Revista - Livraria Drummond (edição 01)

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Drummond EDIÇÃO JULHO/AGOSTO 22

LIVRARIA

• VIT

NOVI

S

DADE

DESCOMPRESSÃO

Leitura melhora a sensação de bem-estar e saúde mental

RINE

GUERRA E PAZ

Como a literatura retratou conflitos bélicos ao longo da história

Prazer em ler Livrarias compactas se consolidam no Brasil como tendência do setor editorial e atraem cada vez mais visitantes

DI CAS E SU GESTÕES • EV EN TOS E E XP OSI Ç ÕES • ARTI G O ESP E C I AL


sumário

4 6 12 16 18 24 26 30

EXPEDIENTE

Ano 1 • Nº1 • JULHO/AGOSTO/2022

Carta a um leitor

Todos os direitos reservados.

MENSAGEM

Envolvimento emocional com os livros

Nenhuma parte desta revista pode ser reproduzida sob quaisquer meios existentes sem autorização por escrito da editora

Distribuição nacional e gratuita EDIÇÃO, REDAÇÃO E ARTE

ON THE ROAD

Guerra de palavras

Agência StartUP Comunicação www.agenciastartup.com.br edgar@agenciastartup.com.br DIREÇÃO EDITORIAL

Diego Drummond, Pedro Almeida, CABEÇA DE PAPEL

Conexão natural

Vitor Tavares REVISÃO

Bárbara Parente

PÉ DE LARANJA LIMA

Modo de descompressão ativado

CAPA

Shutterstock PUBLICIDADE E EVENTOS

Margô Catelli eventos@drummondlivraria.com.br A SANGUE FRIO

Notas, eventos, exposições e afins

DEPARTAMENTO FINANCEIRO

financeiro@drummondlivraria.com.br COMPRAS

comercial@drummondlivraria.com.br 1001 NOITES

Novidades literárias

DRUMMOND LIVRARIA Av. Paulista, 2073 Conjunto Nacional, Loja 153 Consolação, São Paulo/SP 01311-300

OU ISTO OU AQUILO

Livros como companhia

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EDIOURO COM LEITURAS IMPERDÍVEIS

carta a um leitor

UMA NOVA LIVRARIA NO CORAÇÃO DE SÃO PAULO

H

á cerca de dois anos, um grupo de edi-

“Teríamos de criar uma livraria de interesse geral,

tores, distribuidores e livreiros estu-

em local acessível. Manter o espectro de leitores bem

dava a abertura de uma livraria nova e

aberto, e ter um ponto que atenda simultaneamente

notaram que os e-commerces, durante

do executivo ao geek, das crianças e jovens leitores aos

a pandemia, passaram a receber cada

acadêmicos, com livros de todas as editoras e foco em

vez menos lançamentos, enquanto a

novidades, os lançamentos mais recentes.”, afirma Pe-

procura pelos mais vendidos, clássicos

dro Almeida.

e livros tradicionais dos catálogos das editoras, cres-

Diego Drumond cresceu dentro da Livraria Drum-

cia de forma acelerada e consistente. Surgiu o lampe-

mond, fundada por sua mãe no final da década de 80.

jo: faltava a comunicação tão importante das novida-

O grupo decidiu continuar aquela bela história da au-

des, o contato físico com novos livros recém-lançados,

tora apaixonada que ousou criar uma livraria na região

a experiência de poder andar entre os livros e escolher

da Paulista!”

folheando, admirando as capas, sentindo os cheiros,

“Construímos uma ótima opção para lançamentos

lendo orelhas, algo que acontece somente nas livrarias..

de livros. Já somos distribuidores de mais de 300 edito-

O grupo sentiu que, para lidar com essa tendência,

ras e alimentávamos o sonho de criar uma loja física que

teria de proporcionar contato entre os livros e seus po-

pudesse comercializar os livros de todas elas. Encontrei

tenciais leitores, assim como sensibilizar a decisão de

em todos os meus parceiros de mercado editorial a mes-

investimento e esforço de marketing das editoras em

ma vontade. Estamos muito animados”. Vitor Tavares.

promover estes encontros reais com os livros.

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4

Acompanhe nossas redes sociais @novafronteira @editorapetra @coquetel @editorapixel @editoraagir @editoratrama

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O diário secreto de Igor Jansen R$ 39,90


MENSAGEM | POR LUCIANA ALBUQUERQUE

Envolvimento emocional com livros COMPACTAS, INTIMISTAS E ACONCHEGANTES, NOVAS LIVRARIAS SE CONSOLIDAM COMO

D

escobrir primeiro e explorar as últimas novidades, pegar cada uma delas em mãos, sentir a textura e o perfume, receber indicações de livros que desconhecia ou simplesmente folheá-los aos montes em uma livraria antes de adquirir “o escolhido” são prazeres que só se vive em uma livraria. Apesar dos suportes eletrônicos tomarem espaço nas relações interpessoais e influenciarem o comportamento do consumidor, as livrarias físicas persistem como espaço de descobertas, primeiros contatos, expedições e experiências reais no mundo da cultura, do conhecimento e entretenimento intelectual, que despertam os sentidos e criam interesse em novas leituras, algo que a internet simplesmente não consegue prover.

TENDÊNCIA DO SETOR EDITORIAL E ATRAEM

ENVATO

CADA VEZ MAIS VISITANTES

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MENSAGEM

Muitas livrarias fecharam suas portas de forma

no entanto o público reafirmou seu interesse na leitu-

temporária ou permanentemente devido à crise sa-

ra e nos livros, saímos fortalecidos do grande desafio”,

nitária mundial. As que permaneceram, usaram o

relata Tavares. “É extremamente encorajador ver estes

­e-commerce ou vendas a distância, entrega por dri-

resultados positivos”, completa Dante Cid, presidente

ve-thru, ofertas por mensagens de textos e inúmeros

do Sindicato Nacional dos Editores de Livros – SNEL.

outros artifícios para atenderem aos leitores e perma-

As livrarias menores e mais próximas dos leitores

necerem com os estabelecimentos funcionando. E muito da demanda por livros migrou temporariamente para

O ano de 2022 já aponta que, ao final dos três primeiros períodos, os livros acumulam índices positivos e mostram performance superior à do início de

soas trabalhando de casa puderam reencontrar o pra-

2021, quando já estava em forte aquecimento. Esses

zer de ler. E isso impulsionou não somente as vendas

dados positivos têm fornecido novo ânimo para as li-

de livros, como a retomada do movimento nas livra-

vrarias. “Este é um momento de retomada muito im-

rias quando reabriram suas portas. “Em 2021, obser-

portante para a indústria como um todo. Passamos o

vamos não só um grande fluxo de pessoas nas livrarias,

último ano praticamente falando de crise, dos proble-

DIVULGAÇÃO

Se há uma boa notícia sobre o período de maiores restrições do comércio no Brasil, é a de que mais pes-

mas a abertura de novos pontos. E estamos otimistas com esse movimento”, comenta o presidente da Câmara Brasileira do Livro – CBL, Vitor Tavares. O ânimo tem motivo, em 2021 os brasileiros adquiriram e leram mais livros do que em anos anteriores. “Passamos por um período desafiador para o mercado,

Em 2021, observamos não só um grande fluxo de pessoas nas livrarias, mas a abertura de novos pontos VITOR TAVARES, PRESIDENTE DA CBL

mas do setor. A reabertura das livrarias físicas chega como um respiro, um período de notícias boas para o

ESTEVAM AVELLAR

os e-commerces.

