BÁRBARA BARBIZANI DE MELLO CAIADO
JOSÉ ANCHIETA DA SILVA
ISBN 978-85-8425-554-2
editora
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Bárbara Barbizani de Mello Caiado
Mestre em Ciências Jurídico-Laborais pela Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa. Especialista, com formação avançada, em Direito do Trabalho pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Advogada e consultora jurídica. Membro da Ordem dos Advogados Portugueses. Membro da Ordem dos Advogados Brasileiros.
[IR] REDUTIBILIDADE SALARIAL e Princípio da Proibição do Retrocesso
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Munida de coragem e de ousadia científicas, a autora propõe uma desconstrução do princípio da proibição do retrocesso – que não há de ser um princípio absoluto, até porque o Direito não é uma ciência que trabalha com o absoluto como regra –para o enquadrar no devido lugar reduzindo-o ao sentido que lhe é próprio na escala dos valores das instituições jurídico-laborais. E assim, na medida da constatação de sua ineficácia prática, faz a ponte com a jusracionalidade para evidenciar a incongruência dogmática que subjaz ao predito príncipio.”
[IR]
REDUTIBILIDADE SALARIAL e Princípio da Proibição do Retrocesso
A simplicidade e lealdade intelectual inerente à própria natureza das coisas enquanto horizonte, mas reconhecendo que uma matriz socioeconômica complexa num ambiente de incerteza e mutação, no qual cabe ao Direito procurar modelizar, através de normas e princípios, os conteúdos nos quais deve caber o mundo, constitui a escalada do monte improvável, pois não se pode, condensar numa só lágrima o tumulto oceânico das ondas, pelo que a sorte que aqui se dará à Irredutibilidade de Retribuição e ao Princípio da Proibição do Retrocesso, decorrerá da centralidade inequívoca do trabalhador enquanto parte débil da relação laboral, mas será sempre reflexo do que se crê aperfeiçoar a sociedade como um todo, viabilizar o Direito do Trabalho para a otimização do bem-estar social, competitividade econômica e construir uma relação laboral equilibrada, sustentável e sobretudo ética.
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Copyright © 2017, D'Plácido Editora. Copyright © 2017, Bárbara Barbizani de Mello Caiado. Editor Chefe
Plácido Arraes Produtor Editorial
Editora D’Plácido Av. Brasil, 1843, Savassi Belo Horizonte – MG Tel.: 31 3261 2801 CEP 30140-007 W W W. E D I TO R A D P L A C I D O. C O M . B R
Tales Leon de Marco Capa
Letícia Robini de Souza (Sob imagem de blickpixel para pexels.com) Diagramação
Bárbara Rodrigues da Silva Christiane Morais de Oliveira Enzo Zaqueu Prates Letícia Robini de Souza
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida, por quaisquer meios, sem a autorização prévia do Grupo D’Plácido.
Catalogação na Publicação (CIP) Ficha catalográfica CAIADO, Bárbara Barbizani de Mello. [Ir]Redutibilidade Salarial e Princípio da Proibição do Retrocesso -- Belo Horizonte: Editora D’Plácido, 2017. Bibliografia. ISBN: 978-85-8425-554-2 1. Direito. 2. Direito do Trabalho. I. Título. II. Autor CDU340
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Ao Diogo, por tudo e sempre.
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AGRADECIMENTOS
A Deus, pela graça e misericórdia infinitas. Aos meus pais, por todas as renúncias em favor da minha felicidade. Ao meu irmão,Vinícius Barbizani, em Sydney, por seus ensinamentos. À Professora Ana Paula Pavelski, em Curitiba, pelo incentivo ao desenvolvimento de conhecimento em Direito Laboral. À Juíza Léa Pêssoa Sarmento, em Belém do Pará, por demonstrar uma extraordinária generosidade na partilha de conhecimento. Ao Professor José Anchieta da Silva, em Belo Horizonte, com quem tive a honra de conviver e aprender. Sou grata pela amizade e ensinamentos. Ao Professor Doutor Jorge Reis Novais, pela sua simplicidade na partilha de conteúdos de extrema utilidade social em Direito Constitucional. Ao Professor Doutor Pedro Pais deVasconcelos, pela sua disponibilidade em endereçar temas de elevada complexidade em Direito Comercial. À Professora Doutora Maria do Rosário Palma Ramalho, pelas suas inestimáveis aulas de Direito do Trabalho e determinante orientação em contexto de tese.
