Murilo Amaral Shyrley Bernadelli
Fonte: Shutterstock.com
FRENTE
A
PORTUGUÊS Por falar nisso A língua portuguesa é composta por diversos níveis de estudo: fonológico, morfológico, sintagmático, textual e discursivo. É em nível sintagmático que se estudam as orações subordinadas e como elas se relacionam dentro de um texto. As orações subordinadas, de modo geral, são introduzidas por conjunções subordinativas. Nós veremos que, nas orações subordinadas substantivas, a conjunção que as introduz é a conjunção integrante, que pode ser “que” ou “se”. Já nas orações subordinadas adverbiais, o tipo de conjunção que as inicia são conjunções que denotam circunstâncias de tempo, de modo, de causa, de consequência e várias outras. As únicas orações subordinadas que não são introduzidas por conjunções subordinativas são as orações subordinadas adjetivas, que são iniciadas por um pronome relativo. O pronome relativo recebe esse nome justamente por possuir a função de elo coesivo e a função de pronome propriamente dita. Nas próximas aulas, estudaremos os seguintes temas
A13 A14 A15 A16
Orações subordinadas substantivas ............................................. 610 Orações subordinadas adjetivas ................................................... 615 Pronome relativo .......................................................................... 620 Orações subordinadas adverbiais................................................. 624
FRENTE
A
PORTUGUÊS
MÓDULO A13
ASSUNTOS ABORDADOS n Orações subordinadas substan-
tivas
n Classificação das orações subordinadas substantivas
ORAÇÕES SUBORDINADAS SUBSTANTIVAS As orações subordinadas substantivas, como vimos em aulas anteriores, exercem a função sintática própria de um substantivo dentro do período composto. Diferentemente das orações coordenadas, as orações subordinadas não possuem independência sintática em relação à oração principal. As orações subordinadas substantivas podem exercer seis funções sintáticas, como veremos a seguir: Sujeito; Predicativo; Objeto direto; Objeto indireto; Complemento nominal; Aposto.
n n n n n n
Para compreender a classificação das orações subordinadas substantivas é preciso que você tenha estudado bem as funções sintáticas do período simples. Portanto, para esta aula, é importante que você revise esse assunto, a fim de obter melhor desempenho nesta parte da matéria.
Classificação das orações subordinadas substantivas Orações subordinadas substantivas subjetivas As orações subordinadas substantivas subjetivas exercem, dentro da oração, a função de sujeito. Observe que, na oração principal, há a falta desse constituinte sintático, o qual é exercido justamente pela oração subordinada. Veja os seguintes exemplos: É fundamental que você chegue antes da reunião. É preciso que os estudantes façam uma boa prova. Convém que você não se atrase para a entrevista. Sabe-se que o professor entregará as provas amanhã. Está claro que o inverno é mais rigoroso no sul do país?
n n n n n
!
ATENÇÃO!
Leia as observações abaixo: n Observe que o verbo da oração principal seguido por uma oração subordinada subs-
tantiva subjetiva sempre deve estar empregado na 3ª pessoa do singular.
n A oração subordinada substantiva subjetiva sempre pode ser substituída pelo pronome
“isso”, o qual desempenhará a função de sujeito. Veja: n É fundamental que você chegue antes da reunião.
Fonte: Shutterstock.com
n Isso é fundamental.
610
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Orações subordinadas substantivas predicativas
Orações subordinadas substantivas objetivas indiretas
As orações subordinadas substantivas predicativas exercem, dentro da oração, a função de predicativo. Observe que, na oração principal, há a falta desse constituinte sintático, o qual é exercido justamente pela oração subordinada. Confira os exemplos a seguir:
As orações subordinadas substantivas objetivas indiretas exercem, dentro da oração, a função de objeto indireto. Observe que, na oração principal, há a falta desse constituinte sintático, o qual é exercido justamente pela oração subordinada. Observe os exemplos a seguir:
n n n n
!
ATENÇÃO!
Observe que, nas orações subordinadas substantivas predicativas, o verbo da oração principal é sempre o verbo “ser”.
Orações subordinadas substantivas objetivas diretas As orações subordinadas substantivas objetivas diretas exercem, dentro da oração, a função de objeto direto. Observe que, na oração principal, há a falta desse constituinte sintático, o qual é exercido justamente pela oração subordinada. Veja os exemplos a seguir: Todos querem que você seja aprovado no vestibular. Desejo que meu time vença o campeonato de futebol. A professora verificou se todos os alunos estavam presentes. O pessoal não sabe quem era o dono do carro importado. Alguém dentro desta sala sabe onde está o meu sapato?
n n n n n
!
ATENÇÃO!
Veja que, nos exemplos acima, as orações subordinadas substantivas objetivas diretas se iniciaram por um elo coesivo diferente das tradicionais conjunções integrantes “que” e “se”. Somente tais orações substantivas podem ser iniciadas por esses tipos de elos coesivos. Normalmente, utilizam-se os seguintes: n Os pronomes indefinidos nas interrogativas indiretas:
que, quem, qual, quanto (a)(s).
n n n n n
O gerente precisa de que tudo esteja em ordem. O meu pai insiste em que eu estude para Medicina. Marta não gosta de que a chamem de senhora. Eles gostariam de que a pesquisa fosse feita por mim. O aluno precisa de que o professor arredonde a sua nota.
Orações subordinadas substantivas completivas nominais As orações subordinadas substantivas completivas nominais exercem, dentro da oração, a função de complemento nominal. Observe que, na oração principal, há a falta desse constituinte sintático, o qual é exercido justamente pela oração subordinada. Veja os exemplos a seguir: n n n n n
Eu tenho certeza de que eu vou passar de ano. Meu pai está convicto de que retornarei brevemente. Sentimos orgulho de que você tenha se comportado bem. Temos fé em que a humanidade vencerá mais esta barreira. Estou certo de que meu time vencerá o torneio.
Orações subordinadas substantivas apositivas As orações subordinadas substantivas apositivas exercem, dentro da oração, a função de aposto. Observe que, na oração principal, há a falta desse constituinte sintático, o qual é exercido justamente pela oração subordinada. Confira os exemplos a seguir: n n n
Todos pensam a mesma coisa: que o Brasil está em crise. Eu lhe desejo apenas isto: que você tenha um ótimo retorno às aulas. Fernanda tinha um grande sonho: que o dia do seu casamento chegasse. A13 Orações subordinadas substantivas
O nosso desejo é que ela vença o campeonato. A impressão é de que eu não fui bem na prova. A ambição do político sempre é que o povo vote nele. O objetivo da empresa é que os funcionários trabalhem bastante. O sonho da nação foi que o país não caísse em crise.
n
n Os advérbios nas interrogativas indiretas: como, quando,
Fonte: Shutterstock.com
onde, por que, quão.
611
o de nião esde a insalou adar; ordar em civique nte o ertas
Português
Exercícios de Fixação 01. (IF MA) Leia a tirinha abaixo:
Classificar as orações que fazem parte de um período composto significa identificar a função sintática que as mesmas exercem em relação à oração principal, correspondente a cada uma delas. Assim, na primeira fala do texto acima, Hagar se utiliza de uma oração a) Subordinada substantiva completiva nominal. b) Subordinada substantiva objetiva direta. c) Subordinada substantiva objetiva indireta. d) Subordinada substantiva predicativa. e) Subordinada substantiva subjetiva 02. (IF MA)
DAVIS. Jim. Garfield. Folha de S. Paulo, São Paulo, 8 abr. 2014. Ilustrada.
Sobre a tirinha Garfield responda: O período composto por subordinação, presente no texto, é formado por uma oração principal e por uma oração. a) subordinada substantiva completiva nominal. b) subordinada substantiva objetiva indireta. c) subordinada substantiva objetiva direta. d) subordinada substantiva predicativa. e) subordinada substantiva apositiva. 03. (IF GO)
“As pessoas esperam que o ano que está começando seja melhor que o anterior”. a) A palavra “que” introduz uma oração adverbial causal. b) A palavra “que” introduz uma oração adjetiva explicativa. c) A palavra “que” representa uma interjeição. d) A palavra “que” introduz uma oração subordinada substantiva. e) A palavra “que” representa uma partícula expletiva. 04. (Unievangélica GO) A perfeição e velocidade com que as crianças aprendem a falar Ao chegarem aos 4 anos de idade, as crianças já dominam sua língua materna (e às vezes duas ou três línguas) com total perfeição e facilidade. E note-se que uma criança realiza essa façanha sem receber instrução formal, sem estudar gramática, sem exercícios sistemáticos, em uma tarefa por muito tempo, em que está ocupada aprendendo um mundo de outras coisas: comer sozinha, ir ao banheiro, reconhecer os parentes e amigos, andar, brincar, ligar a TV, fazer birra quando deseja alguma coisa, e todas as outras atividades que preenchem seu dia. O domínio nativo de uma língua envolve, entre muitas outras coisas, a aquisição de um vocabulário de vários milhares de itens e o controle de um grande número de regras, algumas delas bem complexas [...]. E, o que muitas vezes se esquece, também envolve a aquisição de “sequências típicas” de várias espécies, como: expressões idiomáticas do tipo rodar a baiana e de ovo atravessado; uso de verbos que podem significar várias coisas, como dar em dar uma olhada e hoje não dá pra ir lá, ou então fazer em fazer por onde e fazer cera; e milhares de sequências mais ou menos fixas, como levar na moleza, ou duplas de substantivo + modificador como papo furado, débil mental, motorista de táxi. Todas essas sequências típicas são armazenadas na memória independentemente das regras normais da sintaxe, e são elas que dão à fala do nativo aquele caráter espontâneo que um estrangeiro dificilmente consegue adquirir. Não obstante, em três ou quatro anos, as crianças conseguem dominar todo esse conhecimento, e isso em um grau de perfeição que nenhum adulto normalmente consegue, mesmo após longos anos de esforço e estudo.
A13 Orações subordinadas substantivas
PERINI, Mário A. A língua do Brasil amanhã e outros mistérios. São Paulo: Parábola, 2004. p. 127-128.
Disponível em: <www.50emais.com.br>. Acesso em: 01 Nov. 2014.
No primeiro e segundo quadrinhos verifica-se o uso repetido da palavra “que”. Observe o trecho sublinhado e assinale a alternativa correta em relação ao uso do primeiro que em:
612
No enunciado “Não obstante, em três ou quatro anos, as crianças conseguem dominar todo esse conhecimento” a expressão “não obstante” estabelece com os períodos anteriores uma relação de concessão, podendo ser substituída, sem prejuízo de sentido, pelo seguinte operador argumentativo: a) Em razão disso b) Considerando-se isso c) A partir disso d) Apesar disso
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Exercícios Complementares
Envelhecer Arnaldo Antunes
01
A coisa mais moderna que existe nessa vida
02 03
é envelhecer A barba vai descendo e os cabelos vão
04 05
caindo pra cabeça aparecer Os filhos vão crescendo e o tempo vai
06
dizendo que agora é pra valer
07 08
Os outros vão morrendo e a gente aprendendo a esquecer
09 10
Não quero morrer pois quero ver Como será que deve ser envelhecer
11 12
Eu quero é viver pra ver qual é E dizer venha pra o que vai acontecer
13 14
Eu quero que o tapete voe No meio da sala de estar
15 16
Eu quero que a panela de pressão pressione E que a pia comece a pingar
17 18 19
Eu quero que a sirene soe E me faça levantar do sofá Eu quero pôr Rita Pavone
20
No ringtone do meu celular
21 22 23 24
Eu quero estar no meio do ciclone Pra poder aproveitar E quando eu esquecer meu próprio nome Que me chamem de velho gagá
25 26 27 28 29 30
Pois ser eternamente adolescente nada é mais démodé Com uns ralos fios de cabelo sobre a testa que não para de crescer Não sei por que essa gente vira a cara pro presente e esquece de aprender
31
Que felizmente ou infelizmente sempre o
32
tempo vai correr Disponível em https://www.vagalume.com.br/arnaldoantunes/ envelhecer.html. Acesso: 22/9/17.
No enunciado “Eu quero que o tapete voe“ (Ref. 13), tem-se a) uma estrutura sintática e semântica semelhante à do enunciado “Eu quero estar no meio do ciclone” (Ref. 21), o qual apresenta, na ordem, uma oração principal, outra subordinada substantiva reduzida, expressando a ideia
de que, mesmo na velhice, é possível ainda querer realizar e aproveitar certas atividades. b) uma estrutura sintática formada por uma primeira oração, chamada de principal, e por uma outra, denominada de oração subordinada substantiva, que serve como sujeito da primeira, para ser transmitida a ideia sobre quem o enunciador está falando. c) uma estrutura sintática formada por uma oração principal e por uma outra oração subordinada substantiva, a qual funciona como complemento direto da primeira oração, para o enunciador enfatizar o objeto do seu querer e, assim, mostrar sua vivacidade. d) uma estrutura sintática diferente da dos enunciados “Eu quero que a panela de pressão pressione” (Ref. 15) e “Eu quero que a sirene soe” (Ref. 17), que apresentam uma oração principal seguida de uma oração subordinada objetiva direta, em que se mostra a possiblidade de o desejo do enunciador se realizar. 02. (IF MA) Leia a tirinha “Armandinho”.
Ainda sobre a tirinha Armandinho, a frase “Às vezes parece que esperamos algum sinal”, a oração destacada é classificada como oração subordinada substantiva a) predicativa. b) subjetiva. c) completiva nominal. d) objetiva direta. e) objetiva indireta. 03. (IF MA) Marque a alternativa que tenha uma oração com o mesmo valor sintático da oração: “Acho que, no fundo, ela não é muito diferente da nossa”. a) Na listagem não constava que você tivesse votado. b) O presidente do clube duvidou de que o jogador iria para outro time. c) Nossa esperança sempre foi que um dia esse pesadelo acabasse. d) Sempre fazia ao pai o mesmo pedido: que ele nunca vendesse o casarão. e) Você sabe que viajaremos no próximo domingo.
613
A13 Orações subordinadas substantivas
01. (UECE)
Português
04. (Uncisal AL)
Atraindo cada vez mais brasileiros, Canadá se firma como des-
Criança e Natureza: Precisamos trazer áreas
tino global de imigrantes <https://tinyurl.com/m83b8bg> Acesso em: 17.02.2017.
verdes para nossas cidades Em 2008, pela primeira vez na história foi registrado que a maior parte da população mundial morava em cidades. No Brasil, esse número chegava a 84% da população, segundo dados do IBGE 2010. O estilo de vida apressado, que adotamos ao morar em centros urbanos, nos afasta, e também nossas crianças, do convívio com a natureza. No livro A última criança na natureza, o autor, Richard Louv, aponta que o aumento de doenças modernas, que já atingem as crianças, como hiperatividade, déficit de atenção e depressão, tem origem no modo de vida urbana e na falta do contato com a natureza. Provavelmente, você se recorda de ter brincado em uma área livre, em sua infância. Mas, se não mudarmos nossa forma de agir e pensar, as próximas gerações talvez não tenham essa oportunidade. [...] Existem movimentos em diversos países promovidos por pessoas ou organizações que sonham reverter anos e anos de declínio no convívio com a natureza. No entanto, precisamos, todos, fazer nossa parte para tornar as cidades espaços mais ricos em natureza. […] Afinal, queremos ser lembrados pelas gigantes selvas de pedra que construímos ou pelas gigantes selvas verdes que preservamos? Adaptado de: <http://epoca.globo.com/ciencia-e-meio-ambiente/blog-do-planeta/noticia/2017/06/crianca-e-natureza-precisamos-trazer-areas-verdes-para-nossas-cidades. html>. Acesso em: 24 out.2017.
Considerando que os diferentes tipos de orações estabelecem diferentes relações de sentido em um texto, assinale a alternativa cuja classificação das orações destacadas esteja correta. a) “Mas, se não mudarmos nossa forma de agir e pensar, as próximas gerações talvez não tenham essa oportunidade.” – oração subordinada adverbial concessiva. b) “Provavelmente, você se recorda de ter brincado em uma área livre, em sua infância.” – oração subordinada substantiva completiva nominal. c) “O estilo de vida apressado, que adotamos ao morar em centros urbanos, nos afasta, e também nossas crianças, do A13 Orações subordinadas substantivas
convívio com a natureza.” – oração coordenada explicativa. d) “[…] pela primeira vez na história foi registrado que a maior parte da população mundial morava em cidades.” – oração subordinada substantiva subjetiva. e) “No Brasil, esse número chegava a 84% da população, se-
A relação entre as duas orações que compõem o título da notícia é de a) subordinação, porque ambas as orações são independentes. b) subordinação, porque a primeira oração é dependente da segunda. c) subordinação, pois a segunda oração depende da primeira. d) coordenação, porque a segunda oração é dependente da primeira. e) coordenação, pois ambas as orações são dependentes. 06. (IF CE) No período “O problema da pesquisa é que você não cumpriu com todos os objetivos estabelecidos”, encontramos exemplo de uma oração subordinada a) substantiva objetiva direta. b) adjetiva restritiva. c) substantiva predicativa. d) adverbial concessiva. e) substantiva subjetiva reduzida de infinitivo. 07. (FGV SP) Pensar no envelhecimento é algo que costuma incomodar a maior parte das pessoas. Herdamos das gerações passadas a ideia de que a idade inexoravelmente sinaliza o fim de uma vida produtiva plena e que o melhor a fazer é aceitar a decadência física, almejando contar com o conforto proporcionado por uma boa aposentadoria. Mas o mundo mudou. Hoje, uma nova geração descobre que, se tomar decisões sábias na juventude, pode tornar o tempo futuro uma genuína etapa da vida e, mais do que isso, uma fase áurea da nossa existência. Estudos demográficos apontam que as gerações nascidas desde a década de 60 podem contar com, pelo menos, mais 20 anos em sua expectativa de vida. Na verdade, se recuarmos um pouco mais, vamos constatar que esse bônus de longevidade é maior ainda. No início do século 20, mais ou menos na mesma época em que a aposentadoria foi criada, a expectativa de vida ao nascer do brasileiro era, em média, de 33 anos. Hoje estamos quase chegando aos 80. Em pouco mais de 100 anos o bônus de longevidade foi de quase 50 anos! (Você S/A – Previdência, setembro de 2016)
gundo dados do IBGE 2010.” – oração subordinada adverbial conformativa. 05. (Fatec SP) Recentemente, a agência de notícias BBC publicou
614
No texto, a frase “Mas o mundo mudou.” (1º parágrafo) relaciona diferentes informações da argumentação do autor.
uma reportagem sobre o controle imigratório no Canadá, com
Que tipo de oração coordenada o autor empregou? Que senti-
o seguinte título:
do ela estabelece no texto? Questão 07. Em “Mas o mundo mudou”, a oração é coordenada sindética adversativa e estabelece relação de oposição com o que foi enunciado anteriormente. O autor começa relatando a preocupação dos indivíduos com as consequências do envelhecimento e usa a oração adversativa para, em oposição ao que foi dito, argumentar que os jovens de hoje envelhecerão de forma mais sábia.
FRENTE
A
PORTUGUÊS
MÓDULO A14
ORAÇÕES SUBORDINADAS ADJETIVAS As orações subordinadas adjetivas, diferentemente das orações subordinadas substantivas, são iniciadas não pelas conjunções integrantes “que” ou “se”, mas por um pronome relativo. É importante destacar que as orações subordinadas adjetivas podem ser divididas em dois grupos: n n
Orações subordinadas adjetivas restritivas: quando não são isoladas por vírgulas. Orações subordinadas adjetivas explicativas: quando são isoladas por vírgulas.
Formação das orações subordinadas adjetivas
ASSUNTOS ABORDADOS n Orações subordinadas adjetivas n Formação das orações subordinadas adjetivas n Orações subordinadas adjetivas restritivas n Orações subordinadas adjetivas explicativas n A importância da vírgula
Leia a seguir as duas orações: n n
Gabriela é uma estudante muito dedicada. Gabriela passou no vestibular para Medicina.
Veja que nas orações acima há um termo que se repete, isto é, o sujeito das duas orações: “Gabriela”. No entanto, no processo de escrita de um texto, é importante que você evite repetições desnecessárias, como a repetição do nome da estudante acima. Para isso, você pode usar um pronome relativo que evite a repetição. Desse modo, ao juntar as duas orações acima em um só período, elas ficariam dispostas assim: n
Gabriela, que é uma estudante muito dedicada, passou no vestibular para Medicina.
Observe que, na oração “Gabriela é uma estudante muito dedicada”, o termo “Gabriela” foi substituído pelo pronome relativo “que”, que o substitui. Assim, evita-se a repetição desnecessária. A nova oração incluída no período, “que é uma estudante muito dedicada”, é uma oração subordinada adjetiva. Nesse caso, por estar isolada por vírgulas, ela pode ser classificada como uma oração subordinada adjetiva explicativa.
Orações subordinadas adjetivas restritivas Nas orações subordinadas adjetivas restritivas, não há marcação de pausa. Portanto, o uso da vírgula para isolá-las do resto do período é incorreto. Essas orações são as que especificam o sentido da oração principal. Veja o exemplo: n
Jamais teria chegado aqui, não fosse a gentileza de um homem que passava naquele momento.
Fonte: Shutterstock.com
Nesse período, observe que a oração em destaque restringe e particulariza o sentido da palavra “homem”: trata-se de um homem específico, único. A oração limita o universo de homens, isto é, não se refere a todos os homens, mas sim àquele que estava passando naquele momento.
615
Português
Orações subordinadas adjetivas explicativas Nas orações subordinadas adjetivas explicativas, há marcação de pausa. Nesse caso, é necessário o uso da vírgula para isolá-la do resto do período. Essas orações ampliam o sentido da oração principal. Observe o exemplo: n
O homem, que se considera racional, muitas vezes age como um animal irracional.
Nesse período, a oração em destaque não tem sentido restritivo em relação à palavra “homem”: na verdade, essa oração apenas explicita uma ideia que já sabemos estar contida no conceito de “homem”.
A importância da vírgula Imagine-se em um bate-papo com amigos e você ouve alguém dizer, enquanto se despede, que tem que sair para buscar “a namorada que estuda no Colégio Olimpo” ou “a namorada, que estuda no Colégio Olimpo”. Veja que a diferença entre os dois períodos é apenas o uso da vírgula. Assim, tais orações se classificariam da seguinte maneira: n n
Ele saiu para buscar a namorada que estuda no Colégio Olimpo. (oração subordinada adjetiva restritiva) Ele saiu para buscar a namorada, que estuda no Colégio Olimpo. (oração subordinada adjetiva explicativa)
Mas qual diferença o uso da vírgula provocaria na interpretação desse enunciado? Imagine-se como a suposta namorada do período acima. Vivendo em uma sociedade cujos valores morais privilegiam a fidelidade, você preferia que ele tivesse usado vírgulas ou não? Seria melhor que ele tivesse usado as vírgulas, pois significa que ele saiu para buscar a sua única namorada, que, por sinal, estuda no Colégio Olimpo. No entanto, se ele não tivesse usado as vírgulas, significaria que ele buscaria a namorada que estuda no Colégio Olimpo, mas que ele também teria outra namorada que estuda em outro colégio.
Fonte: Shutterstock.com
A14 Orações subordinadas adjetivas
Observe como a oração explicativa apenas traz uma informação adicional para a oração principal, no caso, informando em qual colégio estuda a namorada do rapaz. Já, se a oração fosse restritiva, a namorada seria especificada como a que estuda em tal colégio, enquanto há uma outra que não estuda no mesmo estabelecimento.
616
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Exercícios de Fixação
02. (PUC GO) Sacristão Só tenho a lamentar minha pobreza, que não me permite ajudar os amigos. Severino Mais pobre do que Vossa Senhoria é Severino do Aracaju, que não tem ninguém por ele, a não ser seu velho e pobre papo-amarelo. Mas mesmo assim eu quero ajudá-lo, porque Vossa Senhoria é meu amigo. (Tirando o dinheiro.) Três contos! Estou quase pensando em deixar o cangaço. Eu deixava vocês viverem, o bispo demitia o sacristão e me nomeava no lugar dele. Com mais uns cinquenta cachorros que se enterrassem, eu me aposentava. (Sonhador.) Podia comprar uma terrinha e ia criar meus bodes. Umas quatro ou cinco cabeças de gado e podia-se viver em paz e morrer em paz, sem nunca mais ouvir falar no velho papo-amarelo. Bispo Mas é uma grande ideia, Severino. Severino É uma grande ideia agora, porque a polícia fugiu. Mas ela volta com mais gente e eu não dava três dias para o senhor bispo fazer o enterro do novo sacristão. [...] (SUASSUNA, Ariano. Auto da Compadecida. 32. ed. São Paulo: Agir, 2006. p. 109. Adaptado.)
Assinale a alternativa que indica corretamente a função da oração “que não tem ninguém por ele”, presente na fala de Severino: a) Justificar o motivo pelo qual Severino se considera mais pobre do que o Sacristão. b) Provocar no Bispo um sentimento de piedade e de comoção em relação à condição de solitário de Severino.
c) Apresentar uma informação adicional sem valor textual-discursivo, sendo, portanto, possível suprimi-la do texto. d) Restringir a ideia expressa anteriormente como forma de especificar o personagem. 03. (Espcex SP) Assinale a alternativa que analisa corretamente a oração sublinhada na frase a seguir. “Os animais que se alimentam de carne chamam-se carnívoros.” a) A oração adjetiva sublinhada serve para explicar como são chamados os animais que se alimentam de carne e, portanto, por ser explicativa, deveria estar separada por vírgulas. b) Como todos os animais carnívoros alimentam-se de carne, não há restrição. Nesse caso, a oração sublinhada só poderá ser explicativa e, portanto, deveria estar separada por vírgulas. c) Trata-se de uma oração evidentemente explicativa, pois ensina como são chamados os animais que se alimentam de carne. Sendo assim, a oração adjetiva sublinhada deveria estar separada por vírgulas. d) A oração adjetiva sublinhada tanto pode ser explicativa, pois esclarece, em forma de aposto, o termo antecedente, quanto pode ser restritiva, por limitar o sentido do termo “animais”. e) A oração adjetiva sublinhada só pode ser restritiva, pois reduz a categoria dos animais e é indispensável ao sentido da frase: somente os que comem carne é que são chamados de carnívoros. 04. (UPE) No trecho “O articulista lembra que a Chrysler lançará o Dodge Durango SUV, que nos Estados Unidos custa 54 mil reais, no Salão do Automóvel de São Paulo por 190 mil reais.” A oração em destaque a) compara duas ideias. b) apresenta a consequência de um fato anterior. c) insere uma explicação. d) opõe duas afirmações. e) estabelece uma restrição. 05. (IME RJ) Observe os fragmentos abaixo: “ ... a questão é ter coragem de viver, ... ” / “ ... o que significa correr riscos e assumir responsabilidades ..., ” Pode-se dizer que o segundo fragmento, em relação à ideia expressa no primeiro, representa uma: a) explicação. b) finalidade. c) causa. d) consequência. e) exceção.
617
A14 Orações subordinadas adjetivas
01. (PUC MG) Assinale a alternativa em que a oração sublinhada não tenha o mesmo papel que as demais orações também sublinhadas. a) Foi numa conversa com o Antonio Prata, meu ex-amigo-platônico – “ex” não por não ser mais amigo mas por não ser mais platônico – que a bola começou a quicar. b) Eu, que tenho menos escrúpulos e menos ideias, resolvi escrever. c) Algumas palavras estão numa situação pior, como calculista, que vive em constante ménage [...] d) Esse é o problema do casamento entre as palavras, que por acaso é o mesmo do casamento entre pessoas.
Português
Exercícios Complementares 01. (Famema SP) “O temido Exército Imperial do Japão, que em inacreditáveis 2600 anos de guerras jamais sofrera uma única derrota, tinha sido aniquilado pelos Aliados.” (3º parágrafo) A oração destacada é uma oração subordinada a) adverbial comparativa. b) adjetiva restritiva. c) adjetiva explicativa. d) adverbial temporal. e) substantiva objetiva direta.
meu − continuou o Eneias, os olhos azuis transbordando de 14 generosidade. 15 — Sobre o quê? − perguntou o outro. 16 Eu estava frio. Não havia remédio. Tinha que ouvir, mais uma vez, o assunto. 17 — Um caso passado. Conheceu o Melo, que foi dono de uma grande torrefação aqui em São Paulo, e tinha uma ou várias 18 fazendas pelo interior? 19 Pergunta dirigida a mim. Era mais fácil concordar.
02. (FCM PB) Leia: “Os novos grupos propõem mudanças, desenvolvem mecanismos para recuperar a ética, incentivam o surgimento de novos nomes para ocupar cargos públicos e pressionam o Congresso para aprovar as transformações que desejam colocar em prática.”
(In: Omelete em Bombaim, 1946. Disponível em: www.academia.org.br)
A14 Orações subordinadas adjetivas
Sobre as estruturas em destaque no fragmento acima, é correto afirmar que há a) uma relação de dependência sintática entre “Os novos grupos propõem mudanças” e desenvolvem mecanismos [...].” b) uma relação de independência sintática entre as orações “para ocupar cargos públicos” e “incentivam o surgimento de novos nomes.” c) uma estrutura oracional adjetiva de valor restritivo em “que desejam colocar em prática.” d) uma estrutura oracional reduzida com função complementar em “para aprovar as transformações.” e) uma estrutura oracional adjetiva de valor explicativo em “que desejam colocar em prática.” 03. (PUC Campinas SP) Considere o trecho inicial do conto “A aranha”, do escritor e jornalista paulista Orígenes Lessa (1903-1986). 1 — Quer assunto para um conto? – perguntou o Eneias, cercando-me no corredor. 2 Sorri. 3 — Não, obrigado. 4 — Mas é assunto ótimo, verdadeiro, vivido, acontecido, interessantíssimo! 5 — Não, não é preciso... Fica para outra vez... 6 — Você está com pressa? 7 — Muita! 8 — Bem, de outra vez será. Dá um conto estupendo. E com esta vantagem: aconteceu... É só florear um pouco. 9 — Está bem...Então...até logo...Tenho que apanhar o elevador... 10 Quando me despedia, surge um terceiro. Prendendo-me à prosa. Desmoralizando-me a pressa. 11 − Então, que há de novo? 12 — Estávamos batendo papo... Eu estava cedendo, de graça, um assunto notável para um conto. Tão bom, que até comecei 13 a esboçá-lo, há tempos. Mas conto não é gênero
618
É correto afirmar: a) (Refs. 9 e 11) Em − Está bem...Então...até logo... e Então, que há de novo? a palavra sublinhada está empregada com idêntico sentido e exerce idêntica função, a de indicar que o falante tenta iniciar conversa com um interlocutor. b) (Ref. 13) A expressão há tempos está gramaticalmente bem construída, como também está adequada a formulação “daqui há dias”. c) (Ref. 10) Em Quando me despedia, surge um terceiro. Prendendo-me à prosa. Desmoralizando-me a pressa, pode-se entender que as frases em que ocorre o gerúndio têm valor de oração adjetiva explicativa. d) (Ref. 8) Em Dá um conto estupendo. E com esta vantagem: aconteceu..., o pronome destacado remete à ideia de que o assunto daria um conto estupendo. e) (Ref. 15) Em − Sobre o quê? − perguntou o outro, a palavra está adequadamente grafada, como acontece com o destacado em “Perguntava-se o por quê de tanta agressividade contra um monumento histórico”. 04. (FCM PB) Considere os fragmentos: “É desnecessário dizer que nenhuma produção do conhecimento deveria ter um fim em si mesma [...]” “[..] as garantias e os direitos fundamentais que devem servir de regra básica em todos os países, [...]” Sobre os elementos destacados, pode-se afirmar que: I. No primeiro fragmento, introduz estrutura oracional que tem função complementar. II. No segundo fragmento, introduz estrutura oracional de função adjetiva. III. Em ambos os fragmentos, introduzem estruturas oracionais que desempenham a mesma função. IV. No segundo fragmento, além de ter valor restritivo, exerce a função sintática de sujeito da locução verbal “devem servir”. Está(ão) correta(s): a) apenas I e II b) apenas III e IV c) apenas II, III e IV
d) I, II, III e IV e) apenas I, II e IV
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Pneumotórax Febre, hemoptise, dispneia e suores noturnos. A vida inteira que podia ter sido e que não foi. Tosse, tosse, tosse. Mandou chamar o médico: 5 — Diga trinta e três. — Trinta e três...trinta e três.... trinta e três.. — Respire. — O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo [e o pulmão direito infiltrado. — Então, doutor, não é possível tentar o Pneumotórax? 10 — Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino. 1
BANDEIRA, Manuel. Pneumotórax. Poesia Completa e Prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1983. p.206.
Em relação aos aspectos linguísticos que possibilitam a estruturação do poema, é correto afirmar: 01. As vírgulas na primeira estrofe do poema aplicam-se por diferentes razões. 02. O termo coesivo “e”, nos versos dois e oito, semanticamente, expressa valor aditivo. 03. O conector “que”, nas duas situações do verso dois, introduz oração com valor adjetivo. 04. Registra-se um aposto explicativo no verso nove. 05. As ações verbais utilizadas no verso dez constituem uma locução verbal. 06. (IF MA) Observe a tira Hagar abaixo.
Na tira Hagar, a personagem Helga indaga a postura do marido, usando, no primeiro quadrinho, várias orações que podem ser classificadas como? a) Orações coordenadas sindéticas adversativas. b) Orações coordenadas sindéticas explicativas. c) Orações coordenadas assindéticas. d) Orações subordinadas substantivas subjetivas. e) Orações subordinadas adjetivas restritivas 07. (Unesp SP) Considere a passagem de um romance de Autran Dourado (1926- 2012). A gente Honório Cota Quando o coronel João Capistrano Honório Cota mandou erguer o sobrado, tinha pouco mais de trinta anos. Mas já era homem sério de velho, reservado, cumpridor. Cuidava muito dos trajes, da sua aparência medida. O jaquetão de casimira
inglesa, o colete de linho atravessado pela grossa corrente de ouro do relógio; a calça é que era como a de todos na cidade — de brim, a não ser em certas ocasiões (batizado, morte, casamento — então era parelho mesmo, por igual), mas sempre muito bem passada, o vinco perfeito. Dava gosto ver: O passo vagaroso de quem não tem pressa — o mundo podia esperar por ele, o peito magro estufado, os gestos lentos, a voz pausada e grave, descia a rua da Igreja cumprimentando cerimoniosamente, nobremente, os que por ele passavam ou os que chegavam na janela muitas vezes só para vê-lo passar. Desde longe a gente adivinhava ele vindo: alto, magro, descarnado, como uma ave pernalta de grande porte. Sendo assim tão descomunal, podia ser desajeitado: não era, dava sempre a impressão de uma grande e ponderada figura. Não jogava as pernas para os lados nem as trazia abertas, esticava-as feito medisse os passos, quebrando os joelhos em reto. Quando montado, indo para a sua Fazenda da Pedra Menina, no cavalo branco ajaezado de couro trabalhado e prata, aí então sim era a grande, imponente figura, que enchia as vistas. Parecia um daqueles cavaleiros antigos, fugidos do Amadis de Gaula ou do Palmeirim, quando iam para a guerra armados cavaleiros. (Ópera dos mortos, 1970.)
No início do segundo parágrafo, por ter na frase a mesma função sintática que o vocábulo “vagaroso” com relação a “passo”, a oração “de quem não tem pressa” é considerada a) coordenada sindética. b) subordinada substantiva. c) subordinada adjetiva. d) coordenada assindética. e) subordinada adverbial. 08. (FCM PB) No trecho “Isto ocorre por conta dos estudos que indicam que iniciar logo o tratamento traz benefícios para o paciente [...]”, os termos em destaque: a) iniciam, respectivamente, uma estrutura oracional de função adjetiva e uma de função complementar. b) são elementos referenciais e introduzem estruturas oracionais que têm o mesmo valor sintático. c) substituem o termo estudos, exercendo a mesma função sintática do termo substituído. d) iniciam estruturas oracionais de função adjetiva. e) representam um recurso linguístico para evitar repetições. 09. (Fatec SP) É boa a notícia para os fãs da natação, vôlei de praia, futebol, hipismo, ginástica rítmica e tiro com arco que buscam ingressos para os Jogos Olímpicos Rio 2016. Entradas para catorze sessões esportivas dessas modalidades, que tinham se esgotado na primeira fase de sorteio de ingressos, estão à venda. <http://tinyurl.com/qapfdjt> Acesso em: 12.09.2015. Adaptado.
A oração subordinada destacada nesse fragmento é a) adjetiva restritiva. b) adjetiva explicativa. c) substantiva subjetiva. d) substantiva apositiva. e) substantiva predicativa. 619
A14 Orações subordinadas adjetivas
05. (Unifacs BA)
FRENTE
A
PORTUGUÊS
MÓDULO A15
ASSUNTOS ABORDADOS n Pronome relativo
PRONOME RELATIVO Como vimos na aula anterior, as orações subordinadas adjetivas são iniciadas por um pronome relativo. Este pronome, além de servir como elo coesivo entre as duas orações, funciona como uma retomada de um termo da oração principal. Os pronomes relativos são: n n n n n n n
QUE: pronome relativo universal. O (A) (S) QUAL (IS): pronome relativo referencial. QUEM: pronome relativo referente a pessoa. ONDE: pronome relativo referente a lugar. QUANDO: pronome relativo referente a tempo. CUJO: pronome relativo referente a posse. QUANTO (A) (S): pronome relativo referente a quantidade.
Pronome relativo “QUE” O pronome relativo “que” pode ser utilizado em qualquer oração subordinada adjetiva, exceto nas orações que indiquem posse. Veja os exemplos: n n n n n
Os alunos que estudaram bastante passaram no vestibular. Não sente na cadeira que está com o pé quebrado! Vamos ao restaurante em que servem camarão na moranga. Já estamos na semana em que as férias acabam. Joaquim comprou tudo que viu na cidade grande.
Pronomes relativos “O (A) (S), QUAL (IS)” Os pronomes relativos “o (a) (s) qual (is)” podem também ser utilizados em qualquer oração subordinada adjetiva, exceto nas orações que indiquem posse. No entanto, diferente do pronome “que”, que possui intermináveis funções na língua portuguesa, os referidos pronomes relativos só possuem esta função, sendo, portanto, referências para a identificação e a construção de orações adjetivas. n n n n n
Fonte: Shutterstock.com
n
620
Os alunos, os quais estudaram bastante, passaram no vestibular. Não sente na cadeira a qual está com o pé quebrado! Joana, pela qual me apaixonei, magoou meus sentimentos. Vamos ao restaurante no qual servem camarão na moranga. Já estamos na semana na qual as férias acabam. Joaquim comprou tudo o qual viu na cidade grande.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Pronome relativo “QUEM” O pronome relativo “quem” só pode ser utilizado para substituir uma pessoa da oração principal. Veja: n
Joana, por quem me apaixonei, magoou meus sentimentos.
Pronome relativo “ONDE” O pronome relativo “onde” só pode ser utilizado para substituir um lugar da oração principal. Veja: n
Vamos ao restaurante onde servem camarão na moranga.
Pronome relativo “QUANDO” O pronome relativo “quando” só pode ser utilizado para substituir uma noção de tempo da oração principal.
Observe: n
Já estamos na semana quando as férias acabam.
Pronome relativo “CUJO” e suas variantes O pronome relativo “cujo” e suas variantes só pode ser utilizado para substituir uma noção de posse da oração principal. Veja: n
Vamos ao restaurante cujo atendimento é impecável.
Pronome relativo “QUANTO (A) (S)” O pronome relativo “quanto (a) (s)” só pode ser utilizado para substituir uma noção de quantidade da oração principal. Verifique o exemplo a seguir: n
Joaquim comprou tudo quanto viu na cidade grande.
Exercícios de Fixação
sintáticas nas orações principais. Considerando, no terceiro trecho, os períodos: I.
“Conheci que Madalena era boa em demasia, mas não conheci tudo de uma vez.”
II.
“A culpa foi minha, ou antes, a culpa foi desta vida agreste, que me deu uma alma agreste”.
pode-se dizer que as orações sublinhadas desempenham, respectivamente, funções sintáticas de a) objeto direto e adjunto adnominal. b) adjunto adverbial e sujeito. c) objeto indireto e adjunto adverbial. d) sujeito e adjunto adverbial. e) adjunto adnominal e sujeito. 02. (UFMS) A escola que o prefeito inaugurara não ficava na avenida exatamente, mas numa das ruelas que a ela davam e onde uns moradores aguavam diariamente as calçadas para atenuar a poeira, pois não era asfaltada. Tal localização gerou dissensão entre os vizinhos, uma vez que o terminal rodoviário ficava muito longe. Assinale a(s) alternativa(s) correta(s). 01. A presença do pretérito-mais-que-perfeito no início do texto (linha 1) indica um acontecimento anterior aos eventos narrados no pretérito perfeito e no imperfeito. 02. A oração adjetiva “que o prefeito inaugurara” (linha 1) restringe o sentido da palavra “escola”, fazendo pressupor a existência de outras no local.
04. Deduz-se do texto que o ato de aguar as calçadas permitia que a poeira da ruela não asfaltada fosse eliminada. 08. Em “tal localização”, o termo assinalado é um pronome demonstrativo que retoma anaforicamente “ruela”. 16. O texto permite concluir que todas as ruelas adjacentes à avenida, inclusive a da escola, não eram asfaltadas. 03. (Unirio RJ) Em todas as orações abaixo há uma oração subordinada adjetiva, EXCETO em a) “...esse rio, hoje secreto, que corre como um malfeitor debaixo de ruas.” b) “...então reeditado pela José Olympio, um artigo que é um verdadeiro poema em prosa.” c) “... diz que cada casa do vale, como a sua, tinha sua ponte sobre o rio...” d) “...a tromba d’água que descia do corcovado...” e) “...com exceção do rio tietê, que é praticamente do tamanho do reino...” 04. (Ufam AM) Assinale a opção em que a oração adjetiva delimita o significado do substantivo a que se refere: a) Em sua visita à Turquia, que pertence ao mundo islâmico, Bento XVI afirmou que cristãos e muçulmanos são todos filhos do mesmo deus. b) João Paulo II foi sucedido pelo cardeal Joseph Ratzinger, que era seu braço-direito. c) Muito aprecio Rubem Braga, que escreveu as mais belas crônicas de nossa literatura. d) Já ouviste dizer que cobra que não anda não engole sapo? e) Nas folgas, costumava frequentar a Ponta Negra, onde sempre encontrava velhos e queridos amigos.
621
A15 Pronome relativo
01. (PUC SP) As orações subordinadas desempenham funções
que baixo
agrae fuem: forntro
Português
Exercícios Complementares
opeesta-
01. (Ufam AM)
08. A última oração expressa circunstância de fim. BANZO
m 35 ta de
ibuir uan-
que zões
nos orastão : no ntes undo refe-
16. Não contém orações coordenadas.
1. 2. 3. 4.
Visões que n’alma o céu do exílio incuba, Mortais visões! Fuzila o azul infando... Coleia, basilisco de ouro, ondeando, Níger... Bramem leões de fulva juba...
5. 6. 7. 8.
Uivam chacais... Ressoa a fera tuba Dos cafres, pelas grotas retumbando, E a estralada das árvores que um bando De paquidermes colossais derruba...
9. 10. 11.
Como o guaraz nas rubras penas dorme, Dorme em nimbos de sangue o sol oculto... Fuma o saibro africano incandescente...
12. 13. 14.
Vai coa sombra crescendo o vulto enorme Do baobá... E cresce n’alma o vulto De uma tristeza imensa, imensamente. Raimundo Correia
Entre os versos 5 e 8, observa-se o seguinte enunciado:
rmantam , de-
“Ressoa a fera tuba dos cafres, pelas grotas retumbando, e a estralada das árvores, que um bando de paquidermes colossais derruba...” A respeito desse período, pode-se dizer: I. É composto por coordenação e subordinação, possuindo um total de três orações. II. O pronome relativo “que” refere-se a “árvores” e exerce a função de objeto direto. III. “A fera tuba dos cafres” é o sujeito simples da primeira oração, a principal. IV. A última oração é uma subordinada adjetiva.
o deanto stru-
A15 Pronome relativo
Estão corretas a) apenas II e IV. b) apenas I e III. c) I, II e IV. d) I, II e III. e) apenas III e IV. 02. (UEPG PR) Sobre o período “A comprovação e o aumento da idade desses artefatos são um trunfo que Niéde pretende utilizar para que cientistas do mundo todo debatam uma nova hipótese para a ocupação das Américas”, assinale o que for correto. 01. Contém três orações em sua estrutura. 02. É composto por subordinação. 04. A segunda oração tem valor adjetivo.
622
03. (ITA SP) Tem gente que junta os trapos, outros juntam os pedaços. O que, empregado como conectivo, introduz uma oração a) substantiva. b) adverbial causal. c) adverbial consecutiva. d) adjetiva explicativa. e) adjetiva restritiva. 04. (UFRJ) Camelôs Abençoado seja o camelô dos brinquedos de tostão: O que vende balõezinhos de cor O macaquinho que trepa no coqueiro O cachorrinho que bate com o rabo Os homenzinhos que jogam boxe A perereca verde que de repente dá um pulo que [engraçado E as canetinhas-tinteiro que jamais escreverão [coisa alguma Alegria das calçadas. Uns falam pelos cotovelos: –”O cavalheiro chega em casa e diz: ‘Meu filho, vai buscar [um pedaço de banana para eu acender o charuto.’ [Naturalmente o menino pensará: ‘Papai está malu...” Outros, coitados, têm a língua atada. Todos, porém, sabem mexer nos cordéis com o tino [ingênuo de demiurgos de inutilidades. E ensinam no tumulto das ruas os mitos heróicos da meninice... E dão aos homens que passam preocupados ou tristes uma lição [de infância. Manuel Bandeira (ln: “Libertinagem. Seleta em prosa e verso.” (Org. Emanuel de Momes), Rio de Janeiro: José Olympio, 1971, p.131).
Desabrigo (fragmento) Foi aí que um camelô aproveitando o ajuntamento começou a dizer – Os senhores vendo eu aqui me exibir pensarão que sou um mágico arruinado que não podendo trabalhar no palco vem aqui fazer uns truques pra depois correr o chapéu pe-
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias Questão 04. O recurso de natureza morfológica consiste no uso do sufixo indicador de diminutivo. O de natureza sintática, refere-se ao uso de orações adjetivas para modificar os núcleos do complemento (objeto direto).
Antônio Fraga (“Desabrigo”. Rio de Janeiro: Secretaria Municipal de Cultura, Turismo e Esportes -DGDIC, 1990, pp. 28-29)
Identifique dois recursos predominantes na caracterização dos núcleos do complemento do verbo VENDER, que se encontra no segundo verso do poema de Bandeira: um de natureza morfológica e um de natureza sintática. Diga quais são esses recursos. 05. (Unifor CE) … vi homens a fazerem um barco. Em relação à oração grifada acima SÓ NÃO está correto o que se afirma em: a) Trata-se de uma oração subordinada reduzida de infinitivo. b) A oração desenvolvida, de sentido idêntico, é que faziam um barco. c) Essa oração exerce a função de subordinada adjetiva. d) Ela é equivalente ao objeto direto do verbo da oração principal. e) A construção vi que homens faziam um barco seria também correta, mas se alteraria a função sintática da oração subordinada. 06. (Mackenzie SP) A propósito da exposição de Malfatti 1 Há duas espécies de artistas. Uma composta dos que veem normalmente as coisas e 2em consequência disso fazem arte pura, guardando os eternos ritmos da vida (...). A outra 3espécie é formada pelos que veem anormalmente a natureza, e interpretam-na à luz de 4teorias efêmeras, sob a sugestão estrábica de escolas rebeldes, surgidas cá e lá como 5furúnculos da cultura excessiva. São produtos do cansaço e do sadismo de todos os 6períodos de decadência: são frutos de fins de estação, bichados ao nascedouro. 7 (...) Se víssemos na Sra. Malfatti apenas uma- moça que pinta-, como há centenas por 8aí, sem denunciar centelha de talento, calar-nos-íamos, ou talvez lhe déssemos meia dúzia 9desses adjetivos -bombons-, que a crítica açucarada tem sempre à mão em se tratando 10de moças.
É correto afirmar que a) Há, cá e aí são vocábulos acentuados pela mesma razão. b) em à mão (linha 9) o acento grave, indicador de crase, é facultativo. c) normalmente e anormalmente são palavras formadas apenas por sufixação. d) na linha 9, a palavra que introduz oração subordinada adjetiva. e) substituindo víssemos (linha 7) pelo futuro do subjuntivo, tem-se vermos. 07. (Mackenzie SP) Para um homem se ver a si mesmo, são necessárias três cousas: olhos, espelho e luz. Se tem espelho e é cego, não se pode ver por falta de olhos; se tem espelho e olhos, e é de noite, não se pode ver por falta de luz. Logo, há mister luz, há mister espelho e há mister olhos. Que cousa é a conversão de uma alma, senão entrar um homem dentro em si e ver-se a si mesmo? Para esta vista são necessários olhos, é necessária luz e é necessário espelho. O pregador concorre com o espelho, que é a doutrina; Deus concorre com a luz, que é a graça; o homem concorre com os olhos, que é o conhecimento. Assinale a alternativa correta. a) Conversão é ideia relacionada a um mundo com coisas independentes umas das outras. b) A visão de si mesmo é dada como um dom inato. c) No final do texto, três orações subordinadas adjetivas concluem a tese apresentada. d) O homem apresenta-se isento de responsabilidades no ato de converter-se. e) Toda a possibilidade de conversão dos homens é posta nas mãos do pregador. 08. (Mackenzie SP) As janelas estão fechadas. Meia-noite. Nenhum rumor na casa deserta. Levanto-me, procuro uma vela, que a luz vai apagar-se. Não tenho sono. Deitar-me, rolar no colchão até a madrugada, é uma tortura. Prefiro ficar sentado, concluindo isto. Amanhã não terei com que me entreter. Ponho a vela no castiçal, risco um fósforo e acendo-a. Sinto um arrepio. A lembrança de Madalena persegue-me. Diligencio afastá-la e caminho em redor da mesa. Aperto a mão de tal forma que me firo com as unhas , e quando caio em mim estou mordendo os beiços a ponto de tirar sangue. I. que me firo com as unhas indica, no contexto, uma ideia de finalidade. II. que a luz vai apagar-se é oração subordinada adjetiva. III. os pronomes me e la exercem a mesma função sintática. A15 Pronome relativo
dindo uns níqueis Mas não sou nada disso Sou um representante da afamada fábrica de perfumes mercúrio que não manda distribuir prospectos não bota anúncio no rádio nem nos jornais nem mesmo anúncios luminosos Esta casa meus senhores prefere contratar técnico propagandista que saia por aí distribuindo gratuitamente os seus produtos. Entre os maravilhosos preparados da fábrica de perfumes mercúrio encontra-se esta loção - a afamada loção mercúrio que elimina a caspa e a calvície mas não dá cabo da cabeça do freguês. Se os senhores fossem adquirir este produto nas farmácias ou drogarias lhes cobrariam dez ou quinze mil réis Eu estou autorizado a distribuí-lo gratuitamente às pessoas que adquirirem o reputado sabonete minerva pelo qual cobro apenas dois mil réis para cobrir as despesas da publicidade... Um aqui para o cavalheiro... outro para a senhorita...
Assinale: a) se apenas I e II estiverem corretas. b) se apenas III estiver correta. c) se apenas I e III estiverem corretas. d) se apenas II e III estiverem corretas. e) se todas estiverem corretas. 623
FRENTE
A
PORTUGUÊS
MÓDULO A16
ASSUNTOS ABORDADOS n Orações subordinadas adverbiais n Classificação das orações subordinadas adverbiais
ORAÇÕES SUBORDINADAS ADVERBIAIS As orações subordinadas adverbiais, ao contrário das orações subordinadas adjetivas, não são iniciadas por um pronome relativo e, sim, por uma conjunção, como as orações subordinadas substantivas. As orações subordinadas são divididas em nove tipos de orações. São estas: n n n n n n n n n
Oração subordinada adverbial causal; Oração subordinada adverbial consecutiva; Oração subordinada adverbial concessiva; Oração subordinada adverbial condicional; Oração subordinada adverbial comparativa; Oração subordinada adverbial conformativa; Oração subordinada adverbial final; Oração subordinada adverbial proporcional; Oração subordinada adverbial temporal.
Nesta aula, estudaremos as quatro primeiras orações subordinadas adverbiais acima. Você verá que, para aprofundarmos no estudo das orações subordinadas adverbiais, é preciso que você não somente tenha conhecimento do valor semântico das conjunções adverbiais, como também entenda as relações de significação dentro do período composto por subordinação. Além disso, você poderá observar que uma mesma conjunção adverbial pode ser usada em mais de um tipo de oração subordinada adverbial.
Classificação das orações subordinadas adverbiais Oração subordinada adverbial causal Semelhante às orações coordenadas explicativas, as orações subordinadas adverbiais são introduzidas pelas seguintes conjunções: porque; visto que; uma vez que; já que; haja vista que; que. Leia a seguir os exemplos: n n n
!
Não fomos à festa, porque estava chovendo muito. Eu fui promovido em meu trabalho, uma vez que sou bastante dedicado. Minha mãe ama esta música, já que a faz lembrar-se de minha avó.
ATENÇÃO!
Qual a diferença entre causa e explicação? As orações coordenadas explicativas diferenciam-se das orações subordinadas adverbiais não pelo valor das conjunções, mas pela significação do enunciado. Veja o exemplo: n Eu sei que choveu ontem, porque o chão está molhado.
A oração sublinhada acima é uma oração coordenada explicativa, porque ela apenas evidencia o motivo que levou o sujeito a concluir que ontem chovera. Observe que o fato de o chão estar molhado não é a causa da chuva, apenas a comprovação desse evento. Nesse sentido, seria incorreto classificar a oração acima como subordinada adverbial causal. 624
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Oração subordinada adverbial consecutiva As orações subordinadas adverbiais consecutivas exprimem a ideia de consequência. Essas orações são introduzidas pelas seguintes conjunções: tanto... que; tão... que; tamanha... que Leia os exemplos a seguir: n n n
Edgar chorou tanto ontem à noite que convenceu sua mãe... O frio era tamanho que ninguém quis sair de casa. A dor foi tão forte que o paciente não resistiu.
Oração subordinada adverbial concessiva Assim como as orações coordenadas adversativas, as orações subordinadas adverbiais concessivas exprimem a ideia de oposição e são introduzidas por estas conjunções:
!
ATENÇÃO!
É importante entender que há tanto em orações subordinadas adverbiais causais quanto em orações subordinadas adverbiais consecutivas causa e consequência. A diferença é que enquanto a oração subordinada adverbial causal evidencia a causa, na oração principal há a consequência; e enquanto a oração subordinada adverbial consecutiva evidencia a consequência, na oração principal há a causa. Lembre-se de que não existe causa sem consequência.
embora; apesar de que; mesmo que. Leia a seguir os exemplos: n n n
Embora eu queira muito viajar, não tenho dinheiro. Minha irmã, apesar de morar sozinha, não sabe cozinhar. Mesmo que eu insista, não permitirão minha entrada.
Oração subordinada adverbial condicional As orações subordinadas adverbiais exprimem a ideia de condição para que determinado fato ocorra. Tais orações são introduzidas por estas conjunções: se; caso; desde que. Leia os exemplos a seguir: n
Fonte: Shutterstock.com
n
Se eu passar no vestibular, meu pai vai me dar um carro! A criança, desde que se comporte bem no almoço de família, vai ganhar sobremesa. Caso eu decida mudar de curso, precisarei fazer nova prova.
