Diálogos - Edição 9

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Edição 9

Diálogos do Fórum DRS

Ano 2 Abril/2013

Alex Barril

Luciano Martínez

Alberto Adib

Diego Piñero

Ruralidade na América do Sul: história, presente e futuro das políticas públicas para a região


Expediente Coordenador Executivo do Fórum DRS Carlos Miranda

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Apresentação A série “Diálogos do Fórum DRS” é uma publicação exclusiva do Fórum Permanente de Desenvolvimento Rural Sustentável (Fórum DRS). Tem origem na seção “Diálogos”, do Boletim Informativo do Fórum DRS, que brindou durante anos o leitor com entrevistas e debates com personalidades relacionadas ao tema DRS. A série “Diálogos do Fórum” ganhou espaço exclusivo nas publicações do Fórum DRS desde março de 2012. Em novo formato, a série oferece ao leitor conteúdo rico e exclusivo, com pontos de vista distintos, permitindo que você tenha um panorama mais amplo à respeito dos temas relacionados ao DRS. A interação marca este novo espaço, já que os usuários podem interagir com os participantes dos diálogos por meio do site do Fórum DRS.

Edição 9

Diálogos do Fórum DRS

Ano 2 Abril/2013

Alex Barril

Luciano Martínez

Alberto Adib

Diego Piñero

Ruralidade na América do Sul: história, presente e futuro das políticas públicas para a região

Nesta Edição A nona edição da Revista Diálogos do Fórum DRS dá continuidade aos debates sobre as concepções de Ruralidade na América Latina e suas implicações nas políticas públicas de desenvolvimento rural. Nesse sentido, a presente edição reúne 2 especialistas, com considerável experiência como gestores governamentais – Alberto Adib e Alex Barril, e 2 proeminentes acadêmicos Sulamericanos - Diego Piñero e Luciano Martinez, que fizeram uma reflexão sobre temas, tais como: o conceito ampliado de rural no mundo contemporâneo, o equívoco da visão que associa o rural a condições de atraso ou o reduz às atividades agropecuárias ou ainda, as suas debilidades institucionais e organizacionais e finalmente, debatem o mundo rural em sua inserção nos processos nacionais de globalização.


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Ruralidade na América do Sul: história, presente e futuro das políticas públicas para a região

Diego Piñero, professor de Sociologia Rural no Uruguai; Alex Barril, consultor independente no Chile e Luciano Martínez, professor da Flacso, em Quito, no Equador, discutem, nessa edição, o conceito de rural na América do Sul sob a óptica de diversos países da região, como Uruguai, Chile, Paraguai, Equador, Argentina e Brasil. Como lidam os representantes dos Estados da região com essa questão? Qual a origem histórica do rural nos países que constituem a região? O rural é subestimado na região? Qual o futuro do campo na região? Esta e outras perguntas são debatidas pelos especialistas neste Diálogos do Fórum que foi conduzido pelos consultores do IICA Ivanilson Guimarães e Alberto Adib. Leia e conheça mais sobre a formação do conceito do rural na América do Sul. ALBERTO ADIB: Vou fazer uma breve introdução para começar abordando o tema da ruralidade de forma mais geral. Depois podemos falar de detalhes mais específicos dos países. Bem, temos visto que os critérios que são utilizados pelos financiadores rurais variam muito. Cada país tem o seu critério e isso está muito claro. Outro ponto, ABRIL | 2013

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[...] Pelo o que entendemos do rural na atualidade, percebemos que não. Os países não são tão urbanos, porque a ruralidade hoje tem uma conotação distinta

Alberto Adib

corresponde a uma classificação dicotômica muito

DIEGO PIÑERO - Eu gostaria, em relação

clara, associado a pautas conceituais normativas

a esse tema da subestimação rural, de voltar

e isso, também, está muito claro. Mantiveram-se

na história. Pelo menos no caso do Uruguai é

sem modificação nos últimos 40, 50 anos e têm

importante discutir isso. E a minha pergunta é:

contribuído, agora se vê isso de forma clara, a uma

por que o rural está subestimado?

subestimação do rural, identificando a América Latina como região muito urbanizada, o que afeta muito as decisões políticas. Ou seja, com essa leitura que se faz do rural, com critérios antigos, no Brasil principalmente, temos um país muito urbanizado. Mas pelo o que entendemos do rural

Eu creio que isso tem a ver com o papel que o rural jogou na história do País. No Uruguai, por exemplo, o último tiro da guerra civil foi dado em 1904, ou seja, não faz tanto tempo. E a campanha uruguaia, ou seja, o campo uruguaio durante todo o século XIX foi um campo de guerra, um

na atualidade, percebemos que não. Os países não

campo de enfrentamento entre distintas concep-

são tão urbanos, porque a ruralidade hoje tem uma

ções políticas. E aqueles que lutavam, os que se

conotação distinta. Eu gostaria que vocês comen-

enfrentavam, eram os gauchos, liderados pelos

tassem algo sobre os problemas existentes nes-

seus patrões, que eram os coronéis, que lide-

sa conotação dicotômica para uma interpretação

ravam os exércitos que se enfrentavam nessa

mais atualizada da ruralidade

guerra. Assim, o campo uruguaio, era perigoso www.iicaforumdrs.org.br

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andar, pois não era um campo pacífico e, mais ainda, era um campo de grandes extensões no qual predominava a pecuária. Só se podia andar a cavalo, devido as enormes distâncias. Então, eu acredito que aí nasce uma visão cultural que ainda temos nos dias de hoje, que o campo não está associado ao civilizado. O civilizado é a cidade; e o campo, de alguma forma, representa o não civilizado, a barbárie, aquela famosa dicotomia de Sarmiento, o argentino que escreveu o livro que marcou uma geração, ao menos no Rio de La Plata, uma dicotomia de civilização e barbárie. A barbárie do campo e a civilização na cidade. Eu acredito que esse conceito permeou a cultura dos uruguaios, não acredito que só dos uruguaios, mas outros países talvez tenham vivenciado algo similar.

