Ensino Fundamental Anos Finais
Diálogo inter-religioso
Heloisa Silva de Carvalho
Pedagoga com especialização em Ensino Religioso pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e mestre em Bíblia pelo Centro Bíblico Verbo. Autora de livros didáticos e paradidáticos de Ensino Religioso, atua como professora, coordenadora e formadora de professores, ministrando cursos para educadores e para agentes da pastoral na área bíblica. É membro do Centro Bíblico Verbo.
Jorge Silvino da Cunha Neto
Graduado em Filosofia e Pedagogia, pós-graduado em Currículo e Prática Educativa pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e mestre em Ciência da Religião pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Professor de Ensino Religioso, Filosofia e História no Ensino Fundamental, Ensino Médio e Ensino Superior em São Paulo, é também roteirista.
2a edição
São Paulo – 2024
Diretor-geral
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Diretora de inovação, plataformas e avaliação educacional
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Diretor de conteúdo e negócios
Cayube Galas
Diretora adjunta de soluções didáticas e suplementares
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Gerente de conteúdo
Luciana Leopoldino
Editoras
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Editora-assistente
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Coordenadora de produção editorial
Beatriz Mendes Yamazaki
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Preparação e revisão
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Supervisora de arte e design
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Editora de arte
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Projeto gráfico e capa
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Diagramação
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Analista de fluxo
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Gerente de eficiência e analytics
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Diretor de operações e produção gráfica
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Colaboraram nesta edição:
Eneida Gordo e Layza Real (editoras-assistentes), Elen Doppenschmitt, Leandro Calbente e Priscila Malanconi Aguilar (colaboradores); Marcia Sato (iconografia e licenciamento de textos), Guilherme Henrique Nahes Alonso (tratamento de imagens); Denise Ceron e Vivian C. de Souza (revisoras); Patrícia Maeda (editora de arte).
A coleção Diálogo Inter-religioso é um Projeto Editorial elaborado em parceria entre a FTD Educação e a União Marista do Brasil e desenvolvido a partir do Projeto Educativo do Brasil Marista e das Matrizes Curriculares de Educação Básica – Ensino Religioso.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Carvalho, Heloisa Silva de Diálogo inter-religioso: volume 9 / Heloisa Silva de Carvalho, Jorge Silvino da Cunha Neto. – 2. ed. – São Paulo: FTD, 2024. (Coleção Diálogo inter-religioso)
ISBN 978-85-96-04197-3 (aluno)
ISBN 978-85-96-04198-0 (professor)
1. Ensino religioso (Ensino fundamental) I. Cunha Neto, Jorge Silvino da. II. Título. III. Série.
23-170799
CDD-372.84
Índice para catálogo sistemático:
1. Ensino religioso: Ensino fundamental 372.84 Cibele Maria Dias – Bibliotecária – CRB-8/9427
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Apresentação
Caro estudante,
Você já parou para pensar por que é tão comum encontrarmos imagens religiosas em praças, morros e templos? Você já viu pessoas caminharem pelas ruas e avenidas expressando sua fé? Já se perguntou qual o significado de acender velas, fazer orações, cantar e se expressar de diferentes formas nos variados rituais que compõem a cultura e a religiosidade do nosso país?
Este livro traz textos, imagens e discussões que permitirão a você formular algumas respostas para esses questionamentos. Os primeiros sinais de produção cultural da humanidade têm aspectos religiosos, como é o caso das pinturas rupestres, das sepulturas nos vasos de argila, das pirâmides, das esculturas e dos templos antigos.
O ser humano se expressa até hoje por meio de símbolos que relacionam fenômenos da natureza e acontecimentos cotidianos a manifestações divinas. Muitos desses símbolos e imagens revelam nossa busca por respostas sobre a origem da vida, a morte e o que vem depois dela.
Neste livro, você vai refletir sobre as semelhanças e diferenças entre as diversas maneiras de expressar a fé nas diversas tradições religiosas. Vai conhecer um pouco do universo religioso do povo brasileiro e de outros povos: ritos, símbolos, festas, músicas, danças, vestimentas e alimentos sagrados. Vai aprofundar seus conhecimentos sobre a fé dos povos originários nascida nas florestas; a fé do povo africano e de seus descendentes que resistiu à escravização; a fé do povo europeu, que fez da sua crença a religião oficial de muitos países. Vai estudar outros povos que migraram para cá, trazendo suas culturas e tradições religiosas, muitas crenças e visões de mundo que foram sincretizadas pelos brasileiros ao longo da história e conhecer esses hibridismos religiosos que ampliam nossa visão sobre o povo brasileiro e mesmo sobre o ser humano.
Este livro também vai ajudar você a compreender as manifestações religiosas em seus contextos culturais, históricos, políticos e sociais.
Vivencie essa experiência de aprendizado com sua turma, pois conhecer a diversidade religiosa e o direito de as pessoas expressarem a própria fé abre caminho para o respeito ao próximo e o desenvolvimento da cidadania e de uma sociedade mais justa, solidária e pacífica.
Olhamos para você e sonhamos com um mundo novo, onde a discriminação, a desigualdade e a violência devem ser combatidas com o diálogo e o conhecimento.
Os autores
Conheça seu livro
Neste volume, você vai explorar a riqueza do pluralismo religioso e os problemas que a intolerância e a discriminação religiosa podem trazer. Vai discutir conceitos como os de destino e liberdade, sincretismo e hibridismo. Além disso, vai descobrir que religião e ciência não precisam estar em campos opostos.
Antes de começar, veja como este livro está organizado.
ABERTURA DE UNIDADE
O livro se organiza em três unidades, cada uma com três capítulos. Um texto introdutório abre cada unidade e antecipa os principais conteúdos que serão estudados por você no decorrer dos capítulos. Vale a pena conferir!
CONSTRUINDO SABERES
• Segundo a tradição cristã, o destino não é predeterminado. Os cristãos acreditam que Deus convida o ser humano a colaborar na construção de um mundo onde haja justiça, fraternidade, amor, respeito, enfim, um mundo no qual todos tenham vida em abundância (João 10,10). No entanto, cabe a cada um aceitar ou não esse chamado. Para o Cristianismo, a Providência Divina, ou seja, a ação de Deus no mundo, é amor que cuida, protege, perdoa e recria a história em parceria com o ser humano. Não há destino ao acaso, mas um Deus que age por meio da inteligência e da liberdade humanas.
