GĂŞnero, diversidade sexual e direitos sociais
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Universidade Federal Fluminense REITOR Sidney Luiz de Matos Mello VICE-REITOR Antonio Claudio Lucas da Nóbrega
Eduff – Editora da Universidade Federal Fluminense CONSELHO EDITORIAL Aníbal Francisco Alves Bragança (presidente) Antônio Amaral Serra Carlos Walter Porto-Gonçalves Charles Freitas Pessanha Guilherme Pereira das Neves João Luiz Vieira Laura Cavalcante Padilha Luiz de Gonzaga Gawryszewski Marlice Nazareth Soares de Azevedo Nanci Gonçalves da Nóbrega Roberto Kant de Lima Túlio Batista Franco DIRETOR Aníbal Francisco Alves Bragança
Programa de Extensão UFF Mulher COORDENAÇÃO ACADÊMICA Nivia Valença Barros Rita de Cássia Santos Freitas COORDENAÇÃO ADMINISTRATIVA Maria Beatriz Costa Soares Maria Lucia M. Teixeira de Sousa SUPERVISORA Luciana Bittencourt COMISSÃO EDITORIAL Adriana de Andrade Mesquita, Universidade Veiga de Almeida Elaine Ferreira do Nascimento, Fundação Oswaldo Cruz Jacques Sochaczewski, Fundação Oswaldo Cruz Maria Belén Espoz Dalmasso, Universidad Nacional de Córdoba Nivia Valença Barros, Universidade Federal Fluminense Rita de Cássia Santos Freitas, Universidade Federal Fluminense
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Nivia Valença Barros Rita de Cássia Santos Freitas Luciana Bittencourt (org.)
Gênero, diversidade sexual e direitos sociais Debates preliminares
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Copyright © 2016 Nivia Valença Barros, Rita de Cássia Santos Freitas, Luciana Bittencourt Copyright © 2016 Eduff - Editora da Universidade Federal Fluminense
É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização expressa da editora.
Direitos desta edição cedidos à Eduff - Editora da Universidade Federal Fluminense Rua Miguel de Frias, 9, anexo/sobreloja - Icaraí - Niterói - RJ CEP 24220-008 - Brasil Tel.: +55 21 2629-5287 www.eduff.uff.br - faleconosco@eduff.uff.br Impresso no Brasil, 2018 Foi feito o depósito legal.
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Sumário Apresentação...................................................................................7 Prefácio.......................................................................................... 11 Meninas adolescentes LGBTs no contexto familiar: violência e exclusão social............................................................................... 17 Nivia Valença Barros, Rita de Cássia Santos Freitas, Maria Izabel Barros, Suyane Campos Perez O Direito e o combate às discriminações sexuais..........................28 Eder Fernandes Monica Gênero, diversidade sexual e direitos sociais da população trans............................................................................. 37 Carla Appollinario de Castro Gênero, diversidade sexual e mídia............................................... 45 Antonio Cláudio Ribeiro da Costa, Luciana G. Bittencourt Gênero, orientação sexual e diversidade sexual ............................ 56 Marcelo Ricardo Prata Saúde, estigma e diversidade sexual e de gênero...........................63 Carolina Motta Cardoso Salles Uma sociedade não é uma espécie................................................. 69 Theo Barreto Pereira da Silva Reflexões sobre repressão e controle contra a população trans – transexual e transgênero................................................................ 74 Mônica Cristina Bastos Jorge, Nivia Valença Barros
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Redes de proteção nos serviços de atendimento à população.........92 Olavo De Martino Almeida Relato de experiência.....................................................................98 Silvia Furtado A falta de empatia de magistrados e operadores do direito nos processos de retificação do registro civil das pessoas trans.......... 101 Bruna G. Benevides Sobre os autores........................................................................... 105
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Apresentação As temáticas gênero, diversidade sexual e direitos sociais estão cada vez mais presentes nos debates e reflexões societárias. Na maioria das vezes, tais temas acabam sendo discutidos de forma discriminatória e preconceituosa. Tais fatos contribuem para o aumento da violação dos direitos humanos de indivíduos e grupos que não se enquadram em padrões e normas consideradas como hegemônicas e “normais”. Assim, as construções socioculturais ligadas às questões de gênero e à orientação sexual costumam ser discutidas como valores ou conceitos fechados, construídos e compartilhados de acordo com instituições sociais como família, escola, religião e mídia. Essas formas de preconceito e discriminação contrariam os princípios da dignidade da pessoa humana, da liberdade e da igualdade, reconhecidos pela Constituição Brasileira de 1988. Portanto, todas as pessoas têm o direito de buscar e exercer livremente sua sexualidade e sua identidade de gênero, e não podem ser vítimas de nenhum tipo de discriminação por não seguirem a orientação sexual definida pela maioria. É necessário, então, promover ações que possam contribuir para a formulação de estratégias intersetoriais, dialogando com diversos públicos como um trabalho de prevenção, promoção e estímulo para o exercício da cidadania em nossa sociedade. O Programa UFF Mulher compreende que existe uma grande necessidade de atender a diferentes públicos, bem como de estender esse trabalho como uma ação contínua de conscientização e valorização da diversidade de gênero e sexual, no cenário atual vivenciado em nossa sociedade. É importante ressaltar que, durante o contato direto com o público, o UFF Mulher se preocupa em perceber e detectar carências e problemas apresentados pela sociedade sobre os assuntos pertinentes ao gênero, desenvolvendo atividades voltadas para o esclarecimento e a conscientização, com debates sobre essa temática.
