Catálogo “ Em Volta do Escuro” de Francisco Palma 2018

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EXPOSIÇÃO DE ARTES PLÁSTICAS DE FRANCISCO PALMA

EM VOLTA DO ESCURO

28 DE ABRIL A 20 DE MAIO 2018

SOLAR DOS ZAGALLOS ALMADA



O título “Em volta do escuro” tem como referência uma frase de um texto “ O que é ser contemporâneo”de Agamben. Esta exposição é uma retrospectiva de trabalhos desenvolvidos entre 2012 e 2018, inclui pintura, desenho, escultura, gravura, fotografia, colagem e instalação e apresenta duas grandes temáticas: a primeira à volta de questões humanas, sociais e políticas que se colocam na actualidade e a segunda acerca das distopias da relação entre o homem, a natureza e os espaços urbanos. Alguns dos trabalhos apresentados remetem para acontecimentos da actualidade, recorrendo com frequência a imagens e textos apropriados de outros autores do cinema, da literatura e da dança, e desenvolvem-se em séries como “Refúgios”, “Desesperança” e “Fausto”. Algumas das obras são realizadas em colaboração com outros artistas, Carlos Ribeiro e Maria Bargado.

Francisco Palma


“ (…) Só pode dizer-se contemporâneo quem não se deixa cegar pelas luzes do século e consegue apreender nelas a parte da sombra, a sua obscuridade íntima. (…)o contemporâneo é aquele que percebe o escuro do seu tempo como qualquer coisa que lhe diz respeito e não pára de o interpelar, qualquer coisa que, mais do que toda a luz, se endereça directa e singularmente a ele.”1 “(…)o contemporâneo não é somente aquele que apercebendo o escuro do presente, capta a sua luz invendável; é também alguém que, dividindo e interpolando o tempo, está em condições de o transformar e de o pôr em relação com os outros tempos, de ler de modo inédito a sua história, de a «citar» segundo uma necessidade que não provém de modo algum do seu arbítrio, mas de uma experiência à qual ele não pode responder.”2

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Giorgio Agamben, “Nudez”, Relógio D´Água Editores, Lisboa, 2009, p.23 Ibid., p.28.


Refúgios 1 - Refúgios I, 2012 2 - Refúgios II, 2012


3 - Silêncio Infinito, 2013

“ Porque tudo está em ruínas. Tudo está arruinado, mas posso dizer que foram eles que arruinaram e degradaram tudo. Porque esse tipo de cataclismo não viria sem uma inocente ajuda humana. Pelo contrário, estou falando da mente humana, da sua capacidade de se julgar a si mesma. É claro que Deus tem uma mão nisso, ou, ouso dizer: tem parte nisso. E, seja qual for a sua parte, é a criação mais horrível que se pode imaginar. Porque, como vê, o mundo foi degradado. Então não importa o que eu digo porque tudo foi degradado assim que foi adquirido, e visto que eles adquiriram tudo de forma sorrateira, insidiosa, eles degradaram tudo. Porque tudo o que eles tocam, e eles tocam tudo, foi degradado. E assim será até ao triunfo final, até ao julgamento final. Adquire, destrói. Destrói, adquire. Posso escolher outras palavras, se quiser: toca, destrói e com isso adquire, ou toca, adquire e então destrói. E tem sido assim há séculos. Sempre, sempre e sempre. Às vezes dissimuladamente, às vezes arrogantemente, às vezes, delicadamente, às vezes violentamente. Mas sempre e sempre. Sempre da mesma forma, como um ataque de ratos numa emboscada. Porque, para a sua vitória perfeita foi importante a colaboração do outro lado. Ou seja, tudo o que é excelente, grande de certa maneira e