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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
AAVV – Autores Vários Ac. – Acórdão ACT PT – Autoridade para as Condições de Trabalho ACT BR – Acordo Coletivo de Trabalho ADIn – Ação Direta de Inconstitucionalidade BVerfGE – Entscheidungen des Bundesverfassungsgerichts – Coletânea Oficial das Decisões do Tribunal Constitucional Federal CC – Código Civil CCT – Contrato Coletivo de Trabalho CE – Comunidade Europeia CEE – Comunidade Econômica Europeia CF/88 – Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 CGT – Central Geral dos Trabalhadores do Brasil CIP – Confederação Empresarial de Portugal CLT – Consolidação das Leis do Trabalho CNI – Confederação Nacional da Indústria CNT – Confederação Nacional do Transporte Coord. – Coordenador CP – C ódigo Penal CPC – Código de Processo Civil CRP – Constituição da República Portuguesa
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CSE – Carta Social Europeia CT – Código do Trabalho de 2009 CT 2003 – Código do Trabalho de 2003 CTFP – Contrato de Trabalho em Funções Públicas CTPS – Carteira de Trabalho e Previdência Social CUT – Central Única dos Trabalhadores DIEESE – Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos Dir. – Diretor DL – Decreto-Lei DUDH – Declaração Universal dos Direitos do Homem EC – Emenda Constitucional ECJ – European Court of Justice ed. – Edição Ed. – Editor ETN – Estatuto do Trabalho Nacional FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador FGTS – Fundo de Garantia do Tempo de Serviço FSU – Finnish Seamen’s Union HCJ – High Court of Justice IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IDE – Investimento Direto Estrangeiro IDET – Instituto de Direito da Empresa e do Trabalho IGT – Inspeção-Geral do Trabalho IPEA – Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas IRCT – Instrumento de Regulamentação Coletiva de Trabalho ITF – International Transport Workers’ Federation LCT – Regime jurídico do Contrato de Trabalho LCTFP – Lei do Contrato de Trabalho em Funções Públicas LGTFP – Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas LGOE – Lei Geral de Orçamento Geral do Estado
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LVCR – Leis dos Vínculos, Carreiras e Remunerações dos Trabalhadores que exercem Função Pública MERCOSUL – Mercado Comum do Sul OEA – Organização dos Estados Americanos OGE – Orçamento Geral do Estado OIT – Organização Internacional do Trabalho OJS – Orientações Jurisprudenciais Org. – Organizador PAEF – Plano de Assistência Econômica e Financeira PDI – Plano de Dispensa Incentivada PEC – Programa de Estabilidade e Crescimento PIB – Produto Interno Bruto PIDESC – Pacto Internacional Sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais PLR – Participação nos Lucros e Resultados PME – Pequena e Média Empresa PPE – Programa de Proteção ao Emprego RCT – Regulamentação do Código do Trabalho RCTFP – Regime de Contrato de Trabalho em Funções Públicas RO – Recurso Ordinário SDI – Seção de Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho SNS – Serviço Nacional de Saúde STF – Supremo Tribunal Federal do Brasil STJ BR – Superior Tribunal de Justiça do Brasil STJ PT – Supremo Tribunal de Justiça de Portugal TC – Tribunal Constitucional TCE – Tratado da Comunidade Europeia TFUE – Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia t.v.h. – Taxa de Variação Homóloga TRC – Tribunal da Relação de Coimbra TRE – Tribunal da Relação de Évora
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TRP – Tribunal da Relação do Porto TRT – Tribunal Regional do Trabalho TST – Tribunal Superior do Trabalho do Brasil UE – União Europeia UGT – União Geral de Trabalhadores
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SUMÁRIO PREFÁCIO
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INTRODUÇÃO
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PARTE I
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1. O DIREITO À RETRIBUIÇÃO
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1.1. Notícia histórica 1.2. Enquadramento geral 1.2.1. Plano internacional 1.2.2. Plano europeu 1.2.3. Plano interamericano 1.3. Enquadramento português 1.3.1. Contexto geral 1.3.2. Constituição da República de 1976 1.3.3. Código do Trabalho Português 1.4. Enquadramento brasileiro 1.4.1. Contexto geral 1.4.2. Consolidação das Leis do Trabalho de 1943 1.4.3. Constituição da República de 1988 1.5. Princípios retributivos 1.5.1. Princípio da suficiência salarial ou salário mínimo 1.5.2. Princípio da igualdade remuneratória 1.5.3. Princípio da relativa intangibilidade de retribuição 1.5.4. Princípio da irredutibilidade de retribuição 1.6. Edifício jurídico em breve nota compreensiva
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2. RETRIBUIÇÃO DELIMITAÇÃO NEGATIVA E POSITIVA
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2.1. Remuneração vs retribuição 2.2. Modalidades retributivas e processamento geral 2.3. Adicionais do modo de prestação da atividade 2.3.1. Trabalho suplementar 2.3.2. Isenção de horário de trabalho 2.3.3. Trabalho Noturno 2.3.4. Insalubridade e Periculosidade 2.4. Descansos remunerados 2.4.1. Descanso Semanal 2.4.2. Período de Férias 2.4.3. Feriados 2.5. Complementos salariais 2.5.1. Subsídio de Natal 2.5.2. Subsídio de Férias 2.5.3. Diuturnidades 2.6. Outras prestações 2.7. Remate conclusivo sobre enquadramento teórico
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3. O ALCANCE DO PRINCÍPIO DA IRREDUTIBILIDADE SALARIAL
