CENTRO UNIVERSITÁRIO UNINOVAFAPI CURSO DE GRADUAÇAO EM ARQUITETURA E URBANISMO
MARIA CLARA DOS SANTOS LIMA
CENTRO COMUNITÁRIO ZEZA: Um instrumento de mobilização social, educação e cultura na cidade de Parnaíba-PI
TERESINA – PI 2020
MARIA CLARA DOS SANTOS LIMA
CENTRO COMUNITÁRIO ZEZA: Um instrumento de mobilização social, educação e cultura na cidade de Parnaíba-PI
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Centro Universitário UNINOVAFAPI como requisito avaliativo para a obtenção do grau de bacharel em Arquitetura e Urbanismo.
Orientador(a): Prof(a). Ma. Pamela Krishna Ribeiro Franco Freire.
TERESINA – PI 2020
FICHA CATALOGRÁFICA L732c Lima, Maria Clara dos Santos.
Centro comunitário Zeza: um instrumento de mobilização social, educação e cultura na cidade de Parnaíba-PI. Maria Clara dos Santos. – Teresina: Uninovafapi, 2020.
Orientador (a): Prof. Me. Pamela Krishna Ribeiro Franco. Centro Universitário UNINOVAFAPI, 2020.
135. p.; il. 23cm.
Catalogação na publicação
Monografia (Graduação em Arquitetura e Antonio Luis Fonseca Silva– CRB/1035 Urbanismo) – Centro Universitário UNINOVAFAPI, Francisco Renato Sampaio da Silva – CRB/1028 Teresina, 2020.
1. Patrimônio. 2. Assistência social. 3. Parnaíba. I.Título. II. Franco, Pamela Krishna Ribeiro.
CDD 720.11
CENTRO UNIVERSITÁRIO UNINOVAFAPI CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO COLEGIADO DO CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO
ANEXO 08
2020.2_TCC_Regulamento_R00 [ Revisado em Ago/2020 ]
ATA E LISTA DE PENDÊNCIAS DA BANCA EXAMINADORA FINAL Aos 03 de dezembro de 2020, às 11:00, via ambiente virtual ZOOM, ocorreu a apresentação de Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário UNINOVAFAPI, do(a) aluno(a) MARIA CLARA DOS SANTOS LIMA que apresentou o trabalho intitulado: CENTRO COMUNITÁRIO ZEZA: um instrumento de mobilização social, educação e cultura na cidade de Parnaíba-PI, sob orientação do(a) Professora Orientadora mestra Pamela Krishna Ribeiro Franco Freire. O trabalho apresentado foi avaliado por 03 examinadores, tendo sido a banca presidida pelo professor orientador. O(A) aluno(a) submeteu previamente seu TCC para avaliação (Monografia + Memoriais + Pranchas de Projeto) e relatou oralmente seu trabalho à banca de examinadores nesta data, que após a arguição deram seu parecer. ORIENTAÇÕES PARA PREENCHIMENTO DO PARECER DA BANCA:
[1] Considerar-se-a SEM PENDÊNCIAS o trabalho que obtiver NF ≥ 70 (igual ou superior a setenta pontos).
[2] Considerar-se-a PENDENTE o trabalho que obtiver NF ≥ 60 < 70 (igual ou superior a sessenta e inferior a setenta pontos).
[3] Considerar-se-a APROVADO o trabalho que obtiver NFemitido < 60 (inferior sessenta pontos). _PARECER DA BANCA quanto ao NÃO trabalho entregue e apresentado, ema03/12/2020:
Na oportunidade, esta Banca Examinadora Final considerou o trabalho SEM PENDÊNCIAS, com NOTA FINAL (NF) igual a 100 PONTOS.
Após parecer, e com base no atendimento das pendências (se apontadas), foi estabelecido o conceito final do aluno, conforme orientações abaixo listadas. ORIENTAÇÕES PARA PREENCHIMENTO DO CONCEITO FINAL (CF) DO ALUNO:
[1] No caso de trabalho SEM PENDÊNCIAS, o aluno deverá ter Conceito Final (CF) igual a APROVADO, emitido na data da banca.
[2] No caso de trabalho PENDENTE, o aluno terá sete dias corridos a partir da data da banca para apresentar as correções solicitadas. Para alunos nesta condição, o Conceito Final (CF) só poderá ser emitido após verificação das pendências, podendo ser APROVADO COM RESSALVAS ou NÃO APROVADO. O aluno que obtiver a mudança de grau de PENDENTE para APROVADO COM RESSALVAS terá sua NF alterada para 7,0 pontos no histórico.
_CONCEITO FINAL (CF), emitido em 03/12/2020:
[3] No caso de trabalho NÃO APROVADO no dia da defesa, logo após apresentação, o aluno deverá ter
[Conceito x ] APROVADO Final (CF) emitido na data da banca igual a NÃO APROVADO. [ ] APROVADO COM RESSALVAS
CENTRO UNIVERSITÁRIO UNINOVAFAPI CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO COLEGIADO DO CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO 2020.2_TCC_Regulamento_R00 [ Revisado em Ago/2020 ]
[ ] NÃO APROVADO
LISTA DE RECOMENDAÇÕES (NÃO OBRIGATÓRIO - alunos com NF ≥ 70, igual ou superior a setenta pontos)
- Revisar monografia. Tempos verbais e gramática. - Rever desenho técnico da estrtutura da cobertura nos cortes longitudinais. - Elementos da cobertura.
LISTA DE PENDÊNCIAS (OBRIGATÓRIO – aluno com NF ≥ 60 < 70 pontos, igual ou superior a sessenta e inferior a setenta pontos) (a aprovação do aluno fica condicionada ao atendimento das pendências aqui listadas)
ASSINATURA DA BANCA Teresina, 03 de Dezembro de 2020 Professor Orientador:
Professor Avaliador:
Convidado Externo:
Aluno:
Dedico esse trabalho a todas as comunidades, e seus respectivos líderes, que acreditam que a igualdade e a mobilização social são as chaves da liberdade.
AGRADECIMENTOS
Nunca pensei em ser arquiteta, muito menos urbanista. Ambos os campos, na minha cabeça, pareciam ser antagônicos a minha personalidade megalomaníaca de querer carregar o mundo nos ombros e, desse jeito, poder muda-lo. Surpreendida pelo caminho incerto do destino, acabei descobrindo que, imbuídos da habilidade de transformar, arquitetos podem mudar espaços, urbanistas podem mudar cidades, e os dois juntos podem mudar vidas. No desenvolvimento desse trabalho pude expor, junto dos conhecimentos adquiridos ao longo do curso, um lado pessoal que sempre acreditou na arte, no poder popular, na educação e, principalmente, no amor como ferramentas poderosas capazes de mudar o mundo. Muito obrigada a essa força invisível que me deu conforto o suficiente para continuar quando nada terreno conseguiu. Muito obrigada a minha orientadora, Prof(a) Pamela Franco, pela compreensão, pela paciência e pelos conhecimentos cedidos á esse texto. Muito obrigada a Ingrid e Ana Isabel por me fazerem viver os momentos de diversão com a mesma intensidade dos momentos de concentração. Muito obrigada a Ayala por me ajudar a enxergar a arte e a profundidade até nas coisas mais simples. Muito obrigada a Osmir, Natalie e Mikaelle pelo apoio incondicional, mas também por todas as orientações. Muito obrigada á Bia Costa, sem você não seria possível. Muito obrigada ao Breno por me ensinar que amar é ótimo, mas amar em público é melhor ainda. Acho que agora eu consigo. Por último e mais importante, muito obrigada a minha família brilhante: á Alvina por ser meu exemplo diário de tudo àquilo que almejo um dia conquistar; á Sebastião por todos os esforços; á Débora pela parceria de irmã e por ter me dado meus presentes mais lindos: Arthur e Eva. Eu sou parte das suas vidas, mas vocês são toda a minha história. Muito obrigada.
“Os anos passam sem parar e não vemos uma solução. Só vemos promessas de um futuro que não passa de ilusão, e a esperança do povo vem da humildade de seus corações que jogam suas vidas, seu destino, nas garras de famintos leões. [...] A saúde do povo daqui é o medo dos homens de lá, a sabedoria do povo daqui é o medo dos homens de lá. A consciência do povo daqui é o medo dos homens de lá.” (Alexandre Carlo Cruz)
RESUMO
A cidade de Parnaíba, no Piauí, tem seu conjunto histórico e paisagístico reconhecido como Patrimônio Nacional pelo tombamento á nível federal pelo IPHAN. Parte integrante desse conjunto, o Porto das Barcas, área portuária rica em edifícios históricos, passou grande parte da sua existência tremulando entre um estado dual de conservação e precarização. Porém, no primeiro semestre de 2020, o Governo do Estado, juntamente com o IPHAN, pretende entregar o projeto de recuperação do Complexo Porto das Barcas. No entanto, apesar de permanecerem no perímetro do conjunto, os galpões portuários localizados no bairro Mendonça Clark, mesmo com a reforma, hoje se encontram em estado de ruína. As edificações e a população do bairro onde estão inseridas se fundem em situações análogas de descaso pelo poder público: os habitantes do bairro são carentes de assistência social, equipamentos e iluminação pública, saneamento básico e segurança. Posto isso, esse trabalho propõe a construção de um Centro Comunitário que beneficie a população do bairro Mendonça Clark através de um espaço multiuso que promova cursos, oficinas e encontros, ao tempo que este se qualificará como uma intervenção ao patrimônio em ruínas, ressignificando-o. Palavras-chave: Patrimônio. Assistência Social. Parnaíba.
ABSTRACT
The city of Parnaíba, in the state of Piauí, has its historical and landscaped set acknowledged as National Heritage by IPHAN’s federal landmarking. Forming part of this set, the Harbor of Boats (Porto das Barcas), a port area full of historical buildings, spent most of its existence swinging between a dual situation of preservation and threat. But, in the first half of 2020, the Piaui’s State Government, along with IPHAN, intends to deliver the recovery project of the Harbor of Boats. However, despite of being located at the sets perimeter, the harbor warehouses located at Mendonça Clark neighborhood, even with the remodeling, are currently in a ruin situation. The buildings and the neighbors of it merge at the same position of public power’s negligence: the people are poor of social working, public facilities, basic sanitation and safety. With that being said, this final paper aims the construction of a Community Center that benefits the people of Mendonça Clark neighborhood through an multipurpose space that promote classes, workshops, meetings at the same time that will interverne at the ruined heritage, rehabilitating it. Palavras-chave: Heritage. Social Work. Parnaíba.
