Duarte pacheco e book

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Instituto Superior TÊcnico [s.d], Mårio Novais Galeria de Biblioteca de Arte/ Fundação Calouste Gulbenkian

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TĂ­tulo DUARTE PACHECO DO TÉCNICO AO TERREIRO DO PAÇO Direcção ComissĂŁo do CentenĂĄrio do Instituto Superior TĂŠcnico Apresentação AntĂłnio Cruz Serra PrefĂĄcio AntĂłnio Costa Coordenação cientĂ­fica Palmira F. Silva Textos Ana Homem de Melo e Sandra Vaz Costa Pesquisa de fontes documentais e legendas NĂşcleo de Arquivo do IST: Ana Rigueiro, Catarina Abranches e Filipa Soares Direcção executiva Filipa Soares Editora Althum.com Editor LuĂ­s NazarĂŠ Gomes RevisĂŁo de textos Ana Mateus Design grĂĄfico Henrique Cayatte Design com Ana Machado, Rita MĂşrias e Sara Aguiar ImpressĂŁo Printer Portuguesa TIRAGEM 2.000 exemplares ISBN 978-989-683-016-8 DEPĂ“SITO LEGAL 328 718 / 11 Lisboa, Junho de 2011 URL | 100.ist.utl.pt Av. Rovisco Pais 1059-001 LISBOA URL | althum.com Rua Conde de Sabugosa, 7 – 1.Âş Dt.Âş 1700-115 LISBOA info@althum.com Fotografia da capa Novo Campus do Instituto Superior TĂŠcnico [s.d], HorĂĄcio Novais Secretaria-Geral do MinistĂŠrio de Educação

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Agradecimentos Arquivo Municipal de Lisboa | NĂşcleo Arco do Cego, NĂşcleo FotogrĂĄfico Arquivo Nacional Torre do Tombo | DivisĂŁo de Comunicação Câmara Municipal de Lisboa | DivisĂŁo Municipal de Cultura | Gabinete de Estudos Olisiponenses Museu Municipal de LoulĂŠ | Centro de Documentação | Fototeca NĂşcleo de Arquivo e Documentação do IST NĂşcleo de Arquivo do IST – NArQ. Secretaria-Geral do MinistĂŠrio da Educação


14 | APRESENTAÇÃO ANTÓNIO CRUZ SERRA | PRESIDENTE DO IST

18 | PREFÁCIO ANTÓNIO COSTA | PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA

24 | O PAÍS A RÉGUA E ESQUADRO A OBRA PÚBLICA DE DUARTE PACHECO NOTA INTRODUTÓRIA ESBOÇO BIOGRÁFICO O MITO

46 | OS ANOS DE FORMAÇÃO (1900-1923) UMA FAMÍLIA DE POLÍTICOS

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58 | DUARTE PACHECO O POLร TICO NA ACADEMIA DO PARDIEIRO DA BOAVISTA AO COLOSSO DA ALAMEDA: O Tร CNICO NOVO A CONSTRUร ร O DO Tร CNICO: O DECRETO, O PROJECTO E O CONCRETO

90 | O ENGENHEIRO NA โ RES PUBLICAโ A INSTRUร ร O: SETE MESES E UM PAร S DUARTE PACHECO E LISBOA: AS MUDANร AS NA CIDADE OBRAS Pร BLICAS E COMUNICAร ร ES (1932-1936/1938-1943): O PLANO METร DICO

152 | FONTES DOCUMENTAIS 154 | BIBLIOGRAFIA

Instituto Superior Tรฉcnico [s.d], Mรกrio Novais Galeria de Biblioteca de Arte/ Fundaรงรฃo Calouste Gulbenkian

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O homem vale, sobretudo, pela educação que possui, porque só ela Ê capaz de desenvolver harmoniosamente as suas faculdades, de maneira a elevarem-se-lhe ao måximo, em proveito dele e dos outros

Primeiro diploma legislativo da RepĂşblica para a reforma do ensino bĂĄsico, 29/03/1911.

APRESENTAĂ‡ĂƒO Prof. AntĂłnio Cruz Serra

O Ministro das Obras Públicas discursando durante a inauguração do bairro económico de BelÊm 12 de Junho de 1938, autor desconhecido Arquivo Nacional Torre do Tombo/ Fundo Empresa Pública Jornal O SÊculo

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Em Outubro de 1910, a I República foi implantada num Portugal abalado por crises profundas; uma crise social provocada pelo fraco desenvolvimento industrial e pela deslocação da população para as grandes cidades, nas quais não conseguiam trabalho; uma grave crise económico-financeira associada a uma crescente dívida pública, à falência de bancos e à falta de investimento, interno e externo, e uma crise de confiança nos poderes políticos, despoletada pelos frequentes escândalos de corrupção. A receita republicana para vencer esta crise generalizada da sociedade portuguesa assentava na educação, uma educação voltada para o esclarecimento das consciências, isto Ê, como escreveu Rómulo de Carvalho, uma instrução segura e experimental que permitisse ao Homem adquirir o esteio que haveria de firmar o edifício moral da sua alma. Uma educação que permitisse tirar Portugal da cauda do mundo ocidental e que possibilitasse a modernização a todos os níveis de que o País necessitava. A 23 de Novembro de 1910, Brito Camacho foi nomeado Ministro do Fomento do Governo Provisório da recÊm-criada República Portuguesa. Uma das suas prioridades, como escreveu uns anos depois no periódico A Lucta, era a reforma do Instituto Industrial e Comercial de Lisboa (IICL), para o que imediatamente convidou Alfredo Bensaude, que nomearia director do IICL no início de Dezembro. O relatório que em poucos meses Alfredo Bensaude elaborou para Brito Camacho indicava o óbvio: para reformar o tecido produtivo nacional e concretizar a mudança do país era necessårio alterar radicalmente o paradigma do ensino da engenharia. A reforma do ensino industrial e comercial em Portugal proposta por Bensaude foi aceite na íntegra por Brito Camacho. Assim, o Decreto de 23 de Maio de 1911 desdobrou, o IICL em duas novas escolas, o Instituto Superior TÊcnico e o Instituto Superior do ComÊrcio, actual ISEG. Com um Ministro menos inteligente e menos livre dos preconceitos da rotina do que o Sr. Dr. Brito Camacho, a criação do Instituto, em bases que conduziram a bons resultados imediatos, não teria sido possível, escreveria Bensaude uns anos depois nas suas Notas Histórico-pedagógicas, reconhecendo o momento histórico inÊdito


DUARTE PACHECO – DO TÉCNICO AO TERREIRO DO PAÇO APRESENTAĂ‡ĂƒO

que presidiu a criação do IST. Estas bases foram a total autonomia científico-pedagógica com que o Instituto foi criado e que permitiram a criação de uma escola com elevados padrþes de excelência e exigência, desenvolvendo uma cultura muito própria, o espírito de escola que nos distingue. Mas esse momento histórico seria apenas isso: um momento que se esfumou rapidamente. E essa autonomia começou quase imediatamente a ser atacada. Quatro anos depois, em 1915, Bensaude escrevia uma Representação dirigida pelo Conselho Escolar ao Parlamento, pedindo a revogação de uma lei que comprometia a continuidade dos cursos superiores de engenharia. A irresistível ânsia reformadora dalguns dos nossos governantes ia arruinando a obra do Instituto, explicou. Para alÊm disso, nunca foi concretizada a promessa de construção de instalaçþes condignas ao ensino da engenharia que, citando ainda Bensaude, carece de grandes laboratórios, salas de desenho, oficinas, etc., e que não se poderå desenvolver entre nós, enquanto não possuirmos um edifício apropriado onde esse ensino se possa fazer convenientemente. Em 1919, sem esperanças de conseguir financiamento para a ambicionada construção de um edifício condigno e cansado dos ataques legislativos à nova instituição, Bensaude pediu a demissão de director do TÊcnico, cargo que abandonou definitivamente em 1920. Foi preciso esperar por 1925 e pela entrada de Duarte Pacheco no corpo docente do IST para a situação se alterar. No primeiro Conselho Escolar do IST a que teve direito da palavra, em 1926, Duarte Pacheco propôs-se resolver, no espaço de um ano, o problema das instalaçþes degradadas em que funcionava a Escola. Um homem de acção que se movimentava com muito à vontade nos meios políticos, Duarte Pacheco conseguiu o que tantos tinham infrutiferamente tentado nos 15 anos de existência do TÊcnico: os fundos e as condiçþes necessårias ao arranque das obras de construção de um TÊcnico novo. Essas condiçþes passavam por uma autonomia financeira tão inÊdita quanto o fora a autonomia científico-pedagógica conseguida por Alfredo Bensaude. Com essa autonomia e com uma gestão rigorosa dos dinheiros públicos, Duarte Pacheco conseguiu construir o primeiro campus universitårio pensado e criado de raiz, concretizando nos edifícios da Alameda os ideais pedagógicos do fundador do IST. As primeiras obras no futuro campus tiveram início logo em 1928 e cinco anos depois suscitavam jå inúmeras críticas, em particular às suas dimensþes, consideradas exageradas por muitos. Indiferente às críticas, à amplitude da construção, que pasmava alguns, e à composição estÊtica, que afligia outros tantos, Duarte Pacheco persistiu e as obras foram prosseguindo, mesmo depois da mudança, em 1935, para as novas e nunca inauguradas instalaçþes. TambÊm em 1928, Duarte Pacheco deu início a uma actividade política que colocou o país na rota da modernidade que Brito Camacho

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desejava com a criação do TÊcnico. Em 1938, as solicitaçþes políticas obrigaram Duarte Pacheco a abandonar o cargo de director do TÊcnico. No entanto, nunca abandonou a sua Escola, como se comprova pelo facto de em 1942 ter subscrito ao IST verba para o início da construção do laboratório de Hidråulica. Em 1943, faleceu o ministro das Obras Públicas e Comunicação que marcou não só o TÊcnico que hoje somos como todo um país. Os pavilhþes de Hidråulica e de Måquinas e Motores ficaram por construir embora os projectos que deixou tenham orientado as obras públicas muito para alÊm da sua morte. Camus afirmava que a verdadeira generosidade para com o futuro consiste em dar tudo ao presente. Quer Alfredo Bensaude quer Duarte Pacheco, os directores do TÊcnico Velho e do TÊcnico Novo que permitiram a transformação do IST numa Escola de referência a nível nacional e internacional, poderiam ser os inspiradores deste aforismo. Ambos extraordinårios, estes dois homens conjugam o que deve ser um engenheiro do TÊcnico, alguÊm que sabe e que sabe fazer.

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“Duarte Pacheco nĂŁo sĂł escolheu uma localização privilegiada para a sua Escola, como redefiniu (...) os limites do territĂłrio urbanizado da cidade inscrevendo o TĂŠcnico num vector de expansĂŁo de Lisboa.â€? Dr. AntĂłnio Costa Presidente da Câmara Municipal de Lisboa

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PREFĂ CIO Dr. AntĂłnio Costa

O ano de 1938 foi um ponto de viragem na histĂłria da cidade de Lisboa. No primeiro dia desse ano, Duarte Pacheco tomou posse no cargo de Presidente da Câmara Municipal de Lisboa. Convidado de novo para o cargo de Ministro das Obras PĂşblicas meses depois, Duarte Pacheco, retomou o lugar com poderes reforçados, que lhe permitiram concretizar os planos de urbanização, pensados pela primeira vez a nĂ­vel territorial na sua primeira passagem pelo MinistĂŠrio, entre 1932 e 1936. Director do Instituto Superior TĂŠcnico aos vinte e seis anos, a obra pĂşblica de Duarte Pacheco começou com a revolução urbanĂ­stica que promoveu nas imediaçþes das novas instalaçþes do seu Instituto. A escolha da localização do primeiro campus universitĂĄrio nĂŁo foi acidental, a informação que recolheu no gabinete BeirĂŁo da Veiga, vereador da Câmara e docente do IST, permitiu ao Sonhador de Grandes Coisas delinear o seu primeiro sonho. Duarte Pacheco nĂŁo sĂł escolheu uma localização privilegiada para a sua Escola, como redefiniu com essa escolha os limites do territĂłrio urbanizado da cidade inscrevendo o TĂŠcnico num vector de expansĂŁo de Lisboa. Pela mĂŁo de Duarte Pacheco, uma nova geração de arquitectos foi integrada nos serviços tĂŠcnicos do gabinete de urbanismo da Câmara Municipal de Lisboa. Entre eles destaco, para alĂŠm de Étienne de GrĂśer, que definiu o Plano Geral de Urbanização e ExpansĂŁo de Lisboa e as grandes linhas de desenvolvimento da cidade, Faria da Costa, o primeiro urbanista portuguĂŞs, e Keil do Amaral. O programa de melhoramentos urbanos desenvolvido sob a presidĂŞncia de Duarte Pacheco ĂŠ demasiado extenso para enumerar. Mais do que as grandes obras a que normalmente se associa Duarte Pacheco, gostaria de relembrar a sistematização que imprimiu ao planeamento da cidade, um trabalho pioneiro que deu origem ao primeiro Plano Director de Lisboa, um trabalho com a precisĂŁo, rigor e exigĂŞncia que bebeu na Escola que o formou.

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DUARTE PACHECO – DO TÉCNICO AO TERREIRO DO PAÇO PREFà CIO

A ligação da cidade ao TÊcnico foi assim estreitada por um dos seus insignes directores, aquele que lançou não só a sua Escola como a própria cidade na rota da modernidade. Duarte Pacheco foi um engenheiro político ou um político engenheiro que, hå mais de sete dÊcadas, nos mostrou que a colaboração entre a cidade e a academia Ê um factor importante para o seu crescimento e sustentabilidade. Hoje, no contexto de uma economia do conhecimento, competitiva e dinâmica, essa colaboração Ê cada vez mais indispensåvel. Este livro, que nasce de uma colaboração entre o IST e um Gabinete da CML, o Gabinete de Estudos Olisiponenses do Município de Lisboa, mostra-nos o passado muito específico e desejavelmente irrepreensível, hoje no Portugal democråtico.

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O Ministro Duarte Pacheco [s.d.], autor desconhecido Museu Municipal de LoulÊ/Centro de Documentação/Fototeca

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JosÊ Duarte Pacheco [c. 1942] Alvão, Porto Museu Municipal de LoulÊ/ Centro de Documentação/Fototeca

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NOTA INTRODUTĂ“RIA Sandra Vaz Costa 1

Do extenso quadro de nomes que integraram o Governo de Oliveira Salazar, Duarte Pacheco Ê, seguramente, o mais conhecido dos seus ministros. A vida de Duarte Pacheco foi curta: 43 anos, 7 meses e 7 dias. Em vinte anos de causa pública reformou, legislou, programou e construiu. Nesse mesmo espaço de tempo angariou admiradores e adversårios. A sua presença não foi discreta e a sua forma de fazer política não foi consensual. Empregou mão-de-obra barata para erguer as infra-estruturas que o País não tinha. E porque o País não tinha recursos, escudado no braço forte da lei, expropriou propriedades esventrando quintas e demolindo imóveis, para encurtar espaço no rasgar de uma estrada, ou para definir o perímetro de salvaguarda de um monumento. A classe política estremecia à exposição das suas ideias, e o Governo oscilava entre o temor do embaraço e a certeza da obra feita. Vítima de acidente de viação aos 43 anos de idade, legou ao País uma obra impressionante em número, mas vazia de herdeiros políticos. Mas dentro nesse vazio a política fez nascer o mito: um mito construído, encenado e alimentado; a elegia de um homem que votara a sua vida à causa pública e que morrera ao serviço da Nação. No limiar dos setenta anos volvidos sobre a morte de Duarte Pacheco, o carisma do ministro permanece, permanecendo tambÊm a dualidade de opiniþes. Não se questiona a capacidade de trabalho, a necessidade ou a qualidade da obra construída, questiona-se muitas vezes sobre o modus operandi do ministro e o regime político que integrou. Com a queda do Estado Novo desmoronou-se um sistema político e com ele muitas instituiçþes e reputaçþes. A Ponte Salazar mudou de nome, o Viaduto Duarte Pacheco manteve-se. Pelo País existem avenidas, ruas, escolas e edifícios Duarte Pacheco porque as figuras incontornåveis da história são as mesmas que habitam o nosso quotidiano. 1

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IHA – Centro de Investigação do Instituto de HistĂłria da Arte da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.


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ESBOÇO BIOGRà FICO

EM CIMA

MĂŁe de Duarte Pacheco, Maria do Carmo Pacheco [s.d], autor nĂŁo identificado In Revista Municipal: nĂşmero especial dedicado Ă memĂłria do Engenheiro Duarte Pacheco. Lisboa: Câmara Municipal de Lisboa, Jan. 1944. Museu Municipal de LoulĂŠ/Centro de Documentação FamĂ­lia de Duarte Pacheco, (Duarte ĂŠ o 4Âş elemento da esquerda para a direita, no topo) [c. 1902], autor nĂŁo identificado In Revista Municipal: nĂşmero especial dedicado Ă memĂłria do Engenheiro Duarte Pacheco. Lisboa: Câmara Municipal de Lisboa, Jan. 1944. Museu Municipal de LoulĂŠ/Centro de Documentação Casa onde nasceu Duarte Pacheco [s.d], autor desconhecido Museu Municipal de LoulĂŠ/Centro de Documentação/Fototeca Ă€ ESQUERDA

Duarte Pacheco [c. 1902], Atelier Veiga, Faro Museu Municipal de LoulÊ/Centro de Documentação/Fototeca

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Duarte Pacheco nasceu em LoulĂŠ no dia 19 de Abril. Atesta o assento de baptismo que terĂĄ nascido no ano de 1899. Afirmava o polĂ­tico que nascera em 1900 e que o pĂĄroco, por engano, lhe atribuĂ­ra mais um ano de vida. Quarto filho de JosĂŠ Azevedo Pacheco e de Maria do Carmo Pacheco teve trĂŞs irmĂŁos e sete irmĂŁs. Ă“rfĂŁo de mĂŁe aos seis anos de idade e de pai aos catorze anos, frequentou o ensino em LoulĂŠ atĂŠ ao terceiro ano do liceu. No ano lectivo de 1916/17 transitaria para o Liceu de Faro, concluindo o 7Âş ano com a classificação de 17 valores. Matriculado no Instituto Superior TĂŠcnico em Lisboa no ano lectivo de 1917/18, nas disciplinas de Engenharia Geral, concluiria o curso de Engenharia ElectrotĂŠcnica e MĂĄquinas no ano lectivo de 1922/23. Professor interino do IST para a disciplina de MatemĂĄticas Gerais em 1925, passaria a professor efectivo em 1926. No mesmo ano, seria nomeado director interino do IST e em 1927 director efectivo. De 19 de Abril a 10 de Novembro de 1928 desempenharia o cargo de Ministro da Instrução PĂşblica, regressando Ă direcção do IST ainda em Novembro do mesmo ano e atĂŠ ao dia 5 de Julho de 1932, data em que seria nomeado Ministro do ComĂŠrcio e Comunicaçþes. A 7 de Julho de 1932 o mesmo MinistĂŠrio, com atribuiçþes reforçadas, passaria a denominar-se MinistĂŠrio das Obras PĂşblicas e Comunicaçþes. Na remodelação ministerial de 18 de Janeiro de 1936, o seu nome era preterido e regressava Ă direcção do IST atĂŠ 31 de Dezembro de 1937. No dia 1 de Janeiro de 1938 tomaria posse como Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, cargo de que viria a abdicar a 25 de Maio do mesmo ano por impossibilidade de acumulação de cargos pĂşblicos: a partir desta data Duarte Pacheco integraria de novo o corpo governamental como Ministro das Obras PĂşblicas e Comunicaçþes. No desempenho dos cargos pĂşblicos que lhe foram confiados, foi distinguido com a GrĂŁ-cruz da Ordem Militar de Cristo a 29 de Junho de 1933 e com a GrĂŁ-cruz da Ordem de Santiago de Espada a 9 de Dezembro de 1940. A 9 de Junho de 1941 foi homenageado pelos MunicĂ­pios do PaĂ­s, como forma de agradecimento pela pronta resposta como reagiu aos prejuĂ­zos causados pelo ciclone que assolou o PaĂ­s a 15 de Fevereiro desse mesmo ano.


DUARTE PACHECO – DO TÉCNICO AO TERREIRO DO PAÇO O PA�S A RÉGUA E ESQUADRO

Duarte Pacheco, aluno do IST [c. 1918], autor desconhecido In Revista Municipal, número especial em memória a Duarte Pacheco Museu Municipal de LoulÊ/Centro de Documentação

A 16 de Novembro de 1943 morreria no Hospital de Setúbal, vítima dos graves ferimentos causados pelo acidente de viação sofrido cerca de Vendas Novas, quando regressava a Lisboa, depois de mais uma vistoria a uma das obras em curso: causa da morte; esmagamento da perna direita e colapso circulatório2.

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A causa clĂ­nica da morte de Duarte Pacheco estĂĄ descrita no Livro de Assento de defuntos do CemitĂŠrio do Alto de SĂŁo JoĂŁo, Livro de Registo n.Âş 4356, de 17 de Novembro de 1943, NÂş de Guia 505, Freguesia de Santa Isabel; “Nome Duarte JosĂŠ Pacheco ou Duarte Pacheco, com local de sepultura no MausolĂŠu dos BenemĂŠritos da Cidade, por Ordem de Serviço NÂş 59 da Câmara Municipal de Lisboa em 16 de Novembro de 1943â€?.


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O MITO

O Buick que transportava Duarte Pacheco 1943, autor desconhecido Museu Municipal de LoulÊ/Centro de Documentação/Fototeca

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Na manhã do dia 15 de Novembro, o ministro saíra de Lisboa com destino a Vila Viçosa, com o objectivo de vistoriar os trabalhos finais do Monumento a D. João IV que tinha data de inauguração marcada para dia 8 de Dezembro. A pressa não movia o ministro, movia-o a insistência. Inscrito no calendårio das Comemoraçþes dos Centenårios, o Monumento a D. João IV deveria ter sido inaugurado em 1940, mas por vicissitudes vårias a obra arrastara-se no tempo3. Duarte Pacheco deslocou-se a Vila Viçosa com uma equipa de 5 colaboradores e terminada a sessão de trabalho no paço ducal, a equipa regressava de imediato a Lisboa: na agenda, o expediente encerrava com uma reunião do Conselho de Ministros. Contudo, viagem de regresso nunca se concluiu. Na Cova do Lagarto, ao km 65 da Estrada Nacional nº 4 que liga Montemor-o-Novo a Vendas Novas, cerca das 17h30 ocorreu um despiste. O carro do ministro embateu violentamente contra uma årvore e capotou. Dos seis ocupantes da viatura, quatro sofreram ferimentos ligeiros, Jorge Gomes de Amorim teve morte imediata e o ministro apresentava um grave ferimento na perna direita. Assistido nos Serviços de Saúde da Escola Pråtica de Artilharia de Vendas Novas, foi depois evacuado para o Hospital de Setúbal, e aí foi assistido pela 3 Sobre a cronologia da obra do Monuequipa mÊdica residente. A himento a D. João IV no Paço Ducal de Vila Viçosa V. SAIAL, Joaquim, Estapótese de amputação da perna tuåria Pública Portuguesa. Os Anos não poderia salvar o ministro: a 30 (1926-1940), Lisboa, Bertrand Editora, 1991, pp. 171-179. violência do embate no momen-


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Alunos do Instituto Superior TÊcnico a transportar o caixão do Engenheiro Duarte Pacheco. 1943, autor desconhecido Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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“Uma vida velozmente vivida e inteiramente consagrada ao progresso pĂĄtrioâ€? AntĂłnio de Oliveira Salazar in Monumento de Duarte Pacheco em LoulĂŠ

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DUARTE PACHECO – DO TÉCNICO AO TERREIRO DO PAÇO O PA�S A RÉGUA E ESQUADRO

to do acidente provocara graves hemorragias internas. Duarte Pacheco viria a falecer na madrugada de dia 16. O Governo decretou funerais nacionais com todas as honras militares4. O corpo do ministro chegou a Cacilhas em ambulância cerca das 7h00, atravessou o Tejo num cacilheiro que atracou ao Cais do SodrÊ às 8h05 e daí seguiu para o Salão Nobre dos Paços do Concelho, onde ficou em câmara ardente atÊ às 11h00 do dia seguinte. No dia 16 desceu um vazio sobre o País: o Rådio Clube Português cancelou a emissão, as bandeiras dos serviços públicos, dos municípios, das universidades e dos institutos desceram a meia haste e no dia 17, dia das exÊquias, Lisboa saiu à rua em silêncio e vestida de negro. As direcçþes da União de GrÊmios de Lojistas de Lisboa e dos GrÊmios Concelhios de Comerciantes de todos os gÊneros, bens e serviços, fizeram um convite a todos os associados para que encerrassem portas5. No Salão Nobre da cidade, pelas 10h00 da manhã, na estrita regra protocolar de Estado, o arcebispo de Mitilene celebrou missa de corpo presente que foi acompanhada pela Orquestra Sinfónica da Emissora Nacional. Terminada a homilia, seguiu-se o cortejo fúnebre com traçado definido pelo protocolo, sendo o fÊretro precedido por um grupo de esquadrþes de cavalaria e escoltado por esquadrþes de infantaria da Guarda Nacional Republicana. Chegados ao CemitÊrio do Alto do S. João, ficaram os restos mortais do ministro depositados no MausolÊu dos BenemÊ- 4 Diårio do Governo, I SÊrie, Suplemento, Decreto-Lei n.º 33.240. de 16 de ritos da Cidade de Lisboa. de 1943. Duarte Pacheco extinguira-se 5 Novembro Diårio de Lisboa, 16 de Novembro de fisicamente. Mas não mais que 1943. 6 No dia 18 de Novembro o Diårio do isso. O Governo acabara de perGoverno decretava a nomeação der o Ministro das Obras Públiinterina de Duarte João Pinto da Costa Leite como Ministro das cas. Um homem solteiro, sem Obras Públicas e Comunicaçþes. herdeiros directos e um minisSó na remodelação ministerial de 6 de Setembro de 1944 surgiria a tro sem herdeiros políticos6. Na nomeação definitiva de Augusto semana sequente à sua morte, os Cancela de Abreu como Ministro das Obras Públicas e Comunicaçþes. jornais agitaram-se na publica-

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Funeral de Duarte Pacheco em Lisboa 1943, autore desconhecido Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses


