Crime, segurança pública e capital social em perspectiva sociológica
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Corinne Davis Rodrigues
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CIP - Brasil. Catalogação na Publicação | Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ. C759 Crime, segurança pública e capital social em perspectiva sociológica / organização Corinne Davis Rodrigues. - 1. ed. - Belo Horizonte, MG : Fino Traço, 2014. 156 p. : il. ; 23 cm. (Trabalho & desigualdade ; 19) ISBN 978-85-8054-223-3 1. Segurança pública - Brasil. 2. Segurança pública - Aspectos sociológicos. I. Rodrigues, Corinne Davis. II. Série. 14-15545 CDD: 327.81 CDU: 327(81)
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Sumário Introdução 11 Corinne Davis Rodrigues
As Múltiplas Fases do Capital Social
11
Capital Social e Metodologia Mista
13
Uma experiência em Integração de Metodologia
14
Referências bibliográficas
16
Capítulo 1
Crimes das elites: a estrutura de oportunidades no Brasil
17
1.1 Introdução
17
1.2 Revisão Teórica 1.2.1 Discussões sobre o conceito de crime do colarinho branco 1.2.2 Definição de crime do colarinho branco 1.2.3 O comportamento criminoso: motivações 1.2.4 O comportamento criminoso: oportunidades
18 18 21 23 24
1.3 Metodologia 1.3.1 Dados sobre colarinho branco 1.3.2 Paságarda – um estudo de caso de um processo 1.3.3 O Caso Paságarda 1.3.4 As operações da Polícia Federal
28 28 30 32 34
1.4 O Inquérito pasárgada 1.4.1 Descrição do caso
40 40
1.5 Análise do Inquérito 1.5.1 Altas posições sociais e de respeitabilidade 1.5.2 Motivações econômicas 1.5.3 Relações interpessoais e estrutura de oportunidades
44 44 45 47
1.6 Conclusão
50
Referências Bibliográficas
52
Rogério Silva-Júnior Corinne Davis Rodrigues
Capítulo 2
Percepção de segurança nas escolas da rede pública e particular de Belo Horizonte
55
2.1 Introdução
55
2.2 A violência: abordagens teóricas 2.2.1 Violência escolar, afinal de que se trata? 2.2.2 Abordagens sociológicas para o fenômeno da delinquência no espaço escolar 2.2.3 Violência: uma leitura segundo as imagens
57 57
2.3 Metodologia 2.3.1 Método de análise quantitativa dos dados 2.3.2 Método de análise qualitativa dos desenhos 2.3.3 Objetivos específicos e hipóteses
65 67 69 70
2.4 Resultados 2.4.1 Análise dos modelos estimados de regressão logística binomial 2.4.2 Resultados dos métodos qualitativos 2.4.3 Análise dos resultados através do método de triangulação
71 71 74 75
2.5 Observações e conclusões gerais
76
Referências bibliográficas
78
Aline Nogueira Menezes Mourão Analice Souza Danilo Brasil Soares Karla Juliana Onofre da Silva Weslaine Wellida Gomes
60 64
Capítulo 3
Percepções da população de belo horizonte sobre a polícia militar de Minas Gerais
81
3.1 Introdução
81
3.2 Polícia e sociedade
81
3.3 Metodologia 3.3.1 Metodologia quantitativa 3.3.2 Metodologia qualitativa 3.3.3 Técnica de integração – metodologia quantitativa e qualitativa
84 84 86 87
3.4 Resultados 3.4.1 Variáveis socioeconômicas 3.4.2 Variáveis de vitimização 3.4.3 Variáveis de vitimização por parte da Polícia Militar
88 88 92 94
Daniela Paoliello Iara Vianna Mateus Rennó Rodrigo Ferreira Tatiana Goulart
3.5 Conclusão
95
Referências bibliográficas
98
Capítulo 4
Padrões e (não) padrões na relação entre capital social e pobreza: um estudo do bairro Jardim Teresópolis em Betim – MG
99
4.1 Introdução
99
Carmelita Veneroso Ian Prates Mariana Silveira Costa
4.2 Capital Social – Tradições Teóricas
100
4.3 Pobreza e Território
105
4.4 Metodologia – O bairro Jardim Teresópolis e a operacionalização dos conceitos: a análise quantitativa
107
4.5 Hipótese de pesquisa
110
4.6 A Análise qualitativa
113
4.7 Considerações finais
122
Referências bibliográficas
125
Capítulo 5
Uma investigação sobre a relação entre religião evangélica e capital social
127
5.1 Introdução
127
5.2 Cenário evangélico no Brasil
129
Beatriz Accioly Vaz Fabrício Alves Farias Jonas Vaz Leandro Leal Julio Hermínio Caldeira Brant
