Laboração continua

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Experimentandum

Moléculas Sensacionais

Como veem os nossos olhos?

por David Marcu

Episódio 11: Retinal

Cor e Visão

Vemos por todo o lado cores na Natureza, não apenas as sete tradicionalmente atribuídas ao arco-íris mas todos os cambiantes entre elas e misturas delas. É um defeito muito raro aquele que impede alguém de ver as cores, limitando-o a ver o mundo a preto e branco. No ambiente do nosso planeta, os nossos olhos adaptaram-se, ao longo do caminho de evolução biológica, a perceber as cores. Os responsáveis são células situadas na retina chamadas cones e bastonetes. Não passam de fotoreceptores ou sensores, que convertem luz em corrente elétrica. Os cones, em número de seis milhões em cada olho, são de três tipos. Cada um deles capta melhor cada uma das três cores básicas – o vermelho, o verde e o azul – com as quais se podem fazer as outras. Por outro lado, os bastonetes, mais centrados no verde, são capazes de captar luz muito menos intensa: são por isso os sensores por excelência da visão noturna. Como, ao contrário dos cones, os bastonetes, em número muito maior do que os cones (são cerca de 120 milhões!), se podem situar na periferia, são grandes auxiliares da visão periférica. Dizemos que de noite todos os gatos são pardos, porque só os conseguimos ver com a ajuda dos bastonetes. No conjunto dos nossos dois olhos existem cerca de 250 milhões de sensores (somando o número de cones com o número de bastonetes). Isso corresponde a 250 megapixels, uma resolução muito superior à de uma moderna câmara digital que consegue, se for de suficiente qualidade, uns 18 megapixels. Ainda por cima, a nossa vista tem mecanismos de interpolação entre os pixels, semelhantes aos que algumas câmaras utilizam. É devido a deficiências nos cones que algumas pessoas são daltónicas, isto é, têm dificuldades em distinguir algumas cores, principalmente o verde e o vermelho. Com o azul não há, regra geral, problemas… Este defeito de visão, que abrange cerca de oito por cento dos homens (alguns não sabem, embora haja testes simples para diagnosticar daltonismo) mas apenas 0,4 por cento das mulheres. Trata-se de um defeito genético,

associado ao cromossoma X, que surge sozinho nos homens mas emparelhado nas mulheres. A cor de que nos apercebemos no cérebro, resulta de três fatores: a fonte de luz, o objeto em si que reflete ou difunde parte da luz que recebe e os nossos olhos, que podem ver melhor ou pior as cores. Quando, através do nervo ótico, o sinal que contém informação luminosa chega ao cérebro, a sensação de cor que se forma é necessariamente subjetiva. Há casos muito interessantes de sinestesia, isto é a criação da sensação de cores por estímulos sonoros e não visuais. O poeta francês Rimbaud fala, em versos, das cores das vogais: “A negro, E branco, I rubro, U verde, O azul, vogais, / Ainda desvendarei seus mistérios latentes:” Será que os outros animais também veem cores e, no caso afirmativo, será que as veem graças aos três referidos tipos de cones, tal como nós? De facto, os primatas têm uma visão semelhante à nossa, dita tricromática. Os cangurus e as abelhas também têm essa visão (o caso das abelhas é muito particular, pois elas não veem o vermelho, mas veem o ultravioleta, conseguindo por isso localizar o Sol, mesmo num dia de névoa). Mas nem todos os primatas são tricromáticos. A evolução conduziu a desenvolvimentos separados: muitos macacos do Novo Mundo só têm visão dicromática. A maior parte dos mamíferos não primatas têm visão dicromática: não conseguem distinguir entre o vermelho e o verde. E há mamíferos de visão monocromática como alguns animais marinhos. Mas muitos animais têm mais tipos de cones do que os seres humanos: os répteis, anfíbios, aves e insetos têm maior capacidade de reconhecimento de cores do que os humanos pois a sua visão é tetracromática. Alguns insetos – como certas espécies de borboletas – e algumas aves – como os pombos – chegam a ser tetracromáticos. O mundo é bem mais colorido para eles! Os mecanismos evolutivos para se conseguir ver melhor certas cores têm, em geral, a ver com a captura de alimentos. Vermos

