Alexandre Severo Anna Kahn Breno Rotatori C谩ssio Vasconcellos Claudio Edinger Pedro Motta
#
f o t 贸 g r a f o s
09
b r a s i l e i r o s
revista digital foto grafia acesse leia contribua divulgue
www.revistafotografia.com.br
#09 / setembro / 2012
EXP. / COLABORADORES DESTA EDIÇÃO / Alexandre Severo – Anna Kahn – Breno Rotatori – Cássio Vasconcellos – Claudio Edinger – Pedro Motta / EXPEDIENTE / Responsáveis: Felipe H. Gallarza – Sergio Antonio Ulber / Conselho editorial: Felipe H. Gallarza – Sergio Antonio Ulber – Vitor Ebel / Diretor de arte: Felipe H. Gallarza / Diretor de redação: Sergio Antonio Ulber / Programador: Iacami Enapupê Gevaerd / Jornalista: Gustavo Zonta / Revisão: Sergio Antonio Ulber – Vitor Ebel / COLABORADORES DO BLOG / Caroline Santos – Diogo Carreira – Euclydes da Cunha Neto – Vitor Ebel / Capa: Felipe H. Gallarza / Ilustração p. 07: Sergio Antonio Ulber PRODUÇÃO INDEPENDENTE E COLABORATIVA contato@revistafotografia.com.br ISSN: 2178-8596 A produção total ou parcial de qualquer texto ou imagem, por qualquer meio, sem autorização dos autores ou da revista é totalmente proibida. Para colaborar conosco confira as instruções no site da revista (www.revistafotografia.com.br/colabore). A revista Foto Grafia é um projeto de fomento à produção fotográfica, produzido de maneira independente e colaborativa. A Equipe agradece a todos que colaboram com a Foto Grafia, tornando possível a realização desta. p
[4]
p.
20
p.
Breno Rotatori
Alexandre Severo
Fotos e
A história
contra-fotos
do contrário
de minha avó
p.
30
Anna Kahn Ausência
p.
42
08
que inquieta
p.
56
Claudio Edinger A Serra Catarinense no foco seletivo de Claudio Edinger
Cassio Vasconcellos Visões aéreas do caos e ordem coletivos
p.
64
Pedro Motta Natureza sobreposta
feito para ler por Sergio A. Ulber
Voyeurs, somos todos voyeurs, gostamos de
50 imagens. Um livro, um ensaio, uma história
olhar, de observar, espiar... melhor ainda é ver
contada.
com as mãos. A fotografia nos sacia esta von-
A narrativa fotográfica é tão comum que às ve-
tade, em pequenas janelas vemos algo que
zes passa despercebida, esquecemos que está
não mais nos pertence, ou então o que nunca
presente em álbuns de família, de casamento,
nos pertenceu, mas não importa, gostamos é
de redes sociais. Impressionante é quem con-
de olhar; e isto nos transporta, como num livro
segue narrar para a massa, conquistar o pú-
bom, conforme lemos nos despertam senti-
blico, plantar uma ideia, fotografar o novo,
mentos.
reinterpretar, inventar novos conceitos, mudar
Como bons voyeurs que somos, nossa imagi-
a cabeça de alguém utilizando somente ima-
nação é aguçada, damos à imagem movi-
gens. A fotografia tem poderes precisamente
mento, vemos a continuidade do instante, ou
funcionais quando bem utilizada.
então que teria acontecido antes, enxergamos
Impossível não citar Susan Sontag neste breve
uma cena opaca, um pouco esbranquiçada,
texto construído com base em suas reflexões.
enevoada. Mas vemos, e vemos além: senti-
Se, para ela, o conhecimento adquirido por
mos, interpretamos, questionamos, discutimos,
meio de fotos será sempre um sentimentalis-
aprendemos.
mo, estes ensaios estão aqui como prova, em
Existem histórias que para serem contadas bas-
uma edição especialmente dedicada a eles.
ta uma imagem, como na literatura, quando
A eles e aos seus autores, que conseguem dar
não é necessário mais do que uma página
voz ao que está mudo, beleza ao grotesco ou
para escrever um conto. Algumas pedem mais,
atenção ao despercebido. Aos que conse-
exigem a construção e o desenvol-vimento de
guem despertar em nós um sentimento.