Marcos da Veiga Pereira, sócio-diretor da Editora Sextante, comemora o importante momento de retomada para o mercado de livros

mercado editorial. É muito bacana voltar a ver nossos autores tendo a oportunidade de entrar em contato com o seu público e ver nossos livros disponíveis nas lojas com conteúdos tão necessários para esse momento de

Num mundo em constante transformação e evo-

transformação no Brasil”, comenta Marcos da Veiga Pe-

lução, novos modelos de negócios e otimizações de

reira, sócio-diretor da Editora Sextante.

conceitos começaram a surgir. As antigas megastores estão dando lugar às livrarias compactas, mais inti-

DIVULGAÇÃO

mistas, acrescentando experiências novas ao leitor.

O LIVRO FÍSICO PREVALECEU

“Há mais de uma década, as grandes livrarias já mostravam dificuldades em se manter. O modelo de negócio de livraria megastore com presença em shoppings

Bruno Mota, roteirista, ator

centers vai desaparecer. E isso não é uma realidade

sites não conseguem concorrer.

e premiado humorista, autor de

brasileira, é mundial. Além do alto custo de operação

Além de facilitar a realização dos

Aprenda a rir de si mesmo:

dessas lojas, como o giro de pessoas é muito grande,

Villela, apesar de o e-book

eventos temáticos, como Semana

(é o que os outros estão fazendo),

elas não oferecem um atendimento personalizado e

ser uma opção de formato

da Criança, do Profissional de

Editora Planeta, discorre

uma atenção especial que as livrarias menores con-

para leitura, o Brasil é um país

Saúde, do Advogado, Literária,

na mesma linha. “Quando

seguem oferecer, com funcionários bem treinados e

fundamentalmente de livros

as editoras podem oferecer

proporcionam uma noite de

detalhes que fidelizam os clientes”, explica Eduardo

impressos, os digitais não

materiais promocionais para os

autógrafos, as livrarias tornam real

Villela, book advisor e profissional com mais de 17 anos

ultrapassam 6% do mercado

leitores, como marcadores de

o que existe no plano das ideias,

no mercado editorial.

segundo as últimas pesquisas. “O

páginas, teasers de livros, vendas

na imaginação, que é encontrar

brasileiro ainda não é adepto do

de exemplares autografados.

pessoas, conversar, olhar no olho

livro digital, ele precisa ter seu

A competição deixa de ser

delas, sentir o calor do contato,

livro impresso em mãos. E isso é

por preço quando entram as

pegar o livro, virar a página,

um fator positivo para as livrarias”,

experiências reais na balança”,

perceber o perfume do livro, o que

fala. “Trazer o autor para dentro

completa o especialista.

no mundo virtual não acontece.”

Para o especialista Eduardo

da loja é uma coisa com a qual os

Quando proporcionam uma noite de autógrafos, as livrarias tornam real o que existe no plano das ideias BRUNO MOTA, ROTEIRISTA, ATOR, AUTOR DE APRENDA A RIR DE SI MESMO: (É O QUE OS OUTROS ESTÃO FAZENDO), EDITORA PLANETA

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9


MENSAGEM

Da curadoria à noite de autógrafos

Brasil; vemos isso em Nova York, em Londres, Paris.

Entrar em uma livraria é sempre uma experiência

A experiência tátil, o contato com o autor, o desejo de

repleta de descobertas e novidades. Sentimos o char-

conversar sobre o universo dos livros, a humanização

me e a alma da literatura, da conversa despretensiosa

do atendimento com um livreiro bem treinado, a orga-

entre uma folheada e outra, e muitas vezes é o ponto de

nização de eventos, como semana literária e contação

Criar e desenvolver nas crianças o

encontro com uma companhia agradável, no entanto é

de histórias, são os diferenciais que farão a livraria se

sofisticado ferramental que permitirá

sempre garantido que entraremos também em contato

destacar e fidelizar seus clientes”, completa.

a obtenção do prazer através da

LAÇOS DESDE A INFÂNCIA

com ideias, formas de pensar, conhecimentos e desco-

Ler é muito mais do que uma ação de decifrar as

bertas milenares ou novos meios de dizer e comunicar

letras em palavras, frases ou sons. E um dos prazeres

exemplo e dedicação da família e

pensamentos antigos. E é esse caminho da experiência

da leitura é dar asas à imaginação, fazer com que a his-

dos educadores. Assistir à TV sempre

que tem atraído cada vez mais leitores para esses espa-

tória do livro ganhe vida no pensamento do leitor. Mas

exigiu menos esforço. A tecnologia e

ços e que mais livrarias apostam para conquistar mais

para o autor, não é diferente. “Toda história ganha vida

os equipamentos eletrônicos atraem

públicos. “Boa parte dos clientes valoriza, em primei-

quando damos sentidos a ela, não só pelas fantasias que

atenção com magnetismo ainda maior,

ro lugar, o bom atendimento e as experiências, como

se criam através de uma narrativa, mas pelo desenvol-

oferecendo ação e comodidade sem

passear pelas prateleiras, os eventos de contação de

vimento real das sensações cognitivas. Escrever um

exigirem esforço físico ou imaginativo,

histórias, saraus e a possibilidade de interação com os

livro é oferecer algumas delas, através do tato, quando

pois a maior parte do conteúdo já é

autores em sessões de autógrafos. E isso não é possível

manuseamos o livro, através da leitura, da visão, do ol-

dada pronta de antemão. O indicado é

na internet”, relata Villela. Além disso, ele destaca a

fato, do cheiro do papel recém-saído da gráfica... mas,

que o contato com os livros aconteça

importância do papel do livreiro, que pode indicar lan-

quando nos encontramos com o leitor, entregamos mais

desde cedo, para que as crianças se

çamentos e novos autores conforme o gosto do cliente,

um sentido, a audição, o som das palavras trocadas na

o que só é possível após alguns minutos de conversa.

ENVATO

leitura nunca foi tarefa fácil. Exige

acostumem e formem as técnicas e

noite de autógrafos, e por último, o doce paladar do

treinem seus cérebros para decifrarem

“O que está acontecendo é o renascimento das li-

vinho que brindamos a vida”, discorre Cris Castrucci,

os livros com menos esforço. Visitar

vrarias de rua ou de galeria, fora de shoppings. Isso é

escritora e terapeuta, autora de Arquitetura Emocional

uma tendência mundial, não é só em São Paulo ou no

(Editora Prata), e outros títulos.

livrarias para despertar o interesse dos

Uma experiência de sentidos

WASHINGTON FONSECA

Quem visita a Shakespeare and Company pode carimbar o seu

pequenos, e para que se torne parte da rotina, além de ser excelente passeio,

exemplar comprado e ter a experiência de trazer pra casa um livro

inicia o processo de aprendizado e

com a marca da livraria mais charmosa de Paris. Pensar em oferecer

intimidade com os livros. Ler oferece

boas experiências aos clientes se divide em fazer o básico bem-feito,

muitos benefícios para as crianças,

como ter funcionários bem treinados para o atendimento, e inovar,

como melhorar o desenvolvimento

pensando que o leitor também se transformou. Será que, inserido nes-

intelectual, estimular a criatividade,

te universo cada vez mais veloz da tecnologia, ele não quer parar os

a imaginação sobre o mundo, a boa

ponteiros do relógio ao visitar sua livraria favorita?

