Sobre as contribuições do cartel: uma direção para a formação

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Sobre as contribuições do cartel: uma direção para a formação Marcos Muniz de Souza Cartel: A direção do tratamento Mais-um: Silvana Pessoa Participo de um cartel cujo tema é “A direção do tratamento”. O meu tema especificio é “O lugar do analista na direção do tratamento”. Como atendo em ambulatório e consultório, esta se torna uma questão atual para mim. Desde a gestação do cartel percebi que é um dispositivo de estudo bem diferente de tudo que já participei. Num primeiro momento, tivemos um período de “pré-cartel”, onde os participantes se escolheram em torno do tema. Lemos alguns textos-base de Lacan sobre cartel e Escola e encontramos nossa mais-um. Ou seja, foi todo um processo, um tempo de maturação, onde já estávamos trabalhando há meses desde a ideia inicial, para que pudéssemos oficializá-lo perante a Escola. Não é tão simples assim como parece, dizer “vamos montar um cartel...”; precisávamos sentir o compromisso entre nós em aceitarmos uma empreitada de estudo por dois anos, que depende do desejo de cada um para que alcancemos os objetivos – que são particulares, mas que têm em comum o desejo de saber um pouco mais sobre o tema. Não à toa, todos os cartelizantes estão em momentos próximos na relação de cada um com a Psicanálise. Mas enfim, conseguimos. O que tenho entendido em quase 01 ano de trabalho e o que quero destacar aqui, é a contribuição do cartel na minha formação. No início ficava até mesmo incomodado em alguns encontros, pois não avançávamos nos textos que tínhamos nos proposto a ler. Aos poucos, foi ficando claro para mim, que o “avanço” se dá de outro modo, dificil de traduzir em palavras. Várias foram as vezes em que lemos e discutimos pequenos extratos de textos; todavia, bastava uma frase, ou algo que discutíamos no cartel para que me fizesse todo o sentido em relação a alguma questão sobre o lugar do analista na direção do tratamento. Ou seja, não é um grupo de estudos; são pessoas que se unem, através de um desejo de saber com a transferência de trabalho. Buscam o conhecimento e elaboram um saber particular em relação ao tema do cartel. Cada um com o seu tema de interesse e com repercussões distintas. São evitados qualquer tipo de fenômeno de grupo. Não existe o lugar do mestre, do saber absoluto, assim como o funcionamento não é pautado por um discurso universitário, mas sim em uma relação horizontal em que cada um contribui com o que têm para o andamento do cartel. As vezes mais, as vezes menos. Mas é um percurso individual.


Desta forma, o cartel se tornou uma contribuição para minha formação, no âmbito do estudo teórico. A partir dele, voltei a fazer supervisão – o que proporcionou uma excelente tabelinha entre as duas vertentes. O cartel não traz um avanço especificamente através de um programa de leitura de textos e estudos dirigidos mas, sobretudo através da experiência, tal qual como em uma análise, onde um saber particular é construído, mesmo estando com os pares. Seja no aspecto teórico como no clínico. Coincidência ou não mudanças também ocorreram na minha clínica. Algo tem sofrido mutação e se refere especialmente ao lugar do analista na direção do tratamento. Ressonâncias da formação. Freud dizia que para se tornar um analista, tínhamos de analisar nossos próprios sonhos. Lacan reafirmava dizendo que um analista é produto de uma análise. Penso que o cartel vai no mesmo sentido, oferecendo uma base de estudo teórico que vai de encontro com a análise e a supervisão, todas dentro do mesmo campo psicanalítico. A formação em Psicanálise é produção de saber em três esferas. E o saber é uma construção. Seja em análise, seja em supervisão, seja no estudo através de um cartel.


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