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Logística Integrada
Por Giovanni Fiorentino, Jairo Carolinski e Francesco Cardi*
uma prioridade do CEO
Drástica redução da inflação, a partir de 1994, e maior abertura desencadearam crescimento do mercado interno, abrindo portas para a entrada em massa de competidores internacionais. Nesse cenário nacional de competição mais acirrada, em que muito mais concorrentes disputavam o bolso do consumidor, grande número de empresas brasileiras começou a avaliar de que forma poderia aumentar sua eficiência, no sentido de disponibilizar, ao menor custo, o produto desejado, nas condições exigidas e no local pedido. Estava inaugurada a era da busca de ganho em eficiência na cadeia logística. O mercado brasileiro apresentou intenso crescimento em suas exportações e importações, inserido que estava na globalização da economia. O ganho de eficiência na movimentação de cargas internacionais foi, mais uma vez, o fator que gerou esse crescimento. Assim, de forma gradual e contínua, a globalização deixou de ser um conceito e passou a fazer parte do dia-a-dia do país e de suas empresas. As fábricas brasileiras de empresas multinacionais têm a possibilidade de abastecer mercados de um continente, mas podem depender de insumos de fornecedores de um outro continente. Eficiência e precisão no gerenciamento da cadeia logística são, então, fatores críticos de sucesso para uma empresa entrar no mercado global. Essas mudanças vieram para ficar. Intensidade de competição, globalização e maior nível de exigência dos consumidores são temas que ocuparão definitivamente a agenda dos CEOs de empresas brasileiras nos próximos anos. Saber reagir a essas mudanças e criar valor no negócio não serão tarefas fáceis para essas empresas. Aquelas que conseguirem gerenciar sua cadeia logística com excelência são as que abrirão vantagem competitiva relevante frente aos concorrentes.
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Giovanni Fiorentino é Vice-Presidente e Líder da Área de Logística e Supply Chain Management; Jairo Carolinski é Gerente de Projeto; Francesco Cardi é Consultor Sênior da Bain & Company no Brasil.
Alavanca de valor pouco utilizada Em um estudo recentemente conduzido pela Bain & Company no Brasil, junto a mais de 500 empresas em 15 segmentos diferentes da economia, 80% das empresas entrevistadas reconheceram que a logística já é um diferencial competitivo importante. Muitas dessas empresas, no entanto, mostraram não conhecer em profundidade a realidade de suas cadeias logísticas. Várias delas não conseguiram levantar, com precisão, os custos totais associados à logística. Um número ainda menor acompanhava indicadores críticos de desempenho da logística. A maioria das empresas, de todos os setores, entretanto, tem um denominador comum: a percepção de que seus custos tendem a aumentar e a visão de que há oportunidades para reduzi-los em sua cadeia logística. Além disso, grande número de empresas enxerga que as maiores oportunidades não estão somente na área de transportes, considerada, por anos a fio, o principal alvo de qualquer programa de melhoria logística. Vê, também, outras atividades com grande potencial de melhoria: gestão dos estoques, administração de pedidos e gestão de importação. O mesmo estudo realizado pela Bain & Company no Brasil, mostra que apenas 40% das empresas mencionaram a oportunidade de melhorar o nível de serviço aos clientes, fato que se agrava quando as demais empresas igualmente reconhecem que seus clientes estão ficando cada vez mais exigentes. Esse ponto foi mencionado por cerca de 70% das empresas entrevistadas e destaca pontualidade e confiabilidade na entrega como as principais melhorias a serem obtidas nessa dimensão. As indústrias que apresentam as maiores oportunidades de melhoria em rentabilidade por meio de um melhor gerenciamento da 2
logística integrada são aquelas que lidam com grande número de transações, alta variabilidade na demanda e cadeia de valor fragmentada entre muitos integrantes, ou seja, as que têm grande número de fornecedores e de pontos de entrega. Exemplos de indústrias Quadro 1: Potencial de criação de valor através da gestão da cadeia logística
com alto potencial são as de varejo, de eletro eletrônicos, de farmacêuticos e de bens de consumo em geral (Quadro 1). Vale ressaltar que os ganhos potenciais na logística são fortemente específicos de cada empresa, uma vez que os custos logísticos, ao longo da cadeia, podem variar bastante entre empresas de um mesmo setor industrial, em função das diferentes características de suas operações. Tipologia de clientes (atacadistas, varejistas ou consumidores finais), número e freqüência de entregas, número de centros de distribuição, número de fábricas, processo produtivo e modalidades de relacionamento com clientes e fornecedores servem para ilustrar as variáveis críticas específicas da cadeia logística de cada empresa. Estudo recente realizado pela Bain & Company, desta vez nos Estados Unidos e na Alemanha, demonstrou que os custos com logística das melhores empresas, numa mesma indústria, eram duas vezes menores que a média (Quadro 2).