concentração, ampliar o vocabulário,

Para Vitor Tavares, além do contato com o livro físico, que só uma

treinar a memória e acelerar o

livraria proporciona, essa visita também é um momento de desconexão

raciocínio. O esforço inicial será

da rotina, da correria, da enxurrada de informações que recebemos

recompensado, os benefícios serão

diariamente de forma desordenada e competitiva, para nos reconec-

colhidos por toda a vida.

tarmos com o mundo e com nós mesmos, através da leitura. “A visita a uma livraria permite vivenciar uma experiência que estimula vários sentidos simultaneamente, a visão, o olfato, o tato, a audição. Além disso, é uma oportunidade de explorar novos títulos com menos interferências externas, sem notificações e chamadas, além de exceSegundo o book advisor Eduardo Villela, o brasileiro ainda não aderiu totalmente ao livro digital e quer ter o impresso em mãos

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lente oportunidade para encontrarmos amigos, autores e autoras, nos eventos de lançamento ou porque também estavam procurando novos livros para ler. É uma experiência individual e única, cada um tem sua bagagem, seu estado de espírito e suas preferências de leitura, os livros que já leu e os que gostaria de ler”, comenta o presidente da CBL. 

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ON THE ROAD | POR VIMALA ANANDA JAY

Guerra de palavras COMO A LITERATURA RETRATOU CONFLITOS BÉLICOS AO LONGO DA HISTÓRIA

N

otícias da guerra recente entre a Rússia e a Ucrânia chegam sem cessar. Cenas fortes e palavras duras bombardeiam nossos olhos e ouvidos a todo momento. Embora estejamos em outro extremo do planeta, a guerra também nos afeta. Qual a história dessas nações? Por que decidiram combater? Quem é o mocinho e o bandido? Quais foras as decisões que levaram à morte centenas de pessoas, incluindo crianças? Quais as consequências de uma guerra e por quanto tempo elas perduram? Nossos celulares em rede permitem

que acompanhemos os horrores do con-

últimas três décadas e leitura obrigatória para gestores e líderes de equipes é A Arte da Guerra, de Sun Tzu. Trata-se de um tratado militar chinês, escrito há mais de 2400 anos! No livro, táticas de guerra são expostas e comentadas. O livro original foi pensado como um manual para generais e estrategistas. No Ocidente, um filósofo do século 16 dedicou-se a desembaraçar a estratégia

Batalhas medievais: Histórias de Cavaleiros

político-militar das emoções humanas, tornando-as racionais. Seu nome

flito em tempo real. Como se fôssemos

Séculos depois de Troia, durante o

se tornou expressão popular: maquia-

testemunhas de uma barbárie que ocorre

período medieval, surgem os romances

vélico. O florentino Maquiavel, autor

a todo momento, em ciclos da história.

de cavalaria. Além deles, contos e poe-

de O ­Príncipe, um livro tratado como

Desde o passado, a literatura este-

mas cantavam as histórias de v­ alentes

complementar ao de Sun Tzu. Maquia-

ve presente para narrar, denunciar, en-

cavaleiros, guerreiros que desem-

vel desvenda que por trás de toda guerra

gajar e até mesmo provocar conflitos.

bainhavam a espada lançando-se c­ ontra

há sempre muitos interesses bastante

Há um ditado que diz que palavras são

os escudos dos seus inimigos. A lenda do

ocultos e formas pouco convencionais de

como armas. Provaremos!

rei Arthur, se consolidou no imaginário

um líder alcançar seus objetivos.

coletivo a partir de um primeiro livro, do

Era uma vez... Troia

escritor Chrétien de ­Troyes, que no sé-

O bélico século 20

Tudo começou com os dois poemas

culo 12 adicionou às sagas arturianas as

A relação entre literatura e guerra

épicos, que inauguram a história da li-

histórias de Lancelot e do Santo Graal.

real é uma moeda de duas faces: o que

teratura Ocidental. Sim, tanto a Ilía-

Essas narrativas atravessaram os sécu-

é real e o que é imaginação. Por um

da como a Odisseia têm como mote a

los, ganharam versões e acréscimos e

lado, a literatura “bélica” documenta

Guerra de Troia, conflito entre gregos e

formaram em nosso imaginário a figu-

conflitos e fala sobre seus protagonis-

troianos, que conta inclusive com uma

ra do guerreiro e seus códigos de con-

tas de carne e osso. Por outro, ela tenta

narrativa literária. Cinquenta e um dias

duta. Hoje em dia, diversos roteiristas

criar mitos. heróis e vilões. Até o sé-

do conflito são descritos na obra Ilíada.

de séries como George R. R. Martin, em

culo 20, a literatura de guerra esteve

Já em Odisseia, livro sobre o desenrolar

Guerra dos Tronos, e Bernard Cornwell,

repleta de “seres virtuosos”. Segundo

do pós-guerra, o mestre Homero con-

assim como décadas antes autores como

o escritor e professor de Estudos Li-

ta-nos a jornada de regresso do herói

J.R.R. Tolkien e TH White, inspiram-se

terários da Universidade Federal do

Ulisses a Ítaca. Depois de combater na

nesses relatos medievais para escrever

Pará (Unifespa), Jorge Henrique Ro-

guerra, Ulisses leva dez anos para vol-

grandes sagas

mero, “A virtude, até o século 20, que

tar à sua cidade natal. Feridas da guerra

está presente na guerra, é uma virtude

um livro que se tornou best-seller nas

guerreira, algo que impele à ação, é a

NOMADSOUL1/ENVATO

demoram a cicatrizar...

Na linha dos clássicos atemporais,

12

Vimala Ananda Jay é filósofa e escritora. Doutora em Filosofia Contemporânea pela USP.

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ON THE ROAD

virtus, uma potência de agir que faz

Uma voz que se ergue nesse horizon-

Outro autor a registrar a guerra

com que o guerreiro tenha um código

te é a do escritor norte-americano Ernest

espanhola foi George Orwell. Seus li-

de ética a ser seguido. Isso na Moder-

Hemingway. Conhecido por seu tempera-

vros mais conhecidos são as ficções

nidade se modifica completamente”.