[...] Há processo de reforço na medida em que o rural se conceitua como

Então, quando a gente observa a lei de 1946, que é a lei que estabelece a criação dos centros povoados no Uruguai, essa ideologia está presente na criação dos centros povoados, nessa lei. E o que ali é resgatado ou o que se decide é como

o atrasado e, também, na medida

se cria os centros povoados, a partir de um meio

em que os serviços se instalam

que é o campo. O imanente, o que está presente

nos centros povoados e as políticas

é o campo e não o rural. Então, a lei cria o urbano como civilizado, como o espaço, o lugar, onde

públicas reforçam isso, ou seja,

a sociedade se crê como uma sociedade mais

efetivamente, o rural vai ficando

progressista, que pode acessar serviços que a

atrasado.

Diego Piñero

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diferencia do rural. Inclusive, eu diria, muito etnocentricamente, é mais europeia. Não sei se isso é similar para outros países, mas no caso do Uruguai isso é o que está muito marcado na concepção inicial de como se define o rural. O rural fica, então, para trás, o rural fica definido como arcaico, como aquilo que está contra o progresso.


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ALBERTO ADIB - Como esse conceito, hoje, afeta a política pública? DIEGO PIÑERO -Como consequência dessa definição do rural e do urbano, toda a ação do Estado se centraliza nos povoados e nas cidades, sobretudo nas zonas econômicas, em especial nas cidades maiores. Então é como um círculo vicioso que reforça o atraso, o arcaico do rural. Porque na medida que os serviços como, por

uma conceitualização de um mundo rural ignorante, atrasado. Não há interlocução, com exceção dos proprietários que se movem no mundo político. Se observarmos a conformação da Europa, ou aqui ou o governo; são os proprietários. Com essa visão, além disso, se faz a mudança política. Esse mundo atrasado é um obstáculo para conseguir o desenvolvimento do país e, portanto, precisa ser tirado do caminho.

exemplo, a educação, se instala nas cidades, a

O primeiro processo de reforma agrária no

população rural, que está distante dos centros

Chile inscrito no marco de um novo modelo de

povoados onde estão os serviços, cada vez vai

desenvolvimento, de substituição de importação

ficando mais fora da corrente de modernização.

e etc, foi o interceptor para que o campo fosse

Portanto, há processo de reforço na medida em

uma dificuldade. Latifúndio para o cientista era

que o rural se conceitua como o atrasado e, tam-

um dono de uma propriedade, que dividia fora

bém, na medida em que os serviços se instalam

dali, vivia na cidade, tinha uma produção abso-

nos centros povoados e as políticas públicas reforçam isso, ou seja, efetivamente, o rural vai ficando atrasado. ALEX BARRIL - Continuando com a reflexão de Diego a respeito da marginalização do setor rural, eu acredito que no Chile o tema tem relação fundamentalmente com a estrutura socioeconômica em que se deu o desenvolvimento inicial do país. Talvez um dos mais marcantes no mundo andino.

lutamente extensiva, não era moderno. A reforma agrária tem sua primeira intenção no Chile de modernizar do ponto de vista produtivo, deixar que o campo seja um estorvo e comece efetivamente a ser um aporte para este país que tem que se industrializar, que tem que mudar. Posteriormente, viria a segunda parte para uma reforma agrária mais inclusiva, que o tema passa a ser não só da propriedade da terra, mas também da participação, do acesso a organiza-

A fazenda como estrutura social, econômica

ção, do acesso à educação e etc. Eu diria que

e política, sobretudo nas zonas centrais de Chile,

isso ficou marcado. E hoje, com o transcurso do

marcou o predomínio econômico até 1960. Tinha

tempo, dos 80 para frente, as mudanças políti-

essa cultura de dominação e de atraso. O pro-

cas causaram forte migração do campo para a

prietário era o dono do poder, o que tinha direito

cidade. Um distanciamento por distintas razões,

a voto; e os inquilinos, que eram os peões, es-

não só de cunho laborais, econômicas, mas tam-

tavam absolutamente fora do mundo social. Não

bém políticas. Tem uma forma de olhar a polí-

tinham educação, não tinham saúde, não tinham

tica na qual o campo não é prioridade, ou seja,

nada, dependiam do proprietário. Daí se instala

não há força suficiente no âmbito político dos www.iicaforumdrs.org.br

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setores que representam o mundo agropecuário para influenciar nesta sociedade. Nem sequer os empresários tem a capacidade para se impor ou para demandar com certa força desta política. Incidem muito pouco. Hoje a reivindicação, na conjuntura atual dos empresários no Chile, é o preço do dólar. Ai com certeza eles reclamam. Como a agricultura está voltada para exportação, se o preço do dólar cai, eles são prejudicados e aí se mobilizam para brigar pelo preço do dólar, não para brigar por outro. E o mundo da agricultura familiar, dos assalariados agrícolas não tem suficiente peso organizacional nem sequer para debater. Por ai eu vejo que está essa contradição.

