Artes Visuais
06
/
2011
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Todas as imagens aqui reproduzidas são propriedade exclusiva dos artistas e, em alguns casos, propriedade do espaço expositivo da Fábrica Braço de Prata. As imagens não podem ser reproduzidas sem autorização dos autores. O co n te ú do de ste catálo go é da re spo n sabilidade do s v ár io s au t o r e s .
Anica Govedarica - Pintura Henrique Silva “Afinidade e Contraste ” - Pintura
Laura Ruffinelli - Pintura João Carvalho Pina
“O PREC já não mora aqui” - Fotografia
ESTAÇÃO IMAGEM | Mora
Anica Govedarica - Pintura
http://www.artslant.com/global/artists/show/86566-anica-nina-govedarica
ninagovedarica@yahoo.com
Universo espelhado de dentro de um poço com uma mão tocando as estrelas. (Ou uma pintora indo para o centro dessa espiral) É como ir de encontro a uma poça de céu, espelhada como se tivesse nascido num País inventado por homens com uma simbologia fresca, vinda das florestas. Nessa virtude de observar por detrás do confronto do poema. Porque são minúsculas as sensações poéticas as suas pinturas. Engano do olhar-ver. Do tamanho de um universo visto na lonjura. Partículas suaves que se vão amenizando quando vistos de cima. A Nina transmite nas suas telas, a frescura de uma criança atenta para lá do equinócio dos sentidos. São sistemas de filamentos com a profundidade de um País suspenso, o seu País de tudo e nada, como artista de todos os mundos. A compreensão para lá do fenómeno do tato. Refúgios de contos breves, enlevos de quadros num toque de Miró. Aqui e ali pequenos voos de pássaros. Aqui e ali uma pegada breve como um verso, um aceno nessa pequena partícula. O Mar absorto do espanto. Como o seu sentido de humor transmitido de suavidade. A gargalhada unindo os jogos nos seus pontinhos de afetos transmitidos. Mapa, onde caminham as histórias com um perfume de árvores onde se escondem muitos segredos. A Nina e os seus mapas, percursos num infinito de direções como as migrações de aves canoras que simbolizam a vida nos voos ousados. Respirando suavemente sobre gotas de orvalho que o vento transfigura na memória e no silêncio da descoberta. Suavemente no pequeno labirinto dos seus sonhos… Eis um tesouro que se vai descobrindo. Eduardo Nascimento Abril 2011
ANICA (NINA) GOVEDARICA Artista plástica croata, nascida em 1971 em Zagreb, onde estudou Belas-Artes durante quatro anos (desenho, pintura clássica e moderna a óleo e aguarela) com prof. Emil Robert Tanay e onde se licenciou em engenharia civil. Viveu em Portugal, onde está de regresso depois de alguns anos na Croácia, entre os anos de 1998 e 2004, e onde expôs regularmente, estando representada em várias colecções particulares. Exposições individuais: 1997- Gradska knji_nica Samobor, Croácia. 1998 - Galerija Ericsson Tesla, Zagreb, Croácia. 2000 - Galerija Santa Rita, Colares, Portugal. Galeria do Instituto Nacional de Habitação, Lisboa. 2001- Loreto, Lisboa, Portugal. 2002 - Quebra Costas, Coimbra, Portuga. Galeria Chora Musica, Almada, Portugal. 2003 - Livraria Ler Devagar, Lisboa, Portugal. 2005 - Samoborski Muzej, Croácia. Dvorac Gredice, Zabok, Croácia. 2011Centro de Arte Contemporânea da Amadora, Portugal Exposições colectivas: 2001- XII Bienal de Artes Plasticas da Festa do Avante, Portugal. 2002- Galeria Municipal do Museu Regional de Sintra, Portugal. VII Bienal de Artes Plasticas “Cidade de Montijo”. 2005 - Espaço Delfim Guimarães, Amadora, Portugal. 2006 - 4º zagorski likovni salon, Croácia. 2009 - 5º zagorski likovni salon, Croácia. 2010 – Feira d’Arte Contemporânea da Amadora, Portugal
