Teorias da educação do campo no sudoeste do paraná possíveis

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TEORIAS DA EDUCAÇÃO DO CAMPO NO SUDOESTE DO PARANÁ: POSSÍVEIS IMBRICAMENTOS Rogério Rech1 Resumo: Este escrito busca cumprir com um dos quesitos necessários da disciplina de Teorias da Educação no Doutorado em Educação da PUC, ou seja, uma reflexão com base no discutido a partir dos autores clássicos apresentados. Prefiro escrever em primeira pessoa, com a intenção de trazer elementos do empirismo, da experiência que possam dialogar com as teorias da educação. Uma metáfora que pode representar tal empreitada é a da árvore. As raízes representam minha experiência, a copa são as teorias da educação e o caule são as possíveis articulações que procuro encaminhar. Palavras-chaves: Sudoeste do Paraná, educação do campo e experiência

Apresentação. Faço uma advertência inicial no sentido de que trazer alguns autores não significa fazer uma “salada de frutas”. Ao descrever as especificidades de cada autor, faço a opção por aqueles que melhor descrevem o movimento de Educação do Campo no Sudoeste do Paraná. Uso uma metáfora genealógica já utilizada por Valente (2008) em outro contexto. Ao se reportar aos autores que o precederam Wagner Valente nomina de bisavô profissional para uma terceira geração de educadores em Matemática, avô profissional a segunda geração e pai profissional a geração que o precedeu. Assim, por denotação chamo Comenius (1592-1670) de nosso tataravô profissional. Nosso tataravô europeu está preocupado em ensinar “tudo a todos”. Apresenta a necessidade dos professores ensinarem menos e os alunos aprenderem mais, onde haja menos barulho ensinando com tal certeza que seja impossível não conseguir bons resultados. É coerente dizer que estou dialogando com meu tataravô professor a partir de perguntas do presente o que o coloca em uma posição pouco confortável. Meu tataravô viveu o momento da Revolução Industrial onde existia a necessidade de universalizar a escola. A discussão de Comenius, guardada as proporções, ainda está presente entre os educadores do campo. Ainda não se tem acesso a todos nessas escolas. Dados da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad) de 2005 mostram que 41,4% dos alunos da zona rural matriculados no ensino fundamental estão com idade superior à adequada e que 25,4% da população rural adulta, de 15 anos ou mais, é analfabeta. Apresento Rousseau (1712-1778), meu bisavô profissional. O contexto de escrita do autor é a Revolução Francesa. Aparecem os ideais de uma escola laica, gratuita e pública em um Estado Moderno. Ao escrever Emilio (1762) meu bisavô descreve um personagem que por 1

Doutorando em Educação rechrogerio@gmail.com

pela

Pontifícia

Universidade

Católica

(PUC).

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62 RECH, R. natureza é bom, mas que pode ser corrompido pela sociedade que é regida por um Contrato Social (1762) onde todos perdem individualmente para construírem coletivamente. O conceito de cidadão com direitos e deveres. Rousseau ao tratar de uma sociedade que corrompe, usa a metáfora da parteira e do filósofo. A primeira aperta a cabeça por fora e o segundo aperta por dentro. Dialogando com meu bisavô, trago um elemento que me aproxima da conversa. Para Rousseau é importante considerar as diferenças. Quando surge a Educação do Campo, o principal discurso na Primeira Conferência de Educação do Campo de 1998 em Luziânia GO da qual fui testemunha ocular era que a Escola no Campo, deveria ser Escola do Campo para garantir suas especificidades. Quero dizer prá você, meu bisavô, que esse argumento é perigoso porque as últimas décadas mostraram que ser diferente também pode justificar as classes sociais onde alguns em tese poderiam estar mais bem adaptados. Por outro lado, ao proclamar a diferença podemos cair na “arapuca” de esquecer que somos da classe trabalhadora. Dewey (1859–1952), meu avô profissional. Considero que trazê-lo para conversa sobre Educação do Campo é uma ousadia. Primeiro evidentemente que existem mais elementos que o distancia da Educação do Campo daqueles que o aproxima. Dewey constrói o pragmatismo, isto é, a necessidade de tudo ser objetivo. Coloca a ciência a serviço do utilitarismo. O movimento da Escola Nova no Brasil com base em Dewey fez um enorme desserviço para uma educação popular no Brasil, pois se colocou como protagonista na crítica à Pedagogia Tradicional sufocando as Pedagogias Socialistas. Minha experiência mostra que algumas Escolas do Campo da Região Sudoeste do Paraná, trazem elementos de Dewey. Em especial o discurso que “tudo deve ser na prática”, o que ensinar teria a ver necessariamente com uma aplicação imediata. Como diz Pistrak (18881940), “os professores fogem da teoria como o diabo da cruz”. Assim iniciativas da “salaambiente” em que os alunos ao invés da permanência na mesma sala, mudam de acordo com a disciplina em espaços físicos que são laboratórios parecem adequar-se a resolução de problemas imediatos sem considerar o já elaborado e sem problematizar como outros pensaram teoricamente o mesmo problema. Freire (1921-1997), meu pai professor. Cabe aqui uma justificativa de não tratar de Dermeval Saviani. Faço a opção de não descrevê-lo em função dos limites de qualquer texto. Admito evidentemente que seus escritos são discutidos com mais ênfase na academia, mas como disse no começo do texto que tenho por base o empirismo e o diálogo com o movimento da Educação do Campo, no momento prefiro conversar com Paulo, meu pai Rev. Desenvolvimento Regional, Ampére, n. 03, p. 61-69, jul./dez. 2012.