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Funeral de Duarte Pacheco em Lisboa 1943, autor desconhecido Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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ção de textos com vincado elogio fĂşnebre7. Em unĂ­ssono relatam a precoce orfandade de Duarte Pacheco na cidade onde nasceu, LoulĂŠ; exaltam o brilhante percurso e distinção obtida no Liceu de Faro; clamam a ascensĂŁo meteĂłrica no Instituto Superior TĂŠcnico, onde de aluno caloiro a director nĂŁo mediou 10 anos. Quanto ao enorme edifĂ­cio que compĂľe a sua acção polĂ­tica, os mesmos jornais sĂŁo unânimes na classificação da actividade ministerial: plano grandioso, pensamento e acção, cultura disciplinada, capacidade de trabalho, sĂŁo apenas algumas das palavras-chave. No dia 18 de Novembro, em sessĂŁo da Câmara Municipal de Lisboa, Eduardo Rodrigues de Carvalho protagoniza o primeiro discurso institucional sobre o falecido ministro8. Presidente substituto da Câmara Municipal de Lisboa desde 1938, altura em que Duarte Pacheco renuncia ao cargo por incompatibilidade de acumulação com a pasta das Obras PĂşblicas, conhecedor do trabalho e do mĂŠtodo do ministro, seu 7 Cfr. O SĂŠculo, “Esboço BiogrĂĄficoâ€?, colaborador desde os tempos 16.11.1943; Idem, “O Ăşltimo sonho de Duarte Pachecoâ€? 17.11.1943; Ibide trabalhos preparatĂłrios ao dem, “O Duro OfĂ­cio de Governarâ€?, projecto das Gares MarĂ­timas, 22.11.1943. Cfr. Jornal de NotĂ­cias “Ao serviço da Naçãoâ€?, 19.11.1943; Rodrigues de Carvalho foi seCfr. DiĂĄrio de NotĂ­cias “O Ăşltimo guramente um dos homens de adeus a Lisboaâ€?, 20.11.1943. 8 A Exposição de Eduardo Rodrigues confiança do polĂ­tico. de Carvalho estender-se-ia ainda No discurso proferido, Rodripela sessĂŁo camarĂĄria de 25 de Novembro. gues de Carvalho enaltece a obra


“ Ele estĂĄ e perdurarĂĄ consciente ou inconscientemente, na alma (‌) de mui geraçþes vindouras, que sofrerĂŁo a influĂŞncia dinâmica desse gĂŠnio nacional que cruzou, fugaz o espaço portuguĂŞs.â€? Jaime Rua, in A Voz de LoulĂŠ

Funeral de Duarte Pacheco em Lisboa 1943, autor desconhecido Museu Municipal de LoulÊ/ Centro de Documentação/Fototeca

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operada por Duarte Pacheco na cidade de Lisboa, relembrando o impulso inĂŠdito promovido pela construção das novas instalaçþes do IST. Relembra obras como a requalificação no abastecimento de ĂĄgua Ă cidade e sublinha ainda a boa relação municĂ­pio-ministĂŠrio face Ă iniciativa do ministro em promover a elaboração do tĂŁo necessĂĄrio plano de urbanização e extensĂŁo da cidade. Em reconhecimento dos melhoramentos operados pelo ministro, Rodrigues de Carvalho lança quatro propostas: que a tĂ­tulo pĂłstumo lhe seja concedida a medalha de ouro da cidade e o nome aposto na lista de benemĂŠritos; que seja dado o seu nome a uma das principais artĂŠrias da cidade, relacionada com a sua obra; que se proceda ao estudo e realização de um mausolĂŠu funerĂĄrio e que se proceda ao estudo da forma e local onde se perpetue o reconhecimento municipal pela obra ministerial9. A proposta lançada por Rodrigues de Carvalho darĂĄ inĂ­cio a um debate velado acerca da edificação de um monumento em memĂł- 9 CARVALHO, Eduardo Rodrigues de, “A Obra do Engenheiro Duarte Pacheria de Duarte Pacheco, situação co no MunicĂ­pio de Lisboaâ€?, in Boletim 10 que perdurarĂĄ atĂŠ 1952 . do Comissariado do Desemprego, A 25 de Novembro, a 2ÂŞ sessĂŁo leLisboa, Imprensa Nacional, 1934gislativa da III Legislatura da As- 10 1974, Boletim de 1943, pp. 89-105. Data em que em definitivo tem inĂ­cio sembleia Nacional foi consagrada a construção do Monumento a Duarte Pacheco, em LoulĂŠ. Ă memĂłria do falecido ministro. Cfr. CML, Actas das SessĂľes da CâProferiram discurso o Presidente mara Municipal, Actas NÂş 74 e 75, sessĂľes da CML realizadas nos dias da Assembleia, o Presidente do 18 e 25 de Novembro e dias 9, 18, 27 Conselho e trĂŞs deputados. Num e 30 de Dezembro de 1943. Cfr. ELIAS, Helena Catarina da Sildiscurso breve e linear, o Presiva Lebre, Arte PĂşblica e Instituiçþes dente da Assembleia Nacional do Estado Novo – Arte PĂşblica das enunciou as caracterĂ­sticas mais Administraçþes Central e Local do Estado Novo em Lisboa: Sistemas de evidentes de Duarte Pacheco: perEncomenda da CML e do MOPC/MOP sonalidade forte e rica, capacida(1938-1960), Barcelona, dissertação de mestrado apresentada ao Deparde de trabalho, espĂ­rito de iniciatamento de Escultura da Faculdade tiva, agudeza mental, poder de rede Belas Artes da Universidade de Barcelona, 2006, pp. 320-322. alização e força de vontade. Equi-

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Desenho e maqueta do mausolĂŠu previsto para acolher os restos mortais de Duarte Pacheco no cemitĂŠrio do Monsanto, da autoria do Arquitecto Keil do Amaral 1943, autor desconhecido Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses Aspecto geral do projecto do monumento em homenagem a Duarte Pacheco previsto para a Serra do Monsanto – Parque Florestal, da autoria do Arquitecto Keil do Amaral 1943, autor desconhecido Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses


Inauguração do Monumento ao Engenheiro Duarte Pacheco em LoulÊ 1953, autor desconhecido Museu Municipal de LoulÊ/Centro de Documentação/Fototeca

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O Presidente do Conselho e alguns membros do Governo à porta dos Paços do Concelho à saída do funeral do Ministro das Obras Públicas, Eng. Duarte Pacheco. 17 de Novembro de 1943, autor desconhecido C.M.L./Secção de Propaganda e Turismo Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

para a morte do ministro a proporçþes de uma verdadeira perda nacional11. O discurso do Presidente do Conselho, muito breve, como o prĂłprio reconhece, abre o espaço polĂ­tico necessĂĄrio Ă instrumentalização da memĂłria do falecido ministro: um ministro com impulso de dinamismo, intensa felicidade de criar, poder de resolução e vontade de aço. Um engenheiro que detestava as improvisaçþes, que adiava os problemas atĂŠ ao seu estudo exaustivo mas definitivamente resolvido. Um ministro desinteressado atĂŠ Ă renĂşncia, resignado ante a incompreensĂŁo, mas confiante no sentimento de gratidĂŁo do povo. Um ministro que podia ter morrido na função, envelhecido precocemente mas que em lugar disso, morreu ao serviço dela, vĂ­tima dela. Um homem pĂşblico que tomava a peito servir o interesse de todos12. No inĂ­cio do discurso, Salazar remetia para um outro momento aquelas palavras de louvor e de justiça para dizer um dia. Demoraria dez anos para voltar a proferir palavras em memĂłria de Duarte Pacheco13. No dia 20 de Dezembro, pouco mais de um mĂŞs apĂłs a morte do polĂ­tico, na abertura da sessĂŁo plenĂĄria do Conselho Superior de Obras PĂşblicas, sessĂŁo a que presidiu o ministro interino Costa Leite, o presidente do douto conselho, 11 Cfr. “Uma SessĂŁo na Assembleia NaAntĂłnio Vicente Ferreira, profecional: O Discurso do Presidente da Assembleia Nacionalâ€? in Boletim do ria o Ăşltimo discurso do ano e o Comissariado do Desemprego, LisĂşltimo dos elogios fĂşnebres. boa, Imprensa Nacional, 1934-1974, Boletim de 1943, pp. 78-79. Para o presidente do CSOP, 12 SALAZAR, AntĂłnio Oliveira, “Na Moraquele que havia sido seu aluno, te de Duarte Pachecoâ€?, in Discursos e Notas PolĂ­ticas, vol. IV, 1943-1950, colega, director no IST e seu amigo, Coimbra, Coimbra Editora Lda., 1951, era um homem raro. No discurso pp. 23-27. de Vicente Ferreira surge um 13 Salazar sĂł voltaria a mencionar o nome de Duarte Pacheco em Novemnovo, tĂŠnue, mas decisivo porbro de 1953, em LoulĂŠ, por ocasiĂŁo menor: Duarte Pacheco ĂŠ o exeda inauguração do monumento em memĂłria do ministro. cutor de um plano maior, traça-

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“Seria errado chamar-lhe um produto tĂ­pico da Escola, porque ele foi um homem verdadeiramente singular, fora de todos os esquemas.â€? Eduardo R. Arantes e Oliveira, in Obras PĂşblicas em Portugal no SĂŠculo XX

do por mão mestra: nas palavras do presidente do CSOP, o falecido ministro era o colaborador ideal que Oliveira Salazar encontrara para a execução do seu plano de obras públicas14. Os números de Dezembro de 1943 das revistas da Ordem dos Engenheiros, do Sindicato dos Arquitectos e da Associação de Estudantes do IST, a par de tantas outras, prestam tambÊm, ao falecido ministro, as suas homenagens. Nos números publicados no primeiro trimestre do ano de 1944, alguns periódicos retomam o acontecimento. A Revista Municipal da Câmara de Lisboa dedica um número especial à memória do falecido ministro elencando a relação das obras mais emblemåticas da capital planeadas e dirigidas pelo gabinete ministerial e publica um dos raros discursos de Duarte Pacheco15. O Boletim do Comissariado do Desemprego reserva o primeiro capítulo à memória do ministro, reúne um dossier de imprensa com artigos publicados sobre Duarte Pacheco à data do seu falecimento e faz uma listagem estimativa das obras mandadas executar pelo ministro, ao abrigo do programa de financiamento subsidiado pelo Fundo de Desemprego:

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“Basta dizer que foram lavradas portarias para comparticipaçþes de 7.100 obras, num valor total de 300.000 contosâ€?. 16

No primeiro nĂşmero de 1944 da Revista Panorama, revista de arte e turismo editada pelo SPN/SNI, enfatiza a vida e obra do falecido ministro e publica um texto de AntĂłnio Ferro e um texto de Cottinelli Telmo. Na opiniĂŁo de Cottinelli, Duarte Pacheco ĂŠ o Sonhador de Gran- 14 CSOP, Livro de Actas das SessĂľes PlenĂĄrias, Acta nÂş 8, de 20 de Dezemdes Coisas17. NĂŁo se distanciando de 1943. do conteĂşdo e do estilo da alo- 15 bro O nĂşmero especial de 1944 da Recução feita aos microfones da vista Municipal da Câmara Municipal de Lisboa publica o discurso Duarte Emissora Nacional, aquando Pacheco aquando da tomada de pos18 da morte do ministro , o texto se no segundo mandato de Ministro das Obras PĂşblicas e Comunicaçþes, que AntĂłnio Ferro encerra um cerimĂłnia que teve lugar no dia 25 de ciclo que se vinha formando Maio de 1938. desde Novembro de 1943. Em 16 “A obra do Engenheiro Duarte Pacheco atravĂŠs do Comissariado do DetrĂŞs meses a memĂłria e a imasempregoâ€?, in Boletim do Comissariado do Desemprego, ano 1944, Lisboa, gem do ministro fora burilada Imprensa Nacional, pĂĄg. 26. ao pormenor, e Ferro, no seu 17 TELMO, JosĂŠ Ă‚ngelo Cottinelli, “Um estilo gongĂłrico daria o Ăşltimo Grande Homem de Acçãoâ€? in Panorama, Revista de Arte e Turismo, Lisretoque: “Estou a vĂŞ-lo...mĂĄscara viva (...) mĂĄscara dinâmica (...) o que foi grande na vida cinematogrĂĄfica deste homem vertiginoso, mais ainda que

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boa, SPN-SNI, ano 3, nÂş 19, Fevereiro de 1944, s/p. Cfr. Alocução proferida pelo Sr. AntĂłnio Ferro, presidente da direcção da Emissora Nacional ao microfone da mesma Emissoraâ€?, in Boletim do Comissariado do Desemprego, ano 1944, Lisboa, Imprensa Nacional, pĂĄg. 106-108.


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a sua obra foi o seu sonho (...) Não! O engenheiro Duarte Pacheco não morreu, não morrerå! Difícil, atÊ, desejar paz à sua alma! A sua alma continuarå a trabalhar. Os seus restos mortais são imortais (...) assim a sua alma continuarå a ser, por muitos anos, a grande construtora do Estado Novo, da Påtria ressurgida, do Portugal de Salazar�. 19

Este mesmo texto estaria na base da locução do pequeno documentĂĄrio realizado tambĂŠm em 1944 por AntĂłnio Lopes Ribeiro. Numa curta-metragem de 11 minutos, a par das teatrais palavras de Ferro, surgiam as poderosas imagens do funeral de Estado do falecido ministro. Enfatizada a solenidade da homenagem prestada na morte de Duarte Pacheco, as imagens sucediam-se na demonstração da obra produzida pelo homem que votara a vida ao serviço pĂşblico20. Contudo, em vinte anos de vida pĂşblica Duarte Pacheco angariara admiradores na exacta proporção em que angariara inimigos. NĂŁo esquecendo a referencial e conveniente vĂŠnia ao presidente do Conselho, todos os que concordavam com o modo de actuação do ministro das Obras PĂşblicas nĂŁo hesitavam em classificar os melhoramentos estruturais do PaĂ­s como as obras do Duarte Pacheco21 ou intitular o ministro com o cognome de o Edificador22. Do lado oposto, todos os que foram atropelados pela mĂĄquina construtiva das Obras PĂşblicas, que por ela foram materialmente prejudicados ou politicamente enfraquecidos, nĂŁo hesitavam em reunir esforços para deter, nĂŁo tanto a polĂ­tica instituĂ­da pelo Governo e assegurada pelo braço forte da lei, mas o seu implacĂĄvel e determinado executor: Duarte Pacheco. Por Lisboa e pelo PaĂ­s era usual a graçola: “A pior provĂ­ncia do PaĂ­s ĂŠ o Algarve. A pior vila LoulĂŠ. A pior famĂ­lia os Pachecos. E o pior dos Pachecos o Duarte!â€?

Se em vida Duarte Pacheco nĂŁo reunira nunca o consenso, quando soou a notĂ­cia da sua morte, o facto foi assinalado com lĂĄgrimas e champanhe23. Entre lamentos e festejos, a dualidade manteve-se. Contudo, o choque e a surpresa esfumaram-se em breves momentos. A morte do ministro alterava o quadro polĂ­tico. O mi-

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FERRO, AntĂłnio, “O Engenheiro Duarte Pachecoâ€? in Panorama, Revista de Arte e Turismo, Lisboa, SPN-SNI, Ano 3, n.Âş 19, Fevereiro de 1944, s/ paginação. V. Arquivo Nacional de Imagens em Movimento (ANIM), “A Morte e a Vida do Engenheiro Duarte Pachecoâ€?, n.Âş extraordinĂĄrio do Jornal PortuguĂŞs, Sociedade Portuguesa das Actualidades, Realização e Locução de AntĂłnio Lopes Ribeiro, 1944. FERREIRA, AntĂłnio Vicente Ferreira, Discurso em MemĂłria de Duarte Pacheco, in CSOP, Livros de Actas das SessĂľes PlenĂĄrias, Acta n.Âş 8 de 20 de Dezembro de 1943. MARTINS, Rocha, “Lisboa quem te viu!â€?, in DiĂĄrio de NotĂ­cias, 11 de Novembro de 1943. Artigo publicado cinco dias antes da morte de Duarte Pacheco. DACOSTA, Fernando, “Um Confiscadorâ€?, in MĂĄscaras de Salazar, Lisboa, Casa das Letras, 2006, pp. 164.

Engenheiro Duarte Pacheco, Ministro das Obras Públicas e Comunicaçþes [c. 1942], Cecil Beaton Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses


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nistro que morrera solteiro e sem descendentes directos ou herdeiros polĂ­ticos, extinguia-se fisicamente, mas muito rapidamente seria aclamado como poucos: nĂŁo necessitava de memĂłrias, discursos ou notas polĂ­ticas. Em lugar de palavras, o PaĂ­s herdava a obra. Obra aplaudida pelos seguidores e obra onde continuariam a tropeçar todos aqueles que jĂĄ haviam sido colhidos pela mĂĄquina construtiva do Edificador. Assiste-se assim Ă progressiva neutralização dos aspectos negativos associados a uma prĂĄtica ministerial que, regenerada politicamente num processo selectivo de memĂłria, retirava Ă figura pĂşblica todas as inconveniĂŞncias a ela usualmente associadas. Dos elogios fĂşnebres de Novembro de 1943 aos textos panegĂ­ricos de 1944 decorre este esvaziamento de inconveniĂŞncias, da mesma forma que se procede Ă superlativação de capacidades e qualidades. Duarte Pacheco ĂŠ entĂŁo petrificado numa imagem de homem que encara a causa pĂşblica como um sacerdĂłcio; um homem despojado e desinteressado de bens terrenos. A sua capacidade de trabalho ĂŠ elevada a uma categoria quase sobre-humana, nĂŁo sĂł pela argĂşcia, sagacidade, agilidade mental e domĂ­nio transversal das matĂŠrias e da argumentação, mas tambĂŠm pela tenaz resistĂŞncia fĂ­sica ao cansaço e Ă fome24. A circunstância que envolveu a morte do ministro: acidental, 24 CARVALHO, Eduardo Rodrigues de, “A Obra do Engenheiro Duarte Pacheco no brutal e arbitrĂĄria, aos 43 anos MunicĂ­pio de Lisboaâ€?, in Boletim do Code idade, no fulgor de todas as missariado do Desemprego, ano 1944, Lisboa, Imprensa Nacional, pĂĄg. 103. capacidades fĂ­sicas e mentais,

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O Ministro das Obras Públicas e Comunicaçþes, Engenheiro Duarte Pacheco nas Festas Centenårias em Arcos de Valdevez. 1940, Brigada de Estudos do Rio Vez Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses Sua Excelência o Sr. Presidente da República cortando a fita que abre a nova linha à exploração com a assistência de Suas Excelências os Srs. Ministros das Obras Públicas, Interior, Governador Civil do Distrito Major Gaspar Ferreira e casa civil e militar da Presidência. 1932, Companhia Portuguesa para a Construção e Exploração de Caminho-de-ferro do Vale do Vouga Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

fez emergir essa imagem paradigmĂĄtica de polĂ­tico – homem pĂşblico, que serviu a pĂĄtria atĂŠ ao Ăşltimo momento. Com todas as virtudes e nenhum defeito, talvez uma ou outra marca de carĂĄcter mais forte mas em prol do bem comum, a figura do ministro, outrora objecto das maiores controvĂŠrsias e alguns embaraços de Governo, passaria a ser utilizada como sĂ­mbolo e como forma de legitimação dos que herdaram a sua obra: os polĂ­ticos, os mesmos polĂ­ticos que, reservando para si a iniciativa das homenagens a prestar Ă memĂłria do Eng. Duarte Pacheco, e a orientação sobre a forma de o fazer 25, levariam dez anos a erguer um monumento em sua memĂłria. Nas vĂŠsperas da inauguração, Frederico Ulrich, ministro das Obras PĂşblicas, informava o Presidente do Conselho que as coisas estariam bem afinadas e, embora nĂŁo tendo visto a obra concluĂ­da, acreditava que com 17 metros de altura, o impacto visual e imponĂŞncia do monumento, sortisse efeito26. E deste modo o dia 16 de Novembro de 1953 amanhecia em LoulĂŠ com a certeza de uma consagração nacional, a uma dĂŠcada de distância. Do discurso inaugural de Olivei25 CML, Actas das SessĂľes da Câmara, ra Salazar, uma magistral oração, Acta nĂşmero 75 da reuniĂŁo de Câmauma peça literĂĄria do melhor quilara efectuada a 9 de Dezembro e com 27 continuação a 18, 27 e 30 de Dezemte o DN retiraria as seguintes bro, pp. 111, nesta perspectiva citada “head-linesâ€?: por ELIAS, Helena Catarina da Silva “Duarte Pacheco nĂŁo era um polĂ­tico na acepção cor-

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Lebre, Op. Cit. pĂĄg. 322, nota 439. Idem. Cfr. DiĂĄrio de NotĂ­cias, 17 de Novembro de 1953.


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rente do termo, mas homem de Governo extreme, como os permite um regime em que a governação tem podido ser quase tudo e a pequena polĂ­tica quase nadaâ€?.28

Duarte Pacheco, nĂŁo fora de facto, um polĂ­tico na usual acepção do termo. Ao contrĂĄrio de Oliveira Salazar e dos vĂĄrios ministros que constituĂ­ram os Governos do Presidente do Conselho, Pacheco raras vezes discursou, dispensava as notas polĂ­ticas e revelava-se arredio de cerimĂłnias protocolares. Duarte Pacheco impregnava o exercĂ­cio da sua actividade como ministro com o pensamento e o mĂŠtodo em que a Engenharia o havia moldado: para a obtenção de um resultado, uma obra; demorando-se na concepção dos elementos, no processo de conjugação desses mesmos elementos atĂŠ Ă fase de conclusĂŁo. Obra concluĂ­da, resultado obtido. Para as cerimĂłnias de inauguração, outros polĂ­ticos cumpririam a função, os da polĂ­tica do discurso inflamado, da polĂ­tica do quase nada. Mas para o regime, o ano de 1953 terminava com um balanço positivo: em Abril o Presidente do Conselho recebera em Lisboa as maiores ovaçþes populares por ocasiĂŁo da celebração do “Jubileu Ministerialâ€? e em Novembro, em LoulĂŠ, numa moldura humana considerĂĄvel, encerrava-se definitivamente a questĂŁo incĂłmoda e por dez anos adiada: o Monumento de Homenagem a Duarte Pacheco. Com o mesmo discurso, Salazar, que sabia jogar com palavras, reclamava para si e para o seu Governo neste acto de homenagem a legitimidade da celebração de uma obra que, afinal era o prĂłprio regime: um regime em que a governação tem podido ser quase tudo, e podendo ser tudo podia ser tambĂŠm a vida e obra do ministro homenageado. Em LoulĂŠ prestava-se tributo ao desempenho de Duarte Pacheco, mas a obra era do regime. Publicamente Oliveira Salazar nĂŁo voltaria a mencionar o nome do ministro, contudo, politicamente e sempre que a situação se afigurasse favorĂĄvel e a bem da Nação, polĂ­ticos e literatos evocariam o nome do ministro. A obra que Duarte Pacheco construiu ĂŠ extensa e em grande parte devida Ă tenacidade e convicção com que defendia os seus objectivos. Mas uma obra nĂŁo se explica por si sĂł, pelas leis e polĂ­ticas vigentes, muito menos por modelos de carĂĄcter. Um homem nĂŁo faz uma obra, e Duarte Pacheco nĂŁo foi excepção. Uma obra explica-se se integrada numa perspectiva maior e resulta do trabalho de uma equipa que age na prossecução de objectivos comuns. Duarte Pacheco foi, em essĂŞncia, um polĂ­tico. Um polĂ­tico com um mĂŠtodo de trabalho minucioso no plano e tĂŠcnico no modelo; mas em polĂ­tica nĂŁo existem coincidĂŞncias, existem convergĂŞncias de interesse. As novas instalaçþes do Instituto Superior TĂŠcnico, erguidas 28 “Discurso de Oliveira Salazar a Inauguração do Monumento Duarte Paentre 1929 e 1942, constituem a checo, em LoulĂŠâ€?, in DiĂĄrio de NotĂ­cias, 17 de Novembro de 1953. primeira obra pĂşblica de Duarte

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Tomada de posse do segundo mandato como Ministro das Obras Públicas e Comunicaçþes 1938, autor desconhecido Museu Municipal de LoulÊ/Centro de Documentação/Fototeca

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Pacheco, constituindo tambÊm um bom exemplo de convergência de interesses. Na construção do IST, Duarte Pacheco liderou o processo político que lhe deu origem, centralizou no seu gabinete a direcção da obra, mas não agiu sozinho nem foi o único a colher benefícios da obra construída. Por outro lado, e ao contrårio do propalado pela historiografia do regime, Duarte Pacheco não viveu uma orfandade desprotegida. Teve família de sangue, de credo político e de manobra social. Importa pois, à luz de novos elementos e de uma leitura desapaixonada dos factos, fazer a reconstituição de uma moldura familiar, social e política que permitiria a este homem, dotado de uma capacidade invulgar de trabalho de, no espaço de vinte anos, modificar materialmente uma escola, uma cidade e um País.


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“A verdadeira generosidade em relação ao futuro consiste em dar tudo no presente”. Albert Camus

UMA FAMÍLIA DE POLÍTICOS

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Não sendo clara a data de nascimento de Duarte Pacheco, 19 de Abril de 1899 ou de 1900, não existem dúvidas sobre a intensidade com que viveu uma vida curta em anos mas longa em obra. O assento de baptismo de Duarte Pacheco, para além da sua filiação, fornece informação sobre a ocupação dos seus progenitores: do pai, chefe da repartição de Finanças do concelho de Loulé, e da mãe, doméstica. Em 1894, data a que respeita o assento de baptismo de Humberto, o irmão mais velho de Duarte e segundo filho dos Pachecos, o pai desempenhava o cargo de escrivão de Fazenda29. Nos anos que medeiam os assentos de baptismo destes seus dois filhos, José de Azevedo Pacheco progrediu na carreira de funcionário público e ascendeu também na importância da participação política local: monárquico convicto, era um dos dirigentes locais do Partido Regenerador30. A família Pacheco retratava o estrato social médio-alto do País no início do século: José de Azevedo Pacheco integrava a lista 29 IST, Núcleo de Arquivo, Colecção de Processos Individuais de Professores. dos cerca de 19 mil funcionários A cópia do assento de baptismo de públicos do reino e pertencia Humberto Pacheco consta do proaos 53% que trabalhavam na 30 cesso individual de Duarte Pacheco. POLICARPO, Verónica, “Duarte José administração fiscal31. A vida Pacheco”, in Dicionário Biográfico Parlamentar (1935-1974), direcção política activa de José de Azede Manuel Braga da Cruz e António vedo Pacheco conferia-lhe um Costa Pinto, Lisboa, Colecção Parlaacréscimo de importância face 31 mento, 2005, pp. 284-289. RAMOS, Rui, D. Carlos, Lisboa, Círculo ao estrato social médio. A uma de Leitores e Centro de Estudos do Povos e Culturas de Expressão Portugueescala regional, era um homem p. 173. influente que executava as di- 32 sa – Temas e Debates, 2007, Natural de Boliqueime, concelho de rectivas gerais do partido a que Loulé, Joaquim da Ponte licenciou-se em Direito em 1893. Membro do pertencia. Partido Progressista, foi eleito depuA tradição de compromisso potado à Câmara dos Pares do Reino pelo círculo eleitoral de Loulé, VIDE lítico nesta família iniciara-se MOREIRA, Fernando, “Joaquim da com dois tios de Duarte PachePonte”, in Dicionário Biográfico Parlamentar 1834-1910, vol. III (N-Z), co, Marçal de Azevedo Pacheco coordenação de Maria Filomena Mó(1847-1896) e Joaquim da Ponte nica, Lisboa, Colecção Parlamento, 2006, p. 363. (1866-?)32, ambos elevados a Par

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DUARTE PACHECO – DO TÉCNICO AO TERREIRO DO PAÇO Os Anos de Formação 1900-1923

do Reino. Marçal Pacheco, que fora eleito presidente da Câmara Municipal de Loulé em 1874, acumulou o cargo com as funções de deputado pelo Partido Regenerador. Em 1883, Marçal Pacheco detinha as funções de conselheiro e par do reino, o que lhe conferia uma elevada importância política, intervindo em permanente defesa da região algarvia 33. Joaquim da Ponte, membro do Partido Progressista, foi governador civil de Faro. No entanto, embora pai e tios fossem notáveis monárquicos, Duarte Pacheco cedo se assumiu como Republicano. Em 1919 ter-se-á alistado no batalhão académico 33 PACHECO, Marçal, bacharel em Dique combateu uma revolta moreito, Marçal Pacheco exerceu advocacia e foi presidente da Câmara nárquica aquartelada em Monde Loulé. Fixando posteriormente santo no episódio que ficou residência em Lisboa, desempenhou conhecido como “A Escalada de o cargo de chefe de repartição do Ministério da Justiça e Negócios EcleMonsanto”34. siásticos. Em 1895, Marçal Pacheco De todos os irmãos, Humberto publicou A Resposta do País, panfleto político que relatava a frágil situação Pacheco parece ter sido aquele económica, financeira e política então que maior importância desemvivida. V. A Resposta do Paiz, Lisboa, 3.ª edição, Typographia Industrial penhou na forma como a perPortugueza, 1895. sonalidade de Duarte Pacheco 34 José Augusto França, Margarida Acciaiuoli, Jorge Borges de Macedo ense estruturou. Da precoce oroutros autores. fandade em Loulé à partilha do 35 tre Aliás, a actividade de Humberto espaço em que viveram em LisPacheco no ramo das seguradoras manteve-se nas décadas seguintes, boa ou até ao companheirismo pois, em 1960, quando encetou diálopolítico, estes dois irmãos pago com a CML para executar a doação do espólio de Duarte Pacheco, na recem ter vivido uma relação correspondência trocada com o mude cumplicidade. Por outro nicípio, por várias vezes anexou o seu cartão pessoal e desse cartão consta lado, a actividade profissional que é Administrador da Companhia 35 de Humberto , que embora de Seguros Ourique, sita na Avenida da Liberdade, n.º 211-1.º andar. formado em Direito nunca

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Tio de Duarte Pacheco, Deputado e par do reino, Dr. Marçal Pacheco [s.d], autor desconhecido Óleo sobre tela Sta. Casa de Misericórdia de Loulé Pai de Duarte Pacheco, José Azevedo Pacheco [s.d], autor desconhecido Museu Municipal de Loulé/Centro de Documentação/Fototeca Irmão de Duarte Pacheco, Dr. Humberto Pacheco [s.d], autor desconhecido Museu Municipal de Loulé/Centro de Documentação/Fototeca

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Embora pai e tios fossem notáveis monárquicos, Duarte Pacheco cedo se assumiu como Republicano. Em 1919 ter-se-á alistado no batalhão académico que combateu uma revolta monárquica aquartelada em Monsanto no episódio que ficou conhecido como “A Escalada de Monsanto”.

