, Out Of The World, de Philippe Parreno, no Palais de Tokyo, Paris
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Philippe Parreno, Anywhere, Anywhere, Out Of The World, até 12/1/14, Palais de Tokyo, Paris, http://www.palaisdetokyo.com
fera ambígua, oscilantes entre a distração dos efeitos e a aflição dos conteúdos. Por meio de instalações, performances, concertos, projeções, filmes, objetos, esculturas, desenhos e textos, essa “unidade” é vista pelo artista como um canteiro ou uma oficina inédita de intervenções. Ele orquestra o todo também em acordo com uma técnica teatral para a qual são fundamentais as presenças fantasmagóricas da música, sons, luz e movimento. “É preciso sempre se colocar em relação à produção da forma e à exposição da forma”, diz. “As duas coisas são totalmente dependentes. O objeto de arte não existe sem a sua exposição.” Usando condignamente a carta-branca que recebeu, Philippe Parreno reveste os 22 mil metros quadrados dessa instituição dedicada à arte contemporânea com obras recentes e antigas. Há muitos vazios, mas o vazio é fundamental à expressão dos nossos tempos. Desde a recepção, uma enorme tela nos acolhe, transformando-nos
reviews em sombras chinesas. Depois, uma imagem nos chama ao longe, imensa. Nos aproximamos. Aos poucos, a confusão se estabelece: em vez de ficar nítida, ela se turva. E tudo é assim. De perto nada mais é real, as formas vacilam. Fica um sentimento de transtemporalidade, em que passado, presente e futuro se superpõem e se misturam sempre sob a mesma música, o mesmo ritmo de Petrouchka, de Stravinski. Parreno se inspira no cinema, na televisão, no teatro e nos espetáculos. Constrói dispositivos díspares, ambientes e situações, planeja percursos, cria tramas e conduz o espectador a uma viagem – ora como partícipe, ora como contemplador um pouco entorpecido – por meio de uma tensão constante entre a realidade e o virtual. Como acontece com os filmes que nos marcam a ponto de acordarmos pensando neles, Anywhere, Anywhere, Out Of The World – título desta mostra que empresta os versos do poeta escocês Thomas Hood retomado por Baudelaire – é capaz de perenizar na vida real a mesma sensação de desamparo, deslumbramento e intranquilidade, várias horas depois.
Artes visuAis/ArQuiteturA
Na proposta do escritório SPBR para o Panorama, o edifício do MAM-SP deixaria de ser uma dissidência do conjunto arquitetônico do Parque do Ibirapuera e passaria a circunscrevê-lo, tornando esse inconteste patrimônio moderno da cidade acervo permanente
teMPo triPArtido GuilherMe kujAwski
33º Panorama da Arte Brasileira tem a arquitetura e o tempo como matrizes conceituais O bom senso entende o tempo como um fluxo linear de eventos que ocorrem de maneira sequencial: do passado para o futuro, fazendo breve escala no presente. Porém, para futuristas, profetas e escritores de ficção, tal modelo é desconsiderado em nome de um tem-
FoToS: nELSon Kon. nA páGInA Ao LAdo: AURéLIEn MoLE/CoRTESIA pALAIS dE ToKyo
33º Panorama da Arte Brasileira, P33: Formas Únicas da Continuidade no Espaço, até 15/12 no MAM, Av. Pedro Álvares Cabral, s/nº, Portão 3, Parque do Ibirapuera, SP
po compacto, no qual o futuro nem sempre é uma consequência direta do passado. Gilberto Freyre apregoava o conceito do “tempo tríbio”, ou seja, se os humanos se conectam apenas ao passado, o tempo torna-se arcaico; se apenas procuram viver o futuro, torna-se utopia; se vivem intensamente a singularidade do presente, correm o risco de perder a função da memória e da perspectiva. Para o Mestre de Apipucos, o tempo tripartido deveria ser vivido em sua integridade. Pode-se aventar que esse tenha sido o ponto de partida conceitual da 33ª edição do Panorama da Arte Brasileira do Museu de Arte Moderna (MAM), com curadoria de Lisette Lagnado e cocuradoria de Ana Maria Maia. Mas o tempo como grandeza exige um complemento imprescindível: o espaço. No caso do Panorama, a sede do museu, instalada sob a famosa marquise de Oscar Niemeyer. Certamente, não é por mero acaso que o tí-