63 RECH, R. professor. Por mais de uma década tenho participado da Articulação Sudoeste do Paraná por Educação do Campo. Em todos os eventos percebi o desejo desses educadores de tratar com Paulo Freire. Em suas camisetas as frases mais célebres de nosso pai professor parecem colocar um híbrido entre uma proposta metodológica de ensinar e uma filosofia de vida. É o autor mais utilizado para fundamentar as práticas pedagógicas, dessa forma no terceiro capítulo desse artigo vou retomar alguns elementos da teoria freireana para fazer as justificativas do escrito nesse parágrafo. Bourdieu (1930-2002) é um tio muito especial. Vou convidá-lo na tentativa de expressar algumas dificuldades dos alunos do campo. Bourdieu (2011) traz um elemento importante ao considerar a escola simplesmente como reprodutora das relações capitalistas. As escolas francesas até Bourdieu acreditavam em uma escola redentora capaz de mudar a vida dos alunos. Bourdieu assevera que a escola burguesa ao proclamar a igualdade de condições aos alunos favorece aos mais favorecidos e desfavorece os menos desfavorecidos. Meu “tio professor” mostra que os aspectos da cultura têm relevância para o aprendizado das crianças. A escola prioriza um tipo de cultura, ou seja, a burguesa então considera alguns valores que apenas as classes mais abastadas possuem. Assim existe um “peso” da origem social no resultado do aprendizado. Minha experiência tem mostrado que o aluno do campo tem enfrentado dificuldades do ponto de vista cultural. Assim o sotaque e o preconceito parecem rondar a vida do estudante rural quando colocado no espaço urbano. Traz consigo certo acanhamento e falta de destreza. É coerente dizer que existem muitos casos que essa dificuldade tornou-se uma superação, o que a teoria de meu “tio professor”, parece não considerar.

Educação do Campo no Sudoeste do Paraná. Uma segunda advertência, o que entendo por Educação do Campo tem muito a ver com a dinâmica do vivenciado na Articulação Sudoeste de Educação do Campo. Trago ainda elementos da ideia de desenvolvimento entrelaçada com educação a partir do Projeto Vida na Roça (PVR), do Projeto Vargem Bonita e das aulas ministradas nos cursos de pós-graduação em Educação do Campo pela DP & Consultoria e pela Academia Brasileira de Ciências na Educação (Abrasce). As Diretrizes Estaduais da Educação do Campo do Paraná citam algumas iniciativas onde se visualiza a Educação do Campo, entre elas está o PVR. Fui militante desse processo de desenvolvimento e da construção de uma proposta pedagógica. O PVR foi uma iniciativa Rev. Desenvolvimento Regional, Ampére, n. 03, p. 61-69, jul./dez. 2012.