CRIANÇAS

1984 e A Revolução dos Bichos, mas

Adolescentes e crianças são as vítimas das guerras frágeis tanto na

aventureiro, ele fez registros importantes

ele publicou também Recordações da

experiência quanto na compreensão dos perigos do que está por trás

século 20, que o historiador Eric Hobs-

desses movimentos bélicos na literatu-

Guerra Espanhola e Homenagem à Ca-

de um conflito. Há alguns registros que vêm sendo publicados nas úl-

bawn chamou de A Era dos Extremos.

ra moderna. Seu livro Por quem os sinos

talunha, que trazem registros impor-

timas décadas, mas dentre todos se destaca a história de Anne Frank,

Um século permeado por conflitos glo-

dobram conta a história do professor

tantes do conflito.

que ficou isolada durante anos, em um pequeno sótão, com a família,

bais, que por sua vez passaram a ser co-

Robert Jordan, que se torna combaten-

Foi no calor do efervescente século

durante a Segunda Guerra e foi registrando tudo em seu diário. Anos

nhecidos por um público maior. Temos

te nas Brigadas Internacionais durante

20 que vários escritores abraçaram o

mais tarde, uma outra menina, Zlata Filipovic, de Sarajevo, escreveu

aí o boom da informação: começando

a Guerra Civil Espanhola. O personagem

ofício de rodar o mundo, denunciando

sobre a traumática experiência da guerra que assolou Sarajevo, na ex-

pelo jornal diário, depois a TV e a in-

foi inspirado no próprio Hemingway, que

a violência da guerra, lutando voluntá-

ternet e também adquirimos um maior

havia lutado na guerra, tendo sido gra-

ria ou involuntariamente nos conflitos.

poder de destruição: das chocantes trin-

vemente ferido. Ele também atuou como

Julio Cortázar, importante autor do rea-

cheiras (da I Guerra Mundial) à bomba

correspondente jornalístico em inúmeros

lismo fantástico, foi um deles, chegando

atômica e às guerras químicas.

países e conflitos.

a escrever e inspirar-se, em 1979, nas

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EVGENIIBASHTA/FPK

AUTORES E LIVROS IMPERDÍVEIS HOMERO Ilíada HEMINGWAY Por quem os sinos dobram ANNE FRANK Diário de Anne Frank MARY DEL PRIORI A história do Brasil nas duas guerras mundiais VIKTOR FRANKL Em busca de sentido ORWELL Homenagem à Catalunha e recordando a guerra civil espanhola

THALES GUARACY A conquista do Brasil V. TCHERNAVIN VLADIMIR Nos campos de trabalho Soviéticos BERNARD CORWELL As crônicas do rei Arthur

-Iugoslávia, de 1992 a 1995.

agruras e batalhas do povo da Nicará-

Há inda um importante registro fei-

Há ainda uma farta literatura que

gicas e sociais da Rússia czarista de seu

gua (Guerra da Nicarágua). Gareth Jo-

to por Mary Del Priori da participação

trata desde a formação do país, das ex-

tempo. Por tramar contra o czar, cum-

nes, jornalista galês que teve sua histó-

do Brasil nas duas Guerras Mundiais.

pedições exploradoras e colonizadoras,

priu pena na Sibéria. Foi daí que surgiu

ria narrada no filme A Sombra de Stalin,

O Brasil foi a única nação da América

à fundação e mesmo as revoluções in-

a obra de caráter biográfico Recorda-

foi responsável por revelar ao ocidente

do Sul a enviar contingentes para as

ternas. Guerra do Paraguai, invasões

ções da Casa dos Mortos, em que relata

a farsa do milagre soviético que havia

duas grandes guerras. Uma obra que

francesas e holandesas, entre muitas

dias nos campos de trabalhos forçados.

promovido o Holomodor, o genocídio da

traz ângulos raramente explorados

outras. Thales Guaracy e Laurentino

Já em O Idiota ele traz um dos episódios

Ucrânia. Até então o mundo havia acre-

do envolvimento brasileiro nas duas

Gomes têm registrado algumas delas

reais, quando um grupo de prisioneiros,

ditado nos relatos de outro jornalista,

guerras, como a geopolítica, a economia,

em seus livros também.

ele incluído, foi levado para fuzilamen-

Walter Duranty, que chegou a receber

a espionagem, o desenvolvimento

um prêmio por suas reportagens elogio-

de instituições militares e o próprio

sas ao regime do ditador russo.

cotidiano dos soldados no calor da

Diante da guerra ocidental que

ção de crimes de vários detentos havia

to. No entanto era uma encenação, e, na

Literatura e guerra hoje

hora do fuzilamento, depois que a rela-

Outros autores fizeram parte até

batalha. Willian Waak também tratou

acompanhamos, quando falamos em

sido lida, uma ordem chegou e encerrou

mesmo de tramas envolvendo espiona-

do tema em seu livro As Duas Faces da

literatura e guerra, logo vem à men-

a cena, que mereceu destaque em seu li-

gem e altas cúpulas de poder. John Le

Glória, apresentando a visão de como

te os escritores russos. Dostoievsky foi

vro. Um autor totalmente desconhecido

Carré deixou registradas em sobressal-

foi a participação brasileira na Segun-

um dos maiores escritores da literatura

do público brasileiro, Vladimir Tcherna-

tadas páginas de suspense suas aven-

da Guerra na visão tanto dos inimigos

universal e um pensador que tinha em

vin, o primeiro prisioneiro a conseguir

turas como agente especial do Serviço

quanto dos aliados.

seu radar questões existenciais, psicoló-

fugir de um Gulag, também retratou os

Britânico durante a Guerra Fria.

horrores desses campos até sua cinematográfica fuga, num bote, alcançando a

Brasil Mas, e no Brasil, as batalhas não tiveram registros em obras literárias? Vamos começar com a obra Os Sertões, de Euclides da Cunha. Monumental em sua agudeza e precisão, a pena de Euclides registra um dos conflitos mais sangrentos da História do Brasil quando o autor testemunhou o conflito como jornalista de O Estado de São Paulo.

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ANOLIS01/ENVATO

mento arredio, por seu estilo cru e ímpeto

Essas duas faces se evidenciam no

Finlândia e, depois, a Inglaterra, onde

Se há uma guerra, você é classificado por um número. Numa pulseira com placa metálica, se não me engano. Ou numa corrente de pescoço, metálica. Nós vamos lutar contra isso. Cada um é um, sem número. O si-mesmo é apenas o si-mesmo.” (LISPECTOR, A descoberta do mundo, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984, p. 573)

viveu com a família até o fim de sua vida. Todas essas vozes testemunharam tantas guerras, em todos os continentes e deixaram seus registros para que tivéssemos um caminho talvez não apenas sobre a Paz, mas sobre o que uma guerra provoca. As perdas irreparáveis podem ser um ponto de partida para evitarmos novas guerras.

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CABEÇA DE PAPEL

Conexão natural DIVULGAÇÃO

GABI VILLAS

Q

ue a literatura oferece a oportunidade de visitarmos diferentes mundos, isso todo mundo sabe. Mas para ampliarmos esse universo, nada melhor do que sairmos da nossa zona de conforto, e desbravarmos novos autores e gêneros que muitas vezes desconhecemos. Para ajudar você nessa missão, que tal algumas indicações de obras que marcaram a vida de personalidades e formadoras de opinião, brasileiras? Quem sabe essas histórias possam marcar a sua também!

RENATO STOCKLER

CONFIRA DIFERENTES SUGESTÕES DE LEITURA E DEIXE-SE TRANSFORMAR PELO MARAVILHOSO UNIVERSO DAS HISTÓRIAS

Obra: Úrsula Autora: Maria Firmina dos Reis

Obra: Autor:

Eu adorei conhecer ‘Úrsula’, o primeiro romance abolicionista de uma mulher preta, que narra a vivência do negro escravizado, portanto com lugar de fala. Firmina publicou-o usando o pseudônimo ‘Uma Maranhense’ tal era o preconceito à figura feminina.

A literatura é a alma das nossas inspirações artísticas. Ao ler ‘Chove nos Campos de Cachoeira’ de Dalcídio Jurandir, fiquei admirada ao conhecer toda a potência desse meu conterrâneo. Um escritor tão eloquente e universal. Suas páginas nos provocam um imaginário cinematográfico. Sua coletânea conhecida por Extremo Norte, é formada por dez livros, um melhor que o outro. Um escritor que já na sua época, era inspiração para colegas renomados como Jorge Amado.