A16 Orações subordinadas adverbiais
n
625
Português
Exercícios de Fixação 01. (Famerp SP) Desde o início da história europeia, criamos o hábito de distinguir entre poder temporal e poder espiritual. Quando cada um deles dispõe da autonomia em seu domínio e se vê protegido contra as intrusões do outro, fala-se de uma sociedade laica ou, como se diz também, secular. Poderíamos crer que, na parte do mundo marcada pela tradição cristã, essa relação em torno da questão da autonomia já estaria prontamente organizada, pois o Cristo anunciou que seu reino não era deste mundo, que a submissão a Deus não interferia em nada na submissão a César. No entanto, a partir do momento em que o imperador Constantino impôs o cristianismo como religião de Estado, no século IV, a tentação de apoderar-se de todos os poderes de uma vez revelou-se. A frase introduzida pelo conectivo “No entanto” expressa, em relação à anterior, uma ideia de a) consequência. d) condição. b) oposição. e) proporção. c) causa. 02. (Uncisal AL)
cimo minha boca está trêmula, no décimo primeiro digo em espanto o nome de Deus, no décimo segundo chamo meu irmão. O décimo terceiro tiro me assassina — porque eu sou o outro. Porque eu quero ser o outro. Em relação à oração que a precede, a oração destacada tem sentido de a) consequência. d) causa. b) conclusão. e) finalidade. c) alternância. 04. (FM Petrópolis RJ) Limites da manipulação genética Nos últimos anos, a possibilidade de manipulação 2 genética de seres humanos se tornou tecnicamente 3 real, o que levou à publicação de vários 4 manifestos da comunidade científica internacional 5 contra o uso da técnica em embriões, óvulos e espermatozoides 6 humanos. Não aceitamos alterações 7 genéticas que possam ser transmitidas às próximas 8 gerações. Apesar disso, cientistas chineses publicaram 9 um trabalho descrevendo a criação de embriões 10 humanos geneticamente modificados! Abrimos a 11 Caixa de Pandora? .......................... 1
PEREIRA, L. O Globo. Opinião. 12 maio 2015. Disponível em: <https://oglobo.globo.com/opiniao/limites-da-manipulacao-genetica-16125529>. Acesso em: 20 jun. 2017. Adaptado.
No texto, o trecho “Não aceitamos alterações genéticas que possam ser transmitidas às próximas gerações.” (Refs. 6-8) estabelece, com a frase anterior, uma relação de a) finalidade. b) contradição. c) causalidade. d) concessão. e) condição.
A16 Orações subordinadas adverbiais
Disponível em: <http://polentanews.blogspot.com.br/2012/01/saude-gentetem-que-tratar-com.html>. Acesso em: 27 out. 2015.
Verifica-se em PLANTÃO MÉDICO É SOCORRO, NÃO É CONSULTA a presença de duas orações. A inserção de uma conjunção, na última oração, capaz de explicitar a relação que ela estabelece com a oração anterior, teria sentido de a) causa. d) concessão. b) finalidade. e) proporcionalidade. c) conclusão. 03. (Unifesp SP) Esta é a lei. Mas há alguma coisa que, se me faz ouvir o primeiro e o segundo tiro com um alívio de segurança, no terceiro me deixa alerta, no quarto desassossegada, o quinto e o sexto me cobrem de vergonha, o sétimo e o oitavo eu ouço com o coração batendo de horror, no nono e no dé-
626
05. (ESPM SP) Assinale o item cujas orações traduzam ideias de causa e consequência respectivamente: a) Raul Castro, por sua vez, insistiu que o porto era viável, porque confiava no fim do embargo americano. b) As audiências têm acontecido sem manifestações, já que o presidente do colegiado fez com que o acesso à sala ficasse limitado e controlado pela Polícia Legislativa. c) O sedentarismo é favorecido pelo ambiente, uma vez que o corpo humano está desenhado para mover-se. d) O presidente havia definido que o Jaburu serviria de local para algumas reuniões políticas, visto que a primeira-dama se incomodava com o fluxo intenso de parlamentares. e) Ainda que só de passagem, ir à Lua não é um feito trivial. Tanto que ninguém esteve por aquelas bandas desde que a Apollo 17 partiu do solo lunar, em 1972.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Exercícios Complementares d) concessão, já que, independentemente das acusações, o
itens sobre ela propostos:
Catar precisa demonstrar ao mundo que é o país mais
“Na sociedade em que vivemos, estamos imersos em uma trama exigente e paradoxal”.
resiliente do mundo. 04. (FCM PB) Considere o fragmento:
I.
O período é composto por coordenação, sendo as ora-
II.
ções assindéticas. O período é composto por subordinação, sendo a 1ª
cer a cidadania, nada substitui a troca de ideias em campo.”
III.
oração subordinada adverbial e a 2ª, principal. O período apresenta uma oração subordinada substantiva (1ª) e uma subordinada adjetiva (2ª).
I.
tem função adverbial.
II.
apresenta uma relação de subordinação com “[...]
IV.
O período é composto por subordinação e coordenação, sendo a 1ª oração subordinada e a 2ª, coordenada assindética.
A análise está correta apenas em a) I. b) II. c) III. d) IV. 02. (Famema SP) Assinale a alternativa em que a oração subordinada indica uma finalidade. a) Mesmo que tivesse dado dinheiro ao mendigo, não teria evitado as sensações desagradáveis que sua presença me provocava. b) Dei dinheiro ao mendigo porque isso evitaria as sensa-
“Ainda que a tecnologia seja o grande diferencial desses novos coletivos para ampliar o alcance e as formas de exerSobre a estrutura oracional em destaque, pode-se afirmar que
nada substitui a troca de ideias em campo.” III.
traduz a ideia de tempo.
IV.
pode ser substituída, sem alteração de sentido, por mesmo sendo a tecnologia o grande diferencial desses novos coletivos.
Está(ão) correta(s) a) apenas I. b) apenas II e III. c) apenas III e IV. d) apenas I, II, IV. e) I, II, III e IV. 05. (Famema SP) “Os adoradores de Aurélia sabiam, pois ela
ções desagradáveis que sua presença me provocava. c) Assim que dei dinheiro ao mendigo, evitei as sensações desagradáveis que sua presença me provocava. d) Caso tivesse dado dinheiro ao mendigo, teria evitado as
não fazia mistério, do preço de sua cotação no rol da moça”
sensações desagradáveis que sua presença me provocava. e) Dei dinheiro ao mendigo para evitar as sensações desagradáveis que sua presença me provocava.
b) condição.
03. (UECE) No enunciado “O Catar precisa demonstrar ao mundo que, apesar de todas as acusações, é o país mais resiliente no Oriente Médio”, a expressão parentética “apesar de todas as acusações” estabelece com a oração com a qual está ligada uma relação de a) condição, pois, se o Catar não demonstrar ao mundo que é o país mais resiliente do Oriente Médio, ele continuará ainda sofrendo muitas acusações. b) finalidade, porque o propósito do Catar, diante de todas as acusações, é o de precisar demonstrar ao mundo que é o país mais resiliente do Oriente Médio. c) consequência, visto que o motivo de o Catar precisar demonstrar ao mundo que é o país mais resiliente do Oriente Médio deve-se às acusações sofridas.
No período em que se insere, o segmento destacado apresenta sentido de a) consequência. c) conclusão. d) proporção. e) causa. 06. (Unifesp SP) Leia o excerto do “Sermão de Santo Antônio aos peixes” de Antônio Vieira (1608-1697). “Santo Agostinho, que pregava aos homens, para encarecer a fealdade deste escândalo mostrou-lho nos peixes; e eu, que prego aos peixes, para que vejais quão feio e abominável é, quero que o vejais nos homens.” Nas duas ocorrências, o termo “para” estabelece relação de a) consequência. b) conformidade. c) proporção. d) finalidade. e) causa.
627
A16 Orações subordinadas adverbiais
01. (Fac. Santo Agostinho BA) Leia a frase abaixo e julgue os
FRENTE
A
PORTUGUÊS
Exercícios de Aprofundamento 01. (UEMG) “De repente chegou o dia dos meus setenta anos. Fiquei entre surpresa e divertida, setenta, eu? Mas tudo parece ter sido ontem! No século em que a maioria quer ter vinte anos (trinta a gente ainda aguenta), eu estava fazendo setenta. Pior: duvidando disso, pois ainda escutava em mim as risadas da menina que queria correr nas lajes do pátio quando chovia, que pescava lambaris com o pai no laguinho, que chorava em filme do Gordo e Magro, quando a mãe a levava à matinê. (Eu chorava alto com pena dos dois, a mãe ficava furiosa.) A menina que levava castigo na escola porque ria fora de hora, porque se distraía olhando o céu e nuvens pela janela em lugar de prestar atenção, porque devagarinho empurrava o estojo de lápis até a beira da mesa, e deixava cair com estrondo sabendo que os meninos, mais que as meninas, se botariam de quatro catando lápis, canetas, borracha – as tediosas regras de ordem e quietude seriam rompidas mais uma vez. Fazendo a toda hora perguntas loucas, ela aborrecia os professores e divertia a turma: apenas porque não queria ser diferente, queria ser amada, queria ser natural, não queria que soubessem que ela, doze anos, além de histórias em quadrinhos e novelinhas açucaradas, lia teatro grego – sem entender – e achava emocionante. (E até do futuro namorado, aos quinze anos, esconderia isso.) O meu aniversário: primeiro pensei numa grande celebração, eu que sou avessa a badalações e gosto de grupos bem pequenos. Mas pensei, setenta vale a pena! Afinal já é bastante tempo! Logo me dei conta de que hoje setenta é quase banal, muita gente com oitenta ainda está ativo e presente. Decidi apenas reunir filhos e amigos mais chegados (tarefa difícil, escolher), e deixar aquela festona para outra década.” LUFT, 2014, p.104-105
Leia atentamente a oração destacada no período a seguir: “(...) pois ainda escutava em mim as risadas da menina que queria correr nas lajes do pátio (...)” Assinale a alternativa em que a oração em negrito e sublinhada apresenta a mesma classificação sintática da destacada acima. a) “A menina que levava castigo na escola porque ria fora de hora (...)” b) “(...) e deixava cair com estrondo sabendo que os meninos, mais que as meninas, se botariam de quatro catando lápis, canetas, borracha (...)” c) “(...) não queria que soubessem que ela (...)” d) “Logo me dei conta de que hoje setenta é quase banal (...)” 02. (Uncisal AL) Crianças nascidas por embriões congelados são mais sociáveis e independentes 628
RIO – Crianças nascidas a partir de embriões congelados são mais sociáveis, independentes e têm melhores habilidades de comunicação do que aquelas concebidas naturalmente ou através de outras formas de tratamento de fertilidade. Esta é a principal conclusão de um estudo feito na China e apresentado na reunião anual da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva, que desta vez acontece no Havaí. Os pesquisadores acompanharam 250 jovens chineses desde o nascimento até o berçário, analisando seus comportamentos e leituras psicológicas. A equipe avaliou as autodependência, habilidades de comunicação, de trabalho, de socialização e de autogestão das crianças. [...] Cientistas disseram que as crianças nascidas por tratamento de fertilidade muitas vezes eram mais sociáveis e extrovertidas porque geralmente elas tinham pais mais velhos, que as adoravam. E sugeriram que os embriões selecionados para o congelamento podem ser de melhor qualidade. [...] Disponível em: <http://oglobo.globo.com/sociedade/saude/criancas-nascidas-por-embrioescongelados- sao-mais-sociaveis-independentes>. Acesso em: 22 out. 2014. (adaptado).
Assinale a alternativa em que o fragmento do texto apresenta duas orações subordinadas, considerando a sintaxe da língua portuguesa. a) “Crianças nascidas a partir de embriões congelados são mais sociáveis, independentes e têm melhores habilidades de comunicação...” (1º parágrafo). b) “Os pesquisadores acompanharam 250 jovens chineses desde o nascimento até o berçário, analisando seus comportamentos e leituras psicológicas.” (2º parágrafo). c) “A equipe avaliou as autodependência, habilidades de comunicação, de trabalho, de socialização e de autogestão das crianças” (2º parágrafo). d) “Cientistas disseram que as crianças nascidas por tratamento de fertilidade muitas vezes eram mais sociáveis e extrovertidas...” (3º parágrafo). e) “...as crianças nascidas por tratamento de fertilidade muitas vezes eram mais sociáveis e extrovertidas porque geralmente elas tinham pais mais velhos, que as adoravam.” (3º parágrafo). 03. (Escs DF) 1 Enquanto a nutrição é uma ciência, o nutricionismo é 2 um paradigma que classifica os alimentos de acordo com seus 3 componentes. Para alguns, essa é uma abordagem reducionista: 4 a qualidade da comida é entendida apenas no nível bioquímico 5 e, mesmo nesse nível, os nutrientes são analisados 6 isoladamente dos alimentos. É claro que essa especialização da 7 ciência, que conseguiu entender a função de diversos 8 nutrientes, trouxe muitos ganhos à humanidade. Se a 9 abordagem nutricionista mantém o foco no detalhe, outros tipos 10 de análise consideram a alimentação como um todo: não só os 11
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Bárbara Lopes. Comida integral. In: Vida Simples, out./2012 (com adaptações).
Assinale a opção que apresenta uma ideia dependente de outra expressa no período sintático e que constitui oração subordinada de natureza explicativa e introduzida por conectivo. a) “e, mesmo nesse nível, os nutrientes são analisados isoladamente dos alimentos” (Refs.5-6) b) “que conseguiu entender a função de diversos nutrientes” (Refs.7-8) c) “Se a abordagem nutricionista mantém o foco no detalhe” (Refs.8-9) d) “que classifica os alimentos de acordo com seus componentes” (Refs.2-3) e) “Para alguns, essa é uma abordagem reducionista” (Ref.3) 04. (Ibmec SP) No trecho, “Implícita neste racismo que não se reconhece está a ideia de que caricaturar carinhosamente ou infantilizar o negro é uma maneira de consolá-lo pela sua condição de diferente.”, as duas orações sublinhadas são classificadas, respectivamente, como: a) Subordinada adjetiva restritiva /subordinada substantiva completiva nominal b) Subordinada adjetiva restritiva / subordinada substantiva objetiva indireta c) Subordinada adjetiva explicativa / subordinada substantiva objetiva direta d) Coordenada sindética explicativa / subordinada adverbial consecutiva e) Subordinada adjetiva restritiva / subordinada substantiva objetiva direta 05. (Uerj RJ) Só o homem nas grandes cidades, o tigre nas florestas, o mocho nas ruínas, as estrelas no céu e o gênio na solidão do gabinete costumam velar nessas horas que a natureza consagra ao repouso. Classifique sintaticamente a segunda oração do período acima. Em seguida, substitua essa oração por outra de sentido correspondente, sem conectivo, preservando sua estrutura inicial. 06. (Unesp SP)
Classificação: subordinada adjetiva restritiva. Oração: consagradas ao repouso pela natureza.
O leão fugido
O leão fugido do circo vinha correndo pela rua quando viu um senhor à sua frente. Aí caminhou pé ante pé, bateu delicadamente nas costas do senhor e disse disfarçando a voz leonina o mais possível: “Cavalheiro, tenha cuidado e muita calma: acabei de ouvir dizer que um macaco fugiu do circo agora mesmo”. O cavalheiro, ouvindo o aviso, voltou-se, viu o leão e morreu de um ataque do coração. O leão então murmurou tristemente: “Não adianta nada. É tal a nossa fama de ferocidade que matamos, mesmo quando queremos agir em favor do próximo”. Moral: A quem nasce feroz não importa o tom de voz. (Millôr Fernandes, Fábulas Fabulosas)
No trecho da fala do leão – “É tal a nossa fama de ferocidade que matamos, mesmo quando queremos agir em favor do próximo.” –, a oração em destaque, em relação à anterior, expressa sentido de a) consequência. c) restrição. b) explicação. d) conformidade. 07. (Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública) 1 O ambiente competitivo atual tem sido regido 2 pela transformação tecnológica, globalização, 3 competição acirrada e extrema ênfase na relação 4 custo-benefício, qualidade e satisfação do cliente, 5 exigindo um foco muito maior na criatividade e 6 na inovação como competência estratégica das 7 organizações. Competência estratégica essa que se 8 não for rapidamente priorizada e incrementada, a 9 organização tenderá a ficar obsoleta tal é a rapidez 10 das mudanças e da implementação de novos 11 serviços e produtos. 12 Se a pessoa quer ser criativa, deve fazer coisas 13 diferentes todos os dias! Mudar o seu ambiente de 14 trabalho, mudar alguma coisa no seu lar, ver novos 15 filmes, ir a novos lugares, falar com novas pessoas, 16 ler livros variados. Na medida em que a mente fica 17 exposta a novidades, há estímulo, a observação fica 18 mais aguçada e é mais fácil fazer novas conexões 19 entre as ideias. 20 Quando a pessoa tem paixão pelo trabalho 21 que realiza, a criatividade manifesta-se mais 22 espontaneamente, já que a tarefa é sentida 23 prioritariamente como prazerosa, acima do 24 dever, da obrigação. O autodesenvolvimento com 25 conhecimento não apenas na área de atuação, mas 26 em outros temas, amplia os horizontes e ajuda, 27 também, nas conexões de ideias variadas. Cabe 28 ressaltar também a habilidade de se trabalhar 29 em equipe, já que muitas vezes as ideias pegam 30 “carona” umas com as outras e a sinergia do 31 trabalho de um grupo coeso e diversificado em 32 suas capacidades é muito maior do que a soma do 33 intelecto dos indivíduos que o compõem. 34 Porém, algumas pessoas conseguem 35 implementar suas ideias e outras não. Por que 36 não? Porque têm receio de se expor, medo do 37 grupo social, de parecerem ridículas, e acabam 38 acomodando-se. Para implantar uma ideia criativa, 39 é preciso, acima de tudo, muita determinação. 40 A criatividade por si só não basta. É preciso 41 implementá-la. Transformá-la em uma inovação 42 concreta através de novos produtos, serviços, 43 formas de gestão. Senão ela não passa de uma 44 elucubração mental e não se transforma em ação. HOLANDA, Fátima. Criatividade e inovação: O verdadeiro diferencial das empresas. Disponível em: <http:// www.portaleducacao.com.br/administracao/ artigos/3395/criatividade-e-inovacao-o-verdadeiro-diferencialdas- empresas#ixzz3mNZouefS>. Acesso em: 21 set. 2015. Adaptado.
Há uma ideia de causa e consequência no fragmento transcrito em 01. “exigindo um foco muito maior na criatividade e na inovação como competência estratégica das organizações.” (Refs. 5-7). 02. “se não for rapidamente priorizada e incrementada, a organização tenderá a ficar obsoleta” (Refs. 7-9). 03. “Se a pessoa quer ser criativa, deve fazer coisas diferentes todos os dias!” (Refs. 12-13). 04. “Na medida em que a mente fica exposta a novidades, há estímulo, a observação fica mais aguçada” (Refs. 16-18). 05. “Para implantar uma ideia criativa, é preciso, acima de tudo, muita determinação.” (Refs. 38-39). 629
FRENTE A Exercícios de Aprofundamento
componentes químicos, mas também o tamanho das porções, 12 as estratégias de marketing e até a companhia no momento das 13 refeições são levados em conta. Esse olhar vem, aos poucos, 14 ganhando influência na elaboração de políticas de saúde.
Fonte: Wikimedia commons
FRENTE
B
PORTUGUÊS Por falar nisso Nos módulos anteriores, vimos o Pré-Modernismo e os poetas representantes da primeira fase da poesia. É importante lembrar que a literatura brasileira vem daquele momento de destruição, de rompimento com todos os padrões, de momentos de demolição e de busca de liberdade mostrados na Semana de Arte Moderna de 1922. A partir de 1930, entra-se na segunda fase da literatura. Uma fase de construção, com um pouco mais de maturidade, depois da loucura dos anos de 1920. Talvez agora, os poetas tenham a necessidade de eliminar os excessos da primeira fase, sem abandonar as conquistas: a liberdade de expressão, o verso livre e a linguagem coloquial. Eles não podiam se esquecer de voltar à poesia no sentido de conservar o lirismo, a temática do amor, da solidão, assim como a temática social. Esse foi um período extremamente fértil tanto em termos de produção em versos quanto em prosa. Na segunda fase, entre os anos de 1930 e 1945, a poesia modernista alargou seus horizontes temáticos e consolidou-se graças à herança de todas as conquistas da geração da Semana de 1922, como também de seus precursores. Essa segunda geração foi pautada pelo amadurecimento e pela ruptura com a fase polêmica de suas primeiras manifestações. Nesse período, a poesia modernista apresentou à Literatura Brasileira grandes nomes, como Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles, Vinícius de Moraes, Murilo Mendes, Jorge de Lima e Mario Quintana. A partir de agora, vamos abordar a vasta obra de Drummond, sua metapoesia, seu autoconhecimento, com suas multiplicidades de temas. Estudaremos também a poeta Cecília Meirelles, que exibe uma poesia feminina, delicada, intimista, com um lirismo tradicional, somado à grande musicalidade, mostrando a consciência sobre a transitoriedade da vida. Veremos, ainda, a poesia metafísica de Vinícius de Moraes como produto das intensas crises políticas e ideológicas que atravessaram os anos de 1930. Não podemos nos esquecer de abordar a poética de Murilo Mendes e Jorge de Lima sob a perspectiva da suprarrealidade e da busca da unidade com o sagrado, a partir da evidência de um estado de crise existencial e espiritual que se materializa ao nível do corpo e de suas respectivas linguagens poéticas. Vamos explorar também a prosa de Clarice Lispector e Guimarães Rosa. Nas próximas aulas, estudaremos os seguintes temas
B13 B14 B15 B16
Modernismo segunda fase – poesia – Carlos Drummond .................................................................................................. 632 Modernismo segunda fase – poesia – Vinícius de Moraes, Cecília Meireles, Murilo Mendes e Jorge de Lima...... 642 Modernismo terceira fase - prosa – Clarice Lispector ...............................................................................................656 Modernismo terceira fase – prosa – João Guimarães Rosa ......................................................................................668
FRENTE
B
PORTUGUÊS
MÓDULO B13
ASSUNTOS ABORDADOS n Modernismo segunda fase – poesia
- Carlos Drummond de Andrade
n Início do século XX - momento conturbado n Carlos Drummond de Andrade
MODERNISMO SEGUNDA FASE – POESIA CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE Início do século XX - momento conturbado Conhecer os acontecimentos históricos permite-nos melhor compreensão dos fatos. No início do século XX, não só a Europa, mas todo o mundo, vivia um momento bastante conturbado. Contudo, talvez tenha sido a época em que aconteceram as maiores transformações do século. No cenário internacional, a década de 1930 começa sob o forte impacto da crise iniciada com a quebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque, seguida pelo colapso do sistema financeiro internacional: é a Grande Depressão. Essa grande crise econômica mundial fortaleceu e possibilitou a ascensão ao poder de governos ditatoriais e fascistas em vários países. Esses líderes defendiam propostas populistas, como também a ideia de que somente um governo forte e centralizador poderia tirar a nação da grave crise que enfrentavam. Assim aconteceu na Alemanha, de Hitler; na Itália, de Mussolini; e na Espanha, de Franco. Esse momento foi caracterizado por paralisações de fábricas, falências bancárias, altíssimo índice de desemprego, rupturas nas relações comerciais, fome e miséria generalizadas. Em 1933, Adolf Hitler chega ao poder na Alemanha, proclama a superioridade da “raça” ariana e inicia a perseguição aos judeus, deficientes físicos, homossexuais, ciganos e negros. O desenvolvimento do nazifascismo e de sua vocação expansionista, bem como o crescente militarismo e armamentismo, somados às frustrações geradas pelas derrotas na Primeira Guerra Mundial, delineiam um quadro que levaria o mundo à Segunda Guerra Mundial. Assim ocorrera a invasão da Polônia pelas tropas de Hitler, na madrugada de 1º de setembro de 1939. Esse foi o conflito armado mais sangrento da história, que envolveu as maiores potências da época. A Segunda Grande Guerra terminou em 1945, com a rendição da Alemanha e da Itália, trazendo prejuízos enormes, principalmente aos países derrotados. O último país a assinar o tratado de rendição foi o Japão, que sofreu, dos Estados Unidos, o horror atômico responsável por arrasar Hiroshima e Nagasáki, em agosto de 1945. Essa foi uma ação desnecessária que provocou a morte de milhares de cidadãos japoneses inocentes, deixando um rastro de destruição nessas cidades. No cenário interno, o Brasil também vive uma época de profundas transformações. Em 1930, registra-se a queda assustadora do preço do café, principal produto de exportação brasileira, provocada pela quebra da Bolsa de Nova Iorque. De 1937 a 1945, Getúlio Vargas aborta o processo democrático, dando um golpe de estado, e instaura a ditadura liderada por ele mesmo. Em 1945, Vargas foi deposto do regime do Estado Novo. Com isso, houve a redemocratização do País, com a adoção de uma nova Constituição em 1946, marcando o fim da Era Vargas. Posteriormente, Vargas ainda voltaria à Presidência da República, eleito por voto direto e governaria o Brasil de 31 de janeiro de 1951 até 24 de agosto de 1954, quando se suicidou, com um tiro no coração. Esse fato ocorreu no Palácio do Catete, na cidade do Rio de Janeiro, à época, capital federal.
632
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
As principais características da poesia de 1930 são: n n n n n n n n n n n n n n
Período de intensa criatividade; Incorporação das conquistas da geração de 22; Liberdade formal; Experimentação estética; Abandono do experimentalismo radical da primeira geração (espírito demolidor); Convivência harmoniosa entre o poema de forma livre e de forma fixa (principalmente do soneto); Uso de versos brancos e livres e liberdade temática; Universalismo; Ironia e humor; Utilização de linguagem coloquial e das variantes sociais e regionais; Coloquialismo; Rejeição ao academicismo; Tendência religiosa e ao espiritualismo; Temas sociais;
n n n
Poemas metalinguísticos; Questionamento da realidade psíquica e social; Duas vertentes: uma existencialista e outra politizada.
Superada a fase do nacionalismo crítico que promovia a releitura do passado histórico do Brasil, os autores passam a se dedicar à reflexão sobre o mundo contemporâneo, utilizando-se de todos os recursos que tinham à disposição para a criação poética, aproveitando as conquistas da primeira geração. A publicação do livro Alguma poesia, em 1930, é considerada referência do início da poesia da segunda geração modernista. A reflexão sobre o sentido de estar no mundo é a proposta que define o projeto literário da segunda geração modernista. Essa reflexão não só está associada à preocupação com a renovação da linguagem, como também à análise do ser humano e de suas preocupações e angústias. Os poetas expressavam um desejo imenso de compreender a relação entre o indivíduo e a sociedade da qual faziam parte. Nesse sentido, o contexto sociopolítico delineia e define um foco para a poesia desse momento. A obra de Carlos Drummond de Andrade é consolidada em múltiplos temas e uma enorme riqueza singular de expressão. Neste módulo, vamos nos delimitar em três aspectos da sua expressão poética: as relações entre a expressão poética e os elementos do cotidiano, a consciência social e a metapoesia.
Carlos Drummond de Andrade Drummond escreveu, em 1944, imprimindo o espanto dos poetas ao refletirem sobre a perversidade e os horrores de que o ser humano é capaz. Meus olhos são pequenos para ver o mundo que se esvai em sujo e sangue, outro mundo que brota, qual nelumbo - mas veem, pasmam, baixam deslumbrados.
B13 Modernismo segunda fase - poesia - Carlos Drummond de Andrade Fonte: Wikimedia Commons
A poesia desse período estava marcada por um profundo desejo de entendimento do ser humano em seus mais amplos aspectos. Carlos Drummond, Cecília Meireles, Vinícius de Moraes, Murilo Mendes e Jorge de Lima foram os escritores que ampliaram o horizonte da poesia na Literatura brasileira, sem se esquecer da consolidação das liberdades formais, conquistadas pela geração anterior, que protagonizou uma revolução estética e permitiu o cultivo dos versos livres e brancos, como o das formas tradicionais. Esses novos poetas tentavam buscar inúmeras temáticas, desde as sociais até as espirituais. A temática social se fazia sempre presente em decorrência dos conflitos políticos que envolviam o mundo e a eclosão da Segunda Guerra Mundial. O medo, a incerteza, a sensação de abismo e a tendência à espiritualidade tomavam conta da produção poética de 1930. Diante desse cenário conflituoso, surge uma poesia intimista, sem ser antiética. É nesse momento que a poesia religiosa é cultivada.
633
Português
n n n n n n n
Multiplicidade de temas: infância – Itabira; O cotidiano; Influência da 1ª fase: paródia, autoironia, (O Gauche) Autoconhecimento (Poema de sete faces); Poeta social: preocupações com a realidade e com o homem de seu tempo; (Mãos dadas, E agora José?); Guerra – Visão 1944; Metafísica: o ser humano e sua essência – Claro Enigma, Sentimento do Mundo, No meio do Caminho; Metalinguagem – Procura da poesia; Amor (reflexão sobre o sentimento) – O Mundo é grande, Quadrilha.
A consciência social A partir do humor e da ironia, bem como de um acentuado sentimento de aniquilamento (niilismo), o escritor rejeita o escapismo. A consciência social é um acordo do poeta com o semelhante. É uma espécie de atuação por meio da poesia. Para Drummond, é a possibilidade de resgatar a consciência do estado de enclausuramento e a presença do pavor.
Elementos do cotidiano
Em meio a tantas injustiças, ordens, proibições e desmandos vistos e vividos na primeira metade do século XX, o lirismo do poeta surge como forma de questionamento, de filosofia, de protesto, de repensar crenças, valores e conceitos predeterminados por uma sociedade injusta e excludente.
No livro Alguma Poesia, Drummond lança, com muita lucidez, seu olhar sobre a estupidez do cotidiano, conforme os versos de “Cidadezinha Qualquer”:
No poema “A flor e a náusea”, Drummond tenta exprimir a crítica sobre a crise existencial, política e sociais em que vivia a humanidade.
n n
Casas entre bananeiras mulheres entre laranjeiras pomar amor cantar. Um homem vai devagar. Um cachorro vai devagar. Um burro vai devagar. Devagar... as janelas olham. Eta vida besta, meu Deus. (ANDRADE, Carlos Drummond de. Antologia poética. 2. ed. São Paulo: abril, 1982, p. 37.)
B13 Modernismo segunda fase - poesia - Carlos Drummond de Andrade
exibem uma associação de ideias que brotam do acaso, como sinais de um mundo que perdeu seus referenciais.
Podemos observar, nesses versos, certa apatia diante do espetáculo da vida. Neles, o cotidiano é marcado pelo desencanto e pela ausência de perspectivas. Esse aspecto ganha destaque, estilisticamente, pelo uso da estruturação nominal e da repetição. As palavras “casas”, “bananeiras”, “mulheres”, “laranjeiras”, “pomar”, “amor”, “cantar”, “homem”, “cachorro” e “burro”
Figura 01 - Estátua de Carlos Drummond de Andrade, na praia de Copacabana, no Rio de Janeiro.
634
A sétima estrofe começa com o verso que configura o clímax do poema: Uma flor nasceu na rua! Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego. Uma flor ainda desbotada ilude a polícia, rompe o asfalto. Façam completo silêncio, paralisem os negócios, garanto que uma flor nasceu. (Antologia Poética – 12a edição – Rio de Janeiro: José Olympio, 1978, ps. 14,15 e 16)
Carlos Drummond de Andrade é o poeta das expressões equilibradas, sempre de emoção controlada, mesmo quando tomado por um espírito de revolta ou de inconformismo. Entretanto, nesse fragmento, ele exclama sua exaltação, enchendo com seu grito a “rua cinzenta”. A “flor” contrasta com os “bondes, ônibus, e o “rio de aço do tráfego”, representantes da tecnologia, do progresso, do império da maquinaria, elementos que seriam responsáveis também pela ausência da sensibilidade, da beleza e do lirismo em nosso tempo.
Andre Luiz Moreira / Shutterstock.com
Características de Drummond
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
A metatextualidade, genericamente chamada de metalinguagem, é a mensagem centrada no código. É um poema que fala do ato criativo, da dificuldade de seu material – a palavra, do conflito pedregoso diante da folha branca como “uma pedra no meio do caminho”. Em outras palavras, é a utilização crítica dos elementos do cotidiano, numa síntese da relação entre o poeta e a realidade, pondo em relevo seu humor, sua ironia e ainda seu senso de autocrítica. Em “Mãos Dadas”, Drummond diz: “Não serei o poeta de um mundo caduco/ também não contarei o mundo futuro”. Isto é, o poeta não é arcaísta nem invencionista. Em “O lutador”, o escritor é mais explícito: “Lutar com palavras/ é a luta mais vã./ Entanto lutamos/ mal rompe a manhã./ São muitas, eu pouco. Já em “Canção Amiga”, Drummond surpreende ao dizer: “Eu preparo uma canção/ em que minha mãe se reconheça/ todas as mães se reconheçam”; parece uma contradição para quem disse que não é o poeta de um mundo caduco ou que diz suspiros ao anoitecer, mas ele desfaz o problema: Atente para os versos de “O Sobrevivente” em que Drummond lança seu grito irônico e apocalíptico. O Sobrevivente Impossível compor um poema a essa altura da evolução [da humanidade. Impossível escrever um poema - uma linha que seja - de [verdadeira poesia. O último trovador morreu em 1914. Tinha um nome de que ninguém se lembra mais. Há máquinas terrivelmente complicadas para as [necessidades mais simples. Se quer fumar um charuto aperte um botão. Paletós abotoam-se por eletricidade. [...] Os homens não melhoram e matam-se como percevejos. Os percevejos heroicos renascem. Inabitável, o mundo é cada vez mais habitado. E se os olhos reaprendessem a chorar seria um segundo [dilúvio. Drummond devia estar pensando no início da Primeira Guerra Mundial e em Augusto dos Anjos que, curiosamente, foi quem morreu em 1914 e foi o primeiro trovador dos novos tempos, novas palavras, nova visão de mundo e novo ponto de vista.
Nos versos a seguir, percebemos o ponto de vista tecnológico, beirando a ficção científica: Há máquinas terrivelmente complicadas para as [necessidades mais simples. Se quer fumar um charuto aperte um botão. Paletós abotoam-se por eletricidade. É o fascínio pelo que o século XX vinha prometendo automatização e mecanização das tarefas. Ao concluir, Drummond diz: Inabitável, o mundo é cada vez mais habitado. E se os olhos reaprendessem a chorar seria um segundo [dilúvio. Retomando a temática das questões sociais e a preocupação com o mundo, vamos à leitura de dois poemas de Drummond sobre O Medo. O mundo tinha acabado de passar pela Primeira Guerra (1914-1918) e estava submetido à Segunda Guerra Mundial (1939-1945), assistindo ao crescimento dos regimes totalitários. No Brasil, Getúlio Vargas estava no poder - período conhecido como Estado Novo. Sabemos que o ser humano é passível de diversos sentimentos e emoções que são resultados das situações que transpõem seu cotidiano. O medo é um deles. Drummond era incapaz de ignorar o social e sua individualidade. Ele procurava estabelecer um vínculo com a realidade e via o medo como uma imposição dos opressores. O poema O Medo representa o sentimento mais utilizado para causar rejeição ao sistema político em que o autor acreditava - o comunismo. Drummond critica desde a base social e educacional até a condição política pela qual o Brasil vinha sendo levado. O Medo é um retrato, na visão do poeta, das causas e consequências da sociedade daqueles anos. Classe média e elite, as principais responsáveis pela ascensão da Ditadura do Estado Novo, no Brasil, e do fascismo na Europa, agora estavam vivenciando todos os aspectos do medo. A leitura deste poema revela a insatisfação com o presente e a falta de perspectiva com relação à vida. Essas imagens estão impressas no vocábulo “escuro”- ( Nascemos escuro) que sugere a ideia de desorientação e incerteza em relação ao futuro. O sujeito lírico sente a mediocridade da sociedade que se revela indiferente quanto às questões sociais. O Medo Em verdade temos medo. Nascemos no escuro. As existências são poucas; Carteiro, ditador, soldado. Nosso destino, incompleto. 635
B13 Modernismo segunda fase - poesia - Carlos Drummond de Andrade
O Metapoema de Drummond
Português
E fomos educados para o medo. Cheiramos flores de medo. Vestimos panos de medo. De medo, vermelhos rios Vadeamos.
Do homem só. Ajudai-nos, lentos poderes do [láudano. Até a canção medrosa se parte, Se transe e cala-se.
Somos apenas uns homens e a natureza traiu-nos. Há as árvores, as fábricas, Doenças galopantes, fomes.
Refugiamo-nos no amor, Este célebre sentimento, E o amor faltou: chovia, Ventava, fazia frio em São Paulo. Fazia frio em São Paulo... Nevava. O medo, com sua capa, Nos dissimula e nos berça. Fiquei com medo de ti, Meu companheiro moreno. De nós, de vós; e de tudo.
B13 Modernismo segunda fase - poesia - Carlos Drummond de Andrade
Estou com medo da honra. Assim nos criam burgueses. Nosso caminho: traçado. Por que morrer em conjunto? E se todos nós vivêssemos? Vem, harmonia do medo, Vem ó terror das estradas, Susto na noite, receio De águas poluídas. Muletas
636
Faremos casas de medo, Duros tijolos de medo, Medrosos caules, repuxos, Ruas só de medo, e calma. E com asas de prudência Com resplendores covardes, Atingiremos o cimo De nossa cauta subida. O medo com sua física, Tanto produz: carcereiros, Edifícios, escritores, Este poema, outras vidas. Tenhamos o maior pavor. Os mais velhos compreendem. O medo cristalizou-os. Estátuas sábias, adeus. Adeus: vamos para a frente, Recuando de olhos acesos. Nossos filhos tão felizes... Fiéis herdeiros do medo, Eles povoam a cidade. Depois da cidade, o mundo. Depois do mundo, as estrelas, Dançando o baile do medo. (A rosa do povo. In Reunião. 9 ed.
Rio de Janeiro, J. Olympio, 1978.)
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Podemos perceber já no título o emprego do artigo definido “o”. Drummond especifica e determina de modo particular o substantivo “medo”. Mas não é um medo qualquer. É um medo generalizado.
Para o poeta, até então comunista, o medo representava uma arma utilizada pelo sistema capitalista e pelos ditadores para o controle social, já que estávamos em plena Ditadura do Estado Novo.
Na primeira estrofe - “nascemos no escuro” chama-nos a atenção. Nesse verso, a escuridão se liga à ideia de ausência de vida, de esperança, de luz, enfim.
No verso “de medo, vermelhos rios vadeamos”, “vermelhos rios” remete-nos ao sangue, o sangue dos mortos pela ditadura, que ‘vadeamos’. Vadear significa transportar pela margem mais rasa - passamos por cima desse sangue por medo.
E fomos educados para o medo. Cheiramos flores de medo. Vestimos panos de medo. De medo, vermelhos rios Vadeamos. Somos apenas uns homens E a natureza traiu-nos. Há as árvores, as fábricas, Doenças galopantes, fomes.
Fonte: Wikimedia Commons
Na segunda e terceira estrofes, Drummond esclarece aspectos capitalistas, como o consumo e a indústria - “vestimos”, “fábricas” - e suas consequências, paralelamente à Segunda Grande Guerra, que ainda estava acontecendo, como “doenças” e “fomes”. O autor utiliza “fomes” (no plural), em que podem ser englobadas as fomes de comida, de dignidade e de liberdade.
A proposta final do poema parece-nos pessimista porque o poeta imagina um futuro ainda comandado pelo medo, herança de pais para filhos. Em todo o poema, há um tom irônico, quase sarcástico, pois o autor faz uma apologia do medo quando, na verdade, o ideal seria todos se livrarem dele. Por fim, as duas últimas estrofes dão continuidade ao sentimento de medo. Ao olhar para frente, Drummond diz que o medo já está cristalizado nos mais velhos e que seus ‘herdeiros’ também já estão cristalizados, erguendo seus muros de medo, até as estrelas. Ao terminar com o verbo “dançando” (no gerúndio) – impera uma continuidade, uma sucessão. Sugere, portanto, que não será essa a geração que viverá sem estar baseada no medo, mas ainda virão outras. As “outras vidas”, os “outros poemas”, que não mais dançarão “o baile do medo”. Ao comparar os dois poemas, podemos perceber que a situação do medo impera em ambos. O amor aparece inacessível ao coração do homem, soterrado pelo medo. Veja que Drummond elege flores amarelas porque elas simbolizam o desespero. O poeta insiste no tema “medo” porque, sobretudo na época da ditadura militar, o homem viveu sob um verdadeiro regime de terror, cujas consequências são ainda sentidas. Figura 02 - Soldados americanos – Segunda Guerra Mundial
637
B13 Modernismo segunda fase - poesia - Carlos Drummond de Andrade
Podemos perceber também o efeito da repetição da palavra “medo”, na segunda estrofe, em que a palavra aparece quatro vezes demonstrando que o medo está marcadamente presente em tudo.
Português
Congresso Internacional do Medo Provisoriamente não cantaremos o amor, que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos. Cantaremos o medo, que esteriliza os abraços, não cantaremos o ódio, porque este não existe, existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro, o medo grande dos sertões, dos mares, dos desertos, o medo dos soldados, o medo das mães, o medo das igrejas, cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos democratas, cantaremos o medo da morte e o medo de depois da morte. Depois morreremos de medo e sobre nossos túmulos nascerão flores amarelas e medrosas. (Brejo das almas. In Reunião.)
Em Congresso Internacional do Medo, por se tratar de um poema crítico e reflexivo, podemos observar que o substantivo abstrato “medo” persiste, pois há uma ênfase maior para esse sentimento e o título apenas reforça essa afirmação (“Congresso Internacional do medo”). A partir do título, constatamos que se trata de um sentimento específico do Brasil. O medo está presente em vários lugares e em várias ações. Por isso não seria conveniente tratar do “amor” ou do “ódio”, mas deve-se comentar sobre o medo, esse sentimento que gera desequilíbrio, angústia, dúvida, insegurança, diante do contexto social da época, pois no período em que o poema foi escrito, havia o clima de Guerra Mundial, cujos sentimentos que se experimentavam eram a dor, o sofrimento e muito medo. Um medo que paralisava, diante de um mundo mergulhado no caos. Drummond sempre se apresentou como poeta da vida presente e como “gauche”. Isto significa que ele é capaz de retratar o incômodo das situações diante das quais o indivíduo é colocado.
B13 Modernismo segunda fase - poesia - Carlos Drummond de Andrade
Terminada a Segunda Guerra Mundial e após um período de engajamento político mais explícito, Drummond passa por uma fase de decepção com os rumos que tomou o socialismo. O abandono da militância o levou a uma introspecção mais acentuada. O melhor produto desse momento é a obra Claro Enigma que apresenta um traço forte da poesia do autor: sua capacidade de verticalizar os temas de que trata, submetendo-os a uma visão profunda e transcendente.
Fonte: Shutterstock.com
Publicado em 1951, Claro Enigma nos mostra um poeta mais amargo, voltado para questões mais reflexivas sobre a condição humana. O Drummond social que se destaca na segunda geração modernista da década de 1930, engajado em questões sociais em Sentimento do Mundo (1940), dá a vez a um poeta mais introspectivo e filosófico nessa obra.
638
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Exercícios de Fixação A MÁQUINA DO MUNDO
03. (PUC SP) A respeito de Claro Enigma, livro inteiro de Carlos Drummond de Andrade, NÃO É CORRETO afirmar que a) carrega no título uma figura de linguagem chamada oxí-
E como eu palmilhasse vagamente
moro, a qual alcança seu desenvolvimento maior na pri-
uma estrada de Minas, pedregosa,
meira parte da obra, ou seja, “Entre lobo e cão”.
e no fecho da tarde um sino rouco
b) revela afastamento da temática social, privilegiando
se misturasse ao som de meus sapatos que era pausado e seco; e aves pairassem no céu de chumbo, e suas formas pretas
temas filosóficos, como ocorre nos poemas de “A Máquina do Mundo”. c) estrutura seus poemas, usando também as formas da tradição como versos metrificados e rimados, formas es-
lentamente se fossem diluindo
téticas e poéticas do passado, como em “Oficina Irritada”.
na escuridão maior, vinda dos montes e de meu próprio ser desenganado, a máquina do mundo se entreabriu para quem de a romper já se esquivava e só de o ter pensado se *carpira.
poemas de variada temática, mas sempre utilizando-se unicamente de estruturas poéticas idênticas e clássicas, como acontece em as “Notícias Amorosas”. 04. (Fac. São Francisco de Barreiras BA)
Carlos Drummond de Andrade, Claro enigma.
*carpir-se: lamentar-se. 01. (Fac. Israelita de Ciências da S. Albert Einstein SP) O trecho acima integra um poema maior da obra Claro Enigma, de Carlos Drummond de Andrade. Considerando o poema como um todo, NÃO É CORRETO afirmar que a) caracteriza-se por um tom sombrio, insere-se nos poemas escuros da obra e apresenta o material temático desenvolvido no poema. b) revela o lirismo filosófico e existencial do poeta sob a configuração de uma máquina que se mostra a um desiludido viajante. c) personifica um caminhante que aceita o convite que lhe é feito, e decifra a máquina do mundo, compreendendo, assim, o sentido íntimo da vida e de tudo. d) mantém uma relação dialogal com mesmo tema de obra de Camões e com a estrutura poético-narrativa da obra de Dante Alighieri. 02. (Fuvest SP) Ainda sobre a leitura de A máquina do mundo, atenda ao que se pede.. a) O ponto de vista do eu lírico em relação à “máquina do mundo” ilustra as principais características de Claro enigma? Justifique. b) Transcreva o verso que sintetiza o evento sublime de que
Cota Zero Stop. A vida parou Ou foi o automóvel? ANDRADE, Carlos Drummond de. Cota Zero. Disponível em: <http://oficinadoescritor.blogspot.com. br/2008/07/literatura.html>. Acesso em: 13 nov. 2016.
Considerando-se o título e os efeitos de sentidos existentes no poema, é correto afirmar sobre esses versos drummondianos: a) O título, “Cota Zero”, sugere uma situação inicial, um ponto de partida para anunciar o acréscimo da cota ganha por cada ser humano com o processo de industrialização. b) A palavra “Cota”, utilizada em sentido denotativo, estabelece uma parte daquilo que cabe a cada pessoa analisar para dar sua contribuição ao progresso industrial. c) O verso “Stop.” lembra uma placa de trânsito que indica uma parada instantânea, o que sinaliza para o interlocutor um sentido contrário, ou seja, o de avançar em busca do desenvolvimento. d) O impacto do pressentimento de que algo havia parado revela a ironia do eu poético diante do sentimento de uma existência marcada pela dependência do homem moderno às máquinas, sem referendar outros valores. e) O questionamento feito gera a certeza de que a vida, como o automóvel, se move, assim como o avanço tecnológico é realmente bom e acelera evolução do indivíduo.
Questão 02. a) O livro Claro Enigma (1951), pertencente à terceira fase de Carlos Drumonnd de Andrade, caracteriza-se pelo questionamento metafísico e pela crise existencial. Isso o afasta da temática social e da poética iconoclasta das fases anteriores. Em “A máquina do mundo”, cuja forma e conteúdo dialogam com a poesia do poeta renascentista Dante Alighieri, há a possibilidade de o eu lírico desvendar “a total explicação da vida, / esse nexo primeiro e singular”, pois a máquina fez-lhe esse convite que é surpreendentemente rejeitado. O penúltimo poema – “A máquina do mundo” – sintetiza um percurso reflexivo e insolúvel recorrente no livro. Esse tom sombrio é evidenciado nessas quatro estrofes pelas expressões “de chumbo”, “escuridão” e, principalmente, “desenganado”. Esse sentido de perplexidade, de isolamento, é recorrente em Claro Enigma, como se nota já nos dois versos iniciais do primeiro poema do livro, “Dissolução”: “Escurece, e não me seduz / tatear sequer uma lâmpada”. b) O verso que sintetiza o evento sublime é “a máquina do mundo se entreabriu”.
639
B13 Modernismo segunda fase - poesia - Carlos Drummond de Andrade
(...)
trata o texto.
d) divide-se em seis partes e aglutina, em cada uma delas,
BA)
Português
o ca-
utu-
Exercícios Complementares
com-
01. (Fac. Israelita de Ciências da S. Albert Einstein SP)
gran-
Oficina Irritada Eu quero compor um soneto duro como poeta algum ousara escrever. Eu quero pintar um soneto escuro, seco, abafado, difícil de ler. Quero que meu soneto, no futuro, não desperte em ninguém nenhum prazer. E que, no seu maligno ar imaturo, ao mesmo tempo saiba ser, não ser. Esse meu verbo antipático e impuro há de pungir, há de fazer sofrer, tendão de Vênus sob o pedicuro.
B13 Modernismo segunda fase - poesia - Carlos Drummond de Andrade
Ninguém o lembrará: tiro no muro, cão mijando no caos, enquanto Arcturo, claro enigma, se deixa surpreender. O texto Oficina Irritada é de Claro Enigma, obra de Carlos Drummond de Andrade. De sua leitura se pode depreender que a) é um poema que segue rigorosamente os procedimentos de construção do soneto clássico e tradicional, particularmente quanto à disposição e ao valor das rimas e ao uso da chave de ouro como fecho conclusivo do texto. b) é um metapoema e revela que o soneto que o autor deseja fazer é o mesmo que o leitor está lendo, como a evidenciar na prática a junção do querer e do fazer. c) utiliza-se de expressões como “tiro no muro” e “cão mijando no caos”, que, além de provocar mau gosto e o estranhamento do leitor, rigorosamente, nada têm a ver com a proposta de elaboração do poema. d) faz da repetição anafórica e do paralelismo dos versos, um recurso de composição do poema que o torna enfadonho e antiestético e revela um poeta de produção duvidosa e menor. 02. (IF PE) TRISTEZA NO CÉU No céu, também, há uma hora melancólica. Hora difícil, em que a dúvida penetra as almas. Por que fiz o mundo? Deus se pergunta e se responde: Não sei. Os anjos olham-no com reprovação, e plumas caem.
640
Todas as hipóteses: A graça, a eternidade, o amor caem, são plumas. Outra pluma, o céu se desfaz. Tão manso, nenhum fragor denuncia o momento entre tudo e nada, ou seja, a tristeza de Deus. ANDRADE, C. D. Antologia poética. São Paulo: Companhia das Letras, 2012. p. 244.
Sobre o poema “Tristeza no céu”, de Carlos Drummond Andrade, podemos afirmar que a) há uma atmosfera nostálgica e saudosista expressa principalmente no verso “O momento entre tudo e nada”. b) a dúvida atribuída a Deus, “Por que fiz o mundo?”, reverte-se em negatividade e melancolia evidenciadas no final do poema “O momento entre tudo e nada/Ou seja, a tristeza de Deus” c) exprime oposição entre o ser do poeta e o mundo exterior, uma vez que o eu lírico estende seu descontentamento à própria criação. d) a partir de uma visão crítica, como no verso “Os anjos olham-no com reprovação e plumas caem”, estabelece-se uma perspectiva esperançosa. e) tem cunho metalinguístico, pois constrói-se uma reflexão sobre o próprio fazer poético, como no verso “Por que fiz o mundo?”. 03. (PUC SP) Entre o Ser e as Coisas Onda e amor, onde amor, ando indagando ao largo vento e à rocha imperativa, e a tudo me arremesso, nesse quando amanhece frescor de coisa viva. Às almas, não, as almas vão pairando, e, esquecendo a lição que já se esquiva, tornam amor humor, e vago e brando o que é de natureza corrosiva. N’água e na pedra amor deixa gravados seus hieróglifos e mensagens, suas verdades mais secretas e mais nuas. E nem os elementos encantados sabem do amor que os punge e que é, pungindo, uma fogueira a arder no dia findo.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
04. (Unievangélica GO) Leia o texto a seguir. Às 398 razões de incompatibilidade entre a arte moderna e o público poder-se-ia acrescentar mais esta: o público geralmente procura o assunto, enquanto a arte moderna o esquiva ou elimina. ANDRADE, Carlos Drummond de. Passeios na ilha. In: Poesia e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1992. p. 1422.
Essa incompatibilidade entre a arte moderna e o público, apontada por Carlos Drummond de Andrade, advém do fato de o experimentalismo literário inicial do Modernismo ter conferido maior importância a) à forma do que ao conteúdo. b) ao contexto histórico do que à estética. c) ao social do que à linguagem. d) à ideologia do que à plasticidade verbal. 05. (PUC SP) A Ingaia Ciência A madureza, essa terrível prenda que alguém nos dá, raptando-nos, com ela, todo sabor gratuito de oferenda sob a glacialidade de uma estela, a madureza vê, posto que a venda interrompa a surpresa da janela, o círculo vazio, onde se estenda, e que o mundo converte numa cela. A madureza sabe o preço exato dos amores, dos ócios, dos quebrantos, e nada pode contra sua ciência e nem contra si mesma. O agudo olfato, o agudo olhar, a mão, livre de encantos, se destroem no sonho da existência. O poema acima, de Carlos Drummond de Andrade, está em Claro Enigma. Dele pode-se afirmar que
a) é um texto clássico cujo título remete ao sentido de um conhecimento vivaz, de uma arte alegre retomada dos provençais e, por isso se estrutura em linguagem coloquial e de fácil entendimento. b) é um soneto que não pode ser enquadrado no Modernismo porque retoma temas poéticos e procedimentos estéticos próprios do Classicismo, em linguagem de elaboração sofisticada e extremamente formal. c) revela o vazio existencial do indivíduo, exacerbado pela maior clareza que a vida traz, e se desenvolve em versos decassílabos, organizados em rima cruzada tanto nos quartetos quanto nos tercetos e faz bom uso do enjambement como elemento de continuidade semântica e rítmica do poema. d) refere o tema da maturidade, enfocando-o como a experiência que anula os sentidos na percepção do mundo, mas capaz de tornar o homem feliz ao entender racionalmente a realidade. 06. (Fac. Israelita de Ciências da S. Albert Einstein SP) Legado Que lembrança darei ao país que me deu tudo que lembro e sei, tudo quanto senti? Na noite do sem-fim, breve o tempo esqueceu minha incerta medalha, e a meu nome se ri. E mereço esperar mais do que os outros, eu? Tu não me enganas, mundo, e não te engano a ti. Esses monstros atuais, não os cativa Orfeu, a vagar, taciturno, entre o talvez e o se. Não deixarei de mim nenhum canto radioso, uma voz matinal palpitando na bruma e que arranque de alguém seu mais secreto espinho. De tudo quanto foi meu passo caprichoso na vida, restará, pois o resto se esfuma, uma pedra que havia em meio do caminho. Esse poema integra a obra Claro Enigma, de Carlos Drummond de Andrade. Da leitura dele, depreende-se que a) o poeta exalta a força que a poesia tem de tornar perenes as vicissitudes efêmeras da vida. b) as rimas, bastante convencionais, dão ao poema um tom passadista que faz dele um texto de dúbia qualidade estética. c) o legado a que se refere o texto diz respeito somente à poesia metaforizada como canto radioso. d) o poema se organiza em versos alexandrinos, de caráter parnasiano, sem deixar de apresentar a clássica chave de ouro, que confere brilhantismo ao fecho do texto.
641
B13 Modernismo segunda fase - poesia - Carlos Drummond de Andrade
O poema acima é de Carlos Drummond de Andrade e integra a obra Claro Enigma. Da leitura dele não se pode concluir que a) é um poema de extração filosófica, pois se apoia em indagação sobre a existência e as complicações do amor. b) constrói-se com citações/referências tanto de obras da poesia brasileira quanto do que há de melhor na poesia portuguesa. c) afirma que o amor se manifesta em linguagem clara e objetiva e deixa suas marcas apenas sobre os corpos líquidos de forma indelével e definitiva. d) é um texto que se estrutura em forma fixa, com rimas e métrica convencionais, nos moldes da poesia clássica.