LISTA DE FIGURAS Figura 01 – Mapa dos dois lados do Porto das Barcas..............................................12 Figura 02 – Perspectivas do Galpão..........................................................................12 Figura 03 – Perspectivas atuais do Galpão................................................................13 Figura 04 – Atividades no Centro Social N. Sra. das Mercês....................................16 Figura 05 – Violência no Centro de Assistência Social..............................................17 Figura 06 – Fachada Toynbee Hall............................................................................26 Figura 07 – Sala de Jantar do Toynbee Hall..............................................................27 Figura 08 – Fachada Hull House................................................................................28 Figura 09 – Intervenção proposta na Catedral de Notre-Dame.................................39 Figura 10 – Porto das Barcas no século XX...............................................................44 Figura 11 – Porto das Barcas no século XX...............................................................44 Figura 12 – Porto das Barcas atualmente..................................................................45 Figura 13 – Mercado do Quarenta.............................................................................46 Figura 14 – Projeto do CRAS Mendonça Clark..........................................................48 Figura 15 – Pavilhão Museu KAOMAI........................................................................49 Figura 16 – Implantação Museu KAOMAI..................................................................50 Figura 17 – Zoneamento Museu KAOMAI.................................................................51 Figura 18 – Diagrama de conservação das árvores Museu KAOMAI........................52 Figura 19 – Antiga tubulação do Museu KAOMAI......................................................53 Figura 20 – Nova tubulação do Museu KAOMAI........................................................53 Figura 21 – Organização das árvores Museu KAOMAI.............................................54 Figura 22 – Café do Museu KAOMAI.........................................................................54 Figura 23 – Corte do Museu KAOMAI........................................................................55 Figura 24 – Estrutura do Telhado Museu KAOMAI....................................................56 Figura 25 – Rua interna Museu KAOMAI...................................................................56
Figura 26 – Trabalhadores no SESC Pompeia..........................................................59 Figura 27 – Fachada Frontal dos Galpões do SESC Pompeia..................................59 Figura 28 – Implantação SESC POMPEIA.................................................................60 Figura 29 – Zoneamento SESC POMPEIA................................................................61 Figura 30 – Bloco SESC POMPEIA...........................................................................61 Figura 31 – Primeiro Pavilhão do SESC POMPEIA...................................................62 Figura 32 – Foyer SESC POMPEIA...........................................................................62 Figura 33 – Estrutura SESC POMPEIA......................................................................63 Figura 34 – Estrutura das Oficinas SESC POMPEIA.................................................63 Figura 35 – Refeitório SESC POMPEIA.....................................................................64 Figura 36 – Raspagem do reboco das paredes do SESC POMPEIA........................64 Figura 37 – Paredes baixas SESC POMPEIA...........................................................65 Figura 38 – Esquadrias SESC POMPEIA..................................................................65 Figura 39 – Fachadas industriais SESC POMPEIA...................................................66 Figura 40 – Fachada SEDE CASTANHAS DE CAJU................................................67 Figura 41 – Implantação SEDE CASTANHAS DE CAJU...........................................68 Figura 42 – Zoneamento SEDE CASTANHAS DE CAJU..........................................68 Figura 43 – Planta Baixa SEDE CASTANHAS DE CAJU..........................................69 Figura 44 – Habitantes envolvidos com SEDE CASTANHAS DE CAJU...................69 Figura 45 – Habitantes desenhando o projeto SEDE CASTANHAS DE CAJU.........70 Figura 46 – Cobogó em SEDE CASTANHAS DE CAJU............................................70 Figura 47 – Entorno SEDE CASTANHAS DE CAJU..................................................71 Figura 48 – Perspectiva Isométrica SEDE CASTANHAS DE CAJU..........................72 Figura 49 – Fachada com Marquise SEDE CASTANHAS DE CAJU.........................72 Figura 50 – Pátio interno SEDE CASTANHAS DE CAJU..........................................73
SUMÁRIO INTRODUÇÃO...........................................................................................................11 2. JUSTIFICATIVA.....................................................................................................15 3. OBJETIVOS...........................................................................................................19 3.1 Geral........................................................................................................19 3.2 Específicos..............................................................................................19 4. METODOLOGIA DA PESQUISA...........................................................................20 5. REFERÊNCIAL TEÓRICO.....................................................................................22 5.1 CONCEITOS...........................................................................................22 5.2 PANORAMA HISTÓRICO.......................................................................43 5.3 SITUAÇÃO ATUAL..................................................................................45 6. ESTUDOS DE CASO.............................................................................................50 6.1 MUSEU KAOMAI.....................................................................................49 6.1.1 Informações Gerais....................................................................... 49 6.1.2 Contexto Geral...............................................................................49 6.1.3 Implantação, Acessos e Entorno....................................................50 6.1.4 Organização Espacial....................................................................52 6.1.5 Estrutura e Outros Aspectos Construtivos.....................................55 6.1.6 Justificativa Analítica......................................................................56 6.2 CENTRO CULTURAL SESC POMPEIA.................................................58 6.2.1 Informações Gerais........................................................................58 6.2.2 Contexto Geral...............................................................................58 6.2.3 Implantação, Acessos e Entorno....................................................60 6.2.4 Organização Espacial....................................................................61 6.2.5 Estrutura e Outros Aspectos Construtivos.....................................64 6.2.6 Justificativa Analítica......................................................................66
6.3 CENTRO COMUNITÁRIO SEDE CASTANHAS DE CAJU.....................67 6.3.1 Informações Gerais...........................................................................................67 6.3.2 Contexto Geral..................................................................................................67 6.3.3 Implantação, Acessos e Entorno.......................................................................68 6.3.4 Organização Espacial........................................................................................69 6.3.5 Estrutura e Outros Aspectos Construtivos........................................................70 6.3.6 Justificativa Analítica.........................................................................................73 REFERÊNCIAS..........................................................................................................75
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INTRODUÇÃO
Localizada há 339km da capital, Parnaíba, em termos de população, é a segunda maior cidade do Piauí (IBGE, 2019). Fundada por meio de uma Carta Régia em 1761 (IPHAN, 2008), o município hoje conta com mais de 150 mil habitantes (IBGE, 2019) e, justificado pelo seu conjunto histórico e paisagístico, foi reconhecido como Patrimônio Nacional pelo tombamento a nível federal (IPHAN, 2011). Parte integrante desse conjunto e “marco-zero” simbólico em forma de Arquitetura, o Porto das Barcas é uma área portuária construída no século XIX e constituída de antigos prédios da alfândega, cais, pátios, diques, becos e vielas (FUNDAC,
1987).
Atualmente
reconhecido
como
ponto
nodal
noturno
(SUPERINTENDÊNCIA DE TURISMO, 2016), o Porto reaproveita as suas construções históricas ao abrigar restaurantes, agências de excursionismo, bares, pousadas e lojas de artesanato que fomentam a cultura, o turismo e os encontros na cidade. Embora essas estruturas tenham passado grande parte da sua existência tremulando entre um estado dual de conservação e precarização, no primeiro semestre de 2020 o Governo do Estado, juntamente com o IPHAN, pretende entregar o projeto de recuperação do Complexo Porto das Barcas: uma obra de revitalização prevista desde meados de 2012 e considerada hoje uma das maiores do Piauí (Coordenação de Registro e Conservação/SECULT, 2012). No entanto, apesar da manutenção do espaço ter sido de fundamental importância e regozijo na região, apenas uma parte da história do conjunto arquitetônico vem sendo contada. Representação física da palavra dicotomia, a área portuária, localizada em uma intersecção entre os bairros São José, Mendonça Clark e Nossa Senhora do Carmo, é “dividida” conotativamente em um lado A, conservado e habitado, e um lado B, em total descaso. Graficamente, pode-se utilizar a rodovia e a ponte, que conectam Parnaíba e Ilha Grande de Santa Isabel, como “limite” de conservação (figura 01).
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Figura 01: em laranja, temos o lado A mais a Leste, encontra-se o ponto nodal noturno onde os edifícios são bem conservados; em rosa, temos o lado B mais ao Oeste da ponte, onde as edificações estão em completo descaso.
Fonte: GoogleEarth, 2013.
Os galpões portuários localizados no bairro Mendonça Clark, apesar de permanecerem na orla do Rio Igaraçu e no perímetro do Porto das Barcas, hoje se encontram em estado de ruína (figura 02). Figura 02: perspectivas de visualização das ruínas do galpão.
Fonte: Pamela Franco, 2016.
A assimetria no tratamento dos edifícios históricos da região contribui para uma possível perda completa daqueles que foram abandonados (figura 03) e ainda fomenta o medo dos habitantes do bairro, posto que a estrutura precária se caracteriza como ponto de prostituição e uso de drogas.
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Figura 03: perspectivas mais atuais de visualização das ruínas do galpão.
Fonte: Google Street View, 2020.
O receio de transitar pelos arredores dos galpões e a ausência de um espaço que preste assistência e estimule a mobilização da comunidade do entorno aprofunda o abismo social existente entre áreas tão próximas. No aglomerado elitizado e comercial dos bairros São José e Centro é predominante uma Arquitetura de maior porte, onde se localizam as antigas residências de famílias tradicionais e abastadas da cidade, equipamentos privados importantes como o SESC Caxeiral e os outros conjuntos históricos tombados. Já no logradouro vizinho, o contraste é gritante: habitado por uma comunidade pobre que se utiliza do rio Igaraçu e do artesanato parcialmente como obtenção de renda, a maioria das casas não possuem infra-estrutura de abastecimento de água e esgoto, o que obriga famílias ribeirinhas á lavarem suas roupas na margem do rio (IPHAN, 2008. p. 83). A maioria das edificações do bairro Mendonça Clark são residenciais e de origem popular. Em sua construção são utilizadas técnicas tradicionais: os elementos são recolhidos diretamente da natureza e resultam em fachadas simples, sem muita ornamentação. Apesar de associada constantemente com a ideia de pobreza, esse tipo de edificação, geralmente perpetuada de geração em geração, é marco de uma cultura, e denominada Arquitetura tradicional popular. Ela é apresentada como sugestão para constituir um sexto conjunto histórico anexo aos já existentes na cidade de Parnaíba (IPHAN, 2008. p. 81), porém o processo de tombamento dessa área só pode ser concluído após a valorização da técnica construtiva e qualificação das edificações, posto que faltam investimentos para o desenvolvimento de ambos. À medida que a cidade se moderniza, a comunidade permanece invisibilizada pelo poder público e sem um local próprio onde seus habitantes
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possam se reunir e discutir diretrizes e melhorias para os seus respectivos bairros, receber assistência social ilimitada e ainda aprender com o ambiente, criando suas memórias e abraçando o local como seu. Logo, o que se propõe neste trabalho é a construção de um Centro Comunitário com viés assistencialista e educativo. Acredita-se que essa proposta pode, além de assistir a população carente do bairro Mendonça Clark, ressignificar as ruínas do galpão portuário, impulsionar novas memórias, valorizar técnica, mãode-obra e cultura local, e reintegrar os habitantes em uma sociedade que há muito os exclui.
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2. JUSTIFICATIVA Muito antes de ser elevado a categoria de município, o perímetro que hoje delimita Parnaíba já atraía diversos navegadores que se impressionavam com as notícias que corriam na região sobre a extensão do rio que a cortava. Os galpões portuários que fazem parte do Complexo Porto das Barcas são provas físicas da imensa projeção internacional, nos séculos XIX e XX, que a cidade teve e a qual assegurou seu crescimento econômico, representação social, política e cultural. Ainda que atualmente estejam sob condição de ruína, esses espaços podem ser encaixados no conceito de patrimônio industrial que se resume, segundo Silva (2006. p. 01), em um arquivo á céu aberto que estabelece uma conexão com o tipo de industrialização de um período histórico e do modo de vida da classe trabalhadora correspondente á ele. Ou seja, ao ser reconhecido como patrimônio industrial, um edifício conserva aspectos estéticos de uma época, mas também resgata as características organizacionais da população do seu entorno, o que possibilita uma análise de perspectiva histórica, social e econômica dos habitantes. Embora ruínas sejam a materialização da chamada “mancha dourada do tempo” (RUSKIN, 1989. p. 187) sobre edifícios históricos e o galpão em questão fazer parte do primeiro dos conjuntos parnaibanos tombados pelo IPHAN (em 2011), hoje edificações e população do bairro onde estão inseridas se fundem em situações análogas de descaso pelo poder público: marginalizados, os habitantes do bairro Mendonça Clark são carentes de equipamentos e iluminação pública, saneamento básico e segurança. Atualmente os galpões industriais são utilizados como pontos de prostituição e para consumo de drogas. Em 2017, o Ministério Público do Piauí evidenciou ainda mais os perigos relacionados ao abandono das edificações quando ajuizou uma ação civil pública com o objetivo de promover a anulação do termo de cessão de uso celebrado entre o Estado do Piauí e a Associação Comercial de Parnaíba, que concedeu à entidade privada o uso do Complexo Arquitetônico Porto das Barcas. Segundo o Promotor de Justiça Antenor Filgueiras Lôbo Neto (2017. p. 04), os principais problemas sociais que assolam o local consistem na falta de segurança pública, em razão da desativação do Posto Avançado da Policia Militar, a prostituição, inclusive de menores, o uso indiscriminado de todo o tipo de drogas ilícitas e o medo consciente por partes dos comerciantes que trabalham nas lojas do
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referido complexo. Na parte física, ele pontua as patologias nas estruturas dos prédios, bem como o comprometimento dos telhados, de toda parte hidráulica e de toda parte elétrica. Ainda que tenham sido sugeridas como bens culturais no documento responsável pelo tombamento dos conjuntos históricos e paisagísticos de Parnaíba, as construções residenciais do entorno dos galpões, que fazem parte do quinto conjunto denominado Arquitetura Tradicional Popular (IPHAN, 2008. p. 83), são reduzidas ao preconceito que associa sua técnica construtiva á ideia de pobreza, o que imerge mais ainda a população em uma perspectiva de desigualdade que perdura imutavelmente há mais de 50 anos. Invisibilizados pelo lado elitizado do porto, os habitantes do bairro Mendonça Clark recebem assistência de um ângulo muito mais direcionado á ações de benevolência que á políticas públicas necessárias. No entorno, existem duas instituições principais que buscam alinhar assistencialismo a ideia de direito de cidadão: o Centro Social Nossa Senhora das Mercês, mantido pela Arquidiocese de Parnaíba, e o CRAS Mendonça Clark. Desde 1970, a Arquidiocese de Parnaíba estimula o trabalho social na área citada combatendo a desnutrição de crianças e adolescentes e promovendo cursos de capacitação, palestras para as famílias e atividades educativas/recreativas. O que anteriormente era esporádico se materializou no Centro Social Nossa Senhora das Mercês (figura 04) que, apesar de pequeno, é de grande ajuda para a comunidade. Figura 04: atividades educativas sendo realizadas no Centro Social Nossa Senhora das Mercês, no bairro Mendonça Clark em Parnaíba-PI.
Fonte: Diocese de Parnaíba, 20--.
Já os CRAS, são tidos como “a porta de entrada da Assistência Social” (SEDESC, 2015). Localizados prioritariamente em áreas de maior vulnerabilidade
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social, os Centros de Referência oferecem serviços de Assistência Social, visando fortalecer a convivência com a família e a comunidade. Conhecendo o território, a equipe do CRAS pode apoiar ações que visem o bem-estar comunitário através de palestras, campanhas e eventos com a colaboração da comunidade para a resolução de problemas comuns, tais como: falta de acessibilidade, violência no bairro, trabalho infantil, falta de transporte, baixa qualidade na oferta de serviços, ausência de espaços de lazer, cultural, entre outros. No bairro temos o CRAS Mendonça Clark que, segundo notícia do Portal Costa Norte (2018), vive assolado pela violência, tendo um vigilante assassinado há meses atrás (figura 05). Figura 05: comoção social e tumulto em frente ao Centro de Referência da Assistência Social.
Fonte: Portal Costa Norte, 2019.