DENISE MELLO É CANTORA, COMPOSITORA, LOCUTORA, VIOLONISTA, PROFESSORA DE CANTO POPULAR E MUSICALIZAÇÃO INFANTIL, MEMBRO DO CLUBE DA VOZ

DIRA PAES, ATRIZ

Obra: Autor:

MARLLON OLIVEIRA

KARINE TELES, ATRIZ, ROTEIRISTA E DIRETORA

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SONIA PINHEIRO

Obra: Vista Chinesa Autora: Tatiana Salem Levy Tenho a vida marcada por muitas leituras. São muitos os livros que marcaram a minha vida e me abriram novas perspectivas. Recentemente fui muito balançada pelo livro Vista Chinesa, de Tatiana Salem Levy. Fazendo um paralelo da violação violenta do corpo de uma mulher com a violência contra a natureza. Uma leitura forte, incômoda, mas que provoca grandes reflexões. Li durante a quarentena, presa em casa no meio de um bairro muito populoso e chorei por uma avalanche de motivos.

Obra: A Bolsa Amarela Autora: Lygia Bojunga

Chove nos Campos de Cachoeira Dalcídio Jurandir

Fernão Capelo Gaivota Richard Bach

Fernão Capelo Gaivota marcou muito a minha vida porque foi o primeiro voo meu para a minha individualidade, para a minha consciência e meu autoconhecimento, desenvolvendo a minha habilidade em questionar o sentido da vida. Escrevo, desde então! Realizo os meus voos através da linguagem escrita e me aperfeiçoo compartilhando sonhos, emoções, histórias, experiências e conteúdo pessoal. CRIS CASTRUCCI, É AUTORA DE ARQUITETURA EMOCIONAL (2022), ALICE VOLTOU PRA CASA (2018) E VOCÊ ME VIU POR AÍ? (2013)

Foi um dos primeiros livros sem figuras que eu li, quando tinha uns 7 anos. Foi também a primeira vez que uma história me fez sentir representada e compreendida, e esse efeito foi tão estonteante que me fez decidir, naquela idade, que escrever é o que eu faria pelo resto da vida. É um livro infanto-juvenil de 1976 – mas que serve a qualquer pessoa, de qualquer geração. Conta a história da Raquel, uma menina que se sente injustiçada pelo jeito como as coisas são. Ela esconde suas três grandes vontades – crescer logo, ser menino e escrever – dentro de uma bolsa amarela. Mas na sua jornada com amigos inusitados – como um galo de briga que só quer paz, uma guardachuva enferrujada e um alfinete de fralda perdido – a Raquel aprende que vontades não podem ser contidas, senão crescem e explodem. É puro realismo mágico, com uma sensibilidade tremenda sobre sentimentos juvenis e uma visão muito vanguardista sobre questões de identidade, igualdade e justiça social, que ainda estamos discutindo hoje. A Lygia Bojunga merece cada um dos seus muitos troféus, como o prêmio internacional Hans Christian Andersen, uma espécie de Nobel da literatura infantil, que recebeu pelo conjunto de sua obra. Até hoje, quando preciso de coragem para assumir minhas vulnerabilidades e enfrentar a vida, eu releio A Bolsa Amarela, e recomendo que você faça o mesmo.”. ROBERTA FARIA É JORNALISTA E EMPREENDEDORA SOCIAL, CO-CEO DA EDITORA MOL

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PÉ DE LARANJA LIMA | POR PRISCILA D ‘AMORA

Modo de descompressão ativado IMPORTANTE FERRAMENTA PARA AMPLIAR

do do cérebro. Todos se acalmavam e começam a dormir”, rememora o autor Pedro Bandeira e afirma: “Sem a arte, a gente enlouqueceria, e na literatura somos mais livres para imaginar”.

Da literatura ao mundo da leitura Ângela Zamora Cilento, docente do curso de Filosofia no Centro de EduUniversidade Presbiteriana Mackenzie

LITERATURA ESTIMULA O CÉREBRO E TEM

(UPM), traz à reflexão o fato de as pes-

RELAÇÃO COMPROVADA NA MELHORA DA

soas viverem em um mundo muito ace-

SENSAÇÃO DE BEM-ESTAR E SAÚDE MENTAL

lerado, em que se encontram repleta de

Q SHUTTERSTOCK

o estresse migrava para o lado esquer-

cação, Filosofia e Teologia (CEFT) da

A VISÃO DE MUNDO E CONHECIMENTO, A

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história que prendia a atenção de todos,

uando procuramos o significado da palavra literatura no dicionário, nos deparamos com a seguinte definição: modalidade de arte, desenvolvida com base na palavra tendo a função de retratar realidades, a sociedade, o homem e as suas ações, de modo a provocar reações específicas no leitor, como emoção e reflexão, além de aumentar o seu conhecimento de mundo. “A arte, desde seu princípio, tem a função de aliviar a tensão. E para uma literatura ser boa ela precisa ser universal, comunicar independentemente do idioma. O ser humano tem dois hemisférios cerebrais. O direito é o hemisfério da razão, no qual as informações ficam ali armazenadas, e o lado esquerdo, o da emoção. Então, se você está com um grande problema no lado direito, está pensando em alguma coisa séria que você tem que enfrentar, você abre um livro, escuta uma bela música e isso alivia a compressão racional do seu estresse do lado direito”, explica Augusto Buchweitz, autor de mais de 50 obras, vencedor de prêmios como o troféu APCA, Jabuti, entre outros.

afazeres; exercitar o olhar de criança, contemplativo, no qual tudo interessa, ajudaria a reaprendermos a “ler” o Segundo seus estudos, como pes-

mundo. “Neste sentido, Montaigne, um

quisador do Instituto do Cérebro e pro-

pensador do século XVI, nos ensina que

fessor da Escola de Ciências da Saúde e

tudo o que se oferece aos nossos olhos

da Vida, a leitura é um exercício que es-

deve servir de livro.”

timula o cérebro. De acordo com Buch-

Segundo a filósofa, em primeiro lu-

weitz, o hábito de ler livros tem relação

gar, o mundo da leitura oferece os melho-

comprovada com uma melhor qualida-

res meios de busca do sentido da existên-

de de saúde mental por envolver ima-

cia. “Montaigne nos adverte que devemos

ginação, mentalização, antecipação e

nos adornar, isto é, embelezar a nossa

aprendizagem.

alma, fruto que só amadurece com ba-

A imaginação tem papel fundamen-

ses sólidas”, pontua Ângela, e ainda expli-

tal nessa “descompressão cerebral”, es-

ca que a citação não faz referência a uma

cape tão necessário para a vida huma-

“ciência livresca”, apenas por mera eru-

na. “Ao imaginar histórias mesmo antes

dição, mas se dá a partir do momento em

da literatura assumir a forma escrita,

que nos apropriamos de ensinamentos

em sua oralidade, quando éramos Homo

para a vida e para a ação. “O mundo

sapiens, nômades e vivíamos fugindo,

da leitura apresenta, por meio de suas

preocupados com a sobrevivência, a

produções culturais, a possibilidade de

literatura já possuía essa importância

mergulharmos nos dramas da existência

dos dias atuais. A partir do momento

humana, nos ensina a percebermos por

em que alguém começava a contar uma

meio de seus personagens os valores que

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PÉ DE LARANJA LIMA

portam, como estes se conduzem diante das circunstâncias. Nos mostram nosso lado bem humano: nossa inveja, crueldade, arrogância e ambição.”

