Voz Própria nº 20-21

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A grave crise económica em que está inserido o capitalismo a escala global está afectando gravemente as condiçons de vida da imensa maioria social que conformamos o povo trabalhador galego. O aumento de preços nos produtos alimentares básicos, nos combustíveis e na energia, assim como nas hipotecas, está a bater com força na classe trabalhadora, basicamente os sectores mais fracos: pensionistas, mulheres, imigrantes e juventude.

Embora o regime instrumentalize os sucessos desportivos para anestesiar as massas e ganhar tempo a paulatina deterioraçom das condiçons de vida provocará inexoravelmente umha resposta popular. Sem lugar a dúvidas, aí estaremos e coincidiremos com todo o mundo que optar por combater Espanha e o Capital.

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reportagem

Audiência Nacional confirma perseguiçom política contra a esquerda independentista galega

análise

Que os ricos paguem a crise Análise dos resultados eleitorais de 9 de Março Autonómicas 2009 Pág. 6

A Ilegitimidade da democracia espanhola

dossier

Cada dia, torna-se mais difícil chegar a fim de mês, porque os preços nom param de subir enquanto os salários continuam congelados. Mas a burguesia nom pára de experimentar o aumento das suas taxas de lucro. A concentraçom de capital em poucas mao, a especulaçom, as políticas governamentais em matéria impositiva estám a fazer os ricos mais ricos. Mas nom se conformam com isto. Pretendem que lhes paguemos integralmente a sua crise; daí que apostem em aplicar condiçons de trabalho decimonónicas. A solicitude de prolongar a jornada laboral semanal até as 65 horas, realizada pola Uniom Europeia, fai parte desta ofensiva estratégica do Capital contra o Trabalho. Mas enquanto o governo espanhol de Zapatero considera opinável a existência da crise, enquanto a Junta do PSOEBNG governa para o grande capital autóctone e transnacional, o sindicalismo opta por renunciar a defender os interesses operários e populares. O aumento do desemprego, da precariedade laboral, da emigraçom, da pobreza e exclusom social, a perda de poder aquisitivo, a privatizaçom dos serviços públicos, a ausência de oportunidades e futuro para a juventude, as enormes dificuldades por que atravessam pensionistas e reformad@s fai necessária umha ofensiva de classe. Há condiçons objectivas suficientes para avançar na configuraçom de um amplo movimento social contra as políticas do governo autonómico e espanhol, contra a Europa do Capital que incorpore e globalize num programa comum de luita a diversidade das demandas e reivindicaçons populares. Mas todo aponta para umha timorata resposta sindical. A CIG acabou de anunciar um morna e administrativa resposta para depois do Verao, renunciando assim a vertebrar e transformar o mal-estar individual em luita colectiva. Umha parte da direcçom, hipotecada com o regionalismo, impossibilita avançar na perspectiva de umha greve geral e outras medidas de luita que forcem umha mudança de rumo das políticas socioeconómicas neoliberais. A dependência nacional que padecemos nom se pode desligar da actual crise, na hora da elaboraçom do programa de luita. Porém, a casta sindical empoleirada na direcçom está mais preocupada em nom afectar os resultados das eleiçons autonómicas, em conservar os seus particulares privilégios burocráticos, do que em defender os interesses operários e populares.

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entrevista

Três anos depois da derrota eleitoral do fraguismo, nengumha das grandes promessas do governinho PSOE-BNG tem sido cumprida. A situaçom socioeconómica da Galiza nom tem melhorado, a recuperaçom da nossa identidade nacional nom tem avançado, e as condiçons de vida da classe trabalhadora tam só tenhem retrocedido. A política da actual Junta da Galiza é umha monumental fraude em que já quase ninguém deposita as mínimas esperanças. A crise estatal interna do PP tem contribuido para manter fora de jogo a direita conservadora, quando ainda nom se tinha recuperado da perda de Sam Caetano, favorecendo assim o continuísmo político de Tourinho-Quintana. A ausência de umha alternativa de esquerda e soberanista com projecçom de massas, que gere ilusom entre amplos sectores populares, dificulta enormemente a convergência das luitas populares, em constante ascenso no último ano. Sem a vertebraçom de um diverso e plural espaço sociopolítico abragente da diversidade ideológica e das experiências militantes que definem hoje o conjunto da esquerda independentista e soberanista, a Galiza e a su maioria social continuarám indefesas perante a permanente ofensiva de Espanha e do Capital. Umha candidatura unitária para as eleiçons autonómicas da Primavera de 2009 teria sido umha boa oportunidade para inverter umha situaçom que se arrasta injustificadamente desde há excessivo tempo. Mas, novamente, mesquinhos interesses partidários e estratégias que desprezam a luita de massas impossibilitárom um objectivo que, sem lugar a dúvidas, teria sido referendado com sucesso nas urnas, possibilitando a abertura de um novo ciclo na luita de libertaçom nacional e social de género da Galiza. NÓS-UP fijo o possível na procura de um acordo. O conjunto das entidades e activistas sociais que coincidem connosco neste diagnóstico assim o podem confirmar. Para facilitar o acordo, exprimimos disposiçom em flexibilizar posiçons estratégicas. Mas as propostas que fomos propondo ao longo da Primavera caírom em saco furado. Novamente, tal como em 2005, estamos isentos de qualquer responsabilidade pola divisom eleitoral da esquerda independentista.

Voz Própria entrevista Igor Lugris, membro de Fala Ceive

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Francisco Martins Rodrigues, sempre connosco FARC-EP Constituida Associaçom solidária Galiza Venezuela Pág. 36

internacional

editorial


reportagem análise

reportagem

Audiência Nacional confirma perseguiçom política contra a esquerda independentista galega

Audiência Nacional

NÓS-Unidade Popular acompanhou e apoio em Madrid os quatro activistas acusados de queimar figura do rei espanhol, fazendo pública a frontal oposiçom galega à perseguiçom judicial das ideias soberanistas e republicanas. Fôrom umhas três horas de animada e colorida concentraçom, a partir da entrada dos quatro vizinhos do Condado, acompanhados polo advogado da nossa organizaçom, para serem interrogados polo juiz instrutor, Fernando GrandeMarlaska. Concentraçom solidária Às mais de 50 pessoas deslocadas de diferentes pontos da Galiza, somáromse em frente do edifício da Audiência Nacional (antigo Tribunal de Ordem Pública franquista) companheiros e companheiras de organizaçons solidárias da esquerda madrilena, entre elas Nines Maestro, da Corriente Roja, o sociólogo Agustín Morán, do Centro de Asesoría y Estudios Sociales (CAES), o professor Carlos Taibo, velho amigo da esquerda independentista galega, e membros da direcçom madrilena de Izquierda Castellana. Contodo, a presença mais ovacionada foi a de Pepita Seoane, mae de Carlos Cela Seoane, activista do SRI detido na Corunha, sob umha arbitrária acusaçom de ‘terrorismo’ e ainda permanece em prisom. Pepita recebeu o afecto das pessoas concentradas, permanecendo toda a manhá junto ao resto de pessoas mobilizadas. Ao todo, concentrárom-se umhas 80 pessoas, mas a polícia espanhola, que rodeou a concentraçom em todo o momento, impediu que o situassem na parte frontal do edifício, conduzindo-as

para as traseiras da sede judicial, onde despregárom umha faixa de 12 metros de comprimento com a legenda “Galiza nom tem rei: Avante a República Galega. Santi, Alex, Cris, Carlos Solidariedade”. Durante esse tempo, as numerosas pessoas que passavam polas ruas centrais onde se localiza a Audiência Nacional observárom as numerosas bandeiras da Galiza, junto algumhas castelhanas, da República espanhola, vermelhas e feministas. Entre as legendas mais coreadas polas pessoas concentradas, salientárom as de solidariedade com os acusados, e outras como “Liberdade para os povos”, “A Audiência Nacional nom nos calará”, “A repressom nom é a soluçom”, “A soluçom: autodeterminaçom”, “Nem príncipe, nem rei: República Galega”. Declaraçom em galego, liberdade e imputaçom aos quatro independentistas As declaraçons dos quatro acusados fôrom feitas em galego, contando com um intérprete em todo o momento. Quase à umha da tarde ficárom livres, após lhes ter sido comunicada a imputaçom colectiva, apesar de só um deles reconhecer ter queimado o boneco que representava o chefe do Estado monárquico espanhol no dia 6 de Dezembro, em Vigo. O magistrado interpreta no auto de imputaçom, de oito páginas, que os quatro participárom activamente ou “dando cobertura” umha acçom que considera um “delito de injúrias graves à Sua Majestade o Rei de Espanha” (sic). Daí que translade ao procurador do Estado as diligências prévias para que num prazo de dez dias “formule escrito de acusaçom solicitando a abertura do julgamento oral”.

O advogado dos quatro companheiros recorreu a decisom, considerando que nom há base para umha imputaçom de todos os denunciados pola polícia espanhola em Vigo, existindo só base racional para a imputaçom do militante autoinculpado por umha acçom que, de qualquer maneira, nengum Estado verdadeiramente democrático consideraria delictiva. Expectaçom mediática e reafirmaçom soberanista e republicana À saída dos acusados, as pessoas concentradas aplaudírom a firmeza dos quatro independentistas perante as pressons judiciais num caso de puro exercício do direito à livre expressom política. A comparência criou umha importante expectaçom mediática, com presença de reporteiros da maioria dos meios televisivos e impressos espanhóis, bem como da Televisom e a Rádio galegas. Os companheiros Maurício Castro, porta-voz nacional de NÓS-UP, e Alexandre Bolívar, o acusado que assumiu a queima do boneco monárquico, oferecêrom declaraçons reafirmando

a legitimidade da acçom simbólica do passado dia 6 de Dezembro, e denunciando a arbitrariedade de tentar condenar os quatro companheiros, quando nas declaraçons deles ficou claro que só um deles participou numha acçom simbólica aplaudida polas várias centenas de participantes na manifestaçom autodeterminista de Vigo. Maurício Castro agradeceu a importante solidariedade da esquerda social e política madrilena com a causa autodeterminista e republicana galega, sublinhando que som iniciativas solidárias concretas como essa as que podem alicerçar a necessária irmandade entre os respectivos povos para conquistar os direitos das maiorias sociais e a soberania das naçons sem Estado peninsulares. A concentraçom concluiu com o canto do nosso Hino Nacional.


Manipulaçom mediática e actuaçons ilegais do El País Mais umha vez, umha das agências que cobrírom a notícia espalhou umha informaçom falsa sobre a declaraçom dos companheiros, atribuindo-lhes umha suposta ‘argumentaçom’ contra a monarquia com base na transmissom da SIDA no interior da família real. Absurdas palavras que nunca fôrom pronunciadas polos nossos companheiros, totalmente solidários com a causa da luita social pola erradicaçom dessa doença e pola dignidade das pessoas afectadas pola mesma. A nossa organizaçom tivo que dirigir-se à Agência EFE para exigir umha imediata rectificaçom dessa mentira, para evitar a desnaturalizaçom de umha justa reivindicaçom democrática do nosso povo.

Audiência Nacional

Por outra parte, o jornal El País voltou a mostrar a sua privilegiada posiçom de poder, ao publicar integralmente no seu web, aos poucos minutos, o auto emitido polo juiz instrutor, o que apesar de ser umha prática ilegal continua a ser habitual em temas relacionados com supostos delitos de natureza política. NÓS-Unidade Popular quer agradecer a solidariedade recebida durante as últimas semanas e encorajar o movimento popular a continuar a suster as necessárias luitas sociais e políticas em favor dos direitos nacionais galegos e os interesses do nosso povo trabalhador.

Grande-Marlaska viu-se forçado a rectificar a denominaçom de ‘dialecto gallego’ ao idioma co-oficial da Galiza NÓS-Unidade Popular deu a conhecer à sociedade galega um documento que ilustra a consideraçom que o nosso idioma merece ao magistrado da Audiência Nacional espanhola Fernando Grande-Marlaska Gómez. Numha providência emitida polo referido juiz no passado dia 28 de Janeiro, em resposta ao pedido de um intérprete por parte da defesa dos quatro acusados de queimar a figura em madeira do rei de Espanha, Grande-Marlaska afirmou literalmente que “en lo referente a [la] petición de designación de intérprete de dialecto gallego, ya se instó en su día por este juzgado de la Empresa encargada”. É importante sublinhar que nom se trata de um texto informal que pudesse admitir um descuido ou lapsus linguae. Estamos diante de um documento judicial de tipo formal, emitido polo Julgado Central de Instruçom nº 3 da Audiência Nacional, que opta por um tratamento denigrante e de claro desprezo para um dos idiomas co-oficiais numha das Comunidades Autónomas que actualmente formam o Estado espanhol. Em nossa opiniom, que um organismo judicial como a Audiência Nacional e um juiz como Fernando Grande-Marlaska se dem ao luxo de desprezar abertamente o idioma

da Galiza é um facto relevante que deve ser conhecido pola sociedade galega e polas instituiçons da Comunidade Autónoma da Galiza. Mas é também necessário que se produza um pronunciamento dos máximos responsáveis da Junta da Galiza, o presidente Emilio Peres Tourinho e o vice-presidente Anxo Quintana. Para NÓS-Unidade Popular, esse desprezo judicial ao nosso idioma constitui mais um indício do carácter reaccionário e anacrónico da Audiência Nacional, organismo judicial continuador do Tribunal de Ordem Pública franquista. Mais um motivo para novamente exigirmos a sua desapariçom. NÓS-Unidade Popular tem demonstrado na sua curta existência que a resignaçom nom é um dos seus sinais de identidade. A nossa teimosia em exercer os nossos direitos colectivos como galegos e galegas é umha constante da nossa actividade política, a nível de organizaçom e individualmente por parte da nossa militáncia. A rectificaçom do desprezo com que o magistrado da Audiência Nacional tratou o nosso idioma é umha mostra de que a perseverança e a denúncia constantes dam os seus frutos. Este, por pequeno que seja, implica umha rectificaçom oficial de um juiz, perante o eco que conseguimos dar ao seu atrevimento, que escandalizou sectores importantes da sociedade galega.

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Queremos, neste senso, agradecer a difusom da nossa denúncia pública a meios de comunicaçom como Vieiros e Gznacion, e a entidades sociais como o Observatório para a Defesa dos Direitos e Liberdades ‘Esculca’ e a Associaçom Galega da Língua (AGAL). Ao invés, queremos sublinhar o sepulcral silêncio de outras entidades às quais nos dirigimos para solicitar iniciativas que nom se produzírom, nomeadamente a Mesa pola Normalización Lingüística e o Movimento polos Direitos Civis. Também é bem eloqüente o silêncio da Junta da Galiza e dos seus máximos representantes, o presidente Emilio Peres Tourinho e o vice-presidente, Anxo Quintana, bem como dos respectivos partidos, o PSOE e o BNG. Todos eles parecem mais interessados em pedir-nos o voto do que em representar com dignidade o nosso povo perante os ataques aos seus sinais de identidade.

Chegárom antes as “sérias desculpas” de Grande-Marlaska, substituindo formalmente a denominaçom de “dialecto gallego” pola de “lengua o idioma gallego”, que as respostas de entidades e instituiçons supostamente defensoras da nossa dignidade lingüística e nacional. Triste realidade a de umha autonomia que nom serve aos interesses da sociedade a quem se deve.

Apresentado recurso contra a imputaçom dos quatro companheiros acusados de ‘injúrias graves à Coroa’ A defesa dos quatro companheiros acusados de ‘injúrias gravés à Coroa’

polo juiz Grande-Marlaska após terem declarado na Audiência Nacional no

passado dia 29 de Janeiro, apresentou a inícios de Fevereiro um recurso pedindo o arquivamento da causa. Para tal, a defesa de Alexandre, Carlos, Santiago e Cristofer argumenta que o acto de queima simbólica de um boneco que representava o monarca espanhol foi só umha expressom de crítica política, à qual está exposta, pola sua condiçom pública, o chefe do Estado. Também som postas de manifesto várias contradiçons com que se pretende forçar umha suposta participaçom dos quatro acusados, quando na realidade só um deles reconheceu tê-lo feito.

sentença contra os quatro acusados, e especialmente para os três que claramente nom participárom na queima do boneco. De NÓS-Unidade Popular esperamos que finalmente prevaleça algum critério democrático no caso e os quatro companheiros fiquem livres de qualquer pena em relaçom ao exercício de um direito fundamental como é o de livre expressom.

De maneira razoada, o recurso solicita descartar qualquer sançom ou


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Que os ricos paguem a crise

Que os ricos paguem a crise Basta de incremento de preços

A classe trabalhadora leva mais de umha década perdendo poder aquisitivo, conquistas e direitos laborais, assistindo ao sistemático corte das liberdades fundamentais. Porém, nos ultimos anos, este processo característico das políticas neoliberais aplicadas polos governos espanhóis do PP e PSOE –mas também pola Junta autonómica do PSOE-BNG– tem provocado um importante aumento da carestia da vida, com a congelaçom salarial e a subida de produtos básicos da alimentaçom, energia e transportes. Cada vez custa mais chegar a fim de mês, cada vez os salários e as pensons de miséria tenhem menos valor, cada vez se podem comprar menos cousas com idêntico dinheiro polo imparável aumento da inflaçom. Leite, pam, fruta, carne, combustíveis, gás, electricidade, etc, nom param de aumentar semana após semana, tornando cada dia mais difícil a vida da imensa maioria social galega que configuramos o povo trabalhador. Som reformados, juventude, trabalhadoras e trabalhadores em precário, desempregad@s que padecem com maior intensidade os efeitos da crise e recensom económica. Porém, os ricos cada vez som mais ricos, amassam mais e maiores fortunas. Bancos, indústrias, grandes empresas de serviços privatizados, anunciam ano após ano maiores benefícios. Sem pudor e com absoluta impunidade, a burguesia nom oculta os seus obscenos lucros à custa de sobreexplorar a classe obreira e restringir conquistas e direitos laborais. As reformas laborais permanentes pactuadas com o corrupto sindicalismo espanhol e apoiadas de forma praticamente unánime pola corrupta e cleptocrática casta que hegemoniza a política institucional som conseqüência dos acordos que reformárom o franquismo nesta pseudodemocracia,

mas também pola ausência de representaçom política de classe. Convém lembrar que umha das primeiras medidas aprovadas polo conjunto dos deputados e deputadas do parlamentinho autonómico em Março de 2006 foi aumentar o seus milionários salários, atingindo ordenados mínimos superiores aos 4.000€ por mês. Posteriormente, no final do Verao do ano passado, PP, PSOE e BNG acordárom mudar a legislaçom da funçom pública, concedendo umha retribuiçom vitalícia de 15.000€ para todos aqueles/ as funcionári@s que tenham ocupado cargos na Administraçom autonómica. Isto significa mais de mil euros por mês, enquanto as estatísticas oficiais constatam que som mais de 700 mil as galegas e galegos com rendimentos inferiores a 600€ mensais, e que o salário médio da Galiza é inferior ao do ano 2000, com os ordenados mai baixos do Estado. Tourinho ganha mais de 80 mil euros por ano e Quintana acima dos 71 mil dos Conselheir@s. Mas altos funcionários do regime como a presidenta do parlamentinho superam os 110 mil euros, os conselheiros da CRTVG cerca de 120 mil. E assim um longo et cétera. Eis a realidade! A casta política profissional, independentemente da sigla e da retórica –PP, PSOE, BNG e IU– defende interesses similares, enriquece-se e obtém enormes privilégios à custa do povo trabalhador, legislando para Amáncio Ortega, Manuel Jove, Tojeiro ou Carmela Arias.

Som horas de mudarmos esta situaçom. É necessário deter a voracidade ilimitada da burguesia. O patronato só pode ser freado mediante a luita unitária e organizada da nossa classe. As trabalhadoras e trabalhadores galegos, o conjunto dos sectores populares, nom podemos continuar impassíveis e ancorados na resignaçom paralisante. Há que mobilizar-se, protestar, reivindicar, exigir responsabilidades. Há que participar activamente nas luitas das empresas e centros de trabalho, implicar-se nelas, evitar que sejam instrumentalizadas polas burocracias sindicais para favorecer interesses políticos espúreos. É preocupante o grau de dependência de umha parte da dirigência sindical galega em relaçom a directrizes partidárias alheias aos interesses da nossa classe e à imensa maioria dos filiados e filiadas da CIG.

De NÓS-Unidade Popular, temos claro que a única saída para a crise é a autoorganizaçom obreira e popular, para enfrentar de maneira unitária as políticas neoliberais, respondendo a cada agressom com mais autoorganizaçom e mais luita. Luita sindical e política, à margem de qualquer dependência dos centros de poder do sistema, tanto dos patronais como dos partidários.


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Análise eleitoral

Análise dos resultados eleitorais de 9 de Março Todo continua praticamente na mesma. Assim podemos definir os resultados eleitorais de 9 de Março na Comunidade Autónoma da Galiza, onde a polarizaçom bipartidarista é umha realidade consolidada, mas continua a ser imperfeita. Embora globalmente perdam quase 100 mil votos, as forças espanholistas continuam a ser esmagadoramente hegemónicas. O PP sofre umha perda de 90 mil votos e o PSOE tam só recolhe 3.500 mais. Os apoios eleitorais do regionalismo nom sofrem variaçons. O BNG, face às optimistas declaraçons de Quintana, tam só logra frear a tendência baseada na sua paulatina perda de votos iniciada com a mudança de século. Nesta ocasiom, congela o apoio de 2004, atingindo só 360 votos mais, mantendo os dous deputados. IU perde umha quarta parte dos votos atingidos em 2004, frustrando a tendência alcista das municipais de Maio passado. Quiçá um dos aspectos mais destacáveis seja a queda da abstençom, que passa de 29.03% a 24.59%, ligeiramente inferior à média estatal, no que sem lugar a dúvidas é um novo fenómeno que altera umha das características específicas dos processos eleitorais galegos. Isto confirma que umha boa parte deste abstencionismo é ideológico, deriva desses plurais e heterogéneos sectores sociais que enquadrados em parámetros de esquerda e progressistas optam conscientemente por nom participar no circo eleitoral. A ausência de candidaturas de esquerda independentista pola primeira vez na história da democracia espanhola contribuiu para que boa parte de um

sector social –minoritário, mas com grande dinamismo social– opte por nom depositar na urna o seu voto, fugindo da (i)lógica do “mal menor” tam arreigada entre amplos sectores da esquerda social. Porém, tampouco devemos desconsiderar que o apelo à abstençom que a maioria das forças independentistas galegas fijo nom tivo repercussom pública, ao nom participarmos activamente na campanha. O PP, fora do governo autonómico, sofre umha suave hemorragia eleitoral, mas as duas forças que gerem Sam Caetano som incapazes de capitalizar eleitoralmente o controlo dos recursos do poder. Há um intercámbio eleitoral entre PP e PSOE, PSOE e BNG, e mesmo entre PP e BNG. O regionalismo incrementa o voto rural, baixando nas cidades e núcleos urbanos, e confirmando as mudanças internas no que era a sua tradicional base social. Menos voto operário e juvenil e mais voto cativo das redes clientelares tecidas a partir das Conselharias de Serviços Sociais, Meio Rural e, em menor medida, de Indústria. A escala estatal, nem o PP nem o PSOE logram os seus objectivos. Rajoi, embora melhore os resultados de 2004 com 400 mil votos mais, traduzidos no incremento de 5 deputados, nom consegue ser a força política mais votada e afastar o PSOE da Moncloa. O PSOE também melhora os resultados de há quatro anos com 40 mil votos mais, mas sem atingir a tam sonhada maioria absoluta do felipismo. Sem lugar a dúvidas, umha das conseqüências mais destacadas foi a concentraçom do voto sociolgicamente progressista, tal como já conseguira em 2004, mas nesta ocasiom com

um resultado político superior, ao fagocitar as duas forças políticas que na primeira metade da legislatura lhe emprestárom a maioria parlamentar de que carecia. O devacle de ERC, que passa de 8 a 3, deputados perdendo 355 mil votos, de IU que fica também sem grupo próprio, passando a contar com só 2 representantes após a fuga de 320 mil votos para o PSOE, e da CHA que perde 60% dos votos perdendo o seu deputado, é fruto da política colaboracionista e da perda de perfil próprio IU. Este fenómeno também explica a queda do regionalismo canário. Esta situaçom confirma que no conjunto do Estado espanhol o bipartidarismo se vai afiançado tal como o sistema leva três décadas tentando impor. No País Basco, a forte queda eleitoral do PNB. perdendo 117 mil votos, de EA, com 30 mil menos ficando sem representaçom, a fuga de 52 mil em IU, assim como a suave queda do PP com 9 mil menos, mas também de Aralar, que fica sem umha quarta parte, contrasta com o incremento eleitoral do PSOE, que sobe 86 mil nas Bascongadas, beneficiando-se dessa concentraçom de votos à custa das forças reformistas. A ilegalizada e reprimida esquerda abertzale consegue novamente confirmar a solidez e fidelidade da sua disciplinada base social. O incremento em dez pontos da abstençom nas CAB e de 3 em Nafarroa traduzem-se em 185 mil votos abstencionistas seguindo o apelo realizado polas diversas organizaçons da esquerda independentista e socialista basca. NÓS-Unidade Popular congratula-se de que na CAG mais de 568 mil galegas e galegos optássemos novamente

por nom participar neste processo eleitoral, superando as enormes pressons sobre a necessidade de optar polo mal menor para evitar que o PP ganhasse as eleiçons. Tal como já manifestamos no início da campanha eleitoral, ganhasse quem ganhasse as eleiçons nom iam provocar mudanças substanciais na vida do povo trabalhador e no futuro da Naçom Galega. PSOE e PP representam interesses semelhantes, som projectos similares. Para evitarmos mais retrocessos nas condiçons de vida, na perda de direitos e liberdades, para garantir o exercício do direito de autodeterminaçom que permita superarmos a condena à morte do nosso projecto nacional, só há umha via possível e plausível: a luita unitária e organizada. Eis o caminho. Depositar expectativas e confiança na soluçom destes problemas na aritmética parlamentar é simples superstiçom, é puro fetichismo. Porém, NÓS-UP considera urgente e necessário que o conjunto do soberanismo de esquerda deste país busque as fórmulas mais acaídas para lograr que nas eleiçons autonómicas de 2009 os cada vez mais amplos sectores sociais que nom nos sentimos representados polo regionalismo nem polas variantes do reformismo espanholista, e que consideramos que nom se deve infravalorizar a importáncia da representaçom política, apresentemos candidaturas unitárias sem nengum tipo de exclusons com base num programa de mínimos aberto.

Direcçom Nacional de NÓS-Unidade Popular Galiza, 11 de Março de 2008


análise análise

Eleiçons Autonómicas

Praticamente três anos após a chegada do PSOE-BNG ao governo da Comunidade Autónoma Galega, nom se cumprírom as promessas de abertura de um novo ciclo político caracterizado por mudanças substanciais frente à nefasta etapa do fraguismo. As condiçons de vida da imensa maioria da populaçom piorárom, os direitos nacionais da Galiza nom experimentárom o mais mínimo avanço, os direitos e liberdades democráticas continuam estagnados e as formas e estilos de governar som semelhantes aos que o PP aplicou durante dezasseis anos. Sectores populares que tinham apostado com entusiasmo na mudança abandonárom as esperanças, abraçando o cepticismo e a frustraçom nestes quase três anos de continuísmo. Porém, contingentes da classe trabalhadora e das populaçons afectadas polas políticas neoliberais e regionalistas da Junta da Galiza tenhem, de forma progressiva, manifestado com mobilizaçons sociais e protestos a necessidade de forçar umha mudança de rumo. O movimento social contra a destruiçom do território, contra a especulaçom urbanística, contra os selvagens planos de infraestruturas e as irracionais estratégias energéticas mostrou sem eufemismos a existência de um

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Autonómicas 2009

Nom foi possível acordo para candidatura unitária da esquerda soberanista amplo mal-estar social superador da resignaçom paralisante. Amplos sectores sociais enquadrados em parámetros de esquerda, que consideramos que umha parte substancial dos problemas da Naçom Galega só podem ser resolvidos mediante o exercício do direito de autodeterminaçom, vimos defendendo umha candidatura integradora e unitária de toda a esquerda nacional sob um programa de mínimos. Consideramos que existem condiçons suficientes para fazer realidade o anseio de importantes sectores da classe trabalhadora organizada, da juventude e dos movimentos sociais. Por todos estes motivos, NÓS-UP manifestou a inícios da Primavera, tal como acordou na IV Assembleia Nacional realizada em Dezembro de 2007, a sua disponibilidade para avançar nesta direcçom com plena disposiçom a contribuir para o sucesso desta necessidade histórica: recuperar a esperança, dar voz aos movimentos sociais, regenerar a política de esquerda, incorporar o direito de autodeterminaçom no centro de gravidade da acçom política galega, ajudar a quebrar a hegemonia dos clónicos projectos políticos que hoje ocupam em exclusiva a política institucional do nosso país.