Um exemplo bastante conhecido de vantagem competitiva baseada em supply chain é o da Dell, cuja estratégia de produtos make-to-order requer uma cadeia logística totalmente integrada e transparente no que diz respeito a fornecedores e clientes. Quadro 2: Custos totais com logística (Amostra EUA - Alemanha)
A Dell consegue trabalhar com poucos dias de estoque, enquanto seus competidores trabalham com pelo menos um mês. Tal diferença adiciona, segundo a própria Dell, cinco pontos de vantagem na margem operacional, numa indústria em que os produtos rapidamente se tornam obsoletos. Diante desse contexto, cabe a pergunta: “Por que as empresas deixam de gerar uma vantagem competitiva frente a seus concorrentes, apesar de reconhecerem que há oportunidades de melhoria em seus processos logísticos e de sofrerem crescente pressão dos clientes quanto à melhoria também nos serviços a eles prestados?”.
Ausência de visão e de abordagem integrada A resposta à pergunta anterior pode estar, primeiramente, no fato de que boa parte das empresas ainda gerencia sua logística como uma série de atividades separadas, pouco
coordenadas e distribuídas entre diversas áreas empresariais, cada uma com seu próprio orçamento, prioridades e métricas. Por conseqüência, otimizar estoques, custos e níveis de serviço se torna um exercício muito difícil, quase sempre destinado ao fracasso. Vários são os exemplos de conflito entre áreas. Um deles contemplaria uma empresa em que a área de vendas é responsável pelo serviço ao cliente e, portanto, tem como parâmetro de avaliação o prazo de entrega, enquanto a área de produção seria responsável pelo estoque de produtos acabados e medida pelo valor do estoque. Outro exemplo seria o conflito entre a área de compras e a de produção, no caso de a área de compras ser avaliada somente em relação aos preços negociados com os fornecedores e não pelos custos associados a um fornecimento muito demorado e não confiável, tais como excesso de estoques, paradas na produção, defeitos nos produtos etc. Nos exemplos citados, além das dificuldades para se conseguir um bom desempenho nos processos da empresa, há duas outras fontes marcantes de ineficiência cujo impacto, embora difícil de ser quantificado, pode, inclusive, ser considerado de maior relevância. 1. O tempo de pessoas-chave é gasto para gerenciar conflitos internos, ao invés de ser empregado para vender mais ou reduzir o custo de produção; 2. As alavancas-chave de desempenho não são controladas pelas áreas organizacionais, fato que faz com que essas áreas se sintam isentas de responsabilidade com relação aos seus resultados e aos da empresa. O pouco conhecimento do conceito de Supply Chain Management, termo inglês que exprime o gerenciamento integrado da cadeia logística, explica, em parte, um gerenciamento equivocado da logística. A bem da verdade, esse é um conceito bastante novo para o mercado brasileiro, trazido, há seis ou sete anos, por grandes operadores logísticos internacionais que aportaram no país. 3
Outra explicação está na visão um tanto míope de um elevado número de empresas brasileiras, em relação à atitude e ao comportamento de seus gerentes, quando, por exemplo, voltam seu foco para a exploração de uma posição de negociação mais vantajosa em compras, visando conseguir redução de preços, e perdem de vista melhores oportunidades. Além disso, entra em campo o receio de se “perder poder ” ao compartilhar informações entre áreas funcionais ou fornecedores e clientes. Sabe-se que mudança de comportamento é algo difícil de ser concretizado. Dessa forma, é preciso que a Alta Direção sinalize com clareza qual o direcionamento a ser dado no trato da logística.
Quadro 3: Visão integrada da cadeia logística
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Importância de uma visão integrada da logística Uma visão integrada de logística consiste, em síntese, no gerenciamento de vários fluxos - de mercadorias, de informações e financeiros - ao longo da cadeia inteira, abarcando desde os fornecedores até os clientes finais (end-to-end) (Quadro 3). O foco nessa visão integrada leva a uma ampla e nova gama de mudanças comportamentais: planejar vendas, alinhar planos de produção, de vendas e de compras, definir forma de relacionamento com clientes e fornecedores, estabelecer objetivos, desenhar processos, criar métricas, desenvolver fórmulas de controle e, finalmente, embora não menos importante, criar uma responsabilidade única no gerenciamento da cadeia logística.