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bem o vermelho dá-nos muito jeito para apanharmos certos frutos, ao passo que para as abelhas, que não veem o vermelho (nem é preciso, porque quase não há flores vermelhas), verem o ultravioleta dá muito jeito nos campos de flores. A visão ultravioleta é também muito útil para algumas aves. Acrescento, já que estou a falar em aves, que elas são provavelmente, de todos os animais, aqueles que têm maior capacidade visual. Não é por acaso que se fala em olho de águia. Não tem apenas a ver com a variedade de cones (o grau de cromatismo), mas também com o número de cones e bastonetes (o tal número de megapixels) e, evidentemente, com toda a restante ótica do olho, já que para uma boa fotografia importam não só os sensores como também as lentes e o diafragma. Um falcão consegue ver um minúsculo rato num prado a quilómetros de altitude! Também não é por acaso que se fala do olho de lince. Entre os mamíferos, os felinos são os animais com a acuidade visual mais extraordinária. Tanto no ar como na terra, a visão foi sendo desenvolvida no mundo animal para que cada espécie pudesse encontrar mais facilmente os seus alimentos, assegurando assim a sua sobrevivência. A história evolutiva que conduziu à visão da cor é fascinante. Um antepassado muito remoto dos primatas deve ter sido tetracromático, mas a certa altura, no tempo dos dinossauros, os antepassados dos atuais mamíferos perderam, por uma mutação, uma boa parte da visão da cor, ao ficar só com dois dos cones dos quatro que existiam. Os primatas readquiriram mais tarde alguma da capacidade de ver a cor, por um fenómeno chamado duplicação de genes. Isto passou-se no Terciário Inferior, há mais de vinte milhões de anos, pelo que não admira que permaneça em parte na obscuridade. Paleontólogos, geneticistas, biólogos, físicos e químicos trabalham em conjunto para esclarecer os mistérios da origem da nossa capacidade de ver o mundo colorido. Carlos Fiolhais Departamento de Física da Universidade de Coimbra (Artigo primeiramente publicado na revista “As Artes entre as Letras”)

Este é o primeiro episódio de uma série especial, dedicada aos cinco sentidos. E para o primeiro episódio, foi fácil escolher o tema: vamos falar do RETINAL, a molécula sensacional associada ao sentido da visão. Porquê? Bem… Porque assim posso também dizer que este é um episódio com vista para o Ano Internacional da Luz - 2015, cuja celebração está a decorrer. De facto, é através da visão que nos apercebemos da existência da luz, mais concretamente da chamada “luz visível” – ou seja, aquela parte da radiação luminosa que os nossos olhos são capazes de detetar. E é nesse processo de deteção da luz que surge a molécula de Retinal. Esta molécula é uma das formas da Vitamina A e é ainda uma parente próxima das moléculas de caroteno, responsáveis pela cor das cenouras e pelos amarelos-dourados das folhas de outono. É uma molécula alongada e com uma extremidade flexível, tal como vemos nas “palhinhas” dos refrigerantes. No seu estado normal, o Retinal adota uma estrutura de “palhinha com a ponta dobrada”. Quando a luz visível incide nesta molécula, ela sofre uma transformação para um arranjo geométrico mais linear, como uma “palhinha direita”. É esta alteração da estrutura do Retinal que desencadeia a cascata de reações químicas que resultam finalmente num sinal elétrico, enviado ao cérebro através das células nervosas. Conclusão: o Retinal é mesmo uma molécula sensacional. (É que…) Vê-se mesmo que é!

“Moléculas Sensacionais” é um projeto de Paulo Ribeiro Claro (Departamento de Química da Universidade de Aveiro e CICECO) e de Catarina Lázaro (programa Click/Antena 1) em parceria com a Fábrica Centro Ciência Viva de Aveiro.

O que preciso? - Balão - Lanterna - Lente biconvexa - Objeto opaco (por exemplo uma chave)

Como fazer? 1. Encher o balão e encaixar a lente na abertura deste. 2. Alinhar a lanterna, a chave, a lente e o balão, de modo a obter uma imagem na parte traseira deste último. 3. Observar e, se necessário, aproximar ou afastar o conjunto lente/balão da fonte de luz, de modo a obter uma imagem mais nítida.

O que acontece? O olho humano é um “instrumento” ótico bastante complexo e delicado que nos permite ver os objetos que nos rodeiam. Quando a luz atinge os objetos é refletida em várias direções, entrando alguns desses raios luminosos nos nossos olhos: sofrem refração na córnea, passam pela pupila, atravessam o cristalino e o humor vítreo (substância gelatinosa transparente que preenche o espaço entre o cristalino e a retina), produzindo-se uma imagem invertida na retina. Esta última consiste numa camada de tecido constituído por células sensíveis à luz, que transformam os sinais luminosos em sinais elétricos que posteriormente são enviados ao cérebro pelo nervo ótico. O facto de a imagem ser produzida de forma invertida na retina, justifica-se por a córnea e o cristalino serem lentes convexas que quando os raios luminosos as atravessam mudam de direção, convergindo num ponto. O balão pretende assim simular o globo ocular, a lente biconvexa a córnea e a parte de trás do balão a retina. Devido então às propriedades da lente utilizada, surge uma imagem invertida da chave na parte de trás do balão. O movimento de aproximar ou afastar o conjunto lente/balão da fonte de luz, simula o ajuste do cristalino na focagem da imagem.

CIENTISTAS NA SERRA O programa começa com uma Feira de Ciência, onde poderá participar nas oficinas “Fornos Solares e Pipocas” e “Creme de Mãos e Sais Efervescentes”, entre as 15h e as 18h.

14 AGOSTO | 6ª FEIRA & 15 AGOSTO | SÁBADO Local Praça do Regionalismo, Pampilhosa da Serra Horário 15h00-18h00 PARTICIPAÇÃO GRATUITA

Inscrições e mais informações www.cienciaviva.pt/veraocv/2015

Fábrica Centro Ciência Viva de Aveiro 2015


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