• Nas religiões de matriz africana, a divindade concede aos seres humanos o livre-arbítrio para que assumam as consequências de suas escolhas e atitudes cotidianas.
ABERTURA DE CAPÍTULO
Os estudos do tema do capítulo e a reflexão sobre o conteúdo se iniciam com a interpretação da imagem de abertura, feita por meio da leitura da epígrafe e das perguntas da seção Novos horizontes
Darma, carma e samsara
Todas as escolhas que fazemos diariamente são orientadas por nossa percepção da realidade, que é construída com base em diferentes fatores, entre eles nossas crenças religiosas. A percepção que temos do sagrado influencia a forma como nos relacionamos com o mundo. O pensador romeno Mircea Eliade (1907-1986) chamou de hierofanias todas as revelações ou manifestações do sagrado que percebemos em nossa vida. Nos primórdios da história, os seres humanos costumavam expressar essas manifestações sacras por meio da linguagem simbólica dos mitos.
CONSTRUINDO SABERES
• Os espíritas também acreditam que o ser humano é responsável por seus atos, possui o livre-arbítrio, e as escolhas feitas durante a vida podem ter reflexo em todas as reencarnações.
Destino e liberdade Vamos relembrar o que dizem algumas tradições religiosas sobre destino e livre-arbítrio. 1 Você acredita que o ser humano
• No Budismo, a plena liberdade de escolha é uma condição inseparável do ser humano. O senso de responsabilidade permite que as decisões sejam tomadas de modo a não gerar sofrimento a nenhum ser vivente.
Em geral, nas narrativas míticas, o destino da humanidade estava nas mãos das divindades, e, portanto, era impossível a qualquer mortal fugir aos desígnios dos deuses. Desse modo, os grupos sociais humanos criaram ritos e cerimônias como um modo de agradar aos deuses e tentar garantir para si um destino mais favorável. As experiências religiosas sofreram muitas transformações ao longo do tempo, principalmente com o surgimento das religiões monoteístas e a introdução de ideias como o livre-arbítrio, que colocava uma interrogação na ideia de destino. O conceito de destino pode ser analisado de acordo com diferentes crenças religiosas. O Hinduísmo, por exemplo, possui práticas religiosas que podem sofrer muitas variações entre seus adeptos, mas há alguns princípios fundamentais, como os conceitos de darma, carma e samsara O darma é como o hindu compreende o destino, ou seja, o caminho proposto pelo Universo. O carma complementa o darma e representa as escolhas do indivíduo e suas consequências. Portanto, quando o carma é pautado por boas escolhas, o indivíduo se aproxima do darma; as más escolhas afastam-no do darma. O samsara é o ciclo de vida, morte e renascimento, e o objetivo do hindu é ter iluminação suficiente até que consiga superá-lo. Representação da Roda da Vida ou Roda do
Aqui você vai estudar os principais conceitos dessa área do conhecimento, de modo a compreender, a interpretar e a ressignificar aspectos da religiosidade e do fenômeno religioso.
ATIVIDADES
Mosteiro de Kopan, no Nepal.
Momento de praticar o que foi estudado na seção e refletir sobre o conteúdo.
Lembre-se de que o conteúdo deste volume foi elaborado para auxiliá-lo no desenvolvimento de suas aulas durante todo o ano letivo. Você tem toda a autonomia para utilizá-lo da forma que julgar mais conveniente, visando sempre ao melhor aproveitamento dos estudantes. Oriente a realização das leituras e atividades em sala de aula ou em casa, de acordo com sua realidade local, dependendo da necessidade de sua mediação ou não.
Unidade 1
Ensinamentos e valores das tradições religiosas
Unidade 2
O pluralismo religioso no mundo contemporâneo
CAPÍTULO 4 As atitudes diante do Transcendente ........................... 62
Construindo saberes: A conversão como compromisso com a transformação social 64
Meditação e contemplação ....................................................................................... 66
Arte que encanta: Apresentação de Jesus no Templo, de Giotto di Bondone, e A paixão segundo G.H., de Clarice Lispector 68
Os povos e o sagrado: 19a e 22a Suratas, Corão ...................................................... 70
O cuidado com o mundo: Ajudar ao próximo com empatia .................................. 71
Outros olhares: “A alteração de nome em razão de conversão ao Judaísmo” e “Você sabe por que é comum os religiosos mudarem o nome?” ..................... 72
Além da imagem ....................................................................................................... 74
Teia do conhecimento 75
CAPÍTULO 5 As novas configurações religiosas ................................ 76
Construindo saberes: Sincretismo e hibridismo religiosos 78
A influência oriental nas tradições ocidentais 80 Novos movimentos religiosos .................................................................................. 81
Arte que encanta: Religião brasileira I, de Tarsila do Amaral, e “Oriente”, de Gilberto Gil 84
Os povos e o sagrado: Oração do Pai-Nosso .......................................................... 86
O cuidado com o mundo: Círculo Laudato si’ e a eco-espiritualidade ................. 87
CAPÍTULO 6
Religião e religiosidade no mundo global 92
Construindo saberes: Globalização e religião ......................................................... 94
Pluralismo religioso e identidade: diálogo possível ............................................... 95
Secularização e fundamentalismo 97 O mercado religioso e seus produtos 98
Arte que encanta: Gioconda Kunhã, de Denilson Baniwa ................................... 100
Os povos e o sagrado: Mito indígena quéchua 102
O cuidado com o mundo: Cidadania planetária e a questão dos refugiados 103
Outros olhares: O viés utilitarista da religião ........................................................104
Além da imagem .....................................................................................................106
Teia do conhecimento 107
Espaço de... projeto de vida: Para uma vida melhor ............................................108
O que aprendi .......................................................................................................... 110 Assistir 110
Visite o ambiente digital
Nesse espaço, você encontrará diferentes recursos para sua formação, orientações para o planejamento de suas aulas e o Manual do professor, com informações sobre a abordagem teórico-metodológica desta coleção, sobre o Ensino Religioso no Ensino Fundamental, além de orientações específicas para este volume e de outros recursos digitais.