uma narrativa, 100, 200, 500 páginas, 10, 20, p
[6]
p
[8]
Cassio Vasconcellos
Visões aéreas do caos e ordem coletivos Observar o mundo por uma nova perspec-
Estas imagens feitas por Cássio são criadas
tiva, de cima, e mostrar as paisagens que
a partir de centenas de outras fotografias. A
dificilmente o olhar humano, que fica rente
imagem aérea do aeroporto, por exemplo,
ao chão, poderia ver. Este tem sido o foco do
resultou de registros feitos no sobrevôo de he-
trabalho recente do fotógrafo paulista Cássio
licóptero em 8 aeroportos: 5 no estado de
Vasconcellos, que tem dedicado seu tempo
São Paulo e 3 nos Estados Unidos. Ele registrou
à tomada de cenas aéreas. Ver o mundo do
todos os tipos de aviões e a movimentação
alto faz parte da rotina de Cássio, que tirou
que há nestes lugares. As fotografias foram
o brevê e também pilota helicópteros, um
recortadas e os elementos que compõem a
sonho que alimentou desde que era menino.
imagem final foram recolocados um a um. “A
Lá de cima, o fotógrafo consegue fazer re-
ideia do trabalho é mostrar as conexões que
gistros inusitados e, através da manipulação
existem entre estes lugares em uma forma
e da montagem destas capturas, compõe
que se assemelha a neurônios, um desenho
cenas panorâmicas que formam grandes
quase orgânico”, explica Cássio Vasconcel-
painéis. São mosaicos fotográficos impres-
los.
sionantes, que mostram desde o caos das
De longe, a imagem até parece uma foto-
grandes cidades, como o acúmulo de mi-
grafia abstrata, mas, no tamanho em que foi
lhares de pessoas (caso da imagem É NÓIS,
pensada para impressão (2 metros de largura
que ilustra esta página) ou o tráfego de
por 5 metros de comprimento), permite que,
veículos (nas fotos feitas sobre o Ceasa, em
de perto, possam ser vistos todos os detalhes
São Paulo, p. 18-19), até a estranha ordem
captados pela lente do fotógrafo.
existente em uma praia ou em aviões esta-
Trabalho semelhante, Cássio fez no projeto
cionados em um aeroporto.
intitulado Coletivo, de 2008, que teve grande
p
[ 10 ]
repercussão no país. O artista criou um mo-
Aqui, ao contrário, o painel opera por modu-
saico fotográfico, de 12 metros de extensão
lação, engendrando uma superfície que se
por 2,20 metros de altura, formado por 50
configura em variação contínua”.
mil carros colocados lado a lado. De longe,
Cássio Vasconcellos nasceu em São Paulo,
a impressão é de estar vendo uma enorme
em 29 de setembro de 1965. Iniciou sua tra-
tapeçaria cheia de pontos coloridos. De per-
jetória na fotografia em 1981, na escola Ima-
to, é possível ver os detalhes de cada veículo,
gem-Ação. Durante sua carreira, seu trabalho
um mar de carros fotografados em sobrevôos
pessoal, sempre voltado a projetos artísticos,
feitos em grandes pátios de recolhimento de
percorreu muitas galerias e museus no Brasil
veículos apreendidos ou abandonados.
e pelo mundo, participando de mais de 130
Como afirma Nelson Brissac, professor do Pro-
exposições em 18 países. Neste período, o
grama de Pós-Graduação em Tecnologias
fotógrafo paulista foi agraciado com o Prê-
da Inteligência e Design Digital da PUC-SP, no
mio Nacional de Fotografia da Funarte, na
texto de apresentação do projeto, “o painel
categoria Arte, em 1995, com o Prêmio Porto
fotográfico está ancorado nesse dispositivo
Seguro de Fotografia, em 2001, e o Prêmio
de mobilização do observador, de desloca-
de Melhor Exposição de Fotografia do Ano,
mento do ponto de vista. O quadro fotográfi-
da Associação Paulista de Críticos de Arte de
co clássico em geral opera como um molde,
São Paulo, em 2002.