nobre não deve participar em qualquer batalha. Não deve haver luta, o simples desaparecimento repentino de um lado, significa o desaparecimento de tudo o que é excelente, grande e nobre. De modo que esses vencedores que atacam de emboscada, agora governam a terra, e não haverá um único canto onde se poderá esconder deles porque tudo em que eles puderem pôr a mão é deles. Até as coisas que pensamos que não podem alcançar, mas eles alcançam, também são deles. Porque o céu pertence-lhes, e todos os nossos sonhos. Deles é o momento, a natureza, o silêncio infinito. Até mesmo a imortalidade é deles. Tudo, tudo está perdido para sempre! E essa multidão de nobres, grande e excelente, permanece lá, se assim me posso expressar. Eles pararam nesse ponto e tiveram que entender, e tiveram que aceitar que não há nem Deus nem Deuses. E o excelente, o grande e o nobre foram obrigados a entender e a aceitar este facto desde o início. Mas é óbvio que eles não foram capazes de entender. Eles acreditaram e aceitaram, mas não conseguiram entender. Permaneceram ali, perplexos, mas não resignados, até que alguma coisa, aquela centelha do cérebro, finalmente os iluminou. E de repente perceberam que não há Deus ou Deuses. De repente eles viram que não há bons ou maus. Então eles viram e entenderam que se isso for verdade, então eles mesmos não são nada. Veja, eu acho que isso pode acontecer no momento em que possamos dizer que eles estão extintos, queimados. Extintos e queimados como o fogo faz ao arder lentamente no prado. Um é sempre o perdedor, o outro é sempre o vencedor. Derrota, vitória, derrota, vitória, e um dia, aqui na vizinhança, fui obrigado aperceber, e percebi, que estava enganado, estava verdadeiramente enganado quando pensei que nunca houve e nem poderia haver nenhuma mudança no futuro. Porque, acredite em mim, agora eu sei, que essas mudanças já ocorreram. Não se importe com isso. Isso é tolice! ”

Texto extraído de uma conversa no filme “Cavalo de Turim” (2011) de Béla Tarr


Desesperança 4 - Desesperança, 2014

Eles querem que eu os olhe. Para olhar a desesperança das coisas...

4 - Desesperança, 2014

Eles querem que essa irreversibilidade das coisas me enlouqueça. Eles querem que eu olhe o esforço desprezível que todos fazem antes de cair Não deixarei que me arrastem. Devemos voltar à beleza. Redescobrir a vida, a alegria das grandes coisas


5 - Confronto, 2015


6 - Queda, 2017 7 - Beleza, 2018


8 –Sem Título, 2015


Fausto 9 - A vergonha, 2015

“Quem comete um erro é excluído; é fechado dentro de uma caixa. Quem está fora vê apenas a caixa. Mas quem está fechado, excluído, consegue ver cá para fora. Vê tudo, vê-nos a todos. Em cada compartimento há dezenas de caixas. Milhares de caixas por todo o lado. A maior parte delas vazia. Outras têm lá dentro pessoas excluídas. Ninguém sabe quais as caixas que têm pessoas. As caixas são tantas que ninguém lhes dá importância. Pode estar lá uma pessoa, até a que amas, mas nem olhas. Já não produzem efeito. Passas por elas centenas de vezes. ”

Gonçalo M. Tavares, in 'Jerusálem'p.128


10 - O Desprezo, 2015 11 - Arrependimento, 2014


12 - Não o Olhe #01, 2016 13 - Não o Olhe #02, 2016


14 - Não o Olhe #03, 2018 15 - Não o Olhe #04, 2018


16 - “Faust”, 2017 17 – “Acabou o medo”, 2018


18 - Num relatório polémico, 2017


Distopias 19 - Distopia#1, Jardim, 2015


" (...) A erva daninha é a Nêmesis dos esforços humanos. Entre todas as existências imaginárias que atribuímos às plantas, aos animais e às estrelas, é talvez a erva daninha aquela que leva a vida mais inteligente. É verdade que a erva nem sequer produz flores nem porta-aviões, nem Sermões na montanha (...). Mas, ao fim e ao cabo, é sempre a erva que tem a última palavra. (...). É o que os historiadores, em geral, chamam as trevas da Idade Média. Não há outra saída senão a erva (...). A erva só existe entre os grandes espaços não cultivados. Preenche os vazios. Cresce entre, e no meio das outras coisas. A flor é bela, a couve é útil, a papoila faz enlouquecer. Mas a erva é profusão, é uma lição de moral” Henry Miller / Henri Fraenkel, Hamlet Corrêa,1956, pp. 48-49 (citado em “Rizoma“ de Deleuze e Guattari, 1976, p.46)