Apesar de contar com dois centros com viés assistencialista, ainda é ausente no perímetro um espaço público que, além de conseguir abarcar o grande número de habitantes, valorize sua cultura/técnica construtiva, e promova a unificação e a educação dos mesmos. É dessa lacuna social que surge a necessidade de um centro comunitário, posto que ele como estrutura polivalente, segundo Bonfim (et. al, 2000. p. 07), é um local onde se desenvolvem serviços e atividades de forma articulada, com o objetivo de ser uma ferramenta de prevenção á problemas sociais que visa o desenvolvimento do local através de um projeto coletivamente assumido por todas as partes da comunidade. A construção de um equipamento socioeducativo como o Centro Comunitário ZEZA no bairro Mendonça Clark resultará em uma apropriação popular do espaço histórico já existente, tornando público algo já pertencente na rotina da própria comunidade. O desenvolvimento das sociedades é alcançado através da elaboração de políticas públicas e privadas que criam novas perspectivas, mas essas são mais
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bem sucedidas quando a população se identifica, se apropria e aprende com o local onde as atividades são executadas, pois, segundo Jane Jacobs (2004, p. 110), escritora e ativista política, a melhor forma de se criar espaços públicos, é se apropriando de locais que já tenham vida, disponham da passagem de pessoas e façam parte de suas rotinas: “se for no centro da cidade, deve ter lojistas, visitantes e transeuntes, além de funcionários [...] deve situar-se onde a vida pulse, onde haja movimentação de escritórios, atividades culturais, residências e comércio.” Posto que pretende-se construir um Centro Comunitário que tem como chave estimular a mobilização social, mas também promover a educação e a cultura, é possível incluir o projeto nas diretrizes do Plano Municipal de Cultura de Parnaíba (PREFEITURA DE PARNAÍBA, 2015). Parte do Plano Nacional de Cultura, esse programa busca investir na produção cultural e artística com o objetivo de difundi-la até 2025. Entre os itens listados, se encontram artesanato e patrimônio imaterial e histórico. No que concerne ao primeiro, a primeira meta diz respeito á ampliar o apoio a oficinas e cursos de artesanato nas mais diversas zonas da cidade, citando ainda a Cooperativa Artesanal Mista de Parnaíba (CAMPAL), localizada a menos de 300m do galpão portuário. Já quanto ao segundo, o principal objetivo discorre sobre a criação de um programa de educação patrimonial para a população que possibilite a sensibilização da mesma para com seus bens históricos, sendo estes palpáveis ou não. Em uma perspectiva mais prática, outro aspecto que respalda essa justificativa é o reconhecimento de Parnaíba como patrimônio nacional através do tombamento a nível federal em 2011. A cidade entrou para o Programa de Aceleração do Crescimento – PAC – Cidades Históricas, o que lhe garante recursos financeiros para investimentos voltados para a preservação do patrimônio tombado e execução de obras de infraestrutura social, urbana, logística e energética.
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3. OBJETIVOS 3.1
Geral
Desenvolver o projeto de um Centro Comunitário, aliado á um Território Educativo, que beneficie a população da zona central de Parnaíba-PI. 3.2
Específicos
• Preservar grande parte da estrutura original do galpão portuário, hoje em ruínas, e revitalizá-lo através da construção de um Centro Comunitário que o ressignifique. • Observar características da população do entorno, através de contato direto com a associação de moradores, á fim de absorver e valorizar os aspectos sociais, econômicos e culturais locais no desenvolvimento do projeto. • Criar um espaço que estimule a mobilização social e sedie atividades educativas e culturais, desenvolvendo a sensação de pertencimento da população marginalizada na história e sociedade locais. • Atrair visibilidade para essa parcela do centro histórico da cidade, visando investimentos públicos e privados na comunidade em que está inserido.
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4. METODOLOGIA DA PESQUISA
Esse trabalho se dividiu em cinco etapas: a primeira foi extensa e consistiu em uma análise bibliográfica, conceitual e documental, centrada na compreensão do significado de diversos temas importantes para a construção dessa monografia. Centro Comunitário, assistência social, patrimônio, ruínas, gentrificação e outras concepções relacionadas foram expostas sob os mais diversos pontos de vista, a fim de montar um painel de referências prévio que possa ajudar na compreensão das fases posteriores. Nessa etapa também se apresentou uma linha do tempo que busca se aprofundar na história dos conceitos abordados anteriormente através da perspectiva de alguns autores como Tönnies, Marx, Ruskin, Brandão, Varine, entre outros. Principalmente no que consiste á parte do Centro Comunitário, o objetivo principal foi compreender como aconteceu a adaptação e evolução dos mesmos, desde o seu surgimento até emersão no Brasil, e de quais formas as políticas assistencialistas se relacionam com essa tipologia arquitetônica. A fase em seguida foi voltada para o histórico e a situação atual da cidade onde buscou-se implantar o projeto: Parnaíba, mais especificamente a região do Porto das Barcas, foram estudados desde a sua origem até a atualidade, analisando aspectos básicos da comunidade do entorno da edificação, suas particularidades e a disponibilidade de espaços públicos para a mesma. Através do Mapa Cultural de Parnaíba, disponibilizado pelo Governo do Piauí e já referenciado nesse trabalho, foi possível mapear quais instituições vigentes oferecem serviços semelhantes a um Centro Comunitário no entorno. Em um estudo resumido, perscrutaram-se instituições, a fim de investigar uma hipótese: ainda não são suficientes as opções de espaços sociais na vizinhança da área de projeto. A terceira fase se dividiu em dois momentos: inicialmente, através dos estudos de caso, foi possível não só começar a filtrar as opções para o programa de necessidades e inspirações plástico-estéticas que serão seguidas durante a fase de ateliê do projeto, mas também quais rumos o planejamento desse tomou, como um brainstorming de ideias; posteriormente, com as ideias listadas, foi feito um contato mais direto com a comunidade e com a associação de moradores: foi através dessa conversa com a população que as decisões projetuais foram consolidadas, de forma
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a entender as necessidades dos habitantes e como elas podiam ser inseridas no partido arquitetônico. Na quarta fase, buscaram-se maneiras de compreender o terreno e o entorno através de diagnóstico, com visita in loco, onde topografia, levantamento fotográfico e mapa de danos foram levantados. Somente após o desenvolvimento dessas quatro etapas anteriores chegou-se na última fase: o projeto de intervenção ao patrimônio industrial através da construção de um centro comunitário no bairro Mendonça Clark. Com os dados coletados na fase de diagnóstico, pôde-se discutir as necessidades da comunidade e a possibilidade delas serem implantadas no projeto, compondo assim os estudos preliminares para o fluxograma da edificação. Posteriormente, com ambientes e seus pré-dimensionamentos determinados, utilizaram-se programas de software, como AutoCad e SketchUp, na criação dos desenhos e volumes do projeto.
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5. REFERENCIAL TEÓRICO
5.1. Conceitos
5.1.1. O Centro como espaço físico e o seu elemento chave: a comunidade
O Centro Comunitário, em viés etimológico, é a junção de dois conceitos indispensáveis para a compreensão da sua função social: centro e comunidade. O significado de centro pode ser ramificado nas mais diversas áreas: seja na política (centrismo político) ou na geometria (o ponto central ou ponto médio), ele se apresenta como um ponto de confluência no meio de várias ideias. O centro, como espaço físico, se convenciona como um lugar ou área que possui intensas atividades onde as pessoas se reúnem para qualquer finalidade, sendo assim ferramentas que promovem para o seu entorno um certo desenvolvimento, assumindo função de palco das principais ações de algum lugar. Já a comunidade, de onde deriva-se o termo “comunitário”, é composta por suas “leis principais: a) parentes, cônjuges, vizinhos e amigos se gostam reciprocamente; b) entre os que se gostam, há consenso; c) os que se gostam, se entendem, convivem e permanecem juntos, ordenam sua vida em comum” (TÖNNIES, 1947. p. 41). Antagonicamente caracterizadas por Ferdinand Tönnies, sociedade e comunidade precisam uma da outra em uma relação de cooperação e participação, posto que a primeira se consolida dentro da segunda. Diferenciadas em três núcleos distintos, a casa, a aldeia/vila e a cidade, segundo o autor, as comunidades prezam acima de tudo a união: “se na comunidade os homens permanecem unidos apesar de todas as separações, na sociedade permaneceriam separados não obstante todas as uniões” (ibidem. p. 65). Posto isso, a sociedade pode ser interpretada como uma esfera maior que, embora abarque conjuntos de comunidades diversas, acaba por separá-las baseando-se em características que as diferenciem. Segundo Sell (2009, p.50), Karl Marx, sociólogo alemão, acreditava que as separações eram baseadas nas questões econômicas: as chamadas classes sociais determinam as comunidades
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que controlam e aquelas que são controladas, gerando a desigualdade social. Dentro dessa perspectiva, é possível enxergar o porquê do fortalecimento de comunidades á margem da sociedade é necessário: ainda que separadas, essas associações fortalecidas podem trabalhar individualmente, mas á fim de alcançar o bem comum alavancando assim o todo gradualmente, e diminuindo o desequilíbrio provocado pelas diferenças de classe.
5.1.2. As relações interpessoais e a Assistência Social
Posto que se enquadra a comunidade como uma entidade cooperativa, deve-se compreender quais e o que são as relações mútuas existentes entre os seres vivos. A ecologia, ciência que estuda esses fenômenos, reafirma a necessidade dessas interações para que o espaço se modifique: O entendimento dos diferentes fenômenos que englobam essas relações e interações entre seres vivos (incluindo o homem) e os componentes abióticos é amplamente discutido à luz de teorias ecológicas. O ambiente é alterado, físico e quimicamente, pela maneira como os indivíduos realizam suas atividades. Também as interações entre organismos, têm influência na vida de outros seres, da mesma espécie e de espécies diferentes. (BEGON, 2007. p. 223). De acordo com os benefícios e prejuízos que essas trocas podem trazer aos seres que as executam é possível filtrá-las em dois grupos principais: harmônicas ou positivas e desarmônicas ou negativas. Dentro do primeiro contingente, é possível enxergar a protocooperação, uma relação interespecífica, ou seja, que pode ocorrer entre espécies diferentes, na qual “os indivíduos cooperam entre si, mas não são dependentes um do outro para sobreviverem” (ODUM, 1969. p. 398). Derivada
dessa
ideia
surge
o
conceito
do
cooperativismo
que,
historicamente, busca “questionar os efeitos danosos das estruturas existentes” (ARAÚJO, 2014. p. 84), mas ao mesmo tempo criar um modo de produção associado:
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O cooperativismo é um movimento, filosofia de vida e modelo socioeconômico, capaz de unir desenvolvimento econômico e bem-estar social. Seus referenciais fundamentais são: participação democrática, solidariedade, independência e autonomia. É o sistema fundamentado na reunião de pessoas e não no capital. Visa às necessidades do grupo e não do lucro. Busca prosperidade conjunta e não individual. Estas diferenças fazem do cooperativismo a alternativa socioeconômica que leva ao sucesso com equilíbrio e justiça entre os participantes. (REISDORFER, 2014. p. 15). Sendo assim, indo na contramão da perspectiva moderna, que aprofunda e encoraja conceitos de vivência cada vez mais individualistas, o cooperativismo propõe um modelo de desenvolvimento onde sejam executadas atividades pessoais, mas visando um bem coletivo. Ao avaliar suas bases de fundação, é possível correlacionar esse padrão ao assistencialismo, outra estratégia de transformação social que visa o crescimento mútuo entre os membros da sociedade. Antigamente pautado apenas em solidariedade, caridade e filantropia, o assistencialismo evoluiu e hoje se consolida como Política Social Pública, reconhecido pela Constituição Federal de 1988. Porém, antes de expor os conceitos e abordagens dessa política, é necessário conhecimento prévio sobre no que consiste a “questão social”. Difundida em meados de 1830 como produto da industrialização, a origem da questão social provém da relação capital x trabalho e do seu antagonismo: O conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista madura tem uma raiz comum: a produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a apropriação dos seus frutos mantém-se privada, monopolizada por uma parte da sociedade. (IAMAMOTO, 2004, p. 27). Desse modo, a interação existente entre questão social e assistencialismo é que os componentes da primeira são frutos das desigualdades sociais que geram a necessidade da segunda, não obstante a ação de pessoas, organizações governamentais e entidades sociais, em favor das camadas sociais mais desfavorecidas, com ajudas pontuais e momentâneas (como doação de remédio e comida) se convencionarem no assistencialismo.
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No entanto, não embasada em teoria alguma, essa prática gera impacto negativo na comunidade em que é implantada, pois não transforma sua realidade social. As necessidades individuais são atendidas de forma passageira e não significativamente
estrutural
(com
a
elaboração
de
projetos
e
políticas
assistencialistas á longo prazo) o que beneficia a imagem de quem ajuda, mas mantém a coletividade em situação de carência. Oriunda desse problema, a assistência social surgiu na década de 1930 e é regulamentada pela Lei nº.8662, de 07 de junho de 1993. O assistente social é quem elabora, executa e avalia as políticas sociais, fazendo o intermédio entre organizações populares e órgãos da administração pública: A ação de assistência social visa atender às necessidades das comunidades marginalizadas, atendendo seus problemas emergentes ou permanentes, através de projetos e planejamentos que procuram prevenir exclusões sociais, riscos e vulnerabilidades. Algumas das características da assistência social são a atenção, o amparo, a proteção, a ajuda e o socorro médico. Os meios para suprir certas necessidades podem ser os serviços de saúde, as creches, o atendimento à maternidade e à infância, entre outros. (PROCÓPIO, 2009. p. 01). Portanto, o desenvolvimento de projetos assistenciais se adequa á comunidade em que eles vão se aplicar, através da avaliação das necessidades da população que a compõe. Para alavancar condições sociais e transformar espaços, a assistência social, não o assistencialismo, é fundamental.
