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OPINIÃO
EMPREENDER NÃO É IGUAL PARA TODOS
POR ANA FONTES
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Quando decidi começar meu próprio negócio, depois de quase duas décadas no ambiente corporativo, percebi que as dificuldades e os obstáculos no empreendedorismo eram diferentes para homens e mulheres. E, entre as próprias mulheres, as condições não eram as mesmas se elas fosses negras, nordestinas e de origem simples, como era meu caso.
Em primeiro lugar, devemos entender que as mulheres foram e são as mais marginalizadas no ambiente de trabalho e profissional. É uma corrida desigual, na qual partimos sempre em desvantagem e precisamos provar nossa competência a cada volta.
Nesta pandemia, que já se estende por mais de um ano e meio, o cenário de desigualdade talvez tenha alcançado o ápice. Além da alta taxa de desemprego geral, a participação da mulher no mercado de trabalho no país caiu ao menor índice nos últimos 30 anos.
Segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), no primeiro trimestre deste ano, as mulheres representavam menos de 40% da força ativa de trabalho. Antes da pandemia, a média superava os 50%.
Boa parte dessas mulheres desempregadas viu no empreendedorismo uma saída para amenizar essa realidade. Contudo, a Covid-19 também afetou os pequenos negócios, obrigando muitos deles a fechar as portas.
Embora a crise tenha prejudicado diversos setores produtivos, os segmentos mais castigados foram os de serviços, como hotelaria, alimentação, beleza e domésticos, postos ocupados em sua maioria por mulheres. Daí o impacto tão forte no desemprego delas e no próprio empreendedorismo feminino.
Além disso, é importante levar em conta outras desigualdades, como a dupla jornada de trabalho, a falta de crédito bancário, o preconceito estrutural e a violência doméstica. Dados do Ministério Público de São Paulo registraram um crescimento de mais de 40% de violência dentro de casa e de feminicídio nos últimos 12 meses do ano.
Nesse cenário, deparamo-nos com iniciativas de algumas instituições privadas e de organizações não governamentais que entenderam as necessidades dessas mulheres e ajudam a diminuir os números dessa vulnerabilidade social.
Eu, diretamente envolvida em diversas dessas ações, posso dizer que o empreendedorismo é uma das principais portas para a geração de renda e para a independência financeira da mulher.
Mas precisamos enxergar esse empreendedorismo de forma justa, entendendo as diferenças e as dificuldades pontuais, criando assim condições para que mulheres realmente tenham formas de decidir sobre seus próprios negócios e sobre sua vida.
Quando investimos no empreendedorismo feminino, investimos também na própria sociedade. Quando uma mulher gera receitas, ela compartilha seus ganhos para o bem-estar de sua família e do seu entorno, promovendo educação e desenvolvimento social.
E tem sido elas também as que melhor adequaram os negócios às novas exigências destes tempos desafiadores, buscando aprender sobre digitalização, relacionamento com clientes e formas de inovar mesmo no seu pequeno negócio. E criam um círculo virtuoso, quando têm vagas de trabalho contratam outras mulheres.
Sei que temos um longo percurso pela frente. Mas, quando olho para trás, tenho a certeza de que a luta é fundamental e a causa necessária para inclusão e justiça social. n
Ana Fontes é empreendedora social, fundadora da Rede Mulher Empreendedora e do Instituto RME, Delegada Líder BR W20/G20 e LinkedIn Top Voices 2020
UMA FILOSOFIA DE VIDA
POR CAROL SGANZERLA FOTO FERNANDO TORRES
Empreender nunca esteve nos planos de Fábio Ennor Fernandes. Quem olha seu currículo pode pensar que abrir um negócio era um sonho desse paulistano criado em Ribeirão Preto. Nascido em uma família de classe média, filho de uma dona de casa e de um corretor de imóveis, antes mesmo de definir seus objetivos profissionais, projetou sua vida ideal. Aos 22 anos, quando trabalhava em uma empresa americana de logística em Barueri, próximo a São Paulo, o turno que ocupava o obrigava a levantar às três da manhã. “Aquilo me incomodava demais”, relembra ele. Decidiu, ali, que traçaria um plano para que, em curto prazo, não dependesse de ninguém e conseguisse pagar todas as suas despesas. “Naquele momento, comecei a ver quanto custava a vida que eu desejava levar e como poderia colocar esse plano em prática. Sucesso, para mim, é acordar a hora que eu quero”, diz.