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reviews tulo desta edição – P33: Formas Únicas da Continuidade no Espaço – faça uma alusão à escultura homônima de Umberto Boccioni, artista italiano e um dos mais célebres integrantes do movimento futurista. Assim, pode-se traduzir “continuidade” por “continuum”, o sistema de coordenadas da física que une espaço e tempo em uma mesma grandeza. Tome-se como exemplo a continuidade entre a exposição Bahia no Ibirapuera – que aconteceu durante a 5ª Bienal de São Paulo e cujo pavilhão deu origem ao atual museu – e o solar do Unhão, a sede do MAM-Bahia. A ponte imaginária seria a mesma que liga a fine art e a hoje chamada outsider art, sendo essa exatamente a proposta de Lina Bo Bardi para o espaço construído em 1959 para celebrar a arte baiana. Por esse motivo, a arquitetura é parte integrante da matriz conceitual desta edição do Panorama. As curadoras se permitiram um exercício de especulação futurista para imaginar sedes ficcionais para um “novo” MAM. O projeto do escritório SPBR, por exemplo, envolve módulos móveis que seriam depositados por helicópteros em regiões da cidade culturalmente desfavorecidas. É possível traçar um paralelo entre esse projeto e o Gramsci Monument, do artista suíço Thomas Hirschhorn, e a Cúpula Parlamentar Inflável, imaginada pelo filósofo alemão Peter Sloterdijk. No campo das artes visuais, o Panorama também é orientado pelo tempo tríbio. O paulistano Beto Shwafaty gerou uma quimera a partir da Unidade Tripartida, de Max Bill e o logotipo da empresa Adobe, propondo um novo objeto cultural. E, dentro da proposta de “expandir” o MAM para outros pontos da cidade, a artista francesa Dominique Gonzales-Foerster ocupa o piso da Galeria Nova Barão, amalgamando um posto de salvamento da orla carioca e o poema Beba Coca-Cola, de Décio Pignatari.
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A Medida das Coisas, Tacita Dean, até 26/1, Instituto Moreira Salles, R. Marquês de São Vicente, 476, Rio de Janeiro
Para a exposição de Tacita Dean no IMS foram criados novos trabalhos a partir de fotografias e postais antigos do Rio de Janeiro, Petrópolis e Teresópolis
Artes visuAis
AléM do QuAdro silAs MArtí
Obra fílmica de Tacita Dean, em retrospectiva no IMS, constrói simulacro quase perfeito do mundo visual Quando a artista britânica Tacita Dean filmou todo o processo de produção dos últimos rolos de filme 16 milímetros numa fábrica da Kodak no interior da França, lamentou o fim do suporte que usa em quase toda a sua obra, dizendo que ali se perdia a plataforma para se construir “um simulacro quase perfeito do nosso mundo visual”. Talvez a melhor chave de leitura de sua obra, agora revista numa grande retrospectiva organizada por Rina Carvajal no Instituto Moreira Salles, no Rio, seja esse “quase perfeito” de sua afirmação. Dean se aferrou ao analógico nos filmes que vem produzindo desde os anos 1990 não por qualquer tipo de
