Assédio moral e assédio sexual - A perspectiva sociológica

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Assédio Moral e Assédio Sexual – A perspectiva sociológica - Roteiro de Estudo -

Prof. Me. Everton Luiz Renaud de Paula

Assédio Moral e Assédio Sexual na visão sociológica - Roteiro de Estudo de Prof. Me. Everton Luiz Renaud de Paula está licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-CompartilhaIgual 4.0 Internacional.


Base conceitual

O estudo sobre o assédio no ambiente de trabalho, seja ele moral ou sexual, pode ser dirigido a partir de várias perspectivas. Para todas elas os conceitos fundamentais sobre o assunto se mantém. O que precisa ser aprimorado é tipo de olhar estabelecido para estudo. Neste momento da disciplina, nosso principal enfoque é a partir da perspectiva sociológica, dentro da qual precisamos olhar os indivíduos, a relação que estabelecem entre si e a relação que existe dentro das organizações. Existem duas autoras que podem ser consideradas referências e pioneiras do assunto, de

cujos trabalhos diversos outros estudos derivaram e a partir dos quais muitas linhas de pensamento se estruturam. A primeira delas é a médica psiquiatra francesa Marie-France Hirigoyen que em 1998 sistematizou sua pesquisa no livro Le Harcèlement Moral, traduzido para o português no início de 2000. Sua perspectiva aborda a violência no trabalho, os fatores psicológicos, sociais e jurídicos desde a realidade da França. A outra autora que contribuiu fortemente para a ampliação da reflexão sobre o assédio moral no Brasil é a médica Margarida Barreto com sua dissertação “Violência, Saúde e trabalho: uma jornada de humilhações”. Os trabalhos expressam marcos importantes para a compreensão do

tema. Segundo a psicóloga Lis Andréa Pereira Soboll (2008) que estuda o tema e destaca a contribuição das autoras citadas acima, pode-se entender que para Hirigoyen: “O termo assédio representa melhor os pequenos ataques ocultos e insidiosos tanto de um indivíduo como de um grupo, contra uma ou várias pessoas, típicos dessas situações. A palavra moral empregada tem duplo sentido: sinaliza as agressões de natureza psicológica e as noções de bem e de mal definidas culturalmente [...] No Brasil o termo adotado por Margarida Barreto, a partir de Hirigoyen, é descrito como ataques repetitivos e intencionais de uma pessoa ou grupo a uma ou mais pessoas para atormentar, prejudicar e provocar, com efeitos nocivos à saúde” (SOBOLL, 2008, p. 29).


Base conceitual

São atos que podem ocorrer do gestor para um colaborador; de um grupo de colaboradores para um colaborador específico; ou, de um grupo de colaboradores para seu gestor. Destas concepções já se pode destacar quatro elementos essenciais para classificar uma conduta como abusiva:

I. Habitualidade: é uma conduta hostil repetida em um período prolongado de tempo. II. Ataques psicológicos: “condutas e omissões que induzem desconforto psicológico, que ofendem e humilham” (SOBOLL, 2008, p. 33)

III. Intenção: de prejudicar, anular, excluir, humilhar. IV. Pessoalidade: é um processo direcionado e pessoal. No livro Assédio moral/organizacional: uma análise da organização do trabalho (2008), Soboll retoma as categorias de atitudes hostis, elaborada por Hirigoyen, que executadas dentro dos elementos apresentados anteriormente caracterizam o assédio moral:

1. Deterioração proposital das condições de trabalho: retirada da autonomia, contestações sistemáticas de decisões, privação de acesso aos instrumentos de trabalho, atribuição de tarefas incompatíveis com sua saúde, vontade ou habilidades são alguns exemplos desta categoria.

2. Isolamento e recusa de comunicação: contato apenas por texto, falta de diálogo com a vítima, colocação em separado dos demais, ignoram a presença da vítima, entre outros são fatores que representam a promoção do isolamento.

3. Atentado contra a dignidade: representado por situações como insinuações desdenhosas para qualificar a pessoa, gestos de desprezo para com a vítima, zombarias, atribuição de atividades humilhantes, críticas da vida privada, etc.

4. Violência verbal, física e sexual: são atos indicados por não levar em conta a situação de saúde da pessoa, destruir patrimônio físico, perseguição na rua ou em casa por meio de ligações, cartas, ameaças. Propostas ou gestos sexuais. Tratamento aos gritos.


Base conceitual

Enquanto o assédio moral percorre as estruturas psicológicas das pessoas, embora se manifeste no espaço físico do trabalho e a partir de suas relações, o assédio sexual está diretamente voltado para a forma física. Está caracterizado por comentários, gestos, olhares e demais atitudes que usem de uma estrutura de poder estabelecida para buscar favorecimentos sexuais. É uma forma de exercício de dominação que pode derivar de homens ou mulheres. Segundo o Código Penal, a Lei

10.224, de 15/5/2001, acresce ao Código Penal o art. 216-A, que define o assédio sexual nos seguintes termos: “Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”


Perspectiva Sociológica

Para as formas de assédio encontradas no ambiente de trabalho há uma relação comum com a visão sociológica sobre as relações de poder. Para compreender esta relação vamos inicialmente compreender os principais elementos que sustentam essa discussão.

 Os indivíduos e a consciência que possuem de si mesmos e dos outros. Envolve também a compreensão da liberdade e sua forma de entregar sua liberdade nas relações interpessoais e organizacionais.