NÓS-UP manifestou disposiçom para renunciar a apresentar candidatura própria nas eleiçons de 2009, se o conjunto da esquerda nacional da Galiza se mostrasse disposta para concorrer sob umha mesma candidatura superadora da fragmentaçom. Reuniom multilateral para estudar a configuraçom da candidatura unitária, soberanista e de esquerda A 13 de Maio, NÓS-Unidade Popular enviou umha carta a todas as entidades políticas situadas em posiçons autodeterministas e anticapitalistas: FPG, Espaço Irmandinho, PCPG, Corrente Vermella, Colectivo Nacionalista de Marim (CNM) e as correntes soberanistas ainda integradas no BNG. Esta iniciativa, na qual de partida renunciamos a qualquer protagonismo, foi acompanhada de umha reuniom aberta, em regime de autoconvocatória, realizada a 11 de Julho, com as organizaçons e pessoas interessadas numha candidatura unitária. Tam só Corrente Vermelha, PCPG e activistas sociais a título particular respondêrom positivamente ao que é umha demanda amplamente sentida polos sectores sociais galegos mais comprometidos com a necessária mudança nas políticas institucionais num sentido verdadeiramente de esquerda e soberanista. A pesar de NÓS-Unidade Popular ter

garantido, como parte da sua proposta, que chegado o momento nom poria sobre a mesa nengum obstáculo infranqueável, nem mais condiçons que aquelas que unem as entidades a que se dirige: o carácter soberanista, anticapitalista e antipatriarcal da alternativa unitária a articular, nom foi possível avançar nesta direcçom pola falta de resposta da FPG e do CNM, e a negativa explícita de Espaço Irmandinho. Por este motivo, mantendo as portas abertas a qualquer proposta alicerçada na direcçom unitária que puder ser apresentada nos meses próximos, NÓS-Unidade popular anuncia que se vê obrigada a participar com candidatura própria às eleiçons autonómicas de 2009. Embora nom tenha sido possível umha candidatura aberta e plural da esquerda soberanista galega, evitando-se por fim a dispersom das forças verdadeiramente comprometidas com os interesses da maioria do povo galego, NÓSUnidade Popular nom cessará na sua firme determinaçom de lograr espaços polítcos de confluência.


Nesta ocasiom, o dossier do Voz Própria analisa o processo político que reformou o franquismo na actual democracia burguesa espanhola. Seis trabalhos abordam diferentes aspectos de um dos episódios mais mitificados e, portanto, mais desconhecidos, da nossa história mais recente. O primeiro texto realiza umha aproximaçom genérica e integral de aquilo que, sem lugar a dúvidas, é umha das mais elaboradas e eficazes fábulas da história contemporánea. Seguidamente, debulhamse as mais importantes falácias e fetiches de “umha farsa bem elaborada”. A continuaçom, aborda-se como a descentralizaçom administrativa do Estado autonómico nega o direito de autodeterminaçom, assim como a ilegitimidade das instituiçons espanholas na Galiza. O quinto texto analisa a posiçom do soberanismo galego neste processo. A crítica aos Pactos da Moncloa, o acordo socioeconómico paralelo ao prévio pacto político, antecede o último trabalho que analisa os mitos e falácias do 23F.

A ilegitimidade da democracia espanhola

DOSSIER CENTRAL

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Dia da

O processo político de tránsito do autoritarismo franquista à actual democracia burguesa espanhola, popularmente conhecido como Transiçom, é sem lugar a dúvidas umha das mais elaboradas e eficaces fábulas da nossa recente história contemporánea. O franquismo construído sobre o holocausto galego que ceifou entre 1936 e a década seguinte mais de dez mil vidas na selvagem repressom contra o movimento operário e popular, liquidando fisicamente umha considerável parte dos quadros políticos, sindicais, culturais e sociais fruto de mais de um século de luita de classes e nacional, foi substituído após a morte natural do Caudilho por umha democracia de corte ocidental em que o Rei que Franco nomeou foi a pedra angular do novo regime. Para poder atingir este objectivo, foi necessário um amplo acordo entre umha boa parte das elites políticas e económicas do franquismo e a esquerda reformista espanhola. O PCE em troca do seu reconhecimento e aceitaçom polo sistema, renunciou ao programa histórico, baseado na ruptura com o franquismo e na recuperaçom da legalidade do período da II República, desactivando o movimento de massas. Mediante umha operaçom política dirigida e tutelada pola Casa Branca e as principais potências europeias, o aparelho franquista, a oligarquia e as forças reformistas da esquerda espanhola –PCE e PSOE basicamente– assim como as fracçons burguesas do nacionalismo basco e catalám, pactuárom modificar o quadro jurídico-político do totalitarismo fascista subtituindoo por esta pseudodemocracia. Nesta operaçom cosmética, como de um lifting se tratasse, lográrom manter incólumes os mecanismos do poder (administraçom, exército, polícia, aparelho judicial), e os interesses económicos-financeiros acumulados pola grande burguesia em mais de 40 anos de espólio e sobre-exploraçom da classe trabalhadora, da naçom galega e das mulheres. No Estado espanhol, a diferença de Portugal, nom houvo ruptura. Na Ga-

A ilegitimidade da democracia espanhola

Aproximaçom histórica à Transiçom espanhola na Galiza liza nom houvo 25 de Abril. Só umha simples continuidade do franquismo. Foi levada à prática aquela máxima do Príncipe de Salina no filme O Gatopardo, no qual Bernardo Bertolucci analisa o processo de unificaçom da Itália na Sicília: as cousas tenhem que mudar para que todo fique na mesma. A Transiçom é pois um monumental engano baseado numha lei do silêncio, no ocultamento do passado, na manipulaçom histórica, na supressom da verdade. Para atingir este objectivo, para conseguir esta grande metamorfose, sempre disfarçada de consenso, as elites, com o apoio das potências ocidentais, pugérom em andamento umha vasta campanha de desmemorizaçom colectiva para desarmar ideológica e politicamente os importantes contigentes operários e populares que durante décadas luitárom sem trégua contra o fascismo, impondo umha operaçom cosmética cujo resultado é o actual regime caracterizado polas cada vez maiores desigualdades sociais geradas pola economia de mercado, e a hipercentralizaçom negadora do direito de autodeterminaçom da Galiza. Para o sucesso, havia que eliminar as siglas odiadas polas massas, suprimir ou condenar ao ostracismo umha minoria de irredutíveis nostálgicos que, negando-se a submeter-se à necessária cirugia estética, faziam perigar os privilégios e as fortunas amassadas em quatro décadas de sobre-exploraçom da classe trabalhadora, das naçons oprimidas e das mulheres.

Início da Transiçom A morte de Franco 20 de Novembro de 1975, após umha longa agonia hospitalar, marca sem lugar a dúvidas o início real do processo. O franquismo no seu conjunto, com toda a complexidade de grupos e interesses que conviviam no seu seio, até que fisicamente desaparece a figura unificadora que durante quase 40 anos empobreceu a Galiza e provocou um retrocesso histórico no seu desenvolvimento económico e social, do qual ainda nom estamos plenamente recuperad@s, nom manifestava interesse em realizar as necessárias adaptaçons no aparelho jurídico-político para se homologar com as democracias ocidentais. Entre a execuçom de Carrero Blanco

DOSSIER CENTRAL

pola ETA em Dezembro de 1973, passando pola aparente liberalizaçom do denominado “Espírito do 12 de Fevereiro” promovido por Carlos Árias Navarro, até a farsa do referendo da “Reforma Política” de fim de ano de 1976 (em que todas as forças políticas estavam ilegalizadas), umha boa parte do establisment emanado da vitória militar sobre o movimento operário e popular considerava viável perpetuar no essencial o regime, realizando só tímidos ajustamentos e oportunas modificaçons para satisfazer assim algumhas demandas democráticas que intermitentemente provinham dos estados amigos, basicamente da CEE, e de Washington em

momento oportuno para dar o passo que permitisse pilotar o processo, assegurando manter incólumes os alicerces do franquismo, que nom eram mais do que os do capitalismo hispano. Os que a partir de 1976 se disfarçam de democratas de toda a vida, os que com o inestimável apoio dos meios de comunicaçom construírom a falsa tese de fazerem parte dessa selecta geraçom de abnegados servidores de Espanha que contribuírom com discreçom e humildade, sempre na sombra, para o sucesso da mudança pacífica e tranquila, entre 1974-76 continuavam a integrar o franquismo orgánico e, portanto, por activa ou por passiva, som correspon-

Adolfo Suárez jurando o seu cargo como “Jefe Provincial del Movimento” em 11 de Junho de 1968

menor medida, como a mais adequada fórmula, contribuindo para desactivar as demandas democráticas de cada vez maiores sectores populares. Mas nem Carlos Árias Navarro, nem Torcuato Fernández Miranda, nem Manuel Fraga, Adolfo Suárez, Rodolfo Martín Villa ou Leopoldo Calvo Sotelo, por citar só alguns nomes, todos eles sem excepçom fruto e resultado do franquismo, realizárom movimentos de peso antes da mortal tromboflebite de Franco para democratizar o regime, para o implosionare a partir do interior; só ensaiárom prudentes tentos e sondagens. Os enormes privilégios de que desfrutava esta casta política, o enriquecimento atingido pola gestom do aparelho estatal, a estabilidade dos “quarenta anos de paz” tam valorizados pola oligarquia e o grande capital industrial e financeiro, nom aconselhavam arriscar-se a abraçar prematuramente a democracia burguesa polo que pudesse passar. Havia que aguardar o

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sáveis pola censura, polo empobrecimento e marginalizaçom, dos crimes e do aumento da repressom policial, das torturas, das represálias em forma de desterros, multas, perdas de emprego e batalhons de castigo nos restos das colónias africanas. A conflituosidade social e laboral nom impossibilitava que de momento o franquismo se mantivesse intacto, sem fisuras, no seio do Exército e do conjunto das forças coercitivas: Guarda Civil e Polícia Armada, na judicatura, no funcionariado, na totalidade da administraçom. Boa parte do núcleo “aberturista” ainda nom tinha calibrado com rigor o que realmente significava o PCE, que sectores sociais representava a sua corrupta direcçom. O partido liderado polo incombustível Carrilho já era naquela altura umha força completamente inofensiva desde o longíquo abandono de qualquer veleidade revo-


lucionária logo de liquidar o movimento guerrilherio a inícios dos anos cinqüenta, e a posterior capitulaçom em toda a regra emanada da deriva reformista como sócio-fundador da liquidacionista corrente eurocomunista compartilhada com o PCI de Enrico Berlinguer e o PCF de Georges Marchais. A sombra do PCE só gerava alarmismo entre os núcleos do búnquer, no exército e nos sectores situados na extrema-direita que se organizaram a partir de 1966 na revista Fuerza Nueva, posteriormente transformada em partido político e força de choque dos nostágicos do 18 de Julho, embora fosse oportunamente empregada pola burguesia para atingir mais concessons nas negociaçons que estavam a ser abertas. Aqui radica um dos principais mitos, portanto das falácias, construídos na Transiçom: a existência de umha geraçom de quadros políticos e dirigentes franquistas, os tecnocratas, próximos da corrente democrata-cristá e liberal, que levavam anos no interior do regime a mexer fios e a procurar os caminhos mais ajeitados para a sua democratizaçom. Mas estes ministros e ex-ministros, altos funcionários de Franco, só começárom a pensar seriamente em adequar o franquismo ao que hoje padecemos após a morte do general e quando tinham assegurada a traiçom do PCE mediante o suborno político do carrilhismo e a refundaçom do novo PSOE em Suresnes.

Nom podemos desconsiderar o nervosismo e preocupaçom que o 25 de Abril português provocou no conjunto do franquismo. A queda do principal aliado durante quatro décadas foi um revulsivo na hora de levar a sério a caducidade da obsoleta arquitectura jurídico-política que impujo pola força das armas o capitalismo espanhol a partir de 1936. O búnquer optava por resistir e, portanto, apostava numha involuçom, mas os sectores ligados directamente aos interesses do grande capital eram conscientes da necessidade de pilotar um franquismo sem Franco. Para o conseguir, era essencial um grande pacto denominado eufemisticamente consenso, incorporando as cúpulas da “esquerda” e, simultaneamente, conseguir umha desmobilizaçom social. Características da etapa histórica O processo tem lugar numha conjuntura caracterizada pola crise económica internacional gerada polo incremento do petróleo que provocava fenómenos até o momento “inéditos” como o incremento dos preços, o desemprego (denominado na altura “paro obreiro”) e umha inabitual inflaçom que já nom só afectava à classe trabalhadora, mas também a certas camadas dessas classes médias tam favorecidas polo milagre económico dos sessenta. Esta conjuntura económica adversa favorecia pois o desenvolvimento de um amplo movimento social de protestos, greves, manifestaçons contra o franquismo, que convergiam com naturalidade com as reivindicaçons democráticas e nacionais promovidas pola esquerda e os movimentos de libertaçom nacional. Na Galiza, os grupos da esquerda re-

análise

A ilegitimidade da democracia espanhola

O Governador Civil de Barcelona, Rodolfo Martín Villa, festeja o Alzamiento Nacional em 18 de Julho de 1974, ao seu lado o “olímpico” Juan Antonio Samaranch, presidente da deputaçom barcelonesa.

volucionária estavam a deslocar o PCE nalgumhas luitas de massas, principalmente no movimento estudantil e juvenil, mas era basicamente o soberanismo galego articulado à volta da UPG que começava a disputar a hegemonia nas luitas operárias e populares ao carrilhismo. As greves de Ferrol e Vigo, de Março e Setembro de 1972, tinham sido o detonante de umha nova era no combate à ditadura. A autoorganizaçom operária acompanhava as reivindicaçons e conflitos laborais presentes na maioria dos sectores e concentraçons fabris. A Universidade estava imersa numha conflituosidade permanente. Os protestos e iniciativas contra a negaçom da normalizaçom da língua e da cultura galega nom deixavam de somar adesons. O mal-estar era cada vez maior, abrangendo sectores sociais diversos que protestavam contra a carestia da vivenda, contra as agressons das empresas ao território, contra os planos energéticos predado-

Fernando Herrero Tejedor louvando ao império espanhol ante a atenta mirada de três dos seus aprendizes mais avantajados: Adolfo Suarez, Rodolfo Martín Villa e Juan José Rosón. Mota del Cuervo (Cuenca) 4 de Junho de 1965

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res. Ascón, Baldaio, Jove, as Encrobas som os nomes de algumhas das grande luitas populares deste período. A repressom O franquismo, perante a expansom da luita de massas e o paulatino incremento da agitaçom social, optou por aumentar a repressom. A violência que caracterizou permanentemente o franquismo foi no último período do regime novamente impulsionada polo Estado decretando estados de excepçom nas províncias levantiscas do Norte, e empregando as forças policiais ou os grupos paramilitares vinculados à extrema-direita sob a protecçom dos aparelhos estatais. A morte de Moncho Reboiras a 12 de Agosto de 1975 exemplifica a dialéctica que estamos a narrar: incremento da luita popular contra o fascismo e agudizaçom e radicalizaçom da resposta violenta e repressiva por parte do regime. Imediatamente a seguir ao assassinato do responsável da Frente Militar da UPG na ferrolana rua da Terra, chega o fatídico 27 de Setembro desse mesmo ano, quando som fusilados cinco combatentes antifascistas, dous deles militantes da ETA e os outros três da FRAP, entre eles os vigueses José Humberto Baena Alonso e José Luís Sanchez Bravo Solha, no que aparentemente foi a sanguinária demonstraçom de fortaleza do franquismo. Mas na prática foi um canto de cisne: o regime sentia-se encurralado e optou por recuperar o discurso mais intransigente que caracterizava as primeira década de fascismo. Para fazer frente à pressom internacional que tinha solicitado clemência e a suspensom das condenas de morte, para responder à grande campanha de denúncia, à indignaçom social que tinha provocado multitudinárias mobilizaçons de pro-

anáreanáDia lise da


análise

re-

Dia da

testo, ataques a interesses económicos espanhóis em diferentes partes do planeta, e mesmo o assalto e incêndio da embaixada em Lisboa, o regime organiza umha grande manifestaçom de incondicional adesom ao Caudilho. A 1 de Outubro, Franco aparece por última vez em público diante de dezenas de milhares de simpatizantes na madrilena praça de Oriente, mobilizados polo aparelho do Movim¡ento Nacional, acompanhado polos príncipes Juan Carlos e Sofia, e com voz praticamente inintelegível dá leitura a um breve discurso em que explica que “Todo obedece a umha conspiraçom massónica esquerdista na classe política em contubérnio com a subversom comunista-terrorista no social”. Mas, contrariamente a outro dos mitos construídos polos media e as forças do sistema durante a Transiçom sobre os responsáveis da etapa de violência política, que circunscrevem unicamente às organizaçons armadas que combatiam o fascismo, basicamente a ETA e os GRAPO, o Estado foi o principal promotor e inductor da violência, provocando dúzias de mortes entre o movimento popular. A polícia, a Guarda Civil e os bandos fascistas provocárom entre 1976 e 1980 mais de um cento de mortes em manifestaçons e greves, ou em acçons “incontroladas” contra militantes e locais das organizaçons de esquerda. A juventude das pessoas falecidas era umha das principais características do perfil das vítimas desta violência justificada ao igual que agora no combate ao terrorismo e a subversom, mas também exprimia sem matizes a ruptura geracional da mocidade com os vencedores da Guerra de 1936-39. Salvo nos primeiros meses deste período fôrom alguns dos pais da Constituiçom e intocáveis figuras do actual regime, Adolfo Suárez, Martín Villa, Manuel Fraga, Juan José Rosón, quem presidiam o Governo espanhol e encabeçavam o ministério do Interior, denominado da Governaçom naquela altura, e portanto os máximos reponsáveis dos assassinatos cometidos de forma directa ou indirecta polas forças da ordem. Embora a Polícia Armada mudasse de nome e a cor do uniforme, passando

A ilegitimidade da democracia espanhola a denominar-se Polícia Nacional e trocando o cinzento polo castanho, mantivo, tal com a Guarda Civil e o Exército fascista de 1936, inalterável a sua composiçom, intacta a sua estrutura e doutrina. Nengum polícia ou funcionário estatal foi julgado por algum destes crimes. A impunidade e imunidade foi umha dos consensos da Transiçom. Assim, mais de trinta anos depois, as famílias e amizades das vítimas ainda aguardam justiça. Entre elas, as de Elvira Parceiro Rodríguez, umha jovem viguesa de 22 anos que faleceu a 21 de Abril de 1978 no hospital a conseqüência do derrame cerebral provocado polos golpes que recebe da polícia numha manifestaçom de apoio aos trabalhadores de Ascón; as de Emílio Fernandes Castro, falecido a 14 de Agosto de 1979 após umha brutal malheira da polícia em Monforte de Lemos, nos incidentes que tenhem lugar nas festas do povo; ou as do dirigente comunista Abelardo Colaço Araujo, assassindo de seis tiros nas costas numha rua madrilena a 29 de Agosto de 1980.

Inventar e construir novos instrumentos políticos Umha das prementes necessidades para o êxito do processo de reformar o franquismo na actual democracia bourbónica foi atingir a plena incorporaçom do PCE aos acordos da Transiçom, refundar o PSOE e dotar a burguesia de umha nova força política transitória mas aglutinante: a Uniom de Centro Democrático (UCD). Embora domesticado, ninguém se fiava plenamente do PCE, polo qual o melhor cenário era integrá-lo como primeiro passo para a sua posterior desativaçom. O histórico partido fundado por Pablo Iglesias era nesta altura praticamente inexistente, estando reduzido a um aparelho com presença no exílio sob a direcçom da velha guarda encabeçada por Rodolfo Llopis. Na Galiza de 1974, o PSOE nom passava de um pequeno punhado de militantes sem a mais mínima iniciativa e presença no movimento antifranquista. Para solventar isso, a fundaçom social-democrata alemá Friedrich Ebert, numha eficaz operaçom de marketing, promove a realizaçom do XXVI Congresso, que tem lugar em Suresnes em Outubro de 1974, onde a dupla formada por Felipe González e Alfonso Guerra substitui de forma anti-estatutária e sem garantias democráticas a direcçom histórica. Era imprescindível

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transformar o minúsculo partido carente de introduçom –dados oficiais do próprio PSOE reconhecem que este Congresso representava 3.586 militantes, dos quais 1.038 estavam no exílio– no principal referente da “esquerda espanhola” para desactivar e substituir o carrillismo, como a melhor garantia de assegurar essa ordenada reforma política que evitasse o exercício do direito de autodeterminaçom da Galiza e das outras naçons oprimidas, e a superaçom da economia de mercado. O capitalismo espanhol procurava a melhor fórmula para perpetuar com novo rosto a continuidade legitimando a legalidade imposta pola vitória de Abril de 1939. Assim, milhons de marcos e de dólares, fôrom injectados para atingir o que o imperialismo e o grande capital necessitavam. Isto permite explicar que o PSOE reconstruido mediante essa operaçom plástica realize em Madrid com absoluta normalidade o XXVII Congresso em Dezembro de 1976, apadrinhado polos capos da social-democracia europeia: François Mitterrand, Willy Brant, Mário Soares e Oloff Palme, enquando o conjunto da verdadeira oposiçom sem excepçom continuava sendo ilegal, padecendo a repressom dirigida por Fraga e Martín Villa. Nesta lógica, que tam só procurava desactivar o movimento operário cooptando líderes mediante suculentos salários e todo o tipo de privilégios e fagocitando as elites do ronsel das forças populares, o franquismo sem Franco também permitiu e favoreceu a realizaçom do XXX Congresso da UGT, umha central que, tal como o PSOE, carecia nessa altura de verdadeira introduçom e influência no proletariado. Mas era imprescindível incorporar a classe obreira aos acordos da Transiçom plasmados nos Pactos da Moncloa de Outubro de 1977, que disciplinam o movimento operário e renunciam à luita de classes. Houvo resistências no seio do PSOE na hora de aprovar os ritmos que o convertêrom na actual maquinaria eleitoral e alicerce do regime juancarlista. De facto no XXVIII Congresso realizado em Maio de 1979 Felipe González ve-se obrigado a demitir tacticamente para forçar o abandono do marxismo que a maioria d@s delega@s tinham impedido. Meses depois, um congresso extraordinário ratifica esse objectivo, que permite converter-se nas eleiçons de Junho de 1977, após a sua legalizaçom em Fevereiro, no segundo partido com representaçom institucional

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como antessala da posterior vitória eleitoral de Outubro de 1982. A reconstruçom artificial do PSOE permitiu o tam desejado descalabro paulatino do PCE. O seu espaço sociopolítico, quantitativamente inferior às previsons de 1975-76, foi ocupado parcialmente polo PSOE. Por um lado, boa parte da militáncia de base desencantada pola traiçom da sua direcçom optou polo abandono em massa –o denominado fenómeno do “desencanto”– enquanto milhares de quadros desertárom iniciando um rápido deslocamento para o PSOE na procura das enormes possibilidades de progressom e ascenso social. Isto permite explicar porque parte dos dirigentes do actual partido de Zapatero som ex-comunistas e porque o actual PCE/IU é umha caricatura do PCE do

raçom da actual Constituiçom monárquica de 1978, que sanciona a sagrada unidade espanhola, a economia de mercado e o sistema patriarcal. O PSOE foi determinante na hora de neutralizar as luitas sociais, operárias, populares, nacionais, juvenis, das mulheres. Sem ele, o actual regime nom se teria consolidado. Posteriormente, foi o seu primeiro governo que cumpriu com os acordos de introduzir o Estado espanhol na CEE (actual UE) e na NATO.

análise

A ilegitimidade da democracia espanhola

A UCD foi a plataforma política que permitiu a umha boa parte do velho aparelho franquista umha acelerada reciclagem para dirigir o processo de tránsito do autoritarismo para a democracia burguesa. Com umha definiçom ideológica vácua, foi capaz de incorporar um contigente amplíssimo das elites locais sob um programa centrista e conciliador. No seu seio chegárom a conviver desde oportunistas provenientes directamente do Movimiento Nacional e do Sindicato Vertical que dias antes manifestavam adesom incon-

vernador Civil de Ávila, e ministro-secretário-geral do Movimiento, embora sempre com um perfil baixo. Realmente, a experiência funcionou bastante bem nos primeiros anos, mas a partir de 1980 começárom a abrolhar irreversivelmente as contradiçons internas entre as cada vez mais fragmentadas famílias e baronias que conviviam no seu seio, incapazes de unificar colectivamente os múltiplos e em muitos casos antagónicos interesses que conformavam esse engendro artificial de marketing político. A incapacidade para manter a ordem interna explicitada no rocambolesco congresso realizado em Palma de Maiorca a inícios de Fevereiro de 1981 e após salvar previamente a Suárez na votaçom da moçom de censura apresentada polo PSOE em Maio de 1980, provocárom a sua demissom como Presidente do Governo espanhol e da UCD em 29 de Janeiro de 1981. Umhas semanas depois, tem lugar o auto-golpe de estado do 23 de Fevereiro. A segunda etapa da Transiçom estava em andamento, com a vitória eleitoral do PSOE em Outubro de 1982.

oportunidades conjunturais, doses de teatralizaçom, superaçom de dificuldades inerentes a umha operaçom tam complexa na qual o principal objectivo foi substituir a participaçom popular polos acordos de cenáculos das elites sob a batuta do grande capital espanhol e transnacional, sempre controlados polo atento olhar das embaixadas das grandes potências. Nom podemos obviar que Carrillo e a sua direcçom (Jordi Solé Tura, Tamames, etc) nom podiam convencer repentinamnete a militáncia do giro copernicano imposto, sobretodo naqueles aspectos mais duros de roer, como a aceitaçom da monarquia parlamentar do Rei que Franco designou em 1969, renunciando ao Estado republicano polo qual caírom milhares de militantes nos quarenta anos de ditadura. Era necessário tempo e assumir o enfraquecimento organizativo mediante os abandonos, as expulsons, a divisom. O PCE movia-se na dialéctica de manter a influência e o prestígio sobre sectores das massas e, simultaneamente, evitar que a esquerda soberanista ocu-

dicional braço em alto ao Caudillo de España por la gracia de Dios, a sectores autodefinidos “social-democratas” que se tinham afastado da oficialidade do regime. Mas todos aqueles que procuravam manter intactos os seus interesses e privilégios filiárom-se em massa ao novo partido dirigido por Adolfo Suárez, um vulgar, medíocre e ambicioso quadro franquista que tinha sido Go-

A teatralizaçom do processo O processo político de reforma do franquismo na actual democracia burguesa foi pactuado entre 1975-81 por boa parte das elites franquistas, representadas por Fraga e Adolfo Suárez, e a oposiçom representada por Carrillo e o recém inventado Felipe González. Os acordos necessitárom tempo, combinaçom de ritmos dilatados e aceleraçons, improvisaçom aproveitando as

passe o espaço da luita popular, mas tinha que moderar as luitas, afastando a classe operária e sectores populares das incómodas inércias combativas que obstaculizavam ganhar a confiança do transfuguismo franquista que representava o grande capital. A burguesia reclamava permanentes gestos e concessons. Era a quadratura do círculo. Simultaneamente o sector “aberturista” do aparelho franquista tinha que

reportagem análise

Dia da Galiza análise Combatente

Manifestaçom de adesom a Franco na Praça de Oriente, em Outubro de 1975, quatro dias depois dos fuzilamentos do 27 de Setembro. Franco, e o daquelas Príncipe Juan Carlos, saúdam desde o Palacio Real

antifranquismo, enfraquecido pola hemorragia que provocou a expulsom de Carrillo e seguidores em 1985, e crise permanente em que segue instalado. Atingido este objectivo essencial para o sucesso da Transiçom, o PSOE converteu-se na força que legitimava a partir da esquerda os vergonhosos pactos e os muros de silêncio. Felipe González cumpriu o acordado participando activamente na elabo-

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análise

isolar o núcleo duro, os sectores mais imobilistas, as entidades da extremadireita radicalmente contrárias ao pacto e, sobretodo, evitar que o mal-estar do exército fraguasse em movimentos autónomos mediante contínuas tentativas de golpes de estado que gorassem o processo. Havia que deslocar a velha classe política que nom se deixava reciclar e manter controlados os generais que seguiam aferrados ao modelo imposto em 1936. Em Novembro de 1975, Juan Carlos de Bourbon e Bourbon é nomeado Rei de Espanha nas Cortes franquistas emprestando juramento “por Deus e sobre os Santos Evangélios de cumprir e fazer cumprir as Leis Fundamentais do Reino e guardar lealdade aos princípios que informam o Movimento Nacional”. Em 23 de Julho de 1969, descartando a sucessom que correspondia ao seu pai Juan de Bourbon, as Cortes franquistas tinham aprovado a sucessom de Franco e a continuidade do regime na figura de Juan Carlos. Duas décadas antes, finalizado o conflito militar de 1939-45 e com a intençom de agradar às potências vencedoras e satisfazer aos monárquicos, Franco convertera a Espanha num reino sem rei. No Verao de 1969, o até daquela príncipe manifestou no juramento como Rei designado por Franco que “Estou profundamente emocionado pola grande confiança que tem depositado em mim a sua Excelência o Chefe do Estado... Formado na Espanha surgida o 18 de Julho, conhecim passo a passo as importantes realizaçons que se tenhem conseguido sob o mando magistral do Generalíssimo”. Por se houvesse algumha dúvida, ainda acrescentou umhas eloqüentes referências após jurar lealdade a Franco, fidelidade aos “Principios do Movimiento Nacional” e resto das Leis Fundamentais do Reino: “Quero expressar, em primeiro lugar, que recebo da sua Excelência o Chefe do Estado e Generalíssimo Franco a legitimidade política surgida 18 de Julho de 1936. Pertenço por linha directa à Casa Real Espanhola... Meu General: apesar dos grandes sacrifícios que esta tarefa poda proporcionar-me, estou certo que o meu pulso nom tremerá para fazer quanto for preciso na defesa dos Princípios e Leis que acabo de jurar”.