formatando a composição da paisagem.
p
[ 12 ]
01 p
[ 13 ]
p
[ 14 ]
p
[ 15 ]
p
[ 16 ]
p
[ 17 ]
p
[ 18 ]
p
[ 19 ]
Alexandre Severo
A hist ria do contrári A chance dos três irmãos terem nascido
ciais, vivem correndo para se esconder
albinos na mesma família era de uma
do sol. O jeito é brincar dentro de casa.
em um milhão, mas aconteceu. Kauan,
A dura rotina destas crianças foi
5 anos, Ruth Caroline, 10, e Esthefany
registrada pelas lentes do fotojornalista
Caroline, 8, nasceram brancos em uma
pernambucano Alexandre Severo. O
família de negros na cidade de Olinda,
projeto, intitulado À Flor da Pele, nasceu
em Pernambuco. A mãe, Rosemere Fer-
de uma reportagem feita para o Jornal
nandes de Andrade, 27, é negra, o pai
do Commercio, com texto do jornalista
é moreno. Pobres, eles moram em uma
João Valadares. O trabalho, realizado
favela chamada V-9 e, sem recursos
em agosto de 2009, foi mundialmente
para comprar protetores solares espe-
reconhecido.
p
[ 20 ]
p
[ 21 ]
A agência Reuters elegeu a foto “O gato” como uma das Imagens do Ano (Pictures of the Year). A foto mostra os irmãos albinos Esthefany e Kauan brincando com a prima negra Taina tendo o testemunho de um gato siamês. O projeto também foi selecionado para a mostra Descubrimientos, do PhotoEspaña 2009/2010. No trabalho, Alexandre busca registrar o difícil dia-a-dia das três crianças albinas
p
[ 22 ]
e como elas convivem com o defeito
dedos cruzados são sempre para cho-
genético que as deixou brancas. São
ver. É o convite para o banho de mar na
imagens belas, doces, até ingênuas,
Praia Del Chifre, em Olinda. Rezam para
mas, ao mesmo tempo, duras e con-
espantar o domingo de sol. Só assim,
testadoras. A condição social desfa-
com o céu pintado de preto, são crian-
vorável é o principal agravante da
ças”, relata João Valadares.
doença. Sem ter como se proteger do
Às vezes, Kauan, o mais novo, desafia o
sol, as crianças ficam trancadas den-
maior inimigo. Fecha os olhos e corre no
tro de casa, grudadas na televisão, em
meio da rua gritando com o sol. Ele sorri
cima da cama com as janelas fecha-
e ouve os gritos da mãe para voltar logo
das, sentadas diante do ventilador. “Os
para dentro de casa. Severo
p
[ 23 ]
captura com maestria este belo mo-
isso seguem todos de mãos dadas.
mento em que Kauan volta a ser uma
Apesar de tantas dificuldades as três
criança normal.
crianças sonham com o futuro: Ruth
A ida para a escola, a 200 m de casa,
quer ser policial, Kauan, bombeiro ou
também vira um martírio. De bonés,
dentista, e Esthefany, modelo. São os
camisetas de mangas longas, eles
“anjinhos” da mamãe Rosemere que
tentam se proteger da luz para evitar as
ganharam cores e vida nas fotografias
noites diante do ventilador e as feridas
de Severo. Como pontua o jornalista
pelo corpo. A doença também compro-
João Valadares, “esta é a história do
mete a visão, os três óculos estão que-
contrário”.
brados. As quedas são constantes, por
Alexandre nasceu em 1978, em
p
[ 24 ]
Recife, e começou a fotografar em
O fotógrafo ainda ganhou diversos
2002. Trabalhou nos principais jornais
prêmios de fotojornalismo e tem obras
de Pernambuco, com destaque para o
no Museu da Abolição – Centro de
Jornal do Commercio, onde passou 7
Referência da Cultura Afro-Brasileira, Re-
anos. Hoje, mora em São Paulo e é
cife, e na Galeria Arte Plural (PE).
fotógrafo independente. Publicou
Também teve trabalhos expostos no
trabalhos na Revista Time, Revista S/N,
Kaunas Photo Festival (Lituânia), Paraty
Sueño de la Razón, Folha de São Paulo,
em Foco 2009, FestFotoPoA 2009, Tate
no livro Melhor do Fotojornalismo 2010,
Modern (Londres), Galeria Arte Plural
dentre outros veículos nacionais e
(Recife) e no Museu do Homem do
internacionais.