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3.1. Face à legislação 120 3.1.1. Quadro português 121 3.1.1.1. Consagração aberta e a possibilidade de restrição ao direito à retribuição 123 3.1.1.2. Lei n.º 23/2012 e as Leis de OGE – reduções remuneratórias por meio de lei 126 3.1.2. Quadro brasileiro 130 3.1.2.1. Consagração em forma de regra e a inconstitucionalidade mais evidente 131 3.1.2.2. Leis restritivas – exemplos esparsos 133 3.2. No âmbito contratual 135 3.2.1. Quadro português 137 3.2.1.1. Proibição de alteração contratual 137 3.2.1.2. Casos excepcionais 138 3.2.2. Quadro brasileiro 140
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3.2.2.1. Proibição de alteração contratual 140 3.2.2.2. Alteração de função ou jornada 144 3.3. Diante da negociação coletiva 146 3.3.1. O poder dos sindicatos 148 3.3.1.1. Evidências de Construção de Valor 150 3.3.1.2. Evidências de Destruição de Valor 153 3.2. Quadro Português 156 3.2.1. Natureza Convênio-Dispositiva da Irredutibilidade no Sistema Português 160 3.2.2. Neutralização dos IRCT operada pela Lei n.º 23/2012 162 3.2.3. Regime de Caducidade da Lei n.º 55/2014 165 3.2.4. Fenômeno da Negociação Coletiva Atípica 167 3.3. Quadro Brasileiro 169 3.3.1. Novo Sindicalismo Brasileiro 174 3.3.2. Indisponibilidade Relativa da Irredutibilidade no Sistema Brasileiro 176 3.4. Aplicação jurisprudencial do princípio da irredutibilidade 178 3.4.1. Quadro Português 180 3.4.1.1. Posicionamento Geral da Jurisprudência Portuguesa 181 3.4.1.2. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 602/2013 182 3.4.1.3. Acórdãos do Tribunal Constitucional acerca das Leis de OGE 184 3.4.2. Breve Análise do Contexto Jurisprudencial Europeu 188 3.4.2.1. Posicionamento do Tribunal Europeu de Direitos Humanos 188 3.4.2.2. Posicionamento do Tribunal de Justiça Europeu 191 3.4.3. Quadro Brasileiro 194 3.4.3.1. Posicionamento Geral da Jurisprudência Brasileira 196 3.4.3.2. Negociação Coletiva: Análise de Casos 198 3.4.3.3. Lei Vs Irredutibilidade como Garantia 204 3.5. Primeira nota conclusiva sobre irredutibilidade 206
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PARTE II
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4. DIREITO À RETRIBUIÇÃO E REALIDADE ECONÔMICA COLOCAÇÃO 211 DO PROBLEMA 4.1. A retribuição face à contingência macro-econômica 212 4.1.1. O cenário econômico atual 214 4.1.1.1. O ambiente norte-americano de alto risco e baixa regulação 215 4.1.1.2. Do contágio norte-americano para Europa e Portugal 217 4.1.1.3. Portugal, envolvente estrutural e conjuntura de crise Europeia 218 4.1.1.4. O Brasil em quasi atrativa solidão 220 4.1.2. O Trabalho enquanto Fonte de Crescimento ou Recessão 222 4.1.2.1. Portugal e Brasil: Comparação em Quadro Econômico Desigual 224 4.1.2.2. Relação entre Produtividade, Desemprego e Procura 226 4.1.2.3. A Centralidade do Fator Trabalho na Competitividade dos Países 232 4.2. A retribuição face à contingência política 240 4.2.1. Impacto das Escolhas Políticas no Direito à Retribuição 241 4.2.1.1. Margem de Escolha do Legislador 242 4.2.1.2. Reserva do Politicamente Adequado 243 4.2.1.3. Reserva do Financeiramente Possível 244 4.2.1.4. Constitucionalização da Ordem Econômica 245 4.2.1.5.Vantagem Política na Maximização de Interesses Econômicos e Coletivos 247 4.2.1.6. Benefício Político e Social de Erradicação da Pobreza 249 4.2.2. Caso Português – Recente Evolução do Sistema Laboral 251 4.2.2.1. Código do Trabalho de 2003 251 4.2.2.2. LivroVerde e Livro Branco das Relações Laborais 253 4.2.2.3. Código do Trabalho de 2009 254 4.2.2.4. A Crise e a Assistência Financeira a Portugal 255 4.2.3. Caso Brasileiro – Caminho para a Maturidade Jurídica 256
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4.2.3.1. Emergência das Assimetrias Sociais e Territoriais 257 4.2.3.2. Caso da Convenção n.º 158 da OIT de 1982 259 4.2.3.3. Flexibilização – Movimentos Esparsos 261 4.3. Breve comentário à contingência econômica e política 262
5. O PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DO RETROCESSO
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5.1. Notícia histórica 265 5.2. Dogmática geral 267 5.2.1. Perspectiva alemã 267 5.2.2. Perspectiva francesa 270 5.2.3. Perspectiva italiana 272 5.2.4. Perspectiva espanhola 274 5.3. Realidade portuguesa 275 5.3.1. Dogmática portuguesa 275 5.3.1.1. Importação alemã 276 5.3.1.2. Inovação jurisprudencial 277 5.3.2. Ineficácia do Princípio da Proibição do Retrocesso em Portugal 280 5.3.2.1. Amadurecimento Jurisprudencial 280 5.3.2.2. Recolocação Doutrinária do Problema 282 5.3.3. Protecção dos Direitos Fundamentais em Portugal 286 5.3.3.1. Âmbito de Protecção e Conteúdo Juridicamente Garantido 288 5.3.3.2. Justificação da Restrição e Margem de Controle Judicial 289 5.3.3.3. Teoria dos Limites aos Limites – Controle Constitucional Propriamente Dito 292 5.3.3.4. Limites Materiais de Revisão 296 5.3.3.5. A Célebre Questão dos Direitos Adquiridos 296 5.4. Realidade brasileira 298 5.4.1. Dogmática Brasileira 298 5.4.1.1. Importação Portuguesa 300 5.4.1.2. Despontar do Princípio na Jurisprudência 300 5.4.2. Subsistência do Princípio da Proibição do Retrocesso no Brasil 301 5.4.2.1. Resistência Doutrinária 302
