Cidinalva Gonçalves Maciel* Loharah Oliveira Martins** DIREITOS HUMANOS E DIREITOS FUNDAMENTAIS E A FORMAÇÃO DO EDUCANDO DE ENSINO SUPERIOR HUMAN RIGHTS AND FUNDAMENTAL RIGHTS IN THE FORMATION OF THE STUDENTY IN THE HIGHER EDUCATION DERECHOS HUMANOS Y LOS DERECHOS FUNDAMENTALES Y LA FORMACIÓN DE LOS ESTUDIANTES DE LA EDUCACIÓN SUPERIOR
Resumo: O presente trabalho descreve os Direitos Fundamentais e Direitos Humanos, e a perspectiva de sua aplicação na formação superior dos educandos, demonstrando a importância da conscientização e do entendimento prático desses direitos enquanto cidadãos em pleno desenvolvimento, valorizando a dignidade da pessoa humana, fundamento essencial do presente estudo. Traz os efeitos do estudo em direitos humanos aplicado ao ensino superior como fator de desenvolvimento do indivíduo e analisa o papel das instituições de ensino superior como formadoras da capacidade crítica e como o ordenamento jurídico brasileiro atual aborda a educação em direitos humanos nas universidades. Ao formar profissionais atentos a esses princípios é possível que se modifique o processo de alienação da população em geral, determinando um desenvolvimento da sociedade em diversas áreas. Abstract: The present study describes the Fundamental Rights and Human Rights, and the perspective of their application in the higher education of the students, showing the importance of awareness and practical understanding of these rights as citizens in full development, valorizing the dignity of the human person as essential foundation of this study. Study the effects of bring human rights applied in higher education as a factor in theindividual development, analyzing the * Especialista em Direito Penal pela FESURV e pós-graduanda em Docência Universitária pela UEG. Advogada. ** Bacharel em Direito pela PUC- GO. Advogada.
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role of higher education institutions, such as formingthe critical capacity, and as the Brazilian legal system, current discusses to human rights education in universities. Training professionals, pay attention to these principles, it is possible to modify the process of alienation from the general population, determining asociety's development in various areas. Resumen: Este documento describe los Derechos Fundamentales y los Derechos Humanos y la perspectiva de su aplicación en la educación superior de los estudiantes, lo que demuestra la importancia del conocimiento y de la comprensión práctica de estos derechos como ciudadanos en pleno desarrollo. La valoración de la dignidad de lapersona humana esencial es el fundamento de este estudio. Estudiar los efectos de llevar los derechos humanos que se aplican a la educación superior como un factor en el desarrollo del individuo, analizar el papel de las instituciones de educación superior,tales como la formación de la capacidad crítica, y como el sistema legal brasileño, los enfoques actuales de la educación en derechos humanos en las universidades. La formación de profesionales conscientes de estos principios puede modificar el proceso de alienación de la población en general, que determinan el desarrollo de una sociedad en diversas áreas. Palavras-chaves: Direitos Humanos, dignidade, educação, liberdade, igualdade. Keywords: Human rights, dignity, education, freedom, equality. Palabras clave: Derechos humanos, dignidad, educación, libertad, igualdad. INTRODUçãO O princípio que traz de forma clara e objetiva o desafio de se alcançar o equilíbrio nas relações humanas e no bem-estar individual 350
e coletivo é o princípio da dignidade da pessoa humana. Elencado no art. 5º, inciso III, da Constituição Federal (CF) de 1988 como um dos fundamentos da República, demonstra toda a sua importância. A dignidade da pessoa humana em um mundo cheio de desafios, desigualdades e infortúnios é uma meta a ser alcançada, e o educando de ensino superior precisa estar engajado para alcançar esse objetivo. Atingir um grau satisfatório de tolerância uns com os outros é uma perspectiva a ser concluída, principalmente entre aqueles que estão se tornando cidadãos críticos e participativos. Nada melhor do que o ambiente de formação superior para que esses ideais sejam alcançados, aprendendo o verdadeiro conhecimento, onde as diferenças não nos afastam uns dos outros, mas, pelo contrário, nos aproximam na medida em que nossa visão de mundo, de ser cidadão, se amplia. Entretanto, por ser a educação em direitos humanos um estudo muito amplo, é preciso delimitar a área de estudo para uma possível análise dos efeitos dessa educação voltada a princípios básicos como, por exemplo, a igualdade, a liberdade, a paz, o bem-estar, a cidadania, a democracia. Desse modo, tendo as instituições de ensino superior a função social de irradiar o conhecimento crítico, esta análise será direcionada a essa educação nas universidades. A pesquisa, quanto aos objetivos, será explicativa, pois pretende determinar por que o estudo de direitos humanos nas instituições de ensino superior é importante como ponto fundamental de transformação do educando e, consequentemente, da sociedade brasileira, através do estudo dos efeitos. O método utilizado na pesquisa será o dedutivo, por meio dos procedimentos da pesquisa bibliográfica, pois serão utilizadas como fontes de estudo livros, sites especializados, revistas, tendo em vista que os dados a serem analisados constituem fatos dispersos no tempo e no espaço. As etapas da investigação se iniciarão através da discussão do tema com o orientador, passando para a seleção da bibliografia pertinente ao tema, que possibilitará a elaboração das análises para a produção do texto da pesquisa. 351