5.3 Investigação empírica 131 5.3.1 O caso dos evangélicos na região metropolitana de Belo Horizonte 131 5.4 Conclusão
143
Anexo 1
146
Referências bibliográficas
149
Comentários, à guisa de conclusão
150
Alexandre Cardoso
Dedico este livro a todos os meus alunos graduados do Curso de Ciências Sociais da UFMG e aos quais devo a minha imensa gratidão. Foi através da inteligência, dedicação e espirito científico desse grupo que transformamos um trabalho semestral em uma obra digna de publicação. Este grupo talentoso certamente reúne de modo exemplar as qualidades que aspiramos enxergar em grandes cientistas sociais.
Introdução Corinne Davis Rodrigues
As Múltiplas fases do capital social
O
s cinco artigos nesta coletânea tratam de temas diferentes, porém inter-relacionados. Os três primeiros artigos apresentam pesquisas na área de sociologia do crime, especificamente a criminalidade, a segurança e a polícia. O quarto artigo da coletânea examina a pobreza e o último trata do tema da sociologia da religião. Apesar da diversidade de temas, cada um dos artigos examina de alguma forma a importância de capital social na explicação do fenômeno estudo, seja ele a criminalidade, a segurança, a pobreza ou a religião. Apesar de o capital social ser um termo inicialmente atribuído ao sociólogo Bourdieu (1985), o conceito tem as suas origens na sociologia clássica de Durkheim, quem ressaltou a importância da vida em grupo como remédio à anomia (1984). Segundo Bourdieu (1985), capital social pode ser definido como aqueles recursos atuais ou potenciais que são o resultado de uma rede de relacionamentos. Ele define estes recursos como um bem individual, capazes de serem invocados para o avanço individual. Outros, como Putman (2000), enfatizam que os recursos resultantes dos relacionamentos sociais são um bem coletivo e avançam sobre metas coletivas, como melhorias comunitárias, por exemplo. Independentemente da definição utilizada, não há como negar que o conceito de capital social aparece como fator relevante na explicação de uma variedade de fenômenos sociais, como criminalidade (Sampson e Groves, 1989; Bursik e Gramsick, 1993), mobilidade social (Granovetter, 1974; Bourdieu, 1985), participação política (Putman, 2000), entre outros. Os artigos apresentados nesta coletânea reforçam a versatilidade do conceito de capital social. Três dos artigos tratam de temas na área da sociologia de crime. Na área de criminalidade, o capital social tem um destaque na explicação dos mecanismos por meio dos quais o comportamento normativo é reforçado. Esta linha tem origem no trabalho de Clifford Shaw e Henry McKay (1969). Com base nas ideias da Escola de Chicago de sociologia urbana, eles visaram entender por que algumas áreas da cidade persistiam como áreas de alta criminalidade, apesar 11
dos indivíduos que nelas moravam. Eles explicavam a persistência de crime numa área como uma função da falta de organização social da localidade. Essa teoria, conhecida como a teoria de desorganização social, postula que a existência de certas características sociais dos bairros contribui para a permanência de altas taxas de criminalidade, independentemente da composição demográfica do local. Entre essas características, são significativas a heterogeneidade da população, o grau de imigração no bairro, as redes sociais dos moradores e a eficácia coletiva da comunidade (Shaw e McKay, 1969; Bursik, 1988; Sampson e Groves, 1989; Sampson e Raudenbush, 1999). As últimas duas características, redes socais dos moradores e eficácia coletiva da comunidade, remetem ao conceito de capital social. Recentes elaborações da teoria da desorganização social continuam a destacar a importância do capital social em determinar o nível de desorganização social de uma comunidade e consequentemente a quantidade de criminalidade. Especificamente, características comumente associadas com o capital social, como a prevalência de redes de amizade e ligações dentro da comunidade de larga duração (Sampson e Groves, 1989), bem