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José Augusto França, Margarida Acciaiuoli, Jorge Borges de Macedo entre outros autores

exerceu advocacia36 tendo optado pelo ramo dos Seguros, e com quem, de acordo com Borges de Macedo37, Duarte Pacheco teria colaborado, permitiu não só o desafogo da autonomia financeira, como o acesso a um outro mundo; o mundo dos negócios. Enquanto Humberto pertencia ao Partido Republicano Democrático38, de acordo com Cunha Leal Duarte Pacheco terá ingressado no partido União Liberal Republicana a 30 de Maio de 192639. Este novo partido resultava da dissidência da ala nacionalista do Partido Liberal Republicano, tendo o apoio de Alberto da Cunha Rocha Saraiva, e de um importante grupo de militantes evolucionistas simpatizantes de António José de Almeida. No domínio político, Duarte Pa36 Criada em 1936, a Ordem dos Advocheco integrava a ala republicagados herdou os ficheiros arquivados na extinta Associação dos Advogados na liberal que apoiava a ditadura de Lisboa e cujos estatutos remonmilitar mas que a prazo pretentam a 1838. Do arquivo histórico da dia a restauração da ConstituiOrdem dos Advogados, que guarda os acervos documentais da profissão ção republicana de 191140. E foi desde 1838, não consta o nome de ciente desta crença política que Humberto Pacheco como advogado. 37 MACEDO, Jorge Borges de, Op. Cit., em 1926 foi empossado no carp. 12. go de director do IST e em 1928, 38 MACEDO, Jorge Borges de, “Cerimónia Comemorativa a Duarte Pachetomando posse como Ministro co”, in Técnica, Lisboa, 1994, n.º 2, da Instrução, jurou honrar o car1994. go para o qual foi nomeado em 39 LEAL, Cunhal, Coisas de tempos Idos: as minhas memórias, Lisboa, 1966. prol dos ideais republicanos41. 40 POLICARPO, Verónica, “Duarte Pa-

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checo”, in Dicionário Biográfico Parlamentar 1935-1974, vol. II M-Z, direcção de Manuel Braga da Cruz e António Costa Pinto, Lisboa, Imprensa de Ciências Sociais – Assembleia da República, 2005, p. 284. ACCIAIUOLI, Margarida, Op. Cit., pág. 390.

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O PERCURSO ACADÉMICO

Em 1914, quando José de Azevedo Pacheco morreu, Humberto tinha 20 anos e Duarte 14. Duarte frequentava nessa altura o Liceu de Faro em regime de internato. Em 1917, Duarte concluiu o ensino liceal com distinção e nesse mesmo ano seguiu para Lisboa, ao encontro do irmão Humberto. Humberto matriculou-se em 1912 no Instituto Superior Técnico42 mas no ano seguinte inscreveu-se na Faculdade de Direito. No ano lectivo de 1917/18 Duarte inscreveu-se no curso geral de engenharia do recémcriado IST43, escolhendo Engenharia Electrotécnica em 1920, curso que concluiria três anos depois44. Tendo concordado em reservar apenas às irmãs a herança paterna, os irmãos, com possibilidades financeiras que permitiriam a sua educação, cedo se autonomizaram. Duarte Pacheco, ainda aluno de Liceu, ter-se-á iniciado nas “explicações” a colegas menos expeditos nas matérias leccionadas. Em Lisboa, a situação manter-se-ia. Nos relatos de Herculano de Carvalho, professor do IST e seu sucessor na direcção do instituto:

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“Já durante o curso ele se distinguira pela sua actividade docente, servindo-se dos seus conhecimentos de matemática para viver materialmente independente, com as numerosas lições particulares que dava”.45

Duarte Pacheco [c. 1917], autor desconhecido Museu Municipal de Loulé/Centro de Documentação/Fototeca

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A par das explicações, há registos da vida estudantil activa de Duarte Pacheco. A 15 de Fevereiro de 1918, ainda no decorrer do primeiro ano lectivo de Duarte Pacheco, teve lugar no IST uma assembleia geral de alunos que visava o debate sobre o projecto de re- 42 IST, Núcleo de Arquivo, Registo Indivinovação do Regulamento do 43 dual de Alunos, ano de 1916. Decreto de 23 de Maio de 1911. Instituto criado em 1911. A ne- 44 Por norma a historiografi a estabelece o ano de 1922 como datada concessidade desta revisão relacioclusão do curso de Duarte Pacheco, nava-se com duas questões precontudo, nos registos encontrados no Núcleo de Arquivo do IST no ano lecmentes, por um lado a colisão tivo de 1922-1923, Duarte Pacheco de interesses entre engenheiros surge inscrito em sete disciplinas. V. Apêndice Documental, Documento 7. e condutores de obra na dispu45 CARVALHO, Herculano de, “Duarte ta de soluções e categorias proPacheco matemático e realizador”, in fissionais46 e, por outro lado, a Revista Internacional, in Memoriam, normativa governamental que 46 Lisboa, 1951. Sobre esta questão V. RODRIGUES, visava a uniformização da duMaria de Lurdes, Os Engenheiros em Portugal, Oeiras, Celta Editora, 1999. ração dos cursos superiores de V. ainda GRÁCIO, Sérgio, “Notas soEngenharia, de cinco para seis bre a emergência e a consolidação do ensino da engenharia”, in Momenanos em Lisboa e no Porto, factos de Inovação e Engenharia em to que se veio a concretizar. Portugal no Século XX, vol. I, Lisboa, coordenação Manuel HEITOR, José Sendo uma das características Maria Brandão de BRITO e Fernanda do IST o incentivo da vida acaROLLO, Lisboa, Publicações D. Quixodémica livre e activa, desta aste, 2004, pp. 231-239.

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sembleia geral de alunos resultou a criação de um documento que sustentava a posição dos mesmos face à situação criada. Informavam os alunos que, no caso de não serem acautelados os interesses do Instituto, deveria o director demitir-se. Deste documento, redigido pelos estudantes e endereçado ao director do Instituto Alfredo Bensaude, constavam 178 assinaturas. Duarte Pacheco assinava em 136º lugar, como aluno do curso geral47. Encetado o diálogo com o Conselho Escolar do IST, a comissão de representação dos alunos conseguiu um acordo que satisfazia estudantes e corpo docente48. Este facto, ocorrido logo no início do curso, revelava um jovem Duarte Pacheco que toma consciência de que uma mera deliberação política poderia ter consequências profundas na escola que ele próprio frequentava. Deste modo, e volvidos apenas quatro meses após o ingresso no IST, Duarte Pacheco envolvia-se activamente na vida do Técnico, postura que marcaria a sua vida49. Duarte Pacheco concluiu, segundo os cadernos de assento do IST, o curso de Engenharia Electrotécnica com a classificação final de 14,3 valores, não atingindo as médias brilhantíssimas que alguma historiografia lhe atribuiu. No mesmo registo individual de aluno, não existe qualquer referência ao serviço militar prestado ou ao local, instituição ou empresa onde o jovem engenheiro poderá ter realizado o tirocínio, designação da época para o período de estágio. Oficialmente, Duarte Pacheco não tirocinou e, se o fez, foi a título particular e sem registo nos seus certificados de habilitações. Os anos de licenciatura de Duarte Pacheco são anos de formação intensiva: formação académica, política e social. Aluno inteligente e sociável, rapidamente angariou a simpatia de colegas e a atenção de professores. Por outro lado, a consciência e a convicção políticas, que desde cedo demonstrou, agiram como factor de integração, de pertença a um grupo. Do mesmo modo, quer a boa prestação estudantil, quer o processo de identificação política, foram factores que permitiram a distinção de Duarte Pacheco da massa anónima da estudantina.

imagens das páginas anteriores

Registo de matrícula com identificação do aluno, disciplinas realizadas e resultados finais. 1917-1923 In “Matrícula de alunos ordinários”: livros 2 e 3 Instituto Superior Técnico/Núcleo de Arquivo

IST, Núcleo de Arquivo, Actas do Conselho Escolar do IST e Correspondência Recebida, Documento n.º 6, lido na sessão do Conselho Escolar do IST de 15 de Fevereiro de 1918. 48 IST, Núcleo de Arquivo, Actas do Conselho Escolar do IST e Correspondência Recebida, Documento n.º 6, lido na sessão do Conselho Escolar do IST de 20 de Fevereiro de 1918. 49 Embora a direcção do IST e a Associação de Alunos do IST tenham chegado a um ponto de compromisso, o novo regulamento do Instituto Superior Técnico só surgirá em 1921 pelo decreto 7.727 de 6 de Outubro. 47

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Duarte Pacheco num dos anfiteatros do Instituto Superior Técnico [c. 1937], autor desconhecido Museu Municipal de Loulé/Centro de Documentação/Fototeca

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Notas Biográficas do funcionário José Duarte Pacheco, cargos que desempenhou no ensino técnico, nomeações, outros cargos públicos, comissões de serviço, títulos honoríficos, condecorações, louvores, etc. 1925-1938 In “Processo individual de Docente” Instituto Superior Técnico/Núcleo de Arquivo e Documentação

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“Só em Portugal é que se ligou à Arquitectura a idéa da fachada, da pele, da superfície exterior da parte construída. É êste um erro em que por ignorância quási sempre, e por conveniência algumas vezes, muito boa gente cae, na nossa terra”.

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Porfírio Pardal Monteiro, Revista Arquitectos, 1940.

Após a conclusão do curso de Engenharia Electrotécnica em 1923, Duarte Pacheco só voltou a ser referido na documentação do IST em 1925, data em que integrou os quadros docentes como professor interino da cadeira de Matemáticas Gerais. Contudo, como nos informa Caetano Maria Beirão da Veiga, numa homenagem póstuma a Duarte Pacheco, realizada em 1951 na Casa do Algarve, o Técnico continuou presente nos dois anos que medeiam a data de conclusão do curso e a data de entrada no IST como professor: “Quando Duarte Pacheco terminou o curso de Engenheiro Electrotécnico eu ocupava o cargo de Administrador Delegado da Empresa Nacional de Publicidade, proprietária e editora do Diário de Notícias. Nessa época, o Duarte passava horas a meu lado, no meu gabinete particular e servia-se dele como 50 Caetano Maria Beirão da Veiga, “Duarse seu fosse”.50

Duarte Pacheco manteve-se muito próximo do seu professor Caetano Beirão da Veiga e usou o gabinete deste como se seu fosse. Durante os anos em que estudou no Técnico, a relação entre Duarte Pacheco e Beirão da Veiga tinha-se transformado numa relação de amizade quase paternal como o segundo reconheceria51. Caetano Maria Beirão da Veiga (1884-1962) foi professor catedrático da disciplina de Contabilidade no IST e no Instituto Superior de Comércio. Mas, a par da actividade docente, exerceu também actividade privada no sector dos seguros, previdência e aplicações financeiras52.

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te Pacheco. Inteligência, Dinamismo e Infatigabilidade”, in Revista Internacional, 1951, s/p. V. Apêndice Documental, Documento 8. A Universidade de Lisboa e os seus Mestres. Notas Biográficas, Lisboa, 1956, pp. 539-541. Caetano Maria Beirão da Veiga concluiu o curso superior de Comércio em 1904, no Instituto Industrial e Comercial de Lisboa. No início da sua actividade profi ssional, desempenhou funções diplomáticas na Direcção-Geral dos Negócios Políticos e Diplomáticos e no Gabinete do Ministro dos Estrangeiros. Na carreira docente, foi professor do IST, do Instituto Superior de Comércio e do Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras. Foi nomeado director efectivo deste último instituto e foi, por diversos períodos, director interino do IST. Em 1923, foi eleito vereador da Câmara Municipal de Lisboa. No domínio da actividade privada, Beirão da Veiga exerceu cargos de administração na Companhia de Seguros A Soberana e no Banco Português do Atlântico, foi actuário do Montepio Geral e presidente do conselho de administração do Banco Português do Continente e Ilhas.

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Em 1923, como o próprio informa, desempenhava o cargo de administrador delegado da Empresa Nacional de Publicidade, detentora do Diário de Notícias. À época, a Empresa Nacional de Publicidade pertencia ao grupo económico Companhia Industrial de Portugal (CIP) - Caixa Geral de Depósitos. Em suma, a amizade de Beirão da Veiga permitiu a Duarte Pacheco o acesso a um grupo maior: o da alta finança e do capital. Mas, em 1923, Beirão da Veiga desempenhava ainda uma outra função: a de vereador da Câmara Municipal de Lisboa, e foi no gabinete do vereador que Duarte Pacheco estudou as plantas da cidade e planeou a localização das novas instalações do Técnico. No Verão de 1925, ausente de Lisboa e na impossibilidade de estar presente na sessão do Conselho Escolar do IST agendada para 31 de Julho, Aureliano Mira Fernandes53 enviava no dia 18 do mesmo mês, uma carta a Eduardo Ferrugento Gonçalves (1863-1942)54, então director do Técnico. Na missiva, que iria produzir modificações no quadro docente da Escola no ano lectivo seguinte55, Mira Fernandes afirma que a regência das três cadeiras é demasiado cargo para um professor só. O docente declara que é seu desejo que o 53 Aureliano de Mira Fernandes (18841958), doutorado em Matemática, Conselho o faça substituir na reera professor catedrático do IST e do gência da primeira cadeira, o que Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras (ISCEF). No Téccorresponde à disciplina de nico, era regente das três cadeiras Matemáticas Gerais, e adianta de Matemáticas Puras (Matemáticas Gerais, Cálculo Diferencial Integral e que a sua substituição acarreta das Variações e Mecânica Racional), e dois problemas: o técnico e o legal. no ISCEF regia a disciplina de Análise Matemática. Pertencia ainda a duas A situação de sobrecarga horária sociedades científicas: a Academia e pedagógica atribuída a Mira das Ciências de Lisboa e a Academia de Ciências Exactas, Técnicas e NatuFernandes era uma situação parrais de Madrid. Eminente matemático tilhada por todos os professores e reconhecido na comunidade cientíregentes do IST. Era pois remofica internacional, entre livros, lições e artigos, a sua bibliografia ascendeu ta a hipótese de algum docena 118 títulos. Mira Fernandes era aste assoberbar ainda mais a sua sim um dos mais conceituados professores do IST. Cfr. A Universidade agenda lectiva com a regência Técnica de Lisboa e os seus mestres, da disciplina que Mira FernanNotas Biográficas, Lisboa, 1956,pp. 768-775. des queria deixar de leccionar. 54 Eduardo Augusto Ferrujento GonçalDaí o facto de o matemático, na ves ingressou na Escola do Exército em 1881 e ali concluiu o curso de Enmissiva endereçada ao director, genharia Militar e Civil em 1885, tenreferir que sobre o primeiro [o prodo-se dedicado à carreira docente. Foi blema técnico], no caso de nenhum professor da disciplina de Máquinas Marítimas, Topografia e Geodesia na dos nossos ilustres colegas querer Escola Naval e na Escola de Guerra. incumbir-se da regência, sabe V. Exª, Foi também professor do IST, regendo a disciplina de Máquinas e Geradores. o que eu penso. E o director sabia. De 1921 a 1926 foi director do IST. A escolha do novo docente esta- 55 IST, Núcleo de Arquivo, Correspondência Recebida a Actas do Conselho va tomada mas colocava-se um Escolar (1918-1927), Acta da Sessão problema, como afirmava Mira do Conselho Escolar de 18 de Julho de 1925. Fernandes: o problema legal.

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O regulamento do IST determinava que, vagando uma das disciplinas, o Conselho Escolar poderia convidar para seu provimento qualquer pessoa com provas de competência técnica demonstrada por trabalhos e matérias que constituíssem o programa da dita cadeira. Nas palavras do fundador do IST, Alfredo Bensaude, o Conselho Escolar atribuía muito menos valor aos diplomas académicos do que à sua actividade científica ou técnica post-escolar56, medidas pela produção científica e pela colaboração em trabalhos da técnica ou da indústria.57. Até 1930, data em que o Instituto passou a integrar a Universidade Técnica de Lisboa, o recrutamento de docentes era feito pelo Conselho Escolar. Nas palavras de Bensaude, a vontade do Conselho Escolar não é secreta58. Avaliando a produção científica e técnica dos nomes propostos, o eleito era defendido em parecer por três professores e pelo director. Esse mesmo parecer era proposto ao ministro da tutela e publicado em Diário de Governo. Na sessão do Conselho Escolar de 31 de Julho de 1925, o Conselho resolveu por unanimidade que Mira Fernandes fosse substituído na regência da cadeira de Matemáticas Gerais pelo ex-aluno do instituto, o Sr. Duarte José Pacheco, na qualidade de professor interino59. Contudo, a questão legal foi relembrada por dois membros do Conselho. O professor Silva Pinto lembrou que seria conveniente Duarte Pacheco apresentar tese, a fim de não criar um mau precedente. O professor Lino Neto acrescentou que a exigência do mesmo exame final para um caso destes, ou seja, para ingresso no corpo docente, seria bom para prestigiar a escola. Beirão da Veiga contra-argumentou afirmando que o proposto é um espírito brilhantíssimo e não exigindo o regulamento o exame final para a nomeação de professores interinos, essa formalidade pode bem dispensar-se no caso presente60. De facto, o regulamento não exigia tese final para a nomeação de professores interinos, mas atentando nas palavras cautelosas de Silva Pinto e de Lino Neto, a inexistência de um trabalho final de curso poderia abrir um mau precedente. Este simples facto acrescenta duas informações. Por um lado ficamos a saber que Duarte Pacheco nunca apresentou tese final de curso. Por outro lado, sabemos também que antes dele, nunca nenhum outro docente do IST havia sido recrutado sem a titularidade desta credencial académica. Esta situação vem demonstrar que o ingresso de Duarte Pa- 56 BENSAUDE, Alfredo, “O Recrutamento dos Professores do Instituto checo no corpo docente do IST Superior Técnico”, Notas Históriconão correspondeu ao método Pedagógicas sobre o Instituto Superior Técnico, in Revista Técnica, Ano normal de recrutamento de XXII, n.º 175, Junho de 1947, p. 435. professores. Tendo em linha de 57 Idem, Op. Cit., p. 435. 58 conta os requisitos estipulados 59 Idem, Op. Cit., p. 435. IST, Núcleo de Arquivo, Corresponpor Bensaude aquando da criadência Recebida a Actas do Conselho Escolar (1918-1927), Acta da Sessão ção da escola, Duarte Pacheco do Conselho Escolar de 31 de Julho não correspondia ao perfil dos de 1925. engenheiros recrutados para 60 Idem.

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docentes do Técnico. Não havia demonstrado de 1923 a 1925, espaço de tempo que medeia entre a conclusão do curso no Técnico e o seu ingresso como professor no mesmo instituto, saber tratar, com originalidade e proficiência, os assuntos que constituem o programa da cadeira a prover, do mesmo modo que não existe notícia de ter colaborado em trabalhos de técnica ou indústria61. Estes eram, de facto, os requisitos base de recrutamento do IST: a produção científica e a aplicação prática e técnica do saber. Duarte Pacheco não cumpria nenhum dos dois requisitos. A sua entrada no corpo docente do IST revela que existiria um outro interesse que legitimava o ingresso de um novo elemento numa escola em ascensão e explica a decisão do Conselho, por unanimidade, de atribuir a docência da disciplina de Matemáticas Gerais a Duarte Pacheco.

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BENSAUDE, Alfredo, Op. Cit., p. 435.

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DO PARDIEIRO DA BOAVISTA AO COLOSSO DA ALAMEDA: O TÉCNICO NOVO

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Instalado na Rua da Boavista desde a sua criação, o IST carecia de condições dignas. Vivendo a escola uma situação deplorável, era necessária e inadiável a criação de condições para a existência de novas instalações: “Havia muito já, que toda a gente considerava indecorosas as instalações do instituto, situadas no Conde Barão, abarracadas, inestéticas, anti-higiénicas e provisórias – como tanta coisa nesta quadra nacional; todos falavam, maldiziam, censuravam, mas ninguém actuava”.62

Duarte Pacheco seria o homem de acção indispensável à concretização do projecto. E no Conselho Escolar do IST, senão no todo dos seus elementos constituintes, pelo menos nos elementos de maior peso de decisão, existia a plena consciência do facto. Antes de Duarte Pacheco nada se conseguiu e depois dele nada de material se lhe acrescentaria63. Desde a sua criação, a 23 de Maio de 1911, que a questão das novas instalações do IST transcendia o conceito de mero equipamento educativo, apontando Alfredo Bensaude as necessidades prementes: “o ensino da engenharia carece de grandes laboratórios, salas de desenho, oficinas, etc.,” pelo que “não se poderá de- 62 VEIGA, Caetano Maria Beirão da, Op. Cit., s/p. senvolver entre nós, enquanto 63 Com a morte de Duarte Pacheco não possuirmos um edifício em 1943, cessaram em defi nitivo as apropriado onde esse ensino se obras das novas instalações do IST. Previstos no projecto inicial e a edifi possa fazer convenientemencar a poente do Pavilhão Central, dois 64 te”. Albergar condignamente pavilhões (Hidráulica e Laboratório o IST era assim uma necessida- 64 de Máquinas) não foram construídos. IST, Núcleo de Arquivo. Copiador de de indiscutível. As condições Cartas n.º 5, Novembro de 1915 a 30 de Abril de 1918, Alfredo Bensaude mínimas de ensino teórico não ao administrador da Caixa Geral de estavam garantidas e o ensino Depósitos e Instituições de Previdência, em 21 de Janeiro de 1916. prático, tão querido a Alfredo

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Bensaude, estava seriamente comprometido, uma vez que os espaços para laboratórios eram escassos e o material rareava. As transformações estruturais de mercado iniciavam-se nos restantes Países europeus e, com condições tão precárias, o ensino técnico em Portugal não poderia competir com os seus congéneres. E numa sociedade em transformação célere, os engenheiros eram reconhecidamente os agentes produtores de riqueza e progresso65. Em 1916, Alfredo Bensaude conseguira verba governamental para a construção do novo edifício destinado ao IST, 400 contos. Con­tudo, o projecto nunca avan­çou66. Bensaude conseguiu que a Caixa Geral de Depósitos disponibilizasse os primeiros 100 contos para o arranque das obras, mas, apesar de inúmeras diligências, o processo ficou bloqueado. Bensaude recorreu ao Ministro da Instrução Pública, ao presidente da Comissão do Orçamento da Câmara dos Deputados e ao secretário do Conselho Superior da Administração Financeira, mas o projecto nunca se concretizou67. Com os 100 contos Bensaude poderia iniciar o projecto, mas sem a certeza da posse efectiva dos restantes 300 contos, a desbloquear a 50% nos anos económicos de 1917-1918 e 1918-1919, o director do IST receava ver-se na contingência de em determinada altura ter de suspender as obras por falta de recursos68. E a verba prometida nunca foi desbloqueada. Aquando da sua criação, ficou o Técnico instalado na Rua da Boavista, ao Conde Barão. Herdara as instalações do extinto Instituto Industrial e Comercial de Lisboa69. Ficou também na posse de alguns terrenos na área do extinto Convento das Francesinhas, propriedade que administraria como me65 lhor lhe aprouvesse. BENSAUDE, Alfredo, Op. Cit., p. 436. 66 Pelo artigo 31 da Lei Orçamental n.º O barracão da Boavista, designa220 de 30 de Junho de 1914, o Goção pela qual eram conhecidas as verno autorizou o empréstimo de 400 contos para a construção do novo instalações do Técnico, poucas edifício do Instituto Superior Técnico. condições oferecia à prática do 67 Núcleo de Arquivo, Copiador de Cartas n.º5, Novembro de 1915 a 30 de ensino. As salas de aulas teóricas Abril de 1918. eram exíguas, os laboratórios e 68 Núcleo de Arquivo, carta de Alfredo Bensaude ao presidente da Comisas oficinas, não sendo construísão do Orçamento da Câmara dos dos de raiz, não apresentavam as Deputados. características necessárias ao en- 69 Aquando da criação do Instituto Industrial, optara-se por aquela localisino, a iluminação era deficienzação tendo em conta a grande conte, o aquecimento inexistente centração industrial na zona da Boavista. Sobre o tema, Cfr. CUSTÓDIO, e as infiltrações de água eram Jorge, “Reflexos da Industrialização permanentes, ao ponto de colona fisionomia e vida da cidade”, in O Livro de Lisboa, coord. Irisalva Moita, carem em risco a segurança de Lisboa94-Expo98, 1998, pp. 461-462. alunos, professores e do próprio 70 As precárias condições de funcionamento do IST na Boavista são recoredifício70. rentemente lembradas nas Sessões Bensaude pautou o mandato do Conselho Escolar do IST entre os como director do IST pela inanos de 1911 a 1935.