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5.4.2.2. Modas Jurisprudenciais 304 5.4.3. A Protecção dos Direitos Fundamentais no Brasil 307 5.4.3.1. Âmbito de Proteção e Conteúdo Juridicamente Garantido 309 5.4.3.2. Justificação da Restrição e Margem de Controle Judicial 310 5.4.3.3. Teoria dos Limites aos Limites – Controle Constitucional Propriamente Dito 311 5.4.3.4. Cláusulas Pétreas – Limites Materiais de Reforma da CF/88 312 5.4.3.5. Sensacional Questão dos Direitos Adquiridos 313 5.5. Incongruência dogmática do princípio da proibição do retrocesso 315 5.5.1. Introdução à Incongruência do Princípio da Proibição do Retrocesso Social 316 5.5.1.1. Pressuposto de Ausência de Consagração Constitucional dos Direitos Sociais 317 5.5.1.2. Pressuposto de Implementação do Progresso Contínuo 320 5.5.2. Casos-Limite e Recondução à sua Refutação 322 5.5.2.1. Núcleo Essencial do Direito e Dignidade da Pessoa Humana 324 5.5.2.2. Respeito pelo Princípio da Igualdade e Proteção da Confiança 327 5.5.2.3. Direito Sedimentado em Determinada Sociedade 329
6. DESCONSTRUÇÃO DO RETROCESSO PROIBIDO – CONCLUSÃO SUMÁRIA 331 CONSIDERAÇÕES FINAIS - DIREITO À RETRIBUIÇÃO, IRREDUTIBILIDADE SALARIAL E PROIBIÇÃO DO RETROCESSO
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REFERÊNCIAS
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LISTA DE JURISPRUDÊNCIA
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ANEXOS
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PREFÁCIO
UM PREFÁCIO QUE NÃO ERA NECESSÁRIO A Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa acolheu, no ano letivo de 2012/2013, um coeso grupo de brasileiros que ali cursaram mestrado e doutorado nos vários ramos oferecidos, tendo, logo, se destacado, no grupo, a pessoa de Bárbara Barbizani de Carvalho de Mello Franco Caiado, filha de mineiros das Minas Gerais, formada pela boa escola de Curitiba-PR e que, já residindo em Lisboa, cursou, com êxito e com brilho, o seu Mestrado na área de concentração das Ciências Jurídico-Laborais. O seu curso de mestrado foi coroado com a defesa de sua dissertação, sob o título de “(Ir)Redutibilidade Salarial e a Incongruência Dogmática do Princípio da Proibição do Retrocesso”. A jovem mestra se revelou. Enfrentou tema de peso e da hora, e se propôs a tratar da questão numa visão comparada do Direito do Trabalho vigente no Brasil (sua construção doutrinária e jurisprudencial) e do Direito Laboral vigorante em Portugal, sob a segura e erudita orientação da Professora Doutora Maria do Rosário Palma Ramalho. O tema compreende mesmo desafio de fôlego para os dois ordenamentos jurídicos, nos dois lados do oceano atlântico. Portugal e Brasil enfrentam problemas de razoável magnitude em relação às suas legislações laborais. Portugal, em face dos compromissos assumidos com a TROIKA trabalha na reorganização de suas contas e o Brasil precisa rever sua Consolidação das Leis do Trabalho - CLT que é de meados da centúria passada (1945), acordando tarde para uma realidade que já nem é nova, no sentido de se atribuir mais valia para as avenças privadas, entre trabalhadores e empregadores, sobrepondo 19 BOOK_Irredutibilidade salarial.indb 19
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o negociado sobre o legislado, como forma de efetiva valorização da representação coletiva sem, necessariamente, o engessamento de relações com leis, regulamentos e julgados que não respondem às necessidades da sociedade com a presteza que delas outrora se podia esperar. O mundo moderno não tem tempo para liturgias e burocracias desnecessárias. No mundo moderno as coisas novas ficam velhas antes mesmo de se tornarem conhecidas. Desde a parte introdutória da obra se percebe não apenas a atualidade da tese como a excelente base teórica dos escritos de Bárbara Barbizani. Para sustentar o direito à retribuição como um direito fundamental, a pesquisadora traz a texto a proclamação da Organização Internacional do Trabalho – OIT, com o Tratado de Versalhes (1919) a reconhecer que o trabalho não pode ser reduzido à condição de mercadoria, recorrendo ainda à centésima convenção desse mesmo organismo plurinacional (1951) quando se reconheceu a isonomia salarial, na confirmação da afirmativa segundo a qual para trabalho igual se confere remuneração também igual. O texto faz o ajuste linguístico, registrando logo à partida, salário e retribuição em sentido estrito, acomodando as corretas linguagens adotadas pelos dois ordenamentos examinados. O trabalho, moderno, contém proposições intelectualmente honestas e ideologicamente moderadas como há de ser na relação entre capital e trabalho. A pesquisadora disserta sobre o princípio da proibição do retrocesso, contestando a sua efetividade, sem paixões. Desmonta a sua compreensão como um direito adquirido cuja medida estará no preenchimento das necessidades humanas no território firme daquilo que seja possível. É preciso ter presente que as relações entre as pessoas são reescritas permanentemente, a cada momento da Humanidade. Daí a compreensão de que nenhum direito social é, exatamente, um direito ensimesmado, em si apenas compreendido. O Direito não é autista. Munida de coragem e de ousadia científicas, a autora propõe uma desconstrução do princípio da proibição do retrocesso – que não há de ser um princípio absoluto, até porque o Direito não é uma ciência que trabalha com o absoluto como regra –para o enquadrar no devido lugar reduzindo-o ao sentido que lhe é próprio na escala dos valores das instituições jurídico-laborais. E assim, na medida da constatação de sua ineficácia prática, faz a ponte com a jusracionalidade para evidenciar a incongruência dogmática que subjaz ao predito príncipio.