como a participação em associações voluntárias e a capacidade de mobilizar recursos formais (Bursik e Gramsick, 1993) demonstraram ser importantes na determinação do nível de desorganização social de uma comunidade. Essa linha teórica está presente nos três primeiros artigos desta coletânea. Vemos nos artigos apresentados aqui como o capital social e especialmente os laços sociais são relevantes para explicar o crime de colarinho branco, o sentido de insegurança nas escolas e as percepções sobre a polícia. O capital social também se destaca nas discussões de estratificação, especialmente na explicação sobre mobilidade social (Granovetter, 1974; Bourdieu, 1985). Aqui o capital social serve como fonte de benefícios mediados por meio de redes que se encontram fora do contexto familiar imediato. Granovetter (1974), por exemplo, aponta para a importância do chamado “laços fracos”, ressaltando que oportunidades para avanço no mercado surgem de contatos de conhecidos muito mais do que de contatos familiares. O que ressalta nessa vertente dos estudos sobre o capital social é a qualidade das redes de contatos. Da mesma forma que o capital social pode ser um mecanismo de avanço (como argumenta Granovetter), ele pode também ser limitador, se os contatos não forem diversificados. Wilson (1987), por exemplo, examina como a saída da classe média negra americana do centro urbano enfraqueceu as redes de contato para aqueles negros que pertenciam aos centros urbanos, limitando-lhes as oportunidades de emprego. 12
Os dois últimos artigos nesta coletânea examinam a importância do capital social, baseando-se nessa perspectiva. O primeiro deles trata do impacto do controle social sobre a pobreza. O último examina o capital social em uma rede específica, a organização religiosa. Capital social e metodologia mista Além do tema tratado, outra característica compartilhada pelos artigos nesta coletânea é sua abordagem metodológica. Todos os artigos partem de um desenho de pesquisa que integra a metodologia quantitativa e qualitativa, também conhecida como metodologia mista. Nas ciências sociais, é comum dividir a metodologia de pesquisa em dois campos distintos: a metodologia quantitativa e a metodologia qualitativa. Essa divisão refere-se não somente a diferentes técnicas de coleta e análise de dados, mas a diferentes perspectivas epistemológicas (Fielding, 2010). De modo geral, a metodologia quantitativa se associa à perspectiva de positivismo, enquanto a metodologia qualitativa se associa à perspectiva fenomenológica. Em outras palavras, a metodologia qualitativa engloba uma visão do mundo social na qual a realidade é construída, relativa, e sujeita aos contextos particulares do fenômeno ou interação social. Em contraste, a metodologia quantitativa parte do pressuposto de que existe uma realidade objetiva no mundo social que pode ser descoberta e generalizada por meio de vários contextos. Apesar das evidentes diferenças entre as duas metodologias, a partir dos anos 1990 surge um movimento nas ciências sociais que questiona a necessidade de se escolher entre as duas metodologias. Eles argumentam, ao contrário, que a pesquisa nas ciências sociais beneficiaria a mistura ou a integração das metodologias quantitativas e qualitativas. Frustrados com o debate metodológico que enfatizava a virtude, a legitimidade ou a validade de uma metodologia sobre a outra, estes cientistas questionaram a atual dicotomia metodológica como falsa (Newman e Benz, 1998; Minayo e Sanches, 1993). Estes pesquisadores argumentam que os objetos de pesquisa social são complexos e multidimensionais demais para serem estudados exclusivamente pela ótica de uma ou outra metodologia. Newman e Benz (1998), por exemplo, sugerem que as metodologias qualitativas e quantitativas não devem ser vistas como polos opostos, mas como partes de um contínuo, sendo a utilização de ambas necessária para uma visão holística de qualquer problema estudado. Os desenhos da metodologia mista visam fornecer uma visão mais completa do fenômeno estudado, já que não são restritos pelas limitações 13