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sistente luta por instalações condignas para o seu instituto e para “o desenvolvimento da primeira escola superior de engenharia do País, aquela de que mais directamente depende o progresso”71. Apenas com promessas, Bensaude não procurou terrenos para a edificação das novas instalações do Instituto. Na posse de parte dos terrenos do extinto Convento das Francesinhas, resolveu, a 15 de Agosto de 1916, adjudicar a Francisco Vital dos Santos Teixeira a empreitada de demolição e terraplanagens necessárias para levar a cabo o programa das novas instalações72 com projecto arquitectónico de Miguel Ventura Terra. Contudo, a falta de verbas não permitiria a construção de um novo edifício. De 1919 a 1926 a questão das precárias condições de instalação do IST continuaria a ser referida em Conselho Escolar, mas das intenções à viabilização de um projecto de melhoramentos, nada aconteceu. É precisamente na sessão imediatamente anterior à primeira presença de Duarte Pacheco como membro do Conselho Escolar que a questão das instalações do Instituto é novamente relançada e questionada. A entrada de Duarte Pacheco no corpo docente do IST não alterou a evidência das necessidades prementes da Escola. A sua entrada alterou, drasticamente, o modo de agir. Como os seus colegas do Conselho, também Duarte Pacheco acreditava que urgiam novas instalações para a Escola. Mas Duarte Pacheco acrescentou um outro factor de importância a este projecto. Um factor decisório – o político. No ano lectivo de 1925-1926 leccionou a disciplina de Matemáticas Gerais e representou o director do IST na comissão nomeada pelo Governo para o estudo das reclamações de alunos em greve e, em Outubro de 1926, seria nomeado professor efectivo da escola, estatuto que lhe permitiu tomar assento no Conselho Escolar, o órgão decisório e deliberativo do Instituto nas questões de organização e planificação científica, técnica, pedagógica e financeira. No primeiro Conselho Escolar do IST a que teve direito da palavra, Duarte Pacheco não perdeu oportunidade nem tempo e expôs a sua opinião. Na breve intervenção, o jovem docente não se limitou a constatar o óbvio e a lamentar o infortúnio. Com a objectividade e dinamismo que iriam pautar a sua vida pública, Duarte Pacheco revelou nesta breve exposição o seu método de trabalho: análise das situações; identificação dos erros, definição de prioridades e 71 IST, Núcleo de Arquivo. Copiador de construção das soluções: Cartas n.º 5, Novembro de 1915 a “O Sr. Professor Pacheco afirma que, enquanto o instituto estiver tão deficientemente instalado e tão pobre, não pode progredir (...) Outro problema que julga

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30 de Abril de 1918, carta de Alfredo Bensaude ao director do Posto de Desinfecção Pública de Lisboa, em 18 de Setembro de 1916. IST, Núcleo de Arquivo. Copiador de Cartas n.º 5, Novembro de 1915 a 30 de Abril de 1918, carta de Alfredo Bensaude a Francisco Vital dos Santos Teixeira, em 15 de Agosto de 1916.

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necessário resolver é o do recrutamento do professorado. O sistema de contratar professores estrangeiros deve acabar (...) urge pensar na criação de bolsas de estudo, a fim de os rapazes formados nas nossas escolas (...) possam ir ao estrangeiro especializar-se e vir depois exercer o professorado. Outro assunto que também necessita de ser resolvido é o dos laboratórios. De todos os laboratórios do instituto só o de Química desempenha a sua missão e trabalha regularmente”.73

Inconformado e assertivo, Duarte Pacheco afirmou que a manter-se a situação de precariedade das instalações, o IST não teria como progredir. E, sob o seu ponto de vista, a estagnação do Instituto devia-se não só às deficientes instalações, mas também à falta de material, falta de laboratórios e falhas nos critérios de renovação do pessoal docente. Identificados os erros, Duarte Pacheco giza as prioridades: resolver no espaço de um ano o problema das instalações. E como a renovação das instalações e a criação de bolsas de estudo para recrutamento de professorado exigem fundos monetários, Duarte Pacheco apontou a forma de os conseguir: fazer pressão sobre os poderes públicos e tomar a iniciativa de ida de todos os professores a Sua Exa. o Ministro do Comércio74. A pressão, sob o ponto de vista de Duarte Pacheco, seria política ao utilizar os argumentos e as acções do próprio Governo: se o Estado pode sobrecarregar o seu orçamento com mais 10.500 [contos] anuais, por motivo das últimas reformas de ensino, também pode proporcionar ao instituto os meios de efectivar esta pretensão. Em suma, se era pretensão do Governo reformar o ensino, a legitimação do discurso político poderia passar por uma obra efectiva: as novas instalações do Técnico. E foi com este argumento que Duarte Pacheco pressionou constantemente o poder político até à obtenção dos fundos necessários ao arranque das obras do Técnico. Elevando o projecto das novas instalações do IST a porta-estandarte das reformas de ensino, da projecção do ensino técnico e da formação da nova classe profissional geradora de riqueza, entre Novembro de 1926 e Junho de 1927 Duarte Pacheco conseguiu do Governo a publicação de três decretos fundamentais ao arranque de uma obra estrutural. A uma distância de 25 anos, Herculano de Carvalho diria que: “a acção dificílima que por vontade de ferro e por um optimismo invencível, Duarte Pacheco desenvolveu para conseguir do Parlamento que então votasse a 73 concessão da primeira ver IST, Núcleo de Arquivo. Correspondência Recebida e Actas do Conselho ba para compra dos terreEscolar (1918-1927), Acta da Sessão nos e início da construção do Conselho Escolar de 6 de Novembro de 1926. e depois para promover as 74 Idem. expropriações necessárias, 75 CARVALHO, Herculano de, Op. Cit., sem paginação. demolições, etc.”.75

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Logo a 1 de Fevereiro de 1927 foi publicado o Decreto n.º 13 113 que permitiu ao IST contrair um empréstimo com a Caixa Geral de Depósitos no valor de 3.500 contos para construção do novo edifício. A 2 de Junho o mesmo ano o Decreto n.º 13 717 explicitou a necessidade de atribuição de bolsas de estudo no estrangeiro para professores e alunos diplomados pelo IST; e o Decreto n.º 13 718, publicado no mesmo dia, elevou para 10.500 contos a verba destinada à construção do novo edifício. A confiança do Conselho Escolar estava conquistada. Entre Novembro de 1926, data em que Duarte Pacheco tomou pela primeira vez assento no Conselho, e Junho de 1927, acumulando com a regência de disciplinas e com a responsabilidade técnica e científica inerente a cada um dos professores com assento no Conselho, todas as questões burocráticas, de consultadoria, delegação e comissão passaram a ser atribuídas por unanimidade a Duarte Pacheco. O argumento era por demais repetido: Duarte Pacheco era o professor mais novo, e no perfeito domínio da argúcia e inteligência revelava total disponibilidade. Como se não bastasse, era ainda bem conhecedor de todos os assuntos76. Com a presença de Duarte Pacheco, as perspectivas para o novo Técnico alteraram-se por completo. De 1911 a 1926, o Instituto não conseguiu sequer transferir-se para um outro edifício que apresentasse melhores condições. Duarte Pacheco ingressara no corpo docente do IST no ano lectivo de 1925/26, tomando pela primei- 76 IST, Núcleo de Arquivo, Correspondência Recebida e Actas das Sessões ra vez assento no Conselho Esdo Concelho Escolar (1918-1927), colar do Instituto no ano lectivo Actas das Sessões do Conselho Escolar de 6 de Novembro de 1926 a 8 de 1926/27. A 6 de Novembro de de Junho de 1927. 1927, no primeiro momento em Neste espaço de tempo Duarte Paque no Conselho Escolar teve o checo representou o director do IST na Comissão nomeada pelo Governo uso da palavra, Duarte Pachepara estudar as reclamações de aluco identificou os problemas do nos em greve; procedeu à reforma da tabela de horários para todos os Instituto e avançou com as solucursos leccionados no IST; por deções. Entre 1 de Fevereiro e 2 de legação do IST integrou a Comissão encarregada pela Direcção Geral Junho de 1927, o poder político do Ensino Industrial e Comercial de ao publicar os decretos n.º 13 classificar os candidatos a vagas de professores agregados das escolas 113, n.º 13 717 e n.º 13 718, tornado ensino elementar industrial e va força de lei as palavras de um comercial; ficou encarregue de forhomem, que recém-chegado ao mular a resposta ao Instituto Electrotécnico e de Mecânica Aplicada IST, conseguiria o que o Consede Toulose que solicitada a inclusão lho Escolar e dois directores de do IST na lista oficial de escolas estrangeiras cujos cursos deveriam ser um Instituto Público não conequivalentes aos cursos das escolas seguiram em 15 anos: terreno e superiores de engenharia portuguesas; foi delegado do IST à Comissão verba para construção. Organizadora do I Congresso NacioNa sessão do Conselho de 5 de nal de Engenharia, entre outras representações. Fevereiro de 1927 foi lido o decre-

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to 13 113, o documento em que o Governo autorizava o IST a negociar com a Caixa Geral de Depósitos um empréstimo de 3.500 contos para a construção das novas instalações e, de harmonia com o disposto no artigo 5º do mesmo decreto tornava-se necessário eleger os dois representantes do Conselho para, juntamente com a Comissão Administrativa, dirigir e fiscalizar a construção do novo edifício, tendo sido escolhidos: “Os professores Duarte Pacheco que tanto se tem interessado pelo assunto e Francisco Maria Henriques em vista das suas qualidades e da sua especialização”.77

Neste primeiro momento de leitura do decreto que autorizava o empréstimo para o início da construção do novo edifício, foi alvitrado em Conselho Escolar o nome de um arquitecto, Álvaro Machado, o regente da disciplina de Arquitectura no Técnico, contudo, a questão de direcção arquitectónica da obra não será nunca referida, como se a uma esfera superior se tivesse já decido o nome do arquitecto que projectaria o novo edifício: Porfírio Pardal Monteiro. Anos mais tarde, num registo de memórias, Pardal Monteiro recordaria a forma como Duarte Pacheco lhe fizera a encomenda do projecto: “Tenho a seu respeito boas informações, dadas por pessoas que me merecem a maior confiança. Você é o arquitecto que eu e o Conselho escolhemos. Portanto só tenho um caminho a seguir: entregarlhe o projecto para o Instituto ou confiar este trabalho a um arquitecto estrangeiro, portanto escolha!”78

O projecto do novo Técnico fora gizado na esfera da política pública e não no âmbito de um exercício voluntário de cidadania como o fora na sua criação. Bensaude fora o cientista, o pedagogo defensor de um projecto de ensino revolucionário legitimado pelo poder político que o contactou num momento não muito habitual na nossa História. Mas esse momento de presciência pouco comum nos nossos governantes foi isso mesmo, apenas um momento: Bensaude nunca conseguiu concretizar a sua ideia de escola ratificada no decreto que a criou. O projecto de Escola que Bensaude pensou foi retomado por Duarte Pacheco, fazendo o percurso inverso. Ou seja, foi Duarte Pacheco que contactou e pressionou ao mais alto nível os decisores políticos. Como o próprio afirmaria a propósito da concessão de crédito para a construção do novo edifício do Instituto, tinha acesso directo aos ministros, à cúpula do poder: “Disse-lhe Sua Excelência o Ministro que não podendo o Estado dar de uma só vez o dinheiro necessário para

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Idem, Ibidem. MONTEIRO, Porfírio Pardal, Memorial, 7 de Novembro de 1956, pp. 57.

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a conclusão da obra, entendia que os 3.500 [contos] não deviam ser gastos apenas nos alicerces. Devia a obra ir sendo feita parcialmente concluindo o que fosse começado, pois assim mais fácil lhe parecia conseguirem-se os meios necessários para a conclusão da obra”.79

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Mas a par da concessão de verba para o financiamento de obra, Duarte Pacheco tinha também a segunda e imprescindível questão já resolvida – a do terreno. E pensando numa perspectiva global, de congregação de esforços mas também de interesses, pensara também a angariação de parceiros: “Pensou interessar também os industriais na realização deste desejo e pede aos colegas que o coadjuvem nesta iniciativa. Sabe que não há muito o que se pode conseguir mas o efeito moral será enorme e levará o Governo a dar mais facilmente o que faltar. Relata já terem sido ence­tadas as negociações com o proprietário do terreno, tendo este fixado o pagamento em duas prestações: um no acto da escritura e a segunda até ao fim de Junho depois de retiradas as colheitas”.80

E, focando a questão dos terrenos, relembre-se, como atrás foi dito, que Duarte Pacheco, nos dois anos que decorreram entre a conclusão do curso em 1923 e o seu ingresso no IST como professor interino em 1925, não exerceu engenharia. Como referiu Beirão da Veiga: quando terminou o curso passava horas a meu lado, no meu gabinete e servia-se dele como se seu fosse. Relembre-se ainda que Beirão da Veiga, professor catedrático do IST, do ISCEF e vereador da CML, exercia ainda, para além dessas duas actividades, uma outra a título privado, na banca e nas seguradoras, as entidades que avaliam e validam a posse e a transacção de propriedade, nomeadamente no mercado de terrenos. Nestes dois anos, entre 1923 e 1925, Duarte Pacheco, por estreita relação pessoal ou por actividade própria, tendo trabalhado com o irmão no ramo das seguradoras, teve acesso directo ao mercado do imobiliário. Na proximidade ou no exercício pleno da actividade seguradora, teve também acesso ao mercado financiador da transacção de bens e propriedades: a banca. A utilização do gabinete de Beirão da Veiga demonstra a plena confiança e a estreita amizade que o professor tinha pelo ex-aluno. Mas revela outros dados. Duarte Pacheco utilizaria o gabinete com um propósito, um propósito que seria do conhecimento de Beirão da Veiga, tendo o seu consentimento e a sua aprovação: procurar a localização das novas instalações 79 IST, Núcleo de Arquivo, Correspondo Técnico. dência Recebida e Actas das Sessões Desde logo, existia o interesse do Concelho Escolar (1918-1927), Actas das Sessões do Conselho Esmaior de professores e alunos colar de 6 de Novembro de 1926 a 8 que, desde a fundação do Institu­ de Junho de 1927. to, reclamavam no domínio da 80 Idem, Ibidem.

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Duarte Pacheco, entre os seus pares do Instituto Superior Técnico, numa visita às obras do Técnico Novo [post. 1927], autor desconhecido Museu Municipal de Loulé/Centro de Documentação/Fototeca

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esfera política, a credibilidade e a adesão não se conseguiam com palavras, mas com acção, com obra. E a verdadeira reforma do ensino, o desenvolvimento da primeira escola de engenharia do País, só seria possível com o seu efectivo melhoramento material: o novo edifício. Deste modo, também no domínio político, a viabilidade deste projecto apresentaria como uma medida benéfica. Como dissera o ministro do Comércio a Duarte Pacheco, devia a obra ir sendo feita concluindo o que fosse começado. A construção do IST seria conseguida numa conjugação de esforços e no encontro dos vários interesses em jogo. Cada um a seu modo, buscava legitimidade e reconhecimento. E se todos o poderiam conseguir, todos o conseguiram. Neste processo Duarte Pacheco foi a pedra de fecho de uma abóbada, de uma cúpula, e não o expedito e voluntário professor de 26 anos que recém chegado ao corpo docente do Instituto se lançara solitário num projecto que dependeu unicamente da sua vontade e esforço, como diria Beirão da Veiga numa versão abonatória: “Animado daquela confiança firme, impulsionado por uma visão larga (...) eis que se mete na Câmara Municipal de Lisboa, coberto com o simples título de professor do Instituto, e de alto a baixo, esquadrinha a planta da cidade (…) decide que se elevaria imponente o edifício do Técnico, condigno e adequado à finalidade da Escola. E aí se ergueu”.81

Margarida Acciaiuoli coloca em questão como foi possível que um jovem e desconhecido professor tivesse entrado assim pelas Repartições do Município de Lisboa, fazendo prevalecer as suas ideias82. Para Duarte Pacheco o acesso às repartições do município foi muito fácil. Entre 1923 e 1925 “o jovem desconhecido” utilizara o gabinete de Beirão da Veiga como se seu fosse, e eis que se mete na Câmara coberto com o simples título de professor porque o próprio Beirão da Veiga lhe permitiu esse acesso. Duarte Pacheco entrou nas repartições do município não como simples e desconhecido professor, mas como amigo pessoal do vereador camarário. Acresce ainda um outro facto. Desde a sua fundação que o IST viveu uma situação de insalubridade de instalações. E desde a mesma data existiu uma comissão encarregada do exame de viabilidade de mudança do instituto. Esta designação é muitas vezes utilizada na documentação produzida pelo Conselho Escolar do Técnico, pois a questão das 81 VEIGA, Caetano Maria Beirão da, Op. instalações é assunto recorrente Cit., s/p. 82 ACCIAIUOLI, Margarida, Op. Cit., p. nas discussões do professorado83. 397. Acrescido também da qualida- 83 IST, Núcleo de Arquivo, Corpos documentais referentes aos Copiadores de de membro desta comissão, de Correspondência de 1911 a 1926 Duarte Pacheco terá tido acesso e Actas das Sessões do Conselho Escolar de 1911 a 1926. aos serviços camarários que lhe

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permitiram o escrutinar de terrenos livres na cidade de Lisboa. E o mais indicado docente do IST e membro da referida comissão seria Duarte Pacheco, uma vez que, de todos os professores do Instituto, era ele o que reunia mais informação sobre a questão, pois colaborara com o irmão no ramo dos seguros, tendo por isso os contactos e os acessos directos aos proprietários e intervenientes do ramo imobiliário. Acresce ainda o facto de que, caso lhe faltasse o modo de chegar a alguns proprietários de forma directa, outro meio havia para estabelecer o contacto: o gabinete de Beirão de Veiga, ilustre professor que trazia a este projecto a credibilidade financeira, social e que como vereador da Câmara, acrescentava também ao projecto o necessário manejo político. Como político que também era, Duarte Pacheco agarrou este projecto como a primeira das suas obras. Para Duarte Pacheco, o Técnico seria um projecto de obra e um projecto político e os dois decretos que conseguiu em 1927 assim o demonstram. Sete meses antes, quando pela primeira vez tivera o uso da palavra no Conselho Escolar, Duarte Pacheco afirmara que no espaço de um ano a questão da construção do novo edifício estaria resolvida. Afirmara também a necessidade de criação de bolsas de estudo para formação de professores. As diligências do jovem professor tinham sortido o efeito desejado pela escola e a escola estava disposta a retribuir. Havia já algum tempo que, por razões de saúde, o director do IST havia pedido dispensa de funções. Na sua ausência, e no cumprimento do regulamento, fora substituído por Beirão da Veiga, à data o professor com mais tempo de serviço prestado ao instituto. Na sessão do Conselho Escolar de 21 de Junho de 1927, Beirão da Veiga informava que não pretendia continuar a dirigir interinamente o Instituto. Da mesma forma que, em 1925, Mira Fernandes criara o momento oportuno para a entrada de Duarte Pacheco no IST, em 1927 Beirão da Veiga colocava à disposição o cargo de director interino, no exacto momento em que os destinos do Instituto iniciavam um novo e decisivo rumo. Perante a posição de Beirão da Veiga, o nome de Duarte Pacheco surgiria no Conselho Escolar como solução única e unânime para a direcção interina do IST84. Com 27 anos de idade, Duarte Pacheco sendo o professor do IST com menos tempo de serviço, era reconhecido pelos seus pares como o único membro do Conselho Escolar com o conhecimento profundo das necessidades do Instituto e com todas as qualidades e o tempo que aos restantes falta[va] 84 IST, Núcleo de Arquivo, Corresponquase em absoluto85. A 10 de Agosto dência Recebida e Actas das Sessões do Concelho Escolar (1918-1927), de 1927, seria nomeado pelo GoActa da Sessão do Conselho Escolar verno como director efectivo do de 21 de Junho de 1927. 85 Idem. Instituto Superior Técnico.

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Como director do IST, Duarte Pacheco estava agora investido de plenos poderes de representação e negociação. Como atrás se referiu, a 5 de Fevereiro de 1927, Duarte Pacheco informara o Conselho de que haviam já sido iniciadas as negociações com o proprietário do terreno sobre o qual se construiria o novo edifício do IST86. Este terreno situava-se nas imediações do bairro do Arco do Cego, o primeiro bairro social de Lisboa, ideia da I República mas ainda inacabado. Em 1927, arrancava em definitivo a obra do bairro do Arco do Cego, iniciando-se também o projecto do IST. A CML tomaria a responsabilidade de execução do projecto do bairro social que estaria concluído em 1935. Em 1935, tinha também início o primeiro ano lectivo nas novas instalações do IST. Esta campanha de obra concertada, este duplo interesse que decidiu a retoma de um projecto e a aceitação de um outro que lhe era contíguo, materializava os diálogos e os objectivos comuns de duas instituições. Em 1927, Duarte Pacheco era director do IST e na mesma data era presidente da CML o coronel Vicente de Freitas. Numa iniciativa concertada, estes dois homens, encabeçando as instituições que dirigiam, marcariam a urbanização e a extensão daquela zona da cidade. Alguns arruamentos estavam já lançados, contudo a determinação na conclusão do bairro do Arco do Cego e a escolha do local de implantação do campus universitário seriam duas obras que, decisivamente, iriam valorizar os terrenos circundantes. A Câmara Municipal de Lisboa avançou com a conclusão da obra do bairro, actualizando contudo a faixa social destinada a ocupar os fogos; já não os operários mas antes a burguesia de serviços, nomeadamente a dos próprios serviços camarários87. Com esta mesma percepção e com o empréstimo contraído com a CGD, o IST comprou os terrenos necessários à área de construção do novo edifício. Mas foi literalmente mais longe. Adquirindo uma área bem mais alargada do que a necessária à construção, o Instituto investiu capital na compra de prédios rurais, pois o que ali existiam eram quintas. Apresentado o plano de obra à Câmara Municipal de Lisboa obter-se-ia o licenciamento de construção. Mas na licença obtida foi contemplada toda a área adquirida e não apenas a área necessária à construção das novas instalações da escola. Com esta medida, o investimento feito pelo IST havia capitalizado num muito curto 86 IST, Núcleo de Arquivo, Correspondência Recebida e Actas das Sessões espaço de tempo. Tendo adquido Concelho Escolar (1918-1927), rido prédios rurais, o IST era Acta da Sessão do Conselho Escolar agora proprietário de prédios de 5 de Fevereiro de 1927. 87 SILVA, Raquel Henriques da, “Bairro urbanos, pois tinha já licenciada Social do Arco do Cego”, Portugal: Arpela câmara a área de terrenos quitectura do Século XX, TOSTÕES, Ana; Becker, Annette; WANG, Wilpara construção. Licenciada a fried (com.), Munique, Nova Iorque, urbanização, seria possível penFrankfurt, Lisboa, Prestel / DAM / PF 97, 1998, p. 162. sar no saneamento e nos arrua-

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mentos, e com a valorização obtida na alteração de valor de mercado, o IST venderia parcelas do terreno a um preço superior ao da aquisição. Esta situação permitiria o acumular de valores que seriam canalizados para o fortalecimen­to de uma segunda verba necessária ao Instituto: a verba des­tinada ao financiamento da construção. É já como proprietário que o IST faz permutas de terrenos com a CML88, permutas essas necessárias a obras camarárias e não a obras de extensão do campus universitário. Com efeito, só no ano de 1929 a troca de terrenos ascendeu ao valor total de 10 970,72/m2 destinados a leitos de rua. Mas a autarquia não foi caso único. Outras instituições públicas comprariam ao Técnico terreno necessário à construção. Foi o caso do Instituto Nacional de Estatística. A 23 de Março de 1933, o IST recebia do INE a quantia de 300 000$00 correspondente à segunda prestação do pagamento de um lote de terreno89. A 11 de Maio de 1934 o mesmo INE pagaria a quantia 200 000$00, correspondente à terceira prestação90. O mesmo aconteceria com particulares. A 13 de Novembro de 1932 o Instituto recebia de Augusto Pontes dos Santos Chaves como sinal de princípio de pagamento de um terreno na Av. Miguel Bombarda e com a área de 430,08 m2 ao preço de 100$00 cada 1m2 a quantia de 5 000$0091. Em carta datada de 25 de Novembro de 1932 e endereçada ao director-geral do Ensino Técnico, o IST informava que nos 88 Entre os anos de 1929 e 1942, o IST permutou dezenas de parcelas de anos económicos de 1927 a terrenos com a Câmara Municipal de 1932 obtivera 1419 121$18 em Lisboa. receitas próprias, verba que CML, Arquivo Intermédio – Arquivo Municipal do Arco do Cego, Escrientregara ao Tesouro92. No turas de Trocas de Terrenos. A 9 de Fevereiro, em documento assinado ano de 1933 a receita obtida na pelos dois outorgantes, Câmara e o venda de terrenos atingiria os Instituto Superior Técnico, está des917 529$3093. crito que a Câmara entrou na posse de 10 950,72m2 de terreno destinado Todas estas actividades estavam ao prolongamento da Avenida Miguel contudo consignadas em lei. O Bombarda, dando em troca dois talhões de terreno, um com a área de decreto n.º 13 113 de 1 de Feve1485,49m2 e outro com 646,56m2, reiro de 1927 previra que: Fls 48v (7). Com data de 2 de Feve“As importâncias provenientes da venda dos terrenos sobrantes dos que vão ser adquiridos, poderão ser alienados pelo Instituto Superior Técnico”.94

O decreto n.º 13 718, de 2 de Junho de 1927 acrescia ao Instituto uma ainda maior margem de manobra de negociação:

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reiro de 1929 existe uma escritura de permuta de terrenos entre a CML e o IST, permuta essa que visa conclusão da Avenida n.º 20. A 26 de Março de 1942, a CML compra ao IST um terreno com 113m2, sito próximo da Avenida Almirante Reis. 89 IST, Núcleo de Arquivo, Copiador de Cartas sem numeração (1932-1936). 90 Idem, Ibidem. 91 Idem, Ibidem. 92 Idem, Ibidem. 93 Idem, Ibidem. 94 Alínea a) do Artigo 4º do decreto 13 113 de 24 de Janeiro de 1927, publicado no Diário do Governo, I Série, de 1 de Fevereiro de 1927.