Papel, telas e imaginação

A importância da leitura

Embora estejamos em plena revolução tecnológica, a autora Léia Cassol acredita que as crianças são inseridas

confessa que sua paixão pela tradição

no mundo a partir da perspectiva dos

oral é uma herança de seu pai, que lhe

pais, que são adultos. Se esses oferece-

DIVULGAÇÃO

Léia Cassol, escritora de literatura infantojuvenil e contadora de histórias,

contava histórias quando era bem pequena, e que essa experiência pessoal a faz afirmar o quão importante é ter contato com a leitura desde cedo. “A leitura é a forma mágica de vivermos as aventuras e peripécias de personagens que ficam ecoando em nós, pois gerou emoções. À medida que crescemos, esse eco é resgatado de forma inconsciente, colaborando de forma positiva com a

rem tablets ou celulares antes dos livros, a criança irá interagir com isso.

Sem a arte, a gente enlouqueceria, e na literatura somos mais livres para imaginar

“A questão é que a imaginação é fomen-

PEDRO BANDEIRA, ESCRITOR

gramas, apenas irão reproduzir o que

resolução de nossos conflitos pessoais

tada quando há espaço para que o receptor crie nas entrelinhas do que está vendo. Por isso, a contação de histórias é tão importante para os pequenos. Se receberem tudo pronto na tela e ficarem apenas recebendo imagens e prolhes é passado”, revela.

e profissionais”, enfatiza a autora do li-

Para curto prazo, a escritora acre-

vro A Menina do Cabelo Roxo e O Chá das

dita na permanência dos livros de papel,

DIVULGAÇÃO

Maravilhas.

Léia diz que quando o nosso cére-

principalmente na literatura infantil.

bro é estimulado na infância ele não

“Os pequenos amam livros impressos.

identifica o que é real ou não. Sendo as-

Precisam do concreto. Porém, as tec-

sim, uma vez que o ser humano imagi-

nologias de realidade aumentada já es-

na, reações químicas acontecem no or-

tão por aí, e devem ser utilizadas como

ganismo capazes de mudar a fisiologia,

apoio ao material oferecido. Uma não

alterando o estado interno. “Crianças

exclui a outra. A longo prazo, acredito

que ainda não são alfabetizadas reali-

que as futuras gerações terão histórias

zam o mesmo processo fisiológico quan-

em outros formatos. Torço para que es-

do ouvem histórias. Conscientes desses

ses formatos sejam instigadores e per-

efeitos, seria natural usar a leitura como

mitam que o leitor faça inferências e

ferramenta para o nosso desenvolvi-

amplie o conhecimento de mundo a cada

mento pessoal.”

novo texto lido.”

A leitura é a forma mágica de vivermos as aventuras e peripécias de personagens que ficam ecoando em nós LÉIA CASSOL, ESCRITORA DE LITERATURA INFANTOJUVENIL

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LANÇAMENTO

1

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RezendeEvil em uma batalha que pode destruir a Terra MENSAGEM DE APLICATIVO NÃO É LITERATURA “A todo momento, somos bombardeados por informação, por notificações, por mensagens de áudio, e fica cada vez mais difícil separar o ruído do sinal. Diante desse cenário, a voz interna e silenciosa dos livros é um verdadeiro oásis.” Essa citação feita pelo escritor, cronista, criador de desenhos animados, roteirista de histórias em quadrinhos, Fábio LUNA YABU

Yabu, nos coloca em uma reflexão e nos convida para a importância da leitura, e como nunca é tarde para começar ele nos dá algumas dicas para encontrar a calmaria no meio dessa tempestade em que vivemos:

Fábio Yabu, roteirista de histórias em quadrinhos

VOCÊ JÁ LÊ MUITO

A média do brasileiro é assustadora: são mais de 5 horas diárias olhando para a telinha, consumindo todo tipo de conteúdo. Vídeos, imagens, e sim, muito texto. Mas agora pense em quando foi a última vez que esse tempo gasto lhe trouxe um benefício concreto, um novo conhecimento, uma reflexão profunda, uma nova visão de mundo.

Mas uma pergunta fica no ar. Como uma criança pode ser apresentada aos livros para escolher? Numa livraria,

LEITURA NÃO É (SÓ) DESCANSO

numa biblioteca. Essa experiência não

Os livros não são um remédio para insônia, a menos que

acontece num site ou através de um ta-

sejam chatos e cansativos, obrigatórios. Há gente que pensa

blet. Livros para os muito pequenos têm

em pegar num livro quando não consegue dormir, o que não

estímulos táteis, outros, efeitos visuais,

é exatamente um problema em si, mas revela ou que a leitura

de impressão etc. Não são poucos os que

não é prioridade (e talvez desconheça os benefícios dela), ou

acreditam que os livros eletrônicos são

que está com os livros errados, talvez que se obrigue a ler sem

mais úteis para aqueles que já se tor-

que haja prazer. Tente reservar um tempo para o descanso, e

naram leitores. Ainda assim, passadas

outro para a leitura. Apenas 20 minutos diários são o suficiente

mais de uma década desde que os livros

para ler um livro de 300 páginas em menos de uma semana.

eletrônicos foram disponibilizados em grande escala, eles continuam a respon-

MAS TAMBÉM NÃO É UMA COMPETIÇÃO

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der por cerca de 5% das vendas, fazendo

O mundo hoje se parece com uma grande competição

muitos que previram a substituição dos

olímpica. A leitura não precisa e nem deve ser assim. Não é na

livros físicos pelos digitais revisarem

quantidade de páginas ou de títulos lidos que nos tornamos

suas ideias, imaginando uma acomoda-

leitores melhores, mas na qualidade do tempo em que

ção, tratando-o agora como opção, não

passamos imersos naqueles mundos, nas trocas de experiência

como substituição. E a liberdade para

com o escritor e personagens, nas respostas e, principalmente,

que cada um possa escolher como ler é

nas perguntas que encontramos neles.

o melhor caminho.

Prestes a completar dezoito anos, Ava acha a vida um tédio. Sua rotina se resume a ir pela manhã para a escola e, à noite, observar os astros com um telescópio de sua janela. Até que um dia ela sonha que foi abduzida por um extraterreste e depois disso coisas muito estranhas acontecem. Mas não só com ela... Julie, sua melhor amiga, e Rezende, o colega de classe, também passam por experiências incomuns e descobrem algo sobre a origem da raça humana — segredos guardados por milhares de anos —, mas que agora são revelados. Isso porque uma batalha entre aliens está prestes a acontecer...

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A SANGUE FRIO

MODERNISMO

Exposição Walter Firmo: “No verbo do silêncio a síntese do grito”, com curadoria de Sergio Burgi, no Instituto Moreira Salles – IMS Paulista. Até 11/09 Onde: Avenida Paulista, 2424 Galeria 3 – 8º andar São Paulo – SP

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200 ANOS DE FUNDAÇÃO DO BRASIL

Confira a Agenda Bonifácio e acompanhe dezenas de atividades que celebram o bicentenário da independência, incluindo a reinauguração do Museu do Ipiranga.