A ilegitimidade da democracia espanhola Continuando com as mudanças paulatinas, tenhem lugar os primeiros passos da II Restauraçom bourbónica, sem a mais mínima consulta popular seguindo o disposto por Franco em 1969. Em Dezembro, é constituido o primeiro governo sem Franco sob a presidência de Carlos Árias Navarro e com ministros como Manuel Fraga, Adolfo Suárez, Rodolfo Martín Villa ou Leopoldo Calvo Sotelo. Em Janeiro de 1976, é constituido o Conselho de Forças Políticas Galegas, um organismo rupturista contrário a qualquer acordo com o franquismo promovido pola esquerda nacional (UPG, PSG e PGSD), em aliança com duas forças de ámbito estatal (MCG e Partido Carlista) cujo objectivo era promover um processo constituinte exercitando o direito de autodeterminaçom. O efémero CFPG desaparece em Novembro. Era a resposta do soberanismo galego às sucursais autóctones das plataformas oposicionistas espanholas promovidas polo PCE e os seus aliados (Xunta Democrática) e polo PSOE (Plataforma de Convergencia Democrática de Galicia) fundidas na Taboa Democrática em Julho de 1976. Frente à alternativa autonomista da esquerda espanhola, o CFPG elabora e apresenta em Abril as Bases Constitucionais para a participaión da Nación Galega nun Pacto Federal como projecto estratégico. Embora recolha explicitamente o direito de autodeterminaçom, a iniciativa está limitada pola doutrina minimalista imperante nos “Dez pontos fundacionais da UPG” de 1964, ao nom recolher a independência nacional, optando por um Estado federal. O prematuro desaparecimento do organismo rupturista galego reduz a sua incidência no processo político da Transiçom, mas sim consegue deslocar o PCE como principal força opositora, atingindo umha considerável penetraçom em certos sectores proletários, juvenis e populares, mediante a ampla rede organizativa que teceu o movimento soberanista. Será, pois, a AN-PG que reivindique e mobilize ao longo dos primeiros anos da segunda metade da década em prol do estabelecimento de um governo galego provisório. A importáncia concedida polo imperialismo ao processo político da reforma franquista permite compreender as chaves da viagem que o recém nomeado Rei realiza em Junho de 1976 aos Estados Unidos e as decisons que a sua equipa de assesores adopta ime-

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diatamente. No mês de Julho, é cessado como Presidente do Governo espanhol Arias Navarro, substituindo-o Adolfo Suarez, e no mês de Setembro é ratificado o tratado de amizade com os EUA, garantindo a continuidade das estratégicas bases militares norte-americanas instaladas em 1953. Era necessário despreender-se de um político excessivamente vinculado com Franco, substituindo-o por outro mais jovem e aparentemente menos implicado com o velho regime, e ratificar a continuidade do Estado espanhol ao bloco imperialista ocidental. A monarquia tinha que cumprir o papel unificador do novo regime e por este motivo o inexperto e desconhecido Bourbon mantém umha série de conversas e reunions secretas com alguns dos mais destacados líderes do pocesso. Com Fraga em Abril e com Felipe González em Agosto. Enquanto as greves reclamando melhores salários e condiçons laborais se alargam e as forças políticas opositoras continuam ilegalizadas, a 15 Dezem-

bro de 1976 tem lugar o referendo sobre a Reforma Política para legitimar a operaçom cosmética que já conta com o importante aval das elites dirigentes do PCE e do PSOE. Os resultados nas quatro províncias em que a Administraçom espanhola tem dividida a Comunidade Autónoma Galega aparentemente exprimem um apoio popular maciço ao projecto de reforma pactuada do regime, mas esta assistência tam elevada às urnas devemos analisá-la como as ánsias de participaçom, de votar, de umhas massas que levavam mais de quarenta anos sem poder exercer o sufrágio universal. Os partidos de esquerda seguiam clandestinos e sem possibilidade real de dar a conhecer sua posiçom contrária ao referendo apelando à abstençom. Ainda assim, com estas premissas, a abstençom na CAG foi superior à média estatal, de 30.16% face a 22.53%. (Quadro 1)

Quadro 1 • Referendo Reforma Política (15 Dezembro 1976)

Eleitorado

Votantes

A favor

Corunha

705.129

497.838

475.473

9.161

Lugo

295.833

208.386

197.342

4.118

6.057

869

Ourense

307.281

196.544

190.235

2.787

3.195

327

Ponte Vedra

529.598

380.784

362.279

8.481

9.060

964

1.283.552 1.225.329

24.547

Total

1.837.841

Contra Em branco Nulos 12.043 1.161

30.355 3.321

Quadro 2

Participaçom eleiçons Junho 1977

Censo Votantes Abstençom

1.897.536 1.152.376 745.160

% 60,7 39,3

Quadro 3 • Resultados eleiçons Junho 1977 na CAG Candidatura

Siglas

Votos

%

Unión de Centro Democrático

UCD

606.726

53,99

20

Partido Socialista Obrero Español

PSOE

175.127

15,58

3

Alianza Popular

AP

148.239

13,19

4

Partido Socialista Popular-Unidad Socialista

PSP-US

53.067

4,72

Partido Comunista de España

PCE

34.188

3,04

Partido Socialista Galego

PSG

27.197

2,42

Coalición Elect. Equipo de la Democracia Cristiana FDC-EDC 23.014

2,05

Bloque Nacional Popular Galego

BN-PG

22.771

2,03

Reforma Social Española

RSE

9.425

0,84

Frente Democrático de Izquierdas

FDI

7.373

0,66

Alianza Socialista Democrática

ASDCI

4.728

0,42

Partido Demócrata Gallego

PDG

3.196

0,28

Agrupación Electoral de Trabajadores

AET

2.724

0,24

Frente para la Unidad de los Trabajadores

FUT

2.340

0,21

Alianza Nacional 18 de Julio

AN18

2.116

0,19

Falange Española de las Jons Auténtica

FJONSA

1.640

0,15

16

Deputad@s


Imediatamente, no dia 18 de Dezembro, os “procuradores” das Cortes franquistas legitimam o processo numha sessom que a historiografia oficial incorrectamente denomina harakiri mas que na práctica foi aprovar umha blindagem ao passado, a primeira disposiçom da lei de ponto final que deu imunidade a todos os responsáveis, sem excepçom, polos roubos, abusos, torturas e assassinatos cometidos polo franquismo. A primeira parte deste processo culmina com a legalizaçom do PCE em Abril, que lhe permite participar nas eleiçons de Junho de 1977, ainda com boa parte da oposiçom de esquerda revolucionária e dos movimentos de libertaçom nacional sem legalizar. A escala estatal, a UCD, o partido que aglutinava a maioria das elites políticas e económicas franquistas, dirigido por Adolfo Suárez obtém 35% e 165 deputad@s, seguido polo PSOE com 29% e 118, o PCE com 9% e 20 deputad@s e AP com 8% e 16 deputad@s. Na Comunidade Autónoma, os resultados, com umha abstençom de 39.3%, constatam a fraqueza eleitoral da esquerda nacionalista, claramente inferior à sua capacidade de mobilizaçom social. No seu conjunto, atinge 49.968 votos, divididos entre os 27.197 do PSG, e os 22.771 do BN-

PG, a coligaçom conformada pola UPG e a AN-PG. A esquerda radical estatal atingiu em total 12.437, fraccionados entre os 2.340 da FUT (“Frente Unido de Traballadores”), promovido pola LCR; 2.724 a “Agrupación Electoral dos Traballadores” (AET) candidatura sob a qual concorria a ORT; e 7.373 o “Frente Democrático de Izquierda” apoiado polo PTE e a CSUT. (Quadros 2 e 3) Os resultados das eleiçons de Março de 1979, com umha abstençom de 48.7%, na CAG constatam um importante aumento da esquerda nacionalista. O BN-PG e Unidade Galega –a coaligaçom formada polo Partido Galeguista, o Partido Obreiro Galego e o Partido Socialista Galego– atingem 121.241 votos, triplicando assim os resultados de 1977. Também a esquerda radical estatal, nesta ocasiom mais fragmentada que em 1977, pois concorre com seis siglas diferentes, experimenta um ascenso eleitoral, atingindo no seu conjunto mais de 22 mil votos. (Quadro 4) O cerne da arquitectura política do regime já estava em marcha. Entom era necessário disciplinar o movimento operário e neutralizar as reivindicaçons nacionais. O primeiro problema foi resolvido em Outubro com a assinatura dos “Pactos da Moncloa” polo que o sindicalismo espanhol maioritário (CC.OO e UGT) renuncia à luita de classes assumindo as normas que devem regir nas relaçons laborais entre a classe operária, o patronato e o governo. Era imprescindível descabeçar o movimento sindical, cooptando parte da sua direcçom para neutralizar

a capacidade de luita operária e recuperar a paz laboral característica do franquismo. Na Galiza, o sindicalismo nacional e de classe representado polo SOG-INGINTG mantivo umha oposiçom frontal aos acordos. Um PCE enfraquecido polos resultados eleitorais de Junho do 77 envolvido em permanentes e maciços abandonos realiza em Abril de 1978 o IX Congresso, em que abandona o leninismo.

Siglas

Unión de Centro Democrático Partido Socialista Obrero Español Coalición Democrática Bloque Nacional-Popular Galego Unidade Galega (PG-POG-PSG) Partido Comunista de España Partido Socialista Obrero Español (sector histórico) Coalición Unión Nacional Partido del Trabajo de Galicia Movimiento Comunista-Organización de Izquierda Comunista Organización Revolucionaria de Trabajadores Izquierda Republicana Liga Comunista Revolucionaria Partido Comunista de los Trabajadores Partido Carlista Organización Comunista de España (Bandera Roja) Falange Española (Unidad Falangista) Partido Proverista (Egidako Batzarra)

A Constituiçom espanhola e a descentralizaçom administrativa Para integrar o nacionalismo burguês, basicamente o PNB e CiU, pois na Galiza o movimento nacional estava praticamente hegemonizado polas duas correntes do soberanismo de esquerda –a rupturista representada pola UPG/BN-PG e a pactista vinculada ao PSG/POG– o governo espanhol permite a volta de Tarradellas a Catalunha em Outubro. Deste jeito, nom só logra que o velho dirigente do nacionalismo burguês no exílio legitime a monarquia, mas também apoie os fraudulentos acordos da Transiçom. Posteriormente, tem lugar o conflituoso processo de tímida descentralizaçom administativa que dá lugar ao actual Estado das Autonomias, com o qual consegue integrar o PNB, CiU e as elites regionalistas nos acordos, e reduzir a enorme desestabilizaçom que provocavam as reivindicaçons de liberdade nacional da Galiza, Catalunha e País Basco.

Votos

UCD 514.779 PSOE 183.958 CD 148.139 BNPG 63.446 UG 57.795 PCE 43.655 PSOE-SH 12.368 UN 8.148 PTE 7.255 MC-OIC 5.084 ORT 3.339 IR 3.283 LCR 3.191 PCT 2.271 PC 1.834 OCE-BR 1.446 UF 216 P PROV. 195

DOSSIER CENTRAL

Mas, para institucionalizar a metamorfose do fascismo, antes foi necessário aprovar umha constituiçom à medida dos interesses do capitalismo. A actual Constituiçom foi pactuada entre as elites franquistas representadas pola UCD e AP e a esquerda reformista hegemonizada polo PSOE e o PCE e ratificada num novo referendo celebrado em Dezembro de 1978 no que se aprova o actual quadro jurídico-político baseado na economia de mercado que legitima a exploraçom da burguesia sobre a classe trabalhadora, consagra a centralizaçom e o estado unitário negador do direito de autodeterminaçom, a Monarquia como forma de estado, o sistema patriarcal que perpetua a marginalizaçom e opressom da metade da força trabalho: as mulheres, e poderes excepcionais ao exército golpista e fascista de 1936, institucionalizado, tal como a Igreja católica, num “poder fáctico”.

reportagem análise

Quadro 4 • Resultados eleiçons Março de 1979 na CAG Candidatura

análise

A ilegitimidade da democracia espanhola

%

Deputad@s

48,55 17 17,35 6 13,97 4 5,98 5,45 4,12 1,17 0,77 0,68 0,48 0,31 0,31 0,30 0,21 0,17 0,14 0,02 0,02

17

Dia da Galiza análise Combatente

A Constituiçom espanhola nega o direito de autodeterminaçom do povo galego, ao estabelecer que “a soberania nacional reside no povo espanhol” (artigo 1.2). Mas, por se houvesse algumha dúvida, estabelece no artigo 2 que esta Constituiçom se fundamenta “na indissoluvel unidade da naçom espanhola, Pátria comum e indivisível de todos os espanhóis”. E fiel ao testamento político de Franco de que “todo fica atado e bem atado”, o artigo oitavo recolhe que as “Forças Armadas tenhem como missom garantir a soberania e a independência de Espanha, defender a sua integridade territorial e o ordenamento constitucional”, ou seja, impedir pola violência institucional o direito democrático de autodeterminaçom. O regime apresenta a Constituiçom de 1978 como um texto sagrado, de supersticiosa adesom e indiscutível veneraçom. Mas esta Constituiçom feita para umhas necessidades concretas num momento concreto, tam só maquilhou e reformou o franquismo, carecendo de legitimidade democrática pois tam só foi aprovada com o apoio de pouco mais de 44% d@s galeg@s no referendo realizado em 6 de Dezembro 1978. A esquerda independentista e o conjunto do nacionalismo galego da altura nom apoiou este texto, chamando a votar nom, em branco ou solicitando a abstençom, e mantendo assim umha grande coerência estratégica na hora


análise

de combater a II Restauraçom bourbónica e nom legitimando os novos instrumentos de dominaçom.

re-

Dia da

Posteriormente, para neutralizar as aspiraçons nacionais da Galiza e das outras naçons oprimidas polo projecto nacional espanhol, tivo lugar umha limitada descentralizaçom administrativa do Estado, alicerçada na homologaçom de regions, províncias e naçons no que acertadamente se denominou café para todos. A actual Espanha das autonomias equipara em igualdade de condiçons a territórios como La Rioja ou a Múrcia com umha naçom como a Galiza. Mas este modelo, que aparenta ser igualitário e democrático, tam só pretende destruir a naçom galega, basca e catalá reforçando a unidade territorial de Espanha. Em Outubro de 1979, tenhem lugar os referendos autonómicos das Bascongadas e da Catalunha, e em Março as eleiçons dos seus respetivos parlamentos. As burguesias de ambos territórios optam por assumir as regras de jogo que lhes permitem amplos poderes e perpetuar a sua dominaçom

A ilegitimidade da democracia espanhola 5) com um resultado modesto para a esquerda soberanista que atinge quatro deputados (Quadros 5 e 6). A autonomia que nos cedeu Espanha, o parlamentinho e as instituiçons autonómicas, carecem das competências mínimas para poder solucionar os problemas do Povo Trabalhador Galego. Carecem de capacidade porque nom som soberanas, som meros apêndices das instituiçons espanholas. Formam parte da arquitectura institucional com a que garantir a estabilidade do capitalismo espanhol

Do 23 F à vitória de 1982 A vitória do PSOE, com maioria absoluta em Outubro de 1982 –vinte meses depois do auto-golpe de estado do 23 de Fevereiro, facto imprescindível para legitimar Juan Carlos de Bourbon e consolidar o actual regime– foi decisiva para culminar o cerne da Transiçom. Nom podemos desconsiderar a opiniom que sempre mantivo Agnelli, o magnate italiano proprietário da Fiat, de que a melhor maneira de proteger os interesses do Capital numha democracia burguesa é contar com governos de centro-esquerda. Tal como sabiamente opinava o velho dono da multinacional automovilística, no caso que analisamos a tradiçom e o arraigo histórico das siglas do PSOE na consciência operária e popular facilitárom

Quadro 5

Participaçom eleiçons autonómicas 1981

Censo Votantes Abstençom

2.174.246 1.006.222 1.168.024

Quadro 6 • Resultados das primeiras eleiçons autonómicas Candidatura

Siglas

Votos

% Deputad@s

Alianza Popular Unión de Centro Democrático PSOE Bloque-PSG Esquerda Galega Partido Galeguista Partido Comunista de Galicia Partido Socialista dos Traballadores Unión Socialista Galega-PSOE Indep. Defensa Capital La Coruña Irmandade Galega Liga Comunista Revolucionaria-MCG Partido Ruralista Español Fuerza Nueva Derecha Democrática Española Falange Española de las JONS

AP UCD PSG-PSOE BNPG-PSG EG PG PCG PST USG-PSOE IDC IG LCR-MCG PRE FN DDE FE-JONS

301.039 274.191 193.456 61.870 33.497 32.623 28.927 18.249 12.709 5.486 4.929 4.858 4.291 3.950 2.022 1.498

30,52 27,80 19,62 6,27 3,40 3,31 2,93 1,85 1,29 0,56 0,50 0,49 0,44 0,40 0,21 0,15

Galicia Ceibe Partido Comunista de España M-L

GC PCE-ML

1.433 1.216

0,15 0,12

emprego e desarmárom a capacidade de combate e resistência da classe trabalhadora facilitando a paulatina perda de direitos e conquistas atingidas na década de setenta. Os intermináveis catorze anos de felipismo, basicamente as três primeiras legislaturas, carac-

Carrero Blanco, Franco e o Bourbon

sobre os seus povos trabalhadores em troca de renunciar ao exercício de autodeterminaçom. No nosso país, na consulta realizada para refrendar o Estatuto de Autonomia, em 1980, tam só participou 21% d@s galeg@s. Posteriormente, em Outubro de 1981, tenhem lugar as primeiras eleiçons autonómicas com umha abstençom maciça: 1.168.024 galeg@s, 53.7% do censo com direito ao voto nom acode a votar, (Quadro

poder aplicar os duros ajustamentos laborais que o capitalismo espanhol e a sua integraçom na CEE exigírom. (Quadros 7 e 8) O felipismo, com a inestimável colaboraçom da UGT, impujo umha dura reconversom industrial que provocou na Galiza a destruiçom de boa parte dos sectores estratégicos da economia nacional (sector naval, siderúrgico, agro-pecuário, pesca) aplicando a receita neoliberal das reformas laborais permanentes que precarizárom o

DOSSIER CENTRAL

% 46,3 53,7

terizárom-se pola repressom contra o movimento operário e os movimentos de libertaçom nacional, destacando a utilizaçom da guerra suja, o terrorismo de Estado contra a insurgência basca mediante a criaçom dos GAL. Mas nom só. Fôrom os anos da corrupçom generalizada, do abuso de poder permanente, da prepotência ilimitada, do corte das liberdades, da fagocitaçom e repressom contra os movimentos sociais, do enriquecimento express e sem pudor –conhecidos polo termo

18

26 24 16 3 1 1

espanhol ‘pelotazo’– dos dirigentes e das suas famílias, o que Petras caracterizou como o “socialismo espanhol caminho de Marbella”. O PSOE, contrariamente ao recolhido no programa eleitoral com que venceu em 1982, após umha obscena campanha de manipulaçom com referendo incluído, incorporou o Estado espanhol na NATO em 1986; foi quem mimou o exército mediante o permanente incremento dos gastos militares e a sua modernizaçom realizando liftings contínuos, mas conservando a oficialidade e a doutrina golpista, encarcerando centenas de jovens objectores e insubmissos, actualizando o acordo militar com os EUA, que permite a permanência das bases militares. Mas também colaborando abertamente com os a ofensiva imperialista do militarismo norte-americano, que dá início à “nova desordem internacional” na primeira guerra contra o Iraque de 1991, enviando tropas e dando o apoio logístico imprescindível para bombardear a populaçom civil de Bagdade e das grandes urbes iraquianas.

Recapitulando O período histórico denominado Transiçom representa umha taxativa vitória da burguesia e do bloco de classes oligárquico espanhol sobre o movimento operário e as reivindicaçons nacionais.


Os interesses económicos e financeiros que provocaram e sustentaram o franquismo durante quatro décadas conseguírom perpetuar-se mediante umha nova forma, transitando pacificamente do autoritarismo fascista à democracia parlamentar assente numha economia de mercado de corte ocidental. A Transiçom culminou assim atingindo praticamente a maioria dos objectivos perseguidos pola burguesia hispana e o imperialismo. O Estado espanhol mantivo intacta a sua unidade e integridade territorial; o tránsito do capitalismo com tintes autárquicos e forte intervencionismo estatal carácterístico da década de setenta deu lugar a umha economia liberalizada bem integrada nos blocos imperialistas ocidentais: NATO e UE; o movimento operário foi desarmado e neutralizado como sujeito político; a esquerda estatal laminada e reduzida praticamente ao

testemunhalismo; a monarquia bourbónica logrou legitimar-se vencendo as fortes resistências e passividade popular. O Povo Trabalhador Galego nom deu recuperado os direitos democráticos e boa parte das conquistas sociais, laborais e nacionais que atingira na primeira metade da década dos anos trinta do século XX, violentamente suprimidos pola violência fascista. O grau de desenvolvimento, sustento social e maduraçom política-ideológica da esquerda independentista e soberanista nesta etapa impossibilitou a ruptura, mas trinta e oito anos depois da morte do ditador a prática totalidade dos objectivos e reivindicaçons continuam intactas. O movimento de

libertaçom nacional e social de género, o conjunto da esquerda nacional aprendeu dos erros do passado e prossegue a luita, porque o projecto nacional espanhol nom está consolidado e o futuro deparará grandes batalhas e combates que devemos ganhar. Esta cárcere de povos denominado Espanha e o conjunto das forças políticas e sociais sobre as quais asenta é consciente da necessidade de introduzir umha série de reformas limitadas na arquitectura institucional do regime continuador do franquismo sem questionar a sua essência, ou seja, mantendo como dogma de fé a indivisível unidade territorial do Estado.

Quadro 7

Participaçom eleiçons Outubro 1982

Censo Votantes Abstençom

2.071.437 1.320.603 750.834

% 63,8 36,2

Quadro 8 • Resultados eleiçons Outubro de 1982 na CAG

Candidatura

Siglas

Votos

%

Coalición Electoral (Alianza Popular, Partido Demócrata Popular)

AP-PDP

488.406

37,80

13

Partido Socialista Obrero Español

PSOE

426.366

32,99

9

Unión de Centro Democrático

UCD

230.097

17,81

5

Bloque PSG

PSG

38.427

2,97

Centro Democrático y Social

CDS

33.573

2,60

Esquerda Galega

EG

22.191

1,72

Partido Comunista de España

PCE-PG

20.094

1,55

Partido Socialista de los Trabajadores

PST

12.478

0,97

Agrupación Electoral Gallega Independiente

AEGI

5.511

0,43

Fuerza Nueva

FN

2.543

0,20

Solidaridad Española

SE

2.403

0,19

Unificación Comunista de España

UCE

2.402

0,19

Independientes y Emigrantes de Galicia

IDG

2.222

0,17

Partido Comunista de España (Marxista-Leninista)

PCE-ML

1.841

0,14

Partido Comunista Obrero Español

PCOE

1.653

0,13

Falange Española de la JONS

FEJONS

910

0,07

Candidatura Unidad Comunista

CUC

704

0,05

Coalición Esquerda Revolucionaria

LCR-MCG

425

0,03

DOSSIER CENTRAL

Deputad@s

19

análise

A ilegitimidade da democracia espanhola

O PSOE é conhecedor da grave crise que atravessa o capitalismo espanhol, das cada vez maiores dificuldades para manter em pé o actual Estado das Autonomias, e por isso duvida como introduzir as mudanças necessárias que compatibilizem as reivindicaçons das burguesias basca e catalá, os interesses das elites autonómicas e a urgente estabilidade política que demanda a oligarquia. Tal como na etapa de transiçom do franquismo para o actual regime de democracia burguesa, opta-se novamente por um pacto, após umha negociaçom que satisfaga todas as partes, que assegure mais vinte ou trinta anos de estabilidade na unidade estatal, e simultaneamente tenha suficiente peso como para desactivar as demandas soberanistas impulsionadas polas diversas esquerdas independentistas. Os acordos selados na Transiçom necessitam ser revistos. Nestes parámetros tam limitados é que se estám a desenvolver todas as soluçons ao problema estrutural que arrasta secularmente o capitalismo espanhol. Mas nem a burguesia basca, nem a burguesia catalá, e muito menos a pequena burguesia hegemónica na direcçom do autonomismo galego, estám interessadas em que a Galiza, Euskal Herria e Catalunha podam ser estados soberanos. Conformarám-se com umha nova redistribuiçom dos excedentes, dos privilégios, das taxas de ganho, com maiores atribuiçons e poderes executivos na sua área geográfica de dominaçom, mais capacidade na hora de desenhar e administrar os recursos económicos, basicamente mediante o alargamento da capacidade fiscal, e poder contar com representaçom directa na UE para defenderem sem intermediários os seus particulares interesses. Chegou a hora da esquerda soberanista agir com projecçom de massas denunciando a nova fraude que furta os direitos democráticos a decidirmos o nosso futuro.

reportagem análise

Dia da Galiza análise Combatente


análise

re-

Dia da

Converter umha brutal ditadura fascista numha democracia burguesa de tipo ocidental evitando umha insurreiçom popular a grande escala é algo que requer, entre outras cousas, umha magnífica estratégia de intoxicaçom ideológica. Ora bem, fazê-lo mantendo praticamente intacta a superestrutura política, judiciária, repressiva e militar do regime anterior é algo que requer de autêntica guerra psicológica sustentada no tempo. Desde 1975 e até hoje mesmo, nos jornais, nas escolas, no cinema, na TV e no resto de meios de difusom de ideologia do Estado espanhol, desenvolve-se umha intensa campanha de manipulaçom cujo objectivo é ocultar a natureza real do processo mediante o qual se nos impujo o quadro jurídico-político que hoje padecemos e, em simultáneo, botar terra em cima dos crimes cometidos durante o mesmo. A seguir vamos repassar brevemente algumhas das principais mentiras que a diário os apologetas da Espanha constitucional nos obrigam a deglutir. Algumhas som autênticas necedades que só os mais perversos propagandistas do regime se atrevem a difundir, mas boa parte delas estám solidamente instaladas nas consciências d@s oprimid@s, muito especialmente nas de quem nom viveu os acontecimentos que trata este dossier. A Transiçom foi um processo pacífico, exceptuando episódios isolados Durante a Transiçom fôrom dúzias @ s militantes de esquerda e activistas sociais assassinad@s polas forças repressivas e por pistoleiros fascistas. Foi nestes anos que se sentárom as bases do moderno terrorismo de Estado, da guerra suja contra os movimentos revolucionários, criando-se ou relançando-se, sob a tutela do Estado, organizaçons paramilitares como o Batallón Vasco Español, a Triple A (Alianza Apostólica Anticomunista), os Grupos Armados Españoles, Antiterrorismo ETA, Acción Nacional Española, Guerrilleros de Cristo Rey ou os Comandos Antimarxistas, entre outros. Na maior parte dos casos, apenas se tratou de siglas criadas ad hoc polos corpos repressivos para executar acçons armadas, incorporando agentes da polícia e serviços secretos, mercenários e militantes da ultradireita. Ao todo, somam

A ilegitimidade da democracia espanhola

Umha farsa bem elaborada: falácias da Transiçom centenas de atentados contra todo o tipo de objectivos nos Estados espanhol e francês; por exemplo, ao BVE atribuem-se cerca de 80 acçons. Além disso, a resistência popular armada, com destaque para a ETA ou os GRAPO, viveu umha época de efervescência. Segundo os dados da imprensa espanhola, só em 1980 o número de baixas causadas por estas organizaçons achega-se da centena. Esta actividade armada coincidia com um clima geral de mobilizaçom e conflituosidade social. Em 1976 houvo 1.438 dias de greve por cada 1.000 trabalhadoras ou trabalhadores; se focalizarmos na indústria, o número eleva-se para os 2.085 dias de greve, o que quadruplica no mínimo a média europeia. Um total de 17.731 greves, 150 milhos de horas de trabalho perdidas só nos primeiros nove meses de 1976; e nos anos posteriores a estatística é similar. A repressom contra todos estes movimentos populares foi brutal e as incontáveis detençons e encarceraçons por motivos políticos fôrom freqüentemente acompanhadas de torturas. Durante os “pacíficos” dias da Transiçom as manifestaçons dissolviam-se a tiro.

