Guia EXAME de Sustentabilidade 2007

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Ecoeficiência Agronegócio

DEZEMBRO/2007 | R$ 19,90 | www.exame.com.br

A receita das empresas que se tornaram referência em economia de água e energia

Pressionado por ativistas e pelo mercado internacional, o setor procura se reinventar

Marketing Companhias de todo o mundo tentam ganhar dinheiro com o discurso “verde”

Entrevista O guru

Michael Porter

avisa: o aquecimento global mudará — radicalmente — os negócios

EXAME

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RGODEGUEZ

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2007

Sustentabilidade 20

A lista das empresas-modelo em responsabilidade social corporativa no Brasil


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Sumário

102 A modelo Gisele Bündchen em tribo indígena: além da imagem sustentável

6 Carta ao Leitor 9 Portal

pesquisa 12 Apresentação Para selecionar

LULU COSTA

as melhores, o Guia EXAME de Sustentabilidade traz uma nova metodologia em parceria com a FGV-SP 14 Resultados O que mostra o levantamento das empresas inscritas na oitava edição do Guia EXAME de Sustentabilidade

empresas-modelo 22 Accor A sustentabilidade está no cotidiano dos funcionários

26 28 32 34 36 40 42 44 48 50 52

56 58 60 64 66 70

desenvolvimento de seus funcionários Amanco Redução no consumo de água resulta em custos menores Aracruz O esforço para solucionar impasses com índios e ativistas Arcelor Como reduzir insumos e aumentar a produção Basf Produção reestruturada e pioneirismo no setor químico Braskem Onde sustentabilidade é sinônimo de expansão Caterpillar Crescimento sustentável para a comunidade local CPFL Usinas mais produtivas financiam projetos ambientais Elektro Reurbanização e qualidade de vida a quem precisa IBM Capacidade ociosa dos computadores auxilia pesquisas Itaú O fundo de investimento que neutraliza emissões Mapfre Projeto ensina educação de trânsito a alunos da rede pública Natura O desafio de crescer sem perder antigos valores Philips Inovação com produtos de baixo consumo energético Promon Atrás de fornecedores com práticas sustentáveis Real Funcionários passam a sustentabilidade adiante Serasa Consultoria em gestão para instituições beneficentes Suzano Nova postura faz crescer as vendas e o valor das ações

Capa: Corbis

72 Unilever Em busca da ecoeficiência em toda a cadeia de produção — dos fornecedores ao consumidor final

negócios globais 76 Oportunidades Empresas encontram formas de lucrar com o aquecimento global 80 Ecoeficiência Como algumas das maiores empresas do mundo saíram à frente na corrida pelo impacto zero 84 Parcerias A difícil missão da ONG Future 500 de solucionar conflitos entre ativistas e grandes empresas

entrevista 86 Estratégia Para o guru Michael Porter, projetos de responsabilidade corporativa também devem ter foco no negócio

brasil 92 Energia Mercado de energias alternativas é promessa de bons negócios 96 Agricultura Empresas do agronegócio querem virar cobranças a seu favor

negócios 102 Marketing O esforço — e os tropeços — das empresas pela imagem “verde” 106 Créditos de carbono Empresas brasileiras embarcam nesse bilionário mercado mundial

ROBERT NICKELSBERG/GETTY IMAGES

24 Acesita Empresa patrocina

76

Construção de usina eólica nos Estados Unidos: novos negócios

gestão 110 Fornecedores Para garantir matéria-prima, empresas capacitam produtores 114 Transparência Empresas aderem ao GRI para prestar contas de suas ações socioambientais

livros 118 Idéias Cinco obras conferem diferentes ângulos à sustentabilidade

artigo 122 Governança Como conciliar a pressão por resultados com a postura responsável



Carta leitor sustenta

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Carta ao leitor

Mais um grande passo adiante

• Coordenação: Cristiane Correa • Edição: Ana Luiza Herzog, Cristiane Mano e Ernesto Yoshida • Reportagem: Adriana Pereira, Beatriz Marques Dias, Betina Moura, Everton Vasconcelos, Fátima Peres, Flávio Viégas, Fabrício Marques, Guilherme Fogaça, Gustavo Magaldi, Guy Corrêa,José Alberto Gonçalves, Laura Lopes, Leandro Quintanilha, Lia Vasconcelos, Lílian Cunha, Luci Gomes, Lucia Kassai, Márcio Sampaio de Castro, Maurício Oliveira,Tatiana Vaz,Tiago Cordeiro, Ursula Alonso Manso • Assessoria técnica: Centro de Estudos de Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas de São Paulo (FGV-SP) Equipe: Mario Monzoni (coordenação), Roberta Simonetti, Renata Loew e Sonia Loureiro

6 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

• Arte | Coordenação: Ricardo Godeguez Equipe: Alessandra Silveira, Rita Ralha, Nicéia Cecilia Lombardi (designers) e Osmar Vieira (infografista) • Fotografia | Coordenação: Germano Lüders Equipe: Lia Lubambo (fotógrafa), Angelica Breseghello Bueno, Iara Brezeguello, Natália Parizotto, Pedro Strelkow (pesquisadores) • Revisão | Coordenação: Ivana Traversim Equipe: Arlete Mendes de Souza, Eduardo Teixeira Gonzaga, Maurício José de Oliveira, Rachel Reis, Regina Pereira, Silvana Marli Fernandes, Taís Salbé, Walter Farro • Tratamento de imagem | Coordenação: Leandro Fonseca Equipe: Carlos Alberto Pedretti, Julio Gomes e Mauá

LIA LUBAMBO

O

ito anos atrás, quando EXAME decidiu lançar a primeira edição do Guia de Boa Cidadania Corporativa, a preocupação social e ambiental das empresas ainda era algo disperso e mal compreendido no Brasil. Aqui e ali, surgiam as primeiras iniciativas, e grupos de empresários e executivos apenas começavam a abraçar a causa, quase como domquixotes dos negócios. Tirar uma idéia da cabeça e colocá-la no papel com a missão de fazê-la prosperar no tempo é um dos maiores desafios que um editor pode ter. E, com a idéia do guia nas mãos, saímos em busca de modelos internacionais que pudessem nos indicar caminhos. Logo descobrimos que esses modelos não existiam e que precisaríamos começar tudo do zero — da metodologia, durante anos baseada nos indicadores do Instituto Ethos, ao modelo de inscrição; do conteúdo das reportagens aos critérios A equipe sustentável — Ricardo, Yoshida e Ana Luiza (em pé); Cristiane de premiação. E foi dessa vontade da redação de faCorrea, Cristiane Mano e Guilherme: a mais profunda análise do assunto zer algo completamente novo que o guia nasceu. E foi da certeza de que a atitude responsável das emarte Ricardo Godeguez. Pela primeira vez desde o nascimento do presas não era, como os céticos afirmavam, mero modismo que ele guia, EXAME contou com um parceiro do mundo acadêmico — cresceu e se consolidou, nestes últimos oito anos, como a mais imo Centro de Estudos de Sustentabilidade da Fundação Getulio Varportante publicação sobre o assunto no país. gas — na tarefa de avaliar a atuação financeiro-social-ambiental de Durante esse período, tentamos acompanhar a tremenda evo140 das maiores empresas brasileiras. Após oito anos, também decilução da responsabilidade social corporativa no Brasil e no mundo. dimos mudar o nome da publicação, rebatizando-a de Guia EXAME Muitas das idéias iniciais foram reformuladas. Só uma coisa não mude Sustentabilidade. Não se trata de uma questão semântica. Com dou desde então: nossa crença de que a sustentabilidade só é possía mudança, queremos deixar evidente um caminho que sempre trivel com boas práticas financeiras, ambientais e sociais. Empresas lhamos — mesmo quando sustentabilidade era um termo estranho sempre serão empresas. Nasceram para dar lucro e assim assegurar ao mundo dos negócios — e estamos aperfeiçoando. A edição 2007 seu futuro. Mas hoje está claro que esse lucro não será alcançado chega num momento de profunda reflexão das empresas, pressiono longo prazo se seus impactos na sociedade e no meio ambiente nadas pelas ameaças do aquecimento global, pela escassez cada vez não forem administrados. Mostrar isso — com informações, análimaior de recursos naturais e pela necessidade brutal de atrair os meses, conceitos e exemplos — é o objetivo deste guia e ele é cumprilhores talentos e se posicionar perante a sociedade. Esperamos que do de maneira especial nesta edição de 2007. Trata-se de um trabaeste guia, com seus exemplos, ajude a iluminar essa reflexão. lho jornalístico primoroso, coordenado pela editora executiva Cristiane Correa e executado pelos jornalistas Cristiane Mano, Ana Luiza Herzog, Ernesto Yoshida e Guilherme Fogaça. O desafio de transCláudia Vassallo Diretora de redação formar um assunto relevante em belas páginas coube ao editor de


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Presidente e Editor: Roberto

Civita Jairo Mendes Leal, Mauro Calliari Conselho Editorial: Roberto Civita (Presidente), Thomaz Souto Corrêa (Vice-Presidente), José Roberto Guzzo Diretor Secretário Editorial e de Relações Institucionais: Sidnei Basile Diretora Corporativa de Publicidade: Thais Chede Soares B. Barreto Vice-Presidentes:

Diretor Editorial: José Roberto Guzzo Diretor-Superintendente: Alexandre Caldini

Diretora de Redação: Cláudia Vassallo Redator-Chefe: André Lahóz Editores Executivos: Cristiane Correa, Maurício Lima, Sérgio Ruiz Luz, Sérgio Teixeira Jr. Editores: Cristiane Mano, Daniel Hessel Teich, Eduardo Salgado, José Roberto Caetano, Marcelo Onaga, Maria Luisa Mendes, Tiago Lethbridge Subeditores e Repórteres: Ana Luiza Herzog, Carolina Meyer, Daniella Camargos, Denise Carvalho, Fabiane Stefano, Giuliana Napolitano, Gustavo Poloni, Larissa Santana, Luciene Antunes, Melina Costa, Roberta Paduan, Tatiana Gianini Estagiário: Lucas Renan Bessel Sucursais: Angela Pimenta (Brasília), Suzana Naiditch (Porto Alegre), Malu Gaspar, Samantha Lima (Rio de Janeiro) Revisão: Ivana Traversim (chefe), Eduardo Teixeira Gonzaga, Regina Pereira Supervisora de Atendimento ao Leitor: Marta Leone Diretora de Arte: Roseli de Almeida Editora de Arte: Cláudia Calenda Designers: Jean Takada, Luciana Maia, Marta Teixeira, Simone Spitzcovsky Infografista: Maria do Carmo Benicchio Edições Especiais: Ricardo Godeguez (editor de arte), Alessandra Silveira, Rita Ralha (designers) Estagiária: Victoria Andreoli CTI: Leandro Almario Fonseca (chefe), Carlos Alberto Pedretti, Julio Gomes Fotografia: Germano Lüders (editor), Lia Lubambo (fotógrafa), Iara Brezeguello, Pedro Strelkow (pesquisadores) Portal EXAME Editor: João Sandrini Repórteres: Francine De Lorenzo, Luciana Barreto, Márcio Juliboni, Peri de Castro Dias Webdesigner: Fábio Teixeira Webmaster: Marcus Cruz www.exame.com.br Apoio Editorial: Beatriz de Cássia Mendes, Carlos Grassetti Departamento de Documentação e Abril Press: Grace de Souza Publicidade Diretora de Vendas: Selma Souto Diretor de Publicidade Regional: Jacques Baisi Ricardo Diretor de Publicidade Rio de Janeiro: Paulo Renato Simões Gerente de Vendas: Edson Melo (RJ) Gerente de Projetos Especiais: Antonia Costa Coordenadores: Douglas Costa (SP), Christina Pessoa (RJ) Executivos de Negócios: Adriana Nazaré, Andrea Balsi, Carlos Eduardo Brust, Edvaldo Silva, Emiliano Hansenn, Francisco Barbeiro Neto, Heraldo Evans Neto, Marcela Dzeren Oréfice, Marcelo Pezzato, Renata Miolli, Sueli Fender (SP), Ailze Cunha, Leda Costa (RJ) Planejamento, Controle e Operações Diretor: Fabian S. Magalhães Eventos e Circulação Gerente de Eventos: Regina Bernardi Gerente de Produto: Viviane Ribeiro Gerente de Circulação - Avulsas: Andrea Abelleira Gerente de Circulação - Assinaturas: Viviane Ahrens Assinaturas Diretora de Operações de Atendimento ao Consumidor: Ana Dávalos Diretor de Vendas: Fernando Costa Em São Paulo: Redação e Correspondência: Av. das Nações Unidas, 7221, 20o andar, Pinheiros, CEP 05425-902, tel. (11) 3037-2000, fax (11) 3037-2027 PUBLICIDADE São Paulo www.publiabril.com.br Classificados tel. 0800-7012066; Grande São Paulo, tel. 3037-2700 ESCRITÓRIOS E REPRESENTANTES DE PUBLICIDADE NO BRASIL: Central-SP: (11) 3037-6564 Bauru Gnottos Mídia e Representações Comerciais, tel. (14) 3227-0378, e-mail: gnottos@gnottosmidia.com.br Belém Midiasolution Belém, tel. (91) 3222-2303, e-mail: ana.midiasolution@veloxmail.com.br Belo Horizonte Escritório tel. (31) 3282-0630, fax (31) 3282-0632 Representante Triângulo Mineiro F&C Campos Consultoria e Assessoria Ltda., telefax (16) 3620-2702, cel. (16) 8111-8159, e-mail: fmc.rep@netsite.com.br Blumenau M. Marchi Representações, tel. (47) 3329-3820, telefax: (47) 3329-6169, e-mail: mauro@mmarchiabril.com.br Brasília Escritório: tels. (61) 3315-7554/55/56/57, fax (61) 3315-7558; Representante: Carvalhaw Marketing Ltda., tels. (61) 3426-7342, 3223-0736/7778, 3225-2946, fax (61) 3321-1943, e-mail: starmkt@uol.com.br Campinas CZ Press Com. e Representações, telefax (19) 3233-7175, e-mail: czpress@czpress.com.br Campo Grande Josimar Promoções Artísticas Ltda., tel. (67) 3382-2139, e-mail: karenb@josimarpromocoes.com.br Cuiabá Agronegócios Representações Comerciais, tels. (65) 9235-7446/9602-3419, e-mail: lucianooliveir@uol.com.br Curitiba Escritório: tels. (41) 3250-8000/8030/8040/8050/8080, fax (41) 3252-7110; Representante: Via Mídia Projetos Editoriais Mkt. e Repres. Ltda., telefax (41) 3234-1224, e-mail: viamidia@viamidiapr.com.br Florianópolis Interação Publicidade Ltda., tel. (48) 3232-1617, fax (48) 3232-1782, e-mail: fgorgonio@interacaoabril.com.br Fortaleza Midiasolution Repres. e Negóc., telefax (85) 3264-3939, e-mail: simone.midiasolution@ veloxmail.com.br Goiânia Middle West Representações Ltda., tel. (62) 3215-5158, fax (62) 3215-9007, e-mail: publicidade@middlewest.com.br Manaus Paper Comunicações, telefax (92) 3656-7588, e-mail: paper@internext.com.br Maringá Atitude de Comunicação e Representação, telefax (44) 3028-6969, e-mail: marlene@atituderep.com.br Porto Alegre Escritório: tel. (51) 3327-2850, fax (51) 3327-2855; Representante: Print Sul Veículos de Comunicação Ltda., telefax (51) 3328-1344/3823/4954, e-mail: ricardo@printsul.com.br Recife MultiRevistas Publicidade Ltda., telefax (81) 3327-1597, e-mail: multirevistas@uol.com.br Ribeirão Preto Gnottos Mídia Representações Comerciais, tel. (16) 3911-3025, e-mail: gnottos@gnottosmidia.com.br Salvador AGMN Consultoria Public. e Representação, tel. (71) 3311-4999, fax (71) 3311-4960, e-mail: abrilagm@uol.com.br Vitória ZMR - Zambra Marketing Representações, tel. (27) 3315-6952, e-mail: samuel@zambramkt.com PUBLICAÇÕES DA EDITORA ABRIL: Veja: Veja, Veja São Paulo, Veja Rio, Vejas Regionais Núcleo Negócios: Exame, Exame PME, Você S/A Núcleo Tecnologia: Info, Info Corporate Núcleo Informação: Revista da Semana Núcleo Consumo: Boa Forma, Elle, Estilo, Manequim, Revista A Núcleo Comportamento: Claudia, Gloss, Nova Núcleo Semanais de Comportamento: Ana Maria, Faça e Venda, Sou Mais Eu!, Viva Mais! Núcleo Bem-Estar: Bons Fluidos, Saúde!, Vida Simples Núcleo Jovem: Almanaque Abril, Aventuras na História, Bizz, Capricho, Guia do Estudante, Loveteen, Mundo Estranho, Superinteressante Núcleo Infantil: Atividades, Disney, Recreio Núcleo Homem: Men’s Health, Playboy, Vip Núcleo Casa e Construção: Arquitetura e Construção, Casa Claudia Núcleo Celebridades: Bravo!, Contigo!, Minha Novela, Tititi Núcleo Motor Esportes: Frota S/A, Placar, Quatro Rodas Núcleo Turismo: Guias Quatro Rodas, National Geographic, Viagem & Turismo Fundação Victor Civita: Nova Escola INTERNATIONAL ADVERTISING SALES REPRESENTATIVES Coordinator for International Advertising: Global Advertising, Inc., 218 Olive Hill Lane, Woodside, California 94062. UNITED STATES: World Media Inc. (Conover Brown), 19 West 36th Street, 7th Floor, New York, New York 10018, tel. (212) 213-8383, fax (212) 213-8836; Charney/Palacios & Co., 9200 So. Dadeland Blvd, Suite 307, Miami, Florida 33156, tel. (305) 670-9450, fax (305) 670-9455. JAPAN: Shinano Internation, Inc., Akasaka Kyowa Bldg. 2F, 1-6-14 Akasaka, Minato-ku, Tokyo 107-0052, tel. 81-3-3584-6420, fax 81-3-3505-5628. TAIWAN: Lewis Int’l Media Service Co. Ltd. Floor 11-14 no 46, Sec. 2 Tun Hua South Road Taipei, tel. (02) 707-5519, fax (02) 709-8348. EXAME 907 (ISSN 0102-2881), ano 41, no 23, é uma publicação quinzenal da Editora Abril S.A. Edições anteriores: venda exclusiva em bancas, pelo preço da última edição em banca mais despesa de remessa. Solicite ao seu jornaleiro. Distribuída em todo o país pela Dinap S.A. Distribuidora Nacional de Publicações, São Paulo. EXAME não admite publicidade redacional.

Serviço ao Assinante: Grande São Paulo: 5087-2112 Demais localidades: 0800-7752112 www.abrilsac.com Para assinar: Grande São Paulo: 3347-2121 Demais localidades: 0800-7752828 www.assineabril.com.br IMPRESSA NA DIVISÃO GRÁFICA DA EDITORA ABRIL S.A.

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Ã

Presidente do Conselho de Administração: Roberto Civita Presidente Executivo: Giancarlo Civita Vice-Presidentes: Douglas Duran, Marcio Ogliara www.abril.com.br



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www.exame.com.br/sustentabilidade Acesse o Portal EXAME e leia as reportagens, os artigos e outras informações exclusivas para a internet que complementam o anuário. Todo o conteúdo da edição impressa também está disponível na web.

RESULTADOS

A maior pesquisa sobre sustentabilidade

GDS/ZEFA/CORBIS

A versão na internet do Guia EXAME de Sustentabilidade permite acesso ao maior panorama sobre responsabilidade corporativa no Brasil. Ali o usuário consegue ver todos os resultados estatísticos do levantamento realizado com 140 empresas de grande e médio porte que preencheram o questionário da pesquisa em 2007. As ferramentas de consulta também dão acesso ao conteúdo das matérias das sete edições anteriores do anuário já publicadas — e possibilita avaliar a evolução das práticas de responsabilidade corporativa no país nesse período.

MICHAEL PORTER

“Parem de gastar tanto dinheiro”

PARCERIAS

O conciliador

Ouça trechos da entrevista de EXAME com o professor de Harvard Michael Porter. O guru da estratégia diz que as empresas não sabem planejar seus investimentos em sustentabilidade.

NYT

Saiba mais sobre como o ambientalista Bill Shireman se tornou o mais requisitado consultor especializado em aliar interesses de ativistas e empresas como Coca-Cola e Lenovo, patrocinadoras das Olimpíadas de 2008, na China.

COLOR CHINA PHOTO/SIPA

ECOEFICIÊNCIA

Estádio na China: vitrine para empresas e ativistas

Menos impacto e menos custo Veja a lista elaborada pela ONG inglesa The Climate Group com algumas das maiores empresas do mundo que estão reduzindo o consumo de recursos como água e energia — e seus custos também.

Se você comprou esta edição na banca, para acessar as matérias no site, digite a palavra-chave

ESTOCOLMO

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Apresentação-alta

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Pesquisa apresentação

A escolha das melhores GERMANO LÜDERS

Em sua oitava edição, o Guia EXAME de Sustentabilidade apresenta a maior mudança metodológica de sua história em parceria com a FGV-SP Cristiane Mano Sede da Bovespa, em São Paulo: a nova metodologia considera as mais atuais referências em todo o mundo, como o índice de sustentabilidade da bolsa

ameaça do aquecimento global elevou definitivamente a sustentabilidade ao centro do debate público em todo o mundo. Nunca se falou tanto sobre o assunto como neste ano — seja na esfera política, seja dentro das empresas. O tema entrou também para a agenda do cidadão comum mundo afora. Num misto de atitude ambientalmente correta com jogada publicitária, até mesmo bandas de rock como Coldplay e Pearl Jam anunciaram a neutralização das emissões de carbono de suas turnês mundiais com o plantio de árvores. À parte os modismos, o barulho ajuda a amadurecer uma discussão que começou nos anos 80, com o surgimento do movimento ambientalista. Pouco mais tarde, nos anos 90, a preocupação passou também a abranger aspectos sociais, como a promoção de relações justas de trabalho, sobretudo com o avanço das cadeias globais de produção. Mais re-

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centemente, a discussão convergiu para o conceito de sustentabilidade, criado pelo inglês John Elkington, fundador da consultoria SustainAbility, uma das mais conceituadas do mundo nessa área. Para Elkington — e para todos os seus seguidores —, nenhuma empresa é capaz de se perpetuar sem levar em consideração três aspectos: ambiental, social e econômico-financeiro, algo que ficou conhecido como triple bottom line. Para refletir a transformação em curso, o Guia EXAME de Boa Cidadania Corporativa passou por duas mudanças importantes em sua oitava edição. A primeira e mais notória é a de nome. A partir deste ano, o anuário passa a se chamar Guia EXAME de Sustentabilidade. A outra é estrutural — uma nova metodologia elaborada pelo Centro de Estudos em Sustentabilidade (GVces) da Fundação Getulio Vargas de São Paulo, responsável pelo Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE) da Bovespa, que reúne

empresas responsáveis listadas na bolsa. A pesquisa deste ano — na qual se inscreveram 206 companhias de grande e médio porte de todo o país — passou a considerar as mais atuais referências em levantamentos sobre sustentabilidade empresarial em todo o mundo. A análise teve duas etapas. Na primeira, as empresas participantes preencheram um questionário, dividido em quatro partes. Uma delas abordava questões introdutórias sobre compromissos, transparência e governança corporativa (elaboradas pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa — IBGC). As demais tratavam dos aspectos econômicofinanceiro, social e ambiental (neste ano, os critérios da dimensão ambiental receberam ponderações diferentes na avaliação final, dependendo do setor de atuação da empresa e de seu impacto no meio ambiente). As respostas foram analisadas estatisticamente, de modo a excluir empresas que tiveram desempenho abaixo

da média em alguma das dimensões do questionário. “O objetivo foi premiar as empresas que têm bom desempenho nos diversos aspectos da sustentabilidade de maneira equilibrada”, diz Mario Monzoni, coordenador do GVces e da pesquisa do Guia EXAME de Sustentabilidade. Com base nessa análise, uma lista de 32 empresas foi submetida a uma aferição jornalística, na qual foram verificadas as respostas ao questionário. A análise estatística e a aferição jornalística foram as bases para a decisão dos oito membros do Conselho Consultivo, que elegeram as 20 empresas-modelo desta edição (veja quadro). Não se trata de uma lista com empresas perfeitas, mas sim dos melhores exemplos de grandes companhias brasileiras que estão conseguindo adaptar seus negócios aos novos tempos. Em todas elas, a sustentabilidade é tratada como algo a ser constantemente aprimorado. A trajetória de cada uma delas é descrita nas reportagens das páginas a seguir.

O conselho consultivo Especialistas em sustentabilidade responsáveis por apontar as empresas-modelo desta edição

Cláudio Boechat Professor e pesquisador do Núcleo de Sustentabilidade e Responsabilidade Corporativa da Fundação Dom Cabral

Fernando Almeida Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro e presidente executivo do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS)

Helio Mattar Diretor-presidente do Instituto Akatu, ONG que incentiva o consumo consciente

Heloisa Bedicks Secretária-geral do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC)

Pedro Meloni Principal advisor do International Finance Corporation (IFC), ramo do setor privado do Banco Mundial, para a América Latina

Ricardo Young Presidente do Instituto Ethos

Rosa Maria Fischer Professora da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo e diretora do Centro de Empreendedorismo Social e Administração em Terceiro Setor da Fundação Instituto de Administração

Sidnei Basile Diretor-secretário editorial e de relações institucionais do Grupo Abril

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Pesquisa apresentação

A escolha das melhores GERMANO LÜDERS

Em sua oitava edição, o Guia EXAME de Sustentabilidade apresenta a maior mudança metodológica de sua história em parceria com a FGV-SP Cristiane Mano Sede da Bovespa, em São Paulo: a nova metodologia considera as mais atuais referências em todo o mundo, como o índice de sustentabilidade da bolsa

ameaça do aquecimento global elevou definitivamente a sustentabilidade ao centro do debate público em todo o mundo. Nunca se falou tanto sobre o assunto como neste ano — seja na esfera política, seja dentro das empresas. O tema entrou também para a agenda do cidadão comum mundo afora. Num misto de atitude ambientalmente correta com jogada publicitária, até mesmo bandas de rock como Coldplay e Pearl Jam anunciaram a neutralização das emissões de carbono de suas turnês mundiais com o plantio de árvores. À parte os modismos, o barulho ajuda a amadurecer uma discussão que começou nos anos 80, com o surgimento do movimento ambientalista. Pouco mais tarde, nos anos 90, a preocupação passou também a abranger aspectos sociais, como a promoção de relações justas de trabalho, sobretudo com o avanço das cadeias globais de produção. Mais re-

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centemente, a discussão convergiu para o conceito de sustentabilidade, criado pelo inglês John Elkington, fundador da consultoria SustainAbility, uma das mais conceituadas do mundo nessa área. Para Elkington — e para todos os seus seguidores —, nenhuma empresa é capaz de se perpetuar sem levar em consideração três aspectos: ambiental, social e econômico-financeiro, algo que ficou conhecido como triple bottom line. Para refletir a transformação em curso, o Guia EXAME de Boa Cidadania Corporativa passou por duas mudanças importantes em sua oitava edição. A primeira e mais notória é a de nome. A partir deste ano, o anuário passa a se chamar Guia EXAME de Sustentabilidade. A outra é estrutural — uma nova metodologia elaborada pelo Centro de Estudos em Sustentabilidade (GVces) da Fundação Getulio Vargas de São Paulo, responsável pelo Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE) da Bovespa, que reúne

empresas responsáveis listadas na bolsa. A pesquisa deste ano — na qual se inscreveram 206 companhias de grande e médio porte de todo o país — passou a considerar as mais atuais referências em levantamentos sobre sustentabilidade empresarial em todo o mundo. A análise teve duas etapas. Na primeira, as empresas participantes preencheram um questionário, dividido em quatro partes. Uma delas abordava questões introdutórias sobre compromissos, transparência e governança corporativa (elaboradas pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa — IBGC). As demais tratavam dos aspectos econômicofinanceiro, social e ambiental (neste ano, os critérios da dimensão ambiental receberam ponderações diferentes na avaliação final, dependendo do setor de atuação da empresa e de seu impacto no meio ambiente). As respostas foram analisadas estatisticamente, de modo a excluir empresas que tiveram desempenho abaixo

da média em alguma das dimensões do questionário. “O objetivo foi premiar as empresas que têm bom desempenho nos diversos aspectos da sustentabilidade de maneira equilibrada”, diz Mario Monzoni, coordenador do GVces e da pesquisa do Guia EXAME de Sustentabilidade. Com base nessa análise, uma lista de 32 empresas foi submetida a uma aferição jornalística, na qual foram verificadas as respostas ao questionário. A análise estatística e a aferição jornalística foram as bases para a decisão dos oito membros do Conselho Consultivo, que elegeram as 20 empresas-modelo desta edição (veja quadro). Não se trata de uma lista com empresas perfeitas, mas sim dos melhores exemplos de grandes companhias brasileiras que estão conseguindo adaptar seus negócios aos novos tempos. Em todas elas, a sustentabilidade é tratada como algo a ser constantemente aprimorado. A trajetória de cada uma delas é descrita nas reportagens das páginas a seguir.

O conselho consultivo Especialistas em sustentabilidade responsáveis por apontar as empresas-modelo desta edição

Cláudio Boechat Professor e pesquisador do Núcleo de Sustentabilidade e Responsabilidade Corporativa da Fundação Dom Cabral

Fernando Almeida Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro e presidente executivo do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS)

Helio Mattar Diretor-presidente do Instituto Akatu, ONG que incentiva o consumo consciente

Heloisa Bedicks Secretária-geral do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC)

Pedro Meloni Principal advisor do International Finance Corporation (IFC), ramo do setor privado do Banco Mundial, para a América Latina

Ricardo Young Presidente do Instituto Ethos

Rosa Maria Fischer Professora da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo e diretora do Centro de Empreendedorismo Social e Administração em Terceiro Setor da Fundação Instituto de Administração

Sidnei Basile Diretor-secretário editorial e de relações institucionais do Grupo Abril

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Resultados da pesquisa OK-alta

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Pesquisa resultados

Elas nunca estiveram tão expostas O Guia EXAME de Sustentabilidade 2007, o maior levantamento de responsabilidade corporativa do país, mostra que a prestação de contas das metas sociais e ambientais — assim como das financeiras — das empresas é uma tendência irreversível Cristiane Mano

Usina da Braskem: dona do primeiro plástico produzido com matéria-prima renovável — o etanol — em todo o mundo

As melhores A lista das 20 empresas-modelo desta edição

Accor

Acesita

Amanco

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Aracruz

Arcelor

Basf

Braskem Caterpillar

CPFL

Elektro

IBM

Itaú

Mapfre

Natura

Philips

Promon

Real

Serasa

Suzano

Unilever

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DIVULGAÇÃO

U

m aforismo tradicional do mundo dos negócios diz que é impossível gerenciar o que não se pode medir. A pesquisa realizada para o Guia EXAME de Sustentabilidade 2007 mostra que a próxima fronteira da sustentabilidade dentro das empresas brasileiras é justamente estabelecer objetivos e acompanhar resultados não apenas de aspectos financeiros, como também ambientais e sociais. A era em que o tema estava apenas ligado ao campo das idéias e das boas intenções foi definitivamente solapada — e cada vez mais é preciso se apoiar em sistemas mensuráveis, com metas e análises. O levantamento desta edição aponta que essa é uma tendência inexorável, embora ainda exista um longo caminho a ser percorrido (veja quadro na pág. 16). Um dos indícios mais evidentes de que as empresas buscam quantificar seu desempenho em cada um desses aspectos está na maneira como têm prestado contas de sua postura sustentável nos negócios. Das 206 empresas inscritas na pesquisa, 140 responderam a todo o questionário — apenas esse grupo foi avaliado. A maior parte delas,


Resultados da pesquisa OK-alta

20/11/2007

22:08

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Pesquisa resultados

Elas nunca estiveram tão expostas O Guia EXAME de Sustentabilidade 2007, o maior levantamento de responsabilidade corporativa do país, mostra que a prestação de contas das metas sociais e ambientais — assim como das financeiras — das empresas é uma tendência irreversível Cristiane Mano

Usina da Braskem: dona do primeiro plástico produzido com matéria-prima renovável — o etanol — em todo o mundo

As melhores A lista das 20 empresas-modelo desta edição

Accor

Acesita

Amanco

14 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Aracruz

Arcelor

Basf

Braskem Caterpillar

CPFL

Elektro

IBM

Itaú

Mapfre

Natura

Philips

Promon

Real

Serasa

Suzano

Unilever

2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 15

DIVULGAÇÃO

U

m aforismo tradicional do mundo dos negócios diz que é impossível gerenciar o que não se pode medir. A pesquisa realizada para o Guia EXAME de Sustentabilidade 2007 mostra que a próxima fronteira da sustentabilidade dentro das empresas brasileiras é justamente estabelecer objetivos e acompanhar resultados não apenas de aspectos financeiros, como também ambientais e sociais. A era em que o tema estava apenas ligado ao campo das idéias e das boas intenções foi definitivamente solapada — e cada vez mais é preciso se apoiar em sistemas mensuráveis, com metas e análises. O levantamento desta edição aponta que essa é uma tendência inexorável, embora ainda exista um longo caminho a ser percorrido (veja quadro na pág. 16). Um dos indícios mais evidentes de que as empresas buscam quantificar seu desempenho em cada um desses aspectos está na maneira como têm prestado contas de sua postura sustentável nos negócios. Das 206 empresas inscritas na pesquisa, 140 responderam a todo o questionário — apenas esse grupo foi avaliado. A maior parte delas,


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O retrato da sustentabilidade no país Os principais aspectos do perfil das 140 empresas que preencheram todo o questionário do Guia EXAME de Sustentabilidade 2007

Perto da estratégia Amanco e Itaú também fazem parte do grupo de 46% das empresas que já vêem na sustentabilidade uma oportunidade para o lançamento de produtos e serviços, como mostram as respectivas reportagens das páginas seguintes. A petroquímica Braskem se prepara para lançar comercialmente, a partir de 2009, o primeiro plástico produzido de matéria-prima renovável em todo o mundo. Fruto de um desenvolvimento de quase três décadas, espera-se que o produto à base de etanol tenha um custo de produção inferior ao produzido do petróleo. Esse é um desafio para empresas em todo o mundo, segundo o especialista em estratégia e professor de Harvard Michael Porter. Um dos maiores especialistas em estratégia empresarial da atualidade, Porter defende que o conceito de sustentabilidade — que se apóia nos aspectos ambiental, social e econômico-financeiro — deve ser visto como uma oportuni-

37% Não

Quase um terço de todas e sociais à remuneração

Econômicofinanceira

63%

Social Nenhuma das anteriores

A companhia divulga relatório de sustentabilidade?

28%

85%

Não

31% 31% 14%

dade de negócio e ser levada ao centro da estratégia das companhias (veja entrevista de Porter na pág. 86). De acordo com ele, a montadora japonesa Toyota é um dos melhores exemplos disso. O modelo Prius, lançado em 1997, com motor que funciona à base de um sistema híbrido de eletricidade e gasolina, conseguiu não apenas diminuir a emissão de gases tóxicos como também garantir à montadora uma enorme vantagem competitiva. As empresas também apresentam metas cada vez mais ambiciosas no quesito ecoeficiência, sobretudo no que se refere ao consumo de água e energia. Nesse caso, existe um duplo benefício — tanto a companhia consome menos recursos naturais como reduz custos. Das

empresas participantes do guia, 66% têm metas de redução do consumo de água e 72% no de energia. Na fábrica de alimentos da Unilever, em Goiânia, a maior da companhia em todo o mundo, a corrida por melhorias aparentemente simples — mas contínuas — começa a dar resultados. Nos últimos sete anos, a Unilever vem trocando o óleo combustível que alimenta suas caldeiras de produção de catchup, atomatados e maionese por biomassa. Hoje, 95% do vapor usado nas máquinas deriva da queima de resíduos, como bagaço de cana e lascas de madeira. Um dos resultados imediatos é uma economia anual de 17 milhões de reais. “Nenhuma das outras fábricas da empresa no mundo tem desempenho semelhante”, diz Rogério Rangel, dire-

as empresas participantes do guia — 31% — já relaciona metas ambientais variável de seus principais executivos >>>

Aspectos econômico-financeiros

A política de remuneração de todos os executivos está vinculada ao desempenho nas dimensões:

Ambiental

Sim

16 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Rangel, diretor da Unilever: economia anual de 17 milhões de reais e matriz energética mais limpa

Sustentabilidade e estratégia A companhia tem um comitê de sustentabilidade

Laboratório da Natura: a empresa tem metas ambiciosas de redução das emissões de carbono

DIVULGAÇÃO

neração dos executivos. Uma minoria — equivalente a 31% das participantes — já adotou o modelo. Essa adoção implica um novo padrão cultural. A fabricante de tubos e conexões Amanco, por exemplo, há mais de dois anos faz com que seus executivos mantenham metas ambientais e sociais relacionadas ao bônus anual. Eles já recebem entre 14% e 20% de seu rendimento variável com base nos resultados sociais e ambientais. O Itaú começou neste ano a seguir o mesmo caminho. Os planos do banco são começar o processo pela cúpula e, nos próximos anos, estendê-lo aos demais funcionários.

FRANÇOIS CALIL

72%, publica um relatório de sustentabilidade, sendo que 46% afirmam estabelecer metas de melhoria e prestar contas das definidas anteriormente. O resultado da pesquisa, o maior levantamento de responsabilidade corporativa do país, está longe de apresentar um padrão de comportamento absoluto em todos os quesitos. Até mesmo pela diversidade das companhias participantes. As empresas que fazem parte da pesquisa representam 15 setores — do petroquímico ao varejista. Esse grupo tem representantes de quatro modelos societários distintos: 39% de multinacionais, 30% de companhias brasileiras listadas, 25% de brasileiras de capital fechado e 6% de estatais. O retrato de empresas com perfis tão diferentes permite concluir, porém, que, independentemente do setor ou do modelo de controle, o assunto não está mais restrito a apenas uma área da companhia ou a ações pontuais. As empresas começam a incorporar aspectos ambientais e sociais, por exemplo, em sua gestão de risco nas mais diversas áreas do negócio — tanto no que se refere à própria operação (59%) como na reputação da marca (47%) e mesmo na obtenção de crédito (41%). Boa parte das empresas (63%) também leva as discussões sobre o assunto para um fórum comum a diferentes diretorias em seus comitês de sustentabilidade. Uma das mudanças mais emblemáticas da disposição das empresas em elevar o tema ao mesmo patamar de relevância das informações financeiras é a ligação entre os indicadores relacionados a aspectos ambientais e sociais e a remu-

72% Sim

Caso divulgue, esse relatório: Estabelece metas de melhoria de desempenho e presta conta das metas anteriormente assumidas

46 %

É auditado sob todos os aspectos, por empresa ou instituição independente

27 %

Foi elaborado com a participação livre das partes interessadas e incorpora suas manifestações e avaliações Nenhuma das anteriores

Há um sistema de gestão de riscos que considere aspectos socioambientais de curto, médio e longo prazo? 34% Não

26 % 11 %

66% Sim

Tal sistema prevê a quantificação do risco: 59%

Operacional

57%

Legal De reputação

47%

De mercado

46%

De crédito De liquidez

41%

Existem metodologias que avaliam o impacto da incorporação de aspectos socioambientais nos resultados financeiros da empresa? 41% Sim

59% Não

36%

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Resultados da pesquisa OK-alta

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O retrato da sustentabilidade no país Os principais aspectos do perfil das 140 empresas que preencheram todo o questionário do Guia EXAME de Sustentabilidade 2007

Perto da estratégia Amanco e Itaú também fazem parte do grupo de 46% das empresas que já vêem na sustentabilidade uma oportunidade para o lançamento de produtos e serviços, como mostram as respectivas reportagens das páginas seguintes. A petroquímica Braskem se prepara para lançar comercialmente, a partir de 2009, o primeiro plástico produzido de matéria-prima renovável em todo o mundo. Fruto de um desenvolvimento de quase três décadas, espera-se que o produto à base de etanol tenha um custo de produção inferior ao produzido do petróleo. Esse é um desafio para empresas em todo o mundo, segundo o especialista em estratégia e professor de Harvard Michael Porter. Um dos maiores especialistas em estratégia empresarial da atualidade, Porter defende que o conceito de sustentabilidade — que se apóia nos aspectos ambiental, social e econômico-financeiro — deve ser visto como uma oportuni-

37% Não

Quase um terço de todas e sociais à remuneração

Econômicofinanceira

63%

Social Nenhuma das anteriores

A companhia divulga relatório de sustentabilidade?

28%

85%

Não

31% 31% 14%

dade de negócio e ser levada ao centro da estratégia das companhias (veja entrevista de Porter na pág. 86). De acordo com ele, a montadora japonesa Toyota é um dos melhores exemplos disso. O modelo Prius, lançado em 1997, com motor que funciona à base de um sistema híbrido de eletricidade e gasolina, conseguiu não apenas diminuir a emissão de gases tóxicos como também garantir à montadora uma enorme vantagem competitiva. As empresas também apresentam metas cada vez mais ambiciosas no quesito ecoeficiência, sobretudo no que se refere ao consumo de água e energia. Nesse caso, existe um duplo benefício — tanto a companhia consome menos recursos naturais como reduz custos. Das

empresas participantes do guia, 66% têm metas de redução do consumo de água e 72% no de energia. Na fábrica de alimentos da Unilever, em Goiânia, a maior da companhia em todo o mundo, a corrida por melhorias aparentemente simples — mas contínuas — começa a dar resultados. Nos últimos sete anos, a Unilever vem trocando o óleo combustível que alimenta suas caldeiras de produção de catchup, atomatados e maionese por biomassa. Hoje, 95% do vapor usado nas máquinas deriva da queima de resíduos, como bagaço de cana e lascas de madeira. Um dos resultados imediatos é uma economia anual de 17 milhões de reais. “Nenhuma das outras fábricas da empresa no mundo tem desempenho semelhante”, diz Rogério Rangel, dire-

as empresas participantes do guia — 31% — já relaciona metas ambientais variável de seus principais executivos >>>

Aspectos econômico-financeiros

A política de remuneração de todos os executivos está vinculada ao desempenho nas dimensões:

Ambiental

Sim

16 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Rangel, diretor da Unilever: economia anual de 17 milhões de reais e matriz energética mais limpa

Sustentabilidade e estratégia A companhia tem um comitê de sustentabilidade

Laboratório da Natura: a empresa tem metas ambiciosas de redução das emissões de carbono

DIVULGAÇÃO

neração dos executivos. Uma minoria — equivalente a 31% das participantes — já adotou o modelo. Essa adoção implica um novo padrão cultural. A fabricante de tubos e conexões Amanco, por exemplo, há mais de dois anos faz com que seus executivos mantenham metas ambientais e sociais relacionadas ao bônus anual. Eles já recebem entre 14% e 20% de seu rendimento variável com base nos resultados sociais e ambientais. O Itaú começou neste ano a seguir o mesmo caminho. Os planos do banco são começar o processo pela cúpula e, nos próximos anos, estendê-lo aos demais funcionários.

FRANÇOIS CALIL

72%, publica um relatório de sustentabilidade, sendo que 46% afirmam estabelecer metas de melhoria e prestar contas das definidas anteriormente. O resultado da pesquisa, o maior levantamento de responsabilidade corporativa do país, está longe de apresentar um padrão de comportamento absoluto em todos os quesitos. Até mesmo pela diversidade das companhias participantes. As empresas que fazem parte da pesquisa representam 15 setores — do petroquímico ao varejista. Esse grupo tem representantes de quatro modelos societários distintos: 39% de multinacionais, 30% de companhias brasileiras listadas, 25% de brasileiras de capital fechado e 6% de estatais. O retrato de empresas com perfis tão diferentes permite concluir, porém, que, independentemente do setor ou do modelo de controle, o assunto não está mais restrito a apenas uma área da companhia ou a ações pontuais. As empresas começam a incorporar aspectos ambientais e sociais, por exemplo, em sua gestão de risco nas mais diversas áreas do negócio — tanto no que se refere à própria operação (59%) como na reputação da marca (47%) e mesmo na obtenção de crédito (41%). Boa parte das empresas (63%) também leva as discussões sobre o assunto para um fórum comum a diferentes diretorias em seus comitês de sustentabilidade. Uma das mudanças mais emblemáticas da disposição das empresas em elevar o tema ao mesmo patamar de relevância das informações financeiras é a ligação entre os indicadores relacionados a aspectos ambientais e sociais e a remu-

72% Sim

Caso divulgue, esse relatório: Estabelece metas de melhoria de desempenho e presta conta das metas anteriormente assumidas

46 %

É auditado sob todos os aspectos, por empresa ou instituição independente

27 %

Foi elaborado com a participação livre das partes interessadas e incorpora suas manifestações e avaliações Nenhuma das anteriores

Há um sistema de gestão de riscos que considere aspectos socioambientais de curto, médio e longo prazo? 34% Não

26 % 11 %

66% Sim

Tal sistema prevê a quantificação do risco: 59%

Operacional

57%

Legal De reputação

47%

De mercado

46%

De crédito De liquidez

41%

Existem metodologias que avaliam o impacto da incorporação de aspectos socioambientais nos resultados financeiros da empresa? 41% Sim

59% Não

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Pesquisa resultados tor agrícola da Unilever Brasil. Até o final de 2007, a unidade começará a usar também como biomassa as sementes e as cascas de 6 000 toneladas de tomate que processa por safra.

Efeito multiplicador Há indícios de que as companhias devem cada vez mais evoluir também no que se refere à emissão de gases de efeito estufa — seja no processo produtivo ou em outras etapas de sua atividade, como o transporte de materiais e pessoas. Segundo o levantamento, 40% das empresas realizam hoje um inventário de emissão de gases de efeito estufa — e 32% já possuem metas de redução dessas emissões. A Natura, por exemplo, anunciou que deve neutralizar todas as suas emissões de car-

mudanças práticas é um fenômeno que pode ser observado em todo o mundo. A americana Procter & Gamble, maior indústria de bens de consumo do planeta, estabeleceu em novembro metas de venda para produtos com menos impacto ambiental. Nos próximos cinco anos, a P&G espera que pelo menos 20 bilhões de dólares de suas receitas (o equivalente a um quarto do faturamento atual) venham de produtos com impacto ambiental 10% menor do que os disponíveis anteriormente. A experiência mostra que o acompanhamento dessas metas pode ser uma tarefa tão ou mais difícil que estabelecê-las. Prova disso é que o gigante Wal-Mart adiou a publicação de seu relatório de sustentabilidade previsto para junho deste ano. Segundo reportagem publicada pelo jornal inglês Financial Times, uma primeira versão preliminar desde que anunciou suas ambiciosas metas, em outubro de 2005, foi considerada inadequada por conselheiros independentes. Na época, divulgou, entre outras coisas, que diminuiria 30% da conta de energia elétrica de suas cerca de 2 070 lojas nos Estados Unidos até 2010. Em novembro a companhia finalmente publicou o relatório. “Este relatório é apenas um passo”, disse o presidente mundial, Lee Scott, em sua introdução. Para todas as empresas é também uma demonstração de que prestar contas das metas sociais e ambientais — assim como das financeiras — é uma tendência irreversível.

der esse esforço para a sua cadeia de fornecedores e consultoras. A postura sustentável das empresas brasileiras tem muito espaço para se estender pela cadeia de negócios. A pesquisa mostra que 64% das companhias monitoram o impacto ambiental de sua atividade produtiva — mas apenas 28% analisam a atividade de seus fornecedores no que se refere ao meio ambiente. Quando o assunto é o impacto social, porém, o índice de empresas que avaliam a atuação dos fornecedores chega a 81%. A maior parte delas verifica o cumprimento da legislação trabalhista, sobretudo em relação à existência de trabalho infantil (68%) ou escravo (67%). Um percentual mínimo de empresas (5%) prevê, no entanto, medidas disciplinares e legais para as situações em

bono ainda neste ano em toda a sua cadeia produtiva. Para isso, uma das mudanças promovidas foi a troca dos microônibus movidos a diesel que transportavam funcionários dentro da fábrica, em Cajamar, na Grande São Paulo, por carrinhos movidos a gás natural. O que não for possível reduzir, segundo a empresa, será compensado com o investimento em projetos de reflorestamento e energia renovável. Alguns projetos já foram selecionados nos estados do Pará, Tocantins e Paraná. A intenção, num segundo momento, é esten-

>>>

que os fornecedores não se enquadram nesses indicadores de monitoramento. É um universo restrito composto de empresas como o banco Real, que desde 2005 coloca um prazo de seis meses para que o fornecedor se adapte às normas. Mais recentemente, a Promon passou a tomar a mesma atitude. Neste ano, a empresa começou a enviar auditores a seus fornecedores para verificar as condições de trabalho dos funcionários. A transição de uma abordagem teórica para outra baseada em métricas e

PAUL J. RICHARDS/AFP PHOTO

A transição de uma abordagem teórica para outra baseada em métricas é um fenômeno que pode ser observado em todo o mundo

Loja do Wal-Mart nos Estado Unidos: atraso na publicação de seu primeiro relatório desustentabilidade

Aspecto ambiental (1) A empresa possui uma política corporativa ambiental?

14% Não

86% Sim

Com reportagem de Ana Luiza Herzog, Lílian Cunha e Lucia Kassai

Aspecto social(1)

Em qual etapa do ciclo de vida dos produtos e/ou serviços da empresa existe algum projeto para a redução de impacto ambiental?

A empresa utiliza critérios Caso utilize, esses critérios levam em conta: sociais para qualificação, seleção e monitoramento de seus fornecedores de bens e serviços? Não utilização de trabalho infantil

64 46 45 39 36 31 28 22 9 %

%

Processo Desenvolviprodutivo mento de novos produtos e serviços

%

Fornecedores mais críticos

%

Logística

%

Todos os clientes e consumidores

%

Pósconsumo

%

Todos os fornecedores

%

Principais clientes

%

Nenhuma das anteriores

19% Não

Esses critérios são: 68% 67%

Não utilização de trabalho escravo

51%

81% Sim

Valorização da diversidade e combate a todas as formas de discriminação

31% Incentivo à contratação de médios e pequenos fornecedores

Incluídos como cláusulas contratuais passíveis de monitoramento

60%

Divulgados previamente e de forma transparente nos processos de seleção

64%

Prevêem medidas disciplinares e legais para situações de não enquadramento Nenhuma das anteriores

5% 5%

(1) Segundo as 140 empresas que preencheram todo o questionário do Guia EXAME de Sustentabilidade 2007

18 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

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Pesquisa resultados tor agrícola da Unilever Brasil. Até o final de 2007, a unidade começará a usar também como biomassa as sementes e as cascas de 6 000 toneladas de tomate que processa por safra.

Efeito multiplicador Há indícios de que as companhias devem cada vez mais evoluir também no que se refere à emissão de gases de efeito estufa — seja no processo produtivo ou em outras etapas de sua atividade, como o transporte de materiais e pessoas. Segundo o levantamento, 40% das empresas realizam hoje um inventário de emissão de gases de efeito estufa — e 32% já possuem metas de redução dessas emissões. A Natura, por exemplo, anunciou que deve neutralizar todas as suas emissões de car-

mudanças práticas é um fenômeno que pode ser observado em todo o mundo. A americana Procter & Gamble, maior indústria de bens de consumo do planeta, estabeleceu em novembro metas de venda para produtos com menos impacto ambiental. Nos próximos cinco anos, a P&G espera que pelo menos 20 bilhões de dólares de suas receitas (o equivalente a um quarto do faturamento atual) venham de produtos com impacto ambiental 10% menor do que os disponíveis anteriormente. A experiência mostra que o acompanhamento dessas metas pode ser uma tarefa tão ou mais difícil que estabelecê-las. Prova disso é que o gigante Wal-Mart adiou a publicação de seu relatório de sustentabilidade previsto para junho deste ano. Segundo reportagem publicada pelo jornal inglês Financial Times, uma primeira versão preliminar desde que anunciou suas ambiciosas metas, em outubro de 2005, foi considerada inadequada por conselheiros independentes. Na época, divulgou, entre outras coisas, que diminuiria 30% da conta de energia elétrica de suas cerca de 2 070 lojas nos Estados Unidos até 2010. Em novembro a companhia finalmente publicou o relatório. “Este relatório é apenas um passo”, disse o presidente mundial, Lee Scott, em sua introdução. Para todas as empresas é também uma demonstração de que prestar contas das metas sociais e ambientais — assim como das financeiras — é uma tendência irreversível.

der esse esforço para a sua cadeia de fornecedores e consultoras. A postura sustentável das empresas brasileiras tem muito espaço para se estender pela cadeia de negócios. A pesquisa mostra que 64% das companhias monitoram o impacto ambiental de sua atividade produtiva — mas apenas 28% analisam a atividade de seus fornecedores no que se refere ao meio ambiente. Quando o assunto é o impacto social, porém, o índice de empresas que avaliam a atuação dos fornecedores chega a 81%. A maior parte delas verifica o cumprimento da legislação trabalhista, sobretudo em relação à existência de trabalho infantil (68%) ou escravo (67%). Um percentual mínimo de empresas (5%) prevê, no entanto, medidas disciplinares e legais para as situações em

bono ainda neste ano em toda a sua cadeia produtiva. Para isso, uma das mudanças promovidas foi a troca dos microônibus movidos a diesel que transportavam funcionários dentro da fábrica, em Cajamar, na Grande São Paulo, por carrinhos movidos a gás natural. O que não for possível reduzir, segundo a empresa, será compensado com o investimento em projetos de reflorestamento e energia renovável. Alguns projetos já foram selecionados nos estados do Pará, Tocantins e Paraná. A intenção, num segundo momento, é esten-

>>>

que os fornecedores não se enquadram nesses indicadores de monitoramento. É um universo restrito composto de empresas como o banco Real, que desde 2005 coloca um prazo de seis meses para que o fornecedor se adapte às normas. Mais recentemente, a Promon passou a tomar a mesma atitude. Neste ano, a empresa começou a enviar auditores a seus fornecedores para verificar as condições de trabalho dos funcionários. A transição de uma abordagem teórica para outra baseada em métricas e

PAUL J. RICHARDS/AFP PHOTO

A transição de uma abordagem teórica para outra baseada em métricas é um fenômeno que pode ser observado em todo o mundo

Loja do Wal-Mart nos Estado Unidos: atraso na publicação de seu primeiro relatório desustentabilidade

Aspecto ambiental (1) A empresa possui uma política corporativa ambiental?