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H enrique S ilva “A C � finidade e
ontraste
- Pintura
hsilva321@gmail.com
Tempo e diálogo No início de 2009 recebi uma proposta artística de Henrique Silva, onde se introduzia um conceito ligado à codificação da linguagem com origem na cartografia antiga. A partir de uma pesquisa da representação cartográfica dos novos territórios descobertos entre os séculos XII e XV, em que se adoptavam diversificados códigos de representação da espacialidade, que em alguns casos ganhava uma certa simbólica geométrica, o artista questiona este conjunto de representações, colocando-as em diálogo e oposição. Da observação e leitura livre desta informação, Henrique iniciou a construção de um código geométrico e cromático que, depois de ter encontrado uma sequência coerente de representação, dá origem aos primeiros trabalhos deste projecto. Deste encontro entre o artista e o programador nasceu um diálogo, que se prolongou ao longo de dois anos, com o objectivo de construir uma proposta artística. Nas várias reuniões que tiveram lugar no atelier do artista houve ocasião de discutir e observar a evolução do trabalho. Vários momentos marcaram este processo. Assistimos a mudanças, transformações, reinvenção dos códigos, reencontros geométricos, alargamentos da paleta cromática. Como em todos os projectos, o tempo e a reflexão permitiram questionar a obra e afinar a intenção. Algumas fragilidades da primeira proposta ganharam maior solidez e consistência. Esta exposição é a manifestação deste processo, que não se encontra terminado. Somos convidados a observar, sentir e caminhar neste momento muito particular da obra do artista. « Afinidade e Contraste »* obriga a uma certa paragem, a um recohimento e a entrar numa nova dimensão sensorial, como se um certo silêncio nos fosse imposto. Fabrice Ziegler * « Afinidade e Contraste » - exposição individual de pintura de Henrique Silva
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Laura Ruffinelli - Pintura
ruffinelli.laura@gmail.com
Laura Ruffinelli nasceu na Umbria (centro de Itália) em 1980. Estudou restauro em Roma e Urbino, onde concluiu o Mestrado em Conservação e Restauro. Laura adora desde sempre pintar e define as suas pinturas como diários abstractos do seu inconsciente, capazes de exprimir os seus estados de alma. Pinturas, portanto, como visões interiores. Nas últimas obras as linhas e as formas dissolvem-se progressivamente na profundidade da tela. A pintura é obtida duma maneira induzida, ou seja, as formas saem naturalmente através de subsequentes passagens de cor. A separação entre as partes é evidente, mas a composição cria uma harmonia onde não há elementos que prevariquem; tudo está suspenso num espaço indefinido. As cores não são puras mas sim misturadas entre si, como massas de tonalidade intensa, que se transformam, por vezes, em traços dissonantes. As exposições colectivas e individuais em que participou, obtiveram grande aceitação por parte do público e da crítica. “…A minha procura prossegue numa tentativa de dar espaço à cor, de alcançar a profundidade, fazendo emergir da tela sempre novas atmosferas, umas vezes mais indefinidas, outras mais consistentes”.