Um distanciamento por distintas razões, não só de cunho laborais, econômicas,

LUCIANO MARTÍNEZ - Bem, seguindo o raciocínio dos meus companheiros que falaram sobre seus países, eu creio que há um quiero no caso equatoriano, que esta relacionado com essa desvalorização do mundo rural. Na minha opinião, pa-

mas também políticas. Tem uma forma

rece que, no caso equatoriano, existe um processo

de olhar a política na qual o campo não é

tardio de industrialização que vai gerando uma vi-

prioridade, ou seja, não há força suficiente no âmbito político dos setores que

são de uma construção do moderno, da modernidade. Isto porque, no caso equatoriano, não se deu a reforma agrária por fundo. A reforma agrá-

representam o mundo agropecuário para

ria de 1964 não gerou um processo de redistribui-

influenciar nesta sociedade. Nem sequer

ção da terra e a fazenda ficou intacta. Então, não

os empresários tem a capacidade para se impor ou para demandar com certa força desta política. Incidem muito pouco.

Alex Barril ABRIL | 2013

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foi possível gerar as condições para um processo de industrialização, com um mercado interno, mas, de qualquer forma, foi sendo construído um imaginário na sociedade de que o rural era o pior. Como não houve transformação para a população rural, esta ficou em condições muito degradadas, com níveis de vida muito baixo, dependendo ainda, eu diria, de um modelo de dominação.


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Até hoje no século XXI as pessoas têm no ima-

atenção é que em toda a América Latina só exis-

ginário esse modelo. Uma dependência que faz

tem dois países que estão se envolvendo sobre o

com que a população rural pense que tem uma

tema ruralidade, quero dizer, efetivamente o Es-

relação com o proprietário. Isso, por um lado, sig-

tado está buscando uma forma de se envolver: o

nifica uma desvalorização porque eles nunca se

Chile, que iniciou o processo agora mesmo (no fi-

desvincularam dessa relação; e, por outro lado,

nal de 2012), e o Brasil. Porque o senhor acredita

foi criado um imaginário de que o importante era

que o Uruguai não está preparado para o tema?

o crescimento das cidades, de ser urbano, pois ali estava o melhor, ali estava a modernização. Eu penso que significou um processo importante de migração do campo para as cidades. E, até hoje, o importante para um jovem campesino é sair para a cidade, porque ali está o moderno; ali estão as melhores condições de vida. Em geral, na sociedade equatoriana, o rural significa, até agora, um espaço de atraso, de desvalorização. Então, me parece que isso são fenômenos estruturais que marcam, não? Isto de não ter feito uma reforma agrária é chave e está marcado principalmente nesse processo de

DIEGO PIÑERO – Não Alberto, o que eu falei é que acreditava que o Uruguai estava preparado para uma discussão sobre o tema da ruralidade, mas olhando do ponto de vista das transformações, sobretudo no emprego e na localização das pessoas no campo e na cidade. O que o Uruguai não está preparado é para uma discussão sobre a ruralidade em termo da multifuncionalidade do rural, pois isso é, na minha opinião, uma discussão muito diferente que possui muitas implicâncias e está muito influenciada pela discussão europeia. Eu ainda acredito que nos nossos países as

desvalorização do rural que, digamos desde a

discussões estão muito em termo desse proces-

metade do século passado pra cá, se acentua e

so de deslocamento entre o rural e o agrícola.

gera que a população rural e, destacadamente a

Eu dizia que em nossa história, até muito pouco

mais jovem, o que me preocupa, não veja o espa-

tempo, o rural e o agrícola coincidiam, ou seja,

ço rural, as atividades rurais, todas as ações do

todas as pessoas que viviam no meio rural de-

campo como de valor para ele.

sempenhavam tarefas agrícolas e, por sua vez,

ALBERTO ADIB - Diego, tem uma coisa que me chamou a atenção na sua fala durante o Fó-

todos os que desempenhavam tarefas agrícolas viviam, tinham sua residência no meio rural.

rum* (*VII Fórum Internacional de Desenvolvi-

O que aconteceu nos últimos 20 anos é que

mento Territorial, entre os dias 11 a 14 de novem-

houve um deslocamento desses dois concei-

bro de 2012, em Fortaleza, e do qual Diego Piñero

tos. Hoje tem muita gente que vive no meio ru-

participou como palestrante) . O senhor falou de

ral, porém desempenham tarefas que não são

uma forma muito en passant de que o Uruguai

agrícolas, em torno de 20%, no caso do Uruguai.

não está preparado para ter uma discussão so-

Pessoas que residem no meio rural não desem-

bre a ruralidade. Outra ponto que me chama a

penham tarefas agrícolas, senão fundamentalwww.iicaforumdrs.org.br

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mente serviços e algo menos na indústria. Em segundo lugar, existem muitas pessoas que hoje desempenham tarefas agrícolas vinculadas a agricultura e que não possuem residência rural. Para dar um dado, os 50% dos trabalhadores assalariados rurais e agrícolas no Uruguai não recebem no meio rural, senão recebem no meio urbano e isso porque há uma enorme transformação nas comunicações e nos meios de transporte. Então, o que acontece? Os trabalhadores assalariados recebem do meio urbano. Quando o patrão o necessita, o chama por telefone e lhe diz: - “você pode vir amanhã? Pois tenho trabalho em tal e tal coisa”. No dia seguinte, essas pessoas sobem nas suas motos, pois hoje as motos na China custam mil dólares e quem não pode comprar uma? E como existem boas estradas e o lugar onde essas pessoas vão trabalhar estão a