14% Não

86% Sim

Com reportagem de Ana Luiza Herzog, Lílian Cunha e Lucia Kassai

Aspecto social(1)

Em qual etapa do ciclo de vida dos produtos e/ou serviços da empresa existe algum projeto para a redução de impacto ambiental?

A empresa utiliza critérios Caso utilize, esses critérios levam em conta: sociais para qualificação, seleção e monitoramento de seus fornecedores de bens e serviços? Não utilização de trabalho infantil

64 46 45 39 36 31 28 22 9 %

%

Processo Desenvolviprodutivo mento de novos produtos e serviços

%

Fornecedores mais críticos

%

Logística

%

Todos os clientes e consumidores

%

Pósconsumo

%

Todos os fornecedores

%

Principais clientes

%

Nenhuma das anteriores

19% Não

Esses critérios são: 68% 67%

Não utilização de trabalho escravo

51%

81% Sim

Valorização da diversidade e combate a todas as formas de discriminação

31% Incentivo à contratação de médios e pequenos fornecedores

Incluídos como cláusulas contratuais passíveis de monitoramento

60%

Divulgados previamente e de forma transparente nos processos de seleção

64%

Prevêem medidas disciplinares e legais para situações de não enquadramento Nenhuma das anteriores

5% 5%

(1) Segundo as 140 empresas que preencheram todo o questionário do Guia EXAME de Sustentabilidade 2007

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CAPINHAS v1

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Empresasmodelo Accor • Acesita • Amanco • Aracruz • Arcelor • Basf • Braskem • Caterpillar • CPFL • Elektro • IBM • Itaú • Mapfre • Natura • Philips • Promon • Real • Serasa • Suzano • Unilever


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Empresa-modelo

Accor

Avaliação da empresa

Da teoria para a prática

Pontos fortes Mantém um programa interno para motivar os funcionários a se dedicar a trabalhos voluntários.

No primeiro dia de trabalho, os funcionários da Accor aprendem que ações relacionadas à sustentabilidade precisam ser incorporadas ao dia-a-dia de suas atividades

Os aspectos socioambientais estão inseridos nas projeções de receitas e despesas da empresa.

Adriana Pereira

a subsidiária brasileira da francesa Accor, uma das maiores empresas de hotelaria e serviços do mundo, todo novo funcionário tem uma espécie de ritual a seguir. No primeiro dia de trabalho, o profissional deve elaborar o que a empresa chama de “contrato de gestão”, um documento que resume os principais objetivos e resultados que ele se propõe a alcançar durante o ano. Além de questões específicas à função do novo empregado, o documento traz as responsabilidades socioambientais assumidas pelo departamento em que ele vai trabalhar: de medidas que a área pretende tomar para reduzir os danos ambientais à implantação e manutenção de programas de inclusão social. O cumprimento do contrato é monitorado pela empresa e seus resultados influenciam diretamente o programa de remuneração variável. “Queremos, sim, que nossos clientes nos reconheçam pelo que fazemos. Mas queremos, em primeiro lugar, que nossos funcionários se sintam engajados, realizados e orgulhosos do que fazem”, diz Firmin António, presidente da Accor no Brasil e diretor-geral da Accor para a América Latina. Em 2006, a Accor patrocinou 92 projetos e ações sociais, com a ajuda de 2 500 funcionários voluntários — 38% mais do que o total mobilizado no ano anterior. Cerca de 45 000 brinquedos e agasalhos foram arrecadados em campanhas internas — 65% mais do que em 2005. Na área de meio ambiente, uma das ações desenvolvidas é o Reci-

22 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Firmin, presidente da Accor, entre crianças do centro de educação infantil criado pela empresa para filhos dos moradores da antiga Favela do Gato, no bairro do Bom Retiro, em São Paulo: do total de 1,5 milhão de reais investido no projeto, 200 000 reais foram doados pelos funcionários

Pontos fracos A política ambiental da empresa não abrange todos os fornecedores.

KIKO FERRITE

N

O relatório de sustentabilidade é auditado, sob todos os aspectos, por uma instituição independente.

clAccor, que incentiva os funcionários a reciclar plásticos e papéis. O dinheiro arrecadado com a reciclagem é investido na compra de produtos, como remédios e cestas básicas, para os empregados da manutenção, limpeza e segurança da própria unidade — desde 2000, o programa beneficia 70 funcionários por ano.

Da porta para fora Para manter essas iniciativas, é preciso mais que trabalho voluntário. No ano passado, a Accor investiu 137 milhões de reais em patrocínios e projetos nas áreas de cultura, educação, saúde e alimentação. Um dos maiores é o Sonho de Criança, desenvolvido pela Ticket, divisão do grupo que atua no mercado de benefícios. Em parce-

ria com a prefeitura de São Paulo, a Ticket construiu um centro de educação infantil para filhos dos moradores da antiga Favela do Gato, no bairro do Bom Retiro, centro da cidade. A iniciativa faz parte de um projeto da prefeitura de urbanização da favela. O espaço construído pela Ticket, com investimento de 1,5 milhão de reais (incluindo 200 000 reais doados pelos funcionários), oferece serviços de creche, educação, lazer e saúde a 240 crianças de até 6 anos. Os benefícios foram estendidos também aos pais das crianças, com a implantação de cursos noturnos de alfabetização, em parceria com a Fundação Bradesco, e de capacitação profissional, com a ajuda do Instituto Dom Bosco. O grande desafio desse projeto é motivar os adultos a encarar um curso suple-

tivo à noite depois de um dia de trabalho. “Temos de ser mais criativos nos modelos educacionais para prender a atenção desse público”, diz Eliane Aere, diretora de recursos humanos da divisão de serviços da Accor. Além de estimular os funcionários a assumir trabalhos voluntários, a Accor está empenhada em convencer os fornecedores a incorporar seus critérios de sustentabilidade. É um aspecto importante porque muitos dos parceiros do grupo têm contato direto com os clientes da Accor. “Não gostaríamos de ter parceiros cujos funcionários são privados de direitos como assistência médica e alimentação”, diz Luiz Edmundo Prestes Rosa, diretor de recursos humanos da Accor América Latina. “A Accor precisa impor seu exemplo.”

Não existe um sistema documentado de gestão de riscos corporativos que considere aspectos socioambientais de curto, médio e longo prazo. O volume de negócios com fornecedores atingidos pelo processo de monitoramento com base em critérios sociais representa menos de 50% do total.

2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 23


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Empresa-modelo

Accor

Avaliação da empresa

Da teoria para a prática

Pontos fortes Mantém um programa interno para motivar os funcionários a se dedicar a trabalhos voluntários.

No primeiro dia de trabalho, os funcionários da Accor aprendem que ações relacionadas à sustentabilidade precisam ser incorporadas ao dia-a-dia de suas atividades

Os aspectos socioambientais estão inseridos nas projeções de receitas e despesas da empresa.

Adriana Pereira

a subsidiária brasileira da francesa Accor, uma das maiores empresas de hotelaria e serviços do mundo, todo novo funcionário tem uma espécie de ritual a seguir. No primeiro dia de trabalho, o profissional deve elaborar o que a empresa chama de “contrato de gestão”, um documento que resume os principais objetivos e resultados que ele se propõe a alcançar durante o ano. Além de questões específicas à função do novo empregado, o documento traz as responsabilidades socioambientais assumidas pelo departamento em que ele vai trabalhar: de medidas que a área pretende tomar para reduzir os danos ambientais à implantação e manutenção de programas de inclusão social. O cumprimento do contrato é monitorado pela empresa e seus resultados influenciam diretamente o programa de remuneração variável. “Queremos, sim, que nossos clientes nos reconheçam pelo que fazemos. Mas queremos, em primeiro lugar, que nossos funcionários se sintam engajados, realizados e orgulhosos do que fazem”, diz Firmin António, presidente da Accor no Brasil e diretor-geral da Accor para a América Latina. Em 2006, a Accor patrocinou 92 projetos e ações sociais, com a ajuda de 2 500 funcionários voluntários — 38% mais do que o total mobilizado no ano anterior. Cerca de 45 000 brinquedos e agasalhos foram arrecadados em campanhas internas — 65% mais do que em 2005. Na área de meio ambiente, uma das ações desenvolvidas é o Reci-

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Firmin, presidente da Accor, entre crianças do centro de educação infantil criado pela empresa para filhos dos moradores da antiga Favela do Gato, no bairro do Bom Retiro, em São Paulo: do total de 1,5 milhão de reais investido no projeto, 200 000 reais foram doados pelos funcionários

Pontos fracos A política ambiental da empresa não abrange todos os fornecedores.

KIKO FERRITE

N

O relatório de sustentabilidade é auditado, sob todos os aspectos, por uma instituição independente.

clAccor, que incentiva os funcionários a reciclar plásticos e papéis. O dinheiro arrecadado com a reciclagem é investido na compra de produtos, como remédios e cestas básicas, para os empregados da manutenção, limpeza e segurança da própria unidade — desde 2000, o programa beneficia 70 funcionários por ano.

Da porta para fora Para manter essas iniciativas, é preciso mais que trabalho voluntário. No ano passado, a Accor investiu 137 milhões de reais em patrocínios e projetos nas áreas de cultura, educação, saúde e alimentação. Um dos maiores é o Sonho de Criança, desenvolvido pela Ticket, divisão do grupo que atua no mercado de benefícios. Em parce-

ria com a prefeitura de São Paulo, a Ticket construiu um centro de educação infantil para filhos dos moradores da antiga Favela do Gato, no bairro do Bom Retiro, centro da cidade. A iniciativa faz parte de um projeto da prefeitura de urbanização da favela. O espaço construído pela Ticket, com investimento de 1,5 milhão de reais (incluindo 200 000 reais doados pelos funcionários), oferece serviços de creche, educação, lazer e saúde a 240 crianças de até 6 anos. Os benefícios foram estendidos também aos pais das crianças, com a implantação de cursos noturnos de alfabetização, em parceria com a Fundação Bradesco, e de capacitação profissional, com a ajuda do Instituto Dom Bosco. O grande desafio desse projeto é motivar os adultos a encarar um curso suple-

tivo à noite depois de um dia de trabalho. “Temos de ser mais criativos nos modelos educacionais para prender a atenção desse público”, diz Eliane Aere, diretora de recursos humanos da divisão de serviços da Accor. Além de estimular os funcionários a assumir trabalhos voluntários, a Accor está empenhada em convencer os fornecedores a incorporar seus critérios de sustentabilidade. É um aspecto importante porque muitos dos parceiros do grupo têm contato direto com os clientes da Accor. “Não gostaríamos de ter parceiros cujos funcionários são privados de direitos como assistência médica e alimentação”, diz Luiz Edmundo Prestes Rosa, diretor de recursos humanos da Accor América Latina. “A Accor precisa impor seu exemplo.”

Não existe um sistema documentado de gestão de riscos corporativos que considere aspectos socioambientais de curto, médio e longo prazo. O volume de negócios com fornecedores atingidos pelo processo de monitoramento com base em critérios sociais representa menos de 50% do total.

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Empresa-modelo

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Acesita

Avaliação da empresa

Lições de negócios

Pontos fortes Tem um programa consistente para melhorar a educação dos funcionários e dos estudantes da região onde está instalada.

A Acesita investe em programa de empresa júnior para estudantes do ensino médio. O desafio da siderúrgica é melhorar a qualificação de sua própria mão-de-obra

Publica um relatório de sustentabilidade, elaborado com a participação dos públicos afetados pelo negócio.

Fátima Péres

urante cinco meses deste ano, o estudante mineiro Fabiano Ferreira dos Santos, da 3a série do ensino médio do colégio Haydée de Souza Abreu, em Timóteo, a 200 quilômetros de Belo Horizonte, experimentou o gostinho de ser dono de um negócio — uma pequena fábrica de cestas artesanais. De maio a setembro, sua empresa produziu 80 cestas, faturou 1 200 reais e obteve 43% de lucro líquido. Mais importante que os números, porém, foi a experiência adquirida. Fabiano e outros 24 estudantes do ensino médio participaram de um projeto de empreendedorismo chamado Junior Achievement, patrocinado pela Acesita, uma das maiores siderúrgicas do país. Os jovens aprenderam noções de como criar, estruturar, administrar e até fechar uma empresa. Funcionários voluntários da Acesita de diversas áreas (recursos humanos, qualidade, marketing, finanças e planejamento) atuaram como instrutores. “Como ponto de partida foi ótimo, pois despertou um espírito empreendedor em todos nós”, diz Santos. “Quando nos formarmos, não vamos pensar somente em procurar emprego. Quem sabe não seremos empresários?” A Junior Achievement é uma instituição sem fins lucrativos criada em 1919, nos Estados Unidos, que atua em 112 países para oferecer aos jovens experiência prática em negócios. A Acesita mantém parceria com a Junior Achievement e patrocina o programa de empresa júnior desde 2003. Em Timóteo, onde está instalada a fábrica da em-

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Demaël, presidente da Acesita, com um grupo de estudantes participantes do programa de empresa júnior: funcionários atuam como instrutores voluntários e ensinam noções de planejamento, marketing e finanças

Pontos fracos Não tem comitê de sustentabilidade ou responsabilidade social estabelecido formalmente.

PEDRO MOTTA

D

Utiliza critérios sociais para a seleção e o monitoramento dos fornecedores.

presa, a iniciativa já beneficiou 216 jovens entre 16 e 18 anos. “O mais importante é que esse trabalho mobiliza toda a comunidade, incluindo pais, escolas e voluntários”, diz Anfilófio Salles Martins, presidente da Fundação Acesita. Única fabricante de aços inoxidáveis da América Latina, a Acesita obteve em 2006 um faturamento recorde de 3,4 bilhões de reais, 10,7% mais que em 2005. Para manter esse bom desempenho, um dos maiores desafios da empresa, que desde 2005 passou a ser controlada pelo grupo europeu ArcelorMittal, é investir na qualificação da mãode-obra. Cerca de 95% dos 3 000 funcionários da fábrica em Timóteo possuem o ensino médio completo. Porém, na Acesita Energética, empresa controlada que fica no Vale do Jequitinhonha, uma

das regiões mais pobres do estado, somente 50% dos 1 000 funcionários têm esse grau de escolaridade. “A expectativa é chegar ao mesmo nível da fábrica em breve, já que o projeto de educação para funcionários foi implementado há dois anos”, diz Rui Santiago, diretor de recursos humanos.

Avaliação de fornecedores Além da educação formal, a empresa investe em programas específicos de treinamento. Em 2006, funcionários de diferentes áreas passaram por quase 156 000 horas de treinamento, o que significou um investimento de 3,6 milhões de reais. “A educação é a base de sustentação para o crescimento da empresa”, diz o francês Jean-Philippe Demaël, presidente da Acesita. Para ele, uma em-

presa com funcionários qualificados contribui também para a melhoria da qualidade de vida da comunidade em que está inserida — Timóteo já é a cidade com o quinto melhor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do estado. Engajada em projetos de responsabilidade social e ambiental — nos quais investiu 7,2 milhões de reais em 2006 —, a Acesita exige a mesma postura de seus parceiros comerciais. Os fornecedores, por exemplo, devem adotar as mesmas práticas dos programas de qualificação dos funcionários e passam por uma auditoria sistemática. O mesmo ocorre com a rede de distribuidores, criada em janeiro deste ano. “Para fazer parte da rede, o distribuidor deve estar afinado com o código de conduta e ética da Acesita”, diz Demaël.

A política de remuneração dos executivos não está atrelada ao desempenho da companhia nas dimensões social e ambiental. Não tem meta de redução do consumo de papel nem um programa estruturado sobre esse tema.

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Avaliação da empresa

Lições de negócios

Pontos fortes Tem um programa consistente para melhorar a educação dos funcionários e dos estudantes da região onde está instalada.

A Acesita investe em programa de empresa júnior para estudantes do ensino médio. O desafio da siderúrgica é melhorar a qualificação de sua própria mão-de-obra

Publica um relatório de sustentabilidade, elaborado com a participação dos públicos afetados pelo negócio.

Fátima Péres

urante cinco meses deste ano, o estudante mineiro Fabiano Ferreira dos Santos, da 3a série do ensino médio do colégio Haydée de Souza Abreu, em Timóteo, a 200 quilômetros de Belo Horizonte, experimentou o gostinho de ser dono de um negócio — uma pequena fábrica de cestas artesanais. De maio a setembro, sua empresa produziu 80 cestas, faturou 1 200 reais e obteve 43% de lucro líquido. Mais importante que os números, porém, foi a experiência adquirida. Fabiano e outros 24 estudantes do ensino médio participaram de um projeto de empreendedorismo chamado Junior Achievement, patrocinado pela Acesita, uma das maiores siderúrgicas do país. Os jovens aprenderam noções de como criar, estruturar, administrar e até fechar uma empresa. Funcionários voluntários da Acesita de diversas áreas (recursos humanos, qualidade, marketing, finanças e planejamento) atuaram como instrutores. “Como ponto de partida foi ótimo, pois despertou um espírito empreendedor em todos nós”, diz Santos. “Quando nos formarmos, não vamos pensar somente em procurar emprego. Quem sabe não seremos empresários?” A Junior Achievement é uma instituição sem fins lucrativos criada em 1919, nos Estados Unidos, que atua em 112 países para oferecer aos jovens experiência prática em negócios. A Acesita mantém parceria com a Junior Achievement e patrocina o programa de empresa júnior desde 2003. Em Timóteo, onde está instalada a fábrica da em-

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Demaël, presidente da Acesita, com um grupo de estudantes participantes do programa de empresa júnior: funcionários atuam como instrutores voluntários e ensinam noções de planejamento, marketing e finanças

Pontos fracos Não tem comitê de sustentabilidade ou responsabilidade social estabelecido formalmente.

PEDRO MOTTA

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Utiliza critérios sociais para a seleção e o monitoramento dos fornecedores.

presa, a iniciativa já beneficiou 216 jovens entre 16 e 18 anos. “O mais importante é que esse trabalho mobiliza toda a comunidade, incluindo pais, escolas e voluntários”, diz Anfilófio Salles Martins, presidente da Fundação Acesita. Única fabricante de aços inoxidáveis da América Latina, a Acesita obteve em 2006 um faturamento recorde de 3,4 bilhões de reais, 10,7% mais que em 2005. Para manter esse bom desempenho, um dos maiores desafios da empresa, que desde 2005 passou a ser controlada pelo grupo europeu ArcelorMittal, é investir na qualificação da mãode-obra. Cerca de 95% dos 3 000 funcionários da fábrica em Timóteo possuem o ensino médio completo. Porém, na Acesita Energética, empresa controlada que fica no Vale do Jequitinhonha, uma

das regiões mais pobres do estado, somente 50% dos 1 000 funcionários têm esse grau de escolaridade. “A expectativa é chegar ao mesmo nível da fábrica em breve, já que o projeto de educação para funcionários foi implementado há dois anos”, diz Rui Santiago, diretor de recursos humanos.

Avaliação de fornecedores Além da educação formal, a empresa investe em programas específicos de treinamento. Em 2006, funcionários de diferentes áreas passaram por quase 156 000 horas de treinamento, o que significou um investimento de 3,6 milhões de reais. “A educação é a base de sustentação para o crescimento da empresa”, diz o francês Jean-Philippe Demaël, presidente da Acesita. Para ele, uma em-

presa com funcionários qualificados contribui também para a melhoria da qualidade de vida da comunidade em que está inserida — Timóteo já é a cidade com o quinto melhor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do estado. Engajada em projetos de responsabilidade social e ambiental — nos quais investiu 7,2 milhões de reais em 2006 —, a Acesita exige a mesma postura de seus parceiros comerciais. Os fornecedores, por exemplo, devem adotar as mesmas práticas dos programas de qualificação dos funcionários e passam por uma auditoria sistemática. O mesmo ocorre com a rede de distribuidores, criada em janeiro deste ano. “Para fazer parte da rede, o distribuidor deve estar afinado com o código de conduta e ética da Acesita”, diz Demaël.

A política de remuneração dos executivos não está atrelada ao desempenho da companhia nas dimensões social e ambiental. Não tem meta de redução do consumo de papel nem um programa estruturado sobre esse tema.

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Empresa-modelo

Amanco

Avaliação da empresa Pontos fortes

Um exercício de eficiência

Mais de 80% da produção vem de processos cobertos por sistemas de gestão ambiental certificados.

Para a subsidiária brasileira da Amanco, reduzir o consumo de água e de outros insumos é uma obrigação que afeta diretamente o bolso de seus executivos

O projeto de gerenciamento dos impactos na vizinhança das unidades fabris inclui reuniões com lideranças comunitárias.

Maurício Oliveira

os anos 90, o bilionário suíço Stephen Schmidheiny criou um conceito que acabaria por redefinir completamente a atividade de milhares de empresas em todo o mundo: ecoeficiência. A idéia, tão sedutora quanto complexa, implica aumentar a produtividade de bens e serviços de uma empresa consumindo menos insumos e gerando menos poluição e lixo — tudo isso ganhando dinheiro. A despeito do ceticismo inicial, Schmidheiny vem usando suas próprias empresas para provar que a ecoeficiência não é um sonho impossível de ser alcançado. Uma de suas melhores vitrines é a subsidiária brasileira da Amanco, fabricante de tubos e conexões, dona das marcas Fortilit e Akros. Entre 2002 e 2006, a Amanco adotou diversas iniciativas em suas quatro fábricas que lhe renderam um ganho em ecoeficiência de mais de 1,2 milhão de dólares. “Toda a nossa estratégia de negócio é desenvolvida para obter resultados não apenas financeiros, mas também sociais e ambientais”, afirma Marcos Bicudo, presidente da Amanco Brasil. Um dos trunfos da empresa é a fábrica de Suape, em Pernambuco, inaugurada em 2005 e que se transformou numa espécie de referência para o grupo. Um sistema compacto de tratamento de efluentes sanitários permite o reúso da água na descarga dos sanitários, na limpeza de pisos e até mesmo na irrigação dos jardins. Toda a energia utilizada na fábrica vem da queima do bagaço de cana. Embora as outras três unidades da

26 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Bicudo, presidente da Amanco, no depósito da empresa: a preocupação com o meio ambiente está presente no desenvolvimento de novos produtos, como na linha de irrigação por microaspersão, que permite a redução do consumo de água em relação ao método convencional

Pontos fracos

FABIANO ACCORSI

N

A política de remuneração variável dos funcionários está atrelada ao desempenho da empresa nos aspectos social e ambiental.

Amanco no país não sejam tão avançadas do ponto de vista tecnológico, todas têm certificação de meio ambiente (ISO 14001), qualidade (ISO 9001) e saúde e segurança no trabalho (OHSAS 18001). Nos últimos quatro anos, graças a essa busca pela eficiência ambiental, o volume de água usado na fabricação de 1 tonelada de tubos caiu, em média, de 1 010 litros para 310 litros (em Suape, o volume é de apenas 90 litros). Hoje, a taxa de reciclagem dos resíduos chega à média de 58%. Apenas o lixo comum é destinado ao aterro sanitário — os demais tipos, como baterias, lâmpadas fluorescentes, óleo usado em máquinas e outros resíduos de processos contaminados, são reciclados, incinerados ou descontaminados. As ações se estendem tam-

bém aos parceiros da empresa. Um exemplo é a aquisição de embalagens de papelão de um fornecedor que utiliza, no processo de fabricação, celulose extraída do bagaço de cana.

Novos produtos A preocupação com o meio ambiente pauta também o desenvolvimento de novos produtos. Um exemplo é a linha para irrigação por microaspersão, lançada em 2003. Essa tecnologia, que consiste em aplicar a água apenas nas raízes das plantas, diminui até 70% o consumo de água, em comparação com o método convencional de irrigação. “Além de contribuir para o futuro do planeta e gerar ganhos importantes para os clientes, estamos obtendo nessa linha uma margem de lucro acima

da média de nossos produtos”, diz Bicudo, sem revelar os números. “É uma típica relação que traz vantagens para todos os lados envolvidos.” Assim como as iniciativas ambientais, as ações sociais da Amanco estão quase sempre integradas ao negócio da empresa. Há um programa nacional de capacitação de instaladores sanitários que a cada ano proporciona qualificação — e melhores perspectivas profissionais — a 40 000 encanadores de todo o país. Essa filosofia de trabalho sustentável influencia diretamente a remuneração dos empregados. Os executivos recebem de 14% a 20% de seu rendimento variável com base nos resultados sociais e ambientais obtidos dentro do respectivo nível de responsabilidade — os percentuais devem crescer a partir deste ano.

Não tem projetos de recuperação e proteção ambiental significativos para manutenção e conservação de espécies de fauna e flora. Adota critérios de desempenho ambiental somente na seleção de fornecedores críticos. A cota de 5% das vagas de trabalho para portadores de deficiência física ainda não foi atingida (está em 2,5%).

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Amanco

Avaliação da empresa Pontos fortes

Um exercício de eficiência

Mais de 80% da produção vem de processos cobertos por sistemas de gestão ambiental certificados.

Para a subsidiária brasileira da Amanco, reduzir o consumo de água e de outros insumos é uma obrigação que afeta diretamente o bolso de seus executivos

O projeto de gerenciamento dos impactos na vizinhança das unidades fabris inclui reuniões com lideranças comunitárias.

Maurício Oliveira

os anos 90, o bilionário suíço Stephen Schmidheiny criou um conceito que acabaria por redefinir completamente a atividade de milhares de empresas em todo o mundo: ecoeficiência. A idéia, tão sedutora quanto complexa, implica aumentar a produtividade de bens e serviços de uma empresa consumindo menos insumos e gerando menos poluição e lixo — tudo isso ganhando dinheiro. A despeito do ceticismo inicial, Schmidheiny vem usando suas próprias empresas para provar que a ecoeficiência não é um sonho impossível de ser alcançado. Uma de suas melhores vitrines é a subsidiária brasileira da Amanco, fabricante de tubos e conexões, dona das marcas Fortilit e Akros. Entre 2002 e 2006, a Amanco adotou diversas iniciativas em suas quatro fábricas que lhe renderam um ganho em ecoeficiência de mais de 1,2 milhão de dólares. “Toda a nossa estratégia de negócio é desenvolvida para obter resultados não apenas financeiros, mas também sociais e ambientais”, afirma Marcos Bicudo, presidente da Amanco Brasil. Um dos trunfos da empresa é a fábrica de Suape, em Pernambuco, inaugurada em 2005 e que se transformou numa espécie de referência para o grupo. Um sistema compacto de tratamento de efluentes sanitários permite o reúso da água na descarga dos sanitários, na limpeza de pisos e até mesmo na irrigação dos jardins. Toda a energia utilizada na fábrica vem da queima do bagaço de cana. Embora as outras três unidades da

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Bicudo, presidente da Amanco, no depósito da empresa: a preocupação com o meio ambiente está presente no desenvolvimento de novos produtos, como na linha de irrigação por microaspersão, que permite a redução do consumo de água em relação ao método convencional

Pontos fracos

FABIANO ACCORSI

N

A política de remuneração variável dos funcionários está atrelada ao desempenho da empresa nos aspectos social e ambiental.

Amanco no país não sejam tão avançadas do ponto de vista tecnológico, todas têm certificação de meio ambiente (ISO 14001), qualidade (ISO 9001) e saúde e segurança no trabalho (OHSAS 18001). Nos últimos quatro anos, graças a essa busca pela eficiência ambiental, o volume de água usado na fabricação de 1 tonelada de tubos caiu, em média, de 1 010 litros para 310 litros (em Suape, o volume é de apenas 90 litros). Hoje, a taxa de reciclagem dos resíduos chega à média de 58%. Apenas o lixo comum é destinado ao aterro sanitário — os demais tipos, como baterias, lâmpadas fluorescentes, óleo usado em máquinas e outros resíduos de processos contaminados, são reciclados, incinerados ou descontaminados. As ações se estendem tam-

bém aos parceiros da empresa. Um exemplo é a aquisição de embalagens de papelão de um fornecedor que utiliza, no processo de fabricação, celulose extraída do bagaço de cana.

Novos produtos A preocupação com o meio ambiente pauta também o desenvolvimento de novos produtos. Um exemplo é a linha para irrigação por microaspersão, lançada em 2003. Essa tecnologia, que consiste em aplicar a água apenas nas raízes das plantas, diminui até 70% o consumo de água, em comparação com o método convencional de irrigação. “Além de contribuir para o futuro do planeta e gerar ganhos importantes para os clientes, estamos obtendo nessa linha uma margem de lucro acima

da média de nossos produtos”, diz Bicudo, sem revelar os números. “É uma típica relação que traz vantagens para todos os lados envolvidos.” Assim como as iniciativas ambientais, as ações sociais da Amanco estão quase sempre integradas ao negócio da empresa. Há um programa nacional de capacitação de instaladores sanitários que a cada ano proporciona qualificação — e melhores perspectivas profissionais — a 40 000 encanadores de todo o país. Essa filosofia de trabalho sustentável influencia diretamente a remuneração dos empregados. Os executivos recebem de 14% a 20% de seu rendimento variável com base nos resultados sociais e ambientais obtidos dentro do respectivo nível de responsabilidade — os percentuais devem crescer a partir deste ano.

Não tem projetos de recuperação e proteção ambiental significativos para manutenção e conservação de espécies de fauna e flora. Adota critérios de desempenho ambiental somente na seleção de fornecedores críticos. A cota de 5% das vagas de trabalho para portadores de deficiência física ainda não foi atingida (está em 2,5%).

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Aracruz

Avaliação da empresa Pontos fortes

Uma relação delicada

É a única empresa florestal no mundo a figurar no Índice Dow Jones de Sustentabilidade, da bolsa de Nova York.

Destaque no mercado financeiro mundial por suas políticas de sustentabilidade, a Aracruz tenta pôr fim aos conflitos com índios e com o MST

Começou a usar os indicadores Global Reporting Initiative (GRI) no relatório de 2006, padronizando e melhorando a prestação de contas da empresa.

Ursula Alonso Manso

o final de agosto, o Ministério da Justiça publicou uma portaria determinando a demarcação de 11 000 hectares de terras indígenas no município de Aracruz, no Espírito Santo. A área era motivo de disputa entre a Aracruz, maior produtora de celulose de eucalipto do mundo, e índios guaranis e tupiniquins. Estudos da Fundação Nacional do Índio (Funai) apontaram que as terras tomadas por eucaliptos da Aracruz eram originalmente ocupadas por índios. A empresa, porém, afirma ter comprado legalmente as terras em 1967. “Tínhamos dois caminhos a seguir depois da decisão do ministério: ir à Justiça ou aceitar a decisão”, diz Carlos Aguiar, presidente da Aracruz. “Escolhemos a segunda opção.” Com a entrega das terras, a Aracruz espera enterrar de vez uma fonte de graves problemas. Em maio de 2005, índios guaranis e tupiniquins invadiram as terras em litígio no Espírito Santo para pleitear a ampliação de sua reserva. Um ano depois, bloquearam a entrada de uma fábrica da Procter & Gamble na Alemanha e pediram que a multinacional suspendesse a compra de celulose da Aracruz. Mas o pior estava por vir. Em dezembro passado, cerca de 200 índios e ativistas do Movimento Rural dos Trabalhadores Sem Terra (MST) paralisaram por dois dias as atividades do Portocel, terminal da Aracruz no Espírito Santo. “O objetivo era pressionar o governo federal a fazer a demarcação das terras”, diz Carlos Alberto Roxo, diretor de sustentabilidade e relações corporativas da Aracruz. Esses percalços causaram algum prejuízo, mas

28 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Aguiar, presidente da Aracruz, em um viveiro de mudas de eucalipto no Espírito Santo: a empresa parte em busca da certificação internacional de suas florestas, passo importante para a conquista de novos clientes no exterior

Adota transparência em relação a multas e autuações que recebeu de órgãos ambientais.

Pontos fracos

ANDRE VALENTIM

N

não abalaram a imagem internacional da Aracruz. Em 2007, a companhia se manteve, pelo terceiro ano seguido, na lista de empresas que compõem o Índice Dow Jones de Sustentabilidade, da Bolsa de Valores de Nova York. O indicador, que reflete as melhores práticas em sustentabilidade corporativa no mundo, é composto de 318 empresas de 24 países, incluindo sete brasileiras — a Aracruz é a única indústria florestal no planeta a figurar no índice. Primeira empresa latino-americana a assumir metas de redução das emissões de gases de efeito estufa, hoje a Aracruz tem um estoque de créditos de carbono de 15 milhões de toneladas. Todas as suas florestas plantadas são certificadas pelo Programa Brasileiro de Certificação Florestal (Cerflor), que atesta a racionalidade no

uso dos recursos florestais. Na Bahia, as florestas da Veracel, uma associação entre a Aracruz e a sueco-finlandesa Stora Enso, já se encontram em processo de obtenção da certificação internacional emitida pelo Forest Stewardship Council (FSC). Em 2008 será a vez de a Aracruz iniciar o processo. “Só não o fizemos antes porque o FSC dá peso às questões sociais e a disputa de terras com os índios atrapalhava”, diz Aguiar. A certificação do FSC é importante e pode ajudar a Aracruz a abrir novos mercados no exterior.

Certificação internacional Virada a página com as comunidades indígenas, a empresa ainda tem o desafio de lidar com o MST. Neste ano, a Aracruz sofreu invasões de

áreas em Prado, na Bahia, e em Eldorado do Sul, no Rio Grande do Sul. “O MST já deixou claro que seu objetivo principal é a luta contra o agronegócio. Pensamos em projetos em conjunto, mas o movimento tem recusado qualquer tipo de cooperação”, diz Roxo. O executivo cita o Produtor Florestal como exemplo de programa que poderia gerar renda para os assentamentos. Hoje, a iniciativa envolve 3 000 pequenos proprietários rurais, que recebem mudas de eucalipto, financiamento, assistência técnica e garantia de compra da madeira. Esses produtores devem fornecer neste ano 12% do suprimento de madeira da Aracruz. “A idéia é que eles respondam por 30% de nossas necessidades no longo prazo”, diz Aguiar.

Apesar de admitir doações a candidatos e partidos na última eleição, não informa, em seu relatório, quais foram os beneficiados. Não possui processos formalmente implementados para erradicar o trabalho infantil. Não tem uma política de valorização da diversidade no quadro de funcionários.

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Aracruz

Avaliação da empresa Pontos fortes

Uma relação delicada

É a única empresa florestal no mundo a figurar no Índice Dow Jones de Sustentabilidade, da bolsa de Nova York.

Destaque no mercado financeiro mundial por suas políticas de sustentabilidade, a Aracruz tenta pôr fim aos conflitos com índios e com o MST

Começou a usar os indicadores Global Reporting Initiative (GRI) no relatório de 2006, padronizando e melhorando a prestação de contas da empresa.

Ursula Alonso Manso

o final de agosto, o Ministério da Justiça publicou uma portaria determinando a demarcação de 11 000 hectares de terras indígenas no município de Aracruz, no Espírito Santo. A área era motivo de disputa entre a Aracruz, maior produtora de celulose de eucalipto do mundo, e índios guaranis e tupiniquins. Estudos da Fundação Nacional do Índio (Funai) apontaram que as terras tomadas por eucaliptos da Aracruz eram originalmente ocupadas por índios. A empresa, porém, afirma ter comprado legalmente as terras em 1967. “Tínhamos dois caminhos a seguir depois da decisão do ministério: ir à Justiça ou aceitar a decisão”, diz Carlos Aguiar, presidente da Aracruz. “Escolhemos a segunda opção.” Com a entrega das terras, a Aracruz espera enterrar de vez uma fonte de graves problemas. Em maio de 2005, índios guaranis e tupiniquins invadiram as terras em litígio no Espírito Santo para pleitear a ampliação de sua reserva. Um ano depois, bloquearam a entrada de uma fábrica da Procter & Gamble na Alemanha e pediram que a multinacional suspendesse a compra de celulose da Aracruz. Mas o pior estava por vir. Em dezembro passado, cerca de 200 índios e ativistas do Movimento Rural dos Trabalhadores Sem Terra (MST) paralisaram por dois dias as atividades do Portocel, terminal da Aracruz no Espírito Santo. “O objetivo era pressionar o governo federal a fazer a demarcação das terras”, diz Carlos Alberto Roxo, diretor de sustentabilidade e relações corporativas da Aracruz. Esses percalços causaram algum prejuízo, mas

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Aguiar, presidente da Aracruz, em um viveiro de mudas de eucalipto no Espírito Santo: a empresa parte em busca da certificação internacional de suas florestas, passo importante para a conquista de novos clientes no exterior

Adota transparência em relação a multas e autuações que recebeu de órgãos ambientais.

Pontos fracos

ANDRE VALENTIM

N

não abalaram a imagem internacional da Aracruz. Em 2007, a companhia se manteve, pelo terceiro ano seguido, na lista de empresas que compõem o Índice Dow Jones de Sustentabilidade, da Bolsa de Valores de Nova York. O indicador, que reflete as melhores práticas em sustentabilidade corporativa no mundo, é composto de 318 empresas de 24 países, incluindo sete brasileiras — a Aracruz é a única indústria florestal no planeta a figurar no índice. Primeira empresa latino-americana a assumir metas de redução das emissões de gases de efeito estufa, hoje a Aracruz tem um estoque de créditos de carbono de 15 milhões de toneladas. Todas as suas florestas plantadas são certificadas pelo Programa Brasileiro de Certificação Florestal (Cerflor), que atesta a racionalidade no

uso dos recursos florestais. Na Bahia, as florestas da Veracel, uma associação entre a Aracruz e a sueco-finlandesa Stora Enso, já se encontram em processo de obtenção da certificação internacional emitida pelo Forest Stewardship Council (FSC). Em 2008 será a vez de a Aracruz iniciar o processo. “Só não o fizemos antes porque o FSC dá peso às questões sociais e a disputa de terras com os índios atrapalhava”, diz Aguiar. A certificação do FSC é importante e pode ajudar a Aracruz a abrir novos mercados no exterior.

Certificação internacional Virada a página com as comunidades indígenas, a empresa ainda tem o desafio de lidar com o MST. Neste ano, a Aracruz sofreu invasões de

áreas em Prado, na Bahia, e em Eldorado do Sul, no Rio Grande do Sul. “O MST já deixou claro que seu objetivo principal é a luta contra o agronegócio. Pensamos em projetos em conjunto, mas o movimento tem recusado qualquer tipo de cooperação”, diz Roxo. O executivo cita o Produtor Florestal como exemplo de programa que poderia gerar renda para os assentamentos. Hoje, a iniciativa envolve 3 000 pequenos proprietários rurais, que recebem mudas de eucalipto, financiamento, assistência técnica e garantia de compra da madeira. Esses produtores devem fornecer neste ano 12% do suprimento de madeira da Aracruz. “A idéia é que eles respondam por 30% de nossas necessidades no longo prazo”, diz Aguiar.

Apesar de admitir doações a candidatos e partidos na última eleição, não informa, em seu relatório, quais foram os beneficiados. Não possui processos formalmente implementados para erradicar o trabalho infantil. Não tem uma política de valorização da diversidade no quadro de funcionários.

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Empresa-modelo

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Arcelor

Avaliação da empresa Pontos fortes

Como produzir mais com menos

Tem programas estruturados para redução do uso de insumos não renováveis. Estende sua política de gestão sustentável aos parceiros, exigindo das empresas contratadas o cumprimento dos padrões internos e o mesmo comprometimento com as causas do meio ambiente, da segurança e da saúde ocupacional.

A ArcelorMittal investe 270 milhões de reais em programas de gestão ambiental e reduz o uso de insumos não renováveis na produção de aço Flávio Viégas

a ArcelorMittal Brasil, braço brasileiro do maior grupo siderúrgico do mundo, a palavra de ordem é produzir mais gastando menos recursos. Em 2006, seu primeiro ano completo de atividade — a empresa foi formada em dezembro de 2005, da integração entre a Belgo, a Companhia Siderúrgica de Tubarão (CST) e a Vega do Sul —, a ArcelorMittal produziu 10,1 milhões de toneladas de aço bruto, 7% mais do que no ano anterior, e obteve uma receita líquida de 14,1 bilhões de reais, crescimento de 5% em relação a 2005. Apesar da forte expansão, graças a investimentos de cerca de 270 milhões de reais em programas de gestão ambiental, a companhia diminuiu o consumo de insumos como água e energia. Além disso, conseguiu reduzir a emissão de gases tóxicos na atmosfera. “Mostramos que é possível, sim, compatibilizar o discurso ecologicamente correto com a prática responsável e sustentável”, diz José Armando de Figueiredo Campos, presidente da empresa. Um dos resultados mais expressivos da ArcelorMittal na área ambiental é o reaproveitamento de 98% dos resíduos industriais — índice muito acima da média do setor siderúrgico, que está em torno de 80%. Durante o processo de produção de aço, a ArcelorMittal gera cerca de 3,7 milhões de toneladas de resíduos (como lama, poei-

32 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Campos, presidente da ArcelorMittal, diante de uma das quatro barcaças utilizadas pela empresa para o transporte de maquinário entre as cidades de Vitória (ES) e São Francisco do Sul (SC): o uso dessas embarcações retira das estradas 290 caminhões, reduzindo a emissão de dióxido de carbono na atmosfera

Pontos fracos Não possui um comitê de sustentabilidade ou de responsabilidade social formalmente estabelecido. Seu relatório de sustentabilidade não é auditado por uma empresa ou instituição independente.

FABIANO ACCORSI

N

Realiza auditorias nas prestadoras de serviços para verificar aspectos contábeis, trabalhistas, tributários, previdenciários e de satisfação dos empregados.

Não tem conselho consultivo instalado.

ra e escória), que são reciclados e usados como matéria-prima em várias aplicações industriais: desde a fabricação de cimento até produtos para a correção de acidez do solo para a agricultura. A venda desses produtos gera receita anual de cerca de 80 milhões de dólares. O mesmo empenho pode ser observado na gestão de recursos hídricos. O índice médio de recirculação de água é de 97%. Ou seja, quase toda a água utilizada nas usinas é tratada e reutilizada, garantindo a ecoeficiência do processo. Além disso, o volume de água utilizado pelas usinas vem diminuindo. “Em 1998, nossas usinas gastavam em média 4,5 metros cúbicos por hora para produzir 1 tonelada de aço. No ano passado, o consumo estava em 3,7 metros cúbicos”, diz Campos. A companhia também tem projetos importantes de redução da emissão de gases causadores do efeito estufa. No ano passado, a CST, uma de suas controladas, tornou-se a primeira siderúrgica do mundo a obter o registro da ONU para a comercialização de créditos de carbono. A CST desenvolve um programa de geração de energia elétrica com o aproveitamento do gás LDG, resultado do processo de produção do aço. Ao longo de dez anos, esse processo evitará a emissão de 500 000 toneladas de dióxido de carbono na atmosfera. Outra iniciativa nessa área é o uso de barcaças para o transporte de maquinários entre as cidades de Vitória, no Espírito Santo, e São Francisco do Sul, em Santa Catarina. Apenas quatro barcaças transportam carga equivalente à de 290 caminhões. Em dez anos, a redução das emissões de dióxido de carbono pode chegar a 3,9 milhões de toneladas.

Educação para todos Além de adotar processos que visam à redução de danos ao meio ambiente, outra frente de atuação da ArcelorMittal são os projetos socioeducacionais, voltados tanto para o público interno quanto para o externo. Esses programas receberam investimento de 28 milhões de reais e beneficiaram mais de 1,5 milhão de pessoas em 2006. Entre as principais iniciativas estão o Programa de Sustentabilidade e Responsabilidade Empresarial (SRE), desenvolvido pela Belgo, que incentiva a adoção de práticas responsáveis entre os fornecedores. Para o presidente da ArcelorMittal, transmitir o conceito de sustentabilidade — não apenas para os empregados, mas para todas as partes interessadas — é uma missão importante para qualquer empresa. “Manter um discurso na mídia e uma prática diferente na gestão é um malabarismo impossível”, afirma Campos. “E é cada vez menor o espaço no mercado para empresas que ignoram essa nova realidade.” 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 33


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Como produzir mais com menos

Tem programas estruturados para redução do uso de insumos não renováveis. Estende sua política de gestão sustentável aos parceiros, exigindo das empresas contratadas o cumprimento dos padrões internos e o mesmo comprometimento com as causas do meio ambiente, da segurança e da saúde ocupacional.

A ArcelorMittal investe 270 milhões de reais em programas de gestão ambiental e reduz o uso de insumos não renováveis na produção de aço Flávio Viégas

a ArcelorMittal Brasil, braço brasileiro do maior grupo siderúrgico do mundo, a palavra de ordem é produzir mais gastando menos recursos. Em 2006, seu primeiro ano completo de atividade — a empresa foi formada em dezembro de 2005, da integração entre a Belgo, a Companhia Siderúrgica de Tubarão (CST) e a Vega do Sul —, a ArcelorMittal produziu 10,1 milhões de toneladas de aço bruto, 7% mais do que no ano anterior, e obteve uma receita líquida de 14,1 bilhões de reais, crescimento de 5% em relação a 2005. Apesar da forte expansão, graças a investimentos de cerca de 270 milhões de reais em programas de gestão ambiental, a companhia diminuiu o consumo de insumos como água e energia. Além disso, conseguiu reduzir a emissão de gases tóxicos na atmosfera. “Mostramos que é possível, sim, compatibilizar o discurso ecologicamente correto com a prática responsável e sustentável”, diz José Armando de Figueiredo Campos, presidente da empresa. Um dos resultados mais expressivos da ArcelorMittal na área ambiental é o reaproveitamento de 98% dos resíduos industriais — índice muito acima da média do setor siderúrgico, que está em torno de 80%. Durante o processo de produção de aço, a ArcelorMittal gera cerca de 3,7 milhões de toneladas de resíduos (como lama, poei-

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Campos, presidente da ArcelorMittal, diante de uma das quatro barcaças utilizadas pela empresa para o transporte de maquinário entre as cidades de Vitória (ES) e São Francisco do Sul (SC): o uso dessas embarcações retira das estradas 290 caminhões, reduzindo a emissão de dióxido de carbono na atmosfera

Pontos fracos Não possui um comitê de sustentabilidade ou de responsabilidade social formalmente estabelecido. Seu relatório de sustentabilidade não é auditado por uma empresa ou instituição independente.

FABIANO ACCORSI

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Realiza auditorias nas prestadoras de serviços para verificar aspectos contábeis, trabalhistas, tributários, previdenciários e de satisfação dos empregados.

Não tem conselho consultivo instalado.

ra e escória), que são reciclados e usados como matéria-prima em várias aplicações industriais: desde a fabricação de cimento até produtos para a correção de acidez do solo para a agricultura. A venda desses produtos gera receita anual de cerca de 80 milhões de dólares. O mesmo empenho pode ser observado na gestão de recursos hídricos. O índice médio de recirculação de água é de 97%. Ou seja, quase toda a água utilizada nas usinas é tratada e reutilizada, garantindo a ecoeficiência do processo. Além disso, o volume de água utilizado pelas usinas vem diminuindo. “Em 1998, nossas usinas gastavam em média 4,5 metros cúbicos por hora para produzir 1 tonelada de aço. No ano passado, o consumo estava em 3,7 metros cúbicos”, diz Campos. A companhia também tem projetos importantes de redução da emissão de gases causadores do efeito estufa. No ano passado, a CST, uma de suas controladas, tornou-se a primeira siderúrgica do mundo a obter o registro da ONU para a comercialização de créditos de carbono. A CST desenvolve um programa de geração de energia elétrica com o aproveitamento do gás LDG, resultado do processo de produção do aço. Ao longo de dez anos, esse processo evitará a emissão de 500 000 toneladas de dióxido de carbono na atmosfera. Outra iniciativa nessa área é o uso de barcaças para o transporte de maquinários entre as cidades de Vitória, no Espírito Santo, e São Francisco do Sul, em Santa Catarina. Apenas quatro barcaças transportam carga equivalente à de 290 caminhões. Em dez anos, a redução das emissões de dióxido de carbono pode chegar a 3,9 milhões de toneladas.

Educação para todos Além de adotar processos que visam à redução de danos ao meio ambiente, outra frente de atuação da ArcelorMittal são os projetos socioeducacionais, voltados tanto para o público interno quanto para o externo. Esses programas receberam investimento de 28 milhões de reais e beneficiaram mais de 1,5 milhão de pessoas em 2006. Entre as principais iniciativas estão o Programa de Sustentabilidade e Responsabilidade Empresarial (SRE), desenvolvido pela Belgo, que incentiva a adoção de práticas responsáveis entre os fornecedores. Para o presidente da ArcelorMittal, transmitir o conceito de sustentabilidade — não apenas para os empregados, mas para todas as partes interessadas — é uma missão importante para qualquer empresa. “Manter um discurso na mídia e uma prática diferente na gestão é um malabarismo impossível”, afirma Campos. “E é cada vez menor o espaço no mercado para empresas que ignoram essa nova realidade.” 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 33


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Empresa-modelo

Basf

Avaliação da empresa Pontos fortes

Na linha de frente

Concentra sua ação socioambiental em iniciativas relacionadas diretamente ao seu sistema de produção.

Em vez de ignorar as cobranças da sociedade, a Basf decidiu redesenhar toda a sua estrutura de produção — e acabou se tornando uma pioneira em seu setor

Estimula a diversidade no quadro de funcionários.

José Alberto Gonçalves

indústria química é um dos setores que mais estão na mira dos ambientalistas. Em 1962, a publicação do livro Primavera Silenciosa, da bióloga americana Rachel Carson, tornou-se um dos manifestos mais célebres do então nascente movimento ambientalista nos Estados Unidos ao revelar dados sobre a morte de pássaros e problemas na saúde humana provocados pelo inseticida DDT, um dos produtos químicos de maior sucesso comercial no século 20. Por quase quatro décadas, indústria química e meio ambiente permaneceram em rota de colisão. Tal oposição, porém, pouco a pouco vai dando lugar a um esforço da indústria para diminuir os impactos ambientais de seus produtos. Na linha de frente dessa batalha está a alemã Basf, que redesenhou suas operações de modo que o conceito de desenvolvimento sustentável passasse a permear todo o ciclo de produção — um movimento intensificado há cerca de dez anos. As diretrizes da matriz são seguidas pela subsidiária brasileira. “Acordamos pela demanda da sociedade. Hoje, sabemos que a preocupação com a sustentabilidade é a chave para o sucesso de uma empresa”, diz Rolf-Dieter Acker, presidente da Basf para a América do Sul. “E também aprendemos a assumir a responsabilidade pelo uso de nossos produtos.” Até a década passada, os fabricantes de agrotóxicos diziam que a intoxicação de agricultores e a contaminação do meio ambiente não eram responsabilidade da indús-

34 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Acker (com uma planta nas mãos), presidente da Basf, com um grupo de funcionários na sede da empresa, em São Paulo: o conceito de desenvolvimento sustentável passou a permear o processo de produção e há um esforço da diretoria para que todos os funcionários incorporem essa cultura no dia-a-dia dos negócios

Pontos fracos DANIELA TOVIANSKY

A

Publica a Demonstração de Valor Adicionado (DVA),um informe contábil que mostra a riqueza gerada pela companhia e sua distribuição na forma de salários, tributos,despesas financeiras,lucros e dividendos.

tria. A Basf preferiu sair da atitude defensiva e, atualmente, desenvolve projetos de capacitação de agricultores e aplicadores. Além disso, monitora o uso adequado de seus produtos — a inspeção abrange, por exemplo, um terço da área total de produção de maçã do Brasil.

Mais eficiência Um dos marcos dessa mudança de postura da companhia foi a criação dos comitês de sustentabilidade — primeiramente no plano global, em 2001, e em seguida nas subsidiárias. O comitê da Basf sul-americana, por exemplo, é composto de oito executivos. Várias idéias surgidas durante as reuniões do comitê transformaram-se em projetos bem-sucedidos. O comitê foi decisivo, por

exemplo, para a formação, em 2003, de um grupo sobre diversidade formado por mulheres, negros, descendentes de orientais e portadores de deficiência que se reuniu durante dois anos e propôs a elaboração de um guia de valorização da diversidade, publicado em 2005. Em 2008, pela primeira vez, a empresa vai realizar um censo entre os funcionários com o objetivo de obter dados para aperfeiçoar a política de diversidade. Nos próximos anos, a operação brasileira pretende intensificar as ações em duas frentes. A primeira delas é a ampliação do alcance de seu programa de eficiência energética. Hoje, o programa tem algumas vulnerabilidades, como a inexistência de metas de redução no uso de combustíveis fósseis. A outra medida é melhorar os

indicadores ambientais do complexo químico de Guaratinguetá, no interior paulista, a maior e mais antiga instalação da multinacional alemã na América do Sul. Formado por 12 fábricas que processam mais de 1 500 produtos, o complexo consome quase três vezes mais água por tonelada produzida que a média do conjunto das demais unidades da Basf no Brasil. Além disso, emite o dobro de gás carbônico. Segundo Odilon Ern, diretor do complexo, os indicadores explicam-se pelo tipo de produtos processados, que demandam mais água e energia. “Mesmo assim, nos últimos dez anos conseguimos diminuir em 78% o consumo de água e em 62% a geração de efluentes por tonelada produzida”, afirma o executivo.

Os aspectos socioambientais não são levados em conta nas projeções de receitas, despesas e custo de capital. Não tem metas para a redução do uso de combustíveis fósseis nos processos industriais. Não possui processos de gestão que visem à eqüidade de tratamento entre funcionários e terceirizados.

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Basf

Avaliação da empresa Pontos fortes

Na linha de frente

Concentra sua ação socioambiental em iniciativas relacionadas diretamente ao seu sistema de produção.

Em vez de ignorar as cobranças da sociedade, a Basf decidiu redesenhar toda a sua estrutura de produção — e acabou se tornando uma pioneira em seu setor

Estimula a diversidade no quadro de funcionários.