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Em conjunto harmônico restam consagrados no trabalho de Bárbara, os princípios da igualdade remuneratória, da suficiência do salário mínimo, da relativa irredutibilidade da retribuição, o que faz lembrar as lições e as advertências do texto de Leão XIII na sua encíclica papal, Rerum Novarum festejadas na encíclica Quadragesimo Anno de Pio XI e outra vez festejada na encíclica Centesimo Annus de João Paulo II, textos que necessitam ser revisitados para melhor compreender a necessidade de uma convivência com dignidade entre o capital e o salário. É ainda elogiável o texto na sua peregrinação pela doutrinária e pela jurisprudência bem como das suas notas de rodapé, fartas, densas, próprias e elucidativas, com escalas nos tribunais da União Europeia. Tudo muito digno de uma tese. Antes de desejar aos leitores, portugueses e brasileiros, uma boa e proveitosa leitura, faço uma revelação que faz sentido na cota da amizade que reciprocamente nos dedicamos. A Dissertação de Bárbara Barbizani e o seu filho Matheus nasceram quase ao mesmo tempo. O filho de Bárbara e de Diogo chegou a tempo de ouvir, na banca examinadora, os aplausos aos quais fez jus a jovem e promissora Mestra em Direito Laboral. Portanto, parabéns à autora e à sua jovem família. Assina este prefácio, desnecessário pelos méritos próprios da Dissertação, um leitor privilegiado. José Anchieta da Silva (da Academia Mineira de Letras Jurídicas)
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INTRODUÇÃO
Eis um desafio: fazer deste exercício acadêmico algo verdadeiramente útil para a sociedade. Explorando o momentum, a natureza de um estudo científico ganha uma aderência que em épocas diversas talvez não tivesse, mas nos anos interessantes que vivemos surge como que ampliada. Quando partimos da ignorância e nos debatemos com o desenvolvimento de um tema, prosseguindo utopicamente um horizonte, que cada dia parece mais longínquo e inacessível, surgem as primeiras perguntas, que se mostram robustas, e anseiam-se por respostas, que se almejam certeiras. Estas, assim como a utopia1, diante da complexidade desta temática, servem para pensar, caminhar e propor soluções intelectualmente honestas e ideologicamente moderadas. No entanto, como tardam em aparecer os portos de ancoragem e como são improváveis de legitimar os passos percorridos, acredita-se que “mais importante do que apontar – ou querer apontar – uma solução definitiva, numa pretensão que logo, só por si, se revelaria acientífica, é descobrir o sentido de uma evolução, os seus factores e a sua concatenação, passada, presente e, na medida do razoável, futura”2. Diante desta terrena e humilde perspectiva, tenta-se, como se tal fosse possível, concate “La utopía está en el horizonte. Si yo me alejo diez pasos, ella se aleja diez pasos más. Así que cuando me preguntan para qué sirve la utopía, yo les contesto: La utopía sirve para caminar”. Embora atribuam a autoria desta frase a EDUARDO GALEANO, o próprio historiador latino-americano esclareceu que em rigor, resultou das palavras do cineasta FERNANDO BIRRI, em uma lição conjunta na Universidade de Montevideo. 2 A. MENEZES CORDEIRO – Tratado de Direito Civil Português, Tomo I, 3.º ed, Coimbra, 2007, 331. 1
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nar as questões primordiais num título: [Ir]Redutibilidade Salarial e a Incongruência Dogmática do Princípio da Proibição do Retrocesso. Assim, seria sempre temporária e levemente carregada de hipocrisia, uma repercussão analítica que fosse contra a Natureza das Coisas e simplesmente ignorasse a ponte “entre jusracionalidade e juspositividade, como catalisador necessário para pôr em presença e relacionar o facto e a norma, o ser e o dever-ser, tanto na legislação como na concretização e na decisão jurídica”3. Embora sem a pretensão de esgotá-lo, não se pode simplesmente colocar no zênite do nosso esforço um título como «[Ir]Redutibilidade Salarial e a Incongruência Dogmática do Princípio da Proibição do Retrocesso» sem o desmistificar, sem o dever de o tornar extraordinariamente simples, para o poder demonstrar na sua densa e necessária atratividade. Dentro desse exercício e reconhecendo que os elementos e fenômenos não cabem fácil ou displicentemente em palavras, procuramos dar uma breve nota da nossa interpretação conceptual. Procuramos explorar a possibilidade do Salário ou Retribuição, enquanto função alimentar resultante do Trabalho, ser ou não Redutível. Salário, na linguagem corrente, significa remuneração, normalmente em dinheiro, devida pelo empregador, em face dos serviços empregados4. Retribuição, ao seu turno e ainda no vocabulário popular, é a ação ou efeito de retribuir, compensação, reconhecimento ou agradecimento do favor que se recebe5. Em sentido jurídico, retribuição ou salário – correspondente a remuneração em sentido estrito – pode ser reconduzido à prestação pecuniária ou em espécie, auferida pelo trabalhador, por razão indissociável e diretamente ligada ao trabalho prestado, e, simultaneamente, devida pelo empregador, como principal dever decorrente do contrato de trabalho. Procuramos entender o Trabalho, abarcando a sua multidisciplinaridade jurídica e econômica, mas não alienando a intrínseca abordagem sociológica, que o define enquanto conjunto de tarefas que, utilizadas para a criação de valor na empresa, deve igualmente ser uma forma digna de interação com P. PAIS DE VASCONCELOS – A Natureza das Coisas, In: AAVV, A evolução do direito no século XXI: estudos em homenagem ao Prof. Arnoldo Wald, Coord. Diogo Leite de Campos, et all.; Coimbra, 2007, 465-519, 466 e 467. 4 Dicionário Enciclopédico de Língua Portuguesa,Vol. II, Lisboa,1992, 1054. 5 Dicionário Enciclopédico de Língua Portuguesa,Vol. II, Lisboa,1992, 1025. 3