5.1.3. A origem dos Centros Comunitários
A compreensão da importância de promover a unificação de comunidades, através da assistência social, gerou a necessidade de um local de reunião onde as entidades cooperativas pudessem não só receber educação, mas também discutir diretrizes para melhorias de infraestrutura local e promover eventos que celebrassem seus valores. A existência de um centro comunitário (CC) se conceitua como “um espaço multiuso que proporciona diversas atividades voltadas para a
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família e a coletividade, trazendo recursos e equipamentos que podem contribuir para o crescimento da região e do seu entorno” (SOUSA, 2017. p. 20). Com apoio comum, os CCs trazem ações para prevenção de problemas sociais onde a participação popular é de suma importância para que se concretizem projetos de melhorias de vida á longo prazo: promoção de palestras, cursos e oficinas profissionalizantes, disposição de fontes de educação (bibliotecas, acesso á computadores), auxílio médico e psicológico, espaço para articulação e associação dos moradores e eventos que promovam a cultura local. A primeira tipologia que condensava Arquitetura e Assistência social data da década de 1884, na Inglaterra. Fundado por Samuel e Henrietta Barnett, o Toynbee Hall (figura 06) se localizava no East End, um bairro pobre de Londres, e era uma forma de resposta ás abordagens fragmentadas e individualistas utilizadas na intenção de promover uma mudança social. Àquela época, o casal convidou estudantes das faculdades de Oxford e Cambridge para viverem no centro e trabalharem como voluntários, á fim de desenvolverem soluções práticas para a pobreza da região, bem como criarem um espírito de liderança. Figura 06: primeira fachada do Toynbee Hall, que segue até hoje funcionando como Centro Comunitário.
Fonte: Builder Magazine , 1883.
Atualmente reformados, os prédios que formavam o centro comunitário eram, segundo Andrew Caunce (2020. p. 01), sede da Boy’s Refugee Industrial School cujo projeto era descrito como uma “residência senhorial em estilo elisabetano” pelo seu arquiteto Elijah Hoole. O local espaçoso era destaque em um bairro pobre, cheio de casas apertadas. O seu partido era composto por uma sala de
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palestras, uma sala de leitura, uma sala de desenho, uma biblioteca, 30 quartos para residentes voluntários e uma elaborada sala de jantar (figura 07). Figura 07: sala de jantar principal do centro comunitário.
Fonte: Toynbee Hall Archives, 1910.
Os cômodos do Toynbee Hall eram de uso de pessoas das mais variadas classes sociais e tinham como objetivo principal promover a interação entre os habitantes do bairro e os estudantes voluntários. Dois anos depois do surgimento do centro comunitário, o fundador compra mais residências no entorno para conseguir abrigar mais visitantes, e é só em 1939 que a gama de serviços á comunidade é maximizada: auditório, salas subterrâneas de workshop, uma câmara-negra para revelação de fotografias, uma corte juvenil, salas de aula, laboratório de ciências e dois estúdios de arte contendo salas de jantar e recreação foram alguns dos adendos á estrutura. O Toynbee Hall, apesar de ter surgido há 135 anos atrás, prossegue identificando necessidades emergentes, projetando novas respostas e convencendo líderes locais e nacionais á absorvê-las. A reforma social e as políticas assistencialistas criadas pelo Centro Comunitário ajudam aqueles que se encontram na pobreza, independente de idade ou origem. Inspiradas pelo impacto causado na Europa pelos Barnett, Jane Addams (considerada “mãe do trabalho social”) e Eileen Starr, após visitarem o Toynbee Hall, acabaram trazendo a ideia para a América do Norte. Em 1889, as duas fundaram a Hull House (figura 08) no lado oeste da cidade de Chicago. Inicialmente, funcionava como uma escola para crianças na primeira infância, depois evoluiu para uma creche e ano após ano, o centro aumentava de tamanho para conseguir satisfazer
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as necessidades da população que usufruía das suas instalações. A Hull House chegou á ter mais de 12 prédios e oferecer serviços educacionais de nível secundário e superior, além de aulas noturnas sobre direitos civis e deveres cívicos. Em seu complexo podia-se encontrar um ginásio, clubes sociais e cooperativos, lojas, orfanatos e playgrounds (TIKKANEN, 2020) Figura 08: Hull House vista externamente.
Fonte: Coleção Granger, 1898.
Já no Brasil, o surgimento dos centros comunitários aconteceu á partir da década de 1940 por influência da Igreja Católica Apostólica Romana e do Serviço Social brasileiro, sendo esse segundo institucionalizado a cargo da Campanha Nacional de Educação Rural (CNER) (AMMANN, 1987. p. 53), cinco anos depois da promulgação da Constituição de 1988. Antes, o assistencialismo ainda era extremamente incorporado ao clientelismo e ao paternalismo, o que distanciava a assistência social á ideia de direito do cidadão e a aproximava de uma política assistencialista e clientelista destinada á populações mais marginalizadas, com características de favor e benfeitoria. Com a nova Constituição, a assistência social passou a ser uma política pública que integrava a seguridade social, o que a caracterizava como direito formal. Segundo Couto (2004, p. 204) duas causas sustentam esse fato: a primeira diz respeito ás tendências internacionais e nacionais dos direitos humanos e do trabalho que reivindicavam uma estrutura social que promovesse mais apoio aos trabalhadores; a segunda está relacionada á absorção da assistência social por uma parcela da população que já fazia uso desses serviços mesmo que esses não os abarcassem: “são aqueles que, pelo desemprego, ou emprego precário e/ou em
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virtude da crise estrutural gestada pela reestruturação produtiva, não encontram mais espaço nas políticas trabalhistas e veem como fundamental a busca de atendimento no campo da assistência social” (COUTO, 2004, p. 169).
Em um
momento de forte efervescência nas lutas sociais, a promulgação da Constituição impulsionou a aprovação da lei que regulamentou a assistência social, sendo criado o Serviço Social Brasileiro. Dezessete anos depois, a CNER criou e acompanhou 45 Centros Sociais de Comunidade em sete estados do país, sendo sua maioria no Rio Grande do Norte e Bahia. Nesses centros eram desenvolvidas atividades bastante semelhantes ás que temos como características de centros comunitários hoje: “articulação de grupos com características em comum, cursos profissionalizantes (corte, costura, bordado, cozinha), alfabetização de jovens e adultos [...]” (REVISTA DA CAMPANHA NACIONAL DE EDUCAÇÃO RURAL, 1959. p. 18). Apesar de se localizarem em continentes diferentes e oferecerem serviços diferentes á população, as variações de Centros Comunitários citados são congruentes quanto ao pensamento que conclui que o espaço dessa tipologia arquitetônica deve ser adaptativo ao local em que se insere. As demandas da população são determinantes para a construção do partido e geralmente são baseadas nas deficiências do perímetro que busca-se beneficiar, sejam elas atividades educativas e econômicas, eventos culturais ou de articulação social. Esse fator de identificação entre centro e comunidade é chave para que o uso do espaço se prolongue. Segundo Hertzberger (1999. p. 45) quando a função do espaço comunitário é impessoal á comunidade, o resultado é a transformação do espaço em não-lugar: “é como se as obras públicas fosse uma imposição vinda de cima; o homem comum sente que não tem nada a ver com ele, e, deste modo, o sistema produz um sentimento generalizado de alienação”. Sendo de uso coletivo, a única regra que abarca centros comunitários ao longo do tempo é a adaptação dos espaços ás mais diversas condições e aos numerosos interesses gerais de todos.
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5.1.4. Ruína e outras variações de Patrimônio
Identidade e patrimônio são conceitos que estão correlacionados e implicam um no outro. Da ótica social, a identidade é uma forma de projeção do indivíduo que, segundo Joseane Brandão (2015. p. 01), “internaliza significados e valores, contribuindo assim para alinhar sentimentos subjetivos com as posições dos indivíduos na estrutura social”, ou seja, a materialidade tem a possibilidade de virar patrimônio se, e somente si, significados forem atribuídos a ela: sem a existência da interação e da identificação do ser-humano com o contexto que ele está inserido, dificilmente a estrutura deixa de ser estrutura pra virar patrimônio. Visto isso, é possível perguntar ‘em que nível de importância está essa herança?’. Segundo o museólogo Hugues de Varine, o patrimônio é a chave do desenvolvimento: O patrimônio é ainda um recurso para o desenvolvimento. É na verdade o único recurso, juntamente com a população, que se encontra em toda parte e que basta procurar para encontra-lo. Todo diagnóstico prévio a uma política de desenvolvimento e à determinação de estratégias adaptadas a um dado território deve levar em conta a totalidade do patrimônio, a complexidade dos usos que podem ser feitos dele e do papel que seus componentes podem desempenhar no processo de desenvolvimento. (VARINE, 2013. p. 19). Os componentes patrimoniais de um território são o resultado de toda a história natural e humana ocorrida nele e, em decorrência dessas, é possível enxergar as condições e os conflitos que impulsionarão o seu desenvolvimento, nos levando a crer que locais que desrespeitam seu patrimônio não podem servir de base para a criação de um espaço equilibrado, ou seja, conservar a herança é ter o alicerce inicial para a evolução da comunidade. O denominado patrimônio histórico e artístico foi o elemento de impulso inicial para a solidificação de uma identidade compartilhada dentro do país, ele viria conferir realidade a “comunidade imaginada” (ANDERSON, 2008. p. 32). Porém, na Constituição de 1988, Artigo 216, modificou-se o conceito geral de patrimônio: abarcando também elementos imateriais, esse passava á se chamar cultural
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brasileiro ao invés de histórico e artístico, sendo esse segundo utilizado apenas para as construções antigas e seus pertences representativos das gerações passadas. Segundo o historiador e arquiteto Carlos A. C. Lemos, é importante deixar de focar a composição de patrimônio em uma maneira material e simplista, e começar a interpretá-la em uma conjuntura maior, como elenco não palpável da cultura de um povo: Sugere o professor francês que o patrimônio cultural seja dividido em três grandes categorias de elementos. Primeiramente, arrola os elementos pertencentes à natureza, ao meio ambiente [...]. O segundo grupo de elementos refere-se ao conhecimento, às técnicas, ao saber e ao saber fazer. São os elementos não tangíveis do Patrimônio Cultural [...]. O terceiro grupo de elementos é o mais importante de todos porque reúne os chamados bens culturais que englobam toda sorte de coisas: objetos, artefatos e construções obtidas a partir do meio ambiente e do saber fazer. (LEMOS, 2008. p 09) Ao segundo grupo, dá-se o nome de Patrimônio Imaterial ou Intangível. Suas primeiras aparições no âmbito mundial são derivadas da criação da UNESCO (United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization/ Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) posto que suas primeiras ações eram motivadas pela preservação das identidades culturais e tradições orais de povos. Apesar de o marco oficial da política de proteção ao Patrimônio Imaterial, no Brasil, seja a Constituição de 1988, quarenta e seis anos antes, no anteprojeto de criação do SPHAN (Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) elaborado por Mário de Andrade, já constava menção ao termo “fatos culturais”, porém sem muita ênfase. Lançada em 2012, a cartilha do IPHAN ‘Patrimônio Cultural Imaterial: Para Saber Mais’ caracteriza esse segmento de patrimônio como “tudo aquilo que é considerado valioso para um conjunto de pessoas, ainda que seja desimportante para outros grupos sociais ou não tenha valor de mercado” (IPHAN, 2012. p. 12). Portanto, diferente do que costuma se pensar, apesar de o terceiro conjunto mencionado ser constituído de artefatos, ou seja, bens palpáveis, ele não deve se sobrepor em grau de importância ao segundo ou primeiro, posto que o produto entre
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as relações dos objetos com os saberes e o meio ambiente é que tem maior valor: o fragmento sem o contexto e o entorno, é apenas um objeto. Mais recentemente, outros dois exemplos de bens culturais vem surgindo. Exemplares de estudo da área da Arqueologia há muito tempo, patrimônio industrial e ruína se posicionam na Arquitetura como essenciais a compreensão da história de um povo. Segundo a Carta de Nizhny Tagil (2003), documento que valida o termo, o conceito do primeiro se resume a: O patrimônio industrial compreende os vestígios da cultura industrial que possuem valor histórico, tecnológico, social, arquitetônico ou científico. Estes vestígios englobam edifícios e maquinaria, oficinas, fábricas, minas e locais de tratamento e de refino, entrepostos e armazéns, centros de produção, transmissão e utilização de energia, meios de transporte e todas as suas estruturas e infraestruturas, assim como os locais onde se desenvolveram atividades sociais relacionadas com a indústria, tais como habitações, locais de culto ou de educação. (TICCIH, 2013. p. 01) A conservação do passado recente é de extrema importância para a compreensão do tempo atual propriamente dito. É através dela que podemos interpretar relações entre membros de uma comunidade que compartilhavam do mesmo local de ofício e principalmente estudar as situações rotineiras desses trabalhadores em uma ótica menos distante da nossa realidade. Para Kühl (2006. p. 03), o patrimônio industrial alonga-se além de fatos históricos e não palpáveis ao integrar estudos específicos sobre técnicas construtivas: “são testemunhos de um período da história de nossa arquitetura marcada pela transposição de estilos e de materiais. [...] Tiveram papel relevante na disseminação da alvenaria de tijolo e de outros materiais industrializados, tal como o ferro, sendo exemplos de racionalização que auxiliaram no estabelecimento de uma renovada práxis construtiva”. No entanto, embora estejam incluídos no conceito de patrimônio cultural pela Constituição de 1988, os bens industriais costumam ter políticas de preservação implementadas parcialmente. Sobre isso, o presidente do Comitê Brasileiro de Preservação do Patrimônio Industrial, em entrevista ao ITAÚ Cultural, ressalta:
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Entretanto, o que se percebe, de maneira geral, é a reutilização para áreas comerciais, shopping centers, ou mesmo o processo de retrofit, ou seja, reutilização e revitalização dos edifícios (e demais espaços) para usos relacionados à cultura [...]. Deve-se destacar que esse entendimento popular para a área industrial reflete apenas parte do patrimônio industrial, que envolve muitos outros elementos, materiais e imateriais – para exemplificar seu caráter multifacetado. (RODRIGUES, 2018. p. 01) Subutilizados, edifícios e objetos de origem industrial hoje são reduzidos a sua estética, suprimindo completamente, na maioria dos casos, sua bagagem imaterial: “o testemunho de atividades que tiveram e que ainda têm profundas consequências históricas” (AZEVEDO, 2010. p. 19). Outro elemento que costuma ser resumido apenas á sua aparência são as ruínas. A deterioração de algo, principalmente em escalas edificáveis, tem conotação negativa quando se relaciona á ferrugem ou bolor. Com conotação positiva é chamada de “pátina”: A pátina é adquirida pelos materiais de uma construção histórica por meio do envelhecimento, pelo tempo ou oxidação e pelo uso. É algo que não pode ser produzido artificialmente, uma vez que o envelhecimento artificial que falsários e restauradores comerciais aplicam sempre parecerá falso passado algum tempo. [...] A pátina é preciosa porque só pode ser adquirida com o tempo. (FEILDEN, 2004. p. 247-248). Perceber a idade de um edifício é uma sensação extremamente sensorial relacionada ao ato de estar dentro, e a valorização, do que poderia ser uma observação objetiva de um lugar e se transforma em experiência, é o que confere importância à ruína. A autenticidade e as marcas do tempo nessas construções é que são capazes de transportar observadores para o passado, ou seja, espaços velhos que são totalmente recuperados ou aparentam ser novos nos causam estranheza, em uma espécie de “falso novo”. Apesar de materiais tradicionais, como tijolo, bronze e pedra, terem um envelhecimento que enobrece a sua aparência, enquanto os mais modernos, como aço, alumínio e concreto, ficam cada vez menos agradáveis aos olhos conforme o
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tempo passa, o que confere o status de pátina á uma superfície deteriorada é a interpretação daquele que observa o objeto histórico. Quando a deterioração se transforma em algo valioso, ela se torna reverenciada e dá caráter autêntico ao lugar, abrindo a mente do observador para fantasias naturais onde as histórias dos locais estão impressas na sua aparência física: As ruínas são poéticas, lugares mágicos, uma fantasia que dança à luz do luar. O gosto por ruínas incita o maravilhamento. Encantados, nós somos cativados por sentimentos rudimentares que vêm à luz como raios de luar e então afundam atrás das sombras de muros primitivos. Estremecer com deleite. (GINSBERG, 2004. p. 317) Posto isso, é necessário avaliar qual forma de intervenção poderia ser menos agressiva ás ruínas e consequentemente á pátina presente no terreno escolhido para a execução do projeto. As “marcas de uso” de uma edificação podem guardar uma história e servir de museu á céu aberto aos visitantes e a comunidade. Intervir deliberadamente sem avaliar quais consequências a total renovação do espaço pode resultar no esquecimento coletivo da importância daquele local para a história, aspecto essencial para a preservação da memória.
