Fundamentos da Alfabetização
Do Desenho à Palavra: os Níveis Conceptuais Lingüísticos
No trabalho com os cinco níveis conceptuais, utilizamos a nomenclatura conside-
rada a mais conhecida entre os professores: Nível 1 – pré-silábico (fase pictórica, gráfica primitiva e pré-silábica propriamente dita) Nível 2 – intermediário I Nível 3 – silábico Nível 4 – intermediário II ou silábico-alfabético Nível 5 – alfabético
O nível intermediário I foi introduzido por se tratar de um momento de conflito fun-
damental para a organização do trabalho do professor.
Nível 1: pré-silábico Fase pictórica
A criança registra garatujas, desenhos sem figuração e, mais tarde, desenhos
com figuração. Normalmente, a criança que vive num ambiente urbano, com estimulação lingüística e disponibilidade de material gráfico (papel e lápis), começa a rabiscar e experimentar símbolos muito cedo (por volta dos 2 anos). Muitas vezes, ela já usa a linearidade, mostrando uma consciência sobre as características da escrita.
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Fase gráfica primitiva
A criança registra símbolos e pseudoletras, misturadas com letras e números. Já
demonstra linearidade e utiliza o que conhece do meio ambiente para escrever (bolinhas, riscos, pedaços de letras). Nesse momento, há um questionamento sobre os sinais escritos. Ela pergunta muito ao adulto sobre a representação que vê em sua comunidade.
Fase pré-silábica
Na fase pré-silábica propriamente dita, a criança começa a diferenciar letras de
números, desenhos ou símbolos e reconhece o papel das letras na escrita. Percebe que as letras servem para escrever, mas não sabe como isso ocorre.
Nesse momento, a criança apresenta as seguintes concepções: Falta de consciência da correspondência entre pensamento e palavra escrita. Falta de correspondência entre fonema e grafema. Não há reconhecimento do valor sonoro convencional, isto é, não é observada a relação existente entre o som A e a letra A. Impressão de que a ordem das letras não é importante. Podem ser quaisquer letras, em qualquer ordem, pois a escrita não é estável. A mesma letra pode mudar de significado em um lugar diferente, porque ela corresponde ao que o sujeito desejou escrever. Uma criança pode escrever girafa assim: LTUXTOAVEMOXOAT. Impressão de que só existe a possibilidade de escrever substantivos, pois eles têm significado. Geralmente a criança não escreve verbos e artigos. Idéia de que a leitura e a escrita só são possíveis se houver muitas letras (sempre mais de três ou quatro) e letras diferentes e variadas.
Na fase pré-silábica, a criança acredita que as letras ou sílabas não se repetem na
mesma palavra.
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Pode-se imaginar, então, o que se passa na cabeça da criança pré-silábica quan-
do se inicia o processo de alfabetização pelo A, E, I, O, U (sem significado) e quando se usa e abusa de sílabas dobradas (lalá, lelé, li, fafá, fifi, zazá, etc.).
Quando questionada se a palavra sol pode ser lida, a criança diz que não, porque
tem poucas letras.
O mesmo ocorre quando se mostra a seqüência lá-lá-lá-lá.
Nessa fase, é comum a criança dizer que para escrever elefante ela precisa de
muitas letras porque elefante é grande e para escrever formiguinha ela precisa de poucas letras, porque formiga é pequena.
Observe a escrita de uma criança pré-silábica:
AIUNOÁXF BXUNAF AXUNB OXNBAUXA
Abacaxi Maçã Banana O menino come pêra
Nível 2: intermediário I
A fase intermediária I caracteriza-se por um conflito. A criança foi provocada a
repensar a certeza do nível pré-silábico e fica sem saída, pois não consegue ainda entender a organização do sistema lingüístico. Geralmente há a negação da escrita, pois o aluno diz que “não sabe escrever”. A postura do alfabetizador, bem como a estimulação lingüística presente no meio, irá determinar se a criança dará continuidade à sua busca ou se desanimará.
As características desse nível são: Ligação difusa entre pronúncia e escrita. A criança já conhece e usa alguns valores sonoros convencionais, além de alguns trechos da palavra. Ao ser solicitada a escrever elefante, por exemplo, ela escreve EXTATEUXE. Já é capaz de justificar: a palavra começa com E e termina com E.