Unidade 3
Perspectivas e desafios das tradições religiosas
CAPÍTULO 7 Encontros e desencontros em nome de Deus ..........
Construindo saberes: Religião não se discute?
Conflitos contemporâneos
Respeito e diálogo juntos na construção da paz ..................................................
Construindo uma sociedade mais justa e fraterna ..............................................
Arte que encanta: “Exaltação da paz”, de Mário de Andrade, e Guernica, de Pablo Picasso ......................................................................................................
povos e o sagrado: Rigveda .............................................................................
O cuidado com o mundo: Mamadou Ba
8
Arte que encanta: Migrant mother, de Dorothea Lange, e “Especulações em torno da palavra
Os povos e o sagrado: Deuteronômio, Torá .........................................................
O cuidado com o mundo: Banho de dignidade
Outros olhares: Acolhimento aos mais vulneráveis durante a pandemia de covid-19 no
Construindo saberes:
Moisés: escravizado que ajudou a libertar seu grupo
Jesus: o jovem de Nazaré e sua boa notícia
Os desafios contemporâneos para os cristãos seguirem Jesus
Os povos e o sagrado: 9a Surata, Corão; Deuteronômio, Torá; Mateus, Bíblia
O cuidado com o mundo: Sebastião Salgado
Outros olhares: Humanização em todos os setores da sociedade
Ensinamentos e valores das tradições religiosas
UNIDADE 1
Nesta unidade, você vai estudar:
• tempo cíclico
• tempo linear
• ciência e fé
1 CAPÍTULO
As
concepções de história das tradições religiosas
O amor é aquela força que tudo liga e religa e que permite que as coisas formem um cosmos e não permaneçam no caos [...] Através do amor, Deus mesmo continua se autodoando e fazendo história dentro da história humana, pessoal e coletiva. Amando o outro, na radicalidade, estamos amando a Deus.
BOFF, Leonardo. Experimentar Deus: a transparência de todas as coisas. São Paulo: Vozes, 2011. E-book. Disponível em: https://docplayer.com.br/5850693-Experimentar-deus-a-transparencia-de-todas-as-coisas.html. Acesso em: 28 fev. 2024.
Consulte sugestões de respostas para as atividades e orientações específicas para esta seção no Manual do professor.
NOVOS HORIZONTES
Partilhar conhecimentos e saberes com familiares e outros membros da comunidade, ensinar e aprender a fazer juntos ou simplesmente ouvir as histórias de nossos ancestrais contadas pelos mais velhos são maneiras de percebermos a passagem do tempo.
Desse modo, podemos descobrir o que se mantém e o que muda, dar continuidade às tradições de nossa família ou de nossa cultura e, por fim, compreender a importância do nosso pertencimento em uma história coletiva. Afinal, não estamos sós.
Sobre o tema, observe a imagem, converse com os colegas e responda.
a) Como você interpreta a imagem de abertura à luz da relação entre história e memória?
b) Que noção de história está contida na epígrafe?
c) Qual é a relevância das tradições religiosas para compreendermos a noção de tempo?
Dê aos estudantes exemplos de povos que veem o tempo de forma cíclica: os povos nativos das Américas, como astecas, maias e incas, acreditavam que tudo acontecia em ciclos que se repetiam com regularidade. No Oriente, os povos babilônicos, sumérios e assírios também tinham uma visão cíclica de mundo e de história, assim como os hindus, que acreditam, desde a Antiguidade, que o Universo passa por ciclos de criação e destruição. Consulte mais informações sobre a visão cíclica do tempo no Manual do professor.
CONSTRUINDO SABERES
Consulte orientações para esta seção no Manual do professor.
História cíclica e história linear
Ao longo da história, inúmeros mitos foram criados por diferentes povos, na tentativa de explicar a origem do ser humano e do Universo, o que contribuiu para que se compreendessem as diversas relações que o ser humano estabelece com o meio ambiente, com os outros, consigo mesmo e com o Transcendente.
De maneira geral, as tradições religiosas das mais diversas culturas têm estreita conexão com os mitos, e sua compreensão do tempo se relaciona com o modo como seus seguidores explicam os eventos observados no mundo. Fundamentado nesse entendimento, cada povo, influenciado pela cosmovisão de uma ou mais tradições religiosas, compreende a passagem do tempo de maneira cíclica ou linear.
A visão cíclica está profundamente ligada às tradições religiosas politeístas e panteístas. Nessas tradições, a história é concebida como ciclos de tempo encadeados e alternados; trata-se de um movimento circular contínuo, em que as coisas chegam ao fim para, então, recomeçar. Em contrapartida, nas tradições religiosas monoteístas, principalmente na cultura ocidental, com influência judaico-cristã, o tempo é visto de maneira linear, por isso o futuro está aberto para mudanças desencadeadas pelas decisões tomadas no presente.
Quando um ano finda, outro se inicia. De acordo com esse ponto de vista, a passagem de ano pode ser encarada de maneira cíclica. Entretanto, podemos pensar de modo mais linear: muito do que se colhe no novo ano é uma continuação, um resultado de ações que foram tomadas no ano anterior. A imagem mostra a tradicional queima de fogos de artifício que marca a passagem de ano na praia de Copacabana, no Rio de Janeiro (RJ).
O tempo cíclico
Segundo o filósofo alemão Ernst Cassirer (1874-1945), o desenvolvimento das tradições religiosas está impregnado de elementos míticos.
Uma das características centrais dos mitos é a presença de elementos da natureza, como a sucessão das quatro estações, as fases da Lua, a aparição de um cometa, a alternância natural entre o dia e a noite, o vaivém das águas dos oceanos. Assim, podemos perceber a intrínseca ligação entre os seres humanos e a natureza, a tal ponto que algumas culturas ainda mantêm rituais específicos para garantir boas colheitas ou para pedir chuvas em tempos de seca, por exemplo.
Os povos antigos sentiam-se conectados ao meio ambiente e sujeitos a uma ordenação do mundo que englobava e interligava toda a existência. Na atualidade, muitas tradições religiosas e culturais mantêm ou resgatam esse vínculo crucial para o futuro da humanidade.