José Alberto Gonçalves

indústria química é um dos setores que mais estão na mira dos ambientalistas. Em 1962, a publicação do livro Primavera Silenciosa, da bióloga americana Rachel Carson, tornou-se um dos manifestos mais célebres do então nascente movimento ambientalista nos Estados Unidos ao revelar dados sobre a morte de pássaros e problemas na saúde humana provocados pelo inseticida DDT, um dos produtos químicos de maior sucesso comercial no século 20. Por quase quatro décadas, indústria química e meio ambiente permaneceram em rota de colisão. Tal oposição, porém, pouco a pouco vai dando lugar a um esforço da indústria para diminuir os impactos ambientais de seus produtos. Na linha de frente dessa batalha está a alemã Basf, que redesenhou suas operações de modo que o conceito de desenvolvimento sustentável passasse a permear todo o ciclo de produção — um movimento intensificado há cerca de dez anos. As diretrizes da matriz são seguidas pela subsidiária brasileira. “Acordamos pela demanda da sociedade. Hoje, sabemos que a preocupação com a sustentabilidade é a chave para o sucesso de uma empresa”, diz Rolf-Dieter Acker, presidente da Basf para a América do Sul. “E também aprendemos a assumir a responsabilidade pelo uso de nossos produtos.” Até a década passada, os fabricantes de agrotóxicos diziam que a intoxicação de agricultores e a contaminação do meio ambiente não eram responsabilidade da indús-

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Acker (com uma planta nas mãos), presidente da Basf, com um grupo de funcionários na sede da empresa, em São Paulo: o conceito de desenvolvimento sustentável passou a permear o processo de produção e há um esforço da diretoria para que todos os funcionários incorporem essa cultura no dia-a-dia dos negócios

Pontos fracos DANIELA TOVIANSKY

A

Publica a Demonstração de Valor Adicionado (DVA),um informe contábil que mostra a riqueza gerada pela companhia e sua distribuição na forma de salários, tributos,despesas financeiras,lucros e dividendos.

tria. A Basf preferiu sair da atitude defensiva e, atualmente, desenvolve projetos de capacitação de agricultores e aplicadores. Além disso, monitora o uso adequado de seus produtos — a inspeção abrange, por exemplo, um terço da área total de produção de maçã do Brasil.

Mais eficiência Um dos marcos dessa mudança de postura da companhia foi a criação dos comitês de sustentabilidade — primeiramente no plano global, em 2001, e em seguida nas subsidiárias. O comitê da Basf sul-americana, por exemplo, é composto de oito executivos. Várias idéias surgidas durante as reuniões do comitê transformaram-se em projetos bem-sucedidos. O comitê foi decisivo, por

exemplo, para a formação, em 2003, de um grupo sobre diversidade formado por mulheres, negros, descendentes de orientais e portadores de deficiência que se reuniu durante dois anos e propôs a elaboração de um guia de valorização da diversidade, publicado em 2005. Em 2008, pela primeira vez, a empresa vai realizar um censo entre os funcionários com o objetivo de obter dados para aperfeiçoar a política de diversidade. Nos próximos anos, a operação brasileira pretende intensificar as ações em duas frentes. A primeira delas é a ampliação do alcance de seu programa de eficiência energética. Hoje, o programa tem algumas vulnerabilidades, como a inexistência de metas de redução no uso de combustíveis fósseis. A outra medida é melhorar os

indicadores ambientais do complexo químico de Guaratinguetá, no interior paulista, a maior e mais antiga instalação da multinacional alemã na América do Sul. Formado por 12 fábricas que processam mais de 1 500 produtos, o complexo consome quase três vezes mais água por tonelada produzida que a média do conjunto das demais unidades da Basf no Brasil. Além disso, emite o dobro de gás carbônico. Segundo Odilon Ern, diretor do complexo, os indicadores explicam-se pelo tipo de produtos processados, que demandam mais água e energia. “Mesmo assim, nos últimos dez anos conseguimos diminuir em 78% o consumo de água e em 62% a geração de efluentes por tonelada produzida”, afirma o executivo.

Os aspectos socioambientais não são levados em conta nas projeções de receitas, despesas e custo de capital. Não tem metas para a redução do uso de combustíveis fósseis nos processos industriais. Não possui processos de gestão que visem à eqüidade de tratamento entre funcionários e terceirizados.

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Braskem

Avaliação da empresa Pontos fortes

Questão de sobrevivência

A sustentabilidade norteia todo o trabalho da área de pesquisa e desenvolvimento. Tem um programa para transmitir aos fornecedores os conceitos da empresa e mostrar como toda a cadeia pode se tornar mais sustentável.

Como a petroquímica Braskem colocou a sustentabilidade no centro de sua estratégia de expansão dos negócios Betina Moura

m seus cinco anos de existência, a Braskem, líder do setor petroquímico na América Latina, fez da autonomia tecnológica um dos pilares de seu negócio. O Centro de Tecnologia e Inovação da companhia possui ativos superiores a 330 milhões de reais, realiza investimentos anuais de 50 milhões de reais e tem como uma de suas principais metas desenvolver polímeros verdes de matérias-primas 100% renováveis. O primeiro produto com essa característica está saindo dos tubos de ensaio para o mundo real. Trata-se do primeiro polietileno — plástico comum no dia-a-dia, presente em saquinhos de supermercado e em embalagens de alimentos — feito com etanol de cana-de-açúcar. O início da produção do “plástico verde” em escala industrial está previsto para o final de 2009 e deve atender à demanda de setores como a indústria automobilística, de embalagens alimentícias e de cosméticos e artigos de higiene pessoal. Essa não é a única conquista da área de pesquisa e desenvolvimento da Braskem. Em 2006, a empresa lançou a primeira resina brasileira com nanopartículas — elementos que têm a espessura de um fio de cabelo e garantem aos produtos propriedades físicas superiores, como maiores rigidez e resistência. Graças a novidades como essa, hoje cerca de 20% da receita líquida da Braskem já vem da venda de resinas desenvolvidas nos últimos três anos. “A sustentabilidade está diretamente ligada à rentabilidade e

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Grubisich, presidente da Braskem, com uma amostra de resina obtida do etanol de canade-açúcar, um produto 100% renovável: o primeiro “plástico verde” certificado no mundo vai ser produzido em escala industrial a partir de 2009

Pontos fracos Pouco mais da metade das empresas parceiras é avaliada nos processos de responsabilidade social. Apesar de previstas no código de conduta, não existem políticas corporativas específicas de valorização da diversidade.

LIA LUBAMBO

E

Realiza pesquisas para medir a satisfação dos funcionários quanto à política de remuneração e benefícios.

Cerca de 40% da produção não tem processos de gestão ambiental, de saúde ou de segurança ocupacional certificados.

à competitividade da companhia. Não se trata de projetos isolados, mas de algo intrínseco à nossa estratégia de negócios”, diz José Carlos Grubisich, presidente da empresa. A Braskem nasceu em agosto de 2002, quando os grupos Odebrecht e Mariani integraram seus ativos petroquímicos aos da Copene, antiga central de matérias-primas petroquímicas localizada no pólo de Camaçari, na região metropolitana de Salvador. Em pouco tempo, a empresa transformou-se num gigante. Em 2006, faturou 15 bilhões de reais e gerou 3 400 empregos diretos. Suas 14 fábricas produziram mais de 6 milhões de toneladas de bens petroquímicos no ano. Seus produtos são usados na fabricação de grande variedade de itens de consumo, desde escovas de dentes, mamadeiras e mochilas até esquadrias de janelas e componentes automotivos. A tarefa de administrar tudo isso, com processos de alta complexidade e matérias-primas não-renováveis, levou a Braskem a adotar em seu código de conduta um compromisso com o desenvolvimento sustentável. “Com tantos fatores de risco, precisamos trabalhar de forma ininterrupta pela redução de resíduos e pela conservação de energia”, diz Grubisich.

Difusão de valores Seguindo essas diretrizes, todos os projetos na área de segurança, de saúde e de meio ambiente foram reunidos dentro de um mesmo programa, o Sempre, que recebeu aporte de 153 milhões de reais em 2006, correspondente a 20% do total de investimentos realizados pela empresa. Em seu relatório de sustentabilidade, a Braskem apresenta alguns resultados concretos do programa, como redução de 3% no consumo de energia elétrica e na geração de resíduos sólidos e redução de 2% no consumo de água. Outra iniciativa recente da Braskem foi a criação de uma diretoria de segurança, saúde e meio ambiente. “A finalidade é demonstrar que o assunto é prioritário para nós”, diz Roberto Simões, vice-presidente responsável por competitividade empresarial. Um dos maiores desafios da Braskem agora é fazer com que seus fornecedores de serviços também adotem uma política mais responsável. Para isso, a empresa colocou em prática há um ano o programa Braskem + Parceiros, que tem o objetivo de capacitar seus fornecedores e difundir os valores e processos da petroquímica. No entanto, hoje apenas 52% das empresas parceiras são avaliadas pela Braskem em relação a seus processos de responsabilidade social. “Precisamos ainda permear toda a cadeia com os nossos conceitos”, diz Simões. 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 37


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Braskem

Avaliação da empresa Pontos fortes

Questão de sobrevivência

A sustentabilidade norteia todo o trabalho da área de pesquisa e desenvolvimento. Tem um programa para transmitir aos fornecedores os conceitos da empresa e mostrar como toda a cadeia pode se tornar mais sustentável.

Como a petroquímica Braskem colocou a sustentabilidade no centro de sua estratégia de expansão dos negócios Betina Moura

m seus cinco anos de existência, a Braskem, líder do setor petroquímico na América Latina, fez da autonomia tecnológica um dos pilares de seu negócio. O Centro de Tecnologia e Inovação da companhia possui ativos superiores a 330 milhões de reais, realiza investimentos anuais de 50 milhões de reais e tem como uma de suas principais metas desenvolver polímeros verdes de matérias-primas 100% renováveis. O primeiro produto com essa característica está saindo dos tubos de ensaio para o mundo real. Trata-se do primeiro polietileno — plástico comum no dia-a-dia, presente em saquinhos de supermercado e em embalagens de alimentos — feito com etanol de cana-de-açúcar. O início da produção do “plástico verde” em escala industrial está previsto para o final de 2009 e deve atender à demanda de setores como a indústria automobilística, de embalagens alimentícias e de cosméticos e artigos de higiene pessoal. Essa não é a única conquista da área de pesquisa e desenvolvimento da Braskem. Em 2006, a empresa lançou a primeira resina brasileira com nanopartículas — elementos que têm a espessura de um fio de cabelo e garantem aos produtos propriedades físicas superiores, como maiores rigidez e resistência. Graças a novidades como essa, hoje cerca de 20% da receita líquida da Braskem já vem da venda de resinas desenvolvidas nos últimos três anos. “A sustentabilidade está diretamente ligada à rentabilidade e

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Grubisich, presidente da Braskem, com uma amostra de resina obtida do etanol de canade-açúcar, um produto 100% renovável: o primeiro “plástico verde” certificado no mundo vai ser produzido em escala industrial a partir de 2009

Pontos fracos Pouco mais da metade das empresas parceiras é avaliada nos processos de responsabilidade social. Apesar de previstas no código de conduta, não existem políticas corporativas específicas de valorização da diversidade.

LIA LUBAMBO

E

Realiza pesquisas para medir a satisfação dos funcionários quanto à política de remuneração e benefícios.

Cerca de 40% da produção não tem processos de gestão ambiental, de saúde ou de segurança ocupacional certificados.

à competitividade da companhia. Não se trata de projetos isolados, mas de algo intrínseco à nossa estratégia de negócios”, diz José Carlos Grubisich, presidente da empresa. A Braskem nasceu em agosto de 2002, quando os grupos Odebrecht e Mariani integraram seus ativos petroquímicos aos da Copene, antiga central de matérias-primas petroquímicas localizada no pólo de Camaçari, na região metropolitana de Salvador. Em pouco tempo, a empresa transformou-se num gigante. Em 2006, faturou 15 bilhões de reais e gerou 3 400 empregos diretos. Suas 14 fábricas produziram mais de 6 milhões de toneladas de bens petroquímicos no ano. Seus produtos são usados na fabricação de grande variedade de itens de consumo, desde escovas de dentes, mamadeiras e mochilas até esquadrias de janelas e componentes automotivos. A tarefa de administrar tudo isso, com processos de alta complexidade e matérias-primas não-renováveis, levou a Braskem a adotar em seu código de conduta um compromisso com o desenvolvimento sustentável. “Com tantos fatores de risco, precisamos trabalhar de forma ininterrupta pela redução de resíduos e pela conservação de energia”, diz Grubisich.

Difusão de valores Seguindo essas diretrizes, todos os projetos na área de segurança, de saúde e de meio ambiente foram reunidos dentro de um mesmo programa, o Sempre, que recebeu aporte de 153 milhões de reais em 2006, correspondente a 20% do total de investimentos realizados pela empresa. Em seu relatório de sustentabilidade, a Braskem apresenta alguns resultados concretos do programa, como redução de 3% no consumo de energia elétrica e na geração de resíduos sólidos e redução de 2% no consumo de água. Outra iniciativa recente da Braskem foi a criação de uma diretoria de segurança, saúde e meio ambiente. “A finalidade é demonstrar que o assunto é prioritário para nós”, diz Roberto Simões, vice-presidente responsável por competitividade empresarial. Um dos maiores desafios da Braskem agora é fazer com que seus fornecedores de serviços também adotem uma política mais responsável. Para isso, a empresa colocou em prática há um ano o programa Braskem + Parceiros, que tem o objetivo de capacitar seus fornecedores e difundir os valores e processos da petroquímica. No entanto, hoje apenas 52% das empresas parceiras são avaliadas pela Braskem em relação a seus processos de responsabilidade social. “Precisamos ainda permear toda a cadeia com os nossos conceitos”, diz Simões. 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 37


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Caterpillar

Avaliação da empresa

Aadoção de uma cidade

Pontos fortes Adota critérios de desempenho ambiental e observa o cumprimento da legislação ambiental na seleção de fornecedores de bens e serviços.

Instalada em Piracicaba há três décadas, a Caterpillar liderou a criação de uma agenda de crescimento sustentável para o município

Monitora seus efluentes, que são lançados no rio obedecendo às exigências da legislação.

Guy Corrêa

ma das principais características de uma empresa cidadã é o comprometimento e a integração com a comunidade em que atua. A subsidiária brasileira da americana Caterpillar, uma das maiores fabricantes de tratores e máquinas industriais do mundo, levou essa premissa ao limite. Instalada no município paulista de Piracicaba há mais de três décadas, a empresa liderou, em 1999, o lançamento de um projeto chamado Piracicaba 2010 — Realizando o Futuro. O objetivo era criar uma agenda de desenvolvimento sustentável para a cidade utilizando a experiência da companhia em planejamento estratégico. “Queríamos emprestar nosso modelo de gestão para que o município tivesse mais qualidade de vida”, diz Natal Garcia, presidente da Caterpillar. A iniciativa logo recebeu a adesão de outras empresas, do poder público e de organizações não-governamentais. Pesquisadores e consultores foram contratados para ajudar na elaboração do plano estratégico para a cidade. Em 2001, foi criada uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), a Piracicaba 2010, para cuidar da gestão da agenda de crescimento. Desde então, uma secretaria executiva composta de 12 membros, entre eles três representantes da Caterpillar, coordena duas reuniões mensais para discutir novos projetos de melhoria da cidade. Até hoje foram elaborados 146 projetos nas mais diversas áreas (esporte e lazer, saúde, trânsito, turismo, segurança, meio ambien-

40 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Garcia, presidente da Caterpillar, no rio Piracicaba, onde são lançadas as águas tratadas pela empresa: há três anos, a fabricante de tratores e máquinas industriais passou a reutilizar boa parte da água que consome, diminuindo 85% do volume que compra da rede pública

Pontos fracos

MASAO GOTO FILHO

U

Tem um programa estruturado para ajudar a cidade onde está instalada a se desenvolver.

te e educação). Desses, 119 estão em andamento. Numa pesquisa realizada com 400 habitantes no final de 2006, 82% dos entrevistados avaliaram que a qualidade de vida no município havia melhorado desde 2001. Para 42%, o setor de saúde foi o que mais se desenvolveu — o maior sinal do avanço seria a diminuição nas filas de atendimento no sistema público de saúde. Parte da melhora é atribuída a duas iniciativas da Piracicaba 2010. A primeira delas foi uma campanha de orientação à população para que deixasse de recorrer ao serviço de atendimento urgente em casos sem gravidade, que podem ser solucionados numa rápida consulta em posto de saúde. A outra iniciativa se voltou para o treinamento dos próprios médicos, com o objetivo de dar a eles uma visão mais geral

de seus pacientes, extrapolando suas respectivas especialidades. Assim, os pacientes começaram a ser atendidos por um único médico, evitando a consulta a vários especialistas.

Conservação da água A empresa, que investiu 43 milhões de reais em projetos de responsabilidade social e ambiental em 2006, também está envolvida em outras ações. Desde a inauguração de sua planta industrial, a Caterpillar mantém uma estação de tratamento de efluentes industriais e sanitários que minimiza os impactos no rio Piracicaba, onde são lançadas águas tratadas pela companhia. Há três anos, a empresa passou a reutilizar boa parte da água que consome, o que representou uma redução de

85% no volume de água potável captado da rede pública. A iniciativa rendeu à operação brasileira no ano passado a conquista da distinção máxima no prêmio de excelência ambiental promovido pelo grupo Caterpillar entre suas 109 plantas industriais espalhadas pelo mundo. A água é um recurso natural que vem recebendo grande atenção do grupo. Há dois anos, a Caterpillar mundial doou 12 milhões de dólares à ONG americana The Nature Conservancy (TNC), encarregada de desenvolver atividades para preservar três importantes bacias hidrográficas no mundo: as dos rios Paraná-Paraguai (Brasil), Mississípi (Estados Unidos) e Yang Tsé (China). “Milhões de pessoas serão beneficiadas em nosso país com esse programa”, afirma Garcia.

Não possui na subsidiária brasileira um conselho de administração nem um comitê de sustentabilidade. Não publica relatório financeiro no Brasil. O processo de elaboração do relatório de sustentabilidade não envolve a participação de outras partes interessadas.

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catterpillar - H-alta

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20:43

Empresa-modelo

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Caterpillar

Avaliação da empresa

Aadoção de uma cidade

Pontos fortes Adota critérios de desempenho ambiental e observa o cumprimento da legislação ambiental na seleção de fornecedores de bens e serviços.

Instalada em Piracicaba há três décadas, a Caterpillar liderou a criação de uma agenda de crescimento sustentável para o município

Monitora seus efluentes, que são lançados no rio obedecendo às exigências da legislação.

Guy Corrêa

ma das principais características de uma empresa cidadã é o comprometimento e a integração com a comunidade em que atua. A subsidiária brasileira da americana Caterpillar, uma das maiores fabricantes de tratores e máquinas industriais do mundo, levou essa premissa ao limite. Instalada no município paulista de Piracicaba há mais de três décadas, a empresa liderou, em 1999, o lançamento de um projeto chamado Piracicaba 2010 — Realizando o Futuro. O objetivo era criar uma agenda de desenvolvimento sustentável para a cidade utilizando a experiência da companhia em planejamento estratégico. “Queríamos emprestar nosso modelo de gestão para que o município tivesse mais qualidade de vida”, diz Natal Garcia, presidente da Caterpillar. A iniciativa logo recebeu a adesão de outras empresas, do poder público e de organizações não-governamentais. Pesquisadores e consultores foram contratados para ajudar na elaboração do plano estratégico para a cidade. Em 2001, foi criada uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), a Piracicaba 2010, para cuidar da gestão da agenda de crescimento. Desde então, uma secretaria executiva composta de 12 membros, entre eles três representantes da Caterpillar, coordena duas reuniões mensais para discutir novos projetos de melhoria da cidade. Até hoje foram elaborados 146 projetos nas mais diversas áreas (esporte e lazer, saúde, trânsito, turismo, segurança, meio ambien-

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Garcia, presidente da Caterpillar, no rio Piracicaba, onde são lançadas as águas tratadas pela empresa: há três anos, a fabricante de tratores e máquinas industriais passou a reutilizar boa parte da água que consome, diminuindo 85% do volume que compra da rede pública

Pontos fracos

MASAO GOTO FILHO

U

Tem um programa estruturado para ajudar a cidade onde está instalada a se desenvolver.

te e educação). Desses, 119 estão em andamento. Numa pesquisa realizada com 400 habitantes no final de 2006, 82% dos entrevistados avaliaram que a qualidade de vida no município havia melhorado desde 2001. Para 42%, o setor de saúde foi o que mais se desenvolveu — o maior sinal do avanço seria a diminuição nas filas de atendimento no sistema público de saúde. Parte da melhora é atribuída a duas iniciativas da Piracicaba 2010. A primeira delas foi uma campanha de orientação à população para que deixasse de recorrer ao serviço de atendimento urgente em casos sem gravidade, que podem ser solucionados numa rápida consulta em posto de saúde. A outra iniciativa se voltou para o treinamento dos próprios médicos, com o objetivo de dar a eles uma visão mais geral

de seus pacientes, extrapolando suas respectivas especialidades. Assim, os pacientes começaram a ser atendidos por um único médico, evitando a consulta a vários especialistas.

Conservação da água A empresa, que investiu 43 milhões de reais em projetos de responsabilidade social e ambiental em 2006, também está envolvida em outras ações. Desde a inauguração de sua planta industrial, a Caterpillar mantém uma estação de tratamento de efluentes industriais e sanitários que minimiza os impactos no rio Piracicaba, onde são lançadas águas tratadas pela companhia. Há três anos, a empresa passou a reutilizar boa parte da água que consome, o que representou uma redução de

85% no volume de água potável captado da rede pública. A iniciativa rendeu à operação brasileira no ano passado a conquista da distinção máxima no prêmio de excelência ambiental promovido pelo grupo Caterpillar entre suas 109 plantas industriais espalhadas pelo mundo. A água é um recurso natural que vem recebendo grande atenção do grupo. Há dois anos, a Caterpillar mundial doou 12 milhões de dólares à ONG americana The Nature Conservancy (TNC), encarregada de desenvolver atividades para preservar três importantes bacias hidrográficas no mundo: as dos rios Paraná-Paraguai (Brasil), Mississípi (Estados Unidos) e Yang Tsé (China). “Milhões de pessoas serão beneficiadas em nosso país com esse programa”, afirma Garcia.

Não possui na subsidiária brasileira um conselho de administração nem um comitê de sustentabilidade. Não publica relatório financeiro no Brasil. O processo de elaboração do relatório de sustentabilidade não envolve a participação de outras partes interessadas.

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CPFL - V-alta

20/11/2007

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Empresa-modelo

CPFL

Avaliação da empresa

Energiacontra oefeitoestufa

Pontos fortes Adota critérios de desempenho ambiental na seleção e no desenvolvimento de todos os fornecedores de bens e serviços.

Ao aumentar a produtividade de suas usinas, a CPFL está conseguindo acumular créditos de carbono para financiar seus projetos ambientais

O percentual de aprendizes contratados corresponde a, no mínimo, 5% dos trabalhadores.

Fabrício Marques

aior grupo privado do setor elétrico brasileiro, a paulista CPFL fechou no dia 1o de outubro um negócio com a escocesa SSE Energy que lhe rendeu pouco mais de 1 milhão de reais. A venda, mediada pela americana C-Trade, não teve nada a ver com comercialização, geração e distribuição de energia — principais atividades da empresa. O que a CPFL ofereceu à companhia escocesa foi uma mercadoria quase intangível: um lote de créditos de carbono, certificados emitidos quando uma companhia promove a redução na emissão de gases que causam o efeito estufa. A venda marcou a estréia da CPFL num mercado que está em crescimento acelerado (veja reportagem na pág. 110). “Vamos fechar uma série de negócios como esse nos próximos meses”, diz Wilson Ferreira Júnior, presidente da CPFL. Os certificados vendidos pela CPFL à SSE são o resultado direto da modernização de seis de suas 21 pequenas usinas hidrelétricas, iniciativa que começou no ano 2000. Ao substituir parte do maquinário — um investimento de 95 milhões de reais —, a empresa ganhou produtividade sem causar danos ao meio ambiente. “Bastou trocar as máquinas, que representam cerca de 30% do custo total de uma hidrelétrica nova, para aumentar a capacidade de produção de eletricidade entre 40% e 80%, dependendo do caso”, diz Ferreira Júnior. A CPFL já se prepara para reformar outras cinco hidrelétricas — três

42 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Ferreira Júnior, na central elétrica de Campinas: bastou trocar as máquinas, que representam cerca de 30% do custo total de uma hidrelétrica nova, para aumentar a capacidade de produção de eletricidade em até 80%

Pontos fracos Não tem seguro para degradação ambiental decorrente de acidentes em suas operações. O bônus dos executivos depende apenas do resultado econômico e não está vinculado ao desempenho social e ambiental da companhia. Não tem meta de redução do consumo de papel nem um programa estruturado relacionado a esse assunto. BIÔ BARREIRA

M

Tem um canal confidencial para o recebimento de denúncias ou reclamações sobre assédio moral e sexual.

em São Paulo e duas no Rio Grande do Sul—, que deverão ficar prontas até 2012. Além da modernização de usinas, a companhia deverá acumular créditos com a construção de hidrelétricas que geram energia sem precisar inundar áreas gigantescas. Em 2001, a CPFL começou a construir seis usinas nos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. Três delas já estão em operação, outras duas serão entregues em 12 meses e a última ficará pronta em 2010. Dessas seis usinas, cinco têm boa relação entre potência gerada e área inundada e deverão render créditos de carbono a partir do final deste ano. Nos próximos cinco anos, a CPFL estima que poderá ganhar entre 60 milhões e 70 milhões de euros com a venda de 7 milhões de toneladas de carbono.

Arborização urbana O dinheiro obtido com a venda dos créditos deverá ser integralmente aplicado em projetos ambientais mantidos pela companhia. Um deles é o programa de arborização urbana, que doa anualmente 300 000 mudas a cidades nas quais a CPFL atua. A iniciativa busca estimular o plantio de árvores nativas de cada região sem que isso comprometa o fornecimento de energia elétrica (se elas forem grandes demais ou estiverem mal localizadas, podem encostar na fiação e interromper o fornecimento). “As mudas estão contribuindo para o replantio em lugares que tiveram árvores removidas e também para a substituição de árvores inadequadas”, diz a bióloga Daniela Helena Favaro, coordenadora de meio ambiente da prefeitura de Nova Odessa, no interior paulista. O município recebeu 1 000 mudas para arborização urbana doadas pela CPFL no início deste ano. Aos poucos, a empresa começa a incorporar o conceito da sustentabilidade também em sua sede. Uma novidade é a proposta de substituir parte de sua frota de veículos, com a compra de carros e motocicletas movidos 100% a energia elétrica. Por enquanto, a iniciativa ainda é tímida. Dos milhares de veículos de sua frota total, apenas quatro automóveis e quatro motos dispensam os combustíveis tradicionais. Os demais veículos deverão ser gradativamente substituídos à medida que esses protótipos se tornarem viáveis técnica e economicamente. Além disso, a empresa está construindo um grande espaço de convivência em sua sede, em Campinas, que utiliza materiais e soluções ecologicamente corretos, como placas solares para abastecimento de energia e piso feito de resíduos da indústria siderúrgica. “Buscamos a promoção de uma cultura de sustentabilidade em toda a cadeia de negócios”, diz Ferreira Júnior. 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 43


CPFL - V-alta

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CPFL

Avaliação da empresa

Energiacontra oefeitoestufa

Pontos fortes Adota critérios de desempenho ambiental na seleção e no desenvolvimento de todos os fornecedores de bens e serviços.

Ao aumentar a produtividade de suas usinas, a CPFL está conseguindo acumular créditos de carbono para financiar seus projetos ambientais

O percentual de aprendizes contratados corresponde a, no mínimo, 5% dos trabalhadores.

Fabrício Marques

aior grupo privado do setor elétrico brasileiro, a paulista CPFL fechou no dia 1o de outubro um negócio com a escocesa SSE Energy que lhe rendeu pouco mais de 1 milhão de reais. A venda, mediada pela americana C-Trade, não teve nada a ver com comercialização, geração e distribuição de energia — principais atividades da empresa. O que a CPFL ofereceu à companhia escocesa foi uma mercadoria quase intangível: um lote de créditos de carbono, certificados emitidos quando uma companhia promove a redução na emissão de gases que causam o efeito estufa. A venda marcou a estréia da CPFL num mercado que está em crescimento acelerado (veja reportagem na pág. 110). “Vamos fechar uma série de negócios como esse nos próximos meses”, diz Wilson Ferreira Júnior, presidente da CPFL. Os certificados vendidos pela CPFL à SSE são o resultado direto da modernização de seis de suas 21 pequenas usinas hidrelétricas, iniciativa que começou no ano 2000. Ao substituir parte do maquinário — um investimento de 95 milhões de reais —, a empresa ganhou produtividade sem causar danos ao meio ambiente. “Bastou trocar as máquinas, que representam cerca de 30% do custo total de uma hidrelétrica nova, para aumentar a capacidade de produção de eletricidade entre 40% e 80%, dependendo do caso”, diz Ferreira Júnior. A CPFL já se prepara para reformar outras cinco hidrelétricas — três

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Ferreira Júnior, na central elétrica de Campinas: bastou trocar as máquinas, que representam cerca de 30% do custo total de uma hidrelétrica nova, para aumentar a capacidade de produção de eletricidade em até 80%

Pontos fracos Não tem seguro para degradação ambiental decorrente de acidentes em suas operações. O bônus dos executivos depende apenas do resultado econômico e não está vinculado ao desempenho social e ambiental da companhia. Não tem meta de redução do consumo de papel nem um programa estruturado relacionado a esse assunto. BIÔ BARREIRA

M

Tem um canal confidencial para o recebimento de denúncias ou reclamações sobre assédio moral e sexual.

em São Paulo e duas no Rio Grande do Sul—, que deverão ficar prontas até 2012. Além da modernização de usinas, a companhia deverá acumular créditos com a construção de hidrelétricas que geram energia sem precisar inundar áreas gigantescas. Em 2001, a CPFL começou a construir seis usinas nos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. Três delas já estão em operação, outras duas serão entregues em 12 meses e a última ficará pronta em 2010. Dessas seis usinas, cinco têm boa relação entre potência gerada e área inundada e deverão render créditos de carbono a partir do final deste ano. Nos próximos cinco anos, a CPFL estima que poderá ganhar entre 60 milhões e 70 milhões de euros com a venda de 7 milhões de toneladas de carbono.

Arborização urbana O dinheiro obtido com a venda dos créditos deverá ser integralmente aplicado em projetos ambientais mantidos pela companhia. Um deles é o programa de arborização urbana, que doa anualmente 300 000 mudas a cidades nas quais a CPFL atua. A iniciativa busca estimular o plantio de árvores nativas de cada região sem que isso comprometa o fornecimento de energia elétrica (se elas forem grandes demais ou estiverem mal localizadas, podem encostar na fiação e interromper o fornecimento). “As mudas estão contribuindo para o replantio em lugares que tiveram árvores removidas e também para a substituição de árvores inadequadas”, diz a bióloga Daniela Helena Favaro, coordenadora de meio ambiente da prefeitura de Nova Odessa, no interior paulista. O município recebeu 1 000 mudas para arborização urbana doadas pela CPFL no início deste ano. Aos poucos, a empresa começa a incorporar o conceito da sustentabilidade também em sua sede. Uma novidade é a proposta de substituir parte de sua frota de veículos, com a compra de carros e motocicletas movidos 100% a energia elétrica. Por enquanto, a iniciativa ainda é tímida. Dos milhares de veículos de sua frota total, apenas quatro automóveis e quatro motos dispensam os combustíveis tradicionais. Os demais veículos deverão ser gradativamente substituídos à medida que esses protótipos se tornarem viáveis técnica e economicamente. Além disso, a empresa está construindo um grande espaço de convivência em sua sede, em Campinas, que utiliza materiais e soluções ecologicamente corretos, como placas solares para abastecimento de energia e piso feito de resíduos da indústria siderúrgica. “Buscamos a promoção de uma cultura de sustentabilidade em toda a cadeia de negócios”, diz Ferreira Júnior. 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 43


elektro - H-alta

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Empresa-modelo

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Elektro

Avaliação da empresa Pontos fortes

Auto-estima e cidadania

Possui um comitê responsável pela avaliação de suas ações no campo da sustentabilidade. Promove iniciativas de desenvolvimento sustentável na comunidade do entorno.

Com o projeto Energia Comunitária, a Elektro colabora para a reurbanização de áreas pobres e melhora a qualidade de vida de milhares de pessoas nos municípios onde atua

Apreocupação com a coleta seletiva de lixo e com o uso consciente de energia é disseminada entre os funcionários.

Márcio Sampaio de Castro

esde que assumiu a presidência da distribuidora de energia Elektro, em 2004, o executivo Carlos Ferreira vem tentando colocar a sustentabilidade no centro da estratégia da companhia. Ex-subsidiária da americana Enron, que entrou em concordata em 2001, a Elektro precisava provar para funcionários, investidores e outros stakeholders que não havia sido contaminada pelos desmandos da matriz. Por isso, uma das primeiras medidas de Ferreira foi começar a desenvolver uma série de ações para se aproximar das comunidades onde a Elektro presta seus serviços — 223 cidades do estado de São Paulo e cinco do Mato Grosso do Sul. As iniciativas incluíram a criação de centros de capacitação técnica de jovens, cursos de informática, montagem de bibliotecas e programas de voluntariado desenvolvidos em diversas entidades. “Tenho feito visitas-surpresa às unidades regionais e vou a campo para checar se princípios como segurança no trabalho têm sido observados pelos nossos funcionários”, afirma Ferreira. Entre os vários projetos desenvolvidos atualmente pela Elektro, o que mais tem exigido a atenção de Ferreira é o Energia Comunitária. Lançado como um programa piloto em outubro de 2006, na favela de Maré Mansa, localizada no Guarujá, no litoral paulista, o projeto nasceu da necessidade da empresa de se aproximar da comunidade local para combater os desperdícios e os riscos causados pelos “gatos” — ligações elé-

44 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Ferreira, presidente da Elektro, na sede da associação de bairro da comunidade Maré Mansa, no Guarujá (SP): em troca da regularização de ligações elétricas clandestinas, a distribuidora de energia doou geladeiras novas e mais econômicas, criou áreas de lazer e ajudou a reurbanizar a favela

Pontos fracos Nos últimos três anos, sofreu sanções administrativas decorrentes da infração de normas de defesa do consumidor. KIKO FERRITE

D

tricas clandestinas. O primeiro passo foi procurar o apoio das lideranças comunitárias, que poderiam facilitar o contato com os moradores da área. Em pouco tempo, a idéia foi ganhando corpo e a Elektro pôde realizar a troca das instalações elétricas nas ruas e dentro das casas. Além disso, a empresa forneceu aos moradores cerca de 200 geladeiras novas para substituir os modelos mais antigos, que gastam mais energia. A troca dos refrigeradores resultou numa economia média de 77% de energia por mês. A empresa providenciou também a reforma da associação de bairro, que abriga uma creche, a criação de uma área de lazer e a formação de 60 eletricistas residenciais. Os investimentos na comunidade Maré Mansa atingiram 650 000 reais e benefi-

ciaram 600 famílias. Para o líder comunitário Jailton Santos, o fato de a Maré Mansa ter sido “adotada” pela Elektro ajudou a elevar a auto-estima dos moradores. “As pessoas passaram a acreditar que as coisas poderiam realmente mudar”, diz Santos. “Não nos vemos mais como uma favela, mas sim como uma comunidade.”

Combate ao desperdício Apoiado no sucesso do programa piloto, o Energia Comunitária está sendo estendido agora para outras áreas carentes de cidades como Itanhaém, Limeira, Mongaguá e Ubatuba. A meta é beneficiar mais de 12 000 famílias até o final de 2007. Até agora os investimentos chegam a 10 milhões de reais. Parte dos recursos cumpre os requisitos

do programa de eficiência energética, regulamentado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). O programa determina que as empresas de energia destinem 1% da receita operacional líquida a ações de combate ao desperdício. Apesar do empenho e dos avanços, a Elektro, como todas as empresas, ainda apresenta vulnerabilidades. Recentemente, a companhia recorreu à Justiça para não precisar cumprir a cota legal de preenchimento de 5% de seu quadro funcional com pessoas portadoras de deficiência. A alegação é que, além de um número significativo de seus empregados exercer funções de risco, ela não tem conseguido preencher as eventuais vagas com portadores de deficiência por falta de qualificação ou interesse de candidatos.

Não conseguiu criar mecanismos satisfatórios para atrair uma boa quantidade de pessoas com necessidades especiais para seu quadro funcional. Os aspectos socioambientais não estão inseridos quantitativamente nas projeções de receitas e do custo de capital.

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elektro - H-alta

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Empresa-modelo

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Elektro

Avaliação da empresa Pontos fortes

Auto-estima e cidadania

Possui um comitê responsável pela avaliação de suas ações no campo da sustentabilidade. Promove iniciativas de desenvolvimento sustentável na comunidade do entorno.

Com o projeto Energia Comunitária, a Elektro colabora para a reurbanização de áreas pobres e melhora a qualidade de vida de milhares de pessoas nos municípios onde atua

Apreocupação com a coleta seletiva de lixo e com o uso consciente de energia é disseminada entre os funcionários.

Márcio Sampaio de Castro

esde que assumiu a presidência da distribuidora de energia Elektro, em 2004, o executivo Carlos Ferreira vem tentando colocar a sustentabilidade no centro da estratégia da companhia. Ex-subsidiária da americana Enron, que entrou em concordata em 2001, a Elektro precisava provar para funcionários, investidores e outros stakeholders que não havia sido contaminada pelos desmandos da matriz. Por isso, uma das primeiras medidas de Ferreira foi começar a desenvolver uma série de ações para se aproximar das comunidades onde a Elektro presta seus serviços — 223 cidades do estado de São Paulo e cinco do Mato Grosso do Sul. As iniciativas incluíram a criação de centros de capacitação técnica de jovens, cursos de informática, montagem de bibliotecas e programas de voluntariado desenvolvidos em diversas entidades. “Tenho feito visitas-surpresa às unidades regionais e vou a campo para checar se princípios como segurança no trabalho têm sido observados pelos nossos funcionários”, afirma Ferreira. Entre os vários projetos desenvolvidos atualmente pela Elektro, o que mais tem exigido a atenção de Ferreira é o Energia Comunitária. Lançado como um programa piloto em outubro de 2006, na favela de Maré Mansa, localizada no Guarujá, no litoral paulista, o projeto nasceu da necessidade da empresa de se aproximar da comunidade local para combater os desperdícios e os riscos causados pelos “gatos” — ligações elé-

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Ferreira, presidente da Elektro, na sede da associação de bairro da comunidade Maré Mansa, no Guarujá (SP): em troca da regularização de ligações elétricas clandestinas, a distribuidora de energia doou geladeiras novas e mais econômicas, criou áreas de lazer e ajudou a reurbanizar a favela

Pontos fracos Nos últimos três anos, sofreu sanções administrativas decorrentes da infração de normas de defesa do consumidor. KIKO FERRITE

D

tricas clandestinas. O primeiro passo foi procurar o apoio das lideranças comunitárias, que poderiam facilitar o contato com os moradores da área. Em pouco tempo, a idéia foi ganhando corpo e a Elektro pôde realizar a troca das instalações elétricas nas ruas e dentro das casas. Além disso, a empresa forneceu aos moradores cerca de 200 geladeiras novas para substituir os modelos mais antigos, que gastam mais energia. A troca dos refrigeradores resultou numa economia média de 77% de energia por mês. A empresa providenciou também a reforma da associação de bairro, que abriga uma creche, a criação de uma área de lazer e a formação de 60 eletricistas residenciais. Os investimentos na comunidade Maré Mansa atingiram 650 000 reais e benefi-

ciaram 600 famílias. Para o líder comunitário Jailton Santos, o fato de a Maré Mansa ter sido “adotada” pela Elektro ajudou a elevar a auto-estima dos moradores. “As pessoas passaram a acreditar que as coisas poderiam realmente mudar”, diz Santos. “Não nos vemos mais como uma favela, mas sim como uma comunidade.”

Combate ao desperdício Apoiado no sucesso do programa piloto, o Energia Comunitária está sendo estendido agora para outras áreas carentes de cidades como Itanhaém, Limeira, Mongaguá e Ubatuba. A meta é beneficiar mais de 12 000 famílias até o final de 2007. Até agora os investimentos chegam a 10 milhões de reais. Parte dos recursos cumpre os requisitos

do programa de eficiência energética, regulamentado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). O programa determina que as empresas de energia destinem 1% da receita operacional líquida a ações de combate ao desperdício. Apesar do empenho e dos avanços, a Elektro, como todas as empresas, ainda apresenta vulnerabilidades. Recentemente, a companhia recorreu à Justiça para não precisar cumprir a cota legal de preenchimento de 5% de seu quadro funcional com pessoas portadoras de deficiência. A alegação é que, além de um número significativo de seus empregados exercer funções de risco, ela não tem conseguido preencher as eventuais vagas com portadores de deficiência por falta de qualificação ou interesse de candidatos.

Não conseguiu criar mecanismos satisfatórios para atrair uma boa quantidade de pessoas com necessidades especiais para seu quadro funcional. Os aspectos socioambientais não estão inseridos quantitativamente nas projeções de receitas e do custo de capital.

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IBM - H-alta

20/11/2007

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Empresa-modelo

IBM

Avaliação da empresa

Tecnologia comapelosocial

Pontos fortes Incorpora a prática do voluntariado ao dia-a-dia de seus funcionários. Monitora seu consumo de recursos naturais, como água e energia elétrica, e tem metas de redução.

A IBM incentiva o uso da capacidade ociosa de computadores em pesquisas voltadas para a saúde e o meio ambiente Gustavo Magaldi

ma das grandes dificuldades encontradas por instituições científicas é a falta de computadores poderosos, capazes de processar os complexos cálculos utilizados no desenvolvimento de pesquisas. A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), do Rio de Janeiro, conseguiu driblar esse problema — pelo menos em um de seus mais importantes projetos de pesquisa. No ano passado, a instituição conseguiu que seu estudo comparativo de genomas recebesse o apoio do World Community Grid, um programa de responsabilidade social da IBM criado para acelerar a conclusão de estudos científicos relacionados à saúde humana e ao meio ambiente. O programa funciona da seguinte forma: por meio de uma tecnologia conhecida como computação em grade, é possível aproveitar a capacidade ociosa de computadores pessoais ligados em rede para realizar cálculos e projeções complexas. Com isso, os cientistas da Fiocruz contaram com o apoio virtual de cerca de 330 000 microcomputadores espalhados pelo mundo. “A tecnologia da IBM poupa anos de pesquisa e por isso é importante que o maior número possível de computadores participe da rede”, diz Wim Degrave, coordenador do projeto de comparação de genomas da Fiocruz. Essa foi a primeira pesquisa fora dos Estados Unidos — e a quarta em todo o mundo — que recebeu o apoio do World Community Grid. O estudo da Fiocruz pôde ser concluído em apenas oito meses, em julho deste ano. Não fosse a par-

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Oliveira, presidente da IBM latino-americana, em um laboratório de informática: iniciativa da empresa de estimular o compartilhamento do tempo ocioso de computadores pessoais no mundo inteiro permitiu que um estudo de genomas da Fiocruz, que levaria vários anos, fosse realizado em apenas oito meses

Pontos fracos

KIKO FERRITE

U

A política de remuneração é avaliada pelos funcionários por meio de pesquisas.

ceria com a IBM, levaria vários anos. A pesquisa comparou os mais de 400 genomas já identificados no mundo. Agora, os resultados devem ser aplicados na elaboração de novas estratégias para o controle de parasitas e doenças infecciosas e para o tratamento de males degenerativos, como o Alzheimer.

Ações voluntárias O sucesso do programa da IBM se deve, em boa parte, à sua simplicidade. Qualquer pessoa, de qualquer país, pode participar do World Community Grid. Basta ter um computador de configuração simples — de qualquer marca — e conexão com a internet para baixar um software no site da comunidade. Quando o software detecta que a má-

quina não está sendo usada, executa automaticamente os cálculos. “Ao longo da vida útil, os computadores pessoais não usam 10% de sua capacidade de processamento. A IBM pensou num modo de aproveitar essa capacidade ociosa para que as pessoas pudessem colaborar com pesquisas em benefício da humanidade”, diz Rogério Oliveira, presidente da IBM para a América Latina. Atualmente, o Brasil é o sexto país em número de internautas que aderiram à iniciativa da IBM — cerca de 4 500 pessoas. O World Community Grid tem custo anual de 1,5 milhão de dólares para a IBM. Para estimular os funcionários a participar de ações voluntárias, a IBM criou o programa On Demand Community (Comunidade sob Encomenda). O funcionário que completa 40 horas

de trabalho voluntário no período de cinco meses pode requerer à companhia uma contribuição social para a entidade que apóia. Atualmente, mais de 1 500 profissionais da IBM Brasil — 15% de sua força de trabalho — participam do programa e já contribuíram com mais de 35 000 horas de trabalho voluntário para cerca de uma centena de instituições. Apesar da preocupação com os impactos sociais de suas ações, a IBM sofre de um problema comum às empresas brasileiras: a dificuldade em conseguir trazer a diversidade para seu quadro de funcionários. Atualmente, profissionais negros ou pardos ocupam menos de 10% dos cargos de gerência, e os portadores de deficiência não alcançam o mínimo de 5% previsto por lei.

Não publica a Demonstração de Valor Adicionado (DVA), um informe contábil que mostra a riqueza gerada pela companhia e sua distribuição na forma de salários, tributos, despesas financeiras, lucros e dividendos. Não elabora relatório de sustentabilidade em português. Apenas os fornecedores críticos — os que podem afetar diretamente os produtos da IBM — são avaliados com base em critérios socioambientais.

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IBM - H-alta

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Empresa-modelo

IBM

Avaliação da empresa

Tecnologia comapelosocial

Pontos fortes Incorpora a prática do voluntariado ao dia-a-dia de seus funcionários. Monitora seu consumo de recursos naturais, como água e energia elétrica, e tem metas de redução.

A IBM incentiva o uso da capacidade ociosa de computadores em pesquisas voltadas para a saúde e o meio ambiente Gustavo Magaldi

ma das grandes dificuldades encontradas por instituições científicas é a falta de computadores poderosos, capazes de processar os complexos cálculos utilizados no desenvolvimento de pesquisas. A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), do Rio de Janeiro, conseguiu driblar esse problema — pelo menos em um de seus mais importantes projetos de pesquisa. No ano passado, a instituição conseguiu que seu estudo comparativo de genomas recebesse o apoio do World Community Grid, um programa de responsabilidade social da IBM criado para acelerar a conclusão de estudos científicos relacionados à saúde humana e ao meio ambiente. O programa funciona da seguinte forma: por meio de uma tecnologia conhecida como computação em grade, é possível aproveitar a capacidade ociosa de computadores pessoais ligados em rede para realizar cálculos e projeções complexas. Com isso, os cientistas da Fiocruz contaram com o apoio virtual de cerca de 330 000 microcomputadores espalhados pelo mundo. “A tecnologia da IBM poupa anos de pesquisa e por isso é importante que o maior número possível de computadores participe da rede”, diz Wim Degrave, coordenador do projeto de comparação de genomas da Fiocruz. Essa foi a primeira pesquisa fora dos Estados Unidos — e a quarta em todo o mundo — que recebeu o apoio do World Community Grid. O estudo da Fiocruz pôde ser concluído em apenas oito meses, em julho deste ano. Não fosse a par-

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Oliveira, presidente da IBM latino-americana, em um laboratório de informática: iniciativa da empresa de estimular o compartilhamento do tempo ocioso de computadores pessoais no mundo inteiro permitiu que um estudo de genomas da Fiocruz, que levaria vários anos, fosse realizado em apenas oito meses

Pontos fracos

KIKO FERRITE

U

A política de remuneração é avaliada pelos funcionários por meio de pesquisas.

ceria com a IBM, levaria vários anos. A pesquisa comparou os mais de 400 genomas já identificados no mundo. Agora, os resultados devem ser aplicados na elaboração de novas estratégias para o controle de parasitas e doenças infecciosas e para o tratamento de males degenerativos, como o Alzheimer.

Ações voluntárias O sucesso do programa da IBM se deve, em boa parte, à sua simplicidade. Qualquer pessoa, de qualquer país, pode participar do World Community Grid. Basta ter um computador de configuração simples — de qualquer marca — e conexão com a internet para baixar um software no site da comunidade. Quando o software detecta que a má-

quina não está sendo usada, executa automaticamente os cálculos. “Ao longo da vida útil, os computadores pessoais não usam 10% de sua capacidade de processamento. A IBM pensou num modo de aproveitar essa capacidade ociosa para que as pessoas pudessem colaborar com pesquisas em benefício da humanidade”, diz Rogério Oliveira, presidente da IBM para a América Latina. Atualmente, o Brasil é o sexto país em número de internautas que aderiram à iniciativa da IBM — cerca de 4 500 pessoas. O World Community Grid tem custo anual de 1,5 milhão de dólares para a IBM. Para estimular os funcionários a participar de ações voluntárias, a IBM criou o programa On Demand Community (Comunidade sob Encomenda). O funcionário que completa 40 horas

de trabalho voluntário no período de cinco meses pode requerer à companhia uma contribuição social para a entidade que apóia. Atualmente, mais de 1 500 profissionais da IBM Brasil — 15% de sua força de trabalho — participam do programa e já contribuíram com mais de 35 000 horas de trabalho voluntário para cerca de uma centena de instituições. Apesar da preocupação com os impactos sociais de suas ações, a IBM sofre de um problema comum às empresas brasileiras: a dificuldade em conseguir trazer a diversidade para seu quadro de funcionários. Atualmente, profissionais negros ou pardos ocupam menos de 10% dos cargos de gerência, e os portadores de deficiência não alcançam o mínimo de 5% previsto por lei.

Não publica a Demonstração de Valor Adicionado (DVA), um informe contábil que mostra a riqueza gerada pela companhia e sua distribuição na forma de salários, tributos, despesas financeiras, lucros e dividendos. Não elabora relatório de sustentabilidade em português. Apenas os fornecedores críticos — os que podem afetar diretamente os produtos da IBM — são avaliados com base em critérios socioambientais.

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Empresa-modelo

Itaú

Avaliação da empresa

Aplicação com duplo retorno

Pontos fortes O conceito de sustentabilidade está incorporado ao desenvolvimento de produtos e serviços. Capacita, periodicamente, todos os profissionais envolvidos no financiamento de projetos de gerenciamento de riscos socioambientais.

O Itaú lança o primeiro fundo de investimento que permite ao correntista contribuir para neutralizar os gases que destroem a camada de ozônio Lucia Kassai

possível fazer investimentos rentáveis e, de quebra, ajudar no combate ao aquecimento global? Para o banco Itaú, sim. No final de agosto, a instituição lançou o primeiro fundo de investimento do país que permite ao correntista aplicar recursos e, ao mesmo tempo, compensar as emissões de gases causadores do efeito estufa. Batizado de Itaú Renda Fixa Ecomudança, o fundo exige aplicação mínima inicial de 10 000 reais e cobra taxa de administração de 3,5% ao ano. Do total que o banco arrecadar na gestão do fundo, 30% serão destinados a ações ambientais que reduzam a quantidade de dióxido de carbono no ar, principal responsável pelo aquecimento global. “Um produto não é bom se não for rentável para o investidor. Ele precisa aliar os dois conceitos para ser verdadeiramente sustentável”, diz Roberto Setúbal, presidente do Itaú. De acordo com uma espécie de “calculadora verde” que o Itaú colocou em seu site à disposição do investidor, uma pessoa que mora sozinha, dirige um carro a álcool, recicla o lixo e faz duas viagens de avião por ano (uma nacional e uma internacional) emite anualmente 4 446 quilos de dióxido de carbono. Para neutralizar essas emissões, ela teria de plantar 30 árvores — ou então investir parte de seus recursos no fundo Ecomudança. “Com essa iniciativa queremos instigar nossos correntistas a refletir sobre o tema da sustentabilidade e do desperdício”, diz Antonio Matias, vice-presidente de marketing e coordenador de responsabilidade socioambiental do banco.

50 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Setúbal (ao fundo, apoiado na mesa) com diretores do banco Itaú: desde o ano passado, todos os pedidos de empréstimo acima de 5 milhões de reais devem passar não somente pela análise de crédito mas também pelo crivo socioambiental

Pontos fracos A taxa de rotatividade de funcionários, de 15,2%, é o dobro da média do mercado. LIA LUBAMBO

É

Tem compromisso formal com a valorização da diversidade de seu quadro de funcionários.

Essa reflexão está cada vez mais incorporada aos negócios do Itaú, que, só no ano passado, destinou 110 milhões de reais a projetos sociais e culturais. O Itaú é um dos bancos signatários dos Princípios do Equador, conjunto de exigências socioambientais aplicadas na concessão de financiamento de grandes projetos. Estabelecidos em 2003, esses princípios tiveram uma revisão no ano passado, quando os principais bancos internacionais anunciaram a redução do valor dos projetos que deverão atender às recomendações socioambientais, de 50 milhões para 10 milhões de dólares. O Itaú decidiu ir além e baixou esse valor para 5 milhões de reais. Assim, todos os pedidos de empréstimo acima desse valor devem passar não somente pela análise de crédito mas tam-

bém pelo crivo socioambiental. Se o candidato não cumprir os requisitos de sustentabilidade, o financiamento é negado — como já aconteceu com uma empresa que se recusou a dar tratamento adequado aos resíduos que produzia. Em 2006, o Itaú concedeu empréstimos no total de 3 bilhões de reais sob essas condições.

Lição de casa Se exige que seus clientes tenham um comportamento socioambiental exemplar, o Itaú também tem procurado fazer a lição de casa. Em 1993, encomendou móveis de madeira certificada de reflorestamento para todas as suas agências no Brasil. Da mesa dos gerentes aos guichês dos caixas, tudo foi substituído. Desde então, várias

outras mudanças foram implementadas. Atualmente, os holerites são impressos em papel reciclado e os copinhos de plástico do escritório foram substituídos por copos feitos com aparas de plástico — embora mais caros, são ecologicamente corretos. Além disso, a remuneração dos executivos começa a ser atrelada também a metas de desempenho social e ambiental. Esse processo será iniciado pela cúpula e deverá ser estendido aos demais funcionários nos próximos anos. Para Setúbal, não existe estratégia de negócio de médio ou longo prazo sem essa conscientização. “A sustentabilidade econômica, social e ambiental tem tudo a ver com o futuro de qualquer empresa. É uma forma de ver o negócio de maneira integrada e mais equilibrada”, diz ele.

Em seu balanço social, não informa o número de demitidos nem o de funcionários terceirizados em 2006. Apesar de vender produtos que ajudam a combater o aquecimento global, o banco não tem metas definidas para sua emissão de gases de efeito estufa.

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Itaú

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Aplicação com duplo retorno

Pontos fortes O conceito de sustentabilidade está incorporado ao desenvolvimento de produtos e serviços. Capacita, periodicamente, todos os profissionais envolvidos no financiamento de projetos de gerenciamento de riscos socioambientais.