Até 28/08 Onde: MIS Jardim Europa – Espaço expositivo 1º andar Av. Europa, 158, Jd. Europa São Paulo – SP

CHRISTINA RUFATTO

O Inhotim acaba de inaugurar as novas obras e exposições temporárias. A abertura da temporada que pode ser comtemplada ao longo do semestre, traz Isaac Julien, importante nome nos campos da instalação e do cinema, convidado a expor um de seus trabalhos mais emblemáticos na Galeria Praça. O Acervo em Movimento, programa criado para compartilhar com o público as obras recémintegradas à coleção, inaugura com trabalhos dos artistas brasileiros Arjan Martins e Laura Belém, ambos instalados em áreas externas do Instituto. Jaime Lauriano também integra a lista dos artistas participantes da programação, e abre o projeto Inhotim Biblioteca, que vai convidar, anualmente, artistas e pesquisadores que estabeleçam diálogos com a biblioteca do Instituto. A instalação do artista mantém relação direta com o Segundo Ato do projeto Abdias Nascimento e o Museu de Arte Negra (MAN), ao propor a curadoria de uma nova bibliografia que contempla autores negros para integrar o acervo da biblioteca do Inhotim. Localização: Brumadinho, a 60 km de Belo Horizonte.

propõe uma leitura que não vê na Semana de 1922 o momento de criação de um Brasil moderno, mas sim como um momento de abertura de portas para a modernidade.

PESSOAS

A Pinacoteca de São Paulo, museu da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo, renova a sua equipe de curadoria e anuncia a contratação de dois novos e jovens curadores: Pollyana Quintela, 30 anos, e Renato Menezes, 32. Os dois passam a integrar a Pinacoteca de São Paulo meses antes da inauguração do novo prédio, a Pinacoteca Contemporânea, previsto para dezembro de 2022, e serão essenciais na construção do projeto curatorial para os 3 edifícios da Pina. Com o acréscimo deste novo espaço, a Pina se tornará, em área e capacidade de público, um dos maiores museus de arte da América Latina, passando a receber até 1 milhão de visitantes por ano.

ROVENA ROSA / AG BRASIL

A CASACOR São Paulo anuncia nova data de exibição: de 5 de julho a 11 de setembro. No ano em que completa 35 anos, a CASACOR, maior experiência do viver das Américas, leva a edição comemorativa de sua principal mostra para o coração de São Paulo: o Conjunto Nacional, na Avenida Paulista, um dos mais importantes marcos arquitetônicos da cidade, que foi projetado há 63 anos pelo arquiteto David Libeskind. Com mais de 10.000 m² de área construída, a CASACOR São Paulo vai ocupar o mezanino do complexo, com seus brises inesquecíveis, e o terraço aberto, que já abrigou o restaurante Fasano.

JOSÉ ROSAEL

ARQUITETURA E DECORAÇÃO

A exposição “Cem Anos Modernos”, do Museu da Imagem e do Som (MIS), instituição da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Governo do Estado de São Paulo,

Viu os lançamentos da Todavia?

ELIETE: A VIDA NORMAL Dulce Maria Cardoso

MAINÁ Karina Buhr

Um romance sobre o tempo, a memória e as ambivalências da vida familiar e conjugal.

Um romance múltiplo por uma das vozes mais eletrizantes do cenário musical brasileiro.

Da autora de SPQR, um estudo luminoso sobre as representações do poder.

ISBN 978-65-5692-313-0

ISBN 978-65-5692-312-3

ISBN 978-65-5692-311-6

DOZE CÉSARES:

IMAGENS DO PODER DO MUNDO ANTIGO AO MODERNO

Mary Beard

A gente também indica QUANDO DEIXAMOS DE ENTENDER O MUNDO Benjamín Labatut ROVENA ROSA / AG BRASIL

DIVULGAÇÃO

PÉ NA ESTRADA

OS SUPRIDORES José Falero

NÃO FOSSEM AS SÍLABAS DO SÁBADO Mariana Salomão Carrara

Um livro poderoso e inclassificável, que converte descobertas científicas em literatura.

Com este seu primeiro romance, José Falero já se apresenta como um dos nomes mais relevantes da nova literatura brasileira.

Um romance sensível e brutal sobre luto, maternidade e as possibilidades de um recomeço.

ISBN 978-65-5692-249-2

ISBN 978-65-5692-071-9

ISBN 978-65-5692-311-6

Cinco anos de boas histórias.

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1001 NOITES

Análise de investimentos

Benjamin Graham e David LeFevre Dodd

Publicado pela FTD Educação, o livro traz breves histórias de Ignácio de Loyola Brandão, Maria Valéria Rezende, Itamar Vieira Junior, Socorro Acioli e do angolano Ondjaki que se passam nas mais diversas regiões do Brasil e em Angola e tratam de temas como bullying e gravidez precoce.

Verdadeiro manual contemporâneo de investimento para quem deseja alcançar o sucesso financeiro: Análise de investimentos, publicado originalmente em 1934 e ampliado pelos autores, tornou-se um dos mais influentes livros de finanças já escritos. A edição da Editora Edipro traz também ensaios de investidores e acadêmicos que explicam como os princípios e técnicas de Benjamin Graham e David LeFevre Dodd são imprescindíveis atualmente.

Antologia de contos 160 páginas

Finanças 1120 páginas

O amanhã cheio de histórias Joselia Aguiar (org)

Spectreman Souji Ushio

A celebração de 50 anos de um herói que ultrapassou gerações combatendo monstros gigantes. Quarenta anos após sua estreia neste país, trata-se de uma coleção de quatro luxuosos volumes com entrevistas sobre os bastidores da produção e enciclopédia dos monstros da série. Uma obra importante e nostálgica de um dos mais inesquecíveis super-heróis japoneses que o mundo já conheceu.

Mangá 428 páginas Pipoca e Nanquim

Humanismo extremo Tom Peters

“O que você está fazendo agora será o carimbo, a marca de toda a sua carreira.” A resposta de Tom Peters para as perguntas que virão no decorrer deste texto pode ser mais simples do que pensamos. O autor, que viajou por 50 estados e 63 países apresentando-se para mais de 5 milhões de pessoas e é um sucesso no Twitter, chega com o possível último livro, Humanismo extremo: O novo padrão de excelência no mundo e nos negócios, ao Brasil com exclusividade pela Buzz Editora.

T U N R E A V , A I G A A E M S R Ã E O V I ! D

Carreira 272 páginas

Rondon, o marechal da paz

Maurício Melo Meneses

Contra Toda Censura

Gustavo Maultasch Em linguagem clara e com diversos casos de grande relevância, Contra Toda Censura é um tratado que reúne mais de uma década de reflexões, aqui condensadas, para quem deseja se aprofundar no tema diante de um mundo que vê crescer um novo furor censório.

Ciências sociais 224 páginas Avis Rara 26

A Faro Editorial lança o novo livro do autor Taylor Adams, que lançou no Brasil Sem Saída, adaptado para os cinemas e já disponível no streaming Star +. Nesta nova aventura, o leitor acompanha a busca alucinante de uma irmã por respostas.