A integração das atividades de logística, seja total ou parcial, pode gerar substancial redução nos custos totais, com um nível de serviço estável ou melhorado. As reduções de custo são oriundas, principalmente, da eliminação de estoques duplicados (entre compras, produção, vendas e distribuidores), da concentração de responsabilidades fragmentadas (redução de fornecedores e dos recursos dedicados à sua gestão e administração), do alinhamento das decisões ao longo da cadeia e da otimização de processos. A Procter & Gamble, por exemplo, realizou um programa de integração com seus distribuidores, mapeando todas as atividades e analisando seus custos. Um novo processo foi desenhado, atividades duplicadas foram eliminadas e responsabilidades foram redefinidas. Primeiro resultado concreto: o tempo de descarregamento da mercadoria foi cinco vezes menor do que o gasto no processo anterior. É importante ressaltar que os ganhos com um gerenciamento integrado da cadeia resultam em eficiência e eficácia. A Dell nos serve como um belo exemplo. Há algum tempo, quando a demanda por discos rígidos de dois Gigas cresceu de forma intensa, a Dell Computers, conseguiu reagir rapidamente ao redirecionar seus pedidos para a nova demanda. Diante desse quadro, o fornecedor dos discos de um Giga acenou com descontos para um concorrente da Dell que, por não estar integrado ao varejo e a seus fornecedores, não tinha ainda detectado essa tendência. O barato saiu caro porque os produtos ficaram encalhados nas prateleiras. Esse exemplo demonstra que decisões certas são tomadas quando se dá a devida importância à integração das informações nas duas pontas (clientes e fornecedores) do supply chain.
Organizar uma cadeia logística de forma realmente integrada é tarefa complexa. Conseguir pessoas para gerenciar e executar essa tarefa internamente é um desafio ainda maior no mercado brasileiro, que carece de profissionais de logística. Para que esse desafio seja vencido, pode-se trilhar o caminho da terceirização da logística para operadores especializados, escolha cada vez mais utilizada no exterior e que, no Brasil, começa a surgir com maior freqüência.
Terceirização da logística: atalho para gestão integrada Diversas pesquisas (Quadro 4) mostram que, nos Estados Unidos, a terceirização para operadores logísticos especializados, também conhecidos pela sigla 3PL, Third-party Logistics, é uma indústria que movimenta 70 bilhões de dólares, excluindo-se o transporte, e vem crescendo a taxas superiores a 20% ao ano (segundo recentes declarações da UPS, uma das principais empresas de courier e logística, até 30% ao ano).
Quadro 4: Indústria de terceirização da logística nos EUA
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A penetração de serviços terceirizados de logística já representa 10% do mercado americano. Valores ainda maiores de penetração são atingidos na Europa, onde o fenômeno da terceirização se iniciou há mais tempo. No Brasil, apesar de não haver estatísticas oficiais, as estimativas da Bain & Company no país são de que a terceirização de serviços de logística integrada gira em torno de 2% (Quadro 5). Quadro 5: Tamanho do mercado de serviços de logística integrada no Brasil em 2000
Os benefícios que se pretende atingir com o uso da gestão terceirizada da logística são vários: o Redução de custos, uma vez que diferentes empresas-cliente podem compartilhar custos e know-how da mesma provedora de serviços logísticos; o Redução de investimentos, não somente em ativos fixos, mas também em seleção, contratação e treinamento de pessoal; o Desempenho operacional superior, uma vez que o contrato entre a empresa cliente e o operador garante o nível de desempenho, pois abrange, por exemplo, nível de serviço, erros no processo, e pontualidade, além de assumir o fardo das variações de demanda, fator crítico para indústrias com alta sazonalidade. Gera, também, maior foco das gerências e das diretorias no negócio principal da empresa; o Controle maior e melhor, com relação a gastos em áreas tipicamente expostas a práticas irregulares.
Já há algum tempo a maioria das empresas brasileiras adota a subcontratação na área de transportes. Assim, a terceirização de etapas da logística não é um processo novo no mercado. Essa terceirização, no entanto, se faz num processo bem conhecido, com parâmetros definidos pela empresa contratante (a transportadora é contratada para executar um frete de uma origem determinada até um destino preestabelecido). Dificilmente se terceiriza com o objetivo de otimizar os processos da empresa, seja somente num elo da cadeia, como transporte, traduzido, por exemplo, num melhor planejamento ou roteirização, seja na cadeia de valor como um todo, revelado no total redesenho do sistema de armazenagem e de distribuição da empresa.
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Mais de 70% das empresas brasileiras que a Bain & Company entrevistou mostraram entender esses benefícios; mesmo assim, os níveis de terceirização ainda são bastante baixos, especialmente no que se refere à terceirização do planejamento logístico, também chamado de “inteligência logística”.