O Itaú lança o primeiro fundo de investimento que permite ao correntista contribuir para neutralizar os gases que destroem a camada de ozônio Lucia Kassai

possível fazer investimentos rentáveis e, de quebra, ajudar no combate ao aquecimento global? Para o banco Itaú, sim. No final de agosto, a instituição lançou o primeiro fundo de investimento do país que permite ao correntista aplicar recursos e, ao mesmo tempo, compensar as emissões de gases causadores do efeito estufa. Batizado de Itaú Renda Fixa Ecomudança, o fundo exige aplicação mínima inicial de 10 000 reais e cobra taxa de administração de 3,5% ao ano. Do total que o banco arrecadar na gestão do fundo, 30% serão destinados a ações ambientais que reduzam a quantidade de dióxido de carbono no ar, principal responsável pelo aquecimento global. “Um produto não é bom se não for rentável para o investidor. Ele precisa aliar os dois conceitos para ser verdadeiramente sustentável”, diz Roberto Setúbal, presidente do Itaú. De acordo com uma espécie de “calculadora verde” que o Itaú colocou em seu site à disposição do investidor, uma pessoa que mora sozinha, dirige um carro a álcool, recicla o lixo e faz duas viagens de avião por ano (uma nacional e uma internacional) emite anualmente 4 446 quilos de dióxido de carbono. Para neutralizar essas emissões, ela teria de plantar 30 árvores — ou então investir parte de seus recursos no fundo Ecomudança. “Com essa iniciativa queremos instigar nossos correntistas a refletir sobre o tema da sustentabilidade e do desperdício”, diz Antonio Matias, vice-presidente de marketing e coordenador de responsabilidade socioambiental do banco.

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Setúbal (ao fundo, apoiado na mesa) com diretores do banco Itaú: desde o ano passado, todos os pedidos de empréstimo acima de 5 milhões de reais devem passar não somente pela análise de crédito mas também pelo crivo socioambiental

Pontos fracos A taxa de rotatividade de funcionários, de 15,2%, é o dobro da média do mercado. LIA LUBAMBO

É

Tem compromisso formal com a valorização da diversidade de seu quadro de funcionários.

Essa reflexão está cada vez mais incorporada aos negócios do Itaú, que, só no ano passado, destinou 110 milhões de reais a projetos sociais e culturais. O Itaú é um dos bancos signatários dos Princípios do Equador, conjunto de exigências socioambientais aplicadas na concessão de financiamento de grandes projetos. Estabelecidos em 2003, esses princípios tiveram uma revisão no ano passado, quando os principais bancos internacionais anunciaram a redução do valor dos projetos que deverão atender às recomendações socioambientais, de 50 milhões para 10 milhões de dólares. O Itaú decidiu ir além e baixou esse valor para 5 milhões de reais. Assim, todos os pedidos de empréstimo acima desse valor devem passar não somente pela análise de crédito mas tam-

bém pelo crivo socioambiental. Se o candidato não cumprir os requisitos de sustentabilidade, o financiamento é negado — como já aconteceu com uma empresa que se recusou a dar tratamento adequado aos resíduos que produzia. Em 2006, o Itaú concedeu empréstimos no total de 3 bilhões de reais sob essas condições.

Lição de casa Se exige que seus clientes tenham um comportamento socioambiental exemplar, o Itaú também tem procurado fazer a lição de casa. Em 1993, encomendou móveis de madeira certificada de reflorestamento para todas as suas agências no Brasil. Da mesa dos gerentes aos guichês dos caixas, tudo foi substituído. Desde então, várias

outras mudanças foram implementadas. Atualmente, os holerites são impressos em papel reciclado e os copinhos de plástico do escritório foram substituídos por copos feitos com aparas de plástico — embora mais caros, são ecologicamente corretos. Além disso, a remuneração dos executivos começa a ser atrelada também a metas de desempenho social e ambiental. Esse processo será iniciado pela cúpula e deverá ser estendido aos demais funcionários nos próximos anos. Para Setúbal, não existe estratégia de negócio de médio ou longo prazo sem essa conscientização. “A sustentabilidade econômica, social e ambiental tem tudo a ver com o futuro de qualquer empresa. É uma forma de ver o negócio de maneira integrada e mais equilibrada”, diz ele.

Em seu balanço social, não informa o número de demitidos nem o de funcionários terceirizados em 2006. Apesar de vender produtos que ajudam a combater o aquecimento global, o banco não tem metas definidas para sua emissão de gases de efeito estufa.

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Empresa-modelo

Mapfre

Avaliação da empresa Pontos fortes

Prevenção no longo prazo

Utiliza critérios sociais para qualificação, seleção e monitoramento de seus fornecedores de bens e serviços.

O projeto de segurança viária da Mapfre atinge 2,5 milhões de alunos da rede pública estadual paulista e vira referência em educação de trânsito

Possui um sistema de gestão de riscos corporativos que considera aspectos socioambientais de curto, médio e longo prazos.

Everton Vasconcelos

epois de realizar um trabalho escolar, no início de 2005, um grupo de alunos da Escola Estadual Hortência Quintino de Faria Botelho, em Mongaguá, no litoral sul paulista, mobilizou-se para fazer um abaixo-assinado e pedir à prefeitura que construa uma ciclovia na estrada que corta a cidade, a rodovia Padre Manoel da Nóbrega. A proposta, destinada a reduzir o número de acidentes com ciclistas que trafegam no acostamento da rodovia, recebeu o apoio de mais de 1 000 moradores. A prefeitura decidiu atender ao pedido e, no ano passado, construiu 8 do total de 11 quilômetros de ciclovia previstos no projeto. Ainda não há estatísticas sobre o impacto da obra na redução de acidentes, mas quem passa pela região nota a diferença no ordenamento do trânsito. “Houve uma sensível melhora no fluxo de veículos e na segurança”, afirma João Martins dos Anjos, diretor do serviço de trânsito de Mongaguá. A escola de Mongaguá é uma das 5 000 instituições de ensino fundamental e médio da rede pública estadual que participam do projeto Educação Viária é Vital, o maior programa de conscientização viária do Brasil e um dos maiores do mundo em número de pessoas atingidas. Lançado há três anos pela Mapfre Seguros, o projeto treina professores de escolas públicas para que eles conscientizem seus alunos da importância da prevenção de acidentes nas estradas. Até agora, especialistas em educação de trânsito capacitaram cerca de 61 000 professores, que, por

52 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Santos, presidente da Mapfre, com crianças participantes de projeto de educação no trânsito: carreta percorre escolas para promover atividades lúdicas e mostrar na prática os conceitos de segurança viária discutidos em sala de aula

Pontos fracos

MASAO GOTO FILHO

D

Realiza campanhas de economia de água e energia elétrica entre os funcionários.

sua vez, orientaram 2,5 milhões de alunos. No final de cada semestre letivo, as escolas participantes do programa apresentam propostas para melhorar o sistema viário em suas regiões. Os dez melhores projetos — como o dos estudantes de Mongaguá — são premiados pela seguradora.

Pista certa Segundo o executivo Antonio Cássio dos Santos, presidente da Mapfre, muitas pessoas se mostram surpresas com o fato de a empresa investir em uma ação educativa voltada para um público que não é consumidor de produtos da seguradora. “Isso pouco importa para nós neste momento. Quanto maior a consciência dos cidadãos sobre suas responsabilidades e seus direitos no trânsi-

to, seja como pedestre, seja como motorista, menores serão os números de sinistros e os custos dos seguros”, diz ele. Neste ano, a empresa lançou outro projeto, batizado de Na Pista Certa, que também investe em educação no trânsito para crianças. Uma carreta de 12 metros de comprimento, transportando uma cidade cenográfica do tamanho de uma quadra de basquete, percorre as escolas atendidas pelo projeto Educação Viária. Nessa minicidade, os alunos têm chance de se divertir e de colocar em prática os conceitos discutidos em sala de aula. Os projetos de segurança viária, saúde e meio ambiente da Mapfre custaram à empresa 2,4 milhões de reais neste ano. A previsão é que em 2008 os investimentos cheguem a 4 milhões de reais.

O sucesso das iniciativas da Mapfre traduzse hoje em mais de 25 parceiros públicos e privados. Um deles é o Consórcio Alumínio do Maranhão (Alumar), que estudava uma forma de reduzir o alto número de acidentes na rodovia BR-135, única ligação da ilha de São Luís com o restante do estado, e pediu ajuda à Fundação Mapfre, em 2006. A instituição forneceu, então, o material didático do projeto Educação Viária. Desde o ano passado, foram capacitados mais de 200 professores de 36 escolas no entorno da BR-135, totalizando quase 17 000 alunos. “O processo de conscientização, embora seja demorado, é o mais eficaz para reduzir acidentes”, diz Graça Abreu, coordenadora de projetos comunitários da Alumar.

Apenas 11 funcionários (menos de 0,5% do total) são portadores de deficiência. Conforme prevê a legislação, empresas com mais de 1 000 funcionários devem reservar pelo menos 5% das vagas para profissionais com deficiência. Menos de 20% do material usado pela empresa é proveniente de reciclagem. Não existe plano de sucessão formalizado para o atual presidente da diretoria executiva.

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Mapfre

Avaliação da empresa Pontos fortes

Prevenção no longo prazo

Utiliza critérios sociais para qualificação, seleção e monitoramento de seus fornecedores de bens e serviços.

O projeto de segurança viária da Mapfre atinge 2,5 milhões de alunos da rede pública estadual paulista e vira referência em educação de trânsito

Possui um sistema de gestão de riscos corporativos que considera aspectos socioambientais de curto, médio e longo prazos.

Everton Vasconcelos

epois de realizar um trabalho escolar, no início de 2005, um grupo de alunos da Escola Estadual Hortência Quintino de Faria Botelho, em Mongaguá, no litoral sul paulista, mobilizou-se para fazer um abaixo-assinado e pedir à prefeitura que construa uma ciclovia na estrada que corta a cidade, a rodovia Padre Manoel da Nóbrega. A proposta, destinada a reduzir o número de acidentes com ciclistas que trafegam no acostamento da rodovia, recebeu o apoio de mais de 1 000 moradores. A prefeitura decidiu atender ao pedido e, no ano passado, construiu 8 do total de 11 quilômetros de ciclovia previstos no projeto. Ainda não há estatísticas sobre o impacto da obra na redução de acidentes, mas quem passa pela região nota a diferença no ordenamento do trânsito. “Houve uma sensível melhora no fluxo de veículos e na segurança”, afirma João Martins dos Anjos, diretor do serviço de trânsito de Mongaguá. A escola de Mongaguá é uma das 5 000 instituições de ensino fundamental e médio da rede pública estadual que participam do projeto Educação Viária é Vital, o maior programa de conscientização viária do Brasil e um dos maiores do mundo em número de pessoas atingidas. Lançado há três anos pela Mapfre Seguros, o projeto treina professores de escolas públicas para que eles conscientizem seus alunos da importância da prevenção de acidentes nas estradas. Até agora, especialistas em educação de trânsito capacitaram cerca de 61 000 professores, que, por

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Santos, presidente da Mapfre, com crianças participantes de projeto de educação no trânsito: carreta percorre escolas para promover atividades lúdicas e mostrar na prática os conceitos de segurança viária discutidos em sala de aula

Pontos fracos

MASAO GOTO FILHO

D

Realiza campanhas de economia de água e energia elétrica entre os funcionários.

sua vez, orientaram 2,5 milhões de alunos. No final de cada semestre letivo, as escolas participantes do programa apresentam propostas para melhorar o sistema viário em suas regiões. Os dez melhores projetos — como o dos estudantes de Mongaguá — são premiados pela seguradora.

Pista certa Segundo o executivo Antonio Cássio dos Santos, presidente da Mapfre, muitas pessoas se mostram surpresas com o fato de a empresa investir em uma ação educativa voltada para um público que não é consumidor de produtos da seguradora. “Isso pouco importa para nós neste momento. Quanto maior a consciência dos cidadãos sobre suas responsabilidades e seus direitos no trânsi-

to, seja como pedestre, seja como motorista, menores serão os números de sinistros e os custos dos seguros”, diz ele. Neste ano, a empresa lançou outro projeto, batizado de Na Pista Certa, que também investe em educação no trânsito para crianças. Uma carreta de 12 metros de comprimento, transportando uma cidade cenográfica do tamanho de uma quadra de basquete, percorre as escolas atendidas pelo projeto Educação Viária. Nessa minicidade, os alunos têm chance de se divertir e de colocar em prática os conceitos discutidos em sala de aula. Os projetos de segurança viária, saúde e meio ambiente da Mapfre custaram à empresa 2,4 milhões de reais neste ano. A previsão é que em 2008 os investimentos cheguem a 4 milhões de reais.

O sucesso das iniciativas da Mapfre traduzse hoje em mais de 25 parceiros públicos e privados. Um deles é o Consórcio Alumínio do Maranhão (Alumar), que estudava uma forma de reduzir o alto número de acidentes na rodovia BR-135, única ligação da ilha de São Luís com o restante do estado, e pediu ajuda à Fundação Mapfre, em 2006. A instituição forneceu, então, o material didático do projeto Educação Viária. Desde o ano passado, foram capacitados mais de 200 professores de 36 escolas no entorno da BR-135, totalizando quase 17 000 alunos. “O processo de conscientização, embora seja demorado, é o mais eficaz para reduzir acidentes”, diz Graça Abreu, coordenadora de projetos comunitários da Alumar.

Apenas 11 funcionários (menos de 0,5% do total) são portadores de deficiência. Conforme prevê a legislação, empresas com mais de 1 000 funcionários devem reservar pelo menos 5% das vagas para profissionais com deficiência. Menos de 20% do material usado pela empresa é proveniente de reciclagem. Não existe plano de sucessão formalizado para o atual presidente da diretoria executiva.

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Empresa-modelo

Natura

Avaliação da empresa Pontos fortes

Um teste de resistência

O programa de neutralização de carbono é considerado um dos mais eficazes por especialistas. Tem parceria com comunidades da Amazônia e da Bahia, que são treinadas para fazer o extrativismo sustentado de produtos como a castanha.

Pioneira em sustentabilidade no Brasil, a Natura tem agora o desafio de voltar a crescer apoiada em seus velhos valores Lílian Cunha

oucas empresas brasileiras têm a preocupação com a sustentabilidade gravada em seu DNA desde o nascimento. A fabricante de cosméticos Natura, fundada em 1969, é um dos raros exemplos — e, naquele tempo, conceitos como “responsabilidade social” e “sustentabilidade” nem sequer haviam sido definidos formalmente. Desde então, a empresa vem construindo sua marca como uma companhia empenhada em questões socioambientais. Neste ano, ela anunciou duas medidas que reforçam essa postura. Uma delas foi a total eliminação de testes em cobaias — uma prática que era motivo de fortes críticas de entidades que atuam em defesa dos animais. A outra foi o lançamento do projeto de redução de gases geradores do efeito estufa em sua cadeia produtiva. “Essas duas iniciativas eram sonhos antigos, que a Natura conseguiu realizar neste ano”, diz Alessandro Carlucci, presidente da empresa. A primeira iniciativa é a ponta-de-lança de uma mudança mais radical que a Natura vem promovendo em sua linha de produtos. Além de abolir testes em animais, ela está, aos poucos, mudando as fórmulas de seus cosméticos. Saem de cena os ingredientes animais e minerais (provenientes do petróleo) e entram matérias-primas vegetais. Os sabonetes foram a primeira linha de produtos a passar por essa mudança, em 2005, num processo que a companhia chama de “vegetalização”. O sebo de boi, a matéria-prima mais usada, foi substituído por óleos vegetais. “Quando o

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Carlucci, presidente da Natura, em um carro movido a gás natural utilizado para o transporte de funcionários dentro da fábrica, em Cajamar (SP): a substituição do microônibus a diesel foi uma das medidas adotadas pela fabricante de cosméticos para reduzir a emissão de gases causadores do efeito estufa

Pontos fracos

FABIANO ACCORSI

P

Baniu o uso de testes em animais em 100% de sua linha de produtos.

consumidor perceber que, em vez de tomar banho com sebo de boi, terá óleos vegetais, é claro que ele dará preferência ao sabonete vegetalizado”, diz Carlucci. Embora a empresa esteja fazendo investimentos em pesquisa para que a troca de materiais não interfira na aparência, na cor e no cheiro dos produtos, algumas mudanças serão inevitáveis. O preço dos cosméticos, segundo o próprio Carlucci, deve subir, embora ainda não seja possível estimar quanto. “Ainda estamos mensurando e tentando mitigar esse impacto.” Apesar do risco, especialistas acreditam que a marca se fortalecerá com essa iniciativa. “Certamente, os clientes da Natura de menor poder aquisitivo vão se afastar num primeiro momento”, afirma a analista Diana Litewski, da corretora carioca Ati-

va. “Mas os consumidores mais esclarecidos vão se manter fiéis e novos clientes passarão a consumir a marca devido às ações de sustentabilidade.”

Neutralização do carbono Para reforçar essa imagem, a empresa aposta também no projeto Carbono Neutro. A idéia é reduzir ao mínimo as emissões de gases geradores do efeito estufa em toda a cadeia produtiva. Para alcançar o objetivo, a Natura trabalha em várias frentes: trocou os microônibus a diesel que transportavam funcionários dentro da fábrica, em Cajamar, na Grande São Paulo, por carrinhos movidos a gás natural; substituiu o álcool utilizado nas fórmulas de perfumes por álcool orgânico (produzido sem agrotóxicos ou quei-

madas) e está intensificando o uso de material reciclado nos frascos. Para a Natura, é vital que essas iniciativas tragam resultados positivos — não só para sua imagem mas também para suas finanças. Depois de décadas de crescimento acelerado, pela primeira vez a empresa está passando por dificuldades. Nos primeiros nove meses deste ano, o lucro caiu mais de 5% em relação ao mesmo período de 2006. Recentemente, um grupo de funcionários da fábrica da Natura ameaçou entrar em greve. Os empregados reclamavam do excesso de trabalho e reivindicavam aumento de salários. “A situação agora está estável. A Natura manteve todos os canais de diálogo abertos com o sindicato”, diz Carlucci.

Embora não divulgue os custos do programa de neutralização de carbono, a empresa admite tratar-se de um investimento que vai ser repassado aos preços ao consumidor. Ainda é muito dependente de matérias-primas oriundas do petróleo.A linha de cremes para a pele,por exemplo, continuará a usar componentes minerais. Os funcionários reivindicam aumento salarial e se queixam de metas de produtividade difíceis de alcançar.

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Natura

Avaliação da empresa Pontos fortes

Um teste de resistência

O programa de neutralização de carbono é considerado um dos mais eficazes por especialistas. Tem parceria com comunidades da Amazônia e da Bahia, que são treinadas para fazer o extrativismo sustentado de produtos como a castanha.

Pioneira em sustentabilidade no Brasil, a Natura tem agora o desafio de voltar a crescer apoiada em seus velhos valores Lílian Cunha

oucas empresas brasileiras têm a preocupação com a sustentabilidade gravada em seu DNA desde o nascimento. A fabricante de cosméticos Natura, fundada em 1969, é um dos raros exemplos — e, naquele tempo, conceitos como “responsabilidade social” e “sustentabilidade” nem sequer haviam sido definidos formalmente. Desde então, a empresa vem construindo sua marca como uma companhia empenhada em questões socioambientais. Neste ano, ela anunciou duas medidas que reforçam essa postura. Uma delas foi a total eliminação de testes em cobaias — uma prática que era motivo de fortes críticas de entidades que atuam em defesa dos animais. A outra foi o lançamento do projeto de redução de gases geradores do efeito estufa em sua cadeia produtiva. “Essas duas iniciativas eram sonhos antigos, que a Natura conseguiu realizar neste ano”, diz Alessandro Carlucci, presidente da empresa. A primeira iniciativa é a ponta-de-lança de uma mudança mais radical que a Natura vem promovendo em sua linha de produtos. Além de abolir testes em animais, ela está, aos poucos, mudando as fórmulas de seus cosméticos. Saem de cena os ingredientes animais e minerais (provenientes do petróleo) e entram matérias-primas vegetais. Os sabonetes foram a primeira linha de produtos a passar por essa mudança, em 2005, num processo que a companhia chama de “vegetalização”. O sebo de boi, a matéria-prima mais usada, foi substituído por óleos vegetais. “Quando o

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Carlucci, presidente da Natura, em um carro movido a gás natural utilizado para o transporte de funcionários dentro da fábrica, em Cajamar (SP): a substituição do microônibus a diesel foi uma das medidas adotadas pela fabricante de cosméticos para reduzir a emissão de gases causadores do efeito estufa

Pontos fracos

FABIANO ACCORSI

P

Baniu o uso de testes em animais em 100% de sua linha de produtos.

consumidor perceber que, em vez de tomar banho com sebo de boi, terá óleos vegetais, é claro que ele dará preferência ao sabonete vegetalizado”, diz Carlucci. Embora a empresa esteja fazendo investimentos em pesquisa para que a troca de materiais não interfira na aparência, na cor e no cheiro dos produtos, algumas mudanças serão inevitáveis. O preço dos cosméticos, segundo o próprio Carlucci, deve subir, embora ainda não seja possível estimar quanto. “Ainda estamos mensurando e tentando mitigar esse impacto.” Apesar do risco, especialistas acreditam que a marca se fortalecerá com essa iniciativa. “Certamente, os clientes da Natura de menor poder aquisitivo vão se afastar num primeiro momento”, afirma a analista Diana Litewski, da corretora carioca Ati-

va. “Mas os consumidores mais esclarecidos vão se manter fiéis e novos clientes passarão a consumir a marca devido às ações de sustentabilidade.”

Neutralização do carbono Para reforçar essa imagem, a empresa aposta também no projeto Carbono Neutro. A idéia é reduzir ao mínimo as emissões de gases geradores do efeito estufa em toda a cadeia produtiva. Para alcançar o objetivo, a Natura trabalha em várias frentes: trocou os microônibus a diesel que transportavam funcionários dentro da fábrica, em Cajamar, na Grande São Paulo, por carrinhos movidos a gás natural; substituiu o álcool utilizado nas fórmulas de perfumes por álcool orgânico (produzido sem agrotóxicos ou quei-

madas) e está intensificando o uso de material reciclado nos frascos. Para a Natura, é vital que essas iniciativas tragam resultados positivos — não só para sua imagem mas também para suas finanças. Depois de décadas de crescimento acelerado, pela primeira vez a empresa está passando por dificuldades. Nos primeiros nove meses deste ano, o lucro caiu mais de 5% em relação ao mesmo período de 2006. Recentemente, um grupo de funcionários da fábrica da Natura ameaçou entrar em greve. Os empregados reclamavam do excesso de trabalho e reivindicavam aumento de salários. “A situação agora está estável. A Natura manteve todos os canais de diálogo abertos com o sindicato”, diz Carlucci.

Embora não divulgue os custos do programa de neutralização de carbono, a empresa admite tratar-se de um investimento que vai ser repassado aos preços ao consumidor. Ainda é muito dependente de matérias-primas oriundas do petróleo.A linha de cremes para a pele,por exemplo, continuará a usar componentes minerais. Os funcionários reivindicam aumento salarial e se queixam de metas de produtividade difíceis de alcançar.

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Empresa-modelo

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Philips

Avaliação da empresa Pontos fortes

Em busca de produtos “limpos”

Adota critérios de desempenho ambiental e cumprimento da legislação na seleção e no desenvolvimento de fornecedores. Tem programa estruturado de reciclagem e metas de redução do consumo de água, papel, energia elétrica e combustíveis fósseis.

Para ganhar mercado, a subsidiária brasileira da Philips aposta em equipamentos que consomem menos energia Laura Lopes

á quase um ano,a praça de Casa Forte, um dos pontos turísticos de Recife, inaugurou seu novo sistema de iluminação. O local se tornou a primeira área pública no país a ganhar um sistema de iluminação batizado de Cosmópolis, projetado para locais abertos como praças, parques e cais. As lâmpadas, halógenas e brancas, consomem 65% menos energia que as comuns. Além disso, deixarão de emitir na atmosfera o correspondente a 4 toneladas de dióxido de carbono por ano. A mudança do sistema de iluminação custou 180 000 reais e, desse total, mais de 70% foram bancados pela subsidiária brasileira da Philips (o restante foi pago pela prefeitura de Recife). As novas lâmpadas fazem parte de um programa mundial da Philips para tornar seus produtos cada vez mais “limpos”. Os que se mostrarem mais eficientes que os modelos similares em pelo menos dois dos seis quesitos avaliados — peso, uso de substâncias tóxicas, consumo de energia, reciclagem, descarte final e embalagem — recebem uma espécie de selo verde da empresa (internamente chamado de green flagship). Em todo o mundo, a Philips conta atualmente com mais de 200 produtos com esse selo, entre televisores de LCD, celulares e lâmpadas. Quase 60% dessa linha é comercializada no Brasil — e foi responsável por 5% do faturamento da subsi-

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Magalhães, presidente do conselho da Philips para a América Latina: a indústria de eletroeletrônicos comercializa no mercado brasileiro cerca de 120 produtos com o “selo verde”, responsáveis por 5% da receita no país em 2006 — a meta é chegar a 20% em três anos

Pontos fracos Os trabalhadores terceirizados (mais de 20% do total de funcionários) não são incluídos nos projetos de sustentabilidade da empresa. Financia candidatos a cargos públicos, mas não publica informações sobre valores, candidatos e partidos no site e no relatório anual.

LIA LUBAMBO

H

Tem compromisso expresso e política interna contra o trabalho infantil e a favor da diversidade.

Falta transparência na divulgação dos resultados econômicos e financeiros.

diária em 2006. A meta é elevar esse índice para 20% até 2010. Líder mundial em sistemas de iluminação, a Philips articula atualmente um movimento na Europa para promover a substituição das lâmpadas incandescentes por alternativas mais econômicas. No Brasil, a empresa tem levado esse assunto para discussão em salas de aula por meio do programa Aprendendo com a Natureza, que visa transmitir conceitos sobre o meio ambiente para crianças de escolas da rede pública.“No início dos anos 80, já falávamos em metas de redução de consumo de energia e água”, diz o engenheiro Marcos Magalhães, ex-presidente da Philips para a América Latina e que deixou o cargo em abril de 2007 para assumir a presidência do conselho consultivo da empresa. Graças a essa visão, a subsidiária da Philips foi uma das primeiras empresas a organizar um departamento de sustentabilidade, no ano 2000. “Foi quando demos visibilidade ao que existia e nos alinhamos às políticas globais, inserindoas na realidade brasileira”, diz Magalhães.

De dentro para fora Na Philips, os funcionários têm papel fundamental nas ações de sustentabilidade. A empresa adota a estratégia de lançar seus projetos de responsabilidade social inicialmente para o público interno. Depois, se eles forem bem-sucedidos, são adaptados para o público externo. Essa cultura acaba estimulando os funcionários a participar também dos programas de voluntariado. Atualmente, 540 profissionais, do total de 4 500 funcionários da companhia, atuam como voluntários em algum projeto. A Philips oferece capacitação, apoio e transporte até as entidades beneficiadas. Um exemplo é sua parceria com a ONG paulista Viva e Deixe Viver, que leva entretenimento a crianças e adolescentes internados em 70 hospitais em todo o Brasil. A Philips treinou funcionários para atuar como contadores de história e destina uma verba anual de 120 000 reais para a ONG. “Estamos no terceiro ano de parceria e temos 46 voluntários da Philips”, diz Valdir Cimino, diretor da ONG. A entidade foi procurada pela Philips coincidentemente na mesma época em que foi divulgada uma pesquisa apontando que o uso de recursos tecnológicos, embora vital para a medicina, acaba deixando o atendimento médico mais “frio” que deveria. Fabricante de equipamentos de tomografia, ressonância magnética e medicina nuclear, entre outros, a Philips resolveu apoiar a ONG para ajudar a melhorar essa situação. “A empresa busca o lucro, mas também quer que a sociedade ganhe com seus produtos. Não só pela relação de uso, mas para melhorar a qualidade de vida”, afirma Flávia Moraes, gerente-geral de sustentabilidade da Philips. 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 59


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Philips

Avaliação da empresa Pontos fortes

Em busca de produtos “limpos”

Adota critérios de desempenho ambiental e cumprimento da legislação na seleção e no desenvolvimento de fornecedores. Tem programa estruturado de reciclagem e metas de redução do consumo de água, papel, energia elétrica e combustíveis fósseis.

Para ganhar mercado, a subsidiária brasileira da Philips aposta em equipamentos que consomem menos energia Laura Lopes

á quase um ano,a praça de Casa Forte, um dos pontos turísticos de Recife, inaugurou seu novo sistema de iluminação. O local se tornou a primeira área pública no país a ganhar um sistema de iluminação batizado de Cosmópolis, projetado para locais abertos como praças, parques e cais. As lâmpadas, halógenas e brancas, consomem 65% menos energia que as comuns. Além disso, deixarão de emitir na atmosfera o correspondente a 4 toneladas de dióxido de carbono por ano. A mudança do sistema de iluminação custou 180 000 reais e, desse total, mais de 70% foram bancados pela subsidiária brasileira da Philips (o restante foi pago pela prefeitura de Recife). As novas lâmpadas fazem parte de um programa mundial da Philips para tornar seus produtos cada vez mais “limpos”. Os que se mostrarem mais eficientes que os modelos similares em pelo menos dois dos seis quesitos avaliados — peso, uso de substâncias tóxicas, consumo de energia, reciclagem, descarte final e embalagem — recebem uma espécie de selo verde da empresa (internamente chamado de green flagship). Em todo o mundo, a Philips conta atualmente com mais de 200 produtos com esse selo, entre televisores de LCD, celulares e lâmpadas. Quase 60% dessa linha é comercializada no Brasil — e foi responsável por 5% do faturamento da subsi-

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Magalhães, presidente do conselho da Philips para a América Latina: a indústria de eletroeletrônicos comercializa no mercado brasileiro cerca de 120 produtos com o “selo verde”, responsáveis por 5% da receita no país em 2006 — a meta é chegar a 20% em três anos

Pontos fracos Os trabalhadores terceirizados (mais de 20% do total de funcionários) não são incluídos nos projetos de sustentabilidade da empresa. Financia candidatos a cargos públicos, mas não publica informações sobre valores, candidatos e partidos no site e no relatório anual.

LIA LUBAMBO

H

Tem compromisso expresso e política interna contra o trabalho infantil e a favor da diversidade.

Falta transparência na divulgação dos resultados econômicos e financeiros.

diária em 2006. A meta é elevar esse índice para 20% até 2010. Líder mundial em sistemas de iluminação, a Philips articula atualmente um movimento na Europa para promover a substituição das lâmpadas incandescentes por alternativas mais econômicas. No Brasil, a empresa tem levado esse assunto para discussão em salas de aula por meio do programa Aprendendo com a Natureza, que visa transmitir conceitos sobre o meio ambiente para crianças de escolas da rede pública.“No início dos anos 80, já falávamos em metas de redução de consumo de energia e água”, diz o engenheiro Marcos Magalhães, ex-presidente da Philips para a América Latina e que deixou o cargo em abril de 2007 para assumir a presidência do conselho consultivo da empresa. Graças a essa visão, a subsidiária da Philips foi uma das primeiras empresas a organizar um departamento de sustentabilidade, no ano 2000. “Foi quando demos visibilidade ao que existia e nos alinhamos às políticas globais, inserindoas na realidade brasileira”, diz Magalhães.

De dentro para fora Na Philips, os funcionários têm papel fundamental nas ações de sustentabilidade. A empresa adota a estratégia de lançar seus projetos de responsabilidade social inicialmente para o público interno. Depois, se eles forem bem-sucedidos, são adaptados para o público externo. Essa cultura acaba estimulando os funcionários a participar também dos programas de voluntariado. Atualmente, 540 profissionais, do total de 4 500 funcionários da companhia, atuam como voluntários em algum projeto. A Philips oferece capacitação, apoio e transporte até as entidades beneficiadas. Um exemplo é sua parceria com a ONG paulista Viva e Deixe Viver, que leva entretenimento a crianças e adolescentes internados em 70 hospitais em todo o Brasil. A Philips treinou funcionários para atuar como contadores de história e destina uma verba anual de 120 000 reais para a ONG. “Estamos no terceiro ano de parceria e temos 46 voluntários da Philips”, diz Valdir Cimino, diretor da ONG. A entidade foi procurada pela Philips coincidentemente na mesma época em que foi divulgada uma pesquisa apontando que o uso de recursos tecnológicos, embora vital para a medicina, acaba deixando o atendimento médico mais “frio” que deveria. Fabricante de equipamentos de tomografia, ressonância magnética e medicina nuclear, entre outros, a Philips resolveu apoiar a ONG para ajudar a melhorar essa situação. “A empresa busca o lucro, mas também quer que a sociedade ganhe com seus produtos. Não só pela relação de uso, mas para melhorar a qualidade de vida”, afirma Flávia Moraes, gerente-geral de sustentabilidade da Philips. 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 59


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Empresa-modelo

Promon

Avaliação da empresa Pontos fortes

Faça o que eu faço

Aplica os conceitos de green building (“edifício verde”) nos contratos com clientes. Todos os funcionários são acionistas da empresa.

A Promon dissemina o conceito de “edifício verde” e exige que seus fornecedores também adotem práticas sustentáveis nos negócios

A soma dos salários nominais dos funcionários admitidos em 2006 é maior que a dos demitidos no mesmo período.

Tatiana Vaz

60 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Pontos fracos Gemignani (sentado) com um grupo de funcionários da Promon: nenhum projeto de engenharia é aprovado sem antes ser submetido ao departamento de análise de risco da empresa, que avalia os possíveis impactos socioambientais

O balanço social evita temas polêmicos ou negativos, como acidentes de trabalho ou mortes em serviço. Não aborda também assuntos como escolha por materiais recicláveis ou ações para evitar acidentes nas obras. Não tem uma política para incentivar a diversidade dos funcionários.

GERMANO LUDERS

À

s 10 da manhã do dia 3 de outubro, os empresários Pedro Peres, Paulo Peres e Roberto Donato, sócios da prestadora de serviços de limpeza paulista InService, receberam os auditores de uma de suas maiores clientes, a empresa de engenharia Promon. Durante a visita, os fiscais verificaram que todos os funcionários da InService são registrados, trabalham uniformizados e com materiais adequados, que a empresa promove treinamentos periódicos e usa produtos de baixo impacto ambiental. A conclusão dos auditores: não há nada que impeça a InService de continuar a prestar serviços de limpeza nos escritórios da Promon em São Paulo e no Rio de Janeiro, como faz desde 2003. “Foi a primeira vez que um cliente veio ver de perto como trabalhamos na prática”, diz Peres. A iniciativa revela a preocupação da Promon em estreitar o relacionamento com seus fornecedores e alinhar estratégias de negócios sustentáveis. A idéia de realizar auditorias começou a ser implantada neste ano. O primeiro passo foi capacitar nove funcionários para avaliar os fornecedores já existentes e selecionar os novos. “Queremos que os princípios de sustentabilidade façam parte do dia-a-dia dos negócios dos nossos parceiros assim como faz parte dos nossos”, diz Luiz Ernesto Gemignani, diretor-presidente da Promon. Trata-se de tarefa trabalhosa, sobretudo pela quantidade de fornecedores com os quais a Promon se relaciona: numa grande obra, o número de empresas envolvidas pode chegar a 2 000.

Não mensura ainda o resultado dos impactos ambientais e sociais dos empreendimentos entregues — a avaliação é feita apenas antes do início do projeto.

O cuidado com o aspecto socioambiental deve estar presente também na concepção de cada projeto. Um exemplo é a obra de modernização da Refinaria Henrique Lage (Revap), da Petrobras, no Vale do Paraíba, no norte de São Paulo. Iniciado em março deste ano e com término previsto para 2010, o empreendimento conta com um sistema de captação de água de chuva para uso nos sanitários e na limpeza externa. Telhas translúcidas na cobertura de algumas áreas, como refeitório, oficinas e almoxarifado, permitem aproveitar a iluminação natural e economizar energia elétrica. É a primeira vez que a Promon adotou soluções como essas no canteiro de obras, e não somente depois que o empreendimento estivesse pronto. Todas essas medidas foram sugeridas por um grupo de 15 engenheiros da Promon, treinados e certificados em Leadership in Energy and Environmental Design (Leed), o padrão americano utilizado para atestar edifícios ambientalmente sustentáveis. Toda semana, esse grupo se reúne para discutir maneiras de aplicar tecnologias que permitam a conservação de energia e o uso inteligente dos recursos nas construções. “Como gera economia, o uso racional dos recursos naturais recebe o aval de todos os clientes”, afirma Álvaro Pureza, coordenador do comitê de sustentabilidade da Promon.

Redução de consumo Antes de aceitar qualquer empreitada, o departamento de análise de riscos da Promon avalia os possíveis impactos socioambientais da obra e apresenta suas sugestões ao cliente. Se o contratante não aceitar as recomendações, a obra pode ser até recusada — o que já aconteceu. Porém, apesar desse cuidado na seleção do projeto, a Promon ainda não encontrou uma forma ideal de mensurar o resultado dos impactos sociais e ambientais depois que seus empreendimentos estão prontos. “Estamos buscando, fora do país, alternativas para calcular esses impactos. Assim, saberemos como e onde precisamos melhorar para economizar ainda mais os recursos”, diz Gemignani. O uso racional de recursos naturais se estende à própria sede da Promon, no bairro paulistano da Vila Olímpia, onde trabalham 800 funcionários. Em 2005, a empresa implementou medidas como a troca de torneiras comuns pelas automáticas e o uso da água de poço artesiano em vez da fornecida pelo sistema de abastecimento. Desde então, o consumo de água caiu 40%. Além disso, 98% do papel e 100% das lâmpadas são reciclados. Coletores de pilhas e baterias estão espalhados por todos os ambientes — e muitos funcionários costumam trazer material também de casa. “Todos ganham com isso”, diz Gemignani. 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 61


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Promon

Avaliação da empresa Pontos fortes

Faça o que eu faço

Aplica os conceitos de green building (“edifício verde”) nos contratos com clientes. Todos os funcionários são acionistas da empresa.

A Promon dissemina o conceito de “edifício verde” e exige que seus fornecedores também adotem práticas sustentáveis nos negócios

A soma dos salários nominais dos funcionários admitidos em 2006 é maior que a dos demitidos no mesmo período.

Tatiana Vaz

60 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Pontos fracos Gemignani (sentado) com um grupo de funcionários da Promon: nenhum projeto de engenharia é aprovado sem antes ser submetido ao departamento de análise de risco da empresa, que avalia os possíveis impactos socioambientais

O balanço social evita temas polêmicos ou negativos, como acidentes de trabalho ou mortes em serviço. Não aborda também assuntos como escolha por materiais recicláveis ou ações para evitar acidentes nas obras. Não tem uma política para incentivar a diversidade dos funcionários.

GERMANO LUDERS

À

s 10 da manhã do dia 3 de outubro, os empresários Pedro Peres, Paulo Peres e Roberto Donato, sócios da prestadora de serviços de limpeza paulista InService, receberam os auditores de uma de suas maiores clientes, a empresa de engenharia Promon. Durante a visita, os fiscais verificaram que todos os funcionários da InService são registrados, trabalham uniformizados e com materiais adequados, que a empresa promove treinamentos periódicos e usa produtos de baixo impacto ambiental. A conclusão dos auditores: não há nada que impeça a InService de continuar a prestar serviços de limpeza nos escritórios da Promon em São Paulo e no Rio de Janeiro, como faz desde 2003. “Foi a primeira vez que um cliente veio ver de perto como trabalhamos na prática”, diz Peres. A iniciativa revela a preocupação da Promon em estreitar o relacionamento com seus fornecedores e alinhar estratégias de negócios sustentáveis. A idéia de realizar auditorias começou a ser implantada neste ano. O primeiro passo foi capacitar nove funcionários para avaliar os fornecedores já existentes e selecionar os novos. “Queremos que os princípios de sustentabilidade façam parte do dia-a-dia dos negócios dos nossos parceiros assim como faz parte dos nossos”, diz Luiz Ernesto Gemignani, diretor-presidente da Promon. Trata-se de tarefa trabalhosa, sobretudo pela quantidade de fornecedores com os quais a Promon se relaciona: numa grande obra, o número de empresas envolvidas pode chegar a 2 000.

Não mensura ainda o resultado dos impactos ambientais e sociais dos empreendimentos entregues — a avaliação é feita apenas antes do início do projeto.

O cuidado com o aspecto socioambiental deve estar presente também na concepção de cada projeto. Um exemplo é a obra de modernização da Refinaria Henrique Lage (Revap), da Petrobras, no Vale do Paraíba, no norte de São Paulo. Iniciado em março deste ano e com término previsto para 2010, o empreendimento conta com um sistema de captação de água de chuva para uso nos sanitários e na limpeza externa. Telhas translúcidas na cobertura de algumas áreas, como refeitório, oficinas e almoxarifado, permitem aproveitar a iluminação natural e economizar energia elétrica. É a primeira vez que a Promon adotou soluções como essas no canteiro de obras, e não somente depois que o empreendimento estivesse pronto. Todas essas medidas foram sugeridas por um grupo de 15 engenheiros da Promon, treinados e certificados em Leadership in Energy and Environmental Design (Leed), o padrão americano utilizado para atestar edifícios ambientalmente sustentáveis. Toda semana, esse grupo se reúne para discutir maneiras de aplicar tecnologias que permitam a conservação de energia e o uso inteligente dos recursos nas construções. “Como gera economia, o uso racional dos recursos naturais recebe o aval de todos os clientes”, afirma Álvaro Pureza, coordenador do comitê de sustentabilidade da Promon.

Redução de consumo Antes de aceitar qualquer empreitada, o departamento de análise de riscos da Promon avalia os possíveis impactos socioambientais da obra e apresenta suas sugestões ao cliente. Se o contratante não aceitar as recomendações, a obra pode ser até recusada — o que já aconteceu. Porém, apesar desse cuidado na seleção do projeto, a Promon ainda não encontrou uma forma ideal de mensurar o resultado dos impactos sociais e ambientais depois que seus empreendimentos estão prontos. “Estamos buscando, fora do país, alternativas para calcular esses impactos. Assim, saberemos como e onde precisamos melhorar para economizar ainda mais os recursos”, diz Gemignani. O uso racional de recursos naturais se estende à própria sede da Promon, no bairro paulistano da Vila Olímpia, onde trabalham 800 funcionários. Em 2005, a empresa implementou medidas como a troca de torneiras comuns pelas automáticas e o uso da água de poço artesiano em vez da fornecida pelo sistema de abastecimento. Desde então, o consumo de água caiu 40%. Além disso, 98% do papel e 100% das lâmpadas são reciclados. Coletores de pilhas e baterias estão espalhados por todos os ambientes — e muitos funcionários costumam trazer material também de casa. “Todos ganham com isso”, diz Gemignani. 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 61


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20/11/2007

20:23

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Empresa-modelo

Real

Avaliação da empresa Pontos fortes

O desafio de preservar uma cultura

A remuneração dos executivos está vinculada ao desempenho do banco nas dimensões social, ambiental e econômicofinanceira. Os aspectos socioambientais estão inseridos nas projeções de receitas, despesas e ativos.

O Real transforma seus funcionários em agentes multiplicadores de práticas sustentáveis. A dúvida é se o processo não será interrompido pelo novo controlador

Tem verbas para iniciativas de investimento social definidas em orçamento anual.

Luci Gomes

m junho, 200 executivos do banco Real foram submetidos a uma prova inédita na instituição. O grupo teve meia hora para dissertar sobre a importância da sustentabilidade e como o banco pode se beneficiar com o tema. Depois do teste, os executivos assistiram a uma palestra de Fábio Barbosa, presidente do Real. O evento fez parte de um programa para formar uma cultura de desenvolvimento sustentável dentro da instituição. Até o final de 2007 serão treinados quase 9 200 funcionários — um investimento de aproximadamente 2 milhões de reais. Com esse treinamento, a instituição pretende formar líderes em sustentabilidade, que transmitam os conceitos aprendidos a seus subordinados, clientes, fornecedores e até mesmo a seu círculo de relacionamento pessoal. “O mais difícil de mudar é o comportamento das pessoas. Isso se consegue com muita consistência e perseverança, mostrando que há outra maneira de fazer negócios, na qual não é preciso apelar para o ‘jeitinho’ ou outros expedientes para atrair clientes”, afirma Barbosa. De acordo com o executivo, é com o tempo e com o reforço da prática no dia-a-dia que a organização vai consolidando a nova cultura e criando um círculo virtuoso.

64 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Usa o padrão brasileiro para publicar suas demonstrações financeiras — e não as normas internacionalmente aceitas de contabilidade.

Barbosa, presidente do Real: para ele, os novos controladores do banco terão interesse em manter as práticas de sustentabilidade que foram responsáveis pelo bom desempenho da instituição nos últimos anos

Não possui um conselho fiscal (não é uma exigência legal, mas uma medida na direção da governança corporativa).

FABIANO ACCORSI

E

Pontos fracos

A recente compra do controlador do Real por um grupo liderado pelo Santander deixa dúvidas em relação à continuidade de suas políticas de sustentabilidade.

Durante o curso de sustentabilidade, são discutidos temas como direitos humanos, meio ambiente, economia solidária e empreendedorismo social. Os alunos visitam projetos dos quais o Real é parceiro e discutem de que forma é possível ampliar a teia de ação sustentável do banco. Eles são treinados para identificar riscos e oportunidades em diferentes situações, tanto do ponto de vista financeiro como do ecológico e social. Foi em um desses processos que Alexandre José da Silva, gerente regional de operações da Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro, deu início a um projeto de coleta de óleo de cozinha, que pode ser transformado em biodiesel. Contratado no início deste ano, Silva participou de três módulos do curso, ministrados em São Paulo. No primeiro deles, em uma discussão em grupo, surgiu a idéia de fazer a coleta de óleo de cozinha, que é uma forma de produzir energia limpa e, ao mesmo tempo, gerar renda para as pessoas que recolhem o óleo. De volta ao Rio, Silva submeteu a idéia a seu superintendente. Pouco tempo depois, as 21 agências da região instalaram equipamentos para a coleta do óleo. O engajamento dos funcionários foi surpreendente, segundo ele. “Flagrei muitos dos gerentes vendendo a idéia aos clientes como se fosse um produto financeiro”, afirma o executivo. Além disso, as agências conseguiram cooptar donos de restaurantes, que descartam grandes quantidades de óleo diariamente. O saldo da iniciativa até agora são 500 litros de óleo recolhidos a cada mês.

Sob nova direção Apesar do esforço empreendido desde 2000 para desenvolver essa cultura baseada na sustentabilidade, o Real vive hoje uma fase de incertezas. Em setembro, o banco holandês ABN Amro, dono do Real no Brasil, foi comprado por um consórcio de bancos liderado pelo espanhol Santander. Como o novo controlador não é uma instituição que se destaca por suas ações de sustentabilidade — no Brasil, é líder em número de reclamações de clientes no Banco Central, por exemplo —, há dúvidas em relação à continuidade dos programas desenvolvidos atualmente pelo Real. No entanto, para Barbosa, o aprendizado acumulado pelos funcionários nos últimos anos deve garantir a preservação desses valores. Barbosa acredita também que os novos controladores do Real terão interesse em manter essas práticas, já que elas foram um dos pilares do bom desempenho da instituição nos últimos anos. “Em qualquer fusão ou aquisição, o objetivo dos controladores é manter o que há de melhor em cada uma das empresas envolvidas na operação”, diz ele. 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 65


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Real

Avaliação da empresa Pontos fortes

O desafio de preservar uma cultura

A remuneração dos executivos está vinculada ao desempenho do banco nas dimensões social, ambiental e econômicofinanceira. Os aspectos socioambientais estão inseridos nas projeções de receitas, despesas e ativos.

O Real transforma seus funcionários em agentes multiplicadores de práticas sustentáveis. A dúvida é se o processo não será interrompido pelo novo controlador

Tem verbas para iniciativas de investimento social definidas em orçamento anual.

Luci Gomes

m junho, 200 executivos do banco Real foram submetidos a uma prova inédita na instituição. O grupo teve meia hora para dissertar sobre a importância da sustentabilidade e como o banco pode se beneficiar com o tema. Depois do teste, os executivos assistiram a uma palestra de Fábio Barbosa, presidente do Real. O evento fez parte de um programa para formar uma cultura de desenvolvimento sustentável dentro da instituição. Até o final de 2007 serão treinados quase 9 200 funcionários — um investimento de aproximadamente 2 milhões de reais. Com esse treinamento, a instituição pretende formar líderes em sustentabilidade, que transmitam os conceitos aprendidos a seus subordinados, clientes, fornecedores e até mesmo a seu círculo de relacionamento pessoal. “O mais difícil de mudar é o comportamento das pessoas. Isso se consegue com muita consistência e perseverança, mostrando que há outra maneira de fazer negócios, na qual não é preciso apelar para o ‘jeitinho’ ou outros expedientes para atrair clientes”, afirma Barbosa. De acordo com o executivo, é com o tempo e com o reforço da prática no dia-a-dia que a organização vai consolidando a nova cultura e criando um círculo virtuoso.

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Usa o padrão brasileiro para publicar suas demonstrações financeiras — e não as normas internacionalmente aceitas de contabilidade.

Barbosa, presidente do Real: para ele, os novos controladores do banco terão interesse em manter as práticas de sustentabilidade que foram responsáveis pelo bom desempenho da instituição nos últimos anos

Não possui um conselho fiscal (não é uma exigência legal, mas uma medida na direção da governança corporativa).

FABIANO ACCORSI

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Pontos fracos

A recente compra do controlador do Real por um grupo liderado pelo Santander deixa dúvidas em relação à continuidade de suas políticas de sustentabilidade.

Durante o curso de sustentabilidade, são discutidos temas como direitos humanos, meio ambiente, economia solidária e empreendedorismo social. Os alunos visitam projetos dos quais o Real é parceiro e discutem de que forma é possível ampliar a teia de ação sustentável do banco. Eles são treinados para identificar riscos e oportunidades em diferentes situações, tanto do ponto de vista financeiro como do ecológico e social. Foi em um desses processos que Alexandre José da Silva, gerente regional de operações da Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro, deu início a um projeto de coleta de óleo de cozinha, que pode ser transformado em biodiesel. Contratado no início deste ano, Silva participou de três módulos do curso, ministrados em São Paulo. No primeiro deles, em uma discussão em grupo, surgiu a idéia de fazer a coleta de óleo de cozinha, que é uma forma de produzir energia limpa e, ao mesmo tempo, gerar renda para as pessoas que recolhem o óleo. De volta ao Rio, Silva submeteu a idéia a seu superintendente. Pouco tempo depois, as 21 agências da região instalaram equipamentos para a coleta do óleo. O engajamento dos funcionários foi surpreendente, segundo ele. “Flagrei muitos dos gerentes vendendo a idéia aos clientes como se fosse um produto financeiro”, afirma o executivo. Além disso, as agências conseguiram cooptar donos de restaurantes, que descartam grandes quantidades de óleo diariamente. O saldo da iniciativa até agora são 500 litros de óleo recolhidos a cada mês.

Sob nova direção Apesar do esforço empreendido desde 2000 para desenvolver essa cultura baseada na sustentabilidade, o Real vive hoje uma fase de incertezas. Em setembro, o banco holandês ABN Amro, dono do Real no Brasil, foi comprado por um consórcio de bancos liderado pelo espanhol Santander. Como o novo controlador não é uma instituição que se destaca por suas ações de sustentabilidade — no Brasil, é líder em número de reclamações de clientes no Banco Central, por exemplo —, há dúvidas em relação à continuidade dos programas desenvolvidos atualmente pelo Real. No entanto, para Barbosa, o aprendizado acumulado pelos funcionários nos últimos anos deve garantir a preservação desses valores. Barbosa acredita também que os novos controladores do Real terão interesse em manter essas práticas, já que elas foram um dos pilares do bom desempenho da instituição nos últimos anos. “Em qualquer fusão ou aquisição, o objetivo dos controladores é manter o que há de melhor em cada uma das empresas envolvidas na operação”, diz ele. 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 65


serasa - H-alta

20/11/2007

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Empresa-modelo

Serasa

Avaliação da empresa

Voluntariado de resultados

Pontos fortes Mantém um programa de inclusão de pessoas com deficiência que é reconhecido pela Organização das Nações Unidas.

A Serasa incentiva o engajamento dos funcionários e troca o modelo de simples doações por consultorias completas em gestão de instituições beneficentes

Oferece aos funcionários cursos do ensino básico à pósgraduação.

Tiago Cordeiro

odo mês de novembro, 64 instituições beneficentes de várias cidades brasileiras recebem a visita de funcionários da Serasa e de seus familiares. Eles se dividem em turmas, identificadas por camisetas de cores diferentes, e se dedicam a atividades como jardinagem, pintura, organização da farmácia, da biblioteca e até mesmo da contabilidade do lugar. Organizados de acordo com a afinidade pessoal de cada participante, os grupos têm sempre um líder, que não ocupa cargo de chefia na empresa. “Eu e os diretores participamos, mas nunca assumimos a coordenação do grupo. Além de fazer a integração entre nossos funcionários, a iniciativa é uma oportunidade para descobrirmos bons potenciais de liderança”, diz Elcio Aníbal de Lucca, presidente da Serasa. Ao todo, o Dia do Voluntário, promovido pela empresa, movimenta 2 500 pessoas em 18 municípios. No dia-a-dia, a Serasa acompanha as atividades de 104 instituições de caridade, o que envolve o trabalho de 946 funcionários. Mais do que fazer doações, a Serasa, uma das maiores empresas do mundo em análise de crédito, preocupa-se em desenvolver para essas entidades projetos completos de gestão. As equipes dão apoio permanente em atividades como marketing, planejamento estratégico e técnicas de qualidade total. “Fazer voluntariado não é dar dinheiro. É dar o recurso necessário para criar a infra-estrutura”, afirma De Lucca. Nos últimos meses, a ONG paulistana

66 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

De Lucca (ao centro), presidente da Serasa, com um grupo de funcionários: empresa é modelo em inclusão de portadores de deficiência física, que contam com programas específicos de treinamento e empregabilidade e trabalham em um ambiente projetado para facilitar seu acesso e sua movimentação

Pontos fracos Não tem 10% de negros em cargos de gerência nem de diretoria.

HEUDES REGIS

T

Incentiva as entidades que recebem ajuda a repensar sua gestão.

Núcleo Assistencial Irmão Alfredo pôde constatar os benefícios provocados pela mudança de postura na gestão. Fundada em 1982, a entidade, que oferece cursos de capacitação para 500 crianças e adolescentes, começou o ano de 2007 com duas grandes empresas doadoras. Hoje, depois de um ano de aprendizado com a Serasa, tem 12 parceiros do porte de Alcoa, Cargill e Nokia. “A Serasa nos ensinou a profissionalizar a captação de recursos”, diz a pedagoga Sônia Costa, responsável pelas relações institucionais da ONG.