Nordeste (Recife).
p
[ 25 ]
p
[ 26 ]
p
[ 27 ]
p
[ 28 ]
p
[ 29 ]
p
[ 30 ]
Maria, 29 anos, empregada domĂŠstica.Na Cidade de Deus, falando ao telefone
Anna Kahn
ausência que inquieta Fotografar o ausente, aquilo que não está mais
bala perdida a levou. E assim foi com Maria, 29
aqui, o que foi tirado. O ensaio “Retratos da
anos, empregada doméstica, com André, 23
ausência”, da fotógrafa carioca Anna Kahn,
anos, estudante, com Maria de Fátima, 64 anos,
lança um novo olhar a respeito das vítimas de
dona de casa e com outras milhares de pessoas
balas perdidas no Rio de Janeiro. Ao contrário
vítimas de balas perdidas. Elas foram, ficaram
das imagens explícitas da violência das grandes
apenas os lugares.
metrópoles, que quase sempre mostram de-
São esses locais vazios, esses espaços não mais
mais, os registros feitos por Anna causam inqui-
ocupados, que aparecem no trabalho de Anna
etação e angústia por aquilo que não mostram.
Kahn. As fotografias são noturnas, pouco ilumi-
Cátia, de 32 anos, dona de casa, não está mais
nadas e misteriosas. As cenas desertas passam
lá. Restou apenas a Praia de Copacabana,
toda a solidão, o luto e a dor causados pela fal-
onde ela estava com amigos e a filha de oito
ta de quem ali estava e foi levado. A ausência e
anos quando foi atingida por uma bala per-
o silêncio nos conduzem a uma ampla reflexão
dida. Alice, de 3 anos, também não está mais
sobre a violência e a vida.
na Cidade de Deus. Ficou apenas a calçada
O ensaio é um dos mais expressivos trabalhos da
pouco iluminada onde ela brincava quando a
fotógrafa Anna Kahn. A exposição deste trabapor Sergio Antonio Ulber p
[ 31 ]
p
lho foi mostrada no Instituto Moreira Salles, de no-
em 1995. Viveu em Paris trabalhando para revis-
vembro de 2007 a fevereiro de 2008, e faz parte
tas e jornais brasileiros de 1999 a 2007. Hoje, é
da coleção do Instituto. Foi também incluído na
representada pela Galeria Tempo, em Copaca-
programação do PhotoIrelands Projections, em
bana.
Dublin, em julho de 2010, e do Fest Foto POA,
Além do projeto Bala Perdida, Anna também re-
em abril do mesmo ano. O ensaio ainda foi sele-
alizou trabalhos importantes como o vídeo-insta-
cionado pelo Festival Paraty em Foco, em 2010,
lação «Pourquoi faut-il toujours avoir un sens?»,
para ocupar a Galeria “O cubo”, transformado
sobre a imobilidade, que foi exibido no Centro
na instalação “Um minuto”. Recentemente, en-
Cultural do Correios, no Fotorio 2011; o ensaio
tre janeiro e fevereiro deste ano, o projeto foi exi-
“Olho mágico – Uma visão dos interiores de
bido na galeria Andreas Murkudis, na Potsdamer
Copacabana”, exposto no Centro Cultural da
Strasse, em Berlim, na Alemanha.