A mitologia do povo asteca, que habitou a região do México a partir do século XIII, narra o nascimento e a história dos deuses e suas relações com a humanidade. A visão cíclica da história determinava a contagem do tempo pela elaboração de calendários. O período final de cada ciclo, que para eles era composto de 52 anos, era sempre um momento de apreensão para os astecas, porque acreditavam que o mundo poderia acabar.
Na mitologia grega, também existem várias narrativas que tratam de repetições, como as histórias de Sísifo e Prometeu, que foram castigados pelos deuses e condenados a passar a eternidade cumprindo um destino cíclico que nunca tinha fim.
No Hinduísmo, a Trimúrti é formada pelas três principais divindades: Brahma, responsável por criar o Universo; Vishnu, que garante sua manutenção; e Shiva, que destrói o Universo e possibilita a origem de um novo ciclo. Para essa tradição, existe o ideal de que tudo o que é criado deve evoluir, manter-se e, de alguma forma, acabar. Esse ciclo não é visto de modo negativo, mas como algo necessário e essencial, pois a destruição também é símbolo de transformação e renovação.
O Budismo e o Jainismo conservaram dois princípios que são fundamentais também para o Hinduísmo: reencarnação e nirvana. Os seguidores dessas tradições religiosas acreditam que todos os indivíduos passam por um ciclo de reencarnações sucessivas até a purificação total. Ao encontrar a purificação, conseguem se libertar de todos os sofrimentos e atingem o nirvana. A passagem do tempo, na concepção cíclica, é compreendida como um período ascendente, seguido de um período descendente. Na fase de ascensão, os seres humanos progridem e encontram a felicidade. Durante as eras descendentes, o mundo se degrada. Esse ciclo se repete infinitamente.
Imagem do calendário asteca, esculpida em pedra por volta do século XV. O artefato é também conhecido como Pedra do Sol, porque estudiosos acreditam que a imagem central do círculo seja o deus Sol. O calendário asteca era composto de dois círculos que se complementavam: um contava os anos, e o outro, os dias, tendo este último como base os ciclos agrícolas.
Sísifo, de Ticiano. 1548-1549. Óleo sobre tela. 237 cm × 216 cm. Museu do Prado, Madri, Espanha.
Na mitologia grega, Sísifo era astuto e enganava deuses e humanos. Ele foi, então, condenado a carregar uma grande pedra até o alto de uma montanha. Entretanto, toda vez que ele estava quase alcançando o topo com a pedra, ela rolava montanha abaixo até o ponto de partida, sendo obrigado a reiniciar o trabalho.
Nirvana: estado permanente e definitivo de iluminação, felicidade e conhecimento.
1A concepção cíclica da história entende o ser humano como capaz de fugir ao seu destino e conduzir sua história? Justifique sua resposta.
Segundo a visão cíclica da história, o ser humano está fadado a repetir seu destino. Isso se comprova no mito grego de Sísifo e na visão asteca da destruição do mundo a cada 52 anos, ou seja, o destino do ser humano está traçado.
Logo, sua liberdade de escolha fica comprometida. Mesmo a ideia de sucessivas reencarnações até chegar a uma purificação, o estado de nirvana, está determinada e o ser humano não pode fugir desse destino.
Sugestão de resposta: Tempo circular
Tradições religiosas
Seres humanos Natureza
EM GRUPO
Explique aos estudantes que mapa conceitual é uma representação esquemática para auxiliar na compreensão de determinado conteúdo.
Em grupos, construam um mapa conceitual digital que mostre a concepção circular de história das tradições religiosas estudadas.
Para a tradição judaico-cristã, o ser humano escreve sua história em um tempo que caminha para uma plenitude: o encontro definitivo com Deus.
Auxilie os estudantes na construção do mapa conceitual digital. Há diversas ferramentas on-line, gratuitas, que possibilitam essa criação, como o Miro e o Canva. Caso não seja possível o uso do recurso digital, disponibilize espaço aos grupos no mural da sala de aula, por exemplo, para a construção desse mapa.
O tempo linear
Consulte informações sobre o tempo linear no Manual do professor.
Nas religiões monoteístas, principalmente as de tradição judaico-cristã, o tempo é visto de maneira linear. Segundo o romeno Mircea Eliade (1907-1986), estudioso das religiões, a grande marca da tradição judaico-cristã está em vincular o ser humano à história.
As religiões abraâmicas (Judaísmo, Cristianismo e Islamismo) seriam, para o estudioso, um ponto de divisão entre a visão cíclica e a visão linear do tempo, uma vez que os eventos sagrados não estão limitados a uma era primordial distante, mas continuam através da história. Não há uma busca pelo eterno retorno a um passado mítico, mas os acontecimentos passados dão razões para os acontecimentos presentes e para as esperanças futuras. Por isso, a memória histórica de um acontecimento está presente na concepção de tempo linear, e isso constitui uma grande novidade na maneira de enxergar a existência. O tempo tem um começo, com a Criação, e um fim, um sentido, ou seja, é um tempo “teológico”: possui um telos, uma finalidade a ser atingida. O tempo visto sob essa ótica permite uma imensidão de possibilidades e de significados. Do ponto de vista cristão, particularmente, com a fé em Jesus, Deus se faz presente na história, e esta se torna o lugar da “epifania”, ou seja, da manifestação de Deus. Daí o compromisso da construção de uma história em que prevaleçam a paz e a justiça. Cada geração, então, é responsável pela geração seguinte, no sentido de lhe deixar um legado negativo ou positivo. Homens e mulheres tornam-se responsáveis não apenas por seu semelhante, mas pelo planeta e por todas as formas de vida, ou seja, tornam-se coparticipantes da construção da história.
Informe aos estudantes que telos é uma palavra grega que pode ser traduzida como “sentido”, “finalidade”.
Comente com os estudantes que o papa Francisco afirmou em sua encíclica Lumen fidei: “a fé ilumina a vida social: possui uma luz criadora para cada momento novo da história, porque coloca todos os acontecimentos em relação com a origem e o destino de tudo no Pai que nos ama”.
Na encíclica Laudato si’ , que significa “Louvado seja”, o papa Francisco afirma:
Tudo está relacionado, e todos nós, seres humanos, caminhamos juntos como irmãos e irmãs em uma peregrinação maravilhosa, entrelaçados pelo amor que Deus tem a cada uma das suas criaturas e que nos une também, com terna afeição, ao irmão sol, à irmã lua, ao irmão rio e à mãe terra.