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o meio e desenvolver as capacidades do trabalhador, já na Carta das Nações Unidas de 1955, prevista comme une adaptation des hommes aux structures et, réciproquement, des structures aux hommes6. Diante desta incontornável importância, como pode uma sociedade responder, quando o núcleo essencial de um direito como o Direito ao Salário / Retribuição é atacado? Como justificar uma lesão a um direito, seja uma limitação, uma eliminação ou uma retrogressão, quando esse direito substancia uma plataforma sobre a qual a sociedade constrói o seu edifício jurídico necessário à sua identidade e coesão? Quando cumulativamente tal direito resultar de reivindicação, protesto e demanda enquanto ação social concertada para a satisfação de necessidades da sociedade ou determinado setor, evocando causalidade legítima e lógica, qual a margem que sobra ao edifício jurídico, para permitir retrocesso social? Em suma, como não atribuir condição de Irredutibilidade ao salário, tornando-o tendencialmente impossível de reduzir ou simplificar, garantindo a sua gênese em patamar intocável7? Uma sociedade democrática e de bem-estar buscará sempre a defesa dos seus direitos e naturalmente do quantum salarial em matéria retributiva. Como pode não ser apelativo se oferecermos às pessoas um princípio teleológico que crie uma blindagem ad eternum aos seus direitos? Princípio no seu significado corrente quer dizer início, momento em que algo tem origem, causa primária ou elemento predominante8. A definição jurídica, ao seu turno, divide-se em Princípios Jurídicos, consistente nas várias normas, e Princípio Hermenêuticos, que são, pela sua natureza, cânones de interpretação que permitem o desenvolvimento, integração e complementação do direito9. Portanto, um Princípio de Proibição veda amplamente determinada conduta, ordena que não se faça e torna-se defeso10. Retrocesso, ao seu turno, é definido como Para um pertinente artigo sociológico sobre travail social e suas valências: JEAN-MARC DUTRENIT –Travail Social et Travailleurs Sociaux, In: Dictionnaire de Sociologie, Paris, 1999, 547. 7 Dicionário Enciclopédico de Língua Portuguesa,Vol. I, Lisboa,1992, 630. 8 FRANCISCO TORRINHA – Novo Dicionário da Língua Portuguesa, Porto,1946, 949. 9 Cf. J.J. GOMES CANOTILHO – Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7.ª ed, 13.ª Reimpressão, Coimbra, 2003, 1161. 10 FRANCISCO TORRINHA – Novo Dicionário da Língua Portuguesa, Porto,1946, 953. 6
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ato ou efeito de retroceder, que significa ceder a outrem, andar para trás, recuar, retrogradar11. Qualquer sociedade ou homem de boa-fé quereria que tal princípio fosse dogmaticamente congruente para si e para seus pares. Mas, o que acontece quando essa sociedade for definida enquanto sociedade em contexto real, sujeita a contingências que estão para além do seu domínio? Esse contexto, enquanto conjunto de circunstâncias e relações econômicas, políticas e sociais exteriores ao fenômeno jurídico, sendo forçado a equacionar contingências, que reúnem eventos e fenômenos, donde derivam consequências na forma de necessidade ou obrigação, pode permitir que se belisque direitos, designadamente o Direito à Retribuição, fazendo cair pela base o Princípio da Proibição do Retrocesso? Nesta seara tentaremos um humilde esforço de procurar desconstruir o Princípio da Proibição do Retrocesso, dada a sua ausência de relação adequada ao fim proposto, encerrando riscos e obstáculos para a sociedade. Esta incongruência12, enquanto relação inconveniente e inapropriada na prossecução do fim proposto, deve vir acompanhada, para lhe podermos conferir um grau aceitável de robustez jurídica, de emergência dogmática, em seu significado original decorrente da religião, definida como uma parte da teologia que tinha por objetivo a exposição de dogmas, em que estes constituíam a expressão da verdade revelada e imutável. Assim, a teologia usava a dogmática para coordenar as verdades reveladas segundo um ponto de vista pessoal para se chegar a determinada teologia dogmática13. Em termos jurídicos, apesar de ter ganho dimensão e significados próprios, a dogmática jurídica em clara influência do conceito inicial tende a ser definida como instância de justificação e validação axiológica das regras jurídicas, capaz de legitimar-se, por meio da validação isolada dos elementos que fundamentam e determinam a sua própria construção14. Para tal, numa realidade profundamente complexa, afastamo-nos da visão do Direito do Trabalho na sua definição inicial tradicional, enquanto ramo do Direito que se concentra somente nos direitos do Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira,Vol. XXV, Lisboa/Rio de Janeiro, 383. Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira,Vol.VII, Lisboa/Rio de Janeiro, 437. 13 Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira,Vol. IX, Lisboa/Rio de Janeiro, 215. 14 Cf. M. R. PALMA RAMALHO – Da Autonomia Dogmática do Direito Laboral, Lisboa, 2000, 141-150. 11 12
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trabalhador, por a considerarmos redutora e antiquada, e seguimos quem o recoloca enquanto disciplina jurídica que otimiza o polinómio: proteção do trabalhador e salvaguarda dos interesses de gestão; realidade e conjuntura econômica; aderência sociológica ao contexto em que ocorre a relação laboral, nomeadamente no seio empresarial; justiça social na distribuição de riqueza e aumento do bem-estar e crescimento econômico; e, por último, a Rule of Law, tomando as normas e princípios enquanto basilares, estáveis e transparentes para a planificação dos deveres e obrigações de cidadania15. O nível de crescimento e bem-estar social de uma nação depende do desenho de uma estratégia eficaz, alinhada e aderente ao desenvolvimento estrutural público e privado, bem como integrada e reativa sobre a conjuntura econômica, política e social. De nada vale uma estratégia excelente se esta não tiver a correspondente base de incidência para poder ser aplicada, reunindo esta base, de forma não exaustiva, as instituições, o know-how e a capacidade instalada.A mesma estratégia tem ainda que fazer sentido e se adaptar ao comportamento das variáveis econômicas e concorrenciais, às contingências políticas e movimentos de cidadania e, finalmente, à atmosfera sociológica de direitos e expectativas de determinada sociedade. Desta forma, o enquadramento da Matéria Salarial e do Direito à Retribuição, enquanto fenômeno elementar, fundamental e decisivo, da estratégia de uma nação, tem que ser tomado de forma integrada e multidisciplinar. A desmontagem do Princípio da Proibição do Retrocesso tem uma utilidade considerável no contexto real e diante do caso concreto. Em Portugal, um desequilíbrio orçamental crônico desabou numa recessão econômica, que fez reequacionar um conjunto significativo de garantias e certezas, colocadas em foco no panorama jurídico. Não menos foi a todos excessivo / Milagre, e cousa, certo, de alto espanto, / Ver as nuvens, do mar com largo cano, / Sorver as altas águas do Oceano são versos d’Os Lusíadas, que, se transportados para o nosso século, talvez nos remetam para aspirações, conquistas, quiçá direitos adquiridos, que reconduzem o nosso raciocínio, para busca de um ponto ótimo de bem-estar, onde a população, refém de uma realidade maior ao seu entendimento, se questiona Porque somos de ti desamparados / Se este nosso trabalho não te ofende, / Mas antes teu serviço só pretende?16. Já ANNE C. L. DAVIES – Perspectives on Labour Law, Cambridge, 2004, 17. LUÍS VAZ DE CAMÕES – Os Lusíadas, Canto V, 255.