Biografia do Patrono das Comunicações – brasileiro indicado ao Nobel da Paz pelo físico Albert Einstein e enaltecido pelo presidente dos Estados Unidos Theodore Roosevelt –, conta a trajetória do personagem numa criativa combinação de literatura e filatelia. Lançada pela Editora Mackenzie, é ricamente ilustrada por selos que retratam aspectos da vida do Marechal Rondon, dos períodos nos quais realizou seu grande trabalho que entrou para a história do Brasil.

Suspense 224 páginas

Biografia 128 páginas

Ponte do Medo Taylor Adams

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A construção da maldade Roberto Motta

No fundo, todo brasileiro vive com perguntas que nunca são respondidas: os responsáveis pelas leis e pela justiça realmente querem o bem-estar geral ou eles próprios ganham com o caos? Por que o combate ao crime, para os políticos, não é prioridade? O criminoso é mesmo um pobre coitado? Estas são apenas algumas das questões que serão respondidas no livro de Roberto Motta, lançamento do selo Avis Rara.

Sociedade 224 páginas

Menos que um

A hipótese do amor Ali Hazelwood

Ilusão Mortal (Delusion in death)

Neste romance que se agita como um líquido inflamável submetido a alta temperatura, Patrícia Melo constrói, numa narrativa caleidoscópica, as inúmeras batalhas cotidianas, de sobrevivência, de uma vasta gama de personagens – camelôs, flanelinhas, desempregados, bêbados, ladrões, cracudos e catadores, gente que tem como destino inevitável o fato de, por força das circunstâncias, ter que viver nas ruas.

Quando um namoro de mentira entre cientistas encontra a irresistível força da atração, todas as teorias cuidadosamente calculadas sobre o amor são postas à prova. Com personagens cativantes e diálogos afiados, este livro engraçado, sexy e inteligente se tornou uma das grandes sensações do TikTok.

J. D. Robb

No novo volume da série Mortal, Eve Dallas precisa desvendar um caso sanguinário em um bar de Nova York. A protagonista de J. D. Robb, pseudônimo de Nora Roberts, embarca nessa nova investigação, preocupada com a possibilidade de outra tragédia iminente.

Ficção Jovem 336 páginas Editora Arqueiro

Policial 462 páginas Bertrand Brasil

Patrícia Melo

Romance 368 páginas Leya

LIVROS PARA ENTENDER O MUNDO

Diatribe de amor contra um homem sentado Gabriel García Márquez

Um dos autores mais importantes do século 20, Gabriel García Márquez tem quase 3 milhões de livros vendidos no Brasil. Em 2022, completam-se 40 anos do Prêmio Nobel de Literatura do escritor. Publicada originalmente em 1987 e inédita no Brasil, Diatribe de amor contra um homem sentado é a única peça escrita por ele, um relato íntimo e sincero de uma mulher prestes a completar 25 anos de casada.

Romance 96 páginas Editora Record

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João e o Pé de Feijão Clássico ilustrado

Nesta edição ilustrada, capa dura, com papel couchê e miolo colorido, somos convidados a acompanhar este divertido conto sobre um pé de feijão encantado que cresceu tanto a ponto de alcançar as nuvens, e nos aventurar com João no castelo mágico, que abriga um gigante malvado e a famosa galinha dos ovos de ouro.

Literatura infantil 36 páginas Moby Dickens

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MARCIO RODRIGUES

OU ISTO OU AQUILO

Livros como companhia

T

POR CRIS PÀZ

enho uma amiga com quem troco histórias,

A escritora Cris Pàz

confissões e até detalhes de sessões de tera-

Guerra, mas decidiu

pia. Moramos em países diferentes, ficamos

então tem ouvido

até outro dia era Cris se rebatizar. E desde “Combina bem mais

meses sem nos falar, mas basta um novo encontro (ao

com você”.

vivo ou virtual) para retomarmos a conversa do ponto onde parou. O tempo é escasso para tanto assunto. Metralhamos ideias e visões de mundo com a naturalidade de quem troca receitas. Da última vez que nos vimos, me demorei tecendo elogios a um livro, que fiz questão de dar a ela antes da viagem. Dias depois, ela me contou

Há aqueles que acendem mais tarde, como um aba-

sobre o fracasso daquele encontro: foram juntos, mas

jur em casa quando tudo está mais calmo. Os que fa-

não se entenderam.

lam manso e fazem rir. Há os que contaram histórias

Não há como obrigar alguém a gostar de um livro,

inesquecíveis, que gostamos de recontar como se fos-

como não se pode forçar amizade entre duas pessoas,

sem nossas. Há os preciosos, que você quer guardar: na

mesmo que uma delas queira muito. E um livro sempre

caixinha, na bolsa, no papel pra ter sempre na ponta da

quer. Duas pessoas podem frequentar por anos os mes-

língua. Há os que você nem precisa transcrever, já têm

mos lugares e jamais haver assunto. Outras podem se

lugar cativo na memória.

encontrar a distância e nunca mais se largarem.

Quando pequena, eu tinha um caderninho para onde

Amigos são como livros. Há os de poucas palavras,

transcrevia trechos que me marcavam nos livros. O ges-

os que têm uma história para cada momento. Há os

to desenhava meu respeito por eles. Sagrados, intocá-

monotemáticos: a cada vez contam algo novo sobre o

veis, eles lá e eu aqui. Com o tempo ganhei coragem pra

mesmo assunto. Há aqueles dos quais não queremos nos

me misturar às páginas, marcá-las onde me marcaram,

despedir, pedimos logo um novo capítulo. Há os que nos

confessar o que havia de mim ali. Passei a macular as fo-

matam de rir, os que vivem dando conselhos — nem

lhas como quem finca bandeira demarcando território.

sempre queremos vê-los, mas é bom saber que exis-

Sou uma colonizadora de trechos já escritos, me aposso

tem. E insistem.

deles por considerá-los meus também.

Há o que já está ali há anos e um dia paramos pra

Tenho poemas na cabeceira, contos na bolsa, ro-

prestar atenção. Só então fica. Há aqueles que, como

mances no sofá. Levo autoajuda na mala de mão, para

poemas, dizem o bastante de modo cirúrgico. Há os

ler na aeronave quando o tédio domina. E o voo pode

clássicos, dizem e repetem o essencial, de tempos em

surpreender antes mesmo da decolagem.

tempos. Há os que encontramos de novo e crescem em

Livros são encontros. Topar com o mesmo livro em

sentido, os que reencontramos depois de décadas e já

dois momentos diferentes da vida podem ser duas his-

não nos dizem nada.

tórias distintas. O livro será sempre o mesmo, mas não

Há os que nos atraem pela capa, mas têm pouco a

as pessoas. Com um velho rosto conhecido posso ter um

dizer. Há aquele de quem sequer nos recordávamos e,

dia, sem planejar, uma conversa surpreendente. Tudo

um dia, por obra do acaso, acorda um afeto esquecido.

a seu tempo, desde que ambos estejam ali.

Há os que falam pouco e o bastante. Aqueles cujas palavras retumbam dentro.

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Na dúvida, eu me cerco de amigos e de livros. Na certeza também.


Revista

DRUMMOND LIVRARIA ANUNCIE E FALE DIRETAMENTE COM UM PÚBLICO APAIXONADO POR LIVROS

Margô Catelli eventos@drummondlivraria.com.br

T +55 (11) 99433-9992


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