64 RECH, R. local da comunidade de Jacutinga no interior de Francisco Beltrão no Sudoeste do Paraná. O projeto foi uma articulação entre a comunidade e as entidades representativas do município, entre elas Associação de Estudos e Orientação Rural (Assesoar), Universidade do Oeste do Paraná (Unioeste), Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Francisco Beltrão (STR) e Prefeitura Municipal. Iniciou-se em 1996 com término em 2006. Representou um conjunto de iniciativas locais com base no empoderamento da população local, ou seja, os moradores do campo. Um dos objetivos do PVR era combater a verticalização das políticas públicas, a partidarização e a descontinuidade de ações públicas. Foram elencadas as prioridades em assembleias locais e sob essa perspectiva de trabalho encaminhou-se os procedimentos. Assim surgiram quatro dimensões de atuação: (a) produção; (b) saúde e saneamento; (c) cultura e lazer; (d) educação. Na produção a opção foi pela agroecologia, com a diminuição de insumos sintéticos. Outro viés foi agroindustrialização, onde surgiram quatro agroindústrias familiares. Reforçaram-se as questões cooperativas de entrega e venda de leite além do fomento a uma feira-livre. Na saúde e saneamento, o PVR promoveu a proteção de matas ciliares, a coleta seletiva do lixo, o reflorestamento e ainda a retirada de duas serrarias que poluíam a sede da vila. Ainda organizou-se a proteção de fontes de água nas propriedades e um sistema coletivo de tratamento da água. Na cultura e no lazer, incentivou-se o esporte local, criou-se um grupo de teatro, outro de dança folclórica e um de Capoeira. Percebe-se uma articulação entre as dimensões. Na educação a Escola Professor Parigot de Souza da comunidade optou por trabalhar por conteúdos de maior amplitude, os temas geradores que serviram de base para compreender o conhecimento elaborado pela sociedade. Eram palavras (substantivos) como “bodega”, “lixo” entre outras, ou ainda, eixos temáticos como “saúde e meio ambiente”. Os temas geradores eram escolhidos em conjunto como os pais em reuniões por proximidade dos moradores, nunca mais de dez famílias que depois se reuniam em uma assembleia para definir e dimensionar esses temas. A escola articulava a temática com os conteúdos do currículo buscando aproximações, articulações e um possível imbricamento. Essa proposta contribuiu na construção da Educação do Campo em Francisco Beltrão e com reforço do trabalho em Dois Vizinhos motivou uma articulação no Sudoeste do Paraná. Essa descrição do PVR está “encharcada” de sentido, mas é preciso compreender as especificidades do Sudoeste do Paraná. Penso que a história da região favorece iniciativas de Educação Popular em especial se considerarmos a resistência e a resiliência dos povos da região que estabeleceram os minifúndios na questão agrária, Agricultura Familiar como modo Rev. Desenvolvimento Regional, Ampére, n. 03, p. 61-69, jul./dez. 2012.


65 RECH, R. de produção e as cooperativas como forma de organização. Os minifúndios têm a ver com dois eventos. O primeiro é a forma de colonização. Enquanto em outras regiões do Brasil não se tinha um critério de acumulação o governo de Getúlio Vargas na década de 1940 estabeleceu no Sudoeste do Paraná as pequenas propriedades, em especial por se tratar de uma fronteira com Argentina e o Paraguai. Outra questão decisiva foi a vitória dos camponeses na Revolta dos Colonos em 1957 contra as Companhias de Terra que estavam a serviço dos latifúndios. Agricultura Familiar é um conceito em construção, mas denota um pouco do que foi Agricultura Camponesa. São duas formas de economia agrícola que se hibridizaram. A Agricultura do Excedente no Sudoeste e de base cabocla, mesclada com a do imigrante. Boneti (2005) diz que os mestiços (caboclos) aqui existentes na década de quarenta do século XX, desenvolviam uma agricultura de subsistência e venda do excedente como aves silvestres, erva–mate e suínos. A Agricultura de Mercado que se construiu a partir dos imigrantes que mantiveram as culturas para o autoconsumo, mas com um viés também do mercado, entendido aqui como uma produção do agrado do consumidor. Os agricultores familiares possuem são detentores dos meios de boa parte dos meios de produção, do capital e da mão de obra. Como característica está a possibilidade de autoexploração da mão de obra, assim quando as dificuldades aumentam busca trabalhar mais. Essa racionalidade de gerência faz também “sobrar” tempo para outras atividades cooperadas. Mesmo que more mais distante de seus vizinhos se fizermos a mesma comparação com entre os moradores urbanos, seu gerenciamento de tempo permite uma formação mais cooperada. Percebe-se que estes avanços em parte são conquistas das Organizações da Agricultura Familiar no Sudoeste do Paraná. Duarte (2010) cita algumas entidades alinhadas com a Economia Solidária tais como a criação nos anos 1980 do Sistema Cresol - Cooperativas de Crédito Rural com Interação Solidária, das Cooperativas de Leite da Agricultura Familiar (CLAF), das Cooperativas de Comercialização da Agricultura Familiar Integrada (Coopafi), as recentes Cooperativas de Habitação Rural e Urbana, tendo esta última a participação de agricultores na sua criação. Tem-se ainda a criação e fortalecimento de movimentos sociais e entidades, como o Movimento dos trabalhadores rurais sem terra (MST), da Comissão Regional dos Atingidos por Barragens do Rio Iguaçu (CRABI) além do movimento dos suinocultores nos anos 1980 e a luta por direitos previdenciários bem como a criação do grupo em defesa das mulheres agricultoras e as vinte e quatro feiras-livres existente atualmente no Sudoeste do Paraná. Rev. Desenvolvimento Regional, Ampére, n. 03, p. 61-69, jul./dez. 2012.


