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Lutas por educação no Brasil recente


Universidade Federal Fluminense REITOR Sidney Luiz de Matos Mello VICE-REITOR Antonio Claudio Lucas da Nóbrega

Eduff - Editora da Universidade Federal Fluminense CONSELHO EDITORIAL Aníbal Francisco Alves Bragança (presidente) Antônio Amaral Serra Carlos Walter Porto-Gonçalves Charles Freitas Pessanha Guilherme Pereira das Neves João Luiz Vieira Laura Cavalcante Padilha Luiz de Gonzaga Gawryszewski Marlice Nazareth Soares de Azevedo Nanci Gonçalves da Nóbrega Roberto Kant de Lima Túlio Batista Franco DIRETOR Aníbal Francisco Alves Bragança


Kênia Miranda

Lutas por educação no Brasil recente O movimento docente da educação superior


Copyright © 2013 Kênia Miranda Copyright © 2017 Eduff - Editora da Universidade Federal Fluminense

Coleção Biblioteca, n. 85

É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem autorização expressa da editora.

Direitos desta edição cedidos à Eduff - Editora da Universidade Federal Fluminense Rua Miguel de Frias, 9, anexo/sobreloja - Icaraí - Niterói - RJ CEP 24220-008 - Brasil Tel.: +55 21 2629-5287 www.eduff.uff.br - faleconosco@eduff.uff.br

Impresso no Brasil, 2017 Foi feito o depósito legal.


Aos meus pais A JosĂŠ



Agradecimentos Assumindo toda a responsabilidade que me cabe, não é redundante dizer que o trabalho científico é um produto coletivo e que muitos foram meus interlocutores neste trabalho. Marcelo Badaró, orientador de tese, referência teórico-prática e amigo; Virgínia Fontes, Roberto Leher, Eurelino Coelho e Sonia Rummert leitores críticos da versão original da tese de que este livro deriva; os companheiros do GT Mundos do Trabalho da UFF, em especial, Paulo Terra, Renake Neves, Felipe Demier e Demian Melo e os do Niep-Marx. Agradeço à colaboração das diretorias e trabalhadores do Andes-SN e da Aduff-SSind., que tornaram possível o meu acesso à grande parte das fontes utilizadas, assim como aos militantes sindicais que me concederam entrevistas a fim de minimizar as muitas lacunas da pesquisa. Agradeço ainda ao Amorj, à Aperj e ao PPGH/ UFF. Agradeço aos companheiros de militância e aos valorosos amigos e amigas que fiz na vida de professora da escola pública. Pelo afeto e incentivo incondicional, agradeço aos meus pais Dalva e Sílvio que me fizeram experimentar, pela primeira vez, o significado da educação pública para a classe trabalhadora e também aos “Mirandas” Silvinho, Fernanda e Leonardo. José Rodrigues e Paula Kleve foram os principais incentivadores deste livro, convencendo-me de que também devemos ter coragem de emancipar os nossos textos. A José, companheiro intelectual, de lutas e de vida, é dedicado este trabalho.



Sumário Apresentação Para nos entender(mos) - Marcelo Badaró Mattos  11 Introdução 15 A consolidação de uma força política: os professores e o Novo Sindicalismo 21

Associativismo e sindicalismo docente  21 Algumas experiências organizativas anteriores ao Novo Sindicalismo 21 A organização sindical nacional dos docentes da educação superior  35 O Novo Sindicalismo 41

Andes: Do Novo Sindicalismo à ruptura com a CUT  49 A Consolidação do movimento: da Andes ao Andes  49

A greve de 1980 e a fundação da Andes: “Éramos colegas; hoje somos companheiros de lutas”  49 A greve de 1982: O ano da defesa do ensino público e gratuito  67 A Andes, os Congressos da classe trabalhadora e a transição conservadora  81 Explicitação das divergências na Andes: disputa eleitoral e convergência crítica à CUT 88 O Andes, um sindicato nacional combativo e cutista  101 Da Andes ao Andes: considerações sobre a década de 1980  107

Das políticas neoliberais à reorganização da classe  108 A greve dos 100 dias contra a privatização da universidade pública  112 Neoliberalismo e crise sindical: O Andes na contracorrente da ideologia de conciliação de classes  120 O Movimento Docente nos anos FHC  132 O Governo Lula e a contrarreforma da previdência  168 A Ruptura do Andes com a CUT  174