A Transiçom democratizou de forma integral todos os ámbitos da sociedade Sem necessidade de pôr em questom que tenha suposto qualquer tipo de democratizaçom na vida política, o que fica evidente é que para determinados sectores da sociedade a Transiçom simplesmente nom existiu. Instituiçons como o exército, a polícia, o sistema judiciário e boa parte da burocracia estatal permanecêrom intactas; com algumha mudança de nome no melhor dos casos. É o caso do temido Tibunal de Orden Público que processava as causas por motivos políticos e que hoje sob o nome de Audiencia Nacional continua a ser a ponta da lança judiciária contra os movimentos revolucionários como o nosso. Os fascistas que ocupavam estes organismos ficárom nos seus postos graças à impunidade total que se decretou a respeito dos crimes cometidos durante a ditadura e se houvo algumha transiçom nestes ámbitos foi unicamente por motivos biológicos. Além do anterior, umha parte importante das leis e procedimentos judiciários fôrom herdados sem mudanças; e nom só, pois durante a Transiçom promulgá-

DOSSIER CENTRAL

rom-se ainda novas leis de excepçom para restringir os raquíticos direitos que outorgaram as pequenas reformas aplicadas à legalidade anterior. Por outra parte, os empresários que durante décadas se enriquecêrom à custa da sobre-exploraçom do Povo

dentro da legalidade e, portanto, participar em processos eleitorais e ter actividade pública. Trata-se, de umha parte, de um PSOE que nada tinha a ver com o de 1936, morto de inaniçom durante a ditadura, absolutamente desaparecido e

Martín Villa, diante da bandeira franquista, informa do resultado do referendo

Trabalhador e mesmo do trabalho escravo dos milhares de presos políticos, mantivérom intactos os seus empórios e participárom directamente na construçom do novo sistema, adaptando o mesmo às suas necessidades de classe. A conseqüência mais visível desta realidade é que até hoje nom se tenhem depurado as responsabilidades polos incontáveis crimes cometidos polo aparelho estatal franquista. Noutras latitudes, após a queda de um regime ditatorial, tem havido comissons da verdade, processos judiciários contra assassinos e torturadores, acusaçons de crimes contra a humanidade, purgas nos aparelhos do Estado ou, quando menos, indemnizaçons e reconhecimentos de carácter cosmético às vitimas directas da repressom. Nada disso tem acontecido no caso espanhol. Ao invés, destacados dirigentes fascistas tenhem continuado a exercer cargos de poder e a participar na vida pública com total impunidade.

As organizaçons de esquerda fôrom legalizadas e todas as opçons políticas respeitadas Na verdade, apenas duas organizaçons “de esquerda”, e as suas afins, recebêrom nos primeiros anos da Transiçom permissom do Estado para actuarem

20

desconhecido polas massas populares e reinventado a golpe de talonário polas social-democracias burguesas europeias (principalmente a alemá) e polos Estados Unidos; um PSOE que renunciava expressamente ao marxismo e a qualquer programa de carácter obreiro. De outra parte, o Partido Comunista de España, que previamente tivo que renunciar a continuar a defender a República e aceitar a monarquia e o projecto estratégico da classe dominante a respeito das naçons oprimidas, naturalmente junto a todos os seus símbolos. O PCE, que naquela altura concentrava sem dúvidas umha parte importantíssima da esquerda revolucionária e mantinha sob a sua batuta as CCOO, tivo que apresentar estas renúncias perante os seus quadros como umha inevitável manobra táctica destinada a aceder à representaçom parlamentar e evitar umha situaçom de repressom em grande escala; porém, hoje é fácil comprovar como as mudanças operadas naquela altura nom fôrom mais do que o começo de umha estratégia permanente de integraçom no sistema e de aceitaçom do seu discurso em todas as questom fundamentais. O resto de organizaçons da esquerda fôrom perseguidas, infiltradas pola po-


lícia e a sua militancia detida, torturada e assassinada. Se nalgum momento a pressom popular ou a necessidade propagandística obrigárom o Estado a legalizar um determinado movimento

Ponentes da Constituiçom espanhola Gregorio Peces-Barba

Manuel Fraga

Gabriel Cisneros

José Pedro Pérez Llorca

Jordi Solé Tura

Miguel Herrero de Miñón

Miquel Roca

DOSSIER CENTRAL

revolucionário, fijo-se sempre com garantias de que no futuro poderia ser desarticulado ou ilegalizado, tal e como estamos a ver hoje com a esquerda independentista basca. A Transiçom foi um logro “de todos os espanhóis” Nem de todos, nem de alguns. O grosso do processo político que conhecemos como Transiçom foi desenhado ao milímetro polos estados francês, alemám e estado-unidense à medida das suas próprias necessidades e das da burguesia espanhola, que reclamava um espaço de acumulaçom e expansom de capital capaz de concorrer com as economias vizinhas e para o qual a rígida administraçom franquista era um obstáculo insalvável. Planificado, financiado e tutelado. Durante a Transiçom, os agentes da CIA e outros serviços secretos nom deixárom de vigiar e controlar o processo, dando instruçons regularmente aos governantes espanhóis. Portanto, longe de umha democratizaçom promovida polo conjunto da sociedade, a Transiçom foi a abertura de um novo mercado capitalista blindado, naturalmente, contra qualquer pretensom “esquerdista”. A sociedade apoiou de forma livre e unánime a Constituiçom de 1978 Se no conjunto do Estado apenas 58% do censo votou sim à Constituiçom, na Galiza essa percentagem nem sequer atingiu os 45% e no País Basco ficou por volta dos 31%. Isto se dermos por bons os resultados de um referendo realizado sem qualquer garantia de limpeza, no qual se referendou um texto absolutamente desconhecido polo eleitorado tanto nos seus conteúdos concretos como nas suas conseqüências políticas imediatas e futuras. Também nom devemos esquecer que a consulta se realizou num clima geral de chantagem política. Era de domínio público que os franquistas que ainda governavam o Estado estavam dispostos a começar umha nova guerra se o Povo Trabalhador decidia tomar um caminho diferente ao ditado por eles. Para além disto, umha boa parte das organizaçons de esquerda do Estado permaneciam na ilegalidade e a repressom política era umha constante diária. O Bourbon foi o árbitro que permitiu a mudança de regime Em todo caso o monarca foi a garantia

21

análise

A ilegitimidade da democracia espanhola

de que todo o processo se desenvolvia sobre a base do regime anterior e sem entrar em demasiadas contradiçons com ele. Na verdade, nom admira, partindo de um elemento de escassa capacidade política, educado por e para o Movimiento Nacional, ao qual jurou solenemente obedecer no momento em que Franco o nomeou seu sucessor –juramento do qual, já agora, ainda nom se retractou. De outra parte, nom devemos obviar que Juan Carlos é, mais umha vez, umha escolha norte-americana. Desde muito antes da sua designaçom como sucessor de Franco os serviços secretos e a diplomacia ianques organizárom umha minuciosa campanha destinada a aplacar as ambiçons do seu pai, Juan de Bourbon, e fertilizar o terreno para que a sua designaçom como chefe de Estado fosse aceite e mesmo impulsionada polas diversas famílias do fascismo. Nom é por acaso que a sua primeira visita oficial ao estrangeiro, já investido chefe do Estado, fosse aos Estados Unidos, onde recebeu o visto oficial desta potência para o processo de reestruturaçom que se preparava para afrontar. Temos a certeza de que ocultar os pormenores da biografia deste elemento deveu ser umha das mais árduas tarefas dentro da campanha de mentiras que estamos a analisar, só olhando a sua participaçom activa no auto-golpe de Estado do 23-F, que analisamos neste mesmo dossier, ou a sua abnegada carreira de enriquecimento pessoal, dá para ver o contraste, no mínimo, com a imagem do soberano imparcial devido aos seus súbditos.


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Dia da

O Estado unitário espanhol foi sempre umha aposta inapelável das classes dominantes empenhadas na construçom de Espanha, a partir da altura em que o Estado-naçom se converteu em peça chave de desenvolvimento no palco internacional do capitalismo ascendente. De base ultraconservadora, o nacionalismo espanhol foi atravessado nos últimos dous séculos, quer na sua versom tradicionalista, quer na liberal, pola necessidade de afirmar e manter o centralismo como desígnio

A ilegitimidade da democracia espanhola

A descentralizaçom administrativa do Estado autonómico nega o direito de autodeterminaçom ideólogos mediáticos e académicos arvorar os direitos do cidadao sobre qualquer adscriçom nacional diferente da que fundamenta a naçom espanhola como historicamente pré-existente, assistimos a umha grande fraude baseada num nacionalismo etnicista formulado como ‘nom-nacionalismo’. Umha grande fraude contraditória nom só com a história da Europa, mas com a de alguns desses mesmos partidos, como o PSOE ou o PCE, que até assinarem os Pactos da Moncloa incluiam o direito de autodeterminaçom, nem que fosse de maneira ritual, nos seus princípios políticos.

cionais do povo galego. Daí que nos últimos anos da sua vida, depois da vitória fascista e em vista das posiçons profundamente espanholistas dos sectores opositores republicanos, o autor de Sempre em Galiza se aproximasse mais de posiçons independentistas, dando por perdida qualquer possibilidade de que Espanha reconhecesse os direitos que como povo assistiam, como ainda assistem, aos galegos e às galegas. Se a ditadura franquista confirmou o pior das essências pátrias dos últimos douscentos anos de invençom de Es-

Primeiro parlamento autonómico, no Paço de Fonseca, com Fernández Albor em primeira fila

imprescindível para a própria subsistência do projecto nacional espanhol, conhecedor da sua fraqueza. Nom há que esquecer que desde 1811 (na véspera da aprovaçom da Constituiçom de Cádis) até a actualidade, emancipárom-se um total de 20 naçons submetidas à administraçom espanhola, facto que, de resto, nom tem nada de estranho, pois se calcula que quase 80% dos estados actuais se formárom a partir de estados pré-existentes. Nada mais longe da realidade que as remotas origens épicas a que as ideologias dominantes nos estadosnaçom costumam remeter as respectivas nacionalidades. Quando na actualidade vemos os grandes partidos espanhóis e os seus

Já Castelao afirmou a única dicotomia possível para o Estado espanhol, entre umha soluçom federal e um separatismo inevitável se se negava o direito à existência da Galiza como realidade diferenciada da espanholidade e sujeito de direitos. A oligarquia centralista tem descartado, desde as primeiras constituiçons espanholas, jurídica, factualmente e até hoje qualquer possibilidade de federaçom, incluída a II República, em que se assumírom as posiçons mais ‘avançadas’ nesse terreno. Aquela República ‘federável’, que nunca se tornou federal, foi para o sector progressista do nosso nacionalismo, representado por Castelao, a melhor prova das limitaçons de qualquer proposta político-institucional espanhola para as aspiraçons democrático-na-

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panha, a nova Constituiçom delegada por Franco ao seu herdeiro Juan Carlos de Bourbon nasceu mais pejada do que qualquer outra anterior, com umhas esquerdas, tradicionalmente centralistas, entregadas ao projecto restaurador de um poder monárquico que descartou qualquer cessom da ‘Espanha una’. A nova Constituiçom de 1978 parte de umha naçom forçosamente ‘comum e indivisível’, que vai ao encontro das essências originárias do nacionalismo espanhol ao ponto de proteger essa unidade imposta com a ameaça constitucional da intervençom militar contra qualquer eventual tentativa de afirmaçom dos povos submetidos ao projecto nacional espanhol.

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Operou-se naquele fatídico 78, portanto, umha fraudulenta manobra consistente em ceder umha descentralizaçom administrativa complementar do histórico e essencial centralismo, protagonista de umha aparente contradiçom resolvida até hoje em favor de um centralismo vernizado de neoregionalismo. A plasmaçom desse modelo chamado ‘simétrico’, e que ficou conhecido nos anos 70 como ‘café para todos’, plasma-se na existência de duplicidades funcionais como a jurídica entre naçom (‘pátria comum e indivisível’) e nacionalidade histórica (sem atributos ou competências qualitativamente diferentes das regionais, subsumidas todas elas no comum conceito administrativo de ‘comunidade autónoma’); a subsistência das deputaçons e as províncias, junto às novas etnidades autonómicas; a existência de tribunais territoriais (como o Superior de Justiça da Galiza) dependentes de instáncias políticas espanholas e inferiores a organismos judiciais alheios à Galiza; a cooficialidade subalterna dos idiomas da Galiza, País Basco e Catalunha, reduzidos a direitos individuais face à oficialidade efectiva do espanhol, único oficial e obrigatório em todo o território estatal; a incapacidade das instáncias autonómicas para decidir soberanamente sobre ámbitos tam importantes como o fiscal, o económico, a segurança, o desporto de competiçom ou a protecçom da costa e o território; com importantes restriçons em campos como o mediático ou matérias como a educativa, com conteúdos maioritariamente impostos à margem de critérios de cada naçom, para garantir o controlo e a reproduçom ideológica dos interesses unitários e assimilistas espanhóis; a impossibilidade, enfim, de negociar directamente com instituiçons supracionais assuntos atinentes em exclusiva a interesses galegos. Por se havia dúvidas sobre a intromissom permanente e a indisposiçom absoluta da autocracia espanhola em relaçom aos povos dependentes e aos seus direitos inalienáveis, o debate aberto nos últimos anos em torno das reformas estatutárias serviu para explicitar o afám opressivo e invasionista do Estado monárquico espanhol, anulando decisons maioritariamente to-


madas por parlamentos autonómicos como o catalám (na proposta inicial de reforma do Estatuto) ou o basco (no chamado Plano Ibarretxe, chumbado em Madrid contra o critério das forças maioritárias de aquela comunidade autónoma). O antidemocrático veto chegou nos últimos meses à ameaça de suspensom de autonomias ‘rebeldes’ que decidam realizar consultas democráticas aos respectivos povos, em resposta ao anúncio nesse sentido realizado polo lehendakari Ibarretxe. Nom é essa a única ameaça re-centralizadora introduzida ultimamente no debate político polos grandes partidos espanhóis. A reforma da Lei eleitoral para restar força aos partidos autonomistas e nacionalistas é umha vaza de reserva polo limitado

te da Galiza –e das restantes naçons sem Estado da Península– a interesses foráneos, um ente chamado ‘povo espanhol’ que tem atribuiçons sobre questons que nom lhe dim respeito, a nom ser que se negue, como de facto acontece, a existência de direitos próprios dos povos que a Constituiçom monárquica espanhola chama ‘nacionalidades’. Deste modo, a espiritual ‘unidade de destino no universal’ joseantoniana vê-se continuada num projecto secular, mas igualmente autoritário e essencialista, que na actualidade fai do mercado o centro dos interesses oligárquicos na hora de manter a qualquer custo o que chamam ‘naçom espanhola’, impedindo que novos povos se separem como nos últimos dous séculos figérom vinte naçons hoje constituídas em Estados independentes (a última, a Guiné Equatorial, em 1968). A língua, a nacionalidade, os símbolos, a história, o ensino… nada escapa a essa desesperada defesa do projecto nacional espanhol, inacabado e, apesar de todo, ainda enfrenta-

Ao contrário do que costumam afirmar os altifalantes mediáticos e propagandísticos do regime, o modelo espanhol fica longe do confederalismo, do federalismo e até de certo grau de descentralizaçom existente em determinados estados unitários, quer republicanos quer monárquicos. Estamos a pensar em casos como o suíço (república federal), o canadiano ou o belga (monarquias federais), que reconhecem a territorialidade lingüística e amplas competências de todo o tipo às naçons e territórios federados, e dos que inclusive permitem a realizaçom de referendos de autodeterminaçom (no caso do Canadá). Nom esqueçamos que, em menos de duas décadas, desde a declaraçom de independência da Lituánia em 1990, mais de vinte novos estados surgírom só no ámbito europeu, a maioria por vias pacíficas e graças, em parte, à presença do direito de autodeterminaçom na Constituiçom da URSS. Por mais que a propaganda espanhola oculte e manipule informaçom, que-

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A ilegitimidade da democracia espanhola

exercido no nosso continente pola República de Montenegro, independizada em 2006 através de um referendo reconhecido pola mesma Uniom Europeia.

A Carta Fundacional da ONU (1945), o Tratado de Helsinki (1975), a Carta de Argel (1976), a Carta da Organizaçom das Naçons e os Povos Nom Representados (1991) e a Declaraçom Universal dos Direitos dos Povos (2001), entre outros documentos e tratados internacionais, e até a Constituiçom da vizinha República portuguesa, nascida essa sim de um processo de ruptura democrática com o fascismo, mantenhem de actualidade o reconhecimento desse direito, exercido repetidamente por naçons como o Quebeque, território francófono dependente do Canadá.

reportagem análise

Dia da Galiza análise Combatente

Portanto, o sistema jurídico-político derivado da ditadura golpista liderada durante décadas polo general Franco no Estado espanhol só pode ser avaliado, trinta anos depois da sua imposiçom sem mais alternativa que a ditadura, como profundamente deficitário em termos de direitos e liberdades, neste caso colectivas. Continua pendente o reconhecimento do direito de autodeterminaçom para, no mínimo, três naçons sem Estado, bem como a consulta sobre a forma de governo para os restantes territórios sob administraçom espanhola, pois nom devemos esquecer que o actual regime vem usurpar a legitimidade republicana de 1931-36, nunca restaurada após o golpe de estado fascista desse ano. Nem reformas estatutárias, nem pactos superestruturais para libertar pressom periodicamente, poderám desactivar a reivindicaçom nacional de povos que, como o galego, nom nos resignamos à assimilaçom por parte do nosso inimigo histórico. Hoje mais do que nunca, frente a descentralizaçons e re-centralizaçons de puro carácter administrativo, reafirmamo-nos nas ideias do movimento de libertaçom nacional galego, porque autodeterminaçom é democracia.

avanço na laminaçom dos fenómenos nacionais basco, catalám e galego. A imposiçom do que podemos denominar ‘lógica demográfica’ para negar a decisom soberana do nosso e de outros povos mantém presa a sor-

do a outros projectos nacionais que se afirmam cívica e democraticamente contra as imposiçons do nacionalismo orgánico-historicista do Estado espanhol.

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rendo reduzir o exercício do direito à livre determinaçom às colónias clássicas do chamado terceiro mundo, a realidade é que documentos jurídicos de instituiçons internacionais mantenhem nos dias de hoje esse direito em activo. De facto, foi ainda recentemente

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Dia da

As instituiçons espanholas na Galiza som, basicamente, negadoras da identidade da naçom galega e dos direitos do povo galego, ao ponto de negarem a existência de um povo galego como tal. Quando do sistema se fai referência ao “povo galego”, na realidade nom se fala de um sujeito político de pleno direito, mas de umha base social fundamentalmente espanhola que, naturalmente, dá apoio de maneira incondicional às instituiçons do Estado espanhol (o seu aparelho de propaganda, o seu aparelho repressivo, as suas leis, o seu sistema educativo...) Galiza, a sua territorialidade e o povo galego O Estatuto de Autonomia de Galicia, que é a lei fundamental da Comunidade Autónoma da Galicia, postula de maneira inequívoca quem tem direito a ser considerado como galeg@: ARTIGO 3 1.Para efectos do presente Estatuto, gozan da condición política de galegos os cidadáns españois que, de acordo coas leis xerais do Estado, teñan veciñanza administrativa en calquera dos municipios de Galicia. 2.Como galegos, gozan de dereitos políticos definidos neste Estatuto os cidadáns españois residentes no estranxeiro que tivesen a súa última veciñanza administrativa en Galicia, e acrediten esta condición no correspondente Consulado de España. Gozarán tamén destes dereitos os seus descendentes inscritos como españois, se así o solicitan na forma que determine a lei do Estado. A conclusom que disto se pode extrair é que essa lei fundamental que rege o nosso pretenso “autogoverno” e que dá reconhecimento oficial às comunidades galegas no exterior, supedita de maneira clara o facto de ser galego ao de ser espanhol, com o qual, apesar de reconhecer de umha maneira tácita o carácter nacional da Galiza acolhendo-se à figura legal de “nacionalidade histórica”, na prática reduz esse facto a umha questom meramente geográfica: resumindo, som galeg@s aquelas e aqueles espanhóis e espanholas que residem na regiom espanhola da Galiza. O Estatuto também fecha sem possibilidade de emenda a questom territorial:

A ilegitimidade da democracia espanhola

A imposiçom institucional espanhola ARTIGO 2 1.O territorio de Galicia é o abranguido polas actuais provincias da Coruña, Lugo, Ourense e Pontevedra. 2.A organización territorial terá en conta a distribucion da poboación galega e as súas formas tradicionais de convivencia e asentamiento. 3.Unha lei do Parlamento regulará a organización territorial propia de Galicia de acordo co presente Estatuto. Além de que em vinte e sete anos de Estatuto nom se desenvolveu de maneira séria o ordenamento territorial da Galiza, submetendo-nos ao sistema provincial-local espanhol, absolutamente clientelar e corrupto e de maneira nengumha observador “das formas tradicionais de convivência e assentamento”, nom se abre qualquer via para resolver a questom da territorialidade da Galiza no que di respeito a trerritórios histórica e culturalmente vinculados à Galiza e hoje sob administraçom castelhano-leonesa ou asturiana. De facto, no rascunho que o BNG inicialmente apresentara na abortada comissom para o novo estatuto do Parlamento Galego havia um artigo que previa, ao contrário do actual Estatuto, a possibilidade de serem anexionado à CAG aqueles concelhos que assim o decidissem, e este artigo foi retirado da proposta polo rejeitamento radical por parte do PSOE e do PP, a pressom mediática e as nada veladas ameaças por parte de algumhas vozes do estamento judiciário. É portanto umha questom doutrinária. Por seu turno, a Constituiçom espanhola proíbe de maneira explícita declarar a independência de qualquer território do Estado espanhol, assim como as federaçons entre comunidades autónomas. O exército espanhol é o garante da soberania e integridade territorial do que se entende por Espanha e está facultado para intervir em caso de se considerar em perigo essa integridade territorial. Merece especial atençom este aspecto, já que em nengum momento é a vontade dos povos que a conformam o factor fundamental da unidade da “naçom espanhola”.

ARTIGO 5 1.A lingua propia de Galicia é o galego. 2.Os idiomas galego e castelán son oficiais en Galicia e todos teñen o dereito de os coñecer e de os usar. 3.Os poderes públicos de Galicia garantirán o uso normal e oficial dos dous idiomas e potenciarán o emprego do galego en tódolos planos da vida pública, cultural e informativa, e disporán os medios necesarios para facilita-lo seu coñecemento. 4.Ninguén poderá ser discriminado por causa da lingua. A realidade, apesar de que o próprio Estatuto prevê os mecanismos para encaminhar um processo de normalizaçom que jamais houvo (a redacçom de umha Lei de Normalizaçom Lingüística e a criaçom de umha companhia de rádio e televisom com uns princípios fundacionais orientados ao potenciamento do galego, por exemplo) é que a língua galega está a perder falantes e nom ganha ámbitos de uso. Os sucessivos decretos sobre o uso do galego no ensino tenhem sido sistematicamente dinamitados polos grupos de pressom contra a língua galega (com a ajuda dos meios de comunicaçom de massas, maioritariamente refractários à língua galega) ou simplesmente ignorados polos próprios governos que os ditárom. No ámbito laboral, som cada vez mais freqüentes os casos de repressom ou discriminaçom por

As instituiçons espanholas e a língua galega Extremamente grave é a situaçom da língua, que o próprio Estatuto de Autonomia reconhece como “própria da Galiza”.

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causa do idioma. Cumpre destacar a hostilidade com que o patronato do comércio acolheu a pretensom por parte do governo autonómico de legislar para favorecer o uso do idioma neste sector. Em qualquer caso, a situaçom é de discriminaçom estrutural, desde que a Constituiçom espanhola recolhe como dever de todo cidadao espanhol o de conhecer o castelhano, mas nom existe o dever, a nível de Estatuto de Autonomia, de conhecer a língua galega. Esta situaçom foi descrita no seu dia por Carvalho Calero como de relegamento à condiçom de “língua para objectores de consciência”, quer dizer, só a iniciativa individual é a que garante o conhecimento e a transmissom da língua. A instituiçom encarregada de preservar o bom uso do galego (a única reconhecida para esse labor por Espanha) é a Real Academia Galega, a qual cada dia deixa mais em evidência a ausência de critérios e finalidades realmente científicas no seu agir e o seu papel em realidade legitimador do status actual do galego, para além de actuar de maneira arbitrária e obscurantista nas suas funçons sancionadoras da normativa, um factor que opera precisamente a favor da hostilidade contra o galego, e introduzir um discurso totalmente criminalizador do reintegracionismo lingüístico. Cumpre


destacar a postura da Real Academia Galega sobre o nome do nosso país, precisamente quando se estavam a dar certos avanços na introduçom da forma “Galiza” a nível institucional. No último acordo normativo, a RAG reconhecia a validez por igual das formas “Galicia” e “Galiza”, mas esta postura foi matizada por pressons políticas recentemente. Na realidade, a RAG reconhece a forma “Galiza” como um arcaísmo, reservando-lhe a condiçom de hábil para o uso institucional normal à forma “Galicia”. É umha maneira de neutralizar qualquer tentativa de legitimar socialmente o uso da forma “Galiza”, receitando-lhe umha marginalizaçom “sanitária”. No poder provincial e local, a língua galega tem um tratamento desigual, destacando o claramente hostil que recebe em Cámaras municipais como a da Corunha ou Vigo. Fôrom episódios também bastante chamativos os da Póvoa do Caraminhal ou Ponte Areias, cujos presidentes de Cámara no seu dia (na altura Durám Casais e José Castro respectivamente) encorajárom polémicas com a Junta da Galiza, opondo-se aos respectivos topónimos oficiais. É bem conhecida a postura do que foi presidente da cámara da Corunha até há pouco tempo, Francisco

Vasques, sobre o topónimo da cidade e a sua negativa, enquanto estivo no poder, a utilizar o galego na actividade interna da Cámara assim como nas suas relaçons com a vizinhança. Outros episódios se tenhem dado de clara hostilidade à língua do País; por exemplo, a negativa do presidente da Cámara Municipal de Lugo, José Clemente Fernandes Orozco, a ceder terrenos para a construçom de Galescolas, ou os alardes de hostilidade ao galego de ex–presidentes de cámara como Afonso Couze Doce ou Joam Juncal em Ferrol ou Ramom Rodrigues Ares em Sada. Mas, voltando ao presente, nom devemos esquecer a declaraçom de insubmissom à normativa municipal de normalizaçom lingüística que se pretende aprovar na Corunha, por parte de vereadores e vereadoras do governo, leia-se Mar Barcom, Carlos Gonçalves Garcês ou Florêncio Cardador. Nom existem meios coercitivos para empecer que cargos públicos abusem do seu poder e eludam a lei em matéria lingüística. Por outra parte, umha figura que se considera com potestade nesta matéria é a do “Valedor do Povo”. O actual Valedor do Povo já fijo ostentaçom em mais de umha ocasiom da sua hostilidade para com a língua galega, “denunciando” pretensas “agressons” ao espanhol e mostrando-se claramente contra qualquer avanço no uso do galego na administraçom ou noutros ámbitos. Outro “território comanche” para a língua é a administraçom de justiça. O cruzamento de queixas judiciais entre o histórico sindicalista e activista pola língua Eduardo Álvares e o Juíz Decano da Corunha, a causa de umha sentença da qual o primeiro reclamava a sua redacçom em galego, serviu para destapar a precária situaçom da língua em meios judiciários e também a indefensom em que nos vemos @s administrad@s quando pretendemos simplesmente que se respeitem os nossos direitos. O povo galego e o seu direito a participar Um episódio que mostra de maneira clara a falta de vontade da classe política que gere as instituiçons espanholas da Galiza de fazer o povo galego partícipe da vida política do País foi o debate do novo Estatuto de Autonomia, que previsivelmente se reactivará depois das eleiçons autonómicas. Este Estatuto ia ser pactuado numha comissom parlamentar, com sessons a porta

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fechada, e dos lances desse debate o povo inteirava-se pola imprensa. Nada nos fai pensar que na próxima legislatura vaia ser diferente. O Parlamento galego, que simbolicamente deveria ser o cenário principal da democracia, nom é um lugar precisamente propício para a liberdade de expressom. Normas absurdas como a proibiçom de despregar faixas ou luzir camisolas alusivas a algumha reivindicaçom, utilizadas por outra parte de maneira arbitrária, som um reflexo de que o Parlamento nom é umha instituiçom que convide o povo a identificar esta como “a sua casa”. As cámaras municipais som também instituiçons que se resistem à participaçom popular. NÓS-Unidade Popular tem promovido iniciativas para que os diferentes concelhos se dotem de regulamentos de participaçom. Poucas som as cámaras municipais que contam com um regulamento, e, nalgum caso, a criaçom de organismos em que teoricamente estaria representada a sociedade local tem lugar com critérios claramente sectários e de marginalizaçom explícita de alguns sectores. A exclusom da CIG do Conselho Económico e Social da Corunha é um claro exemplo, amplamente denunciado por NÓS-UP naquela localidade. O aparelho repressivo espanhol na Galiza Recordemos qual é o pa- pel do exército espanhol na estrutura do Estado para fazermos umha ideia de quais som as funçons reais do exército espanhol na Galiza: Artículo 8 1.Las Fuerzas Armadas, constituidas por el Ejército de Tierra, la Armada y el Ejército del Aire, tienen como misión garantizar la soberanía e independencia de España, defender su integridad territorial y el ordenamiento constitucional. Isto significa que as Forças Armadas espanholas interviriam em caso de que o povo galego proclamasse a sua indepen-

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análise

A ilegitimidade da democracia espanhola

dência a respeito da Espanha. Os textos legais som interpretáveis, mas a interpretaçom que a própria elite militar espanhola e a classe política espanhola dam a este artigo é mesmo essa, porque assim o tenhem expressado em numerosas ocasions diferentes vozes de representatividade inequívoca.