O conceito de rural foi criado quando o rural e o agrícola coincidiam e

15, 20, 30 quilômetros, eles vão até o prédio, trabalham ali um dia e voltam ou ficam dois ou três dias. Além disso, isso está muito apoiado pelos patrões, porque dessa forma o custo da mão de obra diminui muito, já que o tempo de trabalho na agricultura é variável. Se eu tenho um peão

hoje estão desdobradas, então esse

permanente no meu estabelecimento tenho que

conceito é velho, portanto, temos que

pagar o salário dos meses, mas o emprego, eu o

renovar esse conceito e temos que repensar o que entendemos hoje por população rural.

necessito apenas alguns dias do mês. Assim, os meios de comunicações, as trocas nos meios de comunicações e de transportes facilitaram essa fragilidade, o que permitiu aos patrões diminuir os seus custos em relação a remuneração do

Diego Piñero ABRIL | 2013

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trabalho rural. Então, isso que estamos apresentando, vimos notando nos últimos 12 anos, ou seja, nos últimos 20 anos. Nos últimos 5 anos, se acelerou profun-


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damente e a população rural do Uruguai dimi-

o que estamos fazendo aqui, no Brasil, não é um

nuiu pela metade entre o ano 2000 e 2011, que foi

movimento iniciado pelo Estado e, sim, um movi-

o último censo realizado. Passou de 9,7% a 5,3%

mento que foi provocado por organizações inter-

a população rural, ou seja, já era baixa a popu-

nacionais. Eu creio que no Chile acontece algo,

lação rural no ano 2000. Então, entre o ano de

como o senhor vê isso?

96 e o ano 2000 passamos de 9,7% de população rural para 5,3%, portanto, esta enorme diminuição gera um problema que antes não tínhamos. Primeiro, essa população que reside no meio rural, porém, presta serviços para a agricultura às vezes, mas presta serviços ou é um comerciante e reside em um povoado de mil habitantes, como vamos considerá-lo? Como população urbana ou como população rural? Esse é um dos problemas. Uma pessoa que trabalha durante todo

ALEX BARRIL - Teria que se detalhar mais qual é a intenção e a vontade hoje. Existe efetivamente o interesse de entrar nessa área do rural, da definição. Fundamentalmente os dados do último censo que foi realizado meses atrás e, mesmo que não há dados oficiais, claramente vai mostrar primeiro o crescimento muito menor na população em geral do que se esperava. Se esperava que de 15 fosse passar para 18 milhões de

o ano no meio rural e em tarefas agrícolas, mas

habitantes e são 16,5 milhões. E, segundo, houve

reside em um povoado e numa cidade, como va-

uma diminuição, parecido com o que aconteceu

mos considerá-lo? Como povoado rural ou como

no Uruguai, desse 13% vamos baixar, com certe-

população urbana? Essas são as coisas que pre-

za, para uns 10%.

cisam ser redefinidas. Por que acontece? O conceito de rural foi criado quando o rural e o agrícola coincidiam e hoje estão desdobradas, então esse conceito é velho, portanto, temos que renovar esse conceito e temos que repensar o que entendemos hoje por população rural.

ALBERTO ADIB – Para quem quer ser potência alimentar... ALEX BARRIL – Exato. Então, o Ministério de Agricultura que tem interesse, tem também essa contradição. E faço a mesma pergunta que você: como me explicam isso? Como esse país

ALBERTO ADIB - Eu queria abordar um tema

com um 10% de população rural vai ser potência

e depois você pode mesclar com o que ele dis-

agroalimentária? Eu acredito que será algo fun-

se. O mercado do Chile, o que me chama atenção

damentalmente instrumental. Não creio que isso

é que é um país eminentemente mineiro; e na

vá (...) e se chegar a se concretizar, essa troca

questão do PIB, na contribuição do PIB agrícola

de conceito vai ser fundamentalmente normativa

está em quarto lugar, mas é um país que briga

para mudar o censo. Ou seja, o próximo censo

muito para ser uma potência agroalimentar. En-

será medido com um conceito distinto, mas isso

tão como convive o Chile? É o primeiro país da

não vai ter necessariamente implicância e que o

America latina que está preocupado em definir o

Estado vai ter uma preocupação maior por gerar

conceito de ruralidade, esse é o primeiro, porque

políticas. www.iicaforumdrs.org.br

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Participantes reunidos durante o VII Fórum Internacional, em Fortaleza. Da esquerda para direita: Alberto Adib, Alex Barril, Luciano Martínez, Diego Peñero e Ivanilson Guimarães

Existem coisas que são parecidas. Se analisar-

Não existe uma política bem definida na Améri-

mos o Chile, o sistema de contratação de força de

ca Latina que permita o ingresso de trabalhadores

trabalho também mudou radicalmente. Hoje em

estrangeiros por período de tempo permanente. E

dia, independe do período que se vive, o aporte do

isso teve início com os paraguaios. Começou-se

setor agropecuário em força de trabalho é de 8 ou

a levar muitos paraguaios para trabalhar no Chi-

quase 9%, o que preocupa. Mas se a gente mede

le, nos territórios rurais, nos últimos três a quatro

isso na época da safra, na época da colheita de

anos, porém, ilegalmente. A migração peruana

frutas, onde a mão de obra aumenta fundamen-

também é muito forte, ainda que mais dirigida a

talmente, esse aporte deve subir para 20%. Todas essas pessoas que vão trabalhar na safra para a

serviços urbanos, mas os paraguaios foram impressionantes nos últimos três anos.

colheita é o mesmo que acontece no Uruguai e em

E isso, podemos dizer, motivado por uma visão

outros países. E hoje um dos problemas do Chile

de que o sistema salarial, além de ser uma piada,

é que há uma escassez enorme de mão de obra

é outro incentivo perverso para que as pessoas

para o setor rural e, por iniciativa dos empresários

não trabalhem no âmbito rural. Quando a gente

agrícolas, tem início a discussão de uma política

vê que isso acontece em todos os lugares, per-

migratória.