5.1.5. As formas de intervir no Patrimônio e suas aplicações
Em novembro de 1933, durante o IV Congresso Internacional de Arquitetura Moderna (CIAM), foi elaborada a Carta de Atenas. Dentre outras generalidades, o documento dispõe sobre o Patrimônio Histórico das Cidades e assegura sua preservação: “Os valores arquitetônicos devem ser salvaguardados (edifícios isolados ou conjuntos urbanos). [...] Serão salvaguardados se constituem a expressão de uma cultura anterior e se correspondem á um interesse geral” (ICOMOS, 1931. p. 25). Membro pioneiro na conservação do patrimônio na América Latina, o IPHAN é o órgão responsável não só por regulamentar, coordenar e fomentar o patrimônio cultural, mas também fiscalizar e determinar de quais formas esse será preservado.
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Por muito tempo considerou-se conservação interventiva sinônimo de restauração. Porém, em uma linha do tempo que se estende até os dias atuais, diversas opções de intervenção ao patrimônio foram surgindo e seus conceitos sendo reinterpretados por profissionais do campo da Arquitetura e Arqueologia Apesar de se convencionar restauração como um reestabelecimento dos padrões originais de uma edificação danificada, seja pelo tempo ou por eventos específicos, convicções pessoais são misturadas a teorias anteriores, originando variações conceituais sobre essa técnica. No contexto do período do pós-guerra, na França, é que se tem notícia de um dos primeiros teóricos do restauro. Eugène Emmanuel Viollet-Le-Duc foi o arquiteto designado para reconstruir obras góticas danificadas pelas batalhas napoleônicas: sua principal ideia consistia em autorizar modificações nas estruturas de modo que restaurar um edifício não significasse repará-lo, reconstruí-lo ou mantê-lo, mas sim restabelecê-lo no seu estado mais completo, que pode até nunca ter existido (Viollet-le-Duc, 2000. p. 17). Embora a correção dos projetos originais das obras em que trabalhava seja um elemento controverso do modus operandi de Le-Duc, foi em sua obra Dictionnaire Raisonné de l'Architecture Française du XIème au XVIème Siècle que ele defendeu procedimentos que são utilizados até hoje dentro da Arquitetura, tais como a metodologia de projeto, a importância dos levantamentos detalhados em edifícios a serem restaurados e, principalmente, a necessidade de não optar por nenhuma generalização, mas sim observar o contexto específico de cada obra: A adoção absoluta de um dos dois partidos pode oferecer perigos, e que é necessário, ao contrário, não se admitindo nenhum dos dois princípios de uma maneira absoluta, agir em razão das circunstâncias particulares [...], é necessário, antes de começar, tudo buscar, tudo examinar, reunir os menores fragmentos tendo o cuidado de constatar o ponto onde foram descobertos, e somente iniciar a obra quando todos os remanescentes tiverem encontrado logicamente sua destinação e seu lugar. (LE-DUC, 2018. p. 48-49) Contemporâneo ao Eugène, mas antagônico no pensamento, o inglês John Ruskin era decididamente contra a restauração. No primeiro volume do seu livro Stones Of Venice, ele advoga pelo ruinismo, um movimento que reafirma a
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importância do histórico em detrimento da beleza no que concerne à preservação de edifícios. A adoração do escritor britânico pelo passado era tão grande que conferia a ele certo desprezo pelo presente e suas constantes recomendações diziam respeito a não alterar e conservar ao máximo os materiais, além de interpretar a restauração como “a mais completa destruição que um edifício poderia sofrer” (CHOAY, 1996. p. 155). Apenas em 1884 que o conceito de restauração começou a se uniformizar com opiniões mais ponderadas, as quais não se lateralizavam nem ao conservacionismo histórico extremo de Ruskin, nem ao intervencionismo desmedido de Viollet Le-Duc. Destaca-se nessa linha de pensamento Camillo Boito, arquiteto romano, que baseava suas ideias na necessidade de clareza entre parte original e restaurada bem como na inevitabilidade de conservação das incorporações adicionadas na obra. Quase trinta anos depois as ideias do italiano foram adicionadas as de outros teóricos (Luca Beltrami, Gustavo Giovannoni e mais) para formar a Teoria do Restauro Científico a qual pauta preferir a conservação ao invés da restauração do edifício, limitando essa á uma forma de consolidação do mesmo. A Restauração Científica se apresentava como uma opção moderada que levava em conta as evidências documentais da obra e o seu histórico. Essa teoria, posteriormente criticada por exigir uma postura neutra do arquiteto, deu lugar á Restauração Crítica, mais flexível quanto aos caminhos que o profissional decidiria tomar, e assim se manteria em constante mudança brusca se não fossem as Cartas Patrimoniais: documentos normativos que buscavam convencionar procedimentos básicos baseados em um acordo entre profissionais e especialistas. A Carta Italiana de Restauro, redigida por Cesare Brandi durante um congresso em Veneza em 1972, é referência até hoje nas orientações de como exercer a técnica, além de reafirmar os métodos da Restauração Científica de Boito. De pensamento mais orgânico, Brandi pontuava o restauro como um método derivado da forma como o objeto é apreciado criticamente, ou seja, um tipo de abordagem estética e filológica. Para ele, era imprescindível que essa não destruísse as características da passagem do tempo e da ação antrópica, mas também se ativesse á princípios estéticos como a remoção de acabamentos ruins ou restaurações prévias incorretas. Na contemporaneidade, teóricos da conservação buscam ampliar as pesquisas da área para além do academicismo, criticando a
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imposição da verdade e a segmentação do modo de fazer para apenas alguns grupos de eruditos. Salvador Muñoz Viñas sugere uma nova ótica da teoria da conservação onde o foco passa a ser o indivíduo e não o objeto. Nessa abordagem a verdade absoluta dá lugar à troca, ao diálogo e principalmente ao significado/simbolismo social-sentimental do objeto o qual se tem interesse de preservar. De maneira participativa, as importâncias do bem cultural para a população seriam compiladas e os seus interesses orientariam fundamentalmente os processos de decisão. A metodologia de Muñoz não visa direcionar a todas as pessoas as decisões projetuais, mas sim àquelas que têm sua vida diretamente afetada por elas, concluindo que: “uma boa restauração é a que satisfaz um maior número de sensibilidades” (VIÑAS, 2005, p.177). Com a influência desse pensamento, é possível dispor sobre a teoria da reconstrução. Em oposição à restauração, essa técnica geralmente é optada quando há um imenso valor cultural atrelado á figura imagética da obra e por isso reconstróise a mesma através de técnicas e materiais modernos que possam dar sensação visual idêntica á dos originais embora em sua composição sejam diferentes. O mote ‘com’era dov’era’ (como era, onde estava) utilizado por Luca Beltrami na especificação da reconstrução do Campanário de San Marco, o qual colapsou em 1902, tornou-se uma justificativa plausível juntamente com a vontade popular que julgava a operação indispensável para retomar o sentimento de coletividade em Veneza. Um dos argumentos mais usados para criticar a reconstrução de bens históricos, em casos de arquitetura perdida (total ou parcialmente), seria o surgimento de um falso histórico: O que parece ser de suprema importância, entretanto, é não recair em nenhuma fantasia sentimental que pode induzir restauradores a reconstruir aquilo que foi destruído para além da reparação, e isso somente seria a perpetuação de uma fraude. (ANNONI, 1946. p. 21) A interpretação do reconstruir como fraude é resquício do conceito de autenticidade amplamente discutido no Documento de Nara (ICOMOS, 1994 In: Cury, 2004. p 321) onde infere-se que o máximo da preexistência da obra deve ser
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respeitado para que esta seja considerada autêntica. Porém, segundo Choay (1995. p. 101-120) não deve-se generalizar esse significado, posto que o mesmo se modifica constantemente: na Idade Média, autenticidade se referia ao grau de legibilidade de um texto (sem levar em conta suas alterações em decorrência do tempo); já no campo patrimonial se pavimenta sobre uma dualidade: autêntica é a obra original partindo do pressuposto de identidade, ou autêntica diz respeito ao existir da materialidade física da obra? Outro aspecto base para a desvalorização da teoria da reconstrução é baseada na distinguibilidade do que é novo do que já existia anteriormente. Foi Camillo Boito um dos primeiros teóricos que dispôs sobre esse termo, aprofundado posteriormente na Carta de Veneza: Artigo 12º: os elementos destinados a substituir as partes faltantes devem integrar-se harmonicamente ao conjunto, distinguindo-se, todavia, das partes originais, a fim de que a restauração não falsifique o documento de arte ou de história. (ICOMOS, 1964. p. 03) Todavia, apesar das críticas, a reconstrução é citada como alternativa para intervenção pela primeira vez na Carta de Burra: Artigo 1º. Definições: A reconstrução será o restabelecimento, com o máximo de exatidão, de um estado anterior conhecido; ela se distingue pela introdução na substância existente de materiais diferentes, sejam novos ou antigos. A reconstrução não deve ser confundida, nem com a recriação, nem com a reconstituição hipotética, ambas excluídas, do domínio regulamentado pelas presentes orientações. (ICOMOS, 1980. p 01) E atualmente se mantém como possibilidade viável, principalmente no que diz respeito às grandes tragédias como, por exemplo, o incêndio na parte superior, já anteriormente restaurada por Viollet Le-Duc, da Catedral de Notre-Dame em Paris. O ocorrido na França gerou comoção mundial e abriu um leque de interpretações para vários arquitetos e artistas que propuseram não uma restauração ou uma reconstrução da igreja, mas sim intervenções ao patrimônio, sugerindo a utilização de materiais translúcidos para refazer o teto ou instalações artísticas que lembrassem a situação do fogo (figura 09).
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Figura 09: intervenção sugerida por designer francês onde o momento do fogo é lembrado.
Fonte: Mathieu Lehanneur, 2019.
A expressão “metamorfose arquitetônica”, que caracteriza um novo projeto atrelado á uma obra histórico-artística preexistente, é de autoria de Antón Capitel:
Existem dois diferentes modos de tratar – do ponto de vista comum da disciplina da arquitetura – os problemas dos edifícios valiosos do passado: a metamorfose, que realiza a transformação da realidade arquitetônica originária, e a restauração, que resgata e conserva os valores primitivos. A metamorfose de monumentos, expressão mais radical que a restauração, requer em alguns casos um exercício especialmente reflexivo da disciplina da composição arquitetônica para poder interpretar a configuração original e seguir suas normas, resolvendo ao mesmo tempo seus problemas e respeitando suas qualidades. (CAPITEL, 1988. contracapa). Porém, ainda que sejam respeitadas as qualidades originais de onde se deseja intervir, é indispensável a análise de quais impactos essa metamorfose irá causar na preexistência e no âmbito urbano. Foi Gracia (1992. p. 189 á 230) que classificou esses níveis em três, sendo o primeiro a modificação circunscrita, ou seja, aquela que se limita em intervir no edifício como realidade individual, sem maiores mudanças em seu entorno. Essa técnica preserva a configuração urbana do bem cultural, alterando a sua espacialidade em menor ou maior escala.