66 RECH, R. Assim desse conjunto de iniciativas coube a Região Sudoeste o que se tem dito de “República das Cooperativas”. Percebe-se que dessa forma o terreno é fértil para pensar uma Educação do Campo junto com os projetos de desenvolvimento. Essa afirmativa dá-se em pleno fortalecimento de Universidades Públicas na região. Cito o caso da Unioeste que teve o curso Pedagogia do Campo e da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (Utfpr) com curso similar em Dois Vizinhos.

Uma teoria pedagógica para Educação do Campo. Esta descrição tem muito a ver com o discutido com meus alunos de pós-graduação lato senso nos municípios de Palmital-PR e Realeza-PR além de conversas no V Seminário de Educação do Campo realizado no Assentamento Missões em vinte e oito de junho de 2012. Quando apresentei os autores clássicos para os alunos da pós-graduação, questionei sobre elementos que aproximariam a descrição do Movimento por Uma Educação do Campo. Dois autores foram os mais indicados. Em especial meu pai professor, Paulo Freire. No entanto outro autor foi descrito como base de interpretação, meu outro “tio avô”, Pistrak (1888-1940). Em Paulo Freire percebe-se que o uso dos temas geradores como metodologia de ensino facilita alfabetização. É mais “apropriado” trabalhar com temas como “leite”, do que com “Eva viu a uva”. Em termos de filosofia de vida é que a tendência freireana tem uma maior contribuição. É na relação de classe e do conflito que se cria a categoria da Agricultura Familiar pelo já descrito. Por uma relação de embate entre oprimidos e opressores que se estabelece a disputa. Em Paulo Freire se estabelece o conceito de “marcha” dos despossuídos, bandeira do MST. Foram com palavras geradoras que Assesoar alfabetizou agricultores nos anos 1960 com as primeiras Escolas de Agricultores (Ecas) na Região Sudoeste do Paraná. Os agricultores aprenderam também a “ler o mundo”, como se organizar, como lidar com os opressores. Foi dentro de movimentos da Igreja Católica como a Teologia da Libertação de forte inserção na região que as ideias freireanas tiveram eco. Assim reagir contra a dominação foi a dinâmica de formação. Os alunos da pós-graduação validam que Paulo Freire apesar de evidentemente não escrever especificamente para Educação do Campo é o que melhor traduz esse conjunto de iniciativas. As leituras e debates com os alunos de pós-graduação trouxeram então outro personagem que segundo eles melhor exemplifica a Educação do Campo. Pistrak, meu revolucionário tio avô. Primeiro é relevante compreender em que contexto Pistrak escreve a Rev. Desenvolvimento Regional, Ampére, n. 03, p. 61-69, jul./dez. 2012.


