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ANP coloca em discussão modelo
ANP coloca em discussão modelo alternativo de venda direta
POR MÔNICA SERRANO
Em 24 de novembro, a ANP realizou a audiência pública para debater a minuta de resolução que propôs a flexibilização do modelo atual de comercialização do etanol hidratado. Dois anos depois da greve dos caminhoneiros, que gerou a polêmica da discussão da venda direta do biocombustível das usinas aos postos, e seguindo as diretrizes do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), a agência reguladora encontrou um modelo alternativo, com a criação de um novo agente, o distribuidor vinculado, para realizar o papel de comercializador do produto junto aos postos.
A criação do novo agente não exclui o papel das distribuidoras na cadeia, atual elo intermediário do setor, como se propunha com a venda direta do etanol das usinas aos postos. A proposta é de que esse novo agente seja vinculado à usina e a comercialização do produto se restrinja somente à venda de etanol hidratado oriundo da unidade produtora à qual mantém ligação. O distribuidor vinculado também terá requisitos para exercer atividades menores que as atualmente exigidas para a distribuição de combustíveis, uma vez que parte desses requisitos já seriam atendidos pelo produtor ao qual estaria vinculado, segundo a Agência. Entretanto, ele vai assumir os mesmos tributos do etanol, que são incidentes, hoje, sobre as distribuidoras.
O novo player (distribuidor vinculado) foi a solução encontrada pela ANP para viabilizar a venda direta de etanol hidratado do produtor ao posto revendedor, sem que isso se reflita no pagamento dos tributos federais incidentes na etapa de distribuição. Dessa forma, fica mantida a isonomia concorrencial na esfera tributária na cadeia de abastecimento, conforme recomendou o CNPE à agência.
Após seguir as diretrizes das resoluções 12/2019 e 2/2020 do CNPE, que solicitou estudo de impacto regulatório para avaliar o tema da venda direta, a ANP divulgou a nota técnica 2/2020, que concluiu que a retirada do elo intermediário, ou seja, das distribuidoras de combustíveis, provocaria um desequilíbrio concorrencial no setor, uma vez que não haveria margem legal para compensar a questão tributária. As perdas de arrecadação dos tributos do etanol poderiam chegar a R$ 2,17 bilhões, de acordo com a Agência.
Conduzida por Patrícia Huguenin Haran, superintendente adjunta de Distribuição e Logística (SDL) da ANP, a audiência pública contou com a participação de diversos agentes do setor. A revenda de combustíveis compareceu à audiência, representada pela Fecombustíveis, Sindcomb e Resan, juntamente com o setor Transportador-Revendedor-Retalhista, representada pelo SindTRR.
Proposta precisa de ajustes
Para Paulo Miranda Soares, presidente da Fecombustíveis, a proposta é bem-vinda do ponto de vista de abertura do mercado, po-
rém ainda há necessidade de ajustes. Ele manifestou duas preocupações: a sonegação fiscal do etanol e a questão concorrencial dos postos embandeirados.
Segundo Miranda, a Resolução do CNPE 2/2020, que substituiu a Resolução 12/2020, traz entre as diretrizes recomendadas à ANP: “isonomia concorrencial no aspecto tributário e preservação da arrecadação de tributos de alíquota específica (ad rem) em relação à comercialização do etanol hidratado com distribuidores de combustíveis.”
“O ad rem (em reais) seria uma solução espetacular para este setor, a exemplo do PIS/Cofins, recolhido direto na fonte. A ANP poderia fazer um acordo provisório com o Confaz, até que o Congresso Nacional resolva a questão tributária”, sugeriu, já que a alteração no formato tributário deverá passar por mudança na legislação. “Não podemos abrir o mercado sem que seja possível fiscalizar o setor e coibir a sonegação fiscal”, complementou.
A grande preocupação da Fecombustíveis tem sido o combate às irregularidades do setor. Como se sabe, há um mercado irregular que atua no setor de etanol sob nome “barrigas de aluguel”. São distribuidoras de combustíveis de fachada, que têm como modelo de negócio o não pagamento de impostos (devedores contumazes), ocasionando graves danos com a competição desleal. “Só no estado de São Paulo, no mês de outubro, as barrigas de aluguel venderam 4 bilhões de litros de etanol, mais do que todas as distribuidoras juntas”, disse Miranda.
Outra preocupação do presidente da Federação é que o novo formato de negociação de etanol da ANP favorece os postos bandeiras brancas, mas deixa a desejar à revenda embandeirada. A sugestão para manter a competitividade isonômica da revenda seria flexibilizar as regras para as distribuidoras de combustíveis (elo intermediário) atuarem dentro da usina. “Algumas distribuidoras já fazem isso. A companhia compra etanol da usina e o revendedor FOB vai lá e retira. Esta seria a solução viável para os postos embandeirados”, disse.
Para finalizar, o presidente da Fecombustíveis pediu para a ANP manter no novo modelo proposto a Resolução 44/2013. “É essencial para nossa segurança manter esta norma, porque a amostra-testemunha é a nossa única defesa em caso de não conformidade detectada no etanol”, concluiu.
A Resolução 44/2013 estabelece que, nos casos em que o combustível adquirido pelos postos é retirado na base da distribuidora, a companhia responsável pelo fornecimento é obrigada a entregar a amostratestemunha. Se as especificações de qualidade dos combustíveis não estiverem compatíveis com as definições da ANP, e, supostamente, virem da base, a companhia será responsabilizada e penalizada. ■