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A segunda forma de intervir ao patrimônio, segundo ele, seria a modificação do locus e corresponderia as intervenções que impactam no entorno urbano construído. A essa intervenção se relacionam as ampliações, as modificações, as complementações em partes faltantes ou ainda a substituição dessas partes. Ela é muito comum em bens culturais em situação de ruína ou que foram parcialmente destruídos. O terceiro nível de intervenção diz respeito ás novas edificações que surgem anexas, estética ou funcionalmente, á preexistência. Externa a questão estética, a adaptação a novos usos também é uma preocupação constante na questão intervencionista. Apesar de legal, aparenta ser desafiadora por atravessar as questões de conservação e se incluir em um âmbito de adaptação: o projeto arquitetônico deve ser modificado á fim de permitir a nova função e ainda sanar suas necessidades. O condicionamento do arquiteto do patrimônio à figura de restaurador pode ser limitante a ideia de criar uma intervenção projetual sobre uma arquitetura preexistente. Sobre isso, De La Sota (1990, p. 301) nos lembra: “[...] é preciso ser Arquiteto sempre, seja na Catedral de Leon ou em um pinheiral que acreditemos que nunca ninguém vai pisar”. Embora seja reconhecida a necessidade de uma preservação rigorosa em objetos históricos bem conservados ou de grande valor cultural e arquitetônico, também deve-se considerar a possibilidade de intervir ou criar novos espaços e imagens arquitetônicas em ambientes sem função: ruínas, edifícios com inúmeros replicantes semelhantes ou vazios urbanos dentro de conjuntos tombados. Portanto, é possível inferir que a intervenção viabiliza a melhor utilização de um patrimônio em ruínas, posto que se a população ainda não constituiu ligação com a edificação, não faria sentido reconstruí-la, muito menos a reestabelecer ao seu estado mais perfeito sem adaptar seu uso. A intervenção possibilita que novos espaços sejam criados em benefício dos habitantes do entorno, bem como as ruínas, e consequentemente a história do local, sejam conservadas.
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5.1.6. A educação patrimonial como essência do respeito á cultura
A educação patrimonial obrigatória, regulamentada pela Portaria n° 375 do IPHAN, é uma estratégia utilizada dentro de sociedades para mediação de conflitos, conscientização de indivíduos e, principalmente, como convite para que a população participe de processos preservacionistas. Ao conhecer e vivenciar objetos culturais, o sujeito passa a observá-los não mais sob a ótica de algo alheio á si mesmo, mas sim como um bem indispensável á sua memória e identidade. Segundo Le Goff (In: BITTENCOURT, 1997. p. 104 - 116) a memória é uma aliada importante para a perpetuação do passado, posto que ela possibilita ao homem atualizar impressões anteriores, o que torna a história eterna na consciência humana. O vínculo entre os indivíduos e o “tempo histórico” é proporcionado pela memória. Sucessivamente, a comunidade, ao se enxergar como sujeito dessa história, passa a compreender seus direitos e os seus deveres para com o seu território. É Pellegrini (2007. p. 03) que afirma “que o patrimônio é historicamente construído e conjuga o sentimento de pertencimento dos indivíduos”. Visto isso, é possível inferir que a educação patrimonial, além de determinante para a criação de laços afetivos pessoa-patrimônio, é também justificativa para interpretar espaços históricos como territórios educativos. A conscientização da população sobre apropriar-se dos seus espaços históricos, e, por conseguinte, de sua história, é elemento essencial para a formação dos sujeitos: A conscientização é, neste sentido, um teste de realidade. Quanto mais conscientização, mais se desvela a realidade, mais se penetra na essência fenomênica do objeto, frente ao qual nos encontramos para analisá--lo. Por esta mesma razão, a conscientização não consiste em estar frente à realidade assumindo uma posição falsamente intelectual. A conscientização não pode existir fora da práxis, ou melhor, sem o ato ação-reflexão. Esta unidade dialética constitui, de maneira permanente, o modo de ser ou de transformar o mundo que caracteriza os homens. (FREIRE, 2001, p. 30).
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Pavimentado sobre a premissa de a educação escolarizada ser insuficiente, o conceito de território educativo se inclui nas perspectivas de Paulo Freire quando propõe atravessar os muros da escola para que a realidade e o objeto sejam analisados. Ao alcançar e envolver diversas esferas e elencos sociais, esse tipo de educação põe qualquer indivíduo como protagonista, pois valoriza saberes diversos e dita que todos somos aptos a ensinar e a aprender algo, o que desconstrói valores errôneos que tendem a colocar apenas o acadêmico em posição de superioridade. Ao provocar a interação de múltiplos conhecimentos, o território educativo reconhece a importância da diversidade cultural e rompe com as separações promovidas tanto pelo campo da educação quanto do patrimônio. Materialidade e imaterialidade, cultura e educação, científico e empírico, erudito e popular deixam de ser antônimos e passam a ter o mesmo nível de protagonismo: O território não é apenas o conjunto de sistemas naturais e de sistemas de coisas superpostas. O território tem que ser entendido como o território usado, não o território em si. O território usado é o chão mais a identidade. A identidade é o sentimento de pertencer àquilo que nos pertence. O território é o fundamento do trabalho, o lugar da residência, das trocas materiais e espirituais e do exercício da vida. (SANTOS, 2002, p. 10 apud GOULART, 2010, p.18) Dentro das especificidades exigidas para a execução do território educativo, é possível enxergar “a construção participativa e democrática do conhecimento; a criação de canais de interlocução com a sociedade, a participação efetiva da sociedade nos processos de preservação, o respeito à diversidade cultural e a articulação institucional”, ideais esses defendidos pelo Iphan quanto á educação patrimonial. É devido à democratização e apropriação dos espaços, sem distinção de classes sociais, promovidas pelas estratégias mencionadas, que processos como a gentrificação são evitados. É comum, diante da valorização do patrimônio cultural, que os habitantes originais sejam “expulsos” gradativamente para dar lugar á pessoas que se julgam mais dignas de o habitarem, geralmente motivados pelo academicismo e pelo elitismo. O higienismo, política muito conhecida por sua implantação em Paris, no século XIX, através do Barão de Haussmann, encontra seu semelhante moderno: a gentrificação também “limpa” quaisquer indivíduos indesejáveis de paisagens
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direcionadas á camada mais abastada da população, porém de maneira indireta, através da especulação imobiliária, demissões em massa e o encarecimento dos produtos dos comércios ao redor. Criado pela socióloga Ruth Glass em seu livro London: Aspects of Change, o termo ganha força á medida que o planejamento urbano relaciona preservação patrimonial á renovação: no Brasil, desde 1990, a preservação de sítios históricos é sinônimo de refuncionalização turística (PAES, 2012. p. 319 – 334) para as cidades, visando muito mais a ascensão econômica desses centros urbanos do que a conservação dos seus bens culturais. Como a necessidade de investimentos e fluxos de capital é indispensável para a manutenção da urbe renovada, é necessário que a paisagem aja como “símbolo do capitalismo” (JAMESON, 1996. p. 41) e se adeque ás especificidades estéticas de quem irá “consumi-la”. Sendo a miséria, segundo Vainer (2000. p. 75 – 103), redefinida como um problema na paisagem, os processos de segregação do espaço e seus indivíduos malvistos são encobertos em nome da fetichização e da venda da imagem histórica perfeita. Portanto, é preciso enxergar as políticas de conservação de uma forma mais abrangente, de maneira que povos não sejam invisibilizados, mas sim incluídos nos processos históricos do patrimônio cultural que envolvem, sobretudo, suas existências individuais.
5.2. Panorama Histórico
5.2.1. O cais antes da cidade: o Porto das Barcas e Parnaíba
Habitada apenas por índios Tremembés até 1571, foi a pecuária que motivou a substituição da população na região que viria a ser Parnaíba. No início do século XVIII, por conta da Carta Régia emitida em 1701, só era permitida a criação de gado a uma distância de 10 léguas do litoral, interiorizando assim a economia da futura
província
piauiense.
Essa
determinação
“obrigou”
comerciantes
e
contrabandistas á fazerem uso do Rio Parnaíba como via de transporte, já que o trajeto terrestre se apresentava inviável. Criou-se então, para a guarda de animais e
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acondicionamento da sua carne, um depósito denominado Porto Salgado ou das Barcas (Figura 10) que foi ponto de partida para o desenvolvimento de uma indústria de charque e, posteriormente, de Parnaíba como um todo (PREFEITURA DE PARNAÍBA, 2015).
Figura 10: o Porto das Barcas no século XX.
Fonte: Prefeitura de Parnaíba, 2015.
Este, instalado á margem direita do Rio Igaraçu, prosperou pela grande quantidade de embarcações que ali passavam (Figura 11). Sob a administração do português João Paulo Diniz tornou-se uma feitoria crescente do comércio que teve notável impulso e um dos núcleos que abrigou os primeiros edifícios importantes, como a Câmara, do que seria um distrito elevado á categoria de município, pela Provisão Régia de 1761, denominado de Parnaíba. Figura 11: o Porto das Barcas no século XX.
Fonte: Patrimônio Histórico de Parnaíba, 2014.
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No dia 14 de agosto de 1844, o município foi elevado á categoria de cidade através da Resolução Provincial promulgada pelo então governador José Idelfonso de Souza Ramos: é nessa época que se comprova o maior crescimento da cidade, sendo o Porto um ponto de efervescência comercial através do surgimento de grandes casas comerciais e da introdução da cera de Carnaúba no cenário internacional. Porém, em 1940, o mercado começa á entrar em crise e as referências internacionais de Parnaíba perderam espaço, fazendo o Porto das Barcas ficar sem utilidade e iniciando o declínio da região.
5.3. Situação Atual
5.3.1. O Porto das Barcas e o bairro Mendonça Clark
Aproximadamente 80 anos após a crise, o Porto das Barcas se renovou e hoje abriga, em parte, a vida noturna de Parnaíba. Embaixo da ponte que liga a cidade á Ilha Grande de Santa Isabel estão localizadas, em meio á becos e vielas, pousadas, lojas de artesanato, bares, agências de turismo e um posto da polícia (Figura 12). Figura 12: Porto das Barcas atualmente.
Fonte: Delta do Parnaíba Turismo, 2018.
Localizado na interseção de três bairros (São José, Mendonça Clark e N. Sra do Carmo), o Porto, apesar do seu recente processo de recuperação promovido pelo Governo do Estado e o IPHAN, ainda conta com edificações não conservadas que hoje se encontram em estado de ruína. O estado de abandono dos galpões
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portuários se confunde á marginalização da população do seu entorno: há mais de 50 anos os habitantes do bairro Mendonça Clark sofrem com o descaso do poder público. Regularizado como bairro através do Plano Diretor de Parnaíba apenas em 2007, o perímetro que constitui o Mendonça Clark já era habitado desde meados do século XIX, sendo caracterizado como um conjunto de cortiços que serviam de “apoio” não só para a parte comercial ás margens do Rio Igaraçu, mas também para uma área conhecida como Quarenta, onde se localizava um mercado (figura 13) de frutas, verduras e carnes. Apesar de se localizar no Centro, hoje o mercado reformado continua á ser parte do sustento dos habitantes do Mendonça Clark, dividido com outros ofícios como a lavagem de roupas. Figura 13: Mercado do Quarenta atualmente.
Fonte: Gleitowney Miranda, 2018.
Embora os habitantes tenham, desde 1999, uma associação representativa denominada Associação Produtiva Comunitária Dos Moradores Do Bairro Mendonça Clark, as reivindicações ao poder público parecem ser sempre apenas parcialmente atendidas. Em 2009, o perímetro conhecido como Conjunto Habitacional João Paulo II, que compõe grande parte da área residencial do bairro, foi beneficiado pelo Programa Habitar Brasil BID – HBB e recebeu grande parte dos equipamentos públicos que a população usufrui (uma escola, uma creche, um posto policial, um posto de saúde e o CRAS, antigamente denominado espaço multiuso), bem como 200 (duzentas) construções e 140 (cento e quarenta) melhorias de unidades habitacionais. Porém, é importante frisar que apesar do que consta no documento final de análise do PHB BID, a totalidade dos problemas ainda não foi resolvida: a violência
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no bairro é constante, bem como o tráfico de drogas, problemas de drenagem, iluminação pública e saneamento básico. São recorrentes as notícias nos portais piauienses (Costa Norte e Cidade Verde, em 2019) que mostram a presença de violência e crimes nas imediações do bairro: esfaqueamentos, tráficos de drogas e prostituição se alternam entre a rua e os galpões, transmitindo á população a sensação de medo e insegurança. Um ano antes das execuções projetuais de melhorias no bairro, o documento Conjunto Histórico e Paisagístico de Parnaíba – PI (2008. p. 83) apontava a simplicidade das construções e as sugeria como representantes da chamada Arquitetura Tradicional Popular, mas também evidenciava a situação ruim de saneamento no perímetro: “a maioria não possui infra-estrutura
de
abastecimento de água ou esgoto, e por isso é comum ver famílias inteiras lavando roupas nas margens do rio”.