A Constituiçom espanhola ameaça a populaçom galega. Independentemente de que as posturas autodeterministas podam nom ser maioritárias na nossa sociedade, a ameaça é explícita, além de nom ser a vontade, como já assinalamos, o elemento coesionador na “unidade da Espanha”. Pola sua parte, polícia e Guarda Civil unidas a um aparelho judiciário sob o controlo de elementos reaccionários e com a cumplicidade das grandes empresas de comunicaçom, tenhem jogado um papel sinistro na nossa história social. Nom fai falta remeter-se para tempos remotos. A dura repressom à greve geral de 2002, com encarceramento de quadros sindicais, as operaçons “Cacharrón” e “Castiñeiras” contra a mocidade independentista galega, a actuaçom policial nas greves do metal e da construçom na província de Ponte Vedra, a repressom judiciária e académica contra estudantes nas mobilizaçons contra a LOU ou nos protestos contra a presença da líder ultra-direitista Maria San Gil na Universidade de

reportagem análise

Dia da Galiza análise Combatente


análise

Compostela, a brutal repressom contra vizinhança da Corunha por fazer frente

a fascistas que se manifestavam contra a língua galega, os informes contra-insurgentes que circulam sobre os movimentos sociais a nível interno na polícia espanhola e na Guarda Civil, e que de quando em vez se filtram e se fam públicos... som apenas alguns exemplos que se poderiam dar sobre a actuaçom dos corpos repressivos na Galiza. A hostilidade policial e judiciária contra os movimentos sociais nom fai mais do que confirmar que as funçons dos corpos repressivos do Estado é fundamentalmente contra-insurgente. O saque policial a locais de centros sociais e associaçons culturais ou a criminalizaçom da rede Galiza Nom se Vende som claros casos de agressom ao tecido social galego.

A ilegitimidade da democracia espanhola A isto há que somar a complacência com que som tratados elementos e grupos reaccionários da extrema-direita, apesar de ser publicamente conhecida a sua actividade criminosa, nalgum caso. Recentemente, era julgado um jovem corunhês por se defender de umha agressom fascista (um elemento armado com um punhal). Na

Corunha, tenhem-se dado em diferentes etapas dúzias de agressons de indivíduos de extrema-direita a activistas da esquerda ou a imigrantes e pessoas sem teito, com absoluta passividade por parte das forças de segurança do Estado. Os critérios contraditórios vem-se claramente. A Coroa espanhola e a Galiza Em primeiro lugar, demos umha vista de olhos aos seguintes artigos da Constituiçom espanhola, referentes à Coroa: Artículo 56 1.El Rey es el Jefe del Estado, símbolo de su unidad y permanencia, arbitra y modera el funcionamiento regular de las instituciones, asume la más alta re-

DOSSIER CENTRAL

presentación del Estado español en las relaciones internacionales, especialmente con las naciones de su comunidad histórica, y ejerce las funciones que le atribuyen expresamente la Constitución y las leyes. 2.Su título es el de Rey de España y podrá utilizar los demás que correspondan a la Corona. 3.La persona del Rey es inviolable y no está sujeta a responsabilidad. Sus actos estarán siempre refrendados en la forma establecida en el artículo 64, careciendo de validez sin dicho refrendo, salvo lo dispuesto en el artículo 65,2. Artículo 57 1. La Corona de España es hereditaria en los sucesores de S. M. Don Juan Carlos I de Borbón, legítimo heredero de la dinastía histórica. La sucesión en el trono seguirá el orden regular de primogenitura y representación, siendo preferida siempre la línea anterior a las posteriores; en la misma línea, el grado más próximo al más remoto; en el mismo grado, el varón a la mujer, y en el mismo sexo, la persona de más edad a la de menos. 2.El Príncipe heredero, desde su nacimiento o desde que se produzca el hecho que origine el llamamiento, tendrá la dignidad de Príncipe de Asturias y los demás títulos vinculados tradicionalmente al sucesor de la Corona de España. 3.Extinguidas todas las líneas llamadas en Derecho, las Cortes Generales proveerán a la sucesión en la Corona en la forma que más convenga a los intereses de España. 4.Aquellas personas que teniendo derecho a la sucesión en el trono contrajeren matrimonio contra la expresa prohibición del Rey y de las Cortes Generales, quedarán excluidas en la sucesión a la Corona por sí y sus descendientes. 5.Las abdicaciones y renuncias y cualquier duda de hecho o de derecho que ocurra en el orden de sucesión a la Corona se resolverán por una ley orgánica. A inviolabilidade, irresponsabilidade e imunidade do rei é umha contradiçom evidente com a igualdade dos súbditos espanhóis perante a lei, para além do carácter herditário do cargo. A isto há que somar o facto de que o rei foi intencionadamente convertido no símbolo da unidade da Espanha, com o que esta figura tem a hostilidade de cada vez mais amplas camadas da populaçom galega e também do resto do Estado espanhol. Os sectores soberanistas na Galiza atacam a figura do rei como símbolo que é da privaçom de soberania que sofre o nosso país. A resposta a todos os actos de protesto contra a figura do rei na Galiza e

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noutras partes do Estado foi a repressom judiciária mais implacável. A detençom de quatro pessoas ao termo de umha manifestaçom de Causa Galiza pola queima de um retrato do Rei da Espanha e o seu posterior processamento por parte da Audiência Nacional espanhola dá umha dimensom fiel do carácter central que tem esta figura na estrutura do Estado espanhol. Que o Estado espanhol se apoie numha instituiçom nom democrática, que descanse sobre ela umha boa parte da sua expressom institucional é também um indicador da sua escassa legitimidade. O apoio social às instituiçons O referendo em que se aprovou o actual Estatuto de Autonomia tivo umha participaçom de 21% do censo eleitoral. Certo que 73,35% desses 28% se pronunciou a favor, mas é significativo esse 72% da populaçom galega que nom participou. Quando um processo tem esse índice abstençom, o lógico é perguntar pola sua legitimidade real, mas Madrid nom tivo excessivos problemas para achar umha justificaçom aceitável mesmo para a própria sociedade galega. A explicaçom a este alto índice de abstençom está, claro, na natural passividade d@s galeg@s. Em qualquer caso, a pretensa legitimidade das instituiçons autonómicas está conseguida mais por passiva do que por activa. O grau de conhecimento dessas instituiçons por parte da sociedade galega é quase nulo, e polo geral nom há nem simpatia nem identificaçom para com elas. À maioria espanholista, a autonomia parece-lhe um poder menor, mais molesto do que útil e para a minoria autodeterminista essa autonomia significa simplesmente umha descentralizaçom administrativa sem conteúdo político real. A Constituiçom espanhola foi aprovada em referendo em 1978, com um índice de participaçom de 50,2% na Galiza, atingindo a carta magna espanhola 90% de votos afirmativos. 5,92% dos votos fôrom contrários à Constituiçom e quase metade do censo eleitoral abstivo-se. Também neste caso se poderia falar de um absoluto desconhecimento tanto da “lei de leis” espanhola como das instituiçons do Estado. Antes é o convencimento de que é a única opçom possível o único que nos dias de hoje mantém as instituiçons do Estado espanhol a salvo de serem postas em causa no nosso país.


análise

A ilegitimidade da democracia espanhola

O soberanismo galego perante a reforma franquista

Antecedentes O soberanismo galego, na altura da Transiçom espanhola, está a dar os primeiros passos organizativos de forma independente, após o longo período da pós-guerra. Constituída a UPG pola primeira vez no ano 1963, sera preciso decorrer de mais de umha década para a clarificaçom organizativa e ideológica deste núcleo inicial de militantes marxistas e nacionalistas, processo no qual se irám definindo, com nom pouca tensom, os diferentes posicionamentos entre os diversos sectores que compunham esta pioneira organizaçom do nacionalismo galego e que darám lugar posteriormente às primeiras organizaçons soberanistas galegas. A UPG passará por duas etapas prévias à Transiçom espanhola (a primeira abrangeria desde a sua fundaçom até inícios da década de setenta; e a segunda chegaria até a queda de Moncho Reboiras e a morte de Franco, 1975), e será na segunda quando tomem protagonismo alguns dos actores que serám definitórios na primeira cisom independentista na UPG, no ano 1977. Podemos assinalar dous acontecimentos chaves que marcarám o início desta segunda etapa: a entrada de novos militantes de extracçom operária procedentes da cidade industrial de Vigo: Ramom Reboiras Noia –Moncho Reboiras, Xosé Manuel Garcia Crego e Xosé González –Pepinho– e a participaçom nas luitas obreiras de Vigo e Ferrol. Após umha tentativa falhada de converter a UPG num apêndice da Federación de Comunistas por parte de elementos infiltrados provenientes desta organizaçom maoista espanhola, os novos militantes conseguirám incorporar-se ao Cúmio Central e ocuparám postos no Comité Executivo 1. As luitas obreiras de 72, em Março em Ferrol e em Setembro em Vigo, suporám a incorporaçom de um sector da classe operária galega à luita de libertaçom nacional, fusionando a luita de classes com a emancipaçom nacional. Estes acontecimentos provocarám, No ano 73, o Comité Executivo era conformado por Francisco Rodríguez, Bautista Álvarez, Casal, Manuel Mera, Pepinho, Ramom Munhiz de las Cuevas e Moncho Reboiras.

além da proletarizaçom do partido, que nom demorará a criar a Frente Obreira –comandada por Moncho Reboiras, um importante desenvolvimento orgánico que, por sua vez, desencadeará um esclarecimento e umha concreçom no plano ideológico e organizativo. Nos Estatutos Provisórios de 74, define-se já a UPG como germe do futuro Partido Comunista Patriótico, incorporando-se o centralismo democrático e o marxismo-leninismo pensamento Mao Zedong. Ao mesmo tempo, reestrutura-se a actividade política, impulsionando diferentes organizaçons sectoriais (Comités de Axuda á Loita Labrega (CALL), a UTEG (Unión de Traballadores do Ensino de Galicia), o SGTM (Sindicato Galego dos Traballadores do Mar), ERGA, o STBG (Sindicato de Traballadores da Banca de Galicia) e, finalmente a AN-PG (Asemblea Nacional-Popular Galega), em Abril de 75, como coordenadora de todas as frentes anteriores. Outra conseqüência das anteriores incorporaçons e das novas luitas operárias será a da criaçom da frente armada. Acçons de luita de baixa intensidade 2, a política de relaçons internacionais 3, junto com a crise do regime franquista agudizada com a execuçom do almirante Carrero Blanco pola ETA e os contactos com ETA (pm) a raiz das declaraçons conjuntas, juntamente com o novo caminho que se abre em Portugal a partir de 25 de Abril de 74, terminam de dar o pulo que necessitavam para lançar o novo projecto armado. Este terá a sua posta em andamento, a partir de Fevereiro de 75, da mao, entre outros, de Moncho Reboiras. As primeiras acçons levadas adiante fôrom de interesse económico e avitualhamento. Ao mesmo tempo, tratam de enviar militantes galegos para treinar com a ETA (pm), a qual

manda um observador à Galiza: Miguel Legarza Eguís, alcunhado como Lobo, o qual resultou ser um infiltrado da polícia e responsável, em grande medida, polo desarticulamento da frente armada da UPG no Verao de 75. Será a partir de 11 de Agosto, coincidindo com a presença do ditador na sua residência de Verao, quando se desata umha razzia policial contra o nacionalismo galego e contra o comando basco. Há detençons em toda a geografia galega –perto de 30 pessoas passam a disposiçom do juiz– desmantelamento de numerosos andares francos, e, ao dia seguinte, morre o responsável do comando –Moncho Reboiras– num confronto armado com a polícia. A repressom, que nom se cingiu só aos militantes da frente armada, provocará umha fugida em massa face Portugal, a tal ponto que a maioria da direcçom da UPG se encontrará no país vizinho; na Galiza decretam-se algumhas medidas encaminhadas a afogar o nacionalismo galego: proibiçom da realizaçom de actividades culturais de signo gale-

No ano 1974, fôrom detid@s três estudantes –Maria Aurora Prata Casais, Maria do Carmo Sam Tisso Branco e Carlos Sánchez Pardo– acusad@s de colocarem uns artefactos explosivos com propaganda alusiva ao Dia da Pátria. Algo que acontecerá em mais ocasions ao longo destes anos. ETA, LUAR, MFA, PRP, UDB, IRM (Sinn Féin+IRA), EHAS, Cymru Goch, PSAN(p), Esquerra Catalana dels Treballadors, Su Populu Sardu e Lutte Occitane, etc, a qual terá a sua plasmaçom nas sucessivas declaraçons conjuntas como a I Carta de Brest –crítica ao colonialismo interno europeu– assinada polo IRA, a UPG e a ETA; no ano 73, produz-se a II Reuniom de Brest, em 74 a terceira, em Abril de 75 a quarta e, finalmente, em Janeiro de 76 há um comício conjunto da UPG, ETA e o PSAN (p) na cidade portuguesa do Porto.

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guista e um aumento generalizado do controlo e da repressom, chegando a criar-se grupos parapoliciais. Quatro militantes da UPG entrarám na cadeia: Xosé Maria Branhas, Xoán Manuel López “Lito”, Maria Luisa Vázquez Barqueiro e Manuel Fernández Rodríguez, na qual permanecerám dous anos até a amnistia do ano 1977.

reportagem análise Morte de Franco e início da Transiçom espanhola A repressom que se seguiu ao desmantelamento da frente armada da UPG coincide com a morte na cama do Ditador, o início da transiçom para a democracia burguesa espanhola e para a II Restauraçom Bourbónica. Perante o novo cenário, os partidos e organizaçons políticas optarám por duas vias completamente opostas. De umha parte, deparamos com os partidos que pactuárom a Transiçom: PSOE, PCE, PSP, PTE, ORT, etc; os quais criarám duas plataformas, umha controlada polo PSOE (Plataforma de

Dia da Galiza análise Combatente


análise

Convergência Democrática) e a outra polo PCE (Junta Democrática). Na vertente contrária, situam-se as organizaçons que

apostam na ruptura democrática, posiçom na qual se insere o soberanismo galego que, tal como os restantes movimentos nacionais rupturistas periféricos, acrescentará como ponto substancial das reivindicaçons políticas do momento o reconhecimento e exercício do direito de autodeterminaçom. Perante a criaçom destas duas plataformas da “oposiçom” espanhola, a UPG tomará a iniciativa de criar um organismo que coordene as organizaçons nacionalistas galegas que apostam pola ruptura democrática, nascendo assim o Conselho de Forças Políticas Galegas (CFPG) em Janeiro de 1976, formado inicialmente pola própria UPG,

A ilegitimidade da democracia espanhola o Partido Socialista Galego (PSG) e o Partido Galego Social-Democrata (PGSD) de J. L. Fontenla. Posteriormente, incorporam-se ao CFPG o Partido Carlista e ainda o Movimento Comunista de Galiza (MCG), duas forças que obviamente nom podemos carcaterizar como nacionalistas galegas. A vida orgánica deste entidade será efémera, pois em Novembro do mesmo ano da sua constituiçom, 1976, romperá irremediavelmente. A causa-escusa da fractura será a entrada do MCG, força que nom contava com o apoio da UPG devido, entre outros factores, à sua política sindical. A UPG exigia que @ s militantes do MC abandonassem CCOO, integrando-se no SOG. Perante a negativa do MCG a acatar essa condiçom, o Conselho fracturase. Se bem esta pudesse ser a razom oficial da ruptura, há que ter em conta que no ano 76 se dam umhas importantes tensons dentro da AN-PG, organizaçom de massas que, neste novo período, adquire umha importáncia fundamental. Concebida como um organismo interclassista e suprapartidário de filiaçom individual, antecedente directo do futuro poder popular galego, no seu seio conviviam diferentes sectores nacionalistas, desde o PSG e a UPG até expuls@s desta última. O fracasso do CFPG vai parelho à expulsom de Pepinho e ao abandono da UPG por parte de X. M. Garcia Grego, com a conseguinte passagem a primeiro plano na direcçom da UPG de militantes como Francisco Rodríguez, Ramom Lôpez Suevos ou Elvira Souto

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Presedo. A expulsom deste militante e o abandono de Crego, poderia nom ter maior releváncia, dados os argumentos “oficiais” e levando em conta que nom era a primeira vez que se produziam expulsons no seio da UPG, se nom fosse porque o expulso e o que abandonava em solidariedade representavam umha linha contrária ao novo rumo que estava a encetar a UPG. A UPG promove o BN-PG como plataforma eleitoral, acusando as restantes forças de espanholistas e erigindo-se como única organizaçom “verdadeiramente nacional-popular”. O BN-PG, perante a convocatória de eleiçons legislativas para Junho desse mesmo ano, decide legalizar-se, tal como a AN-PG e a UPG, com o objectivo de se apresentar na contenda eleitoral. Teoricamente, o BN-PG apresentavase para defender o programas da Bases Constitucionais, sendo consciente de que as eleiçons nom se realizavam numhas condiçons plenamente democráticas. A UPG, embora continuasse ilegalizada, estava a dar os primeiros passos face à integraçom no novo jogo político que se abria com a Transiçom, estratégia que contará com a oposiçom de diferentes e sucessivos sectores que protagonizarám diversas cisons ao longo da década de oitenta. A decisom de se apresentar às eleiçons provoca novos problemas no seio da UPG e da AN-PG, concretamente com o sector liderado por Méndez Ferrim, que concluirá com um contingente importante expulsons.

A constituiçom da UPG-lp Desde finais de 1976 e ao longo do ano seguinte, vários grupos abandonam ou som expulsos da UPG ou da AN-PG. Estes militantes começam a estabelecer contactos entre si, realizando juntas a nível local e, mais tarde, nacionais. Este novo grupo estava formado por militantes como Pepinho, Crego, Antom Bértolo Lousada, Luís Souto, Gerardo Rodríguez Árias o “Aviador”, Manuel Pousada Cubelo, Francisco Xavier Vilaverde “O Tupa”, Iago Santos Castroviejo, Marisa e Nevo Álvarez Santamarinha, Pilocha, Pituco, Marisa Garcia Pasim, etc. Pode-se afirmar que a nova organizaçom estará conformada por pessoas procedentes de quatro sectores diferenciados: militantes sem organizar procedentes da UPG, o grupo liderado por Ferrim, também procedente da UPG, sectores do proletariado viguês procedentes da Organización Obreira e retornados do exílio.

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Esta nova organizaçom apostará claramente na ruptura democrática. Nos seus textos analisam o novo cenário político aberto após a morte do Ditador. Partem de que o processo iniciado é um pacto assinado entre a esquerda reformista (tanto política como sindical), os partidos emanados do anterior regime, nomeadamente a UCD junto dos sectores franquistas. Arremetem duramente contra a Reforma Suárez e o Pacto da Moncloa, alternativa adoptada polo capitalismo espanhol para poder sair da crise em que se acha. Perante este cenário, que condena à ruina os sectores produtivos galegos, solicitam a abstençom e a boicotagem nas eleiçons de Junho de 1977, entendendo que nom se dam as mínimas garantias democráticas para se realizarem. As razons principais para solicitarem a abstençom som que se realizam numhas condiçons anti-populares e contrárias aos interesses galegos e operários, nom estám legalizados os partidos nacionalistas de esquerda e há um forte controlo por parte do Estado tanto do processo eleitoral como dos meios de comunicaçom. Aliás, outra mostra mais de falta real de democracia é a existência de presos políticos nas cadeias espanholas. Umha vez decorridas as eleiçons, analisam os resultados afirmando que a elevada abstençom na Galiza, a maior em todo o Estado, tem duas explicaçons. De umha parte, significa que o povo galego está consciente de que os seus problemas nom vam ser resolvidos por via eleitoral; por outra, a falta de umha alternativa galega definida e clara, em parte devido a divisom existente no campo nacionalista.

O Partido Galego do Proletariado (PGP). Primeiros passos de Galicia Ceibe (Organización de Liberación Nacional) Entre os dias 23 e 25 de Março do ano 1978, numha localidade próxima de Vigo, tinha lugar o congresso constituinte do Partido Galego do Proletariado, a primeira organizaçom política galega da segunda metade do século vinte que, sem nengum tipo de ambigüidades, se declara independentista. O PGP adoptará posicionamentos muito críticos perante diferentes alianças nacionalistas que se fraguárom nestes anos, para os que foi reiteradamente excluído. Primeiramente Unidade Galega (UG), formada polo POG, PSG e PG como aliança eleitoral para as legislativas e municipais de 79 e, posteriormente, a Mesa de Forças


Políticas Galegas (MFPG), conformada polo BN-PG e PSG em 1980, que terá como plasmaçom mais evidente a apresentaçom conjunta destas duas organizaçons às primeiras eleiçons autonómicas –Outubro de 1981– e as legislativas de 82. No segundo número do Sempre en Galicia, vozeiro da organizaçom, fará-se umha análise bastante negativa da conjuntura política do momento, definida principalmente pola desuniom entre as forças nacionalistas ainda existindo um clima favorável à convergência entre amplos sectores das respectivas bases sociais. Criticam a aliança eleitoral por esta alicerçada num “programa de direita” estabelecido entre o PSG, PG e POG, da qual se excluiu o BNPG. Como analisam que a experiência da primeira AN-PG foi muito favorável para a introduçom social do nacionalismo galego, reclamam a cristalizaçom de outra aliança. O PGP considera que é necessário criar urgentemente umha organizaçom de massas, que se declare pola autodeterminaçom, para dar cabimento tanto aos postulados independentistas como aos federalistas; plural, reconhecendo a existência de correntes no seu seio como conseqüência natural do conteúdo sociopolítico do nacionalismo galego; de filiaçom individual para evitar interferências com as organizaçons políticas partidárias; e assemblear. As directrizes que emanam deste texto, escrito a inícios do ano 79, rapidamente se farám efectivas. Assim, no seguinte número do vozeiro, dá-se conta da criaçom de Galicia Ceibe (Organización de Liberación Nacional), estrutura política de massas impulsionada ao abrigo do “bom resultado” da candidatura eleitoral que, com homónimo nome, apresentou o PGP às municipais do 79 na cidade de Vigo, atingindo a considerável cifra de 1.908 votos.

Posicionamento eleitoral Durante a sua curta trajectória política, o PGP tivo que fazer frente a duas convocatórias eleitorais mais a dous referendos: as legislativas de 1 de Março de 79 e as municipais de 3 de Abril de 79. Nas duas o PGP chama ao boicote, entendendo que a participaçom nelas supom umha aceitaçom de facto

do quadro jurídico-político emanado da Transiçom, assim como por as considerar ineficazes para solucionar os problemas da imensa maioria do povo galego. As razons mais pormenorizadas que sustentam esta lógica absentista encontramo-las na resoluçom do Cúmio Central do PGP de 11 de Janeiro, reproduzido nas páginas do Sempre en Galicia. Afirma-se que, no caso de atingir representaçom no Parlamento espanhol, ao nom ter possibilidades de formar grupo parlamentar próprio, haveria que fazer de comparsas dos restantes partidos e, seguindo com o seu maximalismo, centram o apelo ao boicote na inviabilidade de atingir nas Cortes de Madrid os objectivos do programa do PGP. Na reflexom também deixam patente que umhas eleiçons emanadas de umha Constituiçom que nom reconhece o direito de autodeterminaçom nom podem ser aceites por umha organizaçom independentista. No final do comunicado, voltam a solicitar dos partidos nacionalistas galegos valentia política para nom se apresentarem às eleiçons, como primeiro passo para consumar um acordo nas municipais. Mas o PGP, neste mesmo comunicado, deixa claro que nom nega por sistema a participaçom nas eleiçons, mas devem considerar imprescindível a existência de umhas condiçons mínimas para que a presença do independentismo nelas signifique um avanço “revolucionário” e nom “un aval pra o proceso dirixido polas clases dominantes”. Assim, para as municipais de Abril de 79, perante a falta de resposta para umha aliança nacionalista, consideram que os militantes do PGP devem apoiar e incluso participar, nas candidaturas nacionalistas, “alí onde non houberan incluidos elementos de duvidoso carácter popular”. Seguindo esta resoluçom, militantes do PGP participarám nas candidaturas do BN-PG e de Unidade Galega (UG) como independentes e, na cidade olívica, conformam a “Agrupación Electoral Galicia Ceibe”, que obtém 1.908 votos, como indicamos anteriormente. O resultado desta operaçom política foi bastante positivo para o independentismo galego, conseguindo vereadores eleitos em Monforte de Lemos –Antom Árias Curto, Melide, Compostela –Francisco Torrente e Vila-Boa –Xosé Patrício Recamám, embora seja surpreendente que nom se mencione este “sucesso” nas páginas do seu vozeiro. Sim emitirám um comunicado, como Agrupación Electoral Galicia Ceibe, para valorizar e celebrar os resultados de Vigo e aplau-

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dir os do nacionalismo em geral, chamando novamente à unidade.

análise

A ilegitimidade da democracia espanhola

Contra a Constituiçom espanhola O PGP, tal como todas as organizaçons nacionalistas de esquerda e da esquerda rupturista espanhola, posicionou-se em contra da Constituiçom proposta no ano 78. Além da sua participaçom nos “Comités contra a Constitución” (CCC), articulados na Galiza contra este referendo, o PGP realizará em solitário umha campanha sob a legenda “Ante o Referéndum Constitucional: ABSTENCION ACTIVA”, editando diverso

-Outorgamento do direito à patronal do “lock-out” e à intervençom do Estado nos conflitos operários. -Confessionalidade do Estado e apoio à Igreja católica. -Estabelecimentos de Estados de excepçom, alarme e guerra. Em relaçom com os conteúdos relacionados com a libertaçom da Galiza situam como inaceitáveis: -Consagraçom de um Estado unitário em lugar de um federal ou confederal. -Direito das nacionalidades e regions à autonomia, sendo componentes da naçom espanhola. -Institucionalizaçom da diglossia: o es-

material entre o que destaca um caderno de 14 páginas em que se explicam as razons para boicotar o referendo. Partindo da premissa de que a Constituiçom tem como objectivo “cambear algo pra que nada se conmova” salientam o que consideram som os conteúdos gerais inaceitáveis do texto: -A restauraçom bourbónica tanto polo tipo de regime que instaura –a monárquica– como por ser a continuidade do franquismo. -Institucionalizaçom do capitalismo como sistema económico.

panhol é língua oficial do Estado e as línguas das naçons sem Estado som oficiais nos territórios autónomos: língua dominante, única com o dever de ser conhecida, e línguas dependentes. -A bandeira galega só poderá ondear se for acompanhada da espanhola. -As forças armadas tenhem como missom defender a integridade territorial do Estado e o seu ordenamento constitucional, o que supom que, no caso de o povo galego querer autodeterminar-se, haveria que enfrentar-se directamente com o Exército espanhol

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análise

re-

Dia da

-Na prática o Senado nom vai ser umha cámara territorial. Também citam as limitaçons reais da autonomia: -Jurisdiçom espanhola. -Mínimas capacidades nacionalizadoras. -A planificaçom económica e fiscal é competência do Estado. -Se bem o método de estabelecimento dos Estatutos autónomos, umha vez aprovado em Madrid, se plebiscitará na Galiza, virá cozinhado polo Congresso espanhol. -A administraçom da defesa, alfándegas, moeda, pesca, recursos mineiros e energéticos, imprensa, rádio, TV, aproveitamentos hidraúlicos, títulos académicos, etc, corresponde ao Estado, ainda que as Autonomias poderám solicitar trespasso de competências, quer dizer, “mendigando migallas”. -O Governo espanhol tem capacidade para modificar leis aprovadas no Parlamento galego, obrigando a que voltem a ser debatidas e aprovadas por maioria absoluta.