cebe que existe uma missão institucionalizada:

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que a vida mais barata é no campo e, portanto,

a importância que tem a agricultura familiar na

os salários são menores, tem que ser menores.

produção do alimento e, a partir daí, traçar um

Tem um salário mínimo agrícola e tem um salário

caminho para uma definição; mas assim no ar, eu

mínimo industrial-urbano. O questionário de ca-

não enxergo...

racterização socioeconômica, que é feito uma vez a cada dois anos regularmente, tem dois valores para medir a pobreza: um valor para o setor urbano e um valor distinto, mais baixo, para o setor rural. As pessoas abandonam o campo não só por questão de moradia, mas também de trabalho, pois se ganha mais trabalhando fora e isso nos levou a esses problemas. É muito complexo porque o tema é que eu não vejo, hoje, que essa vontade manifestada pelo governo em pensar em setorizar o rural, esteja relacionada com alguma mudança de política. Eu acredito que exista um forte impacto na questão institucional. O Ministério da Agricultura vê muito pouco os temas rurais em geral e nessas medições começa a ficar sem clientela e pode ser que aconteça, tardiamente, o mesmo que na Argenti-

ALBERTO ADIB - Você falou uma coisa muito interessante. Você não acredita que deve ser de cima para baixo que se deve buscar a definição do rural. Deve ser uma construção social e que a partir daí nasce. Como vê isso? É possível ou demoraria muito para fazer? Existe organização suficiente das pessoas para poder se mover e buscar isso? LUCIANO MARTÍNEZ - Esse é um tema muito complexo. O governo está desenhando algumas políticas que tem muitas potencialidades do ponto de vista rural, mas tenho o temor de que isso não se centralize como um movimento social. Lamentavelmente, no Equador, o movimento indígena foi declinando e nesse momento, não representa o que poderia ser uma força vinculada a agricultura familiar. Assim, acredito que no caso

na, em uma discussão que aconteceu um tempo

equatoriano é um drama, pois não há uma conso-

atrás: Porque queremos colocar agricultura? Por

lidação do que poderia ser o capital social, desde

que não um Ministério de Economia e Produção

baixo, das organizações. Não tem, por exemplo,

que tenha uma subsecretaria de agricultura?

uma organização de agricultores familiares que

Eu acredito que ai há um temor político a esse nível que esta por dentro da discussão. Mas se

podem ser os que recolham essas propostas e façam sugestões.

não quisesse fazer uma mudança radical, mais

Existe por aí umas organizações que tem a ver

profunda da conceitualização do rural que não

com a parte dos consumidores e nada mais. Isso

esteja relacionada com a geração de política,

se está organizando porque existe uma poten-

creio que passa por outro lado. Tem que se asso-

cialidade muito forte com a parte da soberania

ciar a um setor econômico produtivo, agricultura

alimentar vinculada a a agricultura familiar, mas

familiar que tenha produção. Colocar em debate

não existe uma organização potente que possa

a importância que uma pessoa tem hoje em dia,

vincular isso, contudo, isso é uma necessidade,

apesar da agricultura estar voltada à exportação,

pois caso contrário, vamos ter o desenho de uma www.iicaforumdrs.org.br

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políticas pública muito intencionada, mas que não se conectam. Por exemplo, aproveitando o tema salarial no rural e o urbano, no caso equatoriano tem uma diferença muito notável em relação ao caso do Chile e do Uruguai. E é que ainda os assalariados não foram destituídos de suas terras, quer dizer, são semi proprietários. Então, ainda tem a residência, ficam no meio rural, estão aí e não migraram para as cidades, porque teriam um drama tremendo, imaginem as migrações de todas as áreas rurais. Mas isso permite às empresas, sobretudo, as últimas empresas de exportação de flores e de hortaliças, que se instalaram fortemente na parte da serra, à aproveitar a mão de obra local ou indígena que estão próximas. Permite às empresas pagar bem, justamente porque sabem que de alguma maneira eles conservam, facilitam e desde ai eles tem seu alimento e etc.

Temos esse desenho, mas eu penso que há uma debilidade organizativa, então não há uma possibilidade que se possa construir. E a pergunta seria: como se constrói as políticas públicas em nosso países?

Luciano Martinez ABRIL | 2013

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Então, as condições de trabalho são mais baixas e dessa maneira podem ser competitivos; porque produzir flores no Equador e competir com Holanda, competir com Quênia e etc. no mercado mundial é um problema. No entanto, na parte da costa, aí sim, o poder de concentração da terra expulsou a mão de obra e aí foram formados esses povoados de assalariados que não possuem nenhuma parcela e que estão vivendo nesses pequenos povoados que, além disso, são consideradas cidades porque tem nada mais do que menos de 5 mil habitantes. Ou seja, mais de 5 mil habitantes e é uma cidade. Então é uma quantidade de pequenos povoados que foram formados, que são cidades-domitórios onde estão os assalariados que trabalham. Mas


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isso obedece a um processo de maior ou menor

produtores agrícolas que vivem, e que resolveram

expropriação dos campesinos, se ficavam com a

os temas básico de morada e da comida, e traba-

terra ou não.