20 - Distopia#3, As Trevas da Idade Média, 2016


21 - Distopia#4, Sementes urbanas, 2015-2018


Imagens: 1- Refúgios I, 2012. Colagem, Carvão e Acrílico sobre tela, 32x24cm 2 - Refúgios I, 2012. Colagem, Carvão e Acrílico sobre tela, 32x24cm 3 - Silêncio Infinito, 2013. Acrílico e Carvão sobre Papel/Tela 120x200cm 4 - Desesperança, 2014. Acrílico, Carvão e Colagem sobre Tela, 120x79cm. Legenda: Eles querem que eu os olhe. Para olhar a desesperança das coisas… 5 - Confronto, 2015. Acrílico, Carvão e Colagem sobre Tela, 81x65cm. Legenda: Eles querem que essa irreversibilidade das coisas me enlouqueça. 6 - Queda, 2017. Acrílico, Carvão e Colagem sobre Tela, 81x65cm. Legenda: Eles querem que eu olhe o esforço desprezível que todos fazem antes de cair. 7 - Beleza, 2018. Acrílico, Carvão e Colagem sobre Tela, 81x65cm. Legenda: Não deixarei que me arrastem. Devemos voltar à beleza. Redescobrir a vida, a alegria das grandes coisas. 8 - Sem Título, 2015. Objeto, Grafite e impressão (Francisco Palma e Carlos Ribeiro). 9 - A vergonha, 2015. Técnica Mista sobre Cartão, 30x31x07cm. 10 - O Desprezo, 2015. Técnica Mista sobre Cartão, 45x30x11cm. 11 - Arrependimento, 2014. Técnica Mista sobre Cartão, 30x30x13cm 12 - Não o Olhe#01, 2016, Carvão e Acrílico sobre Papel sobre Tela, 100x90cm 13 - Não o Olhe#02, 2016, Carvão e Acrílico sobre Papel sobre Tela, 100x90cm 14 - Não o Olhe#03, 2018, Carvão e Acrílico sobre Papel sobre Tela, 100x90cm 15 - Não o Olhe#04, 2018, Carvão e Acrílico sobre Papel sobre Tela, 100x90cm 16 - “Faust”, 2017, Serigrafia sobre papel, 4/6 Ex., 41,7x29,6cm/M, 30x22,3cm 17 – “Acabou o medo”, 2018, Serigrafia sobre papel, 2/5 Ex., 58,2x42cm/M, 34x26,5cm 18 - Num relatório polémico, 2017, Serigrafia sobre papel, 5/7 Ex., 59,5x42cm/M, 37,6x19,6cm 19 - Distopia#1, Jardim, 2015. Instalação: Vídeo (DVD, cor, som, 1´54´´, loop). Espelho, madeira, ramo de árvore, relva sintética, pedras de calcário, pasta de papel e acrílico sobre cartolina, 400x400cm (Francisco Palma e Maria Bargado). 20 - Distopia#3, As Trevas da Idade Média, 2016. Texto e fotografia. 21 - Distopia#4, Sementes urbanas (Jacaranda mimosifolia e Brachychiton populneus), 2015-2018. Instalação: Pasta de Cerâmica e Engobe, Madeira (100x100cm) e Fotografia, 400x400cm.