-Se o Governo espanhol entender que num território autónomo nom se cumpre a Constituiçom, pode adoptar as “medidas necesarias” para restituir a legalidade vigente. Por todo isto, o PGP considera que: “(...) no marco da Constitución non é posibel obter ningún estatuto de autonomía “nacional e progresista”. Dito nou-

A ilegitimidade da democracia espanhola tras palabras: no marco da Constitución non cabe unha situación de autogoberno pra Galicia que nos achegue ao exercicio de autodeterminación. Toda práctica nacional-popular pasa, pois, por oporse á Constitución”. A campanha do PGP veiculará-se fundamentalmente no seio dos CCC, os quais realizarám actos em diversos pontos do país, alcançando especial repercussom os Comités de Compostela e Vigo, que realizam actos públicos em que intervenhem representantes de KAS e LAIA. De facto o PGP assinará um documento conjunto contra a Constituiçom com HASI, LAIA, ANV, e ESB. Em sintonia com a sua proposta da ANE, o PGP, embora estivesse convencido de que a postura mais correcta era a abstençom, valorizou as potencialidades de aticular umha frente comum nacionalista, mas as impossibilidades reais do acordo gorárom a tentativa. O BN-PG apostava no voto negativo, o PSG na abstençom e o POG no voto em branco. O PGP mostrava-se em contra do nom por considerar que esta decisom significava aceitar as regras do jogo da Reforma, e porque introduzia confusionismo ao coincidir com a posiçom das organizaçons da direita espanhola que de parámetros ideológicos antagónicos também se opunham à aprovaçom da Constituiçom. Assim, o POG recebe numerosos desqualificativos porque para o PGP é um “quero e nom podo”: desejariam votar afirmativamente, mas nom podem fazê-lo polo seu passado político. A elevada abstençom registada na Galiza –49,79% (1.049.571 galeg@s)– é analisada e valorizada polo PGP como abstençom consciente, de rejeitamento político da nova estrutura jurídica, tese secundada incluso por destacados comentaristas da época nada suspeitos de radicalismo. O certo é que nom devemos desconsiderar que tam elevada abstençom responda a diferentes factores e motivaçons, entre os que se acha a desconfiança, desinteresse, descontentamento e frustraçom de amplos sectores da estrutura social galega, que provocam que a Galiza, após Euskal Herria, seja a naçom do Estado com o índice abstencionsita mais elevado.

O Estatuto de Autonomia O PGP utilizará o seu vozeiro para denunciar o processo estatutário, desde a Comisión dos 16 até o referendo. No Sempre en Galicia de Julho do ano 80

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reproduz-se a resoluçom do Comité Executivo do PGP em prol da abstençom e polo boicote. A razom fundamental desta oposiçom radica na carência de competências que o Estatuto atribui à Galiza. O contexto endógeno em que tem lugar o debate e posterior campanha do referendo autonómico é algo diferente

morte para o PGP, o 23-F suporá o tiro de graça. Na UPG, o golpe de estado precipitará a resoluçom de umha forte e profunda crise interna com a expulsom de amplos sectores da UPG e da AN-PG ao longo do ano 1981. As duas linhas em disputa eram, por um lado, a vencedora, encabeçada por Francis-

Declaraçom conjunta UPG - PSAN - ETA

dos anteriores. O panorama político da esquerda independentista conta com novos agentes; o PGP dotará-se de umha organizaçom de massas, Galicia Ceibe (oln), que progressivamente assumirá maior protagonismo público em detrimento do PGP; há vários nacionalistas presos nas cadeias espanholas a raiz das detençons realizadas na operaçom contra a LAR –Liga Armada Revolucionária– em Setembro de 1980. Esta nova conjuntura fará com que a campanha anti-estatuto seja aproveitada para denunciar a existência de presos políticos, denunciar a repressom e reivindicar amnistia para os catorze nacionalistas. O Estatuto de Autonomia é aprovado com um dos maiores índices de abstençom da história galega: 72%. Porém, a maioria dos sufrágios emitidos fôrom afirmativos, inaugurando a etapa autonómica no nosso país.

O 23-F e a nova crise da UPG Na Galiza, o golpe coincide com um independentismo bastante fraco e descomposto, fruto das detençons do ano 80, e com umha UPG absorta num debate interno sobre a reformulaçom do que se dava em chamar o movimento nacional-popular para adequálo às novas circunstáncias. Se o golpe repressivo de Setembro foi a ferida de

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co Rodríguez e Pedro Luazes; e, pola outra, Garcia Montes, Bernardo Fernández Requeijo, Suso Vásques, Fernando Pérez, Manolo Reboiras Noia, Fernando Acunha e Manuela Fraguela. Este segundo sector, expulso primeiro da UPG e mais tarde da AN-PG, elabora dous documentos, o Documento Antiliquidacionista nº 1, interno, para debater entre a militáncia da UPG; e o Documento Antiliquidacionista nº 2, de carácter público, em que se relatam pormenorizadamente os acontecimentos prévios e posteriores às expulsons. No referente à importáncia que esta cisom tem para a evoluçom da esquerda independentista no último terço do século XX, cumpre citar dous elementos fundamentais: o processo de adaptaçom ao quadro jurídico-político emanado da Transiçom por parte do nacionalismo maioritário verá-se acentuado a partir do 23-F; e, de outra parte, as expulsons, juntamente com o abandono de militáncia polos temores gerados após o 23-F, provocarám que, em breve, se iniciem as conversas unitárias para reformular o nacionalismo no ano 82, nas quais participa Galicia Ceibe (oln) após muitos anos de sectarismo para com o independentismo.


análise

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OS PACTOS DA MONCLOA A domesticaçom e submetimento do movimento operário

A ocultaçom, tergiversaçom e maquilhagem do passado é a prática habitual do aparelho ideológico espanholista para abordar um grande número de acontecimentos históricos. Nom é um acaso, senom um mecanismo necessário para conseguir legitimar o status quo vigorante. A história (e entendamos que nos estamos a referir nom “ao que se passou” senom “ao que se nos di que se passou”) é empregada para oferecer-nos umha visom falseada que se adapte ao que o poder quer que a sociedade acredite. Um dos maiores e melhores exemplos do que estamos a dizer é o discurso oficial sobre a chamada “transiçom democrática”. Um discurso que em multidom de ocasions se contradi abertamente com os factos reais, de maneira especialmente escandolosa enquanto boa parte da populaçom do Estado os viveu em primeira pessoa. Porém, é bem sabido que as memórias individuais tendem a ser fracas e que para a gente comum resulta muito difícil contextualizar a suas vivências pessoais no quadro geral do desenvolvimento histórico. Assim, a criaçom de umha explicaçom falseada pode contar com o consenso de amplas maiorias enquanto jogue com a ignoráncia e a desmemória de muitos e a cumplicidade culpável de uns poucos, de aqueles que sim contam com as ferramentas para comprender o que se passou, mas preferem as comodidades que o poder lhes oferta em troca do seu assentimento. Nesse período que vai da morte do ditador até a definitiva estabilizaçom do sistema político assente na Constituiçom espanhola de 1978, som muitos os factos que respondem a este padrom de falseamento e maquilhagem. Mas desta vez vamos centrar a nossa atençom num dos que talvez seja mais sistematicamente marginalizado, o conhecido como a assinatura dos Pactos da Moncloa. O próprio discurso dominante tende, mais que a falsear estes Pactos, simplesmente a ocultá-los. Recorre para tal ao escasso interesse que adoitam despertar entre o público as grandes decisons macroeconómicas. Assim, enquanto ao falar da Transiçom em qualquer programa da tv ou numha

reportagem de suplemento de jornal dominical os lugares comuns que se repetem som os da agonia do ditador, o juramento do rei, a nomeaçom de Suárez, a legalizaçom do PCE, o “destape”, o referendo da Constituiçom ou o a entrada de Tejero no Congresso dos Deputados; muito raramente aparecem questons mais incómodas como a amnistia dos presos políticos ou os mentados Pactos da Moncloa. Mas, nas raras ocasions em que os Pactos som lembrados, o discurso oficial insiste na demonstraçom de madurecimento e solidez democrática que os actores políticos e sociais mostrárom na hora de acordar as medidas precisas para melhorar a crítica situaçom da economia espanhola. Eles falam de madurez e lealdade democrática. Um observador mais imparcial falaria talvez de aggiornamento. Para nós, que nem nos pregamos ao que ordena Espanha nem somos imparciais, os Pactos da Moncloa som sinónimo de roubo e traiçom.

O porquê dos Pactos da Moncloa Quando se fala da Transiçom, mesmo quando o fazemos a partir de umha postura crítica, muitas vezes se cai numha pobre simplificaçom que se cinge exclusivamente aos factos políticos e esquece o contexto social e económico do momento. A morte de Franco acelerou umha crise política, isso é correcto, mas nom podemos obviar que a oposiçom à ditadura, e em especial o movimento operário, vivia um período de auge desde finais da década de 60. A situaçom de bonança económica vivida no durante o desenvolvimentismo facilitara a emergência de um movimento sindical renovado, veiculado através das Comissons Obreiras. Este movimento sindical, que nasce num período de expansom económica, vai chegar à década de 70 com umha extensom muito ampla apesar das dificuldades geradas pola forçada clandestinidade. Mas a segunda metade da década de 70 vai trazer umha novidade para além da queda da ditadura, a explosom de umha grave crise económica. No ano 1973, os países integrados na OPEP acordaram um embargo de petróleo a aqueles estados que apoiaram Israel na guerra do Jom Kippur. Fruto desta decisom, produziu-se umha escalada nos preços do petróleo

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que abanou a estabilidade do sistema económico capitalista até bem entrada a década de 80. A atitude dos últimos governos da ditadura foi a de assumir os custos da crise sem tomar medidas recessivas, à espera de que a situaçom fosse temporária. Deste jeito pretendia-se nom alimentar a agudizaçom das contradiçons políticas que dirigiam o regime franquista para a sua morte. Mas os desejos dos hierarcas franquistas nom se cumprírom, e a crise revelou-se de natureza estrutural. Assim, mesmo depois da morte de Franco, a situaçom económica explodiu. No momento em que os estados do campo capitalista já iniciaram programas de reajustamento económico, no Estado espanhol toma-se consciência da gravidade da situaçom. O preço do barril de petróleo achavase em 1973 nos 1.63$ e vai passar a mais de 30$ em 1980. Esta espectacular subida virá acompanhada, num Estado que depende em 66% da importaçom de recursos energéticos, de umha acelerada inflaçom. No ano 1976, a inflaçom declarada é de 20%, mas em meados de 1977 já se situa nos 44%. Entre 1973 e 1977, o Estado espanhol acumula 14.000 milhons de dólares de dívida externa, o que supom mais do triplo das reservas de ouro e divisas do Banco de Espanha. Em definitivo, a crise atinge umha dimensom espectacular que se traduz para o comum dos súbditos do reino num aumento espectacular do custo de vida. Também na eclosom do fenómeno do desemprego, disparado polo fechamento de numerosas empresas e polo retorno de parte dos emigrantes radicados até o momento em países europeus também afectados pola crise. Assim, em 1977, o número de desempregados situa-se nos 900.000. Os capitalistas respondem à crise com a bancarrota e a fuga de capitais; pola sua parte, a classe operária contesta com a mobilizaçom e a luita. Assim, o tempo das manifestaçons contra a ditadura é também o de longas e duras greves da classe operária pola manutençom e milhoria das suas condiçons de vida. Os anos 1976 e 1977 serám os das grandes greves que sacodem todo o Estado e que tenhem também umha forte presença no nosso país. No 1976, estima-se que o total de horas nom trabalhadas por causa de greve

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no Estado atinge a abraiante quantidade de 110 milhons, dez vezes mais do que em 1975. A resposta que o governo dá à classe operária é a da repressom, que atinge dimensons especialmente trágicas em sucessos como os de Março de 1976 em Gasteiz, onde som assassinados pola polícia cinco grevistas. Mas a repressom nom basta para estabilizar a situaçom e o poder acorda empregar umha outra táctica.

reportagem análise

Dia da Galiza análise A gestaçom dos pactos Combatente O governo emanado das eleiçons de Junho de 1977, presidido polo que já era presidente por designaçom real, Adolfo Suárez, considera a necessidade de abordar um programa de soluçom para a crise económica que tem que partir de forma obrigatória de um amplo consenso. Este consenso buscará-se entre as diferentes fracçons e partidos políticos que vam do franquismo reformado até o PCE, ficando fora tam só as organizaçons da esquerda nom pactista e as expressons mais ultras do fascismo. O próprio nome de Pactos da Moncloa nasce de toda umha série de reunions que se manterám no palácio que serve como sede do Governo espanhol. Ali, Suárez reúne-se com os líderes políticos, incluídos González e Carrillo, enquanto o seu ministro de economia, Enrique Fuentes Quintana, fai o mesmo com os dirigentes patronais e dos sindicatos UGT e CCOO. Dessas reunions surgem as linhas mestras para a elaboraçom dos dous pactos, um de tipo económico que redige o citado Fuentes Quintana, e outro de tipo político. Polo que se refere ao acordo final, os pactos som assinados polas seguintes pessoas em representaçom dos partidos políticos: Adolfo Suárez em nome do governo, Leopoldo Calvo Sotelo (por UCD), Felipe González (polo PSOE), Santiago Carrillo (polo PCE), Enrique Tierno Galván (polo Partido Socialista Popular), Josep Maria Triginer (polo Partido Socialista de Catalunya), Joan Reventós (por Convergência Socialista de Catalunya), Juan Ajuriaguerra (polo PNB) e Miquel Roca (por CIU). Manuel Fraga, representante da AP, tam só assinou o acordo económico e nom o político. A 25 de Outubro de 1977, produze-se a assinatura dos documentos, e a 27


análise

re-

Dia da

do mesmo mês som ratificados polo Congresso. Pola parte sindical, tam só CCOO manifesta o seu apoio público, embora com notáveis contradiçons internas, enquanto a UGT se manifesta em contra, tal como a práctica totalidade dos sindicatos minoritários e nacionais, caso da ING, ELA ou LAB. Porém, a suposta oposiçom da UGT revela-se com o tempo como um apoio tácito, enquanto as medidas de mobilizaçom contra os pactos serám paulatinamente moderadas.

A ilegitimidade da democracia espanhola belece-se um intercámbio recíproco de favores. A direita assume ceder no campo das liberdades políticas, e a esquerda no das reivindicaçons obreiras. Assim, no documento económico, acorda-se umha moderaçom salarial estabelecendo um máximo de crescimento dos salários acorde com a previsom da inflaçom e nom com a quantia real desta; esta medida supujo de maneira directa que em 1978, com umha inflaçom real de 30% e um aumento salarial previsto de 22%, os salários obreiros perdessem 8% de poder aquisitivo. Além disso, libera-se o despedimento de até 5% dos quadros de pessoal das empresas onde o aumento dos salários suba acima do IPC previsto. Reduzem-se ainda as quotas patronais à Segurança Social, prevendo um au-

A contrapartida que recebem as organizaçons da oposiçom reformista é de tipo político. Assim, recolhe-se a supressom da censura prévia, o reconhecimento do direito de reuniom, a legalizaçom dos partidos políticos e dos sindicatos, a despenalizaçom do adultério feminino, a livre venda de anticonceptivos ou a modificaçom da Lei de Ordem Público; mas, fundamentalmente, o reconhecimento como interlocutores de negociaçom válidos. De facto, o elemento de maior importáncia dos Pactos da Moncloa é a sua carta de natureza como momento fundacional do chamado “pacto social”. Com eles, as organizaçons de matriz obreira que os assinam e acatam fam umha renúncia explícita à transformaçom revolucionária da sociedade, e dam pé a realidade actualmente vigorante.

tos da Moncloa, como já mencionamos anteriormente, é a sua natureza de acta de abertura do chamado pacto social. Com eles, e apesar das iniciais reticências da Alianza Popular dirigida por Manuel Fraga (organizaçom que em 1989 será refundada sob o nome de Partido Popular), o sistema político da II Restauraçom Bourbónica começava a andar alicerçado numhas bases, mais ou menos sólidas, que lhe garantem a necessária pax social. Com a cumplicidade da direcçom das CCOO e a posterior adesom da UGT que tal, como Fraga, ainda demoram um pouco a ir ao rego, grande parte da conflituosidade laboral ficará atenuada e o capital poderá gozar de uns mínimos de estabilidade social. O que se revelará absolutamente imprescindível quando em poucos anos se en-

mento da participaçom orçamentária do Estado no financiamento da mesma. Ou o que é o mesmo: que o que deixam de pagar os patrons à Segurança Social seja subsidiado polos impostos de todos e todas. Também será neste documento que se abrirám as possibilidades da contrataçom temporária da juventude, iniciando umha queda livre até os níveis actuais de precariedade laboral. Isto junto à reforma do sistema fiscal, que passará a basear-se no IRPF e será o meio com que o capital consiga que a sua crise seja financiada polo conjunto da sociedade, em especial polos assalariados que verám como perdem capacidade económica, ao tempo que as grandes empresas recuperam as suas perdas.

As conseqüências dos Pactos da Moncloa A ratificaçom dos pactos no Parlamento espanhol em Outubro de 1977 nom supujo a entrada em vigor de todo o que neles se recolhia, mas o início de um processo de elaboraçom legislativa que recolha os acordos. Logicamente, aqueles aspectos mais incómodos para o poder fôrom aplicados de modo favorável aos interesses do capital, caso da prevista comparticipaçom dos sindicatos na gestom da Segurança Social ou das reformas do sistema educativo, em especial no que toca à introduçom das línguas das naçons oprimidas. De facto, grande parte do acordado seria depois legislado na Constituiçom de 1978. Mas o realmente salientável dos Pac-

tre na fase das grandes reconversons e o desmantelamento da indústria de propriedade estatal; factos que seriam impossíveis de levar avante sem o concurso dos sindicatos reformistas. Paradoxalmente, a orientaçom claudicante das grandes centrais sindicais espanholas foi, em boa medida, a chave que abriu a porta para um maior desenvolvimento do sindicalismo nacional e de classe no nosso país. O espaço que o sindicalismo amarelo deixou foi ocupado por um modo de entender o sindicalismo que nom tolerava que as responsabilidades e as perdas do capital fossem sufragadas pola classe operária.

Assinantes dos Pactos da Moncloa: Tierno, Carrillo, Triginer, Raventós, González, Ajuriaguerra, Suárez, Fraga, Calvo-Sotelo e Roca

O conteúdo dos Pactos Um dos aspectos que normalmente se obvia, por parte dos meios de propaganda oficial, quando se fala dos Pactos da Moncloa é a sua natureza dupla. Evidentemente o próprio nome de Pactos, assim, em plural, revela que se trata de mais de um, mas normalmente nom se especifica o número total. O problema, provavelmente, nom está no número, mas na natureza interrelacionada dos dous aspectos dos Pactos, o de carácter político e o económico; já que pode ser incómodo reconhecer que as bondades da democracia e a liberdade nom se atingírom pola vontade comum de todos os espanhóis, mas por um mercadeio entre os franquistas reciclados e a esquerda reformista. Assim, nos Pactos da Moncloa esta-

DOSSIER CENTRAL

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análise

A ilegitimidade da democracia espanhola

Mitos e falácias do 23F

Os acontecimentos desenvolvidos a 23 de Fevereiro de 1981, quando um grupo de Guardas Civis ao mando do Coronel Tejero assaltam e tomam o Parlamento espanhol e, simultaneamente, Jaime Milans del Bosch, Capitám-General da III Regiom Militar sediada em Valência, declara o estado de guerra ocupando com dúzias de tanques a cidade mediterránica, é um dos capítulos mais obscuros da Transiçom espanhola, mas também dos que deixárom umha profunda pegada na memória colectiva. Contrariamente à versom oficial, o regime aproveitou a tentativa de autogolpe de estado desenvolvida, coincidindo com a sessom em que se ia votar a eleiçom de Calvo Sotelo como substituto a Suárez, para aplicar umha involuçom política no processo de reforma franquista, basicamente para legitimar a monarquia bourbónica e marcar ainda mais os estreitos limites desta pseudodemocracia tutelada

paçom criada aceleradamente para pilotar a Transiçom saltara polos ares polos confrontos antagónicos entre as diversas correntes que co-existiam no seu seio. O PSOE mantinha umha permanente pressom –até o extremo de empregar a moçom de censura– para impor a tam desejada alternáncia política. A Alianza Popular de Fraga Iribarne levava meses à procura de fórmulas para que Suárez a incorporasse ao governo e para que a UCD delimitasse o seu espaço político natural, que considerava estava ilegitimamente apropriando. No grande poder fáctico, o Exército, existia um enorme mal-estar perante as formas e ritmos em que se estava a aplicar a Transiçom. A oficialidade franquista considerava excessivamente acelerado o processo em curso, nom concordava com a legalizaçom do PCE, dissentia da descentralizaçom adminsitrativa que identificava, de forma alarmista, como a antessala da destruiçom de Espanha. A todo isto, devemos acrescentar a crispaçom que gerava a intensa actividade armada da

do-se a hieraquia interna, e acelerando o passo à reserva dos militares claramente golpistas, contribuia a elevar a tensom, gerando enorme malestar nos quartéis. Nom devemos desconsiderar que, no imediato período posterior à morte de Franco, fôrom constantes as tentativas de reconduzir a situaçom por parte do sector mais franquista. Nas salas de bandeiras gorárom-se diversas tentativas de golpe de estado: conspiraçom de Xátiva em 1977, Operación Galaxia em Novembro de 1978, movimentos nas estratégicas unidades da BRIPAC em Janeiro de 1980, entre outras. Nom era nengum segredo que o exército espanhol nom se identificava nem coincidia com a reforma pactuada do regime que impugera pola força em 1936. Embora os Pactos da Moncloa estivessem já assinados, o período era de grande agitaçom social, multiplicando-se as greves e as luitas operárias. A burguesia era incapaz de lograr a estabilizaçom que tanto procurava. Na hora de abordarmos esta etapa,

Intervençom do Bourbon na madrugada de 24 de Fevereiro de 1981

e sempre vigiada polos denominados eufemisticamente poderes fácticos. A complexa conjuntura política da altura estava determinada pola grave crise interna do partido governamental, que tinha provocado semanas antes a demissom de Adolfo Suárez como presidente do Governo espanhol e também da UCD. A fragilidade interna da agru-

ETA, e dos GRAPO em menor medida, e a morna resposta de Suárez no combate ao “terrorismo”. O Exército demandava intervir directamente na luita contra as organizaçons armadas. A política de ascensos aplicadas polo governo promovendo o ascenso de oficiais menos identificados com o franquismo mais doutrinário, saltan-

DOSSIER CENTRAL

nom devemos desconsiderar a conjuntura internacional de agudizaçom da Guerra Fria entre as superpotências imperialistas, após a chegada de Ronald Reagan à Casa Branca. A Administraçom norte-americana nom descartava a possibilidade de um confronto nuclear limitado ao palco centro-europeu. Para o seu sucesso, era imprescindível

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contar com a plena adesom do Estado espanhol, pola posiçom geo-estratégica que ocupa a Península Ibérica. Washington levava tempo a promover governos fortes proclives a soluçons militares nos países aliados do ámbito mediterránico: Grécia, Itália, Turquia, Marrocos, Egipto; e o governo de Suárez mantinha elevadas doses de indecisom e umha política internacional de excessiva neutralidade. Nom tinha adoptado as medidas acordadas em política exterior implementando a tam desejada incorporaçom do Estado espanhol na NATO e na CEE.

reportagem análise

Dia da Galiza análise Combatente

Conjugaçom de diversos golpes Contrariamente à versom oficial que de forma teimosa foi imposta sem a mais mínima concessom à dúvida ou questionamento nos meios de comunicaçom, até a converter em dogma de fé, no 23 de Fevereiro conjugáromse vários golpes que finalmente nom se “complemetárom” pola falta de sintonia nas prioridades dos objectivos por parte dos principais actores. Antonio Tejero Molina, convertido posteriormente em bode expiatório, quando ocupa as “Cortes”, e o general Miláns del Bosch quando ocupa Valência, estavam firmemente decididos a implantar pola força um governo militar legitimado pola monarquia, estavam a dar um golpe de estado ao estilo grego, que pretendia simplesmente impedir o desenvolvimento do sistema constitucional acordado na Transiçom, tencionando forçar um governo militar com ligaçons directas com o franquismo. Representavam o mais reaccionário do estamento militar, que desprezava a democracia burguesa. Mas Tejero também estava a ser manipulado para o sucesso de umha manobra que desconhecia, promovida polo general Alfonso Armada –um monárquico vinculada ao Rei, durante anos foi Chefe da Casa Real e um dos principais assessores de Juan Carlos– que contava com a cumplicidade de sectores da UCD e das cúpulas do PSOE, AP e do PCE, e obviamente a operaçom promovida polo denominado “elefante branco” nom podia ser alheia ao conhecimento da Zarzuela e da embaixada norte-americana. A operaçom que Armada, nomeado dias antes segundo Chefe do Estado Maior (JEME), baptizou como De


A ilegitimidade da democracia espanhola

re-

Gaulle, procurava forçar, após a “providencial“ intermediaçom do Rei, que demorou mais de seis horas a se posicionar no famoso discurso televisivo, passadas as 12 da meia-noite, um governo de concentraçom ou salvaçom

da Guarda Civil recusou aceitar um governo com a presença de ministros do PCE, tal como lhe propujo Armada. Coincidindo com o vigésimo aniversário do golpe, em 2001, diversos meios de comunicaçom filtrárom a composiçom desse governo de “salvaçom nacional” desenhado polos golpistas. Os ministros que acompanhariam o presidente Alfonso Armada seriam Felipe González (Vicepresidente para Assuntos Políticos), José María López de Letona (Vicepresidente para

Dia da

nacional, conformado polos principais partidos do sistema sob a presidência de um militar –ele próprio– para reconduzir e estabilizar a situaçom de crise profunda do processo pactuado na Transiçom, aplicando as decisons estratégicas que reclamavam o grande capital e o imperialismo. Juan Carlos também lograria assim, tal como realmente aconteceu, um reconhecimento e legitimaçom democrática despreendendo-se da mancha original de ser um monarca imposto por Franco; e, perante umha série de decretos de carácter urgente, seriam marcados os límites involucionistas em diversos aspectos da acçom governativa, basicamente no desenvolvimento do Estado das Autonomias e em certos direitos democráticos fundamentais como o de expressom. Deste jeito, conseguia-se incorporar o exército ao processo e satisfazer as demandas de ordem por parte da burguesia. O fracasso foi conseqüência, fundamentalmente, do desconhecimento por parte de Tejero e da trama civil do golpe vinculada com a extrema-direita dos verdadeiros objectivos tácticos que procurava a operaçom. O coronel

Assuntos Económicos), José María de Areilza (Negócios Estrangeiros), Manuel Fraga Iribarne (Defesa), Gregorio Peces Barba (Justiça), Manuel Saavedra Palmeiro (Interior), José Luis Álvarez (Obras Públicas), Miguel Herrero de Miñon (Educaçom), Jordi Solé Tura (Trabalho), Joaquín Rodríguez Sahagún (Indústria), Carlos Ferrer Salat (Comércio), Antonio Garrigues Walquer (Cultura), Ramón Tamames (Economia), Javier Solana (Transportes e Comunicaçons), Enrique Múgica Herzog (Sanidade), Luis María Ansón (Informaçom) e José Antonio Saénz de Santa María (Autonomias e Regions). Os dous militares que conformariam esse executivo junto com Armada fôrom promovidos semanas depois da operaçom golpista. O general de divisom Manuel Saavedra Palmeiro foi ascendido polo Conselho de ministros de 20 de Agosto de 1981 a TenenteGeneral do Exército de Terra, além de ser designado Capitám-General da II Regiom Militar com sede en Sevilha, e Saénz de Santa María também foi ascendido a Tenente-General, assumindo o comando da Capitania da VII Regiom Militar, com sede em Valhado-

DOSSIER CENTRAL

lid, e posteriormente da IV, com sede em Barcelona. A 2 de Novembro de 1983, un ano após a chegada do PSOE à Moncloa, voltou à Guarda Civil como Director-General. Os golpistas estám hoje todos na rua, após terem cumprido mornas e privilegiadas penas de prisom. Armada, depois de 6 anos preso, foi indultado para se reformar e tratar apracivelmente das camélias no seu paço de Santa Cruz de Ribadulha; Tejero, cumpridos uns anos mais, também viu atenuada a sua pena. Miláns del Bosch, falecido em 1997, fora libertado em 91, após nove anos de prisom.