PAPA FRANCISCO. Carta encíclica Laudato si’ : sobre o cuidado da casa comum. São Paulo: Paulinas, 2015. p. 76.
Com base na concepção linear de história, pesquise e elabore uma linha do tempo que relate a história de alguma figura pública ou um movimento que tenha agido de modo a transformar a realidade de maneira positiva. Para enriquecer sua linha do tempo, acrescente datas de acontecimentos importantes da história de seu país e do mundo. A atividade pode ser feita em folha à parte ou com a utilização de recursos digitais. Resposta pessoal. Consulte orientações no Manual do professor.
Mitologia e tradições religiosas africanas
A perspectiva histórica dos povos africanos relaciona-se com sua experiência religiosa animista (animus significa “alma”, em latim). Essa perspectiva distingue o mundo em dois aspectos: o mundo material, que tem existência física, e o mundo espiritual, que é invisível. Esses dois aspectos encontram-se interligados nas religiões tradicionais, de modo que, para elas, pedras, rios, animais, Sol, Lua, árvores, entre outros, possuem uma essência espiritual, o animus , assim como os seres humanos.
As religiões tradicionais africanas explicitam, por meio de seus mitos, contos, lendas e ritos, que os seres humanos podem ser divindades e podem se transformar em animais, os deuses podem ser pessoas, os objetos podem ganhar vida.
A concepção animista sugere uma ética de respeito e cuidado com o meio ambiente, já que a natureza tem uma existência espiritual e é considerada algo vivo e sagrado.
Consulte orientações sobre a cultura africana no Manual do professor.
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Ressalte para os estudantes outro ponto importante das tradições africanas: a ligação dos indivíduos com seus antepassados, a importância de se manter o culto e o respeito a toda a linhagem da qual descendem. Para as religiões tradicionais africanas, a reencarnação pode ocorrer, mas não está ligada a um ciclo de evolução.
As tradições religiosas afro-brasileiras, como o Candomblé, têm suas raízes na crença animista e podem ser tomadas como exemplos.
Explique por que as tradições religiosas africanas também são denominadas religiões animistas. Justifique a influência desse aspecto na relação dos indivíduos com a natureza.
As religiões tradicionais africanas acreditam que pedras, rios, animais, montanhas, Sol, árvores, entre outros, têm uma existência espiritual, da mesma forma que os seres humanos. Por essa razão, as tradições religiosas africanas são chamadas animistas (em referência à alma). Dessa crença, nascem valores de cuidado e respeito com a natureza.
AMPLIANDO
As religiões tradicionais africanas refletem as múltiplas culturas presentes no continente. Os mitos das diversas crenças propõem diferentes explicações para temas como vida, morte e até mesmo a origem da cor da pele das pessoas. No entanto, vários desses mitos discorrem sobre a sabedoria dos animais.
Para conhecer alguns mitos africanos, acesse o QR Code.
https://s.ftd.li/MitosAfricanos
Explique aos estudantes que o QR Code leva à página do site Aventuras na História, em que se apresentam alguns mitos africanos.
Relembre aos estudantes que os Vedas são os livros sagrados do Hinduísmo, que contêm os principais conceitos, mitos e símbolos dessa tradição religiosa.
Avatar: personificação simbólica de um ser. Na tradição hindu, materialização de uma divindade na Terra.
Védica: referente aos Vedas, escritos sagrados do Hinduísmo, que contêm hinos, cânticos e a filosofia dessa tradição religiosa.
ARTE QUE ENCANTA
Consulte informações sobre os avatares de Vishnu no Manual do professor.
No Hinduísmo, acredita-se que a alma passa por um ciclo de reencarnações até atingir a libertação final. Nesse ciclo, a alma volta a viver em outro corpo, humano ou animal, dependendo de suas ações na última vida. Os hindus acreditam que, no atual ciclo, o deus Vishnu é o responsável pela conservação do Universo. Ele veio ao mundo encarnado algumas vezes para restabelecer o equilíbrio entre bem e mal. Segundo a mitologia védica , Vishnu já encarnou nove vezes, tendo Krishna sido seu oitavo avatar, e Buda, o nono. O décimo e último avatar ainda está por vir e significará o fim do atual ciclo. Em sua primeira encarnação, Vishnu assumiu a forma de um homem-peixe. Conta a tradição que os Vedas foram roubados por um demônio. Para recuperá-los, os deuses resolveram inundar a Terra para afogar o demônio. Vishnu, na forma de homem-peixe, veio à Terra para advertir o ancestral do gênero humano, Manu, sobre a necessidade de construir um barco e salvar exemplares de animais e seres humanos. Manu era bom, e os deuses decidiram poupá-lo. Em agradecimento, ele ofereceu um bolo a Vishnu. Em retribuição ao bolo, Vishnu fez surgir uma mulher, com quem Manu repovoou o mundo. Observe uma pintura que representa essa passagem da mitologia hindu.
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Reúna-se com um colega para pesquisar o mito grego de Deucalião e Pirra e a narrativa bíblica do Dilúvio. Depois, identifiquem as semelhanças entre essas histórias e a da mitologia védica. Esse mito grego narra um dilúvio que destruiu todos os seres humanos, exceto o casal Deucalião e Pirra. Deucalião era filho de Prometeu e foi avisado pelo pai sobre o dilúvio a tempo de construir um barco e se salvar da inundação com sua esposa. Acabado o dilúvio, eles foram apanhando e atirando para trás pequenas rochas, que amoleceram e tomaram forma humana. As rochas lançadas por Deucalião viraram homens, e as lançadas por Pirra tornaram-se mulheres. A narrativa bíblica do Dilúvio (Gênesis 6-9) conta a vida de Noé e sua família, que serviam a Deus com justiça, em meio à maldade que reinava na Terra. Deus, demonstrando sua compaixão e bondade, fez com ele uma aliança e o orientou a construir uma grande arca para onde levaria sua família e um casal de cada espécie animal da Terra, pois Ele mandaria um grande dilúvio, e só sobreviveria aquele que estivesse na arca. As três histórias têm aspectos que se assemelham, além da inundação: falam de pessoas íntegras, justas, que se salvam e repovoam o mundo. No mito grego, a diferença é que Zeus decidiu destruir a espécie humana. Ela não foi extinta porque Prometeu previu o acontecimento e salvou seu filho e sua nora. No caso do mito bíblico, Deus não quis acabar com a humanidade, por isso salvou um homem justo e sua família, bem como os animais, e fez com o ser humano uma aliança. Ou seja, a divindade bíblica quis a vida e não a morte.