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Nesse sentido, o UFF Mulher realizou do dia 22 de outubro ao dia 12 de novembro de 2015 o curso de extensão “Atualização em gênero, diversidade sexual e direitos sociais”, com o intuito de promover a troca de experiências e de refletir sobre a questão de gênero por meio do diálogo e da atualização de profissionais de diversas áreas envolvidos nessas temáticas. Além de buscar desmistificar estigmas sobre a identidade de gênero, orientação sexual, direitos e a saúde de pessoas LGBTs, pensando estratégias para o combate à LGBTfobia, por meio do fortalecimento de mecanismos para o exercício de uma cidadania plena dessa população ainda invisibilizada. O curso contou com seis encontros (quatro aulas e dois seminários), totalizando uma carga horária de 26 horas. A metodologia interativa entre alunos e facilitadores proporcionou discussões relevantes nas áreas de saúde, educação, estigma, direito e mídia para o público LGBT. Considerando a necessidade de multiplicar e ampliar o acesso ao material utilizado durante o curso e às demais ações propostas pelo UFF Mulher, o programa criou a coletânea Gênero, diversidade sexual e direitos sociais com o intuito de levar à sociedade mais elementos para a reflexão sobre as temáticas relacionadas às suas diversas discussões. Por isso, sua primeira edição foi construída com as exposições e artigos escritos pelas (os) palestrantes durante o curso, cujos temas englobam sua vivência ou a pesquisa na qual estão envolvidos. Em “Violência contra Meninas Lésbicas” são levantadas questões relacionadas à violência sofrida pela população LGBT e, em especial, pelas lésbicas. Infelizmente, esse tema, apesar de tão presente na sociedade, ainda é pouco discutido. Dentro da proposta sobre direitos da população LGBT temos os artigos “O Direito e o combate às discriminações sexuais”; “Gênero, diversidade sexual e direitos sociais da população trans” e “Reflexões sobre repressão e controle contra a população trans – transexual e transgênero” que traçam um panorama dos direitos das pessoas LGBT no nosso país, com ênfase nas pessoas trans, ressaltando o fato de que o processo de diferenciação em nossa sociedade enfatiza a sexualidade. Assim, é necessário descrever os direitos que 8 !GENERO_V_2.indb 8
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cabem a essa população e como estes podem ser alcançados de forma premente, a fim de resguardar sua cidadania e, por que não dizer, suas próprias vidas. Os artigos “Gênero, diversidade sexual e mídia” e “Gênero, orientação sexual e diversidade” trazem conceitos relacionados a gênero, mídia, diversidade e orientação sexual, apresentando ao leitor conceitos relevantes para o entendimento das diversas questões que permeiam a reprodução de estereótipos baseados nos papéis sociais estabelecidos na sociedade. Destacando-se também o papel da mídia para a propagação de atitudes e comportamentos de padrões do que é ser “feminino e masculino”. Em “Saúde, estigma, diversidade sexual e de gênero”, há informações que atravessam o campo do atendimento à população de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros no Centro de Cidadania LGBT, articulando, concretamente, as demandas apresentadas pelo público atendido e o atual cenário de políticas públicas para essa população. Já os artigos “Uma sociedade não é uma espécie” e “Reflexões sobre repressão e controle contra a população trans – transexual e transgênero” baseiam-se na ideia de que as categorias gênero e sexualidade são o resultado de vivências muitas vezes “desviadas” da ordem simbólica e moral