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Contextualização

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Proposta

Proposta

a formação do espaço urbano no contexto da habitação

O Processo de urbanização de cidades, está diretamente ligado à industrialização. Segundo Santos (1993), este processo brasileiro de urbanização associa-se com o da pobreza, tendo palco a grande cidade. A cidade do Rio de Janeiro, que em sua época colonial concentrou diversas classes na área central - da família imperial aos escravos recém alforriados. Temos a partir do advento dos meios de transporte - bondes e trens -, que impulsionaram a expansão da cidade para as atuais conhecidas zonas Sul e Norte, uma dissolução de classes, onde no centro da cidade se manteve a população de condição mais miserável, com a necessidade de busca de trabalho que era encontrado apenas nesta área (ABREU, 1987).

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Figura 05 - Fluxo das ocupações na Cidade do Rio de Janeiro a partir da implementação de meios de transporte. Elaboração: Autora com base em Google Earth

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No início do século XX, a visibilidade que a capital do país estava tomando no cenário internacional, principalmente pelo Brasil ser o maior produtor de café da época, fez com que o Rio de Janeiro fosse palco de uma das maiores reformas urbanas, que mudou as funções da área central, principalmente eliminando os pobres da área mais valorizada da cidade, na gestão do prefeito Pereira Passos. Aos moldes de Haussmann, em Paris, preocupado com a situação de saneamento básico e higiene da cidade - que sofria com epidemias de febre amarela -, Passos canalizou rios, atribuiu local adequado ao lixo urbano e, em busca de circulação melhor na cidade - tanto do ar, quanto de automóveis - abriu grandes vias, derrubando diversas habitações do proletariado, os conhecidos cortiços. (ABREU, 1987).

Figura 06: Sobrado a ser demolido para as obras de urbanização do centro do Rio, localizado na rua dos Ourives entre a rua da Alfândega e a rua do Hospício. s.d. Foto: Augusto Malta. Fonte: Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro

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Com a valorização da área central, passamos, portanto, a ver uma população periférica se instalando ao redor da área central, pois ainda precisavam estar próximos ao local de trabalho. Afloram favelas e a segregação espacial se apresenta através da moradia ou da precarização dela. A necessidade de construções em tempo escasso e sistematizadas, além de terem preços acessíveis, encontram nas periferias os terrenos mais vantajosos. Faz valer aqui a lei da oferta e procura. Este trabalho irá levantar a questão do lote público em áreas consolidadas e já densificadas como o objetivo de trazer a tona a discussão sobre a função social da propriedade.

O Estado como promotor da infraestrutura necessária para as indústrias, acaba criando áreas privilegiadas na cidade, palco dos empreendedores imobiliários, proprietários fundiários e dos meios de produção, consequentemente de todo o processo de especulação imobiliária. A criação desses ambientes de alto poder aquisitivo, intensifica a segregação social, onde o proletário se vê à margem da cidade formal (GALVAN, FLÁVIO, 2007). O que se percebe é o estado trabalhando para o privado em detrimento do interesse público. O Estado também poderia, neste processo, usar o poder privado em favor do interesse público.

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políticas habitacionais no Brasil

Na República Velha, datada da Proclamação da República, 1889, até a Revolução de Vargas em 1930, já havia o reconhecimento do problema da habitação dos trabalhadores, porém em meio à uma concepção liberal, o Estado não intervém na mesma (BONDUKI, 2014).

A estimulação da produção rentista se deu em cima dessa demanda habitacional. Em um primeiro momento, vemos a criação de vilas operárias, que estavam longe de solucionar o problema do déficit habitacional, por atingir apenas trabalhadores com algum tipo de qualificação, capazes de pagar os aluguéis. Estas vilas dispunham de equipamentos coletivos, forma de disciplinar o operário e garantir o controle da moral e bons costumes na sociedade burguesa. Em algumas situações tais vilas representavam verdadeiras cidadelas. Algumas vilas não estavam atreladas a indústria e eram produzidas como intenção rentista de proprietários de terra (BONDUKI, 2014). Ainda havia uma terceira opção, conhecidos como cortiços, casas insalubres, palco de diversos problemas sanitários em todo o país. (ABREU, 2008).

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A partir da Revolução de 30, no período Vargas, o Estado inicia uma era intervencionista. No setor da habitação, existe a regulamentação da criação das carteiras prediais dos Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAPs), em 1938; e mais adiante, por meio da Lei do Inquilinato (1942) o governo mostra seu impulso na regulamentação do mercado rentista criado através da habitação (BONDUKI, 2014).