A aplicação do estudo de Direitos Humanos e Direitos Fundamentais é um dos instrumentos capazes de mudar o contexto social de um povo, estando tais direitos positivados no decorrer da história e tendo atingido um grau de respeito e reconhecimento universal. Através da Declaração Universal dos Direitos Humanos, elaborada após o fim da Segunda Guerra Mundial, que teve como finalidade o reconhecimento de valores supremos de igualdade, liberdade e fraternidade, em um desenvolvimento dessa visão humanitária, temos também como base o Programa Nacional de Direitos Humanos e o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos. DESENVOLVIMENTO Analisando brevemente a evolução histórica acerca do tema é importante observar o processo de elaboração da Declaração Universal de Direitos Humanos. Ficou assentado, durante a sessão de 16 de fevereiro de 1946 do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas, que a Comissão de Direitos Humanos, a ser criada, deveria desenvolver seus trabalhos em três etapas. A primeira etapa seria para elaborar uma declaração de direitos humanos, de acordo com o disposto no artigo 55 da Carta das Nações Unidas. Posteriormente, dever-se-ia produzir um tratado ou convenção internacional. Em 18 de junho de 1948, foi concluída a primeira etapa pela Comissão de Direitos Humanos, por meio de um projeto de Declaração Universal de Direitos Humanos, aprovado pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948. A etapa seguinte foi completada em 1966, por meio da aprovação de dois pactos, um sobre direitos econômicos, sociais e culturais, outro sobre direitos civis e políticos. Entretanto, antes disso, foram aprovadas várias convenções de direitos humanos pela Assembleia Geral das Nações Unidas. Segundo dispõe Comparato (2010), a terceira etapa, que é a criação de mecanismos capazes de assegurar a universal observância desses direitos, 352
ainda não foi completada. O que já se conseguiu foi instituir um processo de reclamações junto à Comissão de Direitos Humanos das Nações unidas, objeto de um Protocolo facultativo, anexo ao Pacto sobre direitos civis e políticos. A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi elaborada sob o impacto das atrocidades cometidas durante a Segunda Guerra Mundial, com o número aproximado de mortos em torno de 60 milhões de pessoas e 40 milhões de refugiados. É importante ressaltar, também, que nem todos os membros das Nações Unidas partilhavam, à época, das convicções expressas no documento, apesar de este ter sido aprovado por unanimidade; os países comunistas, a Arábia Saudita e a África do Sul abstiveram-se de votar. Assim, a Declaração retomou os ideais da Revolução Francesa e representou a manifestação no âmbito universal, o reconhecimento dos valores supremos de igualdade, liberdade e fraternidade entre os homens, como declarado em seu artigo I. Segundo Comparato (2010), a cristalização desses ideais em direitos efetivos far-se-á progressivamente, tanto nacional como internacionalmente, como fruto de um esforço sistemático de educação em direitos humanos. A Declaração, tecnicamente analisando, é uma recomendação que a Assembleia Geral das Nações Unidas faz a seus membros, disposição do artigo 10 da Carta das Nações Unidas. Assim, sustenta-se que o documento não tem força vinculante. Entretanto, esse entendimento peca por excesso de formalismo, pois, atualmente, reconhece-se que a vigência dos direitos humanos independe de sua declaração em constituições, leis e tratados internacionais, pelo simples fato de estar diante de exigências de respeito à dignidade humana. A doutrina jurídica contemporânea, como discorre Comparato (2010), distingue os direitos humanos dos direitos fundamentais, sendo os últimos os direitos humanos consagrados pelo Estado mediante normas escritas. Sobre a Declaração, Comparato (2010) afirma: Inegavelmente, a Declaração Universal de 1948 representa a culminância de um processo ético que, iniciado com a Declaração
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de Independência dos Estados Unidos e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, da Revolução Francesa, levou ao reconhecimento da igualdade essencial de todo ser humano em sua dignidade de pessoa, isto é, como fonte de todos os valores, independentemente das diferenças de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição, como se diz em seu artigo II. E esse reconhecimento universal da igualdade humana só foi possível quando, ao término da mais desumanizadora guerra de toda a História, percebeu-se que a idéia de superioridade de uma raça, de uma classe social, de uma cultura ou de uma religião, sobre todas as demais, põe em risco a própria sobrevivência da humanidade.
Em relação ao teor do documento, o artigo I da Declaração declara os três princípios axiológicos fundamentais, oriundos da Revolução Francesa, quando se trata de direitos humanos: liberdade, igualdade e fraternidade. É importante ressaltar que tanto a Declaração dos Direitos do homem e do Cidadão, de 1789, como também o Bill of Rights de Virgínia, de 1776, só se referem à liberdade e à igualdade. O princípio da fraternidade só foi mencionado, pela primeira vez, na Constituição francesa de 1791. Com a Declaração passa a ter reconhecimento internacional a definição de direitos humanos em três níveis diferenciados de direitos: os direitos sociais, os direitos civis e os direitos políticos. O princípio da liberdade, na Declaração, é inerente tanto à dimensão política como à individual. O princípio da solidariedade está inserido na base dos direitos sociais e econômicos. Constitui-se através de exigências elementares de proteção às classes ou grupos sociais mais necessitados e fracos, sendo eles o direito à seguridade social, o direito ao trabalho e à proteção contra o desemprego, os principais direitos ligados ao contrato de trabalho, como a remuneração igual por trabalho igual, o salário mínimo, o repouso e o lazer, a limitação horária da jornada de trabalho, as férias remuneradas, a livre sindicalização dos trabalhadores e o direito à educação. A Declaração proíbe também a escravidão e o tráfico de 354