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reviews capricho, mas por acreditar que a representação dos objetos por emulsão sobre a película, em vez de desmembrados em pixels digitais, seja a forma de ver o mundo em seu estado mais verdadeiro, ou melhor, mensurável. Não é por acaso que o nome da mostra seja A Medida das Coisas. Tacita Dean diz gostar do analógico por ser algo que significa “proporção e semelhança”, e também por nunca negar aspectos quantificáveis daquilo que retrata, como “comprimento, largura, voltagem e pressão”. Sua arte se resumiria, então, a uma natureza mecânica, não fosse sua obsessão – e maestria – em retratar nos filmes efeitos sutis da história extraquadro. Toda a mostra no Rio, embora repasse anos de carreira da artista, parece estar arquitetada em torno de Desaparecimento no Mar e a série de filmes que a artista dedicou à investigação do naufrágio de um veleiro que tentou dar a volta ao mundo partindo do Reino Unido nos anos 1960. Dean foi ao ponto de partida do barco, um porto inóspito na Escócia, onde filmou a rotação solitária dos refletores no farol de Berwick. Também viajou à ilha caribenha onde o barco fora encontrado anos depois. Lá, sabendo do fracasso da viagem e de como o piloto Donald Crowhurst se jogou ao mar já com a certeza de estar perdido e desorientado, filmou a embarcação apodrecida de todos os ângulos possíveis. Disse que aquilo poderia ser um “exoesqueleto deixado ali por uma criatura errante hoje extinta”. Uma casa em forma de bolha não muito longe do barco, elemento central de seu filme Bubble House, também surge na descrição da artista como uma “visão futurística” ou “registro de outra era”. Esses resquícios de outras eras, plasmados também no suporte obsoleto da película, ganham pelo olhar de Tacita Dean uma ressonância insuspeita e arrebatadora. Eles nada seriam na definição inabalável do digital. Dessa forma, mergulhados numa espécie de penumbra temporal, esses registros metonímicos – seus filmes sempre focam fragmentos da história para aludir ao todo – aparecem como aquilo que ela observou na fábrica da Kodak, um “simulacro quase perfeito”. FoToS: VICEnTE GIL. nA páGInA Ao LAdo: CoRTESIA TACITA dEAn
Vista da instalação que remete ao filme Laranja Mecânica (1971), de Kubrick, em exposição do MIS-SP
Stanley Kubrick, até 12/1, MIS SP, Av. Europa, 158, SP, www.mis-sp.org.br
exPosição
dr. FAntástico Mostra revela facetas da produção de Stanley Kubrick em montagem imersiva Ao fim do longo percurso da mostra Stanley Kubrick, que refaz a trajetória de um dos cineastas mais originais de todos os tempos, uma questão fica no ar: qual a função de um evento desse tipo? Abordar aspectos mais técnicos para o público especializado ou informar e entreter a massa leiga? A montagem do Museu da Imagem e do Som (MIS), de São Paulo, para a itinerância iniciada em 2004 no Deutsches Filmmuseum Frankfurt (que concebeu a mostra) e, de lá para cá, exibida em Berlim, Melbourne, Gante (Bélgica), Zurique, Roma, Paris, Amsterdã e Los Angeles, parece conseguir um certo equilíbrio entre ambas as vocações, com uma boa dose de apelo popular. Isso se deve em grande parte à expografia criativa e à eficiência da ambientação em transmitir ao espectador a sensação de imersão no universo de Kubrick. Na “introdução” da exposição figuram, sem maiores aparatos cênicos, seus primeiros curtas, as lentes que ele costumava usar e alguns documentários. Mas, a partir do primeiro lance de escadas, o espectador se vê caminhando por
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reviews reedições dos espaços de cada uma das obras-primas do diretor americano: o corredor de O Iluminado (1980), a sala de reuniões de Dr. Fantástico (1964), a leiteria de Laranja Mecânica (1971). Objetos e figurinos originais, como de Barry Lyndon (1975) e 2001 – Uma Odisseia no Espaço (1968), garantem realismo e ampliam a capacidade de leitura dos filmes de Stanley Kubrick. Para um mergulho mais profundo, é preciso tempo para assistir aos diversos documentários espalhados pelo trajeto. LPN