Para expor a forma fragmentada em que a habitação foi tratada na época, é necessário perceber que os IAPs tinham em sua composição interesses próprios, o órgão pode ser dividido em diversas classes (bancários, comerciários, industriários, etc) e, cada uma com suas próprias diretrizes de funcionamento. Em comum tinham o fato de serem exclusivos aos trabalhadores assalariados de carteira assinada e ter sua produção baseada no mercado rentista (BONDUKI, 2014).

De acordo com Alim Pedro: Assim como os proprietários de vilas e casas alugadas, os institutos entendiam que esses empreendimentos possibilitavam uma boa remuneração mensal do capital investido e, ainda, apresentavam grande potencial de valorização dos imóveis (apud BONDUKI, 2014, p.47)

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Com a Lei do Inquilinato, 1942, o governo congela as taxas de aluguel de todo o país, uma manobra populista, que acaba prejudicando os rentistas. O que acabou desestimulando a produção da habitação pelo capital privado. Os proprietários particulares muitas das vezes despejaram seus inquilinos, visando novos contratos ou até a mesmo a venda da propriedade, já que manter a taxa de aluguel estagnada não era rentável. Assim muitos operários passam a ocupar um território privilegiado da especulação imobiliária sobre as classes populares: as favelas (AZEVEDO, ANDRADE 2011; TRAMONTANO, 1998).

Figura 09: Noticia do decreto do governo regulando aluguéis publicado no “Diário Carioca” de 21 de agosto de 1942. Fonte: Memorial da Democracia. Figura 10: Manchete do jornal Correio Paulistano informando o decreto-lei do presidente. Fonte: Bonduki, 2014. Figura 11: Chamada sobre a onda de despejos pós decreto, em meio a inflação. Fonte: Bonduki, 2014.

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Já no regime militar, datado de 1964 à 1986, onde foram instintos os Institutos de Aposentadorias e Pensões, fora criado o Banco Nacional de Habitação (BNH), caracterizado pela nova forma de difusão de moradia: a propriedade privada, forma do trabalhador ascender socialmente, tornando-o empenhado e regrado. Apesar da criação de um volumoso número de habitações, principalmente visando a camada popular, o BNH acaba se caracterizando por empreendimentos em áreas sem infraestrutura e, com uma má qualidade de materiais e arquitetura. Tanto a economia na época, quanto o descontentamento da população com as condições oferecidas pelos empreendimentos do BNH, converteram-se em um grande abandono dos mesmos ou inadimplência e atrasos (AZEVEDO, ANDRADE 2011). Após as críticas ao modelo do BNH, a crise de inadimplência e o fim do Regime Militar, temos a extinção do mesmo, no governo Sarney. O desequilíbrio nas contas públicas causado pelo BNH, fez do período de 1986 à 2002 pouco eficaz quanto às políticas públicas de âmbito federal de habitação social.

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Finalmente, em 2009, temos mais um grande marco na produção de habitação social no âmbito Federal, o Programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV), visando a produção de unidades habitacionais para famílias de 0 a 10 salários mínimos. Este mesmo programa possui semelhanças com a política habitacional implementada pelo BNH (SILVA, TOURINHO, 2015; LEITÃO, ARAÚJO, 2013). Rolnik e Nakano, em 2009, alertam como um padrão periférico de implantação das moradias, visto anteriormente na época do BNH, encarece os custos da mobilidade e infraestrutura urbana e ainda salientam a necessidade do planejamento da gestão territorial nos municípios. A política do MCMV ultrapassa a questão habitacional e insere-se num projeto político extenso, com a indústria da construção civil como alicerce para a dinamização da economia, uma ideia de política habitacional onde a moradia enquanto um direito social aproxima-se do conceito de produto, um bem de consumo, ou um investimento financeiro. A iniciativa privada como produtor dessas unidades habitacionais acaba condicionando a qualidade à questões econômicas (CARDOSO, JAENISCH, 2014). Os conjuntos habitacionais construídos em terras baratas e distantes, sofrem com a onerosidade da infraestrutura, e fortalecem um dos maiores problemas da desigualdade urbana: a valorização imobiliária e fundiária. (MARICATO, 2009). E esses empreendimentos aglomerados em uma região, criam bolsões de moradia popular, com tipologias padronizadas, faixa de renda similar, num tecido urbano monótono com falta de equipamentos urbanos (ROLNIK, 2015).

o rompimento do traçado urbano

Figura 14 - Conjuntos Residenciais Minha Casa Minha Vida (MCMV) em Cosmos, Rio de Janeiro. Fonte: Google Maps 2020. Figura 15 - Modelo Condominial em Conjuntos Residenciais MCMV em Cosmos, Rio de Janeiro. Fonte: Google Maps 2020.