estabelecida. De acordo com os autores, as relações de poder estigmatizam e criam normas para a construção das identidades e das subjetividades que dizem respeito ao gênero, definindo os papéis de forma regulada e determinando o que é ser homem ou mulher; o que é ser pessoa pública e pessoa privada; o que constitui o “mundo feminino” e o “mundo masculino”. Assim, os artigos enfatizam a necessidade de essas categorias serem diferenciadas, discutidas e desnaturalizadas, a partir da visibilidade de pessoas transgênero. Em “Redes de proteção nos serviços de atendimento à população” e no “Depoimento da coordenadora do Centro de Cidadania LGBT Serrana” apresentam-se a importância de se trazer a experiência dos atendimentos dos Centros de Cidadania LGBT, criados pela Secretaria Estadual de Direitos Humanos, enfatizando 9 !GENERO_V_2.indb 9
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a necessidade de aproximação da comunidade universitária diante da realidade de um grupo populacional em busca do “exercício” de cidadania plena. Por fim, o relato “A falta de empatia dos magistrados e operadores de direito nos processos de retificação do registro civil das pessoas trans” destaca a necessidade de uma sensibilidade maior desses profissionais durante os processos de retificação do registro civil das pessoas trans. Em geral, não são se consideram as inúmeras dificuldades que essa população sofre à espera da conclusão do processo, principalmente porque, em caso de deferimento, o “nome” que nele consta não condiz com a identidade de gênero do solicitante. Esperamos que esses textos contribuam para que, cada vez mais, temas relacionados a gênero, diversidade sexual e direitos sociais, principalmente os ligados à população LGBT, sejam discutidos por toda a sociedade como forma de retirar da invisibilidade essa população tão cerceada de seus direitos.
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Prefácio Este pequeno livro apresenta uma parte do curso de extensão “Atualização em gênero, diversidade sexual e direitos sociais”.1 Não poderíamos dizer que ele é o resultado deste curso, pois acreditamos que os resultados são vários e esperamos que o principal deles tenha sido a possibilidade de troca e diálogo ocorrido durante sua realização. Mas, sem dúvida, este é um resultado importante, pois congrega a voz daqueles e daquelas que deram vida a esse curso. E, além disso, essa coletânea se anuncia como a primeira de uma série que acreditamos possa ser mais um canal para o debate de temas ainda pouco discutidos – embora reconheçamos o avanço dos últimos anos. Entendemos ser importante conhecer um pouco dessa história, nossa história. O Programa UFF Mulher teve seu início no ano de 2010 – inicialmente como projeto ganhando, posteriormente, o status de programa. O programa 2 – que envolve práticas extensionistas e de pesquisa – tem como pressuposto a importância da troca de saberes e da perspectiva ativista no interior da academia. Isso significa também que são necessários estudos – e práticas – que possuam uma escuta atenta, como afirma Bourdieu (1998), bem como um olhar para a realidade, a história e a cultura das diferentes formações sociais e dos diferentes sujeitos históricos. O diálogo com a sociedade civil, mais do que um desejo, já se apresenta em nossa vida como prática cotidiana. A UFF, nossa universidade, tem uma longa trajetória de interiorização. Além disso, o Programa UFF Mulher vem se destacando na construção 1
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O curso ocorreu durante os meses de outubro e novembro de 2015, na Universidade Federal Fluminense.