Edifício amigável A sede da Serasa, um edifício erguido na zona sul de São Paulo, é a parte mais visível da busca da empresa pela sustentabilidade. Nela trabalham

1 595 funcionários. Inaugurado há cinco anos, o edifício é considerado exemplar pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e venceu, em 2003, um prêmio de mobilidade e sustentabilidade concedido pelo Secovi, sindicato do setor imobiliário. O prédio, construído de vidro e alumínio, preserva árvores de 50 anos. Há rampas com inclinação inferior a 15 graus, portas com largura adequada a cadeirantes, corrimões e outros recursos para facilitar a movimentação de portadores de deficiência. Os funcionários também têm à disposição salão de beleza, espaço para meditação e uma igreja. Além disso, a Escola Serasa oferece desde aulas de alfabetização até cursos em nível superior e de pós-graduação, ministrados em parceria com a Universidade de Santo Amaro e com

a Fundação Getulio Vargas. “O tripé formado por atenção à sociedade, cuidado com a natureza e bom ambiente corporativo é fundamental, mas não é suficiente”, diz De Lucca. “É preciso que a empresa tenha um modelo de gestão que integre esses aspectos. Nada pode ser pontual.” Em junho, 65% do capital da Serasa foi adquirido pelo grupo britânico Experian, por 2,3 bilhões de reais. O contrato prevê uma opção de compra do restante das ações nos próximos cinco anos. Atualmente, a empresa lidera o mercado de análise de crédito na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos. Com isso, a dúvida de especialistas é se o novo controlador vai perpetuar as políticas de sustentabilidade da Serasa (procurado por EXAME, o Experian não quis falar sobre o assunto).

A gestão é centralizada na figura do presidente, que está no cargo há 16 anos. Sofreu, nos últimos três anos, ações judiciais relativas à violação de normas de defesa do consumidor — segundo a Serasa, as ações foram movidas por consumidores insatisfeitos com bancos ou empresas que não retiraram seus nomes da lista de maus pagadores.

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serasa - H-alta

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Empresa-modelo

Serasa

Avaliação da empresa

Voluntariado de resultados

Pontos fortes Mantém um programa de inclusão de pessoas com deficiência que é reconhecido pela Organização das Nações Unidas.

A Serasa incentiva o engajamento dos funcionários e troca o modelo de simples doações por consultorias completas em gestão de instituições beneficentes

Oferece aos funcionários cursos do ensino básico à pósgraduação.

Tiago Cordeiro

odo mês de novembro, 64 instituições beneficentes de várias cidades brasileiras recebem a visita de funcionários da Serasa e de seus familiares. Eles se dividem em turmas, identificadas por camisetas de cores diferentes, e se dedicam a atividades como jardinagem, pintura, organização da farmácia, da biblioteca e até mesmo da contabilidade do lugar. Organizados de acordo com a afinidade pessoal de cada participante, os grupos têm sempre um líder, que não ocupa cargo de chefia na empresa. “Eu e os diretores participamos, mas nunca assumimos a coordenação do grupo. Além de fazer a integração entre nossos funcionários, a iniciativa é uma oportunidade para descobrirmos bons potenciais de liderança”, diz Elcio Aníbal de Lucca, presidente da Serasa. Ao todo, o Dia do Voluntário, promovido pela empresa, movimenta 2 500 pessoas em 18 municípios. No dia-a-dia, a Serasa acompanha as atividades de 104 instituições de caridade, o que envolve o trabalho de 946 funcionários. Mais do que fazer doações, a Serasa, uma das maiores empresas do mundo em análise de crédito, preocupa-se em desenvolver para essas entidades projetos completos de gestão. As equipes dão apoio permanente em atividades como marketing, planejamento estratégico e técnicas de qualidade total. “Fazer voluntariado não é dar dinheiro. É dar o recurso necessário para criar a infra-estrutura”, afirma De Lucca. Nos últimos meses, a ONG paulistana

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De Lucca (ao centro), presidente da Serasa, com um grupo de funcionários: empresa é modelo em inclusão de portadores de deficiência física, que contam com programas específicos de treinamento e empregabilidade e trabalham em um ambiente projetado para facilitar seu acesso e sua movimentação

Pontos fracos Não tem 10% de negros em cargos de gerência nem de diretoria.

HEUDES REGIS

T

Incentiva as entidades que recebem ajuda a repensar sua gestão.

Núcleo Assistencial Irmão Alfredo pôde constatar os benefícios provocados pela mudança de postura na gestão. Fundada em 1982, a entidade, que oferece cursos de capacitação para 500 crianças e adolescentes, começou o ano de 2007 com duas grandes empresas doadoras. Hoje, depois de um ano de aprendizado com a Serasa, tem 12 parceiros do porte de Alcoa, Cargill e Nokia. “A Serasa nos ensinou a profissionalizar a captação de recursos”, diz a pedagoga Sônia Costa, responsável pelas relações institucionais da ONG.

Edifício amigável A sede da Serasa, um edifício erguido na zona sul de São Paulo, é a parte mais visível da busca da empresa pela sustentabilidade. Nela trabalham

1 595 funcionários. Inaugurado há cinco anos, o edifício é considerado exemplar pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e venceu, em 2003, um prêmio de mobilidade e sustentabilidade concedido pelo Secovi, sindicato do setor imobiliário. O prédio, construído de vidro e alumínio, preserva árvores de 50 anos. Há rampas com inclinação inferior a 15 graus, portas com largura adequada a cadeirantes, corrimões e outros recursos para facilitar a movimentação de portadores de deficiência. Os funcionários também têm à disposição salão de beleza, espaço para meditação e uma igreja. Além disso, a Escola Serasa oferece desde aulas de alfabetização até cursos em nível superior e de pós-graduação, ministrados em parceria com a Universidade de Santo Amaro e com

a Fundação Getulio Vargas. “O tripé formado por atenção à sociedade, cuidado com a natureza e bom ambiente corporativo é fundamental, mas não é suficiente”, diz De Lucca. “É preciso que a empresa tenha um modelo de gestão que integre esses aspectos. Nada pode ser pontual.” Em junho, 65% do capital da Serasa foi adquirido pelo grupo britânico Experian, por 2,3 bilhões de reais. O contrato prevê uma opção de compra do restante das ações nos próximos cinco anos. Atualmente, a empresa lidera o mercado de análise de crédito na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos. Com isso, a dúvida de especialistas é se o novo controlador vai perpetuar as políticas de sustentabilidade da Serasa (procurado por EXAME, o Experian não quis falar sobre o assunto).

A gestão é centralizada na figura do presidente, que está no cargo há 16 anos. Sofreu, nos últimos três anos, ações judiciais relativas à violação de normas de defesa do consumidor — segundo a Serasa, as ações foram movidas por consumidores insatisfeitos com bancos ou empresas que não retiraram seus nomes da lista de maus pagadores.

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Empresa-modelo

Suzano

Avaliação da empresa Pontos fortes

Uma estratégia para o futuro

Há um sistema implementado de gestão de riscos corporativos que considera aspectos socioambientais de curto, médio e longo prazo.

Ao adotar o conceito de sustentabilidade, a Suzano conseguiu expandir a produção e valorizar suas ações na Bovespa

Há um canal para receber denúncias de assédio moral e sexual.

Lia Vasconcelos

Suzano Papel e Celulose acaba de inaugurar a segunda fase de sua fábrica em Mucuri, na Bahia. Com a ampliação, a unidade aumentou sua capacidade de produção em quase 60%, alcançando 3,1 milhões de toneladas de celulose. Apesar da expansão brutal, a empresa vem conseguindo diminuir o impacto ambiental. Graças à introdução de processos mais eficientes de produção e de reúso da água, o consumo desse recurso caiu de 42 para 29 metros cúbicos por tonelada produzida de celulose. Hoje, a fábrica baiana é praticamente auto-suficiente em energia. Mucuri produz 97% do que consome, utilizando sobretudo fontes renováveis de energia, como o licor negro, resíduo tóxico resultante do cozimento da madeira. “Nosso propósito é estar entre as duas maiores e mais rentáveis empresas do setor no Brasil e, assim, poder atuar de modo competitivo e eficiente nos principais mercados internacionais”, afirma Antônio Maciel Neto, presidente da empresa. “Para alcançar esse objetivo, precisamos estar apoiados no conceito de sustentabilidade.” Um dos maiores esforços da Suzano nesse sentido está relacionado ao processo de certificação de suas florestas. Desde dezembro de 2006, 100% dos 462 000 hectares de terra que a companhia possui espalhados pelos estados de São Paulo, Espírito Santo, Bahia, Minas Gerais e Maranhão têm certificação da Forest Stewardship Council (FSC), um programa de cer-

70 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Maciel, presidente da Suzano, em uma floresta de eucaliptos: desde dezembro de 2006, os 462 000 hectares que a empresa possui espalhados por cinco estados estão totalmente certificados pelo Forest Stewardship Council (FSC), o que deve facilitar a abertura de novos mercados no exterior para sua celulose

Pontos fracos Adota critérios de desempenho ambiental na seleção ou no desenvolvimento de fornecedores de bens e serviços apenas para seus fornecedores críticos. Empresas que atuam no ramo do agronegócio são alvo de ativistas, ONGs, índios e quilombolas. Não tem meta de redução do consumo de energia elétrica nem programa sobre esse tema. LIA LUBAMBO

A

Tem compromisso em relação à erradicação do trabalho infantil expresso no seu código de conduta e numa política corporativa específica.

tificação florestal internacional independente. Aproximadamente 50% da área é ocupada por plantações de eucalipto, 40% por mata nativa (o dobro da área mínima exigida pela legislação brasileira) e 10% por infra-estrutura. No Brasil, somente mais duas empresas do setor de papel e celulose têm suas florestas 100% certificadas pela FSC — a Klabin e a Compacel. Em maio deste ano, a Suzano iniciou um projeto de financiamento e orientação à indústria gráfica para que essa etapa da cadeia produtiva também obtenha o selo de certificação da FSC. Com isso, embalagens de papel-cartão, livros, cadernos, revistas e cartões de visita, entre outros produtos finais, chegariam ao mercado certificados. De acordo com a Suzano, essa iniciativa trará inúmeros benefícios, como o acesso facilitado ao mercado mundial, a diferenciação da empresa e de seus produtos em relação aos concorrentes e maior credibilidade perante os consumidores. “Existe uma forte tendência de compra de produtos sustentáveis no exterior e no Brasil”, diz Maciel. Ainda falta incluir nesse processo os cerca de 1 200 pequenos e médios produtores que ocupam 75 000 hectares e fornecem 25% da celulose da Suzano. O plano é incorporá-los ao projeto de certificação florestal a partir de 2008.

Postura cidadã Ações como essas foram fundamentais para que a Suzano fosse incluída há dois anos no Índice de Sustentabilidade das Empresas (ISE), da Bovespa, que reúne as companhias de capital aberto com as melhores práticas sustentáveis. As integrantes desse grupo passaram de 28 empresas em 2006 para 34 neste ano e, juntas, têm um valor de mercado de 701 bilhões de reais — 48,5% da capitalização total da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). “Fazer parte do ISE é um ótimo cartão de visita”, diz Maciel. A Suzano participa do índice há dois anos. Nos últimos 18 meses, as ações da companhia valorizaram cerca de 120%. Um dos maiores desafios que a Suzano enfrenta atualmente para manter essa boa imagem é o relacionamento com ativistas e ONGs. Assim como outras empresas ligadas ao agronegócio, a Suzano tem vivido alguns conflitos com esses stakeholders. Recentemente, terras de propriedade da empresa na Bahia foram invadidas por integrantes do Movimento dos Sem-Teto. “Por sua postura cidadã e pelo valor das leis, a Suzano entende que, em casos de invasões, o poder público e as autoridades constituídas é que devem fazer valer os direitos de posse”, afirma Maciel. “A liberação da área ocorreu sem incidentes.” 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 71


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Avaliação da empresa Pontos fortes

Uma estratégia para o futuro

Há um sistema implementado de gestão de riscos corporativos que considera aspectos socioambientais de curto, médio e longo prazo.

Ao adotar o conceito de sustentabilidade, a Suzano conseguiu expandir a produção e valorizar suas ações na Bovespa

Há um canal para receber denúncias de assédio moral e sexual.

Lia Vasconcelos

Suzano Papel e Celulose acaba de inaugurar a segunda fase de sua fábrica em Mucuri, na Bahia. Com a ampliação, a unidade aumentou sua capacidade de produção em quase 60%, alcançando 3,1 milhões de toneladas de celulose. Apesar da expansão brutal, a empresa vem conseguindo diminuir o impacto ambiental. Graças à introdução de processos mais eficientes de produção e de reúso da água, o consumo desse recurso caiu de 42 para 29 metros cúbicos por tonelada produzida de celulose. Hoje, a fábrica baiana é praticamente auto-suficiente em energia. Mucuri produz 97% do que consome, utilizando sobretudo fontes renováveis de energia, como o licor negro, resíduo tóxico resultante do cozimento da madeira. “Nosso propósito é estar entre as duas maiores e mais rentáveis empresas do setor no Brasil e, assim, poder atuar de modo competitivo e eficiente nos principais mercados internacionais”, afirma Antônio Maciel Neto, presidente da empresa. “Para alcançar esse objetivo, precisamos estar apoiados no conceito de sustentabilidade.” Um dos maiores esforços da Suzano nesse sentido está relacionado ao processo de certificação de suas florestas. Desde dezembro de 2006, 100% dos 462 000 hectares de terra que a companhia possui espalhados pelos estados de São Paulo, Espírito Santo, Bahia, Minas Gerais e Maranhão têm certificação da Forest Stewardship Council (FSC), um programa de cer-

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Maciel, presidente da Suzano, em uma floresta de eucaliptos: desde dezembro de 2006, os 462 000 hectares que a empresa possui espalhados por cinco estados estão totalmente certificados pelo Forest Stewardship Council (FSC), o que deve facilitar a abertura de novos mercados no exterior para sua celulose

Pontos fracos Adota critérios de desempenho ambiental na seleção ou no desenvolvimento de fornecedores de bens e serviços apenas para seus fornecedores críticos. Empresas que atuam no ramo do agronegócio são alvo de ativistas, ONGs, índios e quilombolas. Não tem meta de redução do consumo de energia elétrica nem programa sobre esse tema. LIA LUBAMBO

A

Tem compromisso em relação à erradicação do trabalho infantil expresso no seu código de conduta e numa política corporativa específica.

tificação florestal internacional independente. Aproximadamente 50% da área é ocupada por plantações de eucalipto, 40% por mata nativa (o dobro da área mínima exigida pela legislação brasileira) e 10% por infra-estrutura. No Brasil, somente mais duas empresas do setor de papel e celulose têm suas florestas 100% certificadas pela FSC — a Klabin e a Compacel. Em maio deste ano, a Suzano iniciou um projeto de financiamento e orientação à indústria gráfica para que essa etapa da cadeia produtiva também obtenha o selo de certificação da FSC. Com isso, embalagens de papel-cartão, livros, cadernos, revistas e cartões de visita, entre outros produtos finais, chegariam ao mercado certificados. De acordo com a Suzano, essa iniciativa trará inúmeros benefícios, como o acesso facilitado ao mercado mundial, a diferenciação da empresa e de seus produtos em relação aos concorrentes e maior credibilidade perante os consumidores. “Existe uma forte tendência de compra de produtos sustentáveis no exterior e no Brasil”, diz Maciel. Ainda falta incluir nesse processo os cerca de 1 200 pequenos e médios produtores que ocupam 75 000 hectares e fornecem 25% da celulose da Suzano. O plano é incorporá-los ao projeto de certificação florestal a partir de 2008.

Postura cidadã Ações como essas foram fundamentais para que a Suzano fosse incluída há dois anos no Índice de Sustentabilidade das Empresas (ISE), da Bovespa, que reúne as companhias de capital aberto com as melhores práticas sustentáveis. As integrantes desse grupo passaram de 28 empresas em 2006 para 34 neste ano e, juntas, têm um valor de mercado de 701 bilhões de reais — 48,5% da capitalização total da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). “Fazer parte do ISE é um ótimo cartão de visita”, diz Maciel. A Suzano participa do índice há dois anos. Nos últimos 18 meses, as ações da companhia valorizaram cerca de 120%. Um dos maiores desafios que a Suzano enfrenta atualmente para manter essa boa imagem é o relacionamento com ativistas e ONGs. Assim como outras empresas ligadas ao agronegócio, a Suzano tem vivido alguns conflitos com esses stakeholders. Recentemente, terras de propriedade da empresa na Bahia foram invadidas por integrantes do Movimento dos Sem-Teto. “Por sua postura cidadã e pelo valor das leis, a Suzano entende que, em casos de invasões, o poder público e as autoridades constituídas é que devem fazer valer os direitos de posse”, afirma Maciel. “A liberação da área ocorreu sem incidentes.” 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 71


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Empresa-modelo

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Unilever

Avaliação da empresa

O valor de uma idéia simples

Pontos fortes Considera aspectos socioambientais de curto, médio e longo prazos em suas principais decisões.

Ao mudar o formato das embalagens de seus produtos, a subsidiária brasileira da Unilever diminuiu em quase 30% o consumo de papel

Adota estratégias para a redução do consumo de água e energia e das emissões de poluentes.

Leandro Quintanilha

om uma idéia aparentemente simples, a subsidiária brasileira da Unilever poupou 2 000 árvores em 2006. A tradicional caixa vertical do sabão em pó Omo, líder em vendas há 50 anos, foi substituída por uma versão horizontal — mantendo a porção de 1 quilo do produto. Como o novo formato permite o melhor aproveitamento da matéria-prima usada nas embalagens e do espaço nos caminhões que transportam o produto, a companhia diminuiu em 31% o papel-cartão usado na confecção das embalagens e em 5% o papelão das caixas de transporte. “É a mesma quantidade de sabão, com um benefício ambiental imenso”, diz Vinícius Prianti, presidente da Unilever. A idéia brasileira já foi copiada pela subsidiária da Unilever no Chile. Nos demais países, o sabão em pó é vendido em sacos plásticos. A proposta de mudança da embalagem foi apresentada à direção da Unilever no final de 2005 e nasceu de uma sugestão de um grupo de funcionários da área de desenvolvimento de sabão em pó. Porém, até levar o produto às gôndolas dos supermercados um longo caminho foi percorrido. O processo incluiu pesquisas de opinião com donas de casa — e, à primeira vista, elas não ficaram exatamente empolgadas com a inovação. “Elas tendem a ser um público mais tradicionalista”, diz Prianti. “Ainda assim, entendemos que a idéia era boa o suficiente para ser levada adiante.” Para apresentar a nova embalagem ao consu-

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Prianti, presidente da Unilever, e a nova embalagem do sabão em pó Omo: a mudança, que nasceu de uma sugestão de um grupo de funcionários da área de desenvolvimento, foi copiada depois pela subsidiária chilena

Pontos fracos

AUGUSTO BARTOLOMEI

C

Promove a diversidade. Mais de 30% dos cargos de gerência e diretoria são ocupados por mulheres.

midor, a Unilever realizou uma campanha publicitária enfatizando que a quantidade do produto seria preservada. O sucesso com o público e a economia gerada pela mudança foram tão grandes que a empresa decidiu investir ainda mais na estratégia — com o caminho aberto por Omo, meses depois a Unilever trocou também as embalagens das marcas Minerva e Brilhante.

Ganhos ambientais A economia de embalagem não foi o único avanço ambiental recente da Unilever. No ano passado, a empresa reduziu o consumo de água (14%), de energia (9%), a demanda química de oxigênio (38%), além das emissões de poluentes como óxido de enxofre (21%) e dióxido de car-

bono (10%). Os resultados são parte de um programa de redução do impacto ambiental da companhia que estabelece metas até 2011. Para coordenar suas iniciativas sociais, em 2002 a empresa criou o Instituto Unilever. Há dois anos, o instituto “adotou” uma cidade pernambucana com baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) — a pequena Araçoiaba, com 17 000 habitantes, na região metropolitana de Recife. Por meio desse projeto, que termina no final deste ano, a Unilever investiu 3 milhões de reais em educação, saúde e desenvolvimento econômico da cidade. Os primeiros resultados já começam a aparecer. A mortalidade infantil, por exemplo, caiu 6% em dois anos. Apesar desses avanços, alguns especialistas acreditam que a empresa po-

deria fazer mais. “As ações ainda não correspondem ao tamanho da organização”, afirma o consultor Marco Antonio Fujihara, do Instituto Totum, especializado em sustentabilidade. Para ele, a responsabilidade social deveria perpassar todos os setores da empresa — e não ficar restrita a uma área. “Entidades criadas à parte, como o Instituto Unilever, só fazem sentido num estágio inicial, como um processo de aprendizado”, diz Fujihara. “Num modelo ideal, o responsável por sustentabilidade não seria o presidente do instituto, mas o próprio presidente do conselho administrativo da organização.” Essa é a melhor forma, diz ele, de garantir que as decisões empresariais estejam alinhadas com as necessidades da sociedade e do meio ambiente.

Não tem programa voluntário de neutralização das emissões de carbono relativas a processos nãoprodutivos, como o transporte. Não possui um conselho fiscal em funcionamento. Não publica a Demonstração de Valor Adicionado (DVA)— informe contábil que mostra a riqueza gerada pela companhia e sua distribuição na forma de salários, tributos, despesas financeiras, lucros e dividendos.

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Avaliação da empresa

O valor de uma idéia simples

Pontos fortes Considera aspectos socioambientais de curto, médio e longo prazos em suas principais decisões.

Ao mudar o formato das embalagens de seus produtos, a subsidiária brasileira da Unilever diminuiu em quase 30% o consumo de papel

Adota estratégias para a redução do consumo de água e energia e das emissões de poluentes.

Leandro Quintanilha

om uma idéia aparentemente simples, a subsidiária brasileira da Unilever poupou 2 000 árvores em 2006. A tradicional caixa vertical do sabão em pó Omo, líder em vendas há 50 anos, foi substituída por uma versão horizontal — mantendo a porção de 1 quilo do produto. Como o novo formato permite o melhor aproveitamento da matéria-prima usada nas embalagens e do espaço nos caminhões que transportam o produto, a companhia diminuiu em 31% o papel-cartão usado na confecção das embalagens e em 5% o papelão das caixas de transporte. “É a mesma quantidade de sabão, com um benefício ambiental imenso”, diz Vinícius Prianti, presidente da Unilever. A idéia brasileira já foi copiada pela subsidiária da Unilever no Chile. Nos demais países, o sabão em pó é vendido em sacos plásticos. A proposta de mudança da embalagem foi apresentada à direção da Unilever no final de 2005 e nasceu de uma sugestão de um grupo de funcionários da área de desenvolvimento de sabão em pó. Porém, até levar o produto às gôndolas dos supermercados um longo caminho foi percorrido. O processo incluiu pesquisas de opinião com donas de casa — e, à primeira vista, elas não ficaram exatamente empolgadas com a inovação. “Elas tendem a ser um público mais tradicionalista”, diz Prianti. “Ainda assim, entendemos que a idéia era boa o suficiente para ser levada adiante.” Para apresentar a nova embalagem ao consu-

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Prianti, presidente da Unilever, e a nova embalagem do sabão em pó Omo: a mudança, que nasceu de uma sugestão de um grupo de funcionários da área de desenvolvimento, foi copiada depois pela subsidiária chilena

Pontos fracos

AUGUSTO BARTOLOMEI

C

Promove a diversidade. Mais de 30% dos cargos de gerência e diretoria são ocupados por mulheres.

midor, a Unilever realizou uma campanha publicitária enfatizando que a quantidade do produto seria preservada. O sucesso com o público e a economia gerada pela mudança foram tão grandes que a empresa decidiu investir ainda mais na estratégia — com o caminho aberto por Omo, meses depois a Unilever trocou também as embalagens das marcas Minerva e Brilhante.

Ganhos ambientais A economia de embalagem não foi o único avanço ambiental recente da Unilever. No ano passado, a empresa reduziu o consumo de água (14%), de energia (9%), a demanda química de oxigênio (38%), além das emissões de poluentes como óxido de enxofre (21%) e dióxido de car-

bono (10%). Os resultados são parte de um programa de redução do impacto ambiental da companhia que estabelece metas até 2011. Para coordenar suas iniciativas sociais, em 2002 a empresa criou o Instituto Unilever. Há dois anos, o instituto “adotou” uma cidade pernambucana com baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) — a pequena Araçoiaba, com 17 000 habitantes, na região metropolitana de Recife. Por meio desse projeto, que termina no final deste ano, a Unilever investiu 3 milhões de reais em educação, saúde e desenvolvimento econômico da cidade. Os primeiros resultados já começam a aparecer. A mortalidade infantil, por exemplo, caiu 6% em dois anos. Apesar desses avanços, alguns especialistas acreditam que a empresa po-

deria fazer mais. “As ações ainda não correspondem ao tamanho da organização”, afirma o consultor Marco Antonio Fujihara, do Instituto Totum, especializado em sustentabilidade. Para ele, a responsabilidade social deveria perpassar todos os setores da empresa — e não ficar restrita a uma área. “Entidades criadas à parte, como o Instituto Unilever, só fazem sentido num estágio inicial, como um processo de aprendizado”, diz Fujihara. “Num modelo ideal, o responsável por sustentabilidade não seria o presidente do instituto, mas o próprio presidente do conselho administrativo da organização.” Essa é a melhor forma, diz ele, de garantir que as decisões empresariais estejam alinhadas com as necessidades da sociedade e do meio ambiente.

Não tem programa voluntário de neutralização das emissões de carbono relativas a processos nãoprodutivos, como o transporte. Não possui um conselho fiscal em funcionamento. Não publica a Demonstração de Valor Adicionado (DVA)— informe contábil que mostra a riqueza gerada pela companhia e sua distribuição na forma de salários, tributos, despesas financeiras, lucros e dividendos.

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CAPINHAS v1

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Aeconomia verde A perspectiva de um cenário de restrições imposto pelo aquecimento global representa também um novo caminho de oportunidades de ganho financeiro e novos negócios para grandes empresas mundo afora


CAPINHAS v1

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Empresasmodelo Accor • Acesita • Amanco • Aracruz • Arcelor • Basf • Braskem • Caterpillar • CPFL • Elektro • IBM • Itaú • Mapfre • Natura • Philips • Promon • Real • Serasa • Suzano • Unilever


economia verde-alta

19.11.07

10:08 PM

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Negócios globais oportunidades Energia eólica na Alemanha: o setor é hoje um dos maiores empregadores do país

SEAN GALLUP/GETTY IMAGES

O lado bom do aquecimento global Empresas de todo o mundo descobrem que é possível ganhar muito dinheiro — e, de quebra, ajudar a salvar o planeta Ana Luiza Herzog

m outubro deste ano, a TXU, maior empresa de geração e distribuição de energia do estado americano do Texas, foi comprada pelos fundos de private equity Kohlberg Kravis Roberts & Company (KKR) e TPG. Dona de um faturamento anual de cerca de 10 bilhões de dólares, a TXU foi adquirida por 32 bilhões de dólares — soma que alçou a operação a uma das maiores até então realizadas por fundos de private equity no mundo. Embora vultosos, os valores envolvidos no negócio chamaram menos atenção que as nuances verdes que o coloriram. Para adquirir a empresa, o KKR e o TPG pre-

E

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cisaram firmar um compromisso com dezenas de importantes ONGs, políticos e órgãos de governo ligados à proteção do meio ambiente: se a aquisição fosse concretizada, o plano estabelecido anteriormente pela companhia de construir 11 usinas termelétricas movidas a carvão (fonte de energia que mais emite gás carbônico) seria abortado. O pacto deixou claras duas posições dos fundos. A primeira é que eles não estavam dispostos a encarar uma briga com a liga ambiental que se formou para impedir que o estado do Texas, hoje o campeão em emissões de dióxido de carbono no país, colaborasse ainda mais para o aquecimento global. A se-

gunda é que os fundos de private equity não estão interessados em financiar fontes de energia sujas — simplesmente porque podem perder dinheiro com isso. O KKR e o TPG não são os únicos a seguir esse caminho. Segundo relatórios das Nações Unidas (ONU) e do The Climate Group, ONG internacional com sede na Inglaterra, em 2006 os investimentos em fontes de energia alternativas, como solar, eólica e hidrelétrica, dobraram em relação a 2004 e somaram 71 bilhões de dólares. Desse valor, 11 bilhões de dólares vieram de fundos de private equity. Para 2009, a estimativa é que esses investimentos cheguem a 100 bilhões de dóla-

Uma economia em crescimento Levantamento da ONG inglesa The Climate Group mostra que os números relacionados à onda verde estão acelerando a economia de todo o mundo

1

milhão é o número de carros híbridos que a indústria automobilística venderá em 2010

2

milhões de pessoas já são empregadas pela indústria de energia renovável

10 23 52 700 bilhões de dólares é quanto os IPOs de fabricantes de tecnologias limpas movimentaram em 2006

bilhões de dólares foram investidos na instalação de equipamentos de energia eólica em 2006

bilhões de dólares é a previsão de quanto o mercado de produção e processamento de biocombustíveis vai movimentar em 2015

bilhões de dólares poderão ser movimentados pela indústria de energia renovável em 2010

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Negócios globais oportunidades Energia eólica na Alemanha: o setor é hoje um dos maiores empregadores do país

SEAN GALLUP/GETTY IMAGES

O lado bom do aquecimento global Empresas de todo o mundo descobrem que é possível ganhar muito dinheiro — e, de quebra, ajudar a salvar o planeta Ana Luiza Herzog

m outubro deste ano, a TXU, maior empresa de geração e distribuição de energia do estado americano do Texas, foi comprada pelos fundos de private equity Kohlberg Kravis Roberts & Company (KKR) e TPG. Dona de um faturamento anual de cerca de 10 bilhões de dólares, a TXU foi adquirida por 32 bilhões de dólares — soma que alçou a operação a uma das maiores até então realizadas por fundos de private equity no mundo. Embora vultosos, os valores envolvidos no negócio chamaram menos atenção que as nuances verdes que o coloriram. Para adquirir a empresa, o KKR e o TPG pre-

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cisaram firmar um compromisso com dezenas de importantes ONGs, políticos e órgãos de governo ligados à proteção do meio ambiente: se a aquisição fosse concretizada, o plano estabelecido anteriormente pela companhia de construir 11 usinas termelétricas movidas a carvão (fonte de energia que mais emite gás carbônico) seria abortado. O pacto deixou claras duas posições dos fundos. A primeira é que eles não estavam dispostos a encarar uma briga com a liga ambiental que se formou para impedir que o estado do Texas, hoje o campeão em emissões de dióxido de carbono no país, colaborasse ainda mais para o aquecimento global. A se-

gunda é que os fundos de private equity não estão interessados em financiar fontes de energia sujas — simplesmente porque podem perder dinheiro com isso. O KKR e o TPG não são os únicos a seguir esse caminho. Segundo relatórios das Nações Unidas (ONU) e do The Climate Group, ONG internacional com sede na Inglaterra, em 2006 os investimentos em fontes de energia alternativas, como solar, eólica e hidrelétrica, dobraram em relação a 2004 e somaram 71 bilhões de dólares. Desse valor, 11 bilhões de dólares vieram de fundos de private equity. Para 2009, a estimativa é que esses investimentos cheguem a 100 bilhões de dóla-

Uma economia em crescimento Levantamento da ONG inglesa The Climate Group mostra que os números relacionados à onda verde estão acelerando a economia de todo o mundo

1

milhão é o número de carros híbridos que a indústria automobilística venderá em 2010

2

milhões de pessoas já são empregadas pela indústria de energia renovável

10 23 52 700 bilhões de dólares é quanto os IPOs de fabricantes de tecnologias limpas movimentaram em 2006

bilhões de dólares foram investidos na instalação de equipamentos de energia eólica em 2006

bilhões de dólares é a previsão de quanto o mercado de produção e processamento de biocombustíveis vai movimentar em 2015

bilhões de dólares poderão ser movimentados pela indústria de energia renovável em 2010

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economia verde-alta

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DAVID J. PHILLIP/AP PHOTO

Negócios globais oportunidades

Termelétrica da TXU movida a carvão: compra da empresa foi condicionada ao abandono da tecnologia

res. A magnitude desses valores é uma prova de que, passado um primeiro momento de apreensão e pessimismo em relação ao aquecimento global, o que o mundo vive agora é uma espécie de euforia com a descoberta das oportunidades que seu combate pode propiciar. “É como se da noite para o dia o patinho feio da economia global tivesse se transformado num cisne”, diz um relatório publicado recentemente pelo The Climate Group.

Serviços ambientais Os exemplos de como essas oportunidades estão sendo aproveitadas pelas empresas se multiplicam velozmente. Na Alemanha, a SolarWorld transformou-se na terceira maior produtora de equipamentos de energia eólica do mundo. A companhia tem apenas oito anos de vida e cresce 40% ao ano. Em 2007, sua estimativa de faturamento é de 630 milhões de dólares. Tudo leva a crer que o ritmo de expansão da empresa e de suas concorrentes não deve arrefecer tão cedo. A principal razão é que a Alemanha estabeleceu a ambiciosa meta de ter 12,5% de sua matriz energética proveniente de fontes renováveis de energia até 2010 — hoje o país ainda é fortemente dependente do carvão nacional e das importações de gás natural da Rússia e de petróleo do Orien78 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

te Médio. Um dos efeitos dessa política é que o mercado de energia renovável é atualmente o principal criador de empregos na Alemanha. Hoje, 170 000 pessoas trabalham no setor e, até 2020, mais 100 000 vagas serão criadas. Também na Inglaterra, a expectativa é que a indústria de serviços ambientais, que inclui as empresas de energia renovável, crie 100 000 vagas nos próximos oito anos. Além dos setores envolvidos diretamente na redução da dependência dos combustíveis fósseis, diversos outros estão sentindo os desdobramentos positivos dessa nova economia. Um deles é o de créditos de carbono, que começa a ganhar relevância. Em 2006, ele movimentou 30 bilhões de dólares no mundo todo. O cenário também é animador para as empresas que investem na melhoria da eficiência energética dos produtos que oferecem aos consumidores, preocupados em reduzir o próprio impacto no meio ambiente. A gigante holandesa de eletroeletrônicos Philips deve vender neste ano 325 milhões de lâmpadas fluorescentes — cinco vezes mais do que comercializou em 2001, quando começou a campanha contra as lâmpadas incandescentes, que duram menos e consomem muito mais energia. No Brasil, a subsidiária da alemã BSH deverá entre-

gar até o final do ano 50 000 geladeiras a dez concessionárias de energia obrigadas pelo governo a investir 0,25% de sua receita operacional líquida em ações de aumento de eficiência energética para populações carentes. O que vem colocando a BSH à frente das outras fabricantes de geladeira nas negociações com as empresas de energia é um programa de fabricação reversa. Na prática, além de entregar a geladeira nova a seu dono, a BSH se responsabiliza por levar a antiga, desmontar o produto e dar um destino correto a cada um de seus componentes. Exemplos como esses revelam que a (quase) paranóia gerada pelo aquecimento global já vem dando a algumas empresas oportunidades para encontrar vantagens competitivas em relação aos concorrentes. Mostram também que perder tempo nessa corrida pode ser fatal. “Os investidores não exigirão que as companhias sejam especialistas em climatologia”, disseram Theodore Roosevelt IV e John Llewellyn, diretores do banco Lehman Brothers, num recente artigo da Harvard Business Review sobre o apetite voraz dos investidores por produtos e serviços que mitiguem o aquecimento global. “Mas que elas tenham, sim, noção exata da magnitude dessa tendência e não queiram ficar para trás.”



Benchmarks carbono-1ok

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DUFOUR SEBASTIEN / GAMMA

Negócios globais ecoeficiência

À frente da corrida pelo impacto zero Como algumas das maiores empresas do mundo conciliam as restrições de consumo m grupo cada vez maior de companhias em todo o mundo vem se empenhando para dar um choque de ecoeficiência à sua gestão. A perspectiva de escassez de água limpa, a elevação dos custos de energia não renovável e a crescente demanda da sociedade por uma atitude mais responsável criaram um novo e desafiador cenário para as empresas — e também uma série de oportunidades de conciliar a diminuição do impacto ambiental com uma produção mais eficiente. Uma estimativa recente elaborada pela ONG inglesa The Climate Group aponta que a economia de países e empresas com programas de uso eficiente de recursos, como água e energia, pode chegar a 2,5 trilhões de dólares por ano. EXAME selecionou três casos de empresas internacionais que se tornaram referência no assunto — embora ainda estejam distantes do chamado “impacto zero”.

U

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Roche A obsessão pela medida Um minucioso arsenal de metas e medidas levou a indústria farmacêutica suíça Roche a um dos mais abrangentes programas de reestruturação energética em todo o planeta. Há objetivos ambiciosos e verificados ano a ano para reduzir o consumo de diversos insumos e as emissões de gases de efeito estufa. Como resultado, enquanto as vendas anuais triplicaram de 1996 a 2006, alcançando cerca de 38 bilhões de dólares, o consumo energético manteve um ritmo menos acelerado e cresceu duas vezes. O consumo por empregado, uma das métricas mais usuais para verificar os resultados de um plano de eficiência energética numa empresa em expansão, foi reduzido em 29% em dez anos. A companhia criou até seu indicador de ecoeficiência, conhecido pela sigla em inglês EER (ou taxa de ecoeficiência), que decuplicou no mesmo pe-

ríodo. Uma das principais rupturas no caso da Roche foi substituir o carvão por outros combustíveis renováveis em suas fábricas em cerca de 150 países a partir de 2005. Essa mudança foi fundamental para a redução de 23% de suas emissões de carbono em 2006. Na última década, a queda acumulada é de 72% — resultado que levou a Roche a ganhar em 2007 o primeiro prêmio ambiental realizado pelo jornal britânico Financial Times. Um dos grandes aliados da Roche para acelerar seus programas de redução de consumo de energia é um programa de incentivo à participação de funcionários com idéias inovadoras. Em 1995, a Roche criou uma competição chamada Ecompetition, em que os funcionários da empresa concorrem com idéias que possam melhorar os índices de ecoeficiência. Os vencedores ganham uma viagem de fim de semana à Suíça. Em 2004, uma equipe dos Estados Unidos foi uma das 18 vencedoras com um projeto que em

Laboratório da Roche na Suíça: arsenal de metas para reduzir o consumo de energia

de recursos naturais com a oportunidade de ser mais eficientes José Alberto Gonçalves três anos diminuiu o consumo de energia em 30% num laboratório da fábrica da Roche em Palo Alto, na Califórnia. Trata-se hoje de uma de suas fábricas mais avançadas nessa questão. A subsidiária americana já economizou 22 milhões de dólares ao longo dos últimos cinco anos. A busca pela eficiência exigiu que a Roche passasse uma espécie de pente-fino em todos os seus processos. A empresa iniciou programas de reaproveitamento de gases para a produção de energia, substituiu lâmpadas incandescentes por fluorescentes, melhorou o isolamento das paredes de seus prédios (para reduzir a necessidade de aquecimento em dias frios) e vem ampliando sua frota de carros híbridos. Movidos a gasolina ou eletricidade, os híbridos já representam 20% da frota de veículos da empresa nos Estados Unidos — equivalente a cerca de 400 veículos. “No momento, não vemos um caminho para zerar o uso de combustíveis fósseis. Mas temos claro que

esse tipo de energia durará apenas mais 40 ou 50 anos”, disse a EXAME Rudolf Schwob, diretor de proteção ambiental corporativa da Roche. A empresa contrata regularmente centenas de auditores para verificar os mais de 120 prédios, entre escritórios e fábricas da companhia ao redor do mundo, para acompanhar o cumprimento das metas — revistas e ampliadas a cada cinco anos. “Um de nossos objetivos mais ambiciosos agora, ainda em estudo, é apoiar universidades em pesquisas sobre economia de energia e fontes renováveis”, diz Schwob.

Unilever Força para a cadeia Empresas que se propõem a reduzir o uso de água costumam centrar fogo apenas no consumo de suas linhas de produção. A anglo-holandesa Unilever, contudo, decidiu assumir uma postura mais abrangente. Nos anos 90, seus executivos con-

cluíram que as operações fabris representavam menos de 5% do que eles chamaram de water imprint — ou os rastros de consumo de água em toda a cadeia que precede a produção até o consumo final. A maior parte desses rastros estava associada ao cultivo de matérias-primas de seus alimentos e ao uso pelos consumidores de seus produtos de limpeza e higiene pessoal. A conclusão foi vital para que a empresa adotasse um enfoque inovador em relação ao tema. Em vez de se preocupar apenas com suas operações, a Unilever passou a desenvolver projetos que envolvessem seus fornecedores e também estimulassem os clientes a usar menos água. No caso dos produtores, a empresa começou a disseminar técnicas de irrigação por gotejamento nas lavouras de tomate, espinafre, chá e ervilhas. Na outra ponta — a do consumo —, a abordagem também foi audaciosa. Em 2005, a Unilever decidiu que sua área de pesquisa e desenvolvimento de produtos do2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 81


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Negócios globais ecoeficiência

À frente da corrida pelo impacto zero Como algumas das maiores empresas do mundo conciliam as restrições de consumo m grupo cada vez maior de companhias em todo o mundo vem se empenhando para dar um choque de ecoeficiência à sua gestão. A perspectiva de escassez de água limpa, a elevação dos custos de energia não renovável e a crescente demanda da sociedade por uma atitude mais responsável criaram um novo e desafiador cenário para as empresas — e também uma série de oportunidades de conciliar a diminuição do impacto ambiental com uma produção mais eficiente. Uma estimativa recente elaborada pela ONG inglesa The Climate Group aponta que a economia de países e empresas com programas de uso eficiente de recursos, como água e energia, pode chegar a 2,5 trilhões de dólares por ano. EXAME selecionou três casos de empresas internacionais que se tornaram referência no assunto — embora ainda estejam distantes do chamado “impacto zero”.

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Roche A obsessão pela medida Um minucioso arsenal de metas e medidas levou a indústria farmacêutica suíça Roche a um dos mais abrangentes programas de reestruturação energética em todo o planeta. Há objetivos ambiciosos e verificados ano a ano para reduzir o consumo de diversos insumos e as emissões de gases de efeito estufa. Como resultado, enquanto as vendas anuais triplicaram de 1996 a 2006, alcançando cerca de 38 bilhões de dólares, o consumo energético manteve um ritmo menos acelerado e cresceu duas vezes. O consumo por empregado, uma das métricas mais usuais para verificar os resultados de um plano de eficiência energética numa empresa em expansão, foi reduzido em 29% em dez anos. A companhia criou até seu indicador de ecoeficiência, conhecido pela sigla em inglês EER (ou taxa de ecoeficiência), que decuplicou no mesmo pe-

ríodo. Uma das principais rupturas no caso da Roche foi substituir o carvão por outros combustíveis renováveis em suas fábricas em cerca de 150 países a partir de 2005. Essa mudança foi fundamental para a redução de 23% de suas emissões de carbono em 2006. Na última década, a queda acumulada é de 72% — resultado que levou a Roche a ganhar em 2007 o primeiro prêmio ambiental realizado pelo jornal britânico Financial Times. Um dos grandes aliados da Roche para acelerar seus programas de redução de consumo de energia é um programa de incentivo à participação de funcionários com idéias inovadoras. Em 1995, a Roche criou uma competição chamada Ecompetition, em que os funcionários da empresa concorrem com idéias que possam melhorar os índices de ecoeficiência. Os vencedores ganham uma viagem de fim de semana à Suíça. Em 2004, uma equipe dos Estados Unidos foi uma das 18 vencedoras com um projeto que em

Laboratório da Roche na Suíça: arsenal de metas para reduzir o consumo de energia

de recursos naturais com a oportunidade de ser mais eficientes José Alberto Gonçalves três anos diminuiu o consumo de energia em 30% num laboratório da fábrica da Roche em Palo Alto, na Califórnia. Trata-se hoje de uma de suas fábricas mais avançadas nessa questão. A subsidiária americana já economizou 22 milhões de dólares ao longo dos últimos cinco anos. A busca pela eficiência exigiu que a Roche passasse uma espécie de pente-fino em todos os seus processos. A empresa iniciou programas de reaproveitamento de gases para a produção de energia, substituiu lâmpadas incandescentes por fluorescentes, melhorou o isolamento das paredes de seus prédios (para reduzir a necessidade de aquecimento em dias frios) e vem ampliando sua frota de carros híbridos. Movidos a gasolina ou eletricidade, os híbridos já representam 20% da frota de veículos da empresa nos Estados Unidos — equivalente a cerca de 400 veículos. “No momento, não vemos um caminho para zerar o uso de combustíveis fósseis. Mas temos claro que

esse tipo de energia durará apenas mais 40 ou 50 anos”, disse a EXAME Rudolf Schwob, diretor de proteção ambiental corporativa da Roche. A empresa contrata regularmente centenas de auditores para verificar os mais de 120 prédios, entre escritórios e fábricas da companhia ao redor do mundo, para acompanhar o cumprimento das metas — revistas e ampliadas a cada cinco anos. “Um de nossos objetivos mais ambiciosos agora, ainda em estudo, é apoiar universidades em pesquisas sobre economia de energia e fontes renováveis”, diz Schwob.

Unilever Força para a cadeia Empresas que se propõem a reduzir o uso de água costumam centrar fogo apenas no consumo de suas linhas de produção. A anglo-holandesa Unilever, contudo, decidiu assumir uma postura mais abrangente. Nos anos 90, seus executivos con-

cluíram que as operações fabris representavam menos de 5% do que eles chamaram de water imprint — ou os rastros de consumo de água em toda a cadeia que precede a produção até o consumo final. A maior parte desses rastros estava associada ao cultivo de matérias-primas de seus alimentos e ao uso pelos consumidores de seus produtos de limpeza e higiene pessoal. A conclusão foi vital para que a empresa adotasse um enfoque inovador em relação ao tema. Em vez de se preocupar apenas com suas operações, a Unilever passou a desenvolver projetos que envolvessem seus fornecedores e também estimulassem os clientes a usar menos água. No caso dos produtores, a empresa começou a disseminar técnicas de irrigação por gotejamento nas lavouras de tomate, espinafre, chá e ervilhas. Na outra ponta — a do consumo —, a abordagem também foi audaciosa. Em 2005, a Unilever decidiu que sua área de pesquisa e desenvolvimento de produtos do2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 81


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Fábrica da Unilever: até fornecedores e clientes passaram a usar menos água

Linha de produção da SCA: reação à crítica de ambientalistas

Menos é mais O QUE FEZ

Roche

Unilever

SCA

Investiu quase 260 milhões de dólares apenas nos últimos três anos em redução de energia

Em 1995, começou a mudar processos produtivos em suas fábricas em 100 países para a redução de consumo de água

Desde 1999,a SCAinveste 130 milhões de dólares por ano em reciclagem e certificação de madeira em 45 fábricas de papel

RESULTADO

O esforço e o resultado de algumas das empresas mais avançadas do mundo em ecoeficiência

A empresa reduziu pela metade o consumo de energia por empregado em suas fábricas em mais de 150 países na última década

Desde 1995, reduziu 58% de seu consumo de água por tonelada produzida. Apenas em sua fábrica em Caivano, na Itália, passou a economizar cerca de 130 000 dólares por ano

Hoje, quase metade de toda a sua produção de papéis domésticos utiliza fibra reciclada. A outra metade vem de madeira certificada

82 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

carvão e derivados de petróleo por biocombustíveis e resíduos de madeira. Tudo isso explica por que a SCA ficou entre as dez empresas mais verdes do mundo, segundo levantamento que o jornal inglês The Independent publicou em junho deste ano. Os primeiros passos da nova política socioambiental da SCA, na qual a empresa investe quase 130 milhões de dólares por ano, foram ensaiados ao longo dos anos 90 em reação às críticas de organizações ambientalistas sobre a falta de garantias de que a matéria-prima de suas fábricas vinha de florestas exploradas de maneira sustentável. “Resolvemos dialogar com essas entidades e nos comprometemos com o manejo responsável de nossas florestas”, disse a EXAME Bjorn Lyngfelt, vice-presidente de comunicações do braço de produtos florestais da SCA. Para evitar ataques de ambientalistas, a SCA montou um sistema

A economia de empresas e países em todo o mundo com o uso eficiente de água e energia pode chegar a 2,5 trilhões de dólares por ano

DIVULGAÇÃO

mésticos e de cuidado pessoal precisaria reavaliar a integração dos aspectos social, econômico e ambiental no desenvolvimento de novas marcas e também na revisão de produtos existentes. Na prática, o resultado foi a criação de produtos como o detergente para lavar roupas All Small and Mighty, com dois terços a menos de água em sua composição do que seus concorrentes. Lançado inicialmente nos Estados Unidos em 2005, o detergente também possibilitou reduzir o tamanho das embalagens, que ficaram com apenas um terço das dimensões do modelo antigo. Outra investida foi a reformulação do detergente para lavar roupas Surf Excel, à venda na árida região sul da Índia. O objetivo foi fazer com que o produto gerasse menos espuma, poupando até dois baldes de água por lavagem. “A inovação foi bem recebida pelos moradores da região, que normalmente gastam mais com água do que com sabão”, disse a EXAME Lettemieke Mulder, responsável por assuntos externos ambientais e de sustentabilidade da Unilever, baseado na matriz, em Londres. Dentro de casa, a empresa também vem colhendo bons resultados. Desde 1995, a Unilever reduziu em suas fábricas mundialmente 58% de consumo de água por tonelada. Em regiões secas, muitas das unidades da Unilever perseguem a meta de zerar o despejo de efluentes líquidos nos rios, reciclando-os para uso na irrigação ou na lavagem das fábricas. Na Índia, 36 das 48 unidades da companhia já alcançaram o objetivo. A Unilever não revela quanto economiza por ano

PAUL O'DRISCOLL/LANDOV

Negócios globais ecoeficiência

em todo o mundo com todas as suas metas de redução de consumo de água. Alguns pequenos exemplos, porém, demonstram a dimensão dessa economia. A iniciativa em uma de suas fábricas, localizada em Caivano, no sul da Itália, por exemplo, impediu a perda de quase 20% de toda a água consumida pela unidade — antes evaporada em torres de resfriamento. Com isso, deixou de gastar 130 000 dólares por ano.

SCA A matéria-prima 100% verde Presente em cerca de 50 países e com faturamento de 15 bilhões de dólares em 2006, a sueca Svenska Cellulosa Aktiebolaget (SCA) foi uma das primeiras indústrias de celulose e papel a chegar ao maior patamar de ecoeficiência para o setor — toda sua matéria-prima é reciclada ou certificada. A fibra reciclada representa quase metade dos insumos processados por suas 45 fábricas de embalagens, produtos florestais e papéis de

usos diversos. A atividade acabou virando um novo negócio para a SCA, que hoje também vende material reciclado para outros clientes na Europa e faturou 586 milhões de dólares no ano passado. O restante da matéria-prima vem de madeiras certificadas. A área florestal da companhia ocupa 2,6 milhões de hectares no norte da Suécia e é certificada segundo os padrões do Conselho de Manejo Florestal (na sigla em inglês, FSC) — o mais valorizado mundialmente tanto pelas organizações não-governamentais quanto pelas companhias que atuam no setor. Na SCA até as toras compradas de fornecedores devem seguir as regras do FSC. Nos últimos anos, a companhia também adotou procedimentos para evitar a compra de madeira ilegal ou vinda de regiões onde há violações aos direitos humanos e de indígenas. Além da área de matéria-prima, a política ambiental da companhia sueca prioriza a redução no consumo de água e de efluentes e a diminuição nas emissões de gás carbônico por meio da troca de

de verificação detalhado de seus fornecedores para rastrear a matéria-prima desde sua origem. O resultado é uma avaliação dividida em cores. A vermelha identifica o fornecedor que está fora dos padrões socioambientais. Quem apresenta respostas incompletas, mas atende a parte dos critérios, recebe a cor amarela. Finalmente, a verde é atribuída a fornecedores com sistema de rastreamento da origem da matéria-prima e certificação de sua produção com o selo do FSC ou outro similar. Esses podem vender à vontade sua produção para a SCA. Como parte de seu programa de conservação ambiental, a SCA mantém intactos 7% das áreas de exploração de sua floresta, o que exige investimento de aproximadamente 13 milhões de dólares por ano nas compras de matéria-prima de terceiros. “Não conseguimos repassar o acréscimo de custos aos preços de nossos produtos, mas temos muitos ganhos”, diz Lyngfelt. “As relações com nossos clientes são mais estáveis, mesmo quando os nossos preços sobem.” 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 83


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Fábrica da Unilever: até fornecedores e clientes passaram a usar menos água

Linha de produção da SCA: reação à crítica de ambientalistas

Menos é mais O QUE FEZ

Roche

Unilever

SCA

Investiu quase 260 milhões de dólares apenas nos últimos três anos em redução de energia

Em 1995, começou a mudar processos produtivos em suas fábricas em 100 países para a redução de consumo de água

Desde 1999,a SCAinveste 130 milhões de dólares por ano em reciclagem e certificação de madeira em 45 fábricas de papel

RESULTADO

O esforço e o resultado de algumas das empresas mais avançadas do mundo em ecoeficiência

A empresa reduziu pela metade o consumo de energia por empregado em suas fábricas em mais de 150 países na última década

Desde 1995, reduziu 58% de seu consumo de água por tonelada produzida. Apenas em sua fábrica em Caivano, na Itália, passou a economizar cerca de 130 000 dólares por ano

Hoje, quase metade de toda a sua produção de papéis domésticos utiliza fibra reciclada. A outra metade vem de madeira certificada

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carvão e derivados de petróleo por biocombustíveis e resíduos de madeira. Tudo isso explica por que a SCA ficou entre as dez empresas mais verdes do mundo, segundo levantamento que o jornal inglês The Independent publicou em junho deste ano. Os primeiros passos da nova política socioambiental da SCA, na qual a empresa investe quase 130 milhões de dólares por ano, foram ensaiados ao longo dos anos 90 em reação às críticas de organizações ambientalistas sobre a falta de garantias de que a matéria-prima de suas fábricas vinha de florestas exploradas de maneira sustentável. “Resolvemos dialogar com essas entidades e nos comprometemos com o manejo responsável de nossas florestas”, disse a EXAME Bjorn Lyngfelt, vice-presidente de comunicações do braço de produtos florestais da SCA. Para evitar ataques de ambientalistas, a SCA montou um sistema

A economia de empresas e países em todo o mundo com o uso eficiente de água e energia pode chegar a 2,5 trilhões de dólares por ano

DIVULGAÇÃO

mésticos e de cuidado pessoal precisaria reavaliar a integração dos aspectos social, econômico e ambiental no desenvolvimento de novas marcas e também na revisão de produtos existentes. Na prática, o resultado foi a criação de produtos como o detergente para lavar roupas All Small and Mighty, com dois terços a menos de água em sua composição do que seus concorrentes. Lançado inicialmente nos Estados Unidos em 2005, o detergente também possibilitou reduzir o tamanho das embalagens, que ficaram com apenas um terço das dimensões do modelo antigo. Outra investida foi a reformulação do detergente para lavar roupas Surf Excel, à venda na árida região sul da Índia. O objetivo foi fazer com que o produto gerasse menos espuma, poupando até dois baldes de água por lavagem. “A inovação foi bem recebida pelos moradores da região, que normalmente gastam mais com água do que com sabão”, disse a EXAME Lettemieke Mulder, responsável por assuntos externos ambientais e de sustentabilidade da Unilever, baseado na matriz, em Londres. Dentro de casa, a empresa também vem colhendo bons resultados. Desde 1995, a Unilever reduziu em suas fábricas mundialmente 58% de consumo de água por tonelada. Em regiões secas, muitas das unidades da Unilever perseguem a meta de zerar o despejo de efluentes líquidos nos rios, reciclando-os para uso na irrigação ou na lavagem das fábricas. Na Índia, 36 das 48 unidades da companhia já alcançaram o objetivo. A Unilever não revela quanto economiza por ano

PAUL O'DRISCOLL/LANDOV

Negócios globais ecoeficiência

em todo o mundo com todas as suas metas de redução de consumo de água. Alguns pequenos exemplos, porém, demonstram a dimensão dessa economia. A iniciativa em uma de suas fábricas, localizada em Caivano, no sul da Itália, por exemplo, impediu a perda de quase 20% de toda a água consumida pela unidade — antes evaporada em torres de resfriamento. Com isso, deixou de gastar 130 000 dólares por ano.