Na tradição religiosa cristã, a visão do tempo linear atribuiu valor ao tempo histórico. Para o Cristianismo, é na história que o ser humano realiza o plano de Deus: construir um mundo novo, guiado pela justiça e pela convivência pacífica, a exemplo de Jesus de Nazaré.
2 Leia este poema de Mário Quintana.
Seiscentos e sessenta e seis
A vida é uns deveres que nós trouxemos para fazer em casa.
Quando se vê, já são 6 horas: há tempo…
Quando se vê, já é 6 a feira…
Quando se vê, passaram 60 anos…
Agora, é tarde demais para ser reprovado…
E se me dessem – um dia – uma outra oportunidade, eu nem olhava o relógio, seguia sempre, sempre em frente…
E iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das horas.
QUINTANA, Mário. Poesia completa . Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2006. p. 479.
a) Qual concepção religiosa de tempo o poema apresenta? Justifique sua resposta. O tempo é linear. Parece ser uma sucessão de horas e dias que passam rapidamente. Quando nos damos conta da rapidez do tempo, a vida já está no ocaso.
b) Como você acha que o poema de Mário Quintana poderia ser se ele tivesse uma visão de tempo diferente? Que ideias o poeta trabalharia no poema? Converse com os colegas.
Resposta pessoal. Os estudantes podem mencionar que o poema teria a ideia de que a vida é uma grande roda, um grande ciclo em que tudo se repete, e é nesse constante retorno que o ser humano tem a oportunidade de se tornar melhor.
OS POVOS E O SAGRADO
Consulte orientações sobre Os Oito Nobres Caminhos no Manual do professor.
Segundo os budistas, Buda chegou a um estágio chamado de iluminação, também conhecido como nirvana, em que há profundo conhecimento e abundante felicidade. Em uma atitude de compaixão, Buda ensinou à humanidade uma doutrina com oito caminhos para que outras pessoas também pudessem alcançar a iluminação e se libertassem do sofrimento. Ele falou aos monges próximo a um lugar chamado Benares, na Índia, onde começou a ensinar a sabedoria e o amor.
São os Oito Nobres Caminhos: visão correta, pensamento correto, discurso correto, ação correta, modo de vida correto, esforço correto, atenção correta e concentração correta. Esse, ó monges, é o Caminho do Meio compreendido pelo Tatahagata. Ele proporciona a visão, dá o conhecimento e conduz à tranquilidade, à percepção superior, ao despertar e ao nirvana.
atenção correta concentração correta
visão correta
esforço correto modo de vida correto
ação correta discurso correto pensamento correto
DO SAMYUTTA Nikaya LVI, 11. Trad. Malcom David ECKEL In : ECKEL, Malcom David. Conhecendo o Budismo : origens, crenças, prática, textos sagrados, lugares sagrados. Petrópolis: Vozes, 2009. p. 39-40.
• Atualmente, lideranças e comunidades budistas encontram-se preocupadas com a emergência climática e as questões ecológicas e socioambientais. Como o ensinamento budista sobre os Oito Nobres Caminhos pode inspirar uma nova forma de pensar e agir em relação às questões socioambientais? Elabore, no espaço a seguir, um pequeno texto sobre o tema.
DICA
O texto deve ser escrito no formato de uma postagem em rede social, por isso deve ser curto e direto.
Consulte no Manual do professor uma proposta ampliada desta atividade. Espera-se que os estudantes, tendo em vista os Oito Nobres Caminhos, proponham possíveis caminhos para repensar nossa relação com o meio ambiente. Por exemplo, ao termos uma visão correta e um pensamento correto, atentos à racionalidade da ciência, ao afeto e à compaixão pela vida de nosso planeta Terra, observaremos que as mudanças climáticas têm suas causas nas agressões que fazemos ao planeta, devido ao atual modelo de produção e consumo. Nesse mesmo sentido, quando nosso discurso é correto, expressamos essa mudança de compreensão e pensamento sobre a realidade de destruição do planeta, denunciando injustiças e anunciando novas atitudes e soluções. Ao agir corretamente, passamos a exigir também das autoridades a implementação de políticas públicas para impedir o desmatamento, a destruição dos biomas, a poluição da água e do ar etc.
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1. Ela decidiu entrar na universidade para conhecer aquilo que foi chamado de o sistema no texto. É possível inferir que esse sistema envolve as estruturas políticas do Estado brasileiro, as quais muitas vezes são utilizadas para impedir o pleno exercício dos direitos indígenas. Ao conhecer melhor essas estruturas, ela se tornou gestora ambiental, atuando ativamente na luta pelos direitos de seu povo.
O CUIDADO COM O MUNDO
2. Esse povo indígena foi muitas vezes acusado de não ser um povo originário do território brasileiro, por isso sofre muitos ataques e violências. Entretanto, como o texto explica, essa visão é inadequada, já que os povos indígenas não se
organizaram segundo as lógicas dos Estados nacionais, ocupando territórios que se encontram em diversos países na atualidade.
Ao mesmo tempo que é responsável pela destruição dos recursos naturais do planeta, a ação humana também é capaz de agir para reverter esses efeitos. Um exemplo disso são os movimentos de ambientalistas que promovem e divulgam ações que colaboram para a conscientização das pessoas sobre a relação e os cuidados que precisamos ter com a natureza. Leia a reportagem sobre a líder indígena Eunice Kerexu Yxapyry, que luta pelos direitos dos povos indígenas e a preservação do meio ambiente no Brasil.
3. Espera-se que os estudantes reflitam sobre o papel de diversas lideranças na organização de ações visando à transformação das estruturas do Estado de modo a criar mecanismos para a proteção dos direitos indígenas.
Uma “gota de orvalho que tem como base o fogo”. Esse é o significado do nome de Kerexu Yxapyry, do povo Guarani M’byá. [...]