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no nosso Brasil, onde se vivencia um dos principais ciclos de crescimento de toda a sua história, no culminar na década inclusiva, a nossa exposição demonstrará que se a tempestade é a falsa noite17, também a luz pode ser o falso dia, devendo preparar as estruturas e mentalidades para aceitar que determinados postulados no mundo, ao impedirem que se retrogrida, mais do que poderem colocar em causa o edifício do pensamento jurídico e constitucional brasileiro, não permitem que se avance, não aceitam a própria natureza das coisas, com sua oscilação de mudança e incerteza, pois nas grandes e negras pedras dos alicerces do trapiche as ondas ora se rebentavam fragorosas, ora vinham-se bater mansamente18. Para uma clareza de leitura, procuramos brevemente explicar a estrutura da nossa exposição, bem como colocar alguns pressupostos centrais num mesmo nível de análise, de modo a assegurar um discorrer sólido. Desde logo, por entendermos que uma tese de direito comparado é legítimo que possa ter audiências de leitores de pelo menos nacionalidade portuguesa e brasileira, cabe referir que os termos que juridicamente em Portugal são usados como Retribuição e Remuneração, correspondem respetivamente no Brasil, a Salário-Base e Salário Total / Remuneração. Sendo que, focando no nosso objeto de análise, recorremo-nos ao termos Salário e Retribuição como a parcela patrimonial mais relevante na condição de sinônimos. Procurou-se, em medida não exaustiva, em notas acessórias fazer a ponte entre a linguagem corrente portuguesa e brasileira quando diferem para os mesmos temas. O Capítulo I, amplamente necessário, envereda por um breve apanhado histórico, buscando um elo de ligação entre as perspetivas internacional, europeia e inter e sulamericana, procurando evidenciar o momento histórico em que a Retribuição passou a ter um significado central no Direito do Trabalho e na sociedade. Numa das primeiras tentativas de derivar para a visão comparada que nos acompanhará, foca Portugal, sua Constituição de 1976 e seu Código de Trabalho, bem como logo nos oferece um primeiro contraste com o Brasil, pela sua CLT de 1943 e sua marcada Constituição de 1988. São posteriormente colocados em destaque os Princípios Retributivos, porquanto são concretização do Princípio da Proteção do Trabalhador JORGE AMADO – Mar Morto, 1936, 24. JORGE AMADO – Os Capitães da Areia, 1937, 279.
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e constituem vetores e limites para alicerçar o edifício jurídico no qual assenta a problemática. No Capítulo II, partimos para a definição de Retribuição, investindo na mais correta delimitação negativa e positiva, que nos permitirá compreender a diferenciação relativamente ao conceito de Remuneração, para posteriormente podermos dar foco às modalidades retributivas propriamente ditas, aos adicionais do modo de prestação da atividade, aos descansos remunerados, aos complementos salariais e a outras prestações elegíveis para análise, que cabalmente criam impacto no tratamento do tema, demostrando não só a amplitude do dever remuneratório do empregador, mas também a diferença entre a natureza das diferentes parcelas. De posse das bases do edifício jurídico, eis que então, no Capítulo III, nos ocuparemos de uma das questões chave deste trabalho, observando qual o alcance do Princípio da Irredutibilidade Salarial, através da análise da sua forma e natureza de consagração, bem como da sua repercussão prática nas diversas realidades laborais. Neste sentido proceder-se-á à distinção do comportamento do Princípio, verificando como e em que medida, este vetor se projeta: face à lei e ao dever legiferante; no cerne do contrato de trabalho, dessecando qual a regra geral e quais as exceções à determinação proibitiva; no âmbito coletivo, diante da autonomia sindical e do equilíbrio das partes; e, finalmente, em concretização deste comportamento, qual a interpretação que os tribunais, diante das mais diversas aplicações e implicações do Princípio, dão ao próprio alcance do mesmo. Para atingirmos um nível de desenvolvimento com maior legitimidade, partindo da relação de interdependência entre direito, economia e política, no Capítulo IV, em jeito de contraponto analisaremos como a matéria retributiva se desenvolve em um contexto real, econômico e empresarial, e qual a sua relevância neste cenário, não só como valência alimentar, mas sobretudo como fonte de crescimento e desenvolvimento socioeconômico. Neste sentido, tentaremos aferir qual a relação entre custo da unidade de trabalho, nível salarial, produtividade do trabalho, crescimento e competitividade econômica, para, numa fase posterior, perceber quão determinantes são os níveis salariais para as economias modernas e como, num contexto econômico e político, é importante proceder a uma análise holística e racional do tema da Irredutibilidade, centrado não só numa visão redutora do Princípio da Proteção, mas atual e equilibrada, na qual 29 BOOK_Irredutibilidade salarial.indb 29