A natureza sócio-histórica do trabalho docente  185 Interfaces entre trabalho e educação  186 As especificidades do trabalho docente  190

Trabalho produtivo e trabalho improdutivo  194 Trabalho imaterial  195 Trabalho intelectual e a subsunção do trabalho ao capital  197


Transformações contemporâneas no mundo do trabalho e no processo de trabalho docente  202 Breves considerações sobre as alterações no padrão produtivo e das expectativas capitalistas sobre a educação dos trabalhadores  202 Transformações contemporâneas no Trabalho Docente  208 Proletarização e inserção de classe dos trabalhadores da educação  209

Considerações finais  219 Referências 231


Para nos entender(mos) Em fevereiro de 1978, o então presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo dizia que “A estrutura sindical foi criada dentro de um regime de exceção: o de Getúlio. Mas nos poucos momentos em que o país viveu uma democracia formal, ninguém mexeu nessa estrutura.” Sua crítica à estrutura mirava no papel que desempenhava como indutora da burocratização dos dirigentes sindicais – “A estrutura sindical para um dirigente que quer fazer carreira é perfeita” – e era especialmente focada no papel deletério do imposto sindical – “se a gente não acabar com o imposto sindical vamos ficar amarrados ao governo”. Embora ressalvando que uma mudança da estrutura na direção da “liberdade sindical” teria que vir de baixo para cima, das mobilizações dos trabalhadores, chega a fazer uma afirmação que, retrospectivamente, soa como (anti)profética: “Ah, se eu fosse o governo eu daria plena liberdade aos sindicatos”.1 Sabemos que a estrutura sindical sobreviveu à onda de mobilizações sindicais, conhecida como “novo sindicalismo”, que se seguiu àquela entrevista. Embora com alterações que amenizaram o poder de controle do Estado (como o fim da prerrogativa de intervenção do Ministério do Trabalho e a possibilidade de sindicalização do funcionalismo), o sentido maior da estrutura – unicidade, monopólio da representação, estrutura vertical, reconhecimento pelo Estado, etc. – permaneceu de pé na Constituição de 1988. O imposto sindical não apenas continuou a existir como foi complementado por outras possibilidades de “contribuições” compulsórias. E a estrutura continuou sendo “perfeita” para os dirigentes que queriam “fazer carreira”, o que incluiu, com o passar 1

Entrevista de Luis Inácio “Lula” da Silva a Mino Carta. Fevereiro de 1978. Disponível em: http://democraciapolitica.blogspot.com.br/2013/02/a-historica-entrevista-de-lula-feita. html, Acesso em: novembro de 2015.

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dos anos, muitos daqueles que, como Lula, a questionavam no período final da ditadura militar. A força da estrutura foi tamanha que, quando Lula finalmente “foi governo”, longe de “dar plena liberdade aos sindicatos”, manteve-se e aperfeiçoou-se a estrutura, inclusive abarcando as centrais sindicais (com prerrogativas de arrecadar seu quinhão do imposto sindical) em seu bojo. A permanência da estrutura, com a progressiva conversão de parte significativa de seus antigos opositores a uma postura de defesa de seus princípios, é um dos fatores centrais – não o único, por certo – a explicar o recuo do sindicalismo mais combativo dos anos 1978-1989 nas décadas seguintes. Houve porém excessões. Sindicatos que continuaram a recusar a estrutura sindical oficial e seu modus operandi, rechaçando o modelo do sindicato local/federação/ confederação, limitando dentro do possível os controles estatais e recusando-se a recolher o imposto sindical. O recuo do sindicalismo brasileiro a partir dos anos 1990 é quantificável. Seu principal indicador é a diminuição progressiva e significativa no número de greves ocorridas anualmente no país, assim como a redução no escopo dessas greves, para posturas cada vez mais defensivas, de âmbito econômico-corporativo, o que se percebe por exemplo no fato de que as greves gerais da década de 1980 foram uma experiência que não se repetiu no período seguinte. É interessante, porém, notar, que algumas categorias de trabalhadores seguiram fazendo muitas greves na década de 1990 e, em menor escala, nos anos seguintes. Embora também defensivas – diante de variadas políticas salariais que representaram uma brutal queda no poder de compra da remuneração dos trabalhadores – algumas dessas greves, especialmente no setor público, tiveram o papel de resistência às políticas de diminuição relativa da participação do Estado nas áreas sociais, associadas ao modelo neoliberal. O Andes-SN, Sindicato Nacional de Docentes do Ensino Superior, pode ser tomado como um exemplo interessante de permanência da oposição teórica e prática à estrutura sindical. Como também de impulso à resistência grevista dos docentes das 12