escravos. Após consagrar as liberdades individuais clássicas e reconhecer os direitos políticos, as Nações Unidas adotaram três outras convenções. Em 20 de dezembro de 1952, foi adotada a primeira, que se destinava a regular os direitos políticos das mulheres, de acordo com o princípio básico da igualdade entre os sexos. Em 07 de novembro de 1962, foi adotada a segunda, que dispunha sobre o consentimento para o casamento, o registro e a idade mínima para o casamento. E a terceira, adotada em 21 de dezembro de 1965, a respeito da eliminação de todas as formas de discriminação racial. Com o fim da Segunda Guerra Mundial havia uma multidão de refugiados em toda a Europa, assim, a Declaração, além de reconhecer o direito de asilo a todas as vítimas de perseguição, firmou o direito de todos a ter uma nacionalidade. Por fim, a Declaração afirma a democracia como único regime político compatível com o pleno respeito aos direitos humanos. Assim, o regime democrático passa a não ser uma opção política, e sim a única solução legítima para a organização do Estado. No que concerne às Instituições de Ensino Superior no Brasil, segundo o disposto na Carta Magna brasileira em seu artigo 205, a educação é direito de todos e dever do Estado e da família, devendo ser promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. A Constituição Federal ainda traz, em seu texto, previsões a respeito das universidades, conforme o exposto no artigo 207, que discorre que as instituições de ensino superior gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, obedecendo ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. O mesmo ordenamento jurídico estabelece, ainda, que as atividades universitárias de pesquisa e extensão poderão receber apoio financeiro do Poder Público, no § 2º do artigo 213. A Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Em seu artigo 43, define a finalidade da educação superior no Brasil: 355
Art. 43. A educação superior tem por finalidade: I - estimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito científico e do pensamento reflexivo; II - formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua; III - incentivar o trabalho de pesquisa e investigação científica, visando o desenvolvimento da ciência e da tecnologia e da criação e difusão da cultura, e, desse modo, desenvolver o entendimento do homem e do meio em que vive; IV - promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicações ou de outras formas de comunicação; V - suscitar o desejo permanente de aperfeiçoamento cultural e profissional e possibilitar a correspondente concretização, integrando os conhecimentos que vão sendo adquiridos numa estrutura intelectual sistematizadora do conhecimento de cada geração; VI - estimular o conhecimento dos problemas do mundo presente, em particular os nacionais e regionais, prestar serviços especializados à comunidade e estabelecer com esta uma relação de reciprocidade; VII - promover a extensão, aberta à participação da população, visando à difusão das conquistas e benefícios resultantes da criação cultural e da pesquisa científica e tecnológica geradas na instituição.
Percebe-se, analisando-se principalmente os grifos, que há preocupação de parte do Poder Público em direcionar a educação superior no Brasil, como fator de desenvolvimento do indivíduo, enquanto cidadão, e também da sociedade. A redação da Lei apresenta meios para se desenvolver o senso crítico do indivíduo, pelo do conhecimento dos problemas do seu próprio meio. Assim, relacionando a referida Lei com o estabelecido na Constituição Federal, há possibilidade de que haja implementação das diretrizes determinadas pela Lei, pois foi conferida às instituições de ensino superior autonomia didático-científica. Direitos Humanos versam sobre temas relacionados à 356
dignidade da pessoa humana, em que o Direito à vida, à liberdade, à igualdade e a propriedade são aspectos fundamentais. Enquanto os Direitos Fundamentais estão consagrados em um plano interno, ou seja, na Constituição da República, os Direitos Humanos estão consagrados no plano internacional, em Tratados e Convenções Internacionais. Caracteres dos direitos fundamentais, segundo Silva (2005): 1ª Universalidade: a vinculação desses direitos, a dignidade da pessoa humana e a liberdade conduzem a existência de um núcleo mínimo de proteção ao ser humano que deve estar presente em toda e qualquer sociedade Quando se fala em universalidade significa que os direitos fundamentais têm um núcleo central a todos os ordenamentos jurídicos. Comum a todos os povos. Não são iguais, mas são afins. Ex: direito à vida. Tal característica é muito criticada por muitos autores, em razão dos aspectos culturais de cada povo, entendem que há uma imposição da cultura ocidental. 2ª Inalienabilidade: os direitos fundamentais são intransferíveis, inegociáveis e indisponíveis. Não tem caráter patrimonial. 3ª Imprescritibilidade: mesmo que não os exerça por muito tempo, esses direitos não podem ser alcançados pela prescrição. 4ª Historicidade: os direitos são históricos, ou seja, os direitos surgiram em épocas diferentes (geração de direitos fundamentais) e conteúdos alterados com o passar do tempo. Não surgiram todos de uma única vez. Eles surgiram e foram evoluindo em épocas diversas, conforme necessidade. Antes não se falava em proteção ao meio ambiente. Com a evolução de certos direitos passaram a ser tidos como fundamentais. Surgem em épocas distintas e eles evoluem. 5ª Irrenunciabilidade: os direitos fundamentais são irrenunciáveis; não se pode abrir mão de forma definitiva dos direitos fundamentais. Contudo, o titular do direito pode voluntariamente limitar um direito fundamental.
