Regime de Metas: controlando a inflação com desemprego e falências

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Regime de Metas: controlando a inflação com desemprego e falências João Sicsú – professor-doutor do Instituto de Economia da UFRJ - jsicsu@terra.com.br O regime de metas inflacionárias, implantado no Brasil a partir de 1999, não é tão simples e inofensivo quanto aparenta. Não se resume simplesmente à fixação de uma meta de inflação para o ano civil a ser perseguida pelo Banco Central. É muito mais do que isso. Os seus pilares básicos são: (i)- o Banco Central deve ter um único objetivo, controlar a inflação e (ii)-o único instrumento de controle da inflação é a taxa de juros. Reduzir a inflação com a elevação da taxa de juros, diga-se de passagem, não é tarefa muito difícil. A elevação da taxa de juros eleva o custo de financiamento dos gastos e, simultaneamente, transmite sinais negativos ao potenciais investidores e consumidores. O resultado da elevação da taxa de juros é sempre a redução dos gastos efetivos e, portanto, a desaceleração econômica e o aumento do desemprego. Diante desse quadro, com dificuldades de realizar as vendas esperadas, cada empresário reduz, então, o seu ímpeto para remarcar preços. É preciso ficar claro que se a elevação da taxa de juros não causar desemprego (e, em alguns casos, falências empresariais) não terá qualquer eficácia antiinflacionária. É preciso ficar claro que não existe outro mecanismo de controle da inflação por intermédio da taxa de juros que não seja através da geração de desemprego. Se, por exemplo, o Governo eleva seus gastos para conter o desemprego gerado pelo Banco Central estará contribuindo para manter as vendas empresariais nos níveis esperados, então, estará mantendo o nível de emprego, mas estará diminuindo a força da política monetária antiinflacionária. É por isso que a combinação de um elevado superávit primário (que reduz os gastos públicos) com altas taxas de juros é capaz de reduzir rapidamente a inflação, mas causa também um elevado desemprego, redução de margens de lucro e, no limite, quebras empresariais. Essa foi a experiência brasileira do ano de 2003. Os defensores do regime de metas inflacionárias dizem que não aceitam qualquer inflação - porque esta reduz a renda do trabalhador mais pobre já que este não tem acesso ao sistema financeiro e, assim, não pode se defender da inflação. Ora, é verdade que a inflação reduz a renda real dos mais pobres, mas a elevação da taxa de juros retira toda a renda trabalhador ao deixá-lo sem emprego. É preciso que seja dada, por parte do Governo, a mesma atenção ao combate à inflação (manutenção da renda real do trabalhador) e ao combate ao desemprego (eliminação da renda real do trabalhador). A inflação não pode ser controlada com a elevação do desemprego. A inflação tem que ser controlada com instrumentos que ataquem as suas causas e não os seus sintomas, que são as tentativas empresariais de remarcar preços, já que os custos (que são a causa) já aumentaram. Se a causa da inflação no Brasil é a elevação dos preços administrados e choques cambiais, então, medidas devem ser tomadas urgentemente para que essas causas sejam eliminadas e deixem de atormentar trabalhadores e empresários. A taxa de juros é eficaz para combater a inflação, mas seu uso não é desejável. A boa medicina e a boa economia nos ensinam que devemos combater as causas e não os sintomas dos males.


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