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“É autorizada a comissão administrativa do Instituto Superior Técnico a alienar, por venda ou simples cedência, parcelas ou faixas de terreno adquiridos para as suas futuras instalações, sem o prejuízo do fim a que os mesmos terrenos estão destinados, e a adquirir, por compra ou troca com a Câmara Municipal de Lisboa, ou com quaisquer outras entidades públicas ou particulares, outras faixas ou parcelas de terrenos confinantes, para compensação das que tiver alienado ou cedido”.95

Construção do Instituto Superior Técnico [c. 1934], Pinheiro Corrêa Arquivo Municipal de Lisboa/Núcleo Fotográfico Conclusão da construção do Instituto Superior Técnico [c. 1942], Pinheiro Corrêa Arquivo Municipal de Lisboa/Núcleo Fotográfico

Em todo este processo, e principalmente a partir do momento em que Duarte Pacheco foi nomeado director do IST, tornara-se difícil dissociar a sua figura do Instituto. Seria também muito difícil dissociar o Instituto da figura. Duarte Pacheco encabeçava um projecto: o Técnico. E o Técnico seria o que Duarte Pacheco dele conseguisse fazer ser. O professorado e o Governo já o haviam entendido. E tê-lo-iam entendido ao ponto de académica e politicamente terem delegado neste homem de 27 anos o futuro material de uma escola e a projecção política que daí pudesse advir. Na última referência oficial a Duarte Pacheco, Oliveira Salazar dissera que o seu ministro não era um político na acepção corrente do termo. Do mesmo modo, e em essência, Duarte Pacheco divergia também do modelo de engenheiro, como em 1994, numa cerimónia celebrada no IST, Arantes e Oliveira reconheceria: “Seria errado chamar-lhe um produto típico da Escola, porque ele foi um homem verdadeiramente singular, fora de todos os esquemas”.96

Em Duarte Pacheco todos reconhecemos a convicção. Para os políticos ele era o engenheiro; para os engenheiros era o político. E o que cada um destes grupos encontrava em Duarte Pacheco era a singularidade, a estranheza da faceta que não conseguiam identificar. A ambição de Duarte Pacheco foi simples: a política investia-o do poder de agir. Duarte Pacheco era um político de acção e não de discurso. Acreditava na possibilidade de desenvolvimento através da obra, gerando esta obras subsequentes. Este jovem político acreditava na mudança, no progresso através da acção. Uma acção que abalaria os alicerces das atitudes e das certezas de um conservadorismo que olhava a tradição como a única certeza de futuro.

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Artigo 7.º do Decreto 13 718 de 27 de Maio de 1927, publicado no Diário de Governo, I Série, de 2 de Junho de 1927. OLIVEIRA, Eduardo R. Arantes e, “Obras Públicas em Portugal no Século XX”, in Momentos de Inovação e Engenharia em Portugal no Século XX, Lisboa, D. Quixote, 2004, vol. I, p. 395.

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As novas instalações do Instituto Superior Técnico, construídas entre 1929 e 1942, constituem o primeiro campus universitário erguido em Portugal97. O arquitecto do primeiro projecto edificado de raiz vocacionado para o ensino superior, Porfírio Pardal Monteiro, enfrentava um projecto de obra complexo e vasto e, simultaneamente, contido nos custos. O programa das novas instalações do IST, escola técnica por excelência, implicava a existência de salas de aulas teóricas, salas de trabalhos práticos, laboratórios, anfiteatros, salas de professores, salas de assistentes, sala de conferências, biblioteca, museus de secção e museu de engenharia, salão de festas, dependências da associação de estudantes, serviços de tipografia, serviços administrativos, piscina, ginásio e demais dependências desportivas. A tudo isto acresciam as competências e as especificidades de cada um dos ramos da Engenharia leccionados no IST. Sobre as questões de concepção e organização do programa pedagógico, técnico e científico com vista à estruturação de uma escola modelo, lembraria Pardal Monteiro:

A CONSTRUÇÃO DO TÉCNICO: O DECRETO, O PROJECTO E O CONCRETO

“ (…) [d]a organização do programa das futuras instalações para o ensino das diversas engenharias (…) se incumbiu Duarte Pacheco com alguns professores das diversas especialidades (…) O programa inicial era por tal forma vasto que Duarte Pacheco 97 Em 1934 o decreto n.º 294 de 4 de se viu na necessidade de o Dezembro, publicado em Diário de Governo, II Série de 15 de Dezembro comprimir fortemente”.98

Este vasto programa era o mesmo que Alfredo Bensaude gizara anos antes99. De igual modo, e fixado o programa definitivo, Duarte Pacheco acompanharia de perto a adaptação do programa das instalações ao projecto arquitectónico: “ (…) durante a preparação do projecto Pacheco passava dias e noites no meu atelier numa impaciência enervante (…)”.100

Embora condicionadas pelo limitado orçamento, as obras de construção arrancaram a bom ritmo, mas as críticas não se

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de 1934, determinava a construção da Cidade Universitária de Coimbra e criava a primeira de três das Comissões Administrativas do projecto de obra. As obras da Cidade Universitária tiveram início em 1939, o primeiro edifício foi inaugurado em 1942 e o último em 1975. O projecto geral da Cidade Universitária de Coimbra é da autoria de Cottinelli Telmo. Em 1948, na sequência da morte inesperada, Cottinelli, Cristino da Silva tomava posse como arquitecto-chefe da obra. Em 1949, arrancava o projecto de construção da Cidade Universitária de Lisboa. Porfírio Pardal Monteiro receberia a encomenda dos projectos para a Faculdade de Direito, Letras e Reitoria da Universidade. 98 MONTEIRO, Porfírio Pardal, Memorial, Entrada de Diário de 9 de Novembro de 1956. 99 V. A Génese do Técnico – Alfredo Bensaude, Lisboa, Althum, 2010, pp. 78-81. 100 MONTEIRO, Porfírio Pardal, Op. Cit., Entrada de Diário de 10 de Novembro de 1956.

Construção do Instituto Superior Técnico [c. 1934], Pinheiro Corrêa Arquivo Municipal de Lisboa/ Núcleo Fotográfico

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Novo Campus do Instituto Superior Técnico [s.d], Mário Novais Galeria de Biblioteca de Arte/Fundação Calouste Gulbenkian

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Na história da arquitectura portuguesa, o técnico seria considerado a primeira grande obra pública moderna

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fizeram esperar. Em 1933, ainda apenas as paredes do Técnico estavam levantadas, já as vozes se levantavam também. As obras do Técnico eram o espelho do País: o 8 e o 80. Do pardieiro da Boavista os alunos de engenharia passariam para o colosso da Alameda101. Para o engenheiro Armando Ferreira, autor do ácido artigo de opinião, uma escola que diplomava uma média de 30 engenheiros por ano, sendo que a maioria dos seus estudantes do curso geral cumpriam um programa escolar quase idêntico ao da Faculdade de Ciências, bem podia o Técnico ceder o espaço nos seus vazios pavilhões de especialidade que diplomavam 2 ou 3 alunos por ano para outros alunos de outras escolas, pois existiam faculdades inteiras em casas alugadas! Alfredo Bensaude apelava à razão: “Tenho ouvido dizer que algumas pessoas consideram exageradas as dimensões da nova escola. Parece-me essa crítica injustificada. Os que assim pensam terão talvez em mente o tipo da nossa escola tradicional, em que o ensino se fazia quase exclusivamente por meio de giz e quadro negro (...) As boas escolas técnicas modernas aproximam-se cada vez mais dum aglomerado de laboratórios e de oficinas que se assemelham a verdadeiras instalações industriais”.102

Se a amplitude da construção pasmava alguns, a composição estética afligia outros tantos. Afinal, o Técnico era um caixote!103 Pese embora o facto de a contenção orçamental ter determinado que apenas parte do projecto se concretizasse, uma vez que os edifícios correspondentes aos laboratórios de Hidráulica e de Máquinas e Motores, a poente do pavilhão central, não chegaram a ser construídos, na história da arquitectura portuguesa, o Técnico seria considerado a primeira grande obra pública moderna104, sendo também a primeira obra de Duarte Pacheco, aquela onde ele vivia quase todo o tempo105. A mesma que não quis deixar 101 FERREIRA, Engenheiro Armando, “O Colosso do IST”, in Gazeta dos Camimorrer mesmo quando foi convinhos-de-ferro, Lisboa, n.º 1084, 16 de dado a integrar o Governo, como Fevereiro de 1933, pp. 107-108. 102 BENSAUDE, Alfredo, “O Instituto confessara a Pardal Monteiro: “Veja você como é que eu posso deixar uma obra destas, nesta altura, para ir para o Governo. Eu não entrego isto a ninguém e não posso deixar de levar por diante a construção do novo Instituto. Não posso aceitar, não devo aceitar, quando não isto morre”.106

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Superior Técnico”, in Técnica, Lisboa, Ano XII, n.º 88, Dezembro de 1937, p. 339. “Como poderemos aceitar que em Lisboa e em todo o País se ergam caixotes de Moscovo, de Munique, de toda a parte, menos de Portugal?”, in Arquitectura Portuguesa, n.º 38, Maio de 1938, p. 9. Nesta perspectiva citada por CALDAS, João Vieira, Op. Cit., p. 49. CALDAS, João Vieira, Op. Cit., p. 50. MONTEIRO, Porfírio Pardal, Memórias, Entrada de Diário de 22 de Novembro de 1956. IDEM, Op. Cit..

Piscina e Auditório do novo Campus do Instituto Superior Técnico [s.d], Mário Novais Galeria de Biblioteca de Arte/ Fundação Calouste Gulbenkian

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DUARTE PACHECO – DO TÉCNICO AO TERREIRO DO PAÇO DUARTE PACHECO – O POLÍTICO NA ACADEMIA

Perspectiva da Alameda D. Afonso Henriques tirada do IST com a Fonte Luminosa como pano de fundo [s.d], Mário Novais Galeria de Biblioteca de Arte/ Fundação Calouste Gulbenkian

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Em 1928, no arranque das obras do Técnico, Duarte Pacheco integraria a equipa governamental do coronel Vicente de Freitas desempenhando o cargo de Ministro da Instrução Pública e, entre os anos de 1932 e 1935 anos em que decorrem as obras de maior fôlego na construção das novas instalações do IST, desempenhou o cargo de Ministro das Obras Públicas e Comunicações. Por todo este tempo, embora auxiliado por Beirão da Veiga na direcção do IST, Duarte Pacheco manteve o comando das obras107, mas à medida que o campus se erguia acima da cota soleira, erguiam-se vozes de crítica, sobretudo em relação aos capitais investidos no projecto:

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“Custou já, assim incompleta, ao País, uns 17 mil contos e sabe-se lá o que é preciso gastar para terminar”. 108

Apesar das críticas e das desconfianças de alguns, o Técnico não crescia apenas numa nova forma, crescia também em prestígio técnico, credibilidade e confiança. Apostada a aplicar em prémios escolares a quantia de 1% do valor total obtido anualmente, a empresa Lampada Lumiar, sucursal da Empreza Nacional de Aparelhagem Eletrica (ANAE), pretendia entregar 35% desse valor ao IST109. Propunha a empresa que com esse mesmo fundo fossem criados dois prémios anuais e denominados Lampada Lumiar. Propunha ainda a empresa a atribuição dos prémios da seguinte forma:

“(...) ao aluno que terminar o curso de Engenheiro electrotécnico com a maior classificação e ao aluno mais classificado da especialidade de Electrotecnia”.110

Também a Companhia Cimento Tejo, tendo tomado conhecimento de que seria criada brevemente no Instituto uma cadeira especial para o ensino de cimento armado e suas aplicações, e porque um ensino tão específico só faria progredir a construção civil entre nós, vinha por carta informar a direcção do Instituto da seguinte intenção: “no primeiro ano que funcionar a dita cadeira, entregará mil escudos para serem aplicados como prémio a conferir ao aluno que nela tiver a mais alta classificação

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IST; Núcleo de Arquivo, Correspondência Recebida e Actas do Conselho Escolar (1927-1940), Acta da sessão do Conselho Escolar de 23 de Julho de 1933. 108 FERREIRA, Armando, Op. Cit., p. 108. 109 Na proposta da empresa os restantes 65% seriam atribuídos à Escola Comercial Patrício Prazeres, Escola Industrial Afonso Domingues, Escola Industrial Marquês de Pombal e secção Industrial da Escola Fonseca Benevides e Secção de Arte da mesma Escola. Cfr. IST, Núcleo de Arquivo, Correspondência Recebida e Actas das Sessões do Concelho Escolar 1927-1940, Acta da Sessão do Conselho Escolar de 31 de Julho de 1934. 110 IST, Núcleo de Arquivo, Correspondência Recebida e Actas das Sessões do Conselho Escolar 1927-1940, Acta da Sessão do Conselho Escolar de 31 de Julho de 1934. 107

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e esta importância, enquanto subsistir a cadeira será anualmente posta à disposição para o mesmo fim, no mês em que for necessária”.111

Algo mudara. Nos primeiros dez anos de existência do IST, Alfredo Bensaude enviava cartas às várias empresas existentes para que recebessem como tirocinantes os alunos finalistas do Técnico. Em meados dos anos 30, a construção material do Técnico começara a angariar definitivamente o interesse dos industriais. Esta aliança, este interesse comum entre o IST e empresariado industrial e científico, teria aqui o seu início. Os prémios escolares funcionariam não só como incentivo às boas prestações escolares mas também como forma de incentivo à criação de projectos de investigação e angariação de profissionais competentes. Este tipo de parceria entre a escola e o mercado manter-se-ia e mantêm-se até hoje. Em 1934, o Técnico atingia um dos objectivos que haviam presidido à sua criação: os seus alunos formandos e engenheiros diplomados eram considerados pelos industriais como agentes de progresso. O IST era finalmente reconhecido como a escola de mérito e de excelência que fora criada para ser. Afastado do Governo em Janeiro de 1936, Duarte Pacheco retomava a direcção efectiva do Instituto. Pela mesma data decorria o projecto de reforma do ensino técnico, matéria em que o IST não havia sido consultado, nem em termos pedagógicos nem em termos de conteúdos programáticos e métodos de ensino. Agarrando de forma directa e contundente a questão, Duarte Pacheco procurou saber de forma taxativa qual a posição do Conselho Escolar face à situação. Por outro lado, o facto de argumentar que, contra ou a favor da reforma do ensino técnico, a opinião do Conselho tinha de ser unânime e presente ao ministro da tutela, é um facto que revela uma vez mais o modo de actuação de Duarte Pacheco: directo e objectivo. A última sessão do Conselho Escolar do Técnico presidida por Duarte Pacheco teria lugar a 31 de Julho de 1937. Saía do IST para cumprimento do segundo mandato nas Obras Públicas, abdicando em definitivo da direcção do Instituto mas não esquecia que o projecto delineado em 1927 não estava ainda concluído Em 1942 o gabinete ministerial de Duarte Pacheco subscreveria ao IST verba para o início da construção do laboratório de Hidráulica112. Em 1943 o ministro falecia precocemente. Os pavilhões de Hidráulica e de Máquinas e Motores ficariam por construir.

IST, Núcleo de Arquivo, Correspondência Recebida e Actas das Sessões do Conselho Escolar 1927-1940, Acta da Sessão do Conselho Escolar de 31 de Julho de 1934.

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O Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Duarte Pacheco, no seu Gabinete 1938, autor desconhecido Museu Municipal de Loulé/Centro de Documentação/Fototeca

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A obra pública de Duarte Pacheco teve início em 1925, data do seu ingresso no corpo docente do IST. No desempenho do cargo de director do Técnico, foi responsável pela concretização do plano reformador do seu fundador, Alfredo Bensaude, dando início à renovação material, política, técnica e científica que a Escola assumiria a partir do segundo quartel do século XX. Ao projecto inovador realizado por Duarte Pacheco para o IST, seguiram-se aqueles que realizou na direcção do Ministério da Instrução Pública, no Ministério das Obras Públicas e Comunicações e na Câmara Municipal de Lisboa. No domínio da produção legislativa, Duarte Pacheco foi hábil na construção de um tecido legal que lhe permitiu concretizar os seus projectos de forma rápida e objectiva, mas também autoritária, na medida em que todos os procedimentos e interesses de Estado prevaleceram sobre os interesses e os direitos individuais. O carisma, a convicção e o braço forte da lei constituíram os instrumentos que permitiram a Duarte Pacheco realizar em quinze anos uma obra pública impressionante em número e em escala. Mas uma obra impressionante também no avanço tecnológico, na precisão técnica e na qualidade construtiva. Carismático e portador de uma profunda convicção na possibilidade de desenvolvimento material do País, Duarte Pacheco parecia conseguir transformar simpatizantes em apoiantes de causa. Centralizador no modo de agir politicamente, revelou-se cooperante, flexível e bom ouvinte no modo de trabalhar os projectos, talvez pelo facto de ter sido formado por uma Escola em que o trabalho de equipa sempre foi valorizado como uma das condições inerentes ao sucesso de um projecto. Neste sentido, soube munir-se de uma equipa de trabalho multidisciplinar, eficiente, confiante e produtiva, criando um gabinete de trabalho inédito. Da actividade ministerial de Duarte Pacheco na Instrução Pública e nas Obras Públicas e Comunicações e da sua actividade na gestão camarária da cidade de Lisboa como presidente do município, a historiografia tem traçado em linhas gerais a sua acção política à luz das linhas arquitectónicas e artísticas das principais obras saídas do seu gabinete. Trabalhadas e já discutidas as considerações estilísticas,

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Com maior ou menor dotação orçamental, mas com objectivos precisos e uma equipa de trabalho constituída por técnicos especializados, Duarte Pacheco programou todo um País.

importa identificar as circunstâncias e as condições que permitiram o surgimento da obra pública de Duarte Pacheco. E, traçado o cenário político, económico e social em que foi realizada, importa igualmente identificar o método de trabalho do ministro. Com maior ou menor dotação orçamental, mas com objectivos precisos e uma equipa de trabalho constituída por técnicos especializados, Duarte Pacheco programou todo um País. Num programa que construiu ou reconstruiu as infra-estruturas nacionais, a “grande obra pública” teve o mesmo peso processual que o pequeno melhoramento do caminho vicinal. Se nos manuais da História a grande obra tem tido lugar de destaque, no gabinete de trabalho do ministro mereceu a mesma importância que o pequeno melhoramento. Isto porque, em tudo, Duarte Pacheco considerava que deveria existir coordenação, unidade e eficiência. E neste modelo de actuação, embora pensado de forma particular e exaustiva, cada projecto era parte constituinte e indivisível de um todo. Da análise de vinte anos de discurso do método e obra de Duarte Pacheco emerge um homem profundamente convicto de que a construção material do Técnico, a Cidade, a Instrução, os Equipamentos e as Comunicações tinham uma origem comum na formação dos indivíduos e na construção do País: a viabilidade do futuro. E o futuro para Duarte Pacheco chegou cedo. Se à direcção do Técnico chegara com 27 anos apenas, foi com convicção que o jovem director do Técnico, na véspera de completar 28 anos de idade, tomou posse como Ministro da Instrução Pública. Integrava a equipa governamental do coronel José Vicente de Freitas, o mesmo que anos antes fora presidente da Câmara Municipal de Lisboa. A mesma Câmara na qual Beirão da Veiga fora vereador municipal. Contudo, antes de se lançar por completo à empresa que Vicente de Freitas lhe havia confiado, teria de se deslocar a Coimbra com um propósito: retornar a Lisboa com a certeza de que Oliveira Salazar integraria o Governo como ministro das Finanças. Duarte Pacheco, convincente perante políticos ao ponto de conseguir o decreto de contracção de empréstimos e verbas para construção de uma escola, convincente perante proprietários na venda e permuta de terrenos

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O Ministro das Obras Públicas, Duarte Pacheco à chegada ao aeroporto da Portela de Sacavém [s.d.], autor desconhecido, Arquivo Municipal de Lisboa/Núcleo Fotográfico

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e convincente perante um colégio senatorial de professores catedráticos de um instituto público, que não por mero acaso, o tinham elegido como director de todos eles, parecia talhado para a tarefa. Duarte Pacheco não se deslocou a Coimbra como mero cidadão. 113 Designação utilizada por Gonçalo Canto Moniz na obra Arquitectura Mais do que um republicano de e Instrução. O projecto do liceu moderno 1836-1936, Coimbra, Departadireita incumbido de convencer mento de Arquitectura da Faculdade um anti-republicano a integrar de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, 2007, p. 135. uma equipa governamental113, 114 Fernando Rosas afirma que em Março Duarte Pacheco era um ministro de 1928, quando após a desastrosa já empossado que ia a Coimbra gerência financeira de Sinel Cordes, a ditadura fica sem finanças nem pofalar directamente com um prolítica financeira (...) todas as atenções fessor. Quando Oliveira Salazar se viram para o prestigioso professor de Finanças de Coimbra (...) que se recebeu Duarte Pacheco em faz caro a Duarte Pacheco – enviado Abril de 1928, estava a receber a a Coimbra para o convencer a aceitar a pasta das Finanças – e impõe condivisita do seu ministro, o Ministro ções draconianas que serão aceites. da Instrução Pública. Oliveira Defendemos que Duarte Pacheco vai a Coimbra em Abril, já empossaSalazar poderia até não estar redo do cargo de Ministro da Instrução ceptivo ao convite, mas ficou dePública uma vez que Oliveira Salazar certo receptivo aos argumentos só toma posse como Ministro das Finanças nove dias depois de Pacheco. de Duarte Pacheco: serviço púNa formação inicial do Governo e até blico e condições necessárias ao Oliveira Salazar aceitar o cargo, foi o coronel Vicente de Freitas que interiexercício do cargo114. Salazar tonamente geriu a pasta. Cfr. Fernando mou posse da pasta das Finanças ROSAS, “António de Oliveira Salazar” in Dicionário de História do Estado a 27 de Abril de 1928, não mais Novo, direcção de Fernando ROSAS tendo regressado ao professorae J.M. Brandão de BRITO, Lisboa, Círculo de Leitores, 1996, vol. II, pp. 864. do de Coimbra.

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Vicente de Freitas, designado presidente do Conselho de Ministros na sequência da eleição de Óscar Carmona para Presidente da República, convidou, a 18 de Abril de 1928, Duarte Pacheco a integrar a sua equipa governamental. O coronel escolhia como novo rosto da Instrução Pública o jovem e dinâmico director da escola de Engenharia mais prestigiada do País. A primeira página do Diário de Notícias desse dia traçava o perfil do novo ministro:

A INSTRUÇÃO: SETE MESES E UM PAÍS

“Tomou conta da pasta da Instrução Pública o ilustre matemático e professor sr. Dr. Duarte Pacheco, que muito novo também, é já hoje um dos homens de ciência mais ilustres da nossa terra e desempenhava ultimamente, apesar de ser dos professores mais modernos, por votação unânime do Conselho, as elevadas funções de director do Instituto Superior Técnico, nas quais revelou sempre a maior competência e raras qualidades de ponderação e acção”.115

Assinado o termo de posse, nesse mesmo dia pelas duas horas da tarde116, Duarte Pacheco recolhia ao gabinete ministerial e fazia publicar no Diário do Governo as duas primeiras medidas políticas117. O Programa do ministério sob a tutela de Duarte Pacheco estava indicado na alínea 7 do Programa do Governo empossado em Abril de 1928. Nas palavras do chefe de Governo: “É esse um dos nossos maiores empenhos. A instrução primária ministrarse-á a todos e será gratuita. A secundária e a superior não será preciso desenvolvê-las com tanta intensida115 Diário de Notícias, primeira página, 18 de e serão pagas por aqueles de Abril de 1928. 116 Idem, p. 1. que as quiserem receber (…) 117 Logo na tarde de 18 de Abril de 1928, Mas, além dessas classes de regula a nomeação de reitores e viceinstrução, existe ainda a insreitores dos liceus e dos directores de classe e defi ne o programa de exames trução técnica e é essa que de admissão aos Institutos Superiores procuraremos intensificar o de Comércio de Lisboa e do Porto. V. decreto-lei n.º 15 392, publicado em mais possível, especialmente a Diário do Governo I Série n.º 88. de carácter agrícola, não para A 19 de Abril regula a situação dos professores contratados do Ensino Técnico criarmos novas legiões de enElementar Comercial e Industrial que à genheiros e de doutores, mas data da publicação do decreto n.º 12 147 para organizarmos um verdaestava em exercício de funções e publica ainda a portaria n.º 5323 que revoga a deiro exército de práticos com portaria n.º 4825 que ordenava dispensa conhecimentos necessários à de serviço a todo o pessoal assalariado da Biblioteca Nacional. V. decreto-lei 15 melhor valorização da terra”.118

Duarte Pacheco tutelou a pasta da Instrução Pública de 18 de Abril a 10 de Novembro de 1928. Neste período o ministério produziu cerca de 80 diplomas119.

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398, publicado em Diário do Governo, I Série n.º 89 da Biblioteca Nacional. V. Decreto-Lei 15 398, publicado em Diário do Governo, I Série n.º 89. 118 Idem, p. 2. 119 Caetano Maria Beirão da Veiga, “Duarte Pacheco. Inteligência, Dinamismo e Infatigabilidade” in Revista Internacional, 1951, s/p.

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Duarte Pacheco na tomada de posse enquanto Ministro da Instrução Pública 19 de Abril de 1928, autor desconhecido Arquivo Nacional Torre do Tombo/Fundo Empresa Pública Jornal O Século

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Este facto revela, acima de tudo, o método de trabalho deste político: disciplinar legislativamente o que pode ser corrigido e legislar a construção de novas soluções. Tendo por base a análise da produção legislativa exarada pelo gabinete ministerial, numa primeira fase do mandato Duarte Pacheco procedeu a uma “gestão de recursos humanos e administrativos do ensino”, tendo por objectivo regulamentar de modo uniforme a máquina administrativa do ensino. Esta primeira fase corresponde à etapa inicial do método de trabalho de Duarte Pacheco, a fase reguladora. Na segunda fase do mandato, Duarte Pacheco dá início a uma nova etapa desse mesmo método: a fase de projecto ou das “comissões”. Procedendo à selecção de áreas específicas de actuação política, o ministro cria para cada uma dessas áreas uma comissão de estudo que reúne uma equipa com conhecimentos científicos e técnicos multidisciplinares. Com esta medida o ministro pretende obter não só o diagnóstico aprofundado dos problemas existentes como propostas para a sua solução. Neste sentido, a 21 de Julho de 1928, Duarte Pacheco nomeia uma comissão composta por nove elementos que desempenham funções

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na área do ensino primário, liceal ou superior120. Alguns membros da equipa desempenham cargos de direcção enquanto outros desenvolvem actividade na área da docência. A pluralidade técnica e curricular dos elementos seleccionados por Duarte Pacheco estende-se até à polaridade das opiniões políticas121, mas, para o ministro, o credo político dos elementos constituintes das comissões parecia ser um dado acessório uma vez que interessava somente a contribuição que cada um deles poderia trazer a assuntos que o governante julgava de necessária e urgente resolução. A esta comissão estavam atribuídas seis propostas de trabalho sintomáticas de seis situações existentes na Instrução. O ministro procurava assim optimizar esforços e encontrar soluções eficazes para o combate ao analfabetismo, uma forma eficaz de articulação entre o ensino oficial e o ensino particular, um método rápido de execução de edificações escolares, o cumprimento de normas de higiene e prática desportiva no ensino primário, o estabelecimento da base or- 120 Os membros da comissão criada eram ganizativa das escolas normais os seguintes: Aníbal Valdez de Passos e Sousa, director-geral interino do Enprimárias e reorganização do sino Primário Normal; José Guilherme seu inspectorado e articulação Pacheco de Miranda, inspector-adjunto da Sanidade Escolar e Educação Fído ensino primário praticado sica; engenheiro Francisco Maria Hencom os níveis seguintes de esriques, professor do Instituto Superior Técnico; Bento de Jesus Caraça, procolaridade, nomeadamente o fessor do Instituto Superior de Comérsecundário, e o técnico induscio; António Leitão, director da Escola Normal Primária de Coimbra; Alfredo trial, comercial e agrícola. de Carvalho, professor do Liceu João No domínio do ensino liceal, de Deus; Albano dos Santos Ramalho, foi reunida uma comissão de inspector do Círculo Escolar de Castelo Branco; António Figueirinhas, publiestudo para a criação de resicista e editor da Educação Nacional; e dências estudantis de apoio a Mário Augusto Vieira, professor oficial do Ensino Primário Elementar. alunos deslocados. Para Duarte Cfr. Diário do Governo, II Série, n.º 166 Pacheco, o estudo era a viabilide 21 de Julho de 1928. dade de futuro e era necessário 121 O historiador Joaquim Veríssimo Serrão assinala esta situação de polaridadar um futuro a todos, independe política nos elementos que constituem a comissão encarregada de dentemente das suas origens. elaborar parecer sobre a realidade liNo ensino superior, os decretos ceal. Contudo, também nesta primeira 122 de 1923 e 1924 não produziram comissão existem nomes de oposição directa e pública à linha de actuação nenhum efeito no apoio aos invesda ditadura militar como é o caso de tigadores portugueses123. Duarte Bento de Jesus Caraça. Cfr. SERRÃO, Joaquim Veríssimo, História de PortuPacheco considerou indispenságal (1926-1935), vol. XIII, Lisboa, Edivel a criação de um organismo torial Verbo, 1996, p.s 610-611. permanente de supervisão e 122 Refere-se Duarte Pacheco aos decretos n.º 9332 de 29 de Dezembro de gestão do serviço das bolsas de 1923 e n.º 10 074 de 6 de Setembro de 1924. estudo atribuídas a professores 123 Portaria de 13 de Agosto de 1928, Die alunos, em Portugal e no esário do Governo, II Série n.º 167 de 16 trangeiro, considerando ainda de Agosto de 1928.