livros
literAturA MultiMídiA Livro é ilustrado pela autora e se completa em quatro performances Paula Parisot é escritora, performer e artista visual. Em seu terceiro livro, Partir, combina todas essas linguagens em uma narrativa híbrida que conta a história de um homem de meia-idade que cruza a América em direção ao Alasca, passando por Uruguai, Argentina, Chile, Bolívia, Peru, Equador e Colômbia. Ele não tem família e já desempenhou inúmeras atividades, de pescador a revisor de textos, passando por jogador de futebol. Seu único laço afetivo é Jack Kerouac, um marreco branco que adotou quando era garimpeiro. O que justifica a longa cruzada do protagonista parece ser o direito de escolha de onde morrer, já que o de decidir onde nascer não é dado a ninguém. O que o mobiliza: a necessidade de estar viajando. “O homem precisa estar sempre em movimento. Se parar, morre”, diz o protagonista. Entremeado por reflexões sobre partidas, frustrações amorosas e viver em deslocamento, Partir é também um mosaico de imagens mentais sobre a América do Sul e de personagens insólitos e demasiado humanos, como traficantes, guerrilheiros das Farc e uma jovem, por quem o protagonista brevemente se apaixona, e SELECT.ART.BR
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Livro é ilustrado com desenhos da própria autora, Paula Parisot
Partir, Paula Parisot, Editora Tordesilhas, 280 págs., R$ 48
que já matou por amor. Todas as paisagens são coloridas – não pelo entorno, mas pela diversidade da gastronomia dos locais percorridos. “Posso falar de comida, de alegria, de sofrimento, de amor, afinal, isso é a vida do homem”, diz ele em um determinado momento da história. Ilustrado com desenhos feitos pela própria autora, que tem mestrado em artes visuais pela New School de Nova York, o romance é apresentado ao público por meio de performances que procuram dar novos sentidos à trama e problematizar o processo de criação da obra ficcional. As performances incluem um vídeo – que traz direção de fotografia de Gui Mohallem, e direção de arte de Carolina Beltier –, no qual a autora procura recordar como imaginou a história que se transformou em livro. No lançamento da obra, na Feira do Livro de Guadalajara, no México, em dezembro, Parisot aparecerá em um matadouro com um vestido do coletivo nova-iorquino Threeasfour e vai colocar em questão o livro como objeto, furando todo tipo de papel que está à sua volta. Entre março e abril, apresenta-se no Rio de Janeiro. Pretende passar 15 dias reescrevendo e reeditando a obra, sentada no chão. Na última dessa série, a autora fará um tributo ao leitor. De joelhos, entregará a obra para que o público escolha o que fazer com suas páginas (ler, rasgar, rasurar etc.). Ela apenas observará, fazendo jus a uma das máximas do filósofo Michel Foucault, que, citando Borges, ensinou que o leitor é o duplo do livro. GB
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eM trânsito MArio GioiA
Embora busque uma nova identidade, o Festival Sesc Videobrasil ainda tem o vídeo como força motriz O 18º Festival de Arte Contemporânea Sesc Videobrasil ocupa novamente as dependências do Sesc-Pompeia e busca sedimentar sua nova posição de mostra de arte contemporânea não apenas dedicada ao vídeo. Como a equipe curatorial, no entanto, frisou em entrevista coletiva na apresentação do evento, o vídeo – também em versões expandidas, como a videoinstalação, ou em forma de filmes de artista, conceito híbrido que tenta abarcar a fluidez de tal linguagem hoje – ainda é a força motriz do festival. Isso se dá muito em razão dos 30 anos de história do Videobrasil e porque o modelo de mostra com outras mídias