inerentes numa metodologia ou outra. Tipicamente os desenhos da metodologia mista utilizam as duas metodologias em uma de duas formas. O primeiro desenho de metodologia mista identifica uma das metodologias como central e a outra como complementária. Nesses desenhos, uma das metodologias serve como preliminar à outra, e ambas tendem a ser empregadas segundo a perspectiva da metodologia dominante. Este é o caso, por exemplo, do uso de grupos focais para melhor validar as perguntas de um questionário. O segundo desenho dá igual peso para as duas metodologias, triangulando os achados para uma maior compreensão do fenômeno estudado. Para o caso dos estudos sobre criminalidade e, em especial, os estudos de capital social, a metodologia mista apresenta várias vantagens. Primeiro, a metodologia mista permite examinar várias facetas das consequências do capital social, tanto como quantidade e qualidade de redes como os significados destes para a ação coletiva. No caso específico do estudo da criminalidade, ainda persistem muitas incógnitas referentes à natureza e qualidade do capital social e de que maneira as diferentes configurações do capital social podem influenciar a criminalidade. Para estudos de estratificação, é tão importante entender como os recursos de redes ou laços são acionados quanto a quantificação da sua frequência ou alcance. Uma experiência em integração de metodologia Este livro é constituído por uma seleção de artigos escritos durante a disciplina de “Integração de Métodos Quantitativos e Qualitativos” no curso de graduação de Ciências Sociais da Universidade Federal de Minas Gerais no primeiro semestre de 2009. Esta disciplina se encaixa num propósito maior do curso, qual seja, o de providenciar aos alunos uma formação sólida em metodologia de pesquisa. O curso contempla quatro disciplinas obrigatórias de metodologia e várias disciplinas optativas, como, por exemplo, análise multivariada de dados. A disciplina optativa de “Integração de Métodos Quantitativos e Qualitativos” faz parte deste esforço, visando expor o aluno à tendência recente nas ciências sociais de integração ou “mistura” de métodos. A intenção da disciplina era fornecer, por meio da prática, oportunidades para que os alunos ganhassem experiência e conhecimento no desenho e na execução de pesquisas baseadas na integração de metodologias qualitativas e quantitativas. Os alunos cursados na disciplina trabalharam em grupos de até cinco pessoas no desenho e execução de um projeto de pesquisa que integrou métodos qualitativos e quantitativos. O trabalho 14
final da disciplina para cada grupo foi elaborar um artigo delineando os achados do projeto. Essa tarefa visou a uma análise secundária quantitativa e à coleta primária e análise de dados qualitativos. Essa proposta, tão ambiciosa para uma disciplina da graduação, se tornou possível devido a três fatores. Primeiro, cada um dos nossos formandos em ciências sociais goza de uma base sólida de conhecimento em métodos de pesquisa, devido à ênfase metodológica do curso delineado acima. Segundo, parte do treinamento dos nossos alunos visa a sua inserção em projetos de pesquisa, nos quais desenvolvem oportunidades práticas de treinamento em pesquisa. Terceiro, como vemos nos artigos que compõem esta coletânea, os dados quantitativos (e em alguns casos os dados qualitativos) utilizados nos projetos provinham de pesquisas realizadas pelos próprios professores do curso. Tendo um rico acervo de dados de diversos temas disponíveis para nossos alunos, sem dúvida isso facilitou a definição e execução dos projetos. Os alunos desenvolveram seus projetos em temáticas diversas, como crime, pobreza, participação política, religião, saúde e educação. Este livro reúne cinco dos oito artigos finais, enfocando temas como criminalidade, segurança, estratificação e religião.
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