Conseqüências A conspiraçom fracassou tal como a tinham desenhado Tejero, Miláns e a extrema-direita militar e civil, mas foi todo um êxito nos seus objectivos reais. O “golpe de leme”, na afortunada expressom com que Josep Tarradellas definiu o 23F, conseguiu aplicar a involuçom que procurava a burguesia, impor um novo consenso no consenso da Transiçom na hora de limitar as reformas e a velocidade das mesmas, e avançar no bipartidarismo entre o PSOE e AP/PP, à custa da UCD e do PCE. A esquerda radical espanhola naufragou definitivamente e a esquerda nacional galega viu-se envolta numha profunda crise que provocou a sua reformulaçom, em Setembro de 1982. As conseqüências imediatas do 23F fôrom: a incorporaçom na NATO; a aprovaçom da LOAPA (Lei Orgánica de Armonizaçom do Processo Autonómico), que paralisou o processo de descentralizaçom e homologou as 17 autonomias seguindo a lógica de café para todos; a Lei de Defesa da Constituiçom ou “Antiterrorista”, que converteu a “carta magna” num texto sagrado de obrigada veneraçom e constrangiu ainda mais o exercício da liberdade de expressom ao ponto de nos anos posteriores o Governador Civil da Co-

runha impossibilitar à esquerda nacionalista manifestar-se na zona velha de Compostela. Por esta Lei, aplicada com carácter retroactivo, fôrom expulsos do primeiro parlamentinho os três deputados do Bloque, após se negarem a jurar ou prometer a Constituiçom; por esta lei, era delictivo definir a Galiza como naçom; por esta lei, qualquer opiniom contrária à unidade espanhola podia ser penada com multas e detençons. Nesta etapa, os maus tratos, as torturas e os assassinatos estendêrom-se nas esquadras policiais e quartéis da Guarda Civil, e criarom-se as condiçons para a guerra suja dos GAL, previamente ensaiados polos diversos grupos terroristas para-policias, como o Batallón Vasco-español. O exército conseguiu a sua desejada demanda de intervir no combate contra a ETA, despregandose na fronteira pirenaica. Mas também conseguiu disciplinar ainda mais a populaçom, induzindo temor e medo, esse perigo à involuçom e ao golpismo fomentado polo PCE e o PSOE para desmovimentar a classe trabalhadora, numha sociedade que ainda continuava mediatizada polo holocausto de 1936. A direita e a extrema-direita sentiu-se legitimada na sua violência e a repressom laboral aumentou nas empresas, com despedimentos por razons de índole política ou activismo sindical. O 23F acelerou o desencanto e a desmobilizaçom sociais, o afastamento de amplos sectores populares da actividade sociopolítica, a moderaçom e a procura do politicamente correcto em boa parte das organizaçons políticas e sociais da esquerda. O PSOE, com a vitória eleitoral do Outubro de 1982, apoiada polo grande capital, aplicou obedientemente boa parte dos objectivos que perseguia o 23F, tornando realidade os prognósticos de Franco de “que todo fica atado e bem atado”.

Alfonso e Juan Guerra

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Qual é a situaçom actual da língua e a cultura galegas no Berzo e do seu movimento normalizador? Nos dias de hoje, a situaçom que se vive a este respeito no Berzo é como a que se poda viver dentro da Comunidade Autónoma Galega (CAG), mas com o entrave de nom existir nengum tipo de corpo legal que tenha a utilidade de, no mínimo, pôr algum limite à expansom do espanhol. A transmissom oral fora das cidades e das grandes vilas, isto é, no meio rural, mantém-se, mais ou menos como na CAG, mas conhece-se umha cada vez mais forte introduçom do espanhol nestes ámbitos. Nas vilas e nas cidades, como por exemplo Cacabelos, Camponaraia ou Ponferrada (a cidade que exerce de centro neurálgico de toda a regiom berziana), o retrocesso da língua, em praticamente todos os ámbitos, é evidente. Só as pessoas mais velhas destas vilas mantenhem a língua, enquanto os mais novos a

tenhem praticamente perdida, ainda que continuem a empregar muitíssimo vocabulário, expressons, fraseologia, etc... galega. A introduçom da língua galega no ensino, tanto primário como secundário, tem servido para que o ritmo de aculturizaçom nom seja tam rápido, mas nestes momentos nom há nada que lhe ponha freio. O movimento normalizador fai o que pode, tendo em conta que contamos com poucos meios, pouca estrutura, e que muitas vezes temos que fazer frente a um sinúmero de prejuizos, quando nom ataques directos, que nos mantenhem numha situaçom permanente de defesa, sem podermos avançar cara posturas mais activas e novidosas no que à promoçom da língua se refire. No Berzo nom estamos na fase de reivindicarmos o nosso direito a viver em galego, porque ainda temos que reclamar o nosso direito a sobreviver em galego. E isto nom é umha brincadeira. Pensai que nesta regiom

galegofalante, tal como na Seabra ou no Eu-Návia, a nossa língua nom é oficial, nem co-oficial, e isso significa que, por exemplo, nom é legal dirigir-se às instituiçons públicas (concelhos, Junta, deputaçons, mancomunidades...) em galego. Aqui nom podemos fazer cousas que na CAG paracem tam simples como redigir em galego um escrito comunicando a nossa intençom de colocar umha mesa de reparto de informaçom numha praça ou numha rua, porque o concelho em questom nom admitirá a entrada desse escrito, ou, se o admite, responderá que nom tem obrigaçom de conhecer o idioma, e que, portanto, nom atende o escrito. E como isso, cem mil exemplos mais que poderíamos pôr: muitos meios de comunicaçom nom admitem notas de imprensa ou comunicados redigidos em galego (ou bem som enviados nas duas línguas, ou bem só em espanhol, se queres que che fagam caso), ou nom admitem que lhes fagas declaraçons na nossa língua quando realizamos algumha actividade; nom podemos exercer o nosso direito a ser atendidos em galego em comércios, bancos ou qualquer outro tipo de negócio, mesmo que tenham matriz galega; da mesma forma, nengum tipo de escrito oficial pode ser redigido na nossa língua; as crianças berzianas nom som educadas em galego, ainda que vivam em lugares eminentemente galegofalantes e onde o galego é língua de uso habitual; e assim um longo etcetera de situaçons que na CAG som vividas doutra forma. Porque a questom é que se na CAG alguém quer apresentar umha denúncia por ser discrimando por razom de

entrevista

Voz Própria entrevista Igor Lugris, membro de Fala Ceive, militante de NÓS-UP, activista social em defesa da língua e a cultura nacional nesta comarca estremeira

entrevista

Igor Lugris

língua pode fazê-lo, porque existe um corpo legal (mais ou menos útil, mas existe; e outra questom é o resultado final dessa denúncia), mas aqui nem sequer podemos agarrar-nos ao nosso direito a viver em galego, porque esse direito nom existe. Ou melhor dito: o direito existe, aqui como na CAG, mas aqui nom é reconhecido polas instituiçons competentes.

Em datas mais ou menos recentes produzírom-se diversas polémicas com motivo da defesa da territorialidade galega do Berzo e dos outros territórios galegos hoje nom reconhecidos polo Estatuto de Autónomia. Qual avaliaçom fás das mesmas e quê repercussom tivérom no Berzo? No Berzo, e nos outros territórios do que conhecemos como Galiza irredenta, ou faixa oriental, a Galiza nom autonómica, ou com quigermos chamá-los, este é um tema que cada tanto tempo reaparece. Em ocasions, promovido por meios de comunicaçom sensacionalistas (tipo El Mundo, ou similares), que muitas vezes e com total descaramento só pretendem aumentar as suas vendas. Outras vezes, algum pronunciamento político, de umha ou outra margem da raia, cria novamente um barulho mediático que com o passar dos dias, das semanas, fica em nada. E isso é o lamentável. Porque cada vez que sucede umha cousa assim, nom temos a capacidade para reconduzir a situaçom e estruturar um debate, sério, tranqüilo e plural, sobre o tema da territorialidade. E aí as culpas há que reparti-las entre

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entrevista análise entrevista

Igor Lugris

muitos: primeiramente, e porque a nós nos atinge mais ao perto, a esquerda independentista é incapaz, por diversos motivos, de aproveitar essa situaçom. Mas também há que dizer que o resto do nacionalismo e a esquerda soberanista também nom consegue, e em ocasions eu suspeito que nem quer, dar forma a esse debate e utilizálo para avançar nas suas propostas e posiçons. A última vez em que ocorreu umha cousa assim, foi com motivo da proposta que o BNG fazia para a reforma do Estatuto de Autonomia da CAG, em que recuperava a proposta histórica (já recolhida no Estatuto de Autonomia de 36 e em propostas anteriores), de que qualquer território limítrofe pudesse solicitar a sua integraçom na CAG. É claro que o balbordo mediático espanholeiro foi imediato. Isso é normal. Mas o que nom é normal é que o BNG, e o conjunto do nacionalismo, em vez de defender essa postura, democrática, de dar a capacidade ao povo para decidir o seu futuro, imediatamente comece a pedir desculpa e a tentar disfarçar a proposta. Finalmente, a impressom que dava é que isso nom era mais que umha proposta feita para depois ser retirada, e assim poder ter umha imagem de força “séria, moderada, moderna”... No Berzo, estas polémicas vivem-se de diversos modos, como sucedeu com a “polémica” com o mapa da Galiza editado por NÓS-UP, e que fora distribuído um par de anos antes, mesmo pondo-o à venda em diversos estabelecimentos, com grande sucesso. Os meios de comunicaçom, de forma practicamente unánime, fecham fileiras com o espanholismo antigalego mais rançoso, sem permitir que nengumha voz dissidente ache umha fresta por onde fazer-se ouvir. Mas, noutros ámbitos, na rua, no trabalho, muitas pessoas olham com simpatia movimentos assim, e comentam casos anteriores, falam da proximidade com a Galiza em diferentes campos, e do longe que ficam Leom ou Valhadolid (capital da Comunidade Autónoma de Castela e Leom); e nom som poucas as pessoas que apostam em se integrar na Galiza ou em permitir, no mínimo, que essa possibilidade se admita. É claro que as posturas contrárias som muito numerosas, mas eu nom me atreveria a dizer que maioritárias, porque se as-

análise

Análise eleitoral

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“Ainda continua vigente em muitos sectores autodenominados “progressistas” ou “de esquerda” o discurso rançoso, caduco e alienado do espanholismo” sim fosse, se estivesse tam clara, tam evidente, a pertença territorial desta regiom à Comunidade Castelo-Leonesa, nom seria tam necessária umha tam furibunda reacçom por parte de instituiçons, cúpulas de partidos e organizaçons empresariais e sindicais, e meios de comunicaçom. Quando é preciso dedicar horas e horas de televisom, páginas e páginas de jornais, horas e horas de rádio, a defender a “nom-galeguidade” do Berzo, é que a questom nom deve estar tam clara. Da nossa capacidade e fortaleça depende que sejamos capazes de aproveitarmos essas ocasions para criar consciência, para conseguirmos introduçom social, para criar estrutura, por feble que seja, que nos permita avançar, defendendo sempre e abertamente a galeguidade do Berzo. O Parlamento do Hórreo aprovou na anterior legislatura, no ano 2004, e por unanimidade um Plano Geral de Normalizaçom da Língua Galega, que incluia diferentes actuaçons a realizar nos territórios estremeiros. Desenvolvêrom-se algumhas destas actuaçons? Que actividade leva adiante o actual governo bipartido da comunidade autónoma galega no Berzo e que opiniom tés da mesma? Quando no ano 2004 o Parlamento galego aprova por unanimidade, ainda sob um governo Fraga, o PGNL, a esquerda independentista e umha grande parte do reintegracionismo criticouno por diversos motivos. Cá no Berzo, estivemos numha postura complicada, porque ainda que compartilhássemos muitos dos critérios da esquerda independentista e do reintegracionismo para realizar criticas a esse Plano, também pensávamos que as propostas que ali se faziam em relaçom ao que denominavam “galego estremeiro, quer dizer, o galego falado desde sempre em territórios da antiga Gallaecia que hoje nom pertencem à Comunidade Autónoma de Galiza”, eram muito interessantes e importantes para avançarmos no caminho da defesa e promoçom da nossa língua e cultura. Nesse texto, ainda em vigor, mas sem aplicar, o PP, o PSOE e o BNG reconheciam que a nossa língua tem “tanta tradiçom histórica e tanto enraizamento” nestes territórios como na CAG,

mas que “o facto de pertencerem a outras comunidades autónomas produz umha situaçom deficitária no reconhecimento de direitos lingüísticos (...) e nas medidas de protecçom e promoçoms da língua galega”. Se o PP e o PSOE, que sempre mantenhem o discurso da unidade de “Espanha” e de que eles som umha força espanhola, quer dizer, presente em todo o território do Estado espanhol e defendendo os mesmo critérios em todos os territórios, assinam em Compostela um texto destas características, será porque também o PP e o PSOE de Castela e Leom e o das Astúrias pensavam o mesmo? Lamentavelmente nom. O PGNL nom foi mais que fogos de artifício, fruto de um determinado contexto político galego, no qual parece que as três forças políticas concorriam por verem quem prometia mais cousas “para a língua”, sabendo que todo ia ser só umha campanha de propaganda sem concreçom real. Hoje, quatro anos depois de se ter aprovado aquele texto, nada ou praticamente nada mudou. Dos grandes objectivos que se marcavam nesta área, nengum foi levado avante, nem sequer se dérom os primeiros passos para o conseguir. “Garantir a formaçom em língua galega nos centros de ensino das comunidades de fala galega de fora da Galiza”. Som umha grande maioria os centros educativos nos quais nom se oferta a matéria de língua galega, e com certeza, nom há possibilidades de realizar estudos na nossa língua, nem em infantil, nem em primário, nem secundário nem, muito menos, na etapa universitária, onde o galego simplesmente nom existe. “Criar espaços em que os habitantes de territórios galegófonos podam usar a sua língua em qualquer tipo de relaçom”: visto nos dias de hoje, parece umha brincadeira macabra, sem que nengum paso tenha sido dado neste sentido. “Facilitar o acesso das pessoas destes territórios aos meios de comunicaçom públicos de Galiza”: o sinal de rádio e televisom da CRTVG recebe-se, nalguns lugares com dificuldade, mas estes meios nom prestam a mais mínima atençom a estes territórios na sua programaçom nom sendo anedoticamente, e com a chegada da televisom digital o mais provável e que se deixe de poder aceder à TVG nos territórios da faixa leste. “Prestar

a ajuda que estas comunidades demandem para o melhor connhecimento, conservaçom e progresso da língua que nos é comum”: se por isso se entende continuar a sufragar todos os gastos que cria a pequena presença da nossa língua no ensino, para que a Junta de Castela e Leom nom tenha umha escusa para nom renovar os convénios que permitem essa presença, isso sim, está conseguido. Mas com essa atitude só estamos potenciando que a Junta de Castela e Leom se desentenda do problema porque sabe que para isso está a “Xunta”. Outras propostas recolhidas no PGLN nom fôrom nem tratadas, consta-nos, nas reunions bilaterais entre as Juntas castelhano-leonesa e a galega, e hoje em dia quase nom sabemos se rir ou chorar ao lê-las novamente: “recuperar as formas próprias na toponímia dos territórios de fala galega; implantar o ensino de língua galega, integrado no currículo académico, em todos os centros de ensino públicos do sistema nom universitário; que podam leccionar em galego os professores de qualquer ma­téria, como forma de se prepararem para um eventual ensino superior em universidades galegas; lograr umha presença do galego no sistema escolar nom universitário que se aproxime da existente na Galiza; levar a cabo algumha campanha entre os comerciantes da zona para a galeguiza­ çom da rotulaçom, fazendo visível que estám num território de fala e cultura


galega; iniciar conversas com as autoridades políticas das Astúrias e de Castela e Leom para facilitar a utilizaçom do galego na política municipal das áreas galegófonas; potenciar a presença do galego em revistas e publicaçons da zona, poderia-se pensar mesmo num periódico (...) editado em galego que se ocupe dos problemas, da realidade e das notícias da zona...” Enfim, águas de bacalhau. O que dizíamos, fogos de artifício para entreter incautos. Quais som os maiores entraves para desenvolver iniciativas de promoçom do carácter galego dos territórios estremeiros? Que atitude tenhem as organizaçons, políticas, sindicais, sociais, presentes nesses territórios? O problema da territorialidade é complicado em qualquer ponto que se apresente. Por exemplo, e recolhendo novamente a última polémica relacionada com a proposta de reforma do Estatuto do CAG feita polo BNG, em Castela e Leom o PP e o PSOE criticavam o BNG e o riscavam de “imperalista”, “agressivo” e nem sei quantas cousas mais por recolher nesse projecto umha proposta que aparece exactamente igual no Estatuto de Autonomia de Castela e Leom. Ainda mais: proposta semelhante aparecem em diversos estatutos de autonomia. Devemos ter em conta, além do mais, que a questom da identidade “regio-

nal” e a questom territorial em Castela e Leom estám muito vivas por diversos motivos. Em primeiro lugar, porque o sentimento de pertença a umha mesma comunidade autónoma, a um território unido no aspecto social, político, histórico, económico, sociológico... é praticamente inexistente. Umha explicaçom para isto é que umha comunidade autónoma como a que agora existe nom responde mais que a umha decisom política tomada de costas à populaçom deste território e sem base em nengum critério histórico, geográfico, cultural ou de qualquer outra índole, fruto de acordos e pactos da mal chamada “Transiçom”. É evidente que a identidade comum que poda sentir um/umha habitante de Vila Franca do Berzo com um/umha de Monteagudo de las Vicarias em Sória, ou com um/ umha de Horcajo de Montemayor em Salamanca, ou de Ortigosa del Monte, em Segóvia, dado que nom existe historicamente, é bem complicada de inventar. Umha prova é a necessidade que tivo a própria Junta de Castela e Leom de criar umha fundaçom, a Fundaçom Villalar, para tentar gerar (artificialmente, folga dizê-lo), umha tal identidade comum nesta comunidade. Mais um aspecto a ter em conta é o dos diversos conflitos territoriais que existem dentro da CACeL. De umha parte, o “leonesismo”, pretende umha comunidade autónoma leonesa, com base nas três províncias que eles consideram historicamente formantes do reino leonês: Leom, Zamora e Salamanca. De outra, existe o conflito de Trebinho: território basco gerido pola Junta de Castela e Leom, que em ocasions é empregado como escusa para nom avançar no reconhecimento oficial da língua galega no Berzo e a Seabra. Reconhecer direitos à língua galega e aos seus e às suas falantes, implicaria também reconhecer o direitos para o euskera e os seus e as suas falantes em aqueles territórios. E já sabemos qual é a “política oficial” a respeito de Euskal Herria. E neste tema tanto tem falarmos do PP como do PSOE. Muitas vezes ao falarmos do Berzo, esquecemos que este fai parte de umha comunidade autónoma tam extensa e com graves problemas de coesom. Esta é a mesma comunidade autónoma que a de Burgos, Segóvia, Sória ou Palência. E ainda, por citarmos outro

exemplo de conflito territorial, temos que citar a existência de um castelhanismo que é contrário à partiçom da sua naçom, Castela, em, como mínimo, três comunidades autónomas: Castela e Leom, Castela-A Mancha e Madrid. Portanto, o tema da identidade do Berzo é visto dentro da CACeL tendo em conta o panorama descrito. Ainda temos que acrescentar que o leonesismo, quando menos o política e socialmente maioritário, ainda sendo umha pequena força, é profundamente antigalego, e nega nom só a identidade galega do Berzo, mas a própria existência da língua e cultura galegas como autóctonas do Berzo, cousa comumente aceite por todos os estudos filológicos sérios de qualquer universidade ou centro de estudos. Assim as cousas, os maiores obstáculos para desenvolver as nossas iniciativas, além das nossas próprias (in)capacidades, é ter que fazer frente a um ambiente hostil no político e no mediático, mas também muitas vezes no terreno social: nos sindicatos, em diferentes organizaçons e movimentos sociais, etc... Se na CAG hoje em dia é completamente normal que as organizaçons sindicais, por exemplo, empreguem o galego tanto interna como externamente, aqui seria completamente extraordinário, pois nengum sindicato se dirige à sua filiaçom das zonas marcadamente galegófonas em galego. Ainda continua vigente em muitos sectores autodenominados “progressistas” ou “de esquerda” o discurso rançoso, caduco e alienado do espanholismo. Frases como “o nacionalismo é um invento da pequena burguesia para dividir a classe trabalhadora”, ou “os obreiros nom tenhem pátria”, e cousas semelhantes, som habituais. O desprezo pola realidade lingüística e cultural do Berzo é ainda normal, porque se pretende umha uniformidade nesse terreno que já sabemos de onde provém. Como já sabemos, som esses sectores da “esquerda”, que pretendem adequar a realidade aos seus postulados, e nom ao revés.

entrevista análise

“ Galiza nom é só a CAG, do mesmo modo que a CAG nom é Galiza ”

entrevista

Igor Lugris isso nom significa que seja ineludível a construçom dessa força. Os entraves, os impedimentos, as dificuldades para sermos capazes de construir essa força nom som maiores nem mais complicados de solventar que os que podam existir na CAG: serám parcialmente diferentes, mas mais nada. É tam complicado construir um espaço político e social independentista e de esquerda no Berzo como fazê-lo no Barco de Valdeorras ou em Camarinhas, por exemplo. Em primeiro lugar, depende das nossas capacidades, dos nossos recursos, das nossas forças; quer dizer, de nós mesmos e mesmas. Aqui vivemos umha situaçom diferente, certo, por estarmos sob umha administraçom diferente à da maioria do território da nossa naçom, mas nom esqueçamos que tam espanhola é a administraçom da CAG como a da CACeL. Ambas fam parte do tecido instituicional e político do Estado espanhol, ambas respondem aos interesses da classe dominante, e ambas tenhem o mesmo interesse em defender os privilégios dessa classe dominante frente aos direitos do povo trabalhador. Galiza nom é só a CAG, do mesmo modo que a CAG nom é Galiza. Se no Berzo, e nos outros territórios da faixa leste, há um grande trabalho por fazer, nom é menos certo que na CAG há também um imenso trabalho para pôr na ordem do dia da acçom das forças políticas e sociais o tema da territorialidade. Avançar numha margem da raia sem avançar na outra é impossível. Construir na CAG umha força soberanista que nom tenha em conta a unidade territorial, seria um suicídio. Procurar construir no Berzo umha força realmente de esquerda que nom inclua este tema, é seguir avançando por um caminho impossível: o da legitimaçom da “Transiçom”.

análise

Eleiçons autonómicas

É possível a construçom de umha alternativa independentista galega de esquerdas no Berzo? Com certeza, a única resposta possível é sim. É possível a construçom dessa alternativa porque é necessária. Mas

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internacional

internacional Francisco Martins

Nom por esperada, a notícia do falecimento de Francisco Martins Rodrigues deixa de entristecer a esquerda independentista galega. A continuaçom, reproduzimos as reflexons realizadas por NÓS-UP no mesmo dia da sua morte, assim como a adesom enviada ao primeiro acto de homenagem realizado pola Política Operária 1º de Maio em Lisboa, nos locais da Associação Abril em Maio, no Regueirão dos Anjos. A iniciativa contava com umha exposiçom de fotos, trabalhos inéditos, etc... dedicada ao grande revolucionário comunista. Também se recolhiam algumhas das comunicaçons de condolência que diferentes organizaçons figérom chegar à PO. Finalmente, consideramos oportuno difundir umha interessante aproximaçom da sua intensa biografia e do seu pensamento político-ideológico, elaborado polo Centro Social Henriqueta Outeiro.

Francisco Martins Rodrigues

sempre connosco

Memória viva do heróico movimento revolucionário em Portugal, luitador incansável e insubornável pola revoluçom socialista, foi amigo e apoiante da esquerda independentista galega e dos direitos nacionais da Galiza. Viajou em numerosas ocasions à Galiza durante a última década, respondendo a convites de NÓS-Unidade Popular e dos companheiros e companheiras de Primeira Linha. Connosco saiu às ruas de Compostela nas manifestaçons do Dia da Pátria, discursando e escrevendo sempre em favor dos direitos que assistem ao povo trabalhador galego. Coincidindo com a sua morte a 22 de Abril, a Direcçom Nacional de NÓS-UP manifestou o grande pesar pola perda de um exemplar companheiro, transmitindo as condolências ao irmao povo trabalhador português, que perde umha figura histórica, um grande combatente pola causa operária, primeiro contra a ditadura fascista e depois contra a farsa democrática burguesa. Desde os anos da clandestinidade, a prisom e as torturas, e até o seu derradeiro instante de vida, Francisco Martins mantivo as suas convicçons revolucionárias, incluídas as últimas semanas de luita final contra a doença, quando umha delegaçom da esquerda independentista galega tivo ocasiom de o visitar na sua casa de Lisboa e comprovar a dignidade com que enfrentava a morte certa. NÓS-Unidade Popular quer render sincera homenagem ao companheiro Francisco Martins, transladando o nosso ánimo aos camaradas e às camaradas do colectivo comunista português Política Operária.

Digno luitador polo socialismo, amigo da causa nacional galega A Direcçom Nacional de NÓS-Unidade Popular, organizaçom independentista, socialista e antipatriarcal galega, quer saudar este acto de homenagem ao companheiro Francisco Martins. Desde o momento em que a nossa organizaçom foi fundada, em 2001, o Chico converteu-se em referente ideológico da nossa esquerda independentista e apoiante incondicional dos direitos nacionais do nosso povo. Visitou o nosso país em numerosas ocasions durante a última década da sua vida, e as revistas e publicaçons do colectivo Política Operária tenhem feito parte do acervo teórico da militáncia independentista e revolucionária galega. O Chico foi nestes anos um bom amigo, um companheiro que para nós representou o melhor património revolucionário da esquerda portuguesa nascida do combate ao fascismo e da irrenunciável defesa de um projecto político próprio e libertador da classe operária. Em Francisco Martins Rodrigues, o povo trabalhador português tem sem dúvida um exemplo de dignidade e fidelidade a essa classe que une os povos por cima das fronteiras. Nesse caminho de libertaçom, os povos português e galego terám que encontrar-se para juntos conquistar umha sociedade sem classes nem imposiçons sociais, nacionais e de género. Viva a luita revolucionária socialista! Viva a solidariedade internacionalista! Direcçom Nacional de NÓS-Unidade Popular

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Heresia revolucionária, marxismo genuíno A biografia de Francisco Martins Rodrigues [FMR], é um exemplo admirável do integral combatente comunista que nunca, nem nas mais adversas condiçons, claudica nem capitula, defendendo sem concessons os princípios inquestionáveis da Revoluçom Socialista. Nasceu em Moura, na regiom portuguesa do Alentejo, a 14 de Novembro de 1927. O seu pai foi oficial do exército, de onde foi expulso por ser oposicionista ao governo, e sua mae era filha de pequenos proprietários. Porém, as dificuldades económicas de umha numerosa família de cinco irmaos provoca a mudança para Lisboa onde estuda até ao 6º ano do liceu, empregando-se primeiro numha livraria para posteriormente trabalhar como “aprendiz de mecánico”, na TAP. Nesse mesmo ano de 1949 adere ao MUD Juvenil [Movimento de Unidade Democrática], tendo sido preso 3 meses por participar numha concentraçom contra a NATO, e posteriormente expulso da TAP. É libertado em 1951, arranja emprego num estabelecimento de venda de frigoríficos, mas passa depois a dedicar-se totalmente ao activismo e à militáncia política no MUD Juvenil, formando parte da direcçom. É de novo preso em Maio de 1952 por realizar graffitis políticos e distribuir panfletos contra a NATO. Depois de ser libertado condicionalmente em Novembro do mesmo ano volta a ser detido, por fazer “campanha contra a vinda a Lisboa do general Ridgway, o criminoso da guerra bacteriológica na Coreia”. Dadas as sucessivas prisons e o facto de viver com os pais, abandona a casa, passando a residir em diferentes moradas e sob nomes falsos.

Revolucionário profissional Em 1953, com vinte e seis anos, o “camarada Campos” passa definitivamente à clandestinidade, ingressando como funcionário do PCP, mas umha doença pulmonar provoca que passe praticamente todo 1954 num sanatório para o restabelecimento. Em 1956 quando está “recuado” numha tipografia clandestina do partido em Lisboa editando o material teórico sobre o XX Congresso do PCUS, co-

meça a questionar a viragem do PCP resultado da tese da “coexistência pacífica” soviética. A nova linha “cheirava a conversa social-democrata”, o que unido à saída nos jornais do relatório Kruchev [onde Estaline é acusado de crimes e atrocidades, bem como do culto da personalidade] provocava ainda mais dúvidas entre um Chico Martins que estava configurando, seguindo os ensinamentos da dialéctica materialista, critérios de opiniom, de análise e de pensamento próprio. Em 1957 é preso de novo, por quarta

“O abc do comunismo é o ódio e desprezo polos poderosos. A necessidade de os combater. Sempre. Essa é a nossa arma secreta” vez, por denúncia de um infiltrado no partido, passando três meses de prisom. Na cadeia de Peniche, onde estuda e começa a confeccionar textos de análise e reflexom teórica, conhece vários dirigentes do partido, como Álvaro Cunhal, Francisco Miguel e Jaime Serra, tendo a oportunidade de debater com eles a “linha do partido”, que considerava se estava afastando do leninismo.

Fuga de Peniche No dia 3 de Janeiro de 1960, participa na espectacular fuga da prisom de Peniche –umha das mais duras prisons políticas de Portugal, umha fortaleza antiga, à beira do mar, a meio caminho entre Lisboa e Coimbra– junto a outros nove dirigentes do PCP: Álvaro Cunhal, Francisco Miguel, Joaquim Gomes, Jaime Serra, Pedro Soares, José Carlos, Guilherme da Costa Carvalho, Rogério de Carvalho e Carlos Costa. A fuga converte-se num mito na luita contra o regime salazarista, reforçan-

do o prestígio do PCP como motor e principal força de combate ao fascismo. De novo em liberdade, é colocado numha tipografia clandestina em Carnide, nas redondezas de Lisboa, onde passa um ano sem pisar a rua. Em Maio de 1961, é incorporado ao Comité Local de Lisboa e torna-se membro suplente do Comité Central, para passar a fazer parte já em 1962 da Comissom Executiva com Blanqui Teixeira, na altura membro do Secretariado no interior, mais Alexandre Castanheira. A repressom provoca importantes e numerosas quedas de militantes comunistas no final de 1961, o que obrigava o trabalho desses três membros da Comissom Executiva do Comité Central a envolver todo o país, competendo a FMR a margem sul e os arredores de Lisboa.