e suportes ainda está sendo construído dentro da própria instituição. Nesse momento de transição, a atual edição apresenta um diálogo mais eficiente entre os produtos audiovisuais e as obras realizadas em outras linguagens. Há bons achados dentro da mostra competitiva Panoramas do Sul, com aproximações não tão óbvias. Um exemplo são os diálogos criados entre as pinturas que retratam ambientes industriais, captados por câmeras de vigilância, de Rafael Carneiro, o algo enigmático vídeo Chão Comum, do jovem artista catarinense Tiago Romagnani Silveira, e a escultura Perspectiva Naval, de Rodrigo Sassi, todos trabalhos que, de alguma forma, comentam os resíduos e as ruínas da urbe contemporânea. Outros fecundos encontros estão na instalação Teoria das Bordas (2007), de Lais Myrrha, perto da videoinstalação Geometria Descritiva (2012), de Luiz Roque, do objeto Galho (2012),
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18º Festival de Arte Contemporânea Sesc Videobrasil, até 2/2/14, Sesc-Pompeia, Pivô, CineSesc, SescTV, http:// www.videobrasil.org.br/
Instalação Teoria das Bordas (2007), de Lais Myrrha, em exposição na mostra Panoramas do Sul
de Alexandre Brandão, do livro-objeto The World (2011), de Daniel Escobar, e da videoinstalação Projektion (2011), de Rodrigo Garcia Dutra. Essa última é exemplar em atestar como os trabalhos audiovisuais por vezes pedem um tratamento tridimensional, como se a imagem eletrônica de superfície requeresse uma materialidade própria e mais realçada. Projektion ganha nessa abordagem, ao mixar um filme de Hans Richter com imagens da Casa Modernista, de Gregori Warchavchik, questionando noções como modernidade e vanguarda. Como um festival de vídeo exige, há vários títulos que demandam tempo e disposição do público. Mesmo que alguns vetores poéticos como memória, conflitos geopolíticos e consumismo exacerbado possam costurar linhas de visitação, a singularidade dos trabalhos de nomes como Ali Cherri, Akram Zaatari, Hou Chien Cheng, Ip Yuk-Yiu, Leticia Ramos, Charly Nijensohn, Ayrson Heráclito e Rehema Chachage fará com que cada visitante crie sua leitura sobre uma mostra em uma mesma grandeza.
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Não curtimos Os personagens e as manias dos Feicechatos Pessoas que dão boa noite no Facebook, gente que manda beijos no coração, compulsivos que atualizam seu status de minuto em minuto, contando que estão tomando chá com a tia e que seu bebê falou Bu, ou algo de relevância tão fundamental quanto, são algumas das coisas mais odiáveis e típicas da vida social 2.0. E o povo do “Obrigado por me add”? Pode anotar, em geral, são aqueles que vão te marcar em imagens celestiais e te matarão de constrangimento publicamente, associando seu nome a Jesus, Moisés, Maomé, Buda ou outra divindade alternativa qualquer. Pior que isso só aquele namorado/ namorada de 200 anos atrás que surge do Além para comentar com toda intimidade forçada seu status, sempre naquele clima de vergonha alheia pouca é bobagem. Ah, sim, tem também o coleguinha da escola com quem você não tem contato desde o pré-primário e que reaparece na sua timeline para compartilhar sua admiração pelo Bolsonaro, suas saudades dos anos de chumbo e postar aquela foto ridícula em que você aparece fantasiado de Topo Giggio, imitando Roberto Carlos na Jovem Guarda. GB
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ILUSTRAÇÕES: PEdRO MATALLO
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E-mail (1973-2009) Superado pelo FB, o email acabou se tornando responsável por um grande desperdício de tempo márion Strecker