67 RECH, R. sua obra Fundamentos da Escola do Trabalho. Caldart (2001) mostra que Pistrak é um seguidor das ideias políticas e pedagógicas da companheira de Lênin, Nadezhda Krupskaya, que junto com o marido lideram o processo revolucionário de 1917. Em função do contexto Pistrak assevera a necessidade de saber lutar e saber construir, se em uma mão está o fuzil, na outra o martelo e a foice, símbolos da união do proletariado. Outro princípio a ser seguido pela escola segundo Pistrak é a auto-organização dos alunos, em especial para questões de higiene, e limpeza. Prossegue dizendo que é importante respeitar as fases da criança, mas o trabalho deve ser educativo, na medida em que precisamos discutir pedagogicamente estas atividades: Por que escovar os dentes? Por que limpar a sala? Por que não jogar lixo no chão? Por que o trabalho na escola? A ideia exposta nas entidades de classe da Região Sudoeste do Paraná, do trabalho como princípio educativo desde que distribua riqueza e ao mesmo tempo as pessoas reflita sobre o que fazem. Em Pistrak é possível discutir autonomia e criatividade com que se colocam as Escolas do Campo composta não por pedintes que precisariam ser incluídos, mas com sujeitos altamente criativos. Coletivamente somos todos criativos, o que ensinar não deve ser olhado apenas pelo utilitarismo, mas pela perspectiva social até porque não existe a neutralidade proclamada pela escola burguesa pois segundo meu “tio avô” educa pela disciplina, com fila, com outras instituições como a igreja todas de base na propriedade privada. Pistrak também sugere os complexos temáticos, uma tentativa de organizar o ensino através de temas socialmente significativos, Caldart (2000) diz que isso inspirou os temas geradores das Escolas Freireana de modo que o estudo pode desdobrar em ações e estas ações em novas necessidades de estudos. Ao estudar as perguntas dos professores Pistrak, percebeu que eram muito práticas, no sentido do que e como fazer: Como agir nesse caso? Como aplicar este ou aquele programa? Como organizar a escola neste ou naquele programa? Percebeu que os professores fugiam da teoria como o “diabo da cruz”, termo que já utilizei no início do artigo. Em Pistrak tem-se o sentido da Educação do Campo, em sua questão pedagógica já anunciada nesse texto, na questão política e na construção de uma nova sociedade. Essas três abordagens dialogando dialeticamente compõem os rastros deixados pela Educação do Campo. Uma escola fora da vida e apolítica é uma farsa, um meio de enganar as massas, o trabalho sem discutir as classes sociais é alienante. Penso em um aluno como sugere Pistrak, capaz de trabalhar coletivamente e para encontrar espaço num trabalho coletivo que saiba dirigir e obedecer trocando de atividades de modo a conhecer todas as etapas, que esteja apto para analisar cada problema novo como Rev. Desenvolvimento Regional, Ampére, n. 03, p. 61-69, jul./dez. 2012.


68 RECH, R. organizador e com aptidão para criar novas formas de organização. O trabalho deve ser algo amado e estimado pelo aluno, graças ao trabalho é que o homem se torna disciplinado e organizado, o trabalho eleva a condição humana da alegria, educa o sentimento coletivista, enobrece e por isso é precioso como meio de educação. Assim as Escolas Agrícolas e Casas Familiares poderiam se organizar, com alunos auto-organizados e que aprendam a cooperar, que reflitam e opinem não para aprender menos e diminuir os conteúdos a serem trabalhados, mas para validar o esforço de seus professores principalmente daqueles mais dedicados. Acredito em alunos que trabalhem em tempos de alternância nas propriedades, não com atividades enfadonhas e desgastantes que causem repugnância levando a odiar o trabalho, mas sim perceber o que estão fazendo e se apropriando do que lhes é direito.

Considerações finais. Acredito que dado o grau de dificuldade de trabalhar diferentes teorias da educação para tratar de uma questão como Educação do Campo, fiz o caminho da aproximação tentando pelo menos algum elemento que pudesse contribuir na interpretação. Fui cuidadoso para não fazer uma “salada de frutas” do ponto de vista teórico, por isso da opção por Paulo Freire e Pistrak como autores que melhor descrevem os caminhos da Educação do Campo no Sudoeste do Paraná. Assim, sou otimista quanto à participação da Região Sudoeste na efetivação de uma proposta de Educação do Campo. Em especial porque existe uma base mais sólida. Arrisco dizer que Educação do Campo é um evento da Agricultura Familiar. Não é possível uma escola “carro-chefe” que puxe o desenvolvimento, ela não tem essa competência. O sucesso está em estar presente com as instituições de classe não apenas como consultivas, mas convidadas prá decidir. Assim ao ir até os pais para uma visita, automaticamente seremos visitados, esse é o princípio da reciprocidade. Assim são experiências que surgem, criam se recriam, como o apresentado pela Secretaria de Educação de São Miguel do Oeste, aonde professor vão até os pais garantindo o diálogo e colocando na agenda as questões da educação do campo, das políticas públicas e mais do definindo onde colocar o dinheiro do orçamento. Alegra este autor que os pais da zona rural daquele município colocaram a educação como prioridade e orçamento para deixá-las em condição. Assim, penso que aqueles que tiveram oportunidade de estudar dão muito valor à escola, discursam na não necessidade de escola aqueles que já se serviram dela. Rev. Desenvolvimento Regional, Ampére, n. 03, p. 61-69, jul./dez. 2012.


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