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a proteção dos interesses de gestão acaba por desaguar na defesa do próprio posto de trabalho e numa recuperação econômica que demonstra-se virtuosa para o aumento de investimento e emprego. Por fim, no último e quinto Capítulo analisaremos como surgiu a crença na existência do Princípio da Proibição do Retrocesso Social, onde residem suas incongruências e, na medida da sua ineficácia, como este raciocínio, pode se demonstrar perverso, ao invés de benéfico, aos interesses sociais. Para tal, retomando o exercício do primeiro Capítulo, demonstraremos que, em nada acrescenta uma tentativa de blindagem do quantum salarial embasada numa matriz principiológica importada e fundamentada num raciocínio que tem tanto de engenhoso, quanto de irracional. Neste sentido, aceitando a natureza das coisas, sem nos dissociarmos da importância e da natureza fundamental do Direito à Retribuição, faremos a análise dos mecanismos de proteção, oriundos de um sistema de recobro extremamente amplo e único, que as próprias constituições nos oferecem, centrado numa perspectiva renovada do Princípio da Proteção do Trabalhador – que se baseia em uma visão holística do fenômeno laboral, na qual importa que se desenvolvam mecanismos protetivos não só para o trabalhador, mas também a favor do empregador19 – por meio da qual é possível desenvolver medidas de eficácia duradouras, suficientemente fortes e, sobretudo, condizentes com a importância que o Direito à Retribuição, per se, encerra. A simplicidade e lealdade intelectual inerente à própria natureza das coisas enquanto horizonte, mas reconhecendo que uma matriz socioeconômica complexa num ambiente de incerteza e mutação, no qual cabe ao Direito procurar modelizar, através de normas e princípios, os conteúdos nos quais deve caber o mundo, constitui a escalada do monte improvável, pois não se pode, condensar numa só lágrima o tumulto oceânico das ondas20, pelo que a sorte que aqui se Embora este seja o próprio Princípio da Proteção do Trabalhador renovado e adaptado a um novo contexto, para diferenciá-lo da corrente que limita o Princípio da Proteção à uma só vertente, voltada somente para o trabalhador, PALMA RAMALHO, enquanto doutrinadora que desenvolveu o brilhante raciocínio batizou-o de Princípio da Compensação da Posição Debitória Complexa das Partes no Contrato de Trabalho. Sobre o tema ver: M. R. PALMA RAMALHO – Da Autonomia Dogmática do Direito do Trabalho, Coimbra, 2001, 970-981. 20 Palavras do integralista A. CORRÊA D’OLIVEIRA – Antologia I, Líricas, Porto, 1946, XV. 19
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dará à Irredutibilidade de Retribuição e ao Princípio da Proibição do Retrocesso, decorrerá da centralidade inequívoca do trabalhador enquanto parte débil da relação laboral, mas será sempre reflexo do que se crê aperfeiçoar a sociedade como um todo, viabilizar o Direito do Trabalho para a otimização do bem-estar social, competitividade econômica e construir uma relação laboral equilibrada, sustentável e sobretudo ética.
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BÁRBARA BARBIZANI DE MELLO CAIADO
JOSÉ ANCHIETA DA SILVA
ISBN 978-85-8425-554-2
editora
CAPA_IrredutibilidadeSalarial_240417_Barbara.indd 1
Bárbara Barbizani de Mello Caiado
Mestre em Ciências Jurídico-Laborais pela Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa. Especialista, com formação avançada, em Direito do Trabalho pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Advogada e consultora jurídica. Membro da Ordem dos Advogados Portugueses. Membro da Ordem dos Advogados Brasileiros.
[IR] REDUTIBILIDADE SALARIAL e Princípio da Proibição do Retrocesso
“
Munida de coragem e de ousadia científicas, a autora propõe uma desconstrução do princípio da proibição do retrocesso – que não há de ser um princípio absoluto, até porque o Direito não é uma ciência que trabalha com o absoluto como regra –para o enquadrar no devido lugar reduzindo-o ao sentido que lhe é próprio na escala dos valores das instituições jurídico-laborais. E assim, na medida da constatação de sua ineficácia prática, faz a ponte com a jusracionalidade para evidenciar a incongruência dogmática que subjaz ao predito príncipio.”
[IR]
REDUTIBILIDADE SALARIAL e Princípio da Proibição do Retrocesso
A simplicidade e lealdade intelectual inerente à própria natureza das coisas enquanto horizonte, mas reconhecendo que uma matriz socioeconômica complexa num ambiente de incerteza e mutação, no qual cabe ao Direito procurar modelizar, através de normas e princípios, os conteúdos nos quais deve caber o mundo, constitui a escalada do monte improvável, pois não se pode, condensar numa só lágrima o tumulto oceânico das ondas, pelo que a sorte que aqui se dará à Irredutibilidade de Retribuição e ao Princípio da Proibição do Retrocesso, decorrerá da centralidade inequívoca do trabalhador enquanto parte débil da relação laboral, mas será sempre reflexo do que se crê aperfeiçoar a sociedade como um todo, viabilizar o Direito do Trabalho para a otimização do bem-estar social, competitividade econômica e construir uma relação laboral equilibrada, sustentável e sobretudo ética.
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