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Duarte Pacheco e a Comissão encarregada de elaborar parecer sobre a realidade escolar numa visita a uma escola da rede pública [c. 1928]; autor desconhecido Museu Municipal de Loulé/Centro de Documentação/Fototeca

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necessidade do mesmo organismo promover e orientar os trabalhos de investigação científica através da possibilidade de criação de centros de estudo, de forma a desenvolver e coordenar a actividade intelectual e científica portuguesa. Esta era uma realidade que Duarte Pacheco conhecia bem. No primeiro dia em que tomara assento na sala do Conselho Escolar do IST e exercera o direito do uso da palavra, afirmara a necessidade de incentivo e apoio à investigação e melhor qualificação da classe docente e dos alunos recém-formados do instituto124. Em 1927, por intervenção política directa de Duarte Pacheco, o IST obtivera do Governo uma verba considerável para atribuição de bolsas de estudo125. Contudo, porque a lei vigente não pressupunha a existência de um organismo regulador, gestor e tutelar no domínio da formação e investigação científica, a aplicação prática das bolsas tornava-se difícil e morosa. Como professor e director do IST, Duarte Pacheco tinha experimentado as falhas do sistema. Como membro da equipa governativa e no uso do poder legislativo do cargo que agora desempenhava, decidiu nomear uma comissão cujo objectivo era o de apresentar, no mais curto espaço de tempo, um plano de orga- 124 IST, Núcleo de Arquivo, Corresponnização do necessário organisdência Recebida e Actas do Conselho Escolar Acta da Sessão do Conselho mo tutelar de atribuição, reguEscolar de 6 de Novembro de 1926. lamentação e gestão de bolsas e 125 Diário do Governo, decreto-lei n.º 13 717 de 2 de Junho de 1927. projectos de investigação.

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Mas no domínio da Instrução, a actuação política deste jovem ministro foi mais longe: com a redacção da Portaria de 13 de Agosto de 1928126, Duarte Pacheco determinou a necessidade de intervenção ao nível do ensino liceal. A 11 de Setembro de 1928, criava aquela que ficou conhecida pela designação de Junta dos 40 Mil, embora o decreto a denominasse de Junta Administrativa do Empréstimo para o Ensino Secundário127. A este programa de acção, o ministro aplicava o mesmo método de viabilidade que aplicara um ano antes no projecto das novas instalações do IST: o recurso ao crédito. À Junta assim criada competiria a administração dos 40 000 000$00 a contrair com a Caixa Geral de Depósitos e visando objectivos a cumprir a curto prazo. A Junta dos 40 Mil, criada com o objectivo de planificar as obras dos liceus teria de proceder a um exame das condições materiais de modo a dar balanço às suas necessidades. E para a eficaz elaboração desse exame, o ministro nomeara um representante do Conselho de Inspecção do Ensino Secundário, um engenheiro, um arquitecto, um médico e um representante da Contabilidade Pública128. Nos sete meses de desempenho das funções ministeriais que lhe foram atribuídas, Duarte Pacheco demonstrou saber dar resposta às directrizes traçadas pelo chefe de Governo para a pasta da Instrução. Contudo, na reforma ministerial de Novembro de 1928 o nome de Duarte Pacheco não consta na formação da nova equipa governativa. Cumprindo as directivas respeitantes ao ensino primário e técnico, Duarte Pacheco ignorou as directivas do programa do Governo e foi mais longe, reformulou e pensou o ensino como um todo: do primário ao superior. Defendendo o conceito de “zona pedagógica”, acreditou na criação de uma nova orgânica nas escolas, uma orgânica onde todos os recursos, humanos, administrativos, pedagógicos, didácticos, de conteúdos programáticos e materiais, respeitassem uma mesma unidade e assim actuassem de forma coordenada e eficiente. Em escassos meses e simultaneamente, Duarte Pacheco cumprira e distanciara-se do programa apresentado por Vicente de Freitas em Abril de 1928: Portaria de 13 de Agosto de 1928, Diário do Governo, II Série n.º 187 de 16 de Agosto de 1928. 127 Diário do Governo, Decreto-Lei n.º 15 942, I Série, de 11 de Setembro de 1928. Leia-se MONIZ, Gonçalo Canto, Op. Cit., pp. 135-138. 128 O representante do Conselho de Inspecção do Ensino Secundário e presidente da Junta seria Eusébio Tagmanini, o engenheiro nomeado seria Francisco Maria Henriques, professor do IST, o arquitecto nomeado seria Leonel Gaia, o médico o Dr. Francisco Gentil e o representante da Contabilidade Pública seria Abel Maria Dias da Silva. 129 Declarações de Vicente de Freitas em entrevista ao Diário de Notícias, 19 de Abril de 1928, p. 4. 126

“A [instrução] secundária e a superior não será preciso desenvolvê-las com tanta intensidade e serão pagas por aqueles que as quiserem receber”.129

Duarte Pacheco não alterou regimes de propinas no ensino liceal nem no ensino superior, mas ao decretar a necessidade de existência de residências estudantis para alunos dos dois

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Os Presidentes da República e do Conselho com o Engenheiro Duarte Pacheco, após o compromisso de honra por ter assumido o cargo de ministro das Obras Públicas 25 de Maio de 1938, autor desconhecido Arquivo Nacional Torre do Tombo/Fundo Empresa Pública Jornal O Século

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níveis de instrução, abriu caminho a uma nova linha de actuação política: a assistência social no ensino. E quando o ministro decretou a criação da Junta dos 40 Mil, reconhecia oficialmente a necessidade de renovação material do ensino secundário. Ou seja, o ministro reconhecia ao ensino secundário e ao superior tanta “intensidade de desenvolvimento” quanto ao ensino primário oficial ou particular. Contas feitas, de todos os níveis de ensino em que o jovem ministro actuou politicamente, o menos tocado foi o ensino técnico: uma das bandeiras de salvação erguidas no discursos político de Vicente de Freitas que defendia a intensificação do ensino técnico agrícola130. Talvez seja este facto que justifica a saída prematura de Duarte Pacheco do Governo. Duarte Pacheco regressou assim em Novembro de 1928 à direcção do Técnico. No Ministério da Instrução Pública seria substituído por Gustavo Cordeiro Ramos. Até 1936, o Ministério percorreria um gradual mas firme trajecto de decomposição do sistema de ensino republicano que Duarte Pacheco consolidara até se transformar no sistema educativo do Estado Novo. Republicano convicto, Duarte Pacheco defendera o ensino e incentivara hábitos de leitura pois acreditava que ler constituía um elemento de principal importância para o desenvolvimento de cidadãos plenos; para o projecto educativo nacional de Carneiro Pacheco, as primeiras letras bastariam para que a nação apreendesse a 130 lição de Salazar. Vide Supra nota 18.

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DUARTE PACHECO E LISBOA: AS MUDANÇAS NA CIDADE

A acção de Duarte Pacheco, quer como presidente da Câmara quer como ministro das Obras Públicas, provocou grandes alterações na cidade de Lisboa. A criação da Lei dos Planos Gerais de Urbanização132, a qual vinculava as Câmaras ao estudo da sua topografia e a um consequente plano de urbanização, veio reforçar a ideia de que a cidade deve ser pensada como um todo, sujeito a um plano que abarque toda a sua área. Os planos locais de urbanização, as pequenas obras, as intervenções particulares deveriam estar sujeitas a um desígnio maior, a própria organização da cidade. A sua acção obedeceu a um plano de urbanização, só concretizado depois da sua morte, que acabaria por Ana Homem de Melo131 promover novos eixos de desenvolvimento da cidade. A sua primeira intervenção no tecido urbano, a construção do Instituto Superior Técnico133, foi o laboratório onde Duarte Pacheco testou a sua visão do que deveria ser a organização do território, primeiro em Lisboa e depois alargada a todo o País. Para esta zona da cidade tinha a Câmara Municipal de Lisboa planeado um conjunto de novos arruamentos134, para expansão da urbe, em terrenos até então ocupados pelo que restava de antigas propriedades agrícolas de séculos passados, pelo que o Arquitecto teve de desenhar o seu projecto incluindo esse plano pré-existente. De entre os arruamentos então projectados, previa-se a abertura de uma larguíssima alameda a qual acabaria por influenciar o projecto de Pardal Monteiro 131 Gabinete de Estudos Olisiponenses, que, na sua direcção, fez edifiCâmara Municipal de Lisboa. car a principal fachada do Ins- 132 Decreto-lei 24 802 de 21 de Dezemtituto. A Alameda, que em 1932 133 bro de 1934 O Instituto funcionava até então em receberia o nome do monarca instalações na Rua da Boavista, as quais se mostravam reconhecidafundador de Portugal, realizoumente insufi cientes para o número de se entre 1936 e 1946, década que alunos e para a qualidade de ensino assistiu também à construção 134 que se pretendia para a instituição. Terá sido o projecto aprovado em dos conjuntos habitacionais que Sessão de 7 de Abril de 1928, pois na Sessão de 23 de Março de 1932 na formam o chamado Bairro dos qual é aprovado o topónimo Alameda Actores135. Nesse ano de 1932 um D. Afonso Henriques e outros topónimos para a mesma zona, faz-se refeartigo de jornal anunciava o prorência a esse projecto. Veja-se Actas jecto da alameda dizendo: “Fodas Sessões da Câmara Municipal de ram aproveitadas as magníficas Lisboa. Anos 1928 e 1932. Lisboa: Imcondições topográficas dos terre- 135 prensa Democrática, 1886-1982. Este Bairro dos Actores edifi cado nos a cortar pela nova alameda, segundo um projecto de 1939, englobou edifi cado anterior que formava em forma de bacia, o que permio Bairro dos Aliados (dos anos 20) e tirá de qualquer local ver toda a estendeu-se por terrenos da Quinta alameda. Esta alameda vai dar 136 da Saúde e da Horta da Cera. A grande alameda da Lisboa. In Diáum grande realce ao conjunto rio de Notícias, Lisboa (04/04/1932). Consultado em: D. Afonso Henriques, de avenidas a construir ali e queAlameda – Ficheiro Toponímico Luís brará a monotonia das grandes Pastor de Macedo. Gabinete de Esturectas (…)”136. No topo norte da dos Olisiponenses

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Planta da cidade de Lisboa com indicação das obras realizadas pelo Engenheiro Duarte Pacheco e principais artérias do plano de urbanização da cidade. [194?] Revista Municipal: número especial dedicado à memória do Engenheiro Duarte Pacheco. Lisboa: Câmara Municipal de Lisboa, Jan. 1944. Museu Municipal de Loulé/Centro de Documentação 1 – Instituto Superior Técnico 2 – Abastecimento de Água a Lisboa 3 – Instituto Nacional de Estatística 4 – Bairros de casas económicas 5 – Emissora Nacional 6 – Estação marítima de Alcântara 7 – Casa da Moeda 8 – Estrada marginal Lisboa-Cascais 9 – Acesso ao estádio Nacional 10 – Ponte sobre o vale de Alcântara 11 – Estádio Nacional 12 – Castelo de S. Jorge 13 – Teatro de S. Carlos

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14 – Comemorações Centenárias 15 – Palácio da Assembleia Nacional 16 – Estação Fluvial de Belém 17 – Obras novas da Praça do Império 18 – Museu Nacional de Arte Antiga 19 – Novas artérias do plano de urbanização 20 – Parque florestal de Monsanto 21 – Aeroporto de Lisboa 22 – Novas edificações 23 – Mercado de Arroios 24 – Museu da Cidade 25 – Exposições Nacionais de Floricultura 26 – Parques infantis

27 – Jardins públicos 28 – Nova fábrica de gás da Matinha 29 – Bairro da Quinta da Calçada 30 – Alameda D. Afonso Henriques 31 – Centrais Telegráfica, Telefónica e Circunscrição Técnica de Lisboa 32 – Edifícios Universitários 33 – Praça do Areeiro 34 – Bloco de construções para a Rua Eiffel 35 – Parque Florestal de Monsanto 36 – Novo cemitério de Monsanto

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Alameda foi projectada uma monumental fonte luminosa celebrando a chegada das águas do canal do Tejo à cidade, através de obras de melhoramento do canal do Alviela, iniciativa de Duarte Pacheco. A Fonte remataria a nova alameda contrapondo-se ao modernista Instituto o qual poderia ser apreciado a partir dos terraços expressamente construídos para tal. Projectada em 1939 pelos arquitectos Rebelo de Andrade e com a valiosa participação dos escultores Diogo de Macedo e Maximiano Alves137 e do pintor Jorge Barradas, a fonte foi edificada em terrenos da Quinta do Alperche e viria a ser inaugurada em Maio de 1948 por ocasião da I Exposição de Obras Públicas, organizada pelo Ministério das Obras Públicas e patente no Instituto Superior Técnico. Ainda junto ao Técnico foram construídos de raiz dois edifícios para albergar serviços do Estado: o Instituto Nacional de Estatística e a Casa da Moeda. O primeiro foi projectado em 1931 por Pardal Monteiro, começado a edificar em 1932 em terrenos que pertenciam ao vizinho Instituto Técnico e inaugurado em 1935, ano em que o actual Instituto de Estatística foi criado. Situado num gaveto, escolheu o arquitecto o lado poente (central) para principal fachada e chamou a colaborar Leopoldo de Almeida para a sua decoração exterior. Com projecto do arquitecto Jorge Segurado, de 1934, inaugurou-se em 1941 a nova sede da Casa da Moeda, até então a funcionar num palacete na Rua de São Paulo. Ocupando todo um quarteirão, é formado por um corpo destinado à administração e os restantes às oficinas, de aspecto exterior propositadamente racional, sem embelezamentos desnecessários num edifício que se pretendia fabril138. 137 Estes mesmos arquitectos e Maximiano Alves foram os autores do arMas para além da criação das novas instalações do “seu” Ins- 138 ranjo estético do Sifão do Alviela. Veja-se TOSTÕES, Ana – Casa da tituto, Duarte Pacheco viria a Moeda e Valores Selados. [Em linha] [Cônsul. 2001-04-04]. Disponível em provocar alterações em quase http://www.igespar.pt/pt/patrimonio/ toda a cidade de Lisboa. No pesquisa/geral/patrimoniomovel/dearranque da década de 1930, tail/330093/

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Fonte Monumental Luminosa [post. 1948], autor desconhecido Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

D P A O N A

Perspectiva da Alameda D. Afonso Henriques tirada do topo da Fonte Luminosa com o IST como pano de fundo [post. 1948], autor desconhecido Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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~ PROJECTADOS, DE ENTRE OS ARRUAMENTOS ENTAO PREVIA-SE A ABERTURA DE UMA LARGUISSIMA ´ ALAMEDA A QUAL ACABARIA POR INFLUENCIAR O PROJECTO DE ~PARDAL MONTEIRO QUE, NA SUA DIRECCAO, FEZ EDIFICAR ´ A PRINCIPAL FACHADA DO INSTITUTO

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Vista frontal do Instituto Nacional de Estatística 1932, Lisboa, autor desconhecido Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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Casa da Moeda 1940, Alvão, Porto Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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Lisboa persistia em manter-se nas orientações expansionistas ainda provenientes do final do século XIX, ao longo dos eixos criados pela Avenida da Liberdade (1886) e Avenidas Novas (1904) rumo a norte até ao Campo Grande, de grandes quarteirões e arquitectura cuidada, e do eixo a oriente, formado pela Avenida Almirante Reis, onde a iniciativa particular fizera construir bairros mais económicos de prédios de rendimento. Em 1938, quando foi dado a conhecer o relatório elaborado por António Emídio Abrantes, Elementos para o estudo do plano de urbanização da cidade de Lisboa139, afirmava este engenheiro da Direcção dos Serviços de Urbanização e Obras: “A tendência natural do desenvolvimento da capital tem sido feita no sentido norte e não ao longo do Tejo e para a zona ocidental, como tudo indicava. As causas determinantes dessa tendência são as facilidades de transporte para a zona norte da cidade e a existência ali de materiais e terrenos apropriados para construções, servidos por redes de canalizações. (…) Atribui-se o pouco desenvolvimento da capital para a sua parte ocidental, exactamente a mais bela, a mais higiénica, aquela de onde se desfrutam melhores perspectivas e mais deslumbrantes panoramas (em contraste com a aridez e monotonia da parte norte), à existência do vale de Alcântara, com as suas encostas muito declivosas, que dificultam a expansão urbana para esta zona, onde só se tem construído junto à margem do Tejo”. 140 Sobre a qualidade da habitação o autor apresentava um quadro desolador afirmando que ela era no geral deficiente pela falta de redes de esgoto e de abastecimento de água. Chamava a atenção para o problema dos bairros de barracas que alojavam então 41 796 habitantes; para o facto de, exceptuando os operários que habi- 139 A intenção de fazer um relatório de tavam os poucos bairros particumelhoramentos a realizar em Lisboa, fora já apresentado por este enge141 lares e do Estado construídos nheiro, em 1932, numa conferência para essa classe, as casas operáde imprensa. (V. Costa; Sandra Vaz – O País a régua e esquadro: urbarias serem insalubres. Relata que nismo, arquitectura e memória na a classe média habitava em casas obra pública de Duarte Pacheco. Dissertação para a obtenção do grau de de renda antiga mas muito pouDoutor em História, na especialidade co higiénicas ou então em casas de Arte, Património e Restauro. Universidade de Lisboa, Faculdade de de renda elevada o que obrigava Letras, 2009, p. 287 e seguintes). à partilha dessa casa por mais do 140 LISBOA. Câmara Municipal. Direcção que uma família. Quanto à classe dos Serviços de Urbanização e Obras - Elementos para o estudo do plano que designava por abastada ou de urbanização da cidade de Lisboa burguesa afirmava que optavam [dactilografado] / Câmara Municipal de Lisboa, Direcção dos Serviços de muitas vezes por porem a render Urbanização e Obras, elaborado por as propriedades que possuíam, António Emídio Abrantes. Lisboa, Câresidindo antes em casas de pio- 141 mara Municipal, 1938, pp. 21-22. “(…) ultimamente edificados, no Arco do res condições. Na sua apreciação Cego, Alto da Ajuda, Terras do Forno e Alto da Serafina.” Op. Cit., p. 35. sobre o estado da habitação An-

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Estrada Marginal Lisboa-Cascais 1940, Alvão, Porto Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses O Chefe de Estado e o Ministro das Obras Públicas no Aeroporto de Lisboa. [c. 1940], autor desconhecido Arquivo Nacional Torre do Tombo/Fundo Empresa Pública, jornal O Século

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tónio Abrantes concluiu afirmando que era para as classes pobres que faz mais falta a construção de habitação. Na Lisboa de então, ao núcleo histórico da Baixa/Chiado/Castelo densamente urbanizado e povoado, contrapunham-se junto dos limites do concelho, pequenos núcleos povoados e extensas áreas de cultivo. As zonas industrializadas (a ocidente, Alcântara e Belém e a oriente, Beato, Xabregas e Marvila) de forte ligação ao Tejo para a chegada de matérias e saída de produtos, atraíam numerosa população que se alojava em condições precárias de habitabilidade. A importância do Porto de Lisboa fora já alvo da atenção do Estado que, em 1930, iniciara obras de ampliação do mesmo, dado o volume de transporte de passageiros e de mercadorias que ele atingia. O mesmo se passava com as restantes “ligações com o exterior” como as designou António Abrantes: a ligação entre o caminho de ferro e uma gare marítima; a criação de novas gares marítimas de passageiros e cargas; o projecto de construção de uma auto-estrada Lisboa-Cascais e da estrada Marginal; a construção do Aeroporto da Portela para substituir o aeródromo da Granja do Marquês, em Sintra. No campo da Educação, António Abrantes depois de elencar as escolas primárias, as profissionais e as de ensino médio referia-se ao campus universitário projectado para os terrenos junto da actual Avenida das Forças Armadas onde seriam concentradas algumas das Faculdades dispersas pela cidade em edifícios impróprios para tal função142. A partir do início da década de 1930, com a consolidação 142 Na Cidade Universitária ficariam reunidas as Faculdades de Letras (então do Estado Novo, criaram-se as na Rua do Arco a Jesus), de Direito (no Campo dos Mártires da Pátria), a condições político-económicas de Farmácia (na Quinta da Torrinha) para uma nova fase de desenvole o Hospital Escolar (Futuro Hospital vimento de Lisboa, procurando de Santa Maria).

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Bairro de Belém 1940, Alvão, Porto Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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dar resposta ao constante crescimento demográfico143 e às consequentes necessidades habitacionais, viárias e de equipamentos. A existência de condições degradantes de habitação operária em Lisboa foi mal que acompanhou desde cedo a formação de uma tímida industrialização da cidade. Apesar de inúmeras vezes debatido pela Câmara, e demais entidades competentes, o meio para urbanizar alguns terrenos perto das zonas operárias, nunca foi levado avante tal projecto. Os bairros que foram nascendo destinados a alojamento da população operária, com preocupações sanitárias, eram de iniciativa particular. Foi necessário esperar pela I República para que a questão fosse mais eficazmente debatida e para que começassem a surgir novos projectos de iniciativa pública destinados a alojar uma crescente população operária e de pequena e média burguesia. Em 1919 o Governo legislou a favor da criação de bairros residenciais económicos (decreto de 14 de Abril de 1919), dos quais o primeiro a arrancar foi o do Arco do Cego (1919) e o segundo o da Ajuda (1920) mas que em 1927 ainda não tinham sido concluídos. Seriam inaugurados em 1935 e 1934 respectivamente. A partir da década de 1930, a questão ganha novo alento com a promulgação dos Planos Gerais de Urbanização (1934) os quais delegavam nas Câmaras o papel de agentes urbanizadores dos seus concelhos, vindo permitir a execução de obras de melhoramento de habitação social. Por outro lado, a Lei das Expropriações e um novo regime de financiamento da construção, com o apoio do Fundo do Desemprego e da previdência social permitiram um ritmo constante na edificação de bairros sociais para alojamento de diferentes tipos de população. Assim, para as famílias que viviam em barracas, e atendendo à urgência em extingui-las, projectaram-se os Bairros de Casas Desmontáveis144. Estes bairros dariam uma resposta imediata às necessidades básicas destes agrupamentos familiares pois estava incluída a mudança para casas já mobiladas, com rendas de valor entre 60 e 90 escudos, consoante o número de divisões (de 3 a 6), e o pagamento de água e luz. Para além de uma nova casa, as famílias recebiam o apoio da assistência social que funcionaria em instalações construídas dentro do próprio bairro, onde existiam também vários equipamentos (creches, cantinas escolares, mercado, igreja, campos de jogos, etc.). Entendia-se que as 143 Em 1900, Lisboa tinha 352 210 habitantes; em 1911, 431 738; em 1920, famílias alojadas nestes bairros 484 664; em 1930, 591 939; em 1940, seriam “reeducadas” de modo 694 389 habitantes. In FERREIRA; Vítor Matias, A Cidade de Lisboa: de caa permitir a aquisição de novas pital do império a centro da metrópole. aptidões sócio-laborais, o que Lisboa, Dom Quixote, 1987, p. 91. as levaria a um novo patamar 144 Enquanto os outros tipos de Bairros Sociais se estenderam a todo o País, social e à mudança para casas esta tipologia apenas foi utilizada em Lisboa. permanentes. Em 1948, consi145 Seguimos aqui Lisboa. Câmara Muderava-se este projecto um êxinicipal – Le problème de logement. Lisboa, Câmara Municipal, 1948. to145, afirmando-se que bastava

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Bairro da Quinta da Calçada 1940, Alvão, Porto Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses Bairro do Alto de Serafina 1940, Alvão, Porto Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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um máximo de 4 anos para que as famílias pudessem transitar para o nível seguinte de habitação. Até então tinham sido construídos três destes bairros de casas desmontáveis, o que era considerado o suficiente para as necessidades. Eram eles o Bairro da Quinta da Calçada, da Quinta das Furnas e o da Boavista. Para além desta construção provisória, quer a Câmara Municipal quer o Estado investiram noutras tipologias destinadas a classes sociais menos desfavorecidas, mas que tinham de ser realojadas devido às novas obras em curso na cidade. Os bairros de renda popular destinavam-se a um segmento de população que possuía rendimentos mensais entre 1 000$ e 3 000$ escudos, provenientes do seu trabalho e que formavam famílias legalmente constituídas. Muitos deles serviriam para realojamento de população que veria as suas casas demolidas ao abrigo das transformações que se iam operando em Lisboa. A mudança era feita a expensas da Câmara Municipal e as rendas eram estabelecidas em função dos rendimentos familiares. Predominantemente destinados ao operariado, é exemplo deste tipo o bairro da Quinta do Jacinto, edificado em terrenos onde existira a quinta de Jacinto Gonçalves146 e de que era proprietária a sua viúva. Localizado entre a Calçada da Tapada e o Estádio da Tapadinha, o seu projecto é de 1937 e a sua construção 146 Jacinto Gonçalves (n. 1853, Póvoa da desenvolveu-se até 1958, pelo que Galega – m. 1920, Lisboa) veio muito novo para Lisboa trabalhar como abarca várias tipologias, desde as marçano, passando rapidamente a pequenas moradias geminadas, merceeiro. Vendida a loja, investiu no ramo de transportes de carga (1878) unifamiliares até aos prédios coe de passageiros (1886). As suas colectivos plurifamiliares. Foi uma cheiras localizavam-se de início no topo da actual Rua Feliciano de Soudas primeiras iniciativas camarása, passando depois para a Calçada rias para a habitação operária. da Tapada onde, após desactivar a Os Bairros de Casas Económicas, sua empresa, se dedicou à agricultura. Veja-se: CALIXTO, Vasco, “Os que foram construídos em maior velhos carros do Jacinto”, in Diário de número do que as restantes tipoNotícias, Lisboa (25-02-1960). (Consultado em Bibliografia Olisiponense: logias, serviram para alojamento recortes de jornais / Pastor de Macede famílias de melhores rendimendo; vol. 4, p. 45. Gabinete de Estudos Olisiponenses). tos e que adquiriam o estatuto de