5.3.2. Centros Comunitários (e semelhantes) nas imediações do bairro Mendonça Clark
Em Parnaíba, os exemplos mais próximos (raio de 1,5km) do conceito Centros Comunitários estão nos complexos privados do Sistema S, em instituições públicas conhecidas como os Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) e nos projetos sociais da Arquidiocese da cidade. Em 1942, durante a Era Vargas, foi percebida a necessidade de criação de um conjunto de organizações e entidades voltadas para questões profissionais diversas já que, naquela época, o Brasil passava por uma reestruturação da sua mão-de-obra produtiva. Apesar da ideologia ser semelhante ao que prega um Centro Comunitário, as seis unidades do Sistema S (localizadas no entorno da orla do Rio Igaraçu) que promovem cursos e dispõem de espaços para assistência social e reuniões são privados, ou seja, distanciam a população ribeirinha/de baixa renda de seus benefícios. São elas: União Caxeiral SESC, SESC Avenida de Parnaíba, SENAC Centro, SENAI Centro, SEST SENAT Centro e SESI Centro. O Centro de Referência de Assistência Social Mendonça Clark foi implementado em 2009 pelo Programa Habitar Brasil BID. O projeto reformou e
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requalificou um espaço multiuso utilizado por lideranças comunitárias e grupos de jovens. No CRAS é oferecido à população não só opções relacionadas ao planejamento familiar, mas também projetos culturais, educacionais e artísticos, tais como o Projeto Brincando e Aprendendo (SEDESC, 2018) e o Projeto Como É Bom Ser Criança (figura 14). Figura 14: Projeto Como é Bom Ser Criança em execução no CRAS Mendonça Clark.
Fonte: Meghe Alves, 2018.
A arquidiocese de Parnaíba tem um trabalho social com mais de quinze ramificações não só na cidade em questão, mas em vários outros perímetros urbanos no Piauí. A mais próxima do entorno é o Centro Social N. Sra das Mercês que atende crianças e jovens em um serviço que se aproxima mais á ideia de assistencialismo que assistência social, onde suas atividades lúdicas e projetos sociais visam divertir e entreter, mas não educar á longo prazo. No que tange á mobilização social entre lideranças da comunidade ainda não existe um espaço próprio para as reuniões da associação de moradores.
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6. ESTUDOS DE CASO
6.1. Museu Kaomai
6.1.1. Informações Gerais
•
Ano: 2018;
•
Localização: San Pa Tong District, Chiang Mai – Tailândia;
•
Área: 72,00 m²;
•
Arquitetos: Pacharapan Ratananakorn e Varat Limwibul;
•
Cliente: Kaomai Estate 1955;
6.1.2. Contexto Geral
O Museu Kaomai (figura 15) é um projeto de camadas. Parte integrante do Kaomai Estate 1955, ele revitalizou de uma fábrica de tabaco de 63 anos em Chiang Mai ao adaptar e reutilizar seus espaços. Premiado pelos Prêmios da Ásia-Pacífico da UNESCO para a Conservação do Patrimônio Cultural, na categoria Novo Design, nos Contextos de Patrimônio, em 2018, o museu se localiza em um ambiente que anteriormente fora um grande centro econômico da comunidade local. Figura 15: Finalizações de um dos pavilhões que abrigam o museu.
Fonte: Pacharapan Ratananakorn, 2018.
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Sob a justificativa de considerar o próprio local como museu e não apenas como espaço de exposições, o arquitetos da PAVA agregaram a narrativa do museu histórico-ecológico ao conservar seu patrimônio histórico e natural: a parte histórica se concentra nos diferentes modelos de armazéns de secagem de tabaco que foram preservados, enquanto a parcela natural está na coexistência sustentável das grandes árvores antigas que dão sombra no entorno da edificação.
6.1.3. Implantação, acessos e entorno
Figura 16: Panorama geral da implantação dos edifícios.
Fonte: PAVA Architects, 2018. Com edição da autora.
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Os oito armazéns de cura de folhas, sendo dois transformados em galerias de exposições, ficam localizados dentro do complexo Kaomai Estate 1955, uma extensão do Kaomai Lanna Resort que conta com uma grande vegetação, um café, edifícios de acomodação, uma piscina e um anfiteatro (figura 17). A forma em que os pavilhões estão organizados, em oposição aos outros, frente a frente, cria uma circulação chamada de Kaomai Avenue (ou Avenida Kaomai, em tradução livre) que não só convida os visitantes do resort á andarem pelo perímetro, mas também estimula o encontro da comunidade local que recorre ao complexo com dois objetivos principais: trabalhar e revisitar o passado. Figura 17: Zoneamento Kaomai Estate 1955.
Fonte: PAVA Architects, 2018. Com edição da autora.
Bem zoneados (figura 17), pavilhões expositivos e construções históricas são segmentados em sua própria zona á nordeste, enquanto diametralmente opostos, á noroeste, se encontram os edifícios modernos de acomodação do resort. Na intersecção dos ambientes mencionados, como forma de ponto médio do antigo e do novo, estão o anfiteatro e a trading house, uma espécie de complexo comercial. Na parte sul se concentram as áreas de lazer e descompressão: uma piscina com um bar anexo; o café, que tem a cozinha separada do edifício do salão de chá e uma área externa de mesas e cadeiras e os banheiros de uso dessa área. É
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possível observar a organização bem definida e as diversas circulações (Brick Lane, Green Lane, Chronicle Lane e Kaomai Avenue) através de imagens aéreas; e a vegetação bem conservada através de um diagrama de localização das árvores que coexistem junto ás construções (figura 18). Figura 18: Diagrama da conservação das árvores locais
Fonte: PAVA Architects, 2018.
6.1.4. Organização Espacial
O museu tem seu projeto baseado no respeito aos valores e na autenticidade dos diferentes espaços de trabalho dos secadores de tabaco. As extensas pesquisas sobre a propriedade, com a colaboração de consultores, exfuncionários e artesões locais, ajudaram a preservar as características originais dos armazéns e seu maquinário antigo (figura 19).
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Figura 19: Colagem demonstrando a antiga organização da tubulação dos armazéns de secagem de tabaco.
Fonte: PAVA Architects, 2018. Com edição da autora.
As poucas intervenções nos antigos celeiros de 6x6m integram novos programas e estruturas com o objetivo de trazer as memórias e educar os visitantes sobre o legado do passado: os bens originais (varas de folhas de tabaco, fornos, tubulações de combustível e todas as paredes) de três gerações tiveram estruturas preservadas e instalações refeitas usando técnicas e materiais tradicionais (figura 20). Figura 20: Colagem demonstrando a nova organização da tubulação dos armazéns de secagem de tabaco.
Fonte: PAVA Architects, 2018.
Ao longo do entorno dos armazéns estão árvores frondosas identificadas por rótulo e conservadas sob técnicas de arboricultura diversas. O posicionamento de placas por todo o perímetro do museu é indispensável para que os visitantes tenham
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conhecimento sobre a história dos edifícios, bem como quais direções tomar durante a visita (figura 21). Figura 21: Organização das árvores e placas em torno e dentro dos armazéns.
Fonte: PAVA Architects, 2018.
Segundo o site oficial do Kaomai Lanna Resort, o Café Rong Bom é uma intervenção que combina dois antigos celeiros, de 1978, construídos após o incêndio que destruiu o celeiro que ocupava a área inteira dez anos antes. Os arquitetos e artesãos do Kaomai Estate 1955 buscaram conservar e ao mesmo tempo rejuvenescer a longa história do espaço através da estética do edifício: a forma se manteve, com pé direito alto, duas paredes de tijolos originais e telhado em duas águas, mas os aspectos imagéticos se modernizaram, com emprego de esquadrias de vidro, colunas de concreto e estrutura de ferro (figura 22). Figura 22: O café Rong Bom externa e internamente.
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Fonte: Kao Mai Lanna Resort Website, 201-.
6.1.5. Estrutura e outros aspectos Construtivos
Pautado desde o princípio na conservação das estruturas originais, mas com intervenções que proporcionassem sua otimização, o Museu Kaomai usa de uma nova estrutura de aço para fortalecer a estrutura de concreto armado pré-existente. A estratégia escolhida para que esse fortalecimento não destoasse dos aspectos originais foi a assimilação por cor (figura 23). As tubulações de metal que compunham o sistema de secagem foram restauradas aos seus padrões originais, bem como os fornos de barro. Figura 23: Estrutura do museu-lugar reforçada e corte esquemático da sua estrutura.
Fonte: PAVA Architects, 2018. Com edição da autora.
A composição das paredes, feitas de tijolos, e do telhado, utilizando o trançado das varas das folhas de tabaco, se manteve, escolhendo apenas manter as
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vegetações trepadeiras para compor o aspecto de ruína em alguns prédios (figura 24). Figura 24: Artesão refaz parede de parte do museu e trança a vara da árvore de tabaco para constituir estrutura do teto.
Fonte: PAVA Architects, 2018. Com edição da autora.
Os caminhos e rotas traçados entre os celeiros de produção foram construídos de maneira orgânica com materiais naturais que podem ser encontrados na localidade (figura 25). Figura 25: Caminho que compõe a Green Lane, caminho principal para as áreas de lazer.
Fonte: Kao Mai Lanna Resort Website, 2018.
6.1.6. Justificativa Analítica
O Museu Kaomai é uma obra que se destaca por ser fiel aos seus objetivos iniciais. Apesar de estar dentro de um complexo de luxo, ele democratiza os acessos e tem como meta principal perpetuar a história e a materialidade do patrimônio industrial. Os pontos positivos vão desde a sensibilidade da consulta á antigos trabalhadores e artesãos para o desenvolvimento do partido até as zonas
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predefinidas que ao tempo que afastam funcionalidades distintas, criam caminhos que ainda permitem a conexão entre elas. A PAVA Architects fez do ambiente um museu sutil onde as pessoas não precisassem ver nada exposto para que conseguissem absorver e compreender a história do local. Os traços da personalidade de uma indústria que alavancou a economia daquele lugar em dado tempo permanecem no estilo, na estética das edificações e na preservação ás árvores que as circundam. O contexto de extremo respeito ás preexistências e ao povo que faz parte do local é de extrema confluência ao projeto do centro comunitário. As técnicas tradicionais e a utilização de materiais locais, que visam valorizar o entorno, em contraste com as adaptações modernas fazem dessa construção uma espécie de homenagem atemporal ao polo comercial que a região um dia foi sem que o ambiente se torne obsoleto.
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6.2. Centro Cultural SESC Pompeia
6.2.1. Informações Gerais
•
Ano: 1982;
•
Localização: São Paulo, São Paulo – Brasil;
•
Área: 12.211,00 m² (refere-se apenas a área que corresponde á intervenção na fábrica);
•
Arquitetos: Lina Bo Bardi;
•
Cliente: Serviço Social do Comércio (SESC);
6.2.2. Contexto Geral
O SESC Pompeia é uma obra pioneira no que diz respeito á intervenções e renovações de uso do patrimônio industrial no Brasil. Apesar do centro cultural ter iniciado com a ideia precursora de transformar uma fábrica em um ambiente de “lazer, tempo livre e animação cultural” (GARCIA, 2016, p. 09) e posteriormente ter se alongado para mais anexos esportivos e culturais, o presente estudo focará apenas na transformação inicial, direcionando a leitura dos aspectos projetuais unicamente para os galpões industriais. As movimentações para a constituição do novo centro iniciaram em 1976 quando o Serviço Social do Comércio adquiriu o terreno onde se erguia a sede da firma de tambores alemã Mauser&Cia LTDA desde 1935 (figura 26). Àquela época Lina Bo Bardi já era conhecida por trabalhos anteriores, como o MASP (Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand), e ao ser escolhida para levar esse projeto pra frente decidiu transformá-lo em “um trabalho apaixonante” (BO BARDI, 1986, p.01 apud VAINER, 2016, p.31).
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Figura 26: Trabalhadores movendo tambores na fábrica da Mauser&Cia LTDA.
Fonte: Hans Günther Flieg, 193-.
Embora a IBESA – Indústria Brasileira de Embalagens tenha instalado outra fábrica de tambores, em 1945, no lugar da alemã e posteriormente a Gelomatic, fabricante de geladeiras a querosene, também tenha feito uso do prédio, foi a configuração inicial que distribuía os galpões de maneira racional (figura 27), assim como os projetos ingleses do século XIX, que encantou á Lina. A imponente e sofisticada estrutura de concreto, novidade na época, lembrando o pioneiro nesse tipo de construção François Hennebique, fomentou a vontade da arquiteta de conservar a obra e manter a velha fábrica, intervindo com variadas intensidades, á luz de uma perspectiva contemporânea. Figura 27: aspecto da fachada frontal dos galpões.
Fonte: Leonardo Finotti, 2009.
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6.2.3. Implantação, acessos e entorno Figura 28: Implantação do SESC Pompeia.
Fonte: André Vainer e Marcelo Ferraz, 2013. Com edição da autora.
Os 12 galpões industriais estão localizados dentro de um complexo expandido, com a compra terrenos vizinhos, para abarcar também os anexos (figura 28). Em torno de uma rua principal, chamada R. Interna, erguem-se em oposição seis galpões do lado direito e outros seis do lado esquerdo. Os acessos são dois: o principal, através da entrada á nordeste, pela Rua Clélia e o secundário através da entrada do teatro, numa espécie de “cruzamento” próximo ao final da Rua Interna. O bairro da Pompeia era um subúrbio operário á época do projeto, mas hoje não é mais tão distante do centro comercial de São Paulo. A parcela que iremos focar é a que se resume nos galpões que delimitam a Rua Interna. Lina se manteve simples e sucinta quanto ao zoneamento, dividindo as funções em setor de cultura e lazer, setor administrativo e setor de serviços (imagem 29). Via principal que faz a conexão entre os prédios, a Rua Interna antes era utilizada para a entrada de velhos caminhões no perímetro industrial do bairro da Pompeia. Com a adaptação de Lina, que a manteve após ir pela segunda vez no local e observar crianças brincando e pessoas circulando á pé, se converteu em
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uma passagem apenas para pedestres, posto que esse já era seu uso readaptado pelos habitantes do bairro após o fim das fábricas. Figura 29: Zoneamento da área fabril do SESC Pompeia.