Kerexu é do Território Morro dos Cavalos, em Palhoça, Santa Catarina. Ela integra a Coordenação Nacional Tenondé, da Comissão Guarani Yvyrupa (CGY), a Coordenação Executiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e a Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga). […]
Depois de 15 anos atuando na área da educação e recebendo negativas sobre a implementação da educação indígena nos territórios, ela decidiu conhecer “o sistema” – entidade reivindicada pelos agentes públicos para negar o direito à educação diferenciada. “Os mais velhos da aldeia perguntavam ‘Quem é o sistema, quem é o sistema?’ E para mim isso ficou muito forte na minha cabeça. De entender quem é o sistema. E aí eu fui para a universidade. Fui para a universidade, fui estudar”, diz. Tornou-se gestora ambiental pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), criou um plano territorial chamado eco-etno-envolvimento para contrapor à ideia de desenvolvimento predatório, base do sistema que ela conheceu na educação compartimentada das antigas escolas das aldeias e na histórica invasão dos seus territórios.
Em fevereiro de 2023, Eunice Kerexu foi nomeada Secretária de Direitos Ambientais e Territoriais Indígenas do Ministério dos Povos Indígenas.
Por atuar na demarcação de terras, Kerexu, toda a sua família e aldeia sofreram muitas ameaças. Os Guaranis do Morro dos Cavalos ouviam que não eram legítimos, que tinham sido trazidos do Paraguai. […] A ideia de fronteiras coloniais é tragicamente oposta à ideia do povo Guarani que sempre buscou novas terras, transitando pela região que hoje conhecemos por Brasil, Bolívia, Argentina e, sim, Paraguai. Essa noção fluida de lidar com o território fez o povo Guarani sofrer bastante com a lógica de posse através da violência impetrada pelos europeus quando invadiram o continente. Além dos M’byá, grupo ao qual Kerexu pertence, os Guarani no Brasil também podem ser Ñandeva e Kaiowá, esta última a mais numerosa.
Informe aos estudantes que o QR Code leva a uma entrevista com Ailton Krenak, líder indígena e ambientalista brasileiro.
BRAGA, Aline; TERSO, Tâmara. “A crise climática é um sintoma de muita violência”, diz a liderança indígena guarani Kerexu Yxapyry. Marco Zero, Recife, 13 dez. 2022. Disponível em: https://marcozero.org/a-crise-climatica-e-um-sintoma-de-muitaviolencia-diz-a-lideranca-indigena-guarani-kerexu-yxapyry/. Acesso em: 28 fev. 2024.
1 Qual foi a escolha de Kerexu Yxapyry para lutar pela proteção do meio ambiente e pelos direitos de seu povo? Comente.
Para saber mais sobre lideranças indígenas engajadas na defesa do ambiente, acesse o QR Code.
https://s.ftd.li/AiltonKrenak
2 Discuta com os colegas por que os Guarani do Morro dos Cavalos sofrem muitas ameaças.
3 Como lideranças religiosas e políticas podem agir de modo a assegurar os direitos dos povos indígenas no Brasil? Converse com os colegas.
Informe aos estudantes que, no texto, a sigla Oxfam se origina do nome em inglês “Oxford Committee for Famine Reliefe”, ou seja, Comitê de Oxford para o Alívio da Fome. Essa organização é uma confederação global cujo intuito é atuar contra a desigualdade social e a fome, produzindo relatórios sobre esses assuntos e buscando elaborar soluções possíveis para situações como a pobreza e a fome ao redor do mundo.
OUTROS OLHARES
SHANYMUCHNIK/SHUTTERSTOCK
Estudiosos de várias áreas do conhecimento e líderes de diversas tradições religiosas vêm atuando de maneira integrada em uma abordagem que une espiritualidade e meio ambiente. Seus discursos alertam para a atitude excessivamente consumista do ser humano, que contribui para a degradação ambiental. Ao mesmo tempo, eles buscam conscientizar a sociedade sobre a necessidade do engajamento em relação às questões ambientais.
Líderes religiosos do mundo inteiro incentivam a todos, com base na fé, na religião ou na espiritualidade, a reconhecer a natureza como um espaço sagrado, lugar da manifestação do Transcendente e meio de viver e conviver harmoniosamente com todas as formas de vida. Nesse sentido, tanto os religiosos quanto os cientistas, ao olharem para a história do planeta Terra, destacam as diversas fases e as mudanças pelas quais ele tem passado, bem como os riscos que são iminentes, se o ser humano não mudar sua postura com relação ao meio ambiente e a todas as formas de vida.
Leia, a seguir, um artigo que busca aproximar a espiritualidade da questão ambiental.
Merecemos ainda continuar sobre a Terra?
[...]
Os solos perderam sua umidade, as pedras se superaqueceram e folhas secas e gravetos começam a deslanchar incêndios pavorosos, como os que ocorreram em 2022 em toda a Europa, até na úmida Sibéria, na Austrália, na Califórnia e especialmente na Amazônia. E mais ainda, quando vejo que os chefes de estado e os dirigentes das grandes empresas (CEOs) ocultam tais dados ou não lhes dão importância para não prejudicar os negócios, estão cavando a sua própria sepultura. Pior ainda quando a Oxfam e outros organismos nos mostram que apenas 1% da população mundial controla praticamente todo o fluxo das finanças e que possuem mais riqueza que mais da metade da população mundial (4,7 bilhões) [...] nos vem logo a irrefreável interrogação: nós humanos somos ainda humanos ou vivemos na pré-história de nós mesmos, sem termos nos descobertos como coiguais, habitantes na mesma Casa Comum?
Existem vários vídeos disponíveis na internet com entrevistas, palestras e conferências de Leonardo Boff sobre ecologia, espiritualidade e sustentabilidade. No Manual do professor, há sugestões de materiais para projetar aos estudantes.
[...]
Houve alguém que há mais de dois mil anos passou entre nós nos ensinando a viver o amor, a solidariedade, a compaixão, o respeito e a reverência face à Suprema Realidade, feita de misericórdia e perdão, e, por causa destas verdades radicalmente humanas foi considerado um inimigo das tradições religiosas, um subversivo da ordem ética do tempo e acabou assassinado e levantado no alto da cruz, fora da cidade que era símbolo de maldição e do abandono de Deus. Ele suportou tudo isso em solidariedade para com seus irmãos e irmãs.