FRENTE
B
PORTUGUÊS
MÓDULO B14
ASSUNTOS ABORDADOS n Modernismo segunda fase – Po-
esia - Vinícius de Moraes, Cecília Meireles Murilo Mendes e Jorge de Lima n Vinícius de Moraes n Cecília Meireles n Murilo Mendes n Jorge de Lima
MODERNISMO SEGUNDA FASE – POESIA VINÍCIUS DE MORAES, CECÍLIA MEIRELES MURILO MENDES E JORGE DE LIMA Vinícius de Moraes Como vimos no módulo anterior, o Brasil experienciou fortes mudanças nos campos da política, da economia e da cultura entre os anos de 1930 e 1970. Das mudanças de perspectivas às crises, o momento é interessante para uma reflexão sobre a sociedade e o que ela produziu no processo de (re) construção do Brasil. E é nesse sentido que vamos analisar a obra de Vinícius de Moraes, poeta que faz parte desse período. Vamos observar as rupturas que se estabelecem na cultura e na política, como também tentar enxergar não apenas o artista, mas o homem que compreendeu sua condição sociopolítica, expressando, de alguma maneira, os interesses de sua classe. Como artista, o escritor enriqueceu ainda mais a produção cultural e, merecidamente, foi reconhecido como forte referência dentro e fora do Brasil. A carreira de Vinícius de Moraes, como poeta, iniciou logo após a chegada do movimento modernista ao País e durou até meados da década de 1950, quando ele passou a se dedicar à carreira musical. Portanto, Vinícius foi, sem dúvida, um dos maiores artistas brasileiros do século XX. Versátil e criativo, atuou de forma intensa na poesia, na prosa, no teatro, na música e também no cinema. Além de artista, atuou como diplomata, encerrando tal carreira no início do período militar. Características gerais da obra de Vinícius de Moraes O início da obra de Vinícius de Moraes segue uma aliança com o Neossimbolismo. Isso traz uma renovação católica da década de 1930, além de uma reconstrução do lado espiritual humano.
Fonte: Wikimedia Commons
Inicialmente, sua poesia apresentava uma tendência religiosa, com textos longos e traços bíblicos. São características da poética metafísica da primeira fase: a presença marcante do eu lírico, que se configura pelo constante uso da primeira pessoa do singular; o tom confessional e o franco diálogo com Deus, marcados por uma atmosfera conflituosa- permeada de pessimismo, sofrimento e angústia - que se desenvolve em sua poética por meio de temas substanciais à sua obra, como a morte, o pecado, a solidão, os conflitos entre o corpo e a alma, a fé e a dúvida, a busca do absoluto, o gosto pelo universo simbólico e a comunhão com a natureza. Essa obra inicial trouxe: Reflexão sobre o sentido de estar no mundo; n Versos com estrutura sintática mais elaborada; n Foco no contexto político; n Renovação da linguagem - poemas de forma livre e de forma fixa. “A poesia é tão vital para mim, que ela chega a ser o retrato de minha própria vida” n
Vinícius de Moraes
642
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
As fases da literatura de Vinícius de Moraes
Tudo está cheio de ruídos sonolentos
Vinícius de Moraes não foi um poeta apenas. Ele viveu intensamente a poesia, sugerindo pluralidade. O artista foi um poeta admirável e é considerado o maior sonetista que o Brasil já teve. Levou a riqueza de seus versos para a música e, nessa arte, praticamente inaugurou a profissão de letrista, ajudando a criar um ritmo com a cara do Brasil: a bossa nova.
Que vêm do céu, que vêm do chão
A crítica literária dividiu a obra viniciana em duas fases: Primeira fase: poesia metafísica ou poesia espiritualista, mística (culpa, pecado, alma) e religiosa. A poesia metafísica de Vinícius de Moraes pode ser analisada como produto das intensas crises políticas e ideológicas que atravessaram os anos de 1930 - o fim da República Velha, a disseminação de ideologias vindas da Europa do pós-Guerra.
Nessa fase, Vinícius escreveu:
E que esmagam o infinito do meu desespero. Através do tenuíssimo de névoa que o céu cobre Eu sinto a luz desesperadamente Bater no fosco da bruma que a suspende. As grandes nuvens brancas e paradas __ Suspensas e paradas Como aves solícitas de luz __ Ritmam interiormente o movimento da luz: Dão ao lago do céu A beleza plácida dos grandes blocos de gelo.
- Caminho para a distância (1933);
No olhar aberto que eu ponho nas coisas do alto
- Forma e Exegese (1935);
Há todo um amor à divindade.
- Ariana, a mulher (1936);
No coração aberto que eu tenho para as coisas do alto
- Novos Poemas (1938);
Há todo um amor ao mundo.
- Cinco Elegias (1943).
No espírito que eu tenho embebido das coisas do alto Há toda uma compreensão.
Os dois últimos livros são considerados por alguns críticos como integrantes da segunda fase, uma vez que apresentam um processo de afastamento gradativo das “coisas do sublime”. Além disso, vários poemas do autor enquadram-se nessa fase de temática bíblica. Veja o exemplo. Místico O ar está cheio de murmúrios misteriosos E na névoa clara das coisas há um vago sentido de espiritualização…
[...] Rio de Janeiro, 1933
O poema expressa no poeta o desejo de transcender, de atingir o alto, o eterno e que só se alcança por meio da morte. A contemplação do céu é o caminho direto para o sujeito poético, que em forma de alma, possa alcançar a graça divina. A forma como contempla o alto – com os olhos, com o coração, com o espírito – revela uma entrega total ao Divino e também uma dualidade – o chão e o céu, o corpo e o espírito – em que os opostos estão conectados, como se fossem uma extensão um do outro.
643
B14 Modernismo segunda fase - poesia
Fonte: Wikimedia Commons
Figura 02 - Vinícius de Moraes
Português
Segunda fase - Poesia social Essa fase caracterizou-se pela produção de uma poesia social, de tendência esquerdista, com temas como a valoração do trabalho humano e os preconceitos de classe e de meio. Com o passar dos anos, seu interesse voltou-se para aspectos do cotidiano e para o relacionamento amoroso, em favor de um tom mais intimista, pessoal, voltado para o amor físico, com uma linguagem ao mesmo tempo realista, coloquial e lírica, com enfoque mais erótico que passava a entrar em contradição com sua formação religiosa. Vinícius passou a tratar de coisas mais cotidianas, mais humanas e menos impregnadas pelos valores morais e religiosos. Nessa segunda fase, o poeta valoriza: n n n n
n
a sensualidade – soneto de Devoção; a celebração da mulher – Receita de mulher; o aspecto social – Rosa de Hiroshima; o resgate da forma clássica – soneto – preocupação com aspectos sonoros – Soneto de Fidelidade, soneto de Separação; a poesia engajada – Operário em construção.
De repente do riso fez-se o pranto Silencioso e branco como a bruma E das bocas unidas fez-se a espuma E das mãos espalmadas fez-se o espanto. De repente da calma fez-se o vento Que dos olhos desfez a última chama E da paixão fez-se o pressentimento E do momento imóvel fez-se o drama. De repente, não mais que de repente Fez-se de triste o que se fez amante Fez-se de triste o que se fez contente. Fez-se do amigo próximo o distante Fez-se da vida uma aventura errante De repente, não mais do que de repente. In Antologia poética
Ainda nessa fase, escreveu os seguintes livros:
Soneto de Fidelidade
- Poemas, sonetos e baladas (1946);
De tudo, ao meu amor serei atento Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto Que mesmo em face do maior encanto Dele se encante mais meu pensamento.
- Pátria minha (1949); - Antologia poética (1954); - Livros de Sonetos (1957); - Novos Poemas (II) (1959). Ainda nesse período contamos com um Vinícius do tempo presente, fazendo uma poesia de denúncia. Ele é, ao mesmo tempo, um poeta do tempo que passa, da reflexão sobre a morte e sobre a brevidade da vida e do amor.
B14 Modernismo segunda fase - poesia
Soneto de separação
Em muitos sonetos de Vinícius de Moraes, o amor é a representação de um sentimento poderoso, contudo, fugaz. Essa é a ideia principal do “Soneto de separação” cujas antíteses mostram o impacto da perda do amor na vida das pessoas: o riso torna-se pranto, trazendo a dor e a tristeza. O vento que desfaz a calma, o momento tranquilo é transformado em drama, e faz o próximo tornar distante.
644
Quero vivê-lo em cada vão momento E em seu louvor hei de espalhar meu canto E rir meu riso e derramar meu pranto Ao seu pesar ou seu contentamento. E assim, quando mais tarde me procure Quem sabe a morte, angústia de quem vive Quem sabe a solidão, fim de quem ama Eu possa lhe dizer do amor (que tive): Que não seja imortal, posto que é chama Mas que seja infinito enquanto dure. (In Antologia Poética)
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Podemos identificar no “Soneto de Fidelidade” o sentimento de entrega total à pessoa amada. Isso, independentemente das circunstâncias, e renunciando outras possibilidades de relacionamentos amorosos. Eu possa me dizer do amor (que tive): Que não seja imortal, posto que é chama Mas que seja infinito enquanto dure. Nesse terceto, o autor fala sobre o fim das coisas, anunciando que a morte pode causar o fim de um amor. Ao mesmo tempo, ele deseja que a morte e a solidão não cheguem cedo, para que possa desfrutar desse amor. Vinícius utiliza uma metáfora para se referir ao amor, dizendo que o amor é uma chama e, se é uma chama, não dura para sempre: tem um princípio e um fim. Assim, fica evidente o desejo do poeta de aproveitar ao máximo o amor, enquanto ele existir. Vinícius também utiliza um paradoxo com a palavra “infinito” para descrever algo que não dura para sempre. Nesse caso, a fidelidade é vista como a entrega total ao amor: ele dura enquanto a chama estiver acesa. Nessa mesma fase, o autor dedicou-se à produção de crônicas, textos teatrais e à própria produção musical. O poeta não a distingue de sua poesia escrita, mesmo porque tais produções refletem sua visão de mundo e expressam os valores ideológicos no contexto no qual se inserem. Dividir a obra de Vinícius de Moraes não é apenas uma forma de contemplar as questões éticas e estéticas que caracterizam o erudito e o popular em sua obra. Significa, principalmente, observar as diferenças nos discursos construídos que levaram a crítica a dividir sua obra.
Fonte: Wikimedia Commons
A rosa de Hiroshima O nosso poetinha (como era chamado) foi contemporâneo desse evento trágico e conseguiu registrar com sensibilidade o terrível impacto provocado pela bomba atômica, uma arma de destruição em massa, lançada pelos Estados Unidos, contra a população de duas cidades japonesas: Hiroshima e Nagasáki, em agosto de 1945. O poema é uma grande reflexão sobre os limites da razão humana no uso da ciência e da tecnologia.
A Rosa de Hiroshima Pensem nas crianças Mudas telepáticas Pensem nas meninas Cegas inexatas Pensem nas mulheres Rotas alteradas Pensem nas feridas Como rosas cálidas Mas, oh, não se esqueçam Da rosa da rosa Da rosa de Hiroshima A rosa hereditária A rosa radioativa Estúpida e inválida A rosa com cirrose A antirrosa atômica Sem cor sem perfume Sem rosa, sem nada. Rio de Janeiro, 1954
Podemos perceber claramente como o poema está dividido em três partes distintas: Inicialmente, o poema mostra as imagens sobre as consequências da bomba atômica e sua radioatividade. Quando ele introduz os versos: Mas, oh, não se esqueçam / Da rosa da rosa, ele pede que nos lembremos da bomba em si, simbolizada pela rosa em alusão à flor de dejetos e fumaça que a explosão criou. Há, nesse corpo do poema, um apelo à memória no sentido de despertar a consciência histórica de quem o lê, para não esquecer as consequências da estupidez da “rosa radioativa”. A partir daí, o poema muda e todos os versos fazem parte de uma única imagem – a da bomba. Mas o apelo segue na metáfora da “rosa” que sensibiliza e aguça a imaginação do leitor: A rosa radioativa/ Estúpida e inválida/ A rosa com cirrose/ A antirrosa atômica”. O poema termina com um dístico: Sem cor sem perfume / Sem rosa, sem nada, que mostra novamente as consequências da bomba, deixando o local devastado, desabitado, sem vida. Figura 03 - Bomba nuclear
645
B14 Modernismo segunda fase - poesia
Vinícius talvez tenha sido o poeta que mais viveu de acordo com as ideias de defesa do amor sensual e que defendeu a finitude dos relacionamentos. Entretanto, ainda assim defendia que esse amor fosse vivido intensa e profundamente. Prova disso é que ele se casou nove vezes.
Português
Fonte: Wikimedia Commons
Cecília Meireles Cecília, és como o ar, Diáfana, diáfana. Mas o ar tem limites: Tu, quem te pode limitar? Manuel Bandeira
Cecília é uma poetisa intimista, próxima à abstração da música, ao sentimento religioso e à fluidez do sonho. Estão presentes em seus textos e fazem parte de seu mundo as impressões sensoriais, as fronteiras, as nuvens, as sugestões e a névoa. A perfeição com que Cecília capta e imprime a realidade, reinventando-a liricamente, é reconhecida pelo conjunto da crítica brasileira e portuguesa. A poeta “do ar” que canta o amor, a morte, o tempo, o eterno e o efêmero, representou a afirmação definitiva da autoria feminina na poesia em Língua Portuguesa. Prova disso são os títulos de seus livros: Vaga Música e Mar Absoluto. É perceptível o quanto a vida pessoal se insere na obra literária da poetisa. A morte se fez presente muito cedo em sua vida. Cecília conhece muito cedo o infortúnio e extrai dele forças que lhe serão muito próprias, capazes de esclarecer o seu “estar no mundo” e a sua especificidade existencial. Três meses antes do seu nascimento, seu pai falece, culminando, dessa maneira, o encadeamento das mortes dos seus três irmãos mais velhos. Contudo, a onda de catástrofes não parou por aí, pois três anos após seu nascimento, ela perde a mãe, que deixa a guarda da filha à avó materna, por quem Cecília será criada. Portanto, esse sentimento que tão cedo experimentou, essa noção de “transitoriedade de tudo”, que está impressa na sua vida desde logo ao nascer, tornou-se o fundamento da sua personalidade. Temática da autora
O mar, pela natureza “plástica, fluida e disponível” está particularmente presente na poesia ceciliana, fundindo ser humano e natureza.
Quem falou de primavera sem ter visto o teu sorriso, falou sem saber o que era. B14 Modernismo segunda fase - poesia
Onda - Cecília Meireles
646
Fonte: Wikimedia Commons
Do ponto de vista da temática, há um ponto essencial: a consciência da transitoriedade das coisas. A fugacidade do tempo, a brevidade da vida, a incapacidade de mudanças, a solidão, a influência do amor, a pureza original do mundo, o etéreo e a mística contemplação são temas e motivos dos quais Cecília se vale para regressar a um passado que só reencontrará se reinventá-lo como busca em poemas do Amor e Leonoreta e Mar absoluto e até mesmo em Romanceiro da Inconfidência.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Assim, destaca-se a noção de que a vida é muito breve, parece escorrer por entre os dedos, o tempo passa e tudo se esvai. Cecília escreveu vários poemas que abordam esse tema. Eles trazem uma consciência muito fina, muito profunda da passagem do tempo. Motivo é um poema metalinguístico, cuja reflexão sobre o próprio fazer poético se mostra como uma das principais preocupações da autora ao longo de sua vida. Nessa obra, a poeta reflete sobre seu “canto”, isto é, seu poema. Motivo Eu canto porque o instante existe e a minha vida está completa. Não sou alegre nem sou triste: sou poeta. Irmão das coisas fugidias, não sinto gozo nem tormento. Atravesso noites e dias no vento. Se desmorono ou se edifico, se permaneço ou me desfaço, — não sei, não sei. Não sei se fico ou passo. Sei que canto. E a canção é tudo. Tem sangue eterno a asa ritmada. E um dia sei que estarei mudo: — mais nada. Cecília Meireles, Antologia Poética. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2001
Quando Cecília diz “irmão das coisas fugidias” - fala daquilo que ela tenta segurar, mas que escapa de suas mãos. A autora retrata o sentido das coisas que o eu poemático até conquista, mas perde, vai se esvaindo como espuma ao vento.
Fonte: Wikimedia Commons
Quando ela diz: “Tem sangue eterno a asa ritmada” - a única coisa que resiste à voracidade do tempo é a arte e a poesia e porque ela é poeta. Cecília Meireles foi a grande responsável por consagrar e também popularizar uma literatura intimista e introspectiva que se tornou uma marca da literatura feminina. O lirismo da autora ecoa em sua linguagem, que enfatiza os símbolos e os apelos sensoriais. Ela gosta de sensações vagas e um vocabulário mais abstrato, que remete ao simbolismo, porém com uma nova roupagem.
B14 Modernismo segunda fase - poesia
Seus versos são muito sonoros. A música, algumas vezes, mostra ser mais importante que o próprio sentido dos versos, haja vista que muitos dos seus poemas já foram musicados. A poeta reflete também, em suas obras, variações entre os temas: sonho, fantasia, solidão, padecimento e tempo. O tempo se faz presente em muitos de seus poemas, enfatizando a transitoriedade das coisas. No plano estilístico, há em sua obra uma tendência à linguagem elevada. No poema “Canção do Amor-Perfeito”, podemos identificar, na primeira estrofe, quando o sujeito poemático frisa que a passagem do tempo evapora a beleza, debilita o amor e deixa as palavras ressequidas, mais duras, com menos brilho. A irremediável passagem do tempo faz brotar saudade, recordações e desejos, trazendo solidão e resignação para o eu poético, que espera seu “Amor-Perfeito” fora desse plano material. 647
Português
O Tempo Seca o Amor O tempo seca a beleza, seca o amor, seca as palavras. Deixa tudo solto, leve, desunido para sempre como as areias nas águas. O tempo seca a saudade, seca as lembranças e as lágrimas. Deixa algum retrato, apenas, vagando seco e vazio como estas conchas das praias. [...] Cecília Meireles, in Retrato Natural
A atmosfera de sofrimento e de dor existencial que exala dos poemas de Cecília Meireles situa-se na percepção de que tudo passa e que o fluir do tempo dissolve os amores e as ilusões, o corpo e até mesmo a memória.
Fonte: Shutterstock.com
B14 Modernismo segunda fase - poesia
Em um de seus mais célebres poemas, “Retrato”, a investigação da própria imagem leva à constatação de profundas mudanças em sua pessoa e que sequer foram pressentidas pelo eu lírico. O foco da obra é psicológico e afetivo. A imagem que a poeta conhecia de si mesma está perdida, embutida no fundo de um espelho que também não se pode localizar. O retrato mostra apenas a outra
648
face, a que restou, e que é a presente, porém desconhecida e fonte de grande estranhamento. O título se encaixa perfeitamente ao poema, porque a palavra simboliza algo estático, parado, eternizado e o “eu” poemático tinha imensa vontade de se eternizar. Neste poema, Cecília nos mostra, com nitidez, a transitoriedade, a fugacidade das nossas vidas. Ela fez tudo isso de uma forma tão filosófica, que encanta seus leitores. Retrato Eu não tinha este rosto de hoje, assim calmo, assim triste, assim magro, nem estes olhos tão vazios, nem o lábio amargo. Eu não tinha estas mãos sem força, tão paradas e frias e mortas; eu não tinha este coração que nem se mostra. Eu não dei por esta mudança, tão simples, tão certa, tão fácil: - Em que espelho ficou perdida a minha face? MEIRELES. Cecília. Cecília Meireles – obra poética. Rio de Janeiro: Nova Aguillar, 1985.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Eu não tinha este rosto de hoje
Evidencia a transitoriedade da vida e a melancolia do sujeito poemático ao fazer essa constatação.
nem estes olhos tão vazios,
A constatação continua na percepção dos “olhos tão vazios”, em função dos sofrimentos e experiências vividas…
nem o lábio amargo
O lábio amargo dá continuidade à ideia de revezes da vida.
Eu não tinha estas mãos sem força
O sujeito poético percebe a mudança ocorrida nas suas mãos, partes significativas e que simbolizam força. Ele se vê sem força e já não se dispõe à luta, como nos tempos passados.
tão paradas e frias e mortas;
E continua a descrevê-las, evidenciando o tom melancólico. A repetição da conjunção “e” indica a passagem da vida para a morte.
eu não tinha este coração
Começa a descrever seu coração, que antes era mais mostrado... e finaliza a estrofe dizendo que hoje já está mais escondido.
que nem se mostra. Eu não dei por esta mudança,
Nesses versos, o eu lírico anuncia que não se deu conta da mudança, e percebe que, definitivamente, mudou física e interiormente …
tão simples, tão certa, tão fácil
Usa a palavra “tão”, mostrando claramente esta mudança.
— Em que espelho ficou perdida a minha face?
Aqui, mais uma vez o eu poemático retoma a transitoriedade, a passagem para outro estágio, outro lugar, e deixa claro que é algo que acontece, é universal e que quando menos esperamos, chega o momento para todos.
Romanceiro da Inconfidência - é uma obra de fôlego em que Cecília mostra sua competência de poeta e com estilo definido. Ela resgata o formato poético medieval: poemas narrativos comuns, que contavam histórias, escrevendo uma poesia histórica. É uma obra composta por 85 poemas que narram toda a história do movimento da Inconfidência Mineira, falando sobre os grandes líderes do movimento, os poetas árcades envolvidos e também sobre os personagens anônimos, montando seu estilo, sua linguagem e o tipo de vocabulário que caracteriza sua poesia. Principais Obras
SAIBA MAIS Retrato Natural (1949)
Giroflé, Giroflá (1956)
Amor em Leonoreta (1951)
Evocação Lírica de Lisboa (1948)
O Aeronauta (1952)
Eternidade de Israel (1959)
Romanceiro da Inconfidência (1953)
Ficção
Poemas Escritos na Índia (1955)
Poesia
Pequeno Oratório de Santa Clara (1955)
Espectros (1920)
Pistória, Cemitério Militar Brasileiro (1955)
Nunca Mais e Poema dos Poemas (1923)
Canções (1956)
Baladas para El-Rei (1925) Saudação à Menina de Portugal (1930) Viagem (1039) Vaga Música (1942) Mar Absoluto e Outros Poemas (1945)
Romance de Santa Cecília (1957) A Rosa (1957) Obra Poética (1958) Metal Rosicler (1960) Solombra (1963) Ou Isto ou Aquilo (1963) Poemas Italianos (1968)
Fonte: Wikimedia Commons
Olhinhos de Gato (1940)
Manuel Bandeira afirmou, certa vez, que havia na obra de Cecília Meireles “as claridades clássicas, as melhores sutilezas do gongorismo, a nitidez dos metros e dos consoantes parnasianos, os esfumados de sintaxe e as toantes dos simbolistas, as aproximações inesperadas dos super-realistas. Tudo bem assimilado e fundido numa técnica pessoal, segura de si e do que quer dizer”.
649
B14 Modernismo segunda fase - poesia
Prosa poética
Português
Fonte: Wikimedia Commons
Murilo Mendes A obra poética de Murilo Mendes surgiu dentro da crise social, existencial e cultural que permeou o Brasil na década de 1920. Nesse período, lançou-se o estopim da modernidade, abria-se a possibilidade de se construir um Brasil real, com mais autenticidade, tanto na política e vida em sociedade, quanto na literatura, na pintura e na música. Murilo Mendes é o principal representante do surrealismo brasileiro. Sua poesia revela tendências bastante distintas, criando um estilo próprio, povoando o universo de sonhos surrealistas com imagens do catolicismo. Na sua produção inicial, a influência do olhar irreverente dos primeiros modernistas é bem marcante. O sentido de humanidade e a consciência social são sempre associados, na poesia de Murilo Mendes, à dimensão espiritual. O catolicismo, religião professada pelo poeta, era a base para essa reflexão. Solidariedade Sou ligado pela herança do espírito e do sangue Ao mártir, ao assassino, ao anarquista. Sou ligado Aos casais na terra e no ar, Ao vendeiro da esquina, Ao padre, ao mendigo, à mulher da vida, Ao mecânico, ao poeta, ao soldado, Ao santo e ao demônio, Construídos à minha imagem e semelhança. MENDES, Murilo. Solidariedade. In_____ O menino experimental: antologia. 1 ed. São Paulo, Summus, 1979. P.62
Percebemos no poema uma identificação do autor com todo tipo de pessoas. Na sua visão, todos os seres são feitos à imagem e semelhança do poeta. O versículo bíblico “criados à minha imagem e semelhança” foi retomado por Murilo Mendes, substituindo “criados” por “construídos”. Nessa alteração, construir significa “dar estrutura a, fabricar, edificar”. Portanto, nesse caso, construídos dá ideia de que os homens vão se identificando com o passar do tempo e não são criados já iguais por Deus. Características do autor Murilo Mendes destaca-se pelo senso de modernidade. Seus poemas estão repletos de conteúdos originais e de imagens cotidianas, mescladas de surrealismo, linguagem religiosa e de preocupação com os destinos sociais, políticos e espirituais do homem. Os poemas, anteriores a 1930, carregados de humor, apresentam a análise humorística do Brasil provinciano. Nos posteriores, em tom grave, o poeta revela o homem angustiado diante do Bem e do Mal e ultrapassando, algumas vezes, esse mesmo dilema, transporta-o para o plano metafísico. B14 Modernismo segunda fase - poesia
Sua produção poética permite destacar alguns aspectos- tanto temáticos quanto linguísticos: n
n
n n
650
Humor e ironia como instrumento crítico: esse é o tom dos poemas que herdam algumas características da primeira fase do Modernismo. Predominam em História do Brasil. Surrealismo: é a concepção de mundo que aparecerá em boa parte de sua obra. O Surrealismo, em Murilo Mendes, não é aquele que aproveita as técnicas do estilo, mas a concepção surrealista de mundo: ao mundo verdadeiro, mutilado e injusto. O cristianismo: não um cristianismo comportado, mas arrogante, em que a esperança valia mais que a crença. Barroquismo: mesclado ao surrealismo e à religiosidade, muitas vezes, o misticismo do poeta se expressa num dualismo e em antíteses que mostram uma visão barroca de mundo.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Fonte: Wikimedia Commons
Jorge de Lima Jorge de Lima destacou-se como político, médico, pintor, biógrafo, ensaísta, tradutor, romancista, mas foi principalmente como poeta que ele construiu uma das trajetórias mais vigorosas da literatura brasileira do século XX. A obra de Jorge de Lima passou a ser conhecida pelo público devido ao sucesso dos seus XIV alexandrinos, do qual faz parte o famoso “Acendedor de lampiões”. É nesse período que o autor alagoano pode ser chamado de neoparnasiano. Ele também trilhou caminhos curiosos na literatura brasileira: do Parnasianismo, ele evoluiu para a poesia social e poesia de caráter religioso. Em geral, costuma-se dividir a obra de Jorge de Lima em quatro fases: a parnasiana, a poesia negra, a religiosa e a épica. Sua poesia social apresenta lindas composições de colocação regional, em que ele usa sua memória de menino branco. A infância de Murilo era repleta de imagens de engenhos e de negros trabalhando em regime de escravidão. Olá! Negro Os netos de teus mulatos e de teus cafuzos e a quarta e a quinta gerações de teu sangue sofredor tentarão apagar a tua cor! E as gerações dessas gerações quando apagarem a tua tatuagem execranda, não apagarão de suas almas, a tua alma, negro! Pai-João, Mãe-negra, Fulô, Zumbi, negro-fujão, negro cativo, negro rebelde negro cabinda, negro congo, negro ioruba, negro que foste para o algodão de USA para os canaviais do Brasil, para o tronco, para o colar de ferro, para a canga de todos os senhores do mundo; eu melhor compreenda agora os teus blues nesta hora triste da raça branca, negro! Olá, Negro! Olá. Negro! A raça que te enforca, enforca-se de tédio, negro! LIMA. J. Obras completas: Rio de Janeiro, Aguilar, 1958 (fragmento).
Fonte: Shutterstock.com
B14 Modernismo segunda fase - poesia
As obras Poemas, Novos Poemas, Poemas Escolhidos e o célebre Poemas Negros, de 1947, enveredam pelos regionalismos, pela linguagem coloquial, por imagens do folclore e da cultura negra. O último desses volumes inclui o famoso poema “Essa Negra Fulô”, sua obra mais citada.
651
Português
Essa negra Fulô Ora, se deu que chegou (isso já faz muito tempo) no banguê dum meu avô uma negra bonitinha, chamada negra Fulô. Essa negra Fulô! Essa negra Fulô! Ó Fulô! Ó Fulô! (Era a fala da Sinhá) — Vai forrar a minha cama, pentear os meus cabelos, vem ajudar a tirar a minha roupa, Fulô! [...] Ó Fulô? Ó Fulô? (Era a fala da Sinhá Chamando a negra Fulô.) Cadê meu frasco de cheiro Que teu Sinhô me mandou? — Ah! Foi você que roubou! Ah! Foi você que roubou! O Sinhô foi ver a negra levar couro do feitor.
B14 Modernismo segunda fase - poesia
A negra tirou a roupa. O Sinhô disse: Fulô! (A vista se escureceu que nem a negra Fulô.) Essa negra Fulô! Essa negra Fulô! (Apud Poesia completa.)
Em certos momentos, aborda uma temática mais ampla, denunciando as desigualdades sociais. Veja no poema abaixo. Mulher Proletária Mulher proletária — única fábrica que o operário tem, (fabrica filhos) tu na tua superprodução de máquina humana forneces anjos para o Senhor Jesus, forneces braços para o senhor burguês. Mulher proletária, o operário, teu proprietário há de ver, há de ver: a tua produção, a tua superprodução, ao contrário das máquinas burguesas salvar o teu proprietário. Nesse poema, Jorge de Lima critica o capitalismo desenfreado por oprimir e explorar trabalhadores e transformá-los em máquinas. A “personagem” do poema jorgiano surge como uma peça nas engrenagens da sociedade, ou melhor, é a máquina que fabrica braços para abastecer a superprodução. Nesse contexto, a mulher é a própria sociedade que fabrica filhos em grande número, máquinas humanas que serão transformadas em braços para manter a burguesia. A reprodução em série das indústrias é denunciada pelos operários, que explorados ao máximo, não têm direito a uma vida com dignidade, nem têm seu individualismo respeitado. A partir de Tempo e eternidade, Lima volta-se para a “restauração da poesia de Cristo”, em um trabalho conjunto com Murilo Mendes. Nessa obra, podemos observar a luta entre o material e o espiritual. Convertido ao cristianismo em 1935, como seu amigo Murilo Mendes, seguiu igualmente pelas trilhas do surrealismo. No poema “O sono antecedente” é perceptível a influência do onirismo e da preocupação religiosa em sua poética. O sonho será valorizado de maneira a dar acesso ao inconsciente e aos mistérios do mundo. O sono antecedente Parai tudo que me impede de dormir: esses guindastes dentro da noite, esse vento violento, o último pensamento desses suicidas. Parai tudo que me impede de dormir: esses fantasmas interiores que me abrem as pálpebras, esse bate-bate de meu coração, esse ressonar das coisas desertas e mudas. Parai tudo que me impede de voltar ao sono iluminado que Deus me deu antes de me criar. Jorge de Lima
652
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Exercícios de Fixação 01. (FCM MG) Assinale a alternativa em que os versos de Cecília Meireles, recorrendo à metonímia, referem-se à enfermidade de Aleijadinho. a) “Terra de tantas lagoas! Terra de tantas colinas! No fundo de águas podres, o turvo reino das febres...” b) “Anjos e santos nascendo em mãos de gangrena e lepra. Finas músicas broslando as alfaias das capelas.” c) “Pelos cantos das alcovas, histerias de donzelas.
c) “(E tudo é tão diferente do que em saudade imaginas! Onde estão os teus amigos? Quem te ampara, quem te salva? mesmo em Minas, mesmo em Minas?)” d) “Eles eram muitos cavalos: e alguns foram postos à venda, outros ficaram em seus pastos, e houve uns que, depois da sentença, levaram o Alferes cortado em braços, pernas e cabeça. E partiram com sua carga na mais dolorosa inocência.” 03. (Enem MEC)
bálsamos, pílulas, rezas.” d) “Os rumores familiares que a lenta vida atravessam: elefantíase; partos; sarna; torceduras; quedas; sezões; picadas de cobras; sarampos e erisipelas...” 02. (FCM MG) Em seu depoimento “Como escrevi o Romanceiro da Inconfidência”, Cecília Meireles assim se manifestou em relação a Joaquim José da Silva Xavier: “(...) o Alferes Tiradentes, que calcorreou todas estas serras, estas matas, estes caminhos, a serviço de um partido, à mercê de um sonho, às ordens de seus amigos -, a imperícia ou pusilanimidade desses mesmos amigos, a perfídia dos inimigos, a intriga dos calculistas, dos oportunistas (...)” (MEIRELES, C. Romanceiro da Inconfidência. S.P.: Gaudi, 2014, p.240.)
Assinale a passagem do Romanceiro da Inconfidência em que os versos NÃO fazem referência a esse protagonista. a) “Não há Conde, não há forca, não há coroa real mais seguros que estas casas, que estas pedras do arraial, deste Arraial do Ouro Podre que foi de Mestre Pascoal.” b) “(Nossa Senhora da Ajuda, entre os meninos estão rezando aqui na capela, um vai ser levado à forca, com baraço e com pregão!)”
O exercício da crônica Escrever prosa é uma arte ingrata. Eu digo prosa fiada, como faz um cronista; não a prosa de um ficcionista, na qual este é levado meio a tapas pelas personagens e situações que, azar dele, criou porque quis. Com um prosador do cotidiano, a coisa fia mais fino. Senta-se diante de sua máquina, acende um cigarro, olha através da janela e busca fundo em sua imaginação um fato qualquer, de preferência colhido no noticiário matutino, ou da véspera, em que, com as suas artimanhas peculiares, possa injetar um sangue novo. MORAES, V. Para viver um grande amor: crônicas e poemas. São Paulo: Cia. das Letras, 1991.
Nesse trecho, Vinicius de Moraes exercita a crônica para pensá-la como gênero e prática. Do ponto de vista dele, cabe ao cronista a) criar fatos com a imaginação. b) reproduzir as notícias dos jornais. c) escrever em linguagem coloquial. d) construir personagens verossímeis. e) ressignificar o cotidiano pela escrita. 04. (PUC Campinas SP) Apontam-se no texto duas vertentes da poesia de Cecília Meireles, a) a épica majestosa, predominante, e a poesia intimista, esporádica. b) a lírica pura, predominante, e a expressão da história trágica. c) a dos versos engajados na política e a daqueles voltados para o cotidiano. d) o testemunho cronista da realidade e o caminho da imaginação. e) o interesse pela exploração do fato e a denúncia dos preconceitos sociais.
653
B14 Modernismo segunda fase - poesia
Lamparinas, oratórios,
Português
esso s de com dade as fi-
Exercícios Complementares Texto comum às questões 01 e 02 Soneto de Carnaval
ca-se 01
Distante o meu amor, se me afigura
02 03
O amor como um patético tormento Pensar nele é morrer de desventura
04
Não pensar é matar meu pensamento.
05
Seu mais doce desejo se amargura
06 07
Todo o instante perdido é um sofrimento Cada beijo lembrado uma tortura
08
Um ciúme do próprio ciumento.
09
E vivemos partindo, ela de mim
10 11
E eu dela, enquanto breves vão-se os anos Para a grande partida que há no fim
12 13
De toda a vida e todo o amor humanos: Mas tranquila ela sabe, e eu sei tranquilo
14
Que se um fica o outro parte a redimi-lo.
B14 Modernismo segunda fase - poesia
Vinícius de Moraes
01. (Mackenzie SP) A partir de “Soneto de Carnaval”, é correto afirmar que: a) revela um amor platonizante e transcendente, adotando um tom herdado da poesia palaciana, como em “E vivemos partindo, ela de mim/E eu dela”. (versos 09 e 10) b) conjuga a linguagem coloquial, alegórica e declamatória ao estilo livre e caudaloso da poética de Vinícius de Moraes. c) segue o molde da estética camoniana, valorizando a sonoridade e explorando as rimas em detrimento da temática central, como em “Distante o meu amor, se me afigura” (verso 01) d) apresenta um amor cotidiano, realista, sujeito às mudanças que são impostas pelo tempo. e) canta o amor em seu desespero e paixão, como em “Mas tranquila ela sabe, e eu sei tranquilo/Que se um fica o outro parte a redimi-lo.”(versos 13 e 14) 02. (Mackenzie SP) Assinale a alternativa que NÃO pode ser relacionada a Vinícius de Moraes e sua obra: a) “[...] foi o grande poeta da Ausência, da Distância, do Além. Via com olhos de fantasia, ouvia sons irreais, respirava perfumes de flores inexistentes, cantava figuras que tinham com a realidade concreta o mínimo de contato real.” (Alceu Amoroso Lima)
654
b) “[…] Sua vida foi a ilustração do seu ideal poético. Ele queria um mundo preparado para o amor, livre de limitações, pressões, humilhações, sociais e econômicas.” (Carlos Drummond de Andrade) c) “Aos poucos, o tema puramente católico, no sentido dogmático, é abandonado restando apenas uma atmosfera religiosa que pode ser identificada na maneira como o autor enxerga o mundo.” (Rogério Eduardo Alves) d) “[…] O soneto, por exemplo, que poucos, dentre os nossos poetas realmente vivos não tinham abandonado, ele o retoma como uma necessidade de seu dizer.” (Mário de Andrade) e) “A segunda fase de sua lírica apresenta forte oposição ao transcendentalismo da primeira, nela é possível constatar certo movimento em busca de um mundo mais palpável e material.” (Valéria Rangel) 03. (Enem MEC) Do amor à pátria São doces os caminhos que levam de volta à pátria. Não à pátria amada de verdes mares bravios, a mirar em berço esplêndido o esplendor do Cruzeiro do Sul; mas a uma outra mais íntima, pacífica e habitual – uma cuja terra se comeu em criança, uma onde se foi menino ansioso por crescer, uma onde se cresceu em sofrimentos e esperanças plantando canções, amores e filhos ao sabor das estações. MORAES, V. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1987.
O nacionalismo constitui tema recorrente na literatura romântica e na modernista. No trecho, a representação da pátria ganha contornos peculiares porque a) o amor àquilo que a pátria oferece é grandioso e eloquente. b) os elementos valorizados são intimistas e de dimensão subjetiva. c) o olhar sobre a pátria é ingênuo e comprometido pela inércia. d) o patriotismo literário tradicional é subvertido e motivo de ironia. e) a natureza é determinante na percepção do valor da pátria. 04. (UCS RS) Leia o poema “Soneto de fidelidade”, de Vinícius de Moraes. De tudo, ao meu amor serei atento Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto Que mesmo em face do maior encanto Dele se encante mais meu pensamento.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Hei de vivê-lo em cada vão momento E em seu louvor hei de espalhar meu canto E rir meu riso e derramar meu pranto Ao seu pesar ou seu contentamento.
Com os teus songs, com os teus lundus!” (...) “Não basta iluminares hoje as noites dos brancos com teus jazzes. Olá, Negro! O dia está nascendo! O dia está nascendo ou será a tua gargalhada que vem vindo?”
E assim, quando mais tarde me procure, Quem sabe a morte, angústia de quem vive, Quem sabe a solidão, fim de quem ama
(Jorge de Lima, Poesias completas. v. I, Rio de Janeiro / Brasília: J. Aguilar / INL, 1974, p.180-181.)
Considerando o livro Poemas negros como um todo e a poética de Jorge de Lima, é correto afirmar que o último verso citado a) manifesta o desprezo do negro pela situação decadente da
Eu possa me dizer do amor (que tive): Que não seja imortal, posto que é chama, Mas que seja infinito enquanto dure.
cultura do branco. b) realiza a aproximação entre a alegria do negro e uma ideia
Fonte: MORAES, Vinícius de. Antologia poética. 2. ed., Rio de Janeiro: Editora do Autor, 1960. p. 113.
Embora se distinga da perspectiva romântica, o poema tematiza o arrebatamento amoroso. Sobre os versos, é correto afirmar que eles a) trazem um olhar otimista e alvissareiro sobre o sentimentalismo. b) enfatizam o zelo e o devotamento do sujeito lírico ao seu amor, inclusive na morte. c) descuidam da métrica e do emprego de recursos que dão sonoridade ao texto. d) enfocam a efemeridade do amor, a despeito da sua intensidade, por meio da aproximação entre o sentimento amoroso e a chama. e) ressaltam a imortalidade do amor verdadeiro, ideia reforçada pelo título.
c) remete à vingança do negro contra a violência a que foi submetido pelo branco. d) funciona como um lamento, já que o nascer do dia não traz justiça social. 07. (FPS PE) Retrato Eu não tinha este rosto de hoje Assim calmo, assim triste, assim magro, nem estes olhos tão vazios nem o lábio amargo. Eu não tinha estas mãos sem força, tão paradas e frias e mortas: eu não tinha este coração que nem se mostra.
Noite de São João Jorge de Lima
Vamos ver quem é que sabe soltar fogos de S. João? Foguetes, bombas, chuvinhas, chios, chuveiros, chiando, chiando, chovendo chuvas de fogo! Chá - Bum! LIMA, Jorge de. Obra completa. Rio de Janeiro: José Aguilar,1958. p. 58.
a) Quais são as três figuras de efeito sonoro que predominam nessa estrofe? b) Explique cada uma delas, citando exemplos retirados desses versos de Jorge de Lima. 06. (Unicamp SP) Leia abaixo duas passagens do poema “Olá! Negro”, de Jorge de Lima.
Eu não dei por esta mudança, tão simples, tão certa, tão fácil: - Em que espelho ficou perdida a minha face? (Cecília Meireles. Antologia poética.)
No poema de Cecília Meireles, bem ao gosto da estética modernista, transparece: 1. os efeitos desgastantes da passagem do tempo. 2. um sentimento de perda do qual se lamenta. 3. a certeza de que a mudança independe de cada um. 4. uma visão de fina ironia dos sinais da juventude. 5. o ‘espelho’ a que se refere a pergunta do eu lírico é o tempo da vida. Estão corretas: a) 1, 2, 3, 4 e 5 b) 1, 2, 3 e 4 apenas c) 1, 2, 3 e 5 apenas d) 2, 3, 4 apenas e) 1, 4 e 5 apenas
Questão 05. a) As figuras de efeito sonoro que predominam na estrofe do poema “Noite de São João”, de Jorge de Lima, são aliteração, assonância e onomatopeia. b) A aliteração consiste na repetição do som consonantal. Na estrofe do poema, verifica-se a repetição dos fonemas “v”, “q”, “s”, “f” e “ch” de que são exemplos os vocábulos: “vamos”, “ver”, “quem”, “que”, “sabe”, “soltar”, “S. (João)”, “fogos”, “foguetes”, “fogo”, “chuvinhas”, “chios”, “chuveiros”, “chiando”, “chovendo”, “chuvas” e “chá”. A assonância, por sua vez, consiste na repetição do som vocálico. Na estrofe, verifica-se a repetição dos fonemas “a”, “o” e “i” de que são exemplos os vocábulos: “vamos”, “sabe”, “soltar”, “S. (João)”, “bombas”, “chá”, “fogos”, “foguetes”, “chovendo”, “fogo”, “chios” e “chiando”. Por fim, a onomatopeia consiste na representação gráfica de sons da natureza, de animais, de objetos e de barulhos diversos. Na estrofe, verifica-se a onomatopeia “Chá - Bum!”.
655
B14 Modernismo segunda fase - poesia
05. (UFU MG)
“A raça que te enforca, enforca-se de tédio, negro! E és tu que a alegras ainda com os teus jazzes.
de futuro.
FRENTE
B
PORTUGUÊS
MÓDULO B15
ASSUNTOS ABORDADOS n Modernismo terceira fase - Prosa
- Clarice Lispector
n Características da obra de Clarice Lispector
MODERNISMO TERCEIRA FASE - PROSA CLARICE LISPECTOR Clarice assistiu ao fim da guerra na Itália, em 1945. Nesse ano, no Brasil, os militares destituem Getúlio Vargas do poder. Reúne-se a assembleia constituinte, em 1946, elaborando a mais liberal das constituições que o Brasil já teve. Cria-se, em 1950, a Companhia Cinematográfica Vera Cruz e surge também a televisão. A partir de então, desenvolvem-se os meios de comunicação. Eurico Gaspar Dutra governa o País após a derrubada de Getúlio. Contudo, Dutra não é popular e isso facilita a volta de Vargas, mas sua política desagrada a classe dominante e, sob pressão militar para que se afastasse do governo, ele se suicida em 1954. A sua morte e a instabilidade do poder civil geram uma grave crise política, cujo final feliz foi a eleição de Juscelino Kubitschek para a presidência da República, em 1955. Que mistério tem Clarice? Olhos oblíquos, sugerindo distância. Rosto anguloso, maçãs salientes: um belo rosto eslavo. Lispector é um nome russo. Clarice nasceu na Ucrânia, numa aldeia que não existia no mapa. Em 1926, chegou ao Brasil com sua família, quando era recém-nascida. Viveram algum tempo em Alagoas, depois mudaram-se para Recife, no Pernambuco. Aos 9 anos de idade, a menina Clarice perdeu a mãe. Aos 12 anos, em 1937, Clarice muda-se com a família para o Rio de Janeiro. Encanta-se com a romântica Madame Delly; lê Júlio Dinis, José de Alencar, Eça de Queiros e aventura-se em Dostoiévski, que a emociona. Casada com um diplomata, morou em vários países durante 15 anos, retornando para o Brasil em 1959.
Fonte: Wikimedia commons
Clarice lia muito. Tudo o que podia. As Reinações de Narizinho – o livro mais gostoso de Lobato - foi a obra que a encantou, não só porque era uma leitura prazerosa, mas porque foi muito difícil de consegui-la emprestada de uma livraria. A autora lia uma página por dia, para que não terminasse logo. Mulher simples, sem sofisticação, nunca quis ser particular. Porém poucas pessoas foram tão particulares quanto ela. Clarice era uma mulher de grande liberdade, mas, ao mesmo tempo, uma mulher que viveu uma grande solidão. Solidão era sua maneira de ser livre. Dormia muito cedo e acordava muito cedo. A maior parte do tempo ficava fumando e pensando. Incluída entre os grandes nomes de vanguarda, a autora se sobressaiu pelo modo subjetivo e figurado de colocar as ideias. Além disso, revelava uma tendência à exploração psicológica das personagens, fazendo uma abordagem penetrante dos problemas gerados pela tensão entre os indivíduos e os contextos social e familiar. Essa característica está presente nos romances e contos da autora. Por isso, Clarice pertence à linha chamada intimista. Desde a primeira obra, Perto do Coração Selvagem, publicada quando ela tinha apenas 19 anos, percebeu-se logo seu esforço em querer atingir as camadas mais profundas da consciência humana, em um mergulho psicológico raras vezes experimentado em nossa literatura. Clarice não se preocupa com a construção de um enredo tradicionalmente estruturado, contendo começo, meio e fim. Ela nos surpreende pelo jeito de buscar a compreensão da consciência individual, marcada sempre pela enorme introspecção das personagens, procurando analisar as características que constituem o indivíduo.
656
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Em suas obras, Clarice reunia romances, contos, crônicas e histórias infantis. Algumas delas são: Perto do Coração Selvagem; O lustre; A cidade sitiada; A maçã no escuro; A Paixão Segundo G.H.; Água via; A hora da Estrela; Laços de Família; A legião estrangeira.
Características da obra de Clarice Lispector Clarice Lispector é uma das escritoras mais aclamadas na literatura modernista brasileira. Ela tem um estilo literário inconfundível, presente em toda sua obra. A autora trouxe muitas inovações para a literatura, tanto no que diz respeito à temática, quanto no que se refere à estrutura narrativa. Em suas publicações, aparecem a sondagem psicológica do indivíduo, a análise de suas angústias e de seus dramas existenciais.
n
n
n
n
n
Ruptura com a estrutura linear - interessa-lhe a narrativa embasada na memória, nas emoções, no fluxo de consciência do narrador. Não importa começo, meio e fim. Predomínio do monólogo- os diálogos são reduzidos, dando espaço ao monólogo interior, que é uma técnica, adaptando às análises introspectivas, fazendo uma sondagem dos mecanismos mais profundos da mente humana. Em suas narrativas, as referências de tempo e espaço, o enredo, assim como as personagens, ganham novos significados: o enredo é quase sempre psicológico. O tempo e o espaço têm pouca influência sobre o comportamento das personagens; o tempo é psicológico e espaço é acidental. A obra de Clarice tem um estilo literário inconfundível porque a autora escreve com o corpo. Ela retrata uma linguagem rica e repleta de recursos expressivos. Realiza a fusão de prosa e poesia, com empregos de figuras de linguagem: metáforas, antíteses (eu x não eu, ser x não ser), paradoxos entre outros. A indiscutível originalidade e a perturbadora percepção da validade presentes na obra de Lispector a torna única dentro da literatura brasileira. É impossível ficar indiferente diante do texto, pois a força de sua linguagem é a intensidade das emoções de suas personagens, atingindo o leitor e provocando, no mínimo, incômodo ou estranhamento. Técnica “impressionista” de apreensão da realidade interior – predominância de impressões e sensações.
B15 Modernismo terceira fase - prosa - Clarice Lispector
n
Fonte: Wikimedia commons
Quanto à estrutura da narrativa, sua obra apresenta algumas novidades básicas:
657
Português
Fonte: Wikimedia commons
Alguns críticos afirmam que a leitura de Clarice é difícil e trabalhosa, exigindo do leitor uma atenção concentrada e tensa. O primeiro romance de Clarice, Perto do Coração Selvagem, constrói a travessia de uma heroína rumo à transgressão e à construção de uma identidade pautada nos valores pessoais. O romance compõe-se de duas partes. A primeira é dividida em nove capítulos, com dois planos narrativos que se alternam: o da infância e o da vida adulta de Joana, personagem protagonista do romance. A história de Joana é contada em flashes, que mostram as fantasias de criança ao lado do pai, a visita de um amigo do pai que traz algumas informações sobre a personalidade de sua mãe já falecida, o contato conflituoso com a tia burguesa que a adota após a morte do pai e a puberdade de Joana, em circunstâncias problemáticas. A segunda parte desenvolve-se em torno do triângulo amoroso entre Joana, Otávio e Lídia. Joana, sem filhos, vive em sua casa, envolvida nos horizontes domésticos e já não pode mais contar com a proteção do professor como aconteceu na infância. Ela conhece seu marido, Otávio, que já frustrado com os questionamentos e a busca incessante de Joana por tentar entender o que é felicidade, trai a esposa com Lídia. A narrativa final é fabulosa e se encerra com a personagem feliz com a “partida dos homens” (marido e amante): considera-se liberta e capaz de sentir o mundo em sua plenitude. Na infância, Joana viveu ao lado do pai, a quem confiou suas incertezas. A mãe morreu quando ela ainda era muito pequena; ela a conhecia apenas pelas descrições do pai, que também morreu quando ela ainda era menina. Órfã, a protagonista vai morar com os tios, onde encontra severidade e incompreensão. A inadaptabilidade e o desconhecimento de si mesma faziam parte do processo de descobrir-se, encontrar a razão de ser de sua existência. O estilo introspectivo e intimista de Clarice Lispector revela-nos episódios da infância e da vida adulta de Joana, em que há um questionamento dos valores morais da sociedade brasileira da década de 1940. Diante das indagações sobre o que é bom e mau, por exemplo, a resposta da personagem é singular. Veja a seguir o fragmento de “O banho”, um momento de revelação existencial da protagonista. – Bom é viver..., balbuciou ela. Mau é... – É?... – Mau é não viver... – Morrer? – indagou ele. B15 Modernismo terceira fase - prosa - Clarice Lispector
– Não, não... – gemeu ela. – O quê então? Diga. – Mau é não viver, só isso. Morrer já é outra coisa. Morrer é diferente do bom e do mau. Perto do Coração Selvagem exibe o conflito entre morte e vida, bem e mal, amor e ódio, a crise do indivíduo. A busca por algo aparentemente exterior, mas descobre-se que é a procura do autoconhecimento. Leia o fragmento a seguir. “No momento em que a tia foi pagar a compra, Joana tirou o livro e meteu cuidadosamente entre os outros, embaixo do braço. A tia empalideceu. Na rua a mulher buscou as palavras com cuidado: — Joana... Joana, eu vi... Joana lançou-lhe um olhar rápido. Continuou silenciosa: — Mas você não diz nada? — não se conteve a tia, a voz chorosa.— Meu Deus, mas o que vai ser de você? — Não se assuste, tia. 658
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
— Mas uma menina ainda... Você sabe o que fez? — Sei... — Sabe... sabe a palavra...? — Eu roubei o livro, não é isso? — Mas, Deus me valha! Eu já nem sei o que faço, pois ela ainda confessa! — A senhora me obrigou a confessar. — Você acha que se pode... que se pode roubar? — Bem... talvez não. — Por que então...? — Eu posso. — Você?! — gritou a tia. — Sim, roubei porque quis. Só roubarei quando quiser. Não faz mal nenhum. — Deus me ajude quando faz mal Joana? — Quando a gente rouba e tem medo. Eu não estou contente nem triste. Joana olhou-a com curiosidade: – Mas se eu estou dizendo que posso tudo, que... – Eram inúteis as explicações. – Sim prometo. Em nome de meu pai. [...] – Sim, disse o tio devagar, o regime severo de um internato poderia amansá-la. Padre Felício tem razão. Acho que se meu irmão fosse vivo não hesitaria em matricular Joana num internato, depois de vê-la roubar... Logo esse pecado, um dos que mais ofendem a Deus... No fundo é isso o que me dói um pouco: o pai, negligente como era, não se incomodaria de mandar Joana até mesmo para um reformatório... Tenho pena de Joana, coitada. Você sabe, nós nunca teríamos internado Armanda, mesmo que ela roubasse a livraria inteira ... [...] Desejava achar-se mais. Chamava-se agora fortemente e não lhe bastava respirar. A felicidade apagava-a, apagava-a... Já queria sentir-se de novo, mesmo com dor. [...] Sua vida era formada de pequenas vidas incompletas, de círculos inteiros, fechados, que se isolavam uns dos outros...” Laços de Família
Fonte: Wikimedia commons
B15 Modernismo terceira fase - prosa - Clarice Lispector
Laços de Família é uma coletânea que reúne sete contos inéditos e seis outros, anteriormente publicados. Clarice consegue registrar nesses contos o processo de aprisionamento dos indivíduos por meio dos “laços de família” de sua “prisão” doméstica. Essas formas convencionais são ritualmente repetidas de geração em geração, como um preconceito, sem que se tenha consciência crítica de sua validade. “Feliz aniversário” - considerado o mais irônico e um dos mais perturbadores relatos escritos por Clarice Lispector, está incluído na obra Laços de Família. O tema desse texto é a falsidade que há em muitos relacionamentos familiares. O aniversário da mãe era a única ocasião em que os parentes se encontravam, o que não era motivo de satisfação para ninguém. No conto, a personagem principal D. Anita, a idosa da família, é homenageada pelos filhos com uma festa de aniversário pelos seus oitenta e nove anos de idade. A filha Zilda, com quem mora, prepara uma festa e a família se reúne para parabenizar D. Anita. Entretanto, não há a presença afetiva dos familiares e a aniversariante, sentada sempre no mesmo lugar, observa tudo até um determinado momento em que chega ao seu limite e denuncia, em gestos e palavras, toda a farsa ali embutida. Tal comemoração seria uma forma de esconder o desprezo e abandono dedicados à anciã, que só recebia visita de seus familiares de ano em ano.
659
B15 Modernismo terceira fase - prosa - Clarice Lispector
Português
Apesar da idade avançada, D. Anita não escondia o desgosto para com os filhos e enteados e era, talvez, a única que não estava “representando um papel”, uma farsa. Permanecia mórbida, furiosa e infeliz porque sabia que, na íntegra, todos se aproveitaram do momento do aniversário para disfarçar o descaso, a falta de cuidado e de carinho por ela.
E, para adiantar o expediente, vestira a aniversariante logo depois do almoço. Pusera-lhe desde então a presilha em torno do pescoço e o broche, borrifara-lhe um pouco de água-de-colônia para disfarçar aquele seu cheiro de guardado — sentara-a à mesa. E desde as duas horas a aniversariante estava sentada à cabeceira da longa mesa vazia, tesa na sala silenciosa.
A narrativa é feita do ponto de vista de D. Anita, que observa o comportamento de todos os presentes, confirmando a hipocrisia que existe nos laços de família. Podemos observar também a questão delicada dos parentes idosos das famílias: a obrigação que se sobrepõe ao afeto (sentimento de abandono pela falta de correspondência de carinho e proteção) e de como isso interfere no individualismo de todos.
De vez em quando consciente dos guardanapos coloridos. Olhando curiosa um ou outro balão estremecer aos carros que passavam. E de vez em quando aquela angústia muda: quando acompanhava, fascinada e impotente, o voo da mosca em torno do bolo. [...]