ruffinelli.laura@gmail.com
João Carvalho Pina “O PREC já não mora aqui” - Fotografia
Bolsa - Prémio Estação Imagrm 2010
ESTAÇÃO IMAGEM | Mora http://www.estacao-imagem.com
Ao longo de várias semanas, na estrada, à procura daquilo que foi o processo revolucionário em curso (PREC), nos anos 1974/75, que culminou na reforma agrária e no “sonho” de um estado socialista na Europa Ocidental, reconheci no Alentejo de hoje uma região espelho de Portugal, “um país sem memória”. Quando explicava às pessoas da minha geração o que estava a fazer, sobre os lugares míticos do PREC e da reforma agrária, nem sequer sabiam o que tinha acontecido na sua própria terra, e isso demonstra que nascemos num país sem uma preocupação colectiva de preservar a memória dos eventos históricos do nosso passado recente. Continuamos prisioneiros da nossa história longínqua, da eterna grandeza da época dos descobrimentos, sem olharmos para o que hoje nos identifica como país no mundo, que nos fez chegar onde chegámos para assim podermos entender o que nos acontece no presente e pensar no futuro. Foi uma enorme honra poder ter conhecido alguns dos actores principais de um período tão importante na região do Alentejo. Estou profundamente agradecido a todos por terem decidido partilhar a sua história e deixarem-se fotografar, sem terem feito para isso qualquer exigência ou condicionamento. Assim, o balanço desta experiência para mim tão enriquecedora, é que o Alentejo tem um potencial social, económico e político que se tem desenvolvido lentamente mas a passo firme. Sinto que apesar de quase todos os “sonhos de Abril” terem desaparecido com o fim do PREC, os poucos exemplos que restam souberam adaptar-se nos dias de hoje a uma economia de mercado, e que as preocupações políticas das pessoas que conheci não ficaram fechadas em ideais ortodoxos e ultrapassados. Se voltarmos a olhar para estes espaços daqui a alguns anos, creio que continuaremos a encontrar pessoas com valores fortes, que discutem as suas ideias e lutam pelo que acreditam, faça isso parte de um sonho colectivo ou não. Acho que a democracia é o sonho mais bonito que o Alentejo possa estar a viver. João Carvalho Pina - Março de 2011 Bolsa - Prémio Estação Imagrm 2010 João Carvalho Pina desenvolveu durante o ano de 2010 um projecto documental sobre o que aconteceu às unidades colectivas de produção (UCP) constituídas no Alentejo depois do 25 de Abril de 1974
Tirada da cortiça no concelho de Pavia. A cortiça é retirada dos sobreiros, manualmente, a cada 9 anos. Em Portugal cerca de 23% da área florestal é composta por montados de sobreiro.
Fábrica do Grupo Amorim para tranformação de cortiça, em Ponte de Sôr. A cortiça é um dos bens essenciais da economia alentejana e nacional. Cerca de 70% da transformação mundial de cortiça é feita em Portugal.
Pilha de cortiça para ser tratada e transformada na Fábrica do Grupo Amorim, em Ponte de Sôr. Em Portugal existem mais de 715 mil hectares de montado de sobreiro e 10 mil postos de trabalho na indústria corticeira.
Propaganda política pintada nas paredes de Cabeção, no concelho de Mora, um dos lugares onde a reforma agrária e as invasões de grandes propriedades foi mais intensa.
José Soeiro, antigo trabalhador agrícola, dirigente sindical e deputado do P.C.P. na Assembleia da República. Esteve envolvido nas primeiras ocupações de terras durante a reforma agrária. Na imagem, José Soeiro na Herdade do Outeiro, com 770 hectares, cujas terras foram as primeiras a serem ocupadas pela reforma agrária a 10 de Dezembro de 1974.
Tractor da cooperativa “Poder Popular”, em Cortiçadas de Lavre. Esta cooperativa, que teve cerca de 420 trabalhadores durante o período da reforma agrária, tem agora 6 sócios activos.
Ferramentas de lavoura na cooperativa “Poder Popular”, em Cortiçadas de Lavre.
Propaganda política pintada nas paredes de Cabeção, no concelho de Mora, um dos lugares onde a reforma agrária e as invasões de grandes propriedades foi mais intensa.
José Soeiro, antigo trabalhador agrícola, dirigente sindical e deputado do P.C.P. na Assembleia da República. Esteve envolvido nas primeiras ocupações de terras durante a reforma agrária. Na imagem, José Soeiro na Herdade do Outeiro, com 770 hectares, cujas terras foram as primeiras a serem ocupadas pela reforma agrária a 10 de Dezembro de 1974.
Tractor da cooperativa “Poder Popular”, em Cortiçadas de Lavre. Esta cooperativa, que teve cerca de 420 trabalhadores durante o período da reforma agrária, tem agora 6 sócios activos.