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Bairro de Campolide 1940, Alvão, Porto Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses Escola Primária do Bairro de Campolide 1940, Alvão, Porto Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses Diferentes tipologias de escolas primárias da Vila de Tábua [s.d.], fotos e arranjo de Mário de Almeida, Ovar Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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locatários adquirentes o que permitia, como o nome indica, a aquisição da propriedade ao fim de um período longo de tempo. Estes bairros eram compostos por moradias unifamiliares (geminadas ou não) rodeadas por terreno destinado a horta ou/e jardim. Distribuíam-se por 9 tipos diferentes, consoante o número de divisões, e destinavam-se a agregados familiares mais ou menos numerosos. Também a renda variava conforme o agregado e os seus rendimentos, e foram financiados por várias instituições. Desta última tipologia são exemplos os Bairros da Encosta da Ajuda, da Madre de Deus e da Encarnação. Além da questão da habitação, Duarte Pacheco dedicou grande parte da sua actividade à renovação da rede viária de Lisboa. Dentro do perímetro urbano, reorganizou a circulação na Avenida Almirante Reis (1938-1939), retirando a placa central que até então existia, permitindo o alargamento das faixas de rodagem. No Largo do Rato, então chamada Praça do Brasil, realizaram-se obras de melhoramento (1939), demolindo algumas das antigas casas para dar mais espaço para a circulação. O prolongamento da Avenida Almirante Reis147, rasgada para norte, permitindo o acesso ao aeroporto, foi outro dos projectos realizados durante a sua gestão (1939). Fora do perímetro da cidade, lançaram-se novos eixos de saída. A Marginal, aberta junto ao Tejo, para ligação à Costa do Sol, também ela objecto de um plano de urbanização específico, tinha o duplo objectivo de ligação a Cascais, e o de percurso turístico, explorando a beleza da paisagem e das localidades que atravessava. A sua construção, limitada pela existência da linha férrea, de património construído, das zonas balneares, colocou entraves a uma traçado rectilíneo, optando-se antes pelo acompanhamento marginal e curvilíneo do curso de água. A construção da auto-estrada Lisboa-Cascais, primeira no género em Portugal, arrancou em 1940, foi inaugurada em 1944, mas só viria a ser terminada, em toda a sua extensão, em 1991. Até este ano, apenas atingia o Estádio Nacional, no vale do 147 A Avenida viria a ser designada por Avenida do Aeroporto e, a partir de Jamor. O principal obstáculo à 1960, recebeu o nome de Almirante Gago Coutinho. construção de uma ligação entre

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Lisboa e a sua zona ocidental, era, segundo o parecer de António Abrantes, o vale de Alcântara. Tal obstáculo foi ultrapassado com a construção do Viaduto, projecto do engenheiro Barbosa Carmona e edificado pela Junta Autónoma das Estradas, considerado uma das maiores obras de engenharia de então, com o comprimento de 358 m, 24 m de largura e no tramo central com um vão de 91 m por 36 de altura. Inaugurado em 1944 recebeu o nome do seu mentor numa das cerimónias de homenagem prestadas em Lisboa. Ainda na área dos transportes, novos projectos foram apresentados. Para norte, Duarte Pacheco apostou na criação de uma outra autoestrada com saída entre os recém-criados Bairro da Encarnação e Aeroporto da Portela, iniciada em 1940, mas que não ultrapassou a saída da Encarnação. As obras só viriam a ser retomadas em 1963. Desde 1919 que os aviões aterravam num denominado Campo Internacional de Aterragem, em Alverca, ou no Aeródromo da Quinta da Granja, em Sintra. Os voos transatlânticos eram realizados em hidroaviões, e os passageiros só viajavam em aviões em voos continentais, pelo que sendo Lisboa a cidade mais ocidental da Europa era um nó fundamental na jovem aeronáutica. Em 1928 foi apresentado um projecto para a construção de um aeroporto na Portela, projecto esse que não se realizou. Porém, quando na década de 1930 se determinou a construção de um aeroporto manteve-se a escolha do planalto entre a Charneca e a Portela de Sacavém, zona agrícola, criando-se um novo projecto, da autoria do arquitecto Francisco Keil do Amaral (edifícios e espaços exteriores) e engenheiros Santos Silva e Lopes Monteiro (pistas). Iniciaram-se as obras em 1938 neste local e em

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Panorama do Viaduto Duarte Pacheco [1940], autor desconhecido Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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CONSIDERADO UMA DAS ~MAIORES OBRAS DE ENGENHARIA DE ENTAO FOI INAUGURADO EM 1944 RECEBEU O NOME DO SEU MENTOR NUMA DAS CERIMONIAS DE HOMENAGEM ´ PRESTADAS EM LISBOA

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Cabo Ruivo onde funcionaria até 1950 o local de amaragem dos hidroaviões. O objectivo era que os dois aeroportos ficassem ligados entre si por uma larga avenida designada Avenida Entre Aeroportos (actual Avenida de Berlim) por onde os passageiros eram levados de carro entre os dois aeroportos. As estruturas ligadas à navegação marítima foram melhoradas com a construção das Gares Marítimas da Rocha do Conde de Óbidos, projectada por Pardal Monteiro148 em 1934 e construída entre 194548, e a de Alcântara, do mesmo autor e inaugurada em 1943. Ambas com estrutura em betão armado e de linhas modernistas, tinham à altura do primeiro andar a área reservada aos passageiros e no piso inferior os serviços para carga e uma forte presença da arte modernista nos murais da autoria de Almada Negreiros. O embarque/desembarque dos passageiros seria feito directamente através de uma ponte móvel entre a galeria exterior do primeiro andar e o barco. O projecto inicial previa que as duas gares estariam ligadas entre si por uma extensão da referida galeria com o comprimento de um quilómetro, nunca realizada. Já em 1940, por ocasião da Exposição do Mundo Português, fora inaugurada a Estação Fluvial de Belém, projecto do arquitecto F. Caetano de Carvalho, para facilitar o transporte de passageiros entre as duas margens do Tejo. A Exposição do Mundo Português provocou, aliás, uma das maiores transformações num espaço urbano lisboeta. Em 1938, a 27 de Março, era anunciada publicamente, através de uma nota oficiosa da Presidência do Conselho de Ministros, a iniciativa das Comemorações Centenárias, as quais celebrariam em 1940 o 8.º centenário da Fundação de Portugal e o 3.º centenário da Restauração da Independência. Para essa dupla comemoração, foi apresentado um vastíssimo programa, que incluía um conjunto de obras de construção e melhoramento de infra-estruturas (estações ferroviárias, rede viária, hotéis e pousadas, aeródromo), a realização de congressos internacionais, cortejos e festas e a edição de livros, mas cujo ponto alto era a realização de uma Exposição Histórica do Mundo Português na cidade de Lisboa. Para a capital previa-se ainda a conclusão de várias obras como a Casa da Moeda, o corpo anexo ao Museu de Arte Antiga149, das obras do Palácio de São Bento, o restauro 148 Para toda a equipa de arquitectos e do Teatro de São Carlos a consengenheiros que participaram nos projectos, veja-se COSTA, Sandra trução da auto-estrada LisboaVaz, Op. Cit., p. 320. Cascais e da estrada Marginal, 149 Projecto do arquitecto Guilherme Rebelo de Andrade, iniciado em 1930 e do Estádio Nacional150, o arraninaugurado em 1940 com uma expoque dos Hospitais Escolares, sição dedicada aos Primitivos Portuo desenvolvimento do Parque 150 gueses. Projecto de 1939 da autoria do arquiFlorestal de Monsanto e da hatecto Miguel Jacobetty Rosa, inaugurado em 1944. bitação social.

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Estação Fluvial de Belém 1940, Alvão, Porto Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses Hospital Escolar de Santa Maria, fachada principal [post. 1953], Alvão, Porto Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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Para a execução das comemorações foi criada a Comissão Nacional dos Centenários com várias secções151 dirigida por Augusto de Castro, que tomou posse em Dezembro de 1938 e da qual fazia parte Duarte Pacheco como presidente da Câmara Municipal de Lisboa. Neste cargo, o engenheiro insistiu especialmente em três das iniciativas camarárias necessárias à execução do programa das celebrações, nomeadamente a saída da fábrica do gás dos terrenos da Torre de Belém152, para as instalações da Quinta da Matinha; as ligações da cidade à nova auto-estrada Lisboa-Cascais; e o avanço da arborização do Parque Florestal de Monsanto de modo a criar um verdejante pano de fundo quer a Belém, quer à própria auto-estrada. A passagem, em Maio de 1938, de Duarte Pacheco da Câmara de Lisboa para Ministro das Obras Públicas, sendo substituído na autarquia por um homem da sua confiança, Eduardo Rodrigues de Carvalho, veio permitir acelerar o programa de execução das obras para a Exposição, cuja abertura estava prevista para Maio de 1940153. Para a Exposição do Mundo Português pensou-se desde o início na zona de Belém, antigo embarcadouro das caravelas que tinham construído o Império Português que se pretendia exaltar. A área estendia-se desde o Tejo, a sul, até ao mosteiro e à Rua Bartolomeu Dias, a norte e desde a Praça Afonso de Albuquerque, a leste, e a doca de Belém, a oeste. Assim, procedeu-se às inevitáveis expropriações das propriedades que até então existiam em frente do Mosteiro dos Jerónimos de maneira a permitir a abertura da Praça do Império. Para as expropriações seguiu-se o modelo utilizado no Parque Florestal de Monsanto, onde se envolveu todos os interessados no proces151 Veja-se ACCIAIUOLI, Margarida, Exso, permitindo um consenso que posições do Estado Novo: 1934-1940, acelerava o habitualmente moroLisboa, Livros Horizonte, 1998, p. 113. 152 A fábrica laborava nos terrenos junto so processo de expropriações. da Torre de Belém, desde 1887, coDemolido o casario, em 1938, meçou a ser desactivada em 1938, numa tentativa de desimpedir os reordenou-se a praça, centro da terrenos e desafogar o monumento a Exposição, e à qual foi atribuído tempo da Exposição, mas os terrenos só foram entregues à CML em 1949, oficialmente o nome de Praça do passada a II Guerra Mundial e as caImpério, em 1948154. Para a monurências de abastecimento. mental praça, projecto do arqui- 153 A Exposição, porém, só seria inaugurada em 23 de Junho de 1940. Entecto chefe Cottinelli Telmo, precerraria a 2 de Dezembro do mesmo tendeu-se criar um amplo espaço ano, após ter sido visitada por cerca de circulação para os visitantes ao 154 de três milhões de pessoas. A actual Praça do Império corresponde mesmo tempo que se reordenava a parte da antiga Praça de Dom Vasco da Gama e recebeu o seu nome no âmurbanisticamente toda a zona em bito da Exposição, de forma não oficial. função desta nova centralidade 155 Para a questão da ornamentação da fonte, veja-se SEIXAS, Miguel Metelo, reforçada por uma fonte luminoTELES, João Bernardo Galvão – Pesa traçada pelo arquitecto Antóregrinações heráldicas olisiponenses: a freguesia de Santa Maria de nio Lino155. Belém. Lisboa: Universidade Lusíada, O espaço da Exposição foi proFreguesia de Santa Maria de Belém, longado até ao rio através de 2005, p. 215 e segs.

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Perspectiva da exposição “O Mundo Português” do telhado do Mosteiro dos Jerónimos com a Nau de Portugal como pano de fundo 1940, autor desconhecido Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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Vistas aéreas da Exposição “O Mundo Português” 1940, Pinheiro Corrêa Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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Exposição “O Mundo Português” 1940, Alvão, Porto Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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passagens superiores à linha férrea. Junto ao Tejo construíram-se pavilhões irregulares e outros pontos de interesse, alguns dos quais subsistem até aos nossos dias. O actual Museu de Arte Popular, projecto dos arquitectos António Reis Camelo e João Simões, foi o Pavilhão da Vida Popular; o Espelho de Água, de António Lino, restaurante desde a sua fundação; o Padrão dos Descobrimentos, construído em materiais efémeros, segundo projecto de Cotinelli e do escultor Leopoldo de Almeida, e, em 1960 inaugurado em pedra, com alterações no seu interior, de Pardal Monteiro, e na zona envolvente com projecto de Cristino da Silva; e o Pavilhão dos Desportos Náuticos, antigo Pavilhão dos Descobrimentos, projecto de Pardal Monteiro, muito alterado, tendo-lhe sido retirada a esfera armilar que o encimava. Terminada a Exposição, saía reforçada a imagem de Belém, e de toda a zona ocidental de Lisboa, como ponto turístico numa antecâmara do que se previa para a sua natural continuação – a Costa do Sol. A zona ocidental de Lisboa mereceu especial atenção de Duarte Pacheco com a realização do Parque Florestal de Monsanto, que já aqui referimos. Lançado em 1934, sendo da responsabilidade da Câmara Municipal de Lisboa e a arborização da responsabilidade do Ministério da Agricultura, o Parque vinha dar solução à já muito antiga e debatida questão de um parque da cidade, questão que se

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O Engenheiro Duarte Pacheco a analisar o projecto do Parque Florestal de Monsanto [post. 1938], autor desconhecido Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

Acto simbólico da plantação de uma árvore pelo Ministro das Obras Públicas e Comunicações no início da florestação do Parque do Monsanto [post.1938], autor desconhecido Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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Início da plantação do Parque Florestal de Monsanto [post. 1938], autor desconhecido Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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Panorama do Parque Florestal de Monsanto [1940], autor desconhecido C창mara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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arrastava desde os finais do século XIX, sempre pensada como uma reordenação ou um prolongamento do Parque Eduardo VII. Optando por criá-lo de raiz no limite com a Costa do Sol, Duarte Pacheco eliminava muitos dos obstáculos e fazia avançar o projecto. O Parque Eduardo VII tomava um papel de parque urbano, enquanto que o Parque Florestal de Monsanto ganhava um estatuto de vastíssima área de lazer para toda a capital. Para o projectar foi escolhido o arquitecto Keil do Amaral, que entrara na Câmara um mês depois da nomeação de Duarte Pacheco como presidente. Em simultâneo com o processo de expropriação das terras e a divisão dos 700 hectares do Parque em seis zonas156, iniciava-se o projecto da criação de um “bosque natural e selvagem com centros de interesse para todas as classes da capital”157 onde antes estavam terras de semeadura de cereais e moinhos. Aproveitando estas ruínas de moinhos e a própria topografia do parque, Keil do Amaral criou um circuito sinuoso, com excelentes pontos de vista, e equipamentos espalhados por toda a área: os miradouros de Montes Claros, dos Moinhos do Mocho e da Luneta dos Quartéis, e o Parque Infantil, o Centro de Ténis, a Casa de Chá dos Montes Claros158. Exceptuando a auto-estrada, que atravessava o Parque, embora desnivelada, apenas se considerava a criação das estradas essenciais para o acesso ao parque, escolhendose investir em caminhos para cavaleiros e peões, que assim podiam usufruir da tranquilidade do local. Abordadas que foram as principais obras de Duarte Pacheco, ministro ou presidente da Câmara, dentro dos limites do concelho de Lisboa, concluímos que Lisboa antes e depois dele (quase) não é a mesma cidade. Nas suas iniciativas, a par das alterações legislativas que as permitiram e orientaram, como o reforço do papel da Câmara num plano de urbanização global, podemos encontrar algumas características que viriam a marcar os anos seguintes no desenvolvimento de Lisboa: o predomínio da escolha de zonas limítrofes ou ainda muito ruralizadas para as grandes urbanizações sociais; a construção na cidade de infra-estruturas necessárias 156 Para as fases de expropriação veja-se a supra citada obra de Ana Tostões. a uma urbe moderna; a escolha 157 AMARAL, Francisco Keil do, Relatório de equipas de arquitectos e ende Viagem (Agosto 1939). Relatório genheiros das novas gerações; apresentado à Câmara Municipal de Lisboa, Arquivo da Direcção Geral a construção de uma rede viádos Serviços de Urbanização. Citado ria que permitiu o crescimenem TOSTÕES, Ana, Monsanto, Parque Eduardo VII, Campo Grande. Keil to da cidade e a sua ligação do Amaral, Arquitecto dos Espaços para os concelhos vizinhos; a Verdes de Lisboa, Lisboa, Edições Savalorização da zona ocidental 158 lamandra, 1992, p. 49. Outras construções planeadas não enquanto destino de lazer e se chegaram a executar ou foram feitas muito mais tarde: um segundo cultura. Planeando a urbanizaparque infantil, na Serafina, um anfição de Lisboa, Duarte Pacheco teatro, um centro de desportos e um traçou-lhe o futuro. memorial a Duarte Pacheco.

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NA CIDADE OBRAS PÚBLICAS E COMUNICAÇÕES (1932-1936/ 1938-1943): O PLANO METÓDICO Sandra Vaz Costa

A 5 de Julho de 1932 Oliveira Salazar era empossado chefe do Governo e, no mesmo dia, Duarte Pacheco tomava posse como ministro do Comércio e Comunicações. Dois dias depois, era publicada no Diário do Governo a nova arrumação dos serviços dos Ministérios do Comércio e Comunicações e da Agricultura159. Numa reestruturação orgânica ministerial, e tendo em vista reunir sob a mesma direcção os principais serviços relativos à produção nacional, Duarte Pacheco passaria a ministro das Obras Públicas e Comunicações. O decreto de 7 de Julho de 1932, exarado pela Presidência do Conselho de Ministros, não pretendia efectuar uma mera alteração de designação destes dois gabinetes ministeriais. Reconhecia a necessidade funcional de separação orgânica de vários serviços que, havendo nascido em 1852 sob uma mesma origem de âmbito legal e prático, demonstravam há muito a urgência de reconhecimento autónomo no domínio técnico e científico, do mesmo modo que demonstravam uma necessidade de execução política distinta. Oitenta anos volvidos, e nas palavras de Duarte Pacheco, estava decretado o restabelecimento do:

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“antigo Ministério das Obras Públicas, para nele se promover a concentração de todas as obras de fomento que interessam à melhoria dos serviços do Estado e das condições económicas da Nação, mormente aquelas que pela sua importância técnica e valor económico mais convém integrar num plano metódico de realização em todo o País”.160

O antigo Ministério das Obras Públicas ao qual Duarte Pacheco se referia era o ministério de Fontes Pereira de Melo. O ministério de poder em que as infra-estruturas, os equipamentos, o património, o saber técnico e o saber científico convergiam num único objectivo: o desenvolvimento material do País. À data da criação do MOPC, o mercado interno português evidenciava a incapacidade produtiva do País. A 159 Diário do Governo, Decreto-Lei n.º 21 caracterização populacional era o 454 de 7 de Julho de 1932. 160 Defi nição de missão e objectivos espelho da nação: quatro quintos do Ministério das Obras Públicas e rural161. As condições de vida neste Comunicações dada por Duarte PaPortugal traduziam-se na crueza checo no preâmbulo do decreto-lei que faz transitar do Ministério da dos números revelados pelos inMarinha para o MOPC o processo de 162 quéritos e estatísticas da época : construção da Base Naval do Alfeite. Cfr. Diário do Governo, Decreto-Lei n.º um Portugal 80% analfabeto, com 22 055, I Série de 31 de Dezembro de uma taxa de mortalidade infantil 1932. a rondar os 150 mortos por mil 161 FRANÇA, José-Augusto, Os Anos Vinte em Portugal, Lisboa, Editorial nascimentos, com pouca margem Presença, 1992, p. 265. deixada à indústria e ao comércio. 162 AMARAL, Op. Cit., pp. 41-59.

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Num País com uma produção agrícola quase artesanal, o mercado era muito limitado: faltavam alimentos, matéria-prima e consumidores163. No início do segundo quartel do século XX, Portugal era um País periférico, dependente dos combustíveis sólidos e líquidos vindos do exterior. Cerca de 90% do comércio externo era efectuado por via marítima. E embora crescesse o debate sobre a necessidade de industrialização do País, o Estado optava por dar primazia às vias de comunicação, acreditando que a mobilidade de pessoas e bens bastaria para incrementar o mercado interno. Contudo, o mercado interno vivia maioritariamente de uma produção agrícola pouco desenvolvida e de uma indústria pouco mais que tradicional. O plano metódico de Duarte Pacheco levaria três meses a ser traçado. A 30 de Setembro de 1932, o Diário do Governo publicava o plano do ministro. Dos catorze organismos que constituíam o MOPC, três desempenhariam um papel crucial na transformação material do País164. À Junta Autónoma de Estradas, organismo a que, desde a sua criação em 1927, competia o serviço de manutenção corrente das vias existentes, bem como os serviços de construção e grande reparação, novas competências seriam atribuídas. Na orgânica do MOPC, as atribuições da JAE não se limitavam ao universo das vias de comunicação. Duarte Pacheco atribuía a este organismo o programa de melhoramentos rurais. A “obra de melhoramentos rurais” fora decretada em 1931165 com o intuito de o Estado dotar as populações rurais de trabalhos públicos locais. Em Setembro de 1932 Duarte Pacheco reconhecia a necessidade de intensificar esses mesmos trabalhos e considerava como melhoramentos rurais: “ (…) as obras de interesse local e vantagem colectiva a executar fora dos centros urbanos e das sedes dos concelhos, compreendendo a construção ou reparação de estradas municipais, estradas não classificadas, caminhos vicinais, pavimentos, chafarizes, tanques, lavadouros e obras semelhantes”.166

À Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais que, desde a data de criação em 1929, zelava pela manutenção, conservação e restauro do património arquitectónico e arqueológico classificado, passaria a estar agregado o programa de melhoramentos urbanos: “São considerados melhoramentos urbanos as obras de interesse local e vantagem colectiva a executar fora dos grandes centros, compreendendo a realização de planos de urbanismo, a construção,

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ALVES, Carlos Garcia, “A indústria nacional” in História de Portugal, dir. José Mattoso, Lisboa, Círculo de Leitores, 1994, pp. 61- 99. 164 Diário do Governo, Decreto-Lei n.º 21 454 de 7 de Julho de 1932. 165 Diário do Governo, Decreto-Lei n.º 19 502 de 20 de Março de 1931. 166 Diário do Governo, Decreto-Lei n.º 21 696 de 30 de Setembro de 1932. 163

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Sr. Presidente da República e o Sr. Ministro das Obras Públicas e Comunicações, Engenheiro Duarte Pacheco, no Palácio de S. Bento após as obras de restauro. [post.1938], autor desconhecido Arquivo Nacional Torre do Tombo/Fundo do Secretariado Nacional de Informação

O RESTABELECIMENTO DO ANTIGO MINISTERIO DAS OBRAS PÚBLICAS, PARA NELE SE PROMOVER A CONCENTRACAO DE TODAS AS OBRAS DE FOMENTO QUE INTERESSAM A MELHORIA DOS SERVICOS DO ESTADO E DAS CONDICOES ECONOMICAS DA NACAO

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Castelo de S. Jorge, ap처s as obras de restauro 1940, Alv찾o, Porto C창mara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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a transformação e reparação de escolas primárias, escolas profissionais elementares, liceus municipais, hospitais e outros edifícios de assistência, museus e monumentos nacionais”.167

À DGEMN competia a orientação técnica e a fiscalização das obras de melhoramentos urbanos e, segundo o decreto, competia também ao mesmo organismo o estabelecimento de um acordo com as entidades locais sobre os programas de urbanismo a realizar. Aos organismos locais competia a apresentação de um programa de obras necessárias, do mesmo modo que competia ao Ministério da Instrução Pública a apresentação de um programa geral de construção, ampliação ou reparação de escolas. Reconhecendo a necessidade de resolver o estado sanitário do País, à Administração-Geral dos Serviços Hidráulicos e Eléctricos passaria a competir a orientação técnica das câmaras municipais na realização do programa de melhoramentos de águas e saneamento, bem como a elaboração dos estudos e projectos de obras a realizar, reforma das obras existentes e fiscalização do universo construído: “São consideradas melhoramentos de águas e saneamento as obras de captação e distribuição de água e o estabelecimento, beneficiação e ampliação de redes de esgoto nas vilas e povoações importantes e nas cidades com excepção dos grandes centros”.168

A par dos programas específicos que compunham os melhoramentos rurais, urbanos e de águas e saneamento, programas de trabalhos a realizar a uma escala municipal, todos os catorze organismos que compunham o MOPC trabalhavam de forma articulada a uma escala total do território naquilo a que Duarte Pacheco designava de grandes obras públicas169, ou seja, as infra-estruturas de interesse nacional e vantagem colectiva. A questão das verbas orçamentais, condição indispensável à viabilidade de qualquer projecto, foi também programada pelo ministro. A 30 de Setembro, quando decretou o plano de ataque à escala regional, o plano de melhoramentos rurais, urbanos e de saneamento, o MOPC decretou também a criação do Comissariado e do Fundo do Desemprego170. 167 Diário do Governo, Decreto-Lei n.º 21 O engenheiro que, em 1927, 697 de 30 de Setembro de 1932. 168 Diário do Governo, Decreto-Lei n.º 21 conseguira o financiamento das 698 de 30 de Setembro de 1932. obras de construção das novas 169 Diário do Governo, I Série, DecretoLei n.º 21 699 de 30 de Setembro de instalações do IST171 e que, em 1932. 1928, conseguira um plano de 170 Diário do Governo, I Série, DecretoLei n.º 21 699 de 30 de Setembro de financiamento para a renova1932. 172 ção material dos Liceus , ex- 171 Diário do Governo, I Série, Decreto-Lei n.º13.113 de 1 de Fevereiro de 1927. perimentava agora a uma escala 172 Diário do Governo, I Série, Decretonacional uma solução de finanLei n.º 15 942 de 11 de Novembro de ciamento dos melhoramentos 1928.

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materiais do País, do mesmo modo que canalizava para as obras públicas uma parte considerável da mão-de-obra necessária à sua concretização. No preâmbulo ao decreto que institui a criação do Comissariado do Desemprego, encontramos a crueza do Portugal “quatro quintos rural” traduzida em números. Em Agosto de 1931 o Estado iniciara um inquérito sobre a crise do desemprego173 e os resultados revelaram-se preocupantes. Num primeiro apuramento registaram-se 38 200 desempregados, mas em Dezembro do mesmo ano o número subiria para os 39 200. Em Março de 1932 era já de 40 100 e em Junho atingiria os 41 600. Até ao final do mês de Julho uma descida acentuada da taxa de desemprego cifrava-se nos 26 400. Contudo, o decréscimo não correspondia a nenhuma medida de combate ao desemprego, significava apenas que cerca de 150 000 indivíduos que de Outubro a Março não encontravam colocação, chegada a época das colheitas e das debulhas de trigo a sul do Tejo, encontravam nos meses de Verão o único trabalho possível: o sazonal. Finda a colheita e a debulha do trigo e, pelo Outono, a apanha da azeitona, os números do desemprego voltariam a subir até Junho do ano seguinte. Tomando por referência o censo de Junho de 1932 (41.600 desempregados), cumpria ao Governo organizar o auxílio. Contudo, e ao contrário das medidas operadas em Países de elevada cultura, o Governo não pretendia distribuir qualquer subsídio gracioso ou esmola do erário. Considerando o Governo que Portugal não se encontrava na situação de Países como os Estados Unidos da América, Inglaterra ou Alemanha, encarava-se o problema do desemprego de uma outra forma:

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“Não se dão esmolas, procura dar-se trabalho (...) Num País em que tanta coisa útil há para fazer, é quase ironia que nele haja alguém que não tenha trabalho”. 174

Num País em que tanta coisa de útil havia para fazer, considerava o Governo como prioritários os trabalhos de melhoramentos rurais, melhoramentos urbanos, águas e saneamento, limpeza de valas e ribeiras e arborização. Estando o plano de melhoramentos materiais definido e a mão-de-obra necessária à sua execução recrutada nos números fornecidos pelo Comissariado do Desemprego, bastava encontrar uma forma de financiamento que assegurasse o pagamento dos salários e dos projectos de obra. E a fórmula estava já estabelecida. Porque não bastava o braço protector dos poderes públicos, e porque o interesse era colectivo e exemplo de humanidade e de civismo, o Go- 173 Diário do Governo, I Série, Decreto-Lei n.º 20 222 de 15 de Agosto de 1931. verno chamava a esta iniciativa 174 Diário do Governo, I Série, Decretoa contribuição dos particulares Lei n.º 21 699 de 30 de Setembro de empregados e empregadores: 1932, p. 1976.