“Pareciam ratos se acotovelando, a sua família. Incoercível, virou a cabeça e com força insuspeita cuspiu no chão”.
Os músculos do rosto da aniversariante não a interpretavam mais, de modo que ninguém podia saber se ela estava alegre. Estava era posta á cabeceira. Tratava-se de uma velha grande, magra, imponente e morena. Parecia oca.
Com esse fragmento, a narradora demonstrou o quanto a situação lhe causava repugnância. A ausência de carinho, de afeto, era nada mais que um cumprimento de uma formalidade. Uma obrigação.
— Oitenta e nove anos, sim senhor! disse José, filho mais velho agora que Jonga tinha morrido. — Oitenta e nove anos, sim senhora! disse esfregando as mãos em admiração pública e como sinal imperceptível para todos.
Nesse tipo de texto, é difícil dizer quem é vítima e quem é réu. É muito complicado avaliar os laços de família. Podemos olhar pela perspectiva dos filhos: talvez tenham sido incoerentes. Ou pode ser que a mãe não tenha semeado o amor, o carinho, a alegria que, no fundo, reivindicava. No texto, a narradora não expõe claramente suas oposições ou apresenta dados para que o leitor possa criar sua imagem. Ela apenas apresenta os fatos. Leia o trecho abaixo.
Todos se interromperam atentos e olharam a aniversariante de um modo mais oficial. Alguns abanaram a cabeça em admiração como a um recorde. Cada ano vencido pela aniversariante era uma vaga etapa da família toda. Sim senhor! disseram alguns sorrindo timidamente.
“A família foi pouco a pouco chegando. Os que vieram de Olaria estavam muito bem vestidos porque a visita significava ao mesmo tempo um passeio a Copacabana. A nora de Olaria apareceu de azul-marinho, com enfeite de paetês e um drapeado disfarçando a barriga sem cinta. O marido não veio por razões óbvias: não queria ver os irmãos. Mas mandara sua mulher para que nem todos os laços fossem cortados — e esta vinha com o seu melhor vestido para mostrar que não precisava de nenhum deles, acompanhada dos três filhos: duas meninas já de peito nascendo, infantilizadas em babados cor-de-rosa e anáguas engomadas, e o menino acovardado pelo terno novo e pela gravata. [...] Depois veio a nora de Ipanema com dois netos e a babá. O marido viria depois. [...] E à cabeceira da mesa grande a aniversariante que fazia hoje oitenta e nove anos. Zilda, a dona da casa, arrumara a mesa cedo, enchera-a de guardanapos de papel colorido e copos de papelão alusivos à data, espalhara balões sungados pelo teto em alguns dos quais estava escrito “Happy Birthday!”, em outros “Feliz Aniversário!” No centro havia disposto o enorme bolo açucarado. Para adiantar o expediente, enfeitara a mesa logo depois do almoço, encostara as cadeiras à parede, mandara os meninos brincar no vizinho para não desarrumar a mesa. 660
— Oitenta e nove anos!, ecoou Manoel que era sócio de José. É um brotinho!, disse espirituoso e nervoso, e todos riram, menos sua esposa. A velha não se manifestava. Alguns não lhe haviam trazido presente nenhum. Outros trouxeram saboneteira, uma combinação de jérsei, um broche de fantasia, um vasinho de cactos — nada, nada que a dona da casa pudesse aproveitar para si mesma ou para seus filhos, nada que a própria aniversariante pudesse realmente aproveitar constituindo assim uma economia: a dona da casa guardava os presentes, amarga, irônica. — Oitenta e nove anos! repetiu Manoel aflito, olhando para a esposa. A velha não se manifestava. Então, como se todos tivessem tido a prova final de que não adiantava se esforçarem, com um levantar de ombros de quem estivesse junto de uma surda, continuaram a fazer a festa sozinhos, comendo os primeiros sanduíches de presunto mais como prova de animação que por apetite, brincando de que todos estavam morrendo de fome. O ponche foi servido, Zilda suava, nenhuma cunhada ajudou propriamente, a gordura quente dos croquetes dava um cheiro de piquenique; e de costas para a aniversariante, que não podia comer frituras, eles riam inquietos. Na cabeceira da mesa já suja, os copos maculados, só o bolo inteiro — ela era a mãe. A aniversariante piscou os olhos.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
E quando a mesa estava imunda, as mães enervadas com o barulho que os filhos faziam, enquanto as avós se recostavam complacentes nas cadeiras, então fecharam a inútil luz do corredor para acender a vela do bolo, uma vela grande com um papelzinho colado onde estava escrito “89″. [...] Na cabeceira da mesa, a toalha manchada de coca-cola, o bolo desabado, ela era a mãe. A aniversariante piscou. Eles se mexiam agitados, rindo, a sua família. E ela era a mãe de todos. E se de repente não se ergueu, como um morto se levanta devagar e obriga mudez e terror aos vivos, a aniversariante ficou mais dura na cadeira, e mais alta. Ela era a mãe de todos. E como a presilha a sufocasse, ela era a mãe de todos e, impotente à cadeira, desprezava-os. E olhava-os piscando. Todos aqueles seus filhos e netos e bisnetos que não passavam de carne de seu joelho, pensou de repente como se cuspisse. Rodrigo, o neto de sete anos, era o único a ser a carne de seu coração, Rodrigo, com aquela carinha dura, viril e despenteada. Cadê Rodrigo? Rodrigo com olhar sonolento e intumescido naquela cabecinha ardente, confusa. Aquele seria um homem. Mas, piscando, ela olhava os outros, a aniversariante. Oh o desprezo pela vida que falhava. Como?! como tendo sido tão forte pudera dar à luz aqueles seres opacos, com braços moles e rostos ansiosos? Ela, a forte, que casara em hora e tempo devidos com um bom homem a quem, obediente e independente, ela respeitara; a quem respeitara e que lhe fizera filhos e lhe pagara os partos e lhe honrara os resguardos. O tronco fora bom. Mas dera aqueles azedos e infelizes frutos, sem capacidade sequer para uma boa alegria. [...] [...] Pareciam ratos se acotovelando, a sua família. Incoercível, virou a cabeça e com força insuspeita cuspiu no chão. Todos se entreolharam polidos, sorrindo cegamente, abstratos como se um cachorro tivesse feito pipi na sala. E por assim dizer, de novo a festa estava terminada. As pessoas ficaram sentadas benevolentes. Algumas com a atenção voltada para dentro de si, à espera de alguma coisa a dizer. Outras vazias e expectantes, com um sorriso amável, o estômago cheio daquelas porcarias que não alimentavam mas tiravam a fome. As crianças, já incontroláveis, gritavam cheias de vigor. Umas já estavam de cara imunda; as outras, menores, já molhadas; a tarde cala rapidamente. [...] Acenderam o resto das luzes para precipitar a tranquilidade da noite, as crianças começavam a brigar. Mas as luzes eram mais pálidas que a tensão pálida da tarde. E o crepúsculo de Copacabana, sem ceder, no entanto, se alargava cada vez mais e penetrava pelas janelas como um peso.”
Fonte: Wikimedia commons
B15 Modernismo terceira fase - prosa - Clarice Lispector
Clarice Lispector, extraído do livro Laços de Família, Editora Rocco – Rio de Janeiro, 1998
O trecho seguinte foi transcrito de A hora da Estrela, obra que apresenta dois eixos: o drama de Macabéa, pobre moça alagoana engolida pela cidade grande, e o drama do narrador, duelando com as palavras e os fatos. A hora da Estrela é a história da vida de uma jovem órfã que vai trabalhar no “inacreditável” Rio de Janeiro. Redigido durante dois anos e meio, o livro trouxe sofrimento à escritora, pois devia extrair de seu passado doloroso o Nordeste de sua infância. A hora da Estrela O que se segue é apenas uma tentativa de reproduzir três páginas que escrevi e que a minha cozinheira, vendo-as soltas, jogou no lixo para o meu desespero- que os mortos me ajudem a suportar o quase insuportável, já que de nada me valem os vivos. Nem de longe consegui “ igualar a tentativa de repetição artificial do que originalmente eu escrevi sobre o encontro com o seu futuro namorado. É com humildade que contarei agora a história da história. Portanto se me perguntarem como foi direi: não sei, perdi o encontro. 661
Português
Maio, mês das borboletas noivas flutuando em brancos véus. Sua exclamação talvez tivesse sido um prenúncio do que ia acontecer no final da tarde desse mesmo dia: no meio da chuva abundante encontrou (explosão) a primeira espécie de namorado de sua vida, o coração batendo como se ela tivesse englutido um passarinho esvoaçante e preso. O rapaz e ela se olharam por entre a chuva e se reconheceram como dois nordestinos, bichos da mesma espécie que se farejam. Ele a olhara enxugando o rosto molhado com as mãos. E a moça, bastou-lhe vê-lo para torná-lo imediatamente sua goiaba com queijo. Ele... Ele se aproximou e com voz cantante de nordestino que a emocionou, perguntou-lhe: — E se me desculpe, senhorinha, posso convidar a passear? — Sim, respondeu atabalhoadamente com pressa antes que ele mudasse de ideia. — E, se me permite, qual é mesmo a sua graça? — Macabéa.— Maca — o quê? — Béa, foi ela obrigada a completar. — Me desculpe, mas até parece doença, doença de pele. — Eu também acho esquisito, mas minha mãe botou ele por promessa a Nossa Senhora da Boa Morte se eu vingasse, até um ano de idade eu não era chamada porque não tinha nome, eu preferia continuar a nunca ser chamada em vez de ter um nome que ninguém tem mas parece que deu certo — parou um instante retomando o fôlego perdido e acrescentou desanimada e com pudor — pois como o senhor vê eu vinguei... pois é...
B15 Modernismo terceira fase - prosa - Clarice Lispector
— Também no sertão da Paraíba promessa é questão de grande dívida de honra. Eles não sabiam como se passeia. Andaram sob a chuva grossa e pararam diante da vitrine de uma loja de ferragem onde estavam expostos atrás do vidro canos, latas, parafusos grandes e pregos. E Macabéa, com medo de que o silêncio já significasse uma ruptura, disse ao recém-namorado: — Eu gosto tanto de parafuso e prego, e o senhor? Da segunda vez em que se encontraram caía uma chuva fininha que ensopava os ossos. Sem nem ao menos se darem as mãos caminhavam na chuva que na cara de Macabéa parecia lágrimas escorrendo. Da terceira vez que se encontraram – pois não é que estava chovendo? – o rapaz, irritado e perdendo o leve verniz de finura que o padrasto a custo lhe ensinara, disse-lhe: – Você também só sabe é mesmo chover! – Desculpe. 662
Mas ela já o amava tanto que não sabia mais como se livrar dele, estava em desespero de amor. Numa das vezes em que se encontraram ela afinal perguntou-lhe o nome. – Olímpico de Jesus Moreira Chaves – mentiu ele porque tinha como sobrenome apenas o de Jesus, sobrenome dos que não têm pai. Fora criado por um padrasto que lhe ensinara o modo fino de tratar pessoas para se aproveitar delas e lhe ensinara como pegar mulher. – Eu não entendo o seu nome – disse ela. – Olímpico? Macabéa fingia enorme curiosidade escondendo dele que ela nunca entendia tudo muito bem e que isso era assim mesmo. Mas ele, galinho de briga que era, arrepiou-se todo com a pergunta tola e que ele não sabia responder. Disse aborrecido: – Eu sei mas não quero dizer! – Não faz mal, não faz mal, não faz mal... a gente não precisa entender o nome. [...] Olímpico de Jesus trabalhava de operário numa metalúrgica e ela nem notou que ele não se chamava “operário” e sim “metalúrgico”. Macabéa ficava contente com a posição social dele porque tinha orgulho de ser datilógrafa, embora ganhasse menos que o salário mínimo. Mas ela e Olímpico eram alguém no mundo. “Metalúrgico e datilógrafa” formavam um casal de classe. [...] (LISPECTOR, Clarice. A hora da Estrela. Rio de Janeiro: José Olympio, 1977.)
O primeiro parágrafo do fragmento é metalinguístico, isto é, a narradora dialoga com o leitor sobre o ato de narrar. Nesse momento, podemos notar que o narrador está irritado e, ao mesmo tempo, desanimado pelo fato de a cozinheira ter jogado fora as páginas em que relatara o primeiro encontro dos personagens. Como ela pensava não conseguir reproduzir fielmente o que havia escrito, disse que narraria a “história da história”. Já no segundo parágrafo, a narradora fala sobre o primeiro encontro de Macabéa e Olímpico, em que aparecem algumas referências aos animais. ... mês das borboletas ... englutido um passarinho ..., bichos da mesma espécie ... Macabéa e Olímpico se identificam como dois animais, “bichos da mesma espécie que se farejam”. A angústia de Macabéa e Olímpico é o fato de estar-no-mundo e o ser-do-mundo porque são personagens migrantes que vivem na cidade grande, tentando sobreviver, organizar suas vidas em um mundo desconhecido e adverso. Para suplantar a angústia de estarem perdidos, tentam juntar-se a uma sociedade, pertencendo a uma “classe” e supervalorizando seus papéis na sociedade (Macabéa e Olímpico eram alguém no mundo metalúrgico e datilógrafa – formavam um casal de classe).
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Fonte: Wikimedia commons
A Paixão Segundo GH A Paixão Segundo G.H, de 1964, é uma obra de difícil classificação: Seria um romance? Um depoimento? Ou um monólogo? Essa não é uma obra comum. Em G.H. – a narradora - faz um difícil e penoso mergulho em si mesma, à procura de uma identidade que justifique as razões de viver, de sentir, de amar. O romance nem começa, nem termina. Ele continua. Clarice inicia e termina o romance com seis travessões, indicando a continuidade de sua narrativa. Veja o início: “____________ estou procurando, estou procurando. Estou tentando entender. Tentando dar a alguém o que vivi e não sei a quem, mas não quero ficar com o que vivi. Não sei o que fazer do que vivi, tenho medo dessa desorganização profunda. Não confio no que me aconteceu. Aconteceu-me alguma coisa que eu, pelo fato de não a saber como viver, vivi uma outra? A isso quereria chamar desorganização, e teria a segurança de me aventurar, porque saberia depois para onde voltar: para a organização anterior. A isso prefiro chamar desorganização pois não quero me confirmar no que vivi - na confirmação de mim eu perderia o mundo como eu o tinha, e sei que não tenho capacidade para outro.” [...] Já que tenho de salvar o dia de amanhã, já que tenho que ter uma forma porque não sinto força de ficar desorganizada, já que fatalmente precisarei enquadrar a monstruosa carne infinita e cortá-la em pedaços assimiláveis pelo tamanho de minha boca e pelo tamanho da visão de meus olhos, já que fatalmente sucumbirei à necessidade de forma que vem de meu pavor de ficar delimitada - então que pelo menos eu tenha a coragem de deixar que essa forma se forme sozinha como uma crosta que por si mesma endurece, a nebulosa de fogo que se esfria em terra. E que eu tenha a grande coragem de resistir à tentação de inventar uma forma.” A experiência vivida pela personagem-narradora deve aparecer, na escrita, em uma nova forma capaz de transmiti-la ao leitor. “Esse esforço que farei agora por deixar subir à tona um sentido, qualquer que seja, esse esforço seria facilitado se eu fingisse escrever para alguém. [...] Desculpa eu te dar isto, eu bem queria ter visto coisa melhor. Toma o que vi, livra-me de minha inútil visão, e de meu pecado inútil.
B15 Modernismo terceira fase - prosa - Clarice Lispector
Estou tão assustada que só poderei aceitar que me perdi se imaginar que alguém me está dando a mão. Dar a mão a alguém sempre foi o que esperei da alegria. Desculpa eu te dar isto, eu bem queria ter visto coisa melhor. Toma o que vi, livra-me de minha inútil visão, e de meu pecado inútil. Estou tão assustada que só poderei aceitar que me perdi se imaginar que alguém me está dando a mão. Dar a mão a alguém sempre foi o que esperei da alegria. Muitas vezes antes de adormecer - nessa pequena luta por não perder a consciência e entrar no mundo maior - muitas vezes, antes de ter a coragem de ir para a grandeza do sono, finjo que alguém está me dando a mão e então vou, vou para a enorme ausência de forma que é o sono. E quando mesmo assim não tenho coragem, então eu sonho. Ir para o sono se parece tanto com o modo como agora tenho de ir para a minha liberdade. Entregar-me ao que não entendo será pôr-me à beira do nada. Será ir apenas indo, e como uma cega perdida num campo. Essa coisa sobre natural que é viver. O viver que eu havia domesticado para torná-lo familiar. Essa coisa corajosa que será entregar-me, e que é como dar a mão a mão mal-assombrada do Deus, e entrar por essa coisa sem forma que é um paraíso. Um paraíso que não quero! 663
Português
Enquanto escrever e falar vou ter que fingir que alguém está segurando a minha mão.” O narrador de A Paixão Segundo G.H. inventou a presença de um interlocutor imaginário, com quem ele pudesse dialogar para explicar os fatos por ele vivenciados. Por outro lado, esse fato pode ser visto como uma forma de afastar sua própria solidão. “Meu primeiro movimento físico de medo, enfim expresso, foi que me revelou com surpresa que eu estava com medo. E precipitou-me então num medo maior- ao tentar a saída, tropecei entre o pé da cama e o guarda-roupa. Uma possível queda naquele quarto de silêncio constrangeu-me o corpo em nojo profundo - tropeçar fizera de minha tentativa de fuga um ato já em si malogrado- seria esse o modo que “eles”, os do sarcófago, tinham de não me deixar mais sair? Eles me impediam de sair e apenas com este modo simples: deixavam-me inteiramente livre, pois sabiam que eu já não poderia mais sair sem tropeçar e cair.” Depois de sentir intenso ódio pela empregada, G.H. agora tem vontade de agredi-la. A barata representa para ela o ápice do horror e parte de uma existência mítica selvagem que coloca obstáculos à sua saída do quarto, forçando-a à identificação com a origem da vida. “Fiquei imóvel, calculando desordenadamente. Estava atenta, eu estava toda atenta. Em mim um sentimento de grande espera havia crescido, e uma resignação surpreendida: é que nesta espera atenta eu reconhecia todas as minhas esperas anteriores, eu reconhecia a atenção de que também antes vivera, a atenção que nunca me abandona e que em última análise talvez seja a coisa mais colada à minha vida- quem sabe aquela atenção era a minha própria vida. Também a barata: qual é o único sentimento de uma barata? a atenção de viver, inextricável de seu corpo. Em mim, tudo o que eu superpusera ao inextricável de mim, provavelmente jamais chegara a abafar a atenção que, mais que atenção à vida, era o próprio processo de vida em mim. Foi então que a barata começou a emergir do fundo. Antes o tremor anunciante das antenas.” G.H. vai em seguida, matar a barata. Na imobilidade do inseto, ela reconhece aspectos de sua própria vida, iniciando-se um processo de desindividualização de grande tensão dramática. G.H., por meio de reflexões, entra e sai do mundo referencial, procurando sentido da existência: nesse itinerário, em que a verdade e a loucura se aproximam, recua para dentro de si mesma à medida que se aproxima da matéria primária milenar que constitui a barata esmagada.
B15 Modernismo terceira fase - prosa - Clarice Lispector
“Enfim, enfim, quebra-se realmente o meu invólucro, e sem limite eu era. Por não ser, eu era. Até o fim daquilo que eu não era, eu era. O que não sou eu, sou eu. Tudo estará em mim, se eu não for; pois “eu” é apenas um dos espasmos instantâneos do mundo. Minha vida não tem sentido apenas humano, é muito maior - é tão maior que, em relação ao humano, não tem sentido. Da organização geral que era maior que eu, eu só havia até então percebido os fragmentos. Mas agora, eu era muito menos que humana - e só realizaria o meu destino especificamente humano se me entregasse, como estava me entregando, ao que já não era eu, ao que já é inumano. E entregando-me com a confiança de pertencer ao desconhecido. Pois só posso rezar ao que não conheço. E só posso amar à evidência desconhecida das coisas, e só posso me agregar ao que desconheço. Só esta é que é uma entrega real.” A desistência da personagem, depois de sua “via-crucis”, é uma maneira de entrega, uma doação de amor. Entrega-se à evidência das coisas, da existência objetiva. Há, porém, uma postura ativa, lógica, nessa entrega: a adesão que persegue só será atingida por uma verdadeira “aventura” do acontecimento, com todos os riscos a ela inerentes. “O mundo independia de mim - esta era a confiança a que eu tinha chegado: o mundo independia de mim, e não estou entendendo o que estou dizendo, nunca! nunca mais compreenderei o que eu disser. Pois como poderia eu dizer sem que a palavra mentisse por mim? como poderei dizer senão timidamente assim: a vida se me é. A vida se me é, e eu não entendo o que digo. E então adoro. ____________” 664
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Exercícios de Fixação 01. (FMABC SP) Considere as seguintes afirmações sobre con-
03. (UFGD MS) Com relação a Laços de Família, de Clarice Lis-
tos do livro Laços de Família, de Clarice Lispector.
pector, é correto afirmar:
I.
I.
Em “Feliz aniversário”, os laços familiares estreitam-se, de modo comovente, por conta do reconheci-
adultos ou adolescentes - debatem-se nas cadeias de
mento amoroso que todos tributam à figura da velha
violência latente que podem emanar do círculo do-
matriarca, homenageada em seu posto de honra, na
méstico. Homens ou mulheres, os laços que os unem
ponta da mesa.
são, em sua maioria, elos familiares ao mesmo tempo
Em “O crime do professor de matemática”, a questão central é a do sentimento de culpa e a da tentativa de
III.
de afeto e de aprisionamento. II.
E, como se pouco a pouco se desnudasse uma estraté-
sua expiação, que se fazem representar no enterro de
gia, o cotidiano dos personagens de Laços de Família,
um cão de rua.
cuja primeira edição data de 1960, vai-se desnudando
Em “Amor” e “A imitação da rosa”, esposas decididas
como um ambiente falsamente estável, em que vidas
tomam a si o desafio de insurgir-se contra a rotina fa-
aparentemente sólidas se desestabilizam de súbito,
miliar que lhes impõe o estatuto patriarcal.
justo quando o dia a dia parecia estar sendo marcado
É inteiramente procedente o que se afirma APENAS em a) I e II.
III.
O texto de Clarice Lispector não costuma apresentar ilusória facilidade. Seu vocabulário não é sim-
b) II e III.
ples, as imagens voltam-se para animais e plantas,
c) I.
quando não para objetos domésticos e situações da
d) II.
vida diária, com frequência numa voltagem de in-
e) III.
tenso lirismo.
02. (Unicamp SP) No conto “Amor”, de Clarice Lispector, após ver um cego mascando chicletes, a personagem passa por uma situação que, segundo o narrador, ela própria chama de “crise”: “O que chamava de crise viera afinal. E sua marca era o prazer intenso com que olhava agora as coisas, sofrendo espantada. O calor se tornara mais abafado, tudo tinha ganho
Assinale a alternativa CORRETA: a) As alternativas I e II estão corretas. b) As alternativas II e III estão corretas. c) Apenas a alternativa I está correta. d) Apenas a alternativa II está correta. e) Apenas a alternativa III está correta 04. (UFU MG) Na obra Felicidade clandestina, de Clarice Lis-
uma força e vozes mais altas.” (Clarice Lispector, Laços de Família. Rio de Janeiro: Rocco, 2009, p.23.)
Essa crise, que transforma a relação da personagem com o mundo e com a família, a) nasce do colapso da vontade de viver da personagem, em razão do doloroso prazer com que passou a ver as coisas. b) revela o conflito vivido pela personagem entre o tipo de vida que havia escolhido e as coisas que passou a desejar. c) constitui, para a personagem, uma alteração no modo de vida que antes a fazia sofrer e do qual agora havia se libertado. d) remete à excitação da personagem por ter conseguido harmonizar sua antiga vida com os novos desejos e sensações.
pela ameaça de nada acontecer.
pector, há contos em que crianças são protagonistas, ora diante de situações densas, ora leves, com suas alegrias e tristezas na relação com o outro. Nessa tessitura, o fio condutor do conto a) Miopia progressiva indica a manipulação das coisas e das pessoas por parte do protagonista para garantir a sua entrada no mundo adulto. b) Restos de Carnaval destaca o desejo da personagem menina de divertir-se como centro das atenções na festa de momo. c) Tentação evidencia a importância do olhar entre os protagonistas para representar a comunicação entre eles. d) Come, meu filho prioriza o discurso autoritário da mãe para contrapor-se ao fluxo de consciência do filho.
665
B15 Modernismo terceira fase - prosa - Clarice Lispector
II.
Nesta coletânea de contos, as personagens - sejam
Português
Exercícios Complementares 01. (Unimontes MG) No conto “Felicidade Clandestina”, de Clarice Lispector, a visão da menina pobre que sonhava ler um livro que não possuía resvala ora entre as percepções de uma criança ora entre as de uma mulher. Assinale a alternativa que NÃO expressa nenhuma dessas características. a) “E você fica com o livro por quanto tempo quiser.” b) “Não saí pulando como sempre”. c) “Eu era uma rainha delicada”. d) “Meu peito estava quente, meu coração pensativo”. 02. (Unimontes MG) Assinale a alternativa CORRETA sobre o conto “Felicidade clandestina”, de Clarice Lispector, e o filme A menina que roubava livros. a) Nas duas histórias, os livros representam matéria de salvação para as protagonistas. b) As personagens vivem clandestinamente a experiência libertadora da leitura. c) Os livros roubados são, para as personagens, signos de enfrentamento à pressão vigente. d) Pode-se dizer que o ambiente de guerra se reflete de forma similar nas duas personagens.
B15 Modernismo terceira fase - prosa - Clarice Lispector
03. (Unimontes MG) As obras “A menina de lá”, “Felicidade Clandestina” e A menina que roubava livros podem ser lidas como expressão da/do a) experiência das meninas com o diferente, o inatingível e o libertador. b) ótica invulgar da criança sobre o ambiente da opressão e guerra. c) sentimento catártico das meninas sobre a literatura e a leitura. d) desejo sobre o proibitivo e inatingível. 04. (ITA SP) O título do livro A hora da Estrela, de Clarice Lispector, diz respeito ao seguinte momento do romance: a) O despertar amoroso de Macabéa no namoro com Olímpico. b) A descoberta de Macabéa de que Olímpico a traía com Glória. c) A obtenção por Macabéa de um bom emprego como datilógrafa. d) A previsão do grande futuro de Macabéa, feita pela cartomante. e) A morte de Macabéa, atropelada por um carro de luxo. 05. (UFRGS) Considere os segmentos abaixo, retirados de Água viva, de Clarice Lispector. Sei que depois de me leres é difícil reproduzir de ouvido a minha música, não é possível cantá-la sem tê-la decorado. E como decorar uma coisa que não tem história?
666
(...) Isto tudo que estou escrevendo é tão quente como um ovo quente que a gente passa depressa de uma mão para a outra e de novo da outra para a primeira a fim de não se queimar – já pintei um ovo. E agora como na pintura só digo: ovo e basta. Leia as seguintes afirmações sobre os segmentos e a autora. I. Clarice Lispector é a grande representante da narrativa intimista brasileira, com sua prosa que explora a subjetividade, a partir do eu que absorve os temas do mundo. II. O enredo, na narrativa, está a serviço das reflexões e dos sentimentos, motivo pelo qual é possível chamá-la de prosa poética. III. A narradora tem consciência da limitação da palavra para representar a complexidade da vida e do mundo, por isso se contenta com a palavra mínima/a palavra básica. Quais estão corretas? a) Apenas I. b) Apenas II. c) Apenas I e II. d) Apenas I e III. e) I, II e III. 06. (PUC RS) Leia o trecho do conto “As águas do mundo”, de Clarice Lispector, e as afirmativas que seguem. Aí está ele, o mar, o mais ininteligível das existências não humanas. E aqui está a mulher, de pé na praia, o mais ininteligível dos seres vivos. Como o ser humano fez um dia uma pergunta sobre si mesmo, tornou-se o mais ininteligível dos seres vivos. Ela e o mar. Só poderia haver um encontro de seus mistérios se um se entregasse ao outro: a entrega de dois mundos incognoscíveis feita com a confiança com que se entregariam duas compreensões. Ela olha o mar, é o que se pode fazer. Ele só lhe é delimitado pela linha do horizonte, isto é, pela sua incapacidade humana de ver a curvatura da terra. São seis horas da manhã. Só um cão livre hesita na praia, um cão negro. Por que é que um cão é tão livre? Porque ele é o mistério vivo que não se indaga. A mulher hesita porque vai entrar. Seu corpo se consola com sua própria exiguidade em relação à vastidão do mar porque é a exiguidade do corpo que o permite manter-se quente e é essa exiguidade que a torna pobre e livre gente, com sua parte de liberdade de cão nas areias. Esse corpo entrará no ilimitado frio que sem raiva ruge no silêncio das seis horas. A mulher não está sabendo: mas está cumprindo uma coragem. Com a praia vazia nessa hora da manhã, ela não tem o exemplo de outros humanos que transformam a entrada no mar em simples jogo leviano de viver. Ela está sozinha. O mar salgado não é sozinho por-
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
07. (Unimontes MG) Leia com atenção o trecho, extraído do conto de Clarice Lispector, “Felicidade Clandestina”. Ela era gorda, baixa, sardenta e de cabelos excessivamente crespos, meio arruivados. Tinha um busto enorme, enquanto nós todas ainda éramos achatadas. Como se não bastasse, enchia os dois bolsos da blusa, por cima do busto, com balas. Mas possuía o que qualquer criança devoradora de histórias gostaria de ter: um pai dono de livraria. Pouco aproveitava. E nós menos ainda: até para aniversário, em vez de pelo menos um livrinho barato, ela nos entregava em mãos um cartão-postal da loja do pai. Ainda por cima era de paisagem do Recife mesmo, onde morávamos, com suas pontes mais do que vistas. Atrás escrevia com letra bordadíssima palavras como “data natalícia” e “saudade”. Mas que talento tinha para a crueldade. (LISPECTOR, 2001, p. 58.)
Assinale a alternativa INCORRETA. a) A narrativa, em primeira pessoa, evoca um passado distante e, por isso, as emoções e percepções da narradora já se encontram esmaecidas pelo tempo. b) As descrições físicas da menina, filha do dono da livraria, demonstram que entre ela e a narradora havia um real antagonismo. c) A “letra bordadíssima” que escrevia “data natalícia” e “saudade”, segundo a voz narrativa, evidencia distanciamento e frieza na relação das meninas. d) A crueldade a que se refere a narradora advém da menina, que tinha tudo o que a outra desejava, mas não sabia partilhar. 08. (UFRR) Leia o fragmento do livro de A hora da Estrela de Clarice Lispector
Escrevo neste instante com algum prévio pudor por vos estar invadindo com tal narrativa tão exterior e explícita. [...] Como é que sei tudo o que vai seguir e que ainda o desconheço, já que nunca o vivi? É que numa rua do Rio de Janeiro peguei no ar de relance o sentimento de perdição no rosto de uma moça nordestina. Sem falar que eu em menino me criei no Nordeste. Também sei das coisas por estar vivendo. Quem vive sabe, mesmo sem saber que sabe. Assim é que os senhores sabem mais do que imaginam e estão fingindo de sonsos. [...] A história – determino com falso livre-arbítrio – vai ter uns sete personagens e eu sou um dos mais importantes deles, é claro. Eu, Rodrigo S. M. Relato antigo, este, pois não quero ser modernoso e inventar modismos à guisa da originalidade. Assim é que experimentarei contra meus hábitos uma história com começo, meio e “gran finale”, seguido de silêncio e chuva caindo.[...] O que escrevo é mais do que invenção, é minha obrigação contar sobre essa moça entre milhares delas. E dever meu, nem que seja de pouca arte, o de revelar-lhe a vida. Porque há o direito ao grito. Grito puro e sem pedir esmola. Sei que há moças que vendem o corpo, única posse real, em troca de um bom jantar em vez de um sanduíche de mortadela. Mas a pessoa de quem falarei mal tem corpo para vender, ninguém a quer, ela é virgem e inócua, não faz falta a ninguém. Aliás – descubro eu agora – também eu não faço a menor falta, e até o que eu escrevo, um outro escreveria. Um outro escritor, sim, mas teria que ser homem porque escritora mulher pode lacrimejar piegas. Sobre o texto é incorreto afirmar que: a) A hora da Estrela é uma narrativa que foge ao estilo intimista da autora, como pode ser comprovado na seguinte passagem: “Assim é que experimentarei contra meus hábitos uma história com começo, meio e “gran finale”, seguido de silêncio e chuva caindo”. b) Rodrigo S.M é o narrador-observador e apresenta-se ao leitor sem definir seu objetivo literário, apenas questiona a própria maneira de narrar os fatos, os motivos que o levam a contar a história de uma jovem que pela condição social e econômica também não consegue estabelecer relações amorosas. c) A autora vestida na pessoa de Rodrigo S.M., um narrador-personagem, não permite qualquer sentimentalismo ou apelos ao sublime. Isso se verifica na passagem: “Aliás – descubro eu agora – também eu não faço a menor falta, e até o que eu escrevo, um outro escreveria. Um outro escritor, sim, mas teria que ser homem porque escritora mulher pode lacrimejar piegas.” d) A personagem – a moça – pertence a uma camada social muito diferente da do narrador; e) A autora denuncia a existência de uma vida anônima e massacrada e, por meio dela, a desigualdade social e as condições sub-humanas de sobrevivência.
667
B15 Modernismo terceira fase - prosa - Clarice Lispector
que é salgado e grande, e isso é uma realização. Nessa hora ela se conhece menos ainda do que conhece o mar. Sua coragem é a de, não se conhecendo, no entanto, prosseguir. É fatal não se conhecer, e não se conhecer exige coragem. I. O trecho apresenta uma abordagem filosófica sobre as existências do homem e do mar, a partir de inferências e questionamentos. II. A passagem, intimista, revela uma das principais características da obra de Clarice Lispector. III. Segundo o trecho, o homem não é um ser livre porque tem a capacidade de autoquestionar-se. IV. O trecho também apresenta uma abordagem existencialista, mostrando que a união da mulher com o oceano a faz conhecer-se melhor e, finalmente, desfrutar o mar como os outros humanos. Estão corretas apenas as afirmativas a) I e II. b) II e IV. c) I, II e III. d) I, III e IV. e) II, III e IV.
FRENTE
B
PORTUGUÊS
MÓDULO B16
ASSUNTOS ABORDADOS n Modernismo terceira fase – Prosa
- Guimarães Rosa n Infância solitária
n Palavras dos grandes críticos n Rosa e a revolução linguística n A musicalidade nos textos
MODERNISMO TERCEIRA FASE – PROSA GUIMARÃES ROSA No final da década de 1920, João Guimaraes Rosa aparece pela primeira vez como escritor vencedor de um concurso com o conto “O Mystério de Highmore Hall”, publicado na revista Cruzeiro. O criador de Grande sertão: veredas participava de diversas competições do gênero e, durante os anos de 1930, outros concursos apontavam o mesmo vencedor. O Brasil ressentia, como o resto do mundo, os efeitos da crise econômica iniciada nos Estados Unidos em 1929. Repercutindo de forma catastrófica no principal produto de exportação da economia brasileira – o café-, a crise de 1929 acelerou a ruína do velho regime sustentado pela oligarquia rural e possibilitou a vitória dos liberais. Entre 1930 e 1945, fase marcada por grandes transformações, a Revolução de 1930 coloca no poder Getúlio Vargas que, sete anos depois, apoiado pelo exército, desfecha o golpe de Estado e instaura a ditadura do Estado Novo, momento em que acontecia a Segunda Guerra Mundial. Entre 1930 e 1945, os escritores participam efetivamente da vida nacional e projetam na ficção as tensões acirradas pelo Estado Novo e pela Segunda Guerra. A ficção regionalista e o romance de sondagem social e psicológica são as tendências dominantes nessa fase. Coube à década de 1940 revelar Clarice Lispector - uma escritora que romperia com o enredo factual e mudaria inteiramente o rumo da prosa introspectiva, como já vimos, e o genial Guimarães Rosa – um criador que destruiria o regionalismo do pitoresco e da mera documentação de valores locais. Nem o momento histórico que abrigou esse grande escritor, nem mesmo os movimentos literários, ajudariam a entender a obra desse criador de linguagens. Como exemplo pode ser citada a obra Grande sertão: veredas que traz grande dificuldade de estabelecer relações claras e imediatas entre textos, época e tendências. Rosa é um escritor dedicado às narrativas que têm por objetivo primeiro o homem; no caso o homem de um sertão que extrapola os limites geográficos brasileiros.
Fonte: Wikimedia commons
Infância solitária Guimarães Rosa nasceu na pequena cidade de Cordisburgo, situada entre Curvelo e Sete Lagoas, em Minas Gerais, zona rural destinada à pecuária, onde ele viveu durante 10 anos. O romancista gostava de estudar sozinho e de brincar de geografia, deitar no chão, imaginar histórias, poemas, romances, colocando as pessoas que conhecia como personagens, misturando as melhores coisas que via e ouvia. Figura 01 - Escritor mitológico, realista mágico dos sertões metafísicos, Rosa pretendeu vencer dentro de si o medo miúdo da morte.
668
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Foi médico, soldado e rebelde. Em 1952, fez uma viagem que durou dez dias, pelo sertão de Minas Gerais, com um grupo de vaqueiros. Participou dessa viagem Manuel Narde, vulgo Manuelzão, protagonista de “Uma história de amor” incluída no volume Manuelzão e Miguilin, espécie de reportagem poética a respeito da vida dos vaqueiros no oeste do Brasil. Em 1956, publica Corpo de Baile e Grande sertão: veredas, consagrando definitivamente seu estilo. Em 1963, candidata-se à Academia Brasileira de Letras, na vaga de João Naves Fontoura, e é eleito por unanimidade.
unido à sua erudição, permitiu a criação de inúmeros vocábulos a partir de arcaísmos e palavras populares, invenções e intervenções semânticas e sintáticas, já que ele se destacava como um incansável pesquisador da língua nacional. Ele não só criava neologismos, mas também utilizava regionalismos e arcaísmos (palavras já ultrapassadas) em suas obras. Entre os exemplos mais célebres de sua carreira como criador de palavras, está o termo “nonada” que significa “coisa sem importância”, fusão de “non” (do português arcaico) com “nada” que serviu de abertura do romance Grande sertão: veredas. Confira algumas das palavras inventadas pelo genial autor:
A leitura de qualquer página de Guimaraes Rosa é um conjuro. Paulo Rónai - ensaísta, revisor, crítico, tradutor, linguista, professor húngaro naturalizado brasileiro.
Guimarães Rosa não facilitava a vida de ninguém. Ele queria que o leitor se dedicasse a entendê-lo. Ele exigia esse esforço...A exuberância de linguagem, o regionalismo, o pitoresco, ele parte de tudo isso e consegue fazer uma coisa inteiramente nova. Antonio Callado - jornalista, romancista, biógrafo, teatrólogo e dramaturgo brasileiro.
Uma das invenções mais surpreendentes de Rosa foi aquilo de falar “nesta outra vida de aquém-túmulo”. O que eu não daria para ter fabricado isso! Manuel Bandeira
Rosa e a revolução linguística Prosa e poesia confundem-se na obra de Guimarães Rosa. Utilizando o linguajar sertanejo, o autor recria, inventa palavras, mescla arcaísmos com vocábulos eruditos, populares e modernos, ao mesmo tempo em que contesta a sociedade que “prostitui” o indivíduo pela corrupção, o que dá à sua obra literária um caráter universal, cujas questões morais e metafísicas são abordadas. O autor é enquadrado na terceira fase do modernismo. Embora de caráter regionalista, seus textos superam o regionalismo tradicional, com o realismo documental ou com a transcrição da linguagem popular e coloquial. Trazendo uma linguagem nova, sua temática abordada é existencialista, com as indagações universais do ser humano: o sentido da vida e da morte, a existência ou não de Deus e o diabo, o significado do amor, da ambição, do ódio. Por ter um estilo regionalista, Rosa retrata a linguagem do povo. A experimentação marcou sua escrita e seu texto é muito influenciado pela linguagem popular, chegando a inventar palavras, recriar a linguagem, colocar o falar popular e a vida do sertão em seus escritos. O cenário dos contos e romances escritos por João Guimarães Rosa são quase todos no chamado sertão brasileiro. Daí vem a influência de falas populares e regionais. Tudo isso,
Enxadachim – designa um trabalhador do campo, que luta pela sobrevivência. A palavra reúne “enxada” e “espadachim”. Taurophtongo – significa mugido, voz de touro - uma junção de dois termos gregos, relativos a touro (táuros) e ao som da fala (phtoggos). Embriagatinhar – neologismo de conotação humorística. É a mistura de “embriagado” e “(en) gatinhar”. Serve para designar uma pessoa que, de tão bêbada, chega a engatinhar. Circuntristeza – como a própria palavra sugere, refere-se à “tristeza circundante. Arreleque – asas abertas em forma de leque. Mimbauamanhanaçara – esse é dos mais complexos. Quer dizer vaqueiro ou “o que vigia o gado”. Para criar a palavra, o autor fundiu os termos tupi “mimbaua” (criação, animal doméstico) e “manhana” (vigia) e adicionou o sufixo “çara” (que faz). Imitaricar – significa arremedar, fazer trejeitos imitativos. Provém da junção do verbo imitar com o sufixo diminutivo “-icar”, que indica a repetição de pequenos atos. Ensimesmudo – trata-se de um amálgama entre as palavras ensimesmado e mudo. Guimarães Rosa utilizou-o para designar um sujeito fechado e taciturno. Fluifim – significa pequenino, gracioso e se compõe da junção de fluir e fino. O termo é exemplo da preocupação do escritor em fazer a sonoridade acompanhar o significado da palavra. Velvo – uma das várias palavras que Rosa criou com base em outros idiomas. É uma adaptação do inglês velvet, que significa “veludo”. Na linguagem do poeta, é o nome dado para uma “planta de folhas aveludadas”. Suspirância – suspiros repetidos. Coraçãomente – cordialmente. Na obra de Guimarães Rosa, as dualidades e antíteses são frequentes para que o conflito do sentimento seja enfatizado. Assim, homem e mundo, realidade e devaneio, mundano e divino surgem sempre em contraste e colocam-nos diante de muita angústia, aridez e ceticismo. 669
B16 Modernismo terceira fase - prosa - Guimarães Rosa
Palavras dos grandes críticos
Português
A musicalidade nos textos A maior inovação nos livros de Guimarães Rosa é a linguagem criativa, que explora a sonoridade das palavras, incorpora a fala regional e cria termos, adaptando expressões de outras línguas. O escritor afirmava que o som e o sentido de uma palavra pertencem um ao outro e caminham juntos. “A música da língua deve expressar o que a lógica da língua obriga a crer”, afirmou certa vez, dialogando com o crítico alemão Günter Lorenz. A prosa do Corpo de Baile, ao encontrar-se tão próxima da poesia em sua essência e origem, contém uma disposição musical que transparece e faz soar sentidos inauditos. Em toda a narrativa do livro, vê-se o entrelaçamento rítmico de sons, sejam musicais ou ruidosos. A morte do riachinho, trecho de Uma estória de amor, é um momento de pura poesia. Vamos à leitura! “Porque, dantes, se solambendo por uma grota, um riachinho descia a encosta, um fluviol, cocegueando de pressas, para ir cair, bem em baixo, no Córrego das Pedras, que acabava no rio de-Janeiro, que mais adiante fazia barra no São Francisco. Dava alegria a gente ver o regato botar espuma e oferecer suas claras friagens, e a gente pensar no que era o valor daquilo. Um riachinho xexe, puro, ensombrado, determinado no fino, com rogojeio e suazinha algazarra – ah, esse não se economizava: de primeira, a água pra se beber. Então, deduziram de fazer a Casa ali, traçando de se ajustar com a beira dele, num encosto fácil, com piso de lajes, a porta-da-cozinha, a bom de tudo que se carecia. Porém, estrito no cabo de um ano de lá se estar, e quando menos esperassem, o riachinho cessou. Foi no meio duma noite, indo para a madrugada, todos estavam dormindo. Mas cada um sentiu, de repente, no coração, o estalo do silenciozinho que ele fez, a pontuda falta da toada, do barulhinho. Acordaram, se falaram. Até as crianças. Até os cachorros latiram. Aí, todos se levantaram, caçaram o quintal, saíram com luz, para espiar o que não havia. Foram pela porta-da-cozinha. Manuelzão adiante, os cachorros sempre latindo.
B16 Modernismo terceira fase - prosa - Guimarães Rosa
Fonte: Wikimedia commons
– “Ele perdeu o chio…” Triste duma certeza: cada vez mais fundo, mais longe nos silêncios, ele tinha ido s’embora, o riachinho de todos. Chegado na beirada, Manuelzão entrou, ainda molhou os pés no fresco lameal. Manuelzão, segurando a tocha de cera de carnaúba, o peito batendo com um estranhado diferente, ele se debruçou e esclareceu. Ainda viu o derradeiro fiapo d’água escorrer, estilar, cair degrau de altura de palmo a derradeira gota, o bilbo. E o que a tocha na mão de Manuelzão mais alumiou: que todos tremiam mágoa nos olhos. Ainda esperaram ali, sem sensatez; por fim se avistou no céu a estrela-d’alva. O riacho soluço se estancara, sem resto, e talvez para sempre. Secara-se a lagrimal, sua boquinha serrana. Era como se um menino sozinho tivesse morrido.” João Guimarães Rosa – “Uma estória de amor (Festa de Manuelzão)”
Do ponto de vista linguístico, Guimarães Rosa implantou grandes transformações na sintaxe, na morfologia, nos usos literários. Além disso, o poeta utilizou a fragmentação da linearidade das frases para sugerir a descontinuidade do tempo ou da linguagem oral, como também criou neologismos ou recuperou arcaísmos já esquecidos da língua portuguesa.
Figura 02 - Grande sertão: veredas, Guimarães Rosa.
670
Em Grande sertão: veredas, a narrativa revolucionária e inovadora se organiza como um grande diálogo resultante da entrevista concedida pelo ex-jagunço Riobaldo a um homem culto que vem de fora para saber notícias do sertão, no tempo da jagunçagem, e das guerras provocadas pelas violentas disputas de poder e terras. Trata-se de diálogo, ou monodiálogo, em que se escuta apenas a voz do entrevistado, como se essa fosse a hora e a vez de um indivíduo subalterno pronunciar sua versão da história.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Portanto, podemos notar a fala infinda e infinita. O travessão na abertura do livro indica um diálogo que acontece com um interlocutor invisível, supostamente, alguém letrado, que sabe as respostas às perguntas de Riobaldo, já que estudou. Ser letrado, diante dessa narrativa, é um não saber mais gabaritado. E diante de questões como quem é Deus e quem é o Diabo, nem a fé nem a descrença podem auxiliar muito. O sinal do infinito e a palavra “travessia”, que fecham a narrativa, “transtrazem” a esperança de sempre poder recomeçar a leitura e de ler o livro como se fosse a primeira vez. Confira um fragmento da obra. […] Querer mil gritar, e não pude, desmim de mim mesmo, me tonteava, numas ânsias. E tinha o inferno daquela rua, para encurralar comprido… Tiraram minha voz. [...] O fuzil caiu de minhas mãos, que nem pude segurar com o queixo e com os peitos. Eu vi minhas agarras não valerem! Até que trespassei de horror, precipício branco. Diadorim a vir ― do topo da rua, punhal em mão, avançar ― correndo amouco... Ai, eles se vinham, cometer. Os trezentos passos. Como eu estava depravado a vivo, quedando. Eles todos, na fúria, tão animosamente. Menos eu! Arrepele que não prestava para tramandar uma ordem, gritar um conselho. Nem cochichar comigo pude. Boca se encheu de cuspes. Babei... Mas eles vinham, se avinham, num pé-de-vento, no desadoro, bramavam, se investiram... Ao que ― fechou o fim e se fizeram. E eu arrevessei, na ânsia por um livramento... Quando quis rezar ― e só um pensamento, como raio e raio, que em mim. Que o senhor sabe? Qual: ...o Diabo na rua, no meio do redemunho... O senhor soubesse... Diadorim ― eu queria ver ― segurar com os olhos... Escutei o medo claro nos meus dentes... O Hermógenes: desumano, dronho ― nos cabelões da barba... Diadorim foi nele... Negaceou, com uma quebra de corpo, gambetou... E eles sanharam e baralharam, terçaram. De supetão... e só... [...]
Eu estava vendo! [...] Assim, ah ― mirei e vi ― o claro claramente! aí Diadorim cravar e sangrar o Hermógenes... Ah, cravou ― no vão ― e ressurtiu o alto esguicho de sangue! porfiou para bem matar! Soluço que não pude, mar que eu queria um socôrro de rezar uma palavra que fosse, bradada ou em muda; e secou! e só orvalhou em mim, por prestígios do arrebatado no momento, foi poder imaginar a minha Nossa-Senhora assentada no meio da igreja... Gole de consolo... Como lá em baixo era fel de morte, sem perdão nenhum. Que enguli vivo. Gemidos de todo ódio. Os urros... Como, de repente, não vi mais Diadorim! No céu, um pano de nuvens... Diadorim! Naquilo, eu então pude, no corte da dor! me mexi, mordi minha mão, de redoer, com ira de tudo... Subi os abismos... De mais longe, agora davam uns tiros, esses tiros vinhas de profundas profundezas. Trespassei. Conforme conto. Como contornei, tarde depois, mal sabendo de mim, e querendo emendar nó no tempo, tateando com meus olhos, que ainda restavam fechados. [...] Eu despertei de todo – como no instante em que o trovão não acabou de rolar até o fundo, e se sabe que caiu o raio... Diadorim tinha morrido – mil-vezes-mente – para sempre de mim; e eu sabia, e queria saber, meus olhos marejaram. [...] Rosa. João Guimaraes. Grande sertão: veredas. 19.ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. 2001.
Uma das questões abordadas no livro é a luta entre o “bem “ e o “mal”. Na história, Hermógenes representa o mal. Isso está evidenciado pelo fato de ele ser caracterizado como “desumano”. Diadorim é filha de um jagunço que foi assassinado por Hermógenes à traição. A vitória sobre o algoz de seu pai representa a vitória do bem, mesmo que isso tenha custado a sua vida. Diadorim, nessa luta simbólica entre o bem e o mal, realiza a vingança de forma honrada, em uma batalha em condições de igualdade. Podemos perceber pela leitura o conflito de sentimentos que Riobaldo nutre pelo amigo diante do amor proibido que sente por Diadorim, já que não sabe que o amigo é uma mulher. No trecho que você acabou de ler, é possível perceber esse sentimento diante do desespero e do medo de Riobaldo ao assistir ao combate entre Diadorim e Hermógenes. Além disso, durante toda a história, percebemos a atenção que ele concentra em Diadorim (“queria ver – segurar com os olhos”). Outro ponto importante da narrativa é o seu desmaio, quando percebe que Diadorim havia morrido. A certeza da morte do companheiro, como também o sofrimento causado por essa constatação, confirma que seus sentimentos eram maiores que uma forte amizade. 671
B16 Modernismo terceira fase - prosa - Guimarães Rosa
Esse livro é considerado a obra-prima do autor e um dos mais importantes textos da literatura brasileira. Publicado em 1956, Grande sertão: veredas já foi traduzido para vários idiomas e, por ser uma narrativa em que a experiência de vida e de texto se fundem numa composição fascinante, sua interpretação continua em aberto, constituindo um desafio permanente para o leitor. A obra começa com um travessão e termina com o sinal do infinito; ou melhor, nunca termina.
Português
Fonte: Wikimedia commons
Campo Geral da Obra Manuelzão e Miguilim O fragmento a seguir pertence a “Campo Geral”, novela que faz parte da obra Manuelzão e Miguilim. Mais conhecida como “Miguilim”, Campo Geral é uma narrativa profundamente lírica, que traduz a habilidade de Guimarães Rosa para recriar o mundo captado pela perspectiva de uma criança. A infância aparece com frequência nos textos rosianos e está sempre ligada à magia de um mundo em que a sensibilidade, a emoção e o poder das palavras compõem um universo próximo ao dos poetas e dos loucos. É em Miguilim que essa temática encontra um de seus momentos mais brilhantes e comoventes. É uma espécie de biografia de infância que alguns críticos afirmam ter muito de autobiográfico, centrada em Miguilim - um menino de oito anos, que vivia com a família no Mutum, um remoto lugarejo no sertão, no meio dos Campos Gerais. Com a família, viviam o irmão do pai (tio Terêz), a tia-avó materna (vovó Izidra) e alguns agregados: Rosa, a cozinheira; Maria Pretinha, empregada; e Mãitina, negra velhíssima e beberrona, acusada de ser feiticeira. Dois vaqueiros também compõem o núcleo de personagens da história: Jé e Saluz. Figura 03 - Manuelzão e Miguilim de Guimarães Rosa é um livro dividido em duas narrativas distintas: A narrativa de Campo Geral e Uma Estória de Amor.
Leia o fragmento a seguir, que mostra o momento em que a visita de um médico muda a vida do menino Miguilim. “Estava Mãe, estava Tio Terêz, estavam todos. O senhor alto e claro se apeou. (...) O senhor perguntava à Mãe muitas coisas do Miguilim. Depois perguntava a ele mesmo: – Miguilim, espia daí: quantos dedos da minha mão você está enxergando? E agora?” (...) E o senhor tirava os óculos e punha-os em Miguilim, com todo o jeito. – Olha, agora! Miguilim olhou. Nem não podia acreditar! Tudo era uma claridade, tudo novo e lindo e diferente, as coisas, as árvores, as caras das pessoas. Via os grãozinhos de areia, a pele da terra, as pedrinhas menores, as formiguinhas passeando no chão de uma distância. E tonteava. Aqui, ali, meu Deus, tanta coisa, tudo... O senhor tinha retirado dele os óculos, e Miguilim ainda apontava, falava, contava como era, como tinha visto. Mãe esteve assim assustada; mas o senhor dizia que aquilo era modo mesmo, só que Miguilim carecia de usar óculos, dali por diante. O senhor bebia café com eles. Era o doutor José Lourenço, do Curvelo. Tudo podia. Coração de Miguilim batia descompasso, ele careceu de ir lá dentro, contar à Rosa, à Maria Pretinha, à Mãitina. A Chica veio correndo atrás, mexeu: - “Miguilim, você é piticego...” Ele respondeu: - “Donazinha...” Quando voltou, o doutô José Lourenço já tinha ido embora. - Você está triste, Miguilim? – Mãe perguntou.
B16 Modernismo terceira fase - prosa - Guimarães Rosa
Miguilim não sabia. Todos eram maiores do que ele, as coisas reviraram sempre dum modo tão diferente, eram grandes demais. - Pra onde ele foi? - A foi pra Vereda do Tipã, onde os caçadores estão. Mas amanhã ele volta, de manhã, antes de ir s’imbora para a cidade. Disse que, você querendo, Miguilim, ele junto te leva... – O doutor era homem muito bom, levava o Miguilim, lá ele comprava uns óculos pequenos, entrava para a escola. Depois aprendia ofício. – “Você mesmo quer ir?” Miguilim não sabia. Fazia peso para não soluçar. Sua alma, até no fundo, se esfriava. Mas Mãe disse: - Vai, meu filho. É a luz dos teus olhos, que só Deus teve poder para te dar. Fim do ano, a gente puder, faz a viagem também. Um dia todos se encontram... [...] O doutor chegou. – “Miguilim, você está aprontado? Está animoso?” Miguilim abraçava todos, um por um, dizia adeus até aos cachorros, ao Papaco-o-Paco, ao gato Sossõe que lambia as mãozinhas se asseando. (...) Estava abraçado com Mãe. Podiam sair. 672
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Mas, então, de repente, Miguilim parou em frente do doutor. Todo tremia, quase sem coragem de dizer o que tinha vontade. Por fim, disse. Pediu. O doutor entendeu e achou graça. Tirou os óculos, pôs na cara de Miguilim. E Miguilim olhou para todos, com tanta força. Saiu lá fora. (...) O Mutum era bonito! Agora ele sabia. (...) Olhava mais era para Mãe. (...) Todos choravam. O doutor limpou a goela, disse: – “Não sei, quando eu tiro esses óculos, tão fortes, até meus olhos se enchem d’água...” Miguilim entregou a ele os óculos outra vez. Um soluçozinho veio. (...) Nem sabia o que era alegria e tristeza. Mãe o beijava. A Rosa punha-lhe doces-de-leite nas algibeiras, para a viagem. Papaco-o-Paco falava, alto, falava.” GUIMARÃES ROSA, João. Campo geral. Em: Manuelzão e Miguilim. 9. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984. p. 139-142.