Biografia/Biography Nasceu em Beja, 1958. É artista plástico e programador cultural, reside e trabalha em Almada. Mestrado em Ciências da Comunicação, variante Cultura Contemporânea e Novas Tecnologias na FCSH da Universidade Nova de Lisboa. Cursos de Desenho e Montagem de Exposições com Paulo Pereira, Artesfera, Barreiro, 2014; Cerâmica Artística, Imargem com José A.Silva, 2014/15; Serigrafia, Imargem com Aurora Bargado, 2012; Especialização Profissional em Gestão de Organizações e Projectos Culturais, Cultideias, Almada, 2011; Gravura em Metal e Litografia com Fernanda Pissaro, Maria Tomás e João Cochofel, 1999-2002, Cooperativa Diferença, Lisboa; Curso de Pintura e Ano Complementar de Ateliê, com Jaime Silva e Mário Rita, e Temas de Estética e História de Arte, com Cristina Azevedo Tavares e Cristina Veiga Simão, 1989-1991 na SNBA. Exposições/Exhibitions (selecção/selected ): 2016 - Exposição I Bienal de Desenho de Almada, Solar dos Zagallos-Almada; 2014 - Fluxos Marginais- dar “espaço” ao olhar, Galeria Fabrica Braço de Prata, Lisboa; 2012 - Noutros Lugares, Artesfera, Barreiro; Deslocalizações, Cooperativa Cultural Barreiro; 2009 – Pluralidades (Oficina de Cultura) e Anual Imargem (Galeria Municipal de Arte), Almada (desde 2009); 2003 - Colectiva, Galeria Santiago, Palmela; 2002 - Retrospectiva, Fórum Castro Verde (Indiv.); Grupo Venham+5 , Barreiro, Moura, Aljustrel e C.Verde; 2001 - Pintura, Galeria Municipal Corroios (Indiv.); 1999 - Conflictus, Galeria Iosephus, Lisboa; “Creative Dialogues, Castel; Mojmírovce/ Bratislava - Eslováquia; Galeria Fluxus, Bratislava; Coleurs Dóeillets”, Hall du Salon d´Honneur de – l´Hôtel de Ville, Bobigny, França; 1997 - Fragmentos do Corpo, Galeria Trindade, Lisboa (Indiv.); Salão Internacional de Arte “Asyl der Kunst” Hauslingen / Alemanha;


1996 - Grupo 13 – Oficina de Cultura, Almada; 24 Pintores na Casa da Imprensa, Lisboa; Ciclo do Fatalismo, Galeria Gymnásio, Lisboa (Indiv.); 1995 - Bienal de Artes do Sabugal/Cuidad Rodrigo; VIII,IX Bienal Internacional de Arte de Cerveira, V.N. Cerveira (1995/1997); 1994 - Galeria Óptica do Conde Redondo, Lisboa; Prémio Bienal de Desenho “Américo Marinho“ Barreiro (1994-2000); 1993 - Bienal Festa do Avante (desde 1993); II e IV Prémio Vespeira , Montijo (199399); Salão Anual e Exposições Artesfera, Barreiro (1993-2015); 1993 - Salão “O PAPEL” S.N.B.A-Lisboa; 1992 - Refluxos, Centro Cultural Emmérico Nunes, Sines (Indiv.); 1991 - Corpos, Circulo Cultural de Setúbal (indiv.); Câmara Cultural de Stara Zagora/ Bulgária; 1989 - Colectiva, Galeria Municipal Almada.


Exposição de Francisco Palma /Francisco Palma exhibition Exposição: Organização: Câmara Municipal de Almada e Francisco Palma Título: Em Volta do Escuro Local: Solar dos Zagallos – Almada Design e Montagem: Francisco Palma Data da Exposição: 28 de Abril a 8 de Maio de 2018 Catálogo: Arranjo Gráfico e Fotografia: Francisco Palma Arranjo Gráfico Capa e Contracapa: Designer Gráfico da CMA Agradecimentos: À direcção, coordenação e colaboradores do Solar dos Zagallos (António Nabiça, Miguel Vargas e Clara Rainho), à colaboração de Carlos Ribeiro e Maria Bargado.




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