 Relação Social – segundo Max Weber, entendida como uma rede na qual as ações sociais dos indivíduos se orientam umas pelas outras, gerando expectativas e probabilidades de comportamentos. É, segundo Weber, a maior força que pode manter os indivíduos unidos.

 Desejo de poder – o poder, como caracterizado por Max Weber, é a possibilidade de um indivíduo impor sua vontade numa relação social.

 Dominação – é a possibilidade do poder exercido, segundo Weber, que encontra obediência dos dominados. Essa obediência não provém apenas do medo de demissão, no caso da empresa, ou da necessidade de sobrevivência material e psíquica. Ela também é oriunda da legitimação do poder.

 Legitimidade – a hierarquia nas empresas é o poder legitimado por uma determinada ordem social, no caso a empresarial, que faz com que os indivíduos dominados reconheçam no seu dominador uma legitimidade para o exercício do poder. É importante retomar a perspectiva da sociologia weberiana onde os três tipos bases de

dominação são: a dominação tradicional – em que os dominados seguem uma tradição; a dominação carismática – em que os dominados são devotos de seus dominadores; e a dominação legal (ou racional) – em que prevalece a impessoalidade, caracterizada pela burocratização da vida empresarial e social regida por suas diversas regras.


Perspectiva Sociológica

Além da visão de Max Weber sobre as relações de poder e as relações sociais, também a o poder a dominação são pontos de reflexão para o filósofo francês Michael Foucault na obra Vigiar e Punir descreve o modelo de controle e vigilância chamado Panóptico. Em diversos momentos a organização do espaço corporativo busca produzir a sensação de vigilância como uma forma exercício de poder na relação social existente dentro da empresa. Em função dos itens também

dispostos por Weber esta forma pode encontrar legitimidade entre os dominados o que confere o exercício de dominação. Esta situação pode chegar ao assédio organizacional, caracterizado por Soboll (2008) quando somado à intencionalidade, habitualidade, pessoalidade e resultar em ataques ao trabalho dos indivíduos. A dialética do filósofo alemão George W. Friedrich Hegel traz uma visão importante para a discussão da relação de dominação que existe nas organizações e que privilegia o cenário de assédio. Quando descreve a dialética do senhor e do escravo o filósofo destaca a visão de que há entre o dominador e o dominado uma relação dialética que os forma e legitima sua relação. E nem o

dominador é exclusivamente dominador, tampouco o dominado se caracteriza exclusivamente como um oprimido. Esta concepção encerra a reflexão levando à clara consideração de que para entender o assédio, seja ele psíquico ou físico, é necessária uma abordagem interdisciplinar que compreenda a questões jurídicas, psicológicas e sociais, mas não se desprenda das relações sociológicas e históricas que explicam e sustentam os fenômenos. É com a apropriação da diversidade de visões e entendimento do fenômeno social que os gestores podem oferecer respostas sustentáveis e inovadoras para os desafios da relação social na organização.


Referências

SOBOLL, L.A.P. Assédio Moral/Organizacional: uma análise da organização do trabalho. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2008. SCHATZMAM, M. A violência moral sob a luz de categoriais de Bourdieu, Verón e do círuclo de Bakthin. In: SOBOLL, L.A.P; GOSDAL, T.C. (orgs) Assédio Moral interpessoal e organizacional. São Paulo: LTr, 2009. Assédio Moral em ambiente bancário - https://prezi.com/dje9xat15d2x/copy-of-assedio-eimoral/ Conferência Dra. Marie-France Hirigoyen - http://www.assediomoral.org/spip.php?article214 Resenha do livro Assédio Moral: a violência perversa no cotidiano http://www.scielo.br/pdf/tce/v13n4/a19.pdf NASCIMENTO, A.M.O; SILVA, S.P.S. Assédio moral X clima organizacional: impacto na produtividade organizacional. RAD Vol.14, n.1, Jan/Fev/Mar/Abr 2012, p.108-121. Disponível em: file:///C:/Users/usuario%201/Downloads/10183-25285-1-SM.pdf Assédio Moral no Trabalho IESC/UFRJ Grupo de pesquisadores ligados à Universidade Federal do Rio de Janeiro. O site informa sobre legislação, referencia obras e sites correlatos, tem também notícias publicadas na imprensa e depoimentos de pessoas que já passaram por situação de assédio moral. http://www.nesc.ufrj.br/assediomoral/ P@rtes - a sua revista virtual Edição especial da revista virtual Partes (ISSN 1678-8419), tratando do assédio moral. http://www.partes.com.br/capaassedio.htm ENTREVISTA com Margarida Maria Silveira Barreto http://assediomoralesaudenotrabalho.blogspot.com.br/2014/04/entrevista-com-margarida-mariasilveira.html O Panóptico: Foucault confirma Orwell http://www.espacoacademico.com.br/028/28cpinto.htm

Assédio moral: reflexo dos tempos modernos no ambiente de trabalho - http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=14283&revista_caderno =25 WEBER: Relações Sociais, Poder e Dominação.http://lllsociologialll.blogspot.com.br/2011/10/aula-weber-relacoes-sociais-poder-e.html WEBER, Max. Economia e Sociedade. Tradução de Regis Barbosa. São Paulo: Universidade de Brasília. 1999.


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