#DicaCine Ptugê
Elenco: Tony Ramos; Bruna Lombardi; Tarcísio Meira; Mário Lago; Taumaturgo Ferreira Criador: Walter George Durst Baseado em: Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa Diretor: Walter Avancini
Fonte: Wikimedia commons
Grande sertão: veredas é uma minissérie brasileira produzida pela Rede Globo e exibida entre 18 de novembro a 20 de dezembro de 1985, integrando as comemorações do aniversário de vinte anos da emissora.
Riobaldo e Diadorim – Tony Ramos e Bruna Lombardi
Sagarana
Fonte: Wikimedia commons
Sagarana é uma coletânea de contos escrita por João Guimarães Rosa, publicada em 1946. A obra faz parte da terceira fase do Modernismo no Brasil, período no qual a literatura foi marcada pela abordagem de temas metafísicos, introspectivos. Rosa traz para a literatura uma linguagem extremamente representativa com elementos típicos da fala do sertanejo mineiro, tornando as narrativas profundamente alegóricas. A ideia de uma literatura essencialmente brasileira – um dos pressupostos do Modernismo – é colocada em prática por esse genial escritor. Os nove contos da coletânea são ambientados no espaço ao qual o romancista dedicou sua escrita: o sertão de Minas Gerais. O nome da obra tem caráter híbrido. É formado pelos radicais “saga”, de origem germânica (significa “canto heroico”) e “rana”, de origem tupi (significa “espécie de”). A obra é marcada pela manutenção da tradição da contação de “causos”. Vaqueiros, jagunços e até mesmo os animais transmitem uns aos outros as histórias que circulam pelo sertão mineiro. Sagarana aborda temas simultaneamente específicos e amplos, comprovando a grandeza de Guimarães Rosa em sua abordagem das questões humanas.
Figura 04 - Sagarana, de Guimarães Rosa.
673
B16 Modernismo terceira fase - prosa - Guimarães Rosa
Nas fases anteriores ao modernismo, as ações dos personagens eram o foco dos acontecimentos. Agora, os pensamentos, sentimentos, expectativas, angústias e conflitos tomam conta das narrativas.
Os seguintes contos integram a obra: O burrinho pedrês; A volta do marido pródigo; Sarapalha; Duelo; Minha gente; São Marcos; Corpo fechado; Conversa de bois; A hora e a vez de Augusto Matraga. O burrinho pedrês − a velhice, apresentada de forma nada romântica, é o foco das discussões desse conto. O conto que abre o livro relata a história da viagem de uma boiada pelo sertão após um grande período de chuvas. Na travessia do Córrego da Fome, todos os cavalos e vaqueiros morrem, exceto dois: Francolim e Badu. A volta do marido pródigo − numa espécie de ode à malandragem, esse conto surge como uma releitura da passagem bíblica que retrata as desventuras do filho pródigo. Sarapalha − esse é um dos contos mais curtos do Sagarana e conta a história de dois primos que moram em um lugar desolado pela malária. Doentes, os primos passam os dias sentados na varanda e, entre uma crise e outra, conversam um pouco. Conto marcado pela presença da doença e da ausência de perdão. Duelo − esse conto é uma espécie de labirinto de paisagens e de perseguições pelo sertão. Ações intempestivas e desejo de vingança marcam a narrativa. A perseguição segue por muito tempo, com momentos mais ou menos tensos. Minha gente − é o primeiro conto em primeira pessoa e o narrador não é identificado pelo seu nome, apenas é chamado de Doutor, no começo da narrativa. É possível estabelecer uma analogia entre esse conto e o poema
Quadrilha, de Carlos Drummond de Andrade, visto que ambos os textos são marcados por uma série de encontros e desencontros amorosos. São Marcos − também é narrado em primeira pessoa. O enredo coloca em xeque a descrença diante da cultura popular do sertão mineiro. O narrador, José, é um homem culto que não acredita em feitiçaria, apesar de conhecer mais de sessenta procedimentos e algumas rezas bravas para evitar o azar. Seu desprezo pela feitiçaria se estende também pelos feiticeiros. Tanto que sempre, ao passar pela casa do feiticeiro do arraial, ele vociferava ofensas contra o preto. Corpo fechado − esse é um dos contos mais marcantes de Sagarana. A narrativa fantástica com marcas do regionalismo vai ser tornar uma das principais características na obra de João Guimarães Rosa. Mais uma vez, a crença popular é apresentada como elemento central. Conversa de bois − nesse conto, como em tantos de Guimarães Rosa, diversas histórias se misturam na narrativa. Enquanto um carro de bois faz seu trajeto, levando rapadura e um defunto, os bois conversam sobre os homens e sobre um boi que pensava como um homem. Tradição e senso de justiça são as marcas deste conto. A hora e a vez de Augusto Matraga − redenção por meio da religião é o ponto central desse conto. Conta a história de Nhô Augusto, filho de fazendeiro, com muitas posses e grande propensão para brigas, mulheres e bebidas. O fazendeiro Augusto Esteves é Matraga, poderoso dono de terras que gasta seu dinheiro com jogo e prostitutas.
Exercícios de Fixação 01. (Unicamp SP) “Sapo não pula por boniteza, mas porém por precisão.” (“Provérbio capiau” citado em epígrafe no conto “A hora e a vez de Augusto Matraga”, em João Guimarães Rosa, Sagarana. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2015, p.287.)
B16 Modernismo terceira fase - prosa - Guimarães Rosa
pelos r disei do udo. mem do o cia. E rição ado. uém
Português
Elementos textuais que antecedem a narrativa como, por exemplo, o provérbio citado, funcionam, em alguns autores, como pista para se entender o sentido das ações ficcionais. No excerto acima, as ideias de beleza e necessidade são contrapostas com vistas à produção de um sentido de ordem moral. Considerando-se a jornada heroica de Augusto Matraga, é correto afirmar que a narrativa a) contradiz o sentido moral do provérbio, uma vez que o protagonista não é fiel ao seu propósito de mudar os hábitos antigos. b) confirma o sentido moral do provérbio, uma vez que o protagonista realiza uma série de ações para corrigir seu caráter e reordenar eticamente sua vida.
674
c) ratifica o sentido moral do provérbio, uma vez que o protagonista é seduzido pelos encantos da natureza e pelos prazeres da bebida e do fumo. d) refuta o sentido moral do provérbio, uma vez que o protagonista não consegue agir sem as motivações da beleza física e do afeto femininos. 02. (Fuvest SP) Sarapalha 1
– Ô calorão, Primo!... E que dor de cabeça excomungada!
2
– É um instantinho e passa... É só ter paciência....
3
– É... passa... passa... passa... Passam umas mulheres 4 ves-
tidas de cor de água, sem olhos na cara, para não terem de 5 olhar a gente... Só ela é que não passa, Primo Argemiro!... E eu 6 já estou cansado de procurar, no meio das outras... Não vem!... 7 Foi, rio abaixo, com o outro... Foram p’r’os infernos!...
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Guimarães Rosa, Sagarana.
A novela Sarapalha apresenta uma estória dentro de outra, por meio da qual a personagem masculina da narrativa principal (Primo Argemiro) alude a uma mulher da narrativa secundária (a moça levada pelo capeta). O mesmo procedimento ocorre em a) Duelo, com Cassiano e Silivana. b) Minha gente, com Ramiro e a filha de Emílio. c) A volta do marido pródigo, com Lalino e Maria Rita. d) O burrinho pedrês, com Raymundão e a namorada de Silvino. e) A hora e vez de Augusto Matraga, com Ovídio e Dionóra. 03. (Uerj RJ) Considere o conto “A terceira margem do rio”, do livro Primeiras estórias, de João Guimarães Rosa. Considere a hipótese de que o título “A terceira margem do rio” se refere também à própria ficção, que se desenvolve entre duas margens: a da realidade e a da imaginação. O trecho do conto que melhor comprova essa hipótese de leitura é: a) o que não era o certo, exato; mas, que era mentira por verdade. b) Os tempos mudavam, no devagar depressa dos tempos. c) e, eu, rio abaixo, rio a fora, rio a dentro – o rio. d) Ninguém é doido. Ou, então, todos.
04. (FMABC SP) A palavra epifania designa a revelação súbita do sentido profundo de alguma coisa, a aparição de uma imagem carregada de expressão. Em sua ficção, Guimarães Rosa costuma valer-se de momentos de epifania, tal como nesta decisiva passagem da novela “Campo geral”: a) Quando chegaram nos coqueiros, Mãe falou que gostava deles, porque não eram árvores dos Gerais: o primeiro dono que fez a casa tinha plantado aqueles, porque também dizia que queria ali outros coqueiros altos, mas que não fossem buritis. b) Parava dentro de casa, na cozinha, perto de Mãe, perto das meninas. Queria que tudo fosse igual ao igual, sem esparrame nenhum, nunca, sem espanto novo de assunto, mas o pessoal da família cada um lidando em suas miúdas obrigações, no usozinho. c) − “Diacho, de menino, carece de trabalhar, fazer alguma coisa, é disso que carece!” − o Pai falava, que redobrava: xingando e nem olhando Miguilim. Mãe o defendia, vagarosa, dizia que ele tinha muito sentimento. d) E Miguilim olhou para todos, com tanta força. [...] Agora ele sabia. Olhou Mãitina, que gostava de o ver de óculos, batia as mãos e gritava: − “Cena, Corinta! ... ”Olhou o redondo de pedrinhas, debaixo do jenipapeiro. e) Depois, a gente cavacava para tirar minhocas, dar para as perdizinhas. Mas o mico-estrela pegou as três, matou, foi uma pena, ele abriu as barriguinhas delas. Miguilim não contou ao Dito, por não entristecer. 05. (Fac. Israelita de Ciênc. da S. Albert Einstein SP) Mas ... Houve um pequeno engano, um contratempo de última hora, que veio pôr dois bons sujeitos, pacatíssimos e pacíficos, num jogo dos demônios, numa comprida complicação. O trecho acima faz parte do conto “Duelo”, uma das narrativas de Sagarana, de João Guimarães Rosa. Essa narrativa, como um todo, apresenta a) duas histórias de vingança que se entrelaçam, ou seja, um marido buscando o amante da esposa e um homem buscando o assassino do irmão. b) uma trama protagonizada por uma mulher de olhos bonitos, sempre grandes, de cabra tonta, que se envolve com um pistoleiro que acaba sendo morto por ela. c) as peripécias vividas por um capiau que se torna o agente de um crime contra seu compadre e amigo, Cassiano Gomes, por desavenças de traição amorosa. d) cenas de adultério praticadas por dona Silivânia, no mais doce, dado e descuidoso dos idílios fraudulentos, com o amante Turíbio Todo, o que provoca tragédia entre seus pretendentes.
675
B16 Modernismo terceira fase - prosa - Guimarães Rosa
– Não foi, Primo Ribeiro. Não foram pelo rio... Foi trem-de-9 ferro que levou... 10 – Não foi no rio, eu sei... No rio ninguém não anda... Só a 11 maleita é quem sobe e desce, olhando seus mosquitinhos e 12 pondo neles a benção... Mas, na estória... Como é mesmo a 13 estória, Primo? Como é?... 14 – O senhor bem que sabe, Primo... Tem paciência, que não é 15 bom variar... 16 – Mas, a estória, Primo!... Como é?... Conta outra vez... 17 – O senhor já sabe as palavras todas de cabeça... “Foi o 18 moço-bonito que apareceu, vestido com roupa de dia-de-19 domingo e com a viola enfeitada de fitas... E chamou a moça 20 p’ra ir se fugir com ele”... 21 – Espera, Primo, elas estão passando... Vão umas atrás das 22 outras... Cada qual mais bonita... Mas eu não quero, 23 nenhuma!... Quero só ela... Luísa... 24 – Prima Luísa... 25 – Espera um pouco, deixa ver se eu vejo... Me ajuda, Primo! 26 Me ajuda a ver... 27 – Não é nada, Primo Ribeiro... Deixa disso! 28 – Não é mesmo não... 29 – Pois então?! 30 – Conta o resto da estória!... 31 – ...“Então, a moça, que não sabia que o moço-bonito era o 32 capeta, ajuntou suas roupinhas melhores numa trouxa, e foi 33 com ele na canoa, descendo o rio...” 8
Português
Exercícios Complementares 01. (Fac. Israelita de Ciênc. da S. Albert Einstein SP) De repente, na altura, a manhã gargalhou: um bando de maitacas passava, tinindo guizos, partindo vidros, estralejando de rir. E outro. Mais outro. E ainda outro, mais baixo, com as maitacas verdinhas, grulhantes, gralhantes, incapazes de acertarem as vozes na disciplina de um coro. (...) O sol ia subindo, por cima do voo verde das aves itinerantes. Do outro lado da cerca, passou uma rapariga. Bonita! Todas as mulheres eram bonitas. Todo anjo do céu devia de ser mulher. O trecho acima integra a obra Sagarana, de Guimarães Rosa. Indique, nas alternativas abaixo, o nome do conto que contém o referido trecho. a) A hora e vez de Augusto Matraga, que narra a violência como instrumento de redenção, materializada na morte de Joãozinho Bem-Bem e do jagunço protagonista. b) Corpo Fechado, história de valentões e de espertos, de violência e de mágica, protagonizado por Manuel Fulô. c) São Marcos, que relata a desavença entre o narrador e um feiticeiro que o deixa cego por força de uma bruxaria. d) Minha Gente, em que se relata a situação vivida por um moço da cidade que vai passar uma temporada no campo e vive amores desencontrados.
B16 Modernismo terceira fase - prosa - Guimarães Rosa
02. (UniCesumar SP) Em 1946, João Guimarães Rosa escreveu Sagarana, reunião de contos que desenvolve tematicamente a matéria do sertão. Assim, observe a enumeração a seguir: linguagem marcada por regionalismo, arcaísmos e neologismos / feitiçaria, cegueira e reza brava / duelo poético, bambus e reis assírio-caldaicos / fina poesia em canto e plumagem das palavras / órgãos sensoriais e orientação de caminhos. São elementos compositivos de narrativas da obra e comparecem a) em todos os contos de Sagarana, com especial ênfase em Conversa de Bois. b) especialmente em São Marcos, cujo nome refere-se a uma reza que salvará o protagonista. c) também em A hora e a vez de Augusto Matraga, narrativa de mandonismo, penitência, martírio, redenção e morte. d) ainda em Duelo, conto de perseguição, assassinatos, vingança e tragédia. e) somente em Corpo Fechado, história de valentões que envolve ciganos, cavalos e reza brava. 03. (UniCesumar SP) Identifique, nas alternativas abaixo, aquela que contém informação que NÃO É CORRETA sobre Augusto Matraga, personagem do conto A hora e a vez de Augusto Matraga, de Guimarães Rosa.
676
a) É ferido, marcado a ferro e jogado num despenhadeiro, após ter sido abandonado pela mulher e por seus capangas. b) Orientado por um padre, cumpre penitência por meio da reza, do trabalho e do auxílio aos outros para a redenção de seus pecados e se propõe a ir para o céu mesmo que seja a porrete. c) Encontra-se com o bando de Joãozinho Bem-Bem, integra-se a ele, volta à vida de crimes e se vinga cruelmente do Major Consilva, seu inimigo. d) Desafia e confronta Joãozinho Bem-Bem, em defesa de crenças e valores religiosos, bem como de pessoas indefesas e oprimidas, mata-o e morre também. e) Segue uma trajetória de vida desregrada junto às mulheres, ao jogo de cartas e age com mandonismo e truculência com as pessoas. 04. (PUC SP) A obra Sagarana, de João Guimarães Rosa, foi publicada em 1946. Dela é correto afirmar que a) se intitula Sagarana porque reúne novelas que se desenvolvem à maneira de gestas guerreiras e lendas e apresentam um tema comum que abarca a vida simples dos sertanejos da região baiana do São Francisco. b) compõe-se de nove novelas, entre as quais se sobressai “Corpo Fechado”, história de valentões e espertos, de violência e de mágica, protagonizada por Manuel Fulô. c) estrutura-se em doze narrativas, de sentido moral e embasadas na tradição mineira, entre as quais se destacam “Questões de família”, história meio autobiográfica, e “Uma história de amor”, expressivo drama passional. d) apresenta narrativas apenas de teor místico religioso como a que se engendra em “A hora e a vez de Augusto Matraga”, cujo estilo destoa do conjunto das outras que compõem o livro. 05. (UEFS BA) O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem. O que Deus quer é ver a gente aprendendo a ser capaz de ficar alegre a mais, no meio da alegria, e inda mais alegre ainda no meio da tristeza! Só assim de repente, na horinha em que se quer, de propósito — por coragem. Será? Era o que eu às vezes achava. ROSA, João Guimarães. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994. p. 449.
O texto em destaque é um fragmento da obra Grande Sertão: veredas, do escritor modernista Guimarães Rosa. Segundo as reflexões do sujeito narrador Riobaldo, a vida pode ser vista como a) o trânsito da existência, marcada pela mistura instável de experiências ambivalentes, que exigem a coragem do ser humano.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
I.
reforçam a tristeza e a insegurança nas tomadas de decisões. c) uma grande dúvida sobre o que realmente é importante e essencial para a felicidade e satisfação do homem. d) uma prova única capaz de transformar o viver das pessoas na concretização do desejo de felicidade.
II.
e) um repertório existencial de reflexões que garantem todas as sensações positivas para o indivíduo. 06. (PUC SP) Do conto “A Volta do Marido Pródigo”, que integra a obra Sagarana, de João Guimarães Rosa, não é correto afirmar que a) há, no protagonista, uma espécie de heroísmo gaiato, correlacionado às espertezas das histórias de sapos utilizadas na narrativa. b) a personagem principal é Lalino Salãthiel, mulatinho descarado, malandro, enganador, mas simpático. Sabe como poucos contar uma boa história e age na vida como se estivesse em contínua representação. c) traz no nome uma alusão bíblica que se concretiza nas ações de abandonar a família, gastar o pouco que tem com bandalheiras, retornar para casa fragilizado e ser de novo aceito. d) mostra total alheamento quanto a situações políticas e de disputas de poder, uma vez que os personagens, que atuam na história, são gente do povo e operários da construção de estradas. 07. (PUC SP) O sol cresce, amadurece. Mas eles estão esperando é a febre, mais o tremor. Primo Ribeiro parece um defunto – sarro de amarelo na cara chupada, olhos sujos, desbrilhados, e as mãos pendulando, compondo o equilíbrio, sempre a escorar dos lados a bambeza do corpo. Mãos moles, sem firmeza, que deixam cair tudo quanto ele queira pegar. Baba, baba, cospe, cospe, vai fincando o queixo no peito; e trouxe cá para fora a caixinha de remédio, a cornicha de pó e mais o cobertor. O trecho acima integra o conto Sarapalha e faz parte da obra Sagarana de João Guimarães Rosa. Dessa narrativa como um todo, é errado afirmar que a) apresenta duas narrativas, uma em tempo presente e outra, em tempo passado, a qual assume dimensão mítica na cabeça delirante de Primo Ribeiro. b) enfoca a solidão, o abandono e a decadência de duas personagens acometidas de maleita e que passam os dias em diálogo sobre suas condições físicas e sentimentais. c) gera um conflito entre dois primos, quando um deles revela ter gostado muito de Luísa, mulher do outro, que o abandonara por um boiadeiro. d) usa predominantemente discurso indireto livre, que faz aflorar o pensamento íntimo da personagem e despreza o diálogo objetivo e direto por sua incapacidade de interlocução. 08. (Unitau SP) Leia as afirmativas sobre “A hora e a vez de Augusto Matraga”, conto de Sagarana, de Guimarães Rosa.
III.
Na primeira parte do conto, o narrador apresenta Nhô Augusto Esteves das Pindaíbas, sua intrépida personalidade, seu poder, sua maldade, seu comportamento libertino e desenfreado. Nessa parte, pode-se dizer, a personagem é regida por um princípio dionisíaco. Na segunda parte do conto, o narrador mostra a mudança de postura e o desejo de Matraga em buscar a salvação para a alma. Nessa segunda parte, pode-se dizer, a personagem é regida por um princípio apolíneo. Na terceira parte do conto, o narrador foca na busca que faz Matraga de sua “hora” e “vez”. Nela, temos o encontro de Matraga com Joãozinho Bem-Bem, com quem luta em favor de um homem que estava prestes a ser assassinado por Joãozinho. Nessa terceira parte, pode-se dizer, a personagem Matraga continua a ser regida por um princípio apolíneo.
Sobre as afirmativas, é CORRETO dizer que apenas a) I e II são falsas. b) II e III são falsas. c) I e II são verdadeiras. d) I e III são verdadeiras. e) I, II e III são verdadeiras. 09. (PUC SP) De Sagarana, obra de J G Rosa NÃO É CORRETO afirmar que a) compõe-se de nove contos de tamanhos diferentes, inseridos todos já na matéria do sertão. b) apresenta linguagem da maturidade roseana, baseada na oralidade sertaneja, com aproveitamento de regionalismos e arcaísmos. c) recebeu o nome Sagarana, termo de origem puramente tupi e que indicia o rol de atos heroicos praticados por valentes guerreiros no combate às injustiças sociais e de fundo político. d) opera uma gama diversificada de enredos que envolvem personagens características do sertão de Minas Gerais. 10. (Fac. Direito de São Bernardo do Campo SP) Sagarana, obra de Guimaraes Rosa, apresenta narrativas que fecundam o mundo primitivo e mágico dos Gerais, abordando temática variada, de que se pode destacar a de dimensão épica ou heroica do dia a dia de vaqueiros e de gado. Assim, indique abaixo, a alternativa que contém conto que trata desse tema. a) Conversa de bois, em que se transporta um defunto para a cidade e, durante a viagem, de forma mágica, os animais interferem na vida dos humanos. b) A hora e a vez de Augusto Matraga, cujo protagonista é marcado com ferro em brasa, a exemplo do que acontece com os animais. c) O burrinho pedrês, cujo episódio principal é protagonizado por Francolim e Sete de Ouros. d) Duelo, cujos protagonistas, envolvidos em adultério e vinganças, se perseguem, até alcançarem um desfecho trágico.
677
B16 Modernismo terceira fase - prosa - Guimarães Rosa
b) a ambiguidade de vivências que, em vez de gerar a alegria,
FRENTE
B
PORTUGUÊS
Exercícios de Aprofundamento 01. (Enem MEC)
07
e morri de infinitas mortes
08
guardando sempre o mesmo rosto
perdas e perdas no íntimo do ser,
09 10
Quando as ondas te carregaram meu olhos, entre águas e areias,
como, em volta do ser, mil outras perdas.
11
cegaram como os das estátuas,
12
a tudo quanto existe alheias.
13 14 15
Minhas mãos pararam sobre o ar e endureceram junto ao vento, e perderam a cor que tinham
16
e a lembrança do movimento.
17 18 19
E o sorriso que eu te levava desprendeu-se e caiu de mim: e só talvez ele ainda viva
20
dentro destas águas sem fim.
Fazer 70 anos Fazer 70 anos não é simples. A vida exige, para o conseguirmos,
[...] Ó José Carlos, irmão-em-Escorpião! Nós o conseguimos... E sorrimos de uma vitória comprada por que preço? Quem jamais o saberá? ANDRADE, C. D. Amar se aprende amando. São Paulo: Círculo do Livro, 1992 (fragmento).
O pronome oblíquo “o”, nos versos “A vida exige, para o conseguirmos” e “Nós o conseguimos”, garante a progressão temática e o encadeamento textual, recuperando o segmento a) “Ó José Carlos”. b) “perdas e perdas”. c) “A vida exige”. d) “Fazer 70 anos”. e) “irmão-em-Escorpião”. 02. (FMABC SP) Sobre o livro Claro Enigma, de Carlos Drummond de Andrade, pode-se afirmar que a) é uma continuidade natural, tanto estilística quanto temática, das obras que o antecederam. b) desenvolve temas sociais e se mostra como denúncia da condição humana no período de opressão e de guerra. c) aborda temas de sondagem filosófica e adentramento do mundo psíquico e existencial marcado por profundo nihilismo. d) apresenta uma visão otimista do mundo em que as formas de liberdade também se revelam no uso de uma poesia sem o rigor de métrica e de rima.
Texto comum às questões 03 e 04
678
01 02 03 04
No desequilíbrio dos mares, as proas giram sozinhas… Numa das naves que afundaram é que certamente tu vinhas.
05 06
Eu te esperei todos os séculos sem desespero e sem desgosto,
Cecília Meireles, “Canção”
03. (Mackenzie SP) Assinale a alternativa correta sobre Cecília Meireles e o Modernismo brasileiro. a) No início da sua carreira, Cecília Meireles se filiou ao grupo Festa, vertente mais espiritualista do modernismo. b) Sua obra faz parte da fase mais iconoclasta do nosso modernismo, a do romance nordestino de 1930. c) “Canção” é um ótimo exemplo da preocupação modernista em aproximar a linguagem poética da oralidade popular. d) A representação do mar em “Canção” revela o traço nacionalista do modernismo: exaltar a geografia brasileira. e) Assim como o cubismo foi uma influência para o nosso modernismo, podemos encontrar esta mesma influência em “Canção”. 04. (Mackenzie SP) A partir do poema “Canção”, considere as seguintes afirmações: I. Os versos Eu te esperei todos os séculos (verso 05) e e morri de infinitas mortes (verso 07) lançam mão da figura de linguagem conhecida como hipérbole. II. Na última estrofe E o sorriso que eu te levava/desprendeu-se e caiu de mim:/e só talvez ele ainda viva/dentro destas águas sem fim, o eu lírico sinaliza uma superação das suas dores amorosas. III. A referência a “estátuas”, no poema, nos faz classificar “Canção” como um poema parnasiano tardio.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
05. (Unitau SP) Analise as afirmativas abaixo, considerando seus saberes sobre a obra A hora da Estrela, de Clarice Lispector. I. Rodrigo S. M. é um narrador distanciado das ações narradas. II. A personagem Macabéa tem o pasmo essencial. III. Rodrigo S. M. é narrador e personagem. IV. A personagem Macabéa registra a pobreza sociológica do Nordeste brasileiro. V. A obra é uma narrativa de tensão interiorizada. Está CORRETO o que se afirma em a) III, IV e V, apenas. b) II, III e IV, apenas. c) I, II e III, apenas. d) II, III, IV e V, apenas. e) I, II, III e IV, apenas. 06. (UFU MG) Os personagens de Felicidade clandestina, de Clarice Lispector, desenvolvem, a partir de acontecimentos corriqueiros do cotidiano, reflexões a respeito da existência e uma densa viagem de autoconhecimento. A partir deste pressuposto, é correto afirmar que: a) “Os desastres de Sofia” e “Cem anos de perdão” são narrados a partir do ponto de vista de uma criança e detalham a perda da inocência e da esperança, consequência de acontecimentos traumáticos. b) “Uma amizade sincera” e “A mensagem” tratam da descoberta de um vínculo sincero e legítimo e a progressiva incapacidade humana de dar continuidade a momentos de verdadeira intimidade. c) “As águas do mundo” e “A quinta história” são histórias metalinguísticas, ou seja, não apresentam acontecimentos, mas focalizam a própria escrita, em especial as dificuldades do fazer literário. d) “O grande passeio” e “Os obedientes” tematizam viagens nas quais personagens que vivem presos ao automatismo das convenções, ao conhecerem novos espaços, deparam-se com momentos de epifanias. 07. (FMABC SP) João Guimarães Rosa escreveu em 1946 o livro Sagarana, composto de nove contos. Indique, nas alternativas abaixo, aquela cujo conteúdo NÃO CONFERE com o conto referido. a) Na baixada, mato e campo eram concolores. No alto da colina, onde a luz andava à roda, debaixo do angelim verde, de vagens verdes, um boi branco, de cauda branca. E, ao longe, nas prateleiras dos morros cavalgavam-se três qualidades de azul. – São Marcos.
b) As ancas balançam, e as vagas de dorsos, das vacas e touros, batendo com as caudas, mugindo no meio, na massa embolada, com atritos de couros, estralos de guampas, estrondos e baques, e o berro queixoso do gado Junqueira, de chifres imensos, com muita tristeza, saudade dos campos, querência dos pastos de lá do sertão... – Conversa de bois. c) Lalino Salatiel vem bamboleando, sorridente. Blusa cáqui, com bolsinhos, lenço vermelho no pescoço, chapelão, polainas, e, no peito, um distintivo, não se sabe bem de quê. Tira o chapelão: cabelos pretíssimos, com as ondas refulgindo de brilhantina borora. – A volta do marido pródigo. d) De repente, na altura, a manhã gargalhou: um bando de maitacas passava, tinindo guizos, partindo vidros, estralejando de rir. E outro. Mais outro. E ainda outro, mais baixo, com as maitacas verdinhas, grulhantes, gralhantes, incapazes de acertarem as vozes na disciplina de um coro. (...) O sol ia subindo, por cima do voo verde das aves itinerantes. Do outro lado da cerca, passou uma rapariga. Bonita! Todas as mulheres eram bonitas. Todo anjo do céu devia de ser mulher. – A hora e vez de Augusto Matraga. 08. (UCS RS) O trecho a seguir pertence ao conto “A terceira margem do rio”, de Guimarães Rosa. “Sou homem de tristes palavras. De que era que eu tinha tanta, tanta culpa? Se o meu pai, sempre fazendo ausência: e o rio-rio-rio, o rio – pondo perpétuo”. (ROSA, 1994, p. 412).
A partir do excerto lido, assinale a alternativa que apresenta a melhor aproximação do conto com a obra Um terno de pássaros ao Sul, de Carpinejar. a) O tom confessional com que o sujeito busca ressignificar a própria vida, a partir da compreensão da figura paterna ausente, mediada pela memória. b) A revolta do filho em relação à figura paterna, tendo em vista a sua ausência intencional na infância do sujeito poético. c) A figura da mãe, assumindo papéis tradicionalmente atribuídos ao pai. d) A desagregação familiar como resultado do egoísmo paterno, que culmina na perda dos referenciais identitários da prole. e) A identificação do sujeito poético ao seu pai, o que se evidencia na escolha da mesma profissão. 09. (Unimontes MG) Sobre o conto “A menina de lá”, de João Guimarães Rosa, pode-se afirmar, EXCETO a) De identidade leve e singela, a protagonista falava “despropositado”. b) A lógica da personagem revela a existência e natureza inteligíveis do seu ser. c) A personagem Nhinhinha exprime uma visão transcendental da vida. d) A incomunicabilidade da menina reflete a sua inadaptação ao contexto. 679
FRENTE B Exercícios de Aprofundamento
Assinale a alternativa correta: a) A afirmação I está correta. b) A afirmação II está correta. c) A afirmação III está correta. d) Todas as afirmações estão corretas. e) Nenhuma das afirmações está correta.
FRENTE
C
PORTUGUÊS Por falar nisso O discurso é o nível macro de análise de um constituinte linguístico. Ao tratar-se de discurso, linguisticamente, a palavra não se limita à acepção que, comumente, dá-se a ela, como semelhante a falas proferidas para multidões. Discurso não é necessariamente o que os políticos dizem em comícios. Discurso é uma forma de linguagem escrita (texto) ou falada (conversação no seu contexto social, político ou cultural), isto é, um sistema social de pensamentos ou de ideias. Os discursos, nessa acepção, passam a ser estudados com um enfoque específico para essa área somente na década de 1960, com a inauguração da disciplina designada “Análise do Discurso” (AD). Desse modo, o discurso, enquanto estrutura verbal, é uma sequência coerente de orações, que se define pelos temas ou tópicos que expressa. No entanto, enquanto interação, trata-se de uma sequência de turnos e ações de vários participantes, na qual cada ato é levado a cabo relativamente ao anterior e prepara o seguinte. O discurso, portanto, pode ser descrito como sendo um processo ou uma representação mental em que os utilizadores da língua aplicam estratégias de produção ou de compreensão antes de armazenar fragmentos do discurso na memória. Nas próximas aulas, estudaremos os seguintes temas
C13 C14 C15 C16
Interlocução e discurso .........................................................................682 Funções da linguagem .................................................................. 688 Pressuposto e subentendido ........................................................ 694 Humor e ironia .............................................................................. 698
FRENTE
C
PORTUGUÊS
MÓDULO C13
ASSUNTOS ABORDADOS n Interlocução e discurso n Interlocução n Discurso n Tipos de discurso n Transposição do discurso direto para o indireto
INTERLOCUÇÃO E DISCURSO Interlocução A interlocução é um constituinte próprio da linguagem. A língua é o meio privilegiado de interação entre os seres humanos. Em todas as circunstâncias em que se fala ou se escreve, há um interlocutor. Este interlocutor pode ser real ou imaginário, individual ou coletivo, pode estar mais ou menos próximo e/ ou mudar em cada situação concreta. Na escrita, podem-se identificar diferentes tipos de interlocutor. Ele pode ser definido, como em uma carta ou em uma petição; genérico; um determinado segmento social, como em um jornal; ou virtual, como na ficção científica ou no e-mail. A presença do interlocutor no discurso de um indivíduo não é algo neutro, sem valor. Ao contrário, em alguma medida, está sempre interferindo no discurso do locutor. É do tipo de relação entre locutor e ouvinte que decorre o tipo de ação a ser empreendida pelo locutor por meio do seu texto. É curioso, nesse sentido, que a maioria das correspondências empresariais ou não toquem na questão da interlocução ou falem na ausência de interlocutor, identificando-se aí uma das dificuldades do produtor do texto. Na situação empresarial, muitas vezes, é-se obrigado a escrever dentro dos padrões previamente estipulados e, além disso, já se espera de quem escreve o conhecimento ou até mesmo o domínio da escrita. Quando há interlocução, significa que é possível verificar a compreensão da mensagem e que é possível reformular o enunciado quantas vezes forem necessárias. Em situações de comunicação oral sem intercâmbio, é fundamental atender à construção do enunciado e ao modo como se transmite. Convém, portanto, caracterizar o destinatário, conhecer a natureza da mensagem, utilizar um nível de linguagem adequado ao público-alvo, dominar as funções da linguagem e, por fim, estar ciente de todas as condições de comunicação.
Como você pôde ler no texto introdutório deste capítulo, discurso é uma prática humana de construir textos, sejam eles escritos ou orais. Logo, todo discurso é uma prática social. A análise de um discurso deve, portanto, considerar o contexto em que se encontra, bem como as personagens e as condições de produção do texto. Assim, discurso é toda situação que envolve a comunicação dentro de um determinado contexto e diz respeito a quem fala, para quem se fala e sobre o que se fala.
682
Fonte: Shutterstock.com
Discurso
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Nesse contexto, o autor pode optar por três tipos de discurso: o discurso direto, o discurso indireto e o discurso indireto livre. Esses três discursos não estão necessariamente separados, pois eles podem aparecer juntos em um texto. Dependerá de quem o produziu.
Tipos de discurso Discurso direto No discurso direto, o narrador dá uma pausa na sua narração e passa a citar fielmente a fala do personagem. O objetivo desse tipo de discurso é transmitir autenticidade e espontaneidade. Assim, o narrador se distancia do discurso, não se responsabilizando pelo que é dito. Pode ser também utilizado por questões de humildade – para não falar algo que foi dito por um estudioso, por exemplo, como se fosse de sua própria autoria. Desse modo, o discurso direto é o mais natural e comum dos tipos de discurso. Por meio de sua utilização, o narrador permite que as personagens se exprimam livremente, ganhando vida própria na narração. Caracteriza-se por ser uma transcrição exata das falas das personagens, sem a participação do narrador. Assim, o discurso direto é o registro das palavras proferidas por uma personagem. O narrador deve expor a fala da personagem a partir do recurso gráfico: travessão ou aspas. É um tipo de discurso alheio a quem narra a história, ou seja, não há interferência por parte do narrador. Alguns verbos, chamados de elocução, são utilizados no começo, no meio ou após os discursos. São eles: dizer, perguntar, responder, exclamar, ordenar, falar, protestar, contestar, alegar, concordar entre outros. Características do discurso direto n Utilização dos verbos da categoria dicendi, como vimos acima, ou seja, aqueles que têm relação com o verbo “dizer”. São chamados de “verbos de elocução”, a saber: falar, responder, perguntar, indagar, declarar, exclamar entre outros. n Utilização dos sinais de pontuação - travessão, exclamação, interrogação, dois pontos, aspas. n Inserção do discurso no meio do texto - não necessariamente em uma linha isolada.
Exemplos n Os formandos repetiam: “Prometo cumprir meus deveres e respeitar meus semelhantes com firmeza e honestidade.” n O réu afirmou: “Sou inocente!” n Querendo ouvir sua voz, resolveu telefonar: — Alô, quem fala? — Bom dia, com quem quer falar? — respondeu com tom de simpatia. Discurso indireto No discurso indireto, o narrador da história interfere na fala do personagem, proferindo suas palavras. Aqui não encontramos as próprias palavras da personagem. Logo, no discurso indireto, as falas das personagens são apresentadas pelo narrador, sendo ele o responsável por falar na vez da personagem, utilizando suas próprias palavras para reproduzir a essência das falas dessas personagens, bem como suas reações e personalidades. Portanto, o discurso indireto é sempre feito na 3ª pessoa; nunca na 1ª pessoa. Ademais, o discurso indireto é definido como o registro da fala da personagem sob influência por parte do narrador. Nesse tipo de discurso, os tempos verbais são modificados para que haja entendimento quanto à pessoa que fala. Além disso, costuma-se citar o nome de quem proferiu a fala ou fazer algum tipo de referência. Características do discurso indireto n O discurso é narrado em terceira pessoa. n Algumas vezes, são utilizados os verbos de elocução, por exemplo: falar, responder, perguntar, indagar, declarar, exclamar. Contudo não há utilização do travessão, pois geralmente as orações são subordinadas, ou seja, dependem de outras orações, o que pode ser marcado por meio da conjunção “que” (verbo + que). Exemplos n Os formandos repetiam que iriam cumprir seus deveres e respeitar seus semelhantes com firmeza e honestidade. n O réu afirmou que era inocente. n Querendo ouvir sua voz, resolveu telefonar. Cumprimentou e perguntou quem estava falando. Do outro lado, alguém respondeu ao cumprimento e perguntou, com tom de simpatia, com quem a pessoa queria falar. Discurso indireto livre No discurso indireto livre, há uma fusão dos discursos direto e indireto, ou seja, há intervenções do narrador, bem como da fala das personagens. Não existem marcas que mostrem a mudança do discurso. Por isso, as falas das personagens e do narrador - que sabe tudo o que se passa no pensamento das personagens - podem ser confundidas. 683
C13 Interlocução e discurso
Nos textos narrativos, é por meio da voz do narrador que conhecemos o desenrolar da história e as ações das personagens. Entretanto, é somente por meio da voz das personagens que conhecemos suas ideias, opiniões e sentimentos. A forma como a voz dessas personagens é introduzida na voz do narrador é chamada de discurso.
Português
Características do discurso indireto livre n Liberdade sintática. n Aderência do narrador ao personagem. Exemplos n Fez o que julgava necessário. Não estava arrependido, mas sentia um peso. Talvez não tenha sido suficientemente justo com as crianças… n O despertador tocou um pouco mais cedo. Vamos lá, eu sei que consigo! n Amanheceu chovendo. Bem, lá vou eu passar o dia assistindo televisão! Nas orações destacadas, os discursos são diretos, embora não tenha sido sinalizada a mudança da fala do narrador para a do personagem.
Transposição do discurso direto para o indireto
C13 Interlocução e discurso
Fonte: Shutterstock.com
Nos exemplos seguintes, verificaremos as alterações feitas, a fim de moldar o discurso de acordo com a intenção pretendida.
684
DISCURSO DIRETO
DISCURSO INDIRETO
Preciso sair por alguns instantes. (enunciado na 1ª pessoa)
Disse que precisava sair por alguns instantes. (enunciado na 3ª pessoa)
Sou a pessoa com quem falou há pouco. (enunciado no presente)
Disse que era a pessoa com quem tinha falado há pouco. (enunciado no imperfeito)
Não li o jornal hoje. (enunciado no pretérito perfeito)
Disse que não tinha lido o jornal naquele dia. (enunciado no pretérito mais que perfeito)
O que fará relativamente sobre aquele assunto? (enunciado no futuro do presente)
Perguntou-me(lhe) o que faria relativamente sobre aquele assunto. (enunciado no futuro de pretérito)
Não me ligues mais! (enunciado no modo imperativo)
Pediu-me que não lhe ligasse mais. (enunciado no modo subjuntivo)
Isto não é nada agradável. (pronome demonstrativo em 1ª pessoa)
Disse que aquilo não era nada agradável. (pronome demonstrativo em 3ª pessoa)
Vivemos muito bem aqui. (advérbio de lugar – “aqui”)
Disse que viviam muito bem lá (ali). (advérbio de lugar – “lá”, “ali”)
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Exercícios de Fixação
O velho adormeceu, a mulher sentou-se 1 à porta. Na sombra do seu descanso viu o sol vazar, lento rei n2 das luzes. Pensou no dia e riu-se dos contrários: ela, cujo nascimento faltara nas datas, tinha já o seu fim 3 marcado. Quando a lua começou a acender as árvores do mato ela inclinou-se e adormeceu. Sonhou dali 4 para muito longe: vieram os filhos, os mortos e os vivos, a machamba encheu-se de produtos, os olhos a 5 escorregarem no verde. O velho estava no centro, gravatado, contando as histórias, mentira quase todas. 6 Estavam ali os todos, os filhos e os netos. Estava ali a vida a continuar-se, grávida de promessas. Naquela 7 roda feliz, todos acreditavam na verdade dos velhos, todos tinham sempre razão, nenhuma mãe abria a sua 8 carne para a morte. Os ruídos da manhã foram-na chamando para fora de si, ela negando abandonar aquele 9 sonho, pediu com tanta devoção como pedira à vida que não lhe roubasse os filhos. 10 Procurou na penumbra o braço do marido para acrescentar força naquela tremura que sentia. Quando a 11 sua mão encontrou o corpo do companheiro viu que estava frio, tão frio que parecia que, desta vez, ele 12 adormecera longe dessa fogueira que ninguém nunca acendera. 1
(Adaptado de: COUTO, Mia. A fogueira. In: Vozes anoitecidas. São Paulo, Companhia das Letras, 2013. p. 25).
01. (UEL PR) No trecho, o final do conto é narrado, momento em que ocorre a morte de uma personagem. Considerando o trecho e o conto, assinale a alternativa correta. a) O título do conto, “A fogueira”, é essencial para a compreensão do trecho, pois é a mulher que delira com a fogueira inicialmente. b) Os filhos do casal assistiam sem piedade à condenação da mãe à morte imposta pelo pai. c) É possível traçar uma comparação entre o velho e a fogueira de que trata o título, já que o velho manteve-se forte até o final da história. d) A mulher mantém-se sempre esperançosa, resistindo, no desfecho do conto, ao fim que se anunciou em trechos anteriores. e) O trecho é marcado pela mescla de sonho e realidade, assim como a fogueira que existe, embora se desconheça quem a acendeu. 02. (UEL PR) Acerca das personagens apresentadas no conto, considere as afirmativas a seguir. I. O velho revela-se autoritário, desajeitado e falante, considerando suas atitudes ao longo do conto.
II.
A mulher mostra-se inteligente, pacata e resignada diante dos acontecimentos que estão por vir. III. A Morte é a personagem rancorosa, que aguarda o desfecho e o dia marcados para levar alguém. IV. Os filhos do casal são indiferentes aos pais, o que dificulta a salvação da mulher ao final do conto. Assinale a alternativa correta. a) Somente as afirmativas I e II são corretas. b) Somente as afirmativas I e IV são corretas. c) Somente as afirmativas III e IV são corretas. d) Somente as afirmativas I, II e III são corretas. e) Somente as afirmativas II, III e IV são corretas. 03. (UEL PR) Sobre a linguagem utilizada no texto, considere as afirmativas a seguir. I. O termo “vazar” está em desacordo com a linguagem formal apresentada ao longo do conto. II. O significado do termo “machamba” consta do glossário da edição brasileira, pois está vinculado à linguagem coloquial do português falado no Brasil. III. O termo “gravatado” indica o vestuário do marido, sem que isso signifique formalidade na linguagem empregada pelo narrador. IV. A expressão “os todos” foi usada para enfatizar a presença, naquele momento, das pessoas que ela mais amava. Assinale a alternativa correta. a) Somente as afirmativas I e II são corretas. b) Somente as afirmativas I e IV são corretas. c) Somente as afirmativas III e IV são corretas. d) Somente as afirmativas I, II e III são corretas. e) Somente as afirmativas II, III e IV são corretas. 04. (Unievangélica GO) Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis; nada menos. Meu pai, logo que teve aragem dos onze contos, sobressaltou-se deveras; achou que o caso excedia as raias de um capricho juvenil. – Desta vez, disse ele, vais para a Europa; vais cursar uma Universidade, provavelmente Coimbra; quero-te para homem sério e não para arruador e gatuno. MACHADO DE ASSIS, Joaquim Maria. Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: Klick Editora, 1999. p. 53.
Tem-se, no segundo parágrafo do excerto apresentado, um exemplo de discurso a) indireto b) direto c) indireto livre d) direto livre
685
C13 Interlocução e discurso
Texto comum às questões 01, 02 e 03
dade
Português
Exercícios Complementares Um estudo sobre contestações do povo dirigidas ao governo na primeira década do século XX, 2 registradas em uma coluna de jornal, revela a atitude do cidadão em momentos não críticos, em 3 seu cotidiano de habitante da cidade do Rio de Janeiro. A conclusão do estudo é que quase 4 só pessoas de algum modo relacionadas com a burocracia do Estado se queixavam, quer os 5 próprios funcionários e operários, quer as vítimas dos funcionários, especialmente da polícia e 6 dos fiscais. Reclamavam funcionários, artesãos, pequenos comerciantes, uma ou outra prostituta. 7 Mas as queixas não revelavam oposição ao Estado. O conteúdo das reclamações girava em 8 torno de problemas elementares, como segurança individual, limpeza pública, transporte, 9 arruamento. Permanece, no entanto, o fato de que entre as reivindicações não se colocava a 10 de participação nas decisões, a de ser ouvido ou representado. O Estado aparece como algo a 11 que se recorre, como algo necessário e útil, mas que permanece fora do controle, externo ao 12 cidadão. Ele não é visto como produto de concerto político, pelo menos não de um concerto 13 em que se inclua a população. É uma visão antes de súdito que de cidadão, de quem se coloca 14 como objeto da ação do Estado e não de quem se julga no direito de a influenciar. 15 Como explicar esse comportamento político da população do Rio de Janeiro? De um lado, a 16 indiferença pela participação, a ausência de visão do governo como responsabilidade coletiva, 17 de visão da política como esfera pública de ação, como campo em que os cidadãos se podem 18 reconhecer como coletividade, sem excluir a aceitação do papel do Estado e certa noção dos 19 limites deste papel e de alguns direitos do cidadão. De outro, o contraste de um comportamento 20 participativo em outras esferas de ação, como a religião, a assistência mútua e as grandes festas 21 em que a população parecia reconhecer-se como comunidade. 22 Seria a cidade a responsável pelo fenômeno? Neste caso, como caracterizá-la, como distingui-la 23 de outras? Entramos aqui na vasta e rica literatura sobre o fenômeno urbano, em particular sobre 24 a cultura urbana. 1
C13 Interlocução e discurso
JOSÉ MURILO DE CARVALHO Adaptado de Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. São Paulo: Companhia das Letras, 1987.
01. (Uerj RJ) No último parágrafo (Refs. 22-24), o autor emprega dois recursos que explicitam sua interlocução com Gab: os leitores. Recursos: uso de frases interrogativas; uso da primeiIdentifique-os. ra pessoa no plural. 02. (UFU MG) Uma barra: na era das mensagens de texto e das descrições de perfis no Twitter, ela se tornou um sinal de pontuação universal para aqueles que querem descrever rapidamente suas atividades sociais (jantar/drinques), as
686
ambições de carreira (trabalho/diversão) e até mesmo os arranjos amorosos (amigo/ amante). Mas, para alguns integrantes da geração Y (aqueles nascidos entre 1980 e 2000), ela se transformou em uma espécie de marcador de identidade (advogada/atriz; relações públicas/ DJ; executiva/cozinheira) para aqueles que trabalham em dois (ou mais) mundos diferentes. Ao contrário de legiões de americanos que têm vários empregos por necessidade, esses jovens escolhem se esticar entre várias atividades. Enquanto um trabalho geralmente paga as contas, outro permite algo mais criativo. Eles consideram esse coquetel de atividades essencial para o bem-estar e consideram que se concentrar em apenas uma coisa para o resto da vida é antiquado. “Uma coisa para o resto da minha vida? Absolutamente não”, diz Maxwell Hawes 4°, 25, que atualmente se alterna entre uma companhia de tecnologia para publicidade em San Francisco e uma start-up (empresa iniciante) e de vestuário masculino. “Eu não imagino como seria isso.” Folha de S. Paulo, 28 de dezembro de 2014.
A citação, entre aspas, presente no fim do texto relaciona-se à ideia desenvolvida no parágrafo anterior com o objetivo de apresentar um(a) a) argumento de autoridade. b) estratégia de persuasão. c) exemplificação como prova. d) interlocução direta. 03. (Enem MEC) Argumento Tá legal Eu aceito o argumento Mas não me altere o samba tanto assim Olha que a rapaziada está sentindo a falta De um cavaco, de um pandeiro e de um tamborim Sem preconceito Ou mania de passado Sem querer ficar de lado De quem não quer navegar Faça como o velho marinheiro Que durante o nevoeiro Leva o barco devagar PAULINHO DA VIOLA. Disponível em: www.paulinhodavilacom.br . Acessado e,: 6 dez. 2012
Na letra da canção, percebe-se uma interlocução. A posição do emissor é conciliatória entre as tradições do samba e os movimentos inovadores desse ritmo. A estratégia argumentativa de concessão, nesse cenário, é marcada no trecho
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
a) “Mas não me altere o samba tanto assim”. b) “Olha que a rapaziada está sentindo falta”. c) “Sem preconceito / Ou mania de passado”. d) “Sem querer ficar do lado / De quem não quer navegar”. e) “Leva o barco devagar”. 04. (Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública)
* ensarilhar-se: emaranhar-se. ** rezinga: resmungo. Constitui marca do registro informal da língua o trecho a) “mas um só ruído compacto” (Refs. 2-3). b) “ouviam-se gargalhadas” (Ref. 5). c) “o prazer animal de existir” (Refs. 8-9). d) “gritou ela para baixo” (Ref. 14). e) “bata na porta” (Ref. 15). 06. (Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública)
TEM COISAS que não podem faltar á pessoa com deficiência. Disponível em: <http://cristianafrazao.zip.net>. Acesso em: jan. 2017.
05. (Fuvest SP) O rumor crescia, condensando-se; o zunzum de todos os 2 dias acentuava-se; já se não destacavam vozes dispersas, mas 3 um só ruído compacto que enchia todo o cortiço. Começavam a 4 fazer compras na venda; ensarilhavam-se* discussões e 5 rezingas**; ouviam-se gargalhadas e pragas; já se não falava, 6 gritava-se. Sentia-se naquela fermentação sanguínea, naquela 7 gula viçosa de plantas rasteiras que mergulham os pés 8 vigorosos na lama preta e nutriente da vida, o prazer animal de 9 existir, a triunfante satisfação de respirar sobre a terra. 10 Da porta da venda que dava para o cortiço iam e vinham 11 como formigas; fazendo compras. 12 Duas janelas do Miranda abriram-se. Apareceu numa a 13 Isaura, que se dispunha a começar a limpeza da casa. 14 – Nhá Dunga! gritou ela para baixo, a sacudir um pano 15 de mesa; se você tem cuscuz de milho hoje, bata na porta, 16 ouviu? 1
Aluísio Azevedo, O cortiço.
NÃO IMPORTA o tipo de homem que você é. Disponível em: <http://www.arari.ma.gov.br/images/saude/imghomem.jpg> Acesso em: fev. 2017.
Alguns aspectos linguísticos, nessa campanha institucional, têm papel essencial para a constituição da função apelativa, e, por isso, o uso a) de todos os adjetivos que compõem a face do homem evidencia as qualidades que não podem faltar naquele que zela regularmente por seu bem-estar. b) do pronome de tratamento “você” direciona o discurso para o perfil do colocutor, que é criticado pela campanha. c) da forma verbal no imperativo “Seja” é um recurso utilizado, dentre outros, para persuadir o interlocutor, convencendo-o da necessidade de cuidar da saúde. d) do substantivo “tipo”, repetido na segunda frase escrita com letras maiúsculas, visa reforçar a principal informação dessa publicidade. e) da oração adjetiva “que cuida da saúde” restringe a mensagem que veicula ao próprio locutor do texto.
687
C13 Interlocução e discurso
Essa campanha institucional, através do jogo de ideias entre o texto verbal e não verbal, tem como objetivo a) criticar empresas que não contratam pessoas com deficiência, argumentando a sua improdutividade. b) defender a causa da inclusão de todos nos vários segmentos sociais, independentemente de contexto de exclusão. c) conscientizar a população em geral da importância do trabalho de pessoas com deficiência para o progresso econômico do Brasil. d) convencer os cidadãos a denunciarem situações de preconceito e discriminação de profissionais com deficiência física. e) mobilizar a sociedade para que valorize os portadores de necessidades especiais, dando-lhes oportunidade de emprego.
FRENTE
C
PORTUGUÊS
MÓDULO C14
ASSUNTOS ABORDADOS n Funções da linguagem n Função emotiva n Função referencial n Função conativa n Função fática n Função poética n Função metalinguística
FUNÇÕES DA LINGUAGEM Sabemos que a linguagem é uma das formas de apreensão e de comunicação das coisas do mundo. O ser humano, ao viver em conjunto, utiliza vários códigos para representar o que pensa, o que sente, o que quer e o que faz. Sendo assim, o que conseguimos expressar e comunicar através da linguagem? Para que ela funciona? A multiplicidade da linguagem pode ser sintetizada em seis funções ou finalidades básicas. A partir da intenção do falante, as funções da linguagem são formas de utilização da própria linguagem. A linguagem, uma eficiente forma de comunicação, é elemento fundamental para estabelecermos comunicação com outras pessoas. Por ser múltipla e apresentar peculiaridades de acordo com a intenção do falante, divide-se em seis funções: n n n n n n
Função emotiva; Função referencial; Função conativa; Função fática; Função poética; Função metalinguística.
Cada uma dessas funções desempenha um papel relacionado com os elementos presentes na comunicação: emissor, receptor, mensagem, código, canal e contexto. Assim, elas determinam o objetivo dos atos comunicativos. Embora haja uma função que predomine, vários tipos de linguagem podem estar presentes em um mesmo texto. Veja o esquema a seguir: FUNÇÃO REFERENCIAL (CONTEXTO/REFERENTE)
FUNÇÃO EMOTIVA (EMISSOR)
FUNÇÃO POÉTICA (MENSAGEM)
FUNÇÃO CONATIVA (RECEPTOR)
FUNÇÃO FÁTICA (CANAL)
FUNÇÃO METALINGUÍSITCA (CÓDIGO)
Função emotiva Também chamada de função expressiva, na função emotiva, o emissor tem como objetivo principal transmitir suas emoções, sentimentos e subjetividades por meio da própria opinião. Esse tipo de texto, escrito em primeira pessoa, está voltado para o emissor, uma vez que possui um caráter pessoal. Reflete, portanto, o estado de ânimo do emissor, seus sentimentos e emoções. Um dos indicadores da função emotiva em um texto é a presença de interjeições e de alguns sinais de pontuação, como as reticências e o ponto de exclamação. 688
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
A pontuação (exclamação, interrogação e reticências) é uma característica da função emotiva, pois transmite a subjetividade da mensagem e reforça a entonação emotiva. Essa função é comum em poemas ou narrativas de teor dramático ou romântico. Como exemplos, podemos destacar: os textos poéticos, as cartas e os diários. Todos eles são marcados pelo uso dos seguintes sinais de pontuação: reticências, exclamação etc. Exemplo Meus amores, tenho tantas saudades de vocês … Mas não se preocupem, em breve a mamãe chega e vamos aproveitar o tempo perdido bem juntinhos. Sim, consegui adiantar a viagem em uma semana!!! Isso quer dizer que tenho muito trabalho hoje e amanhã.... Quando chegar, quero encontrar essa casa em ordem, combinado?!?