Enfim, não existem princípios absolutos, ainda que consagrem direitos fundamentais, pois todos encontram limites em outros direitos fundamentais. Trata-se do princípio da convivência das liberdades públicas, o princípio da relatividade. A cedência 357
recíproca de direitos só é possível se os direitos não forem absolutos, logo, gera a possibilidade de resolução de eventual colisão de direitos. Só há liberdade se há restrição da liberdade. Toda liberdade deve ter limites para que as outras liberdades também sejam asseguradas. Não confundir a titularidade desses direitos com o exercício desses Direitos. Direitos Individuais em espécie: “art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.” Inviolabilidade do Direito à vida: quando se fala em inviolabilidade do direito à vida, a dignidade será utilizada como um postulado interpretativo, tendo em vista que o direito à vida não é apenas o de permanecer vivo. O direito à vida possui uma dupla dimensão e, assim, quando a Constituição Federal protege o direito à vida está protegendo tanto o direito a permanecer vivo, como o direito a uma vida digna, conforme art. 170, CF: “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios [...]”. O Estado deve proporcionar as condições mínimas necessárias (mínimo existencial para uma vida com dignidade). Não se deve confundir a inviolabilidade com a irrenunciabilidade, pois a última é uma característica que todos os direitos fundamentais possuem. O direito à vida, assim como todos os direitos fundamentais, é um direito irrenunciável. A inviolabilidade protege o direito à vida em face de terceiros, ou seja, impede sua violação por parte de terceiros. É certo que o direito à vida não é absoluto e, segundo a Constituição Federal Brasileira de 1988, este é um direito relativo, podendo ser violado quando da legítima defesa. Ainda nesse ponto, pode-se incluir a discussão acerca da recepcionalidade ou não do aborto sentimental pela Constituição Federal de 1988. Outra discussão seria o confronto entre o direito à vida e outros direitos fundamentais. A própria Constituição Federal, no art. 5º, inciso XLVII, alínea “a”, prevê a pena de morte em caso 358
de guerra declarada. Assim, a soberania e a segurança nacional são mais importantes do que o direito à vida de algumas pessoas em certas situações. O princípio isonômico ou da igualdade não veda que a lei estabeleça tratamento diferenciado entre pessoas que guardem distinções de grupo social, de sexo, de profissão, de condição econômica ou de idade, entre outras. O que não se admite é o parâmetro diferenciador ser arbitrário, desprovido de razoabilidade, ou que deixe de atender a alguma relevante razão de interesse público. Assim, para se averiguar se uma lei é ou não inconstitucional deve-se verificar o seguinte: se o elemento discriminador está ou não a serviço de um fim constitucionalmente protegido; se o critério adotado é objetivo e razoável. Caso o critério seja preconceituoso, arbitrário ou discriminatório, não será admitido (art. 7º, XXX, da CF). A Constituição da República de 1988 consagra ambos os aspectos da igualdade, sendo que a igualdade formal está consagrada no art. 5º, caput, e a igualdade material nos arts. 5º c/c 3º, inciso III, c/c os direitos sociais. Vejamos, a igualdade jurídica (formal) consiste no tratamento isonômico conferido a todos os seres de uma mesma categoria essencial. Segundo Silva (2005), a justiça formal coincide com o critério de justiça de Aristóteles “tratar os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual na proporção de sua desigualdade”. Pessoas diferentes, em situações diferentes, devem ser tratadas de forma diferente, mas a proporção nesta diferença deve ser respeitada. Um exemplo disso seria o estabelecimento de alíquotas diferenciadas para isenção de Imposto de Renda. A Igualdade Material exige do Estado uma ação positiva para proteger pessoas menos favorecidas. O Estado deve atuar para reduzir as desigualdades materiais. O art. 3º, III, CF, discorre que “um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil é reduzir as desigualdades sociais e regionais”; e o art. 6º e seguintes tratam dos direitos sociais e visam à redução das desigualdades. As ações afirmativas devem ter prazo de duração, tendo em vista que se prestam para corrigir situações momentâneas, 359
passageiras. O problema é que dificilmente essas ações são revogadas, já que sua revogação seria uma atitude antipopular. A função da lei é diferenciar pessoas diferentes. Deve-se analisar o critério utilizado na distinção para se descobrir se a lei é ou não constitucional. Deve-se saber se o elemento discriminador está a serviço de um fim constitucional. O critério, para ser constitucional, deve ser um critério objetivo, razoável e proporcional, sob pena de afrontar as disposições constitucionais. Não poderá haver critério discriminatório, arbitrário e preconceituoso. O direito à liberdade se dá quando a manifestação do pensamento for abusiva contra terceiros. Nesse caso, caberá o direito de resposta previsto no inc. V – “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”. O que a CF protege é a expressão ou manifestação do pensamento. A expressão do pensamento é um direito que se exaure no momento em que se realiza. O art. 5º, V, CF, assegura o direito de resposta proporcional ao agravo, e, sendo este insuficiente, assegura-se também a indenização por danos morais e materiais. A afirmação histórica dos direitos humanos passou por uma grande evolução ao longo da história mundial, conforme retro-mencionado. Assim também foi o processo de evolução da educação em direitos humanos, que ao longo do desenvolvimento das sociedades vem tendo crescente participação na formação dos indivíduos. A educação em direitos humanos tem papel fundamental na sociedade atual. Segundo Rayo (2004), uma das finalidades da ação integrada que os direitos humanos têm no plano educacional é fazer da educação um instrumento de comunicação viva, de aprendizagem solidária, com crítica construtiva e pensamento aberto, capaz de suscitar transformações sociais através da participação responsável da cidadania. É possível estabelecer a educação em direitos humanos, como meio de modificação da consciência social dos indivíduos, enquanto cidadãos participantes dos problemas presentes no mundo. Há uma crescente preocupação com a conscientização social através da educação em direitos humanos, como discorre 360
Bittar (2008, p. 216): Indiscutivelmente, o momento histórico vivenciado na contemporaneidade – marcado por emergentes impasses de convivência, por novos conflitos sociais e por novas necessidades humanas – torna forçoso buscar uma Educação Conscientizadora voltada para a aprendizagem e a prática dos Direitos Humanos como esforço de “luta contra qualquer espécie de dominação e de opressão”, bem como “critério comum de defesa da dignidade e da autonomia do ser humano”.