Fonte: Andressa Pinheiro Marques, 2014. Com edição da autora.
6.2.4. Organização Espacial
Ao prezar pela conservação dos galpões, Lina buscou a criação de um programa que se adaptasse a dimensão dos espaços com seus enormes vãos livres. A administração geral e os vestiários dos funcionários logo no início proporcionam uma dinâmica coerente, visto que a maioria deles faz uso da entrada principal. Em seguida, temos a maior área de todo o complexo fabril: onde era o galpão de fabricação e estocagem de tonéis, existe agora um conjunto de 5 vãos seguidos divididos em três espaços (figura 30).
Figura 30: Maior área de convivência do complexo (números 13, 14 e 15) e em detalhe o contorno do espaço descrito.
Fonte: Ângelo Braghirolli, 2010. Com edição da autora.
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O número 15 se converteu em um espaço livre para exposições; logo após, existe uma biblioteca com lajes abertas de leitura e videoteca (esses espaços são elevados, como um mezanino); e por último, no número 13, há um espaço de convivência com jogos de salão, espaço para espetáculos, mostras expositivas e um espelho com curso d’água serpenteando todos os espaços e conectando-os (figura 31). Figura 31: Primeiro pavilhão do SESC Pompeia.
Fonte: Maria Clara Lima, 2019.
A segunda parte dos galpões, do lado esquerdo da Rua Interna, se resume aos locais de entretenimento e de oficina do complexo: logo após a área com o curso d’água temos o foyer coberto e o próprio auditório com 760 lugares (figura 32). Figura 32: Foyer coberto, anfiteatro, e laboratórios de música e fotografia (respectivamente 9, 8 e 7); e detalhe para orientação da localização.
Fonte: Ângelo Braghirolli, 2010. Com edição da autora.
É importante ressaltar aqui que apenas a partir da divisão do foyer é que os ambientes são separados espacialmente por paredes. Os primeiros galpões, apesar de parecerem separados externamente, constituem um único espaço na parte
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interna. O teatro tem bancos de madeira, pois Lina queria que se assemelhasse aos grandes teatros de arena romanos (figura 33). Figura 33: Estrutura do teatro.
Fonte: Leonardo Finotti, 2009.
Mais a frente, no número 6, há um enorme galpão que se divide entre espaços de oficinas diversas (marcenaria, tipografia, gravura, tapeçaria e mais) e corredores que, vez ou outra, abrigam exposições de curta duração (figura 34). Figura 34: Estrutura do galpão de oficinas.
Fonte: Maria Clara Lima, 2019.
O lado oposto da rua Interna segue o mesmo princípio do citado anteriormente: a arquiteta utilizou do enorme vão livre para constituir uma cozinha industrial e um enorme restaurante self-service aberto ao público (figura 35). No último galpão abrigou um almoxarifado e uma oficina para manutenções internas do centro.
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Figura 35: Organização da cozinha e do refeitório.
Fonte: Leonardo Finotti, 2009.
6.2.5. Estrutura e outros aspectos Construtivos
Conservando os aspectos estéticos dos galpões, a primeira característica explorada foi a parede original: retiraram-se os revestimentos que cobriam essas estruturas de concreto e tijolos visando não a reprodução ou a cópia da construção antiga da fábrica, mas sim a acentuação do seu caráter industrial mesmo com o novo uso (imagem 36). Figura 36: Trabalhadores da construção civil retiram o revestimento da parede de tijolos.
Fonte: Paquito, 1980.
Nos antigos armazéns, como mencionado anteriormente, foram escolhidas soluções projetuais que dessem a ideia de continuidade de espaço, principalmente ao não se delimitarem barreiras entre os ambientes. Os limites existentes se resumem á novos elementos espaciais como paredes baixas, com altura menor que o pé-direito dos armazéns, constituídas de blocos de concreto de argamassa
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exposta, evidenciando o trabalho artesanal, mas sem perder a característica industrial (imagem 37). Figura 37: Paredes baixas de concreto como divisórias e sua textura.
Fonte: Maria Clara Lima, 2019.
Essas divisórias também ajudam na ventilação cruzada e, principalmente, na iluminação natural: a luz que penetra através das janelas altas, presentes em todo o comprimento dos galpões, clareia todos os ambientes, economizando energia e iluminando por igual às partes do perímetro (imagem 38). A estrutura de sustentação das antigas fábricas é caracterizada por colunas de ferro distantes de si, proporcionando grandes vãos livres. Figura 38: Basculantes e estrutura de ferro.
Fonte: Maria Clara Lima, 2019.
As canaletas de água foram preservadas, expostas nas fachadas dos galpões e revestidas com seixos rolados em uma espécie de mosaico de paralelepípedos. Esses últimos se repetem no piso da rua de acesso com organização assimétrica, sendo incorporados também nas áreas de exposição, mas em forma de pedras goiás colocadas aleatoriamente para efeito lúdico (imagem 39).
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Figura 39: Canaletas aparentes na fachada e piso de pedra goiás.
Fonte: Maria Clara Lima, 2019.
6.2.6. Justificativa Analítica
O SESC Pompeia, apesar de ter o título de centro cultural, teve um impacto muito positivo sobre a sua vizinhança. Desde o início da obra, os aspectos mais íntimos e espontâneos da comunidade foram levados em consideração, sendo os habitantes do entorno os principais beneficiados pela obra que trouxe educação a longo prazo, opções culturais, mas principalmente a apropriação de um espaço que já existia no local, mas não era visto como pertencente á comunidade. Lina Bo Bardi mostrou ser possível fazer de um ambiente industrial, e aparentemente “bruto”, um espaço lúdico onde todas as gerações aproveitam o ambiente e ainda aprendem com ele, seja sobre a própria história, seja através dos livros da biblioteca ou até mesmo as oficinas oferecidas. O Centro Comunitário ZEZA tem por objetivo causar impacto semelhante ao do SESC Pompeia na vida de uma comunidade suburbana, através dos mesmos ideais e do ambiente de intervenção semelhante. As estratégias de otimização bioclimática, a criação de circulações próprias e um programa de necessidades completo que pode ser readaptado á diferentes dinâmicas de trabalho são características chaves que fazem desse projeto interessante e bastante necessário.
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6.3. Centro Comunitário Sede Castanhas de Caju
6.3.1. Informações Gerais •
Ano: 2018;
•
Localização: Bom Jesus das Selvas, Maranhão – Brasil;
•
Área: 106,00 m²;
•
Arquitetos: Christian Teshirogi e Noélia Monteiro;
•
Cliente: Instituto de Socioeconomia Solidária (ISES);
6.3.2. Contexto Geral
A sede da Cooperativa das Mulheres Produtoras de Castanhas de Caju, no maranhão, recebeu um projeto de ampliação que apesar da pouca metragem de área, foi de suma importância para quem há muito precisava dela. A transformação de uma pequena casa local em um centro comunitário tem por objetivo o fortalecimento do senso de comunidade, buscando fomentar a redução da pobreza. A sede, apesar de ser um local de trabalho, é vista pelos habitantes de Nova Vida como um ponto de encontro (figura 40). Figura 40: Fachada frontal da sede.
Fonte: Studio Flume, 2018.
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6.3.3. Implantação, acessos e entorno
Figura 41: Panorama geral da implantação da obra.
Fonte: Studio Flume, 2018. Com edição da autora.
O empreendimento Sementes Vida Nova é formado por seis mulheres que, ao adquirirem sua sede própria, conquistaram não só um local de trabalho, mas também de um ambiente especificamente feito para as necessidades específicas da empresa. Devido á região não ter saneamento básico e o seu abastecimento de água não ser tão eficaz, o projeto integrou conceitos de permacultura, o que garantiu a construção o menor impacto possível no meio ambiente (figura 41). O zoneamento simples do empreendimento garante sua organização. Toda a parte posterior ficou reservada á produção de castanhas de caju, enquanto a frente se divide entre o comércio e a sala da administração (figura 42). Figura 42: Zoneamento do Centro Comunitário Castanhas de Caju.
Fonte: Studio Flume, 2018. Com edição da autora.
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6.3.4. Organização Espacial
A separação dos espaços segue os passos do processo de produção das castanhas de caju (figura 43). Figura 43: Planta baixa da edificação.
Fonte: Studio Flume, 2018. Com edição da autora.
A primeira fase de produção da castanha consiste na cocção e na torra da semente tirada do caju. Esse processo é feito em forno a lenha quente e com bastante vazão de fumaça. Os arquitetos decidiram manter esse processo o mais longe possível da área da loja onde circulam pessoas constantemente (figura 44). Figura 44: estado da semente após a torra.
Fonte: Studio Flume, 2018.
Através da planta é possível ver que a localização do depósito e da mesa de despiculização fica em distâncias intermediárias da loja e do forno. O ambiente de pesagem das castanhas antecede o espaço do depósito para que o processo de armazenamento seja facilitado. Também foi criada uma circulação própria para o
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manuseio de lenha, assim esse fluxo (geralmente feito com rapidez, manuseando pesos) não pode ser interrompido. Todo o processo de organização do espaço contou com a consulta das produtoras da cooperativa que até desenharam as suas sugestões (figura 45). Figura 45: Processo de criação do projeto auxiliado pelas moradoras do local.
Fonte: Studio Flume, 2018.
6.3.5. Estrutura e outros aspectos construtivos
Ao se basear em preceitos de conforto bioclimático o projeto incorpora estratégias para conforto térmico e consegue atender a demanda por um ambiente com baixos custos de manutenção implantado na área dos cocais, em um clima tropical semi-úmido. O calor da torra da castanha mais a localização em uma região quente, fez com que os arquitetos tivessem que pensar soluções. A primeira, e mais visível delas, é a utilização do bloco cerâmico de oito furos que foi firmado horizontalmente, garantindo a constante ventilação dos ambientes (figura 46). Figura 46: Bloco de cerâmica funcionando como um tipo de cobogó.
Fonte: Studio Flume, 2018.
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A maior parte das técnicas construtivas e dos materiais de composição da obra foram utilizados baseados na disponibilidade local para o desenvolvimento de ambas. A necessidade de reaproveitar a maior parte da estrutura de concreto já existente na casa levou o projeto a se desenvolver com a menor quantidade de elementos no gabarito construtivo. O tijolo cerâmico, a alvenaria e as portas pivotantes de madeira foram uma estratégia para que tudo estivesse ao alcance de maneira rápida e simples (figura 47). Figura 47: Parte da obra onde se veem todos os elementos “básicos” de constituição.
Fonte: Studio Flume, 2018.
Como o saneamento básico e abastecimento de água são precários na região, as soluções projetuais tiveram que contemplar também essas situações (figura 48). Para isso, a construção coleta água da chuva para que não falte água durante a seca. Há biodigestor de fossa séptica e círculo de bananeiras para que o esgoto seja tratado. Esses sistemas necessitam de manutenção, e é por isso que inconscientemente estimulam a população a se conscientizar sobre os recursos disponíveis. O contato de alguns membros com a experiência econômica da produção e do comércio também ajuda no desenvolvimento da comunidade, posto que os participantes partilham seus aprendizados com os demais.
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Figura 48: Perspectiva isométrica detalhando os aspectos mencionados.
Fonte: Studio Flume, 2018.
Outro fator de preocupação na concepção do partido foi a ausência de equipamentos públicos na região que impulsionassem a ideia de comunidade. A marquise e o banco de concreto que se completam são um convite para que a população veja aquele ambiente como ponto de encontro (figura 49). Figura 49: Marquise vira banco de concreto que convida as pessoas a sentar.
Fonte: Studio Flume, 2018.
Entre o espaço de cocção da castanha e a área de quebra da semente criou-se um pátio interno que tem função dupla: é o local de secagem do produto, mas também um espaço articulador de encontros (assim como o jardim externo).
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Esse espaço foi vedado com os tijolos cerâmicos na horizontal, que facilitam a ventilação, a iluminação e ainda desconstroem a ideia de dentro-fora (figura 50). Figura 50: Pátio interno.
Fonte: Studio Flume, 2018.
6.3.6. Justificativa Analítica
O que mais impressiona no Centro Comunitário Sede Castanhas de Caju não é a sua grandiosidade ou luxo (como os estudos internacional e nacional são), mas sim a simplicidade complexa paradoxal da sua proposta. O título de local de reunião da comunidade veio em parte através das estratégias facilitadoras para tal, mas muito mais pela sensação de se sentir bem-vindo e pertencer àquele local. Apesar de não representar uma intervenção ao patrimônio histórico, a escolha desse centro comunitário para esse estudo de caso se baseou na sua intenção com objetivos gigantes: unificar a comunidade, promover encontros, fomentar a apropriação espacial e ainda se utilizar de técnicas tradicionais e materiais disponíveis no local para erguer tudo o que foi mencionado. O Studio Flume, escritório de Arquitetura tradicional no desenvolvimento de projetos de viés social, trouxe no foco ás pessoas um ambiente que respeita o gabarito das edificações ao redor, se adequa bioclimaticamente á sua região e ainda utiliza de estratégias básicas para conscientização. Quando se tem vontade de promover o desenvolvimento e não se mantém apenas no ímpeto, buscam-se
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maneiras de alavancar comunidades e trazer o empoderamento e o sentimento de independência aos habitantes. A mobilização social é a principal ferramenta para que locais e pessoas cresçam e, para isso, não é preciso edifícios gigantescos, mas sim respeito ao lugar, a história, as características e, principalmente as vontades de quem deseja crescer.
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