Justiça Federal, em 2009, e no Museu da Casa
Anna Kahn nasceu no Rio de Janeiro em 1968,
Brasileira, em São Paulo, este ano; e ainda par-
formou-se em jornalismo pela Pontifícia Univer-
ticipou do projeto “Fryslan through foreign eyes”,
sidade Católica (PUC-RJ), em 1992, e estudou
na Holanda, onde um fotógrafo de cada con-
fotografia na School of Visual Arts, em Nova York,
tinente teve de retratar a região norte do país
[ 32 ]
Carla, 21 anos, estudante de Minas Gerais, Em Copacabana, de férias, após saltar de um táxi p
[ 33 ]
Alice, 3 anos. Na Cidade de Deus, enquanto brincava na calçada
chamada Fryslân, no Wadden Sea. A respeito do projeto Bala Perdida, o escritor Zuenir Ventura apresenta assim as imagens da fotógrafa carioca: “O que mais impressiona na obra de Anna Kahn é que ela consegue fotografar justamente o que não pode ser fotografado: a ausência, o vazio, o silêncio que quase se ouve e se vê. A desolação. Não há lugar para nada, a não ser para a poesia _ uma triste poesia”. p
[ 34 ]
Claudio, 28 anos, estudante.No Andara铆, enquanto esperava um 么nibus. p
[ 35 ]
p
[ 36 ]
Aparecida, 68 anos, dona de casa. Em Copacabana, ao voltar para casa
Cรกtia, 32 anos, dona de casa. Na Praia de Copacabana, onde estava com amigos e a filha de oito anos p
[ 37 ]
p
[ 38 ]
Josué, 26 anos, estudante. Na Praça da Bandeira, andando de ônibus.
Maria de Fรกtima, 64 anos, dona de casa. No Flamengo, na porta de casa. p
[ 39 ]
p
[ 40 ]
Mariana, 7 anos. No Grajaú, no banco de trás do carro, a caminho da escola com a mãe.
Andr茅, 23 anos, estudante.Na Avenida Brasil, quando viajava de 么nibus.
p
[ 41 ]
Breno Rotatori
Fotos contra fotos de nha avó
Aos 82 anos de idade, Dona Ludmila decidiu que queria uma câmera fotográfica. Seu neto, o fotógrafo Breno Rotatori, 24 anos, deu a ela uma Canon analógica. Com a máquina em mãos, ela passou a registrar os principais acontecimentos de sua vida. As fotografias eram feitas em momentos de comemoração em família, como aniversários, almoços, datas comemorativas, e também nos seus momentos particulares. Assim, dona Ludmila passou a registrar as imagens dos seus dias.
p
[ 42 ]
Curioso pela imagem de uma senhora com uma câmera fotográfica nas mãos, Breno passou a fotografar os atos fotográficos de sua avó. Em diversos momentos, fotografou Dona Ludmila clicando e, ao mesmo tempo, passou a ser fotografado por ela. Aos poucos, essas simples fotos e contra-fotos da avó despertaram vários questionamentos em Breno. Principalmente, por causa das técnicas distintas adotadas para a captura das imagens: uma digital e outra analógica. “As fotos foram feitas no mesmo
p
[ 43 ]
instante, mas vejo as fotografias da minha avó e parece que foram feitas em outra época, na década de 80, por causa da estética da imagem analógica. Elas parecem estar em outro espaço-tempo”, explica Breno. Foi assim que surgiu o projeto Manélud, realizado entre 2009 e 2010. Como aponta o fotógrafo, lado a lado, as fotos, capturadas ao mesmo tempo, formam dípticos e diversos questionamentos começam a surgir: a representação diante da p
[ 44 ]
câmera, os assuntos que Dona Ludmila escolheu fotografar, a sensação de tridimensionalidade causada pelo efeito plano/contra-plano e a já citada relação de tempo entre as imagens digitais e feitas em filme. Muito além das reflexões sobre o fazer fotográfico, o trabalho de Breno mostra a profunda relação dele com a avó Ludmila. Uma atmosfera de alegria, carinho e ,acima de tudo, cumplicidade está implícita em cada imagem/contra imagem.