lham assalariamente período de tempo, diário ou

Então no Equador existem esses dois modelos interessantes: um dos agricultores vinculados e, outro, dos agricultores que já não possuem terra e já são mais parecidos ao modelo do Chile e do Uruguai. Mas voltando a sua pergunta, acredito que isso seja um desafio no caso do Equador. Temos esse desenho, mas eu penso que há uma debilidade organizativa, então não há uma possibilidade que se possa construir. E a pergunta seria: como se constrói as políticas públicas em nosso países? Essa é a pergunta. E acredito, pelo menos a experiência de Equador, é que são construídas desde cima. Perigosamente, advirto. Contratam a um consultor para que faça o manejo estatístico, no Ministério se reúnem e dizem por aqui vai o

mensal na salmonicultura, que tem um uso da mão de obra intensivo e que permite baratear os custos. Foi por isso que o Chile cresceu em termos de exportação de salmão a cifras impressionantes. Essa situação não tem nada que ver com a zona central onde a fruticultura se modernizou e, como alguém falou, está tudo tecnificado, risco computadorizado e só requer mão de obra no momento da colheita, então aí a gente viu e vai trabalhar nesse período de tempo. IVANILSON GUIMARÃES - Eu queria expor uma reflexão. No nosso campo do conhecimento o tema surge a partir de uma necessidade, seja da sociedade ou estritamente do governo. O surgimento do tema de você discutir o que é o rural hoje tem uma motivação, eu diria, tem uma motivação e um objetivo. No Brasil, o motivo de você

assunto e pronto, vamos. Mas será esse o cami-

discutir a chamada nova ruralidade tem uma fi-

nho para construir políticas públicas em nossos

nalidade, tem uma sustentação política, sobre-

países?

tudo sob o ponto de vista da sociedade, que é de

ALEX BARRIL - Pegando o fio da meada do que disse o Luciano, no Chile não é como Uruguai, que talvez seja mais homogêneo quanto a esse tema de salário. No Chile, pela sua estrutura geográfica e pela atividade produtiva, também

tornar passíveis de atendimento pelas políticas públicas os segmentos sociais que até então não eram atingidos por essas políticas. Por isso, eu acho que, do ponto de vista da motivação, a discussão no Brasil se justifica por este lado.

acontece essa situação de manutenção com a

E nos outros países da América do Sul, no

agricultura familiar onde não foram despejados

caso, eu queria ao mesmo tempo fazer essa co-

da terra; mão de obra para a indústria, sobretu-

locação, mas agregar uma outra, do ponto de

do, no sul com o boom que houve com a pesca de

vista da formação dos três países que estão aqui

salmão e tudo relacionado com a salmonicultura

representados. Vocês têm uma formação extre-

e a possibilidade que tem de competir no mer-

mamente diversa. Por exemplo, tem a formação

cado internacional. Isso se dá porque os traba-

do Chile, que teve uma influência europeia; você

lhadores da salmonicultura são todos pequenos

tem e acredito que o Uruguai também tenha essa www.iicaforumdrs.org.br

ABRIL | 2013

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influência; mas nós temos o Equador, que tem

Então, essas são empresas que, em muitos

um forte contingente mestiço ou indígena. En-

casos, são de sociedade anônimas, cujo o pro-

tão a gente descendo um pouco mais a análise

prietário não sabemos quem é, são fundos de

para formação histórica dos três países, eu vejo

investimento convocados pelos bancos ou são

que quando diz assim: “É atrasado?” Eu alegaria

fundos de pensão dos países desenvolvidos ou

a seguinte questão: a quem interessa essa ima-

são juntas de capital, que também não sabe-

gem de permanência do rural atrasado? E se a

mos quem são os proprietários. Eu acredito que

gente não faz uma distinção entre o povo exclu-

hoje não podemos falar somente das elites de

ído e dos avanços, dos progressos que ocorrem

um país, porque as elites dos países continuam

ultimamente, e as elites rurais. No Brasil exis-

existindo, mas hoje, além disso, estão essas ou-

te, secularmente, uma grande vinculação de um

tras entidades denominadas, que não sabemos

compromisso político das elites rurais com as

bem quem são elas, mas são as proprietárias

elites urbanas, a quem não interessa que esses

de grandes extensões de terra e eu acredito que

segmentos sociais que estão marginalizados ve-

elas serão as proprietárias da maior parte des-

nham à tona; que eles sejam atores. Então, que-

sas terras que mencionei antes.

ria fazer essa provocação e, assim, ver se teria algum sentido do ponto de vista de vocês. DIEGO PIÑERO - Posso ampliar ou complicar um pouco mais essa questão? Porque eu acredito que na América Latina, mais particularmente nos países do cone sul, está acontecendo uma profunda transformação agrária na propriedade e na posse pela terra. Estudos recentes nos mostram que, nos últimos 7 ou 8 anos, o que a gente poderia chamar de os países da Cuenca del

Uma das coisas que ocorre é que a propriedade e a gestão se desdobram. Hoje, a propriedade é de uma sociedade anônima ou de outra entidade e a gestão é feita às vezes por um gerente, um técnico, um engenheiro agrônomo, um economista ou um contador que esta responsável por ela. Um pouco do mesmo que aconteceu na indústria. Assim é desenhado o mapa de quem controla, de quem tem o poder no setor agropecuário.