SCA A matéria-prima 100% verde Presente em cerca de 50 países e com faturamento de 15 bilhões de dólares em 2006, a sueca Svenska Cellulosa Aktiebolaget (SCA) foi uma das primeiras indústrias de celulose e papel a chegar ao maior patamar de ecoeficiência para o setor — toda sua matéria-prima é reciclada ou certificada. A fibra reciclada representa quase metade dos insumos processados por suas 45 fábricas de embalagens, produtos florestais e papéis de

usos diversos. A atividade acabou virando um novo negócio para a SCA, que hoje também vende material reciclado para outros clientes na Europa e faturou 586 milhões de dólares no ano passado. O restante da matéria-prima vem de madeiras certificadas. A área florestal da companhia ocupa 2,6 milhões de hectares no norte da Suécia e é certificada segundo os padrões do Conselho de Manejo Florestal (na sigla em inglês, FSC) — o mais valorizado mundialmente tanto pelas organizações não-governamentais quanto pelas companhias que atuam no setor. Na SCA até as toras compradas de fornecedores devem seguir as regras do FSC. Nos últimos anos, a companhia também adotou procedimentos para evitar a compra de madeira ilegal ou vinda de regiões onde há violações aos direitos humanos e de indígenas. Além da área de matéria-prima, a política ambiental da companhia sueca prioriza a redução no consumo de água e de efluentes e a diminuição nas emissões de gás carbônico por meio da troca de

de verificação detalhado de seus fornecedores para rastrear a matéria-prima desde sua origem. O resultado é uma avaliação dividida em cores. A vermelha identifica o fornecedor que está fora dos padrões socioambientais. Quem apresenta respostas incompletas, mas atende a parte dos critérios, recebe a cor amarela. Finalmente, a verde é atribuída a fornecedores com sistema de rastreamento da origem da matéria-prima e certificação de sua produção com o selo do FSC ou outro similar. Esses podem vender à vontade sua produção para a SCA. Como parte de seu programa de conservação ambiental, a SCA mantém intactos 7% das áreas de exploração de sua floresta, o que exige investimento de aproximadamente 13 milhões de dólares por ano nas compras de matéria-prima de terceiros. “Não conseguimos repassar o acréscimo de custos aos preços de nossos produtos, mas temos muitos ganhos”, diz Lyngfelt. “As relações com nossos clientes são mais estáveis, mesmo quando os nossos preços sobem.” 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 83


ONG Future 500 V1-alta

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Negócios globais parcerias

AFP PHOTO/BOCOG/HO

Centro aquático nacional na China: palco das Olimpíadas e vitrine para empresas e ativistas

Uma solução para as brigas Especializada em resolver impasses envolvendo grupos de ativistas e grandes empresas, a Future 500 se transformou numa das mais requisitadas ONGs do mundo Guilherme Fogaça

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Future 500 Quando surgiu Dezembro de 1995

lgumas das maiores empresas do mundo — gigantes como Nestlé, Coca-Cola e Lenovo — preparam-se para estampar suas marcas nas quadras, nos estádios e nas demais instalações em que serão realizados os Jogos Olímpicos de 2008, na China. Estimase que uma multidão de 3 bilhões de pessoas em todo o mundo assistirá aos jogos pela televisão ou pela internet. O evento representa uma oportunidade rara de expor uma marca e associá-la a valores ligados a esporte e diversão — para isso,

A

cada uma das patrocinadoras vai investir até 80 milhões de dólares. É também a vitrine ideal para que grupos opositores às atuais práticas trabalhistas, ambientais e de direitos humanos da China apresentem seus argumentos a um público colossal. Para evitar que a exposição nas Olimpíadas tenha efeito oposto ao pretendido, 15 desses patrocinadores decidiram contratar o americano Bill Shireman, fundador da organização não-governamental Future 500. A ONG é hoje a maior consultoria do mundo especializada em aproximar empresas e sta-

Fundadores Bill Shireman, advogado ambientalista, e Tachi Kiuchi, ex-presidente da Mitsubishi Electric nos Estados Unidos O que faz Aproxima as empresas de seus stakeholders — grupos que podem ser afetados direta ou indiretamente pelo negócio — para que atuem em busca de um objetivo comum Principais clientes Marcas conhecidas (e, portanto, alvos preferidos de ativistas), como Coca-Cola, GE, Dell e Nestlé

keholders — termo atualmente usado para definir todos aqueles que podem ser afetados de alguma maneira pelo negócio, de clientes a ativistas. A metodologia usada pela Future 500 para evitar manifestações que respinguem na imagem dos patrocinadores durante as Olimpíadas será tão óbvia quanto complexa: o diálogo. A organização identifica os objetivos dos stakeholders e verifica o que as empresas podem fazer para que as duas partes trabalhem juntas. “O Bill tem a habilidade única de ter um pé em cada mundo. Ele senta com um presidente de empresa para traçar ótimas estratégias e também é muito respeitado por entidades não lucrativas”, disse a EXAME Alex McIntosh, gerente de cidadania corporativa da Nestlé Waters, uma das clientes da Future 500. A trajetória de Shireman como consultor de grandes companhias começou quase por acaso. Em 1997, o então presidente da Mitsubishi Electric, Tachi Kiuchi, ficou intrigado com uma sucessão de fatos incomuns envolvendo a empresa. De uma hora para outra, Kiuchi passara a receber cartas de crianças perguntando por que a Mitsubishi Electric estava destruindo as florestas mundiais. Sem entender o que estava acontecendo, Kiuchi tentou obter uma resposta com o diretor de operações da Mitsubishi Motors, outra empresa do grupo. Em vez de ouvir uma boa explicação, ele teve mais uma surpresa desagradável. Alguns manifestantes estavam se trancando em carros da marca durante mostras automotivas nos Estados Unidos para denunciar as más práticas ambientais da empresa. Por trás do boicote estavam os ativistas da Rainforest Action Network, grupo de São Francisco que até hoje defende a preservação das florestas. Kiuchi decidiu então pedir a ajuda de Shireman, naquela época um proeminente advogado ambientalista que havia conseguido aprovar uma lei de reciclagem na Califórnia. Shire-

man recomendou ao executivo que se aproximasse dos integrantes da ONG para ganhar a confiança deles e identificar medidas que a empresa pudesse adotar para proteger o meio ambiente. Em fevereiro de 1998, a Mitsubishi se comprometeu com a Rainforest Action Network a cumprir algumas metas, como reduzir 75% do uso de papel no prazo de um ano. Deu certo. Mais tarde, o exemplo foi seguido por 400 empresas pelo mundo. Pouco tempo depois, Shireman e Kiuchi fundaram a Future 500.

Software conselheiro Desde então, algumas das maiores — e mais visadas — companhias globais se tornaram clientes da Future 500. Dessa lista fazem parte nomes como Dell e Nike, que pagam uma taxa simbólica de 6 000 dólares por ano para associarse e usufruir a consultoria da organização (projetos mais complexos, como os que envolvem as Olimpíadas, exigem pagamento extra). Hoje, a ONG possui quatro escritórios ao redor do mundo e uma equipe de 22 consultores para atender os clientes. De acordo com Shireman, a procura pelos serviços aumenta a cada ano. “Empresas de todo o mundo se deram conta de que o bem mais valioso que possuem é o próprio nome”, disse Shireman a EXAME. “Quando suas marcas são atacadas, é como se atacassem suas propriedades.” Segundo ele, no mundo atual — com a internet e a constante troca de informações —, as empresas não podem mais ignorar críticas e ataques públicos. Nem se distanciar de seus stakeholders. Ao contrário. A melhor receita é aproximar-se de cada um deles e procurar o entendimento. Além da consultoria, a organização oferece um software para ajudar a monitorar o relacionamento com os stakeholders. A Coca-Cola, por exemplo, adotou o programa em 2005. O produto, chamado Global Citizenship 360, funciona como uma espécie de conselheiro e confronta a performance da companhia com as expectativas das partes interessadas. “Dessa maneira, todas as unidades da Coca-Cola conseguem listar as práticas que os stakeholders aprovam e as atitudes que eles gostariam que a empresa adotasse”, diz Shireman. 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 85


ONG Future 500 V1-alta

19.11.07

10:06 PM

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Negócios globais parcerias

AFP PHOTO/BOCOG/HO

Centro aquático nacional na China: palco das Olimpíadas e vitrine para empresas e ativistas

Uma solução para as brigas Especializada em resolver impasses envolvendo grupos de ativistas e grandes empresas, a Future 500 se transformou numa das mais requisitadas ONGs do mundo Guilherme Fogaça

84 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Future 500 Quando surgiu Dezembro de 1995

lgumas das maiores empresas do mundo — gigantes como Nestlé, Coca-Cola e Lenovo — preparam-se para estampar suas marcas nas quadras, nos estádios e nas demais instalações em que serão realizados os Jogos Olímpicos de 2008, na China. Estimase que uma multidão de 3 bilhões de pessoas em todo o mundo assistirá aos jogos pela televisão ou pela internet. O evento representa uma oportunidade rara de expor uma marca e associá-la a valores ligados a esporte e diversão — para isso,

A

cada uma das patrocinadoras vai investir até 80 milhões de dólares. É também a vitrine ideal para que grupos opositores às atuais práticas trabalhistas, ambientais e de direitos humanos da China apresentem seus argumentos a um público colossal. Para evitar que a exposição nas Olimpíadas tenha efeito oposto ao pretendido, 15 desses patrocinadores decidiram contratar o americano Bill Shireman, fundador da organização não-governamental Future 500. A ONG é hoje a maior consultoria do mundo especializada em aproximar empresas e sta-

Fundadores Bill Shireman, advogado ambientalista, e Tachi Kiuchi, ex-presidente da Mitsubishi Electric nos Estados Unidos O que faz Aproxima as empresas de seus stakeholders — grupos que podem ser afetados direta ou indiretamente pelo negócio — para que atuem em busca de um objetivo comum Principais clientes Marcas conhecidas (e, portanto, alvos preferidos de ativistas), como Coca-Cola, GE, Dell e Nestlé

keholders — termo atualmente usado para definir todos aqueles que podem ser afetados de alguma maneira pelo negócio, de clientes a ativistas. A metodologia usada pela Future 500 para evitar manifestações que respinguem na imagem dos patrocinadores durante as Olimpíadas será tão óbvia quanto complexa: o diálogo. A organização identifica os objetivos dos stakeholders e verifica o que as empresas podem fazer para que as duas partes trabalhem juntas. “O Bill tem a habilidade única de ter um pé em cada mundo. Ele senta com um presidente de empresa para traçar ótimas estratégias e também é muito respeitado por entidades não lucrativas”, disse a EXAME Alex McIntosh, gerente de cidadania corporativa da Nestlé Waters, uma das clientes da Future 500. A trajetória de Shireman como consultor de grandes companhias começou quase por acaso. Em 1997, o então presidente da Mitsubishi Electric, Tachi Kiuchi, ficou intrigado com uma sucessão de fatos incomuns envolvendo a empresa. De uma hora para outra, Kiuchi passara a receber cartas de crianças perguntando por que a Mitsubishi Electric estava destruindo as florestas mundiais. Sem entender o que estava acontecendo, Kiuchi tentou obter uma resposta com o diretor de operações da Mitsubishi Motors, outra empresa do grupo. Em vez de ouvir uma boa explicação, ele teve mais uma surpresa desagradável. Alguns manifestantes estavam se trancando em carros da marca durante mostras automotivas nos Estados Unidos para denunciar as más práticas ambientais da empresa. Por trás do boicote estavam os ativistas da Rainforest Action Network, grupo de São Francisco que até hoje defende a preservação das florestas. Kiuchi decidiu então pedir a ajuda de Shireman, naquela época um proeminente advogado ambientalista que havia conseguido aprovar uma lei de reciclagem na Califórnia. Shire-

man recomendou ao executivo que se aproximasse dos integrantes da ONG para ganhar a confiança deles e identificar medidas que a empresa pudesse adotar para proteger o meio ambiente. Em fevereiro de 1998, a Mitsubishi se comprometeu com a Rainforest Action Network a cumprir algumas metas, como reduzir 75% do uso de papel no prazo de um ano. Deu certo. Mais tarde, o exemplo foi seguido por 400 empresas pelo mundo. Pouco tempo depois, Shireman e Kiuchi fundaram a Future 500.

Software conselheiro Desde então, algumas das maiores — e mais visadas — companhias globais se tornaram clientes da Future 500. Dessa lista fazem parte nomes como Dell e Nike, que pagam uma taxa simbólica de 6 000 dólares por ano para associarse e usufruir a consultoria da organização (projetos mais complexos, como os que envolvem as Olimpíadas, exigem pagamento extra). Hoje, a ONG possui quatro escritórios ao redor do mundo e uma equipe de 22 consultores para atender os clientes. De acordo com Shireman, a procura pelos serviços aumenta a cada ano. “Empresas de todo o mundo se deram conta de que o bem mais valioso que possuem é o próprio nome”, disse Shireman a EXAME. “Quando suas marcas são atacadas, é como se atacassem suas propriedades.” Segundo ele, no mundo atual — com a internet e a constante troca de informações —, as empresas não podem mais ignorar críticas e ataques públicos. Nem se distanciar de seus stakeholders. Ao contrário. A melhor receita é aproximar-se de cada um deles e procurar o entendimento. Além da consultoria, a organização oferece um software para ajudar a monitorar o relacionamento com os stakeholders. A Coca-Cola, por exemplo, adotou o programa em 2005. O produto, chamado Global Citizenship 360, funciona como uma espécie de conselheiro e confronta a performance da companhia com as expectativas das partes interessadas. “Dessa maneira, todas as unidades da Coca-Cola conseguem listar as práticas que os stakeholders aprovam e as atitudes que eles gostariam que a empresa adotasse”, diz Shireman. 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 85


Entrevista

19/11/2007

23:01

Page 86

Entrevista estratégia

Parem de gastar tanto dinheiro

O

americano Michael Porter é hoje a maior referência mundial em estratégia. Professor da Harvard Business School, onde coordena um programa para presidentes de empresas que faturam mais de 1 bilhão de dólares, ele também gerencia na universidade o Instituto para Estratégia e Competitividade (um renomado centro de estudos de políticas públicas) e é diretor do ranking de competitividade de nações do Fórum Econômico Mundial. Em meio a aulas e consultorias a dezenas de empresas e países, como Nova Zelândia, Taiwan e Líbia, Porter também tem investido parte de seu tempo pregando sobre um tema que, segundo ele, ganhará cada vez mais relevância para as empresas: a responsabilidade corporativa. Ele escreveu o primeiro artigo exclusivamente sobre o assunto em 1999. O mais recente deles, publicado pela Harvard Business Review no final de 2006, foi eleito por um júri de críticos como o melhor da publicação no ano. Em todos eles, Porter bate na mesma tecla: as empresas estão perdendo dinheiro porque ainda não aprenderam a enxergar a responsabilidade corporativa como algo estratégico. Numa visita ao Brasil, ele falou com exclusividade a EXAME sobre por que quebrar essa barreira será crucial para a sobrevivência das companhias no futuro. EXAME Há alguns anos o senhor afirma

que as empresas encaram a responsabilidade social corporativa como um simples instrumento de relações públicas ou de marketing. Por quê? MICHAEL PORTER Eu diria que a área de responsabilidade social passou por dois estágios. O primeiro deles foi o da reação a pressões políticas, quando as empresas se viram forçadas a dar respostas para questões que elas não pensavam ser sua responsabilidade. Há muitos casos emblemáticos desse período. Um deles é o da Nike, que no início da década de 90 passou a ser vítima de um boicote por parte de consumidores no mundo todo ao ter sua relação com fornecedores na Indonésia escancara86 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

da pela imprensa. As empresas estavam sendo criticadas, e isso gerava uma péssima publicidade. Elas passaram então a desempenhar algumas ações — mas não de maneira voluntária. Veio o segundo estágio, que teve início há cerca de cinco anos, quando as companhias começaram a perceber que a responsabilidade social poderia ser algo positivo e que valeria a pena ser proativo. Elas passaram então a enxergá-la como um instrumento para a construção de uma imagem. Por que as empresas têm dificuldade para sair desse estágio? Normalmente, as companhias têm uma estratégia econômica e uma estratégia

ARTE SOBRE FOTO BRENDAN SMIALOWSKI/BLOOMBERG NEWS/LANDOV

Para o guru Michael Porter, as empresas deveriam selecionar melhor seus projetos de responsabilidade corporativa — e investir apenas naqueles que têm relação com seu negócio Ana Luiza Herzog

de responsabilidade social, e o que elas devem ter é uma estratégia só. Na década de 90, escrevi um artigo para a revista Scientific America que explicava como a empresa seria mais competitiva se cuidasse do meio ambiente. Fui duramente criticado. Hoje, sabe-se que existe um universo de oportunidades aí. A mesma lógica vale para outros temas, que já foram mais digeridos pelas companhias, como investimento em treinamento e segurança. O que o senhor sabe sobre o movimento de responsabilidade corporativa no Brasil? Assim como no resto do mundo, diria que a maioria das empresas brasileiras

Normalmente, as companhias têm uma estratégia econômica e uma estratégia de responsabilidade social, e o que elas devem ter é uma estratégia só está no segundo estágio. Não posso fazer uma análise profunda, mas o que me parece é que as empresas são muito generosas e investem muito dinheiro em suas ações. No entanto, fazem muitas coisas ao mesmo tempo, e poucas delas me parecem estratégicas. Na maioria dos casos, essas ações são motivadas por culpa, para melhorar a imagem, porque no Brasil existe uma grande preocupação com eqüidade social.

O senhor afirma que as empresas devem priorizar as questões sociais às quais vão se dedicar. Por quê? Tenho a sensação de que há muito destaque para “quanto” se gasta e pouco para “como”. Veja a Petrobras. A empresa é muito generosa no volume de recursos que destina à sua estratégia de responsabilidade corporativa e embarca numa miríade de questões sociais. Trata-se de um exemplo típico de companhia que espa-

lha seu dinheiro por toda parte na tentativa de ser socialmente responsável. A Petrobras combate o analfabetismo, a fome, incentiva a cultura. E no meio de tudo isso há algumas jóias, projetos relacionados a meio ambiente, biocombustíveis — que são as áreas nas quais sua atuação pode realmente ter um impacto maior. Podemos analisar outras companhias brasileiras e veremos o mesmo padrão de comportamento. 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 87


Entrevista

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Entrevista estratégia

Parem de gastar tanto dinheiro

O

americano Michael Porter é hoje a maior referência mundial em estratégia. Professor da Harvard Business School, onde coordena um programa para presidentes de empresas que faturam mais de 1 bilhão de dólares, ele também gerencia na universidade o Instituto para Estratégia e Competitividade (um renomado centro de estudos de políticas públicas) e é diretor do ranking de competitividade de nações do Fórum Econômico Mundial. Em meio a aulas e consultorias a dezenas de empresas e países, como Nova Zelândia, Taiwan e Líbia, Porter também tem investido parte de seu tempo pregando sobre um tema que, segundo ele, ganhará cada vez mais relevância para as empresas: a responsabilidade corporativa. Ele escreveu o primeiro artigo exclusivamente sobre o assunto em 1999. O mais recente deles, publicado pela Harvard Business Review no final de 2006, foi eleito por um júri de críticos como o melhor da publicação no ano. Em todos eles, Porter bate na mesma tecla: as empresas estão perdendo dinheiro porque ainda não aprenderam a enxergar a responsabilidade corporativa como algo estratégico. Numa visita ao Brasil, ele falou com exclusividade a EXAME sobre por que quebrar essa barreira será crucial para a sobrevivência das companhias no futuro. EXAME Há alguns anos o senhor afirma

que as empresas encaram a responsabilidade social corporativa como um simples instrumento de relações públicas ou de marketing. Por quê? MICHAEL PORTER Eu diria que a área de responsabilidade social passou por dois estágios. O primeiro deles foi o da reação a pressões políticas, quando as empresas se viram forçadas a dar respostas para questões que elas não pensavam ser sua responsabilidade. Há muitos casos emblemáticos desse período. Um deles é o da Nike, que no início da década de 90 passou a ser vítima de um boicote por parte de consumidores no mundo todo ao ter sua relação com fornecedores na Indonésia escancara86 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

da pela imprensa. As empresas estavam sendo criticadas, e isso gerava uma péssima publicidade. Elas passaram então a desempenhar algumas ações — mas não de maneira voluntária. Veio o segundo estágio, que teve início há cerca de cinco anos, quando as companhias começaram a perceber que a responsabilidade social poderia ser algo positivo e que valeria a pena ser proativo. Elas passaram então a enxergá-la como um instrumento para a construção de uma imagem. Por que as empresas têm dificuldade para sair desse estágio? Normalmente, as companhias têm uma estratégia econômica e uma estratégia

ARTE SOBRE FOTO BRENDAN SMIALOWSKI/BLOOMBERG NEWS/LANDOV

Para o guru Michael Porter, as empresas deveriam selecionar melhor seus projetos de responsabilidade corporativa — e investir apenas naqueles que têm relação com seu negócio Ana Luiza Herzog

de responsabilidade social, e o que elas devem ter é uma estratégia só. Na década de 90, escrevi um artigo para a revista Scientific America que explicava como a empresa seria mais competitiva se cuidasse do meio ambiente. Fui duramente criticado. Hoje, sabe-se que existe um universo de oportunidades aí. A mesma lógica vale para outros temas, que já foram mais digeridos pelas companhias, como investimento em treinamento e segurança. O que o senhor sabe sobre o movimento de responsabilidade corporativa no Brasil? Assim como no resto do mundo, diria que a maioria das empresas brasileiras

Normalmente, as companhias têm uma estratégia econômica e uma estratégia de responsabilidade social, e o que elas devem ter é uma estratégia só está no segundo estágio. Não posso fazer uma análise profunda, mas o que me parece é que as empresas são muito generosas e investem muito dinheiro em suas ações. No entanto, fazem muitas coisas ao mesmo tempo, e poucas delas me parecem estratégicas. Na maioria dos casos, essas ações são motivadas por culpa, para melhorar a imagem, porque no Brasil existe uma grande preocupação com eqüidade social.

O senhor afirma que as empresas devem priorizar as questões sociais às quais vão se dedicar. Por quê? Tenho a sensação de que há muito destaque para “quanto” se gasta e pouco para “como”. Veja a Petrobras. A empresa é muito generosa no volume de recursos que destina à sua estratégia de responsabilidade corporativa e embarca numa miríade de questões sociais. Trata-se de um exemplo típico de companhia que espa-

lha seu dinheiro por toda parte na tentativa de ser socialmente responsável. A Petrobras combate o analfabetismo, a fome, incentiva a cultura. E no meio de tudo isso há algumas jóias, projetos relacionados a meio ambiente, biocombustíveis — que são as áreas nas quais sua atuação pode realmente ter um impacto maior. Podemos analisar outras companhias brasileiras e veremos o mesmo padrão de comportamento. 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 87


Entrevista

19/11/2007

22:52

Page 88

Entrevista estratégia Mas não são causas nobres? São todas causas muito nobres, mas deixam claro que há falta de foco estratégico. Um banco deve ajudar a população de baixa renda a poupar, a financiar moradia, porque é disso que ele entende. Apoiar uma companhia de dança é uma questão social genérica para uma empresa de energia, mas pode se transformar num diferencial competitivo para uma empresa de cartão de crédito, que lucra com o aumento dos gastos dos consumidores em entretenimento. O senhor afirma que as empresas têm se tornado reféns dos diferentes públicos que exercem influência na sua gestão, os chamados stakeholders. Elas superestimam a influência deles? As empresas são muito sensíveis a opiniões externas. E é claro que as visões de alguns stakeholders sobre o negócio são

importante é o resultado. Se o que sua empresa faz provoca impactos reais, ela acabará ganhando notoriedade.

Já há empresas que conseguem adicionar uma dimensão social à estratégia e ganhar dinheiro com isso? O varejista americano Whole Foods é um excelente exemplo. A proposição de valor da empresa é vender produtos orgânicos ou naturais para consumidores que se preocupam com a comida que ingerem e com o meio ambiente. E as questões sociais que permeiam essa proposição de valor é que permitem que ela tenha uma posição única no varejo. A empresa prioriza a compra de fornecedores locais, não coloca nas gôndolas alimentos que contenham algum dos 100 ingredientes que ela considera nocivos à saúde humana ou ao meio ambiente e gerencia uma fundação que luta para que os animais sejam criados e abatidos de maneira digna, entre outras iniciativas. Ou seja, tudo que a empresa faz reforça a dimensão social de sua proposição de valor.

Recentemente, o senhor afirmou que o aquecimento global deve alterar radicalmente o cenário corporativo, a exemplo de fenômenos como a globalização e a revolução tecnológica. As empresas estão preparadas? Ainda há muita incerteza sobre o que realmente está acontecendo com o planeta, mesmo com toda a veemência do ex-vice-presidente americano Al Gore. O que deve estar claro para as empresas, porém, independentemente do que a ciência diga sobre o aquecimento global estar em curso ou não, é que é melhor que elas se comportem como se o fenômeno estivesse acontecendo. E a primeira lição a ser tirada disso é que economizar energia e minimizar o desperdício é bom. Bom para a empresa, bom para a sociedade. A segunda é que os custos das emissões de gases causadores do efeito estufa vão subir. E esses dois fatores são fortes o suficiente para reconfigurar toda a estrutura das corporações globais.

No futuro, toda boa estratégia deverá incorporar algum elemento social, que a tornará única, mais difícil de ser copiada

88 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Mas o mercado em que o Whole Foods atua facilita esse tipo de ação, não? Claro. Nem todas as empresas podem construir toda a sua proposição de valor em cima de questões sociais, como o Whole Foods. No futuro, porém, toda boa estratégia deverá incorporar algum elemento social, que a tornará única, mais difícil de ser copiada. A GE está tentando fazer isso com a Ecomagination e sua linha de produtos verdes. A Unilever também, ao tentar criar produtos e sistemas de distribuição para atender consumidores de baixa renda. E o importante é que isso seja real, e não marketing. Você percebe todos esses aspectos sociais do Whole Foods ao entrar em qualquer loja. Por isso, o que importa não é o que você diz, quanto gasta ou quantas pessoas apóia. O

Loja do Whole Foods Market nos Estados Unidos: questões sociais permeiam todas as ações da empresa

ELISE AMENDOLA/AP PHOTO

importantes. O que precisa ficar claro é que esses grupos nunca vão entender com profundidade um negócio. As empresas devem ficar atentas para não ceder à pressão de alguns grupos e passar equivocadamente a acreditar que aquela causa é a mais importante para ela ou para o mundo. Companhias que estabelecem uma estratégia de responsabilidade social simplesmente para aplacar coerções de determinados stakeholders caem numa armadilha: passam a trabalhar para reagir aos ataques, e isso não gera benefícios para o negócio ou para a sociedade. Muitas ONGs que pressionam as empresas, por exemplo, estão mais interessadas em chamar a atenção da mídia para elas do que conseguir algum progresso em relação a um tema.

De que maneira? Hoje, uma empresa compra peças na China, que são então enviadas a Cingapura, que vão para os Estados Unidos e que voltam para a China como produtos acabados, para ser consumidos. Como movimentar-se vai ficar muito caro, um fluxo como esse se tornará inviável. Pense no próprio comércio eletrônico. Não entendo como as pessoas não perceberam que comprar pela internet é uma das ações mais ecologicamente incorretas hoje. Antes você ia até a livraria comprar um livro. Hoje, você acha mais prático encomendar um livro da Amazon, e esse pequeno pacote faz toda a viagem dos Estados Unidos para o Brasil. Dentro de um cenário de aquecimento global, isso não me parece muito eficiente. Por isso, acredito que a maneira como as empresas organizam sua logística e sua relação com fornecedores vai mudar drasticamente. As empresas serão forçadas a voltar a comprar localmente. Muitos dos modelos de negócios que hoje consideramos eficientes não permanecerão assim por muito tempo e terão de ser reinventados. 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 89


Entrevista

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Entrevista estratégia Mas não são causas nobres? São todas causas muito nobres, mas deixam claro que há falta de foco estratégico. Um banco deve ajudar a população de baixa renda a poupar, a financiar moradia, porque é disso que ele entende. Apoiar uma companhia de dança é uma questão social genérica para uma empresa de energia, mas pode se transformar num diferencial competitivo para uma empresa de cartão de crédito, que lucra com o aumento dos gastos dos consumidores em entretenimento. O senhor afirma que as empresas têm se tornado reféns dos diferentes públicos que exercem influência na sua gestão, os chamados stakeholders. Elas superestimam a influência deles? As empresas são muito sensíveis a opiniões externas. E é claro que as visões de alguns stakeholders sobre o negócio são

importante é o resultado. Se o que sua empresa faz provoca impactos reais, ela acabará ganhando notoriedade.

Já há empresas que conseguem adicionar uma dimensão social à estratégia e ganhar dinheiro com isso? O varejista americano Whole Foods é um excelente exemplo. A proposição de valor da empresa é vender produtos orgânicos ou naturais para consumidores que se preocupam com a comida que ingerem e com o meio ambiente. E as questões sociais que permeiam essa proposição de valor é que permitem que ela tenha uma posição única no varejo. A empresa prioriza a compra de fornecedores locais, não coloca nas gôndolas alimentos que contenham algum dos 100 ingredientes que ela considera nocivos à saúde humana ou ao meio ambiente e gerencia uma fundação que luta para que os animais sejam criados e abatidos de maneira digna, entre outras iniciativas. Ou seja, tudo que a empresa faz reforça a dimensão social de sua proposição de valor.

Recentemente, o senhor afirmou que o aquecimento global deve alterar radicalmente o cenário corporativo, a exemplo de fenômenos como a globalização e a revolução tecnológica. As empresas estão preparadas? Ainda há muita incerteza sobre o que realmente está acontecendo com o planeta, mesmo com toda a veemência do ex-vice-presidente americano Al Gore. O que deve estar claro para as empresas, porém, independentemente do que a ciência diga sobre o aquecimento global estar em curso ou não, é que é melhor que elas se comportem como se o fenômeno estivesse acontecendo. E a primeira lição a ser tirada disso é que economizar energia e minimizar o desperdício é bom. Bom para a empresa, bom para a sociedade. A segunda é que os custos das emissões de gases causadores do efeito estufa vão subir. E esses dois fatores são fortes o suficiente para reconfigurar toda a estrutura das corporações globais.

No futuro, toda boa estratégia deverá incorporar algum elemento social, que a tornará única, mais difícil de ser copiada

88 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Mas o mercado em que o Whole Foods atua facilita esse tipo de ação, não? Claro. Nem todas as empresas podem construir toda a sua proposição de valor em cima de questões sociais, como o Whole Foods. No futuro, porém, toda boa estratégia deverá incorporar algum elemento social, que a tornará única, mais difícil de ser copiada. A GE está tentando fazer isso com a Ecomagination e sua linha de produtos verdes. A Unilever também, ao tentar criar produtos e sistemas de distribuição para atender consumidores de baixa renda. E o importante é que isso seja real, e não marketing. Você percebe todos esses aspectos sociais do Whole Foods ao entrar em qualquer loja. Por isso, o que importa não é o que você diz, quanto gasta ou quantas pessoas apóia. O

Loja do Whole Foods Market nos Estados Unidos: questões sociais permeiam todas as ações da empresa

ELISE AMENDOLA/AP PHOTO

importantes. O que precisa ficar claro é que esses grupos nunca vão entender com profundidade um negócio. As empresas devem ficar atentas para não ceder à pressão de alguns grupos e passar equivocadamente a acreditar que aquela causa é a mais importante para ela ou para o mundo. Companhias que estabelecem uma estratégia de responsabilidade social simplesmente para aplacar coerções de determinados stakeholders caem numa armadilha: passam a trabalhar para reagir aos ataques, e isso não gera benefícios para o negócio ou para a sociedade. Muitas ONGs que pressionam as empresas, por exemplo, estão mais interessadas em chamar a atenção da mídia para elas do que conseguir algum progresso em relação a um tema.

De que maneira? Hoje, uma empresa compra peças na China, que são então enviadas a Cingapura, que vão para os Estados Unidos e que voltam para a China como produtos acabados, para ser consumidos. Como movimentar-se vai ficar muito caro, um fluxo como esse se tornará inviável. Pense no próprio comércio eletrônico. Não entendo como as pessoas não perceberam que comprar pela internet é uma das ações mais ecologicamente incorretas hoje. Antes você ia até a livraria comprar um livro. Hoje, você acha mais prático encomendar um livro da Amazon, e esse pequeno pacote faz toda a viagem dos Estados Unidos para o Brasil. Dentro de um cenário de aquecimento global, isso não me parece muito eficiente. Por isso, acredito que a maneira como as empresas organizam sua logística e sua relação com fornecedores vai mudar drasticamente. As empresas serão forçadas a voltar a comprar localmente. Muitos dos modelos de negócios que hoje consideramos eficientes não permanecerão assim por muito tempo e terão de ser reinventados. 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 89


Balanço energético

19/11/2007

22:41

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Brasil energia

O jogo está só começando O mercado de energias alternativas envolve cada vez mais empresas no país e deve movimentar quase 1,8 bilhão de reais em 2010

ma série de idas e vindas marcou a estréia da Telefônica no novo e crescente mercado brasileiro de energia de fontes alternativas. Antes de registrar sua primeira compra, em março de 2003, a companhia passou um ano inteiro apenas estudando como fazer a operação dar certo. Às voltas com uma legislação nova e um mercado na época inexistente, a operadora chegou a contratar uma consultoria para ajudá-la na empreitada. No primeiro ano da nova operação, os percalços continuaram. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) decidiu que as empresas não poderiam arrendar usinas para ter acesso a energias alternativas. Por isso, em novembro de 2003, a Telefônica precisou cancelar o contrato que possuía com uma pequena central hidrelétrica (PCH) em Pesqueiro, no interior do Paraná, e buscar outro fornecedor. Aos poucos, porém, a empresa foi aprendendo a aproveitar as oportunidades do novo cenário. Hoje, mais de um quarto do consumo de energia da Telefônica vem de usinas movidas a bagaço de cana-de-açúcar e PCHs. A mudança diminuiu em cerca de 15% a conta de eletricidade de suas centrais tele-

U

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fônicas — o equivalente a 6 milhões de reais por ano. “Pagamos o preço de sermos pioneiros, mas a decisão valeu a pena”, diz Alexandre Gomes da Silva, gerente de engenharia da Telefônica. Embora ainda incipiente, esse mercado de energias alternativas — PCHs, biomassa e energias eólica e solar — vem crescendo no país. Hoje, além da Telefônica, outras 203 companhias já participam como compradoras no chamado mercado livre de energia brasileiro. O avanço até agora se deve a um incentivo que o mercado livre passou a oferecer ao consumidor especial — uma empresa ou unidade dela, que contrata pelo menos 500 quilowatts por mês. Trata-se de um desconto que varia de 50% a 100% nas tarifas de transporte da energia de fontes alternativas. Podem entrar nesse jogo empresas que consomem a partir de 500 quilowatts médios por mês, equivalentes a cerca de 75 000 reais. Graças aos subsídios do governo, esses contratos são até 20% mais baratos do que os tradicionais. Atualmente, o consumo de energias alternativas representa apenas 3,3% do total negociado no mercado livre — algo em torno de 620 milhões de reais (o restante é contratado sobretudo das grandes hidrelétricas). A partir de janeiro de

GERMANO LÜDERS

José Alberto Gonçalves

Usina movida a bagaço de cana: energia 15% mais barata que a das fontes convencionais


Balanço energético

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Brasil energia

O jogo está só começando O mercado de energias alternativas envolve cada vez mais empresas no país e deve movimentar quase 1,8 bilhão de reais em 2010

ma série de idas e vindas marcou a estréia da Telefônica no novo e crescente mercado brasileiro de energia de fontes alternativas. Antes de registrar sua primeira compra, em março de 2003, a companhia passou um ano inteiro apenas estudando como fazer a operação dar certo. Às voltas com uma legislação nova e um mercado na época inexistente, a operadora chegou a contratar uma consultoria para ajudá-la na empreitada. No primeiro ano da nova operação, os percalços continuaram. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) decidiu que as empresas não poderiam arrendar usinas para ter acesso a energias alternativas. Por isso, em novembro de 2003, a Telefônica precisou cancelar o contrato que possuía com uma pequena central hidrelétrica (PCH) em Pesqueiro, no interior do Paraná, e buscar outro fornecedor. Aos poucos, porém, a empresa foi aprendendo a aproveitar as oportunidades do novo cenário. Hoje, mais de um quarto do consumo de energia da Telefônica vem de usinas movidas a bagaço de cana-de-açúcar e PCHs. A mudança diminuiu em cerca de 15% a conta de eletricidade de suas centrais tele-

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fônicas — o equivalente a 6 milhões de reais por ano. “Pagamos o preço de sermos pioneiros, mas a decisão valeu a pena”, diz Alexandre Gomes da Silva, gerente de engenharia da Telefônica. Embora ainda incipiente, esse mercado de energias alternativas — PCHs, biomassa e energias eólica e solar — vem crescendo no país. Hoje, além da Telefônica, outras 203 companhias já participam como compradoras no chamado mercado livre de energia brasileiro. O avanço até agora se deve a um incentivo que o mercado livre passou a oferecer ao consumidor especial — uma empresa ou unidade dela, que contrata pelo menos 500 quilowatts por mês. Trata-se de um desconto que varia de 50% a 100% nas tarifas de transporte da energia de fontes alternativas. Podem entrar nesse jogo empresas que consomem a partir de 500 quilowatts médios por mês, equivalentes a cerca de 75 000 reais. Graças aos subsídios do governo, esses contratos são até 20% mais baratos do que os tradicionais. Atualmente, o consumo de energias alternativas representa apenas 3,3% do total negociado no mercado livre — algo em torno de 620 milhões de reais (o restante é contratado sobretudo das grandes hidrelétricas). A partir de janeiro de

GERMANO LÜDERS

José Alberto Gonçalves

Usina movida a bagaço de cana: energia 15% mais barata que a das fontes convencionais


Balanço energético

19/11/2007

22:42

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Brasil energia ção das grandes concessionárias de energia, que estão perdendo parte de seus clientes, pode minar o avanço das energias incentivadas. Na tentativa de estancar a fuga de seus consumidores, algumas delas diminuíram o valor das tarifas em até 15% ao longo deste ano. A Sadia, por exemplo, obtém economia de mais de 10% em algumas unidades que deixaram o mercado tradicional e passaram a consumir energia de PCHs e de usinas de bagaço de cana. No entanto, em alguns casos ainda continua usando grandes distribuidoras — que concederam descontos competitivos.

ANTONIO MILENA

Custo das conexões

EDUARDO KNAPP/FOLHA IMAGEM

Loja do grupo Pão de Açúcar em São Paulo: fontes alternativas representam 10% de seu consumo de energia

Os incentivos do mercado livre são uma das mais ousadas medidas do governo para aumentar a participação de fontes de energia alternativas no país 2008, porém, uma série de mudanças na legislação deve fazer com que o consumo de energia dessas fontes aumente. A principal delas é que será permitido somar o consumo de várias unidades de uma mesma empresa. Um banco, por exemplo, poderá somar o consumo de suas agências para alcançar a meta de 500 quilowatts e se habilitar como comprador. O mesmo vale para redes varejistas, que poderão avaliar conjuntamente o gasto de suas lojas. Com isso, especialistas estimam que o número de clientes poderá triplicar o valor das compras de energias alternativas para 1,8 bilhão de reais até 2010. “O mercado realmente vai começar agora”, diz Paulo Pedrosa, presidente da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (ABCE). Os incentivos no mercado livre repre94 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

sentam uma das mais ousadas iniciativas do governo brasileiro para aumentar a participação de fontes alternativas na matriz energética do país. Outro passo é o Proinfa, programa ligado ao Ministério de Minas e Energia que garante a compra pela Eletrobrás, por 20 anos, da energia gerada em 144 projetos selecionados de energia eólica, biomassa e PCHs. Graças a esses dois esforços, as usinas de biomassa — boa parte delas de bagaço de cana — entraram para o mapa da matriz elétrica brasileira, com cerca de 3% da capacidade instalada do país. “Apenas a energia elétrica gerada de bagaço de cana pode decuplicar até 2012”, diz Jorge Trinkenreich, diretor da PSR Consultoria, do Rio de Janeiro. “Nesse caso, essa fonte representará o equivalente a 6% da capacidade atual de geração do Brasil.”

Quem é quem Os agentes que negociam energias alternativas no mercado livre brasileiro Consumidor especial Empresa que contrata ao menos 500 quilowatts por mês e, por isso, recebe desconto na tarifa de transporte da energia alternativa Comercializador Companhia que ajuda o consumidor especial a contratar energia de fontes alternativas

Gerador São pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) e usinas eólicas e de biomassa que fornecem energia ao consumidor especial

Central de controle da Telefônica: economia de 6 milhões de reais por ano

A perspectiva das novas regras já resultou em novos planos de investimento por parte das empresas. Na Oi, maior empresa de telecomunicações do país, a participação das energias incentivadas deverá crescer dos atuais 18% de demanda contratada para 36% até 2010. Para isso, serão investidos 4 milhões de reais na instalação de medidores do consumo elétrico em cada central telefônica. “Assim vamos conseguir incluir unidades menores, que até agora não atingiam o nível de consumo mínimo para entrar no mercado livre”, diz Eduardo Michalski, diretor de suprimentos da Oi. O mesmo acontece com a rede de supermer-

cados Pão de Açúcar. A participação das fontes alternativas na demanda energética mais que dobrou nos últimos dois anos e hoje representa 10% de seu consumo total de energia. “Há planos de aumentar esse índice para 20% até o final do ano que vem”, diz Claudio Vicente Barbosa, gerente de operações do grupo Pão de Açúcar. Segundo ele, a economia nas contas de energia das lojas que possuem contratos com PCHs e usinas de biomassa é superior a 10% em comparação ao que era gasto com as grandes distribuidoras. Há, porém, algumas barreiras que podem emperrar esse crescimento. A rea-

Existe outro nó ainda mais complicado: os custos das conexões entre as usinas de energias alternativas e os sistemas de transmissão e distribuição de energia, hoje bancados pelos próprios geradores. As conexões representam até 40% do custo de uma nova térmica movida a biomassa, segundo Celso Zanatta, gerente de vendas de energia da Crystalsev, empresa que comercializa açúcar e álcool produzidos por várias usinas do interior paulista. A Crystalsev vende hoje 150 megawatts para cerca de 30 empresas consumidoras. A companhia planeja ampliar sua capacidade de comercialização para 650 megawatts, mas ainda avalia a idéia com cuidado, justamente por causa das dificuldades relacionadas às conexões. “Não temos capital nem competência para instalar essas linhas”, afirma Zanatta. “Só vamos ampliar nossa capacidade quando houver uma regulamentação que retire das usinas a incumbência de investir em linhas que as conectem com a rede de transmissão.” A expectativa dos produtores é que a Aneel permita a concessão a empresas interessadas em montar essa estrutura de condução de energia. Enquanto isso não acontece, porém, algumas usinas estão desacelerando seus planos de expansão. “As novas regras não contemplam certos detalhes que podem atrapalhar o avanço desse mercado”, diz Pedrosa, da ABCE. “O governo terá de voltar a esses pontos o quanto antes para eliminar essas barreiras.” 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 95


Balanço energético

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Brasil energia ção das grandes concessionárias de energia, que estão perdendo parte de seus clientes, pode minar o avanço das energias incentivadas. Na tentativa de estancar a fuga de seus consumidores, algumas delas diminuíram o valor das tarifas em até 15% ao longo deste ano. A Sadia, por exemplo, obtém economia de mais de 10% em algumas unidades que deixaram o mercado tradicional e passaram a consumir energia de PCHs e de usinas de bagaço de cana. No entanto, em alguns casos ainda continua usando grandes distribuidoras — que concederam descontos competitivos.

ANTONIO MILENA

Custo das conexões

EDUARDO KNAPP/FOLHA IMAGEM

Loja do grupo Pão de Açúcar em São Paulo: fontes alternativas representam 10% de seu consumo de energia

Os incentivos do mercado livre são uma das mais ousadas medidas do governo para aumentar a participação de fontes de energia alternativas no país 2008, porém, uma série de mudanças na legislação deve fazer com que o consumo de energia dessas fontes aumente. A principal delas é que será permitido somar o consumo de várias unidades de uma mesma empresa. Um banco, por exemplo, poderá somar o consumo de suas agências para alcançar a meta de 500 quilowatts e se habilitar como comprador. O mesmo vale para redes varejistas, que poderão avaliar conjuntamente o gasto de suas lojas. Com isso, especialistas estimam que o número de clientes poderá triplicar o valor das compras de energias alternativas para 1,8 bilhão de reais até 2010. “O mercado realmente vai começar agora”, diz Paulo Pedrosa, presidente da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (ABCE). Os incentivos no mercado livre repre94 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

sentam uma das mais ousadas iniciativas do governo brasileiro para aumentar a participação de fontes alternativas na matriz energética do país. Outro passo é o Proinfa, programa ligado ao Ministério de Minas e Energia que garante a compra pela Eletrobrás, por 20 anos, da energia gerada em 144 projetos selecionados de energia eólica, biomassa e PCHs. Graças a esses dois esforços, as usinas de biomassa — boa parte delas de bagaço de cana — entraram para o mapa da matriz elétrica brasileira, com cerca de 3% da capacidade instalada do país. “Apenas a energia elétrica gerada de bagaço de cana pode decuplicar até 2012”, diz Jorge Trinkenreich, diretor da PSR Consultoria, do Rio de Janeiro. “Nesse caso, essa fonte representará o equivalente a 6% da capacidade atual de geração do Brasil.”

Quem é quem Os agentes que negociam energias alternativas no mercado livre brasileiro Consumidor especial Empresa que contrata ao menos 500 quilowatts por mês e, por isso, recebe desconto na tarifa de transporte da energia alternativa Comercializador Companhia que ajuda o consumidor especial a contratar energia de fontes alternativas

Gerador São pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) e usinas eólicas e de biomassa que fornecem energia ao consumidor especial

Central de controle da Telefônica: economia de 6 milhões de reais por ano

A perspectiva das novas regras já resultou em novos planos de investimento por parte das empresas. Na Oi, maior empresa de telecomunicações do país, a participação das energias incentivadas deverá crescer dos atuais 18% de demanda contratada para 36% até 2010. Para isso, serão investidos 4 milhões de reais na instalação de medidores do consumo elétrico em cada central telefônica. “Assim vamos conseguir incluir unidades menores, que até agora não atingiam o nível de consumo mínimo para entrar no mercado livre”, diz Eduardo Michalski, diretor de suprimentos da Oi. O mesmo acontece com a rede de supermer-

cados Pão de Açúcar. A participação das fontes alternativas na demanda energética mais que dobrou nos últimos dois anos e hoje representa 10% de seu consumo total de energia. “Há planos de aumentar esse índice para 20% até o final do ano que vem”, diz Claudio Vicente Barbosa, gerente de operações do grupo Pão de Açúcar. Segundo ele, a economia nas contas de energia das lojas que possuem contratos com PCHs e usinas de biomassa é superior a 10% em comparação ao que era gasto com as grandes distribuidoras. Há, porém, algumas barreiras que podem emperrar esse crescimento. A rea-

Existe outro nó ainda mais complicado: os custos das conexões entre as usinas de energias alternativas e os sistemas de transmissão e distribuição de energia, hoje bancados pelos próprios geradores. As conexões representam até 40% do custo de uma nova térmica movida a biomassa, segundo Celso Zanatta, gerente de vendas de energia da Crystalsev, empresa que comercializa açúcar e álcool produzidos por várias usinas do interior paulista. A Crystalsev vende hoje 150 megawatts para cerca de 30 empresas consumidoras. A companhia planeja ampliar sua capacidade de comercialização para 650 megawatts, mas ainda avalia a idéia com cuidado, justamente por causa das dificuldades relacionadas às conexões. “Não temos capital nem competência para instalar essas linhas”, afirma Zanatta. “Só vamos ampliar nossa capacidade quando houver uma regulamentação que retire das usinas a incumbência de investir em linhas que as conectem com a rede de transmissão.” A expectativa dos produtores é que a Aneel permita a concessão a empresas interessadas em montar essa estrutura de condução de energia. Enquanto isso não acontece, porém, algumas usinas estão desacelerando seus planos de expansão. “As novas regras não contemplam certos detalhes que podem atrapalhar o avanço desse mercado”, diz Pedrosa, da ABCE. “O governo terá de voltar a esses pontos o quanto antes para eliminar essas barreiras.” 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 95


Desafio do Agro-alta

20/11/2007

21:27

Page 96

Brasil agricultura

Colheita mecanizada de cana: usinas paulistas assinaram um acordo para eliminar totalmente as queimadas e os problemas trabalhistas até 2017

O

agronegócio brasileiro ganhou um prestígio sem precedentes nos últimos anos. Alta produtividade, competitividade e tecnologia tornaram-se marcas de um segmento vital da economia que responde hoje por 92% do saldo da balança comercial brasileira. Em 2007, o faturamento projetado deve alcançar 567 bilhões de reais — 5% mais do que no ano anterior. Com a expansão, no entanto, as empresas do setor ficaram expostas a pressões sociais e ambientais crescentes. Hoje, organizações não-governamentais, clientes e sobretudo países concorrentes dos produtores brasileiros denunciam a prática de desmatamento ilegal, escravidão e uso de trabalho infantil. Embora a maioria dos quase 6 milhões de propriedades rurais brasileiras opere dentro da lei, episódios criminosos como esses prejudicam a imagem de todo o setor. O resultado é que a vigilância sobre produtores de soja, usinas de cana e criadores de gado nunca foi tão grande. Até o etanol, tido como a grande alternativa aos combustíveis fósseis, é colocado em xeque — pelo risco de inflacionar o preço dos alimentos. Um grupo cada vez mais relevante de empresas começa agora a tentar reverter essa ameaça e a transformá-la numa boa oportunidade de negócios. “A sustentabilidade entrou no planejamento estratégico das empresas do agronegócio, e quem não fizer isso terá problemas no futuro”, afirma Pedro Jacyr

SEBASTIAO MOREIRA/AE

Sob pressão As empresas brasileiras do agronegócio nunca estiveram tão expostas a cobranças ambientais e sociais — e agora se mexem para transformar o risco em oportunidade Fabiane Stefano


Desafio do Agro-alta

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Brasil agricultura

Colheita mecanizada de cana: usinas paulistas assinaram um acordo para eliminar totalmente as queimadas e os problemas trabalhistas até 2017

O

agronegócio brasileiro ganhou um prestígio sem precedentes nos últimos anos. Alta produtividade, competitividade e tecnologia tornaram-se marcas de um segmento vital da economia que responde hoje por 92% do saldo da balança comercial brasileira. Em 2007, o faturamento projetado deve alcançar 567 bilhões de reais — 5% mais do que no ano anterior. Com a expansão, no entanto, as empresas do setor ficaram expostas a pressões sociais e ambientais crescentes. Hoje, organizações não-governamentais, clientes e sobretudo países concorrentes dos produtores brasileiros denunciam a prática de desmatamento ilegal, escravidão e uso de trabalho infantil. Embora a maioria dos quase 6 milhões de propriedades rurais brasileiras opere dentro da lei, episódios criminosos como esses prejudicam a imagem de todo o setor. O resultado é que a vigilância sobre produtores de soja, usinas de cana e criadores de gado nunca foi tão grande. Até o etanol, tido como a grande alternativa aos combustíveis fósseis, é colocado em xeque — pelo risco de inflacionar o preço dos alimentos. Um grupo cada vez mais relevante de empresas começa agora a tentar reverter essa ameaça e a transformá-la numa boa oportunidade de negócios. “A sustentabilidade entrou no planejamento estratégico das empresas do agronegócio, e quem não fizer isso terá problemas no futuro”, afirma Pedro Jacyr

SEBASTIAO MOREIRA/AE

Sob pressão As empresas brasileiras do agronegócio nunca estiveram tão expostas a cobranças ambientais e sociais — e agora se mexem para transformar o risco em oportunidade Fabiane Stefano


Desafio do Agro-alta

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Page 98

Brasil agricultura a água limpa, e são forçados a comprar seus alimentos e medicamentos nas próprias plantações em que trabalham, por preços mais altos”. Além de aliviar as pressões, essas empresas estão melhorando os próprios resultados ao adotar políticas mais “sustentáveis”. Um estudo realizado pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da Universidade de São Paulo, aponta que, entre 1981 e 2004, houve queda de quase 21% no número de trabalhadores rurais no setor. No mesmo período, a produção de cana-de-açúcar quase triplicou no país — de 156 milhões de toneladas para 415 milhões de toneladas. “Os resultados dessas empresas devem motivar a adesão de outras”, diz Marcos Jank, presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar de São Paulo.