Até hoje sua mensagem permanece. Em grande parte foi traída ou espiritualizada para desvitalizar seu caráter transformador [...] Mas outros, poucos, seguiram e seguem seus exemplos, sua prática e seu amor incondicional. [...] Mas é por causa desses poucos, creio eu, que Deus ainda se segura e não nos faz desaparecer. [...]
Sou um pessimista esperançado. Pessimista face à realidade perversa sob a qual vivemos e sofremos. Esperançado porque creio que o ser humano pode mudar a partir de uma nova consciência e no Criador que desta crise e eventualmente de uma ruína pode construir outro tipo de seres humanos, mais fraternos entre si e respeitosos da Casa Comum
BOFF, Leonardo. Merecemos ainda continuar sobre a terra? Instituto Humanitas Unisinos, São Leopoldo, 24 jan. 2023. Disponível em: https://www.ihu.unisinos.br/625755-merecemos-ainda-continuar-sobre-a-terra-artigo-de-leonardo-boff. Acesso em: 28 fev. 2024.
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Como o autor do texto descreve a situação do planeta no presente? Ele tem uma visão positiva sobre essa situação? Justifique sua resposta.
O texto apresenta uma visão bastante negativa do mundo contemporâneo. O planeta, segundo o texto, vem sendo marcado por uma devastação sem precedentes dos recursos naturais, além do crescimento das desigualdades sociais. Por isso, o autor afirma que o mundo não atingiu um estado de casa, no qual todos são tratados como coiguais. Essa visão é bastante negativa, mas isso não implica uma perspectiva completamente pessimista a respeito do futuro do planeta, uma vez que o autor se diz esperançoso na mudança do ser humano e declara que tem fé em Deus.
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Explique como o autor relaciona a espiritualidade religiosa com a luta por um mundo melhor.
Para o autor, o mundo enfrenta uma situação crítica. Entretanto, ainda há aqueles que seguem os ensinamentos de Jesus Cristo, a figura que o autor menciona, que há mais de 2 mil anos ensinou valores de amor, solidariedade, compaixão, entre outros. Essas pessoas, segundo o texto, são muitas vezes tratadas de forma caluniosa, mas isso não as impede de continuar defendendo um mundo mais justo. Para ele, essa luta por justiça pode ajudar a entender a razão pela qual Deus ainda não abandonou os seres humanos. Essa perspectiva espiritual é uma forma de manter uma visão otimista a respeito de um futuro mais justo e capaz de preservar a natureza e assegurar uma vida digna para todos.
3 Explique de que forma é possível relacionar as ideias presentes no texto com as concepções de tempo estudadas ao longo do capítulo.
O texto pode ser relacionado com uma visão linear do tempo, própria das religiões abraâmicas. Nessa perspectiva, existe uma preocupação com a responsabilidade das atuais gerações com as futuras, e que por isso devem adotar políticas que revertam a situação crítica do planeta, de modo a assegurar a vida no presente e no futuro.
ALÉM DA IMAGEM
Ao longo do tempo, os seres humanos vêm explorando os recursos naturais do planeta, provocando grandes agressões ao meio ambiente. O surgimento de novas tecnologias, especialmente a partir da industrialização, no século XVIII, ampliou a possibilidade de interferência humana sobre a natureza.
Desde meados do século XX, o avanço da industrialização, o auge da produção em massa e o grande aumento do consumo de mercadorias passaram a provocar mais desequilíbrios no planeta, ameaçando a vida de muitos seres vivos.
Apesar dos esforços de pessoas e organizações para alertar sobre os prejuízos ambientais causados pelo consumismo exagerado, se a sociedade não se conscientizar disso, esse problema tende a aumentar. É preciso considerar o papel e a responsabilidade de cada um nesse processo, para que seja possível minimizar os danos causados pelo estilo de vida das pessoas. Observe um reflexo desse problema na cidade de Nova Délhi, na Índia, em 2021.
Veículo com um canhão de água utilizado para reduzir a poluição do ar na cidade de Nova Délhi, Índia, 2021.
• O recurso registrado na imagem é um exemplo de iniciativa que tenta reduzir os impactos da atividade humana sobre o meio ambiente. Esse tipo de ação é suficiente para minimizar os danos? Quais outras ações deveriam ser tomadas para trazer impactos significativos em relação à redução dos problemas ambientais? Discuta com os colegas.
Respostas pessoais. Espera-se que os estudantes observem que a fotografia mostra uma solução pontual para o problema. O caminhão pode ajudar a dissipar parte da poluição do ar, mas não atua na causa do problema: a emissão de gases poluentes. Assim, é importante pensar em ações mais amplas, como a redução do consumo e do uso de automóveis, o desenvolvimento de tecnologias menos poluentes e outras ações visando à sustentabilidade.
TEIA DO CONHECIMENTO
Consulte orientações para esta seção no Manual do professor.
Neste capítulo, você estudou as concepções de história cíclica e linear das diferentes tradições religiosas, bem como a relação entre tradições distintas e o cuidado com a vida no planeta.
• Vamos retomar essa reflexão, construindo representações visuais. Para isso, com o apoio do professor, siga o roteiro.
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Em dupla, comparem as concepções de história cíclica e linear estudadas em diferentes tradições religiosas e liste as principais diferenças entre elas.
Considerando a lista feita, reflitam sobre maneiras de representar visualmente as concepções cíclica e linear. Pode ser por meio de uma pintura, uma composição de recortes ou fotografias. Também pode ser um vídeo curto ou uma apresentação de slides
Criem representações visuais para apresentar essas concepções. Escolham a linguagem que preferirem. Vocês podem utilizar aparelhos celulares, computadores ou folhas de cartão ou de papel A4.
Com o trabalho pronto, em dia previamente combinado com o professor, apresentem a produção aos colegas e, coletivamente, criem um mural físico ou virtual com as criações de todos. A produção de vocês pode ser compartilhada nas redes sociais da escola.
DICA
É possível, também, criar um roteiro contando uma pequena história cuja temática esteja relacionada às concepções de tempo, gravando um pequeno vídeo com o aparelho celular ou por meio de outro recurso.