Endeusado como um grande revolucionário da comunicação, o e-mail rapidamente conquistou adeptos, se espalhou como pólvora com recursos como reencaminhar e responder para todos, foi violentado pela indústria de SPAM (mensagens não solicitadas), inspirou ataques cibernéticos em massa e acabou se tornando responsável por um imenso desperdício de tempo, detonando a produtividade de qualquer pessoa ou empresa. Um profissional gasta, em média, 2 horas e 14 minutos por dia para ler e responder e-mails, segundo estudo global da McKinsey de 2012. Nossa caixa postal virou um buraco negro, onde mensagens importantes se perdem soterradas por propagandas, malvadezas e irrelevâncias. O e-mail é linear e precário como meio colaborativo. Tente marcar uma reunião por e-mail para sentir a dificuldade. Em 2009, o Facebook tornou-se a rede social mais acessada do mundo e empurrou o e-mail para uma posição cada vez menor na comunicação contemporânea. Ao lado do Twitter, inventou novas formas de comunicação, mais instantânea e menos formal. O velho e-mail bem que tentou superar deficiências, organizando mensagens sobre um mesmo assunto, agregando um sistema de bate-papo, aumentando a capacidade. No entanto, recursos mais elementares e menos prolixos, como o Instagram, vêm demonstrar que menos é mais. Enquanto os velhos se divertem no FB e ainda trocam e-mails, os jovens preferem o WhatsApp, por onde circulam 11 milhões de mensagens por dia, e o Snapchat, onde se trocam 350 milhões de fotos a cada 24 horas. Sem falar que no Snapchat as fotos duram apenas segundos, nos livrando do peso insuportável daquelas milhões de mensagens que o e-mail pode guardar, por mera incapacidade nossa de administrar o tempo para apagar todos os seus lixos e rastros.
EM CONSTRUÇÃO
EstEla sokol E a cor das gElEiras 114
Apesar de ser uma escultura, a obra Meio-Fio, que Estela Sokol exibe até 15/1 na Galeria Anita Schwartz (RJ), dialoga com a pintura. “É a primeira vez que uso encáustica, a escolha deu-se por conta da cor”, contou durante a produção do trabalho, em seu ateliê, em São Paulo. Formada por quatro placas de mármore dispostas em cruz, Meio-Fio usa a antiquíssima técnica pictórica na qual o pigmento é diluído em cera. Na obra de Sokol, a cor surge em faixas paralelas, sulcadas na superfície branca, onde ela insere um azul-claro, mas vivo, variável por
sua concentração de pigmento. “É uma obra luminosa, lembra a cor das geleiras. A luz dá-se por rebaixamento, por uma estranheza do azul no branco”, diz. O trabalho reflete a pesquisa com cores extraídas da natureza, como ocorre nas fotos e intervenções realizadas no glaciar argentino de Perito Moreno, na Patagônia. Nelas, Sokol contrapunha a brancura da neve com elementos de colorido vibrante. Meio-Fio sintetiza características marcantes do trabalho da paulistana: a manipulação da cor e as composições de inspiração construtiva e pop.
L u c i a n a Pa r e j a n o r b i at o F OTO M uj i c a
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AGO/SET 2013
caixa.gov.br/caixacultural
MÃOS QUE REGEM UMA ORQUESTRA
OU TOCAM UM INSTRUMENTO. MÃOS QUE TALHAM A MADEIRA
MÃOS QUE ESCREVEM, DESENHAM, PINTAM
OU ESCULPEM EM ARGILA.
E BORDAM AS CORES DO BRASIL.
MÃOS QUE INTERPRETAM.
QUE SÃO BRAÇOS, PERNAS, VOZ E RITMO NOS PALCOS E NAS RUAS.
MÃOS QUE TÊM NA CAIXA O BANCO BRASILEIRO
MÃOS QUE SÃO
OLHOS PARA CLICAR
AS BELEZAS NATURAIS, URBANAS E COTIDIANAS.
MÃOS QUE MERECEM NOSSO APOIO,
QUE MAIS INVESTE RECURSOS
MAS QUE ACIMA DE TUDO
PRÓPRIOS EM CULTURA.
MERECEM NOSSOS APLAUSOS.
Até o final de 2013, serão mais de R$ 60 milhões destinados às artes e aos artistas brasileiros. Onde tem cultura brasileira, tem as mãos da CAIXA.
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