Ferramentas de lavoura na cooperativa “Poder Popular”, em Cortiçadas de Lavre.
Maria Augusta Ruivo, de 78 anos, com o seu marido José Rosado, de 85, na horta que continuam a lavrar na sua casa em Mora. Em Agosto de 1975, Maria Augusta liderou várias invasões às principais herdades do concelho de Mora com o apoio das forças armadas. Depois do 25 de Novembro, foi procurada pelos capatazes de alguns dos grandes proprietários e chegou a escapar ilesa de um tiroteio, junto ao cemitério de Mora.
João Lopes Aleixo, criador de cavalos e proprietário de terras em Cabeção, no concelho de Mora, com o seu filho, o cavaleiro António Lopes Aleixo. João Lopes Aleixo foi trabalhar para Sevilha depois do início da reforma agrária quando, segundo ele, viu as suas terras invadidas “pela tropa com os camponeses atrás”. Em 1988 recuperou as suas terras com a lei Barreto.
Custódia Troncão, 76 anos, camponesa, natural de Baleizão. Aprendeu a ceifar ao lado de Catarina Eufémia, de quem era amiga. Militante do Partido Comunista, “desde sempre”, participou em várias actividades clandestinas antes do 25 de Abril como a distribuição do jornal O Avante.
Retratos de Álvaro Cunhal e de Lenin na sede concelhia do Partido Comunista Português, em Aviz, onde o P.C.P. tem as votações mais elevadas em Portugal.
Trabalhadores da cooperativa “29 de Julho” cortam árvores mortas, para serem vendidas como lenha em Aldeia Velha, no concelho de Aviz. Esta é uma das poucas cooperativas sobreviventes da reforma agrária, com cerca de 30 sócios activos e 600 hectares de terra (100 próprios e o restante arrendado a outros proprietários).
Valentim José, 80 anos, nascido e vivendo sempre em Mora, começou a trabalhar aos 10 anos e ganhava 5 escudos. Durante o PREC participou nas invasões de terras em Mora e foi membro da cooperativa “A Luta é de Todos” que existiu até 1996.
Bar da sede concelhia do Partido Comunista Português, em Aviz.
A mina de São Domingos, no concelho de Mértola, foi uma das mais importantes em Portugal. Tendo sido encerrada em 1966 por falta de viabilidade económica, a localidade é hoje desertificada.
António Bento Cavaco, de 73 anos, militante do partido comunista desde 1978, começou a trabalhar aos 14 anos na mina de São Domingos como aguadeiro. Caminhava cerca de 50 kilómetros por dia para distribuir água pelos trabalhadores do caminho de ferro e ganhava 15 escudos por dia.
Parte da colheita de aveia da Cooperativa “29 de Julho” em Aldeia Velha, no concelho de Aviz.
Minério de cobre extraído das minas de Aljustrel pronto para ser transportado dos armazéns da Almina.As minas de Aljustrel, com uma longa história de exploração que data do período romano, na península Ibérica, foram recuperadas em 2009 devido à subida do preço do cobre no mercado internacional, e entraram em produção em Julho de 2010.
O exterior da lavaria de minério de cobre nas minas de Aljustrel. Esta mina, que agora pertence ao grupo Martifer, espera estar a produzir 140 mil toneladas de minério de cobre por ano até 2013. A maioria da producção é exportada via Huelva, em Espanha, ou pelo porto de Sines.
Celebração do dia de Santa Bárbara, a santa padroeira dos mineiros, em Aljustrel, a 4 de Dezembro de 2010. Este dia tem também um significado especial, porque nos anos 60, durante as celebrações, foram presos vários mineiros pela PIDE, a polícia política do regime de Salazar.
O coro dos mineiros de Aljustrel canta nas ruas da vila, durante as celebrações do dia de Santa Bárbara.