Receio e oferta pouco conhecida são obstáculos à terceirização “Receio de perder o controle” é uma das razões mais citadas para as empresas brasileiras deixarem de lado a terceirização da logística. Fato nada surpreendente, em vista da falta de familiaridade das empresas com a oferta de operadores logísticos.
Cerca de 40% das empresas entrevistadas deram a entender que nunca receberam uma proposta concreta, mostrando de que forma um operador logístico poderia ajudá-las a melhorar sua cadeia logística. O mesmo não acontece quando se constata o maior grau de terceirização (outsourcing) existente em outras áreas, também críticas, como gestão de sistemas de informação ou centrais de atendimento (call centers), em que há uma oferta de provedores de serviços bem desenvolvida e amplamente conhecida. Um agravante é a grande confusão gerada no mercado devido ao fato de que qualquer transportadora de bairro se auto-intitula como “operador logístico”. A falta de ingerência da Alta Direção das empresas na cadeia logística talvez seja a principal razão da baixa penetração da logística terceirizada. As responsabilidades sobre as várias etapas do supply chain de uma empresa estão distribuídas, via de regra, entre vários níveis operacionais. Os benefícios de um gerenciamento integrado, no entanto, só podem ser avaliados em nível de bottom-line da empresa, que é uma responsabilidade típica da Alta Direção. É difícil de se acreditar que um gerente de transportes possa estar comprometido com o desempenho da empresa a ponto de propor a eliminação de seu cargo, em nome dos benefícios trazidos pela terceirização. Não surpreende, portanto, que os pioneiros da terceirização da logística no Brasil tenham sido as filiais das multinacionais, que seguem a orientação global de suas matrizes. Um exemplo recente, entre muitos outros, dessa tendência é a terceirização da Unilever Bestfoods com a Ryder e da Unilever HPC (Home & Personal Care) com a Excel. Outros exemplos são a FIAT e a GM, que terceirizaram boa parte de suas cadeias logísticas, tanto de abastecimento como de distribuição, para a holandesa TNT.
Foram justamente empresas como a Unilever, a Fiat e a GM que, num passado recente, facilitaram o desenvolvimento no Brasil de operadores logísticos globais como a Ryder, a McLane, a Danzas, a TNT e outras. Outros operadores logísticos internacionais escolheram o caminho da parceria com empresas brasileiras para desenvolver o mercado local. Esse é o caso da Cotia-Penske, parceria da brasileira Cotia Trading com a americana Penske, um dos maiores operadores logísticos do mundo. Além disso, empresas puramente nacionais e de grande potencial, como os Correios, recentemente anunciaram sua firme intenção de atuar em logística integrada, a exemplo de outras empresas de correios internacionais, públicas e privadas. Todos esses operadores estão levando ao mercado um novo conceito sobre logística integrada e aumentando o conhecimento e a aceitação de seus clientes potenciais sobre o valor em se terceirizar a logística com empresas especializadas. A decisão de terceirizar a logística, todavia, dependerá de uma série de fatores particulares a cada empresa. Algumas questões que as empresas devem colocar para não somente avaliar o desempenho de sua cadeia de valor, mas também estudar novas formas para melhorá-lo são: “Quais são os ganhos potenciais?”, “Quais são as prioridades?”, “Como a cadeia logística atende as necessidades para concretização da estratégia?”. Escolher um operador logístico é tarefa que exige muitos cuidados. Conhecer a reputação dos provedores na indústria, a confiabilidade de sua oferta, seu escopo geográfico e suas competências em tecnologia de informação são parte fundamental da lição de casa para qualquer empresa interessada em terceirizar.
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Logística integrada: responsabilidade do CEO A Logística é, sem dúvida, uma alavanca valiosíssima para buscar vantagem competitiva em muitos setores industriais. Alavanca de valor amplamente adotada nos mercados norte-americano e europeu, no Brasil ainda é pouco utilizada, principalmente por falta de uma visão integrada da cadeia. Essa visão restrita é também o principal limitador na terceirização dos processos de supply chain, apesar de representar, sob vários aspectos, uma opção extremamente interessante na rápida redução de custos relevantes e na melhoria da eficácia comercial.
CEOs e diretores de empresas brasileiras devem tomar para si a responsabilidade prioritária de criar valor por meio de um gerenciamento mais eficiente e eficaz da cadeia logística, de forma integrada. Importantes pontos de partida são a compreensão da cadeia logística atual e o desenvolvimento de uma estratégia de Supply Chain Management (Quadro 6).
Quadro 6: CEO checklist
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