p
[ 45 ]
Seja nos momentos em que outras pessoas participam das fotografias, seja nas imagens feitas apenas com a participação dos dois, o que se vê são registros densos de intimidade e afeto, que brincam com o imaginário das relações entre netos e avôs. “Apesar de ter nascido de uma ideia simples, o resultado ficou bem interessante e propõe muitas discussões. Além disso, os sentidos das fotografias começam a ser extrapolados pelo pú-
p
[ 46 ]
blico e surgem outras interpretações que nem faziam parte do objetivo inicial do trabalho”, conta Breno. Breno Rotatori nasceu na cidade de São Bernardo, em São Paulo, em 1988, e se formou em Fotografia pelo Centro Universitário Senac, em 2009. A primeira exposição individual de seu trabalho foi na Holanda, no museu Foam em 2011, um ano depois de publicar o trabalho Manélud na edição Talent da revista do
p
[ 47 ]
próprio museu. Em janeiro deste ano, o trabalho de Breno integrou a exposição de fotografia brasileira Eloge du Vertige, na Maison Europene de la Photografie, em Paris. Além disso, entre 2009 e 2011, o fotógrafo paulista participou de diversas exposições coletivas de fotografia, no Brasil e no exterior. Atualmente, Breno Rotatori trabalha com fotografia e vídeo em São Paulo, explorando as possibilidades das linguagens audiovisuais.
p
[ 48 ]
Enquanto isso, a avó Ludmila continua fotografando e criando sua memória.
p
[ 49 ]
p
[ 52 ]
p
[ 53 ]
p
[ 54 ]
p
[ 55 ]
Claudio Edinger
A Serra Catarinense no foco seletivo de Claudio Edinger Um passeio pelas belas paisagens das cidades serranas do estado de Santa Catarina e seus personagens. Esta é a proposta do fotógrafo Claudio Edinger no ensaio Vocação para o Verde, reportagem fotográfica que venceu o Prêmio Abril de Jornalismo 2012, na categoria Visual. O projeto nasceu da inspiração do fotógrafo carioca em descobrir o que é o Brasil e resultou em belas imagens, e também palavras, que mostram as suas impressões sobre a paisagem colorida da Serra Catarinense. Com uma câmera de grande formato em mãos, Edinger explora nas suas capturas a técnica conhecida como tilt-shift, um estilo de fotografar que transforma cenários em miniaturas, e faz o chamado foco seletivo, guiando o olhar do leitor para faixas específicas da fotografia.
p
[ 56 ]
Os temas de suas imagens são a diversidade das paisagens com todo o seu esplendor e os moradores típicos destas regiões que, para o fotógrafo, parecem até de outro país. “As casas poderiam estar no velho continente. Fica claro que o Brasil do sul é outro”, relata Edinger sobre a sua viagem por Santa Catarina. Entre os registros feitos pelo fotógrafo, estão plantas ornamentais, cachoeiras, vitórias régias, ninféias e jardins, além dos descendentes de europeus que habitam esse “paraíso tropical”. “Uma população loira de olhos azuis que, em dia de jogo do Brasil versus Alemanha, coloca a bandeira germânica na janela”, escreve Edinger. As fotos feitas em Santa Catarina fazem parte de um grande projeto de mapeamento nacional desenvolvido por ele, que busca conhecer melhor o Brasil. Claudio Edinger morou 20 anos fora do país e diz que perdeu, literalmente, o foco da noção do que é o Brasil. Por isso, anda fotografando o Rio de Janeiro, São Paulo, o sertão da Bahia, a Amazônia e, mais recentemente, a Serra Catarinense em busca de respostas. Formado em Economia, Claudio Edinger nasceu em 1952 e quase brigou com o pai quando, em 1974, anunciou que seria fotógrafo. Foi morar em Nova York, em 1976, e só voltou ao Brasil em 1996, vinte anos depois. É autor de 14 livros fotográficos e um romance, intitulado “Um Swami no Rio”, publicado em 2009. Pela sua vasta produção fotográfica recebeu inúmeros prêmios internacionais, incluindo o
p
[ 58 ]
p
[ 60 ]
p
[ 61 ]
Prêmio Leica (duas vezes), o Prêmio Hasselblad, o Prêmio Higashikawa, o Prêmio Ernst Haas, Prêmio JP Morgan, Prêmio Pictures of The Year, Prêmio Abril, Prêmio Especial da Revista Life como finalista do W. Eugene Smith Award e por duas vezes recebeu o Premio Porto Seguro no Brasil. Suas fotos estão nas coleções do MASP, MIS, MAM, MAC, Pinacoteca, Museu Metropolitano de Curitiba, Metronòn (Barcelona), Higashikawa (Japão), AT&T Photo Collection, Equity International Photo Collection, Brazil Golden Art Fund, Itaú Cultural, Centro Cultural Banco do Brasil e nas maiores coleções particulares de fotografia do Brasil. Atualmente, Claudio Edinger vive e trabalha em São Paulo.