Função referencial Também chamada de função informativa, a função referencial tem como objetivo principal informar, referenciar algo. Voltada para o contexto da comunicação, esse tipo de texto é escrito na terceira pessoa (singular ou plural), enfatizando seu caráter impessoal. Nesse sentido, transmite uma informação objetiva sobre a realidade. Dá prioridade aos dados concretos, fatos e circunstâncias. É a linguagem característica das notícias de jornal, do discurso científico e de qualquer exposição de conceitos. Além disso, coloca em evidência o referente, ou seja, o assunto ao qual a mensagem se refere. Apresenta, ainda, uma informação objetiva, expõe dados da realidade de modo objetivo, não faz comentários, nem avaliação. Geralmente, o texto apresenta-se na terceira pessoa do singular ou plural, pois transmite impessoalidade. A linguagem é denotativa, ou seja, não há possibilidades de outra interpretação além da que está exposta.
Como exemplos de linguagem referencial podemos citar os materiais didáticos, os textos jornalísticos e os científicos. Todos eles, por meio de uma linguagem denotativa, informam a respeito de algo, sem envolver aspectos subjetivos ou emotivos à linguagem. Exemplo Na passada terça-feira, dia 22 de setembro de 2015, o real teve a maior desvalorização da sua história. Nesse dia foi preciso desembolsar R$ 4,0538 para comprar um dólar. Recorde-se que o Real foi lançado há mais de 20 anos, mais precisamente em julho de 1994.
Função conativa Também chamada de apelativa, a função conativa é caracterizada por uma linguagem persuasiva que tem o intuito de convencer o leitor. Por isso, o grande foco é no receptor da mensagem. Essa função é muito utilizada nas propagandas, publicidades e discursos políticos, a fim de influenciar o receptor por meio da mensagem transmitida. Esse tipo de texto costuma se apresentar na segunda ou terceira pessoa, com a presença de verbos no imperativo e uso do vocativo. Seu objetivo é influenciar o receptor ou destinatário, com a intenção de convencê-lo de algo ou dar-lhe ordens. Como o emissor se dirige ao receptor, é comum o uso de tu e você, ou o nome da pessoa, além dos vocativos e imperativos. É a linguagem usada nos discursos, sermões e propagandas que se dirigem diretamente ao consumidor. Além disso, objetiva-se também influenciar, convencer o receptor de alguma coisa por meio de uma ordem (uso de vocativos), sugestão, convite ou apelo (daí o nome da função). Os verbos costumam estar no imperativo (Compre! Faça!) ou conjugados na segunda ou na terceira pessoa (Você não pode perder! Ele vai melhorar seu desempenho!). Exemplos n Vote em mim! n Entre. Não vai se arrepender! n É só até amanhã. Não perca!
C14 Funções da linguagem
Ademais, o objetivo do emissor é transmitir suas emoções e anseios. A realidade é transmitida sob o ponto de vista do emissor, a mensagem é subjetiva e centrada no emitente e, portanto, apresenta-se na 1ª pessoa.
689
Português
Função fática A função fática tem como objetivo estabelecer ou interromper a comunicação de modo que o mais importante é a relação entre o emissor e o receptor da mensagem. Aqui, o foco reside no canal de comunicação. Tem por finalidade, desse modo, estabelecer, prolongar ou interromper a comunicação. É aplicada em situações em que o mais importante não é o que se fala, nem como se fala, mas sim o contato entre o emissor e o receptor. Fática quer dizer “relativa ao fato”, ao que está ocorrendo. Esse tipo de função é muito utilizado nos diálogos, nas expressões de cumprimento, saudações, discursos ao telefone etc. Exemplo — Consultório do Dr. João, bom dia! — Bom dia! Precisava marcar uma consulta para o próximo mês, se possível. — Hum, o Dr. tem vagas apenas para a segunda semana. Entre os dias 7 e 11, qual a sua preferência? — Dia 8 está ótimo.
Função poética A função poética é característica das obras literárias, que possuem como marca a utilização do sentido conotativo das palavras. Nessa função, o emissor preocupa-se com a maneira como a mensagem será transmitida por meio da escolha das palavras, das expressões, das figuras de linguagem. Por isso, aqui o principal elemento comunicativo é a mensagem. É aquela, portanto, que põe em evidência a forma da mensagem, ou seja, que se preocupa mais em como dizer do que com o que dizer. O escritor, por exemplo, procura fugir das formas habituais de expressão, buscando deixar mais bonito seu texto, surpreender, fugir da lógica ou provocar um efeito humorístico. Embora seja própria da obra literária, a função poética não é exclusiva da poesia nem da literatura em geral, pois se encontra com frequência nas expressões cotidianas de valor metafórico e na publicidade.
Fonte: Wikimedia commons
C14 Funções da linguagem
Note que esse tipo de função não pertence somente aos textos literários. Também encontramos a função poética na publicidade ou nas expressões cotidianas em que há o uso frequente de metáforas (provérbios, anedotas, trocadilhos, músicas).
690
Exemplo Senhor, nada valho. Sou a planta humilde dos quintais pequenos e das lavouras pobres. Meu grão, perdido por acaso, nasce e cresce na terra descuidada. Ponho folhas e haste, e se me ajudardes, Senhor, mesmo planta de acaso, solitária, dou espigas e devolvo em muitos grãos o grão perdido inicial, salvo por milagre, que a terra fecundou. Sou a planta primária da lavoura. Não me pertence a hierarquia tradicional do trigo e de mim não se faz o pão alvo universal. O Justo não me consagrou Pão de Vida, nem lugar me foi dado nos altares. Sou apenas o alimento forte e substancial dos que trabalham a terra, onde não vinga o trigo nobre. Sou de origem obscura e de ascendência pobre, alimento de rústicos e animais do jugo. Cora Coralina
Função metalinguística A função metalinguística é caracterizada pelo uso da metalinguagem, ou seja, a linguagem que se refere a ela mesma. Dessa forma, o emissor explica um código utilizando o próprio código. Um texto que descreva sobre a linguagem textual ou um documentário cinematográfico que fala sobre a linguagem do cinema são alguns exemplos. Nessa categoria, os textos metalinguísticos que merecem destaque são as gramáticas e os dicionários. Exemplo Procura da poesia “Chega mais perto e contempla as palavras. Cada uma tem mil faces secretas sob a face neutra e te pergunta, sem interesse pela resposta, pobre ou terrível, que lhe deres: Trouxeste a chave?” (Trecho do poema Procura da poesia, de Carlos Drummond de Andrade)
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Exercícios de Fixação 01. (Enem MEC) O texto abaixo é um trecho do discurso do primeiro-ministro britânico, Tony Blair, pronunciado quando da declaração de guerra ao regime Talibã: Essa atrocidade [o atentado de 11 de setembro, em Nova York] foi um ataque contra todos nós, contra pessoas de todas e nenhuma religião. Sabemos que a Al-Qaeda ameaça a Europa, incluindo a Grã-Bretanha, e qualquer nação que não compartilhe de seu fanatismo. Foi um ataque à vida e aos meios de vida. As empresas aéreas, o turismo e outras indústrias foram afetadas e a confiança econômica sofreu, afetando empregos e negócios britânicos. Nossa prosperidade e padrão de vida requerem uma resposta aos ataques terroristas. (O Estado de S. Paulo, 8/10/2001)
Nessa declaração, destacaram-se principalmente os interesses de ordem a) moral. d) religiosa. b) militar. e) econômica. c) jurídica. 02. (UFSCar SP) Para responder às questões adiante, leia os textos a seguir. “Psicografia”, de Ana Cristina Cesar. Também eu saio à revelia e procuro uma síntese nas demoras cato obsessões com fria têmpera e digo do coração: não soube e digo da palavra: não digo (não posso ainda acreditar na vida) e demito o verso como quem acena e vivo como quem despede a raiva de ter visto “Autopsicografia”, de Fernando Pessoa. O poeta é um fingidor. Finge tão completamente Que chega a fingir que é dor A dor que deveras sente.
Que se chama o coração. Vocabulário: comboio: trem de ferro. calhas de roda: trilhos sobre os quais corre o trem de ferro. Compare os poemas de Fernando Pessoa e de Ana Cristina Cesar e responda: a) Por que se pode dizer que em ambos os poemas está presente a função metalinguística? b) Explique a ambiguidade presente no poema de Fernando Pessoa, revelada pelo título e pelo adjetivo “fingidor”, em contraste com o poema de Ana Cristina Cesar. 03. (UFSCar SP) O marinheiro sueco, um loiro de quase dois metros, entrou no bar, soltou um bafo pesado de álcool na cara de Nacib e apontou com o dedo as garrafas de “Cana de Ilhéus”. Um olhar suplicante, umas palavras em língua impossível. Já cumprira Nacib, na véspera, seu dever de cidadão, servira cachaça de graça aos marinheiros. Passou o dedo indicador no polegar, a perguntar pelo dinheiro. Vasculhou os bolsos o loiro sueco, nem sinal de dinheiro. Mas descobriu um broche engraçado, uma sereia dourada. No balcão colocou a nórdica mãe-d’água, Yemanjá de Estocolmo. Os olhos do árabe fitavam Gabriela a dobrar a esquina por detrás da Igreja. Mirou a sereia, seu rabo de peixe. Assim era a anca de Gabriela. Mulher tão de fogo no mundo não havia, com aquele calor, aquela ternura, aqueles suspiros, aquele langor. Quanto mais dormia com ela, mais tinha vontade. Parecia feita de canto e dança, de sol e luar, era de cravo e canela. Nunca mais lhe dera um presente, uma tolice de feira. Tomou da garrafa de cachaça, encheu um copo grosso de vidro, o marinheiro suspendeu o braço, saudou em sueco, emborcou em dois tragos, cuspiu. Nacib guardou no bolso a sereia dourada, sorrindo. Gabriela riria contente, diria a gemer: “precisava não, moço bonito ...” E aqui termina a história de Nacib e Gabriela, quando renasce a chama do amor de uma brasa dormida nas cinzas do peito.
E assim nas calhas de roda Gira, a entreter a razão, Esse comboio de corda
tor apresenta as informações numa linguagem altamente conotativa. a) ... soltou um bafo pesado de álcool na cara de Nacib... b) Os olhos do árabe fitavam Gabriela a dobrar a esquina... c) Já cumprira Nacib, na véspera, seu dever de cidadão... d) Mas descobriu um broche engraçado, uma sereia dourada. e) Parecia feita de canto e dança, de sol e luar, era de cravo e canela.
Questão 02. a) No primeiro texto, pelas alusões: “digo da palavra”, “demito o verso”. No segundo texto, nas quadras antológicas de Fernando Pessoa: “O poeta é um fingidor”, “E os que leem o que ele escreve”, “dor lida”, referências ao fazer poético e à recepção da poesia. b) Os dois textos apresentam propostas divergentes: o primeiro sugere a escritura, a grafia que se faz, ou que alguém faz, da alma (“psico”, “psiquê”), do eu lírico; o segundo identifica, pelo prefixo “auto”, a concepção do “eu” poemático sobre o fazer poético e sobre a recepção da poesia pelo leitor. “Fingidor” é um articulado jogo verbal (paronomásia): “fingidor” (adjetivo) e “finge” (verbo) e “dor” (substantivo).
691
C14 Funções da linguagem
Assinale a alternativa que contém um trecho em que o auE os que leem o que escreve, Na dor lida sentem bem, Não as duas que ele teve, Mas só as que eles não têm.
Português
ssimo
com não utro
Exercícios Complementares 01. (Gama Filho RJ) Texto Sempre existem novas formas de chegar a um mesmo resultado. Muitas vezes, melhor. A comunicação eficaz consistem sempre numa forma original de dizer mais ou menos as mesmas coisas. Porque no fundo, vamos ser honestos, o que tem de ser dito varia pouco. Qual é a pasta de dentes que não deixa os dentes mais brancos? A margarina que não é mais gostosa? O seguro que não protege sua família? O perfume que não provoca romances? Giuseppe Glacosa, que escreveu o libreto da ópera La Bohême para Puccini, afirmou certa vez que em toda a literatura produzida pela humanidade desde os gregos só existiam 148 situações dramáticas possíveis. Em “marketing” é igual. As situações que um produto enfrenta num mercado não são infinitas. Elas se repetem. O que varia é a forma como se abordam essas situações. As pessoas em geral não estão interessadas nos produtos em si. Estão interessadas no benefício que podem tirar desses produtos. Um Rolex torna a pessoa distinta. Um carro esporte torna o dono mais jovem. Um creme de beleza engana a morte. Quais as chances de você ser percebido? Tem de usar talento. Mais um tipo específico de talento: o talento de comunicar. Júlio Ribeiro In Revista Exame, 14/09/94, pp. 110-111 (adaptação)
As funções da linguagem predominantes no primeiro e no último parágrafos do texto são, respectivamente: a) emotiva e fática. b) conativa e metalinguística. c) emotiva e referencial. d) referencial e conativa. e) fática e metalinguística. 02. (Unirio RJ) C14 Funções da linguagem
APELO Amanhã faz um mês que a Senhora está longe de casa. Primeiros dias, pra dizer a verdade, não senti falta, bom chegar tarde, esquecido na conversa de esquina. Não foi ausência por uma semana: o batom ainda no lenço, o prato na mesa por engano, a imagem de relance no espelho.
692
Com os dias, Senhora, o leite primeira vez coalhou. A notícia de sua perda veio aos poucos: a pilha de jornais ali no chão, ninguém os guardou debaixo da escada. Toda a casa era um corredor deserto, e até o canário ficou mudo. Para não dar parte de fraco, ah, Senhora, fui beber com os amigos. Uma hora da noite e eles se iam e eu ficava só, sem o perdão de sua presença a todas as aflições do dia, com a última luz na varanda. E comecei a sentir falta das pequenas brigas por causa do tempero na salada – o meu jeito de querer bem. Acaso é saudade. Senhora? Às suas violetas, na janela, não lhes poupei água e elas murcham. Não tenho botão na camisa, calço a meia furada. Que fim levou o saca-rolhas? Nenhum de nós sabe, sem a Senhora, conversar com os outros: bocas raivosas mastigando. Venha para casa, Senhora, por favor.” DALTON TREVISAN, “Apelo”, em O Conto Brasileiro Contemporâneo (seleção de textos, introdução e notas bibliográficas por Alfredo Bosi) 2ª ed., São Paulo, Cultrix, 1977, p.190.
A eclosão do apelo, no terceiro parágrafo, vai-se construindo por meio de uma função da linguagem nele predominante e que se denomina função: a) poética. b) fática. c) apelativa. d) emotiva. e) referencial. 03. (ITA SP) Assinale a opção que apresenta a função da linguagem predominante nos fragmentos a seguir: (I) Mana Rosa quase que aceitava, de uma vez, para resolver a situação, tal o embaraço em que se achavam. Estiveram um momento calados. − Gosta de versos? − Gosto... − Ah! Pousou os olhos numa oleografia. − É brinde de farmácia? − É. − Bonita... − Acha? − Acho... Boa reprodução... (Orígenes Lessa, O feijão e o sonho)
(II) Sentavam-se no que é de graça: banco de praça pública. E ali acomodados, nada os distinguia do resto do nada. Para a grande glória de Deus. Ele: - Pois é.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
(Clarice Lispector, A hora da estrela)
a) Poética. b) Fática. c) Referencial. d) Emotiva. e) Conativa. 04. (Unirio RJ) INTERROGAÇÕES 1 “Certa vez estranhei a ausência de espelhos nos sonhos. 2 Talvez porque neles não nos podemos ver, como no velho conto do homem que perdeu a sombra. 3 Pelo contrário, seremos tão nós mesmos a ponto de dispensar o testemunho dos reflexos? 4 Ou será tão outra a nossa verdadeira imagem- e aqui começa um arrepio de medo- que seríamos incapazes de a reconhecer naquilo que de repente nos olhasse do fundo de um espelho? 5 Em todo caso, lá deve ter suas razões o misterioso cenarista dos sonhos...” (Mario Quintana)
“... seremos tão nós mesmos a ponto de dispensar o testemunho dos reflexos?” (par.3) A passagem anterior apresenta, predominantemente, as funções: a) conativa e emotiva. b) emotiva e poética. c) referencial e apelativa. d) fática e metalinguística. e) metalinguística e conativa. 05. (Unirg TO) Quando nos comunicamos, desejamos materializar nossas intenções. O sujeito falante comunica-se quando quer expor uma intenção qualquer. Portanto, a cada intenção específica do sujeito que se comunica corresponde uma função de linguagem. Considerando essas informações, analise as afirmativas a seguir: I. No conto “A sereníssima república”, de Machado de Assis, além da função referencial, predomina a função conativa ou expressiva da linguagem, pois o Cônego Vargas faz um discurso em que interpela fortemente seus interlocutores. II. Em Breve espaço entre cor e sombra, Cristóvão Tezza introduz a “epístola” para assimilar diferentes aspectos da realidade. A voz epistolar é longa, ocupa 54 páginas do romance de 266. Essa carta é escrita por uma italiana que encontrou o personagem Tato em Nova Iorque. Predomina nessa carta a função conativa ou imperativa da linguagem.
III.
A função expressiva é predominante no conto “Mater dolorosa” do livro A emparedada e outros contos, de Olívia Sarmento, pois a narradora relata suas memórias, impressões e sentimentos pessoais.
Está(ão) correto(s) o(s) item(ns): a) I. b) II. c) III. d) I, II e III. 06. (Mackenzie SP) I Como são belos os dias Do despontar da existência! — Respira a alma inocência Como perfumes a flor; O mundo – um sonho dourado, A vida – um hino d’amor! Casimiro de Abreu
II Lembramo-nos (...), com saudade hipócrita, dos felizes tempos; como se a mesma incerteza de hoje, sob outro aspecto, não nos houvesse perseguido outrora e não viesse de muito longe a enfiada de decepções que nos ultrajam. Eufemismo, os felizes tempos, eufemismo apenas, igual aos outros que nos alimentam a saudade dos dias que correram como melhores. Bem considerando, a atualidade é a mesma em todas as datas. Raul Pompeia
Com relação ao texto I, é correto afirmar que: a) a métrica regular, as rimas alternadas e a temática bucólica são traços típicos do lirismo setecentista do autor. b) o tom exclamativo, associado ao tema do mito do primeiro amor, comprova seu estilo parnasiano. c) o predomínio de orações subordinadas na recriação da infância perdida revela que o texto é renascentista. d) o tom irreverente dos dois primeiros versos e a linguagem formal comprovam seu estilo modernista. e) a idealização do passado e a linguagem emotiva são índices do estilo romântico. 07. (PUC SP) Observe a seguinte afirmação feita pelo autor: “Em nossa civilização apressada, o “bom dia”, o “boa tarde” já não funcionam para engatar conversa. Qualquer assunto servindo, fala-se do tempo ou de futebol.” Ela faz referência à função da linguagem cuja meta é “quebrar o gelo”. Indique a alternativa que explicita essa função. a) Função emotiva b) Função referencial c) Função fática d) Função conativa e) Função poética 693
C14 Funções da linguagem
Ela: - Pois é o quê? Ele: - Eu só disse “pois é”! Ela: - Mas “pois é” o quê? Ele: - melhor mudar de conversa porque você não me entende. Ela: - Entender o quê? Ele: - Santa Virgem, Macabéa, vamos mudar de assunto já.
FRENTE
C
PORTUGUÊS
MÓDULO C15
ASSUNTOS ABORDADOS n Pressuposto e subentendido n Pressupostos n Subentendidos n O não dito das charges
PRESSUPOSTO E SUBENTENDIDO Pressupostos e subentendidos são informações não expressas formalmente, implícitas dentro de um texto, apenas sugeridas por marcas linguísticas ou pelo contexto. Cabe ao leitor, em uma leitura proficiente, ir além da informação que se encontra explícita, identificando e compreendendo as informações implícitas, ou seja, lendo nas entrelinhas. A ideia de implícito em um texto está naquilo que está presente pela ausência, ou seja, o conteúdo implícito pode ser definido como o conteúdo que fica à margem da discussão, porque ele não vem explicitado no texto. Implícito é aquela informação que está por trás das palavras, são os não ditos. Os pressupostos são de mais fácil identificação, estando sugeridos no texto. Os subentendidos são deduzidos pelo leitor, sendo da sua responsabilidade. Exemplos: n Heloísa está cansada de ser professora. Pressuposto: Heloísa é professora. Subentendido: Talvez porque o salário é baixo ou há muita indisciplina. n
Infelizmente, meu marido continua trabalhando fora do país. Pressuposto: O marido está trabalhando fora do país e a mulher não está satisfeita com essa situação. Subentendido: Talvez por ter melhor salário fora do país ou por não encontrar trabalho no seu país.
Pressupostos
Fonte: Shutterstock.com
Os pressupostos são informações implícitas adicionais, facilmente compreendidas devido a palavras ou expressões presentes na frase que permitem ao leitor compreender essa informação implícita. O enunciado depende dessa pressuposição para que faça sentido. Assim, o pressuposto é verdadeiro e irrefutável. Nesse sentido, uma informação é considerada pressuposta quando um enunciado depende dela para fazer sentido. Considere, por exemplo, a seguinte pergunta: “Quando Patrícia voltará para casa?”. Esse enunciado só faz sentido se considerarmos que Patrícia saiu de casa, ao menos temporariamente – essa é a informação pressuposta. Caso Patrícia se encontre em casa, o pressuposto não é válido, o que torna o enunciado sem sentido.
694
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Repare que as informações pressupostas estão marcadas por meio de palavras e expressões presentes no próprio enunciado e resultam de um raciocínio lógico. Portanto, no enunciado “Patrícia ainda não voltou para casa”, a palavra “ainda” indica que a volta de Patrícia para casa é dada como certa pelo falante. Exemplos de pressupostos: n Decidi deixar de comer carne. Pressuposto: A pessoa comia carne antes. n
n
n
Finalmente acabei minha monografia. Pressuposto: Demorou algum tempo para terminar a monografia. Alunos que estudam de manhã costumam ter melhor rendimento. Pressuposto: Há alunos que não estudam de manhã.
nuações. O uso de subentendidos faz com que o enunciador se esconda atrás de uma afirmação, pois não quer se comprometer com ela. Por isso, dizemos que os subentendidos são de responsabilidade do receptor, enquanto os pressupostos são partilhados por enunciadores e receptores. Em nosso cotidiano, somos cercados por informações subentendidas. A publicidade, por exemplo, parte de hábitos e pensamentos da sociedade para criar subentendidos. Já a anedota é um gênero textual cuja interpretação depende da quebra de subentendidos. Exemplos de subentendidos: n Quando sair de casa, não se esqueça de levar um casaco. Subentendido: Está frio lá fora. n
Subentendidos: Quero beber um copo de água ou quero parar de falar neste momento.
Desde que ela mudou de casa, nunca mais a vi. Pressuposto: Costumava vê-la antes dela mudar de casa.
Marcas linguísticas que facilitam a identificação de pressupostos: n Verbos que indicam fim, continuidade, mudança e implicações: começar, continuar, parar, deixar, acabar, conseguir entre outros. n Advérbios: felizmente, finalmente, ainda, já, depois, antes entre outros. n Pronome relativo introdutório de orações subordinadas adjetivas: que, o (a) (s) qual (is), onde, cujo entre outros. n Locuções que indicam circunstâncias: depois que, antes que, desde que, visto que entre outros.
Já tenho a garganta seca de tanto falar.
n
Você vai a pé para casa agora? Subentendidos: Eu posso lhe dar uma carona ou é perigoso andar a pé na rua a estas horas.
O não dito das charges
Subentendidos
Fonte: Shutterstock.com
Ao contrário das informações pressupostas, as informações subentendidas não são marcadas no próprio enunciado, são apenas sugeridas, ou seja, podem ser entendidas como insi-
Na charge acima, há uma crítica em relação à falta de memória e de compromisso do cidadão em relação ao voto. Além disso, no segundo quadrinho, fica subentendido, ou seja, implícito, que o político fez algo de errado em seu governo, porém não sofre retaliações por isso. Percebam que o conhecimento de mundo ajuda bastante na interpretação, além, claro, de uma observação dos elementos linguísticos envolvidos (jogo de palavras e desenho). C15 Pressuposto e subentendido
Os subentendidos são insinuações, informações escondidas, dependentes da interpretação do leitor. Não possuem marca linguística, sendo deduzidos através do contexto comunicacional e do conhecimento que os destinatários têm do mundo. Podem ser ou não verdadeiros e podem ser facilmente negados, visto serem unicamente da responsabilidade de quem interpreta a frase.
695
Português Questão 02. O trecho do soneto no qual se assinala a passagem de uma estação do ano para outra é: “O tempo cobre o chão de verde manto, / que já coberto foi de neve fria”. A expressão “verde manto” refere-se à primavera, subsequente ao inverno, representado pelas palavras “neve fria”. A mudança de estação indicada pelo eu lírico não ilustra uma alteração aprazível, pois o primeiro verso da terceira estrofe afirma que a passagem do tempo “converte em choro o doce canto”.
Exercícios de Fixação Texto comum às questões 01 e 02 Leia o soneto “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades” do poeta português Luís Vaz de Camões (1525?-1580). Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, muda-se o ser, muda-se a confiança; todo o mundo é composto de mudança, tomando sempre novas qualidades.
Boris Schnaiderman, Dostoiévski Prosa Poesia.
03. (Fuvest SP) Tendo em vista que algumas das recomendações do autor, relativas à prática da tradução, fogem do senso comum, pode-se qualificá-las com o seguinte termo, de uso relativamente recente: a) dubitativas. b) contraintuitivas. c) autocomplacentes. d) especulativas. e) aleatórias.
Continuamente vemos novidades, diferentes em tudo da esperança1; do mal ficam as mágoas na lembrança, e do bem – se algum houve –, as saudades. O tempo cobre o chão de verde manto, que já coberto foi de neve fria, e enfim converte em choro o doce canto. E, afora este mudar-se cada dia, outra mudança faz de mor2 espanto: que não se muda já como soía3. (Sonetos, 2001.)
esperança: esperado. 2 mor: maior. 3 soer: costumar (soía: costumava). 1
01. (Unesp SP) Elipse: figura de sintaxe pela qual se omite um termo da oração que o contexto permite subentender. (Domingos Paschoal Cegalla. Dicionário de dificuldades da língua portuguesa, 2009. Adaptado.)
Transcreva o verso em que se verifica a elipse do verbo. Identifique o verbo omitido nesse verso. Para o eu lírico, qual das mudanças assinaladas ao longo do soneto lhe causa maior perplexidade? Justifique sua resposta, com base no texto. 02. (Unesp SP) Em um determinado trecho do soneto, o eu lírico assinala a passagem de uma estação do ano para outra. Transcreva os versos em que isso ocorre e identifique as estações a que eles fazem referência. Para o eu lírico, tal passagem constitui um evento aprazível? Justifique sua resposta. C15 Pressuposto e subentendido
Texto comum às questões 03 e 04 Evidentemente, não se pode esperar que Dostoiévski seja traduzido por outro Dostoiévski, mas desde que o tradutor procure penetrar nas peculiaridades da linguagem primeira, aplique-se com afinco e faça com que sua criatividade orientada pelo original permita, paradoxalmente, afastar-se do texto para ficar mais próximo deste, um passo importante será dado. Deixando de lado a fidelidade mecânica, frase por frase, tratando o
696
original como um conjunto de blocos a serem transpostos, e transgredindo sem receio, quando necessário, as normas do “escrever bem”, o tradutor poderá trazê-lo com boa margem de fidelidade para a língua com a qual está trabalhando.
04. (Fuvest SP) De acordo com o texto, a boa tradução precisa a) evitar a transposição fiel dos conteúdos do texto original. b) desconsiderar as características da linguagem primeira para poder atingir a língua de chegada. c) desviar-se da norma-padrão tanto da língua original quanto da língua de chegada. d) privilegiar a inventividade, ainda que em detrimento das peculiaridades do texto original. e) buscar, na língua de chegada, soluções que correspondam ao texto original. 05. (Fuvest SP) A adoção do cardápio indígena introduziu nas cozinhas e zonas de serviço das moradas brasileiras equipamentos desconhecidos no Reino. Instalou nos alpendres roceiros a prensa de espremer mandioca ralada para farinha. Nos inventários paulistas é comum a menção de tal fato. No inventário de Pedro Nunes, por exemplo, efetuado em 1623, fala-se num sítio nas bandas do Ipiranga “com seu alpendre e duas camarinhas no dito alpendre com a prensa no dito sítio” que deveria comprimir nos tipitis toda a massa proveniente do mandiocal também inventariado. Mas a farinha não exigia somente a prensa – pedia, também, raladores, cochos de lavagem e forno ou fogão. Era normal, então, a casa de fazer farinha, no quintal, ao lado dos telheiros e próxima à cozinha. Carlos A. C. Lemos, cozinhas, etc.
Traduz corretamente uma relação espacial expressa no texto o que se encontra em: a) A prensa é paralela aos tipitis. b) A casa de fazer farinha é adjacente aos telheiros. c) As duas camarinhas são transversais à cozinha. d) O alpendre é perpendicular às zonas de serviço. e) O mandiocal e o Ipiranga são equidistantes do sítio.
Questão 01. A omissão mais flagrante do verbo ocorre no quarto verso da segunda estrofe: “e do bem – se algum houve –, as saudades”. Trata-se de zeugma, pois o verbo ficar, que aparece no verso anterior, foi omitido e, em seu lugar, foi empregada uma vírgula: e do bem – se algum houve –, ficam as saudades. Pode-se também considerar a elipse do verbo no segundo verso da segunda estrofe, “diferentes em tudo da esperança”, em que o verbo ser, que aparece na estrofe anterior, foi omitido: “novidades / que são diferentes em tudo da esperança”. A mudança que causa maior espanto ao eu lírico aparece no último verso “que não se muda já como soía”, ou seja, a mudança já não ocorre como costumava, indicando que até a própria mudança está à mercê de transformação.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias Questão 01. Para o personagem da tirinha, a escrita de uma carta, gênero epistolar, que deveria ser algo pessoal e verídico, é usada como criação imaginativa, uma vez que difere do que ele fala: “É escrever uma coisa enquanto falo outra”. Dessa forma, o gênero epistolar se assemelha a gêneros tradicionalmente ficcionais como o romance e o conto.
Questão 03.O autor constrói uma analogia entre a cerimônia de casamento e uma peça teatral. Com referência à noiva, um dos trechos remete ao fato de ela “estar estreando” em casamentos. No caso do noivo, de ele ter “representado seu papel” com firmeza.
Exercícios Complementares 01. (Fuvest SP)
completamente indiferente à representação, como se não participasse dela. A música também foi mal escolhida, numa prova de terrível mau-gosto. O fato de a noiva chegar atrasada também deixou altamente impacientes os espectadores, que mostraram evidentes sinais de nervosismo. A sua entrada, porém, foi espetacular, e rendeu-lhe os melhores parabéns ao fim do espetáculo. Lamentamos apenas – e tomamos como um deplorável sinal dos tempos – a qualidade do arroz jogado sobre os noivos. (Adaptado de Millôr Fernandes, Trinta anos de mim mesmo. São Paulo: Círculo do livro, 1972, p. 78.)
O cronista recorre à analogia para construir uma aproximação entre o casamento e uma peça teatral. Mostre, com trechos do texto, dois usos desse recurso: um com referência à noiva e outro com referência ao noivo. 04. (Unicamp SP) Os anos correm entre um século e outro, mas os problemas permanecem os mesmos para os A dificuldade explicitada no último quadrinho verifica-se
kalungas*. Quilombolas** que há mais de 200 anos en-
apenas na redação de cartas ou ocorre também na re-
contraram lar entre os muros de pedra da Chapada dos
dação dos gêneros textuais romance e conto? Justifique
Veadeiros, na região norte do Estado de Goiás, os kalun-
sua resposta.
gas ainda vivem com pouca ou quase nenhuma infraes-
É menor pecado elogiar um mau livro, sem lê-lo, do que depois de o haver lido. Por isso, agradeço imediatamente depois de receber o volume.
trutura. De todos os abusos sofridos até hoje, um em particular deixa essa comunidade em carne viva: os silenciosos casos de violência sexual contra meninas. Entretanto, passado o afã das denúncias de abuso sexual que figuraram em grandes reportagens da imprensa nacional
Carlos Drummond de Andrade, Passeios na ilha.
em abril do ano passado, a comunidade retornou ao seu
Explique por que o autor agradece “imediatamente depois
curso natural. E assim os kalungas continuam a viver no
de receber o volume”. tura do livro recebido de presente. Assim, o escritor
Segundo o autor, o agradecimento prescinde da lei-
esquecimento, no abandono e, principalmente, no medo.
se esquivaria da possibilidade de elogiar um livro que poderia não lhe agradar.
As vítimas não viram seus algozes punidos. O silêncio pre-
03. (Unicamp SP) Leia a seguir a crônica adaptada “O crítico teatral vai ao casamento”, de Millôr Fernandes.
Como espetáculo, o casamento da Senhorita Lídia Teles de Souza com o Sr. Herval Nogueira foi realmente um dos mais irregulares a que temos assistido nos últimos
valece e grita alto naquelas que se arriscaram a mostrar suas feridas. O sentimento é o de ter se exposto em vão. (Adaptado de Jéssica Raphaela e Camila Silva, O silêncio atrás da serra. Revista Azmina. Disponível em http://azmina.com.br/secao/osilencio- atras-da-serra/. Acessado em 03/10/ 2016.)
tempos. A noiva parecia muito nervosa, nervosismo jus-
* Kalungas: habitantes da comunidade do quilombo Kalun-
tificado por estar estreando em casamentos (o que não
ga, maior território quilombola do país.
se podia dizer do noivo, que tem muita experiência de al-
** Quilombolas: termo atribuído aos “remanescentes de
tar) de modo que até sua dicção foi prejudicada. O noivo
quilombosˮ. Atualmente, há no Brasil cerca de 2 600 co-
representou o seu papel com firmeza, embora um tanto
munidades quilombolas certificadas pela Fundação Cultural
frio. Disse “sim” ou “aceito” (não ouvimos bem porque a
dos Palmares.
acústica da abadia é péssima). Fora os pequenos senões notados, teremos que chamar a atenção, naturalmente,
Identifique no texto dois motivos para o sofrimento históri-
para o coroinha, que a todo momento coçava a cabeça,
co vivido pela comunidade quilombola Kalunga. Questão 04. O sofrimento histórico dos kalungas deve-se à quase completa falta de infraestrutura com que sempre viveram e à violência sexual contra as meninas da comunidade, que continua a viver no esquecimento, no abandono e no medo.
697
C15 Pressuposto e subentendido
02. (Fuvest SP) Examine a seguinte citação:
FRENTE
C
PORTUGUÊS
MÓDULO C16
ASSUNTOS ABORDADOS n Humor e ironia n Humor n Ironia
HUMOR E IRONIA O humor e a ironia são efeitos de sentidos que um autor pode utilizar em seu texto a fim de que ele motive seu leitor e o entretenha até o final da leitura. De modo geral, quando o autor emprega tais recursos, ele objetiva fazer uma crítica a um aspecto pontual da sociedade. Todavia, o emprego do humor e da ironia podem ocorrer sem, necessariamente, um alvo crítico. A melhor maneira de se estudar humor e ironia é lendo textos que se valham desses recursos. Desse modo, você verá a seguir diversos exemplos, dentro dos quais existem frases irônicas e humorísticas. Tente identificar a diferença entre esses recursos.
Humor Texto 1 Reações do álcool Na aula de química, o professor pergunta: – Quais as principais reações do álcool? O aluno responde: – Chorar pela ex-namorada, achar que está rico, ficar valente e ser amigo de todo mundo. Professor: – Tirou 10! Texto 2 Haja coração! A professora pergunta: — Quantos corações nós temos? O aluno: — Temos dois, professora! — Dois? — Sim: o meu e o seu! Texto 3 Verbos A professora pergunta para a Mariazinha: — Mariazinha, me dê um exemplo de verbo. — Bicicreta! — respondeu a menina. — Não se diz “bicicreta”, e sim “bicicleta”. Além disso, bicicleta não é verbo. Pedro, me diga você um verbo. — Prástico! — disse o garoto. 698
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
— É “plástico”, não “prástico”. E também não é verbo. Laura, é sua vez: me dê um exemplo correto de verbo — pediu a professora. — Hospedar! — respondeu Laura. — Muito bem! — disse a professora. Agora, forme uma frase com este verbo. — Os pedar da bicicreta é de prástico!
Ironia Texto 1 Leia a seguir os famosos versos do poeta modernista Mário de Andrade: “Moça linda bem tratada, Três séculos de família, Burra como uma porta: Um amor”. Texto 2 Leia a seguir os famosos versos do poeta modernista Carlos Drummond de Andrade: Cidade grande “Que beleza, Montes Claros. Como cresceu Montes Claros. Quanta indústria em Montes Claros. Montes Claros cresceu tanto, ficou urbe tão notória, prima-rica do Rio de Janeiro, que já tem cinco favelas por enquanto, e mais promete.”
Fonte: Shutterstock.com
Texto 3 Leia a seguir um trecho irônico do romance Memória póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis:
C16 Humor e ironia
“Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis”.
699
odualista Bor-
Português
Exercícios de Fixação 01. (Unimontes MG) Neste texto, publicado no Jornal do Commercio on-line, há uma interessante articulação entre palavra e imagem.
A presença do poema de Drummond no texto da publicidade pode ser reconhecida a partir das seguintes pistas, EXCETO: a) o texto se organiza em versos. b) a palavra “pedra” guarda o sentido, oriundo do poema, de obstáculo. c) A expressão “no meio do caminho” remete à imagem de “no meio da rua”, o lugar de trânsito livre. d) a palavra “pedra”, material sólido, da classe dos minerais, é significada no poema como impureza, algo imundo que afasta do caminho os transeuntes.
Disponível em: <jconlineblogs.ne10.uol.com.br>, acesso em: 04 set. 2014.
Analisando-se esse texto, pode-se afirmar sobre o sentido que se constrói: a) Não há investimento sem risco social, e o progresso é mais benéfico que prejudicial à sociedade. b) O trânsito atual, com a lentidão provocada pelo número de veículos, provoca nos motoristas o desejo de um retorno ao passado. c) O progresso tem um custo: a imobilidade do trânsito, por exemplo. d) O progresso deve ser compreendido pelo indivíduo como um dever moral e social, acima da inoperância do trânsito.
03. (Mackenzie SP) Quanto eu tiver setenta anos quando eu tiver setenta anos então vai acabar esta minha adolescência vou largar da vida louca e terminar minha livre docência vou fazer o que meu pai quer começar a vida com passo perfeito
02. (PUC MG) Leia os textos abaixo. vou fazer o que minha mãe deseja
No meio do caminho Tinha uma pedra... E nha uma ponta de cigarro E uma lata. E um plás co. E até cacos de vidro.
aproveitar as oportunidades de virar um pilar da sociedade e terminar meu curso de direito então ver tudo em sã consciência quando acabar esta adolescência Paulo Leminski
Assinale a alternativa correta. a) Uma expressão-chave que definiria o poema seria: “em
No meio do caminho No meio do caminho nha uma pedra nha uma pedra no meio do caminho nha uma pedra no meio do caminho nha uma pedra. C16 Humor e ironia
Nunca me esquecerei desse acontecimento na vida de minhas re nas tão fa gadas. Nunca me esquecerei que no meio do caminho nha uma pedra nha uma pedra no meio do caminho no meio do caminho nha uma pedra.
700
busca do tempo perdido”. b) Nascido em Curitiba, Paulo Leminski faz parte da segunda geração do modernismo brasileiro, tendo aderido à contracultura e à poesia marginal. c) A ausência de humor e ironia são verificáveis em versos como: quando eu tiver setenta anos/então vai acabar esta minha adolescência. d) As construções verbais predominantes no poema denotam um plano de vida ironizado pelo eu lírico. e) O poema de Leminski faz uma leitura melancólica e subjetiva sobre uma trajetória de vida.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Exercícios Complementares 01. (Fac. Baiana de Direito BA)
03. (UERN) Todo gênero é marcado por sua esfera de atuação que promove modos específicos de combinar, indissoluvelmente, conteúdo temático, propósito comunicativo, estilo e composição. (KOCH, Ingedore Villaça; ELIAS, Vanda Maria. Ler e compreender: os sentidos do texto. São Paulo: Contexto, 2012.)
ELVIS. Manifestações. Disponível em: <www.google.com.br>. Acesso em: mar. 2017.
Para identificar o efeito do humor dessa charge, o leitor deve perceber que a) o caráter polissêmico do termo “jeitinho” transforma a resposta em crítica à habilidade criativa do brasileiro para sanar problemas. b) o uso de marcas linguísticas próprias da informalidade faz uma referência zombeteira ao linguajar descuidado do povo. c) o sinal de interrogação seguido de uma exclamação sugere ironia em relação ao fato enfocado. d) o emprego da palavra “gente” inclui o locutário no grupo dos que agem de modo ético, esquivando-se sempre da malandragem característica de algumas pessoas públicas. e) a expressão “vergonha na cara” é uma maneira de retomar as repreensões antigas de pais para filhos, objetivando mostrar o derespeito ao outro que grassa no País hoje em dia. 02. (Unirg TO)
(Disponível em: http://projetoakatu.blogspot.com.br/. Acesso em: novembro de 2014.)
Tendo em vista a tirinha anterior, é correto afirmar acerca do ponto de vista do conteúdo temático que é possível identificar a) a descrição de um acontecimento de ordem social. b) o emprego do humor para apresentar opiniões contrastantes. c) uma crítica acerca de uma situação que produz efeito negativo. d) a expressão verbal dos sentimentos e posicionamento dos personagens. 04. (Unipas PB) Anedota Búlgara Era uma vez um czar naturalista que caçava homens. Quando lhe disseram que também se [caçam borboletas e andorinhas, ficou muito espantado e achou uma barbaridade.
(http://www.gazetadopovo.com.br/. Acesso em 29/04/17)
Analise as imagens e as palavras da charge acima e marque o recurso estilístico usado pelo chargista na construção do humor: a) ironia. b) metalinguagem. c) antítese. d) prosopopeia.
Quanto aos recursos de estilo tipicamente modernista presentes no poema, assinale V, para as proposições verdadeira e F, para as a falsas. ( ) O poema é composto em versos chamados “livres”, pois não obedecem às convenções da métrica tradicional, isossilábica. ( ) No poema, há o registro de linguagem coloquial, característico das narrativas orais. ( ) O humor, no poema (outro ingrediente de predileção modernista), é essencial ao efeito crítico que compromete a sua estrutura poética. ( ) No poema, percebe-se uma fina ironia sobretudo nos versos “ficou muito espantado/ e achou uma barbaridade”
701
C16 Humor e ironia
Carlos Drummond de Andrade, “Alguma poesia”
Português
A alternativa que contém a sequência correta, de cima para baixo, é a 01. V V F V 02. F F V F 03. V V V V 04. V F V F 05. F V F V 05. (Enem MEC)
a) “Considero a televisão muito educativa. Cada vez que alguém na sala liga o aparelho vou para o quarto ler um livro.” (Groucho Marx) b) “Gosto de televisão porque ela me permite falar coisas sobre as quais não acho que valha a pena escrever.” (Truman Capote) c) “A televisão é um veículo de diversão que permite a milhões de pessoas ouvir a mesma piada ao mesmo tempo e, ainda assim, continuar solitárias.” (T. S. Eliot) d) “Só depois que a tecnologia inventou o telefone, o telégrafo, a televisão, a internet, foi que se descobriu que o problema de comunicação mais sério era o de perto.” (Millôr Fernandes) e) “Condenar a televisão seria tão ridículo como excomungar a eletricidade e a teoria da gravidade.” (Federico Fellini) 07. (PUC RS) Leia o trecho extraído de “Maria-Fumaça”, de autoria de Mario Quintana, e analise as afirmativas que seguem. “As lentas, poeirentas, deliciosas viagens nos trens antigos. As famílias (viajavam famílias inteiras) levavam galinhas com farofa em cestas de vime, que ofereciam, pois não, aos viajantes solitários.
CARVALHO, F. R. New Look, Experiência n. 3, 1956. Disponível em: www.carbono-quatorze.com.br. Acesso em: 3 mar. 2012.
Em 1956, o artista Flávio de Resende Carvalho desfilou pela Avenida Paulista com o traje New Look, uma proposta tropical para o guarda-roupa masculino. Suas obras mais conhecidas são relacionadas às performances. A imagem permite relacionar como características dessa manifestação artística o uso a) da intimidade, da política e do corpo. b) do público, da ironia e da dor. c) do espaço urbano, da intimidade e do drama. d) da moda, do drama e do humor. e) do corpo, da provocação e da moda.
C16 Humor e ironia
06. (Unifor CE)
Marque a opção que relaciona a frase à tirinha.
702
E os viajantes solitários (e os meninos) ainda desciam nas estaçõezinhas pobres... Para os pastéis, os sonhos, as laranjas... (...) O mal dos aviões é que não se pode descer a toda hora para comprar laranjas. Nesses aviões, vamos todos imóveis e empacotados como encomendas. Às vezes encomendas para a Eternidade... Cruzes, poeta! Deixa-te de ideias funéreas e pensa nas aeromoças, arejadas e amáveis como anjos. E “anjos”, aplicado a elas, não é exagero nenhum. (...) Entre a monotonia irreparável das nuvens, nada vemos da viagem. Isto é, não viajamos: chegamos. Pobres turistas de aeroportos, damos a volta ao mundo sem nada ver do mundo. I. Nesse texto, Mario Quintana retira a matéria para sua criação literária do tema da viagem, comparando diferentes modalidades de transporte e hábitos dos viajantes. II. Valendo-se de uma linguagem simples, com frases irônicas e com humor, Mario Quintana reflete sobre a função da viagem e o seu significado para o viajante. III. Para o poeta, viajar de avião não concretiza o verdadeiro prazer da viagem, que estaria mais no ato de ver, experimentar, conhecer, do que no percurso partida-chegada. A(s) afirmativa(s) correta(s) é/são: a) I, apenas. b) II, apenas. c) I e III, apenas. d) II e III, apenas. e) I, II e III.
FRENTE
C
PORTUGUÊS
Exercícios de Aprofundamento A enxada [...] Na Forquilha, recebeu Supriano um pedaço de mato derrubado, queimado e limpo. Era do velho Terto, que não pôde tocar por ter morrido de sezão. Como o delegado houvesse aprevenido o novo dono de que Piano era muito velhaco, ao entregar a terra Elpídio ponderou muito braboso: — Quero ver que inzona você vai inventar para não plantar a roça... Olha lá que não sou quitanda! Supriano não tinha inzona nenhuma. Perguntou, porque foi só isso que veio à mente do coitado: — E a enxada, adonde que ela está, nhô? Elpídio quase que engasga com o guspe de tanta jeriza: — Nego à toa, não vale a dívida e ainda está querendo que te dê enxada! Hum, tem muita graça! Piano era trabalhador e honesto. Devia ao delegado porque ninguém era homem de acertar contas com esse excomungado. Pior que Capitão Benedito em três dobros. Se, porém, lhe pagassem o trabalho, capaz de aprumar. Não tinha muita saúde, por via do papo, mas era bom de serviço. Assim, diante da zoada do patrão, foi pelando-se de medo que o camarada arriscou um pedido: — Me perdoa a confiança, meu patrão, mas mecê fia a enxada da gente e na safra, Deus ajudando, a gente paga com juro... — Ocê que paga, seu berdamerda! — E Seu Elpídio ficou mais irado ainda. — Te dou enxada e ocê fica devendo a conta do delegado e a enxada pro riba. Não senhor. Vá plantar meu arroz já, já. — Meu patrãozinho, mas plantar sem... — Elpídio o atalhou: — Vai-se embora, nego. E se fugir te boto soldado no seu rasto. (ÉLIS, Bernardo. Melhores contos. 4. ed. São Paulo: Global, 2015. p. 58-59.)
01. (PUC GO) O conto “A enxada”, de Bernardo Élis, publicado em 1966, apresenta um narrador onisciente que narra a luta dramática da personagem Supriano para conseguir uma ferramenta de trabalho, a enxada, que, embora seja o motor de toda a narrativa, está todo o tempo ausente. Há uma busca insana do protagonista para manter-se no mundo do trabalho como forma de sobrevivência. O diálogo entre patrão e empregado, apresentado nesse fragmento (texto), mostra as relações de dominação, de submissão e de poder. Com base na leitura do
a) O narrador apresenta no discurso indireto a linguagem mais erudita, letrada, própria da literatura, e, na fala das personagens, procura afirmar as características do mundo iletrado do trabalhador rural e as marcas do regionalismo goiano. b) O narrador recorre com insistência ao recurso do discurso direto para que as próprias personagens possam demarcar, na narrativa, a dialética bem/ mal; dominador/dominado; explorador/explorado. c) O narrador, por ser onisciente, mantém-se à espreita de todos os acontecimentos; procura não se envolver para não elevar à condição de herói o trabalhador do campo em detrimento do patrão que cria as condições de trabalho. d) O narrador se identifica e se solidariza com o protagonista Piano por meio de elementos regionais da linguagem, do discurso indireto livre, da adjetivação e da empatia com o que pensa e sente a personagem. 02. (Unifor CE) Joyce é o único que enxerga um pouco, mas perdeu seus óculos. Só enxerga vultos, silhuetas, esboços, primeiros tratamentos, meias palavras, reticências. (...) Súbito, Borges pega alguma coisa. Uma frase. Ergue a mão que segura a frase gotejante e pergunta o que é. Um conceito? Uma estrofe? Em que língua? - É Dublin – diz Joyce. (VERISSIMO, Luis Fernando. Mar de palavras. In: _____. A eterna privação do zagueiro absoluto. Rio de Janeiro: Objetiva, 1999.)
Considerando: I. Discurso direto. II. Discurso indireto. III. Discurso indireto livre. O texto apresenta, apenas a) I. b) I e II. c) I e III. d) II e III. e) I, II e III. 03. (Ufal AL) Graciliano Ramos, em São Bernardo, fala várias vezes, por meio da personagem Paulo Honório, sobre a arte de escrever romance _ o que se pode observar na seguinte passagem: _ Vá para o inferno, Gondim. Está pernóstico, está safado, está idiota. Há lá ninguém que fala dessa forma.
conto, nesse fragmento e na assertiva acima, assinale a alternativa que melhor caracteriza o discurso do narrador:
(...) Foi assim que sempre se fez. A literatura é a literatura, Seu 703
Português Questão 03. Função metalinguística. Centrada no código, apresenta a linguagem falando sobre a própria Linguagem. Tem a finalidade de definir, explicar e ensinar.
Paulo. A gente discute, briga, trata de negócios, naturalmente, mas arranjar palavras com tinta é outra coisa. Se eu fosse escrever como falo, ninguém me lia. Identifique a função predominante da linguagem exemplificada no texto. Justifique sua resposta. 04. (PUC MG) Leia atentamente o poema a seguir.
e ficar entediado. Você passa bons 26 momentos com seus amigos e não se encontra com 27 todos os tios e avôs que normalmente frequentam 28 essas cerimônias”, disse Pablo. Adaptado de: http://www.bbc.com/portuguese/ noticias/ 2015/08/150831_falsos_casamentos_tg. Acesso em 07 set. 2016.
A afirmação de Pablo Bonaface, no último parágrafo do texto, permite inferir que
XIII Estou atravessando um período de árvore. O chão tem gula de meu olho por motivo que [meu olho tem escórias de árvore. (...) O chão deseja meu olho por motivo que meu olho [possui um coisário de madeiras O chão tem gula de meu olho pelo mesmo motivo [que ele tem gula por pregos por latas por folhas A gula do chão vai comer meu olho. No meu morrer tem uma dor de árvore.
a) tios e avôs não frequentam casamentos falsos. b) casamentos reais não permitem o encontro com os amigos. c) casamentos reais não fazem parte das cerimônias que ele frequenta. d) casamentos reais são chatos uma vez que se precisa conviver com parentes desconhecidos. e) a possibilidade de escolher a melhor companhia torna os casamentos falsos prazerosos. 06. (Unitau SP) Charges são gêneros textuais que, geralmente, conjugam humor e crítica na proposição dos sentidos.
Sobre ele, é INCORRETO afirmar que: a) privilegia as coisa ínfimas, os restos, o lixo como imagens recorrentes. b) utiliza a repetição como recurso construtivo. c) faz uso de metalinguagem e intertextualidade. d) afirma a identificação do sujeito poético com as coisas. 05. (PUC RS) Festas de casamento falsas viram moda na Argentina Comida gostosa, música boa, bar liberado ____ 02 noite toda... quem nunca ______ até altas horas numa 03 boa festa de casamento? Esse ritual, que muitos já 04 presenciaram ao longo da vida, é, porém, desconhecido 05 para alguns representantes das gerações mais 06 jovens. 07 Mas há uma solução para elas: Casamento Falso 08 (ou Falsa Boda, no nome original em espanhol), uma 09 ideia de cinco amigos de La Plata, na Argentina. O 10 detalhe era que os convidados não eram amigos ou 11 parentes dos noivos, mas ilustres desconhecidos que 12 compraram entradas para o evento. 13 Martín Acerbi, um publicitário de 26 anos, estava 14 cansado de ir sempre ____ mesmas boates. “Queríamos 15 organizar uma festa diferente, original”, disse. E 16 assim pensaram em fazer esse evento “temático”, que 17 chamaram de Casamento Falso. 18 Pablo Boniface, um profissional de marketing de 19 32 anos que esteve em um Casamento Falso em 20 Buenos Aires em julho, disse que para ele foi a ocasião 21 perfeita para realizar algo que sempre quis fazer: 22 colocar uma gravata. 23 “Para mim essas festas são até melhores do que 24 um casamento real, _____ você não precisa se sentar 25 com estranhos
FRENTE C Exercícios de Aprofundamento
01
704
Disponível em: http://jornalggn.com.br/blog/romulus/ponte-para-o%E2%80%9Cburaco%E2%80%9D-a-panaceia-da-flexibilizacao-trabalhista-e-terceirizacao-desenfreada.Acesso em maio de 2017.
Na charge em questão, essa conjugação é construída a partir a) da analogia crítica entre a terceirização do trabalho e a terceira divisão do futebol, evidenciando que os trabalhadores são rebaixados nesse tipo de organização laboral. b) da ênfase ao fato de que trabalhadores terceirizados são aqueles menos competentes e, por isso, devem ser rebaixados em suas funções. c) da sátira aos trabalhadores terceirizados, que acabam por se comportar como jogadores de futebol rebaixados, uma vez que, como eles, não apresentam competência técnica para desenvolver suas funções. d) da ideia implícita, estabelecida entre a relação imagem-texto verbal apresentada na charge, de que as críticas à terceirização não têm importância, podendo, por isso, ser comparadas a times de terceira divisão.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
e) da ideia explícita, estabelecida entre a relação imagem-texto
Tal charge ilustra
verbal apresentada na charge, de que as críticas à terceiriza-
a) a superioridade da nobreza sobre o clero e o terceiro es-
ção não têm importância, devendo ser comparadas a times
tado, no contexto de centralização do poder nas mãos do
de terceira divisão. 07. (Fuvest SP) Examine este cartaz, cuja finalidade é divulgar uma exposição de obras de Pablo Picasso.
governante. b) a igualdade entre as classes sociais durante o Antigo Regime, uma vez que os três estamentos estão representados. c) a superioridade do clero sobre a nobreza e o terceiro estado, baseada na teoria do direito divino dos reis e na ausência de mobilidade social. d) a superioridade do clero e da nobreza sobre o terceiro estado, que é retratado como aquele que carrega os outros e não possui privilégios. e) a necessidade de que o terceiro estado e a nobreza fossem os únicos responsáveis pela produção de riqueza, para que o clero pudesse governar.