a restrição na escala humana

o rompimento do traçado urbano

Figura 16 - Conjuntos Residenciais Minha Casa Minha Vida (MCMV) no Estacio, Rio de Janeiro. Fonte: Google Maps 2020. Figura 17 - Modelo Condominial em Conjuntos Residenciais MCMV no Estacio, Rio de Janeiro. Fonte: Google Maps 2020.

a restrição na escala humana

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Segundo Rolnik (2015), essa intensa produção fora da malha urbana não é exclusividade do programa, mas pelas dimensões do programa, ele poderia ser utilizado justamente para a qualificação de áreas precárias, e promover um modelo igualitário de ocupação do território, ao invés de potencializar os problemas urbanos. Um dos maiores impactos negativos, foi a adoção da forma de condomínio exclusivamente residencial, isolado do tecido urbano existente, e negligenciando a integração com o espaço público. A uniformidade das áreas está propriamente ligada aos aspectos de desenho urbano e inserção da tipologia própria dos conjuntos e, à negligência da morfologia urbana. “A ineficácia do estado na gestão da questão fundiária e urbana, além da ausência do planejamento urbano, se revertem em transtorno e drama no cotidiano dos moradores.” (LIMA, 2018, p.267)

No ano de 2020, através da medida provisória nº 966, o presidente da república em exercício, instaurou o Programa Casa Verde e Amarela, que visa promover o direito à moradia para famílias de área urbana com renda familiar de até 7 mil reais. Tendo como uma das diretrizes a “promoção do planejamento integrado com as políticas urbanas de infraestrutura, saneamento, mobilidade e gestão do território e transversalidade com as políticas públicas de desenvolvimento econômico e social, com vistas ao desenvolvimento urbano sustentável;” (BRASIL, 2020). Porém, até a presente data, além do próprio decreto, pouco se sabe sobre o programa.

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lotes públicos

No Brasil, com o decreto da Lei de Terras, em 18 de setembro de 1850, onde as terras são adquiridas através de financiamento, o governo deixou de ser o único concedente de terras, e surge o proprietário particular. Entre o século XIX até o início do século XX o mercado imobiliário limitava-se basicamente à compra e à venda de lotes, e vê sua maior alteração a partir do crescimento demográfico na área central do Rio de Janeiro, surgindo uma nova transação imobiliária, aluguéis de cômodos em habitações coletivas (CARDEMAN, 2014)

Segundo Queiroga (2013), com a Lei nº 6766/79, os novos loteamentos urbanos do país devem reservar espaços livres de uso público, onde percebe-se que o sistema viário (ruas, calçadas) engloba a maior parte destas áreas. Fora isso, temos os bens públicos de usos especial e dominicais ou dominiais. No Brasil, o Código Civil define as propriedades públicas como: - bens de uso comum do povo: espaços de apropriação pública por excelência (a rua, a praça, o parque urbano, a praia, etc); - bens de uso especial: destinados a atividades específicas (escolas públicas, postos de saúde, paços municipais, entre tantos outros exemplos); - bens dominicais ou dominiais: os próprios de qualquer ente público passíveis de desafetação. (apud QUEIROGA, 2013, p.113)

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Através do Portal Lícita Imóveis Rio, da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, mapeou-se imóveis de propriedade da Administração Municipal que estão disponíveis para a venda na área da AP2.1, por meio de leilão, conforme a figura 18. Ainda neste mapeamento foram acrescidos terrenos de propriedade Estadual, em vias de propostas de ocupação e leilão. O presente trabalho busca apresentar uma nova forma de se aproveitar do bem público, ao invés de privatizá-lo, percebendo o potencial que tais bens podem ter para a sociedade num geral. Segundo Fridman (1997; p.65)

O uso público deixará de ser uma falsa questão quando este solo, do povo, for utilizado para a melhoria das condições de subsistência dos habitantes da cidade, seja pela construção de moradias sociais, seja pela utilização através dos movimentos culturais, seja pela preservação histórica ou ambiental. Neste caso a proposta de venda definitiva destes patrimônios, caso não venha acompanhada por uma legislação rigorosa, pode tornar-se uma ameaça à qualidade de vida da população.

Figura 18 : Mapa de Terrenos Públicos em Leilão e/ou vazios na AP2.1 do Rio de Janeiro. Fonte: Google Maps/Prefeitura Rio de Janeiro/Estado do Rio de Janeiro com modificações da autora.

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