instituições públicas do ensino superior à introdução de políticas que visavam desresponsabilizar o Estado com sua manutenção financeira, restringir sua autonomia constitucional e introduzir mecanismo de gestão privatizante como modus operandi das instituições. Isso não isentou tal Sindicato dos influxos mais gerais do sindicalismo brasileiro na época, como também de suas contradições específicas. A mais significativa dessas contradições é relacionada à natureza mesma do trabalho docente e da autoidentificação desses “trabalhadores intelectuais”. Ao longo da década de 1980, as resistências internas ao Andes-SN para a filiação a uma central sindical, por exemplo, passaram pela disputa de projetos sindicais que marcou o conjunto do sindicalismo brasileiro na época, mas também podem ser explicadas pelas dificuldades de uma parcela significativa dos docentes de, embora assalariados, identificarem-se com trabalhadores. Kênia Miranda, que vem desenvolvendo uma significativa produção sobre o trabalho docente e o sindicalismo de professores das instituições públicas (não apenas os do ensino superior), demonstra com este trabalho uma grande sensibilidade analítica para dar conta das especificidades desse sindicalismo docente. Sua análise capta a dinâmica histórica da constituição do Andes-SN (desde a época da Andes – Associação Nacional de Docentes de Ensino Superior – no período anterior à conquista do direito de sindicalização), através de um estudo da evolução do sindicato como instituição representativa, em meio ao processo mais amplo do sindicalismo brasileiro. O debate do movimento docente em relação às centrais sindicais – o longo percurso até a filiação à CUT nos anos 1980, assim como a longa polêmica interna movida pelo sindicato no interior da central durante a década de 1990, até a ruptura com a CUT na década de 2000 – recebe destaque nos dois primeiros capítulos do livro. Mas, não é só no plano da dinâmica interna ao sindicato que Kênia vai buscar explicações para a lógica do sindicalismo docente nesses capítulos. Um peso especial, nesses mesmos capítulos, é conferido à análise das greves, momentos em que se explicitam de forma mais explosiva as contradições relativas às condições de trabalho, mas também a luta contra as políticas educacionais dos diferentes governos brasileiros desde os anos 13


1980. Momentos em que os docentes universitários agiram, efetivamente, como trabalhadores. Em meio a tais contradições explicitadas pelas greves, uma merece especial atenção neste livro que o leitor e a leitora agora tem em mãos: aquela que diz respeito às mudanças na relação de trabalho docente, associadas à tendência à maior e mais direta subsunção desse trabalho e desses trabalhadores à lógica e aos interesses da valorização do capital. O terceiro capítulo deste livro é uma contribuição original, com poderosas sugestões teóricas, ancoradas nos clássicos do materialismo histórico, para a compreensão das mudanças no trabalho docente nas últimas décadas. Mudanças que ajudam a entender como, apesar de cada vez mais “proletarizados” (no sentido da expropriação de sua tão valorizada “autonomia” pedagógica e intelectual e exploração de seu trabalho via assalariamento) os docentes tendem a enxergar-se como especialistas em atividades intelectuais muito qualificadas e a encontrar enormes dificuldades de auto-identificarem-se como trabalhadores. Fetiche da academia? A história do sindicalismo docente, como não poderia deixar de ser, continua em aberto. Afinal, neste ano de 2015, mais uma longa greve teve lugar nas universidades federais brasileiras, assim como greves em universidades estaduais ocorreram em diversas unidades da federação. Este livro é, por isso mesmo, uma leitura fundamental não apenas para os pesquisadores dos campos da educação, da história e das ciências sociais, interessados na lógica do trabalho docente e no movimento sindical dos professores. Trata-se também de uma obra que pode ajudar muitos professores que ingressaram nas universidades públicas nos últimos anos e, ao viverem suas primeiras experiências com o trabalho nas universidades, com as greves e o sindicalismo docente, têm muito a ganhar ao conhecer a história mais longa desse processo em que hoje se vêem imersos. Fica o convite à leitura. Para nos entender. Para nos entendermos. Marcelo Badaró Mattos

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Introdução Não são apenas os trabalhadores que ela [a greve] nos apresenta, mas a classe dos empregadores, o Estado e a opinião pública, tal qual aparecem no espelho posto a sua frente pelos trabalhadores. Uma greve é uma relação dinâmica.1