Nas expressões “Mão erudita” e “Olho selvagem”, que com-
09. (Unimontes MG)
põem o texto do anúncio, os adjetivos “erudita” e “selvagem” sugerem que as obras do referido artista conjugam, respectivamente, a) civilização e barbárie. b) requinte e despojamento. c) modernidade e primitivismo. d) liberdade e autoritarismo. e) tradição e transgressão. 08. (Fac. Cultura Inglesa SP) Examine a charge que representa os três estados do Antigo Regime.
(Disponível em: <https://guiaecologico.wordpress.com/tag/cartoon/>, acesso em: 13 out. 2014.)
Nesse texto, os efeitos imagéticos têm o intuito de alertar para por nós consumida. Nesse caso, assinale a alternativa que aponta o aspecto que contribui para a construção do sentido desse texto. a) A água pode se tornar um bem tão escasso que será de muito difícil acesso. b) A água será restrita àqueles que a armazenaram em tempos de abundância. c) A água para consumo humano não estará disponível para venda. d) O consumo unificado da água continuará condicionado à (http://online-lernen.levrai.de)
distribuição igualitária das riquezas. 705
FRENTE C Exercícios de Aprofundamento
uma questão social, ecológica, em nível mundial, que é a água
FRENTE
D
PORTUGUÊS Por falar nisso No processo de escrita de um texto, mais importante até mesmo que o ato de escrever em si e organizar as ideias principais sobre as quais você deseja desenvolver, é reescrever. A reescrita de um texto é fundamental para que ele atinja um grau de qualidade superior. Desse modo, para fazer uma boa reescrita, é preciso, antes de tudo, que você seja um bom leitor dos seus textos. No ato da releitura, é necessário que você saiba julgar aquilo que você escreveu de modo a compreender quais aspectos devem ser repensados e reformulados. Nesse momento, é interessante que o texto, antes da releitura, fique guardado um tempo, para que você possa opinar sobre o que escreveu com um grau maior de distanciamento. Tente reler seu texto como se não tivesse sido você o autor dele. Ao fazer isso, você verá que, progressivamente, a sua escrita irá adquirir mais qualidade e fluidez. Não há nenhum grande escritor que não seja um excelente “releitor” e “reescritor”. Nas próximas aulas, estudaremos os seguintes temas
D13 D14 D15 D16
Carta argumentativa ..................................................................... 708 Carta aberta .................................................................................. 713 Manifesto e abaixo-assinado ........................................................ 720 Texto descritivo ............................................................................. 726
FRENTE
D
PORTUGUÊS
MÓDULO D13
ASSUNTOS ABORDADOS n Carta argumentativa n Características n Estrutura n Argumentação n Interlocução
CARTA ARGUMENTATIVA O objetivo principal de uma carta argumentativa é persuadir o leitor. Desse modo, a argumentação é sua mais importante arma de convencimento, de forma que o emissor, isto é, o escritor, a partir do seu ponto de vista, tenta convencer o receptor, nesse caso o leitor, sobre determinado assunto. Nesse sentido, trata-se de um texto dissertativo-argumentativo que detém peculiaridades em sua produção, haja vista que apresenta um ou mais receptores específicos aos quais se dirige. Vale frisar, portanto, que a principal característica do gênero textual “carta” é justamente a existência de um emissor (remetente) e de um receptor (destinatário). A depender da relação entre os interlocutores, a linguagem utilizada pode ser formal ou informal. Por exemplo: um amigo (informal) e o prefeito (formal). Embora a expansão da internet e dos meios de comunicação tenha criado outras formas de interação (e-mail, redes sociais etc.), a carta enviada pelos Correios ainda é um recurso comunicativo muito importante. Por esse motivo, esteja atento à sua estrutura, pois esse tipo de texto ainda é exigido nos principais vestibulares do País.
Características As principais características da carta argumentativa são: n n n n n
708
Argumentação e persuasão; Linguagem clara e objetiva; Geralmente escrita em 1ª pessoa; Presença de destinatário e remetente; Uso de pronomes de tratamento.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Estrutura Apesar de ser um texto dissertativo-argumentativo (com a forma básica: introdução, desenvolvimento e conclusão), a estrutura da carta argumentativa inclui ainda outros elementos: n
n n
n n
n
n n
Local e data: primeiramente, surge o nome da cidade (local) em que se encontra o emissor e a data que está sendo produzida. Essa parte é também chamada de cabeçalho. Nome do receptor: abaixo da data e do local, deverá surgir o nome da pessoa ou do órgão a quem se destina a carta. Saudação inicial: dependendo da formalidade, utilizamos determinadas saudações iniciais (vocativos). Essas saudações representam as formas de tratamento como: prezado (ou caro) senhor ou senhora, excelentíssimo, digníssimo dentre outros. Introdução: o assunto a ser abordado durante todo o texto deverá ser apresentado; é o tema principal da carta. Desenvolvimento: já que se trata de um texto argumentativo, nesse momento, as argumentações e os pontos de vista deverão ser explorados de forma a convencer o leitor. Conclusão: trata-se da parte final do texto, que apresenta o arremate das ideias expostas na introdução e no desenvolvimento. Em outras palavras, é a parte da síntese das ideias em que aparece uma proposta, recomendação e/ou sugestão. Despedida: é a saudação final que colocará fim ao seu texto. Por exemplo, “atenciosamente” (se for formal), ou “beijos e abraços” (se for informal). Assinatura: normalmente, os vestibulares já indicam uma expressão que você deva usar para assinar seu texto, pois não deve haver identificação do candidato.
Argumentação O recurso fundamental da retórica utilizado na produção de textos argumentativos é, evidentemente, a argumentação, a partir da qual o escritor pode apresentar um conjunto de proposições, promovendo assim o diálogo e reflexões críticas. Um bom texto argumentativo inclui a clareza de ideias e o uso correto das normas gramaticais, ou seja, a coerência e a coesão. Nesse sentido, o ato de argumentar desenvolve a capacidade de intelecção do autor e do leitor, já que ela está pautada na exposição de ideias ou em opiniões organizadas e fundamentadas acerca de determinado assunto, com o intuito principal de persuadir o leitor, seja um interlocutor, seja um ouvinte.
D13 Carta argumentativa
Note que, além de ser uma importante ferramenta dos textos argumentativos escritos, a argumentação pode ser utilizada nos discursos orais, por exemplo, em uma palestra, em debates políticos, em propagandas publicitárias dentre outros.
709
Português
Interlocução A indefinição do interlocutor é, indubitavelmente, a principal diferença entre a dissertação tradicional e a carta. Quando alguém propunha a você que produzisse um texto dissertativo, geralmente não lhe indicava aquele que o leria. Você simplesmente tinha que escrever um texto para alguém. Na carta, isso muda: estabelece-se uma comunicação particular entre um “eu” definido e um “você” definido. Logo, você terá que ser bastante habilidoso para adaptar a linguagem e a argumentação à realidade desse leitor e ao grau de intimidade estabelecido entre vocês. Imagine, por exemplo, uma carta dirigida a um presidente de uma associação de moradores de um bairro carente de determinada cidade. Esse senhor, do qual você não é íntimo, provavelmente, não cursou o Ensino Médio completo. Portanto, sua linguagem, estudante, deverá ser mais simples do que a utilizada em uma carta para um juiz, por exemplo. Embora as palavras possam ser mais simples, as normas gramaticais sempre devem ser respeitadas. Os argumentos e informações deverão ser compreensíveis ao leitor, próximos da realidade dele. Mas, da mesma maneira que a competência do interlocutor não pode ser superestimada, não deve, é claro, ser menosprezada. É preciso ter bom senso e equilíbrio para selecionar os argumentos e/ ou informações que não sejam óbvios ou incompreensíveis àquele que lerá a carta. Diante da necessidade de dirigir-se ao leitor, na dissertação tradicional, recomenda-se que você evite se dirigir diretamente ao leitor por meio de verbos no imperativo (“pense”, “veja”, “imagine” etc.). Ao escrever uma carta, essa prescrição cai por terra. Você até passa a ter a necessidade de fazer o leitor “aparecer” nas linhas. Se a carta é para ele, é claro que ele deve ser evocado no decorrer do texto. Por isso, verbos no imperativo – que fazem o leitor perceber que é ele o interlocutor – e vocativos são bem-vindos. Observação: é falha comum entre muitos estudantes “disfarçar” uma dissertação tradicional de carta argumentativa. Alguns escrevem o cabeçalho, o vocativo inicial, um texto que não evoca em momento algum o leitor. Tome cuidado! Na carta, vale reforçar, o leitor “aparece”.
D13 Carta argumentativa
Exemplo Leia agora uma carta argumentativa embasada em um tema proposto por vestibular. Preste muita atenção ao que foi pedido no enunciado e aos textos de apoio. Note que os elementos da estrutura da carta foram respeitados pelo autor:
710
Rio de Janeiro, 14 de fevereiro de 2011.
À população brasileira, Há muitos anos as mulheres lutam pelos seus direitos, e vêm conseguindo inegáveis avanços. Para que, hoje, possamos votar, trabalhar e usar calças jeans, muito sutiã teve que ser queimado em praça pública. Hoje, no auge de nossas independências, somos diretoras de grandes empresas multinacionais, engenheiras renomadas, grandes cirurgiãs, artistas, e ainda somos mães e esposas. Somos o que há de contemporâneo, de avançado, super-heroínas do dia a dia que se desdobram em mil para atender às nossas próprias exigências, e as da sociedade. Ninguém quer, afinal, menosprezar tanta luta, tanto sacrifício, tanto tempo querendo provar que podemos ser o que bem entendermos. Sou mulher e, assim como os meus deveres, tenho os meus direitos. No entanto, existe um véu que cobre, ainda, todo esse avanço. Na grande maioria das vezes, isso é somente aos nossos olhos. Valorizamos cada conquista, cada meio centímetro percorrido a caminho da independência porque ela é nossa. Mas para os homens, para muitos deles, ainda somos, somente, mulheres. Seres difíceis de se entender. Ainda apanhamos, é verdade. Literalmente ou não. Muitas de nós morrem todos os dias, fruto da violência doméstica, da mão pesada daquele parceiro que escolhemos para amar. Morremos, também, de pouquinho em pouquinho com agressões verbais, descasos, desinteresses. Não é fácil ser mulher. Mais difícil ainda é lutar pelos nossos direitos, uma vez que, embora possamos gritar, nossa voz continua sendo abafada pelo machismo, patriarcalismo, e pelo preconceito. Quem por nós? Nós mesmas. Quem contra nós? Todo o resto. Feminismo já é ultrapassado, vitimização mais ainda. Sutiãs não precisam mais ser queimados. A sexualidade não precisa mais ser conquistada. Os direitos a trabalhar e a votar, também não. Isso tudo já foi alcançado. Acima de tudo, conquistamos o livre-arbítrio. Escolhemos nossas escolhas. Pelo que lutar agora? Lutemos pela dignidade reconquistada. Pela coragem de nos queixarmos dos maus-tratos. Pelo fim do massacre do que nos resta de mais precioso: nosso feminino, nosso lado que quer gritar, que quer justiça para aquelas de nós que perdem a vida em represas, em sítios, em qualquer esquina desse país. Quanto tempo mais ficaremos esperando? Não proponho nenhum tipo de superioridade. Proponho denúncia, atenção e ajuda mútua. Igualdade. Gênero é muito mais do que sexo. É atitude. Atenciosamente. Uma brasileira.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Exercícios de Fixação
A glória da dirupção
Marion Strecker
Uma palavra que vive seu tempo de glória é dirupção. Ou disruption, em inglês, termo que vem sendo mal traduzido por ―disrupção” ou “disruptura”, já que o verbo em português é “diruir” ou “derruir”, que significa “desmoronar”. A palavra é dita com pompa e orgulho no Vale do Silício, na Universidade Stanford e em toda a chamada nova economia. Mas causa terror nos que estão no outro campo econômico, nas indústrias tradicionais e nos que acreditam no saber cumulativo. Poderíamos falar em “ruptura”, mas outra tradução seria “ruína” ou “derrubada”, já que dirupção é uma ruptura feita à força. Traz noção de colapso, de descontinuidade, de desorganização e de deslocamento. A internet causou e ainda causará muita dirupção. Dirupção é aquele momento em que um comportamento é totalmente modificado, e o dinheiro muda de mãos. Começou pelos correios, quando a internet introduziu o e-mail décadas atrás. Avançou na indústria da música e de jogos, alterando profundamente sua forma física, seu sistema de produção, de marketing, de distribuição e de fruição. Está destruindo a receita de empresas jornalísticas, tornando a atividade muito mais complexa, menos centralizada e menos profissional, dando poder de voz a todo cidadão e transferindo publicidade para sites de busca, resumos e links. Modifica dramaticamente a indústria editorial e de entretenimento, embora Hollywood ainda resista, já que a banda larga ainda não é tão larga nem tão acessível assim na nossa sociedade global e móvel. Mas isso é questão de tempo. Espera-se que a próxima indústria a ser diruída pela internet seja a da educação [...]. Folha de S. Paulo, 3 de maio de 2012, B12, Mercado. (adaptado)
Com base no texto, redija uma CARTA ARGUMENTATIVA ao Ministro de Educação, apresentando seu posicionamento a respeito de prováveis efeitos da dirupção na educação. 02. (UFU MG) A computação está evoluindo rápido, e cada vez se acelera mais – isso é praticamente um consenso entre especialistas. Mas essa celeridade, defendem alguns deles, pode nos fazer perder o controle sobre as máquinas. O primeiro computador Macintosh, que completou 30 anos na semana passada, tinha memória 8,4 milhões de vezes menor e um processador que rodava em frequência 163 milhões de vezes inferior em relação ao iPhone 5s, da mesma Apple. Adicione outros 30 anos e estaremos vivendo a “singularidade tecnológica”, o momento em que computadores superarão o cérebro humano de tal forma que é impossível prever que rumo a civilização tomará, dizem futurólogos. A chamada singularidade tecnológica é uma tese defendida por acadêmicos, mais notadamente Raymond Kurzweil, desde 2012 um dos diretores de engenharia do Google, em-
presa que está investindo agressivamente em inteligência artificial. Autor de The Singularity Is Near (A singularidade está próxima, sem edição no Brasil), Kurzweil diz que poderíamos dominar a ciência a ponto de copiar o conteúdo de nosso cérebro (e com isso nossa personalidade) para implantá-lo em super-humanos – e viver para sempre. Outro pregador da singularidade, Vernor Vinge questiona se a existência de seres humanos faria sentido se todo ato, inclusive experiências sentimentais, pudesse ser melhor replicado por máquinas. Paul Allen, que fundou com Gates a Microsoft, escreveu um artigo na “MIT Technology Review” argumentando que, de fato, a evolução da parte física da computação (hardware) pode ter crescimento exponencial indefinido, mas que há gargalos no software. “Não bastaria rodar programas de hoje mais rápido”, diz. “Criar esse tipo de coisa requer um conhecimento científico prévio dos fundamentos da cognição humana, área cuja superfície apenas arranhamos.” GONZAGA, Yuri. Folha de S. Paulo, 3 fev. 2014 (adaptado).
Com base no texto, redija uma CARTA ARGUMENTATIVA a Raymond Kurzweil argumentando contra a sua ideia de que “poderíamos dominar a ciência a ponto de copiar o conteúdo de nosso cérebro (e com isso nossa personalidade) para implantá-lo em super-humanos - e viver para sempre”. 03. (UEPG PR) Por que acredito mais na religião do que na ciência Coincidência. Acaso. Destino. Tantas explicações que não explicam muito, quando a gente fala de uma coisa que nos intriga e para a qual sabemos que não existe mesmo uma explicação. Acho que a religião supera em muito a ciência porque se apega à capacidade mais indômita do ser humano – a de acreditar. Gosto de saber que existe alguém comigo o tempo todo, que me ouve, que me faz estar neste ou naquele lugar na hora certa por este ou aquele motivo. É o inesperado, o salto no escuro. Quem não acredita fica vagando somente entre as possibilidades. Eu prefiro contar com o impossível que, convenhamos, vive cruzando nosso caminho. Além do mais, a quem você gostaria de recorrer na hora daquele aperto, a um Deus misericordioso que pode te ouvir e dessa vez – só dessa vez! – livrar sua cara, ou ao Einstein, com aquela baita língua de fora? (Angela G. Rodrigues. Carta do Leitor. Folha de S. Paulo. out. 2001.
Ao defender a crença na religião, a carta da leitora apresenta um discurso: 01. Com base em provas. 02. Com a argumentação de que o homem tem fé. 04. Com a apresentação de uma posição pessoal. 08. Com a apresentação de evidências categóricas. 16. Com referências a comportamentos sociais.
711
D13 Carta argumentativa
01. (UFU MG)
epú-
Português
Exercícios Complementares 01. (Enem MEC) É bom saber que os atletas mineiros, agora, podem contar com um centro de treinamento de ponta e adequado a diversas modalidades esportivas. Tenho um filho que sonha em ser atleta olímpico. Quem sabe ele não fará parte da equipe de atletismo? Parabéns pela reportagem.
ara o com
RESENDE, L. Fantástica fábrica de atletas – Seção Fale com a Encontro. Encontro, n. 12, out. 2013.
A carta do leitor é recorrente em jornais e revistas. Nesse texto, um dos elementos constitutivos desse gênero é a a) presença de elogio. b) brevidade do conteúdo. c) exploração de fatos corriqueiros. d) ocorrência de frase interrogativa. e) referência a uma matéria publicada.
Tema da Redação A incerteza é um outro nome para oportunidade. A graça da vida está em não saber como as coisas serão. Quando você escolhe um caminho em meio à incerteza, toma as rédeas da sua vida. TRUNK, Penelope. 150 lições de carreira. Você S/A, São Paulo, ed150, p.82,dez.2010.
Com base no fragmento em evidência, escreva uma carta argumentativa sobre o recorte temático: Como se criar oportunidade em um mundo de incertezas e assumir as rédeas do seu próprio destino? 03. (UEL PR) CARTA SOBREVIVE NA ERA DO E-MAIL Ninguém questiona o fato de que a internet chegou para ficar e está transformando o modo como o mundo se comunica. A proliferação do uso de e-mails, sites de relacionamento e mesmo SMS enterrou para muitos a ideia de enviar uma carta. Mas os correios em todo o mundo descobriram que a carta não desapareceu. Há três anos, o envio de correspondências se mantém estável, segundo a União Postal Universal, fundada em 1874 em Berna. No mundo são 1,2 bilhão de cartas mandadas por dia. Por ano, os campeões são os americanos, com 199 bilhões de cartas. O Japão vem em distante segundo lugar, com 25 bilhões, e a Alemanha, com 21 bilhões. Segundo 193 correios do mundo, há grandes diferenças ainda entre os países sobre como as pessoas se comunicam. Na Arábia Saudita, a carta continua sendo a forma mais usada por trabalhadores imigrantes provenientes da Ásia para se comunicar com suas famílias em seus países de origem. Na África, a realidade é mais problemática. Somente uma a cada oito pessoas tem um endereço para onde alguém possa enviar uma carta. Se nem endere-
D13 Carta argumentativa
(Adaptado de: Agência Estado. Carta sobrevive na era do e-mail. Gazeta do Povo, 6 jun. 2010, p. 15.)
Tendo em vista a importância da troca de correspondências nos dias atuais, redija uma carta a um amigo que vive num país distante, numa cidade que não dispõe de rede de comunicação para e-mail e internet, relatando a ele os fatos mais importantes ocorridos no Brasil no ano de 2010. (Atenção: Ao encerrar a carta, assine Fulano de Tal, mantendo o sigilo de sua prova.) 04. (Enem MEC) O valor das coisas
02. (Unifacs BA)
712
ço fixo é uma realidade, a internet continua um sonho distante. No mundo, uma a cada três pessoas tem acesso à internet em casa. Mas a taxa é de uma a cada 20 nos países em desenvolvimento, segundo a União Internacional de Telecomunicações.
Você deve ter notado que a revista custa R$ 13. Não é pouco, eu sei. É mais que boa parte das revistas — e olha que muitas delas têm papel mais grosso, mais brilhante, uma atitude mais arrogante, mais de quem sabe de tudo. Se você desembolsou R$ 13 para ler estas linhas, é porque, de alguma maneira, você enxergou valor aqui neste trabalho que nós fazemos. Temos muito orgulho disso, e muita consciência da responsabilidade que isso implica. Esta edição fala muito deste assunto: o valor das coisas. Ficar antenados nas ideias transformadoras que estão mudando a lógica de tudo é nossa obrigação aqui na revista. Acreditamos que, assim, entregaremos a você uma publicação que ajude a entender as coisas e a tomar as decisões certas para viver bem. É esse o meu compromisso com você. Prometo que vamos trabalhar duro todos os dias para que a revista valha cada centavo que você gasta conosco. Grande abraço, Diretor de Redação. BURGIERMAN, D. R. Superinteressante, ed. 317, abr. 2013 (adaptado).
As cartas ao leitor, publicadas em revistas, valem-se de diversas estratégias argumentativas, por meio das quais se busca construir uma relação de cumplicidade entre revista e público-alvo e promover a adesão do leitor à publicação. Nessa carta, constrói-se uma imagem de revista que a) busca o menor preço para garantir economia ao leitor. b) respeita o leitor e tem consciência de sua responsabilidade em fazer um trabalho de qualidade. c) assume diante do leitor sua diferença em relação a outras revistas que estão no mercado. d) privilegia ideias transformadoras que estão mudando a lógica de tudo no mundo. e) justifica seu investimento porque precisa melhorar seu padrão gráfico.
FRENTE
D
PORTUGUÊS
MÓDULO D14
CARTA ABERTA A carta aberta é um modelo de carta (texto epistolar) que tem como principal característica informar, instruir, alertar, protestar, reivindicar ou argumentar sobre determinado assunto. É um veículo de comunicação coletiva, ou seja, que é destinada a várias pessoas (algum público, sindicatos, representações, comunidade etc.).
ASSUNTOS ABORDADOS n Carta aberta n Estrutura da carta aberta n Exemplo
Portanto, o destinatário e o remetente desse tipo de carta não são seres individuais e, por isso, ela é diferente das cartas pessoais. A carta aberta não está reduzida a somente um gênero textual, isto é, ela pode ser um texto instrucional, expositivo, argumentativo ou descritivo. Diante disso, vale lembrar que ela pode englobar mais de um gênero. Portanto, a carta aberta pode ser, ao mesmo tempo, descritiva e argumentativa. Dessa maneira, ela representa uma importante ferramenta de participação política dos cidadãos, uma vez que apresenta determinado assunto de interesse coletivo. Lembre-se de que a carta aberta não é um texto muito extenso e sua linguagem é clara, coesa e está de acordo com as normas gramaticais. Geralmente, são veiculadas nos meios de comunicação (televisão, rádio, internet etc.), sendo que os assuntos mais abordados apontam algum problema, demanda da comunidade, apoio a uma causa, dentre outros.
Estrutura da carta aberta Para produzir uma carta aberta, devemos estar atentos à seguinte estrutura: n
n
n n
n
Título: geralmente é acrescentado um título que indica a quem será destinada a carta (comunidade, associação, instituição, organização, entidade, autoridades municipais, estaduais e nacionais etc.). Introdução: tal qual um texto dissertativo, ela apresenta introdução, desenvolvimento e conclusão. Na introdução, as principais ideias são abordadas pelos destinatários. Desenvolvimento: segundo a proposta da carta, nesse momento, serão apontados os principais argumentos e pontos de vista referentes ao assunto abordado. Conclusão: momento de arrematar a ideia e sugerir alguma ação dos interlocutores ou possível resolução do problema posto em causa. Na conclusão, ocorre o fechamento da ideia e busca de soluções. Despedida: com saudações cordiais, a despedida finaliza a carta aberta.
713
Português
Exemplo Para compreender melhor o conceito, segue abaixo um exemplo de Carta Aberta: Carta Aberta à Comunidade de Manaus. De acordo com os problemas que temos passado durante os últimos dias no centro de Manaus, resolvemos apontar alguns temas para a reflexão, os quais consideramos de suma importância para a comunidade manauara. Primeiramente, devemos salientar que o pagamento dos espaços destinados à comercialização dos produtos artesanais inclui todos os profissionais que comercializam seus produtos no centro do município. Assim, após a inscrição na Prefeitura, os inscritos deverão pagar a matrícula do espaço alugado e ainda um valor de 20% das vendas anuais. Esse evento de mudança na legislação a partir do mês de outubro, acarretou diversos problemas para os artesões que sofreram com a fiscalização na semana passada no centro da cidade. Visto a repercussão do episódio, decidimos entrar em contato com o órgão responsável para ampliar o tempo de cadastramento de todos os artesãos, visto a desorganização das últimas inscrições, bem como a falta de informação. Além disso, depois de nosso contato, a rádio e canal local de televisão ficaram encarregadas de divulgar durante um mês, informações sobre a nova legislação, bem como a importância do cadastramento e detalhes sobre o pagamento dos espaços locais. Esperamos que todos estejam atentos uma vez que o trabalho de produção e comercialização de produtos artesanais representa uma parte considerável de nosso patrimônio, e, portanto, possui um valor inestimável para a comunidade. Atenciosamente. Associação de Artesãos de Manaus
D14 Carta aberta
Exercícios de Fixação 01. (Unicamp SP) Como um(a) aluno(a) do Ensino Médio interessado(a) em questões da atualidade, você leu o artigo “A volta de um Rio que faz sonhar”. Sentindo-se desafiado(a) pelos questionamentos levantados no texto, você decidiu escrever uma carta para a Seção do Leitor da revista Rio Pesquisa. Em sua carta, discuta a relação estabelecida pela autora entre o conceito de Brasil cordial e a presença de estrangeiros no Brasil, apresentando argumentos em defesa de um ponto de vista sobre a questão. A volta de um Rio que faz sonhar Reverenciada mundialmente por suas belezas naturais, a cidade do Rio de Janeiro tem se transformado em espaço sonhado para aqueles que buscam construir seu futuro em terra estrangeira. Imigrantes, de origens variadas, vêm chegando à cidade, buscando garantir sua sobrevivência, fugir à pobreza ou transformar seus sonhos em realidade. Esse processo insere-se em um quadro mais geral de transformações. Graças à situação assumida pelo Brasil, como uma das maiores economias do mundo, polo de atração na América do Sul, o país vem se tornando, mais uma vez na história, importante lugar de chegada, em um momento em que políticas de vigilância e controle sobre os estrangeiros aprofundam-se nos países ricos em crise. Essa nova situação exige estudos que ultrapassem as questões pontuais para incluir análises sobre
714
as relações presente e passado; entre o local, o nacional e o internacional e entre as práticas e as representações sobre o “outro”. O recente episódio da entrada abrupta de haitianos no Brasil, sem dúvida, apontou a necessidade dessas análises ampliadas. Para além da conjugação entre a necessidade de partir e o conhecimento adquirido sobre um país que se tornou “próximo” pela presença das tropas brasileiras em solo haitiano, o processo revestiu-se de preocupantes aspectos de mudança. Dentre eles, a ação dos coiotes na efetivação dos deslocamentos, marca indicativa do ingresso do país em um contexto no qual grupos organizados vivem da imigração ilegal e máfias internacionais enriquecem com o tráfico humano. O episódio pode ser visto, assim, como a ponta de um iceberg que tende a envolver a América Latina e o Caribe, considerando-se uma das tendências dos processos migratórios da atualidade: as migrações regionalizadas, realizadas no interior dos subsistemas internacionais. Brasil: país cordial? A predisposição do Brasil em receber o estrangeiro de braços abertos é ideia consagrada que necessita sofrer o peso da crítica. Pesquisas variadas têm demonstrado que o país nunca foi imune aos processos de discriminação do “outro”.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
(Adaptado de Lená Medeiros de Menezes, A volta de um Rio que faz sonhar. Rio Pesquisa, Rio de Janeiro, ano V, nº 20, p. 48-50, set. 2012.)
02. (UniCesumar SP)
Como e por que ler Harold Bloom
PREFÁCIO Não existe apenas um modo de ler bem, mas existe uma razão precípua por que ler. Nos dias de hoje, a informação é facilmente encontrada, mas onde está a sabedoria? Se tivermos sorte, encontraremos um professor que nos oriente, mas, em última análise, vemo-nos sós, seguindo nosso caminho sem mediadores. Ler bem é um dos grandes prazeres da solidão; ao menos segundo a minha experiência, é o mais benéfico dos prazeres. Ler nos conduz à alteridade, seja à nossa própria ou à de nossos amigos, presentes ou futuros. Literatura de ficção é alteridade e, portanto, alivia a solidão. Lemos não apenas porque, na vida real, jamais conheceremos tantas pessoas como através da leitura, mas, também, porque amizades são frágeis, propensas a diminuir em número, a desaparecer, a sucumbir em decorrência da distância, do tempo, das divergências, dos desafetos da vida familiar e amorosa. - precípua: principal, essencial - alteridade: natureza ou condição do que é outro; referente ao outro
PRÓLOGO Caso pretenda desenvolver a capacidade de formar opiniões críticas e chegar a avaliações pessoais, o ser humano precisará continuar a ler por iniciativa própria. Como ler (se o faz de maneira proficiente ou não) e o que ler não dependerá, inteiramente, da vontade do leitor, mas o porquê da leitura deve ser a satisfação de interesses pessoais. Seja apenas por divertimento ou com algum objetivo específico, em dado momento , passamos a ler apressadamente. Os indivíduos que, por iniciativa própria, leem a Bíblia, talvez constituam exemplos mais evidentes de leitura com objetivo específico do que os leitores de Shakespeare; no entanto, a busca é a mesma. Uma das funções da leitura é nos preparar para uma transformação, e a transformação final tem caráter universal. - proficiente: competente e eficiente no que faz In: BLOOM, Harold. Como e por que ler. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001, p. 15 e 17.
PRODUÇÃO DE CARTA DE LEITOR Com base no prefácio e no prólogo do livro de Harold Bloom, e considerando as ideias do autor sobre a leitura, escreva uma carta ao editor de um jornal de sua cidade, manifestando sua opinião sobre o papel que a leitura exerce na vida dos cidadãos, nos tempos atuais. Assine sua carta com nome fictício. Sustente seu posicionamento com argumentos relevantes e convincentes, articulados de forma coesa e coerente. Seu trabalho será avaliado de acordo com os seguintes critérios: espírito crítico, adequação do texto ao desenvolvimento do tema, estrutura textual compatível com o gênero carta e emprego da modalidade escrita formal da língua portuguesa. Importante: redija seu texto a tinta, no espaço a ele destinado. O rascunho, redigido no verso da folha ótica, não será considerado. Será desclassificado o candidato que tirar zero na redação. Nota zero será atribuída se o texto construído não apresentar de 20 a 30 linhas (linhas copiadas dos textos da prova serão desconsideradas); fugir ao tema ou apresentar parte do texto em desacordo com o tema proposto; não estiver de acordo com o texto pelo qual o candidato optou; apresentar impropérios, desenhos ouquaisquer outras formas propositais de anulação. 715
D14 Carta aberta
Um exemplo, entre vários, pode ser dado pela prática da expulsão de estrangeiros na Primeira República (1907-1930), que se caracterizou por extrema violência, mesmo contra aqueles que já eram considerados residentes, portanto com os mesmos direitos constitucionais dados aos brasileiros. A representação de um Brasil cordial, desta forma, deve ser entendida como uma construção forjada em determinado momento de nossa história. Lógico que as reações diferiam e diferem de acordo com os diferentes tipos de estrangeiros com os quais travamos contato, ocorrendo diferenças de tratamento em relação àqueles que, pelo local de nascimento ou pela cor, classificamos como superiores ou inferiores. Vários indícios vêm demonstrando que as atitudes discriminatórias não ficaram perdidas no passado, mas podem ser encontradas com relativa facilidade, quando treinamos nosso olhar para melhor observar aquilo que nos cerca. As tensões entre brasileiros e bolivianos nos locais onde estes estão mais presentes, por exemplo, já são bastante visíveis. Isso sem falar no triste espetáculo do subemprego e da exploração a que estão sujeitos latino-americanos fixados ilegalmente no país. É urgente, portanto, que nos perguntemos como tendemos a ver e sentir a presença cada vez mais visível de estrangeiros em solo brasileiro, principalmente daqueles que são oriundos de países pobres, muitos deles necessitando do foco dos direitos humanos. Seremos sensíveis aos discursos e às práticas xenófobas? Defenderemos políticas restritivas e repressoras? Caminharemos para a sofisticação dos instrumentos de vigilância sobre um “outro” que possa ser visto como ameaça? Responder a essas questões, aqui e agora, seria um exercício de profecia que não nos cabe fazer. Isso não exclui, entretanto, que a reflexão sobre essas possibilidades esteja proposta, por mais penosa que ela possa ser, principalmente se considerarmos a rapidez dos processos em curso e a tensão mundial presente no embate entre interesses nacionais e direitos humanos.
ema
Português
oares
ospiMeMRP) eira, ação
Exercícios Complementares 01. (UEG GO) A sofisticação dos meios de produção cada vez mais velozes e variados criou uma lógica de consumo intenso e com alto grau de descartabilidade. O resultado disso é o acúmulo de uma grande quantidade de lixo. A esse respeito, leia a coletânea a seguir. Texto 1 Somos uma civilização dedicada a gerar lixo. Não há mais espaço para depositar resíduos, e a questão de onde colocá-los virou um enorme problema logístico. Segundo o relatório da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), a média de lixo domiciliar de cada brasileiro, de cerca de um quilo, é semelhante a de um europeu. Porém, nossas classes influentes geram muito lixo, enquanto as classes humildes geram pouquíssimo. É assim que se chega a uma média europeia. Algo está profundamente errado nisso, relacionado ao processo socioeconômico de geração de lixo e agravado pela falta de política pública no setor. Há bastante tempo o geógrafo Milton Santos disse que o crescimento urbano no Brasil estava muito ligado à sedução do consumo. Segundo ele, a percepção do consumo atrai as pessoas, induzindo-as, por exemplo, a trocar uma casa bem montada por um automóvel, uma despensa forrada de alimentos por um aparelho eletrônico. Daí que, segundo o Relatório da Abrelpe, em um ano a população cresceu 1%, mas a produção de lixo cresceu 6%. De modo geral, a geração de lixo também está crescendo por causa das altas expectativas de consumo.
em 100 gramas do metal. E a preciosidade encontrada no lixo eletrônico — que tem boa parte enviada para a China e países da África, onde contaminam o solo e as águas com metais pesados — não se resume a essa joia. Celulares, baterias e laptops também contêm outros minerais valiosos — como prata e cobre. Eles vêm sendo garimpados e reutilizados em uma técnica conhecida como mineração urbana. Um dos líderes desse filão é a mineradora sueca Boliden. Cerca de dois terços de toda sua extração de ouro vem da reciclagem. Recentemente, a empresa expandiu a capacidade de sua usina de separação de metais para 120 mil toneladas por ano. SANTOS, Priscilla. 9 soluções para o lixo. Disponível em: <http://revistagalileu.globo.com/Revista/Common/0,,EMI325029-17579,00-SOLUCOES+PARA+O+LIXO.html>. Acesso em: 28 ago. 2017.
Texto 4
ARAIA, Eduardo. Não há planeta para tanto lixo. Disponível em: <http:// www.revistapla-neta.com.br/nao-ha-planeta-para-tanto-lixo/>. Acesso em: 28 ago. 2017. (Adaptado).
Texto 2 Vivemos na civilização do desperdício e também de interesses econômicos, uma vez que grande parte da indústria se voltou para a produção de coisas descartáveis. Veja o caso dos celulares, por exemplo, e se pergunte: por que são lançados a todo momento novos modelos, cada vez mais sofisticados? Trata-se de uma estratégia das indústrias para incentivar o consumidor a trocar de aparelho com frequência e, assim, consumir mais. Na verdade, o marketing moderno já desenvolveu até um conceito: o de obsolescência programada, que significa justamente criar coisas que rapidamente se tornem ultrapassadas e precisem ser substituídas por modelos mais recentes. Reduzir e reutilizar, então, contrariam o próprio modo de organização econômica da sociedade em que vivemos. D14 Carta aberta
RECICLAGEM: soluções para o problema do lixo. Disponível em: <https:// educacao.uol.com.br/disciplinas/geografia/reciclagem-solucoes-para-o-problema-do-lixo.htm>. Acesso em: 28 ago. 2017. (Adaptado).
Texto 3 De cada tonelada de minério é possível tirar 8 gramas de ouro. Da mesma quantidade de sucata eletrônica, se extra-
716
Disponível em: <http://agroeliteif.blogspot.com.br/>. Acesso em: 28 ago. 2017.
Texto 5 Recentemente, entrou em vigor o Plano Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) como uma forma de incentivar a reciclagem de todo tipo de lixo: o de casa, das ruas, da indústria e do comércio. Mas oito em cada dez municípios brasileiros ainda não têm programa de coleta seletiva e os que têm poderiam reciclar muito mais do que fazem hoje. Os brasileiros jogam fora 76 milhões de toneladas de lixo – 30% poderiam ser reaproveitados, mas só 3% vão para a reciclagem. Em dez anos, o número de municípios que implantaram programas de reciclagem aumentou de 81 para mais de 900. Mas isso não representa nem 20% das cidades. Curitiba é a capital com melhor programa de reciclagem. Das mais de 1,5 mil toneladas diárias, cento e dez têm potencial para reciclagem e quase 70% são reaproveitadas. Mas a reciclagem no Brasil ainda está engatinhando. PAIVA, Roberto. Apenas 3% de todo o lixo produzido no Brasil é reciclado. Disponível em: <http://g1.globo.com/jornal-hoje/noticia/2015/04/apenas-3-de-todo-o-lixo-produzido-no-brasil-e-reciclado.html>. Acesso em: 28 ago. 2017. (Adaptado).
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
ROBLE, Odilon. Conhecimento do homem, da natureza e da sociedade. Disponível em: <https://books. google.com.br>. Acesso em: 15 fev. 2017. (Adaptado).
Com base na leitura da coletânea, discuta a questão-tema abaixo: Qual é o melhor modo de lidar com o lixo: reduzir a produção e o consumo de bens ou desenvolver técnicas eficientes de reciclagem? A carta de leitor é um gênero textual, comumente argumentativo, que circula em jornais e revistas. Seu objetivo é emitir um parecer de leitor sobre matérias e opiniões diversas publicadas nesses meios de comunicação. Considerando a definição desse gênero textual, a leitura da coletânea e, ainda, suas experiências pessoais, escreva uma carta de leitor a um jornal ou revista de circulação nacional, emitindo seu ponto de vista − contrário, favorável ou outro que transcenda esses posicionamentos − a respeito da discussão exposta no Texto 5 da coletânea. OBSERVAÇÃO: Ao concluir sua carta, NÃO a assine; subscreva-a com a expressão UM (A) LEITOR (A). 02. (UECE) Prezado Vestibulando, Procurando manter a linha de reflexão sobre fatos, ideias, pessoas, sentimentos, etc. que se impõem nos dias atuais, pensamos em uma proposta de escrita que trouxesse o passado para o presente e que desse margem a uma discussão sobre as possibilidades de uma convivência saudável entre eles, isto é, os valores do passado e os valores do presente. Por isso escolhemos para o exame vestibular 2017.1 o tema AMIZADE, em toda a sua complexidade e amplitude. Será que a pressa que caracteriza o nosso mundo deixará espaço e tempo para o cultivo de sentimentos como a AMIZADE, um sentimento que nem nasce nem se fortalece da noite para o dia; que é algo a ser cultivado? Dizem Capiba e Hermínio Bello
de Carvalho que “Amigo é feito casa que se faz aos poucos... E com paciência pra durar pra sempre”. Reflita sobre as ideias expressas nos quatro textos de apoio alusivos à amizade. Procure captar em cada um deles a essência do que os autores acham que é a amizade. Selecione neles as características de um bom amigo. Componha seu texto de acordo com a proposta. TEXTO 1 Resolução das Nações Unidas Em 27 de abril de 2011, durante a sexagésima quinta sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, dentro do tratamento da “Cultura de Paz”, reconheceu-se “a pertinência e a importância da amizade como sentimento nobre e valioso na vida dos seres humanos de todo o mundo” e decidiu-se designar como Dia Internacional da Amizade 30 de julho, em concordância com a proposta original promovida pela Cruzada Mundial da Amizade. A iniciativa foi apresentada conjuntamente por 43 países (incluindo o Brasil e quase todos os países sul-americanos), e foi aceita unanimemente pela Assembleia Geral. TEXTO 2 Canção da América Amigo é coisa pra se guardar Debaixo de sete chaves, Dentro do coração. Assim falava a canção que na América ouvi, mas quem cantava chorou ao ver o seu amigo partir, mas quem ficou, no pensamento voou, com seu canto que o outro lembrou E quem voou no pensamento ficou, Com a lembrança que o outro cantou. Amigo é coisa pra se guardar No lado esquerdo do peito, mesmo que o tempo e a distância digam não, mesmo esquecendo a canção. O que importa é ouvir a voz que vem do coração. Pois, seja o que vier, Venha o que vier Qualquer dia amigo eu volto a te encontrar Qualquer dia amigo, a gente vai se encontrar. (Milton Nascimento)
TEXTO 3 Versos de Natal Espelho, amigo verdadeiro, Tu refletes as minhas rugas, Os meus cabelos brancos, Os meus olhos míopes e cansados. Espelho, amigo verdadeiro, Mestre do realismo exato e minucioso, Obrigado, obrigado!
D14 Carta aberta
Texto 6 Na natureza tudo parece seguir de acordo com uma ordem reguladora, com uma certa organização eficaz que acaba por propiciar sempre mais e mais a criação e perpetuação da vida. Como seres racionais, criamos uma espécie de segunda natureza, uma ordem reguladora própria que, para os seres humanos, orienta todos os aspectos mais importantes de sua vida. Essa segunda natureza recebe o nome de “cultura”. A cultura oferece aos homens o conjunto de significados, de hábitos, condutas e valores dos quais nos valemos para uma vida em comum. Por um lado, somos influenciados pelos valores da cultura, por outro, somos nós mesmos que criamos tais valores. Viver em conjunto, partilhando de tais valores, sob a mesma influência cultural, implica dividir tarefas, criar expectativas comuns, dividir sonhos e desejos. É exatamente isso que caracteriza uma sociedade humana. Somos seres naturais e culturais, somos racionais e emocionais. Por isso, o homem é tão complexo; por isso a natureza humana é a mais difícil de se compreender. Essa complexidade nos revela as marcas de nossa tarefa fundamental na natureza, que é a de assumirmos nossa posição racional como um elemento diferenciador e protagonista da realidade em que vivemos.
Mas, se fosses mágico, Penetrarias até ao fundo deste homem triste. 717
Português
Descobririas o menino que sustenta esse homem, O menino que não quer morrer, que não morrerá senão comigo. O menino que todos os anos na véspera de Natal Pensa ainda em pôr os seus chinelinhos atrás da porta. (BANDEIRA, Manuel. Poesia Completa e Prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguillar, 2009.)
TEXTO 4 Amigo é casa Amigo é feito casa que se faz aos poucos E com paciência pra durar pra sempre Mas é preciso ter muito tijolo E terra, preparar reboco, construir tramelas Usar a sapiência de um João-de-barro Que constrói com arte sua residência
D14 Carta aberta
Há que o alicerce seja muito resistente Que das chuvas e do vento possa então a proteger E há que fincar muito jequitibá e vigas de jatobá E adubar o jardim e plantar muita flor toiceiras de resedás Não falte um caramanchão pros tempos idos lembrar que os cabelos brancos vão surgindo que nem mato na roceira que mal dá pra capinar e há que ver os pés de manacá cheinhos de sabiás Sabendo que os rouxinóis vão trazer arrebóis Choro de imaginar! Pra festas de cumeeira não faltem os violões! Muito milho ardendo na fogueira e quentão farto em gengibre aquecendo os corações A casa é amizade construída aos poucos E que a gente quer com beira e tribeira Com gelosia feita de matéria rara e altas platibandas Com portão bem largo Que é pra se entrar sorrindo nas horas incertas Sem fazer alarde, sem causar transtorno Amigo que é amigo quando quer estar presente Faz-se quase transparente sem deixar-se perceber Amigo é pra ficar, se chegar, se achegar Se abraçar, se beijar, se louvar, bendizer Amigo a gente acolhe, recolhe e agasalha E oferece lugar pra dormir e comer Amigo que é amigo não puxa tapete Oferece pra gente o melhor que tem E que nem tem, e quando não tem Finge que tem, faz o que pode E o seu coração reparte que nem pão. (Capiba e Hermínio Bello de Carvalho)
Proposta: Escreva uma carta a um amigo narrando um fato que você acredita ser uma demonstração da verdadeira amizade. 718
03. (UEM PR) Doação de órgãos: de que lado você está? O coração do meu filho bate no peito de outra criança “Mamãe, eu vim para ajudar!”. O Guilherme ainda nem sabia falar direito e já vivia repetindo isso! Como no dia em que um amiguinho dele queria desistir de uma apresentação na escola. O Gui pegou a mão do menino e disse: “Fica aqui comigo, eu te ajudo; eu vim para ajudar!”. Meu filho era assim, generoso, amoroso, ativo... Dormia tarde e acordava cedo, como se soubesse que tinha que aproveitar cada segundo neste mundo, pois teria pouco tempo conosco. [...] No dia em que morreu, ele repetia sem parar que estava feliz [...] Uma amiga me convidou para passar o feriado de Corpus Christi do ano de 2013 na casa dela à beira-mar. Curtimos o sábado inteirinho na praia. O Gui brincava e corria sem parar, repetindo: “Mãe, tô muito, muito, muito feliz!” É bom saber que meu filho sentiu tanta felicidade no seu último dia de vida. À noite, eu estava escovando os dentes no térreo da casa e ouvindo o Gui brincar no sótão com o filho da minha amiga (ambos tinham 4 anos). Lembro de escutar a irmã da minha colega falar: “Gui, vem mais para cá, você pode cair”. No segundo seguinte, meu filho estava em queda livre. Despencou e bateu com a cabecinha no chão, no andar térreo. Ele havia se apoiado em falso na hora de mudar de lugar e perdeu o equilíbrio. [...] Eram 20h quando entrei no pronto-socorro. A médica logo disse que o estado do Gui era gravíssimo e que ele precisava ir para um hospital maior, em Santos. Fomos transferidos de ambulância e o Fábio (o pai) foi nos encontrar lá. O médico explicou que faria uma cirurgia para retirar um coágulo do cérebro, mas advertiu: “Caso sobreviva, ele deve ficar em estado vegetativo”. A cirurgia durou uma hora e meia. Durante cada um desses 90 minutos eu rezei por um milagre. Quando o médico disse que tinham conseguido retirar o coágulo, senti que ele podia virar o jogo. “Força, Gui! Você sai dessa”, eu repetia baixinho, mandando boas energias para meu menino, que passou a noite sedado na UTI. Na manhã seguinte, foram reduzindo a sedação e nada de o Gui responder. Só conseguia respirar com a ajuda dos aparelhos e sua sensibilidade não voltava. O tormento de alternar esperança e desespero se estendeu por mais quatro dias. Até que os médicos nos deram a notícia: o cérebro do nosso menino havia morrido. Doamos os órgãos e pensei: “Pronto, Gui, você ajudou!” Não vou perder tempo tentando descrever aqui a dor. Ela não cabe em palavra nenhuma. Eu ainda estava tonta quando nos perguntaram se íamos doar os órgãos, que permaneciam saudáveis. Me lembrei da voz do Gui dizendo: “Mãe, eu vim para ajudar!” Encarei o Fábio. Nos falamos pelo olhar e fizemos que sim com a cabeça. Quinze minutos depois, assinamos o papel da doação e o compromisso de não ir atrás das famílias que recebessem os órgãos. Soube pela mídia que uma menina de 1 aninho tinha recebido o coração. O nome dela não poderia ser outro: Vitória. “Pronto, Gui: você ajudou”, pensei. [...]
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
A gente pede um milagre e esquece que pode fazer um Pensei no milagre que era ter um pedacinho do Gui naquela criatura e senti a presença de Deus. A cada sorriso que Vitória abria, uma sensação de gratidão inundava meu coração. Quando o Joel e a Deisi nos contaram que ela tinha nascido com dois problemas cardíacos e, literalmente, morou no hospital até ter 1 ano e 7 meses, Fábio e eu tivemos a certeza de que havíamos feito a coisa certa ao doar os órgãos do Gui. Às vezes, a gente fica pedindo milagres para Deus e deixa de perceber que podemos ser responsáveis por esses milagres também. Perder um filho é uma dor sem fim. Mas ter salvado uma vida ao doar os órgãos dele ameniza a angústia. Porque dá sentido à partida dele. [...] Desde então, ficamos muito próximos da família da Vitória. Nos falamos sempre e, no Dia das Mães, fomos visitá-los em Santa Catarina. Ficamos na casa deles. Foram dias maravilhosos, vendo a Vitória viver com tanta energia. Emocionante o sorriso que ela dá toda vez que cochicho em seu ouvido: “Aproveita bem esse coração generoso que bate dentro do seu peito, menina”. (Luciana Novello, 43 anos, funcionária pública, Campinas, SP)
“O coração era tão perfeito que começou a bater sozinho!” “Guerreira” é a palavra que define minha filha. Eu estava com quatro meses de gravidez quando descobri, num ultrassom, que a Vitória tinha dois problemas raros no coração. Era como se ela só tivesse metade do órgão – e essa metade não funcionasse muito bem. Assim que nascesse ela iria precisar de uma cirurgia muito arriscada! [...] Em abril de 2012, Vitória nasceu. No segundo dia de vida, já foi submetida a três horas de uma operação difícil, durante a qual teve várias paradas cardíacas. Foi um mês na UTI. Graças a Deus, minha filha foi forte e voltou para o quarto. Ficou lá por dois meses, até que seu coração se desestabilizou e ela voltou a ter paradas cardíacas com frequência. Por dois meses, ela ficou entre a vida e a morte. Então, com 5 meses, passou por nova cirurgia para tentar corrigir o coração. Depois de outro mês na UTI, os médicos deram o braço a torcer: não tinha jeito de sobreviver com aquele coração. Assim, Vitória entrou para a lista de transplantes. Me ligaram às 3h da manhã: havia um coração compatível com a Vitória Eu sabia que nossas chances eram mínimas, porque pouquíssimos pais autorizam doação de órgãos de crianças no Brasil. E ainda teria que ser um coração compatível com o dela. Mesmo assim, nunca perdi as esperanças. Sete meses depois, me ligaram às 3h da manhã: havia um coração compatível vindo de
Santos para São Paulo. Minha pequena teria o órgão transplantado a partir das 11h da manhã. [...] Assim que o transplante terminou, os médicos vieram contar que, ao contrário do que normalmente acontece, nem tinham precisado dar choque no coração para que ele começasse a bater dentro da minha filha. O órgão era tão perfeito para ela que funcionou sozinho assim que foi colocado no peito dela. Na primeira vez que vi minha pequena após o transplante, notei que seus lábios, sempre roxinhos, estavam tão vermelhos que parecia que ela tinha passado batom. Estava linda! Vitória ainda ficou cinco meses no hospital se adaptando ao coração transplantado. Depois de um ano e sete meses, pude levar minha filha para casa [...] Depois do transplante ela continuou com o problema no pulmão, um deles não funcionava. No mesmo ano ela precisou abrir as artérias para não forçar o coração. A equipe médica da rede pública foi muito dedicada ao caso dela, sou muito grata a cada um que se empenhou no transplante da Vi, o cuidado deles foi essencial para minha pequena. É graças a eles que hoje ela respira normalmente. [...] Nossa volta para casa teve muita repercussão na mídia local e acabamos comentando que gostaríamos de conhecer os heróis que tinham salvado a vida de nossa guerreira para lhes agradecer. Soubemos, então, que a família era do interior de São Paulo e tinha topado nos encontrar! [...] É raríssimo uma mãe e um pai terem a coragem que a Luciana e o Fábio tiveram, de doar o coração do Gui. [...] Graças a eles, a Vitória hoje tem 4 anos, é saudável e ativa, vive rindo. Todo dia deixa claro que não veio aqui a passeio. Exatamente como eu tenho certeza de que o Gui faria! (Deisi Rossetti Cavanholi, 36 anos, dona de casa, Orleans, SC) (Adaptado do texto disponível em <http://soumaiseu.uol.com.br/ noticias/faco-o-bem/o-coracao-do-meu-filho-bate-no-peito-de-outracrianca. phtml#.V-A3U_ArLIV>. Acesso em 14/9/2016)
CARTA ABERTA Contexto de produção: Na sua escola, um projeto de caráter interdisciplinar reuniu seus professores de Filosofia, de Sociologia e de Língua Portuguesa. Na ocasião, houve uma importante abordagem temática sobre doação de órgãos, solidariedade e altruísmo. Foram apresentados depoimentos de duas famílias (a doadora e a receptora de órgãos) e um cartaz de campanha publicitária institucional de uma prefeitura (textos 1 e 2, respectivamente) incentivando esse tipo de doação. Movido(a) pelas discussões promovidas pelo projeto, você resolve divulgar na sua página pessoal de uma rede social uma carta, destinada a sua família, onde apresenta a sua decisão de ser ou não um(a) doador(a) de órgãos. Comando de produção: Considerando o contexto de produção acima, elabore uma CARTA ABERTA a ser divulgada em sua página pessoal de uma rede social, destinada aos seus familiares, onde você expresse seu desejo de ser ou não ser doador(a) de órgãos e as razões que o(a) motivaram a tomar tal decisão. Sua carta deve ter o mínimo de 10 e o máximo de 15 linhas. Assine como Lúcia ou Lúcio, sem mais complemento. 719
D14 Carta aberta
Passaram-se oito meses e, em fevereiro de 2014, a família da Vitória quis nos conhecer. Eles estacionaram o carro na frente da nossa casa e meu coração disparou. Quando dei por mim, estávamos todos no meu jardim. Eu abraçada a Deisi, mãe da Vitória, e ao Vinícius, filho mais velho dela. Fábio, aos prantos, não desgrudava do Joel (pai da Vitória). No colo da mãe, a baixinha chorou. Eu a peguei e ela sorriu.
FRENTE
D
PORTUGUÊS
MÓDULO D15
ASSUNTOS ABORDADOS n Manifesto e abaixo-assinado n Manifesto n Abaixo-assinado
MANIFESTO E ABAIXO-ASSINADO Manifesto O manifesto é um tipo de texto dissertativo que vem sendo experienciado pelos vestibulares como opção de redação. Ao longo da história, ouvimos falar de vários manifestos: comunista, futurista, antropófago, poesia Pau Brasil etc. Todos com motivações e alvos diferentes, mas utilizando do mesmo canal de comunicação: a escrita. Não uma simples escrita, mas um manifesto. Afinal, no que consiste esse gênero textual? O objetivo aqui é impactar a opinião pública e, portanto, a linguagem persuasiva é fundamental. Lembra-se do que é persuasão? É quando queremos induzir alguém a apoiar nossa opinião sobre determinado assunto. Assim, a linguagem persuasiva deve ter argumentos convincentes e expositivos e, para tanto, enfatizará os aspectos positivos ou fará um apelo emocional sobre uma situação. Quando se trata de emoção, o manifesto levanta argumentos sobre algo que já é polêmico, a fim de despertar indignação, revolta e protestos. Logo, o princípio e a intenção de convencimento fazem com que o manifesto tenha um caráter político, que atrai a opinião pública e incita a comunidade a tomar uma atitude frente ao problema denunciado. Quando decidir por fazer um manifesto nas aulas de redação ou no vestibular, lembre-se de colocar: título, local, data e escreva “assinaturas” ao final. Nunca se identifique em um concurso, pois sua produção textual pode ser anulada. Além disso, deixe bem claro: o problema discutido, a análise pessoal do autor a respeito do problema e os argumentos-chaves que justificam a escrita do manifesto. Não há uma estrutura fixa a ser seguida, pois se trata de um texto dissertativo. A linguagem deve estar de acordo com o público-alvo. No entanto, não utilize gírias, tampouco palavras de baixo calão.