Oposiçom radical à guerra colonial Com o início da guerra colonial africana, foi-lhe pedido “escrever um manifesto em nome do Comité Central”, mas o escrito nom chega a sair da tipografia, pois Álvaro Cunhal o considera “muito vermelhusco”, fora do “espírito do partido” e é censurado. FMR, aplicando os princípios leninistas, optava por promover a insurreiçom popular armada como melhor mecanismo de oposiçom à luita colonial. A mais eficaz forma de contribuir para a causa da libertaçom dos povos oprimidos polo colonialismo português era derrubando o governo fascista. Novamente som solicitados debates sobre a “linha do partido”, basicamente no referente à questom sobre a estratégia frente à guerra colonial, ou a posiçom sobre as críticas feitas pola China à URSS. Embora a clandestinidade e a repressom dificultassem e limitassem a discussom, FMR questiona a linha política tomada, escreve várias cartas à direcçom solicitando debate, sem obter resposta. Na audiçom da Rádio Pequim vai assistindo às críticas feitas à linha do PCF [de Thorez], do PCI e as divergências da linha chinesa face ao titismo.

internacional

internacional

Francisco Martins Rodrigues • Moura 1927 - Lisboa 2008

Francisco Martins

Ruptura com o reformismo No Verao de 1963, vai a Moscovo para participar numha reuniom do Comité Central do exterior, para levar e apresentar um relatório do Secretariado do interior com o qual “discordava”, e para debater as suas “incompreensons” perante a linha do partido. Encontrase com Álvaro Cunhal e Francisco Miguel, mas as divergências mantenhemse ao fim de três dias de debate. A decisom que sai da reuniom estabeleceu que FMR ficaria como membro do CC no exterior, deixando a Comissom Executiva. Para acautelar umha possível actividade cisionista, propugérom a FMR ser secretário de Álvaro Cunhal, mas perante a negativa de Cunhal, que tinha acusado de oportunista, é enviado para Paris.

Promotor do maoismo português Em Outubro de 1963 chega a Paris para integrar umha organizaçom do PCP. Em reunions partidárias, assiste a debates criticando a linha seguida polo PCP contra a guerra colonial, a “passagem pacífica ao socialismo” ou a crítica feita à “revoluçom democrática e nacional”. O maoísmo começava também a ter eco na estrutura do PCP na capital francesa. Inicia ligaçons com João Pulido Valente e Rui d’Espiney, exilados na Argélia e em dissidência com o PCP. De seguida, abandona o PCP e funda, em Janeiro de 1964, a FAP [Frente de Acção Popular]. Questons de estratégia em torno do aparecimento da FAP e as criticas levantadas sobre o facto de existir umha frente popular sem a direcçom política de um partido de vanguarda, provoca a fundaçom do CMLP [Comité Marxista Leninista Português], onde se procurava “reconstruir” ou “refundar” o PCP, enquanto motor dirigente da frente popular de massas contra o fascismo. O CMLP editou [1964-65] o jornal Revolução Popular. Depois de visitar a China no Verao de 1964 e posteriormente a Albánia para conhecer de primeira mao os modelos “socialistas” alternativos a Moscovo, em 1965 entra clandestinamente em Portugal para reconstruir o partido comunista a partir de posiçons revolucionárias.

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internacional análise

internacional Francisco Martins

Nos primeiros dias de Dezembro de 1965, Francisco Martins Rodrigues e D’Espinay identificam no CMLP e na FAP o infiltrado Mário Mateus, colaborador da polícia política, da PIDE, e “quando ficamos com a certeza que ele era mesmo provocador pago pola polícia, demos-lhe dous tiros”. Mateus, que trabalhava em ligaçom com o agente da PIDE de nome Cleto, lograra dar à polícia secreta pistas para a prisom de Pulido Valente. A FAP reivindicou esta acçom que tivo enorme repercussom na esquerda portuguesa. Com 38 anos, FMR é cercado e detido pola PIDE em Janeiro de 1966. Nas instalaçons policiais, sofre malheiras e aplicam-lhe a tortura do sono, sofrendo duas sessons consecutivas de sete dias sem poder dormir até atingir o delírio e perder a consciência. Neste estado naturalmente decifrou nomes que estavam escritos num papel que nom tinha logrado destruir durante a sua captura. Este facto provocará que durante muitos anos decline fazer parte da direcçom política da esquerda revolucionária portuguesa. “É umha ferida muito grande. Isso colocou-me numha situaçom que influenciou toda a minha posiçom no PCR, influenciou toda a minha demora a fazer a ruptura. Todo o percurso que figem estivo vinculado a isso”. Posteriormente, num julgamento farsa, é condenado em pena cumulativa (política e penal) de 20 anos de prisom junto aos 12 de Pulido Valente e aos 15 de Rui d’Espiney.

análise

Análise eleitoral

O último preso político do 25 de­ Abril­ Spínola finalmente cede e a liberdade definitiva chega às 20h45 do 27 de Abril de 1974 para os três últimos presos políticos da Cadeia do Forte de Peniche. Os do PCP há dias que tinham sido libertados. As essas horas, o major Azevedo, mandatário da Junta de Salvação Nacional, comunicou a Francisco Martins Rodrigues, Rui Pires de Carvalho d’Espinay e Filipe Viegas Aleixo que podiam abandonar livremente a casa dos advogados onde tinha sido fixada a residência após o 25 de Abril. Já em liberdade, participa no grande movimento de massas gerado pola queda do fascismo após ter passado

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“O sistema capitalista nom vai evoluir, nem vai desaparecer por si, nem vai entregar o poder, a única perspectiva que existe é o seu derrubamento pola força”

20 anos na clandestinidade, 12 dos quais nas masmorras salazaristas. A reconstruçom do partido comunista revolucionário Logo a seguir ao 1º de Maio de 1974, passa a integrar-se num dos grupos da fragmentada constelaçom maoista que se auto-qualificava como marxista-leninista, no CARP (M-L), jogando um papel destacado no processo de confluência, primeiro como ORPC (Organizaçom para a Reconstruçom do Partido Comunista), que posteriormente dinamiza a criaçom da UDP em Dezembro de 74, a única organizaçom à esquerda do PCP que atinge representaçom parlamentar e conta com um importante apoio entre o proletariado fabril. Após o contragolpe reaccionário do 25 de Novembro de 1975, com o qual finaliza a crise revolucionária de Abril, o PREC (Processo Revolucionário em Curso), é constituído o PCR (Partido Comunista Reconstruído), no qual passa a fazer parte da sua direcçom. FMR, consagrado já como um dos mais destacados teóricos da esquerda revolucionária portuguesa, caracteriza o 25 de Abril como umha “crise revolucionária”. Destaca como as principais causas da sua derrota a fraqueza estrutural das organizaçons revolucionárias, o subdesenvolvimento teórico e político da corrente M-L, mas especialmente o reformismo do PCP, que nom quijo aprofundar na via socialista procurando unicamente umha transformaçom a fundo do capitalismo português para situar Portugal entre as democracias ocidentais, como con-

seqüência da estratégia do levantamento nacional, da “unidade dos portugueses honrados”. Numha entrevista realizada em Agosto de 2004, o Chico Martins afirmava que “a linha de Cunhal assentava num erro clamoroso que era ele convencer-se que a democracia burguesa feita com a ajuda de um forte PC teria que ser umha democracia burguesa progressista, de esquerda, que deixaria um grande lugar ao PC. Acreditava que o PC ia ser reconhecido e ter umha grande participaçom no governo. Verificou-se que isso era um sonho, umha completa utopia, porque a burguesia estava assustada com o processo revolucionário. A burguesia portuguesa é conservadora ao máximo, estava habituada a cinqüenta anos de tranquilidade, de segurança, ficou apavorada com o processo”.

Em 1983, rompe com a UDP-PCR, constituindo o Colectivo Comunista Política Operária, que passa a editar a revista Política Operária, da qual foi director até o seu falecimento em 22 de Abril em Lisboa. Embora a Revolução Popular sentasse as bases para a formaçom de umha nova corrente, questionando a linha estratégica do PCP de aliança com a burguesia liberal, depois nom continuou nessa linha, sendo a causa que posteriormente, no 25 de Abril, nom existisse umha corrente com firmeza ideológica e força suficiente para poder intervir no processo revolucionário. “Sobretodo nas questons relativas à Uniom Soviética a gente nom fijo a ruptura”. O Chico reflectia sobre a deriva reformista da UDP-PCR afirmando que “em relaçom ao que é o socialismo, compreender o fenómeno da Uniom Soviética, ser capaz de apoiar a Revoluçom Russa a cem por cento, mas reconhecer que a Uniom Soviética nom era socialista, nom era possível. Aqui a UDP e o PCR formárom-se completamente com essa herança, “o grande camarada Estaline”. Isso nom é todo, mas acho

“Nom temos inimigos entre os que se batem contra o capitalismo e o imperialismo. A esses desejamos êxitos, venham de onde vinherem. Porque os seus êxitos som também os nossos êxitos”


“O trabalho comunista entre as massas requer muito esforço e brilha pouco”

que isso foi fundamental. Toda a ideia do partido, como funciona o partido, a disciplina interna, a paranóia das fracçons. Havia um ambiente muito fechado no PCR porque nom se discutiu se o partido do tempo de Estaline era o mesmo do tempo de Lenine, se a vida do partido era igual. Só depois é que a gente quando saiu do PCR começou a discutir isso. Os grupos M-L vinham numha crítica de esquerda ao PC por cousas que eram evidentes, mas nom se pode dizer que tivessem toda umha estrutura ideológica, ter base para fazer um programa comunista completamente renovado, autónomo”.

Destacado legado teórico da Política Operária No ensaio Anti Dimitrov 1935-1985 meio século de derrotas da revoluçom, publicado em Março de 1985, realiza um demolidor balanço do relatório do Jorge Dimitrov ao 7º Congresso da Internacional Comunista, que defendia a unidade de todas as forças operárias, populares e democráticas sob umha mesma estratégia, convertendo o proletariado numha simples força de reserva da burguesia liberal, contrariamente ao defendido por Lenine. Para FMR, substituir a luita de classes pola colaboraçom de classes, defender a unidade em torno das reivindicaçons limitadas da pequena burguesia, comuns a todo o povo, leva automa-

ticamente a “sacrificar as reivindicaçons revolucionárias da classe operária” pois solicitando “muito ao proletariado, muito esforço, muito sacrifício, muita organizaçom, mas todo sem passar os limites daquilo que o programa liberal considerava aceitável. Todo o que no proletariado tendesse a ultrapassar esse limite e em falar em seu nome próprio e dos seus interesses próprios a longo prazo era chamado “sectarismo”, “obreirismo”, que só prejudicava a unidade. Portanto, criárom-se geraçons de operários muito luitadores, muito combativos, com um espírito de sacrifício tremendo, e que politicamente eles nem sabiam que a linha política que defendiam era contrária ao interesse a longo prazo da sua classe”. A sua lucidez e aplicaçom dialéctica e criativa do materialismo histórico, mas também a coragem de militante comunista, nom só o levou a se afastar ao longo da sua dilatada trajectória militante das derivas reformistas, mas a prognosticar a capitulaçom e o fracasso das terceiras vias. Assim considerava que para ter a sua identidade própria o proletariado “tem que se demarcar dos outros, e dos mais próximos é que é preciso se demarcar, como dizia o Lenine, que som aqueles com os que a gente se confunde. A gente nom se confunde com os banqueiros, a gente confunde-se com a pequena burguesia que está ao nosso lado. Temos que fazer essa demarcaçom. A nossa política nom pode ser a deles. Tem que ser diferente, mesmo que eles nom gostem”. O FMR sempre mantivo umha enorme flexibilidade táctica, umha grande permeabilidade discursiva inserida na inquestionável defesa dos princípios estratégicos cuja ausência provocou tantos aggiornamentos e capitulaçons. “Claro que a participaçom nas eleiçons pode ser necessária, mas numha condiçom: termos a certeza de que vamos utilizar as instituiçons burguesas e nom deixar-nos utilizar por elas”.

Umha obra a resgatar e difundir O Chico Martins nunca renunciou ao objectivo de reconstruir o partido

comunista revolucionário, porém considerava que nom se podia reproduzir seguindo velhas receitas, utilizando mimeticamente modelos adulterados. “Tenho recusa absoluta em criar umha organizaçom nos moldes antigos, que acho que alguns camaradas espontaneamente tendem a fazer. Moldes antigos de vida interna e de pôr de lado o aprofundamento das questons políticas que nos trouxérom até aqui”. O trabalho paciente e constante define a sua dilatada trajectória militante: “nom nos deve impressionar a acusaçom de “sectarismo” que os reformistas nos lançam, nem a impaciência dos militantes que nom se resignam a um trabalho apagado e querem resultados palpáveis em pouco tempo”. Polemista infatigável, com umha curiosidade intelectual insaciável, sempre estivo à frente das luitas pola defesa dos interesses da classe operária, contra o neoliberalismo, a guerra e o imperialismo, contra o racismo e a xenofobia, a favor dos direitos das mulheres, da juventude e da classe trabalhadora imigrante, procurando a necessária confluência. Com umha boa parte dos seus trabalhos ainda inéditos, tem publicado diversos ensaios políticos, entre os que destacamos “Anti Dimitrov. 1935-1985 meio século de derrotas da revolução” (1985); “O futuro era agora. O movimento popular do 25 de Abril” (1994); “Abril traído” (1999). Francisco Martins Rodrigues é um dos mais qualificados protagonistas e teóricos do movimento revolucionário português. Iconoclasta e herege com dogmas e fetiches, sempre na procura do caminho certo, adequando e incorporando ao método de análise marxista os fenómenos e mudanças do presente, representa o melhor do marxismo criador, é umha das expressons mais elaboradas da acçom teórico-prática do movimento operário do país irmao. Praticamente até semanas antes do seu falecimento boa parte da sua importante reflexom teórica, durante as últimas três décadas, estivo centrada na necessidade de construir umha corrente

internacional análise

“Podemos ainda ser poucos e fracos. Mas as tempestades que aí venhem vam obrigar-nos a ser muitos e muitas. O partido que dizem que já passou de moda -nom o partidoempresa, nom o partido-administraçom, nom o partido-negócio, mas o partido das e dos revolucionários, esse há de voltar. Porque é preciso acabar com o pesadelo e começarmos a viver como seres humanos”

internacional Francisco Martins

operária comunista caracterizada por umha demarcaçom clara entre a linha proletária e a linha pequeno-burguesa. Mas as suas análises e reflexons teóricas som muito mais amplas abordando o fracasso do 25 de Abril, a história e actualidade do movimento revolucionário em Portugal, o profundo dano causado polo estalinismo e o modelo burocrático soviético ao projecto revolucionário comunista. A necessidade de incorporar as diversas cores da rebeldia à luita pola hegemonia socialista som um exemplo a seguir pola esquerda independentista galega.

análise

Eleiçons autonómicas

Amigo da causa nacional galega Autor de dúzias de artigos de opiniom, parte deles recolhidos no livro “O comunismo que aí vem” (2004), foi sem lugar a dúvidas um dos grandes amigos da esquerda independentista galega em Portugal, o nosso embaixador em Lisboa, defendendo sem ambigüidades o direito de autodeterminaçom da Galiza. Desde inícios de século, o Francisco Martins Rodrigues estabelece profundas relaçons de camaradagem e amizade com a Galiza combatente, colaborando assiduamente com o MLNG. Participa nas jornadas patrióticas do 25 de Julho de NÓS-UP e nas iniciativas unitárias, discursando sempre a favor do direito à independência nacional da Galiza; publicando as suas lúcidas análises no jornal comunista Abrente, e assistindo como conferencista nas VI, VIII e X ediçom das Jornadas Independentistas Galegas organizadas por Primeira Linha em 2002, 2004 e 2006. O Chico preocupou-se por divulgar entre a esquerda portuguesa a luita pola independência nacional da Galiza, sendo um firme defensor do direito de autodeterminaçom das naçons peninsulares, convertendo-se num grande amigo da causa galega, aplicando mais umha vez os ensinamentos de Lenine, quem dedicou grandes esforços teóricos nos últimos anos da sua vida a reflectir sobre a necessidade de o proletariado se implicar a fundo na luita nacional.

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internacional análise

internacional análise Análise Colômbia eleitoral

Solidariedade com a insurgência colombiana Perante o assassinato de Raúl Reyes

A Direcçom Nacional de NÓS-Unidade Popular quer transmitir ao comandante em chefe das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia-Exército do Povo, Manuel Marulanda Velez, ao conjunto do seu Secretariado, a tod@s @s combatentes guerrilheir@s, a familiares e amizades, e ao povo trabalhador da Colômbia, o nosso mais sentido pésame pola morte de Raúl Reyes e @s outr@s militantes revolucionári@s. A esquerda independentista galega lamenta profundamente a sua perda. A morte de um revolucionário em qualquer parte do mundo sempre é motivo de tristeza. Mas a morte de Raúl Reyes, como antes foi a do Che, a de Santucho, Moncho Reboiras, a de Néstor Cerpa Cartollini e a de tantas e tantos outr@s nos seus específicos e concretos quadros nacionais de luita internacionalista, é quiçá maior por ser um referente de íntegro revolucionário, com umha admirável trajectória de entrega à causa da libertaçom nacional e construçom do Socialismo na Colômbia. Raúl Reyes morreu na luita polos ideais de liberdade e justiça social aos quais consagrou toda umha intensa e exemplar vida de militante comunista. O governo narco-terrorsita de Álvaro Uribe, seguindo as directrizes do imperialismo norte-americano, nom quer umha soluçom negociada ao conflito colombiano, pretende impedir por todos os meios o desenvolvimento do intercámbio de prisioneir@

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s, apostando no lucrativo negócio da guerra que enriquece a oligarquia e empobrece as massas populares. Por este motivo, assassinou vilmente nos sábado 1 de Março de 2008, poucos dias depois da entrega unilateral de quatro ex-congressistas, Raúl Reyes, e o resto de combatentes que o acompanhavam. Embora a sua morte seja umha lamentável perda para a maioria social colombiana, para a classe trabalhadora e @s oprimid@s do mundo, na Galiza rebelde estamos firmemente convencid@s de que o desprezível assassinato de Raúl Reyes nom evitará a derrota do Estado narco-terrorista colombiano, fiel vassalo dos interesses do imperialismo norte-americano, o Israel da América Latina. NÓS-UP confia na imensa capacidade das FARC-EP, como vanguarda do povo colombiano, para seguir avançando no desenvolvimento da Revoluçom colombiana. Da Galiza, NÓS-Unidade Popular quer transmitir-vos a nossa incondicional solidariedade com a vossa luita que também é a nossa. Até a vitória sempre comandante Raúl Reyes!! Viva a Revoluçom Colombiana!! Viva o movimento bolivariano!! Viva o internacionalismo!! Galiza, 6 de Março de 2008


Com profundo pesar, recebemos a notícia do falecimento de Manuel Marulanda Vélez a conseqüência de um enfarte no passado dia 26 de Março, nalgum lugar das montanhas da Colômbia. A trajectória vital e militante de Tirofijo, alcunha de Pedro Antonio Marín, fundador e Comandante em Chefe das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia-Exército do Povo (FARC-EP), é um espelho da mais genuína resistência popular frente às nefastas conseqüências provocadas polo imperialismo na América Latina e polos governos oligárquicos que levam quase um século dominando os seus respectivos povos. Manuel faleceu com 78 anos, dirigindo o exército revolucionário mais importante da América Latina, a maior força popular insurgente do continente, a esperança mais tangível de emancipaçom da maioria social. Manuel foi, antes de mais, um “bravo galo colombiano”, que passou de ser um humilde jovem camponês que perante a brutalidade da violência oligárquica desatada na Colômbia em 1948 opta por se refugiar no monte para nom ser massacrado, constituir posteriormente umha milícia rural de autodefesa camponesa e, após diversas experiências e vitórias militares, reformulá-la em 1964, agora com um programa político e ideológico marxista, nas actuais FARC. Mas o camarada Manuel Marulanda é sobretodo um dos melhores exemplos da constância e coerência revolucionária, da firmeza nos princípios, da integridade dos valores humanistas e libertadores que definem as FARC-EP e a todo o movimento bolivariano que combate sem trégua o regime terrorista de Álvaro Uribe, o Israel da América Latina.

Frente ao criminoso governo colombiano, essa pseudodemocracia burguesa alicerçada no narcotráfico e no negócio da guerra, de corruptos generais e de umha casta política que governa exclusivamente para as famílias oligárquicas e as multinacionais, que entregárom a preço de saldo o país aos interesses dos EUA, que semanalmente assassina sindicalistas e activistas sociais, Tirofijo e as FARCEP representam a dignidade, a resistência, os mais profundos anseios de emancipaçom e libertaçom da imensa maioria do povo colombiano que nom

América Latina e também para o resto dos povos do mundo que como o galego nom nos resignamos a ser devorados pola lógica que nos pretende impor o capitalismo neoliberal. NÓS-UP condena sem paliativos a persistente campanha de calúnias promovida polas empresas espanholas de (des)informaçom que, respondendo unicamente aos interesses económicos das multinacionais e do capitalismo espanhol, deformam e adulteram a natureza e o projecto político-ideológico das FARC-EP, lavando sem o menor

internacional análise

A Galiza rebelde e combativa manifesta a sua dor pola morte do camarada Manuel Marulanda Vélez

internacional Colômbia

análise

Eleiçons NÓS-UP quer transmitir ao Secretaautonómicas riado, ao conjunto d@s combatentes das FARC-EP, das milícias bolivarianas, à militáncia do Partido Comunista Clandestino, do Movimento Bolivariano por umha Nova Colômbia, a familiares e seres queridos de Manuel, à direcçom e entidades da Coordenadora Continental Bolivariana de cuja Presidência Colectiva fazia parte, ao conjunto do povo trabalhador colombiano, aos povos e naçons trabalhadoras do mundo, os mais sinceros pésames da Galiza rebelde, do conjunto da nova esquerda independentista, polo seu falecimento. A morte de Manuel, como antes a dos comandantes Jacobo Arenas, Raúl Reyes e Iván Ríos, e muito antes a de Simón Bolívar, José Carlos Mariátegui, Che Guevara, entre tant@s milhons de anónimos luitadoras e luitadores, nom deterám o processo histórico que se desenvolve na Colômbia e em boa parte do continente americano.

Alfonso Cano, Manuel Marulanda e Jorge Briceño “Mono Jojoy”

participa na farsa eleitoral sobre a qual se legitima o uribismo. Manuel nunca se rendeu, nem se deixou seduzir polos cantos de sereia, nom capitulou quando erroneamente lhe recomendárom abandonar a luita, nem quando os regimes burocráticos do socialismo soviético fôrom implosionados. Mais de quatro décadas à frente das FARC-EP é a mais eloqüente mostra da sua estatura de líder revolucionário e indiscutível referente de luita para as massas excluídas da Colômbia, da

escrúpulo a cara manchada de sangue e cocaína do ilegítimo governo de Nariño, que actualmente se mantém no poder pola injecçom mensal de milhons de dólares e dos milhares de assessores militares ianques do imperialista “Plano Colômbia”. A esquerda independentista galega nom duvida da justa luita encabeçada polas FARC-EP, e reitera a identificaçom e camaradagem com os objectivos estratégicos da Independência e o Socialismo, bandeiras com que combatem em cidades e montanhas milhares de homens e mulheres das FARC-EP.

O camarada Manuel Marulanda já nom poderá fisicamente entrar em cavalo branco sobre um Bogotá libertado. Sabemos que mais cedo que tarde os princípios e ideais aos que dedicou a sua vida serám determinantes na refundaçom da nova Colômbia, no que sem lugar a dúvidas será a segunda e verdadeira independência baseda na paz e justiça social, no quadro da integral transformaçom continental que tanto sonhou e à qual consagrou a sua intensa vida.

Direcçom Nacional de NÓS-UP Galiza, 27 de Maio de 2008

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internacional

internacional Venezuela

Constituida associaçom solidária Galiza-Venezuela A Associaçom Galega de Amizade com a Revoluçom Bolivariana (AGARB) ficou constituída no sábado dia 7 de Junho numha assembleia nacional de carácter aberto realizada nos locais da Casa do Imigrante, no bairro viguês do Calvário. No encontro, de carácter público, que culminava um dilatado processo prévio de reunions e definiçom da iniciativa, fôrom debatidos e aprovados os Princípios e o Manifesto da AGARB,

assim como o plano de trabalho deste colectivo de solidariedade com o processo revolucionário venezuelano. Xavier Moreda foi eleito coordenador provisório da iniciativa na assembleia, que contou com a presença de Pedro Ugueto, cônsul da Venezuela em Vigo. A AGARB define-se como umha “organizaçom popular sem ánimo lucrativo, enquadrada nos parámetros da esquerda soberanista e anticapitalista galega”. Polo seu interesse, reproduzimos o Manifesto que será submetido a debate e aprovaçom.

Manifesto da Associaçom Galega de Amizade com a Revoluçom Bolivariana (AGARB)

Após a queda dos regimes burocráticos identificados com o modelo soviético e a longa ofensiva neoliberal imposta polo imperialismo na América Latina, umha nova época começa a abrolhar na Pátria Grande de Bolívar. A tenaz, heróica e incansável luita por um novo mundo que, durante décadas e na maior das solidades, mantivo e mantém acesa a Revoluçom cubana, a insurgência colombiana e as diversas resistências e luitas populares multicolores dos povos indígenas, afro-americanos, das mulheres, da juventude, da classe obreira, de pobres e excluídos sociais, fecundou na actualidade. Na alvorada do novo século XXI, é umha realidade tangível e esperançosa o despertar dos povos da América Latina a recolher o latejar, o fluir das experiências, dos combates, na esteira do melhor pensamento e luitas americanas fundidas com os contributos do marxismo revolucionário. Desde José Marti, Artigas, Sucre, Manuel Rodríguez e Bolívar; passando por Emiliano Zapata, Farabundo Martí, Augusto César Sandino e Carlos Mariátegui; Carlos Fonseca, Carlos Marighella, Che Guevara e Fidel; até Manuel Marulanda e Hugo Chávez; há um interminável e dialéctico fio condutor que a memória e luitas colectivas populares foi capaz de sintetizar e enriquecer. Assim, hoje os povos da América escrevem umha nova página na libertaçom e emancipaçom da humanidade contra a

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criminosa fase neoliberal do capitalismo. Neste processo, a República Bolivariana da Venezuela ocupa um lugar destacado. O processo revolucionário em curso está a servir como catalisador para consolidar e reforçar as luitas pola soberania nacional, contra o neoliberalismo e o imperialismo ao longo do continente.

Perante as vitórias e o exemplo que a Venezuela emana para @s excluíd@s e @s pobres do mundo, para @ s humilhad@s e carentes de esperança, o imperialismo emprega todos as armas de que dispom para desqualificar, caricaturar, manipular a verdadeira magnitude e objectivos da Revoluçom

Bolivariana e do emancipador projecto continental que representa. Por este motivo, da periferia do centro capitalista, de um pequeno povo carente de soberania chamado Galiza, conhecedor da rapina imperialista, da lógica predadora do capitalismo, nasce a Associaçom Galega de Amizade com a Revoluçom Bolivariana (AGARB) para modesta e humildemente contribuir n o

apoio à luita do povo venezuelano contra o imperialismo e em prol do socialismo. A Venezuela foi um dos países americanos que generosamente durante décadas acolheu dezenas de milhares de galegas e galegos que, na fugida da

pobreza a que o capitalismo espanhol submete a Galiza, procurárom umha vida melhor. Também serviu como retaguarda para a luita de libertaçom nacional e social, acolhendo dúzias de exilad@s e fornecendo umha base para construir organizaçons revolucionárias. O povo galego tem umha dívida histórica com o povo da Venezuela, com o que devemos corresponder solidariamente. Os principais objectivos da Associaçom Galega de Amizade com a Revoluçom Bolivariana som difundir na Galiza o processo revolucionário em curso na República Bolivariana da Venezuela; apoiar a luita anti-imperialista e em prol da construçom do socialismo neste país irmao; procurar apoios e adesons à causa bolivariana entre o povo trabalhador galego; impulsionar projectos de cooperaçom, intercámbio, solidariedade e conhecimento mútuo entre o povo galego e o povo venezuelano; recuperar e difundir os históricos laços de amizade entre a Galiza e a Venezuela; e reforçar a luita anti-imperialista e anticapitalista, pola soberania nacional no caminho de Socialismo do século XXI Pátria, Socialismo ou Morte! Galiza, 7 de Junho de 2008, no 80 aniversário do nascimento do Che

Para mais informaçom http://agarb.blogspot.com// agarbolivariana@gmail.com




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