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Introdução

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Prefácio

Prefácio

“A maioria de nós irá um dia enfrentar uma dor severa.

Estou convencido de que a atitude que cultivarmos

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antecipadamente pode muito bem determinar como

o sofrimento irá afetar-nos quando realmente vier.” (Dr. Paul Brand) 1

Asociedade ocidental evita a qualquer custo o sofrimento. Ela resgatou a vivência da filosofia hedonista (cerca de 400 a.C.) que acreditava que a finalidade principal da vida era a busca do prazer e a diminuição da dor. Sendo assim, o sofrimento é visto como um ultraje à vida humana. Parece haver no inconsciente coletivo ocidental a ideia de que é proibido sofrer ou sentir dor. Basta ver o grande esforço da medicina em amenizar toda forma de dor ou incômodo aos pacientes hospitalares. Dr. Paul Brand – cirurgião inglês que atuou na Inglaterra, Índia e Estados Unidos – relata que, enquanto na Índia seus pacientes esperavam o sofrimento e aprenderam a não temê-lo, nos EUA os pacientes eram muito menos preparados para lidar com o sofrimento e muito mais traumatizados por ele. O alívio da dor nos Estados Unidos sustenta uma indústria que movimenta muitos bilhões de dólares por ano, e os comerciais de televisão anunciam remédios

cada vez melhores e mais rápidos para curar a dor. Um slogan até afirmava objetivamente: “Não tenho tempo para a dor”. 2

Essa visão ocidental a respeito do sofrimento levanta enormes discussões existenciais e religiosas. Por exemplo, o questionamento mais comum à fé bíblica tem sido o fato de que, se Deus é bom, por que existe tanto sofrimento no mundo? De fato, não temos respostas para todo tipo de sofrimento. No entanto, de modo geral, a Bíblia nos ensina que a humanidade se corrompeu. O que isso significa? Deus criou o ser humano perfeito e deu a ele o livre arbítrio. No uso de sua liberdade o ser humano optou por viver independentemente de seu Criador, e, por sua rebeldia, colheu suas consequências. Assim, ao desobedecer a Deus ele criou um conflito interno, consigo mesmo (Gn 3.7 e 10); externo, com Deus (Gn 3.8); e na horizontalidade com o próximo e com a natureza (Gn 3.12 e 3.17s).

A partir daí a humanidade entrou em um processo de corrupção e violência, e todos, sem exceção, em cada recanto deste planeta, sofrem as consequências disso. Prova disso é que qualquer pessoa enfrenta seus conflitos, seja vivendo sozinha ou em comunidade. O mal está presente no ser humano e no mundo, e ele atinge a todos sem distinção de raça, cor, gênero ou idade. Portanto, ninguém está isento de ser atingido pelo sofrimento. Podemos comparar a humanidade corrompida com uma massa de pão na qual foi adicionado fermento. Essa massa crescerá por inteiro e não haverá um pedaço dela, por menor que seja, que não receberá a ação do fermento. Certamente cada parte dessa massa vai crescer. Portanto, entender que fazemos parte de uma humanidade frágil e corrompida, de certa forma já explica o questionamento sobre por que sofremos, uma vez que o sofrimento é inerente a toda a humanidade decorrente de sua própria corrupção.

Assim, não importam nossas precauções, quanto nos esforçamos para

ter uma vida boa nem quanto nos empenhamos para ser saudáveis,

para ficar ricos, para viver bem com familiares e amigos, para ser bem

sucedidos na profissão – inevitavelmente, algo arruinará isso. Não há

dinheiro, poder, nem planejamento capazes de impedir que o luto, uma doença terrível, uma traição, um desastre financeiro ou uma infinidade de outros problemas entrem em sua vida. A vida humana é inevitavelmente frágil e sujeita a forças que estão além do nosso poder de controlá-las. A vida é trágica. 3

Ora, se o sofrimento é inevitável, então a solução é olharmos para ele sob outra perspectiva. Existe um ditado muito conhecido e verdadeiro que diz que “há males que vêm para o bem”. O sofrimento não é de todo mau e pode ser usado também para o bem. Basta olharmos na perspectiva da educação de filhos. Como pai, quando eu corrijo minhas filhas com uma reprimenda, um castigo ou uma disciplina, inflijo sobre elas algum tipo de sofrimento, mas com a convicção de que esse sofrimento lhes causará o bem.

Este livro tem a ver com esta perspectiva: enxergar as coisas boas que podemos experimentar por meio do sofrimento, especialmente aqueles que vivem sob a ótica da fé bíblica. João Calvino, um dos líderes da Reforma Protestante do século 16, disse: “Tudo quanto sobrevém aos cristãos é de tal forma controlado por Deus, que o resultado final revela que aquilo que o mundo tem por nocivo, para o cristão é benção”. 4 Deus é tão bom que nos dá alegria não somente apesar do sofrimento, mas até através dele. Isso é maravilhoso e pode parecer incompreensível, mas é uma das grandes belezas da fé bíblica. O sofrimento está no cerne da fé cristã. Foi pelo sofrimento que Cristo se tornou igual a nós e nos redimiu; e

é pelo sofrimento que nos tornamos parecidos com ele. Por isso, o sofrimento pode ter em si, um propósito e uma utilidade.

O sofrimento pode edificar ou destruir. Tanto em um caso quanto no outro o fato é que nunca seremos os mesmos, pois ele nos transforma. Sendo assim, a vida torna-se mais leve e mais plena quando aprendemos a conviver com o sofrimento e nos permitimos ser moldados beneficamente por ele. É o que apresentaremos aqui nesta leitura a cada capítulo. Espero que este livro o ajude nisso!

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