720
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
Características do manifesto O texto do manifesto é uma forma direta e clara de expressar as intenções de um grupo em diversas situações, com o objetivo de impactar a opinião pública, fazendo uso da linguagem persuasiva, isto é, exprimindo argumentos convincentes sobre uma determinada situação. Pode-se dizer que tal gênero atua como uma espécie de denúncia a respeito de um fato que ainda não é conhecido por toda a população, apresentando um caráter político que atrai a opinião pública e estimula uma atitude por parte da população. Por se tratar de reivindicações, esse gênero textual apresenta, na maior parte das vezes, os verbos no presente do indicativo ou no imperativo. O manifesto também pode ser utilizado por grupos artísticos de maneira poética, transformando o protesto em uma ação artística. A estrutura do manifesto O manifesto não possui uma estrutura tão rígida quando comparado aos demais gêneros. No entanto, geralmente se apresenta da seguinte maneira: n
n
n
Título: sintetiza a problemática a ser trabalhada no texto. Exemplos: “Manifesto Feminista”, “Manifesto por mais saúde nas cidades”, “Manifesto pelos direitos dos animais”; Corpo do texto: normalmente, o primeiro parágrafo apresenta as reivindicações. Depois são expostos as questões problemáticas e os motivos pelos quais elas estão na pauta de discussão. São ainda apresentadas as alternativas ou possíveis soluções para a problemática abordada; Local, data e assinatura dos manifestantes: um manifesto, geralmente, não possui um único autor, sendo criado coletivamente. Dessa maneira, o texto recebe a assinatura de vários autores ou o nome do trabalho do grupo.
D15 Manifesto e abaixo-assinado
Observe que, para escrever um manifesto, faz-se necessário definir alguns pontos: qual é o motivo do seu manifesto? Quais são as questões problemáticas que devem ser discutidas? Qual é o público-alvo? O protesto será voltado para o governo, para as mulheres, homens, sociedade em geral, mães, pais, indústria? O autor será apenas você ou um coletivo de trabalho? Tais questões são de extrema importância, pois ajudarão a definir a linguagem e a forma a ser utilizada no texto, a fim de se obter uma comunicação eficiente.
721
Português
Por que escrever um manifesto? Podemos escrever as intenções de um determinado grupo de várias maneiras: uma carta de intenções, um abaixo-assinado, uma carta de reivindicação de direitos. A forma como a mensagem será lida, em especial com o advento da comunicação por meios eletrônicos, também exerce influência sobre qual será a maneira mais adequada para comunicar as ideias que queremos. Entretanto, o manifesto permanece como uma forma direta e clara de expressar as intenções de um grupo em diversas situações. Em parte, isso acontece porque este é um gênero textual bastante conhecido, independente da faixa etária ou do meio em que será lido. Basta lembrarmo-nos de manifestos bastante famosos, como o Manifesto Antropofágico, escrito pelos modernistas da Semana de 22, no Brasil. Ou mesmo o Manifesto Comunista, que serviu de orientação para os movimentos revolucionários alinhados à esquerda que seguiram após sua publicação.
Abaixo-assinado Em meio à dinâmica que norteia nosso cotidiano, nem sempre nos atemos às nossas atitudes, até porque uma característica inerente ao ser humano é priorizar aquilo que retrata novidade. Em função disso, algumas delas tornam-se banais aos nossos olhos. Exatamente pelo caráter corriqueiro é que não percebemos, mas a todo momento estamos argumentando e contra-argumentando, mediante as mais variadas situações das quais compartilhamos. E quando se trata de tal argumentação, ela está condicionada ao privilégio que nos é atribuído enquanto seres humanos ímpares – o de poder expressar nossas opiniões, revelar nossos sentimentos e, sobretudo, manifestar nosso senso crítico diante dos fatos pertinentes às relações sociais como um todo.
Aqui, de forma específica, enfatizaremos sobre um dos gêneros textuais comumente utilizados no nosso dia a dia – o abaixo-assinado. Trata-se de um texto de cunho argumentativo, no qual um determinado grupo de pessoas se mobiliza em prol de uma reivindicação destinada a alguém com poder de decisão, visando à solução da problemática ora requisitada. Lembrando que, ao nos referirmos sobre esse alguém, estamos relacionando-o a reitores de universidades, autoridades políticas de uma maneira geral, síndicos, representantes de bairros, dentre outros. Tendo em vista a necessidade de formalizar a solicitação por meio de algo que esteja devidamente registrado, visando à credibilidade dessa solicitação, destacaremos alguns pontos que incidirão no momento da escrita, e que, diga-se de passagem, precisam de nossa atenção. Como se trata de uma comunicação realizada de forma coletiva, embora endereçada a um destinatário específico, a estrutura assemelha-se àquela presente nas cartas. Estrutura Quanto à linguagem, o texto deverá ser claro, objetivo e preciso, seguindo o padrão formal da Língua Portuguesa. Estruturalmente, compõe-se das seguintes particularidades: n
n
n
Vocativo − conterá o nome do destinatário e/ou o cargo precedido do respectivo pronome de tratamento, dependendo do grau de formalismo e da posição ocupada perante a sociedade; Corpo do texto − deverá constar a exposição do problema apontado seguido de uma argumentação convincente que a justifique; Local, data e assinaturas das pessoas envolvidas na situação − lembrando que, junto ao nome desses indivíduos, poderá constar dados pessoais, tais como o número de um documento pessoal, cargo ocupado ou endereço.
Exercícios de Fixação
D15 Manifesto e abaixo-assinado
01. (UFPR) Leia a tira abaixo.
(Bill Watterson. Disponível em http://ficcaoenaoficcao.wordpress.com/2012/03/25. Acesso em 26 ago.2012.)
722
Sobre a argumentação de Calvin, considere as seguintes afirmativas: 1. Ao se dirigir à professora, Calvin faz uma simulação do discurso jurídico, tanto no vocabulário quanto na organização dos argumentos. 2. A argumentação de Calvin está fundada na premissa de que a ignorância é uma condição necessária para a felicidade. 3. Calvin questiona a eficiência da professora quando diz que sua aula é uma tentativa deliberada de privá-lo da felicidade.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
4. Ao gritar “Ditadura!” no último quadrinho, Calvin protesta contra o desrespeito à Constituição, que lhe garante o direito inalienável à felicidade. Assinale a alternativa correta. a) Somente as afirmativas 1 e 3 são verdadeiras. b) Somente as afirmativas 1 e 2 são verdadeiras. c) Somente as afirmativas 2, 3 e 4 são verdadeiras. d) Somente as afirmativas 1, 2 e 4 são verdadeiras. e) As afirmativas 1, 2, 3 e 4 são verdadeiras. Texto comum às questões 02 e 03 Dez anos de Flip
Segundo o autor, qual é a crítica à Flip feita pelos escritores que assumem a perspectiva apocalíptica? a) A subordinação da produção literária e de sua divulgação na Flip aos interesses comerciais das grandes editoras. b) A exposição exagerada dos autores e de suas obras na mídia, o que resulta na banalização da produção literária. c) O alto custo do evento para os participantes, dificultando o acesso do público realmente interessado. d) A superficialidade dos leitores, mais interessados em ver e ouvir os escritores do que em ler suas obras. e) A falta de patrocinadores para o evento, o que colocaria em risco a continuidade da Flip nos próximos anos. 03. (UEPG PR)
ções tão contraditórias quanto a Flip (Festa Literária Internacional de Paraty), desde que, há dez anos, ela fez de Paraty uma das capitais mundiais da literatura. Recorrendo à polarização proposta por Umberto Eco décadas atrás, há os apocalípticos e os integrados. Para os primeiros, a Flip é um show midiático patrocinado pelas grandes corporações da vida editorial, uma prova de como o capitalismo compra e corrompe tudo – e podemos encontrar sinais de “apocalipse” até no insuspeito escritor Jonathan Franzen (capa da Time como “o romancista da América”). Em sua palestra lembrou que, ao chegar a Paraty, encontrou placas enormes com propaganda de um cartão de crédito e, sussurrou, conspirador, “isso já diz muita coisa”. Os americanos também adoram falar mal do dinheiro. Franzen é um realista de carteirinha. Mas outro grande escritor, este de vocação nefelibata, o espanhol Enrique Vila-Matas, denuncia com uma certa volúpia a “extinção da literatura”, entregue hoje ao horror das leis do mercado. Bem, não tomemos ao pé da letra a afirmação, uma licença poética transcendente – segundo o clássico gosto ibérico, a realidade é uma consequência do desejo, e não o contrário. A ideia apocalíptica pressupõe uma utopia poética, mas também política, redentora e pura, onde a arte, enfim, brilhará como um diamante intocado pelo mundo real. Enquanto isso não acontece, os integrados leem livros, pedem autógrafos, lotam as tendas da Flip, bebem cachaça, passeiam pela cidade histórica, conversam fiado, odeiam alguns autores e amam outros; há um clima de devoção e um culto das celebridades que faz parte do pacote (a diária num hotel de Paraty durante a Flip é uma das mais caras do mundo). (Adaptado de TEZZA, Cristovão. Dez anos de Flip. Gazeta do Povo, 30 jul. 2012.)
02. (UFPR) Em sua apresentação do ponto de vista apocalíptico sobre a literatura, Tezza afirma: “A ideia apocalíptica pressupõe uma utopia poética, mas também política, redentora e pura, onde a arte, enfim, brilhará como um diamante intocado pelo mundo real”.
Reduza a marcha para viver melhor Plugados, conectados, acelerados. Assim vivemos esses dias modernos. Assumimos muitos compromissos e esperamos realizá-los em tempo recorde. Fazemos horas extras na empresa, checamos nossos e-mails a cada instante e somos constantemente acompanhados pela incômoda sensação de que não vamos conseguir cumprir tudo o que temos agendado. Em resumo: são muitos deveres e pouco repouso. Além disso, muita gente confunde agenda lotada com sucesso profissional e competência. Isso não passa de um equívoco. Pequenas pausas são fundamentais e ajudam a reencontrar nossa identidade, que foi perdida no meio dessa correria sem fim. Em contrapartida, quantas vezes, ao desacelerar um pouco, atingimos um silêncio interior tão grande que chega a incomodar? Segundo a psicóloga Patrícia Gebrim, autora do livro Enquanto Escorre o Tempo (Editora Pensamento Cultrix), isso acontece porque as pessoas que estão sempre com a cabeça nas atividades tornaram-se meras cumpridoras de papéis, perdendo assim a sua essência. Elas correm tanto que se esquecem de quem são e passam a se identificar com o que compram, fazem ou com o trabalho. Portanto, é preciso utilizar momentos de sossego para dar um passo para trás e redescobrir quem somos. “Caso contrário, boicotaremos qualquer tentativa de melhorar a qualidade de vida”, pontua a psicóloga. Adaptado de: Angela Tessicini. Revista Vida Natural. Ano III. Edição 43 – novembro/2010.
Assinale o que for correto em relação às ideias veiculadas no texto. 01. O verdadeiro sucesso é aquele em que o ser humano não deixa de lado a sua verdadeira essência. 02. Na dinâmica exageradamente atribulada do dia a dia podemos ter atitudes para melhorar a qualidade de nossa vida. 04. Parar um pouco permite reequilibrar as energias que serão utilizadas para redirecionar a nossa vida para onde desejamos. 08. Há pessoas que têm dificuldade de diminuir o ritmo e aquietar a mente.
723
D15 Manifesto e abaixo-assinado
Ao mesmo tempo, poucos eventos culturais despertam rea-
artsm cogem cor-
Português
s da mbos ado-
Exercícios Complementares Texto comum às questões 01, 02 e 03
itura
Leio o texto “Os onze – Ayres Britto, o ex-amigo de Lula”. OS ONZE Ayres Britto - O ex-amigo de Lula
D15 Manifesto e abaixo-assinado
[...] O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Carlos Ayres de Britto, tornou-se a grande decepção do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na cúpula do Judiciário. No último gesto em desacordo com o Lula, Ayres Britto marcou o julgamento do mensalão para o início de agosto, em plena campanha eleitoral. Lula queria empurrar a decisão, pelo menos, para 2013. O empenho de Ayres Britto se explica em parte pelas pressões que o Supremo sofre para julgar logo o caso. Ao mesmo tempo, assegura sua participação no clímax do mais badalado e complexo processo da história da corte. No dia 18 de novembro deste ano, Ayres completará 70 anos e se aposentará, como determina a lei. Antes disso, registrará na biografia o papel de protagonista de um momento especial do Supremo. Lula indicou Ayres Britto para o STF no primeiro semestre de 2003, logo depois de chegar ao Palácio do Planalto. Ele fez a escolha com a expectativa de que teria no Supremo um aliado para as grandes causas do governo. [...]. Advogado, professor universitário e poeta, Ayres Britto também fazia política em Sergipe. Era filiado ao PT, partido pelo qual se candidatou mais de uma vez. Dono de uma bem sucedida banca de advocacia, tinha um padrão de vida muito superior ao dos militantes petistas. Lula costumava contar com Ayres Britto de cicerone, quando visitava Aracaju nos anos anteriores à primeira eleição para presidente da República. Em seu carro com ar condicionado, Lula desfrutava a conversa agradável, a cultura e a gentileza do correligionário sergipano. Não eram amigos íntimos, mas nutriam simpatia mútua. Alguns setores do PT local resistiam à presença em suas fileiras daquele advogado de hábitos refinados. Seu nome estava nos planos de Lula para o STF desde a campanha eleitoral de 2002. Antes da escolha definitiva, Ayres Britto ainda contou com três padrinhos influentes. Os juristas de São Paulo Dalmo Dalari, Fábio Konder Comparato e Celso Bandeira de Mello fizeram gestões a seu favor. Com tantas recomendações, o poeta nascido em Propiá, Sergipe, com reconhecida atuação acadêmica e profissional na área do Direito, assumiu uma cadeira no Supremo no dia 25 de junho de 2003. Para o PT, era a primeira vez que um militante do partido passava a integrar o STF. No lugar onde esperava um aliado, Lula deparou com um homem disposto a ostentar independência em relação ao Palácio do Planalto. Logo que chegou ao Supremo, Ayres
724
Britto votou contra o governo numa ação relacionada à Previdência. Ele se opôs à cobrança de imposto sobre os vencimentos dos inativos. Embora surpreso, Lula aceitou a postura do ministro que escolhera. A paciência acabou em 2010, quando Ayres Britto presidiu o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Em abril daquele ano, o TSE condenou Lula a uma multa de R$ 5 mil, por fazer campanha antecipada para a pré-candidata Dilma Rousseff durante a inauguração de uma obra em Manguinhos, Rio de Janeiro. Durante o julgamento e em entrevistas, Ayres Britto repreendeu o comportamento de Lula. Disse que o uso da máquina administrativa para fazer campanha era antirrepublicano, parte de um projeto de continuísmo no poder. Lula interpretou o discurso como um gesto agressivo contra a candidatura de Dilma. Ficou irritado e reclamou do comportamento do ministro com um dos juristas que apadrinharam sua indicação. [...]. Nos poucos meses na presidência do STF, ele ainda empunhou uma bandeira corporativa: tomou a frente de reivindicação de aumento salarial para o Judiciário. [...]. No ano passado, o ministro Ricardo Lewandowski, revisor do caso, disse que a demora em tomar a decisão poderia levar à prescrição de alguns crimes. A repercussão foi ruim. [...]. Lewandowski resistiu alguns dias, reclamou da interferência em seu trabalho, mas cedeu às pressões e atendeu ao pedido. A distância entre Lula e o presidente do STF ficou maior. Quando os dois se encontram, cumprimentam-se com cortesia, sem entusiasmo. Mais que qualquer outro integrante do Supremo, Ayres Britto concentra as mágoas do presidente que o indicou. Fonte: Revista Época, Edição 742, 6 de agosto de 2012, p. 60-78.
01. (UFGD MS) Assinale a alternativa que explica o motivo da decepção do presidente Lula com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Carlos Ayres de Britto. a) O presidente do Supremo “registrará na biografia o papel de protagonista de um momento especial do Supremo”. b) Carlos de Ayres Britto, “Dono de uma bem-sucedida banca de advocacia, tinha um padrão de vida superior ao dos militantes petistas”. c) “Alguns setores do PT local resistiram à presença em suas fileiras daquele advogado de hábitos refinados”. d) “Para o PT, era a primeira vez que um militante do partido passava a integrar o Superior Tribunal Federal”. e) Carlos de Ayres Britto se mostrou “[...] um homem disposto a ostentar independência em relação ao palácio do Planalto”. 02. (UFGD MS) Segundo o texto, é correto afirmar que a nomeação de Ayres Britto para o Superior Tribunal Federal significou
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
03. (UFGD MS) Assinale a proposição que interpreta de modo correto a seguinte expressão: “Empunhou uma bandeira corporativa”. a) Associou-se a uma corporação. b) Julgou crimes corporativos. c) Defendeu interesses da carreira. d) Despertou a opinião pública para crimes de corrupção. e) Repreendeu aqueles que usam dinheiro público para fazer campanha política. Texto comum às questões 04, 05, e 06 Neste exato instante em que seus olhos passam por estas linhas, está ocorrendo um pequeno milagre da tecnologia. Não, 2 não estou falando do computador nem da transmissão de dados pela internet, mas da boa e velha leitura, inventada pela primeira 3 vez cerca de 5.500 anos atrás. Para nós, leitores experimentados, ela parece a coisa mais natural do mundo, mas isso não passa 4 de uma ilusão. Ler não apenas não é natural como ainda envolve cooptar uma complexa rede de processos neurológicos que 5 surgiram para outras finalidades. 6 Acho que dá até para argumentar que a escrita é a mais fundamental criação da humanidade. Ela nos permitiu ampliar 7 nossa memória para horizontes antes inimagináveis. Não fosse por ela, jamais teríamos atingido os níveis de acúmulo, 8 transmissão e integração de conhecimento que logramos obter. Nosso modo de vida provavelmente não diferiria muito daquele 9 experimentado por nossos ancestrais do Neolítico. 10 A conclusão é que, de alguma forma, conseguimos adaptar nosso cérebro de primatas para lidar com a escrita. Para 11 Stanislas Dehaene (matemático e neurocientista francês), operou aqui o fenômeno da reciclagem neuronal, pelo qual processos 12 que surgiram para outras funções foram recrutados para a leitura. A coisa funcionou tão bem que nos tornamos capazes de ler 13 com proficiência e rapidez, obtendo a façanha de absorver a linguagem através da visão, algo para o que nosso corpo e mente 14 não foram desenhados. 15 Antes de continuar, é preciso qualificar um pouco melhor esse “funcionou tão bem”. É claro que funcionou, tanto que me 16 comunico agora com você, leitor, através desse código especial. Mas, se você puxar pela memória, vai se lembrar de que teve de 17 aprender a ler, um processo que, na maioria esmagadora dos casos, exigiu instrução formal e vários anos de treinamento até 18 atingir a presente eficiência. 19 Enquanto a aquisição da linguagem oral ocorre, esta sim, naturalmente e sem esforço (basta jogar uma criança pequena 20 numa comunidade linguística qualquer que ela “ganha” o idioma), a escrita/leitura precisa ser ensinada e praticada. 1
As dificuldades não são poucas. Começam nos olhos (só conseguimos ler o que é captado pela fóvea) e se estendem por 22 todo o tecido neuronal. Um problema particularmente interessante é o da invariância. Como o cérebro faz para concluir que A, a, a, 23 a, a são a mesma letra, apesar dos diferentes desenhos? Pior, mesmo quAnDo fazemos uma sopa de fontes e mIsturAmos 24 TuDo, continuamos DECIFRANDO A MENSAGEM com pouca perda de velocidade. 21
(Adaptado de SCHWARTSMAN, Hélio. Conversando com os mortos. Folha de S. Paulo. 14 jun. 2012.)
04. (UFPR) A partir da leitura do texto, considere as seguintes afirmativas: 1. A escrita é um recurso tecnológico, um código, e sua invenção redimensionou o conhecimento humano. 2. Na escrita, observa-se o problema da invariância quando um mesmo sinal gráfico é usado para representar letras diferentes. 3. O aprendizado da leitura é análogo ao da oralidade: ambos dependem de instrução formal e treinamento. 4. A escrita não possibilita apenas a ampliação da memória humana, mas também a interligação e o compartilhamento de informações. Corresponde(m) ao ponto de vista de Schwartsman no texto a(s) afirmativa(s): a) 1 apenas. d) 1 e 4 apenas. b) 2 apenas. e) 1, 3 e 4 apenas. c) 2 e 3 apenas. 05. (UFPR) Nas referências 22 a 24, observa-se no texto uma formatação não convencional, usada pelo autor com o propósito de estabelecer, entre a forma e o conteúdo do texto, uma relação de: a) descompasso. d) disjunção. b) alternância. e) equivalência. c) ambiguidade. 06. (UFPR) A partir da leitura do texto “Sobre quem gosta de ler”, identifique as afirmativas a seguir como verdadeiras (V) ou falsas (F): ( ) Para Tom Zé, a leitura é um processo dialógico, em que o texto questiona o leitor e solicita dele reações e respostas. ( ) Segundo o autor, a leitura é um processo em que o leitor interroga o livro em busca de respostas a questões formuladas previamente. ( ) Tom Zé considera a leitura um processo colaborativo, em que o leitor participa da criação do universo representado no texto escrito. ( ) Segundo Tom Zé, a ação e o dinamismo de um leitor podem ser observados a partir de seus gestos e movimentos. Assinale a alternativa que apresenta a sequência correta, de cima para baixo. a) V – F – F – V. b) F – V – V – F. c) V – F – V – F. d) F – V – F – V. e) V – V – V – V. 725
D15 Manifesto e abaixo-assinado
a) a primeira vez que um militante do Partido dos Trabalhadores integrava o STF. b) um refinamento nos hábitos dos militantes do Partido dos Trabalhadores. c) a concretização do maior sonho de Ayres Britto. d) um gesto de desacordo entre o presidente Lula e o STF. e) a primeira vez que um poeta assume a uma cadeira no STF.
FRENTE
D
PORTUGUÊS
MÓDULO D16
ASSUNTOS ABORDADOS n Texto descritivo n Características n Estrutura descritiva n Tipos de descrição n Como fazer um bom texto descritivo
TEXTO DESCRITIVO O texto descritivo é um tipo de produção textual que envolve a descrição de algo, seja de um objeto, pessoa, animal, lugar ou acontecimento, e sua intenção é, sobretudo, transmitir para o leitor as impressões e as qualidades de algo. Em outras palavras, o texto descritivo capta as impressões, de forma a representar a elaboração de um retrato, como uma fotografia revelada por meio das palavras. Assim, alguns aspectos são de suma importância para a elaboração desse tipo textual, desde as características físicas e/ou psicológicas do que se pretende analisar, a saber: cor, textura, altura, comprimento, peso, dimensões, função, clima, tempo, vegetação, localização, sensação, localização, dentre outros.
Características n n n n n n n
Retrato verbal. Ausência de ação e relação de anterioridade ou posterioridade entre as frases. Predomínio de substantivos, adjetivos e locuções adjetivas. Utilização da enumeração e comparação. Presença de verbos de ligação. Verbos flexionados no presente ou no pretérito (passado). Emprego de orações coordenadas justapostas.
Estrutura descritiva A descrição apresenta três passos para a construção: n n n
Introdução: apresentação do que se pretende descrever; Desenvolvimento: caracterização subjetiva ou objetiva da descrição; Conclusão: finalização da apresentação e caracterização de algo.
Tipos de descrição Conforme a intenção do texto, as descrições são classificadas em: n
n
Descrição subjetiva: apresenta as descrições de algo, todavia, evidencia as impressões pessoais do emissor (locutor) do texto. Como exemplos, destacam-se os textos literários repletos de impressões dos autores. Descrição objetiva: nesse caso, o texto procura descrever de forma exata e realista as características concretas e físicas de algo, sem atribuir juízo de valor, ou impressões subjetivas do emissor. Como exemplos, destacam-se os retratos falados, manuais de instruções, verbetes de dicionários e enciclopédias.
Como fazer um bom texto descritivo O texto descritivo é marcado pela proposta de ser um retrato de pessoas, objetos ou cenas. Assim, esse tipo de texto é uma espécie de fotografia do objeto descrito. Além das características físicas, o leitor é incitado à compreensão por meio do uso de todos os sentidos: tato, visão, audição, paladar e olfato. Conforme o que será descrito, o leitor é levado a compreender também as características psicológicas e interiores do objeto.
726
Questão 01. a) “um homenzinho nascido em dias de maio”; “de pouco mais ou menos trinta e cinco anos de idade”; “magro”; “narigudo”; “de olhar vivo e penetrante”; “vestido de calção e meias pretas, sapatos de fivela, capote e chapéu armado”. b) Um novo fato/evento/acontecimento/episódio/caso veio porém um dia dar outra cor e andamento aos atos/eventos/acontecimentos/episódios/casos.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias Questão 03. A representação de Átila, rei dos hunos, alude à imagem aterrorizante que se tinha dos povos denominados de bárbaros pelo ocidente europeu. O excerto descreve a altivez dessa personagem asiática e suas características físicas, relacionando-as às suas origens.
Exercícios de Fixação
cor e andamento aos sucessos; foi o encontro dos dois, padrinho e afilhado, em casa de D. Maria com uma personagem estranha a ambos. Era um conhecido de D. Maria que havia há pouco chegado de uma viagem à Bahia. Figure o leitor um homenzinho nascido em dias de maio, de pouco mais ou menos trinta e cinco anos de idade, magro, narigudo, de olhar vivo e penetrante, vestido de calção e meias pretas, sapatos de fivela, capote e chapéu armado, e terá ideia do físico do sr. José Manoel, o recém-chegado. ALMEIDA, Manuel Antonio de. Memórias de um sargento de milícias. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 102.
a) O texto acima contém elementos narrativos e descritivos. Transcreva quatro expressões de caráter descritivo. b) “Um novo sucesso veio porém um dia dar outra cor e andamento aos sucessos”. Reescreva a frase, substituindo as palavras sublinhadas por outras de sentido equivalente. 02. (UFJF MG) Leia o fragmento da crônica “O filho do japonês”, de Maluh de Ouro Preto “Ventava muito... A lua estava enorme, quase cheia, na noite do primeiro aniversário da morte do filho do japonês. Ventava muito... Da estrada, das ruas de terra batida, subia poeira fina, asfixiante, os galhos nus gemiam, nas encostas a relva tremia. Ventava muito... A água da enseada se encrespou de pequenas ondas sussurrantes, batendo nos rochedos limosos, nos cascos dançantes dos barcos parados, rolando, rolando seixos já redondos e polidos, búzios irisados de cores. Ventava muito... Aquela noite as traineiras voltaram cedo, os pescadores cercaram as redes mais depressa, foi mais rápida a rotina compassada do arrastão, e apesar do luar, as meninas e moças não foram brincar de roda. Ventava muito... Como sempre, a pequena aldeia junto ao mar estava quieta, tristonha e linda, na sua poesia de luzes vacilantes, árvores curvadas, casas humildes e caminhos ásperos. Ventava muito... Nas ruas corriam cães vadios, porcos gordos e cabritos velozes atravessavam a estrada, um cavalo pastava solitário, e a lua subia, prateada, enorme, quase cheia, na noite do primeiro aniversário da morte do filho do japonês. A viúva do japonês, mãe do morto, quis mandar dizer missa, e as filhas pediram ao pároco da cidade vizinha que viesse, mas o padre disse que não, que sentia muito, mas não podia, era tão longe e fora de mão, tão escondido o lugarejo onde nascera e vivera, mas não morrera o filho do japonês... O filho do japonês tinha 20 anos. Forte, risonho, bonito, de tez morena e olhos amendoados, tinha um ar diferente na mistura do sangue caboclo e oriental. Exímio nadador e mergulhador, era quem me-
lhor “matava” lagostas na redondeza, o fornecedor amigo dos turistas. Um dia, fez-se embarcadiço num pesqueiro de camarão, e deixando as lagostas e veranistas, a casa na beira da praia e o botequim herdado do pai, deixando as namoradas, a mãe viúva e as irmãs de olhos puxados, deixando a vila onde nascera e vivera, pôs-se a navegar de norte a sul do país, num barco grande que, certa vez, foi pra bem longe, para as bandas do Uruguai. Uma noite o vento soprou forte, fortíssimo, vento impetuoso de tormenta, águas furiosas entraram no barco, que se abriu, afundou, foi a pique, levando consigo os doze tripulantes, entre os quais o filho do japonês... (...) Ventava muito... A lua estava enorme, quase cheia na noite do primeiro aniversário da morte do filho do japonês. O padre não veio. Natividade, bombeiro sacristão, rezou o terço e ladainha dos mortos, a gente da aldeia cantou, cães latiram, o mar bateu mais forte na colina da capelinha branca, cantando também nos rochedos e seixos rolados, nos cascos dançantes dos barcos parados. Finda a reza, caladas as vozes, fechada a igreja, apagadas as velas, o vento continuou soprando sobre a vila adormecida, o mar continuou sussurrando, e a lua continuou crescendo, no silêncio imenso, na noite fria, linda, que marcou o primeiro aniversário da morte do filho do japonês.” PRETO, Maluh de Ouro. “O filho do japonês”. In: SALES, Herberto (org.) Antologia de crônicas. São Paulo: Ediouro, 2005, pp. 101-103.
Pode-se afirmar que o primeiro parágrafo do texto é marcado pelo predomínio da descrição e o segundo pelo da narração. Identifique os elementos textuais dos parágrafos que permitem demonstrar tal afirmativa. 03. (Unesp SP) Um autor do século VI assim descreveu o rei Átila, que, comandando os hunos, chegou às portas de Roma: Homem vindo ao mundo em um entrechoque de raças, terror de todos os países, não sei como ele semeava tanto pavor, a não ser pela ligação que se fazia de sua pessoa com um sentimento de terror. Tinha um porte altivo e um olhar singularmente móvel, se bem que cada um de seus movimentos traduzisse o orgulho de seu poder. (...) sua pequena-estatura, seu peito largo, sua cabeça grande, seus olhos minúsculos, sua barba rala, sua cabeleira eriçada, seu nariz muito curto, sua tez escura eram sinais de suas origens. (Jordanes. Getica XXXV (c. 551), citado por Jaime Pinsky (org.). O modo de produção feudal, 1982.)
Ao representar Átila, que imagem dos bárbaros o autor transmite?
Questão 02. A descrição pode ser identificada no 1º par por meio de citações de elementos descritivos do ambiente em que ocorre o episódio narrado no texto. A narração no 2º parágrafo pode também ser identificada por meio de citações do fato narrado. Ainda é possível identificar entre os parágrafos a diferença no uso predominante de adjetivos e verbos no pretérito imperfeito no 1º parágrafo, e de marcadores temporais e verbos no pretérito perfeito, no 2º.
727
D16 Texto descritivo
01. (UEG GO) Um novo sucesso veio porém um dia dar outra
ande
Português
dos ados
letes ntos
Exercícios Complementares 02. (Fac. Cultura Inglesa SP)
01. (PUC GO)
amagros
4 [...] Aos domingos, quando Zana me pedia para comprar miúdos de boi no porto da Catraia, eu folgava um pouco, passeava ao léu pela cidade, atravessava as pontes metálicas, perambulava nas áreas margeadas por igarapés, os bairros que se expandiam àquela época, cercando o centro de Manaus. Via um outro mundo naqueles recantos, a cidade que não vemos, ou não queremos ver. Um mundo escondido, ocultado, cheio de seres que improvisavam tudo para sobreviver, alguns vegetando, feito a cachorrada esquálida que rondava os pilares das palafitas. Via mulheres cujos rostos e gestos lembravam os de minha mãe, via crianças que um dia seriam levadas para o orfanato que Domingas odiava. Depois caminhava pelas praças do centro, ia passear pelos becos e ruelas do bairro da Aparecida e apreciar a travessia das canoas no porto da Catraia. O porto já estava animado àquela hora da manhã. Vendia-se tudo na beira do igarapé de São Raimundo: frutas, peixe, maxixe, quiabo, brinquedos de latão. O edifício antigo da Cervejaria Alemã cintilava na Colina, lá no outro lado do igarapé. Imenso, todo branco, atraía o meu olhar e parecia achatar os casebres que o cercavam. [...]. Mirava o rio. A imensidão escura e levemente ondulada me aliviava, me devolvia por um momento a liberdade tolhida. Eu respirava só de olhar para o rio. E era muito, era quase tudo nas tardes de folga. Às vezes Halim me dava uns trocados e eu fazia uma festa. Entrava num cinema, ouvia a gritaria da plateia, ficava zonzo de ver tantas cenas movimentadas, tanta luz na escuridão. [...]. (HATOUM, Milton. Dois irmãos. 19. reimpr. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. p. 59-60.)
D16 Texto descritivo
Assinale a alternativa que indica corretamente a sequência tipológica que predomina no texto: a) Descritiva. Verbos de estado e no pretérito imperfeito, associados a enumerações e a adjetivações, mostram cenas de Manaus sob o ponto de vista do enunciador do texto. b) Narrativa. Verbos de ação, associados a marcadores temporais, são responsáveis por mostrar o percurso feito pelo narrador na cidade e os conflitos por ele ali vividos. c) Dissertativo-argumentativa. O enunciador utiliza informações, fatos e opiniões para convencer o interlocutor de que a cidade que não se vê também deve ser considerada importante. d) Injuntivo-instrucional. O enunciador se vale do apelo para instruir o interlocutor sobre os caminhos possíveis para se conhecer a cidade de Manaus que não se vê.
728
Bruninho resolverá a pobreza global? Bruno Monteiro começa sua jornada de bebê às 7h30. Brinca, chora, faz cocô e outras coisas de neném. Ele nem sabe andar, mas já está em curso um intenso debate sobre como ele trabalhará no futuro. A maioria dos economistas e demógrafos acredita que temos um problema pela frente. O número de filhos por casal vem caindo, e a geração de Bruno será menos numerosa que o necessário para garantir que a economia global cresça. Menor produção global significa mais dificuldade para que a humanidade vença a miséria. Por essa perspectiva, os bebês de hoje, por melhores trabalhadores que sejam, não conseguirão produzir o bastante para assegurar boa vida à sociedade toda. Mas um pequeno grupo de otimistas desafia esse prognóstico sombrio. Entre os otimistas estão os pesquisadores austríacos Erich Striessnig, do Centro Wittgenstein para Demografia e Capital Humano Global, e Wolfgang Lutz, do Instituto Internacional de Análise de Sistemas Aplicada. Num estudo feito em 2014, eles concluíram que os adultos do futuro, graças à educação e à tecnologia, poderão se tornar tão produtivos que compensarão a pequena quantidade de braços para trabalhar. Combinada a outros fatores, essa altíssima produtividade garantirá o desenvolvimento global. Hoje, vários governos, como o do Japão, preocupam-se porque os nascimentos ocorrem abaixo da taxa de reposição para compensar mortes precoces e manter a população estável. Os pesquisadores austríacos acham essa preocupação exagerada. “Para encontrar a melhor taxa, não basta olhar o número de crianças necessário para manter constante a população. É preciso olhar para as características dessas crianças”, afirma Striessnig. “Uma população que passou mais anos na escola tem um maior capital humano e tende a ser mais produtiva.” Cabe, portanto, a cada sociedade zelar para que bebês como Bruno tenham educação primorosa – um desafio que o Brasil, até o momento, não conseguiu superar. (Marcelo Moura e Aline Imercio. Época, 02.02.2015. Adaptado.)
Analisando a construção do texto, é correto afirmar que os autores a) introduzem a discussão sobre crescimento populacional por meio de pergunta retórica, para a qual eles dão parecer pessoal. b) expõem o ponto de vista de estudiosos da economia global que, majoritariamente, creem na capacidade de superação da pobreza pelas novas gerações.
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
c) descrevem parte da jornada de Bruninho, bebê cujo papel é servir de exemplo real à situação a ser debatida no texto. d) citam como fato histórico a retração da economia japonesa e suas consequências na configuração populacional do país. e) narram sucintamente experiências pessoais que estão relacionadas à rotina e à educação de bebês como Bruno Monteiro.
d) aponta, por meio de construções contrastivas, a diferença entre personalidades, revelada pelo olhar que as pessoas têm em situações específicas. 04. (UFPB) 5 Fizeram festa na botada. Os jornais da Paraíba deram notícias, falando no progresso que entrava para a 6 várzea do Paraíba, no gênio empreendedor do dr. José de Melo,
Olhar vítreo Durante toda a conferência seus olhos se mantiveram fixados na minha figura. Não estou falando do olhar de quem ouve uma conferência e se mantém ligado ao que está sendo dito. Esse olhar é um olhar comum, situacional, que faz corresponder a que veio. É de aluno, se está numa sala de aula; é de secretária se está no escritório; é de vendedor se pretende vender um produto. Mas aquele olhar era vítreo. Não se alterava com a situação. Não se expressava como os olhares dos demais ouvintes. Não sorria quando era para sorrir, não se manifestava insatisfeito, não demonstrava impaciência ou raiva. E começava a interferir na minha fala. Em princípio, tentei eliminar mentalmente sua presença, mas o que ocorre de fato, é o contrário. Passamos a olhar mais para ele do que para os outros. Tornamo-nos presas de um inferno vítreo do qual não conseguimos nos livrar. E ele estava lá me dizendo alguma coisa que não conseguia decifrar. Sua impassibilidade forçava a minha mobilidade
na riqueza que seria para o estado um
7
empreendimento
daquele gênero.[...] 8
O Santa Rosa se encheu de convidados. A velha casa, onde
o velho José Paulino vivera os seus oitenta 9 e tantos anos, se reformara também. Ali na cozinha, nas portas largas por onde entravam e saíam os moradores
10
e as negras, tinham posto
grades de ferro. A sala de visitas se enfeitara de poltronas, como as que se viam nas 11 casas da cidade. Os quartos de dormir se forraram. [...] 19
D. Dondon, mulher do dr. Juca, estranhou aquilo. Falou com
o marido, que aquilo não se fazia, que as 20 negras não podiam ser tratadas como cachorros. Eram do engenho, o velho criara aquela gente. E fazer o que 21 faziam com elas era uma ruindade sem tamanho.[...] 28
No dia da botada da Bom Jesus houve festa de arrombar, veio
banda de música, gente de toda a parte, 29 parentes do Itambé. E até o governador mandara o seu representante. O povo lá
insegura. Sua constância ia interferindo nas minhas oscilações de tom de voz e de movimento dos gestos. Conforme foi passando o tempo, foram evoluindo as consequências desastrosas daquele fenômeno. Fui me sentindo oco, com intervalos
por fora, os cabras de eito, os 30 agregados olhavam o aconte-
sensoriais que me atormentavam. Parece que fui deixando de acreditar na veridicção do que falava. E eu estava sozinho, sem testemunha ocular. A não ser aqueles olhos que geravam tudo aquilo e geriam meus procedimentos. Em momento algum acompanhou o movimento do auditório. A impressão que eu tinha é de que ele sabia de tudo. Sabia que estava me deteriorando pouco a pouco. Que estava triturando o último fio de segurança que me restava. Esquálido, fui perdendo o gosto pelo que falava, tentei arrumar uma conclusão e diminuí uns bons minutos para me livrar daquilo. Mal encerrei a última fala, antes dos aplausos de praxe, ele se levantou e saiu.
bira. 32 Folhas de zinco cobriam a maquinaria, uma chaminé de
(GONÇALVES, Aguinaldo. Das estampas. São Paulo: Nankin Editorial, 2013. p. 131-132. Adaptado.)
No texto o enunciador (assinale a alternativa correta): a) narra, por meio de verbos de elocução, as intenções de uma pessoa desconhecida que lhe fixou um olhar de condenação. b) descreve, por meio de signos linguísticos diversos, as impressões e o desconforto deixados por um olhar profundo durante uma conferência. c) avalia, por meio de adjetivos, o comportamento inadequado de pessoas que vão a eventos formais para perturbar o sossego dos palestrantes.
cimento de boca aberta. Os antigos moradores, os João Rouco, estavam também 31 animados com a mudança. Os paredões do engenho haviam crescido, o telheiro baixo de antigamente sutijolo vermelho mostrava-se nova em folha, dominando 33 tudo com aquela ponta fina dos para-raios. REGO, José Lins do. Usina. 20 ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2010, p. 89-91.
Observa-se a predominância de sequência textual descritiva nos seguintes fragmentos: a) “Os jornais da Paraíba deram notícias, falando no progresso que entrava para a várzea do Paraíba, no gênio empreendedor do dr. José de Melo [...]” (Refs. 5 - 6) b) “E as negras tiveram que procurar abrigo mais para longe. Avelina, Luísa, Generosa, Joana Gorda que fossem arranjar os seus teréns lá para o alto.” (Refs. 17 - 18) c) “D. Dondon, mulher do dr. Juca, estranhou aquilo. Falou com o marido, que aquilo não se fazia, que as negras não podiam ser tratadas como cachorros.” (Refs. 19 - 20) d) “No dia da botada da Bom Jesus houve festa de arrombar, veio banda de música, gente de toda a parte, parentes do Itambé.” (Refs. 28 - 29) e) “Folhas de zinco cobriam a maquinaria, uma chaminé de tijolo vermelho mostrava-se nova em folha, dominando tudo com aquela ponta fina dos para-raios.” (Refs. 32 - 33) 729
D16 Texto descritivo
03. (PUC GO)
FRENTE
D
PORTUGUÊS
Exercícios de Aprofundamento 01. (Enem MEC) A escrita é uma das formas de expressão que as pessoas utilizam para comunicar algo e tem várias finalidades: informar, entreter, convencer, divulgar, descrever. Assim, o conhecimento acerca das variedades linguísticas sociais, regionais e de registro torna-se necessário para que se use a língua nas mais diversas situações comunicativas.
“Mas é preciso orientar as pessoas. Quem faz compras para o mês inteiro não vai levar um monte de sacolas de pano para o mercado”. Ainda será preciso criar alternativas para as compras do mês, que enchem o porta-malas do carro. Uma opção é usar caixas de papelão.
Considerando as informações acima, Imagine que você está a procura de um emprego e encontrou duas empresas que precisam de novos funcionários. Uma delas exige uma carta de solicitação de emprego. Ao redigi-la, você a) fará uso da linguagem metafórica. b) apresentará elementos não verbais. c) utilizará o registro informal. d) evidenciará a norma padrão. e) fará uso de gírias.
Sacolas retornáveis substituindo as de plástico é opção em Ponta Grossa e ganha mercado (...) sacolas retornáveis, confeccionadas com sacos de ráfia de farinha e açúcar e decoradas com fuxicos e alças de tecidos, é opção em Ponta Grossa para os sacos plásticos utilizados em padarias e supermercados. O movimento Nós Podemos Paraná em Ponta Grossa lançou uma Campanha para retirar do meio ambiente as sacolas plásticas e ao mesmo tempo gerar renda para famílias carentes (...) “O legal desse projeto é que reutiliza material e não extrai mais matéria-prima virgem”.
02. (UEM PR) A coletânea de recortes de textos abaixo, retirados de fontes variadas, aborda uma temática social contemporânea. Tendo a coletânea como apoio, redija os gêneros textuais solicitados. Quando surgiram, no final da década de 1950, as sacolas de plástico eram motivo de orgulho das redes de supermercados e símbolo de status entre as donas-de-casa. Em meio século, passaram de símbolo da modernidade a vilãs do meio ambiente. (Revista da Semana, 15/10/2007. Site: http://planetasustentavel.abril.com.br/noticia)
Estima-se que os brasileiros joguem fora, mensalmente, um bilhão de sacolinhas distribuídas pelo comércio, principalmente os supermercados – cada consumidor descarta mensalmente 66 unidades. (...) no Brasil já se vêem comerciantes e consumidores tomarem a iniciativa de substituição da velha sacolinha, politicamente incorreta, e as autoridades começam a buscar soluções para que ela vá saindo do nosso dia a dia. (Revista ISTOÉ, 17/10/2007, p. 76-77)
Grifes brasileiras vão apresentar bolsas de compras reutilizáveis em uma Exposição em São Paulo (...) No dia 12 de setembro, a exposição Eu não Sou de Plástico exibirá 110 bolsas de compras criadas por estilistas brasileiros (...) Algumas criaram peças a partir de materiais ecologicamente corretos. (...) A ideia da Secretaria do Meio Ambiente é criar o conceito de que saco de plástico é feio, e sacola reutilizável bonita. (...) Segundo os estudos (...) uma bolsa de lona pode substituir cem saquinhos plásticos. (...) 730
(Revista Época, 13/7/2007, p. 96-97)
(www.fiepr.org.br/nospodemosparana)
Sacolas Reutilizáveis As sacolas reutilizáveis de longa vida tão pouco são a solução (...) são muito mais grossas e caras (...) Elas também não são higiênicas, a menos que sejam limpas após o uso. Apesar de às vezes serem chamadas “embalagem para a vida inteira”, sua vida útil é limitada, dependendo do tratamento que recebem do usuário, e acabam por se tornar detritos extremamente resistentes quando descartadas. (Site: www.romaflex.com.br)
ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO PARANÁ PROJETO DE LEI Nº 134/2007 DECRETA: Art. 1.º Os supermercados, estabelecimentos congêneres e o comércio em geral ficam obrigados a oferecerem aos seus clientes sacolas ou sacos plásticos de material biodegradável ou reutilizável para embalagens dos produtos. (...) (www. crea-pr.org.br/crea2/html/projetos_lei)
GÊNERO TEXTUAL 2 Enquanto leitor, escreva uma carta ao editor de uma revista semanal, com até 15 linhas, expressando sua opinião sobre a temática abordada na coletânea de textos. Assine a carta com apenas a inicial do seu sobrenome final. 03. (Unioeste PR) Escreva uma CARTA DO LEITOR para ser publicado na seção Painel do Leitor de um jornal de circulação nacional, posicionando-se sobre a temática:
Linguagens, Códigos e suas Tecnologias
2006 – 2016: 10 anos da Lei Maria da Penha Uma hora é a bebida. Na outra, é o ciúme, a raiva acumulada, a não aceitação da separação. Com desculpas como essas, todos os dias centenas de homens batem, queimam, espancam, ameaçam e, às vezes, chegam a matar suas esposas, namoradas, filhas e outras mulheres da família. No Brasil, uma a cada cinco mulheres é vítima de violência doméstica, segundo dados da Secretaria de Política para Mulheres. Cerca de 80% dos casos são cometidos por parceiros ou ex-parceiros. Há dez anos, uma lei foi criada no país para punir os autores da violência no ambiente familiar. Batizada de Maria da Penha, em homenagem a uma das tantas vítimas de agressão, ela é considerada pela ONU (Organização das Nações Unidas) uma das melhores legislações do mundo no combate à violência contra as mulheres. Mas ainda há desafios, como a não aplicação da lei em alguns casos, a falta de grupos de recuperação para agressores e de atendimento especializado às vítimas, a não conscientização de parte da população sobre o que é violência doméstica. Adaptado de: http://especiais.g1.globo.com/politica/2016/maria-da-penha---10-anos-em-10-historias/
abrangido por essa área. É natural que, à medida que a ciência avança, novas patologias sejam detectadas, como a depressão ou o autismo, e outras, reinterpretadas e descartadas, caso da histeria e da homossexualidade. Avanços tecnológicos permitem não só diagnosticar melhor, mas diagnosticar mais, mesmo condições que não coloquem a vida em risco ou comprometam sua qualidade. O problema está precisamente na facilidade com que novas doenças podem ser “criadas”, quando situações antes tidas como normais acabam patologizadas. Algumas de formas justificadas, outras, não. Claro que há “boas” e “más” formas de medicalização. Entre os casos positivos, pode-se citar a introdução da pílula anticoncepcional, que permitiu uma revolução sexual. Um exemplo negativo foi a demonização do mau hálito no começo do século XX, ao ser rebatizado como... halitose. Em virtude disso, uma notável campanha publicitária estimulou a venda de uma nova “necessidade”, o antisséptico bucal. Hoje a lista de “doenças” questionáveis não para de crescer: de características pessoais estigmatizáveis como “calvície”, “síndrome das pernas inquietas”, “timidez”, sem falar nas características estéticas, situações de vida (“tristeza”, “luto”) e mesmo consequências do envelhecimento. Parece, portanto, que estamos vivendo o apogeu da “má” medicalização – a chamada “mercantilização das doenças”, como provam os absurdos níveis de consumo de fármacos como a ritalina (especialmente entre escolares, muitos sobre diagnosticados com TDAH) e antidepressivos. Remédio é chiclete. QUILLFELDT, Jorge. Medicina científica X medicalização da vida. Revista Scient American Brasil, ano 13, nº 155. (Texto adaptado)
04. (UFU MG) Leia com atenção o texto a seguir. Medicina científica X medicalização da vida Pessoas saudáveis são pacientes que ainda não sabem que estão doentes, considera o doutor Knock na peça de Jules Romains, em que o personagem convence a todos os habitantes de uma cidade de que estão doentes. A comédia, de 1923, antecipa, de certo modo, uma das características de nosso tempo, a medicalização progressiva de todos os aspectos da vida. Vivemos um momento privilegiado da história, quando a medicina atingiu um nível incomparável de conhecimentos e recursos tecnológicos. Com criatividade, a ciência conquistou terreno apropriando-se até mesmo de áreas de vida durante séculos fora do alcance de qualquer intervenção que não a religiosa – como as doenças psiquiátricas. Medicalizar consiste em “passar a definir e tratar algo como problema médico”, ou seja, direcionar conhecimentos e recursos técnicos da medicina para tratar algo que antes não era
05. (Unesp SP) Os donos da comunicação Os presidentes, os ditadores e os reis da Espanha que se cuidem porque os donos da comunicação duram muito mais. Os ditadores abrem e fecham a imprensa, os presidentes xingam a TV e os reis da Espanha cassam o rádio, mas, quando a gente soma tudo, os donos da comunicação ainda tão por cima. Mandam na economia, mandam nos intelectuais, mandam nas moças fofinhas que querem aparecer nos shows dos horários nobres e mandam no society que morre se o nome não aparecer nas colunas. Todo mundo fala mal dos donos da comunicação, mas só de longe. E ninguém fala mal deles por escrito porque quem fala mal deles por escrito nunca mais vê seu nome e sua cara nos “veículos” deles. Isso é assim aqui, na Bessarábia e na Baixa Betuanalândia. Parece que é a lei. O que também é muito justo porque os donos da comunicação são seres lá em cima. Basta ver o seguinte: nós, pra sabermos umas coisinhas, só sabemos delas pela mídia deles, 731
FRENTE D Exercícios de Aprofundamento
Disponível em: http://pvmulher.com.br/historia-hoje-lei-maria-da-penha/
Com base nas ideias apresentadas no texto, redija uma CARTA ARGUMENTATIVA para o Ministro da Saúde, criticando a “criação” de novas doenças e/ou a medicalização de situações antes tidas como normais. Em sua carta, você, um cidadão brasileiro, deve também cobrar providências da área de saúde em relação a essas questões.
Português
não é mesmo? Agora vocês já imaginaram o que sabem os donos da comunicação que só deixam sair 10% do que sabem? Pois é; tem gente que faz greve, faz revolução, faz terrorismo, todas essas besteiras. Corajoso mesmo, eu acho, é falar mal de dono de comunicação. Aí tua revolução fica xinfrim, teu terrorismo sai em corpo 6 e se você morre vai lá pro fundo do jornal em quatro linhas. (Millôr Fernandes. Que país é este?, 1978.)
Com a frase Parece que é a lei, no segundo parágrafo, o humorista tenta explicar que a) as pessoas poderosas se unem em sociedades secretas. b) o poder dos donos da comunicação parece ter força de lei. c) parece que a lei não existe no mundo da comunicação. d) o poder dos grandes empresários emana de uma lei que os protege. e) as leis não foram criadas para proteger os cidadãos. 06. (Uerj RJ) Viagem ao centro da Terra De início, não enxerguei nada. Havia muito tempo sem verem a luz, meus olhos imediatamente se fecharam. Quando consegui ver de novo, fiquei mais assustado que ad-
1
mirado: – O mar! – É – respondeu meu tio –, o mar Lidenbrock, e espero que nenhum navegador vá me contestar a honra 5de tê-lo descoberto e o direito de batizá-lo com meu nome! Um enorme lençol de água, o começo de um lago ou de um
FRENTE D Exercícios de Aprofundamento
uma origem elétrica. Era como uma aurora boreal, um fenômeno cósmico permanente numa caverna capaz de conter um oceano. Júlio Verne Viagem ao centro da Terra. São Paulo: Ática, 2000.
Não, aquela fonte de luz tinha uma propagação trêmula, uma claridade branca e seca, uma temperatura pouco elevada e um brilho de fato maior que o da Lua, evidenciando uma origem elétrica. (ref. 15-20) A passagem transcrita acima revela uma característica na descrição do cenário que pode ser definida como: a) exemplificação do tema do diálogo entre personagens b) intensificação do envolvimento do narrador com a cena c) contraposição com os aspectos visuais relativos à paisagem d) enumeração de elementos díspares na composição do espaço 07. (PUC GO) Há pessoas que vivem para destruir. Nasceram no fosso da ignorância e lá construíram o seu mundo de ódio, de desprezo, de traição. Fazem cursos de guerra, especializam-se no manuseio de armas bélicas e exercitam-se diariamente no processo de delação. Têm a língua afiada, pronta para soltar vitupérios e o dedo médio lambuzado de titica e enrijecido de tantas deduragens. São obscuras, raivosas, traidoras, covardes e vivem no anonimato. Têm como lema a destruição. Se não posso ser notável, ser importante, ser escritor, por exemplo, que ninguém o seja. E aí, no laboratório de sua insignificância destilam ódio contra aqueles que estão construindo, mostrando ao mundo que ainda é possível plantar rosas e fabricar perfumes.
oceano, estendia-se até onde minha vista não podia alcançar. As ondas vinham bater numa praia bastante recortada, formada por uma areia fina e dourada, salpicada por aquelas conchinhas que abrigaram os primeiros seres da criação. As ondas
Teóricos defendem a ideia de que todo texto é formado de se-
quebravam com aquele barulho característico dos ambientes muito amplos e fechados. Uma espuma 10leve era soprada por
tuais. O leitor identificará as sequências costumazes, tendo em
um vento moderado, e uma garoa me batia no rosto. A cerca de duzentos metros das ondas, naquela praia ligeiramente inclinada, estavam as escarpas de rochedos enormes, que se elevavam a uma altura incalculável. Alguns deles, cortando a praia com sua aresta aguda, formavam cabos e promontórios desgastados pelos dentes da arrebentação. Mesmo ao longe, seus contornos podiam ser vistos em contraste com o fundo nebuloso do horizonte. 15 Era realmente um oceano, com o contorno irregular das praias terrestres, mas deserto, com um aspecto selvagem assustador. Se minha vista podia passear ao longe naquele mar, era porque uma luz “peculiar” iluminava seus menores detalhes. Não a luz do Sol, com seus fachos brilhantes e sua irradiação plena, nem a da Lua, com seu brilho pálido e impreciso, que é apenas um reflexo sem calor. Não, aquela fonte de luz 20tinha uma propagação trêmula, uma claridade branca e seca, uma temperatura pouco
732
elevada e um brilho de fato maior que o da Lua, evidenciando
(TELES, José Mendonça, Crônicas de mim. Goiânia: Kelps, 2011. p. 127.)
quências que entram na constituição dos diversos gêneros texvista os parâmetros da situação. No trecho “Têm a língua afiada [...] Têm como lema a destruição” depreende-se o seguinte tipo de sequência (marque a alternativa verdadeira): a) Narrativa, pela sucessão temporal dos eventos contados em discurso direto, havendo a predominância de verbos conjugados no pretérito perfeito. b) Descritiva, pela caracterização dos elementos, indicando propriedades, qualidades, atitudes expostas analiticamente, numa ordenação lógica, com a presença de verbos de estado e situação. c) Injuntiva, por apresentar ações numa sequência logicamente ordenada, marcada por verbos no imperativo e no futuro do presente, expressando preocupações de comando. d) Argumentativa, por apresentar ordenação ideológica, com contra-argumentos, com verbos introdutores de opinião e conectores argumentativos.