Plata, em termos bem compreensíveis, que são a

Eu ultimamente me pergunto: o que vai acon-

pampa Argentina, Uruguai, Paraguai, a parte sul

tecer com as grandes corporações que reuniam

do Brasil, uma parte extensa do Brasil e o les-

as elites agrárias que você mencionou? Eu digo:

te de Bolívia; essa é a Cuenca del Plata que são

o que se chama de Associação Rural do Uruguai.

enormes planícies que hoje são objetos da cobiça

No Uruguai existe a Sociedade Nacional de Agri-

dos agronegócios e das multinacionais, que es-

cultura. Bom, não sei se no Equador isso está

tão comprando enorme extensões de terra para

acontecendo, mas também tem as associações

destiná-las a produção de soja, produção de trigo

que reúnem os empresários, não? Bem, hoje es-

e produção de grãos no geral e também de gado

sas sociedades ou associações, que antes era

de alta quantidade.

o lugar no qual se decidia as políticas agrícolas

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dos países; essas pessoas que estão nesses lugares, de imediato, não vão ser os que controlam a maior parte da superfície da terra. Haverá outros que nem se quer residem em nossos países, mas que são residentes de outros lados e que vão controlar a terra. Este é um desenho das forças, das relações sociais em torno da governança do setor agropecuário. ALBERTO ADIB - Eu acredito que isso passa pela região andina. LUCIANO MARTÍNEZ - Bem, na região andina, eu creio que o tema sugerido aqui implica em pensar o urbano não apenas no marco do Estado, da nação, mas também da globalização. Acho que temos que incorporar a variável dessas tendências de globalização para pensar o rural em nosso país. Não depende somente das políticas públicas nacionais e, sim, depende também das estratégias que possuem as empresas internacionais, que estão olhando esses espaços e vão investir massivamente. Então, penso que esse é um elemento que não foi discutido e, evidentemente, não podemos deixá-lo de lado. Quem vai definir a estratégia no rural? As políticas públicas do “Buen Vivir” de Correa (referindo-se à política adotada pelo presidente do Equador, Rafael Correa) ou as multinacionais que vão investir em palma africana para a produção de bicombustível? Me parece que esse é um elemento que incomoda e acho que é importante ser retomado. No caso do Equador, um dado concreto, todos temos uma pequena vantagem frente ao restante dos países e é que somos um país pequeno. Então não dispomos da quantidade de terra que estas empresas necessitam para investir. Não há

[...] eu creio que o tema sugerido aqui implica em pensar o urbano não apenas no marco do Estado, da nação, mas também da globalização. Acho que temos que incorporar a variável dessas tendências de globalização para pensar o rural em nosso país. Não depende somente das políticas públicas nacionais e, sim, depende também das estratégias que possuem as empresas internacionais, que estão olhando esses espaços e vão investir massivamente.

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10 mil, 20 mil hectares. Na Amazônia tem, mas

não chileno. As viñas chilenas tradicionais se

isso seria um problema de biodiversidade, eco-

mantiveram, estão produzindo com 3 ou 4.

lógico, os povos sem contatos e etc., o que seria um problema terrível. Mas se eles perceberem que esse espaço é necessário, eles vão tentar. Então somos salvos por esse lado, mas, de qualquer forma, a tendência está presente. Quem são os empresários das áreas agrícolas? Com certeza capitalista nacionais em parceria com capitalistas estrangeiros. Quem são os que estão investindo em bicombustível? Quem são os que estão investindo nas empresas florestais? Capital japonês.

No Chile, o tema é complexo desde o ponto de vista de investimento do capital. Para mim há dois pontos de vista: um é a água. Se o Chile não solucionar o tema do risco, suas possibilidades de manter a produção agropecuária que chegou hoje em dia são muito escassas. Existe um processo de desertificação no norte que é muito forte. E aí tem um problema muito sério, que é a água. Porque a água nas zonas onde se pode ampliar a agricultura, que é a zona norte, entra em contradição com as mineiras. As mineiras

ALEX BARRIL - No caso do Chile, eu acredito

são as que hoje em dia usam a água e secaram

que seja muito parecido, talvez. Mudaram a di-

os poucos vales que existiam e expulsaram por

mensão das empresas. A reforma agrária deixou uma lição. Não é por boa vontade que eles não estão contra a reforma agrária, que fizeram na ditadura, não houve uma acomodação outra vez da terra e voltou o latifúndio tradicional, que poderia ter sido previsível. Tem uma grande quanti-

essas mesmas vias as comunidades e a população indígena aymara, quéchua. Então, o tema da água, a possibilidade de investir em água está relacionado também com o tema da energia, assim como no sul, onde estão as grandes extensões de terras, bosques e

dade de empresas, quase todas sociedades anô-

etc. Ali os capitais europeus, estrangeiros no ge-

nimas, poucas familiares, que dirigem 4, 5 ou 10,

ral, inclusos chilenos, estão comprando porque

em cadeia, fundo ou unidade produtiva. E aí tem

a potencialidade de fazer hidroelétricas é muito

capital.

grande. E o investimento vai por essa via e não

No Chile, o tema do capital estrangeiro acredito que veio fundamentalmente em hora impor-

pelo tema da agricultura. Então as grandes empresas, sobretudo as espanholas , e consórcios.

tante do ponto de vista, como disse Diego, gre-

E essas coisas que estão acontecendo, por

mial dos produtores. É muito forte em tudo que

exemplo, na Argentina, que de repente aparece

se relaciona com vinicultura. Itália, França, Ale-

um senhor, aparentemente filantropo, compran-

manha, Estados Unidos. E a produção de vinhos

do centenas de milhares de hectares de bosque

é para nichos, portanto não requerem de grandes

no sul e fazendo atividade conservacionista, mas

viñas, de grandes extensões. A tecnologia permi-

tem que ver com o tema de água, questão de

te produzir vinhos de cerca na pré-cordilheira,

recursos. Então esse é um tema da água torna

com irrigação de gotejamento. Viña de capital

mais complexo o caso nos países.