Inimiga no 1 O grupo Nova América, dono da marca de açúcar União, é um dos signatários do novo protocolo. Hoje, metade dos 7 milhões de toneladas de cana colhida pela empresa é feita por máquinas. O restante é colhido por 2 200 cortadores. “Uma parte dos cortadores receberá treinamen-

Invasão do Movimento dosTrabalhadores Rurais Sem Terra em fazenda da Monsanto: alvo de diversos grupos ativistas

ONGs,clientes e países as quais desmatamento

concorrentes de produtores brasileiros denunciam diversas práticas,entre ilegal,escravidão e uso de trabalho infantil

Teto de vidro

SOLUÇÃO

DANIEL BELTRA

PROBLEMA

As fragilidades do agronegócio brasileiro e as soluções das empresas do setor Desmatamento

Trabalho escravo e infantil

Manejo de solo

O avanço da soja na região amazônica começa a ser rejeitado por grandes compradores do grão brasileiro, e a pressão dos importadores estrangeiros ainda deve aumentar

Embora tenha havido uma redução no Brasil, o trabalho infantil no campo resiste por uma questão cultural. Começa, em geral, como uma atividade familiar nas pequenas propriedades

O uso incorreto de fertilizantes e defensivos pode empobrecer o solo e contaminar nascentes. E terras inférteis significam menos competitividade no campo

Grandes exportadores como Bunge e Maggi criaram, recentemente, normas ambientais e sociais para seus fornecedores de grãos. Quem não se submeter a elas não conseguirá mais vender a essas companhias

Em novembro, 79 usinas paulistas assinaram um protocolo que prevê a implantação de mecanização em todo o estado de São Paulo até 2017. Além de evitar problemas trabalhistas com os cortadores de cana, os usineiros eliminam as queimadas durante a colheita

Empresas de defensivos agrícolas estão desenvolvendo projetos para conservar o solo e proteger as nascentes. Nos últimos três anos, a Syngenta ajudou a recuperar quase 1 500 nascentes

Manifestação contra o cultivo de soja na região amazônica: moratória para novas áreas de plantio 98 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 99

TADEU VILANI/RBS/FOLHA IMAGEM

Bongiolo, presidente do grupo André Maggi, um dos maiores produtores de soja do Brasil. A empresa está começando a certificar suas fazendas com o ISO 14001, selo de garantia de boas práticas ambientais. “Já existem produtores que estão tendo dificuldade em obter as melhores condições de crédito porque não investem em práticas sociais e ambientais corretas”, diz Bongiolo. Um dos exemplos dessa tentativa de virada é a recente movimentação de 79 usinas de cana de São Paulo para a elaboração de um protocolo ambiental que prevê a antecipação da extinção das queimadas no país de 2021 para 2014. A entidade calcula que até 2017 toda a cana produzida no estado seja colhida com máquinas, extinguindo o corte manual. A mecanização é uma resposta à crescente patrulha ambiental (já que elimina a queima da cana antes do corte) e social sobre os canaviais. Um sem-número de organizações critica as condições do trabalho manual dos cortadores de cana. Um relatório da ONG inglesa Oxfam publicado em novembro afirma que “existem trabalhadores que vivem em condições subumanas, sem acesso


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Brasil agricultura a água limpa, e são forçados a comprar seus alimentos e medicamentos nas próprias plantações em que trabalham, por preços mais altos”. Além de aliviar as pressões, essas empresas estão melhorando os próprios resultados ao adotar políticas mais “sustentáveis”. Um estudo realizado pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da Universidade de São Paulo, aponta que, entre 1981 e 2004, houve queda de quase 21% no número de trabalhadores rurais no setor. No mesmo período, a produção de cana-de-açúcar quase triplicou no país — de 156 milhões de toneladas para 415 milhões de toneladas. “Os resultados dessas empresas devem motivar a adesão de outras”, diz Marcos Jank, presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar de São Paulo.

Inimiga no 1 O grupo Nova América, dono da marca de açúcar União, é um dos signatários do novo protocolo. Hoje, metade dos 7 milhões de toneladas de cana colhida pela empresa é feita por máquinas. O restante é colhido por 2 200 cortadores. “Uma parte dos cortadores receberá treinamen-

Invasão do Movimento dosTrabalhadores Rurais Sem Terra em fazenda da Monsanto: alvo de diversos grupos ativistas

ONGs,clientes e países as quais desmatamento

concorrentes de produtores brasileiros denunciam diversas práticas,entre ilegal,escravidão e uso de trabalho infantil

Teto de vidro

SOLUÇÃO

DANIEL BELTRA

PROBLEMA

As fragilidades do agronegócio brasileiro e as soluções das empresas do setor Desmatamento

Trabalho escravo e infantil

Manejo de solo

O avanço da soja na região amazônica começa a ser rejeitado por grandes compradores do grão brasileiro, e a pressão dos importadores estrangeiros ainda deve aumentar

Embora tenha havido uma redução no Brasil, o trabalho infantil no campo resiste por uma questão cultural. Começa, em geral, como uma atividade familiar nas pequenas propriedades

O uso incorreto de fertilizantes e defensivos pode empobrecer o solo e contaminar nascentes. E terras inférteis significam menos competitividade no campo

Grandes exportadores como Bunge e Maggi criaram, recentemente, normas ambientais e sociais para seus fornecedores de grãos. Quem não se submeter a elas não conseguirá mais vender a essas companhias

Em novembro, 79 usinas paulistas assinaram um protocolo que prevê a implantação de mecanização em todo o estado de São Paulo até 2017. Além de evitar problemas trabalhistas com os cortadores de cana, os usineiros eliminam as queimadas durante a colheita

Empresas de defensivos agrícolas estão desenvolvendo projetos para conservar o solo e proteger as nascentes. Nos últimos três anos, a Syngenta ajudou a recuperar quase 1 500 nascentes

Manifestação contra o cultivo de soja na região amazônica: moratória para novas áreas de plantio 98 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

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TADEU VILANI/RBS/FOLHA IMAGEM

Bongiolo, presidente do grupo André Maggi, um dos maiores produtores de soja do Brasil. A empresa está começando a certificar suas fazendas com o ISO 14001, selo de garantia de boas práticas ambientais. “Já existem produtores que estão tendo dificuldade em obter as melhores condições de crédito porque não investem em práticas sociais e ambientais corretas”, diz Bongiolo. Um dos exemplos dessa tentativa de virada é a recente movimentação de 79 usinas de cana de São Paulo para a elaboração de um protocolo ambiental que prevê a antecipação da extinção das queimadas no país de 2021 para 2014. A entidade calcula que até 2017 toda a cana produzida no estado seja colhida com máquinas, extinguindo o corte manual. A mecanização é uma resposta à crescente patrulha ambiental (já que elimina a queima da cana antes do corte) e social sobre os canaviais. Um sem-número de organizações critica as condições do trabalho manual dos cortadores de cana. Um relatório da ONG inglesa Oxfam publicado em novembro afirma que “existem trabalhadores que vivem em condições subumanas, sem acesso


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Brasil agricultura Amazônia mobilizou redes de supermercados e fast food, entre elas o McDonald’s, que passaram a pressionar a indústria de soja a não comprar grãos da região amazônica. O resultado é que as imposições dos importadores aumentaram e as processadoras tiveram de dar respostas à sociedade.

Suspensão temporária Por enquanto, a solução da agroindústria brasileira foi criar uma moratória de dois anos para a soja proveniente de novos desmatamentos no bioma da Amazônia. Com a medida, as empresas do setor se comprometeram a não comprar a produção de novas áreas de plantio, tentando, assim, desestimular o avanço da soja na região. O prazo termina em junho do ano que vem — quando o assunto será rediscutido —, mas a pressão dos grandes importadores deve continuar. “Precisamos admitir que existe um passivo ambiental no setor e transformá-lo em um ativo ambiental no futuro”, diz Carlo Lovatelli, presidente da Associação Brasileira do Agronegócio. Lovatelli recentemente visitou capitais européias, onde se encontrou com executivos de grandes importadores. “A mensagem dos compradores foi clara. Eles não vão adquirir so-

Poucas empresas que atuam no setor do agronegócio fortalecem suas marcas o consumidor estrangeiro de distinguir,afinal, têm mirado nas grandes empresas exportadoras — e, em alguns casos, também em seus clientes. Em maio de 2006, por exemplo, a Cargill, uma das maiores esmagadoras de soja do mundo, teve seu porto em Santarém, no estado do Pará, bloqueado pelo Greenpeace na tentativa de impedir o carregamento dos grãos que seriam destinados à Europa. As operações da empresa ficaram paradas por menos de 4 horas, mas os estragos já estavam feitos. Logo depois do episódio da Cargill, uma campanha organizada também pelo Greenpeace chamada Comendo a 100 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

ja da região amazônica”, diz Lovatelli. A Bunge, outra gigante do processamento de soja, criou regras rígidas nos quesitos social e ambiental para seus cerca de 70 000 fornecedores de grãos no país. Quem não seguir à risca o programa pode ter o contrato rescindido. Embora raros, já houve casos de produtores limados por não adotar a cartilha de sustentabilidade da Bunge. “Não é mais suficiente produzir bem e a um baixo custo. O importante é se a produção é sustentável no longo prazo”, diz Adalgiso Telles, diretor de comunicação corporativa da Bunge.

Trabalhadores libertados no Pará: uma das fragilidades do setor que dificultam a exportação de produtos brasileiros

RICARDO FUNARI/SOCIALPHOTOS

to para operar em outras áreas do grupo”, diz Mário Ibiee, diretor de recursos humanos da empresa. Alguns dos que ficarem devem, por exemplo, aprender a operar as máquinas, emprego que poderá lhes render um salário maior. A outra parte acabará sendo dispensada (a empresa ainda não sabe precisar o número de pessoas). A expectativa da Nova América, que atua no sudoeste de São Paulo, é que esses trabalhadores sejam absorvidos por outras usinas em áreas onde o cultivo da cana está em plena expansão, como Minas Gerais ou Goiás. Para os produtores de soja, reverter os efeitos dessa crescente pressão ambiental e social exige um esforço ainda maior. É sobre eles que vem recaindo a maioria das ações ativistas nos últimos anos. Um dos maiores celeiros do grão no mundo, o Brasil fechará 2007 com uma safra de 58 milhões de toneladas de soja — produção que dobrou na última década. E, à medida que o mercado consumidor aumenta, a cultura avança sobre o bioma da Amazônia, região que compreende uma área de 367 milhões de hectares. Trata-se de uma equação complexa, que acabou tornando a soja uma espécie de inimiga número 1 da floresta Amazônica. Para conter a invasão do grão, os ativistas

Há algumas iniciativas pontuais em que empresas ligadas à cadeia da soja começam a se unir para criar um movimento que acabe com essa imagem. É o caso do projeto Lucas do Rio Verde Legal, patrocinado pela fabricante de alimentos Sadia e pela suíça Syngenta, uma das maiores produtoras de sementes do mundo. O programa pretende tornar o município mato-grossense de Lucas do Rio Verde — que tem cerca de 600 propriedades rurais e concentra 1% de toda a soja produzida no país — o primeiro livre de passivos ambientais e trabalhistas do Brasil. Na fase ini-

fora do país — o que impede quem é quem no mercado cial do projeto, organizado pela ONG americana The Nature Conservancy, foram mapeadas via satélite todas as fazendas da cidade e verificadas se suas reservas estão em conformidade com a legislação, que prevê uma área de vegetação nativa equivalente a uma faixa entre 20% e 80% do total da propriedade. A soma de hectares irregulares será reposta com a compra de uma área de mesmo tamanho, paga pelos produtores que plantaram onde não deviam. O próximo passo será regularizar questões trabalhistas e práticas de manejo de solo. “Vamos preservar nossos agri-

cultores”, diz Egídio Muniz, gerente de segurança de produtos da Syngenta. Se o projeto der certo, deverá ser replicado em outras cidades do agronegócio. Não há filantropia nem bom-mocismo por parte das empresas. “A sobrevivência do agricultor significa a sobrevivência da empresa”, diz Muniz. Apesar das iniciativas, uma característica inerente ao agronegócio pode colocar em risco o fortalecimento desse movimento. A produção agropecuária gera commodities, e poucas são as empresas rurais que fortalecem suas marcas — o que impede o consumidor de saber, afinal, quem é quem no mercado. Essa é justamente a dificuldade que o setor exportador de carne vive no país. As fazendas de gado são as campeãs na chamada lista suja do Ministério do Tra-

balho, que denuncia a ocorrência de situação semelhante à escravidão. Como esses casos criminosos têm se repetido, os competidores estrangeiros acabaram ganhando munição. A Inglaterra, por exemplo, grande concorrente do país na venda de carne bovina para a Europa, já divulgou estudos tentando provar que os baixos custos da carne brasileira são provenientes do uso de trabalho de escravos na cadeia produtiva. “Os estrangeiros pegam o que há de pior e generalizam com o objetivo de criar barreiras não-tarifárias”, diz o ex-ministro da Agricultura Marcus Vinícius Pratini de Moraes, presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec). “Eles sempre vão inventar problemas para impedir o acesso ao produto brasileiro lá fora.” 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 101


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Brasil agricultura Amazônia mobilizou redes de supermercados e fast food, entre elas o McDonald’s, que passaram a pressionar a indústria de soja a não comprar grãos da região amazônica. O resultado é que as imposições dos importadores aumentaram e as processadoras tiveram de dar respostas à sociedade.

Suspensão temporária Por enquanto, a solução da agroindústria brasileira foi criar uma moratória de dois anos para a soja proveniente de novos desmatamentos no bioma da Amazônia. Com a medida, as empresas do setor se comprometeram a não comprar a produção de novas áreas de plantio, tentando, assim, desestimular o avanço da soja na região. O prazo termina em junho do ano que vem — quando o assunto será rediscutido —, mas a pressão dos grandes importadores deve continuar. “Precisamos admitir que existe um passivo ambiental no setor e transformá-lo em um ativo ambiental no futuro”, diz Carlo Lovatelli, presidente da Associação Brasileira do Agronegócio. Lovatelli recentemente visitou capitais européias, onde se encontrou com executivos de grandes importadores. “A mensagem dos compradores foi clara. Eles não vão adquirir so-

Poucas empresas que atuam no setor do agronegócio fortalecem suas marcas o consumidor estrangeiro de distinguir,afinal, têm mirado nas grandes empresas exportadoras — e, em alguns casos, também em seus clientes. Em maio de 2006, por exemplo, a Cargill, uma das maiores esmagadoras de soja do mundo, teve seu porto em Santarém, no estado do Pará, bloqueado pelo Greenpeace na tentativa de impedir o carregamento dos grãos que seriam destinados à Europa. As operações da empresa ficaram paradas por menos de 4 horas, mas os estragos já estavam feitos. Logo depois do episódio da Cargill, uma campanha organizada também pelo Greenpeace chamada Comendo a 100 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

ja da região amazônica”, diz Lovatelli. A Bunge, outra gigante do processamento de soja, criou regras rígidas nos quesitos social e ambiental para seus cerca de 70 000 fornecedores de grãos no país. Quem não seguir à risca o programa pode ter o contrato rescindido. Embora raros, já houve casos de produtores limados por não adotar a cartilha de sustentabilidade da Bunge. “Não é mais suficiente produzir bem e a um baixo custo. O importante é se a produção é sustentável no longo prazo”, diz Adalgiso Telles, diretor de comunicação corporativa da Bunge.

Trabalhadores libertados no Pará: uma das fragilidades do setor que dificultam a exportação de produtos brasileiros

RICARDO FUNARI/SOCIALPHOTOS

to para operar em outras áreas do grupo”, diz Mário Ibiee, diretor de recursos humanos da empresa. Alguns dos que ficarem devem, por exemplo, aprender a operar as máquinas, emprego que poderá lhes render um salário maior. A outra parte acabará sendo dispensada (a empresa ainda não sabe precisar o número de pessoas). A expectativa da Nova América, que atua no sudoeste de São Paulo, é que esses trabalhadores sejam absorvidos por outras usinas em áreas onde o cultivo da cana está em plena expansão, como Minas Gerais ou Goiás. Para os produtores de soja, reverter os efeitos dessa crescente pressão ambiental e social exige um esforço ainda maior. É sobre eles que vem recaindo a maioria das ações ativistas nos últimos anos. Um dos maiores celeiros do grão no mundo, o Brasil fechará 2007 com uma safra de 58 milhões de toneladas de soja — produção que dobrou na última década. E, à medida que o mercado consumidor aumenta, a cultura avança sobre o bioma da Amazônia, região que compreende uma área de 367 milhões de hectares. Trata-se de uma equação complexa, que acabou tornando a soja uma espécie de inimiga número 1 da floresta Amazônica. Para conter a invasão do grão, os ativistas

Há algumas iniciativas pontuais em que empresas ligadas à cadeia da soja começam a se unir para criar um movimento que acabe com essa imagem. É o caso do projeto Lucas do Rio Verde Legal, patrocinado pela fabricante de alimentos Sadia e pela suíça Syngenta, uma das maiores produtoras de sementes do mundo. O programa pretende tornar o município mato-grossense de Lucas do Rio Verde — que tem cerca de 600 propriedades rurais e concentra 1% de toda a soja produzida no país — o primeiro livre de passivos ambientais e trabalhistas do Brasil. Na fase ini-

fora do país — o que impede quem é quem no mercado cial do projeto, organizado pela ONG americana The Nature Conservancy, foram mapeadas via satélite todas as fazendas da cidade e verificadas se suas reservas estão em conformidade com a legislação, que prevê uma área de vegetação nativa equivalente a uma faixa entre 20% e 80% do total da propriedade. A soma de hectares irregulares será reposta com a compra de uma área de mesmo tamanho, paga pelos produtores que plantaram onde não deviam. O próximo passo será regularizar questões trabalhistas e práticas de manejo de solo. “Vamos preservar nossos agri-

cultores”, diz Egídio Muniz, gerente de segurança de produtos da Syngenta. Se o projeto der certo, deverá ser replicado em outras cidades do agronegócio. Não há filantropia nem bom-mocismo por parte das empresas. “A sobrevivência do agricultor significa a sobrevivência da empresa”, diz Muniz. Apesar das iniciativas, uma característica inerente ao agronegócio pode colocar em risco o fortalecimento desse movimento. A produção agropecuária gera commodities, e poucas são as empresas rurais que fortalecem suas marcas — o que impede o consumidor de saber, afinal, quem é quem no mercado. Essa é justamente a dificuldade que o setor exportador de carne vive no país. As fazendas de gado são as campeãs na chamada lista suja do Ministério do Tra-

balho, que denuncia a ocorrência de situação semelhante à escravidão. Como esses casos criminosos têm se repetido, os competidores estrangeiros acabaram ganhando munição. A Inglaterra, por exemplo, grande concorrente do país na venda de carne bovina para a Europa, já divulgou estudos tentando provar que os baixos custos da carne brasileira são provenientes do uso de trabalho de escravos na cadeia produtiva. “Os estrangeiros pegam o que há de pior e generalizam com o objetivo de criar barreiras não-tarifárias”, diz o ex-ministro da Agricultura Marcus Vinícius Pratini de Moraes, presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec). “Eles sempre vão inventar problemas para impedir o acesso ao produto brasileiro lá fora.” 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 101


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Negócios marketing

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Gisele Bündchen na tribo kisêdjê para a campanha da Grendene: vendas 30% maiores

Todo mundo quer ser verde Na busca por uma imagem “ecologicamente correta”,as empresas investem em projetos de plantio de árvores, recuperação de águas contaminadas e até em jogos online que ensinam como montar a matriz energética de uma cidade virtual

DIVULGAÇÃO

Guilherme Fogaça

ara aumentar as vendas de seguros de automóveis e residências, a operação brasileira do banco inglês HSBC resolveu recentemente adotar uma tática inédita. Em outubro, a instituição lançou o Seguro Carbono Neutro, seu primeiro produto “ambientalmente correto”. A iniciativa prevê que todos os clientes que comprarem apólices recebam um certificado de neutralização de gás carbônico. Detalhe: é o próprio banco que se encarrega de fazer o serviço. “A compensação das emissões de gases é feita por meio da preservação de áreas de mata nativa, que foram calculadas com base no prejuízo médio que os clientes causam ao meio ambiente”, diz Marcelo Teixeira, diretor executivo do HSBC Seguros. Para fechar contratos com os proprietários dessas matas, o investimento inicial do HSBC foi de 3,5 milhões de reais. O dobro desse valor — 7 milhões de reais — foi investido na divulgação do novo produto. Entre as peças desenvolvidas para a campanha estão uma mala-direta com um pote de sementes, ações de conscientização em estacionamentos, um site especial, anúncios na mídia impressa e comerciais para televisão e rádio. Só na primeira semana de comercialização o novo produto aumentou em 25% as vendas de seguros do banco. “Os bons negócios acontecem na medida em que o cliente percebe que esse banco pensa de um jeito diferente”, diz Teixeira. A crescente preocupação com o aquecimento global gerou uma verdadeira febre de produtos e serviços sustentáveis — e o HSBC é uma das muitas empresas que estão pegando carona na onda verde para aumentar suas vendas. A consultoria paulista MaxAmbiental, por exemplo, que executa ações desse tipo, já fechou 400 contratos em 2007, ante apenas 30 em 2006. “No ano passado, tivemos de procurar os clientes. Agora, eles é que vêm até nós”, afirma Eduardo Petit, diretor de marketing da consultoria. Uma pesquisa feita em julho pelo Ibope com 1 500 entrevistados mostrou que 53% dos consumidores brasileiros abandonariam seu fornecedor preferencial de um produto ou serviço se ele causasse algum prejuízo socioambiental. O levantamento mostrou também que 63% dos entrevistados estão dispostos a pagar mais caro por um produto se parte do valor arrecadado for destinada a projetos de proteção do meio ambiente. Pesquisas feitas fora do Brasil também apontam oportunidades. Um levantamento do The Climate Group, organização que estuda o processo de mudanças climáticas, mostra que a maioria dos consumidores — 69% na Inglaterra e 74% nos Estados Unidos — é incapaz de relacionar o nome de uma única marca ao conceito de 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 103


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Gisele Bündchen na tribo kisêdjê para a campanha da Grendene: vendas 30% maiores

Todo mundo quer ser verde Na busca por uma imagem “ecologicamente correta”,as empresas investem em projetos de plantio de árvores, recuperação de águas contaminadas e até em jogos online que ensinam como montar a matriz energética de uma cidade virtual

DIVULGAÇÃO

Guilherme Fogaça

ara aumentar as vendas de seguros de automóveis e residências, a operação brasileira do banco inglês HSBC resolveu recentemente adotar uma tática inédita. Em outubro, a instituição lançou o Seguro Carbono Neutro, seu primeiro produto “ambientalmente correto”. A iniciativa prevê que todos os clientes que comprarem apólices recebam um certificado de neutralização de gás carbônico. Detalhe: é o próprio banco que se encarrega de fazer o serviço. “A compensação das emissões de gases é feita por meio da preservação de áreas de mata nativa, que foram calculadas com base no prejuízo médio que os clientes causam ao meio ambiente”, diz Marcelo Teixeira, diretor executivo do HSBC Seguros. Para fechar contratos com os proprietários dessas matas, o investimento inicial do HSBC foi de 3,5 milhões de reais. O dobro desse valor — 7 milhões de reais — foi investido na divulgação do novo produto. Entre as peças desenvolvidas para a campanha estão uma mala-direta com um pote de sementes, ações de conscientização em estacionamentos, um site especial, anúncios na mídia impressa e comerciais para televisão e rádio. Só na primeira semana de comercialização o novo produto aumentou em 25% as vendas de seguros do banco. “Os bons negócios acontecem na medida em que o cliente percebe que esse banco pensa de um jeito diferente”, diz Teixeira. A crescente preocupação com o aquecimento global gerou uma verdadeira febre de produtos e serviços sustentáveis — e o HSBC é uma das muitas empresas que estão pegando carona na onda verde para aumentar suas vendas. A consultoria paulista MaxAmbiental, por exemplo, que executa ações desse tipo, já fechou 400 contratos em 2007, ante apenas 30 em 2006. “No ano passado, tivemos de procurar os clientes. Agora, eles é que vêm até nós”, afirma Eduardo Petit, diretor de marketing da consultoria. Uma pesquisa feita em julho pelo Ibope com 1 500 entrevistados mostrou que 53% dos consumidores brasileiros abandonariam seu fornecedor preferencial de um produto ou serviço se ele causasse algum prejuízo socioambiental. O levantamento mostrou também que 63% dos entrevistados estão dispostos a pagar mais caro por um produto se parte do valor arrecadado for destinada a projetos de proteção do meio ambiente. Pesquisas feitas fora do Brasil também apontam oportunidades. Um levantamento do The Climate Group, organização que estuda o processo de mudanças climáticas, mostra que a maioria dos consumidores — 69% na Inglaterra e 74% nos Estados Unidos — é incapaz de relacionar o nome de uma única marca ao conceito de 2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 103


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Negócios marketing dos. Se eles não fossem contabilizados, o saldo teria sido bem diferente: um aumento de 24% nas emissões no período. No início desta década, a GE deu a largada no Ecomagination, programa liderado pelo próprio presidente mundial da empresa, Jeff Immelt, que deveria transformá-la num modelo de sustentabilidade. Apesar disso, menos de 8% das vendas do grupo são atualmente geradas por produtos e serviços verdes. Adaptar-se a esses novos tempos não tem sido uma tarefa fácil. O desafio cresce na mesma proporção das exigências de uma sociedade cada vez mais informada e preocupada. Ainda que as empresas avancem, elas terão de se acostumar com vozes críticas, amplificadas pela internet e pelos demais meios de comunicação. Foi isso que aconteceu com o seguro ecológico DIVULGAÇÃO

Caminhão da FedEx: quatro anos após anunciar a troca por modelos híbridos, a frota continua a mesma

do HSBC, para ficar em um exemplo. Alguns ambientalistas já se levantam para dizer que o novo produto não gera mudança de postura por parte dos clientes. Em vez de incentivar a redução das emissões, afirmam eles, o projeto foca a compensação da poluição. “Uma forma real de incentivar o consumidor a poluir menos seria cobrar o seguro do automóvel conforme a quilometragem rodada, em vez de fazer contratos mensais ou anuais”, diz Conan Magee, analista de mercados emergentes da Innovest Strategic Value Advisors, consultoria americana de investimentos estratégicos. Além de reduzir o impacto ambiental, a medida traria outros benefícios, como redução no preço do seguro e no trânsito das cidades.

Na corrida para ser — ou pelo menos parecer — sustentável, projetos amplamente divulgados apresentam vulnerabilidades desenvolvimento sustentável. O que empresas como o HSBC desesperadamente procuram é justamente preencher esse vácuo. “Companhias de todos os setores estão chegando à conclusão de que a questão ambiental é fundamental para seu crescimento”, diz Marilena Lavorato, diretora executiva da consultoria paulista Mais Projetos Corporativos. Os favoritos dos departamentos de marketing são os projetos de reflorestamento e neutralização das emissões. Ocupar esse espaço é uma tarefa árdua sobretudo para empresas cuja natureza do negócio não é nada sustentável, como as petroquímicas. Alvo de críticas ferozes dos ambientalistas, as multinacionais do setor resolveram adotar uma estratégia baseada em entretenimento para se aproximar dos consumidores e melhorar a própria imagem. É o caso da americana Chevron, que em setembro lançou um jogo online chamado Energyville. Trata-se de uma cidade virtual onde os participantes devem montar uma 104 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

matriz energética que garanta o abastecimento do local. Antes de escolher entre as diversas fontes — como energia solar, eólica, hidrelétrica, termelétrica e nuclear —, os internautas podem se informar sobre os impactos ambientais e econômicos envolvidos em cada opção. A partir daí, os jogadores podem avançar até 2030 e conferir — com base em projeções reais — quais as conseqüências de suas escolhas. A mensagem é clara: desde que exista equilíbrio com outras fontes de energia, o uso do petróleo não é tão prejudicial assim.

Discurso vazio Nessa corrida para tentar associar suas marcas às questões ambientais, muitas empresas acabam escorregando. Em 2003, a FedEx, maior empresa de entregas do mundo, tomou uma atitude considerada ambientalmente pioneira: anunciou que começaria a substituir seus 30 000 caminhões a diesel por veículos híbridos. A mudança evitaria que 250 000 toneladas

de gases poluentes fossem lançados na atmosfera por ano. O plano — amplamente alardeado pela empresa — parecia perfeito. O problema é que ele praticamente não saiu do papel. Passados quatro anos, a FedEx tem hoje apenas 93 caminhões híbridos, o equivalente a 0,3% de sua frota. Em outras palavras, apesar do marketing intensivo, muito pouco foi feito. A iniciativa da FedEx é um exemplo do fenômeno batizado nos Estados Unidos de greenwash. O termo se refere a empresas que alardeiam fervorosamente um engajamento ambiental — mas não conseguem transformar o discurso em prática. A rede de cafeterias Starbucks, que considera o aquecimento global uma questão central e até possui um dia nacional para discutir o assunto em suas lojas, consome atualmente 20% mais energia do que há cinco anos. A americana Johnson & Johnson declarou que desde 1990 diminuiu suas emissões de poluentes em 17% — mas levou em conta no cálculo os créditos de carbono compra-

Para não perder a credibilidade, o marketing sustentável deve ser baseado num princípio básico: a transparência. Foi o que o consultor Percival Caropreso, sócio da Setor Dois e Meio Comunicação de Marketing em Responsabilidade Socioambiental, pregou quando a Grendene decidiu executar um projeto de recuperação das águas de uma comunidade indígena na Amazônia, em 2006. “Deixei claro que não se tratava de esmola ou bom-mocismo. A Grendene lucraria com a ação e os índios conseguiriam alcançar um objetivo que tinham há anos”, diz Caropreso. A idéia da ação partiu da supermodelo Gisele Bündchen, garota-propaganda da Grendene, que se interessou pelas questões indígenas depois de uma viagem ao Xingu em 2004. O projeto, desenvolvido em parceria com o Instituto Socioambiental, atua na recuperação e na proteção das nascentes e cabeceiras do rio Xingu, junto à comunidade indígena kisêdjê, em Mato Grosso. A ação incluiu uma campanha em rádios de 35 Anúncio do HSBC: municípios da região. 3,5 milhões de reais para preservar matas nativas “O objetivo era conscientizar a população para evitar o desmatamento das matas ciliares”, diz Andréa Klemm, diretora de marketing da Grendene. Para dar autenticidade à coleção de sandálias inspiradas nas tribos, a empresa enviou designers ao Parque do Xingu para que eles aprendessem os grafismos da comunidade. Como resultado da ação, as vendas da marca Ipanema Gisele Bündchen em 2006 cresceram 30% em relação ao ano anterior. “O sucesso foi tanto que neste ano já lançamos a linha na Austrália e na Espanha”, diz Andréa.

Consumidores preocupados Uma pesquisa do Ibope com 1 500 entrevistados mostra que os brasileiros estão cada vez mais atentos ao que as empresas fazem quando o assunto é sustentabilidade

92%

julgam que separar lixo para reciclagem é uma obrigação da sociedade, mas apenas 30% fazem isso em casa

89%

julgam que os fabricantes têm obrigação de prevenir os problemas que podem causar ao meio ambiente

68%

estão convencidos de que os problemas que envolvem o meio ambiente tendem a piorar ou a ficar iguais à situação atual

46%

pensam que as empresas que fazem algo pela sociedade e pelo meio ambiente usam essas ações apenas como marketing

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Negócios marketing dos. Se eles não fossem contabilizados, o saldo teria sido bem diferente: um aumento de 24% nas emissões no período. No início desta década, a GE deu a largada no Ecomagination, programa liderado pelo próprio presidente mundial da empresa, Jeff Immelt, que deveria transformá-la num modelo de sustentabilidade. Apesar disso, menos de 8% das vendas do grupo são atualmente geradas por produtos e serviços verdes. Adaptar-se a esses novos tempos não tem sido uma tarefa fácil. O desafio cresce na mesma proporção das exigências de uma sociedade cada vez mais informada e preocupada. Ainda que as empresas avancem, elas terão de se acostumar com vozes críticas, amplificadas pela internet e pelos demais meios de comunicação. Foi isso que aconteceu com o seguro ecológico DIVULGAÇÃO

Caminhão da FedEx: quatro anos após anunciar a troca por modelos híbridos, a frota continua a mesma

do HSBC, para ficar em um exemplo. Alguns ambientalistas já se levantam para dizer que o novo produto não gera mudança de postura por parte dos clientes. Em vez de incentivar a redução das emissões, afirmam eles, o projeto foca a compensação da poluição. “Uma forma real de incentivar o consumidor a poluir menos seria cobrar o seguro do automóvel conforme a quilometragem rodada, em vez de fazer contratos mensais ou anuais”, diz Conan Magee, analista de mercados emergentes da Innovest Strategic Value Advisors, consultoria americana de investimentos estratégicos. Além de reduzir o impacto ambiental, a medida traria outros benefícios, como redução no preço do seguro e no trânsito das cidades.

Na corrida para ser — ou pelo menos parecer — sustentável, projetos amplamente divulgados apresentam vulnerabilidades desenvolvimento sustentável. O que empresas como o HSBC desesperadamente procuram é justamente preencher esse vácuo. “Companhias de todos os setores estão chegando à conclusão de que a questão ambiental é fundamental para seu crescimento”, diz Marilena Lavorato, diretora executiva da consultoria paulista Mais Projetos Corporativos. Os favoritos dos departamentos de marketing são os projetos de reflorestamento e neutralização das emissões. Ocupar esse espaço é uma tarefa árdua sobretudo para empresas cuja natureza do negócio não é nada sustentável, como as petroquímicas. Alvo de críticas ferozes dos ambientalistas, as multinacionais do setor resolveram adotar uma estratégia baseada em entretenimento para se aproximar dos consumidores e melhorar a própria imagem. É o caso da americana Chevron, que em setembro lançou um jogo online chamado Energyville. Trata-se de uma cidade virtual onde os participantes devem montar uma 104 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

matriz energética que garanta o abastecimento do local. Antes de escolher entre as diversas fontes — como energia solar, eólica, hidrelétrica, termelétrica e nuclear —, os internautas podem se informar sobre os impactos ambientais e econômicos envolvidos em cada opção. A partir daí, os jogadores podem avançar até 2030 e conferir — com base em projeções reais — quais as conseqüências de suas escolhas. A mensagem é clara: desde que exista equilíbrio com outras fontes de energia, o uso do petróleo não é tão prejudicial assim.

Discurso vazio Nessa corrida para tentar associar suas marcas às questões ambientais, muitas empresas acabam escorregando. Em 2003, a FedEx, maior empresa de entregas do mundo, tomou uma atitude considerada ambientalmente pioneira: anunciou que começaria a substituir seus 30 000 caminhões a diesel por veículos híbridos. A mudança evitaria que 250 000 toneladas

de gases poluentes fossem lançados na atmosfera por ano. O plano — amplamente alardeado pela empresa — parecia perfeito. O problema é que ele praticamente não saiu do papel. Passados quatro anos, a FedEx tem hoje apenas 93 caminhões híbridos, o equivalente a 0,3% de sua frota. Em outras palavras, apesar do marketing intensivo, muito pouco foi feito. A iniciativa da FedEx é um exemplo do fenômeno batizado nos Estados Unidos de greenwash. O termo se refere a empresas que alardeiam fervorosamente um engajamento ambiental — mas não conseguem transformar o discurso em prática. A rede de cafeterias Starbucks, que considera o aquecimento global uma questão central e até possui um dia nacional para discutir o assunto em suas lojas, consome atualmente 20% mais energia do que há cinco anos. A americana Johnson & Johnson declarou que desde 1990 diminuiu suas emissões de poluentes em 17% — mas levou em conta no cálculo os créditos de carbono compra-

Para não perder a credibilidade, o marketing sustentável deve ser baseado num princípio básico: a transparência. Foi o que o consultor Percival Caropreso, sócio da Setor Dois e Meio Comunicação de Marketing em Responsabilidade Socioambiental, pregou quando a Grendene decidiu executar um projeto de recuperação das águas de uma comunidade indígena na Amazônia, em 2006. “Deixei claro que não se tratava de esmola ou bom-mocismo. A Grendene lucraria com a ação e os índios conseguiriam alcançar um objetivo que tinham há anos”, diz Caropreso. A idéia da ação partiu da supermodelo Gisele Bündchen, garota-propaganda da Grendene, que se interessou pelas questões indígenas depois de uma viagem ao Xingu em 2004. O projeto, desenvolvido em parceria com o Instituto Socioambiental, atua na recuperação e na proteção das nascentes e cabeceiras do rio Xingu, junto à comunidade indígena kisêdjê, em Mato Grosso. A ação incluiu uma campanha em rádios de 35 Anúncio do HSBC: municípios da região. 3,5 milhões de reais para preservar matas nativas “O objetivo era conscientizar a população para evitar o desmatamento das matas ciliares”, diz Andréa Klemm, diretora de marketing da Grendene. Para dar autenticidade à coleção de sandálias inspiradas nas tribos, a empresa enviou designers ao Parque do Xingu para que eles aprendessem os grafismos da comunidade. Como resultado da ação, as vendas da marca Ipanema Gisele Bündchen em 2006 cresceram 30% em relação ao ano anterior. “O sucesso foi tanto que neste ano já lançamos a linha na Austrália e na Espanha”, diz Andréa.

Consumidores preocupados Uma pesquisa do Ibope com 1 500 entrevistados mostra que os brasileiros estão cada vez mais atentos ao que as empresas fazem quando o assunto é sustentabilidade

92%

julgam que separar lixo para reciclagem é uma obrigação da sociedade, mas apenas 30% fazem isso em casa

89%

julgam que os fabricantes têm obrigação de prevenir os problemas que podem causar ao meio ambiente

68%

estão convencidos de que os problemas que envolvem o meio ambiente tendem a piorar ou a ficar iguais à situação atual

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pensam que as empresas que fazem algo pela sociedade e pelo meio ambiente usam essas ações apenas como marketing

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Negócios créditos de carbono O passo-a-passo do crédito de carbono Como obter créditos de carbono pelas regras do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), do Protocolo de Kyoto

Laboratório da Solvay: expectativa de que os preços subam ainda mais

Metodologia É necessário criar um novo método para calcular a redução de emissão de carbono (e submetê-lo à aprovação do MDL) ou utilizar um dos mais de 80 já existentes e disponíveis na internet. O projeto precisa da validação de uma auditoria independente

1

DIVULGAÇÃO

LIA LUBAMBO

Matias, da Rhodia: um novo negócio de mais de 1 bilhão de reais para a indústria química

Como transformar ar em dinheiro Cada vez mais empresas brasileiras estão participando do bilionário mercado mundial m menos de uma década, uma atividade inexistente transformou-se num colosso que movimentou 30 bilhões de reais em 2007. Trata-se do mercado mundial de créditos de carbono, que consiste em um fenômeno ainda pouco compreendido: a transformação de ar em dinheiro. Parte dessa conversão se dá quando empresas de países emergentes diminuem suas emissões de gases de efeito estufa e obtêm créditos, aprovados segundo o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), uma das peças-chave do Protocolo de Kyoto. Esses créditos são então vendidos a empresas de países ricos com metas de baixar níveis de poluição — em 2006, essas negociações foram de 6 bilhões de dólares. É justamente nesse mercado que atuam as companhias brasileiras. Em 2004, o Brasil registrou o primeiro projeto de créditos de carbono do mundo, o do aterro sanitário Nova Gerar, uma associação entre a inglesa Eco-

E

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Securities e a S.A. Paulista, no município fluminense de Nova Iguaçu. Hoje, o país tem 240 iniciativas nas várias fases de aprovação pelo conselho do MDL, na Organização das Nações Unidas. Caso todas elas sejam aprovadas integralmente, a atividade pode gerar quase 2 bilhões de dólares em receitas para as empresas brasileiras. Esse volume coloca o Brasil na terceira posição mundial em participação nesse mercado, atrás de China e Índia. O caminho até a venda de créditos de carbono pode ser longo, exaustivo e caro (veja quadro ao lado). Um projeto leva de dois a quatro anos até ser concluído por uma grande empresa. Para que saia do papel e se torne realidade, as empresas desembolsam entre 40 000 e 200 000 dólares. O esforço vale a pena. O valor da venda de créditos pode superar em até três vezes o investimento para sua realização. Além disso, a iniciativa em geral reduz custos — como o reaproveitamento de gases antes lançados na atmosfera

como combustível em fornos industriais. A redução de emissões também representa uma vantagem de imagem. “Para essas empresas, projetos relacionados ao meio ambiente passam a ser vistos como investimento e oportunidade, e não apenas como custo”, diz Marcos Fujihara, diretor da consultoria Totum, especializada em créditos de carbono. O primeiro passo — e também o mais crítico — é demonstrar que o projeto resultará, de fato, na redução das emissões de gases de efeito estufa. Para isso, a empresa precisa de uma metodologia aceita pelo conselho do MDL. Existem duas maneiras de obter uma metodologia: desenvolver uma a partir do zero ou escolher alguma entre as já registradas. Hoje há 85 metodologias publicadas, sendo que a maior parte envolve aterros sanitários e mudanças de matriz energética. Todas foram elaboradas pelas próprias empresas participantes do mercado (a partir do momento em que uma metodologia

de créditos de carbono

José Alberto Gonçalves

é aprovada, ela se torna pública e disponível na internet, mas a empresa não ganha um tostão com isso). As companhias que se dispõem a criar uma nova metodologia precisam de uma boa dose de paciência e empenho. “Cada processo pode levar até dois anos e há sempre o risco de que seja reprovado”, afirma Marcelo Theoto Rocha, pesquisador da Universidade de São Paulo e consultor na área de crédito de carbono. A Aracruz, uma das maiores produtoras de celulose do mundo, sofreu o baque de gastar milhares de dólares num projeto rejeitado. Em outubro de 2005, a companhia submeteu uma metodologia para defender a redução de emissões causada pela mudança no sistema de transporte de matériaprima (que deixaria de ser feito por caminhões e passaria para navios). O projeto levou um ano e meio de estudos e custou à companhia 100 000 dólares. “Pagamos um preço pelo pioneirismo”, diz Rosane Monteiro Borges, gerente corporativa de

meio ambiente da Aracruz. Agora, a Aracruz está conversando com outras companhias interessadas em desenvolver uma metodologia semelhante e, assim, dividir o risco de uma nova tentativa.

Mercado aquecido Definida a metodologia, é hora de detalhar o projeto — que deverá ser validado por uma consultoria externa credenciada pelo conselho do MDL e encaminhado à instituição responsável no país por uma espécie de análise prévia, chamada de Autoridade Nacional Designada (AND). Aqui começa uma das fases mais burocráticas de todo o processo. No caso do Brasil, a AND é uma comissão coordenada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia. Hoje há sete profissionais para analisar centenas de projetos do MDL submetidos à aprovação da comissão nacional. Cada um deles leva até seis meses para ser avaliado. Na China, por exemplo, o prazo de análise é de dois me-

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Aprovação Uma equipe

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Registro O conselho do MDL

5

Emissão dos créditos

coordenada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, em Brasília, avalia o relatório e o encaminha — ou não — ao conselho do MDL

analisa o projeto e pode rejeitar o pedido de registro, pedir uma revisão ou aceitá-lo

Monitoramento A empresa monitora a redução das emissões de gases de efeito estufa após o registro, com o acompanhamento de uma auditoria externa

O conselho do MDL emite os créditos de carbono, na quantidade equivalente às emissões informadas pela auditoria na fase de verificação Fonte: especialistas

ses; na Índia, não ultrapassa três. Ao final, o parecer é enviado ao conselho do MDL, que pode aceitá-lo ou não. “A comissão brasileira pede um sem-número de documentos para investigar qualquer deslize ambiental da companhia”, diz Flávio Pinheiro, da consultoria Econergy, especializada no mercado de carbono. “A vantagem de tanto rigor é que dificilmente os projetos brasileiros são barrados pelo conselho do MDL.” A última etapa, antes da venda dos créditos, é monitorar a redução das emis2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 107


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Negócios créditos de carbono O passo-a-passo do crédito de carbono Como obter créditos de carbono pelas regras do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), do Protocolo de Kyoto

Laboratório da Solvay: expectativa de que os preços subam ainda mais

Metodologia É necessário criar um novo método para calcular a redução de emissão de carbono (e submetê-lo à aprovação do MDL) ou utilizar um dos mais de 80 já existentes e disponíveis na internet. O projeto precisa da validação de uma auditoria independente

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DIVULGAÇÃO

LIA LUBAMBO

Matias, da Rhodia: um novo negócio de mais de 1 bilhão de reais para a indústria química

Como transformar ar em dinheiro Cada vez mais empresas brasileiras estão participando do bilionário mercado mundial m menos de uma década, uma atividade inexistente transformou-se num colosso que movimentou 30 bilhões de reais em 2007. Trata-se do mercado mundial de créditos de carbono, que consiste em um fenômeno ainda pouco compreendido: a transformação de ar em dinheiro. Parte dessa conversão se dá quando empresas de países emergentes diminuem suas emissões de gases de efeito estufa e obtêm créditos, aprovados segundo o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), uma das peças-chave do Protocolo de Kyoto. Esses créditos são então vendidos a empresas de países ricos com metas de baixar níveis de poluição — em 2006, essas negociações foram de 6 bilhões de dólares. É justamente nesse mercado que atuam as companhias brasileiras. Em 2004, o Brasil registrou o primeiro projeto de créditos de carbono do mundo, o do aterro sanitário Nova Gerar, uma associação entre a inglesa Eco-

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Securities e a S.A. Paulista, no município fluminense de Nova Iguaçu. Hoje, o país tem 240 iniciativas nas várias fases de aprovação pelo conselho do MDL, na Organização das Nações Unidas. Caso todas elas sejam aprovadas integralmente, a atividade pode gerar quase 2 bilhões de dólares em receitas para as empresas brasileiras. Esse volume coloca o Brasil na terceira posição mundial em participação nesse mercado, atrás de China e Índia. O caminho até a venda de créditos de carbono pode ser longo, exaustivo e caro (veja quadro ao lado). Um projeto leva de dois a quatro anos até ser concluído por uma grande empresa. Para que saia do papel e se torne realidade, as empresas desembolsam entre 40 000 e 200 000 dólares. O esforço vale a pena. O valor da venda de créditos pode superar em até três vezes o investimento para sua realização. Além disso, a iniciativa em geral reduz custos — como o reaproveitamento de gases antes lançados na atmosfera

como combustível em fornos industriais. A redução de emissões também representa uma vantagem de imagem. “Para essas empresas, projetos relacionados ao meio ambiente passam a ser vistos como investimento e oportunidade, e não apenas como custo”, diz Marcos Fujihara, diretor da consultoria Totum, especializada em créditos de carbono. O primeiro passo — e também o mais crítico — é demonstrar que o projeto resultará, de fato, na redução das emissões de gases de efeito estufa. Para isso, a empresa precisa de uma metodologia aceita pelo conselho do MDL. Existem duas maneiras de obter uma metodologia: desenvolver uma a partir do zero ou escolher alguma entre as já registradas. Hoje há 85 metodologias publicadas, sendo que a maior parte envolve aterros sanitários e mudanças de matriz energética. Todas foram elaboradas pelas próprias empresas participantes do mercado (a partir do momento em que uma metodologia

de créditos de carbono

José Alberto Gonçalves

é aprovada, ela se torna pública e disponível na internet, mas a empresa não ganha um tostão com isso). As companhias que se dispõem a criar uma nova metodologia precisam de uma boa dose de paciência e empenho. “Cada processo pode levar até dois anos e há sempre o risco de que seja reprovado”, afirma Marcelo Theoto Rocha, pesquisador da Universidade de São Paulo e consultor na área de crédito de carbono. A Aracruz, uma das maiores produtoras de celulose do mundo, sofreu o baque de gastar milhares de dólares num projeto rejeitado. Em outubro de 2005, a companhia submeteu uma metodologia para defender a redução de emissões causada pela mudança no sistema de transporte de matériaprima (que deixaria de ser feito por caminhões e passaria para navios). O projeto levou um ano e meio de estudos e custou à companhia 100 000 dólares. “Pagamos um preço pelo pioneirismo”, diz Rosane Monteiro Borges, gerente corporativa de

meio ambiente da Aracruz. Agora, a Aracruz está conversando com outras companhias interessadas em desenvolver uma metodologia semelhante e, assim, dividir o risco de uma nova tentativa.

Mercado aquecido Definida a metodologia, é hora de detalhar o projeto — que deverá ser validado por uma consultoria externa credenciada pelo conselho do MDL e encaminhado à instituição responsável no país por uma espécie de análise prévia, chamada de Autoridade Nacional Designada (AND). Aqui começa uma das fases mais burocráticas de todo o processo. No caso do Brasil, a AND é uma comissão coordenada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia. Hoje há sete profissionais para analisar centenas de projetos do MDL submetidos à aprovação da comissão nacional. Cada um deles leva até seis meses para ser avaliado. Na China, por exemplo, o prazo de análise é de dois me-

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Aprovação Uma equipe

3 4

Registro O conselho do MDL

5

Emissão dos créditos

coordenada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, em Brasília, avalia o relatório e o encaminha — ou não — ao conselho do MDL

analisa o projeto e pode rejeitar o pedido de registro, pedir uma revisão ou aceitá-lo

Monitoramento A empresa monitora a redução das emissões de gases de efeito estufa após o registro, com o acompanhamento de uma auditoria externa

O conselho do MDL emite os créditos de carbono, na quantidade equivalente às emissões informadas pela auditoria na fase de verificação Fonte: especialistas

ses; na Índia, não ultrapassa três. Ao final, o parecer é enviado ao conselho do MDL, que pode aceitá-lo ou não. “A comissão brasileira pede um sem-número de documentos para investigar qualquer deslize ambiental da companhia”, diz Flávio Pinheiro, da consultoria Econergy, especializada no mercado de carbono. “A vantagem de tanto rigor é que dificilmente os projetos brasileiros são barrados pelo conselho do MDL.” A última etapa, antes da venda dos créditos, é monitorar a redução das emis2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 107


Fornecedores/cooperativas-alta

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Gestão fornecedores O projeto piloto começou em agosto passado e envolveu cinco cooperativas de São Paulo, que já receberam um total de 141 000 reais. Uma delas é a Cooper Viva Bem, localizada na Vila Leopoldina, na zona oeste da capital paulista. Com um crédito de 39 000 reais, a cooperativa comprou duas novas prensas para comprimir o material coletado. No primeiro mês com os novos equipamentos, a produção aumentou quase 65%, passando de 78 para 121 toneladas. A lógica empresarial também já foi incorporada à forma de remuneração dos cooperados. O conceito vigente agora é a meritocracia: ganha mais quem produzir mais. “Eles têm metas mensais para alcançar”, afirma Maria Tereza Montenegro, presidente da Cooper Viva Bem. “Quem não alcança é chamado para conversar para que, juntos, identifiquemos quais são as dificuldades.” Ao final de cada mês, a diretoria apresenta aos cooperados os gráficos de produtividade da equipe, que depois ficam fixados na parede do refeitório. Os cooperados sentem a diferença no próprio bolso. Segundo dados da cooperativa, em 2001 a renda média dos catadores era de 150 reais por mês. Hoje é de 700 reais — e os mais eficientes chegam a ganhar 1 500 reais mensais. Os empréstimos serviram também para aumentar o capital de giro das cooperativas. Com os 40 000 reais recebidos, a CooperAção, localizada na zona oeste de São Paulo, passou a pagar os grupos de catadores no momento em que eles entregam o material — e não quando o cliente final paga pelo papel, como é de praxe. “Geralmente leva uns 15 dias para as empresas realizarem o pagamento para a cooperativa e algumas pessoas simplesmente não podem esperar”, afirma Neilton César Polido, secretário da CooperAção.

Não dá para crescer sozinho Para aumentar a fabricação de produtos reciclados, muitas empresas estão sendo obrigadas a criar programas que estimulem também o crescimento de seus fornecedores Guilherme Fogaça

E

110 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

Para vencer esse desafio, a companhia lançou neste ano um projeto de profissionalização das cooperativas, em parceria com a Fundação Avina, o Instituto Ecofuturo e o banco Real. Batizado de Investimento Reciclável, o programa formou um fundo de 360 000 reais para financiar a aquisição de equipamentos e o capital de giro das cooperativas. A iniciativa, inédita no setor, não tem nenhum caráter assistencialista. Os recursos emprestados às cooperativas devem ser devolvidos em até 24 meses (os valores são atualizados apenas pela correção monetária). Além do acesso ao financiamento — algo até então quase impensável para algumas dessas cooperativas de catadores —, o programa oferece cursos de capacitação. A consultoria Eco Consulting foi contratada para realizar treinamentos sobre gestão operacional e administrativa. O objetivo é que, com dinheiro e capacidade gerencial, as cooperativas consigam aumentar a produtividade e a renda — e a Suzano, ao mesmo tempo, tenha garantido um volume crescente de papel para reciclagem.

Espírito empreendedor

Dorf, da Suzano: financiamento e capacitação para cooperativas de reciclagem de papel

MASAO GOTO FILHO/E-SIM

m 2001, a fabricante de papel e celulose Suzano lançou o Reciclato, o primeiro papel brasileiro 100% reciclado produzido em escala industrial. Apesar do ceticismo do mercado, o produto transformou-se num dos maiores sucessos da empresa. Há seis anos, a Suzano fabricava 300 toneladas do Reciclato, que eram comercializadas apenas para a indústria gráfica e o mercado corporativo. Neste ano serão produzidas 39 000 toneladas, vendidas também para o consumidor final. Esse aumento colossal obrigou a empresa a buscar novos fornecedores de matéria-prima. Para produzir o Reciclato em seu ano de criação, a empresa consumia 20 toneladas de aparas de papel usado por mês, proveniente de três cooperativas de catadores de papel. Hoje, são necessárias 700 toneladas do insumo todos os meses, fornecido por 85 cooperativas. “Não dava mais para continuar crescendo sem ter uma rede de fornecedores estruturada”, afirma André Dorf, diretor da unidade papel da Suzano. “Estávamos limitados pelo acesso à matéria-prima.”