No âmbito mundial, em 2005 a Organização das Nações Unidas estabeleceu o Programa Mundial de Educação em Direitos Humanos, que propõe: A construção de uma cultura universal de direitos humanos por meio do conhecimento, de habilidades e atitudes, aponta para as instituições de ensino superior a nobre tarefa de formação de cidadãos(ãs) hábeis para participar de uma sociedade livre, democrática e tolerante com as diferenças étnico-racial, religiosa, cultural, territorial, físico-individual, geracional, de gênero, de orientação sexual, de opção política, de nacionalidade, dentre outras. (PLANO NACIONAL DE EDUCAçãO EM DIREITOS HUMANOS, on line)
A educação em direitos humanos, atualmente, no Brasil, é de fundamental importância para a formação dos cidadãos. Assim como afirmam Andreopoulos e Claude (2007), a educação em direitos humanos funciona como pleno exercício de cidadania, o que requer que cada grupo-alvo esteja capacitado para que se inicie o processo de aquisição de conhecimentos e de consciência crítica necessária para que se compreenda e questione padrões opressores de organização econômica, política e social. Cabe ressaltar que o papel do educador é tão fundamental nessa formação como o do Estado. Dessa forma, segundo Flower e Shiman (apud ANDREOPOULOS, 2007), deve-se assegurar que os futuros professores analisem criticamente o ambiente de direitos humanos em sua própria comunidade e 361
sociedade, determinando, assim, quais papéis as instituições de ensino podem e devem desempenhar no desenvolvimento em direção às metas articuladas pelos documentos internacionais. Esse exame envolve a identificação das pessoas cujos direitos são violados ou até mesmo inalcançáveis, considerando os modos pelos quais as comunidades escolares agem em nome das pessoas destituídas de poder. Percebe-se que o trabalho para que haja uma educação em direitos humanos é uma parceria entre o Estado, como provedor da estrutura e do direcionamento necessários, e os profissionais de educação. No Brasil, a ação do Estado atualmente relacionada diretamente à promoção da educação em direitos humanos é o Programa Nacional de Direitos Humanos, PNDH-3. Conforme disposto no site da Presidência da República, o Programa Nacional de Direitos Humanos, PNDH-3, deu continuidade ao processo histórico de consolidação das orientações para a promoção e concretização da defesa dos Direitos Humanos no país. O mesmo avançou, incorporando a transversalidade nos objetivos estratégicos e nas diretrizes propostas, em uma perspectiva de interdependência, indivisibilidade e universalidade dos Direitos Humanos. No mesmo texto se explica que em 2008 iniciou-se uma cuidadosa atualização e revisão do PNDH I e II, através da realização da 11ª Conferência Nacional de Direitos Humanos, a 11ª CNDH. Esta foi realizada através de 137 encontros prévios, reunindo aproximadamente 14 mil participantes, dentre eles participantes da sociedade civil organizada e do poder público, o que garantiu força institucional ao Programa. Portanto, a elaboração do PNDH-3 é uma ação compartilhada entre a sociedade civil e o governo, o que viabiliza a geração de bases para a o fortalecimento e a criação de ações que possibilitem uma Política Nacional de Diretos Humanos como política de Estado. O PNDH-3 foi instituído pelo Decreto 7.037, de 21 de dezembro de 2009, e atualizado pelo Decreto 7.177, de 12 de maio de 2010, de acordo com disposição em sua apresentação: O PNDH-3 representa um verdadeiro roteiro para seguirmos
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consolidando os alicerces desse edifício democrático: diálogo permanente entre Estado e sociedade civil; transparência em todas as esferas de governo; primazia dos Direitos Humanos nas políticas internas e nas relações internacionais; caráter laico do Estado; fortalecimento do pacto federativo; universalidade, indivisibilidade e interdependência dos direitos civis, políticos, econômicos, sociais, culturais e ambientais; opção clara pelo desenvolvimento sustentável; respeito à diversidade; combate às desigualdades; erradicação da fome e da extrema pobreza.
O Programa Nacional de Direitos Humanos apresenta a divisão em seis eixos orientadores, sendo em cada eixo apresentados objetivos a serem alcançados e o órgão responsável, bem como os parceiros na implantação. Os eixos são: interação democrática entre Estado e sociedade civil; desenvolvimento e direitos humanos; universalizar direitos em um contexto de desigualdades; segurança pública, acesso à justiça e combate à violência; educação e cultura em direitos humanos; direito à memória e à verdade. O PNDH-3 prevê, em seu objetivo estratégico I, da Diretriz 18, a implementação do Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (PNEDH). O Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (PNEDH) é fruto do compromisso do Estado com a concretização dos direitos humanos e de uma construção histórica da sociedade civil organizada. Ao mesmo tempo em que aprofunda questões do Programa Nacional de Direitos Humanos, o PNEDH incorpora aspectos dos principais documentos internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil é signatário, agregando demandas antigas e contemporâneas de nossa sociedade pela construção de uma cultura de paz, da democracia, do desenvolvimento e da justiça social. O Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (PNEDH) foi elaborado pelo Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos, constituído por representantes da sociedade civil, especialistas, instituições privadas e públicas e organismos internacionais. As ações desenvolvidas por entidades e órgãos, sejam 363
públicos ou privados, são avaliadas e coordenadas pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República (SEDH), pelo Ministério da Educação (MEC), pelo Ministério da Justiça e pelas Secretarias Especiais. Assim, segundo previsto no próprio PNEDH, o mesmo: se destaca como proposta de um projeto de sociedade baseada nos princípios da democracia e da justiça social; de construção de uma cultura de direitos humanos, entendida como processo a ser apreendido e vivenciado numa perspectiva de cidadania ativa.