O presente livro é uma versão de minha tese de doutorado em História e fruto de pesquisa que possui estreita interface com a Educação, através da investigação do sindicalismo dos trabalhadores em educação no Brasil, da história da Educação da classe trabalhadora e das políticas educacionais ao longo das três últimas décadas. A tese As Lutas dos trabalhadores da Educação: do novo sindicalismo à ruptura com a CUT teve como objeto de análise o Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN) e o Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação do Rio de Janeiro (Sepe-RJ). Pela extensão da tese e adequação ao Edital da Editora da Universidade Federal Fluminense, que me forneceu a honrosa oportunidade de divulgar esse trabalho, houve a necessidade de modificar o texto original, reduzindo-o a um dos objetos pesquisados, as lutas por educação realizadas pelos docentes da Educação Superior. A análise das experiências das lutas por Educação, através da entidade sindical docente mais representativa no âmbito nacional, o Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN), revelou a centralidade do recurso às greves, como instrumento de intervenção política, na trajetória de construção dessa entidade. 1

PERROT, Michelle. Workers on strike. France, 1871-1890. New Haven, Yale Univ. Press, 1987, p. 4-5. apud MATTOS, 2003.

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Conforme a epígrafe de Michelle Perrot destaca, o dinamismo da greve coloca-nos frente a frente ao conjunto das relações sociais do tempo histórico analisado, revelando os posicionamentos dos atores envolvidos, a complexidade e a riqueza dos momentos de radicalização dos trabalhadores, quando emergem os elementos centrais da luta de classes, determinantes para a análise e a escrita de sua história. Na trajetória de pesquisa sobre o sindicalismo de trabalhadores da educação, que teve o seu início em 2003, ao entrarmos em contato com as diversas fontes produzidas ou arquivadas pelos sindicatos, destacou-se o volume dos materiais existentes sobre as greves. Tal hipótese, a da centralidade das greves na experiência desses trabalhadores com o Estado, com a comunidade escolar, com os partidos políticos e as centrais sindicais nacionais e internacionais, certamente mostrou-se importante fio condutor da pesquisa e de seus resultados. O sindicato aqui analisado recorreu às greves em vários formatos: greves por longos períodos (mais de cem dias), greves de advertência por tempo determinado, greves com piquetes, greves com marchas e passeatas, greves com ocupação de prédios públicos e de praças públicas, através de acampamentos, greves de natureza corporativa ou eminentemente políticas. Além de greve de fome. A resposta preponderante do Estado às mobilizações foi a de aplicação de medidas repressivas, inclusive policiais. No Andes-SN, a maior parte das greves ocorreu no setor das Instituições Federais de Ensino. Os capítulos do livro foram organizados a partir da cronologia das greves realizadas por este setor. Nos momentos de radicalização do antagonismo de interesses entre a categoria dos trabalhadores da educação e o Estado – na cessação do trabalho e na produção de formas públicas de luta – emergiram cenários ricos para a análise dos aspectos em disputa: as políticas educacionais, a organização da classe trabalhadora e os projetos societários. A escolha do Andes-SN como objeto de pesquisa deu-se por sua expressividade nas lutas por Educação no país e, 16


em particular, nas lutas pela Educação Superior, bem como pela experiência construída em antagonismo à estrutura sindical oficial, existente no país desde a Era Vargas. Da concepção à execução da pesquisa, os conceitos de classe social e de luta de classes, em Marx e Engels, foram as categorias fundamentais para a análise da realidade social. O conceito de classe social só faz sentido para as análises históricas se tomado em seu movimento, portanto, na sua relação com a luta estrutural das sociedades divididas em classe, conforme destacam os autores da Ideologia Alemã, “os indivíduos isolados só formam uma classe na medida em que têm que manter uma luta comum contra outra classe”.2 A abordagem de E. P. Thompson sobre a formação da classe a partir da noção de relação histórica nos permitiu outro olhar para o sindicalismo docente que não aquele presente nas análises do estruturalismo marxista. Compartilhamos, assim, com a afirmação de Thompson em A formação da classe operária inglesa que a classe não é uma estrutura, nem uma categoria, mas “algo que ocorre efetivamente (e cuja ocorrência pode ser demonstrada) nas relações humanas”.3 A partir do materialismo histórico, analisamos o processo de consolidação dos trabalhadores da educação enquanto uma nova força social, o seu processo de formação/organização/ reorganização enquanto classe e a luta contra as políticas de transformação da educação em mercadoria. Como é do conhecimento dos pesquisadores do movimento operário, o trabalho com as fontes nos sindicatos é tarefa complexa, por vários aspectos. Em primeiro lugar, a repressão ditatorial fez com que, em determinados períodos, parte do acervo dos sindicatos e/ou de sindicalistas fosse destruída. Em segundo lugar, os sindicatos oriundos do Novo Sindicalismo parecem ter começado a preocupar-se com o acervo apenas recentemente, quando se depararam com a não perenidade de seus materiais, cerca de trinta anos depois 2 3