O choque de gestão do programa acabou despertando o espírito empreendedor dos cooperados. Além de aumentar a produtividade, eles começaram a pensar na evolução do próprio negócio. “Não é possível que daqui a dez anos a gente continue apenas separando o material”, diz Márcia Abadia Martins, presidente da Cooperativa Gran2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 111


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Gestão fornecedores O projeto piloto começou em agosto passado e envolveu cinco cooperativas de São Paulo, que já receberam um total de 141 000 reais. Uma delas é a Cooper Viva Bem, localizada na Vila Leopoldina, na zona oeste da capital paulista. Com um crédito de 39 000 reais, a cooperativa comprou duas novas prensas para comprimir o material coletado. No primeiro mês com os novos equipamentos, a produção aumentou quase 65%, passando de 78 para 121 toneladas. A lógica empresarial também já foi incorporada à forma de remuneração dos cooperados. O conceito vigente agora é a meritocracia: ganha mais quem produzir mais. “Eles têm metas mensais para alcançar”, afirma Maria Tereza Montenegro, presidente da Cooper Viva Bem. “Quem não alcança é chamado para conversar para que, juntos, identifiquemos quais são as dificuldades.” Ao final de cada mês, a diretoria apresenta aos cooperados os gráficos de produtividade da equipe, que depois ficam fixados na parede do refeitório. Os cooperados sentem a diferença no próprio bolso. Segundo dados da cooperativa, em 2001 a renda média dos catadores era de 150 reais por mês. Hoje é de 700 reais — e os mais eficientes chegam a ganhar 1 500 reais mensais. Os empréstimos serviram também para aumentar o capital de giro das cooperativas. Com os 40 000 reais recebidos, a CooperAção, localizada na zona oeste de São Paulo, passou a pagar os grupos de catadores no momento em que eles entregam o material — e não quando o cliente final paga pelo papel, como é de praxe. “Geralmente leva uns 15 dias para as empresas realizarem o pagamento para a cooperativa e algumas pessoas simplesmente não podem esperar”, afirma Neilton César Polido, secretário da CooperAção.

Não dá para crescer sozinho Para aumentar a fabricação de produtos reciclados, muitas empresas estão sendo obrigadas a criar programas que estimulem também o crescimento de seus fornecedores Guilherme Fogaça

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Para vencer esse desafio, a companhia lançou neste ano um projeto de profissionalização das cooperativas, em parceria com a Fundação Avina, o Instituto Ecofuturo e o banco Real. Batizado de Investimento Reciclável, o programa formou um fundo de 360 000 reais para financiar a aquisição de equipamentos e o capital de giro das cooperativas. A iniciativa, inédita no setor, não tem nenhum caráter assistencialista. Os recursos emprestados às cooperativas devem ser devolvidos em até 24 meses (os valores são atualizados apenas pela correção monetária). Além do acesso ao financiamento — algo até então quase impensável para algumas dessas cooperativas de catadores —, o programa oferece cursos de capacitação. A consultoria Eco Consulting foi contratada para realizar treinamentos sobre gestão operacional e administrativa. O objetivo é que, com dinheiro e capacidade gerencial, as cooperativas consigam aumentar a produtividade e a renda — e a Suzano, ao mesmo tempo, tenha garantido um volume crescente de papel para reciclagem.

Espírito empreendedor

Dorf, da Suzano: financiamento e capacitação para cooperativas de reciclagem de papel

MASAO GOTO FILHO/E-SIM

m 2001, a fabricante de papel e celulose Suzano lançou o Reciclato, o primeiro papel brasileiro 100% reciclado produzido em escala industrial. Apesar do ceticismo do mercado, o produto transformou-se num dos maiores sucessos da empresa. Há seis anos, a Suzano fabricava 300 toneladas do Reciclato, que eram comercializadas apenas para a indústria gráfica e o mercado corporativo. Neste ano serão produzidas 39 000 toneladas, vendidas também para o consumidor final. Esse aumento colossal obrigou a empresa a buscar novos fornecedores de matéria-prima. Para produzir o Reciclato em seu ano de criação, a empresa consumia 20 toneladas de aparas de papel usado por mês, proveniente de três cooperativas de catadores de papel. Hoje, são necessárias 700 toneladas do insumo todos os meses, fornecido por 85 cooperativas. “Não dava mais para continuar crescendo sem ter uma rede de fornecedores estruturada”, afirma André Dorf, diretor da unidade papel da Suzano. “Estávamos limitados pelo acesso à matéria-prima.”

O choque de gestão do programa acabou despertando o espírito empreendedor dos cooperados. Além de aumentar a produtividade, eles começaram a pensar na evolução do próprio negócio. “Não é possível que daqui a dez anos a gente continue apenas separando o material”, diz Márcia Abadia Martins, presidente da Cooperativa Gran2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 111


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Gestão fornecedores

A pirataria das garrafas

Com cara de empresa

O comércio paralelo de embalagens impede que a reciclagem de vidro aumente no Brasil

A participação de grandes companhias profissionalizou a maneira como funcionam as cooperativas de catadores

Para otimizar o uso dos equipamentos, as cooperativas reestruturaram o trabalho em até três turnos

Fábrica da Coca-Cola: perspectiva de aprovação do uso de garrafas plásticas com material reciclado

Com o capital de giro, os cooperados eliminaram os atravessadores e passaram a vender o material para as empresas e por um preço maior Fontes: empresas e cooperativas

112 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

senvolvido em parceria com a Tetra Pak, a consultoria TSL Engenharia Ambiental e o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), processa diariamente cerca de 40 toneladas de embalagens. Sua capacidade, porém, é de 60 toneladas por dia. “O que falta para aumentar o processamento é matéria-prima”, afirma Fernando von Zuben, diretor de meio ambiente da Tetra Pak. A busca por uma cadeia produtiva sustentável também está se intensificando no setor de embalagens PET. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) estuda a liberação de um sistema de engarrafamento chamado bottle-tobottle, que utiliza como matéria-prima o PET reciclado. Trata-se de uma tecnologia já aprovada em diversos países, inclusive nos Estados Unidos. A subsidiária brasileira da Coca-Cola é uma das empresas interessadas em adotar o sistema. “Hoje, a indústria têxtil é a principal consumidora dessa matéria-prima. Mas, com a aprovação da Anvisa, nós

também passaremos a utilizá-la”, afirma José Mauro de Moraes, diretor de meio ambiente da Coca-Cola. Segundo ele, a adoção desse processo poderia aumentar o índice brasileiro de reciclagem de PET dos atuais 47% para 54% no período de um ano. Atualmente, a Coca-Cola apóia 35 cooperativas de catadores em 23 estados brasileiros — e a meta é cobrir todos os estados até o início de 2008.

Política de resíduos Apesar dos avanços recentes, a parceria entre empresas e cooperativas está hoje ameaçada por questões regulatórias. O Ministério do Meio Ambiente está estruturando uma política de resíduos sólidos que pode obrigar as empresas a cuidar diretamente de seus resíduos. “Se as corporações precisarem montar os próprios sistemas de tratamento de material usado, elas vão acabar competindo com as cooperativas em vez de ajudá-las a crescer”, afirma André Vilhena, diretor executivo do Compromisso Empresarial

para Reciclagem (Cempre), ONG mantida por vários fabricantes de bens de consumo. O modelo que o ministério pode adotar é semelhante ao da Alemanha, onde os fabricantes são responsáveis por todo o ciclo de vida de seus produtos — desde a fabricação até sua eliminação. No setor de embalagens, por exemplo, a norma estabeleceu a obrigatoriedade de fabricantes e distribuidores recolherem e reciclarem os materiais. Por isso, as empresas do setor criaram a Duales System Deutschland GmbH (DSD), entidade sem fins lucrativos que organiza a coleta e faz a triagem e a reciclagem de todo o material. Para fazer parte da DSD, as associadas precisam pagar uma taxa de filiação, além de tarifas que variam conforme o volume de suas embalagens. O custo de montar essa estrutura obviamente acaba sendo repassado para os consumidores. “Se essas taxas forem criadas no Brasil, toda a cadeia de reciclagem seria desmontada”, afirma Von Zuben.

OLHAR IMAGEM

Reuniões mensais com a apresentação dos balanços de produtividade e de faturamento dão um caráter de transparência ao negócio

ção poderia ser feita com vidro reciclado. Na Alemanha, por exemplo, a reciclagem de vidro chega a 91%. “O problema da falsificação é tipicamente brasileiro”, afirma Leandro Pignataro, gerente-geral de marketing da Owens-Illinois, que opera em mais de 30 países. Além do impacto ambiental, a substituição da areia por cacos de vidro como matéria-prima reduz os custos de produção. Uma das maiores economias é com energia, uma vez que o processo à base de reciclagem exige menos calor nos fornos que o sistema tradicional. Em média, a economia é de 120 reais por tonelada de vidro produzido — praticamente o mesmo preço que a empresa paga para os fornecedores dos cacos. Para incentivar a reciclagem, a companhia faz um trabalho de conscientização da população, executado com a Abividro. A idéia é orientar os consumidores para que eles não revendam as garrafas e não as coloquem no lixo inteiras. “A reciclagem é feita com os cacos. Por isso não é preciso deixar a garrafa inteira para conseguir reciclar”, diz Pignataro.

DIVULGAÇÃO

O

Os cooperados deixaram de receber por hora trabalhada. Agora, o salário varia de acordo com a produtividade de cada um

ja Julieta, na zona sul de São Paulo, que já aumentou de 37 para 53 o número de cooperados e planeja implantar um segundo turno de produção. “Se eu faço a coleta, por que não posso industrializar o material?” No médio prazo, o plano da cooperativa é fabricar embalagens com o processamento do material coletado. Os resultados iniciais do programa são animadores. A produção das cinco cooperativas juntas aumentou quase 40% — e parte do excedente foi comprada pela Suzano. A busca por mais matéria-prima reciclável também é um desafio para a Klabin, fabricante de papéis e cartões para embalagens. Uma das especialidades da empresa é reciclar as embalagens longa vida utilizadas para armazenar leite e sucos. Em 2005, a empresa implantou em sua unidade de Piracicaba, no interior paulista, uma tecnologia que permite separar os três elementos das embalagens longa vida: papel, plástico e alumínio. O sistema, de-

rganizar cooperativas de catadores não é o único desafio das empresas de vidro que usam material reciclado. O setor vive hoje às voltas com uma barreira muito mais difícil de ser eliminada: a reutilização ilegal das garrafas. Nesse comércio paralelo de embalagens, indústrias de bebida sem marca compram garrafas de fabricantes renomados para reutilizá-las com o seu produto.A prática, além de ilegal e perigosa, é um dos grandes freios da reciclagem de embalagens de vidro no Brasil. Segundo dados da Associação Técnica Brasileira das Indústrias Automáticas de Vidro (Abividro), nos últimos quatro anos o índice de reciclagem ficou estacionado em 45% das embalagens.A Owens-Illinois do Brasil, um dos maiores fabricantes nacionais, é uma das empresas que lutam contra esse problema. Atualmente, a companhia utiliza 100 000 toneladas de cacos de vidro por ano para a fabricação de embalagens — equivalentes à metade de toda a matéria-prima utilizada para sua produção anual. No entanto, se houvesse material suficiente, 100% da fabrica-

Produção de garrafas: reciclagem não passa de 45% das embalagens

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A pirataria das garrafas

Com cara de empresa

O comércio paralelo de embalagens impede que a reciclagem de vidro aumente no Brasil

A participação de grandes companhias profissionalizou a maneira como funcionam as cooperativas de catadores

Para otimizar o uso dos equipamentos, as cooperativas reestruturaram o trabalho em até três turnos

Fábrica da Coca-Cola: perspectiva de aprovação do uso de garrafas plásticas com material reciclado

Com o capital de giro, os cooperados eliminaram os atravessadores e passaram a vender o material para as empresas e por um preço maior Fontes: empresas e cooperativas

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senvolvido em parceria com a Tetra Pak, a consultoria TSL Engenharia Ambiental e o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), processa diariamente cerca de 40 toneladas de embalagens. Sua capacidade, porém, é de 60 toneladas por dia. “O que falta para aumentar o processamento é matéria-prima”, afirma Fernando von Zuben, diretor de meio ambiente da Tetra Pak. A busca por uma cadeia produtiva sustentável também está se intensificando no setor de embalagens PET. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) estuda a liberação de um sistema de engarrafamento chamado bottle-tobottle, que utiliza como matéria-prima o PET reciclado. Trata-se de uma tecnologia já aprovada em diversos países, inclusive nos Estados Unidos. A subsidiária brasileira da Coca-Cola é uma das empresas interessadas em adotar o sistema. “Hoje, a indústria têxtil é a principal consumidora dessa matéria-prima. Mas, com a aprovação da Anvisa, nós

também passaremos a utilizá-la”, afirma José Mauro de Moraes, diretor de meio ambiente da Coca-Cola. Segundo ele, a adoção desse processo poderia aumentar o índice brasileiro de reciclagem de PET dos atuais 47% para 54% no período de um ano. Atualmente, a Coca-Cola apóia 35 cooperativas de catadores em 23 estados brasileiros — e a meta é cobrir todos os estados até o início de 2008.

Política de resíduos Apesar dos avanços recentes, a parceria entre empresas e cooperativas está hoje ameaçada por questões regulatórias. O Ministério do Meio Ambiente está estruturando uma política de resíduos sólidos que pode obrigar as empresas a cuidar diretamente de seus resíduos. “Se as corporações precisarem montar os próprios sistemas de tratamento de material usado, elas vão acabar competindo com as cooperativas em vez de ajudá-las a crescer”, afirma André Vilhena, diretor executivo do Compromisso Empresarial

para Reciclagem (Cempre), ONG mantida por vários fabricantes de bens de consumo. O modelo que o ministério pode adotar é semelhante ao da Alemanha, onde os fabricantes são responsáveis por todo o ciclo de vida de seus produtos — desde a fabricação até sua eliminação. No setor de embalagens, por exemplo, a norma estabeleceu a obrigatoriedade de fabricantes e distribuidores recolherem e reciclarem os materiais. Por isso, as empresas do setor criaram a Duales System Deutschland GmbH (DSD), entidade sem fins lucrativos que organiza a coleta e faz a triagem e a reciclagem de todo o material. Para fazer parte da DSD, as associadas precisam pagar uma taxa de filiação, além de tarifas que variam conforme o volume de suas embalagens. O custo de montar essa estrutura obviamente acaba sendo repassado para os consumidores. “Se essas taxas forem criadas no Brasil, toda a cadeia de reciclagem seria desmontada”, afirma Von Zuben.

OLHAR IMAGEM

Reuniões mensais com a apresentação dos balanços de produtividade e de faturamento dão um caráter de transparência ao negócio

ção poderia ser feita com vidro reciclado. Na Alemanha, por exemplo, a reciclagem de vidro chega a 91%. “O problema da falsificação é tipicamente brasileiro”, afirma Leandro Pignataro, gerente-geral de marketing da Owens-Illinois, que opera em mais de 30 países. Além do impacto ambiental, a substituição da areia por cacos de vidro como matéria-prima reduz os custos de produção. Uma das maiores economias é com energia, uma vez que o processo à base de reciclagem exige menos calor nos fornos que o sistema tradicional. Em média, a economia é de 120 reais por tonelada de vidro produzido — praticamente o mesmo preço que a empresa paga para os fornecedores dos cacos. Para incentivar a reciclagem, a companhia faz um trabalho de conscientização da população, executado com a Abividro. A idéia é orientar os consumidores para que eles não revendam as garrafas e não as coloquem no lixo inteiras. “A reciclagem é feita com os cacos. Por isso não é preciso deixar a garrafa inteira para conseguir reciclar”, diz Pignataro.

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Os cooperados deixaram de receber por hora trabalhada. Agora, o salário varia de acordo com a produtividade de cada um

ja Julieta, na zona sul de São Paulo, que já aumentou de 37 para 53 o número de cooperados e planeja implantar um segundo turno de produção. “Se eu faço a coleta, por que não posso industrializar o material?” No médio prazo, o plano da cooperativa é fabricar embalagens com o processamento do material coletado. Os resultados iniciais do programa são animadores. A produção das cinco cooperativas juntas aumentou quase 40% — e parte do excedente foi comprada pela Suzano. A busca por mais matéria-prima reciclável também é um desafio para a Klabin, fabricante de papéis e cartões para embalagens. Uma das especialidades da empresa é reciclar as embalagens longa vida utilizadas para armazenar leite e sucos. Em 2005, a empresa implantou em sua unidade de Piracicaba, no interior paulista, uma tecnologia que permite separar os três elementos das embalagens longa vida: papel, plástico e alumínio. O sistema, de-

rganizar cooperativas de catadores não é o único desafio das empresas de vidro que usam material reciclado. O setor vive hoje às voltas com uma barreira muito mais difícil de ser eliminada: a reutilização ilegal das garrafas. Nesse comércio paralelo de embalagens, indústrias de bebida sem marca compram garrafas de fabricantes renomados para reutilizá-las com o seu produto.A prática, além de ilegal e perigosa, é um dos grandes freios da reciclagem de embalagens de vidro no Brasil. Segundo dados da Associação Técnica Brasileira das Indústrias Automáticas de Vidro (Abividro), nos últimos quatro anos o índice de reciclagem ficou estacionado em 45% das embalagens.A Owens-Illinois do Brasil, um dos maiores fabricantes nacionais, é uma das empresas que lutam contra esse problema. Atualmente, a companhia utiliza 100 000 toneladas de cacos de vidro por ano para a fabricação de embalagens — equivalentes à metade de toda a matéria-prima utilizada para sua produção anual. No entanto, se houvesse material suficiente, 100% da fabrica-

Produção de garrafas: reciclagem não passa de 45% das embalagens

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Gestão transparência Os profissionais de finanças e de relações com investidores das empresas devem se envolver cada vez mais na elaboração do GRI

JORGE SILVA/REUTERS

Funcionários da Shell na Venezuela: o relatório da empresa expõe questões delicadas, como casos de suborno

O balanço do futuro Empresas de todo o mundo estão aderindo ao GRI, o único padrão global de divulgação de informações financeiras, ambientais e sociais Lucia Kassai esde que o primeiro balanço social foi publicado no Brasil, em 1986, pela fabricante de fertilizantes Nitrofértil (mais tarde absorvida pela Petrobras), muita coisa mudou. Na época, a principal preocupação da Nitrofértil era relatar suas relações com os funcionários. Passadas duas décadas, as empresas não só descrevem seu relacionamento com empregados como tam-

D

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bém com fornecedores, meio ambiente, comunidades nas quais suas operações estão inseridas, investidores e órgãos de governo — um calhamaço de informações que pode alcançar 200 páginas e hoje é mais conhecido como relatório de sustentabilidade. Aos poucos, um padrão de divulgação dessas informações foi se estabelecendo em todo o planeta. Trata-se do Global Reporting Initiative (GRI), único modelo aceito

mundialmente. Desenvolvido por uma organização independente de mesmo nome, sediada na Holanda, o GRI já é usado por 850 empresas, entre elas Microsoft, Unilever e BP. No Brasil, onde se estima que cerca de 300 empresas publiquem balanços socioambientais, 50 aderiram ao GRI (boa parte delas adota o modelo do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas, Ibase, mais simples que o GRI). Em

2002, eram apenas quatro empresas. O que explica a crescente popularidade do modelo é o fato de que, ao estabelecer um padrão único, ele permite que os relatórios sejam comparados, assim como acontece há muito tempo com os balanços financeiros. Essa comparação acaba trazendo resultados práticos para as empresas. Depois de adotar o GRI, a siderúrgica mineira Usiminas conseguiu descobrir, por exemplo, que seus investimentos em cultura eram inferiores aos das concorrentes do mesmo porte. “O GRI nos deu mais clareza sobre onde investíamos e em quais áreas poderíamos fazer mais”, diz Denis Freitas, gerente de remuneração e benefícios da Usiminas. De 2000 para 2006, a empresa aumentou em cerca de 300% os valores destinados a projetos culturais, hoje na casa dos 22 milhões de reais por ano. Também co-

mo fruto desse exercício de comparação é que ela decidiu que se tornaria a primeira siderúrgica na América Latina a obter as certificações européias RoHs e ELV, que atestam a produção de aço com baixos níveis de substâncias nocivas, como o chumbo. Os selos foram obtidos no segundo semestre deste ano — e a Usiminas considera que a conquista ajuda a aumentar sua competitividade. Não são raros também os casos de companhias que, ao adotar a metodologia, descobrem que não divulgam com precisão algumas das ações que desenvolvem. “Simplesmente não colocávamos no relatório que o papel que destinamos para a reciclagem é doado a ONGs”, diz Helena Catharina Carvalho, superintendente de comunicação interna e institucional. Ao estabelecer certa normatização para os relatórios de sustentabilidade, o GRI

também caiu nas graças dos administradores de fundos de investimento especializados em ações de companhias sustentáveis. “Ele é, sem dúvida, uma boa ferramenta de análise dos balanços não financeiros”, afirma Todd Larsen, diretor de comunicação corporativa do Social Investment Forum, associação americana com sede em Washington que representa analistas, gestores de carteira, instituições financeiras e de pesquisa que trabalham com a análise de investimentos responsáveis. Estima-se que esses fundos administrem ativos de 179 bilhões de dólares só nos Estados Unidos. A adoção do GRI também é pré-requisito para as empresas que pleiteiam fazer parte da carteira do Índice Dow Jones de Sustentabilidade, que reúne empresas socialmente responsáveis cotadas na bolsa de Nova York. Fazer um relatório nos moldes do GRI é uma tarefa hercúlea. O manual de uso da metodologia em português tem 205 páginas e especifica 79 indicadores econômicos, sociais e ambientais. Eles abrangem desde o consumo de energia e água até a composição da administração de acordo com gênero e raça, passando pelo impacto dos produtos nos consumidores, acidentes de trabalho e volume de emissões de gases de efeito estufa. “O primeiro GRI marca uma empresa para sempre”, diz Andréia Marques, gerente de responsabilidade social da Medley, indústria farmacêutica que adotou neste ano pela primeira vez o padrão internacional. Para cumprir a tarefa, o laboratório envolveu durante cinco meses 60 funcionários no processo de coleta de informações, entre supervisores, gerentes, diretores e o próprio presidente. A Medley também passou a fazer parte de um grupo de estudos sobre a metodologia coordenado pelo Instituto Ethos e pelo Centro de Es2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 115


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Gestão transparência Os profissionais de finanças e de relações com investidores das empresas devem se envolver cada vez mais na elaboração do GRI

JORGE SILVA/REUTERS

Funcionários da Shell na Venezuela: o relatório da empresa expõe questões delicadas, como casos de suborno

O balanço do futuro Empresas de todo o mundo estão aderindo ao GRI, o único padrão global de divulgação de informações financeiras, ambientais e sociais Lucia Kassai esde que o primeiro balanço social foi publicado no Brasil, em 1986, pela fabricante de fertilizantes Nitrofértil (mais tarde absorvida pela Petrobras), muita coisa mudou. Na época, a principal preocupação da Nitrofértil era relatar suas relações com os funcionários. Passadas duas décadas, as empresas não só descrevem seu relacionamento com empregados como tam-

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bém com fornecedores, meio ambiente, comunidades nas quais suas operações estão inseridas, investidores e órgãos de governo — um calhamaço de informações que pode alcançar 200 páginas e hoje é mais conhecido como relatório de sustentabilidade. Aos poucos, um padrão de divulgação dessas informações foi se estabelecendo em todo o planeta. Trata-se do Global Reporting Initiative (GRI), único modelo aceito

mundialmente. Desenvolvido por uma organização independente de mesmo nome, sediada na Holanda, o GRI já é usado por 850 empresas, entre elas Microsoft, Unilever e BP. No Brasil, onde se estima que cerca de 300 empresas publiquem balanços socioambientais, 50 aderiram ao GRI (boa parte delas adota o modelo do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas, Ibase, mais simples que o GRI). Em

2002, eram apenas quatro empresas. O que explica a crescente popularidade do modelo é o fato de que, ao estabelecer um padrão único, ele permite que os relatórios sejam comparados, assim como acontece há muito tempo com os balanços financeiros. Essa comparação acaba trazendo resultados práticos para as empresas. Depois de adotar o GRI, a siderúrgica mineira Usiminas conseguiu descobrir, por exemplo, que seus investimentos em cultura eram inferiores aos das concorrentes do mesmo porte. “O GRI nos deu mais clareza sobre onde investíamos e em quais áreas poderíamos fazer mais”, diz Denis Freitas, gerente de remuneração e benefícios da Usiminas. De 2000 para 2006, a empresa aumentou em cerca de 300% os valores destinados a projetos culturais, hoje na casa dos 22 milhões de reais por ano. Também co-

mo fruto desse exercício de comparação é que ela decidiu que se tornaria a primeira siderúrgica na América Latina a obter as certificações européias RoHs e ELV, que atestam a produção de aço com baixos níveis de substâncias nocivas, como o chumbo. Os selos foram obtidos no segundo semestre deste ano — e a Usiminas considera que a conquista ajuda a aumentar sua competitividade. Não são raros também os casos de companhias que, ao adotar a metodologia, descobrem que não divulgam com precisão algumas das ações que desenvolvem. “Simplesmente não colocávamos no relatório que o papel que destinamos para a reciclagem é doado a ONGs”, diz Helena Catharina Carvalho, superintendente de comunicação interna e institucional. Ao estabelecer certa normatização para os relatórios de sustentabilidade, o GRI

também caiu nas graças dos administradores de fundos de investimento especializados em ações de companhias sustentáveis. “Ele é, sem dúvida, uma boa ferramenta de análise dos balanços não financeiros”, afirma Todd Larsen, diretor de comunicação corporativa do Social Investment Forum, associação americana com sede em Washington que representa analistas, gestores de carteira, instituições financeiras e de pesquisa que trabalham com a análise de investimentos responsáveis. Estima-se que esses fundos administrem ativos de 179 bilhões de dólares só nos Estados Unidos. A adoção do GRI também é pré-requisito para as empresas que pleiteiam fazer parte da carteira do Índice Dow Jones de Sustentabilidade, que reúne empresas socialmente responsáveis cotadas na bolsa de Nova York. Fazer um relatório nos moldes do GRI é uma tarefa hercúlea. O manual de uso da metodologia em português tem 205 páginas e especifica 79 indicadores econômicos, sociais e ambientais. Eles abrangem desde o consumo de energia e água até a composição da administração de acordo com gênero e raça, passando pelo impacto dos produtos nos consumidores, acidentes de trabalho e volume de emissões de gases de efeito estufa. “O primeiro GRI marca uma empresa para sempre”, diz Andréia Marques, gerente de responsabilidade social da Medley, indústria farmacêutica que adotou neste ano pela primeira vez o padrão internacional. Para cumprir a tarefa, o laboratório envolveu durante cinco meses 60 funcionários no processo de coleta de informações, entre supervisores, gerentes, diretores e o próprio presidente. A Medley também passou a fazer parte de um grupo de estudos sobre a metodologia coordenado pelo Instituto Ethos e pelo Centro de Es2007 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 115


balanco GRI-2-alta

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Gestão transparência GRI — Global Reporting Initiative O que é Padrão internacional para divulgação de informações econômicas, sociais e ambientais de uma empresa. Foi desenvolvido por uma organização independente com sede na Holanda (também chamada GRI). Os primeiros relatórios GRI foram publicados em 2000

Quem usa São 850 companhias no

DIVULGAÇÃO

mundo, entre elas Microsoft, Unilever e British Petroleum

Centro Cultural da Usiminas em Ipatinga, em Minas Gerais: aumento dos investimentos em cultura depois da adoção do GRI

tudos em Sustentabilidade (GVces), da FGV, na companhia de outras sete empresas veteranas no uso do GRI. Com a troca de experiências, a empresa concluiu, por exemplo, que seria melhor publicar uma versão completa do relatório para distribuir a ONGs, entidades de classe e bancos, e outra mais simplificada para entregar à comunidade médica. “É extremamente importante para nós que esse público saiba o que estamos fazendo, mas entendemos que os médicos têm pouco tempo para leitura”, diz Andréia.

Serviço de verificação Apesar dos avanços, o GRI não está imune às críticas dos especialistas. Uma delas é a que, como o modelo pressupõe adesão voluntária, não existe obrigatoriedade de as empresas reportarem todos os indicadores. Com isso, algumas companhias deixam de lado aspectos críticos ou delicados. “Isso nos obriga muitas vezes a buscar informações em outras fontes, como registros judiciais e notícias na imprensa”, diz Larsen, do Social Investment Forum. A anglo-holandesa Shell é uma das raras companhias a expor todos os seus problemas. Desde 2004, a Shell registra no documento o número exato de casos de suborno que envolvem funcionários em to116 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

do o mundo. Em 2006, por exemplo, foram 96 — que, segundo a empresa, resultaram na demissão de 143 pessoas. Outra vulnerabilidade é que o GRI não exige que os balanços sejam auditados por uma firma independente — embora a prática seja fortemente recomendada. Além disso, ele permite que as empresas baixem em seu site, sem qualquer dificuldade, selos da entidade para estampá-los nos documentos. Na teoria, deveriam usar o selo A+ as empresas que submetem seus relatórios a um crivo externo e reportam todos os indicadores que são relevantes ao negócio. Na prática, porém, como a organização não tem poder de fiscalização, o correto uso dos selos — que vão de A+ a C+, dependendo da relevância das informações relatadas — está atrelado à idoneidade da empresa. “Assumimos que as companhias são éticas em vincular sua imagem à da entidade, mas não podemos garantir que isso ocorre em 100% dos casos”, afirma Gláucia Terreo, representante do GRI no Brasil. Para dar mais segurança aos públicos que usam os relatórios como fonte de informação, o GRI passou a oferecer no ano passado um serviço de verificação. Quem submete voluntariamente suas demonstrações à entidade ganha, então, o direito

Quantas empresas adotam no Brasil Cerca de 50, entre elas Philips, Usiminas, CPFL, Itaú, Medley e Serasa. A pioneira foi a Natura

Vantagens - As empresas brasileiras podem comparar seus balanços sociais com os das estrangeiras que usam o mesmo modelo - É o padrão predileto dos analistas que investem em empresas sustentáveis

Vulnerabilidades - Permite que as companhias escolham os indicadores que querem reportar, o que dá espaço para que elas se esquivem de assuntos delicados ou polêmicos - Não obriga as empresas a submeter o relatório a auditoria externa

de estampar outro selo, o “GRI checked”. Das 50 empresas que publicam relatórios com as diretrizes no Brasil, quatro ganharam o novo selo: Petrobras, Serasa, Copel e banco Real. Segundo especialistas, provar que o que foi reportado corresponde à realidade — por meio desse selo ou por auditorias externas — é uma tendência inexorável. Além disso, profissionais das áreas financeira e de relações com investidores das companhias devem, cada vez mais, se envolver na elaboração do GRI. “Como ele será cada vez mais usado para complementar a análise financeira das empresas, é natural que sua elaboração seja menos encabeçada pela comunicação e mais por áreas ainda mais estratégicas das companhias”, afirma Gláucia.



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perspectivas Cientistas. Jornalistas. Engenheiros. Em 2007, profissionais de diversas áreas lançaram livros que relacionam a sustentabilidade aos mais variados aspectos da economia e dos negócios. Em meio à prolífica produção editorial sobre o tema, EXAME selecionou cinco das obras mais relevantes — seja pela representatividade de seus autores, seja pela abrangência e originalidade dos argumentos. O conjunto forma uma espécie de leitura obrigatória para homens e mulheres de negócios que buscam entender como as empresas podem lidar com o novo cenário que se impõe

1 As conseqüências do capitalismo acelerado Supercapitalism Editora Alfred A. Knopf, 272 págs. Autor Robert B. Reich gigante do varejo Wal-Mart é freqüentemente criticada por não oferecer bons salários e benefícios a seus funcionários. Muitos diriam que a solução é tentar incentivar a empresa a aplicar mais práticas de “responsabilidade social”. Não é o que pensa Robert Reich, ex-secretário do Trabalho durante o governo Bill Clinton. “O Wal-Mart, assim como qualquer outra empresa capitalista, está apenas seguindo as regras atuais do jogo”, diz ele. Por isso, segundo Reich, é bobagem querer que a empresa mude seu padrão de comportamento — afinal, como o varejista vai poder oferecer os preços baixos de que os consumidores tanto gostam se tiver de pagar bons planos de saúde aos funcionários e não puder dar uma “apertada” em seus fornecedores? Professor de políticas públicas da Universidade da Califórnia, Reich acredita que a responsabilidade das empresas é apenas dar lucro. Em Supercapitalism – The Transformation of Business, Democracy, and Everyday Life (em tradução livre “Supercapitalismo — A transformação dos negócios, da demo-

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Guilherme Fogaça

FOTOS GERMANO LÜDERS

Um tema,

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perspectivas Cientistas. Jornalistas. Engenheiros. Em 2007, profissionais de diversas áreas lançaram livros que relacionam a sustentabilidade aos mais variados aspectos da economia e dos negócios. Em meio à prolífica produção editorial sobre o tema, EXAME selecionou cinco das obras mais relevantes — seja pela representatividade de seus autores, seja pela abrangência e originalidade dos argumentos. O conjunto forma uma espécie de leitura obrigatória para homens e mulheres de negócios que buscam entender como as empresas podem lidar com o novo cenário que se impõe

1 As conseqüências do capitalismo acelerado Supercapitalism Editora Alfred A. Knopf, 272 págs. Autor Robert B. Reich gigante do varejo Wal-Mart é freqüentemente criticada por não oferecer bons salários e benefícios a seus funcionários. Muitos diriam que a solução é tentar incentivar a empresa a aplicar mais práticas de “responsabilidade social”. Não é o que pensa Robert Reich, ex-secretário do Trabalho durante o governo Bill Clinton. “O Wal-Mart, assim como qualquer outra empresa capitalista, está apenas seguindo as regras atuais do jogo”, diz ele. Por isso, segundo Reich, é bobagem querer que a empresa mude seu padrão de comportamento — afinal, como o varejista vai poder oferecer os preços baixos de que os consumidores tanto gostam se tiver de pagar bons planos de saúde aos funcionários e não puder dar uma “apertada” em seus fornecedores? Professor de políticas públicas da Universidade da Califórnia, Reich acredita que a responsabilidade das empresas é apenas dar lucro. Em Supercapitalism – The Transformation of Business, Democracy, and Everyday Life (em tradução livre “Supercapitalismo — A transformação dos negócios, da demo-

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Livros idéias cracia e da vida cotidiana”), ele usa exemplos como o do Wal-Mart para mostrar que cobrar qualquer outra coisa das empresas — sobretudo que elas assumam papéis básicos do Estado, como saúde e educação — é uma falácia. “Precisamos parar de tratar as companhias como se fossem pessoas e não devemos esperar que elas sejam patriotas.” A teoria de Reich é que o capitalismo da metade do século 20 se transformou no capitalismo global, que, por sua vez, evoluiu para o turbinado supercapitalismo. No decorrer desse período, as pessoas adquiriram características de consumidores e investidores, mas perderam suas habilidades como cidadãos. A conseqüência desse processo é o enfraquecimento da democracia. Em 1964, quase dois terços dos americanos acreditavam que o governo era direcionado para o bem de todos. Em 2000, esse número caiu para 35%, e a maioria passou a acreditar que o governo servia a alguns interesses específicos. “Impedir que o supercapitalismo permaneça pisando na democracia é a única saída construtiva. O resto é rodeio”, argumenta o polêmico Reich.

2 A corrida pelo carro sustentável Zoom — The Global Race to Fuel the Car of the Future Editora Twelve, 352 págs. Autores Os jornalistas ingleses

Iain Carson e Vijay V.Vaitheeswaran 120 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

mundo levou um século inteiro para atingir a marca de 1 bilhão de carros. O rápido avanço dos países emergentes, no entanto, pode nos levar ao segundo bilhão dentro dos próximos 30 anos. Para os ambientalistas, esse é mais um motivo de preocupação com o aumento das emissões de gases poluentes. Para a indústria automobilística, porém, é uma nova oportunidade de mercado. É justamente do esforço das montadoras para atender aos anseios de uma sociedade preocupada com o aquecimento global (e com os crescentes preços do petróleo) que trata o livro Zoom — The Global Race to Fuel the Car of the Future (em português, “Zoom — A corrida global para abastecer o carro do futuro”). Os autores Iain Carson e Vijay V. Vaitheeswaran lançam a idéia de que os veículos verdes são a nova fronteira da indústria — e as montadoras que não se derem bem nessa corrida podem ser riscadas do mapa. Trata-se de um desafio enorme. Até hoje, o modelo híbrido de eletricidade e gasolina de maior sucesso é o pioneiro Prius, lançado em 1997 pela Toyota. O Prius já vendeu mais de 500 000 unidades e garantiu à montadora japonesa a liderança no segmento, com 77% de participação. Mesmo que tardiamente, Carson e Vaitheeswaran apontam que as montadoras americanas vivem agora “um grande despertar” e também decidiram investir no carro sustentável. A General Motors, por exemplo, já investiu 1 bilhão de dólares em pesquisas para desenvolver o carro limpo. Dessa forma, nasceu o Chevrolet Volt, um sedã movido a eletricidade com lançamento previsto para 2010. A californiana Tesla Motors é o mais representativo retrato do esforço americano para tentar recuperar o tempo perdido. A empresa, criada em 2003 com dinheiro dos fundadores do Google, Larry Page e Sergey Brin, nasceu para desenvolver carros elétricos de luxo. “As decisões a respeito dos veículos e dos combustíveis desta década vão determinar o curso dos acontecimentos do século. Estamos no início de uma revolução da energia limpa”, prevêem os autores do livro.

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3 O lado nada glamouroso do consumo

caminhões no mundo se deve ao transporte de alimentos em longas distâncias. Trata-se de um modelo que lança até 17 vezes mais dióxido de carbono na atmosfera do que um sistema local de alimentação. McKibben acredita que, para escapar dessa armadilha, é preciso atacar as causas da atual conjuntura: o crescimento centralizado e a obsessão pela eficiência econômica. “É para esses problemas que agora nós temos de olhar”, diz.

Deep Economy Editora Times Books, 261 págs. Autor O ambientalista americano

Bill McKibben á quase duas décadas, o americano Bill McKibben vem se firman-

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do como um dos ambientalistas mais influentes do mundo. Em seu livro mais recente, Deep Economy (em português, “Economia profunda”), ele levanta a tese de que o atual modelo econômico precisa ser totalmente revisto e que a cultura do consumo precisa de um freio urgente. Ex-repórter da revista The New Yorker, McKibben aponta que, historicamente, a sociedade se pauta pela idéia de que “mais é melhor”. Assim, difundiu-se que a chave para conquistar a riqueza era aumentar a eficiência, geralmente com ganho de escala. Mas hoje, segundo o autor, esse modelo está cobrando um preço alto: o aquecimento global e uma sensação generalizada de infelicidade. “O crescimento, ao menos da forma como nós o criamos, está produzindo mais desigualdade do que prosperidade, mais insegurança do que progresso”, afirma ele. Um dos exemplos do autor para sustentar a tese é o desenvolvimento da produção agrícola. Nas últimas décadas, os produtores aumentaram a eficiência, mas a margem de lucro caiu de 35% em 1950 para os atuais 9%. E as conseqüências não se restringem ao campo econômico. Para gerar ganho de escala, as fazendas ficaram concentradas nas mãos de poucos. De quebra, o meio ambiente também foi prejudicado. Cerca de 40% do tráfego de

4 O cético do aquecimento global

custaria 180 bilhões de dólares por ano se todos os países participassem e cumprissem suas promessas. “Essa postura é questionável num mundo onde bilhões de pessoas vivem na pobreza e milhões morrem de doenças curáveis”, afirma. Lomborg sugere que a sociedade atual dê prioridade a preocupações mais imediatas, como combater a malária e a Aids e assegurar o suprimento de água limpa. O cientista político usa dados concretos para abrandar os discursos alarmistas. Segundo ele, os ambientalistas afirmam que o aquecimento global ocasionou redução média de 15 ursos polares por ano entre 1987 e 2004 na baía de Hudson, no Canadá. “No entanto, em nenhum lugar do noticiário se encontra a informação de que, em média, 49 ursos são mortos a bala a cada ano nessa região.” Ele também revela que a maioria das reivindicações dos ambientalistas está mais baseada em emoções do que em dados. Lomborg argumenta que o medo generalizado leva a soluções erradas. “Precisamos relembrar que o objetivo final não é reduzir as emissões de gases do aquecimento global em si, mas melhorar a qualidade de vida e do meio ambiente”, afirma.

Cool It — The Skeptical Environmentalist’s Guide to Global Warming Editora Alfred A.Knopf,253 págs. Autor Bjorn Lomborg

em mesmo o dinamarquês Bjorn Lomborg, conhecido por contradizer as previsões ambientais mais catastróficas, duvida que o aumento dos níveis atmosféricos de dióxido de carbono vem causando mudanças climáticas. “O aquecimento global é real e foi causado pela humanidade”, diz ele em seu novo livro Cool It — The Skeptical Environmentalist’s Guide to Global Warming (em português, algo como “Calma lá — o guia do ambientalista cético para o aquecimento global”). Lomborg, porém, questiona o que chama de histeria e o gasto excessivo em programas de redução das emissões de gases de efeito estufa. Segundo ele, o Protocolo de Kyoto

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5 Vem aí o estadista corporativo Os Desafios da Sustentabilidade — Uma Ruptura Urgente Editora Elsevier, 304 págs. Autor O engenheiro Fernando Almeida

os anos 90, o estado canadense de Newfoundland entrou numa crise quando a poluição lançada no mar pelas cidades costeiras fez com que o bacalhau desaparecesse de seus arredores. Dezenas de milhares de pessoas perderam o emprego. O governo gastou cerca de 2 bilhões de dólares com seguro-desemprego e treinamento para recolocação da mão-de-obra. O caso, citado no livro Os Desafios da Sustentabilidade — Uma Ruptura Urgente, mostra claramente que a continuidade das atividades empresariais depende da conservação dos recursos naturais. O autor, o engenheiro Fernando Almeida, presidente executivo do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), baseia-se na tese de que apenas o setor privado tem disciplina e recursos necessários para liderar a transformação com a urgência requerida. Almeida destaca, porém, que a tomada de decisões que levariam à gestão responsável dentro das empresas acontece de forma muito mais lenta do que deveria. Os administradores têm grandes desafios pela frente. De acordo com metas estabelecidas pelo Painel de Mudanças Climáticas da Organização das Nações Unidas, as empresas serão obrigadas a consumir cada vez menos energia para alimentar uma produção crescente. Segundo Almeida, esse cenário exige uma nova figura nos negócios: os estadistas corporativos. Trata-se de profissionais que deverão ocupar os principais cargos das grandes companhias mundo afora e verão como oportunidade e vantagens competitivas os riscos de um mercado em transformação. Esse grupo de profissionais também terá a capacidade de se relacionar e aprender com clientes, consumidores, prestadores de serviços, colegas, ONGs e agentes públicos, sempre tendo em mente a visão de parcerias eficazes e de longo prazo. De acordo com o autor, esse perfil de profissional ainda está em formação. “Alguns alunos de primeira linha das escolas de administração brasileiras já questionam a política e a prática socioambiental das companhias ao avaliar as ofertas de emprego que recebem”, afirma Almeida.

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Livros idéias cracia e da vida cotidiana”), ele usa exemplos como o do Wal-Mart para mostrar que cobrar qualquer outra coisa das empresas — sobretudo que elas assumam papéis básicos do Estado, como saúde e educação — é uma falácia. “Precisamos parar de tratar as companhias como se fossem pessoas e não devemos esperar que elas sejam patriotas.” A teoria de Reich é que o capitalismo da metade do século 20 se transformou no capitalismo global, que, por sua vez, evoluiu para o turbinado supercapitalismo. No decorrer desse período, as pessoas adquiriram características de consumidores e investidores, mas perderam suas habilidades como cidadãos. A conseqüência desse processo é o enfraquecimento da democracia. Em 1964, quase dois terços dos americanos acreditavam que o governo era direcionado para o bem de todos. Em 2000, esse número caiu para 35%, e a maioria passou a acreditar que o governo servia a alguns interesses específicos. “Impedir que o supercapitalismo permaneça pisando na democracia é a única saída construtiva. O resto é rodeio”, argumenta o polêmico Reich.

2 A corrida pelo carro sustentável Zoom — The Global Race to Fuel the Car of the Future Editora Twelve, 352 págs. Autores Os jornalistas ingleses

Iain Carson e Vijay V.Vaitheeswaran 120 | GUIA EXAME • SUSTENTABILIDADE | 2007

mundo levou um século inteiro para atingir a marca de 1 bilhão de carros. O rápido avanço dos países emergentes, no entanto, pode nos levar ao segundo bilhão dentro dos próximos 30 anos. Para os ambientalistas, esse é mais um motivo de preocupação com o aumento das emissões de gases poluentes. Para a indústria automobilística, porém, é uma nova oportunidade de mercado. É justamente do esforço das montadoras para atender aos anseios de uma sociedade preocupada com o aquecimento global (e com os crescentes preços do petróleo) que trata o livro Zoom — The Global Race to Fuel the Car of the Future (em português, “Zoom — A corrida global para abastecer o carro do futuro”). Os autores Iain Carson e Vijay V. Vaitheeswaran lançam a idéia de que os veículos verdes são a nova fronteira da indústria — e as montadoras que não se derem bem nessa corrida podem ser riscadas do mapa. Trata-se de um desafio enorme. Até hoje, o modelo híbrido de eletricidade e gasolina de maior sucesso é o pioneiro Prius, lançado em 1997 pela Toyota. O Prius já vendeu mais de 500 000 unidades e garantiu à montadora japonesa a liderança no segmento, com 77% de participação. Mesmo que tardiamente, Carson e Vaitheeswaran apontam que as montadoras americanas vivem agora “um grande despertar” e também decidiram investir no carro sustentável. A General Motors, por exemplo, já investiu 1 bilhão de dólares em pesquisas para desenvolver o carro limpo. Dessa forma, nasceu o Chevrolet Volt, um sedã movido a eletricidade com lançamento previsto para 2010. A californiana Tesla Motors é o mais representativo retrato do esforço americano para tentar recuperar o tempo perdido. A empresa, criada em 2003 com dinheiro dos fundadores do Google, Larry Page e Sergey Brin, nasceu para desenvolver carros elétricos de luxo. “As decisões a respeito dos veículos e dos combustíveis desta década vão determinar o curso dos acontecimentos do século. Estamos no início de uma revolução da energia limpa”, prevêem os autores do livro.

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3 O lado nada glamouroso do consumo

caminhões no mundo se deve ao transporte de alimentos em longas distâncias. Trata-se de um modelo que lança até 17 vezes mais dióxido de carbono na atmosfera do que um sistema local de alimentação. McKibben acredita que, para escapar dessa armadilha, é preciso atacar as causas da atual conjuntura: o crescimento centralizado e a obsessão pela eficiência econômica. “É para esses problemas que agora nós temos de olhar”, diz.

Deep Economy Editora Times Books, 261 págs. Autor O ambientalista americano

Bill McKibben á quase duas décadas, o americano Bill McKibben vem se firman-

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do como um dos ambientalistas mais influentes do mundo. Em seu livro mais recente, Deep Economy (em português, “Economia profunda”), ele levanta a tese de que o atual modelo econômico precisa ser totalmente revisto e que a cultura do consumo precisa de um freio urgente. Ex-repórter da revista The New Yorker, McKibben aponta que, historicamente, a sociedade se pauta pela idéia de que “mais é melhor”. Assim, difundiu-se que a chave para conquistar a riqueza era aumentar a eficiência, geralmente com ganho de escala. Mas hoje, segundo o autor, esse modelo está cobrando um preço alto: o aquecimento global e uma sensação generalizada de infelicidade. “O crescimento, ao menos da forma como nós o criamos, está produzindo mais desigualdade do que prosperidade, mais insegurança do que progresso”, afirma ele. Um dos exemplos do autor para sustentar a tese é o desenvolvimento da produção agrícola. Nas últimas décadas, os produtores aumentaram a eficiência, mas a margem de lucro caiu de 35% em 1950 para os atuais 9%. E as conseqüências não se restringem ao campo econômico. Para gerar ganho de escala, as fazendas ficaram concentradas nas mãos de poucos. De quebra, o meio ambiente também foi prejudicado. Cerca de 40% do tráfego de

4 O cético do aquecimento global

custaria 180 bilhões de dólares por ano se todos os países participassem e cumprissem suas promessas. “Essa postura é questionável num mundo onde bilhões de pessoas vivem na pobreza e milhões morrem de doenças curáveis”, afirma. Lomborg sugere que a sociedade atual dê prioridade a preocupações mais imediatas, como combater a malária e a Aids e assegurar o suprimento de água limpa. O cientista político usa dados concretos para abrandar os discursos alarmistas. Segundo ele, os ambientalistas afirmam que o aquecimento global ocasionou redução média de 15 ursos polares por ano entre 1987 e 2004 na baía de Hudson, no Canadá. “No entanto, em nenhum lugar do noticiário se encontra a informação de que, em média, 49 ursos são mortos a bala a cada ano nessa região.” Ele também revela que a maioria das reivindicações dos ambientalistas está mais baseada em emoções do que em dados. Lomborg argumenta que o medo generalizado leva a soluções erradas. “Precisamos relembrar que o objetivo final não é reduzir as emissões de gases do aquecimento global em si, mas melhorar a qualidade de vida e do meio ambiente”, afirma.

Cool It — The Skeptical Environmentalist’s Guide to Global Warming Editora Alfred A.Knopf,253 págs. Autor Bjorn Lomborg

em mesmo o dinamarquês Bjorn Lomborg, conhecido por contradizer as previsões ambientais mais catastróficas, duvida que o aumento dos níveis atmosféricos de dióxido de carbono vem causando mudanças climáticas. “O aquecimento global é real e foi causado pela humanidade”, diz ele em seu novo livro Cool It — The Skeptical Environmentalist’s Guide to Global Warming (em português, algo como “Calma lá — o guia do ambientalista cético para o aquecimento global”). Lomborg, porém, questiona o que chama de histeria e o gasto excessivo em programas de redução das emissões de gases de efeito estufa. Segundo ele, o Protocolo de Kyoto

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5 Vem aí o estadista corporativo Os Desafios da Sustentabilidade — Uma Ruptura Urgente Editora Elsevier, 304 págs. Autor O engenheiro Fernando Almeida

os anos 90, o estado canadense de Newfoundland entrou numa crise quando a poluição lançada no mar pelas cidades costeiras fez com que o bacalhau desaparecesse de seus arredores. Dezenas de milhares de pessoas perderam o emprego. O governo gastou cerca de 2 bilhões de dólares com seguro-desemprego e treinamento para recolocação da mão-de-obra. O caso, citado no livro Os Desafios da Sustentabilidade — Uma Ruptura Urgente, mostra claramente que a continuidade das atividades empresariais depende da conservação dos recursos naturais. O autor, o engenheiro Fernando Almeida, presidente executivo do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), baseia-se na tese de que apenas o setor privado tem disciplina e recursos necessários para liderar a transformação com a urgência requerida. Almeida destaca, porém, que a tomada de decisões que levariam à gestão responsável dentro das empresas acontece de forma muito mais lenta do que deveria. Os administradores têm grandes desafios pela frente. De acordo com metas estabelecidas pelo Painel de Mudanças Climáticas da Organização das Nações Unidas, as empresas serão obrigadas a consumir cada vez menos energia para alimentar uma produção crescente. Segundo Almeida, esse cenário exige uma nova figura nos negócios: os estadistas corporativos. Trata-se de profissionais que deverão ocupar os principais cargos das grandes companhias mundo afora e verão como oportunidade e vantagens competitivas os riscos de um mercado em transformação. Esse grupo de profissionais também terá a capacidade de se relacionar e aprender com clientes, consumidores, prestadores de serviços, colegas, ONGs e agentes públicos, sempre tendo em mente a visão de parcerias eficazes e de longo prazo. De acordo com o autor, esse perfil de profissional ainda está em formação. “Alguns alunos de primeira linha das escolas de administração brasileiras já questionam a política e a prática socioambiental das companhias ao avaliar as ofertas de emprego que recebem”, afirma Almeida.

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artigo sustenta-2-alta

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RAFAEL JACINTO/CIA DE FOTO

Artigo governança

Um difícil equilíbrio de forças

Heloísa Bedicks é secretária-geral do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC)

Ao conselho de administração cabe a difícil tarefa de dosar a pressão por resultados de curto prazo com as questões que vão garantir a perenidade da empresa

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empresa e circunstancialmente desfavoráveis a um grupo de empregados. (A Varig é um exemplo brasileiro em que o interesse dos pilotos com poder de decisão comprometeu de maneira irreversível a sobrevivência da empresa.) De outro lado, o drástico efeito da intensa pressão por resultados financeiros redunda em escândalos corporativos e na cada vez mais efêmera passagem de executivos pela cadeira de presidente — sobretudo nas empresas americanas. A boa notícia é que o poder dessas duas forças tende a se equiparar. A pressão pelo lucro trimestre a trimestre sempre vai existir. Ao mesmo tempo, observa-se hoje, mesmo em países como os Estados Unidos, onde tradicionalmente predomina a pressão dos investidores, a crescente defesa dos interesses da sociedade e do próprio planeta. Mais importante: as mudanças no universo empresarial americano ecoam nas maiores corporações do mundo. O próprio empenho dos mercados em estabelecer critérios rígidos para selecionar empresas com uma postura responsável, no caso dos índices de sustentabilidade, aponta essa tendência. Os conselheiros das empresas, porém, terão mais dificuldade para desempenhar suas tarefas nesse novo modelo — intermediar e filtrar tantos interesses será ainda mais complexo. O segredo está em não cair na armadilha de privilegiar uma ou outra parte acima do interesse maior — a perenidade da companhia.

A Varig é um exemplo brasileiro que mostra como o interesse dos pilotos com poder de decisão comprometeu de maneira irreversível a sobrevivência da empresa

RAFAEL ANDRAD E/FOLHA IMAGEM

esde que a Organização das Nações Unidas cunhou a expressão “desenvolvimento sustentável”, empresas de todo o mundo atentaram para o fato de que era preciso “satisfazer as necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras suprirem suas próprias necessidades”. O alerta feito duas décadas atrás levou várias delas a incorporar a seu cotidiano o triplo alicerce social, ambiental e econômico-financeiro. Caberia ao conselho de administração dessas companhias integrar esses pilares à estratégia de negócios e zelar para que os fundamentos fossem preservados. Essa é a teoria. Na prática, porém, os conselhos de administração em todo o mundo se vêem cada vez mais em meio a um embate de forças antagônicas. De um lado, as crescentes pressões de investidores por resultados de curto prazo. De outro, o escrutínio e as exigências dos chamados stakeholders, membros da sociedade (como funcionários, ativistas e fornecedores) que também têm interesse nas atividades da companhia. Nesse jogo de forças, o mundo já presenciou distorções de ambos os lados. A inclusão de representantes de stakeholders no conselho provou-se uma utopia romântica. Em países como Japão e Alemanha, onde surgiu a tradição de nomear funcionários para o conselho, não se viram bons resultados em momentos de crise, o que exigiu corte de custos e demissões. O veto dos funcionários configurou-se uma barreira intransponível a algumas decisões favoráveis à perenidade da



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