O texto introdutório, apresentado no referido capítulo do PNEDH, faz alusão à importância das universidades na formação dos indivíduos. As universidades brasileiras, especialmente as públicas, em seu papel de instituições sociais irradiadoras de conhecimentos e práticas novas, assumiram o compromisso com a formação crítica, a criação de um pensamento autônomo, a descoberta do novo e a mudança histórica. O texto do PNEDH faz alusão à necessidade de as instituições de ensino superior agirem em relação aos problemas sociais existentes no Brasil hodiernamente, principalmente na busca de ações que influenciarão toda a sociedade: As instituições de ensino superior precisam responder a esse cenário, contribuindo não só com a sua capacidade crítica, mas também com uma postura democratizante e emancipadora que sirva de parâmetro para toda a sociedade. (PLANO NACIONAL DE EDUCAçãO EM DIREITOS HUMANOS, on line)
O capítulo II do PNEDH discorre a respeito da educação em direitos humanos na educação superior, elencando ações programáticas e princípios a serem seguidos. Os princípios descritos são os seguintes: a) a universidade, como criadora e disseminadora de conhecimento, instituição social com vocação republicana, diferenciada e autônoma, comprometida com a democracia e a cidadania;
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b) os preceitos da igualdade, da liberdade e da justiça devem guiar as ações universitárias, de modo a garantir a democratização da informação, o acesso por parte de grupos sociais vulneráveis ou excluídos e o compromisso cívico-ético com a implementação de políticas públicas voltadas para as necessidades básicas desses segmentos; c) o princípio básico norteador da educação em direitos humanos como prática permanente, contínua e global, deve estar voltado para a transformação da sociedade, com vistas à difusão de valores democráticos e republicanos, ao fortalecimento da esfera pública e à construção de projetos coletivos; d) a educação em direitos humanos deve se constituir em princípio ético-político orientador da formulação e crítica da prática das instituições de ensino superior; e) as atividades acadêmicas devem se voltar para a formação de uma cultura baseada na universalidade, indivisibilidade e interdependência dos direitos humanos, como tema transversal e transdisciplinar, de modo a inspirar a elaboração de programas específicos e metodologias adequadas nos cursos de graduação e pós-graduação, entre outros; f) a construção da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão deve ser feita articulando as diferentes áreas do conhecimento, os setores de pesquisa e extensão, os programas de graduação, de pós-graduação e outros; g) o compromisso com a construção de uma cultura de respeito aos direitos humanos na relação com os movimentos e entidades sociais, além de grupos em situação de exclusão ou discriminação; h) a participação das IES na formação de agentes sociais de educação em direitos humanos e na avaliação do processo de implementação do PNEDH.
O “tema transdisciplinar”, citado no item “e” dos princípios do PNEDH, é visto atualmente pelos doutrinadores como fundamental para a efetiva aplicação da educação em direitos humanos na sociedade. O caminho a ser trilhado para uma educação em direitos humanos nas instituições de ensino superior é árduo, porém já percorrido, tendo, assim, como demonstrar o direcionamento e as problemáticas a serem enfrentadas pelos futuros profissionais interessados em aplicar essas diretrizes em seus meios de atuação. 365
O professor Rhoda E. Howard, da Universidade McMaster, em Hamilton, Ontário, Canadá, criou cursos temáticos interdisciplinares para enfatizar o ensino interdisciplinar e a globalização, com duração de 5 (cinco) anos. Assim, segundo descrito pelo professor (apud ANDREOPOULOS e CLAUDE, 2007), em maio de 1991 foi criado o Curso de Extensão em Justiça Internacional e Direitos Humanos. O curso de extensão desenvolvido pelo professor aborda toda a série de direitos humanos relacionados nos principais documentos emitidos pela ONU, incluindo os direitos políticos e civis; os direitos econômicos, culturais e sociais; e os direitos coletivos de “terceira geração”. No programa desenvolvido pela universidade os alunos são selecionados de todas as faculdades da McMaster. O primeiro grupo foi formado por alunos de engenharia, enfermagem, administração, ciências, humanidades, ciências sociais e “artes e ciência”. Dentre os selecionados, a maioria já tem um histórico consistente de atividades voluntárias ligadas aos direitos humanos. Dessa forma, segundo o professor, a grande maioria desses alunos tem como objetivo incorporar sua capacitação em direitos humanos a outras profissões ou carreiras, seja dentro do setor público ou do privado. Inicialmente, foi oferecido um curso único para o grupo, como introdução ao estudo. Entretanto, a partir do segundo semestre foram oferecidos cursos diversos, como, por exemplo, direito à alimentação, desintegração da Iugoslávia, direito ao desenvolvimento, direitos dos deficientes, sociedade civil, saúde do ecossistema e direitos humanos, direitos internacionais da criança, direitos dos povos indígenas, cooperação econômica internacional e direitos humanos, direitos internacionais da mulher, genocídio comparativo, direitos humanos em sociedades tecnológicas e “as faces da tolerância”. O curso de extensão estimula alunos e professores a deixarem de lado os limites de suas experiências acadêmicas normais. Entretanto, levanta a problemática de haverem professores e alunos de origem radicalmente diferentes. De acordo com o professor Howard (apud ANDREOPOULOS e CLAUDE, 2007):
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Tamanha variedade de origens pode ser muito provocante e resultar em estímulo intelectual por novas idéias. [...] Em um programa interdisciplinar colaborativo como o Curso de Direitos Humanos, as disparidades de conhecimento devem ser tomadas como oportunidades para que cada um ensine e aprenda.
A metodologia de ensino adotada pelo programa foi a de aprendizagem autodirigida, onde os professores atuam mais como “facilitadores”, assim, os alunos recebem com mais entusiasmo o estilo de aprendizagem, pois este lhes permite uma liberdade considerável dentro da sala de aula. O professor Howard (apud ANDREOPOULOS e CLAUDE, 2007, p. 336) conclui a análise explicativa de sua experiência da seguinte forma: Assim, o programa de direitos humanos serve para introduzir em alguns campi o debate sobre importantes questões nacionais e internacionais, de uma forma que entrelaça disciplinas e faculdades diferentes e aproxima especialidades acadêmicas. Some-se a isto o entusiasmo e a motivação dos alunos e, definitivamente, vale o esforço de organizar e administrar um programa deste tipo.
A experiência apresentada pelo professor é de fundamental importância para grupos de extensão e pesquisa brasileiros, pois comprova que há meios de fazer funcionar a aplicação de um estudo transversalizado. Finalizando sua explanação sobre o projeto desenvolvido, o professor Howard (apud ANDREOPOULOS e CLAUDE, 2007, p. 335) expõe o desenvolvimento intelectual de seus alunos após participarem do programa: O entusiasmo dos alunos com o programa é notável. Contam-me que, se antes discutiam sexo e esporte enquanto relaxavam bebendo, à noite, hoje discutem questões de direitos humanos. Outros alunos que não fazem parte do programa escutam as conversas e ficam desapontados ao saber que, infelizmente, as turmas estão fechadas para aqueles que não fazem parte do curso de extensão.