MARX; ENGELS, 1987, p. 84. THOMPSON, 1987, p. 9.

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de sua fundação. Em que pesem as dificuldades apontadas acima, localizamos uma vastidão de fontes diversificadas e trabalhamos com fontes primárias como atas de congressos, de assembleias e jornais da entidade, jornais da grande mídia, Manifestos, documentos de avaliação das greves (Comandos de Greve), relatórios de congressos e demais encontros, cadernos de teses de congressos, panfletos eleitorais, publicações (revistas e cadernos), fotografias, faxes, telegramas, reunidos, em sua maioria no Centro de Documentação do Andes-SN (Cedoc). Além de documentos relativos às atividades rotineiras do Departamento Geral de Investigações Especiais (DGIE),4 no arquivo da Polícia Política do Estado do Rio de Janeiro, no Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro (Aperj). Como resultado desse processo de reconstrução histórica da entidade, mediado pelas greves, objetivamos responder qual é a relação estabelecida entre um sindicato antagônico à estrutura sindical oficial e o Estado, além de buscar compreender o papel da luta de classes na história da política educacional brasileira, desde a década de 1980. No primeiro capítulo, “A consolidação de uma força política: os professores e o novo sindicalismo”, tivemos o intuito de realizar um balanço da literatura sobre o movimento docente e, através da recuperação de algumas das experiências do associativismo docente, oferecer um panorama, ainda que parcial, das ações que comprovam que o movimento docente não é uma organização sem passado – mas que o mesmo não é idílico – e que tais experiências influenciaram, de certa forma, no processo de formação da categoria enquanto classe trabalhadora. Em seguida, analisamos a consolidação dos trabalhadores da educação enquanto força política no contexto dos embates presentes no seio da sociedade e do sindicalismo brasileiro, a partir da eclosão do Novo Sindicalismo, período de fundação da Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior.

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O Departamento Geral de Investigações Especiais (DGIE), ligado à Secretaria de Segurança Pública do Estado, foi criado em 1975 como órgão de “inteligência policial” cuja função era reunir informações a fim de colaborar nas tarefas de repressão social.


O segundo capítulo, “Andes: do Novo Sindicalismo à ruptura com a CUT”, trata do processo de construção, pela base, da entidade nacional de docentes do ensino superior e, portanto, do resgate da trajetória da entidade, através das greves contra a política educacional de privatização da educação em curso desde a ditadura civil-militar.5 Nesse capítulo, a luta de classes, que molda a política pública estatal, foi posta em primeiro plano ao analisarmos a capacidade do movimento docente de formulação de projetos para a educação e as experiências construídas nos contextos decisivos de elaboração de tais políticas. No terceiro e último capítulo, “A natureza sócio-histórica do trabalho docente”, para compreendermos o universo das lutas dos trabalhadores da educação, particularmente dos professores, assim como a construção de uma identidade de classe, julgamos necessário nos determos às especificidades desse trabalho. Nesse sentido, realizamos o debate em torno das categorias marxianas que nos permitem refletir sobre a natureza sócio-histórica do trabalho docente, bem como dos processos de alienação e de subsunção à lógica do capital presentes no interior do trabalho intelectual. Analisamos as especificidades do processo de trabalho e as transformações pelas quais o trabalho docente passou, com destaque para o processo de expropriação do conhecimento, elemento chave do processo de proletarização docente. Na conclusão, apresentamos os problemas em aberto da pesquisa e os avanços e os limites das lutas realizadas pelo sindicato analisado, tal como se deram do final da década de 1970 até o processo de ruptura com a CUT, em 2006, que significou um marco no processo de reorganização da classe trabalhadora no Brasil, ainda em curso.

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DREIFUSS, 2006, p. 419.

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