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Uma última colocação que quero fazer diz respeito às semelhanças e diferenças do caso paraguaio. Porque é absolutamente certo que o caso do Paraguai está passando exatamente pelo o que Diego descrevia ao falar da Cuenca del Plata com o processo de estrangerização da terra enorme. E aí, talvez, com muito capital brasileiro pelo tema da soja no caso do Paraguai. Que gera um conflito sério na zona da fronteira. No Paraguai, a população rural ainda é altíssima. Não há discussão, algumas vezes sim, mas tem que se colocar esse tema e discutir a ruralidade para ressaltar a importância que tem no país o rural, o agropecuário. Um país que é estritamente agropecuário. No entanto, ali, o termo campesino quase não é usado, se ofende quando se usa esse termo a nível dos produtores. Ali tem um tema pior, que é o da terra, de como estão transformando toda a zona de pecuária a custa

de um penadeiro florestal. É impressionante a

No Paraguai, a população rural ainda

quantidade de bosques que colocaram em Pa-

é altíssima. Não há discussão, algumas

raguai para fazer terra de pecuária. Contradito-

vezes sim, mas tem que se colocar esse

riamente, onde, por exemplo, a água não é um

tema e discutir a ruralidade para ressaltar

problema. O Paraguai está no Aquífero Guarani, e encima do aquífero Guarani, não tem nenhum problema de água e nem vai ter durante muitos

a importância que tem no país o rural, o agropecuário. Um país que é estritamente

anos, mas pode ser foco de um conflito sobre

agropecuário. No entanto, ali, o termo

água muito forte se isso chegar a produzir. Mas

campesino quase não é usado, se ofende

aí o tema central de Paraguai, por exemplo, é o

quando se usa esse termo a nível dos

tema da transferência de um setor muito próxi-

produtores.

mo na costa da soja e a pecuária que começa a perder espaço, porque tem início o tema florestal como o Uruguai. DIEGO PIÑERO - Eu queria dizer que a definição do rural não é uma questão inocente. A defi-

Alex Barril www.iicaforumdrs.org.br

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A definição do rural, primeiramente, é uma construção social. Não preexiste e isso nós concluímos, a sociedade atua na definição do rural. Portanto, podemos dar distintas definição do rural segundo cada sociedade. E a segunda coisa que sempre a definição do rural vai ser uma arena de conflito, uma arena de luta; conflito e enfrentamento, porque nossas sociedades agrárias não são sociedades onde o conflito não existe. São sociedades, onde o conflito existe e, em alguns casos, muito forte.

Diego Piñero

nição do rural, primeiramente, é uma construção

estamos numa intenção de definir o rural muito

social. Não preexiste e isso nós concluímos, a so-

difícil, porque depende da heterogeneidade dos

ciedade atua na definição do rural. Portanto, po-

países, depende da heterogeneidade da relação

demos dar distintas definição do rural segundo

das forças sociais no interior de cada país e, além

cada sociedade. E a segunda coisa que sempre a

disso, se pretendemos redefinir o rural, estamos

definição do rural vai ser uma arena de conflito,

tocando interesses diversos. E, por isso, em al-

uma arena de luta; conflito e enfrentamento, por-

guns países não há muito interesse em discutir

que nossas sociedades agrárias não são sociedades onde o conflito não existe. São sociedades, onde o conflito existe e, em alguns casos, muito forte.

desde os governos; em rediscutir o tema do rural ou da ruralidade, porque implica em se dispor a discutir a distribuição do poder da sociedade; de como, uma coisa como as políticas públicas, se distribuem ou como se distribuiu o que a socie-

A definição do rural, então, é uma conseqüên-

dade possui. Então, se alguém se propõe a discu-

cia desse conflito e, por sua vez, ajuda a redefi-

tir a ruralidade com o fim de rediscutir a redistri-

nir os termos do conflito. Assim, eu acredito que

buição das políticas públicas, está tocando áreas

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[...] Me parece que, surpreendentemente, tem um processo de valorização do rural que vem desde fora, no sentido que a crise alimentar mundial gerou uma valorização dos espaços rurais, mesmo que seja uma valorização perversa e que não vai beneficiar, digamos, aos campesinos, mas de qualquer maneira, existe um processo de revalorização do rural, dos territórios rurais, das terras, etc.

Luciano Martínez

sensíveis. E, por isso, nem todos os governos es-

seja, a conservação do espaço rural é impor-

tarão dispostos a discutir o tema.

tantíssimo e, por esse lado, tem uma revalori-

LUCIANO MARTÍNEZ - Sim. Eu queria expor outra perspectiva: com tudo isso, me parece que, surpreendentemente, tem um processo de valorização do rural que vem desde fora, no sentido que a crise alimentar mundial gerou uma valorização dos espaços rurais, mesmo que seja uma valorização perversa e que não vai beneficiar, digamos, aos campesinos, mas de qualquer maneira, existe um processo de revalorização do rural, dos territórios rurais, das terras, etc. O campo rural começa a ser visto por outros lados: um, a questão da mudança climática, ou

zação; segundo, por esse processo perverso; e, três, pela crise dos alimentos. Frente a isso, essa revalorização que vem desde fora é uma revalorização mercantil. Como disse Diego isso é, por certo, uma mudança na transformação, na mercantilização global e, em geral, no planeta, dos recursos naturais da terra. Frente ao qual, ai sim, o Estado e, sobretudo, as organizações sociais tem que oferecer uma proposta, porque senão essa transformação vai varrer a sociedade rural; a cultura; a sociedade campesina. Tudo vai ser completamente desalojado por essa força perversa da revalorização que vem de fora. www.iicaforumdrs.org.br

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