p
[ 62 ]
Pedro Motta
Natureza sobrepost
p
[ 64 ]
As cidades crescem, o verde diminui. Mas, às
a natureza pode assumir a qualquer momento.
vezes, o verde insiste em ficar ali e modificar o
O trabalho de Pedro Motta também questiona
cinza das paisagens urbanas. Pelos muros, entre
a relação entre o sujeito e a natureza, que es-
os toldos dos bares, nas calçadas ao lado dos
tão em constante atrito na sociedade contem-
postes. Muitas plantas não se rendem à urba-
porânea. As fotografias mostram que é possível
nização e criam cenas inesperadas. O registro
um convívio mútuo. “Muitas vezes, isso se mani-
desse cenário de persistência da vida e respeito
festa de forma harmônica, outras, menos equili-
do ser humano (como no caso das construções
bradas. Seria como uma sobrevida da natureza
que, em vez de cortar as árvores, se adaptam
em meio ao caos urbano”, explica Motta.
a elas) foi alvo do trabalho do fotógrafo mineiro
As imagens ainda podem ser compreendidas
Pedro Motta. O resultado das capturas, feitas ao
como um registro documental do atual cresci-
longo de quatro anos (2008 a 2012), está no en-
mento dos espaços urbanos. São testemunhos
saio intitulado Reação Natural.
da atual transformação das cidades brasileiras,
A série reúne 10 fotografias (100x100cm) que
cada vez mais cinzas. Contexto que, às vezes,
colocam em discussão a relação da nature-
passa despercebido aos olhos dos moradores.
za com o espaço urbano. São imagens que
Para Motta, as fotografias ainda podem ser en-
mostram como o verde consegue se sobrepor
caradas por um viés mais subjetivo e abstrato. “A
de maneira espontânea à arquitetura das ci-
ideia é abrir caminho para novas formas de rep-
dades. Galhos de árvores passam pelos muros
resentações, que falam de formas, de elemen-
de uma casa, uma planta cresce dentro de
tos estéticos, de deleite visual”, diz o fotógrafo
uma loja. As situações registradas em Reação
mineiro.
Natural apontam para um tipo de descontrole,
Natural de Belo Horizonte, Pedro Motta nasceu
de imprevisibilidade de formas e espaços que
em 1977. Concluiu o bacharelado em Dese-
p
[ 65 ]
p
[ 66 ]
p
[ 67 ]
p
[ 68 ]
nho, em 2002, na Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG, e trabalha com fotografia desde 1995. Ao lado de Pedro David e João Castilho, lançou o livro Paisagem Submersa, pela editora Cosac Naify, em 2008. Entre as principais exposições de Motta estão a “Paradoxos Brasil”, do programa Rumos Itaú Cultural Artes Visuais (2006); a mostra “Fotografia Contemporânea Brasileira”, que esteve em Berlim e percorreu outras cidades da Alemanha (2006); a “III Mostra do Programa Anual de Exposições do Centro Cultural São Paulo”, em São Paulo (2006), e a “Bolsa Pampulha”, no Museu de Arte da Pampulha, em Belo Horizonte (2004). O fotógrafo mineiro também expôs seu trabalho em locais como a 32ª edição do Panorama da Arte Brasileira (2011); a Galeria Luisa Strina (2012 e 2007); o Centro de Exposiciones SUBTE, Montevideo, Uruguay 2011; o Fotoseptiembre, Museu Ex-Teresa Arte Actual, México (2011); o Instituto Cervantes, Madrid, Espanha (2011); e a 2ª Bucharest Biennale, Romênia (2006). Atualmente, Pedro Motta vive e trabalha em Belo Horizonte e São João Del Rei, Minas Gerais. p
[ 69 ]
p
[ 70 ]
p
[ 71 ]
ent達o compar tilhe gostou www.revistafotografia.com.br
www.annakahn.com
www.pedromotta.net
www.cassiovasconcellos.com.br
www.claudioedinger.com
www.alexandresevero.com.br
www.brenorotatori.com
www.revistafotografia.com.br