O programa iniciou suas atividades em 2010 e conta com o apoio do Edital Proext Mec/ Sesu. Desde sua criação, o Programa UFF Mulher desenvolve ações voltadas para a promoção do diálogo e da troca de saberes entre a Universidade e a sociedade por meio de diferentes atividades relacionadas às áreas de gênero, direitos humanos, saúde, educação, entre outros,
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de diálogos e práticas junto à sociedade. Quando iniciamos nossas atividades, tínhamos como sujeitos centrais de nossas preocupações as mulheres. Posteriormente, no entanto, a partir das demandas e de encontros, novos temas surgem e as questões das sexualidades e da diversidade ocupam um lugar central no Programa. Assim, vemos como sujeitos ativos nessa pesquisa, mulheres e homens, cisgêneros, transgêneros, heterossexuais, queers, homossexuais.3 E, tanto metodologicamente como conceitualmente, é importante insistir nessa dimensão: eles devem ser vistos como sujeitos, nunca como meros objetos de pesquisa. As práticas que caracterizam esse projeto devem ser destacadas: encontros nas ruas, tal como o evento “UFF Mulheres na Praça”; construção de formas lúdicas, como um Labirinto Interativo, oficinas, e a atividade “UFF Mulher na Comunidade” que aconteceu em várias cidades do estado do Rio de Janeiro e em várias comunidades em Niterói, além de outros estados, como é o caso de Oriximiná, no Pará, onde foram realizados cursos de capacitação em 2016. Realizamos também outras atividades, tais como conferências, mesas-redondas, seminários e a apresentação de trabalhos em eventos científicos. É importante destacar a realização de vários cursos de extensão na área de violência, que se repetem todos os anos. Esses cursos nasceram essencialmente das demandas recebidas e envolvem prioritariamente os municípios de Niterói e de São Gonçalo. Seu objetivo é capacitar multiplicadores para divulgar essa temática (envolvendo os profissionais das redes de atendimento). Por exemplo, já está sendo providenciada a terceira versão do curso de extensão “Atualização em violência doméstica e intrafamiliar”. O curso “Atualização em gênero, diversidade sexual e direitos sociais” está em sua segunda edição.4 Vale destacar, ainda, o curso “Feminismos e movimentos sociais” também realizado em 2016 – cujo material resultante irá se transformar em nova coletânea, a ser publicada posteriormente. A 3
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As identidades são múltiplas e não temos como listar todas aqui. Consultar, para aprofundamentos, Jesus (2012). Os textos dessa coletânea são o resultado das reflexões e aulas da primeira edição desse curso.
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listagem dessas atividades, ainda que pontual, serve para demonstrar a organicidade desse programa junto à sociedade. É dessa experiência, do contato com diferentes, que novos caminhos foram se colocando e enfatizando a categoria gênero como fundamental. Falar de gênero5 é falar, em nossa opinião, de construção social. É entender que homens e mulheres vivem a mesma realidade, mas vivem de forma diferenciada, pois, desde crianças (desde antes de nascer, na verdade) já são preparados para agir e pensar de formas diferentes. A construção do feminino e do masculino é fruto de uma relação social que traz embutida em si uma hierarquização de poder, pois historicamente, sempre coube ao homem, ao polo masculino, a supremacia do poder. Além disso, entendemos que gênero pressupõe necessariamente a articulação com uma dimensão interseccional: falar de gênero requer que se fale também de raça, de geração, de classe social, de sexualidades, de cultura, de territórios. Essa articulação é o mote para a criação dessa série. Enfim, é importante partirmos da ideia de que não existe a Mulher (ou o Homem). Existem mulheres e homens, diferentes e plurais, ainda que a figura dominante da sociedade esteja encarnada na imagem do homem branco, rico, jovem, sexualmente ativo. Qualquer um que saia desse estereótipo é visto como menor, como alguém a quem “falta” alguma coisa. Dessa forma, a interseccionalidade6 se apresenta como uma dimensão que nos é muito cara – e sua importância percorre tanto as dimensões teórica e extensionista, quanto a política. Precisamos olhar esses diferentes sujeitos em sua diversidade. São eles que estão presentes no UFF Mulher hoje: mulheres e homens, heterossexuais, pobres, brancos, pretos, jovens, velhos, gays, lésbicas, mulheres trans, homens trans e travestis – e quem mais chegar. E essa diversidade enriqueceu nosso programa e nossas vidas. 5
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E não cabe aqui um tratado teórico para discutir essa categoria, nem as críticas que hoje vem recebendo. Isso ficará para um segundo momento, para outra coletânea, para outro encontro. Contudo, para aprofundar essa dimensão, é importante consultar Scott (1990), Louro (2008), Arán e Peixoto Júnior (2007), Aguiar (2007), entre outros. Acerca da dominação masculina, consultar Bourdieu (1999) e Welzer-Lang (2001). Consultar, por exemplo, Kleba Lisboa e Lolatto (2013), Hirata (2014) e Aguiar (2007).