Central de processamento da mina de Aljustrel. As pirites de minério são triturados nestes moinhos para depois serem separados os diferentes compostos, sendo o cobre minério mais importante.
Mineiros trabalham no fundo da mina de Aljustrel para extraírem pirites, de onde será retirado o cobre.
Local onde foi assassinada Catarina Eufémia, em Baleizão. Catarina Eufémia era uma camponesa alentejana e membro do Partido Comunista, que foi morta pela Guarda Nacional Republicana durante uma manifestação para aumento de salários das mulheres que trabalhavam no campo.
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M artinho C osta Da séria “VÖLKERWANDERUNG”- Pintura
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Batalhas Atópicas e Sem Memória Integrada na nobre «Pintura de História» - o grand genre segundo a hierarquia académica formalizada no século XVII -, a cena de batalha serviu, desde a Antiguidade, de monumento comemorativo para narrar com dimensão épica as sagas militares factuais e míticas travadas pelos povos contemporâneos e ancestrais. Tal temática era tida em elevada consideração na medida em que exortava a edificação pública dos ideais civis mediante mensagens de índole moral e intelectual, invariavelmente veiculadas com um forte pendor pedagógico e propagandístico. Na série Völkerwanderung (Deambulação dos povos), Martinho Costa parece pintar batalhas históricas. No entanto, num segundo olhar compreendemos ser vão tentar determinar o local do evento mediante uma série de presenças significativas, testemunhais. São as cenas fabricadas digitalmente, aquelas que fascinam jovens e adultos aficcionados pelo mundo das consolas e jogos para PC. E atende-se que o pintor as quis compreender depois de ter visitado os sites que as catalogam, reconhecendo que já o eram pinturas per se de pleno direito. Porque é que os artistas contemporâneos não pintam as grandes batalhas do presente ou do passado com a dimensão edificante de outrora? Para ensaiar respostas teremos que nos debruçar sobre as superestruturas ideológicas que determinam a nossa época: pós-colonial e anti-imperialista. O relativismo cultural desencantado, que perpassa os discursos intelectuais e políticos dominantes, visa aplacar qualquer sujeito eleito pelos conhecidos messianismos providenciais que inspiraram, durante séculos, os ideários heróicos das nações (ainda que alguns deles continuem espreitando, à espera de um novo ensejo). Neste pano de fundo são sucessivamente convocadas as chagas abertas pela arte oficial que marcou o período entre guerras. Mais: a própria Guerra, sob o crivo colectivo tecido após o segundo grande conflito mundial, tornara-se monstruosidade, identificada com imperialismo, ditadura e fascismo. Vivendo sob o fantasma do Holocausto reitera-se o paradigma da des-idealização da imagem do advento militar. Fenómeno já seminal no século XIX, com Goya – Os Fuzilamentos de 1808 (1816) - e exacerbado, no século XX, por Picasso - Guernica (1937) e Massacre na Coréia (1951). Nasce então o arquétipo do artista como testemunha de acusação dos horrores e absurdos da guerra, representando-a já não com a glória do
fausto heróico, mas como carnificina e catástrofe.Torna-se vileza, atrocidade apocalíptica, aviso premonitório do fim da civilização. Contudo, nas batalhas que Martinho pinta não vemos a versão «pesadelo» do conflito armado visando retratar a brutalidade da barbárie e a ignomínia da degradação humana. Ainda que resolutamente desembaraçadas do sensacionalismo dramático e heróico de outrora, as suas cenas são inócuas pelo seu carácter de pura demonstração, vitrine cénica de eventos «fabricados» em concordância com as tipologias catalogadas na rede digital. Adquirem, ao invés, um