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É notória a canalização, retro-mencionada, do idealismo dos alunos a partir do exposto. Isso estimula outros indivíduos a buscarem também a participação nesse tipo de programa. A evolução do conhecimento desses alunos acaba influenciando as diversas áreas de suas vidas e do conhecimento, a partir do momento em que se cristaliza no desenvolvimento intelectual desses alunos uma cultura voltada à valorização e ao respeito dos direitos humanos na sociedade. Segundo exposto por Carvalho e Masson (apud CARDOSO, 2009), ao iniciar os alunos na aprendizagem, reflexão e discussão sobre conceitos jurídicos, como a educação em direitos humanos, há um ponto de partida para experimentar e construir uma educação à cidadania. A educação tem como paradigma ensinar conhecimentos e educar para a vida. Assim, sem que haja uma educação voltada para a conscientização da importância dos direitos humanos não haverá desenvolvimento intelectual dos indivíduos como cidadãos atuantes nas transformações do seu meio, seja na universidade, na família, na cidade ou até mesmo no país. As finalidades da educação em direitos humanos no ensino superior para o desenvolvimento do indivíduo, segundo Rayo (2004), são: fomentar nos indivíduos os valores universais e os tipos de comportamento em que se baseia uma cultura de paz; reconhecimento do valor do compromisso cívico da associação com os demais, para resolver os problemas e trabalhar por uma comunidade democrática, pacífica e justa; desenvolver a capacidade de aceitar e reconhecer os valores existentes na diversidade das culturas, povos, sexos e indivíduos, desenvolvendo a capacidade de cooperar, compartilhar e se comunicar com os demais, fortalecendo a identidade pessoal e favorecendo a convergência de ideias e soluções que reforcem a fraternidade e a paz entre os indivíduos; desenvolver a capacidade de resolver conflitos com métodos não violentos, através do processo de construção da paz interior na mente dos estudantes, ajustandose à solidariedade, à tolerância e ao altruísmo; cultivar a capacidade de fazer escolhas com conhecimento, tendo como base para análise das situações atuais não apenas os atos da presente situação, mas também a perspectiva de um futuro ao qual 368
se aspira; ensinar aos indivíduos o respeito para com o patrimônio cultural, a proteção do meio ambiente, a adoção de métodos de produção e pautas de consumo que levem ao desenvolvimento sustentável; e o desenvolvimento do sentimento de equidade e solidariedade, tanto no plano nacional quanto no internacional, visando um desenvolvimento equilibrado em longo prazo. Como anteriormente exposto, a educação em direitos humanos no ensino superior é capaz de desenvolver o indivíduo. Entretanto, busca-se, através desse processo, que haja o desenvolvimento da sociedade como um todo, pois através da educação é possível transformar a mentalidade de grande parte da população em relação a conceitos como liberdade, igualdade, cidadania, democracia, respeito, preservação e desenvolvimento. Segundo Maran (apud ANDREOPOULOS e CLAUDE, 2007), os ensinamentos de Paulo Freire são úteis nesse processo: A democracia e a educação democrática estão fundadas na fé no homem, na crença de que eles não só podem, mas devem discutir os problemas de seus países, de seu continente, de seu mundo, seu trabalho, os problemas da democracia em si. A educação é um ato de amor, e portanto um ato de coragem. Não pode temer a análise da realidade ou, sob risco de se revelar uma farsa, evitar a discussão criativa.
No mesmo entendimento, Victoria Camps (apud RAYO, 2004) discorre que educar é, no sentido mais extenso e amplo do termo, formar o caráter para que se cumpra um processo de socialização imprescindível, promovendo, também, um mundo mais civilizado, crítico com os problemas atuais e comprometido com o processo moral das estruturas e atitudes sociais. É essencial para o progresso e o desenvolvimento social e econômico de um país o respeito aos direitos humanos, de acordo com o descrito por Rayo (2004), que afirma, ainda, que direitos fundamentais como a liberdade, a vida e a segurança física de uma pessoa, no mundo atual, encontram-se em constante ameaça das forças da repressão, exploração e ódio. Como ameaça é possível citar, também, a escassez de alimentos, a deterioração do meio ambiente, o problema demográfico, os desastres naturais, os conflitos étnicos e religiosos, a criminalidade 369
internacional, o desemprego e a desintegração social. A sociedade brasileira atual necessita de um desenvolvimento sustentável e social centrado nos seres humanos, através de uma educação qualificada para estimular o pensamento crítico dos indivíduos, levando em consideração as finalidades retromencionadas da educação em direitos humanos no ensino superior para o desenvolvimento do indivíduo e da sociedade. Conforme exposto por Rayo (2004), alcançar metas e objetivos para que haja esse tipo de processo requer mais que boas intenções, e, sobretudo, constantes esforços para que se reduzam as principais fontes de transtornos e instabilidades sociais no Brasil e no Mundo. Esses esforços devem ser realizados no âmbito nacional, regional e internacional, com a finalidade de superar os males de âmbito mundial que ameaçam gravemente a saúde, o bem-estar, a paz e a segurança de milhões de pessoas. Dentre esses males pode-se citar os problemas das drogas; o tráfico ilícito de armas; os conflitos armados; a ocupação estrangeira; a corrupção; a delinquência organizada; a fome crônica; a má nutrição; a intolerância e a incitação ao ódio por motivos de raça, religião ou origem étnica; o terrorismo; a xenofobia; as enfermidades endêmicas e transmissíveis; a deterioração do meio ambiente; a distribuição desigual e o esgotamento de recursos; o crescimento demográfico e os ajustes estruturais nas políticas econômicas. As palavras que iniciam o Progresso das Nações, publicado anualmente pela UNICEF, revelam, conforme Rayo (2004), o anseio de toda humanidade e também podem representar uma síntese do ideal contido em todos os documentos de direitos humanos: Chegará um dia em que o progresso da nações não será medido por seu poder militar ou econômico, nem pelo esplendor de sua capital e seus edifício públicos, mas pelo bem-estar de seus povos: por seus níveis de saúde de nutrição e de educação; por suas oportunidades de receber uma remuneração digna em troca de seu trabalho; por sua capacidade de decisão nas participações que afetam sua vida; pelo respeito a suas liberdades civis e políticas; pela atenção dispensada aos mais vulneráveis e desfavorecidos; e pela proteção oferecida ao desenvolvimento físico e mental de suas crianças.