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Início de uma certa estabilidade exterior das palavras, dependendo da autoridade de alguém que especifica as letras e a sua ordem. A criança sabe, por exemplo, que a palavra Rodrigo tem dois R, mas não sabe onde colocá-los.
Nível 3: silábico
Quando a criança chega ao nível silábico, sente-se confiante porque descobre
que pode escrever com lógica. Ela conta os “pedaços sonoros”, isto é, as sílabas, e coloca um símbolo (letra) para cada pedaço. Essa noção de que cada sílaba corresponde a uma letra pode acontecer com ou sem valor sonoro convencional.A criança pode, por exemplo, escrever fita assim: IA ou LX. Aqui, o aluno acredita que resolveu o problema da escrita, mas a leitura ainda continua problemática, porque os adultos não conseguem ler o que ele escreveu.
As características do nível silábico são: Aceitação de palavras com uma ou duas letras, mas ainda com uma certa hesitação. Algumas vezes, depois de escrever a palavra, coloca mais letras só para ficar “mais bonito”. Exemplo: UALXTO ([uva]. Possibilidade de convivência com a hipótese de quantidade mínima de letras por um bom tempo. Utilização de uma letra para cada palavra ao escrever uma frase. Falta de definição das categorias lingüísticas (artigo, substantivo, verbo etc.). Maior precisão na correspondência som/ letra, o que não ocorre necessariamente sempre. É freqüente que numa frase algumas palavras sejam registradas com recorte silábico. O essencial da hipótese silábica é a sonorização ou fonetização da escrita, inexistente em fases anteriores. EEUO VK CMUO OUI AVKVUQ
elefante vaca camelo boi A vaca dá leite
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Nível 4: intermediário II ou silábico-alfabético
Por se tratar de um nível intermediário, é mais uma vez um momento conflitante,
pois a criança precisa negar a lógica do nível silábico.
Ninguém consegue ler o que ela escreve e, nesse momento, ela se vê sem saída.
Isso acontece principalmente quando ela usa só vogais, porque a mesma combinação de letras serve para escrever uma porção de palavras.
É justamente isso que pode indicar o caminho para o professor: propor atividades
que levem a criança a observar a distância entre sua escrita e a escrita do adulto (respectivamente, por exemplo, ao e sapo).
É o momento em que o valor sonoro torna-se imperioso e a criança começa a
acrescentar letras principalmente na primeira sílaba. Exemplos: TOAT TIAO KVAQ
tomate Tiago cavalo
No nível silábico-alfabético, a criança está a um passo da escrita alfabética. Ao
professor cabe o trabalho de refletir com ela sobre o sistema lingüístico a partir da observação da escrita alfabética e da reconstrução do código.
Nível 5: alfabético
Quando a criança reconstrói o sistema lingüístico e compreende a sua organiza-
ção, ela transpõe a porta do mundo e das coisas escritas, conseguindo ler e expressar graficamente o que pensa ou fala. Ela representa as seguintes características: Compreensão da logicidade da base alfabética da escrita. Exemplo: a criança sabe que os sons G e A são grafados ga e que T e O são grafados to e que, juntos, significam gato.
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Conhecimento do valor sonoro convencional de todas ou de grande parte das letras, juntando-as para que formem sílabas e palavras. Distinção de letra, sílaba, palavra e frase. Às vezes, contudo, a criança ainda não divide a frase convencionalmente (gramaticalmente), e sim de acordo com o ritmo frasal.
Exemplos omininu comeum doci BISILTA PTECA UVDA LUSIA OO PT EC
O menino comeu um doce bicicleta peteca bola Lúcia joga peteca.
É importante destacar que nesse momento a criança escreve foneticamente (faz a
relação entre som e letra), mas não ortograficamente.
O desafio agora é caminhar em direção à convencionalidade, em direção à corre-
ção ortográfica e gramatical.
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Referências COCCÓ, Maria Fernandes e HAILER, Marco Antonio. Didática da Alfabetização – Decifrar o mundo: Alfabetização e socioconstrutivismo. São Paulo: FTD, 1996.
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