sotaque escolar, de figura de manual de história ou de banda desenhada. Martinho surge como aquele que pretende rememorar esse passado longínquo da pintura, constatando a actualização de um olhar já não ferido pela dimensão ideológica. Instaura, com isto, uma assertiva tomada de posição frente à História de Arte. Herdeira da tapeçaria descrita na Ilíada que conta, em curiosa situação de mise en abîme, a guerra de Tróia ( fonte mítica dos modelos protocolares da conduta heróica que perpassou milénios em consecutivas remissões eruditas ), a cena de Batalha que Martinho apropria acaba por demonstrar como os antigos esquemas recuperados pelos jogos de computador são aparentemente «instrumento neutro», fora da época que o fabricou. Lembrando que não há instrumento de uma época (ou poder), mas quando muito uma utilização histórica do instrumento. Assumindo-se, assim, como denúncia de um ingénuo, e por isso perigoso, gesto de branqueamento ideológico das formas de representação do passado. Estas pinturas de batalhas não oferecem modelos. Mas pintá-las significa dar-lhes, irremediavelmente, um peso, uma consistência maior perante a coisa vista em pequeno formato, que logo se desvaneceu no desenrolar do jogo, em prol da mesma coisa pintada, que permanece, ao assumir a perenidade associada ao medium. Por oposição à dinâmica cinemática do jogo, Martinho recupera o silêncio eloquente da arte monumental. Contudo, a solenidade do tema é de imediato rebaixada depois de sabermos a sua proveniência... A indiferença ao histórico espreita para revelar a sua obstinação em seguir o destino da prestação, signo da máquina, como dispositivo de criação de realidades destinadas ao lazer, à aventura do imaginário actuante. De um ponto de vista céptico e desencantado, cínico e niilista, este empreendimento visa repensar as lógicas que subjazem a sociedade do entretenimento. Neste ponto, Martinho deslinda o seu dedo acusatório porque constata a futilidade do trânsito veloz das imagens. Tanto vale este como aquele momento, este ou aquele
lugar, porque carecem de qualquer outro significado que não seja o da imagem por si mesma, simulacral, exaurida da sua função moral e pedagógica. (A embriaguez da amnésia aviltra sempre a desfundamentação do presente.) Ao usar fórmulas obsoletas que, apesar de tudo, ainda ecoam no imaginário popular mais prosaico, Martinho chega a uma irónica determinação da Pintura de História: a história não é mais facto memorável e exemplar, tampouco drama ou episódio, mas sobretudo palco de encenação/ficção incessante. A guerra que Martinho pinta já não é o evento ocorrido que se pode somente ilustrar ou recriar, mas uma virtualidade que pressupõe todos os seus possíveis desenvolvimentos e configurações, términos e resoluções, em aberto. O sujeito-jogador ao assumir de empréstimo todas as identidades - de cavaleiro, arqueiro, chefe militar, estratega - concentra em si todas as responsabilidades e todos os actos da narrativa. Este fascínio, algo nostálgico, assenta ainda na nossa ingénita aptidão para agir na história. Neles exercita-se esse campo de batalha onde se joga a sorte, se testa a pontaria ou se tenta engendrar planos de estratégia militar. A cena «recriada» não deve mais reflectir as ambiciosas fantasias dos soberanos, e sim responder ao deleite particular de cada um. O Homem contemporâneo não pode experimentar outro sentimento senão o das suas escolhas. Como que por louco acesso de soberba, pode imaginar-se assim já um qualquer general, bramindo a espada em grito de guerra, acabando de modo inconfesso por incitar as forças primárias que existem recalcadas em cada um de nós... (O visitante vê esta cegueira, encontra-se de fora, já não é jogador mas o seu juiz.)