Entre outras histórias, essa é contada por Fábio nas palestras que faz para empreendedores ávidos por conselhos de quem construiu uma trajetória pontuada por conquistas. “Não nasci com um propósito de vida, mas tenho um objetivo claro que é estar bem todos os dias e aproveitar o tempo com leveza. Para isso, precisei montar um plano. Meus pais eram mais velhos, cresci sabendo que a vida passa rápido.” Entendendo que a área de vendas seria a ideal para seguir e ter o retorno que esperava, entrou de cabeça. “Ninguém mexe na pessoa que vende e traz negócio. Comecei vendendo uma cachaça, depois polpa de fruta, vegetais congelados, molho de tomate… tinha que ter um escopo”, conta.
Essas representações acabaram, com o tempo, virando uma distribuidora de alimentos, a Rottus, que Fábio Fernandes administra há 15 anos junto a dois sócios, além da Motiva Duo, assessoria de comércio e internacionalização de empresas com sede em Madri, na Espanha. Nessa mesma época, chamado para fazer uma palestra em Ribeirão Preto, o sucesso de sua história o levou a ministrar falas para potenciais empreendedores em outras cidades até que a Fundação Getulio Vargas o convidou para coordenar o Centro de Empreendedorismo e Novos Ne-
gócios, onde entrou em contato com os maiores nomes do mercado. “Em 2012, convidei alguns membros do Lide [Grupo de Líderes Empresariais] e o João Doria [o fundador] me chamou para uma reunião. Ele disse: ‘Você não quer ajudar o grupo a entrar no interior de São Paulo?’. Foi assim que me tornei responsável pela expansão do grupo”, diz Fábio, hoje presidente do Lide Ribeirão Preto e Head Global das Unidades Lide, que visa difundir o grupo para outros países – atualmente está presente em 12 deles, entre Suíça e Inglaterra. “O Lide me abriu inúmeras portas e potencializa muitos relacionamentos.”
Seis meses antes de entrar para o grupo empresarial, Fábio criou um encontro em Catanduva, cidade onde mora desde 2009, no qual convidou 99 formadores de opinião, pessoas influentes da cidade, “só gente boa”, como costuma dizer, para falar sobre criatividade, inovação e tecnologia. Dessa reunião, fundou a Walking Together, uma plataforma de relacionamento que conecta e estimula líderes a provocar mudanças positivas nas cidades com menos de 377 mil
habitantes. “Nosso papel é iluminar as pequenas cidades, fazer as pessoas terem orgulho. Estamos criando uma grande rede para ajudá-las a terem causas nobres, o que os formadores de opinião podem resolver, e a gerarem negócios”, explica Fábio sobre o movimento presente em 70 cidades brasileiras.
O networking construído nesses anos todos lhe rendeu, em 2020,
um convite para ocupar uma cadeira no conselho da Solstic Advisors, empresa de M&A (do inglês, fusões e aquisições). Mais sobre sua trajetória e estilo de vida descomplicado pode ser visto em seu livro Quanto Vale o Seu Tempo? – Uma Estratégia para Ressignificar o Trabalho e a Felicidade a Partir de sua Equação Mais Valiosa: Tempo + Liberdade (ed. Gente). “É um lugar para refletir: está valendo a pena, é isso mesmo que eu queria? Percebo que as pessoas tentam seguir um padrão. Eu descobri o estilo de vida que queria ter, e isso incluía tempo para fazer coisas legais, e fui ver como pagaria as contas. Vejo muita gente encontrar uma forma de ganhar dinheiro para, depois,
O empresário Fábio Ennor Fernandes e seu primeiro livro, lançado em setembro encaixar a vida. Por mais que tenha dado certo financeiramente, deu errado, porque não era a vida que ela queria ter. As pessoas acham que lá na frente é que vai ficar bom. Mas, não, a jornada tem que ser legal”, finaliza.