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SOL NEGRO

Acordar é voltar a ser, re-acender num escuro cúbico; e os primeiros passos que dou em meu re-ser são inseguros.

Re-ser em tal escuridão é como navegar sem bússola. Eu a tenho, ali, a meu lado, num sol negro de massa escura: que é a de tua cabeleira, farol às avessas, sem luz, e que me orienta a consciência com a luz cigana que reluz.

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Na minha voz trago a noite e o mar

O canto é a luz de um sol negro e dor É o amor que morreu na noite do mar

Valha Nossa Senhora

Há quanto tempo ele foi-se embora

Para bem longe, pra além do mar

Para além dos braços de Iemanjá

Adeus, adeus...

* Esta canção aparece no primeiro disco de Maria Bethânia, de 1965, cantada por ela e Gal Costa.

Melancolia

o que há de verdade no mundo? algo mesmo a ser dito?

o que dou ao meu ofício além do meu rosto aflito?

o que encontro além da porta fechada e do silêncio que nidifica no grito?

– a pena é o castigo?

a vela latina abre em agonia como hemorragia e o tempo lento, lento, lento desembrulha o vento ao contrário só há o imediato a terra, a água, o céu e um fogo queimando o pão e o futuro o que não há, juro são joelhos, seios, bocas o animal trigueiro mas existe o escuro mundo sem mundo mundo sem lua você sente que flutua como a náusea, o enjoo o breu cobre tudo a corda do violino a luz, o destino o amado a amada se fazem tão negros e espessos que se perdem um do outro e nas cidades nos cemitérios cai obtuso um fogo negro fogo impuro existe, sem fim, o escuro ele me sopra ele me molda ele me diz a palavra não existe é uma mentira pouco mais, pouco menos verdade infeliz dentro da pedra escuridão se cria espanto imóvel repele o vento que mal se arrasta em meu tormento em outro mundo haverá luz aqui entre nós vento ao contrário vela latina esquecimento

: queima um sol negro

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