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“Todos os que empreguem normalmente um ou mais empregados e operários em indústria ou comércio concorrerão em cada mês, para o Fundo de Desemprego com 1 por cento da importância paga em salários, vencimentos, gratificações, percentagens, subsídios, prémios, diuturnidades ou quaisquer outras remunerações fixas ou eventuais e, correspondentemente cada um dos empregados ou operários com 2 por cento do que no mesmo mês receber, sob qualquer rubrica”. 175

Folheto do Comissariado do Desemprego In MINISTÉRIO DAS OBRAS PÚBLICAS E COMUNICAÇÕES. 15 Anos de Obras Públicas: [s.l.], 1932-1947. Museu Municipal de Loulé/Centro de Documentação

Na prática, por cada trabalhador activo no ramo privado, o Fundo de Desemprego passaria a auferir mensalmente 3% do valor salarial praticado. Se o empregado contribuía com 2% do vencimento, a entidade empregadora contribuía com 1%. Contudo, a contribuição obrigatória para o Fundo de Desemprego não se limitava às actividades de comércio e indústria. Também as actividades liberais eram chamadas a esta contribuição. À contribuição de 2% estavam ainda obrigados os trabalhadores assalariados e os administradores dos estabelecimentos ou empreitadas do Estado,176 bem como os proprietários rústicos e urbanos177. A totalidade das contribuições seria mensalmente depositada na Caixa Geral de Depósitos. Ao Comissariado do Desemprego cabia a gestão do fundo monetário obtido bem como o recrutamento, a distribuição e o transporte dos desempregados preferencialmente para as obras de melhoramentos da área da sua residência ou região, mas, se necessário fosse, para as regiões onde houvesse falta de braços e oferta de trabalho. Com a criação do Fundo de Desemprego e do seu órgão gestor, o Comissariado, o MOPC conseguia de uma só vez chamar à sua guarda não só o controlo e distribuição da mão-de-obra para os planos de melhoramento material do País como o pagamento dessa mesma mão- 175 Diário do Governo, I Série, Decreto-de-obra através de um fundo Lei n.º 21 699 de 30 de Setembro de financeiro paralelo à dotação or- 176 1932, Artigo 20º, p. 1979. Diário do Governo, I Série, Decretoçamental anual do ministério. Se Lei n.º 21 699 de 30 de Setembro de 1932, § p. 1979. à capacidade de aglutinação de 177 Diário do Governo, I Série, Decretoprojectos e unicidade do poder, a Lei n.º 21 699 de 30 de Setembro de que o MOPC se reservava desde 1932, Artigo 22º, p. 1980.

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que operou a nova orgânica ministerial, se aliar esta manobra de engenharia financeira e recrutamento de mão-de-obra e se anexar ainda a “sempre que necessária” lei das expropriações ao abrigo da utilidade pública, reúnem-se todas as condições para compreender a forma de blindagem legal da qual o MOPC se muniu para poder pôr em prática o plano metódico de realização em todo o País, que Duarte Pacheco afirmava ser possível para, através dele, se promover a concentração de todas as obras de fomento178. É pois importante sublinhar que não são apenas os projectos e as obras que crescem em número e avançam no terreno. É o próprio ministério que, na sua renovação orgânica e na crescente e especializada composição técnica e profissional, avança coerente e construído. De Janeiro de 1936 a Maio de 1938 Duarte Pacheco seria afastado do poder político efectivo. Um Estado que se queria Novo tinha um País por construir e num País onde tudo estava por fazer, a construção deste teria de se implantar num terreno. Mas o terreno tinha dono. Por natureza, um dono servil ao Estado Novo se o Estado de algum modo também o servisse. Mas quando o Estado, na figura do Ministro das Obras Públicas e Comunicações, sobrepôs ao direito da propriedade o dever do serviço e da utilidade pública para construir os equipamentos que o País não tinha, surgiu um clima de fricção. O regime político entrava em contradição uma vez que a tensão se exercia substancialmente sobre a propriedade, essa propriedade quase e sempre pertença dos que constituíam o próprio Estado, essa propriedade reconhecida como o sempiterno baluarte de poder. Mais do que centrada em questões de teoria política, a cúpula do Estado Novo concentrava-se no desenho político e administrativo do País, traçado pelo Governo e em torno do qual orbitava uma classe abastada detentora de saber, propriedade e poder. De católicos monárquicos a republicanos, de religiosos a civis, de industriais a empresários, de literatos a construtores, o regime político sustentava-se numa base social e económica em que a serventia de interesses legitimava e reforçava a máquina do Estado. Este regime de interesses e conflitos era gerido pelo Presidente do Conselho, que despachava sozinho e sozinho demitia ou empossava os ministros. Houve ministros que se souberam destituídos das pastas ao ler os jornais pela manhã, como outros houve que foram agraciados com a consideração da palavra. Apenas um ministro mereceu do Presidente do Conselho o reconhecimento público da justificação de afastamento, do sacrifício por pressão política: e esse ministro foi Duarte Pacheco. Entre o eufemismo e a hipérbole, consoante a maior ou menor simpatia face à situação, as várias facções que compunham o Estado Novo ouviram, e interpretaram na figura de estilo correspondente às suas posições, as palavras do Chefe do Governo quando este reconheceu que tivera por uma vez de sacrificar o ministro. E quando o Presidente do Con- 178 Diário do Governo, Decreto-Lei n.º 22 selho retirou a Duarte Pacheco 055, I Série de 31 de Dezembro de 1932.

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o poder político, fê-lo por reconhecer a tensão que estava a exercer sobre o tecido social e financeiro em que assentava o regime. Em 1936 fora politicamente oportuno afastar o ministro. Mas, em 1938, o cenário político internacional alterara-se consideravelmente. Numa Europa em conflito bélico e numa Espanha em guerra civil, a propriedade atingira o estatuto de território político de nações, não de Países. E Portugal não era excepção. Em 1938, na Nota Oficiosa de 27 de Março, ao afirmar que por oito séculos a nação portuguesa permanecera definida e estável nas suas linhas de fronteira, o Presidente do Conselho atribuía à terra o seu mais alto valor: o patriótico. A terra e a História nela plantada, desempenhariam um papel estruturante nas Comemorações Centenárias. Mas para a efectivação do projecto, tornava-se necessário chamar de novo à cena política o homem que, não olhando aos interesses instalados, dava garantias de cumprimento da agenda política e do programa de obras. Contudo, limitar o regresso de Duarte Pacheco à pasta das Obras Públicas e Comunicações no cumprimento preciso do programa previsto para as Comemorações Centenárias, traduz-se numa interpretação redutora do significado desta retoma política, pois o ministro, embora avançando de imediato com as obras mais adiantadas, não irá descurar os planos gerais, como o próprio afirma em decreto e na sequente acção política179. Na Nota Oficiosa de 27 de Março de 1938, Salazar elencava as obras que atestariam o “poder realizador” do regime: a empreitada de restauro e beneficiação do palácio, jardim e parque de Queluz; o novo edifício da Casa da Moeda; o anexo do Museu de Arte Antiga; a auto-estrada Lisboa-Cascais; o Estádio Nacional e sequentes ligações viárias à auto-estrada e à estrada marginal; a libertação da Torre de Belém pela deslocação da Fábrica de Gás para outro local; as obras do Palácio de São Bento e respectiva urbanização da zona envolvente; resolução urbanística do prolongamento da Avenida da Liberdade; beneficiação do Teatro Nacional de São Carlos; o maior avanço possível no projecto do Parque Florestal de Monsanto; conclusão da primeira fase de construção dos Hospitais Escolares de Lisboa e Porto; maior impulso na criação de bairros de casas económicas em Lisboa e ligação radiofónica de Lisboa às terras coloniais. Umas ainda em decreto ou projecto, e outras já em fase de execução, todas estas obras partilhavam de uma origem comum: o Ministério das Obras Públicas e Comunicações, o organismo detentor do poder realizador do regime e que, pelos anos de 1932 a 1936, pensara, decretara e projectara a execução destas obras. Salazar disse um dia que em política, aquilo que parece é, mas em política o que existe é o que se fez, e, com Duarte Pacheco afastado do MOPC de 1936 a 1938, o substituto Silva Abranches não só não fez nada novo como desacelerou o que até então vinha sendo feito, 179 Diário do Governo, I Série, Decreto-Lei principalmente em Lisboa, a cin.º 29 043 de 7 de Outubro de 1938.

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dade detentora ou reguladora das doze obras que o Presidente do Conselho elencara na nota oficiosa de Março como testemunhos do poder realizador do ser português. No período de tempo que Duarte Pacheco presidiu à Câmara Municipal de Lisboa, os projectos do Parque Florestal de Monsanto; o desafogo da Torre de Belém pela transferência da Fábrica de Gás; os trabalhos de urbanização da área envolvente ao Palácio de São Bento, o prolongamento da Avenida da Liberdade ou o desenho dos arruamentos e vias de ligação à auto-estrada Lisboa-Cascais e Estrada Marginal, foram projectos trabalhados no domínio das atribuições camarárias. Regressado ao gabinete ministerial, num espaço de seis semanas Duarte Pacheco abriria dois créditos para reforço de dotações orçamentais para as obras em curso e despesas de gabinete180. Mas este segundo mandato ditaria um passo maior e definitivo: a concretização do plano de urbanização de Lisboa, plano a que a pressão de agenda do cumprimento da Exposição do Mundo Português serviria de álibi para o ordenamento do território. No domínio do plano de urbanização, Duarte Pacheco não avançava unicamente na direcção de Belém, pensava a cidade num todo programado. As acções políticas necessárias à concretização do plano de urbanização de Lisboa seriam ainda facilitadas pela publicação de um outro decreto exarado pelo gabinete do ministro das Obras Públicas e Comunicações: o decreto que permitia a expropriação por utilidade pública ao abrigo de doze obras inscritas no programa dos Centenários: “Aeroporto de Lisboa, estradas e arruamentos de acesso a Lisboa e ao aeroporto; construção de casas económicas em Lisboa e Porto; arranjo e integração do Castelo de S. Jorge; urbanização do Parque Eduardo VII; arranjo do bairro de Alfama; Auto-estrada e estrada marginal Lisboa-Cascais; arranjo urbanístico das zonas dos Palácios da Ajuda, Assembleia Nacional e de Queluz, em Lisboa, e dos Carrancas no Porto; avenida marginal ao Tejo; urbanização da Praça dos Jerónimos; edifícios universitários de Lisboa e novos hospitais de Lisboa e Porto; as obras de urbanização da cidade de Lisboa e novos edifícios para quartéis”.181

Embora este decreto contemplasse numa das suas alíneas as obras de urbanização de Lisboa que o Governo aprovar para serem iniciadas até 1940, das restantes onze alíneas que cumpriam o programa de obras contemplado por este decreto, apenas os quartéis se localizavam por todo o País e o Palácio dos Carrancas e um dos Hospitais Escolares se situavam 180 Diário do Governo, I Série, Decreto-Lei no Porto. Já a auto-estrada e a n.º 28 743 de 7 de Junho de 1938 e Decreto-Lei n.º 28 892 de 30 de Julho estrada marginal Lisboa-Cascais, de 1938. cumpriam objectivos de um pla- 181 Diário do Governo, I Série, Decreto-Lei n.º 28 797 de 1 de Julho de 1938. no urbano e rodoviário de escala

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Estrada Marginal Lisboa-Cascais 1940, Alv찾o, Porto C창mara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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Estádio Nacional 1940, Alvão, Porto Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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regional, mas a sua aplicação técnica e prática continha no plano de urbanização de Lisboa uma importância de extrema relevância. Quando às restantes seis obras, os trabalhos de urbanização surgiam no mesmo patamar de importância que as obras de edificação ou beneficiação. Tal significa que o decreto n.º 28 797 de 1 de Julho de 1938, se assumiu de uma importância extrema e mesmo definitiva para o arranque político e jurídico do Plano de Urbanização da Cidade de Lisboa. Duarte Pacheco reclamou para si a autoria da fórmula que reserva ao Estado a expropriação sem processo de recurso. Ao abrigo do decreto n.º 28 797, entre 1938 e 1943, o Estado, aqui protagonizado pelo MOPC e pelo seu ministro Duarte Pacheco, expropriou em Lisboa cerca de 1300 hectares de terreno conseguindo assim as condições básicas para a execução de um Plano de Urbanização da cidade182. O mesmo plano que, de Janeiro a Maio de 1938, nos breves meses que dirigira a Câmara Municipal de Lisboa, preparou ao pormenor. Um plano onde o território ordenado, planeado, seria um grau zero sobre o qual assentariam os vários programas e tipologias que a arquitectura e a engenharia conceberiam na organização de uma Lisboa Moderna. Existe um denso e coeso conjunto de obras infraestruturais erguidas em Lisboa e cuja responsabilidade política recai sobre Duarte Pacheco. De 1928 a 1938, sob acção directa de Duarte Pacheco assistiu-se a uma inegável transformação, extensão, e melhoramento da cidade. Mas a acção de Duarte Pacheco não se restringiu a Lisboa. Além de todos os trabalhos realizados no domínio das Comunicações, Duarte Pacheco assumiu a liderança de um processo de obras infraestruturais, urbanísticas e de construção sistemática de equipamentos por todo o País que incluiu, para além de escolas, estações dos CTT, tribunais, agências e filiais da Caixa Geral de Depósitos, quartéis, hospitais e prisões, entre outros. Como primeiro presidente da Câmara Municipal de Lisboa nomeado pelo Governo, Duarte Pacheco teve por principal preocupação regular a máquina administrativa municipal em concordância directa com o Código Administrativo de 1936-1940. Em cinco meses de gerência camarária procurou dar resposta às deploráveis questões sanitárias da cidade183, procurou regular as actividades comerciais e industriais, atribuiu aos arquitectos a responsabilidade de assinar os projectos de edificações urbanas e teve a coragem de apontar ao município a 182 FERREIRA, Vitor Matias, Op. Cit., p. quota-parte de responsabilidade 158. no caótico regime de construção 183 Relembremos questões como a recolha do lixo, a proibição de alimenda cidade. Mais do que um protação dos suínos de consumo com lixos domésticos, solução química motor do Prémio Municipal de reguladora dos níveis de cloro-fenóis Arquitectura, Duarte Pacheco existentes na rede pública de abastecimento de água, a regulação de do foi o político que declarou existir comércio de carne, da circulação de uma profunda diferença entre táxis, do regime de toldos e esplanaArquitectura e Construção Civil. das, entre outros.

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Uma vez mais, a frontalidade da acção e a linearidade das suas palavras produziriam mais vozes de desagrado do que aplausos. Muitos interesses estavam instalados há décadas senão mesmo gerações, e a política urbana de Duarte Pacheco abalara já alguns alicerces. Subjacente a todas as obras estruturais e infra-estruturais realizadas por Duarte Pacheco na cidade de Lisboa estaria o plano de urbanização, esse grau zero planificador e regulador da extensão e edificação da capital. Como Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Duarte Pacheco imprimiu em cinco meses de gestão um regime regulador a todas as actividades que compunham a vida citadina. E se como ministro, entre os anos de 1932 a 1936 atribuíra à cidade de Lisboa um número considerável de obras infraestruturais, a partir de 1938 as mesmas avançariam até à conclusão mas sob estritas e exigentes condições de garantia: com um homem da plena confiança do ministro nos Paços do Concelho e com Duarte Pacheco no Terreiro do Paço. A obra pública de Duarte Pacheco tem uma dimensão esmagadora no número, na consistência, na abrangência e na transversalidade de formas, temas e programas. Das propostas de reformas educativas e dos projectos de apoio social à educação ou dos programas das edificações escolares, a acção política de Duarte Pacheco nos sete meses que liderou o gabinete da Instrução Pública, abriu novas perspectivas à condição legal, processual e material do ensino. No Ministério das Obras Públicas e Comunicações Duarte Pacheco realizou uma obra verdadeiramente estrutural. Da reorganização do Ministério e de organismos dele dependentes, à produção normativa e construtiva, o seu legado é absolutamente impressionante. No domínio das Comunicações, os portos marítimos de Leixões, Viana do Castelo e Setúbal, foram alvo de uma profunda reorganização e dotados de novos equipamentos. Só neste programa infraestrutural, e até 1939, o Ministério absorveu 40% do seu orçamento. No domínio das vias de comunicação, de entre estradas nacionais, municipais e vicinais, pontes e viadutos, foram construídos cerca de 500 quilómetros de extensão. Este plano rodoviário não se circunscreveu unicamente ao factor quantitativo. Os perfis das estradas construídas apresentaram um salto qualitativo na medida em que existiu a preocupação de enquadramento paisagístico e inserção urbanística dos traçados. As obras de hidráulica agrícola permitiram uma maior extensão de terrenos produtivos e os trabalhos hidroeléctricos permitiram o reforço do abastecimento eléctrico doméstico, comercial e industrial. No domínio dos programas arquitectónicos, a actuação ministerial de Duarte Pacheco foi também transversal e abrangente. Na Educação, todos os níveis de ensino foram contemplados com novas construções escolares. Das creches às escolas primárias e liceus, dos institutos às universidades, a preocupação do Ministério não se revelou unicamente com o “levantamento de paredes”. Procurou-se

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pensar e construir cada escola com a orgânica que Duarte Pacheco defendia já em 1928 e que se centrava no campo pedagógico. No domínio das Construções Hospitalares, o Ministério deu início à construção dos equipamentos necessários ao serviço nacional de assistência médica e abarcou várias áreas de intervenção. Do posto de vacinação ao sanatório terapêutico, do centro radiológico ao hospital escolar, verificou-se a construção programada nas várias escalas e nas mais diversas dimensões regionais. O programa habitacional, e também os programas de abastecimento de água e saneamento, mereceram de Duarte Pacheco a maior preocupação. Na vigência dos dois mandatos ministeriais, o volume de documentação produzida reflecte a profunda mudança na questão sanitária do País184. Duarte Pacheco concentrou meios e moveu inúmeros esforços para levar a cabo as obras de saneamento básico e abastecimento de água potável aos dezoito distritos do continente. A par da política de restauros monumentais, realizada por um dos organismos dependentes do Ministério, a DGEMN, o gabinete ministerial de Duarte Pacheco concentrou também tempo e verbas consideráveis na beneficiação e na construção dos repositórios do património móvel: os museus. E se a obra pública de Duarte Pacheco passou também pela acção política dirigida ao património móvel e imóvel, é ainda de considerar a sua acção na valorização do património natural e paisagístico. Neste último domínio, o pontuado das estradas ou a implantação das primeiras pousadas portuguesas revelam a minúcia que, no gabinete de trabalho do ministro, era dada a cada projecto. Esse mesmo projecto que encerrava em si, a parte indivisível do todo. E neste todo é importante não esquecermos a equipa. Duarte Pacheco foi um político hábil.Mas em política a sorte não existe, a sorte faz-se. E Duarte Pacheco percebeu cedo que em política não se vive, apenas se sobrevive e ainda assim com uma equipa. E a sua maior força, a sua maior autoridade advinha da equipa que formou. Uma equipa plural de técnicos especializados no domínio da engenharia e da arquitectura. A esta equipa restrita, com acesso directo ao gabinete ministerial, tinham também acesso os técnicos especializados em cada uma das áreas de actuação do Ministério. E eram os engenheiros, os arquitectos e os técnicos especializados que, compondo as “comissões administrativas de obra” dos projectos exarados pelo MOPC, compunham de facto o gabinete ministerial e actuavam pelo País numa frente construtiva incansável. Duarte Pacheco não foi um homem viajado. Pelo País viajou muito, literalmente até à morte, mas do País só saiu uma vez, na companhia de Pardal Monteiro para ver Paris, Roma e Nápoles. Mas Duarte Pa- 184 Expressão inúmeras vezes utilizada por Duarte Pacheco nos preâmbulos checo, que não viveu o suficiente aos decretos-lei e aos despachos mipara viajar, percebeu cedo que nisteriais.

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Fachada principal do Teatro Nacional de S. de Carlos 1940, Alvão, Porto Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses Palácio Nacional de Queluz, após as obras de restauro 1940, Alvão, Porto Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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era importante colher informações no exterior, saber de outras experiências e aprender com os exemplos. E por isso insistiu na formação externa dos licenciados do Técnico, e pela mesma razão, já ministro, enviou os engenheiros e os arquitectos ao exterior em comissões de estudo. E porque era necessário construir escolas, hospitais, pontes, viadutos, gares, museus, prisões e teatros, com os engenheiros e os arquitectos seguiram técnicos tão distintos como professores, médicos, historiadores ou conservadores de obras de arte. E neste gabinete ministerial, além da pluralidade de ofícios, houve também lugar à pluralidade de gostos e de ideias. O traço de Cottinelli, o de Carlos Ramos ou de Keil do Amaral conviveram em harmonia. E a engenharia militar de Eduardo Rodrigues de Carvalho não colidiu nunca com a engenharia de pontes de Barbosa Carmona ou com a engenharia de construções de Guimarães Lobato. A obra construída pelo ministro é evidente e inegável, contudo, o modo, a cadência, o método, os avanços e os recuos, as hesitações ou as cedências, são elementos que consideramos tão decisórios na configuração final na obra construída quanto uma directiva da Presidência do Conselho de Ministros ou a rigidez de uma dotação orçamental fixa. Sem a força do Estado e da Lei que teve ao seu dispor, Duarte Pacheco não teria construído o que construiu. Mas com as condições que lhe foram permitidas e com as condições que ele próprio instituiu a partir do seu gabinete de trabalho, construiu quase ininterruptamente durante quinze anos. E se em História um quarto de século é uma geração, Duarte Pacheco construiu uma geração de País. Com o braço forte e centralizador da lei, Duarte Pacheco teve ao seu dispor uma máquina legal que lhe permitiu a criação de uma blindagem orçamental inédita. Sem um braço legislativo forte, pouco teria sido possível, mas o método de trabalho do ministro explica a capacidade de concretização que o seu gabinete teve e outros não tiveram, ainda que ao seu dispor tivessem a mesma malha legal. Nas palavras de Duarte Pacheco existia um plano metódico de realização em todo o País, e, para a execução plena desse plano metódico, era necessário primeiro regulamentar e depois implementar os diplomas legais necessários à optimização dos serviços. Na fase de projecto, criou comissões de estudo que conceberam propostas de soluções viáveis às necessidades relevadas nos trabalhos de diagnóstico e posteriormente, na fase administrativa, geriu técnica e financeiramente a construção das soluções. A coordenação era estabelecida pelo gabinete ministerial. A unidade tinha já sido por ele definida no período de regulamentação, na tal fase reguladora, de “acalmia”, como definia o próprio. E a eficiência existia porque do gabinete ministerial eram lançadas equipas de trabalho precisas e com objectivos traçados. Assim, mais do que autoritário, Duarte Pacheco foi um homem exigente. Exigente até ao esgotamento, como o próprio afirmava. Mas

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Sé de Lisboa, após as obras de restauro 1940, Alvão, Porto Câmara Municipal de Lisboa/Gabinete de Estudos Olisiponenses

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para os poucos que conseguiram aguentar o seu ritmo, pronunciar o nome Duarte Pacheco provocava um sorriso, que antecedia uma catadupa de histórias com peripécias num gabinete de trabalho onde parecia existir sempre luz. Talvez um hábito que o próprio ministro tivesse levado do Técnico para o Terreiro do Paço. A todas as horas do dia e da noite há sempre uma luz numa qualquer sala do Técnico. No Terreiro do Paço, as luzes apagaram-se cedo, há muito tempo. No dia 15 de Novembro de 1943, Duarte Pacheco assinava o último dos seus decretos, o decreto n.º 33 237, e o último dos seus diplomas para a execução de obras, o decreto n.º 33 236 que “Autoriza a Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais a celebrar contrato para a execução das obras de adaptação do antigo edifício da Alfândega a Ministério das Finanças”. Mais um reforço de dotação orçamental, mais uma obra. No dia seguinte, os decretos eram publicado no Diário do Governo e, logo pela manhã, Duarte Pacheco sairia de Lisboa com destino a Vila Viçosa, a visitar uma outra obra. Deveria chegar ao final da tarde para a reunião do Conselho de Ministros. Não chegou a comparecer a tal reunião. No lugar da Cova do Lagarto, entre Montemor-o-Novo e Vendas Novas, o veículo oficial que o conduzia a alta velocidade despistou-se e capotou. Na madrugada de dia 16 de Novembro morria no Hospital de Setúbal o Sonhador de Grandes Coisas185.

TELMO, José Ângelo Cottinelli, “Um Grande Homem de Acção” in Panorama, Revista de Arte e Turismo, Lisboa, SPN-SNI, ano 3, n.º 19, Fevereiro de 1944, s/p.

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O TĂŠcnico Novo de Duarte Pacheco FONTES DOCUMENTAIS cat. Duarte Pacheco_04_emendas#6.indd 152

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Fontes Documentais Arquivo Municipal de Lisboa Núcleo do Arco do Cego, Núcleo Fotográfico Câmara Municipal de Lisboa Estudos e Projectos de Urbanismo (1887-1997), Planos Directores de Urbanização (1938-1967) Livros de Notas da Câmara Municipal de Lisboa Projecto Geral do Aeroporto de Lisboa Arquivo Histórico do Ministério da Educação Livros de Actas das Sessões do Conselho Superior de Instrução Pública (1926-1929) Arquivos Nacionais Torre do Tombo Arquivo Oliveira Salazar/ Correspondência Oficial

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Arquivo Oliveira Salazar/ Correspondência Particular Fundo Empresa Pública jornal “O Século” Fundo do Secretariado Nacional de Informação Museu Municipal de Loulé/Centro de Documentação /Fototeca Fundo Duarte Pacheco Biblioteca e Arquivo do Ministério das Obras Públicas CAPOPI, Comissão Administrativa para as Obras da Praça do Império CIP - Processos Individuais

Gabinete de Estudos Olisiponenses Espólio Duarte Pacheco Actas das Sessões da Câmara Municipal de Lisboa Galeria de Biblioteca de Arte/ /Fundação Calouste Gulbenkian Colecção Mário Novais Instituto Superior Técnico – Núcleo de Arquivo Processos Individuais de Alunos Instituto Superior Técnico – Núcleo de Arquivo e Documentação Processos Individuais de Funcionários

de Funcionário Gabinete do Ministro/Correspondência Particular Livros de Despachos Ministeriais

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Instituto Superior Técnico [s.d], Mário Novais Galeria de Biblioteca de Arte/ Fundação Calouste Gulbenkian

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