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As sociedades, no mundo em geral, perderam, ao longo do processo de globalização, valores humanos fundamentais para o convívio harmônico dos indivíduos. Portanto, são necessárias ações para conscientizar e educar os cidadãos para uma cultura voltada para a paz, a liberdade, a igualdade, o respeito e a fraternidade. CONCLUSãO O estudo dos Direitos Humanos e Direitos Fundamentais se mostra imprescindível na formação do cidadão no contexto atual, conhecendo suas espécies e, assim, podendo usufruir delas, bem como participando de seu aprimoramento, em um regime Democrático de Direito. Muitas são as desigualdades sociais e a falta de empatia do indivíduo que se contextualiza com o mundo globalizado. O histórico mundial da evolução da compreensão da dignidade suprema da pessoa humana e de seus direitos foi formado por um longo processo iniciado séculos atrás. É importante observar que, ao longo desse desenvolvimento, normalmente percebe-se, também, a ocorrência de grandes fenômenos que imputaram dor, sofrimento e grandes surtos de violência anteriormente às grandes declarações. O ápice dessa evolução se deu com a redação da Declaração Universal dos Direitos do Humanos, redigida após a Segunda Guerra Mundial, consequência das atrocidades cometidas durante a guerra. No Brasil, a temática dos direitos humanos e da educação em direitos humanos está presente no ordenamento jurídico em leis esparsas e também na Constituição Federal. Doutrinariamente, ademais, tem-se percebido a crescente importância da educação em direitos humanos, como fator modificativo da capacidade crítica e reflexiva dos indivíduos. A educação é um importante meio de difusão do conhecimento, mas também tem papel fundamental na formação moral dos indivíduos, sendo capaz de formar intelectualmente indivíduos com senso crítico, modificando, assim, a característica 371
comum da população em geral, a alienação. O indivíduo com senso crítico desenvolvido, conhecedor dos seus direitos e deveres enquanto cidadão, tem a capacidade de refletir e analisar a respeito dos problemas a que seu meio está inserido. Ainda, é hábil para desenvolver, a partir de seus conhecimentos específicos, atividades que busquem a melhora da sociedade como um todo. Atualmente, o Brasil tem vivenciado inúmeros problemas sociais que afetam a todos, direta ou indiretamente, tais como as desigualdades sociais, a violência generalizada, a corrupção, os problemas vivenciados diariamente na saúde, a baixa qualidade do ensino público, a fome e as drogas. Para que haja uma mudança nesse quadro é necessária a integração entre as atividades do Estado e da sociedade civil, concretizada no Programa Nacional de Direitos Humanos. O PNDH prevê a implementação do Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos e, a partir deste, é possível estabelecer como objetivo a transversalização da educação no ensino superior como princípio fundamental para que haja uma real integração da sociedade com o desenvolvimento individual de cada um. A importância dimensionada ao ensino superior se deve à função das universidades como formadoras do pensamento crítico, do desenvolvimento de pesquisas no sentido de auxiliar a evolução da sociedade em termos gerais e como instituições irradiadoras do conhecimento. Instituições de Ensino Superior criam e aperfeiçoam conhecimento, mas influem, também de forma direta, na formação crítica e participativa do educando, fazendo parte de sua responsabilidade ampliar as possibilidades de busca pelo equilíbrio social. Torna-se difícil pensar em uma educação em direitos humanos transversalizada no ensino superior. Entretanto, é possível, fato provado através do curso instituído na Universidade McMaster no Canadá. A experiência abrangendo profissionais de diversas áreas tornou possível uma integração interdisciplinar harmônica, gerando o desenvolvimento intelectual crítico, voltado a princípios de liberdade, igualdade, fraternidade, cidadania e democracia. Formando profissionais de diversas áreas, atentos a esses princípios, é possível que haja modificações estruturais na 372
cíclica alienação da população em geral, o que determinaria um desenvolvimento da sociedade brasileira em diversas áreas.
REFERÊNCIAS ANDREOPOULOS, George J.; CLAUDE, Richard Pierre (Orgs.) Educação em Direitos Humanos para o século XXI. Traduzido por Ana Luiza Pinheiro. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo/Núcleo de Estudos da Violência, 2007. BITTAR, Eduardo C. B. (Coord.). Educação e metodologia para os Direitos Humanos. São Paulo: Quartier Latin, 2008. CARDOSO, Clodoaldo Meneguello (Org.). Educação em direitos humanos na formação universitária: textos para seminários. Bauru: UNESP – OEDH; UNESP – FAAC; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2009. COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. 6. ed. São Paulo: Saraiva 2010. PLANO NACIONAL DE EDUCAçãO EM DIREITOS HUMANOS. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/sedh/edh/pnedhpor.pdf> Acesso em: 26 ago.2010 PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. PNEDH - Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos. Disponível em: <http://www.pres i d e n c i a . g o v . b r / e s t r u t u r a presidencia/sedh/promocaodh/IDedh/IDedhpnedhnovo/> Acesso em: 26 ago.2010 RAYO, José Tuvilla. Educação em direitos humanos: rumo a uma perspectiva global. Porto Alegre: Artmed, 2004. REVISTA DOS TRIBUNAIS. Vademecum: especialmente preparado 373
para OAB e concursos. 3. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional. 24. ed. São Paulo: Malheiros editores Ltda, 2005.
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