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O curso “Atualização em gênero, diversidade sexual e direitos sociais” encontra-se em sua segunda edição e a sensação é a de que, de um ano para outro, ele se solidificou e vem-se ampliando. Esse curso surgiu a partir de demandas da própria rede municipal e este é um dos aspectos que gostaríamos de ressaltar. Dele participaram militantes e profissionais que estiveram presentes como construtores ativos e não como meros recebedores de conhecimento. Essa primeira versão, como todo início, foi feita a partir de erros e acertos – e hoje vemos que a quantidade de acertos foi muito superior à de erros. Seu caráter inicial pode ser visto nos textos que compõem esta coletânea. Não haverá aqui grandes tratados teóricos, mas teremos a rede (profissionais, professores e militantes) falando. Essa é talvez uma das grandes contribuições dessa coletânea e pode ser útil para quem estiver se aproximando dessa temática e que o queira fazer não apenas pelo viés acadêmico (que se encontra presente), mas também que busque conhecer o olhar dos “outros” sujeitos fora da academia: profissionais e militantes. Assim, para concluir esse prefácio, terminamos ressaltando a importância da relação entre universidade e sociedade. Entendemos ser necessário enfatizar a reflexão de Boaventura Santos (2007) acerca da noção de uma “ecologia dos saberes”. Tal conceito tem como pressuposto o reconhecimento da pluralidade de conhecimentos – e práticas sociais – existentes (e não vinculados apenas à ciência moderna). Dada a inesgotável diversidade – inclusive epistemológica – que caracteriza o mundo, o conhecimento também só pode ser alcançado por tipo de conhecimento/saber que busque estabelecer diálogos entre diferentes saberes e diferentes sujeitos. A ecologia de saberes se baseia, assim, na ideia de que “conhecimento é interconhecimento”. É importante, então, dar consistência a um pensamento (e, portanto, uma intervenção – que necessariamente é do âmbito do político) plural e propositivo. A importância desse olhar está na abertura para ouvir – e aprender com – o outro. A universidade tem importante papel e pode contribuir para estabelecer relações mais horizontais com a sociedade. A participação da Universidade Fede14 !GENERO_V_2.indb 14
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ral Fluminense nesses caminhos, a partir do cotidiano que vivenciamos, pode proporcionar o diálogo e o trabalho conjunto, bem como a construção de resultados integrados, promovendo a troca entre os diferentes tipos de saberes, “acadêmicos” e “populares” e a consolidação de uma pesquisa ativista. A idealização – mas, principalmente, o momento de realização – desse curso trouxe-nos a ideia de criar um mecanismo que pudesse trazer a público essas reflexões. Este livro serve a um público específico. Um grupo que quer se aproximar dessas reflexões, com a grande vantagem de contribuir com reflexões teóricas acompanhadas por aquelas advindas da prática profissional e da militância política. Uma “mistura” de saberes que possibilita a construção de um conhecimento mais amplo e que pode (ao menos esta é nossa intenção) criar replicadores e contribuir para uma cidadania efetivamente aberta a todos e a todas, que contemple todos os desejos e necessidades de cada sujeito. Rita de Cássia Santos Freitas Nivia Valença Barros
Referências AGUIAR, Márcio Mucedula. A construção das hierarquias sociais: classe, raça, gênero e etnicidade. Cadernos de Pesquisa do CDHIS, ano 20, n. 36/37, 2007. ARÁN, Márcia; PEIXOTO JÚNIOR, Carlos Augusto. Subversões do desejo: sobre gênero e subjetividade em Judith Butler. Cadernos Pagu, Campinas, SP, n. 28, jan./jun. 2007. BOURDIEU, Pierre. Compreender. In: Petrópolis, RJ: Vozes, 1998.
. A miséria do mundo.
. A dominação masculina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1999. BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. HIRATA, Helena. Gênero, classe e raça: interseccionalidade e consubstancialidade das relações sociais. Tempo Social, v. 26, n. 1, 2014. JESUS, Jaqueline Gomes de. Orientações sobre a população transgênero: conceitos e termos. Brasília, DF, 2012. 15 !GENERO_V_2.indb 15
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KLEBA LISBOA, Teresa; LOLATTO, Simone. Políticas públicas con transversalidad de género. Rescatando la interseccionalidad, la intersectorialidad y la interdisciplinariedad en el Trabajo Social. Cuadernos de Trabajo Social, v. 26, 2013. LOURO, Guacira Lopes. Gênero, sexualidade e educação: uma perspectiva pós-estruturalista. 10. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. SANTOS, Boaventura de Sousa. Para além do pensamento abissal: das linhas globais a uma ecologia de saberes. Novos Estudos CEBRAP, n. 79, 2007. SCOTT, Joan. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Cadernos SOS Corpo, Recife, 199 Porto Alegre, 16 (2), jul./dez, 1990. WELZER-LANG, Daniel. A construção do masculino: dominação das mulheres e homofobias Estudos Feministas, v. 9, 2001.
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