Bruno Marques Doutorando em História de Arte (FCSH da UNL) e membro do projecto de curadoria independente inter-face / Arte Contemporânea
MARTINHO COSTA, Fátima, 1977 Vive e trabalha em Lisboa. Licenciado em Artes-Plásticas - Pintura, pela Faculdade de Belas-Artes de Lisboa, em 2002. Em 2003 completa o Mestrado em Teoria y Prática de las Artes Plásticas Contemporâneas na Universidad Complutense de Madrid. O seu trabalho maioritariamente em pintura, tenta reflectir sobre o modo como as imagens que nos rodeiam são incorporadas na pintura. Este processo de transformação sobre objectos do presente, ocorre sobre uma investigação da história da pintura.Tentando uma actualização dos principais géneros e temas da pintura. Das exposições individuais que realiza desde 2003, destacam-se: Máquina de Campanha, (2005) Sopro Projecto de Arte Contemporânea; Ruína (2008), Galeria 111, Lisboa. Participa em diversas exposições colectivas desde 2000, de onde se destacam: Respublica, 1910 e 2010 face a face, na fundação Calouste Gulbenkian, prémio de pintura Fidelidade, Culturgest, 2006, O Espelho de Ulisses (2005), Centro de Arte São João da Madeira; Paisagem e Limiar (2007), Centro Cultural de Sines.
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Patricia Geraldes “O grande rio coberto de barcas mortas�
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Site-specific
Projecto - ‘ O grande rio coberto de barcas mortas’ Fábrica Braço de Prata – Lisboa 2011 A ideia deste projecto surgiu quando observava as imagens do espaço a intervir, e me apercebi da imponência que o espaço contém, sendo como um grande corredor vertical. Imediatamente comecei a construir imagens imaginando uma serpente gigante que se ergue sobre os espectadores, envolvida por seis medalhões dourados, também eles desenhados mas desta vez com papel de veludo recortado. Os medalhões pintados directamente nas paredes e riscados por papel de veludo que envolvem o grande desenho, apresentam-se como pequenos graffitis e atribuem um elemento de glamour à intervenção. A intenção é tornar um espaço de passagem num momento de pausa e de contemplação. A intervenção consiste em 2 elementos: 1º Um grande desenho preto sobre fundo vermelho, 300 Cm x 200 cm, acrílico sobre papel colocado na parede do meio. 2º Seis círculos prateados sobre os quais seis desenhos feitos em papel de veludo, o diâmetro dos círculos é 20 cm, acrílico e papel de veludo montados nas duas paredes laterais.
Patricia Geraldes 2000/2005 - Licenciatura Artes Plásticas – Pintura pela Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto. 2010/2011 – Artista residente no Sunaparanta- Goa Centre For The Arts ao abrigo do programa Inov Art. Intervenções de Arte Pública 2011 – “Red Gallery – Panjim – Goa, Índia. 2010 – “Yatra” – Panjin – Goa, Índia. 2009 - “O Sol” – Sidi Bou Said – Tunis, Tunisia. 2007 – “Papel de Parede” – Rua Miguel Bombarda – Porto, Portugal Exposições individuais 2011 – “One Foreign Love” Sunaparanta Goa Centre For The Arts – Goa, Índia. 2010 – “My Golden Aquarium” Sput&nic (the Winthow) – Porto, Portugal. “Walls and Raining Drawings” Project room - Espacio Atlantico – Vigo, Espanha. 2009 – “Les Caisses de Dessins” – Sidi Bou Said – Tunis, Tunisia. Exposições colectivas 2009 – Galeria The Palace, Nova Delhi, Índia. 7º Printemps de La Marsa – Tunis, Tunisia. Artlet Almada - Project Room Almada – Porto, Portugal. 2008 – Rumar a Mar Alto - Fundação da Juventude – Porto, Portugal. 2007 - XIV Bienal Internacional de Arte de Vila Nova de Cerveira, Portugal V Bienal Internacional de Arte Jovem de Vila Verde, Portugal. Museu da cidade de Aveiro - Jovens criadores 2006 Aveiro, Portugal 2006 - Galeria do Palácio de Cristal, Projecto artístico «ArtskoolGozSouth» – Porto, Portugal. Galeria Artecore, Projecto artístico «ArtskoolGozSouth»Paris, França. 2005- Palácio de Cristal, Representação na Mostra de Ciência, Ensino, e Inovação da Universidade do Porto, Portugal. Museu da Faculdade de Belas Artes – Porto, Portugal. 2004 - Fundação Engenheiro António de Almeida – Porto, Portugal
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